ILHA DA TRINDADE O PARAÍSO INACESSÍVEL CLICAR GRUPO FRATERNIDADE PP-2-080.
080-Oficinas__Terapêuticas
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Grupo Hospitalar Conceio
Gerncia de Ensino e Pesquisa
Residncia Integrada em Sade Mental
nfase em Sade
OFICINAS TERAPUTICAS, PARA QU?
DA SUBJETIVIDADE REABILITAO PSICOSSOCIAL
Ligiane Machado Bitencourt da Silva1
Resumo
Entre saberes e fazeres, o projeto de pesquisa Oficinas teraputicas, para qu? foi-se tecendo. Amodalidade de atendimento em oficinas implica constante movimento e criatividade, o que nosinquieta e desacomoda e faz com que o refletir, o criar e o recriar sejam constantes. O presentetrabalho tem como foco a anlise de quatro oficinas teraputicas, do Servio de Sade Mental doGrupo Hospitalar Conceio GHC. Entre saberes e fazeres de oficineiros e oficinandos quecirculamos e tambm tecemos. Verbos como fazer, tecer, inventar remetem ao, possibilidade quepode ser compartilhada por meio das diferenas e tambm das semelhanas. As trocas, reflexes ediscusses trazem possibilidades. Este trabalho surge de inquietaes pessoais frente ao olhar e escuta, ao que podemos explorar deste espao to rico, diante do sujeito e das trocasinterdisciplinares, dado que o objetivo da pesquisaeraanalisar a funo das oficinas teraputicas naconstruo da subjetividade de indivduos com sofrimento psquico. Oficineiros e trabalhadores desade, nas diversas categorias profissionais, esto implicados com o uso do termo oficinasteraputicas, o qual busca constantemente fazer desse espao realmente teraputico, diferencial nasvivncias ali tecidas, a fim de que seus reflexos possam expandir o crescimento pessoal, as trocascom outros sujeitos e os caminhos trilhados.
Palavras-chaves: Oficinas Teraputicas. Reabilitao Psicossocial. Subjetividade.
Introduo
As oficinas teraputicas, enfoque deste trabalho, so espaos que se utilizam
de ferramentas e intervenes, para promover a sade e a reabilitao psicossocial.
Esta pesquisa visa ainda reflexo do processo do sujeito com sofrimento psquico
1 Orientao: Ana Cludia Meira.
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que se encontra em atendimento no Servio de Sade Mental do GHC, destacando
o papel dos terapeutas frente reabilitao psicossocial e a nova viso dos modelos
assistenciais.
O interesse em realizar esta pesquisa veio ao encontro de minha formao de
Terapeuta Ocupacional, cuja ferramenta teraputica a atividade humana, e que v
o processo teraputico do sujeito, por vezes assujeitado, como algo que se constri
do interior para o exterior. Nesse processo, possibilidades e limitaes do sujeito so
vislumbrados, bem como suas relaes, articulando novos caminhos para criar,
recriar, construir, desconstruir e reconstruir. O terapeuta passa a ser o facilitador do
que o exterior (o social) prope a esse indivduo.
A partir de minha trajetria profissional e do processo de formao naResidncia Integrada em Sade, acredito que reabilitar produzir subjetividade,
processos de relaes com o meio e com o Outro. dessa forma que ns,
terapeutas, nos aproximamos do conceito de sade. Mas que papel teraputico
esse?
com tal questionamento que elejo as oficinas teraputicas como campo de
pesquisa. Aprofundar esse tema pode trazer um diferencial clnico na abordagem do
tratamento da sade e na Sade, quando reflito sobre a reforma psiquitrica,processo de reformulao da sade mental que se fundamenta no homem como um
ser biopsicossocial. Tendo como objetivo analisar a funo das oficinas teraputicas
na construo da subjetividade de indivduos com sofrimento psquico.
A presente pesquisa teve abordagem qualitativa, ocupando-se do universo
dos significados, e convertendo-se em espao de relaes. Ao desenvolv-la, aps
a coleta de dados, utilizei o mtodo da Anlise e Contedo. Tive a oportunidade de
fazer recortes tericos e prticos das oficinas teraputicas e suas funes. Foramanalisadas as construes humanas significativas, refletindo sobre o significado, a
intencionalidade, atravs dos atos, e as estruturas sociais e suas relaes.
Trata-se de um estudo exploratrio, visando a construir o que determina a
oficina, proporcionando sua maior visibilidade como teraputicas, alm das
propriedades que lhe so inerentes, com cuidados especficos quanto aos
procedimentos dos oficineiros.
Um dos instrumentos escolhidos foi a entrevista semi-estruturada com os
profissionais que coordenam oficinas teraputicas, em trs unidades do servio de
sade mental: o CAPS II, o CAPS ad e a Unidade de Internao Psiquitrica. As
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entrevistas revelaram impresses relatadas pelos oficineiros, decorrentes de suas
vivncias da realidade nos espaos citados, o que trouxe elementos muito
enriquecedores proposta de pensar e tecer saberes e fazeres.
O segundo instrumento foi a observao participante dos espaos de oficinas,
em que tudo acontecia e nas quais os sujeitos estavam inseridos, mediante um
plano teraputico referente ao processo de tratamento. Isso me permitiu entrar em
contato com o que foi relatado nas entrevistas, bem como experienciar a realidade
vivenciada e com os sujeitos ali implicados, atravs de meu olhar e escuta.
Espaos em que transitei
Em minhas andanas, deparei-me com demandas diferentes, teceres
trilhados de sujeitos diversos. No tenho a pretenso e nem acho que haja riqueza
nisso de comparar um espao com o outro, uma oficina com a outra. O que busco
nas oficinas o significado, o seu valor, o que ali foi lapidado nas intervenes
conforme sua demanda, tecido enquanto processo e enquanto produto.
Refletir para que servem as oficinas, o que se espera que o pacienteconquistou, o que o terapeuta espera do settingteraputico, o que valoriza em sua
viso teraputica e o que o grupo pode facilitar nesse processo foram os elementos
contemplados nesta pesquisa.
O panorama que contemplo aqui so os servios de sade mental que podem
realizar diferentes intervenes frente ao sujeito com sofrimento psquico. A
internao psiquitrica trata indivduos em momentos de crise, conforme as
particularidades de cada um. Os Centros de Ateno Psicossocial (CAPS), conformeo Ministrio da Sade (2004), so servios de sade do Sistema nico de Sade
(SUS), abertos e comunitrios. So referncia em tratamento para pessoas que
apresentam quadros severos e/ou persistentes, que justifiquem sua permanncia em
um dispositivo de cuidado intensivo, personalizado e promotor de vida.
