1 1. INTRODUÇÃO A história mostra que o esporte é ...

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1 1. INTRODUÇÃO A busca da autorrealização não é um desejo individual que possa ser suspenso, enquanto continua o processo de educação. È o objetivo básico constante e abrangedor da vida de todos os indivíduos, o único motivo de todos os seus atos. (Snygg & Combs). A história mostra que o esporte é, fundamentalmente, um fenômeno social, cultural, ideológico, político e econômico de importância no mundo moderno. A relevância e a complexidade do fenômeno esporte não são ignoradas pela ciência, que busca através de métodos próprios a obtenção de dados e a conseqüente intervenção, objetivando maximizar o desempenho esportivo. O esporte denota, conforme SIMÕES, CONCEIÇÃO e CORTEZ (2009), a representação da realidade psicossocial. Em meio a cobranças, pressões e esforços que se sobrepõem à natureza do ser humano, os atletas sobrevivem no mundo do esporte, buscando de forma conjunta ou individual o reconhecimento, a ascensão e o status social. Nesse processo, a Psicologia do Esporte e do Exercício surge comprometida com as abordagens relacionadas às condições físicas e mentais de atletas no caminho do sucesso competitivo. As diferentes abordagens da psicologia do esporte realçam que a “resistência psicológica” 1 representa um dos fatores essenciais nas conquistas dos atletas que participam de provas de longa distância como a maratona, que é um evento esportivo- competitivo envolvido por múltiplos fatores biopsíquicos, constitucionais e adquiridos. Ante essa sumária concepção, diríamos que o esporte de competição representa, conforme SIMÕES et al. (2009), um modelo institucionalizado de realidade social, em 1 Resistência Psicológica é um termo utilizado por SALMELA (1990), que representa a decisão de competir em determinadas condições, persistência na tarefa, determinação ou intensidade na realização da tarefa e execução técnica.

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    1. INTRODUO

    A busca da autorrealizao no um desejo

    individual que possa ser suspenso, enquanto continua

    o processo de educao. o objetivo bsico

    constante e abrangedor da vida de todos os

    indivduos, o nico motivo de todos os seus atos.

    (Snygg & Combs).

    A histria mostra que o esporte , fundamentalmente, um fenmeno social,

    cultural, ideolgico, poltico e econmico de importncia no mundo moderno. A

    relevncia e a complexidade do fenmeno esporte no so ignoradas pela cincia, que

    busca atravs de mtodos prprios a obteno de dados e a conseqente interveno,

    objetivando maximizar o desempenho esportivo.

    O esporte denota, conforme SIMES, CONCEIO e CORTEZ (2009), a

    representao da realidade psicossocial. Em meio a cobranas, presses e esforos que

    se sobrepem natureza do ser humano, os atletas sobrevivem no mundo do esporte,

    buscando de forma conjunta ou individual o reconhecimento, a ascenso e o status

    social. Nesse processo, a Psicologia do Esporte e do Exerccio surge comprometida com

    as abordagens relacionadas s condies fsicas e mentais de atletas no caminho do

    sucesso competitivo.

    As diferentes abordagens da psicologia do esporte realam que a resistncia

    psicolgica 1 representa um dos fatores essenciais nas conquistas dos atletas que

    participam de provas de longa distncia como a maratona, que um evento esportivo-

    competitivo envolvido por mltiplos fatores biopsquicos, constitucionais e adquiridos.

    Ante essa sumria concepo, diramos que o esporte de competio representa,

    conforme SIMES et al. (2009), um modelo institucionalizado de realidade social, em

    1 Resistncia Psicolgica um termo utilizado por SALMELA (1990), que representa a deciso de competir

    em determinadas condies, persistncia na tarefa, determinao ou intensidade na realizao da tarefa e

    execuo tcnica.

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    que os atletas, em tese, possuem entre si as mesmas condies fsicas, tcnicas, tticas

    e psicolgicas.

    Um modelo promotor de tenses / emoes / reaes, cuja resultante so os

    estados psicolgicos que se estendem s percepes pblicas (torcedores,

    espectadores), e que so explorados pela mass media e por todos que esto envolvidos

    direta ou indiretamente com a prtica esportiva. Assim, o esporte de competio

    representa um papel significativo na sociedade moderna, acompanhando as evolues e

    refletindo as mudanas cientficas e tecnolgicas. Cria, assim, valores socioculturais,

    ideolgicos, econmicos, polticos, morais e ticos que moldam as condutas e atitudes

    dos esportistas em praticamente todos os esportes individuais e coletivos. Expressa uma

    grandeza de contribuies, ocupando espao nobre na vida do homem. Est presente

    em todas as camadas sociais e, para alguns, representa oportunidade de ascenso

    social e econmica. A institucionalizao do esporte moderno acontece por meio de

    entidades, ligas, associaes e federaes que comandam e detm o poder no meio

    esportivo, assim como o controle sobre o patrimnio financeiro e o status social.

    (KNIJNIK, 2004).

    MIGUEIS (1987) postula que o esporte implica na transformao do que ele

    denomina matrias primas, tais como informao, energia, recursos materiais e

    humanos em um produto final ou resultado, cujo objetivo vencer. No meio esportivo,

    existe um compromisso individual com um conjunto de valores, crenas e normas

    institudas por este meio e que esto em constante transformao devido s exigncias

    de vencer, independentemente do preo a pagar (SIMES, HATA e RUBIO, 1998).

    BRUHNS (1996) assevera que o esporte abrange uma estrutura cultural

    diversificada, dinmica, globalizada quanto s normas estabelecidas, e que a brincadeira

    e os jogos so constantemente infiltrados por componentes novos. Os atletas e as

    equipes esportivas constituem o foco de ateno dos estudiosos da rea do esporte, que

    procuram analisar as influncias e o desenvolvimento de qualidades fsicas, tcnicas,

    tticas, fisiolgicas, sociolgicas e psicolgicas exigidas no esporte.

    O atleta interage com o ambiente fsico e com pessoas, que de alguma forma

    estejam envolvidos com sua prtica, e se depara com situaes desafiadoras e/ou

    ameaadoras (DE ROSE, SATO, SELINGARDI, BETTENCOURT, BARROS e

    FERREIRA, 2004). Acredita-se, ento, que a maratona uma prova que atrai um

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    nmero maior de atletas com o mais alto grau de habilidades atlticas (fsicas, tcnicas,

    etc.) e de competncias emocionais.

    O desgaste emocional do atleta durante o percurso contribui para que essa prova

    seja, freqentemente, analisada sob o ponto de vista psicolgico. Por isso, a maratona

    um fenmeno esportivo que provoca emoes tanto no pblico presente no evento,

    quanto na mdia que transmite e publica os resultados, mas o principal afetado por essas

    emoes o prprio atleta. Para sua prtica sistemtica, supe-se a existncia de

    equilbrio psquico, disciplina e pacincia para a preparao do corpo e da mente.

    preciso, portanto, ter conscincia das limitaes pessoais, para impor determinao e

    superar as inmeras dificuldades com que o atleta se depara no treino e nas

    competies; porque uma prova de 42,195 km, embora atraente, desencadeia

    sentimentos de medo e apreenso com os quais o atleta precisa aprender a lidar.

    uma prova que encerra as competies dos Jogos Olmpicos, e que nos leva

    a reflexes sobre os limites do corpo e tambm sobre a resistncia psicolgica; mesmo

    o atleta mais experiente precisa ser persistente, para superar os obstculos e completar

    o percurso no menor tempo. LUCENA (2008) comenta, por exemplo, que a deciso de

    correr uma maratona torna uma pessoa diferente, sem considerar o sofrimento e a

    superao, mas pelo tempo dedicado diariamente aos treinos, pela determinao e pelo

    esplendor de conseguir atingir o objetivo.

    uma das provas histricas e tradicionais do atletismo brasileiro e mundial. Exige

    do corredor dedicao e preparao complexa e diversificada, que inclua todo um

    treinamento fsico e tcnico. No entanto, em funo de suas demandas, o treinamento da

    maratona deveria incluir tambm um bom preparo para os diversos aspectos psicolgicos

    que se fazem presentes: stress, motivao, agressividade, ateno, ansiedade,

    concentrao aspectos que despertam no meio acadmico o interesse em estud-la.

    SANTOS (1991) asseverou que a prova da maratona cercada, por um lado, por

    um contedo psicoafetivo que intervm no imaginrio das pessoas, em razo dos

    melhores resultados obtidos pelos corredores de elite2, e, por outro lado pelas

    predisposies genticas e adaptaes aos treinos. Compreende-se que determinadas

    2 Elite um grupo social influente, com status elevado e poder de deciso no conjunto da sociedade.

    (BARBANTI, 2003). Estamos falando de elite esportiva.

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    caractersticas permitem ao ser humano resistir intensamente, o maior tempo possvel, s

    condies adversas que aparecem a qualquer instante, durante o percurso.

    Essas caractersticas possibilitam ao atleta lidar com situaes, com o mnimo de

    prejuzo ao seu desempenho, persistindo numa atividade quando a fadiga fsica

    acontece (SINGER, 1982). O autor ressalta que o sucesso e/ou fracasso parecem ser

    determinados parcialmente pela resistncia psicolgica. Significa que um atleta bem

    treinado pode regular voluntariamente suas disposies decorrentes de atividades

    intensas e prolongadas, e a resistncia ao sofrimento pode ser devida a fatores

    genticos, experincias anteriores ou combinao de ambos.

    As questes psicolgicas que se colocam constituem a problemtica da

    resistncia psicolgica. Por isso inegvel que, por meio do pensamento, um

    determinado estado psicolgico possa ser desenvolvido, favorecendo a execuo de

    uma atividade e colaborando para que ela seja mantida e sustentada. Os limiares de

    sofrimento e tolerncia so determinados por questes fisiolgicas e psicolgicas. Por

    conseguinte, na maratona pensamentos e sentimentos relacionados a necessidades e

    desejos, influenciam o desempenho dos atletas.

    Os aspectos emocionais podem levar um atleta a controlar situaes especficas,

    devido a caractersticas pessoais internas que o predispem para tanto. Da se acreditar

    que a resistncia psicolgica seja um dos fatores determinantes para que o atleta

    maratonista alcance sucesso em provas de resistncia. Representa um fator psicolgico

    relevante em momentos importantes no campo dos esportes, especialmente em relao

    s provas de resistncia. Isso faz com que a resistncia psicolgica se torne um objeto

    de estudo para pesquisadores de diferentes reas do conhecimento, especialmente com

    relao a atletas maratonistas, que constantemente desencadeiam estados psicolgicos

    causados por estresse psicofisiolgico.

    Existem estudos que explicam o comportamento esportivo, mas no evidenciam

    os fatos vivenciados pelos atletas no mbito do esporte de competio. Tambm so

    pouqussimos os estudos que abordam o comportamento e a resistncia psicolgica de

    atletas maratonistas. O presente estudo, por conseguinte, representa um avano para a

    compreenso dos principais fatores biopsicossociais relatados por corredores

    maratonistas Isto nos leva a crer que esses atletas se envolvem com situaes cujas

    dificuldades aparecem no transcorrer da prova, a saber:

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    Como os maratonistas resolvem as dificuldades que aparecem durante o transcurso

    da prova?

