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Mario Mario Possas Possas 2 Sumário II.1. Geração e difusão de inovações na teoria da firma e dos mercados Bibliografia: DAVIES, LYONS (1988), cap. 6; COOMBS et al. (1987), cap. 5; DOSI (1991); MOWERY, ROSENBERG (1979); DOSI (1984), 2.1. II.2. Relações entre ciência, inovação tecnológica e trajetórias de difusão Bibliografia: ROSENBERG (1976), caps. 6 e 15; ROSENBERG (1982), caps. 5 a 7; DOSI (1982)(*); DOSI (1984), 2.2.

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Sumário

II.1. Geração e difusão de inovações na teoria da firma e dos mercados

Bibliografia: DAVIES, LYONS (1988), cap. 6; COOMBS et al. (1987), cap. 5; DOSI (1991); MOWERY, ROSENBERG (1979); DOSI (1984), 2.1.

II.2. Relações entre ciência, inovação tecnológica e trajetórias de difusão

Bibliografia: ROSENBERG (1976), caps. 6 e 15; ROSENBERG (1982), caps. 5 a 7; DOSI (1982)(*); DOSI (1984), 2.2.

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II.1. Geração e difusão de inovações na teoria da firma e dos mercados

Além das referências já tratadas – Schumpeter, teorias da Organização Industrial, teorias da firma (especialmente H. Simon) – a Economia da Mudança Tecnológica no enfoque evolucionário também tem como antecedente, embora de menor influência, a abordagem teórica e empírica da “geração e difusão” das inovações, de origem neoclássica, que marcou o tema nos anos 1960-70. Seus expoentes foram Mansfield (1961-2) e Arrow (1962).

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Arrow (1962) é o primeiro modelo neoclássico convencional que tenta lidar com a mudança técnica, no caso expressa numa inovação de processo redutora de custos. Seu objetivo é comparar os extremos de concorrência perfeita e monopólio quanto ao incentivo (lucratividade) para introduzir uma inovação, na linha do que ficou conhecido como testar a “hipótese Schumpeteriana”.

Sua conclusão é que o inovador terá lucros maiores sob concorrência perfeita do que sob monopólio (como ponto de partida), dado que no primeiro caso poderá apropriar-se de todo o lucro auferido, enquanto no monopólio apenas de uma parte, o que implicaria rejeitar a referida “hipótese”.

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Royalty: r = p’m - c’,

pm com r ≤ c – c’ (inovação “drástica”).

πm

pc = c

p’m

π’m r D

c’

0 RMg q5

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Mario Mario PossasPossas Com efeito, é claro no gráfico anterior que o lucro de

monopólio resultante, π’m , seria apropriado inteiramente pelo inovador competitivo, ao passo que um monopolista apropriaria π’m - πm .

O modelo é estendido ao caso menos drástico em que o preço de monopólio estaria acima do nível competitivo (de custos) inicial, com o que fica restringido por este, ou seja, p’m= pc ; mas vale o mesmo resultado.

O modelo é ultrassimplificado, desconsiderando os custos da inovação, o investimento em P&D, a concorrência no processo inovativo, etc.

Além disso, há críticas “externas”, destacando-se as ausências: de incerteza; de um processo de difusão; de uma trajetória anterior; e de aprendizado.

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Um segundo tipo de modelo tradicional é o de Scherer (1962), focalizando o timing da inovação e de sua difusão, ao considerar motivos para retardar a adoção.

Conforme gráfico a seguir, chamando de V a receita bruta esperada da inovação e D seu custo total previsto de desenvolvimento, o período de desenvolvimento previsto de cada adotante, T*, é o que maximiza o rendimento líquido esperado, V-D. Supõe-se que a receita cai aproximadamente de forma linear e que os custos caem a uma taxa decrescente (custo marginal crescente de desenvolvimento), T* é determinado univocamente.

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$

V

//

D

//

0 T* t

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Maior rapidez na adoção – menor T* - pode decorrer de rendimentos proporcionalmente mais altos no começo (vantagens mais altas de “first mover”), e/ou de custos mais baixos (p. ex. aprendizado mais rápido, riscos iniciais menores, etc.).

