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1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia 1 10 – LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR Dizer da segurança do contribuinte equivale a dizer de sua proteção contra o exercício arbitrário ou excessivo do poder de tributar pelo próprio Estado. Não resta dúvida sobre o fato de que o Estado necessita de recursos para o exercício de suas funções. Tanto assim é que o texto constitucional tratou de distribuir competência tributária. No entanto, temos cerca de 5.500 1 pessoas jurídicas de direito público às quais se atribuiu o poder de tributar. É impossível prever como se dará esse exercício, ou seja, é impossível dizer se haverá ou não abuso no exercício desse poder. Dessa forma, o próprio texto constitucional tratou de trazer algumas limitações de forma a preservar valores que são fundamentais para o Estado, ou seja, a existência do Estado pressupõe o respeito a esses determinados valores. Em termos simples, é a Constituição protegendo o indivíduo de eventuais abusos praticados pelos entes tributantes. Essas são as limitações constitucionais ao poder de tributar, inscritas nos artigos de 150 a 152 da Constituição. Indaga-se: são tais limitações direitos individuais e, dessa forma, constituem cláusula pétrea nos termos do art. 60 da Constituição? A Emenda Constitucional nr. 03 atribuiu à União competência tributária para a criação de Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF), dispondo em seu texto que tal tributo não haveria de respeitar o princípio da anterioridade (CF, 150, III, b) nem as imunidades previstas no art. 150, VI da CF. Restou claro que tal emenda aboliu algumas limitações ao poder de tributar no que tocava ao IPMF. Levado o tema ao Judiciário através da ADI 939, quando do julgado de sua medida cautelar, em seu voto, o min. Sidney Sanches entendeu que as limitações ao poder de tributar constituem “...garantia outorgada ao contribuinte...” dizendo ainda que o disposto no art. 150, III, “b” deve ser lido de forma combinada com o disposto no § 2º do art. 5º, ambos da Constituição. No julgamento do mérito da ADI 939, consta do voto min. Sidney Sanches: “Nem me parece que, além das exceções ao principio da anterioridade, previstas expressamente no § 1º. do art. 150, pela Constituição originária, outras pudessem ser estabelecidas por emenda constitucional, ou seja, pela Constituição derivada. Se não se entender assim, o principio e a garantia individual tributária, que ele encerra, ficariam esvaziados, mediante novas e sucessivas emendas constitucionais, alargando as exceções, seja para Impostos previstos no texto originário, seja para os não previstos.” 1 Soma da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

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1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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10 – LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR

Dizer da segurança do contribuinte equivale a dizer de sua proteção contra o

exercício arbitrário ou excessivo do poder de tributar pelo próprio Estado.

Não resta dúvida sobre o fato de que o Estado necessita de recursos para o exercício de suas funções. Tanto assim é que o texto constitucional tratou de

distribuir competência tributária. No entanto, temos cerca de 5.5001 pessoas jurídicas de direito público às quais se atribuiu o poder de tributar. É impossível

prever como se dará esse exercício, ou seja, é impossível dizer se haverá ou não abuso no exercício desse poder.

Dessa forma, o próprio texto constitucional tratou de trazer algumas limitações de forma a preservar valores que são fundamentais para o Estado, ou seja, a

existência do Estado pressupõe o respeito a esses determinados valores.

Em termos simples, é a Constituição protegendo o indivíduo de eventuais

abusos praticados pelos entes tributantes. Essas são as limitações constitucionais ao poder de tributar, inscritas nos artigos de 150 a 152 da

Constituição.

Indaga-se: são tais limitações direitos individuais e, dessa forma, constituem

cláusula pétrea nos termos do art. 60 da Constituição?

A Emenda Constitucional nr. 03 atribuiu à União competência tributária para a criação de Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF),

dispondo em seu texto que tal tributo não haveria de respeitar o princípio da anterioridade (CF, 150, III, b) nem as imunidades previstas no art. 150, VI da

CF.

Restou claro que tal emenda aboliu algumas limitações ao poder de tributar no

que tocava ao IPMF.

Levado o tema ao Judiciário através da ADI 939, quando do julgado de sua

medida cautelar, em seu voto, o min. Sidney Sanches entendeu que as limitações ao poder de tributar constituem “...garantia outorgada ao

contribuinte...” dizendo ainda que o disposto no art. 150, III, “b” deve ser lido de forma combinada com o disposto no § 2º do art. 5º, ambos da Constituição.

No julgamento do mérito da ADI 939, consta do voto min. Sidney Sanches:

“Nem me parece que, além das exceções ao principio da

anterioridade, previstas expressamente no § 1º. do art. 150, pela

Constituição originária, outras pudessem ser estabelecidas por emenda constitucional, ou seja, pela Constituição derivada.

Se não se entender assim, o principio e a garantia individual tributária, que ele encerra, ficariam esvaziados, mediante novas e

sucessivas emendas constitucionais, alargando as exceções, seja para Impostos previstos no texto originário, seja para os não

previstos.”

1 Soma da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

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O STF então manifestou entendimento no sentido de que as limitações ao poder

de tributar constituem direitos fundamentais das pessoas, o que faz de tais normas cláusulas pétreas.

Assim, as exceções às limitações ao poder de tributar somente podem ser

aquelas já construídas pelo legislador constituinte originário, não podendo o legislador constitucional derivado criar outras exceções que tenham por objeto

diminuir as garantias já existentes.

10.1 – AS LIMITAÇÕES

As limitações constitucionais ao poder de tributar estão dispostas nos artigos

150 e seguintes da Constituição. CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios:

Nota-se do caput do art. 150 que tais limitações não estão ali em rol exaustivo (sem prejuízo de...) e vinculam todos os entes federados. Por sua vez, as

disposições do art. 151 vinculam somente a União e as do art. 152 somente os

Estados e Municípios.

10.2 – LIMITAÇÕES GERAIS

10.2.1 – PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL

CF... Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao

contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

Em primeiro lugar é necessário distinguir os termos princípio da legalidade e princípio da reserva legal.

A Constituição, em seu art. 5º., dispõe que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”.

Nesse contexto, o termo lei deve ser visto em seu sentido amplo, abarcando aí atos normativos de natureza infra legal (decretos, portarias, ordens de serviço e

outros).

Já no texto do art. 150, I da Constituição, o termo lei deve ser entendido em seu sentido restrito, ou seja, lei no sentido formal, resultado de um processo

legislativo previsto na Constituição.

Este princípio costuma ser nominado “princípio da reserva legal” em contraposição ao princípio da legalidade genérica previsto no art. 5º. Da

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Constituição. Admite ainda a nomenclatura de princípio da legalidade

tributária.

É comum dizer (e ouvir dizer) que a Magna Carta2 seria o marco inicial do

princípio da legalidade. Através desse documento, os senhores da terra

impuseram ao Rei João Sem Terra a necessidade de obter prévia autorização parlamentar3 para a criação de tributos.

“No sentido material, a lei consiste num ato normativo de caráter geral,

abstrato e obrigatório, tendo como finalidade o ordenamento da vida coletiva, no sentido de trazer certeza, precisão e garantia às relações jurídicas.”4

Se nada mais pudesse ser dito a respeito de lei, sua função no mundo tributário

estaria justificada pela necessidade de “...trazer certeza, precisão e garantia às relações jurídicas...” que tem por objeto permitir a extração de patrimônio de

alguém em favor do Estado.

Em sentido formal, lei é “...todo ato emanado das entidades às quais a Constituição atribua função legislativa, se praticado no uso da competência

constitucionalmente outorgada.”5

O princípio da reserva legal dispõe que só a lei poderá criar tributos e majorar os tributos já existentes.

O tributo nasce na lei e não através da lei, ou seja, é a lei que cria o tributo, sendo descabido imaginar que a lei viesse a autorizar sua criação por outro

instrumento normativo.

Regra geral, em termos simples, será inconstitucional qualquer tributo que não

for criado por lei, como também o será o aumento de qualquer tributo que não decorra de lei. Aplica-se, portanto, a todas as espécies tributárias.

A lei deve ser entendida em seu sentido restrito, ou seja, “...prescrição normativa produzida com observância do processo para esse fim estabelecido,

pelo órgão estatal dotado de atribuição para o desempenho da função legislativa.”6

A “lei” a que se refere o art. 150, I da Constituição deve ser entendida como lei ordinária, já que despida de qualquer adjetivo. No entanto, há tributos cuja

criação reclama lei complementar e para que não reste qualquer dúvida

vamos elencá-los:

imposto residual criado através do exercício da competência residual (CF,

154, I);

empréstimos compulsórios (CF, 148);

novas contribuições para a seguridade social (CF, 195, § 4º) e

imposto sobre grandes fortunas.

2 1215 3 Commune Consilium Regis 4 (Silva J. A., 2006) 5 Seabra Fagundes citado por (Silva, 2006) 6 (Machado, Os Princípios Jurídicos da Tributação na Cosntituição de 1988, 2001)

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Quanto ao Imposto Sobre Grandes Fortunas deixamos registrada uma ressalva.

A doutrina não é pacífica quanto à necessidade de lei complementar como instrumento introdutor desse imposto. Entendemos que compete à lei

complementar definir o que seja “grande fortuna”. Uma vez definido o instituto,

o imposto poderia ser criado por lei ordinária, embora a definição de seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes seja também reserva de lei

complementar por força do art. 146 da Constituição.

Reconhecemos ser majoritária a doutrina que reconhece a necessidade

de edição de lei complementar para a criação do IGF.

Fique então bem claro que os tributos, em regra, são criados por lei ordinária e,

somente nos casos excepcionais, são criados por lei complementar.

O princípio da reserva legal admite visão, no mínimo, sob duas perspectivas. A

primeira é a de que a cobrança de tributo demanda a manifestação de consentimento por parte de quem é tributado. Embora tal afirmação possa

causar estranheza (já que o tributo é prestação pecuniária compulsória) sua instituição decorre da lei, ou seja, da atuação parlamentar que, na verdade,

representa a vontade popular.

A segunda leva ao entendimento de que a criação de tributo requer sejam

postos em lei todos os elementos necessários à caracterização da relação

jurídico-tributária.

Como já vimos quando da análise do conceito de tributo, não basta à lei dizer

“fica criado determinado tributo”. É necessário que a lei instituidora do tributo traga, no mínimo, os elementos constantes do art. 97 do CTN (regulamentador

do princípio da legalidade), quais sejam:

a instituição de tributos, ou a sua extinção;

a majoração de tributos, ou sua redução; a definição do fato gerador da obrigação tributária principal;

sujeito passivo; a fixação da alíquota do tributo e da sua base de cálculo;

a cominação de penalidades; as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou

de dispensa ou redução de penalidades.

Leandro Paulsen entende que a lei tributária deverá trazer os elementos de

modo a “...permitir ao contribuinte conhecer os efeitos tributários dos atos que praticar ou posições jurídicas que assumir... Importa que se tenha a

possibilidade de determinar, com suporte na lei, quais as situações que implicam o surgimento da obrigação tributária, quando e em que momento tal

se dá, quais os sujeitos da relação tributária e como calcular o montante devido, independentemente de complementação de cunho normativo por parte

do Executivo...”7. A lei deverá trazer8:

Aspecto material: qual é a situação geradora da obrigação tributária;

Aspecto espacial: onde a ocorrência da situação é relevante;

7 (Paulsen, Direto Tributário - Constituição e Código Tributário, 2008) 8 (Paulsen, Direto Tributário - Constituição e Código Tributário, 2008)

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Aspecto temporal: quando se deve considerar ocorrida a situação

geradora; Aspecto pessoal: quem está obrigado ao pagamento (sujeito passivo) e a

favor de quem (sujeito ativo);

Aspecto quantitativo: qual o montante devido.

O aspecto quantitativo reclama expressa fixação em lei, não se admitindo expressões do tipo: “a alíquota será a de maior valor admitida em Resolução do

Senado”.

Veda-se a automaticidade na fixação das alíquotas.

Há impostos cujas bases de cálculo reclamam o levantamento de preços praticados no mercado e entre eles podemos citar o IPTU, o ITR e o IPVA. Para

que se chegue ao valor venal de cada imóvel urbano (base de cálculo do IPTU), o município deve fazer um levantamento dos preços dos imóveis em transações

comuns e, agregando a esses dados outros elementos de natureza técnica ou estatística, chega-se a uma relação de valores venais cujo conjunto recebe o

nome de planta de valores.

Esses valores, por serem a expressão monetária da base de cálculo de tributo,

devem ser veiculados em lei. Sua alteração pode ser feita de duas formas:

Por lei, se houver aumento real do valor, assim entendido um aumento numérico superior à inflação oficial do período;

Por instrumento infra legal, se a modificação retratar apenas a correção dos valores, desde que o índice de atualização não seja superior ao índice

de inflação oficial.

Aplicam-se aqui os parágrafos do art. 97:

§ 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação de sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso.

§ 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da

respectiva base de cálculo.

O STJ sumulou entendimento nesses termos:

STJ-160

É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.

A simples atualização monetária não representa qualquer aumento de tributo,

pois nada mais faz que repor o valor do dinheiro corroído pelo tempo em função da inflação. Nada impede que a correção se faça através de qualquer índice,

desde que a variação desse índice no período considerado não seja superior à variação do índice que mede a inflação oficial.

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Qualquer medida que implique redução de tributo ou penalidade a pagar

reclama a edição de lei específica, assim entendida aquela que trata exclusivamente da desoneração ou do tributo objeto da desoneração:

CF 150 ...

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativas a

impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule

exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto

no art. 155, § 2º, XII, "g".

Nada impede o uso de lei delegada em matéria tributária, desde que a matéria

objeto da delegação não constitua reserva de lei complementar. No entanto, com o advento da medida provisória, esse instituto tornou-se desnecessário.

10.2.1.1 - DATA DE VENCIMENTO DA OBRIGAÇÃO

A data de vencimento da obrigação não se encontra entre os elementos sujeitos à reserva legal (CTN, 97) e, portanto, sua fixação pode ocorrer através de ato

infra legal, embora nada impeça que seja fixado por lei.

Tendo sido fixado por lei, sua alteração reclama a edição de lei e nada impede a revogação da lei que definiu a data de vencimento de determinada obrigação e,

a partir daí, sua fixação através de ato infra legal. Se a data de vencimento estiver fixada por ato infra legal, outro ato de mesma hierarquia poderá alterá-

lo. 10.2.1.2 – MEDIDAS PROVISÓRIAS

Muito embora o uso de medidas provisórias tenha se tornado banal, cumpre

não esquecer que “...caso de urgência e relevância...” ainda constitui seu requisito inarredável. São admissíveis em matéria tributária, com os mesmos

efeitos da lei ordinária, podendo então criar ou aumentar tributos com as limitações constantes da CF, 62, § 2o9. aplicáveis à espécie impostos.

Tal conclusão decorre do fato de que a Emenda Constitucional 32 trouxe ao texto constitucional, de forma expressa, as limitações ao uso das medidas

provisórias e entre elas não se encontra o tema tributário.

Nos casos em que o ordenamento tributário impõe a necessidade de lei complementar, o uso de medida provisória está vedado (criação de

empréstimos compulsórios, impostos extraordinários, novas contribuições previdenciárias e imposto sobre grandes fortunas, além de outras situações). A

vedação decorre não do fato de se tratar de matéria tributária e sim da reserva de lei complementar.

9 § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.

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10.2.1.3 - AS EXCEÇÕES (ou AS ATENUAÇÕES)

CF. Art. 153...

§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e

os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.

O PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL admite exceções, não quanto à criação de

tributos (que somente poderá ocorrer em decorrência de lei), quanto a modificação de sua alíquota por meio de ato do Poder Executivo (decreto).

Constituem exceções: II, IE, IPI e IOF.

No que se refere aos impostos, o que justifica tal exceção é seu efeito extra-

fiscal. Vejamos um exemplo.

O saldo de moeda estrangeira em um Estado é o resultado de suas contas

relativas ao comércio exterior. Para obter moeda estrangeira, é necessário, em regra10, exportar. Por outro lado, a importação é causa de saída de moeda

estrangeira.

É necessário administrar as reservas cambiais de modo a manter um saldo

suficiente para honrar os compromissos do Estado a serem solvidos em moeda

estrangeira.

Isso posto, imagine uma situação na qual a importação de veículos está

extremamente aquecida e poderá vir a comprometer o estoque de moeda estrangeira. Isso acontece pois, a cada operação de importação, o pagamento

ao vendedor estrangeiro é feito em moeda estrangeira.

É necessário, então, diminuir o ritmo das importações de modo a diminuir a

saída de moeda estrangeira. Uma das formas de atingir tal intento é aumentar o imposto de importação, tornando o preço final do veículo importado mais alto,

na esperança de que muitos se vejam desestimulados a tal aquisição em virtude de seu valor.

Note que a majoração do imposto de importação não tem por objetivo aumentar a arrecadação e sim regular o comportamento do indivíduo. O que se

busca é um efeito extra-fiscal com a majoração desse imposto.

Em virtude da aplicação do princípio da legalidade, o aumento do imposto de

importação reclama a edição de lei. Vamos supor que, entre a apresentação do

projeto de lei e a sua vigência decorra um prazo de seis meses (somente por hipótese).

Durante esses seis meses, as pessoas que estivessem postergando a compra do veículo importado, em virtude do aumento que se avizinha, muito

provavelmente antecipassem suas compras de modo a fugir o aumento.

Conclusão: durante esses seis meses não haveria o efeito extra-fiscal que se

esperava com a medida e ainda mais, haveria o agravamento da situação que se deseja evitar (compra de veículos importados) agravada.

10 Diz-se em regra, pois há outras formas de obter moeda estrangeiras, formas essas que, nesse exemplo, serão ignoradas.

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Embora seja comum dar a essas situações o nome de exceções, parte da

doutrina entende que há apenas uma atenuação do princípio da legalidade, já que ao Executivo é concedida certa liberdade para fixar as alíquotas dentro de

limites preestabelecidos em lei.

Em outras palavras, é possível que o Executivo, por ato seu (por exemplo, decreto), possa alterar as alíquotas desses quatro impostos nos limites das leis.

Outros atos do Executivo também podem veicular tais alterações e, nesse sentido, o STF, ao julgar o RE 570.680 entendeu que a Câmara de Comércio

Exterior – CAMEX, órgão do poder Executivo, pode alterar alíquotas do Imposto de Exportação, com base no art. 153, § 1º da Constituição.