    Como constroem suas resistncias psicolgicas?

    Quais fatores participam da elaborao e desenvolvimento das estratgias cognitivas

    que podem utilizar nos momentos de extremo cansao? Estas estratgias so

    construdas durante o percurso, na medida em que vo aparecendo?

    De que forma as sensaes, pensamentos e emoes influenciam o desempenho do

    corredor maratonista?

    Essas indagaes fazem parte da multiplicidade de fatores psicossociais,

    sociodinmicos e institucionais que norteiam a vida social e competitiva de atletas

    maratonistas. Isso permitiu que pudssemos levar adiante um estudo que caracterizasse

    alguns aspectos biopsicossociais e culturais envoltos com as condutas e atitudes

    competitivas desses atletas. Utilizamos como base as teorias relacionadas ao

    comportamento humano no campo dos esportes de competio que pretendem, no

    fundo, desvendar os mesmos objetivos: o competidor frente s exigncias competitivas,

    cuja resistncia psicolgica representa o pice na sua vida psquica, como

    demonstrado na figura abaixo:

    FIGURA 1: Dinmica do Comportamento de um Atleta

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    Esse esquema conceitual, referencial e operacional evidenciado, conforme

    SIMES (1987), por meio do valor individual de autoexpresso e participao dos atletas

    nos eventos competitivos. Esse valor no se evidencia somente nas competncias

    atlticas dos maratonistas, mas tambm em funo de um conjunto unitrio e na

    dependncia daquilo que se denomina resistncia psicolgica. Assim, as condutas e

    atitudes dos atletas perante as provas de longa distncia maratonas representam um

    fator preponderante no processo participativo e competitivo das mesmas.

    A resistncia psicolgica de atletas maratonistas, portanto, uma varivel

    comportamental considervel no contexto competitivo das provas de maratona. Logo,

    identificar e caracterizar se essa resistncia psicolgica exerce influncia nas atitudes e

    conduta dos maratonistas tornou-se importante para o esclarecimento de certos

    fenmenos psicossociais que assolam a vida competitiva de atletas.

    2. OBJETIVOS

    2.1 GERAL

    Investigar se a resistncia psicolgica poderia ser associada ao comportamento

    e desempenho de atletas maratonistas (masculino e feminino) do Estado de So Paulo,

    mediante a construo de onze categorias: escolha de tarefa, persistncia,

    determinao, preciso tcnica, relao social, aspectos psicossomticos, religiosidade,

    conflitos, infraestrutura, aspecto fsico e estratgias mentais. Essas categorias

    comporiam o denominado Inventrio do Comportamento do Maratonista.

    2.2 ESPECFICOS

    Caracterizar se existe nas opinies dos atletas relaes significativa quanto

    influncia da resistncia psicolgica em seus comportamentos e desempenhos,

    no que diz respeito ao comportamento que identificam como real nas maratonas.

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    Identificar possveis diferenas na forma que os atletas descrevem seus prprios

    comportamentos, quando analisados no conjunto das entrevistas frente s

    categorias construdas.

    3. JUSTIFICATIVA

    Correr tudo para mim. O problema que nunca me

    dou por satisfeito. Desafios so tentadores e

    envolventes. Sabe quando tudo te leva a desistir? a

    que eu encontro fora para zerar e comear tudo de

    novo. Se a vida cheia de obstculos, depende de a

    gente escolher parar ou seguir em frente. Eu escolho

    seguir em frente. (Claudinei Quirino)

    A importncia das questes psicolgicas no esporte assunto que bastaria para

    preencher diversas laudas. Diramos que existem fatores psicossociais envolvidos com o

    stress, motivao, autoeficcia, ansiedade, ativao. No entanto, a resistncia

    psicolgica de atletas maratonistas uma das variveis pouco exploradas por

    estudiosos / pesquisadores do esporte de competio. Uma analise mais aprofundada

    dessa varivel poderia dar uma viso mais ampla da realidade vivenciada pelos atletas

    maratonistas no transcorrer dos quarenta e dois quilmetros e cento e vinte e cinco

    metros (42, 125km).

    A maior parte dos estudos no analisa a resistncia psicolgica que

    fundamental para um atleta maratonista completar a prova de maneira eficiente e eficaz.

    Embora uma variedade de temas tenha sido investigada comportamento e resistncia

    psicolgica um tpico insuficientemente investigado. Logo, se fazia necessrio um

    estudo mais aprofundamento para aclarar a importncia da resistncia psicolgica na

    vida dos maratonistas. O que esperamos que os resultados alcanados neste estudo

    possam contribuir para ampliar o conhecimento dos profissionais do esporte a respeito

    do estado de resistncia psicolgica seguido pelos atletas frente s provas de

    maratona.

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    4. DELIMITAO DO ESTUDO

    O estudo restringiu-se a pesquisar opinies de atletas (quatro do sexo masculino

    e trs do feminino) que participavam de provas de maratonas promovidas pelas

    organizaes que representam a modalidade no Brasil (Confederao Brasileira de

    Atletismo e Federaes Estaduais). No se procurou delimitar a coleta de dados de

    acordo com o tempo de treinamento para competies de provas de resistncia. O

    critrio para a escolha dos maratonistas limitou-se ao fato de eles estarem competindo

    em maratonas h pelo menos cinco anos e terem concludo o percurso em todas as

    corridas. No presente estudo, no foram consideradas as diferenas de estrutura

    organizacional das provas s quais os atletas estavam sujeitos, nem as diferenas de

    recursos humanos e condies materiais das provas. possvel que esses fatores

    tambm exeram influncia sobre o comportamento e o desempenho dos atletas, mas

    tais diferenas no foram objeto de investigao.

    5. REVISO DE LITERATURA

    Estudar a resistncia psicolgica de atletas maratonistas tambm falar de um

    conjunto de fatores que constituem o comportamento e desempenho em provas de longa

    distncia. Da a necessidade de construir a reviso de literatura em partes.

    5.1 Elementos Histricos da Maratona

    Eu gosto de maratonas. Adoro os longos e solitrios

    treinos em que me perco em mim mesmo; admiro o

    desafio e aprecio a estranheza de acordar cedo para

    sair a suar por a; reconheo as dificuldades do

    percurso, aproveito a conquista do ritmo, o ciclo de

    cada passada e, principalmente, me embebedo da

    euforia da chegada. (Rodolfo Lucena).

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    A histria revela que as provas de maratona so acontecimentos esportivos

    nobres e que encerram as competies dos Jogos Olmpicos. a prova mais exigente

    do calendrio das Olimpadas e a mais longa corrida pedestre do evento.

    A Batalha de Maratona foi uma das Guerras Mdicas. Persas e gregos lutavam, e

    os comandantes gregos chamaram os soldados para a luta, uma vez que estavam

    perdendo terreno para os persas.

    LAIGRET (2000) enfatizou que a histria da maratona possui um correlato

    lendrio, divulgando a Maratona como o nome de uma batalha entre gregos e persas,

    em 490 a.C. Relata que um soldado ateniense, chamado Feidpedes, correu 40 km

    (distncia entre Maratona e Atenas), a mando do comandante grego Milcades, para

    notificar a vitria dos gregos, morrendo em seguida de cansao fsico.

    MATTHIESEN (2007), CAIZARES (1994), VIEIRA & FREITAS (2007) e TUBINO

    (2008) consideram que o general ateniense Milcades enfrentou o forte exrcito persa

    em 29 de setembro de 490 a.C., saindo vitorioso dessa batalha. O momento da

    notificao de Feidpedes nunca teve confirmao histrica; no entanto, a resenha sobre

    este ato herico resistiu aos sculos, conforme descrevem VIEIRA & FREITAS (2007).

    As corridas de longa distncia tiveram sua origem na Gr-Bretanha no sculo

    XVII, mas a primeira maratona dos Jogos Olmpicos Modernos foi organizada em 1896,

    em Atenas, pelo historiador francs Michel Breal, que sugeriu ao Baro Pierre de

    Coubertin e ao comit organizador dos Jogos Olmpicos da Era Moderna uma corrida

    que partisse da cidade de Maratona e terminasse no estado Olmpico de Atenas

    (PASTOR, 1994; GUZMN & CINEROS, 2000, TUBINO, 2007).

    VIEIRA & FREITAS (2007) postulam que Feidpedes foi homenageado com essa

    nova modalidade olmpica, que recebeu o nome de maratona, foi fixada a distncia de 40

    km para os Jogos Olmpicos de 1896 a 1904, dentre os oito atletas finalistas no ano de

    1896, sete eram gregos, e o primeiro campeo olmpico da prova foi um grego, Spiridon

    Louis, com o tempo de 2h 58mim50s. Segundo TUBINO (2007), participaram desta

    competio 17 corredores, provenientes de cinco pases. Spiridon ficou com o ouro,

    Vasilakos (Grcia) com a prata, e Gyula (Hungria) com o bronze.

    A princpio, a distncia causou impacto e foi rejeitada, porque desafiava a mxima

    distncia percorrida at o momento nos Jogos Olmpicos da Antiguidade, que teria sido

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    de 4.800 metros. (GUZMN & CINEROS, 2000). Escreveram que, em 1908, nos Jogos

    Olmpicos de Londres, a distncia da maratona foi aumentada pelo governo ingls para

    42,195 km, para que a famlia real britnica acompanhasse a prova, os atletas

    comeariam a prova no jardim do Castelo de Windsor e terminariam no estdio

    Shepherds Bush, em frente ao rei Eduardo VII. Esta verso tambm relatada por

    LAIGRET (2000). Enfim, aps 16 anos, nos Jogos Olmpicos de 1924 (Paris), ficou

    estabelecido que esta fosse a distncia oficial da maratona.

    Convm destacar o desafio enfrentado por corredores que realizaram fatos

    notveis durante a prova da maratona. O que torna esse quadro mais interessante que

    os atletas eram considerados amadores, ou seja, no recebiam auxlio financeiro, ou

    qualquer recurso material. O esporte era praticado por um ideal olmpico.

    A maratona possui diversas histrias interessantes e eventos marcantes que

    aconteceram nos Jogos Olmpicos. TUBINO (2007) cita que nos Jogos Olmpicos de

    Londres (1908), o italiano Pietro Dorando liderava a prova e caiu inconsciente e

    desorientado, antes de cruzar a linha de chegada, no entanto, o atleta ficou em primeiro

    lugar, porque foi amparado por outras pessoas, e acabou recebendo da rainha

    Alexandra uma taa de ouro. O mesmo autor cita que em Estocolmo (1912) o atleta

    Francisco Lzaro, de Portugal, morreu durante a maratona. Muitos anos depois, em Los

    Angeles (1984), a sua Gabriele Andersen Scheiss terminou a maratona de forma

    dramtica, foi amparada at a linha de chegada, desidratada, cansada e com a

    musculatura totalmente disforme. (PASTOR, 1994).