O acompanhamento clnico e teraputico, aps avaliao, estabelece o plano
teraputico individualizado, nos regimes intensivo, semi-intensivo e no-intensivo. O
Centro de Ateno Psicossocial lcool e Drogas (CAPS ad) direciona seu
atendimento para a pessoa com dependncia qumica, e o CAPS II volta sua
ateno para sujeitos com transtorno mental severo e intenso sofrimento psquico.
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Foi nesses espaos que destaquei as oficinas e as selecionei, por ach-las
interessantes. Delas posso contar que o Sarau oficina com atividades no-
estruturadas se desenvolve com os interesses e acontecimentos do momento,
produzindo efeito em seus participantes. A Oficina de Escrita, com atividades
estruturadas, lugar de expresso, comunicao que faz a diferena. A Oficina
Temtica tem o enfoque nas temticas do ano, nos acontecimentos. Para finalizar,
a Oficina Integrada construindo com o papel, que contm componentes do CAPS
ad, CAPS II, Internao Psiquitrica e, tambm, do Setor Sade do Trabalhador,
prope criaes com papel.
Com a ajuda dos oficineiros, posso, aqui, registrar tais experincias, e
comear a tecer um pouco de suas percepes quanto ao espao em que estoinseridos e se inserem. As oficinas teraputicas so utilizadas nesses espaos de
tratamento e se fazem presentes como intervenes, das quais vrias reas
profissionais se ocupam: a Terapia Ocupacional, a Psicologia, o Servio Social, a
Enfermagem, a Medicina, a Arteterapia. Farei referncia a todos os profissionais que
se ocupam em coordenar oficinas teraputicas, usando a denominao de
oficineiros. As oficinas aqui tratadas so consideradas teraputicas.
Enquanto pesquisadora, penso que importante compreender a viso dosoficineiros acerca de oficinas teraputicas e seus efeitos sobre o sujeito portador de
sofrimento psquico. Como os oficineiros observam e identificam as influncias que
as oficinas tm no tratamento? Como podem discriminar, atravs de sua percepo,
seu papel enquanto oficineiro e as atribuies que julgam necessrias no processo
teraputico das oficinas? Enfim, que concepo de reabilitao psicossocial tm os
trabalhadores dessas trs unidades?
Reflexes inseridas na proposta de pensar
A proposta e a temtica desta pesquisa enlaam-se a vrios questionamentos
que me inquietam e me fizeram ir em busca para compor, trilhar, querer mais. Entre
eles, elegi alguns para utilizar nas entrevistas que fiz, os quais importante registrar
aqui, para ampliar nossa discusso: Como voc percebe o espao de oficinas
teraputicas?; O que torna teraputica esta oficina?; De que maneira as oficinas
teraputicas interferem no processo de sade e doena?; Que atributos e
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atribuies voc, enquanto coordenador, julga necessrio ter para ser um facilitador
na oficina teraputica?; Como voc entende a atividade humana e a reabilitao
psicossocial?.
A pesquisa no processo e produo do tecer das oficinas
Com o olhar, a escuta e as reflexes que esses recortes me proporcionaram,
possvel apresentar trs categorias que julgo importantes sobre o assunto em foco.
A primeira delas trata das concepes dos oficineiros quanto atividade humana,
reabilitao psicossocial e sade/doena, o que, a meu ver, interfere nas oficinas deforma direta, pela conduo do processo e pela possibilidade de ser teraputica ou
no. A segunda categoria ocupa-se das oficinas, seus espaos e suas funes e,
para finalizar, na terceira categoria, temos como foco os oficineiros, seus atributos e
suas atribuies.
Ao compartilhar saberes e fazeres, no pretendo dar uma receita de como
deve funcionar uma oficina, mas propor reflexes e meios de tecermos outros modos
ou valorizar os jeitos j tecidos. Com a anlise do grupo de sujeitos que comps ouniverso da pesquisa, destaco meios de compor invenes e criaes.
Concepes dos oficineiros
A atividade humana vista como prpria do ser humano. constante: a todo
o momento fazemos ou produzimos algo. Ao estar colocado neste fazer, o sujeito vaise transformando e vai se modificando. Ele se estrutura psiquicamente a partir das
relaes primrias e, ao longo de sua vida, vai evoluindo.
Por vezes, tambm desenvolve psicopatologias que o limitam e que o
empobrecem em suas relaes com os outros e com o meio em que vive. Existem
fazeres que so colocados ou impostos, e que obstruem algo vital para a pessoa, ou
seja, a atividade que espontnea, seus desejos, seu querer. As demandas sociais
e o que vem do outro como dado pode levar complicao de histrias de vida e,
por conseqncia, aos transtornos ou problemas de sade.
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Fazer essa manifestao parece reforar a existncia: se est vivo, produz.
So fazeres como uma retroalimentao. O fazer de uma pessoa implica-se ao fazer
de outras e ao social, e gera movimentos de relaes. Contribuem na vida de cada
indivduo. H questes morais e culturais que reforam um assujeitamento do
indivduo, trazendo valores e regras que podem ser um organizador do indivduo ou
o seu desagregador.
Tambm cabe salientar, nestas reflexes, o que uma constncia na fala dos
oficineiros. Um deles, por exemplo, afirma: Fico pensando que a pessoa tem uma
fala, e que no fazer ou na ao, tem algo mais a ser dito. Como se no tivesse tanta
interferncia da questo racional. Outro menciona que
Talvez seja mais fcil se relacionar com o material do que com as pessoas,na verdade. Isso a gente acaba vendo, para esses usurios mais fcil.Fazer, se relacionar com a ao? uma forma de interao, possibilidadede mudana de algumas coisas.
A atividade humana necessria para a pessoa se manter viva, no
organicamente, mas no que diz respeito a seu interesse, desejo de vibrar um pouco
mais por alguma coisa quando parte dela. H alguma interveno que no altera a
direo que as pessoas esto dando no seu fazer.
Os oficineiros devem estar atentos quanto temtica da reabilitao
psicossocial. Existe um querer s vezes mais dos profissionais, oficineiros, no que
se refere insero. Mas o que realmente inserir? Esse um questionamento
importante e necessrio, que, se mal utilizado, ilusoriamente d conta da ansiedade
ou do mal-estar.
Pitta2 (2001, p. 19) enfatiza a importncia da reabilitao psicossocial:
No seu sentido instrumental, a Reabilitao Psicossocial representa umconjunto de meios (programas e servios) que se desenvolvem para facilitara vida das pessoas com problemas severos e persistentes. Numa definioclssica da International Association of Psychosocial RehabilitationServices, de 1985, seria um processo pelo qual se facilita o individuo com
2 Psiquiatra, mestre e doutora em Medicina Preventiva pela Faculdade de Medicina da Universidadede So Paulo-FMUSP. Ps doudoranda pelo Istituto Mario Negri,1992, Milo It; McGillUniversity,1995,CA; Universit de Montral, 1996, CA. Atualmente profesora e pesquisadora da Universidade
Federal da Bahia e UNIFACS. Tem experincia na rea de Sade Coletiva, com nfase em SadeMental.
