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1 INTRODUÇÃO
O dengue é uma doença reermegente e constitui hoje a mais importante
doença viral humana transmitida por mosquito (Schatzmayr, 2000, 2001; Gubler,
1997, 1998). O dengue é uma arbovirose causada por um vírus de genoma RNA
pertencente ao gênero Flavivirus, família Flaviviridae, que apresenta quatro sorotipos
(1, 2, 3, 4). A doença é transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti,
que é o seu vetor urbano e que possui hábitos domésticos (Ibanez-Bernal et al.,
1997).
No País, o Ministério da Saúde registrou no primeiro semestre de 2006, 198,9
mil casos de dengue, 10,89% a mais do que no ano anterior, quando 179,3 mil
pessoas tiveram a doença.Entre janeiro e junho de 2006, as secretarias estaduais e
municipais de Saúde notificaram 278 casos de febre hemorrágica do dengue (FHD),
com 23 óbitos e letalidade de 8,27%. Para 2005, foram notificados 463 casos, com 45
óbitos e letalidade de 9,72% (MS, 2006).
Em 2001-2002 o estado do Rio de Janeiro viveu a maior epidemia registrada
atualmente, coincidindo com o isolamento do sorotipo 3. No Estado foram notificados
368.460 casos, dos quais, 177.919 eram do município (SES/RJ, 2005; Nogueira et al.
1999, Miagostovich et al. 2002 e Nogueira et al. 2001).
Para o ano de 2005, dados consolidados pela Secretaria de Estado de Saúde
do Rio de Janeiro mostram o registro de 2.969 casos de dengue, sendo 1.157 destes
no município. Em 2006 foram notificados no estado 30.413 e confirmados 5.992 e, no
município foram notificados 15.079 e confirmados 2.321 (SES/RJ, 2007).
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Texeira et al. (2005) analisaram os casos registrados no Brasil e observaram
que após a cada introdução e circulação dos sorotipos do vírus ocorre uma epidemia,
porém, os períodos de baixa incidência indicam um provável declínio da população de
susceptível mais do que a efetividade das medidas de controle implementadas.
Observaram também que em anos recentes ocorreu a expansão das áreas afetadas
e o aumento de casos de dengue hemorrágico com alta letalidade.
Do ponto de vista epidemiológico, o espaço é uma categoria de análise
importante na compreensão da dinâmica de doenças infecciosas, como é o caso do
dengue. A grande ocupação desigual do espaço, característica básica do município
do Rio de Janeiro, forma paisagens que podem promover estratos diferenciados de
transmissão de dengue, principalmente no que se refere à permanência de habitats
favoráveis ao vetor (Costa & Natal., 1998).
O uso combinado das ferramentas de SIG e de técnicas de análise estatística
espacial potencializa o processo de análise da distribuição dos agravos no espaço
geográfico, assumindo importância fundamental na área da saúde. A incorporação
desta ferramenta a estudos epidemiológicos contribui para análise de informações
sobre a incidência de determinados agravos à saúde e condições sócio-econômicas
das populações que ocupem diferentes territórios de uma cidade (Medronho, 1995;
Barcellos, 1996; Carvalho et al., 2000).
Estudos da distribuição geográfica de doenças têm grande importância no
planejamento e na tomada de decisões em vigilância epidemiológica. A distribuição
espacial e temporal dos casos de dengue pode ser influenciada por uma série de
fatores geográficos, biológicos, ambientais e antrópicos (Passos et al., 2004; Pontes
& Ruffino-Netto, 1994; Souza-Santos & Carvalho, 2000; Barcellos et al., 2005).
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O mapeamento de doenças vem sendo instrumento básico no campo da saúde
pública e, em anos recentes, grandes avanços nas técnicas de análise têm sido
desenvolvidos com a intenção de gerar mapas para identificar áreas de maior risco,
nas quais a atenção deve ser diferenciada (Lawson et al., 1999; Rojas et al., 1999).
No presente trabalho, analisou-se a distribuição espacial da epidemia de
dengue ocorrida município do Rio de Janeiro em 2001-2002 e as relações com as
variáveis sócio-ambientais mediante a utilização de técnicas de análise de dados
espaciais.
Este trabalho está organizado na forma de artigo, cujo título é “Análise
espacial da epidemia de dengue e o contexto sócio-ambiental no município do
Rio de Janeiro em 2001-2002”.
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2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 O Dengue
O dengue é uma doença reermegente e constitui hoje a mais importante
doença viral humana transmitida por mosquito (Schatzmayr, 2000, 2001; Gubler,
1997, 1998). O dengue é uma arbovirose causada por um vírus de genoma RNA
pertencente ao gênero Flavivirus, família Flaviviridae, que apresenta quatro sorotipos
(1, 2, 3, 4). A doença é transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti,
que é o seu vetor urbano e que possui hábitos domésticos (Ibanez-Bernal et al.,
1997).
Clinicamente é classificado em duas formas principais: a febre dengue (FD) ou
como freqüentemente é chamado dengue clássico, e a febre hemorrágica do dengue
(FHD) também denominado dengue hemorrágico, às vezes com síndrome de choque
por dengue (FHD/SDC). Embora as formas mais graves do dengue, aquelas
registradas como dengue hemorrágico, por exemplo, constituírem uma proporção
relativamente baixa do total de casos, em números absolutos pode-se dizer que tem
um importante significado pelo potencial de letalidade e também pelos cuidados que
requerem (Marzochi, 1991; Martinez, 1995).
A Organização Mundial da Saúde estima que mais de 3 bilhões de pessoas
habitem áreas sob o risco da doença. Anualmente, entre 50 a 100 milhões de
pessoas se infectam em mais de 100 Países com cerca de 550 mil doentes
necessitando de hospitalização e 20 mil evoluindo ao óbito. A incidência global do
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dengue vem sofrendo um crescimento dramático em recentes décadas. Contudo o
dengue hemorrágico, uma complicação potencialmente letal, atinge patamares
mundialmente desastrosos em nível de saúde pública (World Health Organization,
2006).
Após ser picada por um vetor infectado, a pessoa suscetível permanece até
seis dias sem demonstrar o vírus no sangue. Coincidindo com o início dos sintomas,
inicia-se a fase virêmica (cerca de quatro a cinco dias). Neste período, caso a pessoa
seja picada por uma fêmea do vetor, este passa a ser um transmissor do vírus por
toda sua vida, que dura cerca de 80 dias, após um período de incubação no vetor de
2 a 15 dias, geralmente 8 a 11 dias (México. Secretaría de Salud, 1993). Uma
pequena percentagem de fêmeas de A. aegypti infectada pelo vírus, pode mantê-lo
no ambiente através da transmissão transovariana vertical (Torres, 2005).
2.2 O Aedes aegypti
O ciclo de vida do Aedes aegypti, principal vetor da doença, compreende
quatro fases: ovo, larva, pupa e adulto. Os ovos são depositados nas paredes
internas dos depósitos que servirão de criadouros, próximos à superfície da água. A
fase larvária possui quatro estágios evolutivos e sua duração está na dependência da
temperatura, disponibilidade de alimento e densidade das larvas no criadouro (Nobre
et al., 1998).
O A. aegypti encontrou condições muito favoráveis a sua dispersão, como o
acelerado crescimento e urbanização populacional, associada à insuficiência no
controle do vetor e na mobilidade de trânsito de pessoas entre as regiões. A
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ocorrência da doença é mais comum nos núcleos urbanos, onde há uma maior
concentração de domicílios que apresentam um potencial de criadouros resultantes
da ação humana. Contudo, o dengue pode ocorrer em qualquer localidade, desde
que haja uma população susceptível, presença do vetor e a introdução do vírus
(FUNASA, 2002).
O A. aegypti é originário do continente africano (Chiaravalloti-Neto, 1997;
Chieffe, 1985). Ele foi erradicado do Brasil em 1958, reapareceu em 1967, em São
Luís e Belém, sendo então eliminado (Gesler, 1986). Em 1976, é novamente
reintroduzido no Brasil, com a descoberta de um foco em Salvador. Em 1977, foi
encontrado em Santos; em 1979, em Natal, e em 1981, no Paraná. Em 1976
registrou-se a presença desta espécie na cidade do Rio de Janeiro, após um período
de 31 anos sem ocorrência verificável (Marques, 1985). Em 1985-1986, o A. aegypti
já era encontrado praticamente em todos os estados brasileiros (Neves, 1995).