    PRETTO (2005) escreveu que o atleta Abebe Bikila correndo descalo, foi o

    primeiro africano negro a conquistar uma medalha de ouro nos Jogos Olmpicos, em

    Roma (1960), batendo o recorde da prova com o tempo de 2h15min16s, o imperador

    Atse Hail Selassi reconheceu seu feito e, como prmio pelo seu desempenho,

    ofereceu-lhe como presente um carro, um apartamento e uma penso vitalcia, Abebe

    Bikila chegou a realizar algumas flexes ao final da prova. A autora comenta que correr

    em Roma foi uma deciso em comum com o seu tcnico, Onni Niskanen, pelo fato de a

    Etipia ter sido invadida 30 anos antes pela Itlia, e o obelisco Axum ter sido roubado

    pelo exrcito italiano e colocado em Roma, Bikila tambm ganhou a medalha de ouro

    nos Jogos Olmpicos de Tquio (1964), com o tempo de 2h12min11s. Foi o primeiro

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    atleta a vencer duas maratonas olmpicas (PRETTO, 2005; GARCIA, 1991; TUBINO,

    2007).

    Em decorrncia de um acidente de carro na cidade de Sheno, no final da dcada

    de 60, Abebe Bikila comeou a disputar provas para cadeirantes, como postula PRETTO

    (2009), vindo a falecer em 25 de outubro de 1973 devido a uma hemorragia cerebral, o

    heri etope foi enterrado na catedral de St. Joseph, ao lado do imperador Atse Haile

    Selassi.

    A norueguesa Grete Waitz, pioneira nas maratonas e considerada a padroeira da

    maratona de Nova York, bateu vrios recordes nessa prova (em 1978 com 2h32min30s,

    em 1979 com 2h2733s, e em 1980 com 2h25min41s), disputou a maratona de Nova

    York 15 vezes, tendo obtido vitria em 13 edies, tambm obteve o recorde em Londres

    (em 1983, com 2h25min28s), e l venceu nove vezes (PRETTO, 2005).

    BASTOS, (2009) postula que o recorde atual da maratona masculina pertence ao

    etope Haile Gebrselassie, em 2008, com o tempo de 2h03min59s, e na feminina

    pertence inglesa Paula Radcliffe, com o tempo de 2h15min25s, em 2003. Escreveu

    que o atleta portugus Carlos Lopes bateu o recorde mundial da maratona em Roterd

    (1985), com o tempo de 2h07min12s, e o brasileiro Ronaldo da Costa em Berlim (1998),

    com o tempo de 2h06min05s.

    GARCIA (1991) relata que o feito de atletas portugueses em maratonas causa

    uma impresso grandiosa, alguns so considerados heris, como Rosa Mota, a

    primeira a vencer uma maratona pertencente ao calendrio da Federao Internacional

    de Atletismo IAAF, e Carlos Lopes, que alcanou simultaneamente a melhor marca

    mundial olmpica e europia.

    PRETTO (2009) assinala que a corrida foi necessria para manter sob controle a

    asma da atleta Rosa Mota, o mdico Jos Pedrosa, que a tratou, desafiou Rosa Mota a

    correr uma maratona, aps dois anos de treino, em 1982, foi campe na Grcia,

    exatamente no percurso supostamente feito pelo soldado Feidpedes. Comenta que

    Maratona de Chicago, em 1984, foi realizada em condies desfavorveis para Rosa

    Mota que, mesmo sob chuva, vento e frio, correu os ltimos 20 km sozinha e obteve a

    quebra do recorde, em 2h26min21s, e na maratona de Tquio, em 1986, Rosa Mota

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    ficou impressionada com o sistema de segurana para que o pblico no tocasse nos

    maratonistas, que so considerados deuses na terra.

    Alberto Salazar entrou em colapso aps a chegada, quando participou da

    Falmouth Road Race, Massachusetts, corrida de sete milhas (11 km), sob um calor de

    41C durante a prova, o atleta ingeriu pouco liquido, e ainda fez esforo adicional para

    ultrapassar Rodgers, considerado favorito, com isso, sua temperatura corporal atingiu

    42,2C, e precisou ser internado e envolvido em gelo, depois dessa prova, Alberto

    Salazar, ficou conhecido como "All That is Man Salazar. de acordo com GALEMBEK

    (2006), que menciona ainda que Salazar corria entre 256 e 320 quilmetros por semana,

    e na Maratona de Nova York em 1980, completou a prova em 2h09min41s, tempo

    considerado recorde para quem nunca havia corrido uma maratona, no ano de 1981, ele

    quebrou um recorde da prova com o tempo de 2h08min13s, porm o percurso aferido

    era menor do que o oficial de maratonas (42,195 km), em 1982, seu tempo na maratona

    de Nova York foi de 2h09min29s. Conforme a mesma autora, Salazar possua

    resistncia fsica e psicolgica, demonstrada na famosa Maratona de Boston, (1982),

    vencida por Salazar com 2h08min52s, tambm chamada de Duelo sob o Sol, em razo

    da disputa entre Salazar e Dick Beardsley nos ltimos 14 quilmetros da prova.

    Descreve que a asma, a baixa imunidade e o excesso de treinamento, cobraram seu

    preo na forma de diminuio gradual do seu desempenho; mas em 1994, aps 12 anos

    sem vitrias em provas internacionais e aos 35 anos de idade, Salazar foi o primeiro na

    ultramaratona Comrades (100 km), na frica do Sul, trs meses aps a vitria na frica

    do Sul, Salazar torceu o p enquanto treinava e teve uma distenso do tendo tibial

    posterior, por continuar treinando, teve como conseqncia uma ruptura do msculo

    bceps femoral, colocao de pinos nos ossos naviculares (nos ps) e reposio ssea

    no calcanhar.

    Paavo Nurmi, membro dos Finlandeses Voadores, chegou a ganhar nove

    medalhas olmpicas na dcada de 20, tinha por hbito correr com uma mochila cheia de

    pedras e um relgio na mo, e era considerado determinado, inteligente e com fora de

    vontade para conseguir seus objetivos, e de acordo com PRETTO (2009), comeou a

    despontar nas corridas de fundo em 1912, aos 15 anos de idade, nos Jogos Olmpicos

    de Estocolmo, foi declarado atleta profissional; mas pelo fato de receber remunerao

    financeira, o que infringia a regra da Carta Olmpica, foi proibido de participar de

  • 13

    competies internacionais pela Federao Internacional de Atletismo Amador. No

    disputou a maratona nos Jogos Olmpicos de Los Angeles, em 1932. (TUBINO, 2007;

    PRETTO, 2009).

    Um dos fatos mais curioso envolvido no transcorrer de uma prova de maratona se

    nos Jogos Olmpicos de Atenas, em 2004, quando o brasileiro Vanderlei Cordeiro de

    Lima foi interceptado pelo irlands Cornelius Neil Horen (ex-padre irlands, que largou a

    batina em 2005) que o empurrou e o fez sair da rea de competio, faltando

    aproximadamente 6 km para completar o percurso da maratona. O fato que o atleta se

    recuperou, sendo ajudado pelo torcedor grego Polyvios Kossyvas. Vanderlei conquistou

    a medalha de bronze e posteriormente foi homenageado pelo COI com a medalha Baro

    de Coubertin.

    Um nmero considervel de maratonistas brasileiros marcou sua presena na

    histria. Dentre eles, podemos citar, no masculino: Malson Gomes dos Santos,

    Vanderlei Cordeiro de Lima, Frank Caldeira de Almeida, Jos Teles de Sousa, Adriano

    Bastos, Domingos Nonato da Silva, Ronaldo da Costa, Diamantino Silveira Santos e

    Geovanni Santos. No feminino: Marizete de Paula Rezende, Marily dos Santos, Adriana

    Aparecida da Silva, Maria Zeferina Rodrigues Baldaia, Mrcia Narloch, Sirlene Souza de

    Pinho, Janet Mayal e Maria Sandra.

    A maratona pode ser considerada um desafio estabelecido dentro de metas

    concretas e reais acompanhado, porm, de magnetismo e encanto. H diferentes

    significados e simbolismos representados nessa manifestao esportiva. Caracteriza-se

    como uma corrida de rua, considerada de longa distncia, cujo percurso marcado a

    cada quilmetro em painis colocados ao longo da via. Exige do atleta um rigoroso

    treinamento para suportar uma carga prolongada, com a maior resistncia fsica possvel

    (BARBANTI, 1997; LAIGRET, 2000).

    uma prova intensa e de recuperao lenta, que exige esforo e implica em

    excelente condio fsica e psicolgica, por vezes levando os atletas aos limites das

    suas capacidades (ODRIOZOLA, 1994). Os atletas precisam de um perodo de

    recuperao para que haja a regenerao de seu organismo em termos musculares e

    fisiolgicos, necessitando tambm de uma reorganizao psicolgica tudo isso aps

    um ciclo de treino longo, que culmina numa prova muito dura e exigente.

  • 14

    A maratona possibilita altos lucros financeiros, como postula DUTRA (1996),

    tornando-se ento uma prova atrativa para muitos corredores. Impe um treinamento

    especfico ao atleta de alto desempenho, e somente atletas de elite conseguem

    terminar a prova com xito. Essa prova supe uma preparao longa e rigorosa que

    permita aos atletas atingir o objetivo de correr os 42.195 metros.

    DUTRA (2008) escreveu que uma maratona um desafio sem precedentes, por

    conta dos limites fisiolgicos, psicolgicos e das adversidades que podem aparecer

    durante o percurso, e que so tpicas de uma prova dessa natureza. O comportamento

    de antepassados se reproduz nas aes e atitudes do homem moderno, que elege

    certos lugares, fenmenos, objetos e acontecimentos como sagrados (CALLOIS,3 1950,

    apud GARCIA, 1991).

    Por outro lado, GARCIA (1991) menciona que imputado maratona um valor

    sagrado, foi uma inveno do homem, teve como fundamento uma lenda (o soldado que

    correu da plancie de Maratona a Atenas para anunciar a vitria dos atenienses,

    morrendo em seguida), no h referncia a alguma prova da Antiguidade, e tambm no

    existia a maratona nos Jogos Olmpicos da Grcia. A conjuno de diferentes definies

    sobre a histria da maratona, acrescida viso de mito, pode ser explicada da seguinte

    forma, como descreve GARCIA (1991):

    Um relato (CAPRETINNI, DETIENNE, DINOLA, JABOUILLE,

    JESI, RICOEUR) de autor desconhecido (CAPRETINNI,

    JABOUILLE), que conta uma histria supostamente

    verdadeira (ELIADE, JESI, MALINOWSKI) acrescida de

    controvrsias (DI NOLA, GRIMAL, LVI-STRAUSS), mas a

    essncia uma lenda (JABOUILLE), desconhecendo assim a

    sua origem (DI NOLA, ELIADE), construindo um paradigma

    do comportamento humano um ato herico em prol da

    sociedade (ELIADE, MALINOWSKI) ao ser ritualmente

    executado, renova-se o feito glorioso (ELIADE,

    MALINOWSKI) (p.227).

    3 CALLOIS,R. O homem e o sagrado, Lisboa,Edies 70 (ed. port.1988)

  • 15

    A Association of International Marathon and Roads Races, (AIMRR), de acordo

    com TUBINO (2007), organiza o calendrio internacional, promove e registra as

    maratonas, embora os patrocinadores e os governos tenham autonomia para promov-

    las e nem sempre estejam vinculados International Association of Atthletics Federation

    (IAAF).

