07_Modulo 06_Investigacao de Homicidios
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Módulo 6 – Metodologia aplicada à investigação do crime de homicídio
Apresentação do Módulo
Você chegou ao último módulo.
Para encerrar essa primeira parte do curso, você estudará a metodologia aplicada à
investigação do crime de homicídio.
Inicialmente você estudará a investigação criminal como um processo científico. Logo depois,
o método definido pela lei processual penal, visto ser a investigação criminal a primeira fase
da persecução ao infrator da lei penal. Você estudará também os métodos operacionais
comumente aplicados pela polícia na busca da prova do crime de homicídio ; abordará,
especificamente, os métodos do rastejamento, dos círculos concêntricos e da detonação. Por
último, fará uma análise do processo de escolha dos métodos e das técnicas que serão
aplicadas na busca da prova do crime de homicídio.
Bom estudo!
Objetivos do Módulo
Ao final do estudo deste módulo, você será capaz de:
Explicar a investigação de homicídio como um processo científico;
Aplicar os métodos de investigação de homicídio;
Contrastar os métodos e técnicas de investigação para escolher a mais adequada para
cada situação.
Estrutura do Módulo
Aula 1 – Processo científico da investigação de homicídio – aspectos
Aula 2 – Metodologia da coleta da prova no inquérito policial – metodologia do CPP aplicada
à investigação de homicídio
Aula 3 – Métodos aplicados à investigação de homicídio – método do rastejamento
Aula 4 – Outros métodos utilizados na investigação do crime de homicídios – Método dos
círculos concêntricos e Método da detonação
Aula 5 – Escolha do método e das técnicas que serão aplicadas na investigação de homicídio
Aula 1 – Processo científico da investigação de homicídio
Antes de qualquer análise sobre a metodologia da investigação de homicídio, é importante
analisar a seguinte questão: a investigação criminal é um processo científico?
Para chegar a uma resposta, estude, a seguir, alguns conceitos importantes como método
científico e investigação científica.
1.1. Método científico
Quando se fala de processo científico, normalmente se é levado ao conceito do método
científico. Denker, citado por Araújo (2008), diz que “método científico é um conjunto de
regras ou critérios que servem de referência no processo de busca da explicação ou da
elaboração de previsões em relação a questões ou problemas específicos”.
Sobre o mesmo conceito, vale a pena vermos a fala de Dourado e Sequeira ( ):
“O método científico corresponde a uma sequência linear de várias etapas que, segundo
Millar (1991), se inicia com a observação. As restantes etapas incluem habitualmente: a
formulação de hipóteses, o desenho de experiência, a recolha de dados, a análise de dados e a
elaboração de conclusões (Storey & Carter, 1992). A implementação dessas etapas conduz às
explicações, desde que estas tenham sido efectuadas de um modo cuidadosamente estruturado
e sequenciado (Millar, 1998)”. (Dourado & Sequeira, ...).
Analisando os conceitos, a ideia de método científico é a de uma sequência ordenada e linear
de atividades que levarão a uma conclusão. Essa visão dificilmente se adequará perfeitamente
ao processo de apuração de um delito, em que necessariamente as atividades de busca de
prova nem sempre seguirão uma ordem absolutamente linear.
Ainda fazendo referência a Denker, Araújo (2008) diz que para a autora, “o emprego do
método é que faz com que o conhecimento seja considerado científico. Para ela, são três os
elementos que formam a base da investigação científica e caracterizam o conhecimento como
ciência: a teoria, o método e a técnica, sendo esta o “como fazer”, o que é estabelecido pelo
método”.
1.2. Investigação científica
Entretanto, segundo Dourado & Serqueira ( ), as atuais perspectivas no domínio da filosofia
da ciência são no sentido de assumir uma diversidade de procedimentos me todológicos
acatados pela comunidade científica na prática do trabalho científico, não considerando
apenas o rigor dos procedimentos do método científico para construção do conhecimento
científico. Segundo eles, essas mudanças epistemológicas da ciência permitem compreender
que o “fazer ciência” é concretizado através de “investigações”, entendidas como uma
modalidade de resolução de problemas, conforme (Gott & Duggan, 1995), citado pelos
mesmos autores.
Para Giordan e Hodson, citados por Dourado & Serqueira ( ), na investigação não há uma
sequência de etapas bem definidas; há uma sequência de etapas possíveis em que as diferentes
atividades do investigador se misturam continuamente. Apesar disso, são essas etapas que o
levarão à produção do conhecimento científico.
Ainda no ponto de vista de Dourado & Serqueira ( ), “para caracterizar o percurso do
investigador, existem três elementos principais: questão, hipótese e experiência. Estes são
difíceis de separar, funcionando geralmente como um todo, ou frequentemente como um
sistema de interações múltiplas e de feedback.”
É esse conceito de investigação científica que irá nortear a abordagem que será dada ao
processo da investigação de homicídio para que você possa analisá- lo e compreendê- lo como
científico ou não.
1.3. Processo da investigação criminal
Segundo Araújo (2008), uma análise do padrão geral da investigação científica permite a
constatação, aqui citando Copi (1981, p. 391), de que “o detetive, cujo objeto não é idêntico
ao do cientista puro, mas cuja abordagem e técnica para a investigação dos problemas
ilustram, claramente, o método científico”.
Veja que investigar um delito não é muito diferente da investigação de outro fenômeno
qualquer de interesse da ciência.
Informam Dourado & Serqueira ( ) que a investigação, ainda que de forma não
necessariamente sequencial, segue as seguintes etapas: observação, identificação do
problema, formulação de hipóteses, realização de experiências para testar as hipóteses ,
decisões sobre os dados a recolher e modo como fazer, elaboração de conclusões e
apresentação de teorias.
Será que esse processo se aplicaria à investigação de homicídio?
Veja cada uma das etapas.
1.4. Etapas do processo da investigação científica
a. Observação
A pesquisa científica é uma observação da realidade. É o processo inicial da busca de
informações. Grande parte dos dados buscados pelo pesquisador é obtida pela observação
direita de uma situação.
Essa observação receberá influência de ideias prévias e da experiência de vida de quem a
executa. É possível então, que diante de uma mesma situação, pessoas diferentes tenham
conclusões diferentes.
E você, como aplicaria à investigação criminal o procedimento da observação?