A distribuição de A. aegypti nas regiões tropicais segue os padrões espaço-
temporais das chuvas, quando estas aumentam, o número de habitats cresce,
determinando o aumento da densidade vetorial. A densidade de vetores, as
condições climáticas e a freqüência com que as fêmeas produzem o repasto
contribuem para a rápida disseminação do vírus.
2.3 Aspectos epidemiológicos da doença
A epidemia do dengue é função de uma complexa dinâmica da população de
A. aegypti, que envolve múltiplas variáveis, tais como: presença de vetores ativos,
hospedeiros virêmicos, variação climática, criadouros, macro focos entre outros
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(Silveira, 1998). A manutenção do processo endêmico-epidêmico da doença é função
da dificuldade no controle do vetor, e essa questão se amplifica no ambiente urbano,
pois as existências de diversos criadouros do mosquito e dos macros focos garantem
a endemicidade da doença.
Donalísio & Glasser (2002) apontam questões relevantes para transmissão do
dengue tais como a influência das condições climáticas (temperatura, pluviosidade,
altitude) no ciclo vital dos vetores, além da capacidade de adaptação das espécies a
diferentes contextos ecológicos e sociais, de suma importância para vigilância
entomológica e para o controle de vetores do dengue. Glasser & Gomes (2002)
verificaram que quanto menor a temperatura, mais lento foi o processo de expansão
geográfica do A. aegypti, sendo assim uma influência preponderante na determinação
dos diversos padrões macroregionais de expansão geográfica da espécie no Estado
de São Paulo.
As condições climáticas, de acordo com Forattini (2002), através de
temperaturas e precipitações pluviométricas elevadas mostram em geral uma relação
positiva com a transmissão do dengue.
Ribeiro et al. (2006) destacam que a associação entre o número de casos de
dengue e fatores climáticos e identificam o intervalo de tempo em que chuva e
temperatura contribuíram de maneira positiva na geração de casos novos.
Alguns estudos vêm dando ênfase aos fatores envolvidos na ocorrência de
casos do dengue e das formas mais graves como: o dengue hemorrágico e a
síndrome do choque, além de relacioná-las com a introdução e a circulação do vírus,
traçando um quadro de referência a respeito do comportamento epidemiológico do
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dengue através do tempo e em diferentes áreas geográficas (Pontes & Ruffino-Netto,
1994; Silveira, 1998; Texeira et al., 2001).
A transmissão do dengue pode ocorrer em localidades que possuem de 10 a
20 fêmeas do mosquito por residência com cerca de 5 a 10% destes infectados
(Morrison, 1997). Estando o risco de epidemia relacionado ao período de chuvas e ao
aumento da temperatura ambiente, devido ao aumento da velocidade de evolução
das formas imaturas para a alada, redução do período extrínseco de incubação do
vírus, maior atividade hematofágica do vetor, entre outros (Focks, 1995; México,
1993; Watts, 1987).
Em locais onde os sorotipos do vírus da dengue estão sendo introduzidos,
como em nosso País, as taxas de ataque de dengue são semelhantes para todas as
faixas etárias (Kaplan, 1983). Caso não se obtenha êxito no controle do vetor, a
tendência é da manutenção da doença nas faixas etárias mais precoces, em função
da imunidade da coorte em adultos e da geração de novas coortes de suscetíveis,
como ocorre na Ásia.
Convém ressaltar que, sem o adequado controle do vetor, sempre existirá a
ameaça de uma nova epidemia de dengue em nosso País. Assim a compreensão da
dinâmica espacial da doença e suas relações com o ambiente natural e antrópico são
fundamentais para subsidiar estratégias mais eficientes de controle do mosquito
(Tauil, 2001, 2002).
A sua proliferação nas Américas, particularmente no Brasil, vêm apresentando
vários condicionantes, como por exemplo, a concentração muito elevada em médios
e grandes centros urbanos, oriundos de um intenso fluxo migratório rural-urbano
nesses últimos trinta anos, que resultaram em um crescimento desordenado das
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grandes cidades. Em função disso, as cidades não conseguiram acompanhar as
mudanças demográficas ocorridas no País, ocasionando uma carência de serviços
básicos como saneamento e habitação. Grandes partes da população destas
cidades vêm vivendo em locais ditos como sub-moradias, favelas e áreas de invasão,
onde o abastecimento de água é inexistente ou muito precário, levando-a ao
armazenamento inadequado da água (Tauil, 2001; 2002).
Em nosso País, as condições sócio-ambientais aliadas à ineficiência dos
programas de combate ao vetor favoreceram à grande expansão do A. aegypti, desde
sua reintrodução em 1976 (Penna, 2003). Dessa forma, o dengue vem ocorrendo no
Brasil de forma continuada, intercalando-se com as epidemias e associado com a
introdução de novos sorotipos em áreas anteriormente indenes.
No estado do Rio de Janeiro, na epidemia de 1986/87, identificou-se a primeira
ocorrência do sorotipo 1, onde cerca de 95.000 casos foram registrados, sendo
49.695 no município do Rio de Janeiro. Nos anos de 1990-1991, uma nova epidemia
foi notificada no estado, cerca de 105.576 casos notificados e no município, cerca de
62.660, onde circulava além do sorotipo 1, o sorotipo 2, que havia sido isolado em
abril de 1990. Em 1995, como na epidemia anterior apenas os sorotipos 1 e 2 foram
isolados, aproximadamente 35.000 casos ocorreram no estado, desses , 24.567
ocorreram no município. Já em 2001 –2002 o estado do Rio de Janeiro viveu a maior
epidemia registrada atualmente, coincidindo com o isolamento do sorotipo 3. No
Estado foram notificados 368.460 casos, dos quais, 177.919 eram do município
(SES/RJ, 2005; Nogueira et al. 1999, Miagostovich et al. 2002 e Nogueira et al. 2001).
Para o ano de 2005, dados consolidados pela Secretaria de Estado de Saúde
do Rio de Janeiro mostram o registro de 2.969 casos de dengue, sendo 1.157 destes
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no município. Em 2006 foram notificados no estado 30.413 e confirmados 5.992 e, no
município foram notificados 15.079 e confirmados 2.321 (SES, 2006).
No País, o Ministério da Saúde registrou no primeiro semestre de 2006, 198,9
mil casos de dengue, 10,89% a mais do que no ano passado, quando 179,3 mil
pessoas tiveram a doença. Alguns estados como: Espírito Santo, Goiás, Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe, além do Distrito Federal tiveram
aumento no número de casos. Entre janeiro e junho de 2006, as secretarias estaduais
e municipais de Saúde notificaram 278 casos de febre hemorrágica do dengue (FHD),
com 23 óbitos e letalidade de 8,27%. Para 2005, foram notificados 463 casos, com 45
óbitos e letalidade de 9,72% (MS, 2006).
No balanço parcial da situação de dengue realizado no início de fevereiro de
2006 houve redução de 41,23% dos casos da doença em janeiro de 2006 em relação
ao mesmo período de 2005. Em 2006, foram notificados 7.554 casos de dengue,
contra 12.854 no ano anterior. Os estados com maior redução do número de casos
são: Paraná com 100%, Amazonas, Maranhão, Ceará, Acre, Rio Grande do Norte e
Bahia com mais de 80%. Apenas seis estados apresentaram crescimento no número
de casos em relação ao mesmo período do ano de 2005. As maiores elevações foram
registradas em Goiás e Rio de Janeiro (MS, 2006).
O alto nível endêmico do dengue está relacionado à elevada infestação
domiciliar pelo A. aegypti e infecções humanas pelos diferentes sorotipos do agente.