    5.2 Elementos Psicolgicos constitucionais e adquiridos no campo do Esporte

    A corrida para mim bem estar, prazer.

    Minha corrida comigo mesmo. (Bernardinho)

    A psicologia, cincia voltada para a compreenso do comportamento do ser

    humano, encontra nas aes e nos pensamentos um caminho a ser traado para a

    conduo dos elementos significantes do processo de conhecimento. Essa cincia

    psicolgica pode ser definida como a cincia do comportamento e, segundo SINGER

    (1982), a psicologia do esporte o estudo do comportamento diante de atividades

    esportivas, com os objetivos de entender, explicar e possivelmente prever ocorrncias.

    Estuda os processos psicolgicos e o comportamento do atleta na atividade esportiva,

    conforme descreve CARBALLIDO (2001), com o intuito de conhecer e aperfeioar o

    potencial do atleta no treinamento.

    Ao se iniciar um treinamento para a prova de maratona, preciso considerar a

    importncia da preparao psicolgica. Exige concentrao para suportar o esforo

    durante um determinado tempo. As capacidades de perseverana, adaptao, tolerncia

    e autoconfiana interagem com as caractersticas individuais do atleta. Por isso, deve-se

    considerar a resistncia psicolgica como recurso utilizado pelo atleta para administrar

    o cansao fsico e mental, bem como o desconforto decorrente do esforo fsico.

    SANCHES (1994) revela que a maratona exibe caractersticas particulares e

    distintas, em que o atleta enfrenta momentos diferentes durante o percurso. Devido

    durao e ao esforo a que o organismo submetido, a varivel psicolgica torna-se

    primordial e determinante neste caso. Portanto, estud-la seria uma maneira de melhor

    entender o processo vivenciado pelo atleta antes, durante e aps a realizao da

    maratona.

  • 16

    conveniente destacar a importncia dos fatores psicolgicos que podem

    determinar um desempenho esportivo e, tambm, do reconhecimento, por parte dos

    psiclogos e de profissionais de esporte, do fenmeno esportivo como um aspecto de

    extrema relevncia no comportamento humano. Esse um fato bastante discutido entre

    tcnicos e atletas, que podem legitimamente receber vantagens e recursos diretamente

    envolvidos com o mundo esportivo.

    Na viso de BARBANTI (1997, p.7), todo atleta deveria estar psiquicamente

    preparado para o que vai realizar. Diramos, ento, que pode existir influncia dos

    aspectos psicolgicos no comportamento de atletas do esporte competitivo. E percorrer

    uma distncia equivalente maratona difcil; importante, ento, estar preparado

    fsica e psicologicamente (MATTHIESEN 2007). J, CHAN & LAI (1990) escreveram que

    as caractersticas psicolgicas dos corredores podem ser classificadas como: controlados,

    disciplinados, no-orientados intelectualmente ou esteticamente, e motivados pelo bem

    estar emocional causado pela corrida.

    ORLICK (1986) ressalta que um atleta necessita de preparao psicolgica para

    participar de competies, aumentando assim as chances de alcanar um bom

    desempenho. Por isso, importante estar preparado psiquicamente para cada evento de

    forma especfica, com o objetivo fundamental de assegurar a eficcia tcnica no decorrer

    do treinamento e da competio. Para um atleta que est preparado tcnica, ttica e

    fisicamente, os fatores psicolgicos interferem no desempenho esportivo de forma

    combinada ou isolada, independentemente do grau da preparao, porm mediados por

    caractersticas como: nvel de habilidade, tempo de prtica, experincias anteriores,

    idade e sexo (DE ROSE JR., 1999).

    Atributos psicolgicos tm sido reconhecidos de longa data, e os recursos

    cognitivos podem representar uma habilidade para lidar com as dificuldades

    relacionadas com o esforo fsico e mental. Segundo HONDA (2004), o tpico corredor

    pode correr 60 km por semana, e sozinho.

    BURMAN (2007) verifica que pesquisadores tm investigado diversos aspectos

    da maratona pelo lado psicolgico, tais como: motivao, leso, cognio e objetivos a

    serem alcanados. Aspectos psicolgicos determinam o comportamento de atletas de

  • 17

    alto rendimento, segundo DESCHAMPS & DE ROSE JR. (2000), pois estes esto

    submetidos presso de competir, exibir o melhor desempenho e vencer.

    Os fatores psicolgicos pontuam positivamente os resultados esportivos, de

    maneira geral, relacionados ao aumento do desempenho. Estudos apontam uma

    interdependncia de processos psicolgicos no desempenho e no sucesso do atleta no

    esporte. Do mesmo modo, CRUZ (1997), BRANDO & FIGUEIRA (1996) sugerem a

    expresso direta de fatores psicolgicos no desempenho esportivo.

    NOAKES (1991) e COX (1994) descrevem que os aspectos que envolvem a

    preparao da mente e os fatores associados ao autoconceito positivo (que um

    processo dinmico) determinam o sucesso da corrida. Estabilidade emocional,

    autodisciplina, capacidade mental de resistir ao esforo, baixa tenso e extroverso so

    consideradas caractersticas de personalidade, e esto envolvidas no desempenho.

    Conforme podemos verificar, os componentes da personalidade so pontos-chave na

    superao de obstculos.

    As caractersticas psicolgicas dos atletas de alto rendimento so importantes

    para as vrias modalidades esportivas e, condizendo com as caractersticas fsicas,

    necessitam de maiores conhecimentos (BAUR,19884, apud BOHME, 1994). Diante de

    situaes divergentes e da demanda de obstculos, os aspectos psicolgicos podem

    indicar possveis solues.

    Atletas de elite, conforme PEENSGAARD (1999) possuem uma maior

    persistncia nos objetivos e um esforo maior no empenho das tarefas. Na viso de

    GOULD, DIEFFNBACH e MOFFETT (2002), as caractersticas psicolgicas de um atleta

    esto relacionadas s habilidades de controlar a ansiedade, de ser confiante, de ter

    resistncia mental, de focar evitando distraes, de ser objetivo e de ser possuidor de

    otimismo. Segundo eles, preciso considerar as influncias que no esto envolvidas no

    processo esportivo, mas que acabam por interferir no desenvolvimento psicolgico do

    atleta no contexto em que est inserido.

    Atletas maratonistas utilizam como estratgias cognitivas associativas e

    atencionais durante a competio, para monitorar a corrida, o esforo e a fadiga, com

    4 BAUR, J. Talentsucheund Talentforder ung im Sport ( I ) Listun Gssport, n.2,p. 5-10,1988.

  • 18

    base nas sensaes corporais (RAGLIN, 2007; TAKAI, 1998, MASTERS & LAMBERT,

    1989). Seguindo o mesmo pensamento, BAKER, COTE e DEAKIN (2005) escreveram

    que a compreenso das diferenas psicolgicas entre o sucesso e o fracasso de

    corredores est relacionada orientao cognitiva durante a competio.

    Pesquisas tm evidenciado o otimismo como uma caracterstica psicolgica

    relacionada ao bom humor, perseverana e sade fsica e mental de corredores,

    conforme (MORGAN & COSTILL, 1996 ; PETERSON, 2000 ; BUENO,CAPDEVILA e

    FERNANDEZ, 2002).

    .

    5.2.1 Elementos Psicolgicos Envolvidos com o Comportamento dos

    Maratonistas

    Os estados psicolgicos podem oferecer aos atletas dados referentes

    capacidade de superar desafios, avaliando o desempenho na realizao das tarefas

    propostas em busca de um objetivo.

    5.2.1.1 Ansiedade

    Pensamento, emoo, percepo e estados de humor so estados psicolgicos

    que formam a base psquica da regulao do movimento, e podem ser modificados para

    obter o potencial mximo na competio esportiva (DESCHAMPS, 2002).

    MACHADO (1997; 2006) cita que os processos emocionais podem estar

    relacionados com a ao esportiva a ponto de modificar a ansiedade. O autor acredita

    que a ansiedade uma resposta emocional a um determinado acontecimento, podendo

    ser definida como um sentimento de insegurana por uma expectativa de certo perigo

    iminente, ameaa ou desafio. As manifestaes de ansiedade podem ser de carter

    psicossomtico, fisiolgico ou ambos (MACHADO, 2006).

    SIMES et al. (2009) sinaliza que a ansiedade pode ser considerada como um

    estado afetivo, caracterizado por sentimentos conscientes e inconscientes, vinculados a

    um perigo ou realizao de um desejo, evidenciados por estados de agonia, aflio ou

    impacincia.

  • 19

    CRATTY (1993) comenta que a ansiedade pode causar tenso muscular elevada

    aps uma competio, manifestada em dores e fadiga. Para DE ROSE et al. (2004), ela

    definida como o estado emocional negativo caracterizado por nervosismo,

    preocupao e apreenso, associado com ativao ou agitao do corpo. A ansiedade-

    trao permanente na personalidade. As caractersticas da personalidade da pessoa esto

    associadas ao conceito de ansiedade-trao.

    WEINBERG & GOULD (2001) comentam que a ansiedade seria uma tendncia

    comportamental de perceber como ameaadoras circunstncias que objetivamente no so

    perigosas, e de responder a elas com ansiedade-estado de forma desproporcional.

    A ansiedade-estado transitria, envolvendo reaes temporrias de uma pessoa, e

    podemos citar estudos que mostram a ansiedade aumentando em situaes competitivas

    que exigem resistncia e fora. A ansiedade-estado competitiva pode ser vista como uma

    alterao comportamental que podem ser observadas objetivamente em determinados

    momentos / situaes esportivas competitivas. Est relacionada a sentimentos de

    nervosismo, preocupao e apreenso, associadas a estmulos do corpo.

    definida como um estado emocional rpido, imediato, instantneo e transitrio,

    expresso por respostas do indivduo, que percebe antes, durante e aps a competio

    certas situaes como ameaadoras, estando ou no presente o perigo real (MARTENS,

    1977; DE ROSE & VASCONCELLOS, 1997; WEINBERG & GOULD, 2001). Exemplo disso,

    quando um atleta se encontra diante de determinados estmulos que so ameaadores,

    ele responde com nvel de ansiedade-estado, que pode ser considerada uma caracterstica

    psicolgica estvel (DE ROSE & VASCONCELLOS, 1997).

    A ansiedade cognitiva est relacionada com as alteraes que podem ocorrer em

    momentos distintos, e tambm com as preocupaes e possveis pensamentos

    negativos que possam estar presentes no indivduo. A ansiedade somtica, por sua vez,

    est relacionada com alteraes momentneas na ativao fisiolgica e fsica percebida

    pelo indivduo (WEINBERG & GOULD, 2001).

    GOUDIE, TUNSTALL, DAN, e KERINS (2005) postulam que os estados mentais

    ansiedade-estado somtica, ansiedade-estado cognitiva, estado de autoconfiana e

    coragem podem ficar alterados depois de uma maratona. Portanto, as caractersticas

    psicolgicas particulares devem ser preparadas especificamente para a prova e para os

    diferentes momentos com que o maratonista se depara durante o percurso.