O valor que se paga a título de tributo é, em regra, o produto de uma base de cálculo por uma alíquota. Então há, também em regra, três formas de majorar

um tributo:

Aumentar a alíquota;

Aumentar a base de cálculo e Aumentar tanto a base de cálculo como a alíquota.

É de se notar ainda que, em se tratando de aumento dos impostos que

constituem exceção ao princípio da legalidade, este somente poderá decorrer de

ato do Executivo se tiver por causa a majoração da alíquota e, mesmo assim, se a alíquota nova estiver nos limites da lei. Se o aumento ocorrer em virtude

de majoração de base de cálculo, a lei continua a ser imprescindível.

Os impostos incidentes sobre o comércio exterior, tanto o de importação quanto o de exportação, têm feições extrafiscais, servindo ao controle do comércio

exterior e de instrumento de política cambial.

De forma semelhante, o IPI e o IOF, em suas respectivas funções extrafiscais,

servem de instrumento de controle da produção e política financeira. Justificam-se dessa forma as exceções em comento, pois o tempo decorrido durante o

processo legislativo (de produção da lei) tornaria inútil o manejo desses impostos com finalidades extrafiscais.

A CIDE-Combustível também constitui uma exceção ao princípio da legalidade nos termos da CF, 177, § 4o., I, b.

CF...Art. 177... § 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio

econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus

derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos:

I - a alíquota da contribuição poderá ser ... b)reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe

aplicando o disposto no art. 150,III, b;

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Em virtude dessa disposição, a lei fixa a alíquota e o poder executivo pode

apenas reduzir e restabelecer após essa fixação), reduzindo-a e restabelecendo-a a seu critério. O verbo “restabelecer” adquire o significado de fazer voltar a

alíquota ao último valor estabelecido em lei.

Também constitui exceção ao princípio da legalidade a hipótese de ICMS de incidência monofásica (ICMS- Combustíveis). A Constituição no § 4º de seu

artigo 155 trata do tema nos seguintes termos:

§ 4º Na hipótese do inciso XII, "h", observar-se-á o seguinte: I - nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados

do petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo; II - nas operações interestaduais, entre os contribuintes, com gás

natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, o imposto será repartido

entre os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas operações com as demais

mercadorias; III - nas operações interestaduais com gás natural e seus

derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I

deste parágrafo, destinadas a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem;

IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, "g",

observando-se o seguinte: a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser

diferenciadas por produto; b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou

"ad valorem", incidindo sobre valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em

condições de livre concorrência; c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o

disposto no art. 150, III, "b". § 5º As regras necessárias à aplicação do disposto no § 4º,

inclusive as relativas à apuração e à destinação do imposto, serão

estabelecidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, "g".

Então, nas hipóteses de incidência monofásica do ICMS sobre operações com

combustíveis e lubrificantes, as alíquotas (ICMS-Combustíveis) serão definidas através de Convênio (CONFAZ).

11 - PRINCÍPIO DA ISONOMIA

CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios:...

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II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se

encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,

independentemente da denominação jurídica dos rendimentos,

títulos ou direitos;

O sentido do termo isonomia em matéria tributária ganha um contorno especial se comparado com o sentido geral do termo, assim entendido como igualdade

de todos perante a lei, garantia constitucional.

Aqui, a isonomia reclama uma igualdade de capacidade contributiva e, embora

dirigida a todos os impostos (CF, 145, I), somente encontra aplicação quanto aos impostos de caráter pessoal, ou seja, aqueles que levam em conta a

condição pessoal do contribuinte.

“Para o jurista italiano Emílio Giardina, a capacidade contributiva significa

capacidade econômica de pagar o tributo, ou seja, posse de uma riqueza, em medida suficiente para fazer frente à exigência fiscal.”11

O princípio da isonomia atrai grande simpatia, sendo visto por muitos como sinônimo de justiça, principalmente em termos tributários.

No entanto, a igualdade aqui buscada deve implicar um sacrifício igual para os

contribuintes, ou seja, proporcional à sua capacidade contribuinte. A medida da capacidade contributiva é o único traço distintivo entre os sujeitos passivos.

Vale dizer, estão em situação de igualdade tributária aqueles que têm a mesma capacidade contributiva e, mutatis mutandis, estão em situação de

desigualdade aqueles não têm a mesma capacidade contributiva.

A título de exemplo, nota-se que para uma pessoa que tem renda de R$

300,00, R$ 30,00 não significam o mesmo que significam para uma pessoa que tem renda de R$ 30.000,00. Resta então claro que aqui não se trata de uma

igualdade numérica e sim uma igualdade de sacrifício, decorrente, como já foi dito, da capacidade contributiva.

Oliveira admite a existência de dois sentidos para o instituto da capacidade contributiva, “...um objetivo ou absoluto e outro subjetivo ou relativo. No

primeiro caso, a capacidade contributiva significa a existência de uma riqueza apta a ser tributada (capacidade contributiva como pressuposto da tributação),

enquanto no segundo, a parcela dessa riqueza que será objeto da tributação

em face de condições individuais (capacidade contributiva como critério de graduação e limite do tributo).”12

Caminhando no sentido de desvendar o que seria a verdadeira isonomia, é necessário analisar os institutos da proporcionalidade e da progressividade.

A proporcionalidade, como o próprio nome diz, implica existir uma razão de proporcionalidade constante entre a riqueza tributada e o tributo recolhido. Seja

o seguinte exemplo numérico:

11 (Conti, 1997) 12 (Oliveira, 1988)

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11

Riqueza Tributada Alíquota Tributo

100,00 10% 10,00

1.000,00 10% 100,00

10.000,00 10% 1.000,00

100.000,00 10% 10.000,00

A tabela acima pode ser sintetizada numa expressão algébrica da seguinte forma:

A = k x B, ou seja:

Tributo = Alíquota x Riqueza Tributada

Nota-se que a alíquota seria a constante de proporcionalidade que vincularia o

tributo e a riqueza tributada.

Segundo o instituto da progressividade, o tributo “cresce”, não de forma

proporcional e sim de forma progressiva, à medida que cresce a riqueza tributada. Seja o seguinte exemplo numérico:

Riqueza Tributada Alíquota Tributo

100,00 0% 0,00

1.000,00 10% 100,00

10.000,00 15% 1.500,00

100.000,00 20% 20.000,00

Tem-se aqui a impossibilidade de reduzir a tabela acima a uma expressão algébrica linear (marcada pela proporcionalidade).

Na Constituição de 1988, o tema ainda aparece em 4 oportunidades13 e na doutrina brasileira, a progressividade somente encontra justificativa como

instrumento destinado a cumprir o princípio da capacidade contributiva e fazer atingir a justiça fiscal.

CF Art. 145... § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e

serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente

para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados

os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

13 CF, 153 §2o., I; 153, § 4o., ; 156, § 1o., I ,e 182, § 4o., II

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12

A Constituição, em seu art. 145, diz da progressividade (“...graduados segundo

a capacidade contributiva...”) dos impostos, mas a limita aos casos em que tal seja possível.

A expressão “sempre que possível” deve ser entendida não como uma faculdade colocada à disposição do legislador e sim uma obrigação a ser

observada sempre que a estrutura do imposto o permitir.

Renova-se aqui a afirmação anterior de que o instituto da progressividade é

incompatível com os impostos reais, assim entendidos aqueles que incidem sobre a coisa tributada, sendo irrelevante a capacidade contributiva

manifestada.

Apesar dessa incompatibilidade, a Constituição foi emendada14 para permitir

que o IPTU (imposto real) seja cobrado de forma progressiva.

CF, art. 156 ...

§ 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

I - ser progressivo em razão do valor do imóvel;

As hipóteses de possibilidade de tributação de forma progressiva encontram-se

elencadas de forma excepcional e taxativa na CF, nesses termos:

Outra visão a ser lançada sobre a isonomia em matéria tributária decorre do fim

extra-fiscal dos tributos. Lembrando: o tributo tem função fiscal quando tem por objeto retirar patrimônio do particular em favor do Estado e função extra-

fiscal quando seu objetivo é ordenar a economia e as relações sociais. Podemos citar como exemplos:

- tratamento favorecidos às micro empresas e empresas de pequeno porte (CF, 146, III);

- incentivos fiscais de natureza regional (CF, 151, I);

- IPTU progressivo no tempo (CF, 182, § 4º.,I);

- impossibilidade de adesão ao simples para certos tipos de atividades;

- tratamento favorecido para as empresas de utilização intensiva de mão de

obra (CF, 195, § 9º.)

Quanto ao tratamento favorecido às micro empresas e empresas de pequeno

porte, embora possa parecer uma atitude discriminatória, na verdade, ela trata

de forma igual pessoas que se tornaram desiguais das demais. Não resta dúvida de que uma empresa de pequeno porte é tão empresa quanto uma de

grande porte.

É certo que a própria Constituição resolveu estimular a empresa de pequeno

porte como parte de sua política social e econômica. Dessa forma, não afronta o princípio da isonomia tratar de forma desigual das demais as empresas de

pequeno porte desde que, entre elas, ou seja, entre as de pequeno porte não haja diferenciação de tratamento.

14 EC 29

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

13

O que o princípio em comento proíbe é a diferenciação injustificada entre os

sujeitos passivos.

Também não é possível o tratamento tributário diferenciado em virtude da

profissão ou cargo exercido pelo indivíduo. Como exemplo, temos que seria

impossível a concessão de isenção de IPTU aos contribuintes que fossem servidores de determinado Município.

É comum afirmar-se serem vedados os privilégios odiosos.

11.1 – CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Trocando em miúdos, pela aplicação do princípio da capacidade contributiva,

quem pode mais, paga mais; quem pode menos, paga menos e quem não pode não paga.

Nota-se que o texto constitucional vincula o princípio da capacidade contributiva aos impostos e não é de causar qualquer espanto, pois esse é um tributo que

incide sobre a riqueza. Pela aplicação do princípio em tela, o imposto deve ser graduado de acordo com o tamanho da riqueza.

A ressalva de “...sempre que possível...” está direcionada à natureza do

imposto e deve ser entendida como “...sempre que a natureza do imposto permitir...”. Como já visto, não se trata aqui de uma liberalidade ofertada ao

legislador.

Os impostos pessoais são aqueles que, na sua graduação, levam em conta

não só o tamanho da riqueza tributada, como as condições pessoais e particulares do contribuinte. Como exemplo, tome-se o imposto de renda. No

cálculo do valor devido toma-se não só a renda como também as despesas dedutíveis de cada contribuinte (dependentes, despesas médicas, despesas com

educação e outras).

Já nos impostos reais, toma-se o valor da coisa tributada, sendo de nenhuma

importância a condição pessoal de quem deve pagar o imposto. Então, a aplicação do princípio da capacidade contributiva é, em regra, incompatível com

os impostos reais.

Embora vocacionado a incidir sobre os impostos, o princípio da capacidade

contributiva deve ser aplicado a outros tributos não vinculados, ou seja,

naqueles em que não há uma contrapartida específica do Estado, como, por exemplo, nas contribuições devidas à seguridade social. O raciocínio supra leva

a excluir das taxas a aplicação do princípio da capacidade contributiva. No entanto, mesmo em se tratando de taxas, o STF tem julgados que o aplicam às

taxas.

STF - 667

Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa.

O entendimento materializado na Súmula 667 é de que, na hipótese de não

haver limite, o valor das custas processuais poderia tornar-se tão alto de forma

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

14

a se transformar num empecilho ao acesso ao Judiciário. Ademais, o valor da

causa não guarda, necessariamente, nenhuma relação com a capacidade contributiva do titular do direito.

Vale analisar o IPTU quanto à cobrança de forma progressiva. A Constituição,

em sua redação original assim dispunha:

CF, 156 ... § 1º - O imposto previsto no inciso I poderá ser progressivo, nos

termos de lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade.

Dessa forma, a única progressiva admitida em relação ao IPTU era aquela

progressividade no termo, com base no art. 182 da Constituição. Com base nesse dispositivo e no entendimento de que o IPTU é um imposto real, o STF

editou a seguinte súmula:

STF - 668 É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da emenda

constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada

a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.

Após a edição da Emenda Constitucional nr. 29, o texto em comento foi alterado o IPTU passou a admitir duas espécies de progressividade, a saber:

uma de natureza fiscal (art. 156, §1º) e outra de natureza extra-fiscal (CF, 182).

CF Art. 156...

§ 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

I - ser progressivo em razão do valor do imóvel; e II - ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso

do imóvel

Não se pode com isso afirmar que o IPTU deixou de ser classificado com

imposto real. Acontece que é um imposto real que admite a imposição de alíquotas progressivas por expressa disposição constitucional.

11.2 – VIOLAÇÕES

Uma lei do Rio Grande do Norte dispensou do pagamento de custas e

emolumentos pelos serviços judiciais e extrajudiciais os membros e servidores do Poder Judiciário. Levado ao Judiciário, a lei foi julgada inconstitucional por

afrontar o princípio da isonomia tributária que impede o tratamento desigual em virtude de “...em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida...”

(CF, 150, II). ADI 3.334-RN.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

15

12 – PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE

CF Art. 150. ... Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é

vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

Este princípio decorre da garantia constitucional de respeito ao direito adquirido

e ao ato jurídico perfeito. A lei tributária que impõe a cobrança de tributos somente incide sobre os fatos geradores ocorridos após a sua vigência (e não a

sua publicação). Reafirma a vocação prospectiva (para frente) da lei.

O STF15 tem julgado tem no sentido de entender que a simples publicação do

texto é o que interessa, vale dizer, ainda que o Diário Oficial não esteja circulando, o que conta é a data da publicação.

Para que se possa analisar a aplicação do princípio da irretroatividade é

necessário conhecer as diversas espécies de fato gerador:

instantâneo é fato gerador que ocorre numa determinada oportunidade, em geral, definida na lei do tributo. Por exemplo, no que diz respeito ao

Imposto de Importação, o CTN, em seu art. 19 dispõe que:

CTN...

Art. 19. O imposto, de competência da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes

no território nacional.

Por uma ficção, a lei (DL 37/66) define que ocorre a entrada do produto estrangeiro em território nacional quando do registro da respectiva declaração

de importação junto ao órgão competente:

CTN...

Art. 23. Quando se tratar de mercadoria despachada para consumo, considera-se ocorrido o fato gerador na data do

registro, na repartição aduaneira, da declaração a que se refere o art. 4416.

periódico é o fato gerador cuja ocorrência se prolonga no tempo e,

também por uma ficção, tem sua data de ocorrência fixada. Tanto o IPTU como o IPVA têm por fatos geradores a propriedade que, presume-se, vai

ocorrer durante todo o ano. Por uma ficção, define-se que seus

15 RE 226.451-3 16 Art. 44. Toda mercadoria procedente do exterior por qualquer via, destinada a consumo ou a outro regime, sujeita ou não ao pagamento do imposto, deverá ser submetida a despacho aduaneiro, que será processado com base em declaração apresentada à repartição aduaneira no prazo e na forma prescritos em regulamento.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

16

respectivos fatos geradores ocorrem em determinada data, qual seja, em

regra, o primeiro dia do ano.

complexivo: é o fato gerador composto de uma série de situações que se

sucedem no tempo e cuja somatória implica o aperfeiçoamento da ocorrência desse fato gerador em determinada data. Exemplo mais

comum é o do imposto de renda: o fato gerador é a soma das rendas e proventos de qualquer natureza auferidos ao longo de um determinado

período, ou seja, um ano. Assim, a renda auferida no ano de 2.009 será a soma das rendas auferidas entre 1º de janeiro e 31 de dezembro do

mesmo ano. Vale dizer que o fato gerador “começa” a ocorrer em 1º de janeiro e “termina” de ocorrer em 31 de dezembro.

A expressão “fatos geradores” constante do texto constitucional desperta

alguma polêmica. Para alguns (entre eles Leandro Paulsen) deve-se tomar em conta o aspecto material (situação fática) da hipótese de incidência e não

aspecto temporal (quando se considerada ocorrida a situação fática), quase sempre uma ficção jurídica, sob pena de praticar-se a “retroatividade

imprópria”.

Ocorre a retroatividade imprópria na hipótese em que a lei aplica-se a períodos de apuração em curso quando se iniciou a sua vigência. Ao revés,

ocorre a retroatividade própria na hipótese em que a lei aplica-se a períodos de apuração já findos quando se iniciou a sua vigência.

Explica-se: para o imposto de renda, o fato gerador (auferimento da renda), sob o aspecto material, ocorre durante um exercício financeiro (de 1º de janeiro

a 31 de dezembro); por uma ficção jurídica, sob o aspecto temporal, o fato gerador ocorre em 31 de dezembro de cada exercício.

01/01 31/12

RENDA

ASPECTO MATERIAL

FATO GERADOR

ASPECTO TEMPORAL

“Admitir-se, para fins de aplicação do princípio da irretroatividade, a consideração pura e simples da definição legal do aspecto temporal da hipótese

de incidência, sem atentar para o fato econômico tributado, implica a chamada retroatividade imprópria, de todo reprovável e ofensiva da segurança e

confiabilidade do contribuinte, mas, não obstante, aceita pelo Supremo Tribunal Federal. Em se tratando de fatos geradores de período (também designados

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

17

complexivos), a garantia de irretroatividade exige que a lei seja prévia ao início

do período.”17

No entanto, o STF18 tem julgados no sentido de considerar o aspecto

temporal da hipótese de incidência como o marco para se verificar a legislação

aplicável.

Luciano Amaro, de forma simples ensina que “O fato gerador é a série a+b+c. A lei, para respeitar a irretroatividade, há de ser anterior à série a+b+c, vale

dizer, a lei deve preceder todo o conjunto de fatos isolados que compõem o fato gerador do tributo.”19

Essa também é a lição do Prof. Sacha Calmon: “Assim sendo, faz-se necessário não apenas precisar o dia em que ocorre o fato gerador, mas precisar

igualmente o dies a quo e o dies ad quem quando se tratar de ‘fato gerador’ composto de conjunto de fatos na duração do tempo. Caso contrário, não se

teria como operacionalizar em relação a estes o princípio da anterioridade. O imposto sobre a renda anual caracteriza bem a hipótese. Neste, importa saber

quando começa o fato gerador... A lei deve ser prévia ao seu início”.20

No que pertine ao Imposto de Renda, o tema está assim sumulado no STF:

STF- 584:

Ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração.”21

Pelo teor da Súmula, o STF entende que, para fins de imposto de renda e

aplicação do princípio da anterioridade, tem maior relevância a data da entrega da declaração de rendimentos.