Na investigação de homicídio não é diferente. Há um fato carregado de informações, sejam
materiais (vestígios) ou testemunhais. O primeiro procedimento é observá-lo, compará-lo com
os conhecimentos prévios adquiridos pelo investigador, seja do direito ou das ciências
forenses. Só depois disso é que ele será capaz de começar a identificar o problema que tem
diante de si e formular as primeiras hipóteses sobre as circunstâncias e autoria.
b. Identificação do problema
Antes é preciso saber o que é um problema, certo?
A esse respeito, veja o que diz Copi em citação de Araújo (2008):
“Podemos caracterizar um problema como um fato, ou um grupo de fatos, para o qual não
dispomos de qualquer explicação aceitável, que pareça incomum ou que não se adapte às
nossas expectativas ou preconceitos.” (COPI, 1981 p. 392)
Para Dourado & Serqueira ( ), o problema assume na investigação um papel fundamental,
considerando que o objetivo dela é exatamente a resolução de problemas. É o problema que
irá orientar todo o trabalho subsequente da investigação.
Pode-se dizer que na investigação criminal, o problema é o fato posto diante do investigador
que requer a interferência do Estado para definição das circunstâncias em que ele ocorreu e de
quem o praticou. É o caso sob investigação.
Definir o problema é dizer se é um fenômeno que interessa ao direito penal. É preciso então
dizer se houve a prática de um delito, pelo menos em tese, pois a confirmação dessa
possibilidade só se dará no processo judicial.
Exemplo:
Um cadáver do sexo masculino encontrado sentado no sofá da sala de sua casa. Não há
qualquer evidência de que tenha sido vítima de uma ação delituosa.
Com esses dados é possível formular um problema?
Provavelmente não. Será necessária uma leitura mais ampla de todo o contexto que envolve o
cadáver na busca de algum vestígio que indique o que possa ter acontecido ali.
Entretanto, muitas vezes, não é tão simples formular um problema diante de um fato. Segundo
Copi (1981), citado por Araújo (2008), a “mente ativa vê problemas onde a pessoa obtusa só
vê objetos familiares”.
Faça uma breve reflexão.
Imagine um simples taco de sinuca colocado normalmente sobre uma mesa de sinuca, junto às
bolas de sinuca, em um bar onde pessoas bebem e conversam normalmente.
O que esse taco significaria para você nesse cenário?
Provavelmente só um taco de sinuca aguardando ser usado por frequentadores do bar.
E se o mesmo taco, no mesmo lugar, estivesse com o cabo sujo de sangue?
Qual seria sua leitura para essa cena?
Provavelmente pensaria que aquele taco fora utilizado para agredir alguém, certo?
A partir dessa avaliação, se iniciaria a formulação de um problema de interesse jurídico, visto
que não é usual um taco de sinuca ser encontrado sujo de sangue sobre uma mesa de sinuca
em um bar.
Definir a natureza do problema posto é a única forma de saber se há ou não justa causa para o
desencadeamento de uma investigação criminal. Do contrário, poderá o investigador incorrer
em abuso de autoridade.
c. Formulação de hipóteses
Definido o problema, o investigador dará início a um processo de raciocínio que o leva a
conclusões a partir das premissas formuladas, certo?
A respeito, diz Dencker (2007): “A hipótese é a resposta provável do problema que será
testada na pesquisa.”
Araujo (2008) traz no seu Curso de investigação criminal o seguinte conceito:
Hipótese é uma suposição feita pelo investigador na tentativa de responder o problema (o fato
questionado). É a resposta provável de qual, como e quem praticou o crime, que precisa ser
testada pela investigação. (Araujo, 2008)
Falando da investigação científica, dizem Dourado e Sequeira ( ):
“No contexto de uma investigação considera-se que a formulação de hipóteses exige uma
compreensão clara dos fenômenos em estudo, envolvendo, por isso, teorias prévias, e
corresponde a uma actividade de elevada criatividade intelectual.”
Veja que aqui entra a questão do processo cumulativo de aquisição de conhecimento por parte
do investigador, chamado de marco teórico, que serve para orientá- lo na formatação do
problema e na formulação das hipóteses que irá estudar. Esse modelo teórico impede a visão
obtusa citada anteriormente.
Diante de um fato (um cadáver ou a notícia da morte de alguém), tal qual o cientista puro, o
que faz inicialmente o investigador?
Perguntas, não é verdade?
A resposta provável e imediata encontrada em face do contexto e das circunstâncias
conhecidas é o que se chama de hipótese a ser confirmada ou não pela investigação.
A hipótese formulada pelo investigador criminal não é uma simples especulação, mas uma
afirmação baseada em conhecimentos existentes e estimulada pela percepção e observação
dos fatos que lhe são apresentados em um contexto.
Veja um exemplo:
Ao chegar a um local de crime, numa rua deserta e escura, o investigador encontra o cadáver
de uma pessoa do sexo feminino, jovem, caído em decúbito ventral com uma lesão nas costas
provocada por projétil de arma de fogo disparado à curta distância. Em uma das mãos segura
a alça de uma bolsa. Uma das sandálias que calçava está fora do pé, a uns dois metros distante
do corpo. A pessoa que havia chamado a polícia disse ter ouvido o barulho de alguém
correndo gritando e do disparo de uma arma de fogo. O investigador, baseado no contexto dos
dados descritos, nas experiências anteriores e no referencial teórico que lhe é dado pelo direito
penal e pelas ciências forenses, afirma que naquele local provavelmente ocorreu um latrocínio
(roubo seguido da morte da vítima para assegurar a posse do bem subtraído) nas seguintes
circunstâncias: a vítima passava por aquele local quando teria sido abordada pelo autor, que
saiu da escuridão portando uma arma de fogo e pedindo a bolsa. Como a vítima tentou fugir
correndo, o autor efetuou um disparo contra suas costas. Já caída, lhe foi arrancada a bolsa
que segurava.
Essa não é apenas uma opinião do investigador, mas uma afirmação segura baseada em
conhecimentos adquiridos e na constatação de um contexto de informações que estão ao seu
alcance por meio de vestígios materiais e de um testemunho.
Formulada a hipótese, cabe agora à investigação verificar a validade dessa a firmação. A
hipótese poderá ser confirmada ou rejeitada no decorrer da pesquisa.