  • 20

    SALMUSK (1998) postula que os objetivos alcanados pelas medidas psicolgicas

    melhoram as capacidades e habilidades individuais do rendimento, otimizando o

    comportamento na competio e acelerando o processo de recuperao psicolgica.

    5.2.1.2 Caracterizao da autoeficcia, competncia na tarefa, estratgias

    cognitivas e motivao de atletas no esporte de competio

    Para descrever a capacidade percebida, a fim de alcanar o nvel certo de

    execuo, tem-se utilizado termos diversos, como autoconfiana, autoeficcia,

    habilidade percebida e competncia percebida. Conforme BANDURA (1977b) expe uma

    forma de realizar com xito determinada tarefa. O autor considera tambm que a ativao

    interfere no comportamento por meio da interpretao cognitiva (expectativas de eficcia), e

    pode influenciar na execuo de um movimento. Diz respeito ao julgamento do atleta sobre

    suas prprias habilidades e o que pode realizar com elas (GEORGE & FELTZ, 1995). Pode-

    se dizer desta forma, que a autoeficcia descreve a competncia percebida a fim de

    alcanar o nvel certo de execuo.

    A teoria da autoeficcia, muito utilizada no campo dos esportes (BANDURA,

    1977), descreve uma relao entre autoeficcia, motivao e execuo. Tem um impacto

    positivo no desempenho, interferindo no processo de deciso e conservando o nvel de

    motivao (BANDURA, 1997; CHEN, GULLY, & EDEN, 2004).

    Um atleta que possui autoeficcia elevada est focado na persistncia em relao

    a uma situao; e, quando se depara com um obstculo imprevisto, verifica a sua

    capacidade diante da dificuldade. CARBALLIDO (2001) cita que a expectativa do xito

    leva o atleta a focar suas habilidades na vitria. Na expectativa da eficcia, o atleta

    busca a eficincia pelos movimentos tcnicos, dedicando ateno execuo.

    YEO & NEAL (2006) descrevem a autoeficcia relacionada a uma tarefa

    especfica. Pode, assim, ser definida como um estado motivacional que facilita a

    persistncia na tarefa (CHEN, GULLY e EDEN, 2004).

    BANDURA (1993) percebeu que a autoeficcia envolve determinao, habilidades e

    estratgias que podem ser utilizadas para lidar com a tenso e com o esforo. No basta a

    persistncia na atividade para um bom desempenho, e sim acreditar na capacidade para

  • 21

    executar a tarefa, relacionada com a confiana subjetiva de querer realiz-la e superar um

    obstculo.

    Sentimentos que no podem ser considerados causas das aes apresentam

    uma manifestao corporal correlacionada. Desta forma, os sentimentos de autoestima e

    autoconfiana de um atleta evidenciam que ele treinou muito para a maratona, e que o

    tempo da prova foi um prmio merecido pelo seu esforo (GUILHARDI, s.d.).

    Os estados psicolgicos podem oferecer aos atletas dados referentes

    capacidade de superar desafios, avaliando o desempenho na realizao das tarefas

    propostas em busca de um objetivo. BALAGUER (1994) cita que, no esporte, a

    autoconfiana um dos fatores psicolgicos mais freqentemente citados por sua

    influncia sobre o desempenho esportivo. A autora menciona que as fontes fisiolgicas

    da autoeficcia no esto limitadas ativao, pois as pessoas tambm recebem

    informao de sua fadiga, forma fsica, dor, fora e resistncia como indicadores da

    ineficcia fsica.

    BANDURA & LOCKE (2003) revelam que a estratgia eficaz tem como pano de

    fundo a autoeficcia elevada, quando direcionada a uma determinada tarefa,

    apresentando maior persistncia ante uma dificuldade.

    SCANLAN & PASSER (1978) ; BRUSTAD (1988) relatam que as expectativas

    prejudicam a competncia, aumentando o stress de um atleta que percebe

    antecipadamente a falta de competncia para determinada tarefa. O medo de falhar e a

    avaliao negativa ameaam a autoestima. Vale dizer que, o motivo para a realizao de

    uma tarefa antecede a competncia, que est relacionada com as capacidades e

    habilidades do atleta e a complexidade da tarefa, sendo necessrio o conhecimento e

    domnio desta. Assim, pode-se dizer que o atleta est motivado internamente para o

    desempenho por meio de tcnicas na busca da excelncia esportiva. WEINBERG &

    GOULD (2000) indicam que atletas de elite possuem alta percepo de competncia.

    SAMULSKI (2002) relaciona rendimento e aprendizado com tarefas fceis e

    difceis. De acordo com SAMULSKI, CHAGAS & NITSCH (1996), ao analisarmos a

    competncia, preciso considerar as condies objetivas e subjetivas, intercaladas com

    questes pessoais, situacionais e de tarefa.

  • 22

    WEINER5 (1972), apud CRATTY (1983), cita que os atributos podem ser

    compreendidos pelo grau de estabilidade, os estveis esto relacionados com a

    habilidade individual, da equipe e do adversrio, enquanto os instveis relacionam-se

    com a sorte e o esforo. Por outro lado, TAKAI (1998) estudando corredores de longa

    distncia observou que eles se utilizavam de estratgias cognitivas relacionadas com

    ateno para monitorar a corrida e a fadiga. Recursos cognitivos podem ser vistos como

    sinnimo de esforo, conforme descreve ACKERMAN (1986), e a habilidade cognitiva

    representam capacidade cognitiva atencional.

    O esforo e a perseverana, na viso de TRCOLI (2004), esto atrelados ao

    sucesso, na medida em que estratgias alternativas so utilizadas como um meio para

    alcan-lo, ao mesmo tempo em que o atleta capaz de utilizar suas habilidades em

    situaes adversas.

    5.2.1.3 Conflitos psicolgicos relacionados com o processo competitivo

    O conflito, de acordo com LAPLANCHE & PONTALIS (1985), constitui o ser

    humano e pode ser considerado como manifesto, quando existe um desejo e uma

    exigncia moral ou mesmo dois sentimentos que se contradizem; ou latente, quando

    este se exprime de maneira deformada no conflito manifesto,traduz-se na formao de

    sintomas, desordem de comportamento e perturbao de carter.

    Os estados psicolgicos relacionados com questes conflituosas apontam para

    situaes de dvidas e insegurana diante da execuo de uma tarefa tcnica esportiva.

    O processo de interao e conflito pode ser constitudo pela generalidade e diversidade

    de atitudes e comportamentos, na ocorrncia de integrao social e funcional (SIMES,

    2005). Nessa tica, observamos o conflito como um ponto onde o objetivo acaba sendo

    percebido como ambivalente.

    BARROS (2005) comenta que o confronto entre o sucesso e o fracasso acarreta

    em conflitos e novos modelos de comunicao entre o indivduo e o meio social em que

    est inserido. Cita esse autor que situaes de conflito interno no ambiente esportivo

    competitivo podem ser verificadas por meio de observaes quanto a diminuio de

    5 WEINER,B. Theories of motivation: From mechanism to cognition.Skokie, III.Rand McNally,1972.

  • 23

    resultados, situaes de conflito em geral, desinteresse pela atividade, falta de

    habilidade e clareza para resolver os conflitos. As crises, conforme FADIMAN &

    FRAGER (1986) so decorrentes de contradies entre o que a pessoa o que deseja

    ser.

    Na tica de EPIPHANIO (2010), numa certa ocasio da vida normal que

    aparea um conflito relacionado ao desejo manifesto pelo esporte. Este conflito pode ser

    anlogo ausncia de objetivos, falta de perspectiva do esporte e de prazer na prtica

    esportiva.

    O conflito origina-se em situaes de frustrao em que existem presses

    antagnicas, dirigidas ao objeto ao mesmo tempo. DELAY & PICHOT (1972) descrevem

    tambm um obstculo de modo ativo interno ou externo ao indivduo, como um

    acontecimento frustrante diante de uma ao comportamental, complementando as

    reaes s frustraes do obstculo como inconsistncia das fronteiras entre a

    frustrao e o conflito.

    5.2.1.4 Caracterizao de crenas religiosas

    CONCEIO (2008) assevera que o esporte pode ser considerado como um

    fenmeno que transcende diferenas religiosas, polticas e tnicas. Este autor postula

    ainda, que blindar o atleta de determinadas situaes corriqueiras do mundo esportivo

    que inclui badalao, desentendimento, drogas e parceiros sexuais rotativos, cultivar

    um mundo irreal, em que as crenas religiosas se mantm e influenciam os atletas e

    suas equipes. Na viso de SIMES (1999), as crenas, a poltica, as instituies e a

    mdia compem o universo sociolgico esportivo.

    Na construo da religio, os mitos so essenciais na Grcia e no mundo

    contemporneo, visto que, no mbito esportivo, aluses a Deus so freqentes

    (CONCEIO, 2008). As crenas religiosas podem ser descritas de acordo com a

    natureza peculiar dos conceitos, idias e representaes de como o ser humano forma,

    percebe, sente e usa a opinio de Deus, em quatro tipos de crenas religiosas, conforme

  • 24

    CONCEIO (2004), (PRATT6,1907,1923; FREITAS7, 2002) apud CONCEIO, (2008),

    a saber:

    Crena emocional: tem como suporte para esse comportamento religioso, o fato

    de estar vivo transposto pela sensao de unio com o divino e acrescido por sensaes

    corporais que interferem na prpria vontade; evidenciada por aspectos

    psicossomticos envolvidos pelas imagens, msicas e sons.

    Crena tico-moral: a conscientizao dos valores abstrados pela humanidade,

    que molda o comportamento; caracterizada por executar as coisas consideradas

    corretas, incutida pelo erro e no envolvida por sentimentos.

    Crena intelectual: caracterizada pelo comportamento religioso voltado pela

    constatao, verificao, comprovao, evidncias e conceitos intelectuais e expresses

    abstratas de Deus, tendo como vis a razo e reflexo, no sendo descrita pela

    representao de imagens, pode ser mediada por elementos que representem

    autoridade.

    Crena primitiva: tem como base a repetio do ambiente religioso e cultural em

    que a pessoa est inserida, reproduzindo sem discutir e questionar os hbitos e

    costumes ditados por pessoas que exercem poder.

    5.3 Processos Somticos e Psquicos

    Pode estar certo de que nenhum pensamento lhe

    vai ocorrer, se ficar sentado. (George A. Sheehan).

    Na perspectiva de funcionamento entre o corpo e a mente, BASTOS (2003)

    comenta que a corporeidade seria um composto articulado entre trs dimenses: o fsico

    (considerado uma estrutura orgnica, biofsica e motora); o emocional-sentimental

    6 PRATT ,J.B. The psychology of religious belief. New York: the Macmillan, 1907.

    ---------------- The religious consciousness : a psychological study. New York: the Macmillan,1923.

    7 FREITAS, M.H. Crenas religiosas e personalidade e estudantes de psicologia: um estudo por meio de

    questionrio Pratt e do mtodo de Rorschach. 2002.275f. Tese (Doutorado) Instituto de Psicologia,

    Universidade de Braslia.

  • 25

    (delineado como instinto, pulso e afeto) e, por ltimo, a mente (considerada a razo,

    pensamento, cognio e conscincia).

