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1. INTRODUÇÃO E OBJETIVO:
As principais variedades coloridas de quartzo encontradas (ametista, citrino, quartzo
fumê e morion), devido ao fato de geralmente apresentarem cores fracas, eram tidas como
material de baixa qualidade gemológica. Com a oferta da técnica de irradiação e tratamento
térmico, esse cenário se alterou. O quartzo passou a ser visto como uma das principais
matérias-primas para lapidadores e comerciantes de gemas em geral, pois se trata de um
material abundante, de baixo preço e de fácil tratamento. Segundo Favacho (2001), Minas
Gerais possui uma das maiores reservas de quartzo gemológico do mundo, tanto em quartzos
beneficiáveis por irradiação gama e aquecimento quanto em minerais de coleção.
A aceitação de gemas tratadas deu início à busca de procedimentos para o
melhoramento ou mudança da cor em quartzos provenientes de diversas regiões do Estado de
Minas Gerais e também de Estados vizinhos.
Segundo dados da revista Minas Faz Ciência (nº 4 de 2000), editada pela Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), o Instituto Brasileiro de Gemas e
Metais Preciosos (IBGM) estima que o mercado internacional de pedras coradas é de R$ 1,5
bilhão por ano. O Brasil participa com 4%, embora a estimativa é a de que seja responsável
por 30% da produção comercializada no mercado internacional. Minas Gerais, conforme
cálculos do instituto, produz metade das pedras coradas brasileiras. A dificuldade enfrentada
pelo Estado de Minas Gerais é que grande parte das pedras preciosas deixa o Estado em seu
estado bruto. O tratamento e a lapidação são realizados fora do estado, na maioria das vezes
no exterior. Assim, o lucro é transferido para quem agrega valor ao produto. Muitas vezes,
essas pedras preciosas retornam para Minas Gerias após serem tratadas e lapidadas. Portanto,
o domínio da tecnologia da coloração de gemas pelo uso da irradiação é de grande interesse
para o Estado de Minas Gerais.
Os mecanismos causadores da cor no quartzo têm sido objeto de estudo de vários
pesquisadores (COHEN, 1956 e 1985; NASSAU, 1978, 1980 e 1983; NEUMANN e
SCHMETZER, 1984; ROSSMAN, 1994;). O presente trabalho tem como objetivo a
elaboração de um modelo que explique a formação da cor em amostras de quartzo de São José
da Safira, após submetê-las a tratamento (irradiação + aquecimento). Esse modelo auxiliou na
elaboração de um procedimento padrão que permitiu a obtenção de amostras de quartzo nas
tonalidades verde, amarelo e marrom.
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O quartzo natural sem cor é rotineiramente irradiado com raios gama e depois
aquecido para adquirir cores que vão desde o verde-oliva até o marrom-avermelhado,
passando entre essas cores por tons de amarelo-esverdeado e amarelo-marrom.
Após a irradiação, o quartzo se torna preto, devido ao teor de alumínio. Quando
aquecido (as temperaturas para aquecimento, feito ao ar, variam entre 180oC e 360oC), a partir
de uma certa temperatura ela começa a emitir uma luz azul e se observa o seu clareamento.
No final do processo resta a cor que se deseja obter. Observa-se que ela é função da dose.
Para doses baixas, abaixo de 100 kGy1, obtêm-se tonalidades esverdeadas. Para doses
intermediárias, entre 150 kGy e 200 kGy, obtêm-se tonalidades amareladas. Para doses
superiores a 250 kGy, obtêm-se tonalidades amarronzadas. A dose exata para se obter uma
certa cor depende da ocorrência do quartzo e deve ser ajustada para cada caso.
Com essa mudança na coloração da gema, há um aumento considerável no seu valor
econômico. O quartzo incolor possui um valor de aproximadamente 0,02 centavos de dólar
(0,02 ¢) o quilate. Após o tratamento, ele pode alcançar valores entre 50 e 100 centavos de
dólar (50 e 100 ¢) o quilate.
O quartzo é bastante utilizado pelas indústrias de alta tecnologia, principalmente na
microeletrônica, onde é utilizado em dispositivos piezoelétricos. Desde a Segunda Guerra
Mundial o Brasil tem se destacado no cenário internacional como um dos principais
fornecedores dessa matéria prima. Ele pode ser crescido em laboratórios ou pode ser
encontrado na natureza na forma de grandes cristais. Em Teófilo Otoni (Minas Gerais), foi
encontrado o maior monocristal de quartzo enfumaçado de que se tem notícia, pesando mais
de cinco toneladas (FRAZIER, 1998).
Cristais de quartzo são crescidos artificialmente em laboratórios por síntese
hidrotermal em autoclaves. Nesse processo (HALLIBURTON, 1989), duas zonas são criadas
dentro da autoclave. A zona mais baixa, que se encontra a uma temperatura maior, contém
fragmentos de quartzo natural (nutriente). Iwasaki et al (1989, 1990) verificaram que a
concentração de alumínio nas lascas de quartzo natural utilizadas como nutrientes na síntese
hidrotermal altera a morfologia dos monocristais sintéticos obtidos. Utiliza-se uma solução
alcalina ( NaOH ou 32CONa ) para dissolver o nutriente e transportá-lo para a parte superior
da autoclave (essa se encontra a uma temperatura menor que a parte inferior).
A cristalização ocorre em placas localizadas na parte superior. As temperaturas de
crescimento são próximas de 340-350ºC, a pressão dentro da autoclave está na faixa de
1 O gray (símbolo Gy) é a unidade padrão de dose absorvida da radiação ionizante, equivalente a um joule por quilograma (J.kg-1).
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1x108 – 1,3x108 Pa, o gradiente de temperatura é entre 5 e 30ºC e o tempo de crescimento dos
cristais varia entre 30 e 100 dias.
Cristais naturais e artificiais de quartzo possuem morfologias e espectros de absorção
no infravermelho distintos. Essas diferenças podem ser devidas às distintas condições de
crescimento (pressão, temperatura, taxa de crescimento, solução mineralizante, etc)
apresentadas por ambos. Portanto, é fácil compreender porque as linhas de absorção dos
espectros do quartzo natural não são transferidas para o quartzo sintético durante a síntese
hidrotérmica (BAHADUR, 1989; LIPSON et al, 1979).
O quartzo pode ser utilizado como dosímetro (BAHADUR, 2003; BANERJEE,
BφTTER-JENSEN e MURRAY, 1999; BENNY e BHATT, 2002; CORRECHER et al, 2003;
STOKES e FATTAHI, 2003), embora não seja eficiente quando submetido a ciclos de
irradiação e aquecimento (BANERJEE, 2001). A quantidade de luz que ele emite ao ser
aquecido, fenômeno conhecido como termoluminescência, é proporcional à dose recebida.
Essa quantidade pode ser medida em leitores de termoluminescência (CAMPOS, 1998;
LIMA, NAVARRO e VALÉRIO, 2002; MAURÍCIO, 1998). Entretanto, a temperatura onde a
termoluminescência do quartzo natural se inicia, que pode ser detectada a olho nu, também é
proporcional à dose recebida (LAMEIRAS e NUNES, 2004). Essa propriedade é importante
para o pedrista que utiliza serviços de irradiação de instituições que não informam a dose
aplicada. Pela observação da temperatura da termoluminescência, ele pode estimar a dose
aplicada em suas amostras e manter o controle do processo de coloração.
Modelos de defeitos pontuais e alterações causadas pelo processo de irradiação
continuam sendo estudados em cristais sintéticos devido à sua grande aplicação industrial.
Todavia, para o quartzo natural, tais investigações carecem de maior profundidade.
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2. A ESTRUTURA CRISTALINA DO QUARTZO
Os silicatos são materiais compostos principalmente por silício, oxigênio e alumínio.
Assim, a maior parte dos solos, rochas, argilas e areia se enquadram na classificação de
silicatos. Cada átomo de silício está ligado a quatro átomos de oxigênio, os quais estão
localizados nos vértices de um tetraedro. O átomo de silício está posicionado próximo ao
centro do tetraedro. Os alumino silicatos não são considerados iônicos, pois as ligações
interatômicas OSi − exibem um caráter covalente significativo (cerca de 50%), o que torna
essas ligações fortes e direcionais. (ASKELAND, 1994).
O quartzo é um mineral da classe dos silicatos, subclasse dos tectosilicatos2. A sua
estrutura cristalina é melhor representada pelo arranjo tetraédrico onde um átomo de Si é
cercado por quatro átomos de O ( −44SiO ). Cada tetraedro −4
4SiO divide os seus vértices,
formados por oxigênios, com tetraedros vizinhos. Isso dá a fórmula química 2SiO , um silício
para dois átomos de oxigênio, resultando numa rede cristalina eletricamente neutra. Dos
quatro oxigênios presentes em um tetraedro de 4SiO , dois formam ligações “longas” com o
átomo de silício central e os outros dois formam ligações “curtas”. A 298 K, a ligação longa
OSi − possui 1,612 0Α e a curta possui 1,606
0Α . O ângulo de ligação SiOSi −− é de
143,65º (LE PAGE, CALVERT e GABE; 1980). Há alguns arranjos diferentes desses
tetraedros, que são as estruturas polimórficas da sílica.
O quartzo apresenta características interessantes, tais como:
• Piezoeletricidade (desenvolve polaridade elétrica quando deformado e vice-versa);
• Triboluminescência (produz luz quando atritado com outro cristal de quartzo);
• Catodoluminescência (emite luz quando bombardeado por raios catódicos);
• Termoluminescência (emite luz quando aquecido após ser irradiado).
Existem, pelo menos, nove formas polimórficas para a sílica: quartzo, cristobalita,
tridimita, coesita, keatita e stishovita, conforme mostrado na TAB. 1 (DANA e DANA, 1962;
KLEIN, 2002). Cada uma dessas estruturas possui sua própria morfologia, dimensões de cela
unitária e energia de rede (KLEIN, 2002).
2 Tectosilicatos são minerais silicatos formados em redes tridimensionais geradas quando todos os
oxigênios presentes nos vértices em cada tetraedro 4SiO são compartilhados com tetraedros
adjacentes (CALLISTER, 2002).
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As principais ocorrências naturais da sílica são o quartzo alfa (estrutura muito
compacta e pouco simétrica), a tridimita alfa (estrutura mais simétrica e menos compacta) e a
cristobalita alfa (estrutura menos compacta e de maior simetria entre essas três formas). Essas
estruturas são relacionadas através de transformações reconstrutivas (reconstrutive
transformation), processo que requer considerável energia. Essas transformações são
caracterizadas pela quebra de ligações e deslocamento de átomos de suas posições originais
(vide FIG. 1). A lentidão e a elevada energia de ativação dessas reações, permitem que fases
metaestáveis existam por longos períodos. A temperatura e o tempo necessário para que essas
transformações aconteçam variam bastante, dependendo da taxa de aquecimento e da
presença de impurezas nos minerais. Qual estrutura polimórfica é estável em certa faixa de
temperatura, é determinada pelas energias livres de cada estrutura. A estrutura de menor
energia livre é a mais estável e assim, todas as outras tendem a se transformar nela.
Cada uma dessas três estruturas possui uma mudança alfa-beta, como mostrado pela
existência do quartzo α e β , tridimita α e β , e cristobalita α e β (vide TAB. 1). Nessas
transformações (displacive transformation) há deslocamento de átomos das posições originais
sem quebra de ligações (vide FIG. 1). Essas transformações são caracterizadas pela rapidez e
temperatura fixa em que ocorrem.
MINERAL SIMETRIADENSIDADE
(g/cm 3)ÍNDICE DE
REFRAÇÃO
Quartzo α Hexagonal 2,65 1,55
Quatzo β Hexagonal 2,53 1,54
Tridimita αMonoclínica ou Ortorrômbica
2,26 1,47
Tridimita β Hexagonal 2,22 1,47
Cristobalita α Tetragonal 2,32 1,48
Cristobalita β Isométrica 2,2 1,48
Keatita (sintético) Tetragonal 2,5 1,52
Coesita Monoclínica 3,01 1,59
Stishovita Tetragonal 4,35 1,81
TABELA 1
Estruturas polimórficas da Sílica (KLEIN, 2002)
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No presente trabalho apenas o quartzo α foi utilizado. Na TAB. 2 estão apresentadas
algumas características desse quartzo. A FIG. 2 apresenta a sua estrutura cristalina.
O quartzo apresenta uma densidade de átomos menor ao longo do eixo c (vide FIG. 2).
É por isso que impurezas estruturais deslocam dentro de sua estrutura ao longo desse eixo.
De acordo com Iwasaki et al (1991) e Guzzo (1991), os estados de impurezas
presentes no quartzo podem ser classificados como mostrado na FIG. 3.
Inclusões fluidas são porções do fluido mineralizante original que se encontram
aprisionadas na matriz do quartzo. Diversos trabalhos relatam a influência desses estados de
impureza em resultados analíticos de íons alcalinos (Ca, K e Na, principalmente) (GUZZO,
1991; IWASAKI et al, 1991).