Exemplo:
Recorrendo ao caso citado anteriormente, poderá ser que no decorrer da investigação, as
evidências colhidas indiquem para a prática de um homicídio e não de um latroc ínio, visto a
comprovação de que a ação foi simulada pelo autor, o qual, na verdade, fora contratado pelo
ex-namorado da vítima para matá- la.
A tarefa do investigador, tal qual a do cientista, consiste em coletar informações sobre um
determinado fato, analisá- las e interpretá- las para produzir um conhecimento que irá permitir
a reconstrução, o mais próximo possível da realidade, daquele fato, confirmando ou rejeitando
as hipóteses levantadas que poderão ser preliminares (as iniciais que desencadeiam outras) e
definitivas (aquelas que realmente confirmam as verdadeiras circunstâncias e autoria).
d. Realização de experiências para testar as hipóteses
O teste das hipóteses na investigação científica é de fundamental importância para que haja a
aceitação ou rejeição destas. São experiências que irão permitir ao pesquisador confirmar ou
não aquilo que se afirmou sobre o problema.
Na investigação de homicídio, isso também é possível ao confrontarem-se todas as
informações colhidas com a realidade posta, de forma a confirmar ou não aquilo que foi
formulado pelo investigador quanto às circunstâncias e autoria do evento em investigação.
Tal qual ocorre com o que Copi ( ) chamou de cientista puro, ao investigador de homicídio
também nem sempre é possível fazer experiências para validação das hipóteses formuladas,
segundo ensinam Dourado e Sequeira ( ) citando Hudson (1998), “devido à inacessibilidade
aos acontecimentos (em termos de tempo e espaço), à sua inadmissibilidade do ponto de vista
ético, ao perigo que comportam e/ou aos custos que significam (Hudson, 1998)”.
Pode-se dizer que um exemplo clássico de experiência para testar as hipóteses levantadas na
investigação de um homicídio é a reprodução simulada (reconstituição). Entretanto, nem
sempre isso é possível no todo, tendo em vista esse procedimento ficar limitado às condutas
possíveis de serem simuladas sem riscos à moral e à segurança pública, conforme limitações
impostas pelo próprio CPP.
Nessa fase estão todos os procedimentos adotados para a coleta de informações que irão
construir a prova do delito em apuração.
e. Decisões sobre os dados a recolher e modo como o fazer
Tal qual ocorre na investigação científica, na investigação de homicídio, ao formular a
hipótese, o investigador está determinando o tipo de informação que precisará recolher para
comprovar, validar a suposição que fez sobre o fato investigado. Sendo sua hipótese sobre
homicídio passional, por exemplo, sua busca deverá ser no sentido de buscar dados que
demonstrem essa suposta motivação.
Ocorre que no curso da busca de informações poderão surgir elementos novos que obriguem o
investigador a reformular seu ponto de vista, pois a verificação dos dados encontrados poderá
não confirmar a hipótese inicial, apontando para outra motivação, portanto para outras
circunstâncias e até para outro suspeito.
Veja que essas decisões sobre o tipo de informação de que o investigador precisa para
confirmar sua teoria sobre as circunstâncias e autoria do homicídio estão vinculadas à
evolução das hipóteses formuladas como dizem Finley & Pocoví (2000) citados por Dourado
e Sequeira ( ):
“Assim, as decisões sobre a recolha de dados não são tomadas de um modo imparcial e
preestabelecido, mas dependem da teoria associada ao problema em estudo (Finley & Pocoví,
2000)”.
Ou seja, a natureza das informações que se busca em cada vestígio depende do olhar posto
pelo investigador no caso apresentado. Depende do ponto de vista estabelecido sobre o fato
ocorrido.
Resumindo, a construção da prova depende da visão do investigador sobre o fato ocorrido.
f. Elaboração de conclusões
A conclusão é a consequência lógica da análise de todas as informações colhidas na
investigação, confirmando ou não aquilo que foi posto na hipótese.
Da mesma forma que na investigação científica pura, a conclusão a que chega o investigador
do homicídio, confirmando ou não a hipótese formulada, não pode ser tomada como definitiva
até que haja sua validação pelo processo penal.
O que isso significa?
Significa que, em homicídio, o investigador nunca deverá tomar como concluída qualquer
investigação ou como verdade absoluta qualquer conclusão a que chegue.
Essas conclusões deverão ser vistas como aceitação ou rejeição provisória da hipótese, pois, a
qualquer momento em que ela for posta em dúvida (no processo ou não), o investigador
deverá estar preparado e disposto para busca de novas informações.
g. Apresentação da teoria
Na investigação científica, a teoria é a sistematização da conclusão a que chegou o
pesquisador; entretanto, uma das suas características é não ser considerada como a última
etapa de uma pesquisa, mas o início de um novo processo que irá confirmá- la ou não,
conforme ensinam Dourado e Sequeira ( ):
“Contudo, no âmbito das investigações não se aceita que a apresentação de uma nova ideia
corresponda à última etapa, uma vez que, frequentemente, ela constitui o início de uma longa
e, por vezes, árdua sequência de discussões, argumentações, réplicas, novas investigações, e
modificações da nova ideia”.
É diferente na investigação de homicídio? Parece que não.
A teoria apresentada pelo investigador é toda a história do crime que ele conseguiu montar
com a estruturação das evidências colhidas mostrando como, onde e quando ocorreu e, ainda,
quem o praticou.
Entretanto, essa não é a versão final da história do crime, pois ela será submetida ao crivo de
um processo penal com os limites da ampla defesa e do contraditório, podendo, ao final, ser
confirmada total ou parcial ou ser rejeitada totalmente, obrigando a polícia sair em busca de
novas informações.
Percebeu?
Seguindo essa linha de raciocínio, parece não haver dúvida de que a investigação de
homicídio é um processo científico, pois faz uso, como toda investigação científica, de
métodos, técnicas e teorias com procedimentos sistematizados. Ela parte da observação de um
problema, formula hipóteses e chega a uma conclusão.
Aula 2 – Metodologia da coleta da prova no inquérito policial – metodologia do Código
de Processo Penal (CPP) aplicada à investigação de homicídio
Nesse primeiro momento é importante que você relembre o conceito de metodologia aplicado
à investigação científica para que possa compreender sua aplicabilidade à investigação
criminal.