Seja, por exemplo, uma declaração de renda de pessoa física que retrate a

renda auferida no ano de 2007. A declaração de rendimentos correspondente deverá ser entregue até 30.04.2008.

É verdade que os fatos jurídicos que resultaram no fato gerador do imposto de

renda ocorreram durante todo o exercício de 2007, entre 01.01.07 e 31.12.2007, para ser mais exato. No entender de Luciano Amaro, ao qual adere

Hugo de Brito Machado, a legislação aplicável seria a vigente em 31.12.2006,

ou seja, anterior ao conjunto de fatos jurídicos que formaram o fato gerador do imposto de renda em 2007.

No entanto, aplicando-se a súmula 584, teríamos a aplicação da legislação vigente em 31.12.2007. Nesse sentido teríamos a retroatividade da norma, pois

incidiria sobre fatos já ocorridos (aqueles anteriores a 31.12.2007) e que são elementos de um conjunto denominado “fato gerador do imposto de renda

relativo ao exercício de 2.007”.

17 (Paulsen, Direito Tributário - Constituição e Código Tributário, 2009) 18 AgRegAI 420.993 19 (Amaro, Direito Tributário Brasileiro, 1998) 20 (Coêlho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 2002) 21 15/12/1976

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

18

Esta seria uma hipótese de retroatividade imprópria.

Em termos genéricos, uma lei que aumente o imposto de renda e que tenha sido publicada no ano N, somente poderá ser eficaz em relação ao fato gerador

ocorrido no ano N+1, cuja declaração deverá ser entregue no ano N+2.

Na leitura feita da Súmula 584, com as modificações trazidas pela EC/42, a legislação aplicável ao ano de 2007 deveria ser publicada até 31.12.2007, o que

a faria vigente já em 01.01.2008, já que o imposto de renda constitui exceção à anterioridade dos 90 dias (CF, 150, III, “c”).

Embora demonstrada a desatualidade da Súmula 584, o STF voltou a decidir22 com base nela, fixando ainda entendimento de que o fato gerador do IRPF

ocorre a cada 31 de dezembro do ano em que a renda foi auferida.

Nesse julgamento, relativo a IR correspondente ao ano calendário de 1989, a

alegação era de afronta ao princípio da irretroatividade, já que a alíquota do IR havia sido majorada por lei publicada em 28.12.1989.

EMENTA: ”... 3. Com efeito, a pretensão da ora recorrida,

mediante Mandado de Segurança, é a de se abster de pagar o Imposto de Renda correspondente ao ano-base de 1989, pela

alíquota de 18%, estabelecida no inc. I do art. 1º da Lei nº 7.968,

de 28.12.1989, com a alegação de que a majoração, por ela representada, não poderia ser exigida com relação ao próprio

exercício em que instituída, sob pena de violação ao art. 150, I, "a", da Constituição Federal de 1988. 4. O acórdão recorrido

manteve o deferimento do Mandado de Segurança. Mas está em desacordo com o entendimento desta Corte, firmado em vários

julgados e consolidado na Súmula 584, que diz: ‘Ao Imposto de Renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a

lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração.’ Reiterou-se essa orientação no julgamento do R.E. nº

104.259-RJ (RTJ 115/1336). 5. Tratava-se, nesse precedente, como nos da Súmula, de Lei editada no final do ano-base, que

atingiu a renda apurada durante todo o ano, já que o fato gerador somente se completa e se caracteriza, ao final do respectivo

período, ou seja, a 31 de dezembro. Estava, por conseguinte, em

vigor, antes do exercício financeiro, que se inicia a 1º de janeiro do ano subsequente, o da declaração. 6. Em questão

assemelhada, assim também decidiu o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do R.E. nº 197.790-6-MG, em

data de 19 de fevereiro de 1997. ... “.

O tema continua em julgamento no STF e, dos votos já proferidos (5), três

reconhecem a inconstitucionalidade da lei para ser aplicada no ano de 1989 (afronta ao princípio do anterioridade) e outros dois não a reconhecem.

22 RE 194.612

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

19

“Iniciado o julgamento de recurso extraordinário em que se

discute a constitucionalidade da Lei 7.988 (art. 1º, I), de 28.12.89, que elevou de 6% para 18% a alíquota do imposto de

renda aplicável ao lucro decorrente de exportações incentivadas,

apurado no ano-base de 1989. O Min. Carlos Velloso, relator, sob entendimento de que o fato gerador do imposto de renda de

pessoa jurídica é complexivo - ocorrendo nos diversos momentos em que acontecem os fatos econômicos que afetam o patrimônio

da pessoa jurídica -, proferiu voto no sentido da inconstitucionalidade da mencionada Lei relativamente ao ano-

base de 1989, exercício de 1990, por ofensa ao princípio da irretroatividade da lei tributária (CF, art. 150, III, a). Após, o

julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Nelson Jobim. RE 183.130-PR, rel. Min. Carlos Velloso, 20.5.98.”23

Nesse RE já votaram pelo não provimento do recurso os ministros Carlos Velloso, Nelson Jobim e Joaquim Barbosa. Votaram pelo provimento do recurso

os ministros Eros Grau e Menezes Direito. Os autos estão com vistas para o ministro Cezar Peluso desde 14.11.2007.

No STJ há entendimento pacificado quanto à não aplicação do disposto na

súmula 584 do STF e, em seu voto quando do julgamento do REsp 179.966, o ministro Milton Luiz Pereira faz um histórico dessa súmula concluindo pela

sua inaplicabilidade:

“A súmula em referência foi adotada com base em julgamentos

ocorridos nos anos de 1973 e 1975. A respeito da mesma, se lê no 'Caderno de Pesquisas Tributárias', vol. 11, pág. 21:”Embora

divulgada oficialmente muito tempo depois da reforma tributária de 1965⁄1966, a Súmula nº 584 fundou-se no

fato de que o tributo é calculado sobre a renda ou o lucro auferido no ano-base, mas que, por ficção, era considerada

auferida no exercício financeiro da União (ano subsequente), como se fosse a renda obtida no ano-base

mera estimativa da renda (por ficção) ganha no exercício financeiro e sujeita ao imposto’. Por tal modo, no exercício

seguinte ao do período base é que surgiria o LUCRO,

aperfeiçoando-se o fato imponível. (...) A orientação sumulada foi contrariada pelo acórdão do extinto Tribunal Federal de Recursos,

na AC nº 82.686-PR, 5ª Turma, sendo relator o Ministro Sebastião Reis, assim ementado:

“Tributário - Imposto de Renda - DL 1.704⁄79 (art. 1º) Ciclo do Fato Gerador- Período Base. O artigo 1º do DL 1.704⁄79 teve em

mira o período base em curso. Pendente 'in fieri’ à data da publicação respectiva, como acontece no caso concreto cujo

aperfeiçoamento ocorre em 31 de janeiro anterior. A partir do CTN, o fato gerador do imposto de renda passou a identificar-se

com a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica do

23 Informativo 111

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

20

rendimento, no fluxo continuado até o encerramento do seu ciclo

(art. 116, I), o que veio a afastar a legislação anterior, orientada no sentido de que a renda auferida no ano-base seria apenas

'padrão de estimativa' da renda ganha no exercício financeiro, ou

simples valor de referência, apresentando-se hoje tal aquisição no período-base como o próprio fato gerador. Inaplicabilidade da

Súmula 584 do Alto Pretório, pois a mesma foi construída à luz da legislação anterior referida, em conflito com a sistemática do CTN

posterior. (publicada no 'Diário da Justiça', de 3.5.84, p. 6.599).Sem qualquer dúvida, a Súmula 584 autorizava uma

indevida retroação da lei tributária em matéria de imposto de renda.”

Da leitura do histórico dessa Súmula, temos que à época de sua edição, o fato

gerador do imposto de renda ocorreria (por uma ficção) no exercício seguinte ao ano base e, nessas condições, a Súmula merece aplicação. No entanto, o

entendimento atual é de que o fato gerador do imposto de renda ocorre (por uma outra ficção) no último dia do ano base, mostrando-se assim descabida a

aplicação dessa Súmula nos dias atuais.

Repare que o texto da Súmula 584 do STF, de aplicação controversa, acaba por permitir a retroatividade imprópria da norma tributária.

Há julgados de Tribunais Regionais em sentido contrário ao disposto na Súmula 584:

“Ementa ... Toda a tributação relacionada a fatos geradores ditos complexivos (como é o caso do lucro anual) dá-se por períodos de

tempo, relativamente aos quais se afere a dimensão quantitativa do fato gerador – a base de cálculo – para fins de apuração do

montante devido. ... - Ainda que tomado como referência o aspecto temporal da hipótese de incidência tributária, não se tem

como entender possível que a modificação na legislação, ocorrida em dezembro, venha a gravar o lucro do mesmo ano seja

relativamente ao imposto de renda ou à contribuição sobre o lucro, eis que não atende nem à anterioridade de exercício nem à

anterioridade nonagesimal. - O momento de cumprimento de

obrigação tributária acessória e o próprio prazo para pagamento dos tributos são dados irrelevantes para a análise da

irretroatividade e da anterioridade, pois desbordam do fenômeno da incidência. Não há como continuar-se aplicando, pois, a

Súmula 584 do STF. - Afasta-se as limitações à compensação de prejuízos fiscais e da base de cálculo negativa relativas a

exercícios anteriores, impostas pela MP 812, de 30 de dezembro de 1994, na apuração tanto do IRPJ como da CSL relativos ao

lucro de 1994, cujos fatos geradores consideram-se ocorridos em 31 de dezembro do mesmo ano.”24

24 (TRF4, AMS 1999.04.01.096386-4, Primeira Turma, Relator Leandro Paulsen, DJ 08/10/2003)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

21

13 – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE E NOVENTENA

13.1 - VIGÊNCIA DA LEI X EFICÁCIA DA NORMA

O princípio da anterioridade posterga a eficácia da norma tributária.

Publicada a lei tributária cuja eficácia é postergada pelo princípio da anterioridade, é de se indagar qual a situação jurídica dessa lei: ela existe?

Encontra-se em período de vacatio legis? Está vigente? É eficaz?

A resposta a essa indagação demanda distinguir lei de norma jurídica. A lei é

texto, é enunciado. A norma é a lei submetida ao esforço interpretativo.

Conclui-se então que a lei é o que está escrito e a norma é a conduta que se deve adotar em virtude do que está escrito. “A lei é um ente positivo. A norma

é um ser lógico.”25

Existente a lei, ou seja, publicada, ela será válida se for produto da ação de um

órgão competente para tanto e se sua produção tiver observado as regras procedimentais aplicáveis. Uma vez existente e válida a lei, estará vigente

quando ultrapassado o período de vacatio legis, se este existir.

Ressalta-se que até aqui estamos falando da lei, ou seja, do texto, do elemento positivo. Para que tenhamos uma conduta obrigatória é necessário que

tenhamos a norma, ou seja, a lei expressa em seu conteúdo lógico.

Nesse ponto incide o princípio da anterioridade. A lei pode existir de forma válida e vigente, mas a norma dela decorrente ainda não existe em virtude de

tal princípio.

O que fica postergado é a eficácia da norma, da qual depende a sua incidência, a sua aplicação.

Para o professor Sacha Calmon, “As questões de aplicabilidade, incidência e eficácia já se inserem noutra dimensão muito diversa. Inserem-se no plano da

norma. Aplicável é a norma e não a lei. O que incide não é a lei. É o preceito da norma, se e quando ocorrente sua hipótese de incidência no mundo fático.”26

13.2 - A LIMITAÇÃO E SUAS FACES

CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios: III - cobrar tributos:

25 (Coêlho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 2002) 26 (Coêlho, Curso de Direito Tributário Brasileiro, 2002)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

22

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei

que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido

publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o

disposto na alínea "b";

O previsto no art. 150, II, b, a anterioridade de exercício, impede a

cobrança de tributos no mesmo exercício da edição da lei que os instituiu ou aumentou e o previsto no art. 150, II, c, a noventena impede a cobrança de

tributos, antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

Em regra, o quanto se paga de tributo é o produto é o produto de uma base de cálculo por uma alíquota ($ = bc x alíquota).Entenda-se por aumento toda e

qualquer alteração que implique tornar o tributo mais oneroso.

Sendo instrumento destinado a assegurar a estabilidade das relações jurídicas,

impede que o contribuinte seja “pego de surpresa” e, sabendo de antemão o custo tributário de suas atividades, permite que se faça um planejamento

eficaz.

Não se confunde com o princípio da anualidade, que reclamava a existência de autorização anual do Legislativo mediante a inclusão das receitas

a serem arrecadadas no respectivo orçamento (CF 1946, art. 141, §34).

As limitações de que tratam as letras b e c do inciso III do art. 150 da CF são

de observância cumulativa, ou seja, em termos práticos, para se verificar a partir de qual data a lei que criou ou majorou tributo existente será eficaz é

necessário estabelecer as datas decorrentes da aplicação individual das prescrições da letra “b” e da letra “c” e optar pela data que for mais favorável27

ao sujeito passivo.

Um exemplo para aclarar: imagine que em 01.09.2008 tenha sido publicada

uma lei que criou um novo tributo e se queira saber a partir de quando esse novo tributo poderá ser exigido. Para tanto, devemos observar o princípio da

anterioridade tanto em relação à letra “b” como em relação à letra “c”.

Para que você não se engane, faça as contas para cada uma das limitações, ou

seja, para a anterioridade de exercício (letra b) e para a noventena (letra c).

2008 2009

01.09.2008

01.01.2009

publicação

Letra “b”: o novo tributo poderá ser exigido a partir de 01.01.2009;

27 Entenda-se por “mais favorável” aquela que estiver mais distante.

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23

2008 2009

01.09.2008

publicação

30.11.2008

90 dias

Letra “c”: o novo tributo poderá ser exigido a partir de 90 dias contados da data de sua publicação, ou seja, a partir de 30.11.2008.

2008 2009

01.09.2008

publicação

30.11.2008

90 dias

01.01.2009

Eficácia da Lei

Havendo duas datas a “escolha” há de recair sobre a que se mostrar mais conveniente para o sujeito passivo, ou seja, a que se mostrar mais distante da

data de publicação da lei. Concluindo, esse tributo hipotético poderá ser exigido a partir de 01.01.2009.

13.3 - AS EXCEÇÕES

Numa redação que deixou muito a desejar, a Constituição trouxe exceções em

seu art. 150, dividindo-as em exceções à letra “b” e exceções à letra “c”.

CF Art. 150 ...

§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributo previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do

inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos

impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.

Há outras exceções a estas limitações no texto Constitucionais que, somadas às do art. 150, importam no seguinte resumo

Exceções ao previsto na CF, 150, III, b:

- II, IE, IPI e IOF (CF, 150, § 1o);

- Impostos extraordinários (CF, 150, § 1o);

- Empréstimos compulsórios criados em razão de calamidade pública, guerra externa ou sua iminência (CF, 148, I);

- Contribuições devidas à seguridade social (CF, 195, §6o);

- CIDE-Combustíveis (CF, 177, § 4º, b)

- ICMS-Combustíveis (CF, 155, § 4º, c)

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24

Exceções ao previsto na CF, 150, III, c (noventena):

- II, IE, IR e IOF (CF, 150, § 1o);

- Impostos extraordinários (CF, 150, § 1o);

- Empréstimos compulsórios criados em razão de calamidade pública, guerra

externa ou sua iminência (CF, 148, I);

- Fixação de base de cálculo do IPVA E IPTU.

Voltemos ao exemplo analisado quando do estudo das exceções ao princípio da

legalidade, lembrando que, naquele exemplo, era necessário majorar as alíquotas do imposto de importação com finalidade extra-fiscal.

Pela aplicação do princípio da anterioridade de da noventena, a majoração do imposto de importação ainda que feita por ato do executivo (exceção ao

princípio da reserva legal) somente poderia ser exigida no exercício financeiro seguinte e desde que houvesse um prazo mínimo de 90 dias entre a data da

publicação do ato do executivo e a data de início da exigência.

A exceção existe para “resolver” essa dificuldade.

No que tange aos impostos ordinários da União, as exceções ao princípio da anterioridade baseiam-se na natureza extra-fiscal de tais tributos (II, IE, IPI e

IOF).

Assim, era de se esperar que os mesmos impostos fossem, também, exceções ao princípio da noventena (CF, 150, III, c). A noventena é chamada por alguns

de anterioridade mínima, nonagesimal ou mitigada.

No entanto, no tange que aos impostos, as exceções ao princípio da noventena

referem-se aos tributos seguintes: II, IE, IR e IOF.

Em resumo, as exceções relativas aos impostos são as seguintes:

CF, 150, III, b (anterioridade) CF, 150, III, c (noventena)

II II

IE IE

IPI IR

IOF IOF

Vamos imaginar que uma mesma lei tenha sido publicada no dia 21.02.2013 e tenha majorado as alíquotas do IR e do IPI. A questão é: a partir de quando se

podem exigir as alíquotas novas?

A questão torna-se simples desde que aplique o raciocínio sistemático anteriormente proposto. Para o IPI:

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25

2013 2014

21.02.2013

publicação

eficácia

90 dias

Não se observa

o princípio da

anterioridade

Então, para o IPI, a eficácia ocorre a partir de 90 dias contados da data de publicação da lei.

Para o IR:

2013 2014

21.02.2013

publicação

01.01.2014

Eficácia da Lei

Então, para o IR, a eficácia ocorre a partir de 01.01.2014 visto não se aplicar o princípio da noventena.

Dúvida comum é a aplicação desse princípio ao Imposto sobre a Renda. A lei

que majorar esse tributo deverá estar em vigor antes do início do ano-calendário em que se queira que tal majoração produza efeitos. Como o

Imposto de Renda constitui exceção à letra “c” do princípio da anterioridade, lei que o venha a majorar deverá ser publicada a até 31.12 do ano anterior ao

ano-calendário considerado. Em números, qualquer lei que venha a alterar as

alíquotas do IR válidas para o ano de 2009 deverá ser publicada até 31.12.200828. No entanto, não se esqueça da polêmica Súmula 584 vista

quando apresentamos o princípio da irretroatividade.