FIGURA 1: A estrutura mostrada em a sofre transformações para as formas (b), (c) e (d)
(KINGERY, 1975)
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Inclusões sólidas são agregados de um ou mais minerais presentes no quartzo.
Acredita-se que essas inclusões são de ocorrência mínima, sobretudo no quartzo de alta
transparência (GUZZO, 1991).
Impurezas estruturais são elementos presentes na matriz do quartzo que não são
relacionados na fórmula química do mesmo ( 2SiO ). Segundo Guzzo (1991), o arranjo e o
deslocamento dessas impurezas dentro da estrutura cristalina provocam alterações nas
características e propriedades do quartzo.
CorVariável, dependendo das impurezas, inclusões e exposição à radiação ionizante e ao calor
Aparência Aspecto hialino
Transparência Variável
Hábitos cristalinos Variável, mas o mais comum é o hexagonal
Clivagem Muito fraca em três direções
Fratura Conchoidal
Dureza 7 Mohs
Densidade 2,65 g/cm3
TABELA 2
Propriedades do quartzo α
FIGURA 2: Estrutura cristalina do quartzo α . (estrutura da esquerda disponível em
<http://euch3i.chem.emory.edu/proposal/www.gl.ciw.edu/~finger/quartz.html> Acesso em 15 set. 2004;
estrutura da direita disponível em <http://www.metafysica.nl/crystals_rev.html> Acesso em 15 set. 2004).
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Segundo Aines e Rossman (1984), o hidrogênio presente em minerais pode ser
classificado como:
• H que é essencial na identidade e composição do mineral, ou seja, o H está presente na
fórmula química (micas);
• H está presente na forma de impureza estrutural (quartzo).
FIGURA 3: Classificação dos estados de impurezas do quartzo natural (IWASAKI et al, 1991)
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3. DEFEITOS CRISTALINOS DO QUARTZO ASSOCIADOS AO ALUMÍNIO E
TERMOLUMINESCÊNCIA
Quer seja natural ou artificial, o quartzo quase sempre possui um pequeno teor de
alumínio, em geral abaixo de 100 ppm. Esses átomos de alumínio podem ocupar a posição do
silício na rede cristalina ou ocupar uma posição intersticial. Quando na posição do silício, será
usada a notação SiAl e iAl para a posição intersticial.
O alumínio substitucional se encontra no interior de um tetraedro, com um oxigênio
em cada um dos seus vértices. Ele possui valência 3+, enquanto que o silício tem valência 4+.
Assim, é necessário que haja um compensador de carga adjacente ao alumínio para que o
balanço de cargas seja mantido. Exemplos de íons que fazem esse papel de compensadores de
carga no quartzo são +H (centro 04 ]/[ +HOAlSi ), +Li (centro 0
4 ]/[ +LiOAlSi ), +Na (centro
04 ]/[ +NaOAlSi ) e +K (centro 0
4 ]/[ +KOAlSi ). Uma vacância eletrônica pode ser criada no
orbital p não ligante de um íon oxigênio adjacente ao alumínio substitucional (centro 0
4 ]/[ +hOAlSi ). Essa notação foi primeiramente proposta por Weil (1984).
Há pouca referência na literatura sobre o alumínio intersticial no quartzo. O único
trabalho encontrado é de 1960 (COHEN, 1960). Esse autor afirma que o alumínio nessa
condição não causa cor no quartzo.
Podemos imaginar a presença de três defeitos −][ 4OAlSi nas proximidades de um iAl
ou então três hidroxilas. De qualquer forma, esses arranjos devem ser raros, devido às
distorções que eles causam na rede cristalina do quartzo.
3.1 CENTRO 04 ]/[ +HOAlSi
O centro 04 ]/[ +HOAlSi (vide FIG. 4) consiste de um próton intersticial ligado a um
íon oxigênio adjacente ao alumínio substitucional, formando uma hidroxila, que pode ser
observada por espectrofotometria na região do infravermelho.
Kats (1962) determinou diversas bandas de absorção na região espectral de 3600 a
3200 cm-1. Através de medidas em baixas temperaturas, ele atribuiu as bandas de absorção a
3371 e 3311 cm-1 (respectivamente 3383 e 3318 cm-1 na temperatura ambiente), presentes no
espectro do quartzo natural, e as bandas a 3367 e 3306 cm-1, presentes no espectro do quartzo
sintético, ao defeito 04 ]/[ +HOAlSi .
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Diferentemente do quartzo natural, as bandas de absorção no infravermelho
características do centro 04 ]/[ +HOAlSi não são observadas no quartzo sintético (BROWN e
KAHAN, 1975). Essas bandas somente são observadas se esses cristais são submetidos à
radiação ionizante em temperaturas superiores a 200 K ou quando são submetidos ao processo
de eletrodifusão em atmosfera controlada. O centro 04 ]/[ +HOAlSi é formado da dissociação
dos centros 04 ]/[ +MOAlSi ( +M representa um íon metálico alcalino) em conseqüência da
troca dos íon alcalinos por +H (BAHADUR et al, 1989; HALLIBURTON et al, 1981).
Sibley et al (1979) estenderam o estudo das bandas a 3306 e 3367 cm-1, monitorando-
as após sucessivos ciclos de irradiações e aquecimentos. Eles observaram que, embora
irradiações à temperatura ambiente introduzem essas duas bandas no quartzo sintético, uma
subseqüente irradiação a 77 K destrói ambas. Os autores observaram que quando o quartzo
irradiado a 77 K é aquecido a temperaturas superiores a 200 K, as duas bandas reaparecem
com intensidades aproximadamente iguais às observadas após a irradiação à temperatura
ambiente. Durante o aquecimento, entre 230 e 270 K, há uma grande mudança de intensidade
dessas duas bandas de absorção. A banda em 3367 cm-1 continua a crescer enquanto que a
banda a 3306 cm-1 diminui de intensidade. Sibley et al (1979) propuseram que essas bandas
surgem de grupos −OH presentes em dois sítios diferentes, mas intimamente correlacionados
e que há uma transferência de hidroxilas de um sítio para outro durante essa faixa de
temperatura.
Ao contrário do quartzo sintético, o quartzo natural apresenta centros 04 ]/[ +HOAlSi
no estado natural. As bandas de absorção a 3371 e 3311 cm-1 aumentam de intensidade
quando esses cristais são irradiados à temperatura ambiente (BAHADUR, 1989; BROWN e
KAHAN, 1975; KATS, 1962). Acredita-se que o aumento da intensidade dessas bandas seja
devido à troca de íons compensadores de carga ( +M por +H ).
FIGURA 4: representação esquemática do centro 04 ]/[ +HOAlSi (HALLIBURTON et al, 1981).
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Sabe-se que muitos dos prótons presentes no quartzo se encontram combinados com
átomos de oxigênio, originando grupos −OH . Esses grupos podem ser facilmente dissociados
quando o quartzo é irradiado ou aquecido a elevadas temperaturas. Quando esses grupos −OH são dissociados, prótons são liberados. Eles difundem na rede cristalina do quartzo à
procura de novos sítios estáveis. A grande variedade de sítios que possuem grupos −OH
explica o grande número de bandas de absorção na região do infravermelho que ainda não
foram correlacionados a sítios específicos. O quartzo natural possui uma faixa de absorção no
infravermelho de 3200 a 3600 cm-1 (BAHADUR 1998). Essas bandas são termicamente
sensíveis e assim precisam ser estudadas a baixas temperaturas (espectros com bandas mais
definidas).
3.2 CENTRO ]º/[ 4+hOAlSi
O centro 04 ]/[ +hOAlSi (vide FIG. 5) é formado quando o quartzo é exposto à radiação
ionizante e um elétron é arrancado de um oxigênio adjacente ao alumínio substitucional,
resultando em um elétron desemparelhado nesse átomo de oxigênio (O’BRIEN, 1955). Esse
desemparelhamento eletrônico gera uma intensa banda de absorção na região visível do
espectro eletromagnético. O centro 04 ]/[ +hOAlSi pode ser monitorado por meio da
Ressonância Eletrônica Paramagnética (EPR) em baixas temperaturas (BAHADUR e
PARSHAD, 1985).
Conforme proposto por Nuttall e Weil (1981), o estado fundamental para o centro 0
4 ]/[ +hOAlSi corresponde à localização do buraco em um dos dois átomos de oxigênio que
formam longas ligações com o átomo de alumínio central. Entretanto, Schnadt e Schneider
(citados por HALLIBURTON, 1989) propuseram um modelo onde apenas 0,03eV são
FIGURA 5: representação esquemática do centro ]º/[ 4+hOAlSi (HALLIBURTON et al, 1981)
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necessários para mover o buraco de um oxigênio que forma uma ligação longa com o átomo
de silício para um átomo de oxigênio que forma uma ligação curta. Assim, à temperatura
ambiente se espera que esse buraco salte entre todos os átomos de oxigênio adjacentes ao
silício.
Markes e Halliburton (1979) e Halliburton et al (1981) estudaram as condições de
estabilização dos centros 04 ]/[ +hOAlSi no quartzo sintético irradiado em diferentes
temperaturas. Verificou-se que durante a irradiação centros 04 ]/[ +MOAlSi são destruídos e
centros 04 ]/[ +hOAlSi e 0
4 ]/[ +HOAlSi são formados.
Griffiths, Owen e Ward (1955) verificaram que a intensidade das linhas dos espectros
de EPR são proporcionais à coloração fumê produzida pela radiação ionizante. Koumvakalis
(1980) notou que a banda de absorção óptica (aproximadamente a 500 nm) observada em
cristais irradiados, correlaciona-se com o sinal de ressonância paramagnética do centro 0
4 ]/[ +hOAlSi . Entretanto, Nassau e Prescott (1977 e 1978) indicaram que não existe
correlação direta entre os centros 04 ]/[ +hOAlSi e a absorção óptica observada no quartzo
fumê.
Mondragon et at (1988) estudaram a dependência da taxa de dose na formação dos
centros 04 ]/[ +hOAlSi e concluíram que quanto maior é a taxa de dose, maior será a
concentração de centros 04 ]/[ +hOAlSi no material. Sibley et al (1979) propuseram que
subseqüentes irradiações a baixas temperaturas (77 K) de cristais de quartzo irradiados à
temperatura ambiente geram uma maior concentração de centros 04 ]/[ +hOAlSi .
3.3 CENTRO ]º/[ 4+MOAlSi
Os centros 04 ]/[ +MOAlSi (onde +M representa um íon alcalino) são formados
quando um íon alcalino ocupa um sítio intersticial próximo ao íon alumínio substitucional. Os
centros 04 ]/[ +MOAlSi não possuem bandas de absorção no infravermelho e não são
paramagnéticos. Apesar disso, esses centros podem ser monitorados através de medidas de
perda acústica ou de perda dielétrica em função da temperatura. A FIG. 6 mostra o centro 0
4 ]/[ +MAlO .
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Os defeitos 04 ]/[ +MOAlSi não são afetados quando o quartzo é irradiado a
temperaturas inferiores a 200 K (MARKES e HALLIBURTON, 1979). A destruição dos
defeitos 04 ]/[ +MOAlSi só é possível quando há energia térmica suficiente para o
deslocamento dos íons alcalinos (HALLIBURTON et al, 1981). Porém, o hidrogênio
intersticial pode ser deslocado pela irradiação a qualquer temperatura (SIBLEY et al,1979;
HALLIBURTON et al, 1981).
3.4 CENTRO ][ OHM −
Algumas bandas de absorção observadas no espectro de infravermelho do quartzo
ainda não tiveram a origem definida. Kats (1962) presume que esses picos de absorção são
conseqüência da associação entre íons alcalinos ( +Li , +Na e +K ) e radicais −OH . Assim, há
formação de centros ][ OHM − .
Kats (1962) observou que as posições de algumas linhas de absorção no espectro de
infravermelho dependem do íon alcalino preponderante na estrutura cristalina do quartzo. Ele
observou que linhas específicas observadas em cristais de quartzo que possuíam o íon +Li
como compensador de carga majoritário, eram deslocadas quando esses cristais eram
submetidos a eletrodifusões com +Na e +K . As principais bandas de absorção associadas aos
centros OHLi − , OHNa − e OHK − ocorrem respectivamente a 3478, 3453 e 3585 cm-1.
Bahadur (1989) verificou a redução da banda de absorção associada ao +Li no quartzo
natural após irradiá-lo à temperatura ambiente. Ele verificou que com exceção da banda
associada ao defeito 04 ]/[ +HOAlSi , todas as demais bandas sofrem um decréscimo de
intensidade. Provavelmente, a irradiação provoca dissociações dos centros ][ OHM − . Os
prótons liberados migram através da rede cristalina do quartzo até que se recombinam e
formam centros 04 ]/[ +HOAlSi .