Para Dencker (2007), a construção do conhecimento sobre fatos que integram a sociedade
parte de uma ideia inicialmente simples, e, à medida que se avança, vai-se aprofundando o
nível desse conhecimento com a verificação de um número cada vez maior de dados
relacionados ao fato estudado. Essa relação precisa ser analisada e compreendida para que o
investigador possa aproximar cada vez mais o resultado da realidade considerada.
Essa é a abordagem desenvolvida pelo investigador para explicar determinado fato.
Compreendendo a investigação do homicídio como um processo científico, você perceberá
que a investigação de um fato delituoso também busca construir um conhecimento que irá se
aproximar ao máximo da realidade que é investigada. Tal qual a investigação científica
propriamente dita, a investigação do homicídio irá produzir conhecimento provável, com a
probabilidade de ser a resposta ao problema, mas que precisará ser submetido a testes e
verificações pelo processo penal.
Percebeu que a construção do conhecimento induz à existência de um procedimento
sistemático? A uma maneira de fazer?
Pois é. Essa maneira de fazer, essa maneira concreta de produzir o conhecimento é que é
chamada de metodologia.
Como toda ciência, o direito processual penal também constrói modelos esquemáticos da
realidade para orientar a investigação criminal. Esses modelos são encontrados no Código de
Processo Penal (CPP), estabelecendo a metodologia que deve ser aplicada na busca de provas
da prática de um delito de sua autoria.
O CPP adota a metodologia da pesquisa descritiva, com técnicas padronizadas de coleta
sistêmica de dados.
2.1. Metodologia geral
A metodologia que regula os procedimentos gerais da investigação criminal está bem definida
do artigo 6º ao 23 do CPP.
Veja o texto do Código de Processo Penal:
TÍTULO II
DO INQUÉRITO POLICIAL
[...]
Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial
deverá:
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das
coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
(Vide Lei nº 5.970, de 1973)
II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos
criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
IV - ouvir o ofendido;
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do
Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que
lhe tenham ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;
VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras
perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer
juntar aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social,
sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele,
e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e
caráter.
Art. 7o Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo,
a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não
contrarie a moralidade ou a ordem pública.
[...]
Art. 10. [...]
§ 1o A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz
competente.
§ 2o No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas,
mencionando o lugar onde possam ser encontradas.
[...]
Art. 11. Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova,
acompanharão os autos do inquérito.
[...]
Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito.
Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta
de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras
provas tiver notícia.
[...]
Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou
exigido pelo interesse da sociedade.
[...]
Art. 22. No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição
policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja
procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias
ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre
qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição.
Art. 23. Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial
oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o
juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do
indiciado.
2.2. Metodologia específica
O CPP também regulamenta os métodos a serem aplicados de forma específica na coleta de
provas, tanto nos procedimentos da investigação técnico-científica-cartorária como da
investigação técnico-científica-pericial.
A coleta e análise dos dados que irão possibilitar a verificação das hipóteses formuladas
estão regulamentas nos Capítulos do CPP http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del3689.htm que tratam:
a. Do exame de corpo de delito e das perícias em geral, nos artigos 158 a 184;
b. Do interrogatório do acusado, nos artigos 185 a 196;
c. Da confissão: artigos 197 a 200.
d. Do ofendido: no artigo 201.
e. Das testemunhas, nos artigos 202 a 225;
f. Do reconhecimento de pessoas e coisas, nos artigos 226 a 228;
g. Da acareação, nos artigos 229 e 230;
h. Dos indícios, no artigo 239;
i. Da busca e apreensão, nos artigos 240 a 250.
Consulte o CPP e veja que em cada um dos preceitos a lei descreve os procedimentos
metodológicos que serão aplicados na coleta da prova penal.
2.3. Aspectos das metodologias do CPP
Perceba que a metodologia apresentada pela lei processual penal induz a uma prática de
investigação onde são considerados os aspectos interdisciplinar e complementar desse
processo.
O que significa isso?
Primeiro, que a investigação é um procedimento sustentado por vários conhecimentos;
consequentemente, tem a participação necessária de profissionais das mais variadas áreas
(direito, medicina, engenharia, psicologia, sociologia, procedimentos policiais, etc.), as quais
formam as chamadas ciências forenses, que auxiliam a justiça na busca de provas criminais.
Em segundo lugar, que a investigação criminal é um processo de ações que se
complementam. Um ato precisa da complementação de outro. Todos formam uma cadeia de
ações buscando um só objetivo: construir a prova de um crime.
Aula 3 – Método aplicado à investigação de homicídio
Vimos que, sendo um processo científico, a investigação também tem uma metodologia, ou
seja, um modelo esquemático posto pelo direito processual penal para construção do
conhecimento que irá explicar como ocorreu e quem praticou o delito em estudo.
A produção de um conhecimento (provas) sobre determinado delito não é apenas um processo
meramente técnico, mas fruto, também, da capacidade de reflexão e interpretação do
investigador.
Para a produção da prova (conhecimento) de um crime de homicídio não é diferente. Como
em todo processo científico, são utilizados métodos, processos e técnicas diversas.
Buscando sustentação teórica para melhor compreensão e desenvolvimento da ação prática,
pode-se dizer, segundo Dancker (2007) que método “é o conjunto de processos ou fases
empregadas na investigação, na busca do conhecimento”. Pode ser um processo intelectual e
operacional (a própria ordenação da ação da pesquisa).
O método é a estratégia, um plano geral e abrangente, o processo que deverá ser aplicado na
pesquisa das provas de um delito onde há três elementos principais: questão, hipótese e
experiência, conforme visto em aula anterior.
Na investigação de homicídio, o método é a orientação geral para que o investigador chegue a
um fim determinado que é a apuração (explicação) da conduta delituosa de matar alguém.
Ocorre que o Código de Processo Penal limitou-se apenas a descrever as metodologias, salvo
raras exceções, deixando os métodos por conta de outros fundamentos teóricos em disciplinas
complementares, como a própria investigação criminal, a criminalística, a medicina legal, a
administração e outras mais.