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limitaes, a restaurao no melhor nvel possvel de autonomia de suasfunes na comunidade.
Segundo Saraceno3 (2001, p. 16), o processo de reabilitao seria, ento,
um processo de reconstruo, um exerccio pleno de cidadania e, tambm, de
contratualidade nos trs grandes cenrios: hbitat, rede social e trabalho com valor
social. Faz a tentativa de romper com a lgica meramente produtiva.
No discurso aparece o enlace do sujeito com a comunidade, com o fora, com
o profissional de sade e a maneira com que se coloca. Um dos oficineiros retrata
em sua fala que
Reabilitao Psicossocial voltar para a comunidade, conseguir umtrabalho ou ter uma renda e outra alternativa isso, aquilo outro meio queuma receita assim: faa isso que reabilitao psicossocial, no que agente tenha que colar nisso. Mas na correria do cotidiano de trabalho,parece uma coisa que est um pouco pronta. Parece que reabilitaopsicossocial s para quem est nos servios e acaba atrelada sademental.
Note-se que a reabilitao no pode ser encarada como uma receita, mas
como possibilidade de o sujeito ampliar os espaos de criar, como o processo do
sujeito de fazer algo novo, cuja frmula no est dada, que tem outro investimento.
Essa reabilitao deve ter um conceito muito aberto, pensada a partir da histria de
cada sujeito, de cada pessoa que est no servio. Reabilitao estar junto
enquanto profissional, estar atento aos movimentos trilhados, valorizar o que as
pessoas esto trazendo, tanto as possibilidades como as impossibilidades. No papel
de oficineiro ora impulsiona; ora freia alguns processos. Por vezes, no se d conta
de que o sujeito que ali est, com sua histria de vida, seus valores, e que tem de
expressar o seu desejo, o seu querer.Podemos ainda dizer de outro modo. O sujeito tem seu processo, pode
descobrir novos movimentos, descobrir novos fazeres, para acompanhar o cotidiano.
Caso a pessoa se depare com um percurso de privao de vida, as oficinas podero
trabalhar essa questo, pois so espaos para vivenciar novos processos.
3Presidente da World Association for Psychosocial Rehabilitation.
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Reabilitar acolher, mas, na seguinte fala, se v o quanto o termo pode ser
mal utilizado, e amide pega-sepensando no que pretende nas prticas:
Estar acolhendo o que ele est falando e pensar melhores alternativas.Acho que a reabilitao psicossocial desobstruir talvez alguns caminhos,poder estar junto, facilitar nem sempre para desobstruir tambm. No impor caminhos e nem colocar assim, como se no tivesse nada. E semprevejo a criatividade junto, acho que tanto para o usurio como para o tcnico.At porque fica mais gostoso de trabalhar e menos rotineiro e burocrtico.Com facilidade a gente escorrega para o modelinho. Me pego vrias vezessendo bastante onipotente, a trabalhadora. Estudei, sei o que bom, oque vai deixar a pessoa melhor. Se no tivermos clareza disso, no vamosfavorecer muito.
Para que se d a reabilitao psicossocial, os oficineiros acham necessrio:ter escuta atenta, ver possibilidades, facilitar quando se faz necessrio, visualizar
processos, tempos e ritmos diferenciados, percepes e valores singulares,
interao com as pessoas e com o meio.
Ao pensar nos espaos de sade mental e na reabilitao psicossocial,
podemos dizer que realizada a reabilitao e feito movimentos de vivenciar
processos mais protegidos, nos quais o sujeito se envolva, possa conviver, fazer
parte do social, da cultura, mas que, muitas vezes, acaba tambm segregado.Alguns processos levam tempo, mas necessitam de flexibilidade. O movimentar-se
fora um deles. necessrio estimular com olhar atento, valorizando as iniciativas e
os espaos de conviver, como demonstra a fala deste oficineiro: A gente vai
procurando fazer com que isso acontea, buscando lugares, trazendo lugares para
dentro do CAPS, trazendo pessoas, envolvendo politicamente, socialmente,
culturalmente.
Em outros momentos da reflexo, contudo, aparece um cansao pelo
esvaziamento com o uso com o mau uso do termo reabilitao psicossocial.
Por exemplo: Tudo reabilitao psicossocial, que nem qualidade de vida. J
esvaziou. No sei se porque a gente incorporou totalmente esse conceito. Meu
olho no brilha mais, enfim. Falando em olho brilhar, acho que j est engessado.
Guerra4 (2004a) aponta que a reabilitao psicossocial est em movimento,
em construo.Segundoela, existem trs diferentes concepes desse termo, que
4Psicanalista. Professora e pesquisadora do curso de Mestrado em Psicologia da PUC/MG. Doutoraem Teoria Psicanaltica e Especialista em Psicanlise.Tem experincia na rea de Psicologia, comnfase em Psicanlise e Sade Mental, atuando principalmente nos seguintes temas: psicanlise esade mental; psicologia clnica; clnica do social;clnica e reforma psiquitrica.
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trazem distintas formas de lidar ou ver acontecer. Tais entendimentos se refletem
diretamente sobre as intervenes teraputicas e modalidades, como as oficinas
teraputicas, por serem estratgias inclusivas de dispositivos voltados para a
insero.
A reabilitao psicossocial pode ser pensada a partir de diferentes
formulaes tericas existentes nesse territrio, o qual, atualmente, pouco coeso
ou uniforme. O campo da reabilitao ainda muito criticado, e de diferentes
maneiras. Existem controvrsias, o que tambm provoca questes: Reabilitar
como?; Quando a doena fruto de uma ruptura irreparvel?; Como voltar a ser
o que se era antes das perdas?; Reabilitar, recuperar?; E a possibilidade de
aprender novas estratgias subjetivas e psicossociais?; Retorno a um estadoanterior de coisas?