Registros de casos até os dias atuais no Brasil relatam os padrões da evolução da
incidência e da distribuição espacial da doença. Em um artigo de revisão, Texeira et
al. (2005) analisaram os casos registrados no Brasil e observaram que após a cada
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introdução e circulação dos sorotipos do vírus ocorre uma epidemia, porém, os
períodos de baixa incidência indicam um provável declínio da população de
susceptível mais do que a efetividade das medidas de controle implementadas. Além
disso, observou também que em anos recentes ocorreu a expansão das áreas
afetadas e o aumento de casos de dengue hemorrágico com alta letalidade.
Alguns estudos vêm contribuindo para o melhor entendimento da última
epidemia no município do Rio de Janeiro, Passos et al. (2004) analisaram as
diferenças clínicas observadas em pacientes infectados com os três sorotipos
isolados na epidemia, mostrando que os indivíduos infectados pelo sorotipo 3
apresentaram mais chance em ter uma sintomatologia mais grave, sugerindo maior
virulência do mesmo. Casali et al. (2004) avaliaram a ocorrência dos principais sinais
e sintomas dos casos de dengue clássico e dengue hemorrágico, mostrando que não
houve diferença estatisticamente significativa para as manifestações gerais da
doença, onde ambas apresentaram alta ocorrência. Além disso, os autores
verificaram que a evolução para o óbito foi expressivamente maior no dengue
hemorrágico. Entretanto, conhecer um pouco mais sobre as questões sócio-
ambientais que favorecem a permanência do A. aegypti em áreas urbanas e sua
capacidade de transmissão do dengue, através da localização dos casos da doença e
da identificação dos fatores sócio-ambientais que caracterizam esses locais, torna-se
muito importante.
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2.4 Análise epidemiológica e espacial – interfaces com a área da saúde
Do ponto de vista epidemiológico, o espaço é uma categoria de análise
importante na compreensão da dinâmica de doenças infecciosas, como é o caso do
dengue. Esta categoria epidemiológica de análise surge como uma necessidade não
só do passado quando as doenças infecciosas eram um grande problema de saúde,
mas também como dos dias atuais, reflexo de uma urbanização acelerada que se
verifica no terceiro mundo (Silva, 1997).
A grande ocupação desigual do espaço, característica básica do município do
Rio de Janeiro, forma paisagens que podem promover estratos diferenciados de
transmissão de dengue, principalmente no que se refere à permanência de habitats
favoráveis ao vetor (Costa & Natal, 1998).
Outra concepção para o espaço é entendê-lo como um conjunto sem número
de lugares, resultado da interação singular de grupos sociais com seu entorno mais
próximo (Monken, 1995) ou segundo a coexistência de grupos sócio-espaciais
particulares que, apesar de compartilhar o mesmo espaço, possuem modos de vida
diferentes em função de sua inserção social e cultural (Sabroza & Leal, 1992).
Cabe ressaltar que um dos objetivos da Epidemiologia é a análise de padrões
espaciais de doenças, assim, as ferramentas de análise espacial desenvolvidas nos
últimos anos podem potencializar a identificação de padrões espaciais de morbidade
ou mortalidade e os fatores associados a esses padrões, visando sua melhor
predição e controle (Carvalho & Souza-Santos, 2005).
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Segundo Gatrell & Bailey (1996), as estratégias para análise espacial podem
ser divididas em: análise exploratória de dados, visualização e modelagem espacial.
As técnicas de análise exploratória quando aplicadas aos dados espaciais são de
suma importância ao desenvolvimento das etapas de modelagem estatística espacial.
São em geral sensíveis ao tipo de distribuição, à presença de valores extremos e à
ausência de estacionariedade. A forma mais simples e intuitiva de análise exploratória
é a visualização de valores extremos nos mapas (Bailey, 1995).
Entretanto, pode-se distinguir claramente que os procedimentos utilizados para
executar a análise espacial não se resumem simplesmente ao mapeamento dos
eventos, exigindo também a necessidade de se adicionar um novo significado aos
dados. Diversos procedimentos são utilizados para a análise espacial, notadamente,
as técnicas de geoprocessamento, de análise geoestatística, de dados de área
(lattice) e de padrões pontuais (point patterns) (Cliff & Ord, 1981; Cressie, 1993;
Deutsch, 1998; Kaluzny et al, 1996; Marshall, 1991; Medronho, 1995; Medronho et al,
1997; Geary, 1954).
A análise exploratória espacial para os dados de área, visa identificar a
estrutura de correlação espacial que melhor descreva os dados. Assim, a idéia
principal é estimar a magnitude da autocorrelação espacial entre as áreas. Nessa
situação, entre as ferramentas que podem ser utilizadas inclui-se o índice global de
Moran (Moran, 1950) e o índice de Geary. Para evidenciar os padrões espaciais, por
exemplo, em diferentes sub-regiões, podem-se utilizar os indicadores globais de
autocorrelação espacial e o mapa de espalhamento de Moran (Câmara et al., 2002)
A autocorrelação espacial global testa se as áreas conectadas apresentam
maior semelhança quanto ao indicador estudado do que o esperado num padrão
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aleatório, variando de -1 a +1, quantificando o grau de autocorrelação existente,
sendo positivo para correlação direta, negativo quando inversa (Câmara, 2002). Além
do I Moran global, pode ser utilizado o índice local, uma vez que este permite
encontrar os “bolsões” de dependência espaciais não evidenciados nos índices
globais, como por exemplo, possíveis “clusters” e “outliers”.
Através da análise gráfica do índice local, denominada de Diagrama de
espalhamento de Moran ou através de mapa temático bidimensional, denominado de
Box Map, pode-se observar as relações entre o valor do atributo medido e de seus
vizinhos. A divisão deste tipo gráfico é feita em quadrantes: Q1, Q2, Q3 e Q4. Os
pontos localizados no Q1 e Q2 indicam zonas onde o valor medido do atributo
assemelha-se à média dos vizinhos, onde o primeiro indica valor positivo e média
positiva e o segundo, valor negativo e média negativa. Os pontos localizados no Q3 e
Q4 indicam que o valor do atributo medido não se assemelha à média dos seus
vizinhos. Neste caso o Q3 indica o valor negativo e média positiva e o Q4 indica o
valor positivo e média negativa. As áreas localizadas no Q3 e Q4 podem ser vistas
como extremas, ou como áreas de transição, já que não obedecem ao padrão
observado para seus vizinhos (Anselin, 1992).
A partir do cálculo do Moran local e do diagrama de espalhamento do Moran
outros mapas podem ser gerados. São eles: LISA Map e Moran Map. O LISA Map
indica os valores do índice local de Moran classificados em quatro grupos: não
significantes, com significância de 95%, 99% e 99,9%. Esse mapa permite a
identificação das regiões que apresentam correlação local significativamente
diferente do resto dos dados, vistas como "bolsões" de não-estacionariedade, os
quais se referem a áreas de dinâmica espacial própria e que merecem uma análise
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detalhada. O Moran Map classifica em quatro grupos somente os objetos para os
valores do I Moran que foram considerados significantes (>95%), de acordo com o
quadrante aos quais pertencem no gráfico de espalhamento de Moran, ficando os
demais objetos classificados como sem significância (Anselin, 1995).
Quando a autocorrelação espacial está presente, as estimativas do modelo de
regressão devem incorporar essa estrutura espacial, já que a dependência entre as
observações altera o poder explicativo do modelo.
A modelagem é utilizada quando se pretende testar formalmente uma hipótese
ou estimar relações, como, por exemplo, entre a incidência de uma determinada
doença e variáveis ambientais e/ou sociais. Devido ao fato da incidência de uma
doença em uma região estar provavelmente correlacionada à incidência de regiões
vizinhas, não se pode necessariamente utilizar modelos estatísticos clássicos, que
assumem independência entre os eventos (Kleinbaum & Kupper, 1978). Modelos
clássicos, conforme expostas em Tukey (1977), não cobrirão a natureza dessa
dependência espacial, por isso é necessário incorporá-la formalmente aos modelos
estatísticos espaciais (Medronho et al, 1997).
Recentemente, os modelos de análise estatística espacial começaram a ser
utilizado na área biomédica, na determinação de fatores influenciadores do
comportamento de certos fenômenos. Diversos efeitos têm sido incluídos nos
modelos estatísticos espaciais para a área da saúde, como características da
população sob risco e variáveis regionalizadas quando associadas ao fenômeno
(Bailey, 2001).