FIGURA 6: representação esquemática do centro ]º/[ 4+MOAlSi (HALLIBURTON et al, 1981)
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3.5 GRUPOS OH
Segundo Guzzo (1991), as formas de incorporação da associação HO − na estrutura
cristalina do quartzo são:
• Íons −OH associados a impurezas metálicas substitucionais ou intersticiais
( 04 ]/[ +HOAlSi , ][ OHM − );
• Moléculas de OH 2 ;
• Íons −OH presos diretamente ao Si formando centros ][ OHSi − ;
• Centros OH −]4[ , formados pela substituição do Si por quatro prótons +H .
Aines e Rossman (1984) relataram que o espectro de infravermelho do quartzo é
composto por bandas finas sobrepostas a uma banda larga de absorção. As bandas finas e
médias são associadas aos centros 04 ]/[ +HOAlSi , ][ OHM − e à vibração OSi − (KATS,
1962). Não se sabe qual forma de incorporação de grupos OH é responsável pela banda larga
de absorção. Aines, Kirby e Rossman (1984) sugerem que essa banda larga é devida à
presença de OH 2 molecular na estrutura cristalina do quartzo. Aines e Rossman (1984)
afirmam que a intensidade dessa banda larga está relacionada com a temperatura e velocidade
de crescimento dos cristais. Guzzo (1991) afirma que a diferentes formas de incorporação do −OH afetam as propriedades físicas dos cristais de quartzo.
3.6 TERMOLUMINESCÊNCIA
Alguns materiais, quando aquecidos, após serem expostos à radiação ionizante,
emitem luz. Esse fenômeno é conhecido como termoluminescência. O material que exibe essa
propriedade é denominado material termoluminescente.
A termoluminescência (TL) é um dos processos que são conhecidos como Fenômenos
Termicamente Estimulados. São exemplos de processos que fazem parte desse conjunto:
- Capacitância Termicamente Estimulada (TSCap);
- Polarização Termicamente Estimulada (TSPC);
- Condutividade Termicamente Estimulada (TSC);
- Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC).
Cada um desses fenômenos pode ser descrito através de dois estágios (MCKEEVER
et al, 1995). O estádio I consiste na absorção de energia pelo sistema, levando-o do equilíbrio
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para um estado metaestável. O estágio II se baseia na relaxação termicamente estimulada do
sistema para o equilíbrio. A FIG. 7 ilustra esses estágios.
Geralmente, os materiais termoluminescentes são policristais iônicos (CAMPOS,
1998). Esses materiais se caracterizam pela banda de valência repleta de elétrons e a banda de
condução vazia. Entre essas duas bandas, existe uma larga faixa de estados energéticos não
permitidos aos elétrons, denominada banda proibida.
Quando esses materiais são expostos à radiação ionizante, pares de elétrons e buracos
eletrônicos são criados. Essas entidades eletrônicas possuem funções de onda que não são
relacionadas a nenhum sítio específico da rede. Portanto, elas são livres para migrar através
do material. O processo de migração continua até que haja recombinação ou aprisionamento
dessas entidades em estados metaestáveis de energia, localizados na banda proibida,
denominados armadilhas.
O posterior aquecimento da amostra gera uma intensa propagação de fônons através da
rede cristalina do material. Os elétrons, ou buracos, conforme o tipo de armadilha, absorvendo
energia proveniente dos fônons, escapam das armadilhas, indo os elétrons para a banda de
condução e os buracos para a banda de valência.
Caso as armadilhas dos elétrons sejam mais rasas (menor energia de ativação), esses
escapam das mesmas, saltam para banda de condução e se movimentam até que se
recombinam com buracos armadilhados, podendo haver emissão de luz. No caso das
armadilhas dos buracos serem mais rasas, eles saltam para a banda de valência e se
movimentam através do cristal até a recombinação com elétrons armadilhados, podendo
também haver emissão de luz. Ainda é possível que haja liberação simultânea de elétrons e
buracos. Nessa situação, a recombinação acontece em centros de recombinação, ou centros de
luminescência, quando, então, ocorre a emissão de luz. A FIG. 8 apresenta um modelo
simplificado desse fenômeno.
FIGURA 7: diagrama esquemático dos estágios da termoluminescência
(MCKEEVER et al, 1995)
31
A curva de emissão representa a intensidade da luz emitida pelo material
termoluminescente em função da temperatura e consiste, em geral, de vários picos. Cada um
deles está associado com uma determinada armadilha de energia de ativação E . A FIG. 9
exibe a curva de emissão do LiF .
FIGURA 8: representação esquemática da termoluminescência (CAMPOS, 1998)
FIGURA 9: Curva de emissão do )100(TLDLiF (CAMPOS, 1998 )
32
A probabilidade por segundo ( )(tp ) de que a energia fornecida a um dado elétron seja
suficiente para que esse escape de uma determinada armadilha é dada por (MCKEEVER et al,
1995):
)/exp()()( kTETsTp −= (1)
E : representa a energia de ativação da armadilha;
T : temperatura na qual se encontra o material;
)(Ts : fator de freqüência;
k : constante de Boltzmann.
Segundo McKeever et al (1995) e Campos (1998), a presença de picos nas curvas de
emissão de materiais termoluminescentes está relacionada com a probabilidade de escape dos
portadores de carga. Quando o material se encontra em uma temperatura menor que a de um
dado pico, poucos portadores de carga conseguem escapar de armadilhas e a luz emitida é
fraca. À medida que a temperatura aumenta, a probabilidade de escape aumenta, causando um
aumento na emissão, que é máxima na temperatura do pico. A intensidade decresce, em
seguida, devido à redução de portadores de carga armadilhados.
Excitons são pares elétron-buraco que se movem através da rede do material antes que
a recombinação entre eles ocorra (MCKEEVER et al, 1995). Essa migração pode resultar na
formação de centros H e F. Um bom exemplo, é um material iônico do tipo −+ XM no qual
um buraco é aprisionado por dois íons −X adjacentes, resultando na formação de uma
molécula −2X . A repulsão coulombiana entre essa molécula e o elétron causa o movimento da
molécula −2X . Esse movimento produz sucessivas colisões entre essa molécula e íons −X ,
implicando na formação de um átomo neutro intersticial ºX (centro H) e elétron aprisionado
numa vacância de um íon −X (centro F). Alguns picos presentes na curva de emissão
termoluminescente do quartzo são atribuídos a excitons (ITOH, STONEHAM e
STONEHAM, 2002; MCKEEVER et al, 1995; SONG, JÓNSSON e CORRALES, 2000).
O subseqüente aquecimento da amostra gera recombinações entre os centros H e F.
Esse processo pode ser acompanhado pela emissão de fótons termoluminescentes. Assim,
TLfótonsperfeitaredeHF +⇔+ (2)
33
A probabilidade que essa reação ocorra a uma dada temperatura T é descrita por uma
equação similar à equação (1). Portanto, para temperaturas elevadas, a probabilidade que
ocorram recombinações entre centros H e F, é grande.
Segundo McKeever et al (1995) e Campos (1998), para que um material possa ser
utilizado como dosímetro termoluminescente (TLD), esse deve possuir características tais
como:
• Alta concentração de elétrons ou buracos;
• Alta eficiência de emissão de luz associada com o processo de recombinação entre
elétrons e buracos;
• Estabilidade de armadilhamento dos elétrons ou buracos à temperatura em que o
material será utilizado (decaimento térmico);
• Uma curva de emissão simples para maior facilidade de operação e interpretação da
leitura;
• Fácil tratamento térmico de reutilização;
• Uma resposta que varie linearmente para um amplo intervalo de dose absorvida;
• Alta sensibilidade;
• Resistência a diversos fatores ambientais tais como umidade, luz, poluição, solventes
orgânicos e gases;
• Baixo custo;
• Facilidade de obtenção.
Obviamente, é difícil encontrar um material que possua todas as características
citadas. Assim, são utilizados materiais que possuam um compromisso razoável entre essas
propriedades. Dentre os materiais mais utilizados como dosímetros termoluminescentes, é
possível citar: PCuMgLiF ,,: ; COAl :32 ; MnCaF :2 ; DyCaF :2 ; MnCaSO :4 .
Sabe-se que a presença de defeitos na rede do material antes da irradiação proporciona
um aumento na sua capacidade de armazenamento de energia (MCKEEVER et al,1995). Isso
é devido às armadilhas eletrônicas que são criadas por esses defeitos e à estabilização dos
centros H e F que eles proporcionam. Por esse motivo, materiais TLD são intencionalmente
impuros.
Kiyak e Bulus (2001) desenvolveram um método de determinação do valor da energia
de ativação da(s) armadilha(s) associada(s) a um dado pico de luminescência. De acordo com
34
esse método, é possível relacionar a temperatura na qual o pico é observado à energia de
ativação da(s) armadilha(s) pela seguinte equação:
−=
Esk
kTET
m
m lnln2
β (3)
mT : representa a temperatura do pico de termoluminescência;
β : taxa de aquecimento da amostra;
s : fator de freqüência;
k : constante de Boltzmann.
Assim, o coeficiente angular da reta )/ln( 2 βmT x mT/1 fornece a energia de ativação.
Conforme observado pelos autores, quanto maior é a taxa de aquecimento da amostra, maior é
a temperatura onde o pico é observado (vide FIG. 10).
A luminescência apresentada pelo quartzo quando aquecido após ser irradiado tem
sido objeto de estudo de vários pesquisadores (ALONSO et al, 1983; DE LIMA, NAVARRO
e VALÉRIO, 2002; FRANKLIN, PRESCOTT e SCHOLEFIELD, 1995; JANI et al, 1983;
MIALLIER et al, 2001; SANTOS, DE LIMA e VALÉRIO, 2001; SAWAKUCHI e OKUNO,
2003; SPOONER e FRANKLIN, 2002; STOKES e FATTAHI, 2003).
Itoh, Stoneham e Stoneham (2002) propuseram um modelo que explica de maneira
satisfatória os diferentes picos de termoluminescência e de luminescência oticamente
estimulada (OSL) observados no quartzo. Eles observaram a luminescência do quartzo
durante e após a irradiação do mesmo. Segundo esses autores, a termoluminescência do
quartzo irradiado à temperatura ambiente consiste de três principais picos localizados
respectivamente em 110, 325 e 370ºC.
FIGURA 10: Curvas de emissão de amostras de quartzo irradiadas com uma dose de 0,5 kGy e
aquecidas a uma taxa de (a) 3,1ºC/s, (b) 7,1ºC/s e (c) 9,4ºC/s. (KIYAK e BULUS, 2001)
35
4. PRINCÍPIOS BÁSICOS DAS TÉCNICAS ANALÍTICAS UTILIZADAS
4.1 ESPECTROSCOPIA UV-VIS
A energia total de um sistema molecular é dada pela soma das energias de ligação ou
eletrônica, rotacional, vibracional e translacional de seus átomos (GUZZO, 1991). Assim, a
energia total de uma molécula pode ser escrita como:
RotacionalnalTranslacioVibraçãoEletrônicaTotal EEEEE +++= (4)
À temperatura ambiente, os sistemas moleculares se encontram no estado fundamental
eletrônico e vibracional (KELLNER, 1998). A interação com o apropriado tipo de radiação
eletromagnética gera transições nos estados eletrônico, vibracional e rotacional (vide
FIG. 11). Assim, a absorção de luz na região ultravioleta-visível (UV-VIS) do espectro
eletromagnético produz modificações na energia eletrônica das moléculas através da
passagem de elétrons de valência do estado fundamental para estados excitados.
A energia absorvida ( E∆ ) por uma molécula em uma transição eletrônica, o
comprimento de onda (λ ) e a freqüência (υ ) da radiação incidente que produz essa transição
se relacionam através da expressão:
λυ hchE ==∆ (5)
FIGURA 11: Representação esquemática das transições nos estados eletrônico, vibracional e rotacional
(KELLNER et al, 1998)
36
onde h é a constante de Planck (6,63×10-34 J.s) e c é a velocidade da luz (3×108 m/s).
O espectro resultante de uma única transição eletrônica deveria corresponder a apenas
uma linha discreta, pois segundo a Física Quântica, a energia absorvida é quantizada.
Entretanto, bandas de absorção são observadas ao invés de linhas. De acordo com Silverstein
(1979), isso ocorre porque os níveis rotacionais e vibracionais são sobrepostos à absorção
eletrônica.
As principais características de uma banda de absorção são a sua posição e a sua
intensidade. A posição fornece o comprimento de onda, cuja energia é a necessária para que a
transição eletrônica ocorra. A intensidade de absorção depende de dois fatores
(SILVERSTEIN, 1979):
- A probabilidade de interação entre a radiação eletromagnética incidente e o
meio;
- A polaridade do estado excitado.
As intensidade das bandas de absorção são apresentadas em transmitância (T ) ou
absorbância ( A ). A transmitância é definida como sendo a razão entre a energia radiante
transmitida através da amostra ( I ′ ) e a energia radiante incidente ( 0I ):
0IIT′
= (6)
A absorbância é definida como:
TA log−= (7)
Um espectrofotômetro convencional é composto por fonte de radiação,
monocromador, fotômetro, câmara de amostra e detector (vide FIG. 12). O espectro UV-VIS
é obtido medindo-se a intensidade de absorção de luz pela amostra através de uma faixa de
comprimentos de onda.