De acordo com Guerra (2004a), h trs grandes modelos epistmicos no que
se refere reabilitao psicossocial: os modelos psicoeducativos - que valorizam a
aprendizagem e a manuteno do repertrio, adequando o indivduo doente
famlia, ao social, para que tenha equilbrio; os modelos scio-polticos ou crticos
que se referem a vrias redes de negociaes, nas quais esto inseridos os sujeitos,
os servios, os contextos e os recursos disponveis; e os modelos de orientaoclnica, nos quais criticamos os modelos meramente psicoeducativos e nos
aproximamos das abordagens sociopolticas, vendo as possibilidades de cada
sujeito, relaes e condies de estar no mundo, responsabilizando o sujeito pelas
respostas que traz e compondo com ele esse movimento.
possvel trabalhar, compor, criar, experimentar e avaliar nossas aes a
partir do enriquecimento e das conseqncias sobre os indivduos envolvidos nas
aes. Guerra (2004a, p. 10) menciona ainda que
assim, o que deve ser buscado no o real somtico de uma funo, oaprendizado de uma habilidade, mas as condies simblicas para enfrentaro real do gozo do Outro materno e em seguida do Outro social. Ou seja,seguir as estratgias desenvolvidas pelo prprio sujeito como poltica dereabilitao.
uma rede de cuidados que se compe a partir da reabilitao na qual as
oficinas esto inseridas, e podem fazer um diferencial nas relaes, nas trocas
sociais. Ainda necessrio pensar o que tecemos quanto ao que se pressupe
sobre sade/doena.
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A seguir, destaco alguns depoimentos dos oficineiros. Um deles diz: Os
usurios que a gente atende, a grande maioria, vm de uma histria longa de
perdas, de crises, perdas s vezes em funo da crise e, s vezes, em funo de
uma marca, um rtulo, de um CID que est muito colado quase como uma
tatuagem.
Outro declara que A gente acaba trabalhando e sempre focando muito s na
alucinao, e acaba perdendo a dimenso deste sujeito porque est alucinando.
Esse contedo tambm no veio do nada; tem a ver com a histria e com conflitos.
E outro ainda refere a
representao que cada um tem do que est fazendo. porque o processode sade/doena no uma lgica concreta, de como tu te identifica e tev. Se a pessoa s vezes diz que doente, isso, aquilo, enfim, todocomportamento que ela tem dessa forma. A conduta, a fala que ela tem, daquele doente, daquilo que ele introjetou. Ento, nas oficinas, existe estefazer criativo, este fazer diferenciado que no tem a ver com isso que elaacredita, s que faz parte da doena, o prprio sintoma. Acho que trabalhaesse binmio a, como uma pessoa que possa criar, fazer, construir, trocar,ser criativo e ser... Se to doente. Choca um pouco esse pensamento eatua no sentido que a pessoa acaba descobrindo que capaz de fazer talcoisa, auxilia em perceber que ele no se limita a ser aquela doena. Dnovas possibilidades. Acho que as oficinas que tm esse carter facilitamisso. Elas te do, te fazem experienciar uma nova histria e no s aquelaque voc vem do teu dia-a-dia somatizando.
Produzir sade implicar o usurio em seu tratamento, trabalhar com uma
clnica ampliada e interdisciplinar, repensando as prticas. Os oficineiros trabalham
com sujeitos que interagem com o coletivo e com o ambiente, e que transcendem a
eles. Campos5 (2007, p. 53), ao fazer uma anlise do processo sade-doena e dos
sujeitos a implicados, salienta a importncia de
agregar a noo de interesse e uma outra de desejo, que a modificaainda que no a substitua completamente. O desejo seria uma tendnciapsquica do sujeito humano de buscar prazer, o gozo, com certo grau deindependncia de sua prpria sobrevivncia; ou seja, a busca do prazer no
5Mdico especialista Em Sade Pblica e Em Planejamento do Seto com mestrado em Medicina
(Medicina Preventiva) doutorado em Sade Coletiva e residencia-medica pela Hospital das ForasArmadas em Braslia/DF (1977) . Atualmente professor titular da Universidade Estadual deCampinas, Membro de corpo editorial da Trabalho, Educao e Sade e Membro de corpo editorial
da Revista Cincia & Sade Coletiva. Tem experincia na rea de Sade Coletiva , com nfase emSade Pblica.
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se subordina completamente racionalidade do interesse, ainda que aconsidere em diferentes graus conforme o sujeito e o contexto especfico.Note-se que o desejo pode voltar-se tambm para finalidades perversas,destrutivas, tanto em relao a si mesmo, quanto aos outros ou ao contexto.
O autor pontua a importncia dessas duas noes para a construo de
intervenes concretas, seja na clnica, seja na sade pblica. Que desejo esse
sujeito tem? Quando trabalha-se com o interesse, d-se nfase quantidade, e
quando trabalha-se com o desejo, remete-se qualidade e intensidade da vida,
ao seu sentido, ao seu significado. As oficinas teraputicas e a sua finalidade tm
sido focos de debate e interveno na sade mental.
Nos espaos de oficinas que fizeram parte dessa pesquisa, aparecem a
diversidade e as diferenas dos sujeitos ali implicados, o que no impossibilita trocas
e apoio ao outro, que est em momento diferenciado e/ou difcil. Logo, visualizamos
que a diversidade e as diferenas podem estar na sade, na doena, nas histrias
de vida e no que elas vm a produzir.
As oficinas, seus espaos e suas funes
As oficinas so uma modalidade de atendimento diferenciada.A oficina tende
a viabilizar acontecimentos que so peculiares a ela, os quais, no fossem
abordadas pelas oficinas, talvez no fossem vivenciados pelo paciente em nenhuma
outra modalidade. Nelas, pode fazer um trabalho de elaborao e de diferenciao,
na medida em que foge ao padro dos atendimentos tradicionais.
Vistas como espao de possibilidades em torno de uma atividade concreta, as
oficinas so introduzidas para essa pessoa como um novo repertrio. Muitos notm um repertrio de vida assim, no sabem exatamente o que fazer e podem vir a
experimentar e se deparar com coisas novas ao verem-se inseridos nesse espao.
como se descobrissem o mundo.
As oficinas proporcionam espaos de circulao e de linguagem, que
perpassam o grupo e trazem novos elementos quando trabalham com o ritmo e o
tempo de cada um. Diferem de outras modalidades, como o atendimento individual
mais tradicional ou o atendimento em grupo, que acontecem mais pela via da fala, eem que no h nenhum mediador, recurso ou ferramenta que viabilize outros meios
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de expresso, que faa o meio de campo, atendendo a um lugar interno, contatando
com sentimentos e proporcionando vivncias.
Almeida6 (2004) v as oficinas como dispositivo no campo de Sade Mental,
sendo necessrio e importante espao onde se concretizam as aes operacionais
dos CAPS. Tornam-se territrios de encontro entre quem cuida e quem cuidado,
fazendo elo com o exterior, ou seja, o lao com o social. Como refere Rickes 7(2006,
p. 3), o lao social consiste na operao simblica compartilhada que define um
campo domesticado de sentido ao qual chamamos de realidade.
O social est em diferentes olhares da realidade e na interao com o outro.
Oferece um repertrio de possibilidades, assim como encontra obstculos. Impasses
assim, Nise da Silveira os encontrou no trabalho que desenvolveu no Rio de Janeiro,na dcada de 40. Ela trouxe o uso da expresso e da arte para a produo de
sade, influenciada pela psicanlise. Na poca, foi contra o que estava dado e
institudo como teraputico, e valorizou as questes da expresso, os significados
simblicos e a capacidade de escuta.