Em modelos com efeitos espaciais globais, supõe-se que é possível capturar a
estrutura de correlação espacial em um único parâmetro, que é adicionado ao modelo
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de regressão tradicional. Para tratar a autocorrelação global em um modelo de
regressão têm-se duas alternativas: primeiro, através do modelo espacial auto-
regressivo (Simlutaneous AutoRegressive – SAR ou Spatial lag model), uma vez que,
se considera a dependência espacial por meio da adição ao modelo de regressão do
novo termo na forma de uma relação espacial para a variável dependente; segundo,
através de modelo de regressão espacial condicional (Spatial error model ou
Conditional AutoRegressive – CAR), com parâmetros globais, onde efeitos espaciais
são considerados um ruído ou perturbação. Nos modelos de regressão espacial com
efeitos globais, parte-se do princípio de que o processo espacial subjacente aos
dados analisados é estacionário, ou seja, implica que os padrões de autocorrelação
espacial existentes nos dados podem ser capturados em um único parâmetro
(Câmara et al., 2004).
A aplicação dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG) possibilita agilizar a
pesquisa em saúde, provendo novos métodos para o manejo da informação espacial.
Constitui-se também em uma poderosa ferramenta para o estudo das relações entre
saúde e ambiente. Além disso, os SIG possuem uma capacidade integradora de
diversos tipos de dados espaciais, facilitando a compreensão do fenômeno em estudo
em toda a sua complexidade (Barcellos, 1996; Barcellos & Ramalho, 2002).
O uso combinado das ferramentas de SIG e de técnicas de análise estatística
espacial potencializa o processo de análise da distribuição dos agravos no espaço
geográfico, assumindo importância fundamental na área da saúde. Um dos principais
desafios na área da saúde pública é o desenvolvimento de métodos específicos para
análise de riscos à saúde, subsidiado pela disponibilidade e qualidade dos dados
existentes, a partir da composição de perguntas precisas que sejam respondidas pelo
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sistema (Carvalho & Souza-Santos, 2005; Pinheiro et al., 2001; Braga et al., 2001)
Souza-Santos & Carvalho (2000) ressaltaram que a análise de dados espaciais
empregada em seu estudo mostrou-se uma importante ferramenta na vigilância e no
controle do A. aegypiti, apesar de não ter levado em consideração, por falta de dados,
a quantidade de criadouros existentes e nem sua produtividade, por localidade.
Dessa forma, os autores propuseram a utilização de técnicas de análise de dados
espaciais na vigilância a nível local e no controle do vetor.
Barcellos et al. (2005) a partir do uso de técnicas geoprocessamento discutem
os determinantes da distribuição de casos de dengue e do vetor no espaço urbano de
Porto Alegre, avaliando os cenários potenciais onde ocorrem à transmissão autóctone
do vírus, através de indicadores sócio-ambientais dos setores censitários com
presença de vetor e de casos. Os autores ressaltam que a metodologia utilizada no
estudo apresenta grande potencial para vigilância da doença em cidades com nível
de infestação baixo e, que através da utilização de técnicas de SIG é possível de
forma mais precisa identificar áreas de risco.
Estudos da distribuição geográfica de doenças têm grande importância no
planejamento e na tomada de decisões em sistemas de vigilância epidemiológica. Em
áreas urbanas, a distribuição espacial e temporal dos casos de dengue pode ser
influenciada por uma série de fatores geográficos, biológicos, ambientais e antrópicos
(Medronho et al., 1997; Costa & Natal, 1998; Barcellos et al., 2005; Barcellos et al.,
1998; Souza-Santos & Carvalho, 2000).
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3 JUSTIFICATIVA
O presente trabalho justifica-se a partir de algumas relevantes questões:
1. O grande impacto causado no Município do Rio de Janeiro durante a
epidemia de 2001-2002, onde ocorreu a maior concentração de casos da doença do
Estado. Além do isolamento do sorotipo DEN 3, ocorrido pela primeira vez.
2. A utilização de modelos estatísticos espaciais tem se mostrado promissor
na compreensão da dinâmica de diversas doenças, em especial, as infecciosas.
3. Avaliar a influência de variáveis sócio-ambientais na ocorrência de dengue
no município do Rio de Janeiro pode contribuir para uma melhor compreensão da
dinâmica espacial desta doença. Estes conhecimentos podem ajudar a subsidiar a
adoção de ações mais eficientes ao combate da doença.
Dessa forma, este trabalho justifica-se, portanto pelo propósito de sugerir a
incorporação de novas metodologias que possibilitem o uso do espaço como
categoria de análise, utilizando técnicas de análise espacial, de modo a ajudar na
compreensão da difusão do dengue no meio urbano.
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4 OBJETIVOS
4.1 Objetivo Geral
Analisar a distribuição espacial do dengue e suas relações com variáveis
sócio-ambientais durante a epidemia do município do Rio de Janeiro em 2001-2002.
4.2 Objetivos Específicos
1. Descrever a incidência do dengue nos anos de 2001 e 2002;
2. Analisar a distribuição espacial do dengue por bairro em cada semana
epidemiológica;
3. Correlacionar a ocorrência de dengue com variáveis sócio-ambientais.
20
Artigo: Análise Espacial da Epidemia de Dengue e o Contexto Sócio-ambiental
no Município do Rio de Janeiro em 2001-2002.
21
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas o dengue vem se expandindo mundialmente, sendo os
países tropicais os mais atingidos, em função de suas características climáticas,
ambientais e sociais (World Health Organization, 2006).
Em nosso País, as condições sócio-ambientais aliadas à ineficiência dos
programas de combate ao vetor favoreceram a grande expansão geográfica do A.
aegypti, desde sua reintrodução em 1976 (Penna, 2003, Texeira et al. 2005).
O estado do Rio de Janeiro, em 2001–2002 viveu a maior epidemia registrada
desde a década de 80, coincidindo com o isolamento do sorotipo 3. No Estado foram
notificados 368.460 casos, dos quais, 177.919 eram do município (SES/RJ, 2005;
Nogueira et al. 1999).
Para o ano de 2005, dados consolidados pela Secretaria de Estado de Saúde
do Rio de Janeiro mostram o registro de 2.969 casos de dengue, sendo 1.157 destes
no município. Até esta mesma data, para o ano de 2006 foram notificados no estado
30.413 e confirmados 5.992 e, no município foram notificados 15.079 e confirmados
2.321 (SES/RJ, 2007).
O controle do dengue é uma das tarefas mais difíceis dos serviços de saúde
pública em razão da ampla difusão do vetor, da grande mobilidade das populações,
aliados ao grande contingente populacional existente no município e à complexidade
dos problemas sociais e políticos que afetam a qualidade de vida e o ambiente
(Tauil, 2002).
A identificação das áreas geográficas que apresentam maior risco de
adoecimento constitui uma tarefa imprescindível para a elaboração de programas
22
preventivos e de controle de dengue, a partir da avaliação de exposições
diferenciadas aos vários fatores envolvidos na transmissão do dengue (Barcellos et
al., 1998, 2005).
Do ponto de vista epidemiológico, o espaço é uma categoria de análise
importante na compreensão da dinâmica de doenças infecciosas, como é o caso do
dengue (Silva,1997). A grande ocupação desigual do espaço, característica básica do
município do Rio de Janeiro, forma paisagens que podem promover estratos
diferenciados de transmissão de dengue, principalmente no que se refere à
permanência de habitats favoráveis ao vetor (Costa & Natal, 1998).
O uso combinado das ferramentas de SIG e de técnicas de análise estatística
espacial potencializa o processo de análise da distribuição dos agravos no espaço
geográfico, assumindo importância fundamental na área da saúde. A incorporação
desta ferramenta às técnicas de epidemiologia contribui para análise de informações
sobre a incidência de determinados agravos à saúde e condições sócio-econômicas
das populações que ocupem diferentes territórios de uma cidade (Medronho, 1995;
Barcellos, 1996; Carvalho et al., 2000).