Embora tenhamos falado até agora sobre disposições aplicáveis aos tributos em

geral, a criação de novas contribuições sociais destinadas à seguridade social ou a majoração das já existentes encontra, quanto ao seu aspecto

temporal, disposição própria, não se aplicando as disposições da CF, 150, III, b. Quanto a essas contribuições, aplica-se a CF 195, § 6o, a chamada

anterioridade nonagesimal.

CF 195 ...

§ 6º As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação

da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b".

A CIDE-Combustível também constitui uma exceção ao princípio da anterioridade nos termos da CF, 177, § 4o., I.

CF, 177...

28 Não se deve esquecer da polêmica possibilidade de aplicação da Súmula 584 do STF.

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26

§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio

econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus

derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes

requisitos: I - a alíquota da contribuição poderá ser:

a) diferenciada por produto ou uso; b) reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe

aplicando o disposto no art. 150, III, "b";

Como a exceção limita-se à anterioridade de exercício, o restabelecimento das alíquotas deve observar a limitação da noventena.

É necessário investigar o sentido do termo restabelecimento que não se pode

confundir com majoração. Aqui, restabelecer significa trazer a alíquota ao limite estabelecido em lei. A majoração ocorre quando a alíquota vai a patamar

superior ao estabelecido na lei.

0% X%

RESTABELECIMENTO

REDUÇÃO

MAJORAÇÃO

ALÍQUOTA

No que se refere à majoração das alíquotas da CIDE-Combustíveis, não há

qualquer exceção ao princípio da anterioridade e da noventena.

Também constitui exceção ao princípio da anterioridade (CF, 150, III, b) a hipótese de ICMS de incidência monofásica (ICMS- Combustíveis).

CF, 155... § 4º Na hipótese do inciso XII, "h", observar-se-á o seguinte:...

IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, "g",

observando-se o seguinte: c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o

disposto no art. 150, III, "b".

Cumpre notar que tanto a CIDE-Combustível como o ICMS- Combustível

constituem exceções somente em relação à anterioridade de exercício CF, 150, III, “b”) e não à noventena (CF, 150, III, “c”) que deve ser observada.

Resumindo:

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27

TRIBUTO Deve observar o disposto na CF, 150, III, b ?

Deve observar o disposto na CF, 150, III, c ?

Quando pode ser cobrado?

Emp. Compulsório CF, 148, I

Não Não Imediatamente

II Não Não Imediatamente

IE Não Não Imediatamente

IPI Não Sim 90 dias após a publicação

IR Sim Não 1º dia do exercício à publicação

IOF Não Não Imediatamente

Imposto Extraordinário CF, 154, II

Não Não Imediatamente

IPVA- Base de Cálculo Sim Não 1º dia do exercício à publicação

IPTU- Base de Cálculo Sim Não 1º dia do exercício à publicação

Novas contribuições para a seguridade social

Não Observa o disposto na CF, 195, § 6º

90 dias após a publicação

CIDE-Combustíveis, restabelecimento de alíquotas

Não Sim 90 dias após a publicação

ICMS- Combustíveis, restabelecimento de alíquotas

Não Sim 90 dias após a publicação

13.4 - MEDIDAS PROVISÓRIAS

CF 62, § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de

impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V29, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver

sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi

editada.

Tem-se que as limitações trazidas no § 2o. do art. 62 aplicam-se aos impostos (o texto não disse tributos).

No que tange à criação de novos impostos com base na competência residual outorgada à União (CF, 154, I), o uso de medida provisória está afastado em

virtude da necessidade de lei complementar.

Então, quando a medida provisória criar ou majorar imposto, sua eficácia (a

criação ou majoração) depende de ser a mesma convertida até o último dia do exercício financeiro anterior ao que se deseja cobrar o tributo novo ou o tributo

majorado, a não ser, é claro, que o imposto em questão constitua exceção à anterioridade.

Em se tratando de impostos criados ou majorados por medida provisória, além de observar o disposto no § 2º do art. 62 da CF, deverão observar o prazo de

90 dias, ressalvadas as hipóteses de exceção trazidas no § 1º do art. 150 da

Constituição.

A emenda constitucional 32, ao postergar a vigência do disposto na medida

provisória que crie ou aumente imposto, por óbvio, não cuidou da anterioridade

29 II, IE, IPI e IOF

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28

nonagesimal, introduzida pela EC 42 (CF, 150, III, c), ou seja, não trouxe

qualquer exceção a ela.

Da lição dos professores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino30,em resumo,

pode-se concluir que, na hipótese de medida provisória que aumente ou crie:

1. Os impostos II, IE, IOF e 154 II não se submetem ao art. 150, III, “b” e

“c” da Constituição, ou seja, a cobrança é imediata.

2. O IPI se sujeita à observância da Constituição, 150, III, “c”, sendo o termo inicial do prazo de 90 dias o dia da publicação da medida

provisória.

3. Em relação ao IR, a medida provisória deve ser convertida em lei até o último dia do exercício anterior ao exercício relativo ao ano-calendário no

qual se deseja a produção de efeitos, não devendo observar o art. 150, III, “c”, por constituir exceção.

4. Em relação aos demais tributos (que não sejam as contribuições devidas

à seguridade social), devem observar art. 150, III, b e c da Constituição,

sendo o termo inicial do prazo de 90 dias o dia da publicação da medida provisória.

Para Carrazza, “... todos os demais tributos só poderiam ser exigidos se a

medida provisória que os instituísse houvesse sido convertida em lei até noventa dias antes do término do exercício financeiro, de modo a atender ao

disposto no art. 150, III, “c”.”.31 A posição do professor Carrazza se mostra no sentido que o termo inicial do prazo de 90 dias é a data da conversão da lei e

não da publicação da medida provisória.

Ao contrário do que entende o professor Carraza e na mesma linha do entendimento exposto por Marcelo Alexandrino, Leandro Paulsen32 afirma ser a

data de publicação da medida provisória o termo inicial da contagem dos noventa dias, lembrando que esse sempre foi o entendimento do STF sobre o

tema antes da EC 32/01.

No que tange à criação de contribuições destinadas à seguridade social, aquelas

cujas materialidades já estão descritas na Constituição Federal já estão todas criadas. A criação de novas contribuições destinadas à seguridade social

reclama lei complementar, afastando assim a possibilidade de sua criação por medida provisória.

Se o aumento das contribuições ocorrer por meio de medida provisória, o termo inicial do prazo nonagesimal de que cuida o art. 195, § 6o. da CF é a data da

sua publicação. Na hipótese de a conversão ocorrer com alteração substancial do texto, o termo inicial seria a conversão da medida provisória em lei.

30 (Alexandrino, et al., 2008) 31 (Carrazza, 2004) com grifo nosso 32 (Paulsen, 2006)

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29

A nosso aviso, é difícil conciliar a edição de medida provisória, cujo pressuposto

inarredável é a urgência, com a exigência ou majoração de tributos sujeitos ao princípio da legalidade estrita e da anterioridade, cabendo ressaltar que nos

casos em que a urgência é esperada, a Constituição já tratou de prever

exceções (ao art. 150, III, b e c e ao art. 150, I). Assim, melhor seria não admitir o uso das medidas provisórias em matéria tributária.

No entanto, não foi essa a opção do constituinte derivado e, uma vez aceito seu uso, entendemos não ser razoável limitar os efeitos da medida provisória,

condicionando seus efeitos à sua conversão em lei. Se, somente a lei pode produzir efeitos, melhor solução seria vedar o uso de medida provisória em

matéria tributária.

13.5 - OUTRAS SITUAÇÕES

DATA DE VENCIMENTO

A alteração da data de vencimento da obrigação tributária e a correção monetária de suas bases de cálculo não se sujeitam ao princípio da

anterioridade, posto que não significam majoração de tributo.

STF-669 Norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se

sujeita ao princípio da anterioridade.

CORREÇÃO MONETÁRIA

Por não caracterizar aumento real de tributo, a correção monetária de valores da base de cálculo não está sujeita à observância do princípio da anterioridade.

REVOGAÇÃO DE ISENÇÃO

O STF já entendeu que, revogada a isenção, o tributo passava a ser exigido de

imediato, sendo esse entendimento sintetizado na seguinte ementa da lavra do Min. Carlos Velloso:

“Ementa... I – Revogada a isenção, o tributo torna-se imediatamente exigível. Em caso assim, não há que se observar o

princípio da anterioridade, dado que o tributo já existente (...).”33

Embora essa a posição do STF, o tema é polêmico e dele trataremos quando estudarmos as isenções.

REDUÇÃO DE DESCONTO

33 RE 204062-2, Min. Carlos Velloso. 2ª. Turma. 27.09.96.

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30

É comum e até esperado que entes tributantes concedam desconto para

pagamento antecipado de seus tributos. Exemplos típicos são os relativos ao IPTU e IPVA, cujos sujeitos ativos concedem um desconto para pagamento até

uma determinada data.

Determinado Estado em certa oportunidade, como perdeu a oportunidade

temporal para majorar o IPVA, resolveu eliminar o esperado desconto em virtude do pagamento antecipado como forma de aumentar a receita. Foi

ajuizada uma ADI cuja alegação era de que a retirada do desconto e, por consequência, deveria respeitar tanto o princípio da anterioridade como o da

noventena.

No julgamento da ADI-MC 4.016 restou definido que a supressão desse desconto não se submete ao princípio da anterioridade.

PRORROGAÇÃO DE ALÍQUOTA

Uma questão de prova ilustra a situação a ser tratada:

Considere que determinado Estado da Federação tenha publicado lei majorando a alíquota do ICMS de 18% para 19% e estabelecendo que sua

vigência terminaria em 31 de dezembro de 2009. Considere, ainda, que, em meados desse mês, tenha sido publicada lei que manteve a alíquota de

19% para o ano de 2010. Nesse caso, a lei publicada em dezembro de 2009 viola o princípio da anterioridade nonagesimal.CESPE-2009-

Defensor Público da União

Como já visto, o objetivo das limitações aqui estudada é impedir que o contribuinte seja apanhado de surpresa pela majoração tributária, com as

notórias consequências nefastas ao planejamento de suas operações.

Na hipótese apresentada, considerando que a lei que majorou o tributo tinha

prazo de duração predeterminado, não seria absurdo esperar cabível a aplicação do princípio da anterioridade nonagesimal.

No entanto, o STF já manifestou entendimento contrário segundo o qual a

prorrogação da alíquota não se submete à limitação relativa ao princípio da anterioridade. Não se pode deixar de frisar que a decisão cuja ementa aqui está

foi tomada por maioria de votos (três votos em sentido contrário).

“TRIBUTÁRIO. ICMS. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA.PRORROGAÇÃO. INAPLICABILIDADE DO PRAZO NONAGESIMAL (ARTIGO 150, III,

C, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A Lei paulista 11.813/04 apenas

prorrogou a cobrança do ICMS com a alíquota majorada de 17

para 18%, criada pela Lei paulista 11.601/2003. 2. O prazo nonagesimal previsto no art. 150, III, c, da Constituição

Federal somente deve ser utilizado nos casos de criação ou

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31

majoração de tributos, não na hipótese de simples

prorrogação de alíquota já aplicada anteriormente. 3. Recurso Extraordinário conhecido e provido para possibilitar a

prorrogação da cobrança do ICMS com a alíquota majorada.”34

14 – PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO CONFISCO

O conceito de “efeito confiscatório” decorrente dos tributos é um tema sobre o

qual ainda não há consenso. A ideia de “confiscar” está próxima de “tomar algo de alguém”, assumindo assim caráter punitivo.

Vendo pelo aspecto punitivo, tal limitação seria desnecessária pois, por definição, o tributo não constitui de sanção de ato ilícito.

Tal princípio deve ser visto como a impossibilidade de alguém vir a perder propriedade sua para o Fisco em virtude da tributação, ou seja, proibir que a

tributação atinja níveis tão elevados de modo a provocar a perda de qualquer bem ou seu equivalente em dinheiro. Deriva da necessária observância da

capacidade contributiva.

Para Baleeiro, os tributos com efeito confiscatório são aqueles “...que absorvem

parte considerável do valor da propriedade, aniquilam a empresa ou impedem o

exercício da atividade lícita e moral”35.

A partir de que nível o tributo passa a ostentar natureza confiscatória? Embora

não haja consenso, a definição do nível de tributação a partir do qual se tem o efeito confiscatório deve levar em conta o princípio da razoabilidade. Não há

consenso, repita-se.

O STF36 já manifestou entendimento de que a verificação do efeito confiscatório

deve tomar em conta a carga tributária como um todo e não apenas um tributo de forma isolada.

Desse entendimento deriva a possibilidade de tributos com natureza nitidamente extra-fiscal, como é o caso dos impostos incidentes sobre o

comércio exterior, venham a ter suas alíquotas fixadas de forma proibitiva. Imagine, como exemplo, um perfume importado sujeito a uma alíquota de IPI

igual a 100%.

Outro tema sobre o qual não há consenso: as multas absurdas, da ordem de

200%, apresentam natureza confiscatória? Se a resposta for afirmativa, restaria

afrontado o princípio do não confisco?

Machado entende que a multa encontra-se ao desabrigo da proteção, pois

tributo e multa, evidentemente, não se confundem. Outra corrente, que tem expoente na pessoa do prof. Ives Gandra, entende que ao vedar o uso do

tributo com efeito confiscatório o constituinte se referiu à obrigação principal, ou seja, aquela que tem por objeto levar dinheiro ao Estado, seja decorrente do

tributo ou da penalidade.

34 RE 584100 com grifo nosso. 35 (Baleeiro, Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, 1997) 36 ADC-MC 8/DF

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32

O STF tem manifestado entendimento no sentido de afastar a aplicação de

penalidades de caráter confiscatório. Tome-se como exemplo a ADI 551 ajuizada “...pelo Governador do Rio de janeiro, que a apresentou contra

dispositivo da Constituição daquele Estado que determinava não poderem as

multas por infrações tributárias ser inferiores a duas vezes o valor do tributo, quando por falta de recolhimento, e a cinco vezes, quando resultantes de

sonegação de tributo”.37

“EMENTA: .... A desproporção entre o desrespeito à norma

tributária e sua consequência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do

contribuinte, em contrariedade ao mencionado dispositivo do texto constitucional federal. Ação julgada procedente.”38

Dos votos proferidos nesse julgamento fica clara a dificuldade de se saber a partir de que ponto determinada carga tributária é confiscatória:

“...esse problema da vedação de tributos confiscatórios que a jurisprudência do Tribunal estende às multas gera, às vezes, uma certa dificuldade de

identificação do ponto a partir de quando passa a ser confiscatório. (...) Também não sei a que altura um tributo ou uma multa se torna

confiscatório; mas uma multa de duas vezes o valor do tributo, por mero

retardamento de sua satisfação, ou de cinco vezes, em caso de sonegação, certamente sei que é confiscatório e desproporcional.”39

“Portanto, penso que se pode invocar o art. 150, inciso IV, da Constituição Federal, e, obviamente, o princípio da proporcionalidade na acepção que este

Tribunal tem lhe emprestado do devido processo legal no sentido substancial ou substantivo.”40

“Constatamos que as multas são acessórias, e não podem, como tal, ultrapassar o valor do principal. No caso, quando se cogita de multa de duas

vezes o valor do principal - que é o tributo não recolhido - ou de cinco vezes, na hipótese de sonegação, verifica-se o abandono dessa premissa e dos princípios

da razoabilidade e da proporcionalidade.”41 Note que o ministro Marco Aurélio parece sugerir a aplicação da limitação

prevista no art. 412 do Código Civil:

Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não

pode exceder o da obrigação principal.

A vedação ao confisco é dirigida ao gênero tributo. Seria possível exigir uma taxa com efeito confiscatório? Nessa situação, não se pode entender o confisco

como o instituto que aniquila a capacidade contributiva, posto que a existência dessa capacidade é irrelevante para a fixação do valor da taxa.

Considerando que a taxa tem por objetivo indenizar o custo que o Estado teve na prestação do serviço público, seu valor deverá ser algo próximo desse custo.

37 (Ovalle, 2009) 38 ADI 551 39 Ministro Sepúlveda Pertence 40 Ministro Gilmar Mendes 41 Ministro Marco Aurélio

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33

Caso o valor da taxa seja significativamente superior ao custo de prestação

do respectivo serviço, estaremos diante de uma situação confiscatória.

Uma questão apresentada no último concurso de AFRFB42 em 2009 trouxe uma

polêmica entre os candidatos. A questão cobrava o conhecimento do conceito

de tributação sob o aspecto estático e sob o aspecto dinâmico. Eis a questão: Entre as limitações constitucionais ao poder de tributar, que constituem

garantias dos contribuintes em relação ao fisco, é incorreto afirmar que:

a)os impostos sobre o patrimônio podem ser confiscatórios, quando considerados em sua perspectiva estática.

b)uma alíquota do imposto sobre produtos industrializados de 150%, por exemplo, não significa necessariamente confisco.

c)o imposto de transmissão causa mortis, na sua perspectiva dinâmica, pode ser confiscatório.

d)o princípio do não confisco ajuda a dimensionar o alcance do princípio da progressividade, já que exige equilíbrio, moderação e medida na quantificação

dos tributos. e)a identificação do efeito confiscatório não deve ser feita em função da

totalidade da carga tributária, mas sim em cada tributo isoladamente.

Os conceitos em questão são de natureza doutrinária.

Diz-se de tributação sob a perspectiva estática quando o objeto tributado é

incapaz de renovar a riqueza eventualmente perdida. Nessa hipótese, segundo a doutrina, o tributo poderia assumir dimensões confiscatórias.

Imagine um imóvel tributado pelo IPTU. A cada tributação, uma parte (em

valor) do imóvel é retirada do sujeito passivo e entregue ao Município. Como a riqueza sob a perspectiva estática não se renova, ao longo de algum tempo, o

proprietário terá perdido o equivalente ao imóvel para o município. Se você imaginar uma alíquota de IPTU igual a 5%, em 20 anos o equivalente ao imóvel

terá sido entregue ao Município. Estaria então caracterizada uma hipótese de possível efeito confiscatório quando da tributação de patrimônio, sob o aspecto

estático. A afirmativa A da questão está, então, certa.

Por outro lado, sob a perspectiva dinâmica, quando o ônus tributário (custo do tributo) pode ser incorporado ao preço produto ao mercadoria tributada,

havendo portanto o repasse desse ônus, não há que se falar em caráter confiscatório do tributo. Assim, como o IPI com alíquota de 150% não implica

caráter confiscatório.