O foco das oficinas so os sujeitos que ali esto, seres individuais, com suas
histrias de vida, suas trajetrias. Eles apresentam limitaes psquicas, que geram
dependncia e engessamento, entre tantas outras questes. Vamos comear docomeo: as crianas nascem, desejadas ou no, com heranas genticas, em lares
que as acolhem ou no, mas que se desenvolvem ou somente se criam, como
ouvimos comumente. Primeiro, vm a estrutura, o afeto, as relaes; depois, os
instrumentos de que a criana se utiliza para interagir. Ela desenvolve-se, responde
ao desejo do outro, constri o seu prprio desejo, e, nesses movimentos de
interao, realiza o fazer, o brincar.
Winnicott (1971, p. 80) aponta: no brincar, e somente no brincar, que oindivduo, criana ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e
somente sendo criativo que o indivduo descobre o eu (self). Assim, as vivncias
6Psicloga. Mestre em Psicologia Social e Organizacional.
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Psicloga, Mestre e Doutora em Educao / UFRGS pela Faculdade de Educao. membro da AssociaoPsicanaltica de Porto Alegre e da Rede de Pesquisa Escritas da Experincia. Atualmente professor adjunto daUniversidade Federal do Rio Grande do Sul. Desenvolve estudos na rea de Psicologia e Educao, com nfaseem Psicanlise.
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que as oficinas teraputicas oferecem, por meio da atividade expressiva e criativa,
representam para os adultos que delas participam o que o brincar representa para a
criana. Ou seja, traz possibilidades de dar sentido, de ter valor simblico, de
construir idias, de se ver enquanto sujeito de desejo.
Ainda podemos demarcar o conceito que Winnicott (1971) elabora sobre o
objeto e os fenmenos transicionais, que so iluses que criam a possibilidade de
construir o sentido da realidade propiciadora ao indivduo sustentar-se na relao
com o outro. Abre-se o campo para o jogo, para o gesto e para o criar e recriar-se
neste espao intermedirio. Tal espao pode vir a ser as oficinas teraputicas,
atravs da expresso da arte, da palavra, das imagens. Tudo pode ser utilizado
como experincia existencial.Ostrower8 (1991, p. 30), no estudo da arte, afirma que
Descobrir o espao e descobrir-se nele representa para cada sujeito umaexperincia a um s tempo pessoal e universal. A partir dos primeirosmovimentos fsicos do corpo, a criana comea a ensaiar o espao, adiscerni-lo e a conhec-lo, a vivenci-lo, vivenciando a si mesmo,consciente e inconscientemente. So os processos que se interligam aoprprio curso de estruturao da percepo consciente, as possibilidadesde a pessoa sentir, pensar-se dentro do ambiente em que vive.
Nessa perspectiva, os oficineiros tm importante papel, pois conduzem uma
oficina com o olhar e a escuta atentas. Vale retomar, aqui, o significado da palavra
conduzir: guiar, encaminhar termos apropriados quando pensamos em oficineiros
e o lugar que ocupam frente oficina teraputica. Esse territrio permite ao sujeito o
resgate, o compartilhar, o poder se inserir, o aprender novas coisas, o poder ter um
dado de realidade, das trocas entre eles, da rotina que a vida, o cotidiano. E
tambm situa o oficineiro quanto s questes de interveno:
s vezes, tenho mais pudor de dar uma puxada para o que estacontecendo. E legal que alguns usurios podem apontar. Em quemomento a gente est, em que local, d uma puxada para a realidade. Naverdade, supercomplexo. Tem as oficinas pr-estabelecidas e algunsmovimentos que no sei se d para chamar de oficinas, que vo
8Artista plstica e educadora. artista de renome internacional. Sua rea de ensino compreende a
teoria da arte, sobretudo os princpios bsicos da linguagem visual, a estrutura do espao relacionadaa expressividade das formas e o papel da percepo e intuio dos processos criativos.
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acontecendo a partir de cada grupo que se forma. Por exemplo, tem ummovimento agora, bem legal que aconteceu do teatro.
Para o oficineiro, importante trabalhar com a dimenso do sujeito, o que
este leva e produz de si. O sujeito que participa das oficinas tem a sua histria e os
seus interesses e, na maioria das vezes, relacionados arte, msica, dana,
trova, piada, culinria, literatura. Muitas vezes, nas escolhas das msicas e das
danas, falam de conflitos, de desejos, de situaes interrompidas. Histrias difceis
socialmente e atravessadas por crises. Com isso, aparece essa outra identidade que
acabam assumindo: a de doentes, a de quem est impossibilitado de se inserir ou
permanecer, por exemplo, em um grupo de dana ou, enfim, em outros espaos da
comunidade. A fala de um oficineiro registra isso:
A convivncia no Sarau tambm interessante. O jeito de cantar, no temum nico jeito de cantar, no tem um nico estilo de msica, no tem umnico volume possvel. A flexibilidade, a plasticidade, nas infinitaspossibilidades de criar, esto inseridas no contexto. Por isso que umgrupo que acolhe praticamente cem por cento das pessoas que estointernadas
As vivncias que permitem percepes diferenciadas e um olhar do prpriosujeito sobre seu momento e o que pode ser valorizado, construdo, trazem tambm
ao oficineiro intervenes que possibilitam criar, valorizar e desenvolver meios
facilitadores desse processo de crescimento, como descrito no seguinte relato:
Na oficina de escrita h mais uma possibilidade de ter uma transformao,de reconhecer aquilo que escreveram como produto que dele, que saiu,que interno e que por isso foi para o papel. s vezes, eles fazem essedescolamento como se aquilo que est escrito no dissesse respeito a eles.
Quando a gente faz esse link, tem essa ligao que interna e essereconhecimento de que o que saiu s saiu porque estava dentro dele.
E continua, em linha idntica, o mesmo oficineiro:
muito comum, com paciente deprimido, relatarem todo um desnimo, umpessimismo, uma desesperana e, na escrita, conseguem escrever de umjeito superpositivo, uma coisa de luta, de vontade, de fora e, s vezes, nose do conta disso, de que se eles botaram no papel porque talvez elestenham mais fora do que quanto eles relatam para a gente.
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De acordo com Campos (2007), as oficinas teraputicas podem ser pensadas
como lugar de co-produo do ser humano, no sentido de fazer junto. O autor
salienta a importncia de se trabalhar no com parte do sujeito, mas com sua viso
global, levando em conta fatores sociais, culturais, orgnicos, subjetivos. Essa
maneira de pensar remete ressignificao de sade mental. Criar o novo,
analisando o velho padro, construir a partir de mudanas dos tempos e valores.