3.1. Método do rastejamento
Vimos que a característica da investigação é não ter uma sequência de etapas bem definidas,
mas uma multiplicidade de sequências possíveis, ou seja, ainda que ela desenvolva
procedimentos estabelecidos cientificamente, como construção de problemas, formulação de
hipóteses, análise de dados, etc., essas atividades se misturam com frequência, atendendo as
condições do contexto em que se encontram.
Pela sua natureza, o crime de homicídio tem uma grande diversidade no modo de fazer
(modus operandi), dependendo de fatores como a motivação, o instrumento usado, a
quantidade de autores ou vítimas, o contexto cênico, ou seja, a ambientação do delito (com
um ou mais locais), etc.
Ribeiro (2006), em sua obra Investigação Criminal – homicídio adverte para essa diversidade
das características no modo de fazer o crime, dizendo que o crime “não é uma atividade
rigorosamente padronizada; pelo contrário, dificilmente no delito se repetem os
procedimentos e a mesma lógica”. Esse princípio se aplica muito bem ao homicídio.
Dentro dessa multiplicidade de formas na prática de um delito, em especial do homicídio, a
escolha do método deverá ser fundada no contexto daqueles fatores que influenciaram a
operacionalização do delito.
Nem sempre a notícia de um homicídio chega à polícia acompanhada de informações em uma
ordem cronologicamente lógica. Muitas vezes, ensina Ribeiro (2006), a primeira informação é
sobre o desaparecimento da vítima ou ainda sobre a arma do crime, mas pode ser também
apenas um vestígio fora do contexto.
Há vários métodos aplicados na investigação criminal, em especial no homicídio, com
pequenas variações e adequações às circunstâncias.
Para Ribeiro (2006), o método mais apropriado para apuração do crime de homicídio é o que
ele chama de rastejamento ou rastejo.
Veja o que diz Ribeiro a respeito do processo do rastejamento:
“Nesse método, o investigador parte de um determinado elemento conhecido, submetendo-o à
observação, à análise e a exame. Isso lhe permite chegar ao elemento seguinte e, ass im,
sucessivamente vai perseguindo fielmente o rastro, os vestígios, os dados e as informações
sobre o crime, à medida que vão naturalmente surgindo, até levá-lo ao total desvendamento
do fato”.
A descrição do método demonstra o desenvolvimento de um raciocínio indutivo, em que o
investigador, seguindo passo a passo cada rastro (vestígio ou informação) deixado pela prática
do delito, vai criando uma cadeia de relações entre essas informações particulares até chegar à
informação geral sobre as circunstâncias e autoria do homicídio.
3.2. Etapas do método
O método consiste, portanto, nas seguintes etapas:
Parte de um determinado elemento conhecido – Poderá ser um cadáver, um simples
vestígio (mancha de sangue, um pedaço de tecido rasgado, etc.) ou uma notícia de
desaparecimento, possibilitando, portanto, a formulação do problema.
Submete o elemento conhecido à observação e análise – O elemento inicial torna-se a
realidade a ser conhecida e observada para dela serem tirados os primeiros dados sobre o
problema posto. A análise desses dados possibilitará que o investigador comece a registrar as
primeiras noções do caso.
Formula hipóteses – A observação e análise dos dados iniciais permitirão que
investigador formule as hipóteses que serão objeto da verificação de validade.
Coleta e análise de dados para verificação das hipóteses – A partir das informações
colhidas do elemento conhecido, chega ao dado seguinte, colhendo, sucessivamente, cada um
dos dados que irão surgindo em cadeia com a análise de cada um. Para isso, toma as decisões
sobre os vestígios que precisam ser colhidos e a técnica que será adotada para a coleta.
Chega à apuração do fato – Colhidas as informações necessárias, e possíveis muitas
vezes, é chegada a hora de concluir a investigação, relatando sob re as evidências coletadas
indicativas das circunstâncias e autoria da prática de possível homicídio.
Entendido?
O método do rastejamento é uma sequência de etapas comuns à investigação científica dentro
do que você já estudou ser uma sequência possível. As circunstâncias em que é aplicado não
permitem que o investigador siga ordenadamente todas as etapas, visto s a ordem e o tipo de
informação que lhe são mostrados em primeiro plano.
Tal possibilidade decorre das informações que são evidenciadas para o investigador. Segundo
ensina Ribeiro (2006), muitas vezes a primeira e única informação posta para o investigador é
uma mancha de sangue na roupa de uma pessoa encontrada na via pública que é levada à
delegacia de polícia para averiguações. A partir daí são desenvolvidos os procedimentos
investigativos na busca de pontos de aderência a essa circunstância.
3.3. Caso-exemplo:
Durante uma blitz nas ruas de um bairro de Brasília, no período noturno, a polícia aborda e
conduz para a delegacia um homem, morador de rua, que apresentava manchas de sangue na
parte frontal da camisa sem que houvesse nele qualquer lesão que justificasse as manchas.
Trata-se de um morador de rua, com sintomas de embriaguez, encontrado sentado e
apreensivo no meio-fio em um local escuro e ermo.
Feita uma busca nas proximidades do local onde fora encontrada aquela pessoa, a polícia
encontra uma barra de ferro suja de sangue jogada sobre a grama. Em outro local próximo,
são encontrados respingos de sangue no chão. Buscando informações nos sistemas da polícia
e dos hospitais, os investigadores ficam sabendo que naquela noite uma pessoa do sexo
masculino com lesões na cabeça fora encontrada debaixo de um viaduto próximo ao local
onde estava o morador de rua e levada ao hospital pelo SAMU, onde veio a falecer. Os
exames periciais confirmaram que as lesões eram compatíveis com a barra de ferro
encontrada, que o sangue que se encontrava na barra de ferro, na roupa do morador de rua e
respingado no chão, era da vítima, bem como que esta viera a falecer em consequência dos
ferimentos na cabeça.
A investigação demonstrou ainda que as impressões digitais encontradas na barra de ferro
eram da pessoa encontrada com a camisa suja de sangue.
Foram encontradas duas testemunhas, moradores de rua, que informaram da agressão do
suspeito à vítima com a barra de ferro.
Veja no caso, que a polícia parte de uma informação (o vestígio de sangue na camisa do
suspeito), observada e analisada, que possibilitou o sequenciamento de informações que
terminaram levando às circunstâncias e autoria do delito. Cada informação apurada foi
formando uma cadeia de informações que, ao final, demonstrou toda a dinâmica do evento
inicialmente apenas sugerido em um respingo de sangue na camisa de um morador de rua.