37
4.2 ESPECTROSCOPIA NO INFRAVERMELHO
A Espectroscopia no Infravermelho pertence ao grupo de técnicas espectroscópicas de
vibração molecular, juntamente com a Espectroscopia Raman, Espectrometria de Massa,
Cromatografia e Espectroscopia de Ressonância Magnética Nuclear (RMN). Essas técnicas
formam a base da análise orgânica moderna (KELLNER et al, 1998).
A utilização da Espectroscopia no Infravermelho permite obter informações tais como:
• Identificação qualitativa da estrutura de materiais;
• Teores de componentes em uma mistura.
A radiação infravermelha corresponde à porção do espectro eletromagnético situada
entre as regiões do visível e das microondas. Quando absorvida, a radiação infravermelha se
converte em energia de vibração molecular. O comprimento de onda de absorção depende da
massa relativa dos átomos, das constantes das forças de ligação e da simetria da mesma.
Assim, o comprimento de onda de absorção é uma propriedade intrínseca de cada molécula
(GUZZO, 1991).
Existem dois tipos de vibrações moleculares: as vibrações axiais e as angulares. As
vibrações axiais correspondem a movimentos de estiramento ao longo do eixo de ligação
entre átomos de tal forma que a distância interatômica aumenta e diminui alternadamente. As
vibrações angulares são caracterizadas pela variação nos ângulos das ligações, seja de um
grupo de átomos em relação à molécula, ou seja internamente nesse grupo de átomos.
(GUZZO, 1991).
Dois pré-requisitos necessários para que haja absorção de luz na região do
infravermelho por uma molécula são:
FIGURA 12: Figura esquemática de um espectrofotômetro de feixe duplo (PETERS et al, 1974)
38
• A energia da radiação eletromagnética incidente deve coincidir com a diferença de
energia entre o estado vibracional fundamental e o estado excitado da molécula (vide
FIG. 13);
• A molécula a ser investigada deve ser polar, de tal forma que a radiação
eletromagnética incidente provoque alterações no dipolo elétrico da mesma.
Assim, grupos −OH são eficientes absorvedores de luz na região do infravermelho
devido à ligação altamente polar resultante da associação entre oxigênio e hidrogênio.
4.3 ESPECTROSCOPIA DE ABSORÇÃO ATÔMICA (AAS)
Em 1955, Alan Walsh, estudando as linhas Fraunhofer do espectro solar, concluiu que
o fenômeno responsável pelas mesmas poderia ser utilizado na determinação da composição
de materiais. Walsh construiu um espectrofotômetro simples e conseguiu bons resultados.
Desde então, a técnica se desenvolveu muito.
A AAS se baseia na absorção de radiação por átomos livres, usualmente no estado
fundamental. Selecionando-se o comprimento de onda para um dado elemento que
corresponde à diferença de energia entre o estado fundamental e os estados excitados, a
absorção da radiação causará a passagem de elétrons do estado fundamental para estados
excitados. O valor da absorção está relacionado com a concentração de átomos no estado
fundamental, e, portanto, à concentração do elemento. Medindo-se a fração da radiação
absorvida, uma determinação quantitativa do elemento pode ser feita. Portanto, a
Espectroscopia de Absorção Atômica utiliza a propriedade dos átomos de absorver fótons
FIGURA 13: Diagrama esquemático da transição entre o estado vibracional fundamental e
excitado de uma molécula após absorção de fóton com comprimento de onda na região do
infravermelho.
39
com comprimentos de onda bem definidos (cada elemento absorve um comprimento de onda
bem definido).
O processo de absorção foi representado por Pinto (1996) na seguinte forma:
*XhX →+ υ (8)
onde *X representa a espécie excitada. A espécie excitada possui um tempo de vida muito
curto, retornando ao estado fundamental, logo após a absorção. A energia absorvida pode ser
convertida em energia química, térmica ou radiante, segundo a equação (PINTO, 1996):
energiaXX +→* (9)
Um espectrômetro de absorção atômica possui uma fonte de radiação (geralmente
utiliza-se uma lâmpada de cátodo oco, específica para cada elemento), um atomizador, um
monocromador, um detector e um computador (vide FIG. 14).
Na AAS, a amostra é vaporizada e esse vapor, submetido a uma excitação térmica,
apresenta uma população de átomos no estado fundamental maior que a de átomos em estados
excitados, pois as fontes de excitação (chamas) utilizadas não atingem uma temperatura capaz
de provocar grande excitação (KELLNER et al, 1998).
Quando um feixe de intensidade 0I passa através de um percurso óptico b , o feixe
remanescente possui intensidade I . Supondo que todos os átomos do meio estejam no estado
fundamental:
FIGURA 14: Diagrama esquemático com os principais componentes de um espectrômetro de
absorção atômica (KELLNER et al, 1998)
40
abceII −= 0 (10)
onde a representa a absortividade molar característica de cada elemento e c é a concentração
do elemento no meio absorvente. Logo, é possível obter o teor do elemento de interesse em
determinada amostra a partir da equação (10).
Segundo Kellner et al (1998), o espectro de absorção é mais simples do que o espectro
de emissão. Além disso, diferentemente da Espectroscopia de Emissão Atômica, na AAS a
probabilidade de ocorrer interferências devido a coincidências de linhas é menor.
4.4 ESPECTROSCOPIA DE EMISSÃO ATÔMICA POR PLASMA
INDUTIVAMETNE ACOPLADO (ICP/AES)
A Espectroscopia de Emissão Atômica é um dos métodos analíticos mais antigos. A
primeira observação de emissão utilizando uma chama de álcool foi feita por Brewster,
Herschel, Talbot e Foucault no começo do século XIX . Os resultados obtidos foram a base
do trabalho de Bunsen e Kirchhoff que pode ser considerado como o nascimento da
Espectroscopia de Emissão Atômica. O grande sucesso da ICP/AES é devido à universalidade
que ela possui e ao elevado número de elementos que podem ser analisados (KELLNER et al,
1998).
A ICP/AES é baseada na produção e detecção do espectro emitido durante o processo
de relaxação sofrido por elétrons que passam de estados excitados para o estado fundamental
de energia, emitindo o excesso de energia na forma de fótons. O espectro de emissão é
característico para cada elemento. Logo, é possível determinar tanto qualitativamente quanto
quantitativamente os elementos presentes num dado material. A figura 15 mostra como
ocorrem os processos de absorção e emissão de energia.
Figura 15: Esquema dos processos de excitação e emissão, onde 123 λλλ >> (PINTO, 1996)
41
Análise quantitativa é possível uma vez que a intensidade da linha de emissão pode ser
relacionada à concentração do elemento. A intensidade I da linha é proporcional:
1. À diferença de energia entre o estado excitado, mE , e o estado fundamental, 0E .
2. À população de elétrons, mn , no estado excitado.
3. Ao número de transições possíveis entre mE e 0E por unidade de tempo. Esse valor é
expresso pela probabilidade de transição A , definida por Einstein.
Logo, I pode ser escrita como:
mm nAEEI .).( 0−≈ (11)
A relação entre as populações de elétrons dos vários níveis energéticos é descrita pela
lei de Boltzmann. Considerando a população mn e kn para os níveis mE e kE ,
respectivamente, segundo Boltzmann:
)/exp(.)/exp(.
kTEgkTEg
nn
kk
mm
k
m
−−
= (12)
onde k é a constante de Boltzmann, T é a temperatura da amostra e g é o peso estatístico de
cada nível. Desse modo, segundo Boltzmann, a população de elétrons para um nível qualquer
é proporcional à exponencial de )( E− . Logo, a população decresce rapidamente quando E
aumenta. A passagem de elétrons para níveis excitados de energia é obtida aquecendo-se a
amostra a elevadas temperaturas.
O processo pelo qual átomos gasosos são produzidos na chama pode ser resumido
como (PINTO, 1996):
• Evaporação do solvente, resultando num composto sólido:
• Vaporização do sólido e dissociação em seus átomos, que, inicialmente, estarão
no estado fundamental:
42
• Alguns átomos podem ser excitados pela energia térmica da chama a níveis de
energia mais elevados, atingindo uma condição que permita que esse excesso de
energia seja emitido na forma de fótons:
Na figura 16, são mostrados os componentes básicos do equipamento utilizado na
Espectroscopia de Emissão Atômica.
Figura 16: Esquema dos componentes de um Espectrômetro de Emissão Atômica
(PINTO, 1996)
43
4.5 ANÁLISE POR ATIVAÇÃO NEUTRÔNICA (AAN)
A Análise por Ativação Neutrônica foi originalmente utilizada em 1936 por Von
Hevesy e Levi (ADANS e CROUTHAMEL, 1970) para detectar a atividade de disprósio e
európio em misturas de terras-raras. Eles observaram que a atividade induzida na amostra
decrescia com diferentes constantes de decaimento )(λ em matrizes distintas. Hevesy e Levi,
a partir dessa observação, sugeriram que esse método poderia ser usado para determinar a
composição de diversos materiais.
A AAN é baseada na conversão do nuclídeo estável )(A em um radioanuclídeo )(B ,
chamado radionuclídeo indicador, por meio de uma reação nuclear (KELLNER, 1998). A
reação é induzida quando o material é exposto à radiação ionizante )(x , que pode ser
nêutrons, partículas carregadas (partículas alfa, prótons, dêuterons, trítios e He3 ) ou raios
gama. Essa reação nuclear pode ser representada como:
QyBCxA ++→→+ (13)
ou
ByxA ),( (14)
onde y é um fóton ou partícula emitida (próton, partícula alfa ou nêutron), C é o núcleo
composto formado e Q fornece o montante de energia liberado ou absorvido na reação (vide
figura 17). Se Q é positivo, a reação é exotérmica. Se Q é negativo, a reação é endotérmica.
Figura 17: Esquema de uma reação ),( γn . Figura disponível em:
<http://www.elementalanalysis.com/naa> Acesso em 20 nov. 2004
44
O mecanismo predominante usado nas reações nucleares pela AAN é via formação de
núcleo composto. A meia-vida desse núcleo é cerca de 10-20 – 10-14 segundos. Essa reação
consiste de duas etapas: a captura da partícula incidente para formar o núcleo composto em
estado excitado, o decaimento ou relaxação do núcleo composto via emissão de um ou mais
raios gama (raios gama característico) ou via emissão de uma partícula.
O núcleo composto pode decair de diversos modos com probabilidades diferentes:
Portanto, a absorção de uma partícula incidente pelo núcleo )(A pode resultar em
diferentes reações nucleares. Segundo Kellner et al (1998), o número de reações possíveis
cresce com o aumento da energia cinética da partícula incidente.
Os reatores nucleares, por produzirem um fluxo de nêutrons da ordem de 1012 nêutrons
cm-2s-1, possibilitaram o emprego da AAN como técnica analítica de alta sensibilidade.
Assim, o método assumiu importante papel na determinação de elementos traços em uma
ampla variedade de materiais.
A energia dos nêutrons produzidos em um reator é bastante variada. Em geral, na
AAN são utilizados nêutrons com energias inferiores a 0,5 eV (região de energia dos nêutrons
térmicos), pois a maioria dos elementos apresentam secção de choque maior nessa faixa de
energia (SOARES, 2005). A secção de choque nuclear é a probabilidade de interação entre o
núcleo e a partícula incidente (TAUHATA et al, 1999).
Por serem eletricamente neutros, os nêutrons não são afetados pelos campos
eletrostáticos produzidos pela eletrosfera e pelo núcleo atômico. Seu grande poder de
penetração se deve a essa neutralidade elétrica (TURNER, 1995).
A equação fundamental da AAN pode ser expressa como (PINTO, 1996):
)1()()(6023,0
0
tedvvvM
maA λφσ −
∞
−
= ∫ (15)
onde:
→A atividade no final da irradiação,
→M massa atômica do elemento em estudo,
45
→a abundância isotópica do isótopo radioativo,
→m massa do elemento analisado presente na amostra,
→v velocidade do nêutron incidente,
→σ secção de choque,
→φ fluxo de nêutrons,
→λ constante de decaimento,
→t tempo de irradiação da amostra.
A equação (15) indica uma relação de proporcionalidade direta entre a atividade da
amostra ao término da irradiação )(A e a massa do elemento químico de interesse )(m
presente na amostra. A massa atômica )(M , a abundância isotópica )(a e a constante de
decaimento )(λ são constantes conhecidas para cada isótopo. O tempo de irradiação )(t e a
atividade da amostra )(A são parâmetros medidos experimentalmente.
O método convencional utilizado na AAN é baseado na comparação da atividade da
amostra com a atividade de vários padrões para cada elemento a ser analisado. Segundo
Kolotov e De Corte (2004), esse método apresenta desvantagens, tais como:
• Elevado tempo de preparação e análise;
• Limitado número de padrões que podem ser utilizados;
• Inviabilidade de detecção de elementos não esperados;
• Dificuldade na realização de análises multi-elementares.