Valorizar este sujeito aumentar a capacidade de tomar conta de si, envolvendo-o
com sua prpria sade, com a possibilidade de relaes.
As oficinas so um lugar de expresso e trabalho a partir da e voltado para
a expresso, de modo que no so unilaterais, como refere o oficineiro:
Existe este fazer criativo, este fazer diferenciado que no est relacionadocom isso que a pessoa acredita s, que faz parte da doena, o prpriosintoma. Fazer criativo que no se remete s ao oficinando, mas tambm aooficineiro, at porque fica mais gostoso.
As oficinas so espaos onde as pessoas, de alguma forma, conseguem se
inserir e os oficineiros o tempo todo tentam facilitar isso.
s vezes, difcil, por haver uma situao de crise. Amide, o grupo podeestar indo em uma direo, e um de seus integrantes vir com uma histriaparalela.
O oficineiro coloca-se na tentativa de fazer um link, com vistas a que essa
pessoa possa inserir-se no movimento.
O resgate vem vinculado s histrias de vida, a momentos perdidos ou no
vivenciados pelo sujeito, que os compartilha nos espaos de tratamento. Os
oficineiros retratam o resgate, atravs do que vivenciam. Observe-se o relato desteoficineiro:
Uma palavra que sempre me vem cabea quando penso em uma oficina tambm de resgate, at por estar na internao, eles vem fragilizados porhistrias interrompidas. E vo acontecendo alguns resgates, voltamfragmentos das histrias, em outra oficina aparece outro, enfim. Vaiacontecendo tambm uma costura, as pessoas vo se deparando commemrias de sua vida.
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O mesmo emerge da fala de outro:
Na Temtica tem os temas prprios de cada poca, o que se perdeu ao
longo do tempo, ao longo da vida, principalmente pelo hbito da droga. Daeles comeam a resgatar isso, que o dia-a-dia das pessoas, resgatam aspocas, lembrar das datas comemorativas, o significado disso. A gente querresgatar, valorizar o que eles tm de vnculo com a famlia, vnculo com aprpria histria. A Temtica eu vejo por principalmente representar isso,resgatar esses valores anteriores de vnculo de vida. Fica muito centradonos guetos de drogas, neste hbito, ento, o lazer se perde. Tudo focalizapara a droga e para o consumo.
Os espaos das oficinas tambm esto envolvidos em reconhecer
habilidades, buscando utiliz-las de forma positiva no processo de vivncias, o que
aparece no seguinte relato de um oficineiro:
Neste momento, cada um do grupo tinha uma habilidade, reunindo esta,acontecendo um espetculo de teatro, dedoche. Poder contribuir assim paraogrupo com habilidades suas e que talvez um outro espao fosse visto deuma outra forma. Penso muito em V., que questiona muito, fala muito,provoca, enfim, mas que visvel assim uma habilidade que ele tem com acomunicao. E a nesse trabalho com o teatro, ele pde ganhar um lugar,que ele o diretor desta pea. Est mais frente do grupo, est fazendo,tendo um papel, um reconhecimento por algo positivo, e que em outromomento era negativo. Ele est articulando o grupo, vai para a assembliae quer questionar tudo mesmo, quer colocar um contra o outro. E algunselementos aparecem na histria, que uma fico, ento, ficou bem assim.
E ele prossegue, na reflexo includa em seu relato:
A oficina mais um espao tcnico, facilitando aumentar o repertrio dessapessoa, em funo de interesses dela, porque tambm no umaprescrio, mas a gente vai junto que movimentos so necessrios paraproduzir relaes e processos. E nos utilizamos de movimentos, de proporum pensar, o que mais uma possibilidade alm de vivenciar, que traz
transformao e de reconhecimento.
Guerra (2004b) enfatiza as oficinas como um lugar social do trabalho,
diferenciado do campo do trabalho protegido. Isso porque as oficinas percorrem
duas vias: a da criatividade e a da obra, o que desloca do trabalho repetitivo e
alienante.
Permitir surpreender-se e participar dos espaos so acontecimentos
freqentes nas oficinas, gerando movimento e interaes. possvel que a oficinavolte a fazer parte do movimento de vida e os integrantes se dem conta do que
mais podero vir a fazer. O espao fora das intervenes teraputicas deve ser
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lembrado e salientado, pois o circular na comunidade que, talvez, antes de tais
vivncias o usurio no fizesseou tivesse interesse pode vir a acontecer.
Ter outras identificaes no processo de vida que no a doena favorece aos
indivduos, que se beneficiam das oficinas teraputicas. Essa modalidade de
interveno no pode perder de vista o sujeito e sua trajetria. Segundo um
oficineiro,
Na Oficina Integrada, uma das principais questes no focar tanto nosintoma. Por no falar da patologia em si, eu acho bem importante, porqueali se pensa no fazer e na construo coletiva das pessoas. No que elasno estejam ali na posio de doentes, mas ali tem a possibilidade de sairum pouco deste lugar e pensar na construo, no fazer.
A oficina ainda lugar de transformao, relatada pelos oficineiros como algo
interno do sujeito, mas tambm emergente de suas aes e presente em seu
processo de vivncia. Os recursos teraputicos propiciam, enquanto intermediadores
de expresso, sentimentos e inveno que saem da rota do racional, da dicotomia
certo/errado.
Greco9 (2004), diante das oficinas como lugar de mediao, destaca que o
oficineiro testemunha movimentos, delrios, produes e que no passivo, estem movimento. Alm disso, ele leva consigo a sua singularidade, conduz a oficina
do comeo ao fim, utiliza ferramentas e seu referencial esttico para isso.
Os oficineiros facilitam processos como compartilhar, trocar e conviver. Cada
pessoa com seu papel, com suas diferenas, exercita a capacidade de estar com o
outro, tendo lugar de valor e reconhecimento que, por vezes, est prejudicado pela
posio que ocupa na famlia, na comunidade, no social, proporcionando novos
vnculos.Faz-se necessrio criar uma rede de negociaes, pois o homem produto e
produtor do social. As interaes se fazem da produo de sujeitos, e a sociedade
retroage com elas, possibilitando a produo dos prprios sujeitos, com seus
valores, sua cultura, seu saber, na trajetria de sua histria. Para um dos oficineiros,
as oficinas so
9Mdico Psiquiatra Mestre Psicologia/UFMG Doutorando Cincias da Sade/UFMG .
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um espao de troca deles. Tem coisas que a gente facilita, mas tem algunsmovimentos que partem deles, mesmas trocas de experincias, devivncias. s vezes, eles entendem algumas coisas que a gente deixapassar; interessante isso, resultado bem positivo.