Estudos da distribuição geográfica de doenças têm grande importância no
planejamento e na tomada de decisões em vigilância epidemiológica. Em áreas
urbanas, a distribuição espacial e temporal dos casos de dengue pode ser
influenciada por uma série de fatores geográficos, biológicos, ambientais e antrópicos
(Passos et al., 2004; Pontes & Ruffino-Netto, 1994; Souza-Santos, 2000; Barcellos et
al., 2005).
O mapeamento de doenças vem sendo instrumento básico no campo da saúde
pública e, em anos recentes, grandes avanços nas técnicas de análise têm sido
23
desenvolvidos com a intenção de gerar mapas para identificar áreas de maior risco,
nas quais a atenção deve ser diferenciada (Lawson et al., 1999; Rojas et al., 1999,
Carvalho & Souza-Santos, 2005).
Dentre as inúmeras técnicas de análise espacial que podem ser utilizadas no
estudo de doenças infecciosas, ressalta-se a análise exploratória de dados espaciais,
que visa descrever como o padrão do dengue, por exemplo, se apresenta no espaço,
ou seja, se existe dependência espacial na distribuição da doença e quais as relações
espaciais presentes (Bailey, 1995; Andrade et al. 2001).
Quando a autocorrelação espacial está presente, as estimativas do modelo de
regressão devem incorporar essa estrutura espacial, já que a dependência entre as
observações altera o poder explicativo do modelo. Deste modo, o uso de modelos de
regressão espacial torna-se adequado, uma vez que, incorpora a a dependência
espacial das variáveis a serem utilizadas (Câmara et al., 2004).
A investigação entre a relação de fatores sócio-ambientais e a epidemia de
dengue nos anos de 2001 e 2002, pressupõe que existe uma acumulação de riscos
em determinados lugares delimitáveis e identificáveis no espaço. Assim, neste estudo
foi realizada uma análise ecológica de dados sócio-ambientais e epidemiológicos da
doença, com intuito de verificar as possíveis associações de variáveis entre este
fenômeno, buscando uma melhor compreensão do contexto em que se produziu esse
processo sócio-espacial.
24
MATERIAL E MÉTODO
Características do município do estudo
O município do Rio de Janeiro possui uma população de 5.857.904 habitantes
(IBGE, 2000), situado 23o 04’ 10’’ de Latitude Sul e 43o 47’ 40’’ de Longitude Oeste,
possui uma área total de 1.224,56 Km2, localiza-se na região sudeste do Brasil.
De acordo com critérios físico-urbanísticos, administrativos e de planejamento,
o município do Rio de Janeiro se divide em dez áreas de planejamento, 33 regiões
administrativas e 158 bairros (IBGE/2001). A figura 1 apresenta a divisão
administrativa do município em bairros (154) e RAs e ainda a estruturação em Zonas
(Sul, Norte, Oeste e Centro).
Figura 1. Distribuição Administrativa do Município do Rio de Janeiro em 2001.
10000 0 10000 20000 Meters
N
__ Região Administrativa
___ Bairros da Zona Oeste
___ Bairros da Zona Norte ____Bairros do Centro ___ Bairros da Zona Sul
25
Desenho do estudo
O método epidemiológico de análise utilizado no presente trabalho foi o
desenho ecológico. A ocorrência do dengue foi analisada segundo áreas geográficas,
delimitadas como bairros e correlacionadas com variáveis sócio-ambientais.
Os 125.041 casos notificados e residentes do município do Rio de Janeiro
foram coletados da Secretaria Municipal de Saúde, através do Sistema Nacional de
Agravos de Notificação (SINAN), durante a quadragésima oitava semana
epidemiológica de 2001 (25/11 a 01/12) e a vigésima semana epidemiológica de 2002
(12/05 a 18/05) segunda alça do processo epidêmico, perfazendo um total de 25
semanas. Esse intervalo de tempo justifica-se por algumas características
importantes como a identificação de um único sorotipo, o DEN 3, maior concentração
de casos da doença e um período contínuo claramente definido como a estação do
ano verão.
A base cartográfica digital utilizada na elaboração dos mapas foi obtida na
Prefeitura do Município do Rio de Janeiro.
Foi construído um banco de dados com as informações demográficas e sociais
para o município do RJ, obtidas do Instituto Pereira Passos (IPP) e do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2001).
O bairro do Joá foi agregado à Barra da Tijuca, Grumari ao Recreio dos
Bandeirantes, Parque Columbia à Pavuna, em função de serem bairros criados
recentemente e dessa forma, diversos casos ocorridos nestas localidades eram
notificados como sendo do bairro de origem. O bairro de Paquetá foi retirado da
26
análise por ser uma ilha e assim não apresentar a informação de bairros vizinhos.
Dessa forma, o número de bairros analisados neste estudo correspondeu a 154.
O total de casos notificados por bairro foi mapeado para onze semanas
epidemiológicas correspondendo ao início do surgimento de casos, a algumas
semanas anteriores a semana de maior número de casos, a semana de maior
número de casos, a algumas semanas após a semana de maior número de casos e
a última semana do período estudado (25), com a intenção de analisar visualmente
para que área ou áreas a epidemia se difundiu.
Posteriormente foi estimado um único indicador, taxa de incidência média do dengue
(Kleinbaum et al., 1982), para cada bairro, correspondendo ao período de 25
semanas epidemiológicas. Este indicador foi correlacionado com as variáveis sócio-
ambientais.
Foram empregadas transformações do tipo logaritimo neperiano para a
variável resposta (taxa de incidência média do dengue) e as variáveis independentes
(Quadro 1). Essas transformações foram escolhidas porque resultaram em melhores
aproximações para a distribuição simétrica.
Para descrever a associação entre todas as variáveis estudadas,
preliminarmente, foi construída a matriz de correlação de Pearson, onde as variáveis
que apresentaram significativa correlação no nível de 5% com o desfecho foram
utilizadas na análise multivariada.
Os softwares utilizados foram S-Plus 2000 para análise estatística e ArcView
3.2 e Terraview 3.1.3. para realização de mapas.
27
Quadro 1. Descrição das variáveis independentes.
. Proporção de domicílios com serviço de coleta de lixo: número de domicílios em há serviço de coleta de lixo
em relação ao total de domicílios.
. Proporção de domicílios em que o lixo é jogado em terreno baldio ou logradouro: número de domicílios em
que o lixo é jogado em terreno baldio em relação ao total de domicílios.
. Proporção de população alfabetizada: número de habitantes alfabetizados a partir de 5 anos de idade em
relação à população total acima de 5 anos.
. Proporção de população não alfabetizada: número de habitantes não alfabetizados a partir de 5 anos de idade
em relação à população total acima de 5 anos.
. Proporção de domicílios com lavadora de roupas: número de domicílios com lavadora de roupas em relação
ao total de domicílios.
. Proporção de domicílios particulares cuja pessoa responsável não tem rendimentos, inclusive os domicílios
cuja pessoa responsável recebia somente em benefícios: número de domicílios cuja pessoa não tem rendimento
algum em relação ao total de domicílios particulares.
. Proporção de domicílios com abastecimento de água proveniente da rede pública geral: número de domicílios
com abastecimento de água proveniente da rede pública geral em relação ao total de domicílios particulares
permanentes.
· Proporção de domicílios ligados à rede pública de esgoto: número de domicílios ligados à rede pública de
esgoto em relação ao total de domicílios particulares permanentes.
. Densidade populacional urbana: número de pessoas dividido pela área/ha urbana.
. Densidade pessoas por dormitório no domicílio: número de pessoas dividido por dormitório.
A medida de autocorrelação espacial utilizada neste estudo foi I Moran global,
que testa se as áreas conectadas apresentam maior semelhança quanto ao indicador
estudado do que o esperado num padrão aleatório, variando de -1 a +1, quantificando
o grau de autocorrelação existente, sendo positivo para correlação direta, negativo
quando inversa (Câmara et al., 2004). Além do I Moran global foi utilizado o índice
local através do Moran Map da taxa de incidência média de dengue, já que este
permite encontrar os “bolsões” de dependência espaciais não evidenciados nos
índices globais, como por exemplo, possíveis “clusters” e “outliers”.
28
Para análise de autocorrelação, foi construída uma matriz de vizinhança para
os 154 bairros do município, sendo definida por bairros contíguos com pelo menos
um ponto em comum.