    Apesar da psicologia j ter demonstrado cientificamente a interferncia dos

    processos psquicos e somticos no comportamento, nota-se que ainda hoje no meio

    esportivo, no dada a importncia necessria sucesso desses estados e

    correspondncia entre eles. Provavelmente porque muitos ainda acreditam que a relao

    entre corpo e mente no influencia o desempenho esportivo. O fato que a configurao

    corpo-mente interage e contribui na manuteno do desempenho esportivo.

    Estudos realizados por PUNI (1965) revelaram que o desempenho era melhor em

    atletas que apresentavam um contedo emocional positivo, demonstrando assim uma

    relao direta entre pensamentos e parmetros fisiolgicos. Essa correspondncia

    bilateral fundamental para a compreenso dos fenmenos psquicos e somticos, com

    vistas a compreender a influncia no contexto esportivo.

    BERGSON (1942) postula que o crebro centraliza o psiquismo do exato

    momento, e a correlao entre os processos orgnicos e os psicolgicos permanece

    somente quando houver ao. Por mais simples e trivial que um comportamento parea,

    observado em situao natural, jamais deve ser destitudo de uma funo.

    WERTHEIMER (1970) defende que o corpo e a mente so aspectos diferentes,

    mas conectados a um ramo comum. Coincide com o pensamento de NEUMANN 8

    (1964) apud BARBANTI (1989) de que o fsico e o psquico so nicos e inseparveis,

    mas com um funcionamento alternado, dependendo das circunstncias envolvidas.

    HATFIELD & BRODY (1994) demonstraram que a mente interfere no

    desempenho fsico, verificando que os atletas de elite tendem a monitorar os seus

    esforos fsicos, com a ateno voltada tarefa que est sendo executada.

    A psicofisiologia uma abordagem que integra os estudos realizados na fisiologia

    (corpo) e na psicologia (mente), considerando o ser humano como uma unidade

    integrada. Para ROUDIK (1965), os mecanismos psicofisiolgicos destinados a superar

    as dificuldades esto associados subjetivamente pelo atleta, e estes podem ser

    8 NEUMANN, O. Liebeseliche entwicklung in jugendalter. Mnchen: Karl Hoffman, 1964.

  • 26

    treinados para mobilizar esforos que podem incluir uma capacidade de minimizar o

    sofrimento.

    Nesse sentido, como sugerido por SANTIN9 (apud BRITO, 2004), os

    pensamentos, as emoes e os gestos so fsicos e psquicos ao mesmo tempo. A

    questo primordial defendida por esse autor a do homem agindo como um todo; assim,

    o movimento, como um fenmeno fsico, deveria ser compreendido tambm como um

    comportamento, uma postura e uma intencionalidade.

    A mente no pensa; o pensar um processo somtico, de acordo com HANNA

    (1976), determinando assim o desenvolvimento da relao dinmica entre o somtico e o

    psquico. importante ressaltar que o corpo e a mente respondem a um mesmo

    fenmeno, so dois aspectos do mesmo processo, e na maratona esta interao se

    evidencia por completo.

    PENNA (1980) evidenciou a relao entre as quantidades psquicas e as fsicas,

    dizendo serem estes dois aspectos pertencentes a uma mesma realidade.

    A ligao entre corpo e mente, conforme ROBBINS (1987) destaca, demonstra uma

    comunicao interna, relacionada com as imagens e sentimentos, e outra externa, que seria

    a comunicao da pessoa pelas palavras, expresses faciais e postura. Desta maneira, por

    meio do funcionamento do corpo, a natureza e qualidade dos movimentos determinam o

    estado em que estamos decidindo a qualidade do comportamento que apresentamos.

    Parece existir uma interdependncia entre sintomas somticos e psquicos, em

    que a alterao da rea somtica corresponde a modificaes no psquico, e o mesmo

    tambm ocorre no sentido inverso (BARBANTI, 1997). inegvel o reconhecimento da

    complexidade de fatores emocionais e mentais a ponto de serem determinantes no

    desempenho esportivo.

    REICH (1989) descreve a existncia de uma identidade real, uma unidade do

    funcionamento das funes psquica e somtica, com denominador comum.

    VASCONCELLOS (1992) postula o fator psquico como a causa de alteraes

    somticas: existe uma reciprocidade entre o corpo (sistemas vasculares, endcrino e

    nervoso) e a mente (pensamento, emoes, idias).

    9 SANTIN,S. Educao fsica: a abordagem filosfica da corporeidade. Iju. Unijui, 1987.

  • 27

    A mente exerce influncia sobre o corpo pelos pensamentos, atitudes e imagens

    pessoais de si mesmo e do ambiente. O predomnio desses fatores determina direta ou

    indiretamente o desempenho do atleta (DESCHAMPS, 2002). Diante de acontecimentos

    que interferem e inibe o desenvolvimento esportivo, os aspectos psicolgicos podero

    ser os fatores mais importantes e determinantes da maratona. Em momentos cruciais, o

    corpo apresenta sinais de cansao, e a mente, em suas articulaes, supera a

    dificuldade. Em contrapartida, quando os processos psquicos esgotam suas

    possibilidades, o somtico estrutura o seu funcionamento.

    5.4 O processo Competitivo do Maratonista

    S o silncio grande, tudo o mais fraqueza.

    (Alfred de Vigny)

    Ser atleta de alta competio , sem dvida, ter uma capacidade desportiva

    excepcional para a obteno de resultados competitivos superiores, a competio a

    prtica esportiva inserida no mbito do alto rendimento, cujos resultados so aferidos por

    padres internacionais correspondentes s modalidades esportivas, com a carreira

    orientada para o xito esportivo. (FERNANDES, MONTEIRO, ARAJO, 1991).

    A competio um fator que est includo na sociedade, uma realidade na vida

    do atleta para alcanar um objetivo especfico. Na realidade, ela faz parte e finaliza todo

    um processo esportivo, constitudo do treino-aprendizagem e finalizado pela competio.

    Na viso de MACHADO (1994), a competio influencia vrias esferas da sociedade

    moderna. uma forma de motivao e estmulo para superar os limites individuais, e no

    esporte tem como objetivo a vitria.

    DE ROSE (1999) descreve que a competio abrange outras prticas sociais: no

    est restrita somente ao esporte, mas representa comportamentos relacionados a um

    determinado contexto social alcanar a vitria, evitar o fracasso. Exemplos da

    competio inserida no contexto social so citados por KNIJNIK (2001).

    A competio inerente vida esportiva. Embora a comparao de

    desempenhos esteja freqentemente associada ao esporte, estamos diariamente

    competindo com outras pessoas e com ns mesmos, em inmeras situaes da vida. Os

  • 28

    aparatos da psicologia so necessrios para compreender o atleta no ambiente

    competitivo (BARROS, 2005).

    DE ROSE (2002) e DE ROSE & VASCONCELLOS (1997) postulam que o atleta

    avaliado por meio da competio e por caractersticas peculiares de demonstrao de

    habilidades e capacidades, que equivalem competncia na tarefa. A comparao fornece

    instrues sobre sua competncia, por meio de seu comportamento e de seus adversrios,

    e na avaliao ocorrem crticas direcionadas ao atleta e ao seu desempenho, de forma

    qualitativa e quantitativa.

    MARTENS, VEALLEY e BURTON (1990) definem a competio como a situao na

    qual o desempenho de uma pessoa comparado com algum padro j existente, na

    presena de pelo menos outra pessoa que conhea os critrios para a comparao e que

    possa avaliar o processo. Ultrapassar os limites impostos por uma competio, de acordo

    com LIMA (1990), eleva o nvel do desempenho, exigindo do atleta dedicao. Impor

    uma participao de destaque no esporte competitivo, estabelecendo um elo entre as

    variveis psicossociais e de desempenho tcnica, fsica e ttica , pressupe a

    superao de altos nveis de exigncias psicolgicas.

    O processo competitivo um conjunto de aes e situaes que envolvem

    demonstrao pblica, com o objetivo de obter marcas e resultados cada vez melhores,

    sendo estes pessoais e/ou coletivos. Para DE ROSE (1999), a competio um

    processo complexo que motiva comportamentos individuais e sociais, acrescido de um

    componente cultural.

    O esporte competitivo produz em seus praticantes uma grande demanda, no que

    diz respeito aos aspectos fisiolgicos, comportamentais e psicolgicos. Essa demanda

    pode gerar diferentes nveis de cargas emocionais (SAMULSKI & CHAGAS, 1996). Em

    qualquer nvel de competio, os atletas so submetidos a dois tipos de demandas: as

    fsicas e as psicolgicas. O stress ocorre quando estas demandas extrapolam os

    recursos fisiolgicos e psicolgicos dos atletas (SMITH, 1986).

  • 29

    5.4.1 O Desempenho Esportivo do Maratonista

    O desempenho pode ser considerado como uma modificao operada nas

    dimenses cultural, motora e orgnica, conforme postula MALINA10 (1980), apud KISS &

    BHME (1999).

    Vrios so os aspectos que podem influenciar o comportamento e o desempenho

    dos atletas em situao competitiva. Este desempenho resulta da combinao de fatores

    fisiolgicos, biomecnicos e psicolgicos.

    Fatores de ordem fisiolgica, de maneira geral, so aqueles relacionados com os

    aspectos da preparao fsica, os quais permitem suportar as diferentes cargas de

    exigncia fsica dos eventos competitivos. Dentre os fatores fisiolgicos diretamente

    correlacionados ao desempenho de corredores maratonistas, podemos citar: consumo

    mximo de oxignio, economia de corrida, metabolismo e intensidade do exerccio,

    quantidade e qualidade dos nutrientes, umidade, temperatura, vento e treinamento da

    resistncia fsica (SANTOS, 1991; JONES & HARD, 1990).

    Os fatores biomecnicos referem-se execuo dos gestos especficos bsicos de

    cada esporte: so os fundamentos tcnicos considerados aceitveis para o nvel do atleta

    (JONES & HARDY, 1990). Para GALLAHUE (2003), so habilidades motoras

    especializadas que permitem a soluo de problemas especficos de cada modalidade,

    dentro de uma perspectiva desenvolvimentista.

    Na viso de JONES & HARDY (1990), os fatores psicolgicos podem interferir no

    desempenho, independentemente do grau de preparao fsica e tcnica do atleta.

    Apontam para questes pessoais e/ou coletivas que completam a preparao individual,

    com reflexos na equipe. De maneira geral, h diversos aspectos psicolgicos que podem

    ter influncia sobre o desempenho de atletas. Entre eles podem ser citados: motivao,

    ansiedade, stress, ateno, concentrao e agressividade.

    Na busca de um melhor rendimento, necessrio que o atleta desenvolva e/ou

    mantenha atributos psicolgicos como autoconfiana, liderana, adaptao social,

    controle emocional e psicomotor, organizao de objetivos, ateno, estratgia de rotina.

    10 MALINA,R.M. A multidisciplinary approach to physical performance. In: OSTYN, M.; BEUNEN,G.;

    SIMONS,J. eds. Kinanthropometry II. Baltimore, University Park Press, 1980. p.33-68.