A afirmativa B da questão diz de tributação do IPI com alíquota de 150%.

Independentemente de se analisar a tributação pela perspectiva dinâmica ou estática, poder-se-ia dizer estar correta pois o enunciado traz uma expressão

que muito ajuda nessa conclusão: “...não significa necessariamente...”

42 ESAF

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34

Na afirmativa C, não resta dúvida que a renda obtida com a transmissão do

imóvel (que não se confunde com o valor do imóvel) pode ser toda consumida pelo pagamento de tributo. Vejamos.

Imagine que você vendeu um imóvel pelo valor de R$ 100,00. Ao vendê-lo, você recebe R$ 110,00. Dessa operação se pode concluir que a transmissão

gerou uma riqueza nova de R$ 10,00. Supondo que o a alíquota do ITCD fosse de 10%, toda essa riqueza nova teria sido consumida pela tributação,

caracterizando assim o efeito potencialmente confiscatório.

O princípio do não confisco, aplicável a todos os tributos e não somente aos tributos nos quais a cobrança progressiva é possível, evita que essa cobrança

progressiva seja de tal forma exorbitante de modo a resultar em confisco. A afirmativa D está correta.

A afirmativa E está incorreta pois para se dizer da existência de efeito

confiscatório é necessário ter em conta toda a carga tributária e não somente um tributo. Esse é o entendimento do STF já visto neste trabalho.

Aires F. Barreto, advertindo que não pretenderia acertar na solução mas sim formular “...algumas balizas, senão critérios, para distinguir a presença, ou não,

do efeito de confisco.”, traz a seguinte lição:

“Primeiro, entendemos que podem ser confiscatórios os impostos sobre o patrimônio — quer considerados na sua perspectiva estática (propriedade

imobiliária), quer na sua perspectiva dinâmica (transmissão de propriedade imobiliária) — e o imposto sobre a renda. Segundo, os demais impostos, como

regra, não seriam confiscatórios...”43 A nós parece ter sido essa a doutrina adotada pelo examinador.

15 - PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO À LIMITAÇÃO DO TRÁFEGO

CF, 150 ...

V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por

meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo

Poder Público;

Em termos miúdos, é vedada a criação de tributos que tenham por fato gerador

algo equivalente à transposição, por bens ou pessoas, de limites territoriais de Municípios ou Estados.

Não impede, por óbvio, a imposição de tributos incidentes sobre o comércio aduaneiro.

43 (Barreto, 2009)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

35

Imagine que um Estado, em virtude um surto de febre aftosa, tenha interesse

em limitar o ingresso de gado proveniente de um Estado cujo gado está, emsua maioria infectado e para tanto criou uma Taxa de Ingresso de Gado. A taxa

seria inconstitucional.

Ao ressalvar a hipótese de cobrança de pedágio a Constituição alimenta a discussão sobre a natureza jurídica do pedágio: tributo ou preço público?

Não havendo consenso sobre a matéria, temos por lúcido o entendimento de que “..., nos dias atuais, o pedágio pode ou não ser tributo, dependendo da

opção do legislador. Os pedágios cobrados por concessionárias de serviços públicos, pessoas privadas, nas rodovias “privatizadas”, não são cobrados como

taxas, mas sim como preços públicos (...).Diferentemente, se o pedágio é cobrado por pessoas jurídicas de direito público, pode ser tributo, da espécie

taxa.”44

A lei 7.712/8845 instituiu a cobrança de um tributo que ganhou o apelido de

“selo pedágio”, uma vez que a comprovação de seu pagamento se fazia através da exibição de um decalque junto ao para-brisas.

"Art. 1ºEsta Lei disciplina a cobrança de pedágio pela utilização de

rodovias federais, pontes a obras de arte especiais que as

integram. Art. 2ºContribuinte do pedágio é o usuário de rodovia federal sob

jurisdição do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem - DNER.

Art. 3ºO montante calculado para ser arrecadado com o pedágio não poderá ultrapassar ao necessário para conservar as rodovias

federais, tendo em vista o desgaste que os veículos automotores, utilizados no tráfego, nelas provocam, bem como a adequação

dessas rodovias às necessidades de segurança do trânsito.

Há julgado no STF entendendo ser o “selo pedágio” um tributo na modalidade taxa:

“EMENTA: - CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PEDÁGIO. Lei

7.712, de 22.12.88. I.- Pedágio: natureza jurídica: taxa: C.F., art.

145, II, art. 150, V. II.- Legitimidade constitucional do pedágio instituído pela Lei 7.712, de 1988. III.- R.E. não conhecido.”46

Do voto do ministro Carlos Velloso colhe-se conclusão de que o pedágio pode

ser tributo da espécie taxa:

“Primeiro que tudo, deixo expresso o meu entendimento no sentido de que o

pedágio, objeto da causa, é espécie tributária, constitui-se numa taxa. O fato de ter sido o pedágio tratado no Sistema Tributário nacional exatamente nas

44(Alexandrino, et al., 2006) 45 Revogada pela lei 8.075/90. 46 RE 181.475-RS, Min. Carlos Velloso. DJ 25.06.1999

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

36

limitações ao poder de tributar — CF, art. 150, V — é significativo. Ora, incluído

numa ressalva a uma limitação â tributação, se fosse preço, a ressalva não teria sentido. É dizer, se está a Constituição tratando de limitações à tributação, não

haveria sentido impor limitação a um preço (tarifa), que tem caráter contratual,

assim incluído no regime de direito privado.

O pedágio tem natureza jurídica de taxa. A lição é velha e de lavra ilustre.

Ensina Aliomar Baleeiro que “O proprietário de um veículo força o poder público a melhorar pavimentações, instalar sinalizações elétricas, inspecionar

periodicamente máquinas e freios, dirigir o tráfego nos pontos de congestionamento e estabelecer permanente polícia da velocidade e da

observância das regras de prudência e perícia no trânsito. A taxa fornece à autoridade o meio de o automobilista indenizar o Estado pelo uso de coisa

conveniente a seus interesses, mas que ocasiona riscos para o público e maiores despesas para os serviços governamentais.” (Direito Tributário

Brasileiro, 10a ed.. Forense, Rio, 1981, pág. 324).

Em seu voto proferido no TRF4 e objeto do RE supra citado, o hoje ministro

Teori Zavascki conceitua o pedágio como preço público, chamando em seu auxílio a doutrina de Bernardo Ribeiro de Moraes que assim leciona:

“Examinando o pedágio, RAMON VALBES COSTA (V, pág. 188) aponta três elementos essenciais para a cobrança: existência de obras artificiais, realizadas

com o fim de satisfazer necessidades de transporte; natureza de bem público que têm os imóveis que abrigam essas obras e instalações; remuneração pela

utilização dessas obras artificiais, máquinas ou equipamentos, realizadas ou instaladas nos bens públicos.O pedágio, assim, apresenta-se como preço

público. É o preço que o usuário paga pela utilização de certas obras, máquinas ou equipamentos, realizados ou instalados em imóveis de uso comum do povo,

a fim de satisfazer necessidades de circulação de pessoas ou de bens. A receita auferida é originária e facultativa.”47

16 – OUTRAS LIMITAÇÕES

16.1 – LIMITAÇÕES DIRIGIDAS À UNIÃO

16.1.1 – PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE GEOGRÁFICA

Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território

nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento

de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento

sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;

47(Moraes, 1984)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

37

Esta limitação impede que a União institua tributos não uniformes. Assim, a

título de exemplo, a alíquota do IPI para um determinado produto deve ser a mesma, tanto em Goiás como no Rio Grande do Sul.

Imagine que determinada montadora de veículos estivessem planejando se instalar no Brasil e, durante os estudos de viabilidade constatasse que o IPI no

Estado X tem alíquota de 10% e no Estado Y de 20%.

Considerando que o valor tributação tem impacto direto no preço de venda do produto, no caso o veículo, parece lógico imaginar que a indústria venha a se

instalar no Estado X.

Ao instituir alíquotas diversas, teríamos o privilégio de alguns Estados em relação a outros. Considerando a característica federal de nosso Estado e a

autonomia entre os entes federados, não seria aceitável que a União, através de manobras tributárias viesse a interferir em suas respectivas gestões.

O que se permite é a concessão de incentivos fiscais com objetivos específicos

e, exemplificando, podemos citar o caso da Zona Franca de Manaus que foi

criada com o objetivo específico de industrializar aquela região de modo a fomentar a integração daquela região e seu desenvolvimento sócio-econômico.

Note então que não é qualquer incentivo fiscal que constitui uma exceção ao

princípio da uniforme e sim aqueles que tem finalidade específica, ou seja, propiciar uma maior igualdade no desenvolvimento entre as diversas regiões no

país. Não parece ser possível uma tributação diferenciada para se obter, por exemplo, o maior desenvolvimento tecnológico (somente) da região Centro-

Oeste.

16.1.2 - PRINCÍPIO DO NÃO PRIVILÉGIO A TÍTULOS FEDERAIS

Art. 151. É vedado à União:... II - tributar a renda das obrigações da dívida pública dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como a

remuneração e os proventos dos respectivos agentes públicos, em níveis superiores aos que fixar para suas

obrigações e para seus agentes;

Antes de estudar essa limitação vamos imaginar uma situação. Uma pessoa comum que precise de dinheiro emprestado vai a um banco, firma um contrato

de empréstimo no qual são estabelecidas as condições básicas (entre outras) quais sejam, o valor do empréstimo, o prazo de pagamento e a taxa de juros. É

uma forma ordinária de tomar empréstimo.

Os entes federados podem tomar empréstimo junto ao grande público. Para não

ser obrigado a firmar vários contratos (um com cada um que se mostre interessado em emprestar o dinheiro), o ente federado o faz através do

lançamento de títulos da dívida pública.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

38

Nesse título há a promessa de pagar ao portador, ao final do prazo, o valor de

face acrescido de juros e correção monetária (variável conforme seja o título).

Ao final do prazo para resgate, o portador (aquele que emprestou o dinheiro ao ente federado) receberá o valor de face (que é o valor emprestado) com os

acréscimos previstos na apólice. Seja o valor total do resgate, admitindo uma alíquota única de 10% para o imposto de renda48, o seguinte:

Valor de face: R$ 1.000,00

Correção Monetária: R$ 5.000,00

Juros: R$ 2.000,00

IR (-): R$200,00

Valor líquido: R$ 7.800,00

Se três entes federados (União, Estado e Município) lançarem títulos com, rigorosamente, as mesmas condições para resgate, o público, ao escolher a

quem emprestará seu dinheiro o fará com base em critérios subjetivos, ou seja, outro critério qualquer que não seja a remuneração.

No entanto, se a União (competente para cobrar o IR) fizer incidir uma alíquota

de 5% para os rendimentos de seus títulos e 10% para os títulos de outros entes, teremos os seguintes números:

União Outros Entes

Valor de face R$ 1.000,00 R$ 1.000,00

Correção Monetária R$ 5.000,00 R$ 5.000,00

Juros R$ 2.000,00 R$ 2.000,00

IR(-) R$100,00 R$200,00

Valor líquido R$ 7.900,00 R$ 7.800,00

Repare que nessa hipótese, quem emprestar seu dinheiro à União terá um

rendimento maior e, muito provavelmente, seja esse um fator decisivo na escolha do investimento.

48 Incidente somente sobre a parcela dos juros.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

39

Na prática, a União terá maiores atrativos para captar empréstimos que os

demais entes federados. Essa situação é incompatível com a autonomia que deve existir entre os federados.

A limitação em tela tem por objetivo evitar situações como a aqui narrada.

A renda a que se refere o art. 151, II da Constituição não é renda do Estado, já que tal tributação estaria impedida pelo art. 150, VI, a (imunidade

recíproca).

As obrigações da dívida pública a que se refere o texto supra são aquelas

lançadas no mercado (pela União, Estados, Municípios e Distrito Federal) como fonte de financiamento para o déficit interno. Quem aufere renda em virtude

da aquisição das obrigações é o particular que, ao adquiri-las, empresta seu dinheiro ao Estado (lato sensu) e, dessa forma, não há qualquer limitação à

tributação, pela União, de renda auferida pelo particular.

Vem a calhar o esclarecimento do Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, citado

por Leandro Paulsen: “...pode a União tributar a renda das obrigações estaduais e municipais como pode tributar os proventos dos servidores dos

Estados e Municípios. Entretanto, não poderá tributá-las em nível superior ao ‘que fixar para as suas próprias obrigações e proventos de seus próprios

agentes’. A igualdade de carga tributária incidente sobre as obrigações

estaduais, municipais e federais é indispensável. De outro modo, estas últimas seriam favorecidas, visto que, gravadas mais pesadamente as obrigações

estaduais e municipais, o investidor as preteriria, preferindo naturalmente as federais.”49

Então, não é vedado à União “...tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”, sendo vedado fazê-

lo “...em níveis superiores aos que fixar para suas obrigações...”.

16.1.3 - PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DE CONCESSÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA

Art. 151. É vedado à União:...

III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.

Tal limitação decorre da necessária autonomia de que gozam os entes federados.

Embora o texto constitucional faça referência expressa ao termo “isenção” deve-se depreender a impossibilidade de qualquer forma de exoneração

tributária.

Esse artigo veda a chamada isenção heterônoma, ou seja, aquela concedida

por pessoa que não detém a competência tributária referente ao tributo sobre o

49(Paulsen, Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência 2008)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

40

qual recai a isenção. O reverso é a chamada isenção autônoma. Exemplos:

- União concede isenção sobre o ISS: isenção heterônoma (vedada);

- Município concede isenção sobre o ISS em seu território: isenção

autônoma (permitida)

Em algumas situações, pode parecer que a Constituição permite à União conceder isenções de tributos estaduais e municipais. Vejamos.

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...)

XII - cabe à lei complementar: e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o

exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, "a";

Não se pode confundir a edição de lei complementar com a atuação da União.

Adiantando o que veremos quando tratarmos do tópico Legislação Tributária, temos queLeis Complementares são aquelas que “...dispondo sobre matéria

expressa ou implicitamente prevista na relação constitucional, está submetida

ao quorum qualificado do art. 69 da Constituição, isto é, maioria absoluta nas duas casas do Congresso Nacional.”50

O Congresso Nacional, em virtude do disposto na Constituição, exerce as seguintes funções legislativas:

constituinte derivado, responsável pela discussão e votação das emendas constitucionais;

legislador federal, quando exerce as competências típicas da União e,

legislador nacional quando produz normas gerais ou seja, aquelas

aplicáveis a todas as pessoas políticas, nos termos do art. 24 da Constituição51.

Assim, ao exercer sua função de legislador nacional em matéria tributária, o Congresso produz normas de caráter geral sob a forma de lei complementar e

tais normas, por serem de caráter geral, deverão ser observadas por todos os entes integrantes da federação.

Ao implementar o disposto na letra “e” do inciso XII do art. 155 da

Constituição, ou seja, ao excluir da incidência do ICMS as exportações através de lei complementar, temos, realmente, uma hipótese de isenção (desoneração

50 Lição de Paulo de Barros Carvalho segundo Heleno Taveira Tôrres ao prefaciar obra de sua coordenação denominada Leis Complementares em Matéria Tributária – Aspectos Práticos Atuais, São Paulo, Manole, 2003. 51 § 1ºNo âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. § 2ºA competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. § 3ºInexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. § 4ºA superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

41

legal) mas como produto do Congresso Nacional e não como produto da União

no exercício de sua competência para legislar sobre matéria tributária.

O disposto na letra “e” do inciso XII do art. 155 supra citadoperdeu seu

objeto (mas continua no texto constitucional) quando a EC 42 alterou a

redação da CF, 155, § 2º, X, “a”, ampliando a imunidade das exportações em relação ao ICMS:

a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior,

assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores;

Não faz sentido imaginar uma hipótese de isenção (exclusão do crédito

tributário) quando há uma imunidade (ausência de competência tributária) sobre o mesmo tema.

Cuidado! Uma questão com enunciado do tipo “Segundo a Constituição,

compete a lei complementar excluir a incidência do ICMS nas exportações para o exterior...” deve ser respondida como correta.

O mesmo raciocínio aplica-se ao disposto no inciso II do § 3º do art. 156 da

Constituição:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...)

§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do "caput" deste artigo, cabe à lei complementar: (...)

II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.

O disposto na CF 156 também supra citado está no texto da Lei Complementar 116/03 que faz o papel de norma geral em relação ao ISS. É, sem dúvida, uma

hipótese de isenção mas não concedida pela União e sim pelo Congresso Nacional na condição de legislador nacional.

Efeito similar decorre da hipótese na qual eventual tratado internacional venha a excluir a incidência de determinados tributos. Como exemplo, cite-se a

hipótese de, por meio de um tratado internacional, os calçados fabricados no

Congo sejam comercializados no Brasil sem a incidência de imposto sobre a circulação de mercadorias.

Os efeitos tributários decorrentes de tratados e convenções internacionais não podem ser imputados à União, não havendo então, em caso de isenção nas

hipóteses como as aqui tratadas, qualquer violação da CF, 151, III.

A celebração de tratados e convenções é da competência do Presidente da

República que, nessa condição, o faz como Chefe de Estado. Quem celebra o tratado ou convenção é o Estado Brasileiro representado pelo seu Chefe e não a

União, ente federado representado pelo Chefe de seu Poder Executivo.

Por arremate, em virtude do disposto no art. 18 da Constituição, emprestando à

CF, 151, III uma interpretação lógica, é de se concluir também pela

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

42

impossibilidade de Estado ou Municípios concederem isenção de tributos da

União, ou seja, a isenção heterônoma é, de todo, vedada.

16.2 – LIMITAÇÕES DIRIGIDAS AOS ESTADOS E MUNICÍPIOS

VEDAÇÃO À DISCRIMINAÇÃO TRIBUTÁRIA

CF...

Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços,

de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.

Este princípio tende a evitar a guerra fiscal entre Estados, entre Municípios e entre Estados e Municípios. Torna-se assim impossível que um Estado

estabeleça, em relação ao ICMS, alíquotas internas diferenciadas conforme a origem do produto (ex: se de origem interna: 5%, se de origem externa: 10%).

Por exemplo, seria inconstitucional a exigência mais gravosa de IPVA sobre veículo importado (diferenciação pela origem).

17 - IMUNIDADES.