O autor supõe que, quanto menor a concentração do mercado, mais baixa e inclinada a curva V (menor poder de apropriação dos ganhos), assim como mais rápida a imitação. Isso leva a encurtar o tempo de P&D, e no limite torná-lo negativo – inviabilizando a inovação.

De certo modo, a (pretensa) “hipótese Schumpeteriana” poderia estar sendo confirmada em certa medida...

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Mario Mario PossasPossas Kamien & Schwarz vão na mesma direção,

acrescentando diversos inovadores, probabilidades nas expectativas de custos e lucros, e parâmetros de rapidez na inovação de rivais. A conclusão é que um parâmetro intermediário entre monopólio e concorrência perfeita maximiza o valor de T.

Modelos como o de Dasgupta e Stiglitz (1980) incorporam teoria dos jogos, inaugurando a linha chamada de “patent race”, com base no esforço de P&D de concorrentes por uma inovação de processo patenteável. Daí resulta um equilíbrio de um único ou diversos inovadores, se houver incerteza. O ponto mais importante parece ser o de que “estrutura de mercado e inovação são determinadas conjuntamente”... 10

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Mario Mario PossasPossas O enfoque tradicional desenvolveu, desde os anos 1960,

uma variedade de modelos de difusão, com alguma base em evidências empíricas. Um autor de referência foi Mansfield, que estabeleceu em 1961 um modelo “epidêmico”, na suposição de que a difusão de inovações segue padrões análogos aos das epidemias.

A hipótese é que novas tecnologias se propagam por imitação e disseminação de informações (por “contágio”). Seguindo a analogia, sua difusão se faz segundo uma taxa de difusão (taxa de variação da proporção dos adotantes potenciais que já adotaram a inovação) é função crescente da proporção dos adotantes, devido ao risco decrescente associado, maior acessibilidade e maior aprendizado. 11

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Mario Mario PossasPossas A equação que representa essa trajetória é:

∆x(t)/∆t [1-x(t)] = β x(t),

onde x(t) é a proporção de adotantes no universo, e β é o coeficiente de velocidade de adoção;

ou, em termos contínuos,

d x(t)/dt = β x(t) [1 – x(t)].

Essa equação diferencial tem como solução:

x(t) = 1/[1 +e-(α + βt)],

onde α < 0 e β > 0 afetam a forma da curva: α maior retarda a difusão, e β maior aumenta a inclinação da curva. Esta é a função logística, também conhecida com “sigmoide” ou simplesmente com curva “S-shaped”.

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x(t)

1

0 t

onde x (0) = 1/(1+ e-α); x(-α/β) = ½; e x(∞) = 1.

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Mario Mario PossasPossas• Embora muitos setores apresentem curvas de difusão

que seguem padrão semelhante, esse tipo de modelo é criticado pela excessiva simplicidade. Em particular, por não considerar:- a incerteza na introdução e difusão de inovações;

- a diversidade entre as firmas;

- as diferenças na lucratividade esperada;

- as particularidades das inovações de processo. Crítica mais importante, possivelmente, é quanto ao

caráter estático do modelo: não é examinada a origem da inovação, sua continuidade e modificações incrementais, durante o processo de difusão; não há mudanças no ambiente nem aprendizado.

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Mario Mario PossasPossas Outro tipo de modelo de difusão que surgiu nos anos 70

é o modelo “probit”, que diferentemente do anterior supõe agentes heterogêneos quanto a alguma variável – geralmente o tamanho (mas poderia ser outra qualquer), que afeta a rentabilidade líquida da adoção de uma inovação, basicamente por economias de escala (cf. David, 1975; Davies, 1979).

Seja S a variável relevante, e S* um valor crítico, tal que só haverá adoção da inovação se S > S*. Esse valor crítico varia entre empresas e ao longo do tempo: à medida que o risco de adoção vai caindo e a rentabilidade subindo com a difusão, S* vai se reduzindo. Supondo uma distribuição aproximadamente normal, tem-se de novo uma curva em forma de S.

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n% x(t)

=>

0 S*(t) S 0 t

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Mario Mario PossasPossas Finalmente, pode-se mostrar de maneira simples e

direta um padrão geral de hipóteses para a curva de difusão em forma de “S”.