Uma alternativa para esse método é o chamado método 0k , onde 0k é um fator
adimensional que pode ser medido com elevada precisão para mais de 130 isótopos (DE
CORTE, 1987; KOLOTOV e DE CORTE, 2004). Esse método consiste na co-irradiação de
uma amostra padrão de massa conhecida, geralmente Au197 , com a amostra a ser analisada.
As concentrações da maioria dos elementos podem ser calculadas em um único experimento
através da atividade do padrão e de parâmetros do detector e do reator. O fator 0k é definido
por:
pppa
aaap
MM
kγσγσ
,0
,00 Θ
Θ= (16)
onde M é a massa atômica, Θ é a abundância isotópica, 0σ é a secção de choque a nêutron
térmicos e γ é a abundância absoluta do fotopico medido. O índice a se refere à amostra e p
46
ao padrão utilizado. Os fatores 0k para a maioria dos elementos são encontrados na literatura
(KOLOTOV e DE CORTE, 2004).
A fórmula utilizada para o cálculo da concentração ac do elemento de interesse
presente na amostra é (KOLOTOV e DE CORTE, 2004):
)()(
)(1
/
/
,0
,0
,0 αα
εε
ai
pi
a
p
ap
p
m
a
m
a QfQf
kSDCW
tASDCW
tA
c+
+×××
= (17)
onde:
:A área sob o fotopico medido,
:mt tempo de medida,
)exp(1 irrtS λ−−= , sendo irrt o tempo de irradiação,
)exp( DtD λ−= , sendo Dt o tempo de decaimento,
mm ttC λλ /)]exp(1[ −−= , sendo mt o tempo de medida,
:W massa da amostra e do padrão irradiado,
:λ constante de decaimento,
:ε eficiência do detector para o fotopico considerado,
000 /σIQ = sendo 0σ a secção de choque para nêutrons térmicos e 0I a integral de
ressonância,
:α medida da distribuição não ideal do fluxo de nêutrons.
Segundo Soares (2005), o método 0k apresenta algumas vantagens em relação ao
método convencional, tais como:
• Menor custo;
• Possibilidade de determinação de maior número de elementos por amostra;
• Detecção de elementos que não estavam previstos.
4.6 RESSONÂNCIA PARAMAGNÉTICA ELETRÔNICA (EPR)
Evidências da existência de elétrons desemparelhados em alguns átomos foram obtidas
em 1921 por Otto Stern e Walther Gerlach. O experimento consistia em passar um feixe de
átomos metálicos, vaporizados, por um campo magnético não-homogêneo (vide FIG. 18).
Stern e Gerlach observaram que com alguns metais não houve desvio do feixe. Com outros,
47
tais como o sódio, o feixe dividiu-se em dois componentes, um sendo desviado para cima e
outro para baixo (vide FIG. 18).
O desvio apresentado pelo feixe de átomos de sódio é atribuído à presença de um
elétron desemparelhado em cada átomo. O fato de o feixe ser dividido em dois componentes
mostra que numa metade de átomos o spin do elétron desemparelhado está em uma direção, e
na outra metade o spin está na outra direção. A experiência de Stern-Gerlach é a mais direta
evidência de que os elétrons possuem spin (RUSSEL, 1994).
A Ressonância Paramagnética Eletrônica é um método espectroscópico capaz de
detectar a presença de entidades eletrônicas com elétrons desemparelhados. Quando essas
entidades eletrônicas são expostas a campos magnéticos externos, transições entre os estados
de energia pelos elétrons desemparelhados podem ser induzidas.
Magnetismo surge do movimento de cargas em escala atômica ou subatômica. O
momento magnético de um átomo é dado por:
)( SgL eB
vvr+−= µµ (18)
onde Bµ é o magnéton de Bohr, 2≈eg é chamado de fator eletrônico, Lr
é o momento
angular do átomo e Sr
é o spin do elétron.
A equação (18) indica que átomos isolados, exceto aqueles que possuem a
configuração de gases nobres, possuirão momento magnético resultante diferente de zero,
visto que os elétrons presentes nas camadas mais externas estão desemparelhados. Em sólidos
esse magnetismo é destruído, pois a presença de ligações químicas impede que existam
elétrons desemparelhados. Entretanto, existem casos em que sólidos possuem um magnetismo
resultante:
• Elementos de transição, por possuírem os sub-níveis 3d, 4d, 5d, 4f e 5f parcialmente
preenchidos;
FIGURA 18: O experimento de Stern-Gerlach. (RUSSEL, 1994)
48
• Moléculas que possuem um número ímpar de elétrons ( NO e 2NO , por exemplo);
• Certos defeitos tais como vacâncias ou impurezas presentes no material podem ganhar
ou perder elétrons, produzindo um momento magnético localizado.
O elétron em um átomo estável pode ocupar um conjunto de estados discretos de
energia. Se um dado elétron ocupa um nível energético designado por 0E na ausência de um
campo magnético externo B , na presença desse campo ele pode ocupar um dos dois estados
de energia dados pela expressão:
BgEE Beµ21
021 ±=
± (19)
Portanto, há uma degenerescência do estado de energia 0E . Esse fenômeno é conhecido como
Efeito Zeeman (ALONSO e FINN, 1992) e é mostrado na figura 19.
Convém salientar que, conforme mostrado na FIG. 19, a separação entre os estados
degenerados de energia é proporcional ao campo magnético externo aplicado.
Transições entre os níveis de energia podem ser induzidas através da absorção ou
emissão de um fóton de energia υh (vide FIG. 20 e 21). Assim, a condição de ressonância é
dada por:
Bgh Beµυ = (20)
FIGURA 19: Degenerescência do nível de energia 0E .
49
FIGURA 20: Representação esquemática de transições eletrônicas observadas no átomo de
hidrogênio na ausência e na presença de um campo magnético externo. l é o número quântico
azimutal e lm é o número quântico magnético. Figura disponível em:
<http://w.home.cern.ch/w/wadhwa/www/zeeman.html> Acesso em 25 set. 2004.
FIGURA 21: Esquema de transição entre níveis de energia induzida pela
emissão ou absorção de fóton de energia υh
50
Conforme mostrado na FIG. 20, há uma regra de seleção que não permite que ocorram
transições entre níveis de energia nos quais a diferença entre os números quânticos azimutal
)( lm seja maior do que um.
A condição de ressonância é obtida quando há uma máxima transferência de energia
do campo de radiação de freqüência υ (freqüência ressonante) para o sistema. Em geral, a
probabilidade de absorção espontânea de energia pelo sistema é desprezível quando
comparada à absorção estimulada pelo campo de radiação externo. Para que a amostra
absorva uma considerável porção de energia, outros parâmetros devem ser considerados:
− A população de elétrons no nível de menor energia deve ser maior que a de
elétrons no nível de maior energia, motivo pelo qual experimentos de EPR são
realizados em baixas temperaturas (STONEHAM, 1975).
− O tempo de vida do estado excitado também deve ser considerado.
O Espectrômetro EPR é composto de um eletroímã que gera e modula o campo
magnético no qual a amostra é exposta e de componentes responsáveis pela emissão e
detecção de microondas. Equipamentos antigos geralmente utilizam klystrons como fonte de
microondas (vide FIG. 22).
Durante o experimento, a freqüência das microondas é mantida constante enquanto o
campo magnético é variado. Quando a condição de ressonância é alcançada (equação 20), há
absorção de microondas pela amostra. O espectro resultante é mostrado na FIG. 23.
FIGURA 22: Representação esquemática de um espectrômetro EPR. Figura disponível em:
<http://www.chemistry.nmsu.edu/studntres/chem435/Lab7/intro.html> Acesso em 26 set. 2004.
51
FIGURA 23: Esquema de espectro obtido por EPR: (a) espectro resultante da absorção de
microondas pela amostra, (b) o sinal detectado é comumente representado como a
primeira derivada do sinal mostrado em (a).
52
5. METODOLOGIA:
5.1 ESPECTROSCOPIA IF E UV-VIS
Amostras de quartzo transparente (“cristalino”) provenientes do município de São José
da Safira (MG) foram utilizadas no presente estudo. As amostras selecionadas são lascas.
Lasca é o termo utilizado para designar pequenos pedaços provenientes de blocos maiores que
foram quebrados (GUZZO, 1991).
Essas amostras foram orientadas segundo o eixo óptico do cristal, pois não apresentam
qualquer morfologia externa regular. Para isso, foram obtidos difratogramas de raios x
(Método de Laue). Essa etapa foi realizada no Laboratório de Cristalografia do departamento
de Física do Instituto de Ciências Exatas (Icex) da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). Pela simetria cristalina apresentada pelo quartzo, o eixo óptico coincide com o
eixo c.
As amostras foram cortadas perpendicularmente ao eixo óptico do cristal utilizando-se
um disco diamantado. Posteriormente, foram obtidas pastilhas (paralelepípedos) de dimensões
10x10x2 mm destinadas às análises de Espectroscopia no Infravermelho (IV) e
Espectroscopia no Ultravioleta-Visível (UV-VIS). É importante dizer que as pastilhas foram
obtidas de modo que o feixe de luz incidente nas análises por IV e UV-VIS sempre esteve
paralelo ao eixo c do cristal.
As pastilhas foram irradiadas com raios gama (doses variadas), provenientes de uma
fonte de cobalto-60, em um irradiador a seco panorâmico modelo GB-127 da Nordion no
Laboratório de Irradiação Gama (LIG) do CDTN. As doses variaram entre 50 e 450 kGy.
Após a irradiação, elas foram aquecidas ao ar em um forno com porta de vidro
temperado que permite a visualização do seu interior. Um termopar com registro digital foi
colocado próximo às amostras. Quando a cor de interesse era obtida em cada pastilha, essa era
imediatamente retirada do forno.
Foram obtidos espectros de absorção de luz nas faixas visível, ultravioleta e
infravermelho do espectro eletromagnético das pastilhas nos estados natural, irradiada e
irradiada e aquecida. Os espectros de UV-VIS desse trabalho foram obtidos utilizando-se o
Espectrofotômetro UV-2401 PC da Shimadzu. Os espectros de infravermelho foram obtidos
utilizando-se o Espectrofotômetro MB 102 da ABB Bomem Inc.
53
5.2 ESPECTROSCOPIA DE EMISSÃO ATÔMICA E ESPECTROSCOPIA DE
ABSORÇÃO ATÔMICA
O teor de impureza presente nas amostras de quartzo foi obtido utilizando-se a AAS e
a ICP/AES mediante preparação de soluções-amostra. A ICP/AES e a AAS foram utilizadas
devido à inerente sensibilidade que possuem na análise de elementos em teores de traço. A
FIG. 24 mostra de forma esquemática a seqüência experimental utilizada para preparação das
soluções-amostra.
O teor de impureza foi obtido através de três determinações, ou seja, três soluções-
amostra foram preparadas. Dessa maneira, pode-se verificar a eventual contaminação das
soluções-amostra e erros inerentes à preparação das mesmas. Os valores fornecidos pelas
técnicas são concentrações relativas ( RC ), uma vez que as amostras foram diluídas em um
volume de 50 ml. Descontando-se de RC o valor das amostras “branco” ( B ) e multiplicando-
FIGURA 24: Esquema das etapas seguidas para preparação das soluções-amostra
54
se por F (fator de diluição = volume / massa), obtém-se a concentração intrínseca de
impureza nas amostras (GUZZO, 1991). No presente trabalho foram utilizados os
Espectrômetros de Absorção Atômica modelos 5000 e AA 300 da Perkin-Elmer, juntamente
com o Espectrômetro de Emissão Atômica modelo Spectroflame da Spectro e o Fotômetro de
Chama modelo Digimed NK-2004.
5.3 ANÁLISE POR ATIVAÇÃO NEUTRÔNICA
A AAN foi utilizada no presente estudo com o objetivo de medir o teor de impureza
presente nas amostras de quartzo e compará-lo com os resultados obtidos por AAS e
ICP/AES. A AAN foi escolhida por apresentar características tais como:
− Pode ser realizada para qualquer tipo de amostra;
− Elevada sensibilidade;
− Não precisa de branco analítico;
− Capacidade multi-elementar de análise simultânea.
Os teores dos elementos são obtidos por comparação com padrões. As amostras e os
padrões são colocados em tubos de poliestireno e irradiados simultaneamente, sob o mesmo
fluxo de nêutrons e mesmo intervalo de tempo. A determinação dos tempos de irradiação e de
espera dependem do teor do elemento na amostra, da sua meia-vida e das possíveis
interferências (PINTO, 1996). A medida da atividade da amostra ao término da irradiação é
feita por Espectroscopia Gama (KNOLL, 1989). Um dos detectores mais utilizados em
laboratórios para medida de emissores gama com baixa intensidade e para identificação de
radioisótopos presentes em materiais é o detector de Germânio Hiperpuro (HPGe)
(TAUHATA et al, 1999). Esse detector tem substituído o tradicional detector de germânio
dopado com lítio - Ge(Li) - por ser de mais fácil operação (TAUHATA et al, 1999; TURNER,
1995). A FIG. 25 mostra de forma esquemática as etapas seguidas na AAN.