“O poder de tributar implica o poder de destruir”52. Diante dessa realidade, da necessária observância e manutenção de certos valores constantes da ordem

constitucional e da necessidade de proteger o indivíduo contra os excessos tributários do Estado, o texto constitucional retirou (negou competência)

algumas situações do campo da tributação. Onde há imunidade há a negação da competência tributária.

Note que a imunidade tem por objetivo estimular determinadas ações necessárias às consecução dos objetivos do Estado ou proteger seus valores

fundamentais.

A IMUNIDADE é, então, a falta de competência tributária e deve ser

interpretada de forma teleológica.53

Já vimos que somente a Constituição pode outorgar competência tributária, ou

seja, somente ela trata de competência tributária. Sendo a imunidade

considerada a falta de competência tributária, resta claro que somente a Constituição pode tratar de imunidade tributária.

Parte das imunidades encontra-se no art. 150 da Constituição na seção II que trata das “limitações do poder de tributar” e sua definição varia segundo os

doutrinadores, a saber:

Ricardo Lobo Torres: intributabilidade;

Misabel Derzi: norma que estabelece incompetência;

52 Marshall, Mc Culloch x Maryland 53 que relaciona um fato com sua causa final (diz-se de argumento, explicação ou conhecimento) (Houaiss, 2009)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

43

José Souto Maior Borges: hipótese de não incidência constitucionalmente

definida.

Para Paulo de Barros Carvalho é a “...classe finita e imediatamente

determinável de normas jurídicas, contidas no texto da Constituição

Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras

de tributos que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas.”54

Apesar das divergências doutrinárias, a lição de Paulo de Barros Carvalho deixa claro que, estando o ente tributante impedido de “...expedir regras instituidoras

de tributos...” sobre pessoas ou bens albergados pela imunidade, estarão, nessa situação, impedidos de criar tributos sobre pessoas ou bens albergados

pela imunidade.

Uma norma constitucional autoriza a tributação, outra norma também

constitucional impede a tributação. E aí?

Solução que prima pela clareza vem da pena do prof. Helenilson da Cunha

Pontes: “O enunciado imunizante não limita, nem recorta, a norma de competência tributária simplesmente porque surge após a consideração de

todas as condições normativas pressupostas no Texto Constitucional para o

exercício do poder de instituir e exigir tributos, do qual os textos imunizantes são apenas uma espécie. Vale dizer, a norma de competência tributária é o

resultado da consideração, pelo intérprete do direito, de todas as condições previstas, em sua maioria, no arcabouço constitucional como pressuposto para

o exercício do poder de instituir tributos.”55

A tributação então decorre não da aplicação de diversas normas de forma

isolada e sim da aplicação simultânea e harmônica de todas as normas incidentes em determinada situação. Consideradas todas as normas, há de se

concluir a resultante da incidência dessas diversas normas.

Para aqueles que se lembram dos estudos de física do ensino médio, quando da

atuação de diversas forças sobre um único corpo, buscava-se a determinação da força resultante das forças.

Então, imagine a seguinte situação. Você tem uma força qualquer (a

competência tributária) e tem outra força qualquer (a imunidade), de igual módulo (tamanho da força), em sentido contrário. A resultante dessas duas

forças é nula, ou seja, não há a possibilidade de tributação.

17.1 – CLASSIFICAÇÃO

54 (Carvalho, 2007) 55 (Pontes, 2005)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

44

Imunidades

quanto ao destinatário

quanto ao fundamento

quanto ao alcance

quanto à eficácia

quanto à fonte

subjetiva

objetiva

mista

ontológica

política

geral

específica

condicionada

incondicionada

explícita

implícita

Imunidades

A imunidade é chamada subjetiva quando atua sobre determinadas pessoas (ex: entidades de assistência social sem fins lucrativos) e objetiva quando

relacionada ao bem protegido (ex: jornais são imunes como garantia da liberdade de imprensa).É mista quando leva em consideração a pessoa e a

coisa tributada de forma simultânea. Um exemplo de uma imunidade mista é a imunidade do ITR em relação às pequenas glebas rurais (coisa tributada)

quando trabalhada pelo proprietário que não possua outro imóvel (pessoa tributada).

A imunidade é ontológica56 quando deriva do princípio da igualdade e seu exemplo típico é a imunidade de que gozam os entes federados já que, nos

termos do art. 18 da Constituição, não há qualquer hierarquia entre eles. A imunidade política decorre de uma opção quanto à maneira de gerir o Estado e

pode ser alterada por emenda constitucional sendo exemplo a imunidade do ICMS em relação às mercadorias exportadas. Nos termos da constituição

vigente, essa imunidade tem por objeto tornar o produto nacional mais

competitivo no mercado externo (chega lá fora mais barato). Nada impede que um novo governo, avesso às exportações, manobre no sentido de extinguir tal

imunidade através de emenda constitucional.

É geral quando abrange todos os tributos ou uma espécie deles. É específica

quando abrange um determinado tributo.

É condicionada quando depende de lei que torne a norma eficaz (ex:

imunidades das entidades de educação sem fins lucrativos, nos termos da lei) e incondicionada quando o texto constitucional é bastante em si (ex: imunidade

recíproca).

As imunidades implícitas são aquelas que, por óbvio, não estão expressas no

texto constitucional, mas derivam da interpretação lógica de outras normas do texto. Quanto aos impostos, o art. 145 impõe que, sempre que possível,

deverão ser graduados quanto à capacidade contributiva. No entanto, há um determinado nível até o qual a renda não denota nenhuma capacidade

contributiva (mínimo essencial) e, embora não haja previsão expressa, não se

pode tributar a renda até esse limite em virtude da necessária observância da capacidade contributiva quando da graduação dos impostos. Por exclusão, são

as expressas as imunidades constantes do texto constitucional.

56 relativo ao ser em si mesmo, em sua dimensão ampla e fundamental, em oposição ao ôntico, que se refere aos entes múltiplos e concretos da realidade. (Houaiss, 2009)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

45

17.2 – INTERPRETAÇÃO

Como já vimos, a imunidade tem por objetivo a preservação de certos valores,

podendo também servir de instrumento de política econômica ou financeira.

O alcance da interpretação da norma de imunidade desperta certa polêmica. O

STF já disse ser possível a interpretação ampla, de modo a proporcionar a maior eficácia das normas constitucionais e a preservação dos valores por elas

protegidos, sendo que suas decisões caminham nesse sentido.

Oportuna é a lição do prof. Ives Gandra: “Pessoalmente, considero que, por ser

a imunidade uma vedação absoluta ao poder de tributar, sua exegese só pode ser extensiva, visto que, outorgar a faculdade, ao ente tributante – com seus

permanentes problemas de caixa -, de definição do que seria o instituto, poderia transformar, em verdade, o poder regulador, em poder aproveitador,

reduzindo o intuito constitucional de permitir que instituições sociais ou educacionais façam o que governo deveria e não faz com seus tributos.”57

Todas as vezes que a Constituição trouxer uma exoneração tributária, ainda que lhe dê outro nome (isenção, não incidência, remissão, anistia e alíquota

zero, ex: CF, 195, § 7o.), estaremos diante de uma imunidade. Podemos

concluir que a imunidade não é instituto exclusivamente aplicável aos impostos, sendo, portanto, aplicável a qualquer espécie tributária.

Ressalta-se aqui que as imunidades tratadas no art. 150 dirigem-se a impostos e não às outras espécies tributárias. No entanto, repita-se, não se pode afirmar

que o instituto da imunidade seja exclusivo dos impostos.

CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios: ... VI - instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto;

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das

instituições de educação e de assistência social, sem fins

lucrativos, atendidos os requisitos da lei; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua

impressão.... § 2º A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às

fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas

finalidades essenciais ou às delas decorrentes. § 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não

se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas

aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja

57 (I. G. Martins 2005)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

46

contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário,

nem exoneram o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

§ 4º As vedações expressas no inciso VI, "b" e "c", compreendem

somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.

São imunes:

17.3 - ENTES FEDERADOS

O inciso “a” do art. 150 trata da IMUNIDADE RECÍPROCA que proíbe que um

ente federado exija impostos sobre patrimônio, renda e serviços de outro ente federado. Tal imunidade, por força do § 2º desse mesmo art. 150, é

extensiva às autarquias e fundações mantidas pelo poder público, desde que o objeto da imunidade esteja vinculado às suas atividades essenciais.

CF... Art. 18. A organização político-administrativa da República

Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Justifica-se pela necessidade de se dar eficácia ao modelo federativo. Não

haveria como se falar em autonomia dos entes federados se, através da tributação, um ente pudesse intervir (ainda que de forma indireta) na

disponibilidade de recursos de outro ente.

Tem por finalidade:

“Operar como salvaguarda do pacto federativo, para evitar que a tributação funcione como instrumento de coerção ou indução de um ente

sobre o outro;

Proteger atividade desprovida de capacidade contributiva, isto é,

atividades públicas em sentido estrito, executadas sem ânimo lucrativo; e

Não beneficiar a expressão econômica de interesses particulares, sejam

eles públicos ou privados, nem afetar intensamente a livre concorrência,

excetuadas as permissões constitucionais.”58

A nosso aviso, os impostos incidem sobre a manifestação de riqueza e a

atividade estatal (aquela voltada para o bem comum) não pode ser hipótese de geração de riqueza. Não havendo riqueza, não há como exigir impostos.

O texto constitucional poderia levar a uma dúvida: a imunidade impede a cobrança de quaisquer impostos sobre “...patrimônio, renda ou serviços...” ou

sobre apenas os impostos classificados como incidentes sobre “patrimônio, renda ou serviços...” nos termos da classificação constante do CTN?

58 RE 601392/PR, Min. Joaquim Barbosa.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

47

A ser válida a segunda hipótese, ou seja, se a imunidade abrigando os impostos

se dá conforme a classificação do CTN, estariam fora dessa proteção o IPI, o ICMS, IOF e ISS, já que tais tributos estão vinculados à produção e à

circulação.

O entendimento do STF aponta no sentido de que a imunidade abrange todos os impostos que venham a ter fato gerador vinculado ao patrimônio, renda ou

serviços dos entes imunes. Leandro Paulsen59 diz que essa conclusão decorre do julgamento do STF relativo à imunidade relativa ao IPMF e IOF.

São imunes a renda, o patrimônio e os serviços prestados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

O conceito de renda, não explicitado no texto constitucional, vem sendo construído pela jurisprudência e caminha no sentido de associá-lo a aumento

patrimonial60.

O termo patrimônio deve ser entendido como “...complexo das relações

jurídicas de conteúdo econômico de uma pessoa...”61

Como serviços devem ser entendidos aquelas atividades que têm como

elemento essencial um prestar ou fazer, nos termos do RE 116.121 da relatoria do Min. Celso de Mello.

A imunidade recíproca, no que se refere aos entes federados, não conhece

qualquer condicionante.

17.3.1- EMPRESAS PÚBLICAS E DE ECONOMIA MISTA

CF... Art. 150. ... § 2º A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às

fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas

finalidades essenciais ou às delas decorrentes.

Nota-se que a literalidade do § 2o. limita a imunidade às autarquias e às fundações públicas. Então, ainda em termos literais, empresas públicas e

economia estão ao desabrigo da imunidade.

No entanto, o Min. Carlos Velloso62 entendeu que a Empresa Brasileira de

Correios e Telégrafos – EBCT, empresa pública federal, por prestar serviço de

competência exclusiva da União (serviços postais e correio aéreo nacional), também merece a proteção da imunidade recíproca.

No voto condutor do Min. Velloso, “estabeleceu-se a distinção entre (a) empresa pública como instrumento de participação do Estado na economia e (b)

empresa pública prestadora de serviço público, para afirmar que estas últimas estão abrangidas pela imunidade tributária prevista no art. 150, VI, ‘a’, da

59 (Paulsen, Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência 2008) 60 RE 117.887-6/SP 61 (Andrade Filho 2005) 62 RE 407.099-5/RS

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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Constituição (...). Assim, às empresas públicas prestadoras de serviços públicos

se aplicaria o § 2º e não o § 3º do art. 150, acima citados”.

Em fevereiro de 2007, o Min. Gilmar Mendes, em decisão proferida em ação

cautelar63, entendeu por estender os efeitos da imunidade à “...Companhia de

Águas e Esgotos do Estado de Rondônia – CAERD é sociedade de economia mista prestadora do serviço público obrigatório de saneamento

básico (abastecimento de água e esgotos sanitários) e, portanto, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal, está abrangida pela imunidade tributária

prevista no art. 150, inciso VI, “a”, da Constituição.”64

Nota-se que não é toda e qualquer sociedade de economia mista ou empresa

pública que fica albergada pela imunidade, pois o próprio texto constitucional traz limitações no § 3º do art. 150 e sim aquelas cujas atividades se identificam

com as funções de Estado.

Segundo o STF65, a Petrobrás tem suas atividades essenciais ligadas não a

“...serviço público inerente à estrutura política da União Federal, e sim de monopólio legalizado para proteger o interesse geral envolvido nas referidas

atividades. Assim, a Petrobrás não faz jus à imunidade recíproca.

A Caixa Econômica Federal66, de modo similar, não tem direito a essa

imunidade quando no exercício de atividades estranhas às funções essenciais.

Como exemplo, citamos as atividades de venda de veículos.

A abrangência da limitação do parágrafo desperta alguma controvérsia,

principalmente diante da discussão sobre a conceituação de serviço público.

O professor Rogério Emílio de Andrade67, em trabalho de qualidade, propõe as

seguintes distinções:

“A)EMPRESA ESTATAL EXPLORADORA DE ATIVIDADE ECONÔMICA EM SENTIDO

ESTRITO: como esse campo está reservado constitucionalmente aos particulares, a exploração direta pelo Estado só será permitida quando

necessária aos imperativos de segurança nacional ou relevante interesse público, e mesmo assim sujeitando-se ao regime jurídico próprio das

empresas privadas no tocante às obrigações tributárias. Não podendo, portanto, gozar de qualquer benefício não extensível ao setor privado, conforme

estabelece o Art. 173 e parágrafos da Constituição Federal;

B)EMPRESA ESTATAL QUE DESENVOLVA SERVIÇO PÚBLICO: Nesse caso, não

temos a intervenção do Estado em campo reservado aos particulares, mas mera

técnica administrativa de descentralização de suas atividades que permite aumentar a eficiência do serviço público prestado, não persistindo, pois, a

vedação do Art. 173 da Constituição, que veda a concessão de benefícios não extensíveis ao setor privado: trata-se do próprio Estado desincumbindo-se de

tarefa que lhe é própria.”

63 Ação Cautelar 1550-2, Segunda Turma do STF 64 Grifo nosso 65 RE 75.000 66 RE 74.032 67 (Andrade)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

49

Então, o STF parece mais uma vez caminhar no sentido de alargar a proteção

conferida pelo instituto da imunidade, estendendo-a a empresas públicas ou de economia mista que se dediquem à prestação de serviços

públicos de natureza obrigatória, ou seja, empresa estatal que desenvolva

serviços relacionados à atividade estatal propriamente dita.

Na lição do Min. Eros Grau68, “empresas públicas e sociedades de economia

mista que explorem atividade econômica em sentido estrito” não faz jus a privilégios fiscais sob pena de afrontar o § 3º do art. 150 da Constituição.

As concessionárias de serviço público não estão albergadas pela imunidade recíproca posto que exercem suas atividades com finalidade lucrativa.

Para dizer da existência de atividade econômica em sentido estrito é “... essencial é verificar se existe uma atividade vinculada ou se há uma atividade

em cujo exercício predomine a autonomia da vontade. Somente nesse caso é que se pode falar numa atividade econômica e em livre concorrência (art. 170

ss.). E somente nesse caso é que está afastada a imunidade recíproca (art. 150, § 3a).”69

17.3.2- IMUNIDADE E IMPOSTOS INDIRETOS

Assunto polêmico é o relativo ao alcance da imunidade recíproca, ou seja, são alcançados também os chamados impostos indiretos (IPI e ICMS)?

Quando o particular compra uma geladeira, no preço da geladeira está incluído o custo do ICMS que já foi recolhido pelo vendedor. Vale dizer, não fosse o

ICMS, o custo da geladeira seria menor para o comprador. Nesses impostos indiretos, o contribuinte de fato é o adquirente da mercadoria ou do produto; é

ele quem, embora não pague diretamente o imposto, suporta o ônus financeiro da tributação.

Nesses casos, a relação jurídico-tributária é formada entre o vendedor (que não é imune) e um ente tributante qualquer. O comprador, ainda que seja imune,

não faz parte da relação e, portanto, sua condição pessoal não traz qualquer consequência para tal relação jurídica.

Para Paulo de Barros Carvalho, na hipótese de o comprador ser pessoa imune, o vendedor (não imune) deve recolher o tributo devido sob pena de “...beneficiar

elementos estranhos ao Poder Público, refugindo ao espírito da providência

constitucional.”70

Em resumo do até aqui visto, a tese supra sustenta que, em se tratando de IPI e de ICMS, sendo o ente público contribuinte de fato (comprador), haverá a

incidência do tributo posto que o contribuinte é o vendedor (não imune). Lado outro, sendo o ente público contribuinte de direito (vendedor), não haverá a

incidência tributária em virtude da imunidade. Esse é o entendimento que predomina no STF.

68 (Grau, 2001) 69 (Ávila, 2010) 70 (Carvalho, 2000)

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

50

Quando o ente público é contribuinte de fato (aquele que suporta o ônus financeiro da tributação)não tem direito à imunidade.71

Ao contrário, Aliomar Baleeiro entendia ser de nenhuma importância a condição de contribuinte de direito ou de fato, sendo mister verificar, para fins dos

efeitos da imunidade, quem efetivamente suportaria o ônus da tributação. Na hipótese de ser o ente público, a operação deve ocorrer sem a respectiva

tributação.

Voltando ao exemplo da geladeira, sendo o adquirente o ente público, a venda deveria ocorrer sob o abrigo da imunidade de modo que o preço final seja

menor para o poder público.

A tese defendida por Baleeiro não prevaleceu e o STF editou a Súmula 591, cabendo lembrar que os precedentes são julgados da década de 70:

STF-591

A imunidade ou a isenção tributária do comprador não se estende ao produtor,

contribuinte do imposto sobre produtos industrializados.

Embora haja súmula em sentido contrário, atualmente, pode-se citar a existência de um julgado (ao menos um) entendendo que a imunidade também

se aplica nos casos de impostos indiretos (ICMS e IPI).