3.4. Passos do método do rastejamento
No processo do rastejamento há uma sequência de passos a serem seguidos pelo investigador
para que ele possa, realmente, rastejar, buscar, passo a passo, cada vestígio indicado na
sequência dos procedimentos de busca das informações.
Veja esses passos:
Observação – O elemento informativo posto diante do investigador deverá ser
cuidadosamente observado, analisado, para que dele sejam colhidos todos os dados existentes.
Identificação de problemas – Das observações e análises feitas, naturalmente virão as
primeiras perguntas sobre a natureza da situação que é posta diante do investigador. Está o
investigador diante de um fato que exige a intervenção da polícia?
Formulação de hipóteses – Identificado o problema posto (um possível homicídio
tentado ou consumado, provavelmente ocorrido dessa ou daquela forma, com tal instrumento,
etc.) virão as primeiras perguntas e possíveis respostas para as circunstâncias e autoria.
Realização de experiências para testar hipóteses – A partir desse ponto, o empenho
do investigador será no sentido de comprovar aquilo que está em nível hipotético apenas.
Ocorreu realmente um homicídio? De que forma, onde, quando e quem o praticou? As
experimentações virão com depoimentos, exames periciais e procedimentos de
reconhecimento, acareação, reconstituição, etc.
Decisão sobre os dados a colher e modo como fazer – Posto o possível fato ocorrido e
elaboradas as prováveis respostas para as circunstâncias e autoria, cabe agora definir quais
informações serão necessárias para comprovação dessas hipóteses, bem como onde e como
serão buscadas. É nesse momento que se decide sobre os métodos e técnicas a serem
aplicadas.
Elaboração de conclusões – Nessa fase já foram desenvolvidas todas as possíveis
buscas de informações; elas já foram devidamente catalogadas, analisadas e avaliadas quanto
a sua potencialidade probante para o caso, o que fica demonstrado nos relatos apresentados
pelo investigador, confirmando ou não as teorias que havia formulado.
Apresentação de teorias – De uma leitura contextual de toda a investigação, surge o
relato final com a história detalhada e possível que será submetida ao crivo de um processo
penal.
Trata-se, portanto, de uma sequência ordenada dentro da lógica possibilitada pelas
informações que vão surgindo a partir da análise de cada um dos dados colhidos.
Esse é o método mais comum na apuração do crime de homicídio.
Aula 4 – Outros métodos utilizados na investigação do crime de homicídio
Como todo cientista, o investigador criminal deverá dispor de mais de um método para aplicar
no momento certo. Cada situação exige a tomada de um caminho próprio. O investigador
deverá estar preparado para mudar o rumo e os meios de busca da prova dependendo do
cenário que lhe é apresentado em determinado momento. Por isso terá que conhecer e estar
apto a aplicar métodos e técnicas diferentes diante de cada situação.
O trabalho de investigação é um desafio permanente no qual o investigador deverá estar
sempre apto para enfrentar o inesperado, pois, como diriam os velhos mestres, cada caso é um
caso.
4.1. Método dos círculos concêntricos
Em seu trabalho “Investigação Policial de Homicídios: análise de métodos, técnicas e do
procedimento policial”, Ferraresi ( ) faz a seguinte anotação sobre o método dos círculos
concêntricos:
“Conforme Dorea (1995, p.208), os departamentos de polícia norte-americanos adotam um
procedimento técnico-metodológico padrão para as investigações de casos com morte
denominado método dos círculos concêntricos. Esse método consiste simplesmente em se
considerar a vítima como o centro de uma série de círculos e, iniciando-se as investigações a
partir daquele que dela se encontre mais próximo, ampliando-se ao infinito, abrangem-se
todos os círculos de relação da vítima. A prática desse método de investigação, somada ao
emprego de técnicas de coleta e análise de indícios, poderá constituir-se em um procedimento
capaz de apontar a autoria e as circunstâncias de um crime...” Ferraresi ( )
Veja a representação gráfica do método para compreender melhor o processo de investigação
desencadeado em obediência às suas regras.
Esse método terá melhor aplicação nos casos em que haja uma definição bem clara dos
ambientes de relacionamentos da vítima. Entretanto, nada impede que, não havendo tais
informações, elas devam ser buscadas inicialmente.
No andamento da investigação, serão formuladas as hipóteses e realizadas as pesquisas para
verificação da validade das afirmações, tendo como referência os círculos nos quais estão
inseridos os relacionamentos da vítima.
4.1.1. Etapas do método
Círculo 1 – os relacionamentos familiares. Este círculo poderá ser subdividido de
acordo com o grau de parentesco e ou proximidade de cada grupo de parentes. Uma análise
detalhada do contexto do grupo familiar é que vai ditar as regras para a coleta de informações.
Círculo 2 – os relacionamentos de amizade . Também poderá ser subdividido de
acordo com o grau de proximidade e o nível do relacionamento de amizade. Deverão ser
consideradas as redes de relacionamento.
Círculo 3 – os relacionamentos profissionais. Poderá ser subdivido de acordo como o
grau de proximidade e o nível do relacionamento.
Círculo 4 – os relacionamentos sociais. Veja que esse círculo poderá ser subdividido
de acordo com os ambientes sociais (igreja, clube, associações, etc.)
Círculo 5 – Poderá ser aquele no qual existem relações que não se encaixam nos
demais, como relacionamento criminoso, etc.
Conforme destaca o autor citado, essa técnica, somada às técnicas de coleta e análise de
indícios, poderá se tornar um procedimento suficientemente eficaz na apuração da autoria e
circunstâncias de um homicídio.
Esse método é recomendado principalmente quando as hipóteses iniciais apontam para a
possibilidade de que a motivação esteja vinculada a algum círculo dos relacionamentos da
vítima.
4.2. Método da detonação
Há situações em que o investigador, mesmo identificando o problema (sabendo que houve a
prática de um provável homicídio), identificando um suspeito da autoria em potencial e
formulando as primeiras hipóteses, não consegue testar as hipóteses pela inacessibilidade aos
dados necessários à verificação de sua validade (informações de prova).