Para a garantia da qualidade das análises, materiais de referência certificados pelo
NIST (National Institute of Standards and Technology), IGGE (Institute of Geophysical and
Geochemical Exploration) e IAEA (International Atomic Energy Agency) foram irradiados
juntamente com as amostras de quartzo. Esses materiais de referência são utilizados para
validação de resultados analíticos de análise de elementos em teores de traço em diversos
tipos de materiais. Para certificação de materiais de referência são utilizadas diversas técnicas
analíticas, tais como:
55
− COLOR (Colorimetry);
− FAES (Flame atomic emission spectrometry);
− FIA-HAAS (Flow injection-hydride generation atomic absorption spectrometry);
− ICP-AES (Inductively-coupled plasma atomic emission spectrometry);
− ID-ICPMS (Isotope dilution, inductively coupled plasma mass spectrometry);
− INAA (Instrumental neutron activation analysis);
− LEAFS (Laser-excited atomic fluorescence spectrometry);
− PGAA (Prompt gamma activation analysis);
− RNAA (Radiochemical neutron activation analysis).
Todo material foi submetido a uma dose de 25 kGy com raios gama para controle
microbiológico.
FIGURA 25: Representação esquemática das etapas seguidas na AAN.
56
5.4 RESSONÂNCIA PARAMAGNÉTICA ELETRÔNICA
A EPR foi utilizado no presente estudo para monitoramento da concentração do
defeito paramagnético ]º/[ 4+hOAlSi no quartzo em amostras somente irradiadas e irradiadas
e aquecidas com dose de 250 kGy no LIG do CDTN. Para realização das análises, as amostras
foram pulverizadas em graal de Ágata. Os espectros de EPR foram obtidos à partir do pó de
quartzo após compactação.
57
6. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS E DISCUSSÃO A TAB. 3 e a FIG. 26 mostram os valores das concentrações obtidas por AAN e os
valores certificados para o material de referência GBW 07602 (IGGE).
Elementos determinados
Valor medido (ppm)
Valor certificado (ppm)
Sc 0,32 0,31 ± 0,02
Cr 3,58 2,3 ± 0,2
Fe 1030,16 1020 ± 40
Co 0,46 0,39 ± 0,03
Zn 34,84 20,6 ± 1
Rb 0 4,2 ± 0,2
Sb 0,31 0,078 ± 0,015
Cs 0,28 0,27 ± 0,02
Ce 2,88 2,4 ± 0,2
Hf 0,1 0,14 ± 0,03
Th 0,41 0,37 ± 0,02
Sc Cr Fe Co Zn Rb Sb Cs Ce Hf Th0
2
4
6
8
100
1000Material certificado
GBW07602
Con
cent
raçã
o (p
pm)
Elementos
Valores medidos Valores certificados
FIGURA 26 – Gráfico das concentrações obtidas e certificadas para o material de referência
GBW 07602.
TABELA 3
Valores medidos e valores certificados para o material de referência GBW 07602
58
A TAB. 4 e a FIG. 27 mostram os valores das concentrações obtidas por AAN e os
valores certificados para o material de referência GBW 07603 (IGGE).
Elementos determinados
Valor medido (ppm)
Valor certificado (ppm)
Sc 0,33 0,32 ± 0,02
Cr 2,96 2,6 ± 0,1
Fe 1107,49 1070 ± 40
Co 0,48 0,41 ± 0,03
Zn 57,89 55 ± 2
Rb 0 4,5 ± 0,2
Sb 0,65 0,095 ± 0,011
Cs 0,46 0,27 ± 0,02
Ce 2,55 2,2 ± 0,1
Hf 0,11 0,15
Th 0,37 0,36 ± 0,03
Sc Cr Fe Co Zn Rb Sb Cs Ce Hf Th0
1
2
3
4
100
1000 Material certificadoGBW07603
Con
cent
raçã
o (p
pm)
Elementos
Valores medidos Valores certificados
TABELA 4
Valores medidos e valores certificados para o material de referência GBW 07603
FIGURA 27 – Gráfico das concentrações obtidas e certificadas para o material de referência GBW 07603
59
Sc Cr Fe Co Zn Rb Sb Cs Ce Hf Th0
1
2
3
4
100
200
300
400 Material certificado1573 a
Con
cent
raçã
o (p
pm)
Elementos
Valores medidos Valores certificados
A TAB. 5 e a FIG. 28 mostram os valores das concentrações obtidas por AAN e os
valores certificados para o material de referência 1573 a (NIST).
Elementos determinados
Valor medido (ppm)
Valor certificado (ppm)
Sc 0,11 0,1
Cr 2,94 1,99 ± 0,06
Fe 322,41 368 ± 7
Co 0 0,57 ± 0,02
Zn 35,89 30,9 ± 0,7
Rb 17,41 14,89 ± 0,27
Sb 0,21 0,14
Cs 0,15 0,53
Ce 2,24 2
Hf 0,13 0
Th 0,11 0,12
TABELA 5
Valores medidos e valores certificados para o material de referência 1573 a
FIGURA 28 – Gráfico das concentrações obtidas e certificadas para o material de referência 1573 a
60
Mg Mn Ti V0
50
600
650
700Material certificadoSL7 (IAEA/Soil 7)
Con
cent
raçã
o (p
pm)
Elementos
Valores medidos Valores certificados
A TAB. 6 e a FIG. 29 mostram os valores das concentrações obtidas e os valores
certificados para o material de referência SL7 (IAEA).
Elementos determinados
Valor medido (ppm)
Valor certificado (ppm)
Cl < 50 Não reportado
Cu < 20 11
I < 5 Não reportado
Mg 12 ± 1 11,3
Mn 700 ± 25 631
Ti 3,6 ± 0,5 3
V 70 ± 7 66
Através dos dados apresentados, verifica-se que as variações de concentrações
determinadas frente aos valores certificados, de uma maneira geral, são pequenas. Isso conduz
TABELA 6
Valores medidos e valores certificados para o material de referência SL7
FIGURA 29 – Gráfico das concentrações obtidas e certificadas para elementos presentes no material de referência SOIL 7 (IAEA)
61
a uma validação dos parâmetros utilizados nas análises tais como fluxo de nêutrons, tempo de
irradiação e decaimento, limite de detecção e calibração do detector de espectrometria gama.
A TAB. 7 apresenta as concentrações de vários elementos obtidas por Análise por
Ativação Neutrônica para amostra de quartzo de São José da Safira.
Elemento Concentração (ppm)
Cl 40 ± 8
Cu < 8
I < 1
Mg 110 ± 22
Mn 3,1 ± 0,2
Ti < 40
V < 1
Ce 0,323
Sb 0,448
Fe 32,6 ± 1,0
Zn 1,866
Co 0,036
La 0,026
Na 32,9 ± 1,2
A TAB. 8 apresenta as concentrações de Na, K, Li, Al, Fe e Mn obtidas por
Espectroscopia de Absorção Atômica para amostra de quartzo de São José da Safira.
A TAB. 9 apresenta as concentrações de Al, Ti, Fe, Cr e Mn obtidas por
Espectroscopia de Emissão Atômica por Plasma Indutivamente Acoplado para amostra de
quartzo de São José da Safira.
TABELA 7
Concentrações de diversos elementos em amostra de quartzo de São José da
Safira determinadas por AAN
62
Elemento Concentração (ppm)
Na 1100 ± 200
K 5,5 ± 1,2
Li 46 ± 5
Al 560 ± 60
Fe 27 ± 3
Mn 3,6 ± 0,4
Elemento Concentração (ppm)
Al 524,8 ± 15,7
Ti 4,4 ± 0,3
Fe 22,3 ± 1,7
Cr 1,6 ± 0,2
Mn 2,1 ± 0,2
Conforme observado nas TAB. 8 e 9, as amostras de quartzo de São José da Safira
apresentam expressivas concentrações de lítio e alumínio. Portanto, há grande probabilidade
que essas amostras apresentem uma concentração significativa de centros ]º/[ 4+LiOAlSi .
Convém observar que os valores dos teores de sódio e alumínio obtidos por AAS e
ICP/AES parecem muito altos. Medidas feitas com EDS (Energy Dispersive Spectroscopy) no
Laboratório de Microanálise do Departamento de Física da UFMG, revelaram um teor de
alumínio em torno de 80 ppm, cromo em torno de 1 ppm e ferro em torno de 5 ppm. Além
disso, medidas feitas com AAN indicaram um teor de sódio em torno de 32 ppm (vide
TABELA 9
Concentrações de diversos elementos em amostra de quartzo de São José da Safira
determinadas por ICP/AES
TABELA 8
Concentrações de diversos elementos em amostra de quartzo de São José da Safira
determinadas por AAS.
63
tabela 7). Microinclusões presentes no quartzo ou contaminações ocorridas durante o processo
de preparação das soluções-amostra podem ter afetado esses resultados.
Nas condições normais de temperatura e pressão, o transporte elétrico iônico
predomina no quartzo. Entretanto, a radiação ionizante cria um grande número de elétrons e
buracos, acarretando em um aumento da condutividade elétrica do quartzo (HALLIBURTON,
1989).
Os raios gamas arrancam elétrons de suas posições dentro da rede cristalina do
quartzo, ejetando-os para um outro local da rede. As nuvens eletrônicas dos oxigênios do
tetraedro do silicato se superpõem, tal que o átomo de silício fica pouco exposto aos raios
gama. Os elétrons arrancados são dos oxigênios, que passam então a ter buracos. Ou seja, os
raios gama criam pares de elétrons ( e ) e buracos ( +h ).
+− +→ heγ (21)
Assim, um tetraedro que teve um elétron arrancado passa a ter uma carga positiva,
pois agora ele possui um buraco eletrônico:
−+ +→+ ehSiOSiO ]º/[]º[ 44 γ (22)
Entretanto, o tetraedro com um buraco logo atrai um elétron e volta ao seu estado
inicial. Da recombinação de um elétron com um buraco eletrônico resulta a emissão de um
fóton, já que foi necessária uma energia para arrancar o elétron de um tetraedro. Esse
fenômeno é bastante rápido, tal que o quartzo não acumula energia devido à sua exposição a
raios gama. Seja ε∆ a energia necessária para arrancar um elétron. Se um raio gama arrancar
n elétrons, então ele sairá da amostra com uma energia igual a εε γ ∆− .n , sendo γε a sua
energia ao incidir na amostra. Por outro lado, espera-se a emissão de n fótons com energia
igual a ε∆ .
Essa descrição é simplificada. O processo de recombinação de um elétron e um buraco
pode ocorrer por meios diferentes, tal que mais de um fóton pode ser emitido. Porém, a soma
de suas energias deve ser igual a ε∆ .
Um raio gama pode arrancar um elétron da nuvem eletrônica de um oxigênio vizinho a
um SiAl , conforme mostrado na FIG. 30. A absorção da energia proveniente dos raios gama
pode influenciar tanto na performance eletromecânica quanto na cor do quartzo (BAHADUR,
1998; GRIFFITHS, OWEN e WARD, 1955; HALLIBURTON et al, 1981; ITOH,
64
STONEHAM e STONEHAM, 2002; KOUMVAKALIS, 1980; NASSAU, 1978; ROSSMAN,
1994).
Com um buraco eletrônico, o tetraedro deixa de ter carga negativa e libera o íon M+
para se difundir dentro da rede cristalina do quartzo. Essa reação pode ser representada da
seguinte forma:
−+++ ++→+ eMhOAlMOAl SiSi ]º/[]º/[ 44 γ (23)
A partir dessa reação, outras podem ocorrer. Por exemplo, um íon M+ pode se
combinar com um elétron, resultando num átomo neutro numa posição intersticial, Mi:
0iMeM →+ −+ (24)
As nuvens eletrônicas dos oxigênios dos tetraedros do SiAl se superpõem às dos tetraedros de
SiSi vizinhos, tal que o buraco eletrônico pode migrar para um tetraedro vizinho e desse para
outro tetraedro adjacente. Essa reação pode ser representada da seguinte forma:
++−+ +→+ ]/[][]º[]º/[ 4444 hSiOOAlSiOhOAl SiSi (25a)
Há autores que preferem escrevê-la assim:
+−+ +→ hOAlhOAl SiSi ][]º/[ 44 (25b)
FIGURA 30 – Representação esquemática da estrutura do quartzo: (a) puro, (b) contendo SiAl com
hidrogênio como compensador de carga. A radiação ejeta um elétron de um oxigênio adjacente ao alumínio substitucional formando um centro ]º/[ 4
+hOAlSi (NASSAU, 1978).
65
O defeito ]º/[ 4+hOAlSi pode se combinar com um elétron, de acordo com a seguinte
equação:
−−+ →+ ][]º/[ 44 OAlehOAl SiSi (26)
A reação (26) é acompanhada pela emissão de um fóton de 380 nm (ITOH, STONEHAM e
STONEHAM, 2002). Ela pode ser revertida pela exposição dos defeitos −][ 4OAlSi a fótons
desse comprimento de onda. Vide Apêndice A para considerações sobre este defeito.