“TRIBUTÁRIO. ICMS. IMPOSTO INDIRETO. CONTRIBUINTE DE FATO. AUTARQUIA FEDERAL. IMUNIDADE DO ART. 150, VI, A.

EXISTÊNCIA. Comprovado que é a autarquia federal quem arca com o ônus do ICMS, vez que os valores devidos são incluídos

nas faturas mensais, tem ela direito de repetir o que indevidamente pagou, pois goza do benefício da imunidade

tributária recíproca constante do texto constitucional.”72

Em resumo, a súmula 591 do STF continua válida, embora o entendimento de

Baleeiro ainda mereça respeito da doutrina e, na prática, os entes públicos não podem adquirir bens ao abrigo de imunidade relativa ao ICMS e IPI.

17.3.3 - CASOS PARADIGMÁTICOS

INCRA, na exploração de unidade agroindustrial:

“Ementa - Incra. Imunidade tributária. Exploração de unidade

agroindustrial. Ausência de configuração de atividade econômica capaz de impor o regime tributário próprio das empresas

privadas. 1. A atividade exercida pelo Incra, autarquia federal, não se enquadra entre aquelas sujeitas ao regime tributário

71 AI 671.412 - AgR 72 (TRF4, 2 T, AC 97.04.23659-0/SC, rel. Juiz Fernando Quadros da Silva. DJ. 11/05/2000).

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

51

próprio das empresas privadas, considerando que a eventual

exploração de unidade agroindustrial, desapropriada, em área de conflito social, está no âmbito de sua destinação social em setor

relevante para a vida nacional. 2. A imunidade tributária só deixa

de operar quando a natureza jurídica da entidade estatal é de exploração de atividade econômica. 3. Recurso extraordinário

conhecido e provido.”73

Entes Federados - IOF

“Ementa - IMPOSTO - IMUNIDADE RECIPROCA - Imposto sobre Operações Financeiras. A norma da alínea "a" do inciso VI do

artigo 150 da Constituição Federal obstaculiza a incidência recíproca de impostos, considerada a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios. Descabe introduzir no preceito, a merce de interpretação, exceção não contemplada, distinguindo os

ganhos resultantes de operações financeiras”74

Cartórios e o ISS

“EMENTA: ... Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra

os itens 21 e 21.1 da Lista Anexa à Lei Complementar 116/2003, que permitem a tributação dos serviços de registros públicos,

cartorários e notariais pelo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN. Alegada violação dos arts. 145, II, 156, III, e

236, caput, da Constituição, porquanto a matriz constitucional do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza permitiria a

incidência do tributo tão somente sobre a prestação de serviços de índole privada. Ademais, a tributação da prestação dos

serviços notariais também ofenderia o art. 150, VI, a e §§ 2º e 3º da Constituição, na medida em que tais serviços públicos são

imunes à tributação recíproca pelos entes federados. As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação,

porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos

serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O recebimento de remuneração pela

prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata

de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos

mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços

públicos concedidos e a não tributação das atividades delegadas. Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida, mas julgada

improcedente.”75

73 RE 242.827 74 AI 172.890-AgR 75 ADI 3089

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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17.4 - ENTIDADES RELIGIOSAS

CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios: ... VI - instituir impostos sobre:...

b) templos de qualquer culto;... § 4º As vedações expressas no inciso VI, "b" e "c", compreendem

somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas

Em homenagem ao princípio da liberdade de credo religioso, já que não existe

religião oficial no país, a Constituição outorgou imunidade aos templos de qualquer culto.

Ademais, a atividade religiosa, por ser de natureza espiritual, não pode ser geradora de riqueza tributável.

A palavra “templo” deve ter uma interpretação maior que apenas o templo

assim entendido como local no qual se realiza a cerimônia ou o culto religioso, abrangendo os locais de culto, administração e da formação religiosa.

Entenda-se por “templo” a instituição religiosa de qualquer espécie, pois os valores morais adotados por cada uma delas não são discutidos pelo direito

tributário. Então o imóvel do templo é imune, o veículo usado na atividade religiosa é imune, suas aplicações financeiras são imunes e as ofertas recebidas

dos devotos, consideradas renda da entidade religiosa são também imunes, ainda que remetidas ao exterior, já que não há qualquer condicionante aplicável

a tal imunidade.

São imunes os fatos decorrentes das atividades indispensáveis e relacionadas à

prática do culto religioso. Nota-se que o § 4º do art. 150 fala em entidades.

Questão que se apresenta é a decorrente de atividades que não estão,

necessariamente, ligadas à atividade religiosa. Vejamos alguns exemplos:

IMÓVEIS ALUGADOS

Há situações em que imóveis de propriedade de instituições religiosas estão alugadas a terceiros que desenvolvem atividade diversa. Não resta dúvida de

que o aluguel de bens imóveis a terceiros não faz parte das atividades essenciais das entidades religiosas.

O STF já decidiu que na hipótese de a renda desses aluguéis reverter em prol do desenvolvimento da atividade religiosa, tanto a renda obtida quanto o imóvel

alugado continuam ao abrigo da imunidade (RE 325822).

No entanto, vale analisar os votos proferidos nesse julgado cujo objeto era o

reconhecimento de instituição religiosa ser imune ao IPTU incidente sobre imóveis seus, ainda vagos ou dados em locação.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

53

Observa-se que o ministro Ilmar Galvão (relator) negou provimento ao recurso

por entender que lotes vagos e imóveis dados em locação não se incluem na noção de “templos de qualquer culto”, no que foi acompanhado pelos ministros

Carlos Velloso, Sepúlveda Pertence e Ellen Gracie. A divergência foi aberta com

o voto do ministro Gilmar Mendes que, trazendo a doutrina do professor Ives Gandra, deu provimento, ou seja, reconheceu o direito à imunidade. Vale a

transcrição parcial do voto:

“E, mais adiante, ao referir-se à expressão ‘rendas relacionadas com as

finalidades essenciais’, constante do § 4a do art. 150 da Constituição Federal, Ives Gandra afirma: "O § 4o, todavia, ao falar em atividades relacionadas,

poderá ensejar a interpretação de que todas elas são relacionadas, na medida em que destinadas a obter receitas para a consecução, das atividades

essenciais. Como na antiga ordem, considero não ser esta a interpretação melhor na medida em que poderia ensejar concorrência desleal proibida pelo

art. 173, § 4a, da Lei Suprema. Com efeito, se uma entidade imune explorasse atividade pertinente apenas ao setor privado, não haveria a barreira e ela teria

condições de dominar mercados e eliminar a concorrência ou pelo menos obter lucros arbitrários, na medida, em que adotasse idênticos preços de

concorrência, mas livre de impostos. Ora, o Texto Constitucional atual

objetivou, na minha opinião, eliminar, definitivamente, tal possibilidade, sendo que a junção do princípio estatuído nos arts. 173, § 4o, e 150, § 4a, impõe a

exegese de que as atividades, mesmo que relacionadas indiretamente com àquelas essenciais das entidades imunes enunciados nos incisos b e c do art.

150, VI, se forem idênticas ou análogas às de outras empresas privadas, não gozariam da proteção imúnitória.Exemplificando: se uma entidade imune tem

um imóvel e o aluga. Tal locação não constitui atividade econômica desrelacionada de seu objetivo nem fere o mercado ou representa uma

concorrência desleal. Tal locação do imóvel não atrai, pois, a incidência do IPTU sobre gozar a entidade de imunidade para não pagar imposto de renda. A

mesma entidade, todavia, para obter recursos para suas finalidades decide montar uma fábrica de sapatos, porque o mercado da região está sendo

explorado por outras fábricas de fins lucrativos, com sucesso. Nessa hipótese, a nova atividade, embora indiretamente referenciada, não é imune, porque

poderia ensejar a dominação de mercado ou eliminação de concorrência sobre

gerar lucros não tributáveis exagerados se comparados com os de seu concorrente." O Profo. Ives assinala que por esta linha de raciocínio, todos os

lucros e ganhos de capital obtidos em aplicações financeiras e destinados às finalidades das entidades imunes são rendimentos e ganhos imunes. É de

se entender que o § 4° é um complemento do § 3o, assim redigido: "As vedações do inciso VI, a, e, do parágrafo anterior não se aplicam ao património,

à renda e aos serviços relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis e empreendimentos privados, ou em que haja

contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem

imóvel." Ives conclui: "O que vale dizer que apenas se as atividades puderem gerar concorrência desleal ou as finalidades das entidades imunes não forem

beneficiadas por tais resultados é que a tributação se justifica, visto que, de rigor, tais atividades refogem ao campo de proteção tributária que o

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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legislador supremo objetivou ofertar a essas finalidades da sociedade(...).Pois

bem. Ao fazer uma leitura compreensiva do texto constitucional, na linha preconizada pelo Moreira Alves, entendo que, de fato, o dispositivo do art. 150,

VI, "b", há de ser lido com o vetor interpretativo do § 4a deste mesmo artigo da

Constituição. Vê-se, pois, que a letra "b" se refere apenas à imunidade dos "templos de qualquer culto"; a letra "c", ao "patrimônio, renda ou

serviço". Portanto, o disposto no § 4a alcança o patrimonio, a renda ou serviços dos templos de qualquer culto, em razão da equiparação entre

as letras "b" e "c".”76

A decisão constitui um precedente para que todo o patrimônio, renda e serviços das entidades religiosas, ainda que não estritamente relacionados às suas

atividades essenciais, permanecem imunes desde que seu produto seja aplicado nas atividades essenciais.

CEMITÉRIOS RELIGIOSOS

O Município exigiu, através de execução fiscal, o IPTU decorrente da

propriedade do imóvel urbano no qual está instalado o Cemitério dos Ingleses,

local onde são sepultados os praticantes da religião anglicana. Em sua resistência, a executada alegou sua condição de imune em relação aos impostos

por força da Constituição, 150, VI, b, já que a proprietária do imóvel é a Sociedade da Igreja de São Jorge.

Quando do julgamento do RE 578.862/BA, o STF, à unanimidade, entendeu que

o cemitério, quando relacionado às atividades religiosas e sem fins lucrativos, é imune nos termos do art. 150, VI c da Constituição. Isso não

implica reconhecer a imunidade a todo e qualquer cemitério, como bem ressaltou o ministro Eros Grau em seu voto:

“Essas observações são relevantes porque diversa da que se há

de aplicar aos cemitérios que consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso é a norma de decisão que calha a

situações nas quais empresas exploram a atividade de locação

e/ou venda de jazigos. Vale dizer: no julgamento do presente recurso esta Corte não dirá, simplesmente, que cemitérios em

geral estão abrangidos, ou não estão abrangidos, pela imunidade; diversamente, decidiremos se cemitérios que

consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso estão, ou não estão, por ela alcançados. Pois é evidente que jazigos

explorados comercialmente, por empresas dedicadas a esse negócio, não gozam da proteção constitucional de que se cuida.

Ainda que a família e amigos próximos do ali enterrado possam cultuar a sua memória diante do jazigo. No caso se trata de

76 Grifo nosso.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

55

situação diversa daquela a que neste apartado de meu voto faço

alusão.”

17.5 - PARTIDOS POLÍTICOS e OUTRAS ENTIDADES

CF...

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e

aos Municípios: ... VI - instituir impostos sobre:...

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das

instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;...

§ 4º As vedações expressas no inciso VI, "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as

finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.

De forma similar ao que acontece com a imunidade recíproca, a imunidade aqui

deve ser entendida como extensiva a todos os impostos.

Por definição legal, “O partido político, pessoa jurídica de direito privado,

destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na

Constituição Federal.”77

Partidos políticos são instrumentos que viabilizam a liberdade de ideologia

política, sendo que o pluralismo partidário constitui meio de realização efetiva do Estado Democrático de Direito. São as agremiações que preenchem os

requisitos constantes no art. 17 da Constituição Federal.

Suas fundações, também objeto da imunidade em relação aos impostos, tem

por objetivo ”... o estudo e pesquisa, à doutrinação e à educação política, rege-se pelas normas da lei civil e tem autonomia para contratar com instituições

públicas e privadas, prestar serviços e manter estabelecimentos de acordo com suas finalidades, podendo, ainda, manter intercâmbio com instituições não

nacionais.”78

A imunidade outorgada às Entidades Sindicais dos Trabalhadores tem por finalidade proteção dos trabalhadores, considerados hipossuficientes em relação

ao empregador e devem funcionar como elo de ligação entre o trabalho e o capital, possibilitando a efetivação dos valores sociais do trabalho. Aqui vale

ressaltar que somente as entidades sindicais dos trabalhadores são imunes, as das categorias patronais não o são.

As instituições de educação que têm por objeto a difusão de ensino e cultura e exercem atividades complementares às atividades do Estado gozam de

77 Lei 9.096/95, art. 1º. 78 Lei 9.096/95, art. 53.

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imunidades quanto a impostos incidentes sobre seu patrimônio, renda e

serviços.

É de se reparar que não há qualquer restrição quanto ao objetivo da instituição

de educação, podendo, assim, ser qualquer ciência, arte ou ofício e em

qualquer grau de especialização, não importando também se a instituição cobra mensalidades de seus alunos ou não.

De igual modo também são imunes as Entidades de Assistência Social cujo fim é a propagação de ações assistenciais, o chamado terceiro setor, referente

ao trabalho voluntário que constitui verdadeira complementação das ações estatais na área social.

“Considera-se entidade de assistência social aquela que, sem visar lucro, cumpre um dos objetivos previstos no artigo 203 da Constituição Federal de

1988, ou seja, pratica algum ato que implique na proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice...”79

Não se deve confundir entidade de assistência social com entidade de utilidade pública.

17.5.1 - ENTIDADE SEM FINS LUCRATIVOS

“A expressão sem fins lucrativos quer dizer que a instituição imune não pode

ser fonte de lucros para os seus sócios ou instituidores. Deve aplicar todos os seus recursos no desenvolvimento de suas próprias atividades. Só isto.”80

A condição de estar organizado sob a forma de instituição sem fins lucrativos limita-se às instituições de educação e assistência social.

Sendo a imunidade uma limitação ao poder de tributar, cabe a lei complementar regular sua aplicação por força do art. 146 da Constituição.

As entidades elencadas na letra “c” devem, para se beneficiar da imunidade, fazer prova de que satisfazem os requisitos desse art. 14, sendo descabido tal

tutela através de ação mandamental dada a necessidade de produção de prova.

I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas

rendas, a qualquer título;

II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção

dos seus objetivos institucionais;

III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros

revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Os requisitos constantes dos itens II e III do art. 14 do CTN são os

indispensáveis para que a fiscalização possa apurar o cumprimento do disposto no inciso I.

“...ATENDIDOS OS REQUISITOS DA LEI.”

79 (I. N. Souza 2002) 80 (Machado, Imunidade Tributária e Educação s.d.)

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É de se indagar sobre a natureza da lei a que se refere o art. 150, VI, c. Numa

primeira vista, à míngua de qualquer adjetivo, é de se concluir ser ela lei ordinária.

No entanto, alguns doutrinadores resistem à ideia por entender serem tais

requisitos integrantes da norma de imunidade e, portanto, estaria sua regulamentação a depender de lei complementar, por força do art. 146, II da

Constituição. A lei 9.532/97 trouxe requisitos para que as instituições de educação e de

assistência social possam gozar da imunidade em relação aos impostos federais:

Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou

de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em

geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.

§ 1º Não estão abrangidos pela imunidade os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda

fixa ou de renda variável.

§ 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:

a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados;

b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;

c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva

exatidão; d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da

data da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a

realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial;

e) apresentar, anualmente, Declaração de Rendimentos, em

conformidade com o disposto em ato da Secretaria da Receita Federal;

f) recolher os tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados e a contribuição para a seguridade social

relativa aos empregados, bem assim cumprir as obrigações acessórias daí decorrentes;

g) assegurar a destinação de seu patrimônio a outra instituição que atenda às condições para gozo da imunidade, no caso de

incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de suas atividades, ou a órgão público;

h) outros requisitos, estabelecidos em lei específica, relacionados com o funcionamento das entidades a que se refere este artigo.

§ 3º Considera-se entidade sem fins lucrativos a que não apresente superávit em suas contas ou, caso o apresente em

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determinado exercício, destine referido resultado, integralmente,

à manutenção e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais.

É fácil notar que os requisitos aqui listados estão em maior número que os

requisitos listados no art. 14 CTN. Considerando que, nos termos do art. 146 da Constituição, cabe à lei complementar regular as limitações ao poder de tributar

e que a imunidade é uma delas, a lei ordinária não poderá trazer requisitos contrários ou diversos dos constantes da lei complementar.

O tema foi levado ao Judiciário através da ADin-MC 1802 que, julgada, restou

assim ementada:

“Ementa ... cautelar parcialmente deferida. ... 2. À luz desse critério distintivo, parece ficarem incólumes à eiva da

inconstitucionalidade formal arguida os arts. 12 e §§ 2º (salvo a alínea f) e 3º, assim como o parág. único do art. 13; ao contrário,

é densa a plausibilidade da alegação de invalidez dos arts. 12, § 2º, f; 13, caput, e 14 e, finalmente, se afigura chapada a

inconstitucionalidade não só formal mas também material do § 1º

do art. 12, da lei questionada. 3. Reserva à decisão definitiva de controvérsias acerca do conceito da entidade de assistência

social, para o fim da declaração da imunidade discutida - como as relativas à exigência ou não da gratuidade dos serviços prestados

ou à compreensão ou não das instituições beneficentes de clientelas restritas e das organizações de previdência privada:

matérias que, embora não suscitadas pela requerente, dizem com a validade do art. 12, caput, da L. 9.532/97 e, por isso, devem

ser consideradas na decisão definitiva, mas cuja delibação não é necessária à decisão cautelar da ação direta.”

Por força da decisão liminar restaram suspensos os efeitos dos seguintes

dispositivos:

§ 1º Não estão abrangidos pela imunidade os rendimentos e

ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável. ...

f) recolher os tributos retidos sobre os rendimentos por elas pagos ou creditados e a contribuição para a seguridade social

relativa aos empregados, bem assim cumprir as obrigações acessórias daí decorrentes;

O tema continua81 submetido ao crivo do Judiciário através da ADIn 1802. A

doutrina82 de Ives Gandra e de Leandro Paulsen diz da inconstitucionalidade da lei 9.532/97 no que invadiu campo reservado a lei complementar.