Um dos oficineiros relata que
A Oficina Integrada tem agregado as pessoas tambm em funo deinteresse. um trabalho mais artesanal, interesse, s vezes, deconvivncia. Nosso interesse de estar fora do servio de sade, que aindano tanto deles, de estar na comunidade.
Lima10 (2004) faz referncia regio de possibilidades, que so dispositivos
que podem ser lugares de aprendizagem, de produo, de intercmbio, de
ampliao de relaes, de mergulho no universo da cultura. Segundo o autor, as
vivncias no processo de criao que se insere em um contexto so atravessadas
pela sade e pela arte, que se ampliam para alm e estendem-se para o cotidiano.
a tambm que residem a diversidade e as trocas que os indivduos realizam nas
relaes. Um dos oficineiros compreende que
Eles vem que no esto num grupo de comuns, pessoas do II, ad,Internao, funcionrios do Conceio. Cada um tem um papel diferente;ento, como eles vo trocar isso, no fica centrado naquela doena, porficar falando com o seu par e de se apropriar daquela doena e de seidentificar com aquilo de que doente. E ali eles vo se dar conta que sopessoas que esto no mundo e que vo fazer essa troca. Consideroteraputico pelo fato de ser integrada, de eles no s se sentirem bem nogrupo de iguais, mas de diferentes, e a sociedade diferente.
Outro oficineiro revela:
A gente tem pacientes esquizofrnicos, bipolares, com diagnstico dedepresso grave; no tem distino por patologia. No uma oficina spara pacientes com transtornos de humor bipolar, ou s para neurticosgraves. E o grupo sempre foi um grupo que aceitou, mesmo que as pessoasvo mudando.
10Docente do Curso de Terapia Ocupacional, Mestre em Psicologia Clnica.
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Segundo Afonso11 (2006), na elaborao das oficinas, importante refletir
sobre demanda, foco, enquadre e flexibilidade. Demanda o fio condutor, onde se
d o contrato inicial e que, por vezes, tem que ser reformulado, porque nem sempre
a demanda um pedido explcito de um grupo. Essa perspectiva prev uma pr-
anlise, requer um levantamento de dados para que se qualifique o encontro do
coordenador12 com o grupo. A temtica da oficina o foco, o tema gerador, e est
relacionada com quem sero os participantes da oficina, o contexto institucional, o
local, os recursos, o nmero de encontros e o planejamento flexvel.
A autora destaca tambm que, ao trabalhar com as concepes de Winnicott
(1971), a modalidade das oficinas pode ser compreendida como um jogo, uma
brincadeira, que permite abordar um tema, um conflito, por meio de uma estrutura.Ao expandir as perspectivas, possibilita a expresso de sentimentos e idias, a
encenao das relaes, a no cristalizao do cotidiano, e, por extenso, aprender
novos significados.
Oficineiros
Destacam-se, na seqncia, os atributos (subjetivos) que os oficineiros
sujeitos desta pesquisa julgaram necessrios ao se remeter modalidade, s
intervenes. Em suas falas, trazem como evidncia querer realizar uma oficina e ter
escuta como elementos essenciais. Um deles pondera:
No acho que todo mundo tenha que fazer uma oficina. Mesmo nacategoria, acho que colou muito na Terapia Ocupacional, oficina e tal.
Talvez as pessoas que passam em nossa formao gostem, mas acho queuma questo bsica ter afinidade, tem que gostar, tem que se sentir vontade, seno fica muito duro, muito estranho.
O oficineiro precisa ter um olhar mais sensvel, no to concreto. Deve fazer
essa traduo, ver o que a interveno representa para a pessoa, sua histria de
11Na poca do projeto professora adjunta do departamento de psicologia da UFMG.
Psicloga,mestre e doutora em Educao atuando enquanto pesquisadora.
12O autor refere-se aqui a coordenador como o oficineiro.
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vida, ver as singularidades, a individualidade e trabalhar com ela, ali, na oficina.
Pode articular vivncias entre seus integrantes, como relata um oficineiro:
E a, s vezes, eu me pego, sei l, muito envolvida e falando bastante, etm umas coisas que passam, porque tm muitas coisas que eles trazem deuma forma muito tmida. Tem que estar muito atento para perceber e parapoder dar um lugar ali ou no.
Importante para os oficineiros tambm observar o transitar dos sujeitos, seu
movimento, seu ir e vir. Isso leva ao questionamento: de que forma colocar-se em
um grupo to diferente? Afonso (2006, p. 12) relata que o grupo se constitui como
rede de relaes. O grupo faz a interao face a face. Seus componentes so
indivduos que esto envolvidos em um processo de comunicao intersubjetivo,
mediante a linguagem verbal e a no-verbal, e esto inseridos em um conjunto de
aes. Existe um compartilhamento de vivncias. Segundo um oficineiro,
Outros questionamentos tambm surgem: ser que vai dar certo ou novai? A gente se coloca com atitudes e falas, mas ser que fulano sebeneficiou daquele momento, um se beneficia ouvindo tal coisa, outro j soadiferente; ento, como administrar isso?
Quando alguns oficineiros trazem a palavra tolerncia, surge a idia de
tempos e ritmos diferentes, a necessidade de olhar para isso e o trabalho com nossa
ansiedade frente resposta do outro ou no-resposta - ou, ainda, ao inesperado.
Trazem a tolerncia de acompanhar passo a passo o ritmo de cada um, de ter um
olhar mais sensvel, e no to concreto. O oficineiro precisa ter essa tolerncia, no
sentido de poder encontrar um canal adequado, no momento adequado. O tolerar
tambm aparece diante das histrias e dos momentos difceis de cada sujeito.
Durante as entrevistas, um oficineiro ressaltou a necessidade de poder
valorizar, dando lugar, ou pegando um fiozinho da meada:
De estar resgatando esta histria, de estar investindo nos interesses. Depoder estar dando um lugar para ver uma palavrinha, uma frase que venhaassim baixinha, tmida. Poder ajudar a aparecer e tornar l de papel machum objeto ou poder acolher no grupo, poder fazer um projeto, darandamento. No ficar no vazio, uma frase solta, uma coisa solta, poder darum lugar e ajudar a viabilizar.
Outro oficineiro foi categrico em seu relato, quanto a isso:
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Conseguir apostar no paciente, valorizar que ele consegue produzir umacoisa de muito valor, porque na oficina de escrita conseguem coisas muito,muito bonitas, e normalmente assim. A maioria escreve coisas muito
legais.
A produo de uma oficina no deve necessariamente ser um produto, mas
uma produo de criao. Tem seu tempo prprio, seu ritmo e, s vezes, no se
conclui. O sujeito estimulado a assumir um lugar ativo, por meio da expresso e da
criatividade; a questionar-se, para dar sentido vida e para transformar suas
prticas. Cabe ao oficineiro, atravs dos objetivos propostos nas intervenes
teraputicas, mobilizar o sujeito ao ato de fazer, impulsionando-o para seguir
tecendo coisas novas.