O defeito −][ 4OAlSi pode atrair um íon M+, voltando ao seu estado inicial:
]º/[][ 44++− →+ MOAlMOAl SiSi (27)
A reação (27) é acompanhada pela emissão de um fóton de 420 nm (ITOH, STONEHAM e
STONEHAM, 2002). Poder-se-ia concluir que essa reação é reversível, pela exposição do
defeito ]º/[ 4+MOAlSi a fótons desse comprimento de onda. Esse defeito poderia absorver
fótons, que o elevaria a uma excitação suficiente para a sua dissociação em −][ 4OAlSi e +M .
Porém, se o íon +M não migrar rapidamente, a atração eletrostática impede a dissociação,
fazendo com que o fóton absorvido seja logo emitido. Esse defeito também pode se combinar
com um buraco:
]º/[][ 44++− →+ hOAlhOAl SiSi (28)
A reação (28) é acompanhada pela emissão de um fóton de 365 nm (ITOH, STONEHAM e
STONEHAM, 2002). Ela pode ser revertida pela exposição dos defeitos 04 ]/[ +hOAlSi a
fótons desse comprimento de onda.
Os raios gama podem ainda provocar as seguintes reações:
−+ +→+ eMM i γ (29)
−+− +→+ ehOAlOAl SiSi ]º/[][ 44 γ (30)
A retirada de mais um elétron do defeito ]º/[ 4+hOAlSi é possível, porém a duração
do defeito ++ ]2/[ 4 hOAlSi é muito curta. Ele logo se combina com um elétron e volta à
condição inicial.
Os defeitos −][ 4OAlSi e ]º/[ 4+hOAlSi podem existir por um longo período. Quando se
interrompe a exposição aos raios gama, tem-se uma população dos defeitos −][ 4OAlSi ,
66
]º/[ 4+hOAlSi , +M , +h , −e e iM . Esses seis defeitos estão submetidos a duas condições de
contorno: a soma dos números de defeitos −][ 4OAlSi e ]º/[ 4+hOAlSi deve ser igual à soma
dos números de defeitos +M e iM (conservação do número de átomos de alumínio e de
compensadores de carga); a soma dos números de defeitos −][ 4OAlSi e −e deve ser igual à
soma dos defeitos +M e +h (conservação da carga elétrica).
É possível notar que nada impede que o número de defeitos −][ 4OAlSi ou
]º/[ 4+hOAlSi se anule. Assim, poderia existir uma situação onde só haja defeitos −][ 4OAlSi e
não existam defeitos ]º/[ 4+hOAlSi e vice-versa.
A reação (27) é acompanhada pela emissão de um fóton de 420 nm. Poder-se-ia
concluir que essa reação é reversível, pela exposição do defeito ]º/[ 4+MOAlSi a fótons desse
comprimento de onda. Esse defeito poderia absorver fótons, que o elevaria a uma excitação
suficiente para a sua dissociação em −][ 4OAlSi e +M . Porém, se o íon +M não migrar
rapidamente, a atração eletrostática impede a dissociação, fazendo com que o fóton absorvido
seja logo emitido. Esse defeito também pode se combinar com um buraco:
]º/[][ 44++− →+ hOAlhOAl SiSi (31)
A reação (31) é acompanhada pela emissão de um fóton de 365 nm (ITOH, STONEHAM e
STONEHAM, 2002). Ela pode ser revertida pela exposição dos defeitos 04 ]/[ +hOAlSi a
fótons desse comprimento de onda.
A FIG. 31 mostra o espectro de absorção na região ultravioleta e visível (UV-VIS)
obtido a partir das pastilhas. Observa-se os máximos de absorção de todas amostras se
encontram na região ultravioleta, de maneira que as cores são determinadas por seus
prolongamentos dentro do espectro visível (ARAÚJO, 2001).
Nota-se o desaparecimento dos picos de absorção situados na região visível no
espectro da amostra irradiada e aquecida quando comparada com a amostra apenas irradiada
(vide FIG. 32). Assim, espera-se que essas transições sejam devidas a um defeito diferente
daquele responsável pelos picos de absorção na região do ultravioleta próximo. Os picos de
absorção na região visível são devidos ao defeito 04 ]/[ +hOAlSi , enquanto os picos de
absorção no ultravioleta próximo são atribuídos ao defeito −][ 4OAlSi . A FIG. 33 exibe as
transições esperadas para esses defeitos.
67
200 300 400 500 600 700 8000,0
0,5
1,0
1,5
2,0
Abso
rbân
cia
(UA)
Comprimento de Onda (nm)
100 KGy 150 KGy 300 KGy 350 KGy 400 KGy 450 KGy
A FIG. 32 mostra os espectros UV-VIS de amostra irradiada com dose de 80 KGy
antes e após aquecimento.
200 300 400 500 600 700 8000,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
Abso
rbân
cia
(UA)
Comprimento de Onda (nm)
Amostra irradiada e aquecida Amostra só irradiada
FIGURA 31 – Espectro de absorção de luz na região visível (400 a 700 nm) e ultravioleta (200 a 400 nm) para amostras irradiadas e aquecidas de São José da Safira – MG. Na legenda é indicada a dose aplicada em cada amostra antes do aquecimento.
FIGURA 32 – Espectros UV-VIS antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 80 KGy.
68
A FIG. 34 mostra os espectros de transmitância na região do infravermelho para a
amostra irradiada com dose de 80 kGy antes e após o aquecimento. Os defeitos −][ 4OAlSi e
]º/[ 4+hOAlSi não possuem transições entre 1772 nm (5640 cm-1) e 6000 nm (1667 cm-1),
explicando porque a amostra irradiada apresenta o mesmo espectro IR antes e após o
aquecimento. As transições além daquelas esperadas são provavelmente devidas ao
estiramento de hidroxilas, causadas pela presença de +H como compensador de carga.
2000 2500 3000 3500 40000
20
40
60
80
100
Tran
smitâ
ncia
(UA)
Número de Onda (cm-1)
Amostra irradiada e aquecida Amostra somente irradiada
FIGURA 34 – Espectros no infravermelho antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 80 kGy.
FIGURA 33 – Transições esperadas para os defeitos −][ 4OAlSi (a) e ]º/[ 4+hOAlSi (b).
69
300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350 355 360
-10
0
10
20
30
EPR
(uni
dade
s de
abs
orçã
o)
Campo Magnético (mT)
Amostra somente irradiada (30 K) Amostra irradiada e aquecida (30 K)
Com esse modelo, é possível explicar a formação da cor no quartzo. A irradiação
causa a formação de defeitos ]º/[ 4+hOAlSi e −][ 4OAlSi . O defeito ]º/[ 4
+hOAlSi causa
absorções de luz no espectro visível, cujos picos se situam em 365 nm, 475 nm e 650 nm. A
superposição desses picos causa absorção em todo o espectro visível, o que provoca o
enegrecimento do quartzo. Quanto maior a exposição aos raios gama, maior será a
concentração desse defeito (é claro, limitado pelo teor de alumínio) e mais acentuado será o
enegrecimento da amostra (GRIFFITHS et al, 1954; KOUMVAKALIS, 1980). Quando
aquecido, esse defeito é eliminado através da seguinte reação (26):
−−+ →+ ][]º/[ 44 OAlehOAl SiSi (26)
com a emissão de fótons de 380 nm (ITOH, STONEHAM e STONEHAM, 2002). Poder-se-ia
sugerir que fótons com comprimentos de onda de 475 e 650 nm também podem ser emitidos
durante a reação (26) (vide figura 33). É por essa razão que se observa o clareamento do
quartzo irradiado junto com uma luminescência azulada durante o aquecimento. Os espectros
de EPR mostrados nas FIG. 35, 36, 37 e 38 indicam que os centros ]º/[ 4+hOAlSi são
destruídos quando amostras irradiadas são aquecidas.
FIGURA 35 – Espectros de EPR a 30 K antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 kGy.
70
300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350 355 360
-30
-20
-10
0
10
20
30
EPR
(uni
dade
s de
abs
orçã
o)
Campo Magnético (mT)
Amostra somente irradiada (50 K) Amostra irradiada e aquecida (50 K)
300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350 355 360-40
-20
0
20
40
EPR
(uni
dade
s de
abs
orçã
o)
Campo Magnético (mT)
Amostra só irradiada (80 K) Amostra irradiada e aquecida (80 K)
FIGURA 36 – Espectros de EPR a 50 K antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 kGy.
FIGURA 37 – Espectros de EPR a 80 K antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 kGy.
71
300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350 355 360-15
-10
-5
0
5
10
15
20
Amostra somente irradiada (120 K) Amostra irradiada e aquecida (120 K)
EPR
(uni
dade
s de
abs
orçã
o)
Campo Magnético (mT)
Conforme mostrado nas FIG. 35, 36, 37 e 38, a amostra somente irradiada apresenta
uma elevada concentração de defeitos ]º/[ 4+hOAlSi , diferentemente da amostra irradiada e
aquecida, que apresenta uma baixa concentração desses defeitos. Isso indica que esses centros
são destruídos durante o aquecimento.
Nassau (1978) propõe que o aquecimento necessário para que a reação (9) ocorra, é
um meio de fornecer energia ao sistema para que esse transponha a barreira de ativação e
retorne para o estado fundamental, emitindo a energia armazenada durante a irradiação na
forma de luminescência (vide FIG. 39).
A FIG. 40 exibe o espectro de EPR a 300 K antes e após aquecimento de amostra de
quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 KGy. A razão pela qual ambas
amostras apresentam a mesma intensidade das linhas nos espectros de EPR não é entendida. Há
pesquisadores que atribuem esse fenômeno à presença de um defeito paramagnético que,
diferentemente do ]º/[ 4+hOAlSi , resiste ao aquecimento (KRAMBROCK, 2004). Nota-se que
as intensidades das linhas nos espectros de EPR a 300 K são muito menores que as
intensidades das linhas a 30 K (vide figura 35), 50 K (vide figura 36), 80 K (vide FIG. 37) e
120 K (vide FIG. 38).
FIGURA 38 – Espectros de EPR a 120 K antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 kGy.
72
300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350 355 360
-2,5
-2,0
-1,5
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
EPR
(uni
dade
s de
abs
orçã
o)
Campo Magnético (mT)
Amostra somente irradiada (300 K) Amostra irradiada e aquecida (300 K)
O defeito −][ 4OAlSi causa absorções na região divisória entre as regiões ultravioleta e
visível, cujos picos se situam em 280 nm e 380 nm. A superposição desses picos forma um
FIGURA 39 – (a) estados de energia existentes no quartzo fume; (b) quando irradiado, o sistema passa do estado fundamental A para o estado excitado B; (c) a luz visível é absorvida pelo sistema, onde esse é promovido para estados excitados E e F; (d) o aquecimento faz com que o sistema transponha a barreira de ativação C e retorne para o estado fundamental A (NASSAU, 1978).
FIGURA 40 – Espectros de EPR a 300 K antes e após aquecimento de amostra de quartzo de São José da Safira (MG) irradiada com dose de 200 kGy.
73
outro pico na região do ultravioleta logo acima do visível (em torno de 397 nm). Quanto
maior a exposição do quartzo à radiação ionizante, mais intenso será esse pico. Parte dele
avança dentro do espectro visível, absorvendo sucessivamente as cores violeta, anil, azul e
verde (vide FIG. 41). Isso provoca as cores observadas no quartzo: amarelo, verde e marrom.
Assim, de acordo com a reação (26), a população de defeitos −][ 4OAlSi cresce durante
o aquecimento do quartzo e deve ser eletricamente compensada por uma população igual de +M através da reação (27):
]º/[][ 44++− →+ MOAlMOAl SiSi (27)
com a emissão de fótons de 420 nm (ITOH, STONEHAM e STONEHAM, 2002). Caso o
aquecimento continue, a reação (27) eliminará toda população de defeitos −][ 4OAlSi e o
quartzo adquirirá um aspecto hialino incolor.
Portanto, para que o quartzo adquira as cores desejadas, é necessário que hajam
defeitos −][ 4OAlSi . Durante o aquecimento necessário para eliminação do defeito
]º/[ 4+hOAlSi , ocorre a reação (27). Ela depende da difusão do íon +M até a posição do
defeito −][ 4OAlSi . Assim, quanto mais o íon se afastar do defeito −][ 4OAlSi durante a
FIGURA 41 – Representação gráfica esquemática do espectro de absorção de luz de amostras de quartzo irradiadas e aquecidas de São José da Safira (MG). A cor da linha da curva representa aproximadamente a cor obtida.