  • 30

    HUME, HOPKINS, ROBINSON & HOLLINGS (1993) consideram que o

    rendimento esportivo pode sofrer influncias de fatores psicolgicos, cognitivos e sociais

    (que seriam subjetivos), e de fatores mais objetivos, tais como os morfolgicos e

    motores. Por outro lado, BHME (2002) descreve que a capacidade de desempenho

    esportivo pode ser observada, medida e avaliada por meio da realizao das tarefas e

    atividades esportivas. A forma, e o grau de expresso da capacidade de desempenho

    dependem do desenvolvimento de caractersticas psicolgicas, cognitivas,

    neuromusculares, energticas e constitucionais. Aspectos emocionais e psicolgicos

    podem levar um atleta ao controle da situao, no trabalho especfico que est sendo

    realizado, ou a uma perda sensvel do rendimento, devido a certas caractersticas

    internas predispostas.

    A motivao para o rendimento seria o desejo de melhorar, cumprindo uma tarefa

    exigente e, ao mesmo tempo, adquirindo excelncia esportiva (WEINBERG & GOLD,

    2001).

    5.4.1.1 Barreira dos 30 km na Maratona

    A marca dos 30 km considerada uma fronteira, e utilizada como referncia ao

    momento em que o corpo encontra-se muito prximo de seu limite fisiolgico e

    psicolgico. O rendimento sofre declnio, os movimentos corporais ficam difceis e o

    maratonista se depara com a fadiga fsica e psicolgica, como descreve (DUTRA, 2008).

    Esse ponto mximo acaba por suscitar no corredor uma espcie de barreira, um

    obstculo cuja superao depende dele; a partir dos 30 km, o atleta principia a mostrar

    sintomas de esgotamento, sinais fsicos que o corpo emite para alertar que est fatigado,

    tais como: dores de cabea, mal-estar, nuseas, cibras, presso baixa e sudorese

    excessiva; alm de fatores psicolgicos como irritabilidade, desnimo e falta de

    confiana, que podem fazer o atleta desistir de terminar a prova, o autor ainda comenta

    da necessidade de um treinamento fsico e mental, visando enfrentar a to falada

    barreira dos 30 km e, para tanto, faria uso de estratgias cognitivas.

  • 31

    Na opinio de NOAKES (1991), o atleta que utiliza estratgia durante a corrida,

    respeitando o ritmo treinado e economizando energia, no se assusta com a barreira dos

    30 km. O autor tambm comenta que para um ultramaratonista a barreira comea no

    quilmetro 56. BECKER11 (2002) apud DUTRA (2008) comenta que estratgias

    cognitivas, associativas e dissociativas podem ser utilizadas pelos atletas em momentos

    difceis de dor e fadiga (por exemplo, comentando que muito resistente) para superar a

    barreira psicolgica.

    5. 5 Resistncia

    Correr me ensinou valores como disciplina e

    respeito. O atletismo foi a nica oportunidade que

    tive e me sinto um atleta realizado. (Vanderlei

    Cordeiro de Lima)

    No contexto desportivo, o desenvolvimento da resistncia implica adiar a instalao

    da fadiga e/ou a diminuio das suas consequncias durante a execuo de um

    determinado exerccio fsico. Promove, ainda, a maximizao dos processos de

    recuperao aps o esforo. Exemplo disso Emil Zatopek que recebeu o estigma de

    locomotiva humana, devido a sua competncia competitiva. Nos Jogos Olmpicos de

    Helsinque (1952), alcanou a faanha at hoje inigualada de conquistar o ouro olmpico

    vencendo os 5.000 e os 10.000 metros. Na maratona, conquistou um novo recorde olmpico

    com 2h23min04s (DUTRA, 1996). As teorias sobre a resistncia so teorias explanatrias, tendo obtido

    reconhecimento porque tenta compreender e definir a natureza do desenvolvimento

    humano (COHU, 2006). Esse conceito originou-se na psicologia social, sendo utilizado

    tambm na medicina e na educao.

    Com base em estudos evolucionistas, LIEBERMAN & BRAMBLE (2007)

    argumentam que o homem est adaptado para corridas de longa distncia, sustentando

    11 BECKER,B. Manual de Treinamento Psicolgico para o Esporte. 2. ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2002.

    v. 1. 173 p.

  • 32

    uma corrida por horas, e que essa capacidade pode ter definido caractersticas teis

    para a sua sobrevivncia. A partir dessa exposio, pode-se assinalar a resistncia

    como uma capacidade, constituindo parte do processo evolutivo.

    BARBANTI (1996) e BOMPA (1999) escrevem que a resistncia a capacidade

    do organismo de resistir fadiga diante de uma atividade motora prolongada,

    conservando a carga de trabalho durante o tempo necessrio, em tarefas extenuantes.

    Assim, num primeiro momento, pode-se dizer que a resistncia seria definida como a

    capacidade de sustentar um esforo por um perodo de tempo prolongado, resistindo ao

    cansao (MOREHOUSE12 1967; JONATH, 1970;13 LANGLADE apud BARBANTI, 1997).

    Na prova da maratona, classicamente considerada como a prova de resistncia por

    excelncia, o objetivo manter, durante toda a prova, de natureza ininterrupta, a intensidade

    de carga o mais elevada possvel. No momento em que o atleta entra na zona de fadiga

    corporal, a tendncia seria desistir. No entanto, com um preparo psicolgico adequado

    em que se enfatize a questo da resistncia, verifica-se que o atleta tem condies de se

    aproximar do extremo da fadiga (VALDEZ, s.d.).

    Pode-se dizer que a queda da capacidade de realizar esforo fsico considerada

    um estado de fadiga. ZINTL (1991) e LEIBAR & VERDUGO (1997) constatam que a

    conseqncia seria o esgotamento fsico e mental. Embora reversvel esse esgotamento

    afeta o equilbrio psquico, diminuindo a motivao para executar o exerccio.

    Em uma primeira anlise, na viso de BARBANTI (1997), a resistncia relaciona-se

    fundamentalmente com a fadiga e a capacidade de recuperao dos praticantes,

    influenciando o desempenho nas vertentes: energtica, coordenativa, biomecnica e

    psicolgica. A resistncia uma qualidade que faz um atleta superar obstculos, adaptar-se

    e recuperar-se. Essa qualidade mantm o esforo rduo e permite suportar a fadiga

    Em concordncia com o que foi dito at o momento, a resistncia no um

    atributo exclusivo de atletas que realizam atividades de longa durao; o modo

    otimizado de lidar com a fadiga, necessrio e indispensvel em todas as modalidades

    12 MOREHOUSE,C. Development and maitennance of isometric streng of subjects with diverse initial

    strength.Research Quarterly, 38, 1967.

    13JONATHU, U. Circuit training, Berlim, 1970.

  • 33

    esportivas. A durao necessria para que um exerccio possa ser considerado como de

    resistncia surge com uma amplitude de variao muito elevada, segundo BOMPA

    (1999). E o conceito de resistncia aplica-se a perodos de tempo extremamente

    diversos, de muito breves a muito longos.

    A resistncia seria um processo onde o indivduo consegue superar as

    adversidades, adaptando-se ao contexto. Parece estar relacionada a fatores de risco e

    proteo; desta forma, a resistncia pode ser entendida como uma estratgia com

    resultados positivos e at transformadores (TABOADA, 2006). Assim considerando,

    treinar a resistncia no apenas promover a aquisio das adaptaes orgnicas que

    se consideram necessrias para o desempenho do atleta, como tambm assegurarmo-

    nos de que este ser capaz de integrar essas aptides ao seu desempenho competitivo.

    5.5.1 Resistncia Psicolgica no Esporte

    H uma fora dentro de cada um que o impele a

    reagir, retomando as suas foras, demonstrando

    que preciso continuar. (Matthiesen)

    O conceito de resistncia psicolgica surge na literatura cientifica na dcada de

    setenta, com significado de proteo frente a situaes de stress, associado com

    caractersticas especficas, designando uma pessoa resistente, com vigor, que supera as

    dificuldades na viso de KOBASA (1979), tambm podem controlar, influenciar e estar

    profundamente envolvidas e comprometidas com as suas experincias, em um desafio.

    Uma questo apontada por SALMELA (1990) est relacionada com as condies

    culturais e socioeconmicas. Isso pode explicar, segundo ONESTI (1993), as diferenas

    das respostas individuais diante de eventos desfavorveis e adversos, demonstrando um

    fator bsico que seria ambiental e constitucional, variando em funo do tempo e da

    situao. A resistncia psicolgica, portanto, pode ser considerada uma qualidade

    inconstante.

    OGILVIE & TUTKO (1971) afirmam que os esportistas possuem resistncia

    psicolgica elevada, autodomnio e controle emocional, entre outras caractersticas, para

    tolerar situaes difceis. Segundo TYSZKOWA (1978), a resistncia psicolgica pode

  • 34

    ser considerada uma estrutura de relacionamento entre a pessoa e o ambiente em que

    est inserida, com meno aos valores, objetivos, competncias e traos psicolgicos,

    influenciando o processo de recepo de informao, reconhecimento e avaliao de

    dificuldades. Ter resistncia psicolgica equivale capacidade de menosprezar a

    dificuldade.

    A natureza das dificuldades pode ser oriunda de diversas fontes. Existe uma

    peculiaridade da modalidade referente s dificuldades e o controle da situao. Essas

    questes podem ser resolvidas, tendo como passo principal identificar e reconhecer a

    fonte da dificuldade. Isso acontece durante o treinamento. As dificuldades podem estar

    relacionadas com o material, vestimenta e equipamentos que sero utilizados pelo atleta

    durante a competio esportiva (JAROV, 1982). Outra dificuldade pode ser oriunda de m

    preparao fsica, dor ou de leses que aparecem durante a prova. Superar essa

    indisposio tem a ver com a intensidade da dor e a importncia da competio. Alm

    dessas dificuldades existem outras que se relacionam com o local em que acontece a prova.

    As dificuldades so superadas atravs de autodomnio, pacincia e sentimento de

    responsabilidade, coragem e perseverana.

    As pesquisas das ltimas dcadas tm mostrado que as emoes positivas e a

    cognio so importantes para compreender o funcionamento psicolgico e as respostas

    frente s adversidades, como a noo de resistncia na construo da perseverana

    (VAZQUEZ, 2003). No h dvidas de que qualquer exerccio promove condies fsicas

    para a execuo motora e neuromuscular, e tambm envolve caractersticas de

    personalidade, como a emoo e cognio do atleta.

    O conceito de resistncia psicolgica pode ser representado, na viso de SALMELA

    (1990), em vrias dimenses, tais como: decidir competir em determinadas condies

    (escolha da tarefa), persistncia, determinao (intensidade da realizao da tarefa, fazer o

    melhor possvel), alcanar o mximo de preciso na execuo tcnica (ajustamento do

    comportamento s necessidades). Segundo o autor, esses comportamentos seriam

    representativos da resistncia psicolgica do atleta, no mbito esportivo.

  • 35

    A figura 2 mostra um esquema com elementos que caracterizam e representam,

    segundo SALMELA (1990), a essncia da resistncia psicolgica.

    Figura 2: Estrutura de funcionamento da resistncia psicolgica, segundo

    SALMELA (1990).