Com a intenção de verificar a existência de relações entre o desfecho e
variáveis, foi realizado o modelo de regressão linear multivariada através da
estratégia de seleção stepwise. Posteriormente, para análise espacial utilizou-se o
modelo CAR - Conditional Auto Regressive que capta a dependência espacial da
variável desfecho. Os efeitos da autocorrelação espacial são associados ao termo de
erro ε e o modelo pode ser expresso por:
Y = X+ ε , ε = W ε + ξ
Onde Wε é o componente do erro com efeitos espaciais, ciente
correlacionada. A hipótese nula para a não-existência de autocorrelação é que =0,
ou seja, o termo de erro não é espacialmente correlacionado (Câmara et al., 2004;
Anselin, 1992).
Para o diagnóstico em regressão foram realizados mapas dos resíduos nos
modelos finais de regressão linear multivariada e no CAR buscando indícios de
ruptura dos pressupostos de independência, ou seja, uma alta concentração de
resíduos positivos ou negativos em uma parte do mapa indica a presença de
autocorrelação espacial. Foi utilizado também o teste de I Moran sobre os resíduos
em ambos os modelos para verificar quantitativamente a autocorrelação espacial
existente.
29
RESULTADOS
A distribuição espacial da taxa de incidência média de dengue nos bairros do
município do Rio de Janeiro, correspondendo ao período de 25 semanas
epidemiológicas, indicou que bairros da zona oeste foram os mais atingidos, seguidos
dos bairros do centro e da zona sul. Apenas alguns bairros da zona norte
apresentaram taxas altas de dengue (Figura 2).
Figura 2. Taxa incidência média de dengue no Município do Rio de Janeiro nas 25 semanas epidemiológicas (2001-2002).
Taxa incidência média de dengue
5.332 - 100.386
100.386 - 160.362
160.362 - 279.392
279.392 - 1837.391
10000 0 10000 20000 Meters
N
30
Os mapas dos casos de dengue (Figura 2 e 3) mostram treze das vinte e cinco
semanas epidemiológicas utilizadas neste estudo. Na primeira semana (48/2001), o
bairro de Guadalupe localizado na zona norte, foi o que apresentou maior número de
notificações (treze casos). Na semana 50/2001, além do bairro de Guadalupe, os
bairros da Penha, Tijuca também são atingidos. Na semana 52/2001, este número
aumenta para dezoito bairros, a maioria localizados no centro e na zona norte.
Apenas dois da zona oeste (Santa Cruz e Taquara). A semana 02/2002 revelou a
expansão da doença para mais de 50% dos bairros que compõem o município e um
aumento substancial do número de casos nos bairros anteriormente atingidos.
Verificou-se que poucos bairros da zona sul apresentaram casos (Catete, Flamengo,
Botafogo e Copacabana). A doença se difundiu progressivamente nas semanas 04 e
06/2002, atingindo mais 80% dos bairros, revelando um aumento de casos em alguns
bairros da região centro, norte e oeste. Na semana 08/2002 observou-se que os
bairros da zona oeste mantiveram-se como nas duas semanas anteriores, porém
Santa Cruz e Guaratiba elevaram o número de casos de dengue. Os bairros das
regiões centro e norte reduziram um pouco os casos, exceto Bonsucesso, Maré, São
Cristóvão, Santa Tereza e Tijuca, respectivamente. Na zona sul, o bairro de Humaitá
elevou o número de casos.
A semana 10/2002 apresentou quase que 50% dos bairros que compõem o
município com elevados números de casos. Entretanto os bairros de Bonsucesso e
Maré, na região centro; Tijuca e Jardim América, na zona norte; Praça Seca,
Jacarepaguá, Curicica, Taquara, Senador Camará, Bangu, Campo Grande,
Paciência, Santa Cruz e Sepetiba, na zona oeste e Botafogo, Rocinha e Copacabana,
31
na zona sul foram os mais atingidos. Na semana 12/2002, observa-se que o número
de bairros atingidos se manteve como o da semana 10/2002, porém houve uma
redução de casos notificados. Observou-se para semana 14/2002 significativa
redução de casos, exceto em alguns bairros da zona oeste, como Bangu, Campo
Grande, Paciência, Santa Cruz, Sepetiba, Guaratiba, Pedra de Guaratiba,
Jacarepaguá, Curicica, Anil, Taquara e Praça Seca, em bairros da zona sul, como
Copacabana, Botafogo, Rocinha e Vidigal, em bairros da zona norte, como Alto da
Boa Vista e Tijuca, e em bairros do centro, como Bonsucesso e Ramos. Na semana
16/2002 os bairros de Campo Grande, Paciência, Santa Cruz e Sepetiba (zona oeste)
e, os bairros de Copacabana e Rocinha (zona sul) permaneceram com elevado
número de casos. Para os demais se observou redução e ou ausência de casos.
A semana 18/2002 apresentou pouquíssimos bairros com casos da doença. Na
última semana do período analisado apenas o bairro da Rocinha, localizado na zona
sul da cidade apresentou vinte casos de dengue. Cabe ressaltar que, os bairros de
Campo dos Afonsos, Vila Militar, Senador Vasconcelos, ambos localizados na zona
oeste, durante o período estudado não ultrapassaram mais que 22 casos de dengue.
Essa situação também foi observada par o bairro de Engenheiro Leal, zona norte do
município.
Dentre as dez variáveis (Tabela 1) utilizadas no estudo, três apresentaram
correlação estatisticamente significativa com a taxa de incidência média de dengue,
porém a associação foi negativa, são elas: “percentual de domicílios ligados à rede
sanitária geral” (-0,24); “percentual de domicílios com lavadora de roupas” (-0,17);
“densidade populacional por área urbana” (-0,21).
32
Tabela 1. Matriz de correlações entre as covariáveis.
Dengue SREND SABELER NSLER SELIMP JOGTERA REDGERAS DENSDOMI DENPOPUR TEMLAV REDEGERA
Dengue 1
* .
SREND 0.085 1
* 0.295 .
SABELER -0.022 -0.242 1
* 0.789 0.003 .
NSLER 0.01 0.254 -0.969 1
* 0.905 0.002 0 .
SELIMP -0.127 -0.382 0.119 -0.147 1
* 0.116 0 0.142 0.069 .
JOGTERA -0.075 0.377 -0.095 0.143 -0.151 1
* 0.523 0.001 0.419 0.219 0.196 .
REDGERAS -0.236 -0.375 0.162 -0.164 0.127 -0.183 1
* 0.003 0 0.044 0.042 0.116 0.116 .
DENSDOMI -0.025 0.59 -0.149 0.177 -0.23 0.454 -0.437 1
* 0.762 0 0.065 0.028 0.004 0 0 .
DENPOPUR -0.214 -0.113 0.103 -0.12 -0.026 -0.332 0.639 -0.458 1
* 0.008 0.163 0.202 0.14 0.746 0.004 0 0 .
TEMLAV -0.169 -0.787 0.309 -0.31 0.505 -0.396 0.516 -0.493 0.254 1
* 0.036 0 0 0 0 0 0 0 0.002 .
REDEGERA -0.085 -0.292 0.19 -0.177 0.257 -0.185 0.318 -0.254 0.301 0.362 1
* 0.297 0 0.019 0.028 0.001 0.111 0 0.001 0 0 .
* (p <= 0,05)
33
Figura 3. Distribuição espacial dos casos de dengue em seis semanas epidemiológicas no Município do Rio de Janeiro.
Semana 48/2001
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 50/2001
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 52/2001
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 02/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 04/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N Semana 06/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
48/2001 50/2001
52/2001 02/2002
04/2002
06/2002
34
Figura 4. Distribuição espacial dos casos de dengue em sete semanas epidemiológicas no Município do Rio de Janeiro.
Semana 08/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1572
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 12/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 14/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semama 16/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 18/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 20/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 10/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
08/2002
10/2002
12/2002
14/2002
16/2002
18/2002
20/2002
35
A autocorrelação espacial global indicou que tanto a variável taxa incidência
média de dengue”quanto as covaráveis “percentual de domicílios ligados à rede
sanitária geral, “densidade populacional por área urbana”, “percentual de domicílios
com lavadora de roupas” apresentaram autocorrelação significativa (Tabela 2).