74
irradiação, maior será a população desse defeito após o aquecimento. A natureza do íon é
muito importante. Se ele tiver grande mobilidade, como o íon +H , ele poderá se afastar
bastante do defeito −][ 4OAlSi durante a irradiação, porém poderá facilmente retornar à sua
posição de origem e se combinar com esse defeito durante o aquecimento. Se ele tiver uma
pequena mobilidade, como o +Na (e talvez até o +K ), ele não se afastará do defeito e se
recombinará com ele rapidamente durante o aquecimento. Um íon de mobilidade média,
como o +Li , deve proporcionar a melhor condição para a existência de uma significativa
população de defeitos −][ 4OAlSi após o aquecimento.
As FIG. 42 e 43 mostram ajustes feitos para os espectros de absorção UV-VIS para a
amostra somente irradiada e irradiada e aquecida, respectivamente, tomando por base os picos
de absorção propostos por Itoh, Stoneham e Stoneham (2002). Somente o pico de 280 nm na
FIG. 43 não foi reportado por esses autores.
200 300 400 500 600 700 8000,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
χ2=0,475
Amostra somente irradiada
Abso
rbân
cia
(AU
)
Comprimento de Onda (nm)
110 nm 365 nm 475 nm 650 nm
FIGURA 42 – Ajustes para o espectro UV-VIS da amostra somente irradiada. Na
figura são indicados os picos de absorção do defeito ]º/[ 4+hOAlSi .
75
200 300 400 500 600 700 8000,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1,0Amostra irradiada e aquecida
χ2=0,093
Abso
rbân
cia
(AU
)
Comprimento de Onda (nm)
110 nm 280 nm 380 nm
As idéias acima descritas estão de acordo com Guzzo (1991), que irradiou amostras de
quartzo de diferentes procedências com raios gama à temperatura ambiente. Ele verificou que
amostras com elevada concentração de lítio apresentavam grande grau de escurecimento após
serem irradiadas, diferentemente de amostras com alta concentração de hidrogênio, que
apresentavam baixo grau de escurecimento. GUZZO (1991) concluiu que a formação de
centros ]º/[ 4+hOAlSi é proporcional à concentração de centros ]º/[ 4
+LiOAlSi e
inversamente proporcional à de centros ]º/[ 4+HOAlSi . Provavelmente isso ocorre porque a
formação dos centros ]º/[ 4+hOAlSi e ]º/[ 4
+HOAlSi são processos concorrentes, uma vez
que a mobilidade do hidrogênio na rede cristalina do quartzo é elevada.
A figura 44 mostra os espectros de transmitância na região do infravermelho para
amostra de quartzo natural antes e após irradiação com dose de 80 kGy.
FIGURA 43 – Ajustes para o espectro UV-VIS da amostra irradiada e aquecida. Na figura são indicados os picos de absorção do defeito −][ 4OAlSi .
76
2000 2500 3000 3500 40000
20
40
60
80
100
[Li-O
H]
[Al Si
O4/H
+ ]º
Tran
smitâ
ncia
(UA)
Número de Onda (cm-1)
Amostra após irradiação Amostra antes da irradiação
Nota-se que a concentração de centros ]º/[ 4+HOAlSi é maior na amostra após a
irradiação, conforme observado pelo aumento da banda de absorção em 3380 cm-1. A
concentração de centros ][ OHLi − é menor na amostra após a irradiação, conforme
evidenciado pela diminuição da banda de absorção em 3478 cm-1. Essas observações estão de
acordo com Bahadur (1989), que verificou a redução da banda de absorção associada ao
centro ][ OHLi −+ no quartzo natural após irradiá-lo à temperatura ambiente. Ele verificou
que com exceção da banda associada ao defeito 04 ]/[ +HOAlSi , todas as demais bandas
sofrem um decréscimo de intensidade. Provavelmente, a irradiação provoca dissociações dos
centros ][ OHM − . Os prótons liberados migram através da rede cristalina do quartzo até que
se recombinam e formam centros 04 ]/[ +HOAlSi .
FIGURA 44 – Espectros no infravermelho antes e após irradiação de amostra de quartzo natural de São José da Safira com dose de 80 kGy. Os picos de absorção atribuídos aos defeitos
]º/[ 4+HOAlSi (3380 cm-1) e ][ OHLi − (3478 cm-1) são indicados na figura (KATS, 1962).
77
7. CONCLUSÕES:
As técnicas de espectroscopia no infravermelho, ultravioleta-visível, de absorção e de
emissão atômica juntamente com análise por ativação neutrônica e ressonância paramagnética
eletrônica foram empregadas para caracterizar e estudar impurezas e defeitos em amostras de
quartzo de São José da Safira. A análise dos resultados obtidos pode ser sintetizada pelos
seguintes pontos:
1. A pequena concentração de alumínio, usualmente encontrada no quartzo como
substituto para o silício, parece ser responsável pela formação de cor (verde, amarelo e
marrom) após irradiação com raios gama e aquecimento entre 180 e 360 ºC.
2. O defeito ]º/[ 4+hOAlSi , formado durante a exposição do quartzo a raios gama, causa
absorções de luz no espectro visível, cujos picos se situam em 365 nm, 475 nm e 650
nm. A superposição desses picos causa absorção em todo o espectro visível, o que
provoca o enegrecimento do quartzo. Quanto maior a exposição aos raios gama, maior
será a concentração desse defeito e mais acentuado será o enegrecimento da amostra.
3. Durante o aquecimento da amostra, o defeito ]º/[ 4+hOAlSi é eliminado juntamente
com a emissão de fótons de 380 nm, 475 nm e 650 nm. É por esse motivo que se
observa o clareamento do quartzo junto com uma luminescência azulada durante o
aquecimento. A eliminação do defeito ]º/[ 4+hOAlSi foi constatada comparando-se a
intensidade das linhas nos espectros de EPR em amostra irradiada com 200 kGy antes
e após aquecimento.
4. O defeito −][ 4OAlSi , produzido na eliminação do defeito ]º/[ 4+hOAlSi , causa
absorções na região divisória entre as regiões ultravioleta e visível, cujos picos se
situam em 280 nm e 380 nm. A superposição desses picos forma outro pico na região
do ultravioleta logo acima do visível. Quanto maior a exposição do quartzo à radiação
ionizante, mais intenso será esse pico. Parte dele avança dentro do espectro visível,
absorvendo sucessivamente as cores violeta, anil, azul e verde, provocando as cores
observadas no quartzo. Para doses abaixo de 70 kGy, o quartzo adquire tonalidade
esverdeada. Para doses entre 70 e 200 kGy, ele adquire tonalidade amarelada. Para
doses acima de 200 kGy, obtém-se tonalidade amarronzada.
78
6. Para que o quartzo adquira as cores desejadas, é necessário que hajam defeitos −][ 4OAlSi . Durante o aquecimento necessário para eliminação do defeito
]º/[ 4+hOAlSi , há eliminação do defeito −][ 4OAlSi . Essa reação depende da difusão do
íon +M até a posição do defeito −][ 4OAlSi . Assim, quanto mais o íon se afastar do
defeito −][ 4OAlSi durante o aquecimento, maior será a população desse defeito durante
o aquecimento. A natureza do íon é muito importante. Se ele tiver grande mobilidade,
como o íon +H , ele poderá se afastar bastante do defeito −][ 4OAlSi durante a
irradiação, porém poderá facilmente retornar à sua posição de origem e se combinar
com esse defeito durante o aquecimento. Se ele tiver uma pequena mobilidade, como o +Na (e talvez até o +K ), ele não se afastará do defeito e se recombinará com ele
rapidamente durante o aquecimento. Um íon de mobilidade média, como o +Li , deve
proporcionar a melhor condição para a existência de uma significativa população de
defeitos −][ 4OAlSi após o aquecimento. Foi encontrado um teor de 46 ppm (medido
através de AAS) no quartzo de São José da Safira.
7. O modelo proposto por (ITOH, STONEHAM e STONEHAM, 2002) explica a
formação das tonalidades verde, amarelo e marrom no quartzo.
Finalmente, para futuros trabalhos no estudo de impurezas e defeitos no quartzo se
pode sugerir:
1. A eletrodifusão poderia ser empregada para indução de cor em amostras de quartzo.
Outras possibilidades seriam irradiações de amostras em baixas temperaturas e
irradiações com diferentes taxas de dose.
2. As impurezas e os defeitos presentes na ametista, no quartzo rosa e no quartzo verde
poderiam ser estudados com maior atenção.
3. Espectros de absorção no infravermelho poderiam ser obtidos em baixas temperaturas.
Isso possibilitaria a detecção de picos de absorção que não foram detectados à
temperatura ambiente.
79
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85
APÊNDICE A
CONSIDERAÇÕES SOBRE A SUBSTITUIÇÃO DO SILÍCIO PELO ALUMÍNIO NO QUARTZO
Para iniciar essa discussão, é necessário abordar o caráter das ligações entre silício e
oxigênio na sílica. A configuração eletrônica do silício pode ser assim representada:
Si: [Ne] 3s2 3p2
onde [Ne] é a configuração eletrônica do Neônio.
O oxigênio possui a seguinte configuração eletrônica:
O: [He] 2s2 2p4
onde [He] é a configuração eletrônica do Hélio.
Na estrutura cristalina do quartzo α, os átomos de silício compartilham um elétron
com cada átomo de oxigênio adjacente de modo que todos os átomos envolvidos adquirem
configuração eletrônica estável (vide figura 1).
A configuração eletrônica de cada tetraedro 4SiO (vide figura 2) presente na estrutura
do quartzo α pode ser assim representada:
)22][4()][( 52 psHeONeSi ×+
Essa molécula 4SiO é altamente reativa, pois tem um elétron desemparelhado em cada átomo
de oxigênio. Ela poderia reagir com outros quatro átomos de silício, que compartilhariam um
elétron com cada oxigênio adjacente. Por sua vez, cada silício teria três elétrons
desemparelhados e poderiam reagir, cada um, com mais três oxigênios. Esses novamente
poderiam reagir com átomos de silício e assim sucessivamente. Esse arranjo espacial fornece
uma relação de dois átomos de oxigênio para cada átomos de silício. Essa situação é aquela
encontrada no quartzo α. Outros arranjos também podem existir e correspondem a outras
formas polimórficas da sílica.
Figura 76: diagrama de Lewis da estrutura do quartzo α
86
Quer seja natural ou artificial, o quartzo quase sempre possui um pequeno teor de
alumínio, em geral abaixo de 100 ppm. Esses átomos de alumínio podem ocupar a posição do
silício na rede cristalina ou ocupar uma posição intersticial. A configuração eletrônica do
alumínio pode ser assim representada:
Al: [Ne] 3s2 3p1
onde [Ne] é configuração eletrônica do Neônio.
O alumínio substitucional se encontra no interior do tetraedro 4SiO (vide figura 2).
Ele possui valência 3+ enquanto que o silício tem valência 4+, conforme pode ser notado a
partir da distribuição eletrônica de ambos. Assim, é necessário que haja um compensador de
carga adjacente ao alumínio para que o balanço de cargas seja mantido. Exemplos de íons que
fazem esse papel de compensador de carga no quartzo são +H (centro 04 ]/[ +HOAlSi ), +Li
(centro 04 ]/[ +LiOAlSi ), +Na (centro 0
4 ]/[ +NaOAlSi ) e +K (centro 04 ]/[ +KOAlSi ).
A irradiação e a ativação térmica podem provocar a dissociação de centros 0
4 ]/[ +MOAlSi e a migração do íon +M para longe do SiAl :
+−+ +→ MOAlMOAl SiSi ][]º/[ 44 (1)
onde +M representa um íon monovalente ( +++ KNaLi ,, ou +H ). Centros ]º/[ 4+MOAlSi
apresentam equilíbrio de cargas e não provocam absorção de luz.
O centro −][ 4OAlSi criado por esse processo, tem todos os átomos com configuração
eletrônica estável. Porém, não há equilíbrio de local de cargas, que pode ser recuperado pela
migração do íon +M até o centro (equação 2) ou pela liberação de um elétron, que então
migraria até o íon +M (equações 3 e 4):
Figura 77: átomo de alumínio no interior de um tetraedro SiO4
Silício ou alumínio
Oxigênio
87
)420(]º/[][ 44 nmMOAlMOAl SiSi υ+→+ ++− (2)
−+− +→+ ehOAlOAl SiSi ]º/[][ 44 γ (3)
ºiMeM →+ −+ (4)
onde ºiM representa um átomo neutro intersticial e +h representa um buraco eletrônico no
tetraedro formado pelos oxigênios com o alumínio.
Essa recuperação depende de ativação térmica ou de radiação ionizante. Na falta delas,
o centro −][ 4OAlSi pode existir indefinidamente. Porém, a repulsão eletrostática tende a
afastar elétrons do oxigênio em relação ao alumínio na direção dos átomos de silício vizinhos.
Portanto, o desequilíbrio local de cargas provoca a associação do centro −][ 4OAlSi
com silicatos vizinhos. Uma melhor representação desse defeito poderia ser uma configuração
mais complexa:
−− ⋅ }][]{[ 444 SiOOAlSi
Provavelmente, as absorções de luz atribuídas ao centro −][ 4OAlSi devam ser mais
corretamente atribuídas a essas associações.