    O cansao seria a diminuio da resistncia. De acordo com WEINECK (1991), seria

    a capacidade psicofsica do atleta de resistir fadiga, inerente natureza humana, em que

    os sistemas cardiorrespiratrio, orgnico, metablico e nervoso, bem como os elementos

    psquicos, definem a resistncia fsica, psquica e sensorial. Para FREY (1977)14 apud

    WEINECK (1991), a capacidade do atleta de resistir perante a um estmulo pelo maior

    tempo possvel considerada resistncia psquica.

    A resistncia psicolgica diz respeito persistncia do envolvimento e da

    motivao do atleta, voltado para um objetivo, durante um determinado perodo de

    tempo. A adaptao s necessidades pode tambm ser caracterizada pela forma de

    resistir frustrao e de ser perseverante nos comportamentos de escolha de tarefa

    (SALMELA, 1990).

    14 FREY,G Zur Terminologie und Struktur physischer Leistungsfaktoren und motorischer Fhigkeiten.

    Leistungssport. V.5,p.339-362,1977.

  • 36

    A resistncia psicolgica permite ao atleta sustentar um determinado estado,

    alcanado pelo esforo intenso e, muitas vezes, prolongado. A superao uma

    caracterstica inerente ao esporte, conforme RUBIO & SILVA (2003), e diz respeito

    histria de vida de atletas olmpicos, tidos como exemplos na soluo de problemas e

    rompimento de barreiras. Aliam-se superao os fatores tcnicos, fsicos e

    psicolgicos que, quando bem trabalhados, ampliam os limites na busca da vitria.

    O pensamento positivo, a autoconfiana e a motivao se fazem constantes no

    desafio da superao, em relao ao esforo realizado. Alguns estudos indicam uma

    relao da resistncia psicolgica com o desempenho esportivo, em situaes que visam

    o bem estar psicolgico e situaes de adversidade.

    Um destes estudos, realizado por BANKS (2004), tinha como objetivo identificar a

    resistncia que ele classificava como de reforo fator significativo para definir a

    efetividade do desempenho. Alguns indivduos possuam habilidade e motivao, mas

    falhavam no desempenho esportivo. POLISENSKY & KARGER (1987) investigaram a

    resistncia psicolgica de jogadoras de basquetebol feminino, em situaes de

    adversidade, tendo a preparao psicolgica como varivel do processo de treinamento.

    J, SCHINKE & JEROME (2002) desenvolveram um protocolo para o treinamento

    da resistncia em circunstncias competitivas adversas, indicando que o desempenho

    pode ser melhorado atravs do desenvolvimento das habilidades cognitivas.

    5.5.1.2 Resistncia Psicolgica na maratona

    Eu estava convencido, a cada dia, de que havia

    atingido os limites da resistncia humana. Depois,

    gradativamente, alguma coisa aconteceu." (David T.

    Burhans)

    Na maratona, os atletas apresentam caractersticas evidentes de desgaste fsico e

    psquico, com peculiaridades que merecem ser analisadas e interpretadas, dimensionando

    e adequando o nvel de expectativa quanto ao desenvolvimento do percurso.

    SAMULSKI (2006) salienta que os atletas apresentam com frequncia problemas de

    adaptao, presso psicolgica por parte da mdia e problemas de contedo emocional; as

  • 37

    consequncias desses fatores so: ansiedade pr-competitiva, estresse psicossomtico e

    insnia.

    Os motivos para correr a maratona derivam da experincia durante o percurso,

    segundo SUMMERS, MACHIN e SARGENT (1983) e incluem sentimentos de realizao

    e aptido fsica. Alm dessa questo, de acordo com MAGLISCHO (2003) e

    OLBRECHET (2000), observa-se uma adaptao psicolgica de intensidade

    correspondente.

    Desta forma, possuir resistncia psicolgica e fsica para provas de longa durao

    exige determinao para superar obstculos de ordem psicolgica e fisiolgica, que

    podem aparecer durante o percurso, interferindo no resultado da prova. A construo

    individualizada da resistncia psicolgica permite compreender o significado dessa

    dimenso.

    Em provas de longa distncia, manter um ritmo alto durante a competio inteira

    exige um grande esforo fsico e psquico. Essa somente uma parte de um

    desgastante processo de superao somtica e psquica; e, segundo CHRISTIANSEN &

    BAUM (1991), a superao pode ser definida como um processo de ajustamento s

    exigncias do ambiente.

    Maratonistas filipinos demonstravam possuir tendncias competitivas, vencer e

    firmar metas, segundo MARTIN & GILL (1995), e estavam focados intrinsecamente para

    a autosuperao. A resistncia psicolgica pode ser considerada um estado

    representativo da qualidade da relao entre corpo e mente em que os movimentos

    corporais induzem aos sentimentos, pensamentos e percepes. Permite dar maior

    ateno s mudanas internas que ocorrem durante o percurso da corrida, formando um

    composto que influencia o comportamento dos atletas maratonistas.

    Estudos realizados por RYAN & KOVACIC (1966) demonstraram uma relao

    entre a capacidade de tolerar o sofrimento e o tipo de atividade esportiva escolhida. Os

    resultados indicam que as diferenas entre grupos de atividade so de natureza

    psicolgica, e que provavelmente o resultado seja de influncia cultural ou ambiental,

    reduzindo as interpretaes subjetivas de sofrimento, de tal forma que parea menos

    profundo.

  • 38

    Esse estudo buscou compreender os motivos para perseverana durante a

    exausto, com base em elementos fsicos, emocionais e mentais interativos de cansao

    durante a maratona. A partir do relato de motivos e experincias dos atletas, a hiptese

    principal sustenta que a maratona pode ser conceituada enquanto uma arena, que

    permite ao ser humano lutar com diferentes nveis de mudana de necessidades fsicas,

    psicolgicas e interpessoais.

    Em resumo, este esforo fornece uma contribuio significativa ao campo da

    psicologia do esporte, fornecendo percepes de qualidades relativas s variaes de

    experincias, motivos e significados como funo da experincia de maratona

    (MANUEL, 2001). Deve-se realar a importncia dos fatores psicolgicos na eficcia do

    processo de treino, bem como a preparao mental que permita suportar a fadiga e o

    desconforto prprios da execuo de exerccios prolongados com intensidade elevada.

    BAKOULIS (1987) afirma que a preparao mental para corredores de longa

    distncia to importante e necessria quanto o treinamento fsico, e observa que

    corredores de elite apresentam determinao e pacincia. um desafio para transpor

    obstculos que parecem insuperveis. Atributos psicolgicos de maratonistas tm sido

    reconhecidos de longa data, com nfase para os atletas maratonistas de elite que se

    utiliza de estratgias cognitivas associativas durante a competio com base nas

    sensaes corporais, incluindo o esforo (RAGLIN, 2007).

    ZINTL (1991) estabelece uma forma de treinar a resistncia no ambiente

    esportivo, mantendo a intensidade durante o mximo de tempo possvel e evitando que a

    intensidade decline principalmente nas atividades fsicas e durante o transcurso da

    maratona. Logo, existe uma multidisciplinaridade de fatores (biolgicos, fisiolgicos,

    psicolgicos, sociais, culturais) envolvidos com o comportamento e o desempenho de

    atletas. Fica evidente na literatura que os conceitos estabelecidos realam a

    caracterizao de comportamentos com tendncias competitivas que envolvem o

    desempenho. Isto nos levou aos seguintes questionamentos:

    As diferentes opinies emitidas pelos atletas quanto resistncia psicolgica

    alinham-se com os fatores sociais, psicolgicos e ambientais?

  • 39

    Esses questionamentos podem ser investigados, avaliados e caracterizados com os

    fatores disposicionais e situacionais, vinculados ao comportamento e desempenho dos

    atletas maratonistas?

    Essas indagaes nos conduzem formatao de uma hiptese sobre as

    relaes fatoriais envolvidas pelo estudo, a saber:

    6. Hipteses Descritivas

    6.1.1 Central

    O ambiente das provas de maratonas constitui-se como um modelo das

    manifestaes sociopsicolgicas, psicofisiolgicas e intrapessoais, que se estruturam e se

    desenvolvem pelas oscilaes do desempenho verificadas entre os atletas e as formas de

    comportamento associadas resistncia psicolgica.

  • 40

    6.2 Complementar

    Os comportamentos e desempenhos encontrados pelos atletas maratonistas no

    transcorrer das provas, mediante entrevistas semiestruturadas, revelam que a resistncia

    psicolgica poderia exercer influncia nos seus desempenhos.

    7. MATERIAL E MTODO

    O mtodo utilizado no presente estudo se caracteriza por um delineamento do

    tipo de pesquisa descritivo-exploratria que, de acordo com GIL (1996), necessita de

    uma reviso bibliogrfica detalhada, visando clarear e descrever as opinies emitidas por

    atletas maratonistas do sexo masculino e feminino, bem como um conjunto de fatores

    psicossociais envolvidos com a resistncia psicolgica frente s barreiras do

    desempenho competitivo.

    O procedimento metodolgico qualitativo uma abordagem cuja investigao se

    concentra nas informaes obtidas durante o processo, compreendendo-o de maneira

    contextualizada (NEGRINE, 2004). O contexto importante na pesquisa qualitativa, uma

    vez que embasa o trabalho. A abordagem exploratria, na viso de KOCHE (1997)

    desenvolvida a partir de teorias publicadas em livros e peridicos. O pesquisador

    pressupe um vnculo entre o objeto de estudo e a sua percepo.

    Esta metodologia garante um determinado rol de informaes importantes para o

    estudo, dando maior flexibilidade s entrevistas (estruturadas e semiestruturadas),

    proporcionando mais liberdade para o entrevistado relatar os aspectos que, segundo sua

    tica, seja relevante em se tratando de determinada temtica.

    Os resultados encontrados no presente estudo tm como finalidade a dissertao

    de mestrado, juntamente com trabalhos que podem ser apresentados em eventos

    cientficos. Os resultados sero utilizados de forma integral, respeitando a

    individualidade e resguardando a privacidade dos atletas que participaram das

    entrevistas. Aps o trmino da pesquisa, os atletas devero receber uma cpia do

    trabalho, junto com os resultados, tanto individuais quanto do grupo, que contriburam

    com o estudo.

  • 41

    7.1 Casustica

    Fizeram parte do presente estudo sete atletas brasileiros, com idade cronolgica

    entre 37 e 52 anos, sendo trs do sexo feminino e quatro do sexo masculino, provenientes

    de diferentes camadas sociais, praticantes de provas de maratonas. Quando observamos

    a tabela 1, verificamos por sexo, a quantidade de atletas selecionados em funo do

    nvel de escolaridade.

    Tabela 1: Nmero de atletas em funo do sexo e do nvel de escolaridade.

    A tabela 2 apresenta a descrio da idade dos atletas que fizeram parte da

    amostra em funo do sexo e a idade do incio da prtica da maratona e proporciona

    uma viso geral do universo da amostra.

    Tabela 2:Nmero de atletas em funo da idade sexo e idade no incio da

    prtica da maratona.

    Idade no incio da prtica Idade Masc. Fem.

    da maratona

    24 anos 52 1 -

    27 anos 42 1 -

    26 anos 52 1 -

    32 anos 37 1 -

    36 anos 42