Suponhamos que rentabilidade esperada e custos de desenvolvimento sigam o padrão temporal visto anteriormente:

$r = rB - c

r

c rB

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Supondo-se que a taxa de adoção no tempo seja uma função linear da rentabilidade esperada líquida r,

dx(t)/dt = λ r(t),

a sua forma seria como no gráfico à esquerda, que daria uma difusão em forma de S como à direita.

dx(t)/dt x(t)

1

λ r(t)

=>

0 t 0 t

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Aspectos específicos da literatura empírica sobre difusão apontam:

(i) diferenças interfirmas: é razoavelmente comprovado (p. ex. Mansfield, 1963) que o tamanho influi favoravelmente na velocidade de adoção (disposição para enfrentar riscos e custos, diversificação, etc.);

(ii) diferenças intrafirmas estão ligadas a tamanho, aversão a risco e aprendizado; também se comportam como curvas em forma de “S”; o tamanho não parece ter muita influência.

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As supostas “hipóteses Schumpeterianas” foram das mais testadas empiricamente, com resultados duvidosos. Em geral adota-se o gasto em P&D como input e o patenteamento como output do esforço inovativo, associando-os ao tamanho e à concentração.

O resumo dos resultados mais encontrados parece ser que o P&D cresce com o tamanho a partir de um certo ponto e até certo limite, quando começa a cair proporcionalmente. Quanto à concentração, não há resultado conclusivo.

A observação geral mais interessante parece ser a necessidade de um enfoque dinâmico, com causalidade dupla, dependendo fortemente de fatores quanto a oportunidade, cumulatividade e apropriabilidade.

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Mario Mario PossasPossas Um debate tradicional nesse campo é o do “demand

pull” vs. “technology push” (p. ex. Dosi, 1984). Os expoentes respectivos teriam sido respectivamente Schmookler e Schumpeter.

Essa dicotomia é em boa medida artificial, porque extrema os argumentos. Entretanto, é verdade que a posição Schumpeteriana (e neo-Schumpeteriana) favorece relativamente mais o “technology push”, ainda que numa posição algo mais próxima de um meio-termo (ou melhor, uma posição que supera a dicotomia). Os “sinais de mercado” obviamente são relevantes ex ante, embora a presença de uma trajetória própria da tecnologia seja um fato estilizado essencial.

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Mario Mario PossasPossas Em Dosi (1984, 2.1) é criticado o enfoque “demand

pull”, com base em que:

(i) demanda de mercado não é o mesmo que necessidades ex ante, que não se expressam diretamente:

(ii) a reação dos produtores dificilmente seria tão rápida e flexível como a hipótese sugere, porque a tecnologia tem um escopo restrito de potencialidades, que requer muito mais tempo e investimentos do que seria um mero ajuste da oferta.

Na verdade, ocorre frequentemente o contrário: “necessidades” podem ser criadas pela “oferta”, ao vislumbrar um conjunto de oportunidades disponíveis.

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Mario Mario PossasPossas A introdução do tema da mudança tecnológica – antes

tratada como exógena - como objeto legítimo de análise econômica se deve em grande parte a N. Rosenberg, que enfatizou (incluindo evidência empírica) a existência de regularidades nas trajetórias de avanço tecnológico , com seus “pontos de estrangulamento” e “mecanismos focalizadores” (adiante).

Em Mowery & Rosenberg (1979) é feita uma crítica detalhada à ótica “demand pull”, considerando:

(i) não há evidência empírica da hipótese;

(ii) o enfoque teórico tem caráter basicamente estático e ignora a complexidade do lado da oferta, cuja interação com a demanda envolve feedbacks;

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(iii) a influência do mercado é mais importante como mecanismo de seleção (ex post) do que como sinalizador ex ante, até pelo alto grau de incerteza envolvido;

(iv) a conotação do foco na demanda ex ante tem implicação política, ao enfatizar a reatividade do processo inovativo em vez de sua iniciativa, a qual abriria mais espaço para políticas tecnológicas;

Conclusão: demanda é condição necessária, não suficiente.

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