Tabela 2. Coeficientes I de Moran e níveis de significância.
Variáveis
I. Moran
p- valor
Ln taxa média Incidência Dengue 0,21 < 0,001
Ln percentual domicílios com rede sanitária 0,61 < 0,001
Ln densidade populacional urbana 0,42 < 0,001
Ln percentual domicílios com lavadora roupa 0,27 < 0,001
Observou-se no cálculo do I Moran local da variável desfecho (Figura 4),
através do Moran Map, o cluster de áreas em alguns bairros localizados na região
centro, zona oeste e norte do município do Rio de Janeiro. Os bairros da região
centro e zona oeste mostram um padrão diferenciado da zona norte. As duas
primeiras, região centro e zona oeste, mostram as áreas de clusters que apresentam
valores altos do atributo estudado e a média de seus vizinhos (Q1), já na zona norte
ocorre o inverso, áreas de clusters que apresentam valores baixos do atributo e a
média de seus vizinhos (Q2). Foram observadas poucas áreas consideradas de
transição e que podem ser analisadas como extremos, localizadas nos quadrantes
Q3 e Q4. Esta situação indica que as áreas pertencentes a esses quadrantes, não
seguem o mesmo processo de dependência espacial das demais. Dentre as 154
36
áreas analisadas, 113 não foram significativas (NS), 16 pertencem ao Q1, 18
pertencem ao Q2, 3 pertencem ao Q3 e 4 pertencem ao Q4.
Figura 5. Moran Map do “taxa de incidência média de dengue” - Município do Rio de Janeiro em 2001-
2002 - Semanas epidemiológicas 48/01 a 20/02 (25/11 a 18/05) .
A análise de regressão linear multivariada realizada com todas variáveis
utilizadas neste estudo apontou o “percentual de domicílios ligados à rede sanitária
geral” como a única variável para qual se verificou uma contribuição significativa para
explicação da ocorrência da doença. O coeficiente de determinação encontrado no
modelo foi baixo, indicando que 5% da variabilidade total da taxa de incidência média
do dengue no município do Rio de Janeiro é explicada pelo percentual de domicílios
Moran Map dengue
NS
Q1
Q2
Q3
Q410000 0 10000 20000 Meters
N
37
ligado à rede sanitária. Uma análise visual dos resíduos da regressão indicou uma
aglomeração de resíduos positivos na região centro, sul e oeste da cidade e resíduos
negativos na zona norte e parte da oeste (Figura 6). O índice de Moran dos resíduos
foi de 0,19 (p < 0,001), mostrando autocorrelação espacial.
Figura 6. Resíduos do modelo de Regressão linear múltipla - Município do Rio de Janeiro em 2001-
2002 - Semanas epidemiológicas 48/01 a 20/02 (25/11 a 18/05)
O modelo CAR também apontou o “percentual de domicílios ligados à rede
sanitária geral” como a única variável significativa. O coeficiente encontrado foi
próximo ao do modelo de regressão linear multivariado (Tabela 3). Da análise visual
dos resíduos, verifica-se que não há um padrão espacial tão bem estabelecido como
Resíduos RLM
-3.672 - -0.522
-0.522 - 0.033
0.033 - 0.597
0.597 - 2.773
10000 0 10000 20000 Meters
N
38
no encontrado na análise dos resíduos da regressão múltipla (Figura 7). Porém o
índice de Moran foi de -0.14 (p = 0,005), revelando autocorrelação inversa.
Tabela 3. Modelos de Regressão Múltipla e Conditional Auto Regressive (CAR) da “taxa de incidência média de dengue” e da covariável “percentual domicílios com rede sanitária”, no município do Rio de Janeiro nos anos 2001-2002.
Figura 7. Resíduos do modelo CAR - Município do Rio de Janeiro em 2001-2002 - Semanas
epidemiológicas 48/01 a 20/02 (25/11 a 18/05)
Modelos Coeficientes Erro-padrão t p-valor
Regressão múltipla
Intercepto 7,662 0,860 8,909 < 0,001
Ln Percentual domicílios ligado à rede sanitária -0,592 0,198 -2,991 0,003
R2= 0,049
Regressão CAR*
Intercepto 7,763 1,028 7,555 < 0,001
Ln Percentual domicílios ligado à rede sanitária -0,599 0,237 -2,532 0,012
Rho= 0,1217
* Conditional auto Regressive
Resíduos CAR
-3.685 - -0.325
-0.325 - 0.037
0.037 - 0.466
0.466 - 2.559
10000 0 10000 20000 Meters
N
39
DISCUSSÃO
No que diz respeito à evolução dos casos de dengue, como mostrado nos
resultados, através da análise realizada a partir da elaboração de mapas para treze
semanas epidemiológicas, os casos começaram a surgir nos bairros da zona norte e
só após duas semanas, alguns bairros do centro e da zona oeste também foram
atingidos. O mesmo não ocorreu para os bairros da zona sul, uma vez que, que teve
o surgimento de casos só a partir da semana 02/2002. Apesar dos casos surgirem
tardiamente nessa região, bairros como Copacabana e Botafogo permaneceram com
um número de casos relativamente alto durante o período estudado. Contudo, o
cenário observado na ocorrência de dengue para cidade do Rio de Janeiro mostrou
que sua difusão foi rápida e crescente após a segunda semana de 2002,
permanecendo assim até a semana doze de 2002. Essa análise indicou que durante
o período total, o município apresentou-se altamente vulnerável a doença,
evidenciando o fator espacial como determinante na propagação dos casos.
Os resultados obtidos através do cálculo do I Moran global para as variáveis
estudadas expressaram autocorrelação estatisticamente significativa. Além disso, a
análise dos indicadores de autocorrelação local para taxa média incidência de dengue
mostrou a existência de dependência espacial para 41 bairros do município do Rio de
Janeiro. Dentre essas, cinco localizadas na zona oeste e quatro na região centro (Q1)
consideradas como áreas de alto risco para doença.
Correlacionando-se o padrão espacial do dengue encontrado com o espaço
urbano organizado no período estudado para o Município do Rio de Janeiro, pode-se
sugerir que os bairros da zona oeste identificados no cálculo do Moran Map como os
40
que tiveram valores altos do atributo estudado e a média dos seus vizinhos (Q1) são
em parte os bairros que apresentaram ocupação mais recente e condições de infra-
estrutura básica deficiente e precária (Kawa & Sabroza, 2002). Porém os bairros
localizados na região centro da cidade, apesar do maior acesso aos serviços de infra-
estrutura básica, apresentam alta densidade populacional urbana. É importante
destacar que, não foi aferida a qualidade desses serviços.
Através do procedimento stepwise, constatou-se que apenas a variável
“percentual de domicílios ligados à rede sanitária geral” explicou a variabilidade total
da taxa de incidência média de dengue no município do Rio de Janeiro. Sabe-se que
a melhoria nas condições de esgotamento sanitário tem grande impacto na
ocorrência de infecção e morbidade por inúmeras doenças. Entretanto, mesmo
sabendo que essa variável não está diretamente ligada a transmissão de dengue,
pode-se sugerir que seja uma “proxy” da falta do saneamento ambiental, observado
pela urbanização não planificada, por moradias inadequadas com precárias ou
inexistentes condições de infra-estrutura básica.
Segundo Ault (1994), a urbanização não planificada e as favelas suburbanas
têm criado não só novas oportunidades para reprodução das populações de vetores
como a interação entre pessoas infectadas e suscetíveis.
Apesar deste modelo linear final não explicar de forma mais consistente a
ocorrência de dengue no Rio de Janeiro, observou-se visualmente através da análise
realizada nos resíduos da regressão uma aglomeração de resíduos na região centro,
zona sul, oeste e norte da cidade, indicando pelo cálculo do Moran a autocorrelação
espacial existente.