Essa dificuldade poderá ocorrer por questões de tempo e ou espaço. Ou seja, muitas vezes o
tempo decorrido entre o fato e a investigação é razoavelmente grande para que muitas
informações tenham se perdido ou ficado ocultas em espaços desconhecidos ou naturalmente
inacessíveis, requerendo uma ação de coleta mais específica.
O processo mais adequado para essa situação é muito similar ao que é aplicado pelo
garimpeiro na extração de minerais em barrancos e leitos de córregos ou rios ou em terra
firme, quando há indícios de que naquela área há minerais escondidos, mas não sabem quais,
onde e em que quantidade. Para fazer a extração, fazem pequenas cavidades, determinando a
profundidade e o diâmetro do buraco para colocação de explosivos que irão detonar a área de
exploração. Feita a detonação, são garimpados e beneficiados os minerais, separando-se as
impurezas. Identificados os minerais, eles são separados de acordo com o peso, o tamanho e a
cor.
Dessa observação e fazendo uma análise comparativa das suas práticas na investigação de
homicídio com o processo de detonação para coleta de minerais, o delegado de polícia
Francisco Araujo, cunhou a expressão método da detonação para denominar uma das formas
de se processar a busca de provas de um homicídio.
Veja, portanto, qual a similaridade desse método com a apuração de provas em determinados
casos de homicídio.
4.2.2. Conceito
Analogicamente ao processo de garimpagem de minerais com o uso de explosivos, o método
da detonação é o processo no qual o investigador, para romper a inacessibilidade às
informações que possibilitarão a verificação das hipóteses com apuração das circunstâncias e
da autoria, faz uso de técnicas de investigação invasivas, como infiltração e busca e
apreensão, detonando a resistência do nicho onde se encontrem as informações necessárias.
Colhidas as informações, elas são analisadas e selecionadas para o contexto de evidências que
irão sustentar a apuração do delito.
Tal qual o explosivo, a ação das técnicas citadas, invasivas da intimidade de pessoas, detona a
resistência dessa intimidade para dela colher as informações necessárias.
4.2.3. Etapas do método
Identificação do problema – A observação inicial indica a existência de um delito.
Aplicação de técnicas invasivas para a coleta de dados – São desenvolvidas ações de
captura de informações que irão fomentar a formatação da prova.
Análise dos dados capturados – Verifica o potencial da informação colhida como
elemento de prova para a investigação em curso e o nível de confiabilidade como confirmação
da validade das hipóteses formuladas.
Formulação de novas hipóteses – Feita a análise dos dados colhidos, surgem novas
respostas que precisam ser verificadas.
A busca e apreensão tem sido uma ferramenta muito eficaz na aplicação do método, pois,
devido à sua diversidade de ação e ao fato de não ser encoberta, possibilita maior mobilidade
e facilidade para a coleta de dados. A infiltração e a campana são muito eficazes na coleta de
informações para o planejamento da busca.
O método da detonação tem sido de eficácia comprovada em crimes de homicídio com a
existência de suspeitos intocados pela falta de qualquer evidência. Os casos de motivações
passionais e econômicas são situações clássicas na aplicação do método da detonação.
4.3. Complementaridade dos métodos
Muito embora sejam métodos autônomos, podem ser aplicados individualmente,
simultaneamente ou de forma complementar um ao outro. Tudo depende das circunstâncias,
da necessidade e da capacidade de observação do investigador.
Aula 5 – Escolha do método e das técnicas que serão aplicadas na investigação de
homicídio
Vimos que para a investigação de homicídio há alguns métodos que deverão ser aplicados de
acordo com o contexto, que envolve tanto a prática do delito quanto as condições de
investigação.
O método é a forma ordenada que o investigador adota para a busca das provas ao longo da
investigação. Diz o que fazer. A técnica é o “como fazer”, certo?
Conforme já foi dito, poderá ser aplicado mais de um método e mais de uma técnica. Tudo
depende do que o investigador queira fazer e obter. A escolha da técnica depende ainda do
tipo de informação a ser coletada e do ambiente onde ela se encontre.
Vimos como se desenvolvem os métodos do rastejamento, dos círculos concêntricos e da
detonação.
Lembra que você estudou a investigação criminal como uma investigação científica com uma
“sequência possível” de procedimentos? Ainda que se faça a escolha de um método, nem
sempre será possível seguir uma sequência ordenada. Tudo irá depender da natureza das
informações que forem sendo colhidas e do cenário em que se encontre o caso.
5.1. Metodologia da escolha da técnica para a investigação de homicídio
Segundo Araujo (2008), adequando orientação de Denker (2007, p. 160) para a investigação
de homicídio, pode-se dizer que, para a escolha da técnica de investigação, deve ser adotada a
seguinte metodologia:
A técnica que será empregada dependerá das circunstâncias em que o crime foi
praticado, dos objetivos e da disponibilidade de recursos para a realização do processo.
As técnicas não se excluem; poderão ser empregadas em uma mesma investigação
metodologias e técnicas diversas, conforme a variável (as informações que serão analisadas) e
a fase da investigação.
É recomendável iniciar a investigação por um estudo exploratório, para tomar
conhecimento da situação, o que possibilitará ao investigador decidir quais serão os métodos
necessários às fases posteriores.
Considerando o aspecto científico da investigação de homicídio, o investigador não poderá
abrir mão de uma postura científica em todo o processo. A metodologia aplicada à seleção de
uma técnica para a busca de provas possibilita que se faça essa escolha dentro da melhor
adequação possível para cada situação.
5.2. Escolha das técnicas e procedimentos aplicados à investigação de homicídio
Inicialmente convém ressaltar que a proposta deste curso não é discutir o aspecto operacional
das técnicas de investigação para a apuração de provas de homicídio, mas apresentar
possibilidades do uso de determinadas técnicas como consequência de uma avaliação racional
das necessidades apresentadas em cada momento da investigação. Nessa linha, também você
deverá se limitar à análise de técnicas aplicáveis à investigação técnico-científica-cartorária,
visto ser este o foco principal do conteúdo.
Para investigar homicídios, há uma série de formas para se chegar à informação que formatará
a prova. Ocorre que, para uso do meio correto, é preciso considerar todo o contexto que
envolve a investigação e as especificidades de cada uma das informações buscadas. Esse
contexto terá que ter uma atenção especial para que a técnica aplicada seja eficiente e eficaz.