Enquanto profissionais de sade e oficineiros, importante investir em saber
e estudo, instrumentalizar-se, ter a informao, transmitir a informao e utilizar-se
dela para criar processo. Em alguns momentos, cabe ao profissional poder reforar o
movimento do grupo com outras iniciativas, ter curiosidade para aprender, realizar
trocas, investir no que faz atravs do terico e da prtica e estar engajado, o que
faz diferena nas intervenes.
Cabe conectar-se com o fora, para no ficar em espaos teraputicos que por
si s se bastam. Vale poder entender quem so as pessoas que fazem parte desta
oficina, deste grupo, e remeter-se inter-setorialidade, outras reas ou lugares,
outros meios, como a cultura, para compor novos saberes e fazeres.
As atribuies que os oficineiros apontaram partiram das prticas das oficinas
contempladas nesta pesquisa: Para os oficineiros, facilitar e acolher parece estar
diretamente ligado a inserir, e com esse vis vamos dando um lugar para as coisas
acontecerem. Acolher a fala dos integrantes atravs da escuta, de criar e construircom ela possibilidades.
Ao pensar em planejar e fazer trocas, necessrio ter a capacidade de dividir
tarefas, aceitar saberes que no os seus, para que a capacidade de compartilhar
esteja em foco. Isso est presente tanto na fala deste oficineiro: A gente, ento, se
reuniu, para planejar, para tentar organizar e fazer um investimento, como na deste
outro:
A outra coisa no espao da oficina a relao. Sou uma trabalhadora, souuma tcnica, mas no d para ter uma relao distante. Eu me sento junto,
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estou vivenciando e experimentando junto, estou realmente integrada aogrupo, horizontal de convivncia e de compartilhar mesmo.
Pensar nestes sujeitos, atravs de trocas interdisciplinares, proporciona
refletir nas propostas teraputicas, sem perder a especificidade, mas sabendo trocar.
Uma equipe nunca interdisciplinar o tempo todo, mas os momentos acontecem e
so ricos em permutas. As oficinas teraputicas, enquanto propostas teraputicas,
tambm devem utilizar este dispositivo de trocas.
Aliado a isso, planejar e organizar tambm no perder a dimenso do
sujeito: A gente acaba trabalhando e sempre focando muito s na alucinao, e
acaba perdendo a dimenso do sujeito porque est alucinado, esse contedo
tambm no veio do nada; tem a ver com as histrias e conflitos, como refere um
oficineiro.
Proporcionar que a atividade e sua organizao tragam vivncias
significativas para cada um uma funo importante da oficina. A organizao
tambm pode ser um elemento que engessa, se no levarmos em conta outras
questes a considerar, quando falamos em oficineiros e oficinas teraputicas: Criar
e ir em busca traz qualidade ao fazer, torna mais gostoso o trabalho e no deixa ficar
rotineiro. Podemos nos referir aqui a recursos, possibilidades e at mesmo adificuldades.
Os oficineiros so grandes observadores, esta modalidade de atendimento
exige isso, pois interfere diretamente nos manejos e intervenes. As habilidades de
saber comunicar-se e de saber pontuar quando algo no est inserido no saber pelo
oficinando, bem como a utilizao de dados de realidade e de uma linguagem
compreensvel so recursos que podem vir a acrescentar e fazer sentido.
Consideraes finais
Ao encerrar esse estudo, fao algumas consideraes. Em primeiro lugar,
sigo me indagando, pois todos estamos em constante movimento, enquanto sujeitos,
com nossas relaes, trajetrias e o meio em que vivemos. Nossa busca constante
e instigante. A metodologia me permitiu colher dados to ricos, cuja anlise tecida luz do referencial terico possibilitou criar, nesses movimentos, pensamentos e
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prticas, saberes e fazeres. Mais que isso, convida a prosseguir pensar-fazendo
como refere Lobosque13 (2006).
Percepes podem ser enunciadas, tecidas e compartilhadas. Partem do no-
saber de cada dia, vo compondo-se por meio da inveno, da criao,
configurando-se entre enlaces, desenlaces e ns, entre avesso e direito, entre o
sujeito e as possibilidades de ampliar seu cotidiano.
As oficinas foram tecidas com suas histrias. Elas partem de um fio;
necessitam de aes, invenes e criaes. Tudo o que for tentado ser
transformado em coisa nova. Ser aprendiz de si e estar receptivo a trilhar novos
caminhos faz dos oficineiros compositores de suas histrias, bem como das histrias
das pessoas com as quais compartilham os espaos das oficinas teraputicas.Todos ns temos histrias, fazemos histrias, compartilhamos histrias.
Registro aqui uma pequena passagem, relatada por uma paciente j idosa, quando
falava dos fatos de sua vida. Estava ela comparando seus filhos, que eram cinco,
sua me, que lhe pergunta: Quantos dedos tm esta mo?. Ela replica: Cinco.
A me volta a question-la: So iguais?. No!, responde ela prontamente. E a
sua me, av de seus filhos, conclui: Voc tem cinco filhos, e so todos
diferentes, como os dedos de sua mo. Em muitos dos momentos quecompartilhamos, ela me contou essa passagem, referindo-se tambm a outros fatos
da vida e que achei interessante compartilhar com vocs, leitores e profissionais.
Ora, temos muitas oficinas teraputicas, nas quais a diversidade se faz
presente. Cada qual carrega consigo muitas peculiaridades, muitas formas de se
tecerem coisas novas. Dos profissionais que as compem, tambm podemos dizer
que so diferentes, como os dedos da mo e, ao se articularem, realizam o
movimento.E no poderia encerrar estes escritos de outro modo oficinas teraputicas,
para qu? Como mudar o mundo sem conseguir mudar a nossa prpria rua? Como
provocar diferenas nas oficinas sem conseguir provocar mudanas em oficinas que
compomos e em que estamos inseridos? Assim os oficineiros sero facilitadores de
13Psiquiatra de um Centro de Referncia em Sade Mental (servio de atendimento a crises
substitutivo ao hospital psiquitrico); coordenadora do Frum Mineiro de Sade Mental; supervisoraclnica de servios de sade mental em diversas cidades brasileiras;
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processos de subjetividades, proporcionando que os sujeitos com suas
singularidades trilhem caminhos e vivenciem processos de relao, de
compartilhamento no cotidiano. A Reabilitao Psicossocial se d tambm atravs
desta modalidade que so as oficinas teraputicas, onde se trabalha com o singular
e coletivo, com as relaes, com os sujeitos suas percepes, com os caminhos que
trilham, com os obstculos; e durante este processo podemos visualizar o processo
e o progresso e onde cada um quer chegar.
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