41
Com a finalidade de se ajustar as variáveis a um modelo que assumisse a
estrutura espacial, utilizou-se o modelo Conditional Auto Regressive (CAR), onde se
observou um coeficiente semelhante o da regressão tradicional. O padrão espacial
dos resíduos foi semelhante ao da regressão múltipla porém a autocorrelação
espacial foi negativa, indicando que os valores baixos em uma localização estão
rodeados de valores altos, ou seja, os valores do atributo de um objeto, nesse caso
os resíduos, tendem a ser diferente dos valores de seus vizinhos, ou vice-versa.
Ambos os modelos não foram capazes de identificar a influência de outros
fatores estudados, talvez em função da unidade de análise utilizada, ou mesmo por
não ter se considerado outras variáveis importantes para a transmissão da doença,
como a regularidade do abastecimento de água, por exemplo (Ribeiro et al., 2006,
Barcellos et al., 2005, Costa & Natal, 1998).
Além disso, nos modelos de regressão com efeitos globais parte-se do
princípio que o processo espacial subjacente aos dados analisados é estacionário, ou
seja, os padrões de autocorrelação espacial são capturados em um único parâmetro.
Quando na verdade, à utilização de dados censitários, pode produzir diversos
padrões espaciais que não são captados em um único parâmetro. Assim sugere-se
que, para testar tal hipótese, seria interessante investigar o processo espacial através
de modelos cujos parâmetros variam no espaço, como os que levam em conta os
efeitos espaciais locais (Câmara et al., 2004; Fotheringham, et al, 2000).
Cabe ainda ressaltar, o acesso e a qualidade dos serviços de abastecimento
de água que a pesar de não ter apresentado uma correlação com o dengue nesse
estudo, têm sido apontado como determinantes da transmissão. A ausência desses
42
serviços ou mesmo a irregularidade no fornecimento de água pode implicar em
situações extremamente favoráveis a procriação do vetor (Oliveira & Valla, 2001).
Vários estudos reconhecem a importância de indicadores de habitação e renda
como determinantes da intensidade de dengue, contudo apontam muitas vezes para
conclusões contraditórias (Barcellos et al., 2005 Chiaravalloti Neto et al, 1998, Costa
& Natal, 1998).
Ressalta-se que a informação obtida de dados secundários através do censo
demográfico, quando agregadas para descrever grandes regiões ocultam a grande
variabilidade existente dentro destas. Assim, a agregação espacial pode influenciar os
resultados relacionados às variáveis. Na cidade do Rio de Janeiro então, este tipo de
problema agrava-se ainda mais, uma vez que apresenta sérios problemas de infra-
estrutura urbana e desigualdade sócio-econômica. Dessa forma, à medida que
utilizamos unidades espaciais maiores, a informação obtida através das variáveis
sócio-ambientais descrimina menos essas regiões.
Um outro aspecto relevante, diz respeito às limitações dos indicadores
utilizados quando trabalhados com dados de notificações, uma vez que, pode ter
havido uma provável subnotificação de casos de dengue, acarretando um viés de
seleção (Casali et al, 2004; Toledo et al, 2006).
Em função da complexidade que envolve o processo de adoecer por dengue,
seria interessante que as informações obtidas para a doença no município do Rio de
Janeiro estivessem em unidades de análise menores como, por exemplo, no nível de
setor censitário (Mondini, 2005).
43
Sugere-se neste estudo que maiores investigações devam ser realizadas a
nível local para esclarecer, por exemplo, aspectos qualitativos e quantitativos de
alguns indicadores utilizados.
Assim, ainda que não tenha sido possível identificar um modelo multivariado
para o dengue na epidemia de 2001-2002 no município do Rio de Janeiro com as
variáveis utilizadas, o estudo sugere a importância do uso de ferramentas de análise
espacial e destaca a metodologia proposta por utilizar técnicas de análise exploratória
que incorporam a dependência espacial em áreas na análise de ocorrência do
dengue.
44
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6 COMENTÁRIOS FINAIS
A utilização do espaço enquanto categoria de análise em estudos
epidemiológicos tem revelado sob uma ótica inovadora, o desenvolvimento
metodológico das intervenções nos agravos em saúde pública. Assim, o
desenvolvimento e aprimoramento de metodologias que incorporem o espaço como
uma vertente importante na análise de doenças infecciosas torna-se imprescindível
na implementação de estratégias de controle eficazes.
O presente estudo procurou explorar a união de ferramentas espaciais através
da utilização de SIG e estatística espacial, com objetivo de analisar as relações
existentes entre a incidência do dengue nos anos de 2001-2002 e variáveis sócio-
ambientais. Nesse sentido, a investigação foi baseada na análise dos resultados
apontados pelo I. Moran global e pela elaboração de mapas a partir do Moran Map,
os quais fornecem um diagnóstico resumido do comportamento espacial das
variáveis, permitindo assim o levantamento das correlações existentes entre a taxa de
incidência média e variáveis sócio-ambientais, consideradas potenciais variáveis
explicativas do fenômeno.
Entende-se que o estudo apresentou limitações, uma vez que não levou em
conta outras possíveis variáveis relacionadas à transmissão da doença, como por
exemplo, regularidade do abastecimento de água, densidade espacial do vetor,
produtividade de criadouros.
Em função de, não existir um consenso entre quais fatores influem no aumento
de casos em uma determinada área, ressalta-se a utilização de diversas variáveis em
54
novos estudos, com intuito de identificar os fatores associados ao dengue e, por
conseguinte, fornecer melhor embasamento para novas propostas de controle da
doença.
55
7 ANEXOS
ANEXO 1. Moran Map das variáveis.
Figura 1. Percentual de domicílios ligados à rede sanitária. Figura 2. Densidade populacional urbana. Figura 3. Percentual de domicílios com lavadora de roupa.
Moran Map Percentual rede sanitária geral
NS
Q1
Q2
Q3
Q4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Moran Map Densidade populacional urbana
NS
Q1
Q2
Q3
Q4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Moran Map Percentual lavadora roupa
0
1
2
3
4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Figura 1
Figura 2
Figura 3
56
ANEXO 2. Box Mapa da variável taxa de incidência média de dengue e das variáveis.
Figura 1. Taxa incidência média de dengue. Figura 2. Percentual de domicílios ligados à rede sanitária. Figura 3. Densidade populacional urbana. Figura 4. Percentual de domicílios com lavadora de roupa.
Box Map dengue
Q1
Q2
Q3
Q4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Box Map Percentual rede sanitária geral
Q1
Q2
Q3
Q4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Box Map Densidade populacional urbana
1
2
3
4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Box Map Percentual lavadora roupa
1
2
3
4
10000 0 10000 20000 Meters
N
Figura 1 Figura 2
gura 1
Figura 3 Figura 4
57
ANEXO 3. Distribuição espacial das variáveis.
Figura 1. Percentual de domicílios ligados à rede sanitária. Figura 2. Densidade populacional urbana. Figura 3. Percentual de domicílios com lavadora de roupa.
Quartil Percentual rede sanitária geral
9.4 - 71.18
71.18 - 88.45
88.45 - 95.72
95.72 - 100
10000 0 10000 20000 Meters
N
Quartil Densidade populacional urbana
3.793 - 74.547
74.547 - 121.92
121.92 - 156.356
156.356 - 2330.177
10000 0 10000 20000 Meters
N
Quartil Percentual lavadora roupa
3.07 - 3.93
3.93 - 4.12
4.12 - 4.28
4.28 - 4.52
10000 0 10000 20000 Meters
N
Figura 1 Figura 2
Figura 3
58
ANEXO 4. Distribuição espacial dos casos de dengue em seis semanas epidemiológicas no Município do Rio de Janeiro.
Semana 49/2001
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 51/01
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 01/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 03/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 05/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N Semana 07/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 49/01 Semana 51/01
Semana 01/02
Semana 03/02
Semana 05/02
Semana 07/02
59
ANEXO 5. Distribuição espacial dos casos de dengue em seis semanas epidemiológicas no Município do Rio de Janeiro.
Semana 09/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 11/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1632
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 13/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 15/2002
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 17/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
NSemana 19/02
0 - 11
11 - 22
22 - 38
38 - 50
50 - 73
73 - 107
107 - 208
208 - 1475
10000 0 10000 20000 Meters
N
Semana 09/02
Semana 11/02
Semana 13/02
Semana 15/02
Semana 17/02 Semana 19/02