Ele diz respeito, principalmente, ao ambiente onde está a informação e à sua natureza.
Exemplo:
A informação buscada diz respeito às relações de amizade entre o suspeito de ter mandado
executar o homicídio e o suspeito de tê- lo executado. O que a investigação busca, no
momento, é a confirmação dessa relação, que poderá ser feita por diversos meios, dependendo
da natureza da informação desejada.
Se a troca de informações entre os dois for realizada por meios de comunicação, poderão ser
usadas as quebras de sigilo telefônico e telemático. Caso haja convivência social entre os dois
e familiares, poderá ser aplicada a campana ou a infiltração. Ou, sendo o pagamento de verba
contratada, poderá ser feita a quebra do sigilo bancário e fiscal.
A escolha da técnica está vinculada à hipótese formulada diante do problema posto, do tipo de
informação que a investigação busca como prova. Tudo depende da capacidade de leitura que
o investigador terá para avaliar o meio mais eficaz para a necessidade existente.
Além disso, relembrando, é preciso compreender que o uso de uma técnica não elimina outra,
visto que a investigação, dependendo do contexto em que se apresenta, poderá valer-se de
mais de uma técnica e procedimentos ao mesmo tempo.
É importante a compreensão de que técnicas diversas poderão ser aplicadas na investigação
do mesmo fato, dependendo do momento, das circunstâncias, da complexidade da
investigação e da natureza da informação buscada. As técnicas poderão ser complementares.
Os procedimentos de investigação de homicídio buscam a coleta de informações necessárias à
produção da prova, fazendo uso de técnicas e meios especializados. Buscam prospectar dados
com o objetivo de obter conhecimentos que confirmem suposições levantadas pela
investigação.
5.3. Técnicas tradicionais para a apuração de provas do homicídio
No curso Investigação Criminal II, Araujo (2008) relata as técnicas tradicionais na
investigação de crimes cuja aplicabilidade deverá ser analisada para cada caso e momentos da
apuração de provas de homicídio.
Reveja cada uma dessas técnicas 1
Além dessas técnicas, há também procedimentos eletrônicos, como a interceptação
telefônica e a interceptação ambiental, de grande eficácia num momento em que as
1 Acessando o arquivo em anexo tecnicasbasicasdeinvestigacao.pdf
atividades criminosas, aproveitando as dádivas das novas tecnologias com o avanço
tecnológico e eletrônico, se tornam cada vez mais sofisticadas e complexas.
Considerando o caráter de apoio que poderá ser dado a qualquer uma das técnicas
operacionais da investigação, é bom ressaltar aquela que, na atividade de inteligência, é
chamada de provocação.
A própria nomenclatura induz ao conceito da técnica, ou seja, sua realização tem o objetivo de
fazer com que a pessoa investigada adote atitudes que poderão atender o interesse da
investigação sem que ela perceba isso.
O exemplo mais provável dessa ocorrência é no caso de uso do monitoramento telefônico de
um suspeito, quando se cria uma condição para que ele desenvolva as comunicações
esperadas para comprovação do que se busca.
No Código de Processo Penal poderão ser encontradas algumas técnicas operacionais da
busca de prova penal, muito úteis na investigação de homicídio, como a reprodução
simulada dos fatos ou reconstituição, como é mais conhecida (art. 7º do CPP), o
reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226 a 228 do CPP) e a busca e apreensão (arts.
240 a 250 do CPP).
A reprodução simulada é muito apropriada para um momento final da investigação, quando
já foram reunidas informações confirmadoras das evidências de autoria, mas é preciso fechar
janelas abertas no que diz respeito às circunstâncias, tempo e espaço físico em que ocorreu o
delito. É nesse momento que são tiradas as dúvidas que restaram na apuração das provas
quanto à verossimilhança.
A busca e apreensão é mais prospectiva. É muito aplicada nos momentos iniciais da
investigação para se abrirem caminhos às evidências ou em momentos em que a investigação
precisa confirmar evidências constatadas, mas com janelas abertas quanto a sua validade.
O reconhecimento de pessoas e coisas é também uma técnica de confirmação de evidências.
Conforme vem sendo induzido, a aplicação de qualquer técnica ou procedimento na
investigação de homicídio terá que respeitar os limites da legalidade e das garantias
fundamentais do cidadão, bem como do respeito à d ignidade da pessoa. A regularidade da
aplicação dos métodos e técnicas não pode se limitar aos procedimentos operacionais, mas,
acima de tudo, deve deslocar-se à verificação da sua legalidade.
Concluindo...
Olá, você terminou a primeira fase do curso Investigação de Homicídio com uma abordagem
de conhecimentos comuns à investigação criminal, mas com um viés da apuração de provas
da prática de homicídio.
Parabéns!
Neste último módulo, você estudou sobre temas que tratam da análise da investigação
criminal como um processo científico. Justificando essa cientificidade dos procedimentos
investigatórios de um delito penal, foram apresentados, analisados e discutidos métodos
próprios da busca de provas a serem desenvolvidos na apuração dos crimes de homicídio.
Entretanto, é bom informar que esses mesmos métodos poderão ser aplicados em outras
modalidades de investigação criminal que apresentem condições parecidas com as que foram
apresentadas como exemplo.
Em verdade, o que se procurou fazer nessa primeira fase do curso Investigação de Homicídio
foi sensibilizar o investigador, ora estudante, para a necessidade de perceber que a
investigação criminal é um processo científico e, como todo processo dessa natureza, está
sustentada em um referencial teórico e se vale de métodos e técnicas sustentadas em
princípios específicos e em regras éticas fundamentais.
O olhar com o viés da cientificidade da investigação evitará que o investigador seja apenas
um aventureiro sem conhecimentos básicos, sem planos e sem métodos na fundamental busca
de provas da prática de um delito; permitirá que ele seja realmente um investigador no sentido
puro do termo.
Aproveite esses conhecimentos nas suas práticas investigativas de delitos. Ainda que essa não
seja sua função principal, mesmo assim, aproveite para ser um melhor colaborador dos
profissionais encarregados de tal missão.
Dissemine, aplique, discuta; ajude a construir esse conhecimento!
Espero reencontrá- lo na segunda fase do curso, quando serão discutidos aspectos práticos da
investigação de homicídio.
Aproveite.
Até lá e boa sorte!