81 Vista para a AGU em 17.12.2009 82 (Paulsen, 2009)

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59

Por enquanto, por força da decisão cautelar, o STF entende que tais requisitos

são ligados a “...a fixação de normas sobre a constituição e funcionamento de entidade assistencial ou de educação imune...”83. Em suma:

para que seja considerada entidade de educação ou de assistência social

deverá ser observado os disposto nas lei 9.532/97; para que seja considerada entidade sem fins lucrativos deverá atender o

disposto nos três incisos do art. 14 do CTN.

Tais entidades não têm direito adquirido à imunidade, pois deixarão de gozar de tais benefícios na hipótese de não cumprirem o disposto nesses três

incisos, situação em que perdem sua condição de entidades “sem fins lucrativos”, cabendo à autoridade administrativa competente suspender tal

benefício. Vale dizer que não há direito adquirido a regime jurídico.

17.5.2 - CASOS PARADIGMÁTICOS

ENTIDADES FECHADAS DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

As entidades fechadas de previdência privada são entidades de assistência

social, tendo em vista que complementam as ações de assistência oficial e

estão, pois, abrigadas pela imunidade. No entanto, o STF tem entendimento sumulado sob o nr. 730 de que tal imunidade somente ocorre se tais entidades

não receberem qualquer contribuição de seus afiliados, ou seja, devem ser mantidas exclusivamente por seus patrocinadores.

STF-730 A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins

lucrativos pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos

beneficiários.

Tal entendimento decorre do fato de que as atividades de assistência social prestadas pelo Estado são gratuitas.

IMUNIDADE E ATIVIDADES ESSENCIAIS

Somente são imunes tais entidades quando o objeto estiver relacionado à

atividade essencial da entidade, como se verifica novamente no § 4º, do artigo 150, CF.

Com relação à imunidade concedida às entidades de assistência social, o STF tem adotado uma postura de ampliar o instituto no sentido de

entender que ainda que o patrimônio, renda ou serviços das entidades imunes por força das letras “b” e “c” da CF, 150, VI não estejam relacionados às

atividades essenciais das entidades, restam imunes desde que o produto seja empregado nas atividades essenciais. A prova do emprego desse produto cabe,

por óbvio, ao contribuinte.

83 ADI MC 1.802-3

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

60

Em juízo, o Lar de Maria, instituição de assistência social, buscou livrar-se do

pagamento do ICMS relativo à venda de pães por ela produzidos. No âmbito da justiça estadual o pleito foi negado sob o argumento de que o

custo do ICMS recai sobre o consumidor e não onera o patrimônio, renda ou

serviços das entidades imunes por do artigo 150, VI, “c” da Constituição. Quando do julgamento do RE, em voto do ministro Carlos Velloso, o STF

entendeu o descabimento de classificação dos impostos para fins de aferir a extensão da imunidade, acabando por reconhecê-la em relação ao ICMS

pretendido.

Nos embargos de divergência aviados pelo Estado de São Paulo, a ministra Ellen Gracie entendeu descabido o reconhecimento da imunidade por tratar-se

de imposto indireto, ou seja, cuja estrutura permite a repercussão econômica do tributo.

A divergência foi aberta pelo ministro Gilmar Mendes que, retornando à posição de Aliomar Baleeiro sobre a imunidade em relação aos impostos indiretos,

assim se manifestou em seu voto: “A despeito da possibilidade de se transferir ao comprador o pagamento efetivo

do imposto, o reconhecimento da imunidade tem relevância jurídico econômica

para o vendedor, quanto mais não seja, como reconheceu o Ministro Sepúlveda Pertence, para fins de concorrência, e por conseguinte, para ampliar a eficiência

dos serviços prestados pela entidade beneficente.” Aos julgar esses embargos de divergência, o STF, por maioria, reconheceu

que a imunidade tributária prevista pelo art. 150, VI, c da CF abrange o ICMS sobre comercialização de bens produzidos por entidade

beneficente. Considerou-se que o objetivo da referida norma constitucional é assegurar que as rendas oriundas das atividades que

mantêm as entidades filantrópicas sejam desoneradas exatamente para se viabilizar a aplicação e desenvolvimento dessas atividades, e que a

cobrança do referido imposto desfalcaria o patrimônio, diminuiria a eficiência dos serviços e a integral aplicação das rendas de tais

entidades.84

Em consequência, as entidades aqui tratadas (CF, 150, VI, b e c) são imunes no

que se refere a:

- aplicações financeiras;

- imóvel utilizado como residência de religiosos;

- estacionamento de orfanato, igreja e hospitais;

- lotes vagos e prédios comerciais;

- imóveis alugados a terceiros;

- quermesses e atividades festivas com fins de arrecadação de renda;

Quanto aos imóveis alugados pelas entidades beneficiárias da imunidade prevista na CF, 150, VI, “c” vale conferir a presente súmula.

84 RE (EDv) 210.251-SP

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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STF-724

Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, "c", da

Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades

essenciais de tais entidades.

Exatamente por entender que tal situação não está relacionada às atividades essenciais da entidade imune, o STF entendeu que terrenos baldios não estão

ao abrigo da imunidade. ICMS e IPI

Quando adquirentes de mercadorias ou produtos no mercado interno, o

contribuinte é o vendedor e já vimos que, nessa hipótese, o adquirente não tem qualquer benefício.

No entanto, quanto importador, o contribuinte desses impostos pode ser entidade imune, nessas hipóteses, o STF tem reconhecido a imunidade dessas

entidades. Vejamos,

“EMENTA: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS

INDUSTRIALIZADOS E IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. ENTIDADE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMPORTAÇÃO DE "BOLSAS PARA COLETA

DE SANGUE". A imunidade prevista no art. 150, VI, c, da Constituição Federal, em favor das instituições de assistência

social, abrange o Imposto de Importação e o Imposto sobre Produtos Industrializados, que incidem sobre bens a serem

utilizados na prestação de seus serviços específicos. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso não

conhecido”85

“EMENTA: TRIBUTÁRIO. ICMS. IMUNIDADE. OPERAÇÕES DE IMPORTAÇÃO DE MERCADORIA REALIZADA POR ENTIDADE DE

ASSISTÊNCIA SOCIAL. AGRAVO IMPROVIDO. I - A jurisprudência da Corte é no sentido de que a imunidade prevista no art. 150,

VI, c, da Constituição Federal abrange o ICMS incidente sobre a

importação de mercadorias utilizadas na prestação de seus serviços específicos. II - Agravo improvido.”86

“ICMS. IMUNIDADE. (ART. 150, VI, C, DA CF). AQUISIÇÃO DE

MERCADORIAS E SERVIÇOS NO MERCADO INTERNO. ENTIDADE BENEFICENTE. 1. A imunidade tributária prevista no art. 150, VI,

c, da Constituição, compreende as aquisições de produtos no mercado interno, desde que os bens adquiridos integrem o

patrimônio dessas entidades beneficentes. 2. Agravo regimental improvido.”87

85 RE 243.807 86 AI 669.257 - AgR 87 AI 535.922 - AgR

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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A leitura da ementa do julgado supra levaria ao falso entendimento de que a

entidade imune, quando adquirente de bens no mercado interno, destinados a seu patrimônio, estaria imune quanto ao pagamento do ICMS, contrariando o

que afirmamos que a imunidade não alcança o contribuinte “de fato”.

No entanto, lendo o voto da ministra Ellen Gracie, concluímos que tal imune

somente persiste nas hipóteses em que a entidade imune é importadora, estando desobrigada do recolhimento de ICMS ou de IPI. Vale conferir parte do

voto.

“Na linha destes precedentes, a ora agravada, entidade de assistência social sem fins lucrativos, goza de imunidade tributária quanto ao ICMS nas

importações, independentemente de se tratar de patrimônio, renda ou serviços. O que importa indagar é se o bem adquirido integra o patrimônio dessas

entidades.”88

A IMUNIDADE ALCANÇA O IOF

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE.

INSTITUIÇÃO DE ENSINO SEM FINS LUCRATIVOS. IOF SOBRE OPERAÇÕES BANCÁRIAS. CF, ART. 150, VI, C. Hipótese em que o

tributo incide sobre o patrimônio das entidades da espécie, representado por ativos financeiros, com ofensa à imunidade

prevista no dispositivo em referência. Recurso desprovido.”89

“EMENTA: - Recurso extraordinário. Entidade de assistência social. IOF. Imunidade tributária. Art. 150, VI, "c". - No tocante

às entidades de assistência social, que atendam aos requisitos atendidos pela ora recorrida, esta Corte tem reconhecido em

favor delas a imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, "c", sendo que, especificamente quanto ao IOF, a Segunda Turma, no

AGRRE 232.080, relator o eminente Ministro Nelson Jobim, reconheceu a aplicação dessa imunidade, citando, inclusive, a

decisão tomada nos EDAGRE 183.216, onde se salientou que "...

o fato de a entidade proceder à aplicação de recursos não significa atuação fora do que previsto no ato de sua constituição".

Recurso extraordinário não conhecido.”90

ATIVIDADES ESTRANHAS ÀS ESSENCIAIS

“EMENTA: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, C, DA CONSTITUIÇÃO. INSTITUIÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL.

EXIGÊNCIA DE IMPOSTO SOBRE SERVIÇO CALCULADO SOBRE O PREÇO COBRADO EM ESTACIONAMENTO DE VEÍCULOS NO PÁTIO

INTERNO DA ENTIDADE. Ilegitimidade. Eventual renda obtida

88 Voto da ministra Ellen Gracie no AI 535.922 - AgR 89 RE 249.980 - AgR 90 RE 241.090

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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pela instituição de assistência social mediante cobrança de

estacionamento de veículos em área interna da entidade, destinada ao custeio das atividades desta, está abrangida pela

imunidade prevista no dispositivo sob destaque. Precedente da

Corte: RE 116.188-4. Recurso conhecido e provido.”91

“EMENTA Imunidade tributária. IPTU. Finalidade do bem. 1. A utilização do imóvel para atividade de lazer e recreação não

configura desvio de finalidade com relação aos objetivos da Fundação caracterizada como entidade de assistência social. 2. A

decisão que afasta o desvio de finalidade para o fim de assegurar a imunidade tributária com base no reconhecimento de que a

atividade de recreação e lazer está no alcance dos objetivos da Fundação não agride o art. 150, § 4º, inciso VI, da Constituição

Federal. 3. Recurso extraordinário conhecido, mas desprovido.”92

“EMENTA: IMUNIDADE TRIBUTARIA. CF, ART. 150, VI, C. SERVIÇO SOCIAL DO COMERCIO - SESC. IMPOSTO SOBRE

SERVIÇOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE DIVERSÃO PÚBLICA. A

renda obtida pelo SESC na prestação de serviços de diversão pública, mediante a venda de ingressos de cinema ao público em

geral, e aproveitada em suas finalidades assistenciais, estando abrangida na imunidade tributaria prevista no art. 150, VI, c, da

Carta Republica. Precedente da Corte: RE 116.188-4 Agravo regimental improvido.”93

“IMUNIDADE - INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA

SOCIAL SEM FINS LUCRATIVOS - IMÓVEIS - ESCRITÓRIO E RESIDÊNCIA DE MEMBROS. O fato de os imóveis estarem sendo

utilizados como escritório e residência de membros da entidade não afasta a imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea

"c", § 4º da Constituição Federal.”94

17.6- LIVROS, JORNAIS e PERIÓDICOS

Por último, as imunidades relativas aos livros, jornais e periódicos limitam-se ao

produto acabado e ao papel destinado à sua impressão. Não se entende à tinta, maquinário e outros insumos95 nem à livraria, à empresa jornalística ou banca

de revistas. Os livros, jornais e periódicos ficam então imunes ao IPI, ICMS, II e IE.

O termo “papel” tem uma interpretação maior que o produto da celulose, pois inclui filmes e papéis fotográficos (súmula 657 do STF) e o plástico que adere

ao cartão da capa dos livros como forma de aumentar sua durabilidade (BOPP).

91 RE 144.900 92 RE 236.174 93 RE 155.822 - AgR 94 RE 221.395 95 Há decisões em sentido contrário.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

64

Vale notar que a Constituição não faz qualquer limitação ao conteúdo dos livros,

jornais e periódicos para que a eles seja concedida imunidade. Assim, são também alcançados pelas imunidades as listas telefônicas, os álbuns de

figurinhas, fascículos semanais e as apostilas.

Ainda não há entendimento definitivo (embora haja entendimento prevalente no STF) quanto à imunidade dos livros eletrônicos. Há, com razão, aqueles que

entendem estar o livro eletrônico imune em virtude do objetivo da imunidade. Há outros que, numa atitude positivista, entendem que somente o livro em

papel está imune, pois o texto constitucional fala do “...papel destinado à sua impressão...”.

Recentemente, o STF decidiu que essa imunidade não abrange os livros eletrônicos, ou seja, aqueles que tem suporte magnético em CD-ROM.

“A orientação firmada por esta Corte interpreta o art. 150, VI, d

da Constituição de forma a restringir a salvaguarda constitucional aos estritos contornos dos objetos protegidos: livros, jornais,

periódicos e o papel destinado a sua impressão. ... Dado que o suporte físico que funciona como mídia (“CD-ROM”) não se

confunde e não pode ser assimilado ao papel, o acórdão recorrido

contrariou a orientação fixada por esta Corte (Cf., e.g., o AI 530.958, rel. min. Cezar Peluso, decisão monocrática, DJ de

31.03.2005 e o RE 497.028, rel. min. Eros Grau, decisão monocrática, DJe 223 de 26.11.2009).”96

Embora esse entendimento possa parecer pouco contemporâneo, é ele o

atualmente prevalente no STF.

17.7- OUTRAS IMUNIDADES

CF, 5o.

XXXIV, a e b

XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra

ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e

esclarecimento de situações de interesse pessoal;

LXXIII

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a

anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio

96 Decisão monocrática proferida pelo min. Joaquim Barbosa nos autos do RE 416.579.

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

65

histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas

judiciais e do ônus da sucumbência;

LXXIV

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que

comprovarem insuficiência de recursos;

LXXVII

LXXVI - são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei:

a) o registro civil de nascimento;

b) a certidão de óbito;

CF, 149

§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo:

I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;

É uma forma de incentivar as exportações através da sua desoneração.

Na verdade, o que busca exportar é o produto nacional e não o custo tributário.

CF, 153

§ 3º O imposto previsto no inciso IV (IPI): ...

III - não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao exterior.

Tem por objetivo desonerar as exportações, tornando-o produto nacional mais competitivo no mercado externo.

§ 5º O ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial, sujeita-se exclusivamente à incidência do imposto de que trata o

inciso V do caput deste artigo (IOF), devido na operação de origem; a alíquota mínima será de um por cento, assegurada a transferência do montante da

arrecadação nos seguintes termos:

I - trinta por cento para o Estado, o Distrito Federal ou o Território, conforme a

origem;

II - setenta por cento para o Município de origem.

Quando o ouro se apresenta como instrumento patrimônio (ativo financeiro) perde sua condição de mercadoria ou de insumo para a

produção de joias e outros artefatos.

CF, 155

§ 2º O imposto previsto no inciso II (ICMS) atenderá ao seguinte:...

X - não incidirá:

a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre

serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações

anteriores;

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive

lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica;

c) sobre o ouro, nas hipóteses definidas no art. 153, § 5º;

d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão

sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita.

...

XII –

§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e

o art. 153, I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de

petróleo, combustíveis e minerais do País.

Note que essa limitação é feita em relação somente aos impostos, não

impedindo que outros tributos incidam sobre as operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo,

combustíveis e minerais do País.

O assunto está sumulado sob o nr. 659 no STF: “É LEGÍTIMA A

COBRANÇA DA COFINS, DO PIS E DO FINSOCIAL SOBRE AS OPERAÇÕES RELATIVAS A ENERGIA ELÉTRICA, SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES,

DERIVADOS DE PETRÓLEO, COMBUSTÍVEIS E MINERAIS DO PAÍS.”

CF, 195

§ 7O. São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em

lei.

Embora o texto constitucional diga de isenção, não resta dúvida que se

trata de imunidade condicionada à observância de lei. Sendo a imunidade uma limitação ao poder de tributar, a lei que a regula só pode ser lei

complementar (CF, 146).

EMENTA: I. Imunidade tributária: entidade filantrópica: CF, arts. 146, II e 195, § 7º: ... A Constituição reduz a reserva de lei

complementar da regra constitucional ao que diga respeito "aos lindes da imunidade", à demarcação do objeto material da

vedação constitucional de tributar; mas remete à lei ordinária

"as normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune". II. Imunidade

tributária: entidade declarada de fins filantrópicos e de utilidade pública: Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos: exigência

de renovação periódica (L. 8.212, de 1991, art. 55). Sendo o Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos mero

reconhecimento, pelo Poder Público, do preenchimento das condições de constituição e funcionamento, que devem ser

atendidas para que a entidade receba o benefício constitucional,

1ª. Etapa do X Exame de Ordem Direito Tributário Prof. Dalmiro Camanducaia

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não ofende os arts. 146, II, e 195, § 7º, da Constituição Federal a

exigência de emissão e renovação periódica prevista no art. 55, II, da Lei 8.212/91.97

Então a necessidade de lei complementar se limita à imunidade, não ao

que venha a ser necessário para que as entidades sejam consideradas “...beneficentes de assistência social...”.

CF, 226

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

17.8- IMUNIDADES IMPLÍCITAS

As IMUNIDADES IMPLÍCITAS são aquelas que, por óbvio, não estão expressas no texto constitucional, mas derivam da interpretação lógica de

outras normas do texto.

Quanto aos impostos, o art. 145 impõe que, sempre que possível, deverão ser

graduados quanto à capacidade contributiva. No entanto, há um determinado

nível até o qual a renda não denota nenhuma capacidade contributiva (mínimo essencial) e, embora não haja previsão expressa, não se pode tributar a renda

até esse limite em virtude da necessária observância da capacidade contributiva quando da graduação dos impostos.

Uma questão: as imunidades constituem cláusulas pétreas?

As imunidades que tiverem por objeto assegurar princípios fundamentais do

regime democrático, bem como defender direitos e garantias do cidadão não poderão ser suprimidas nem modificadas in pejus. No entanto, aquelas que têm

por objeto dar eficácia a decisões políticas de ordem fiscal ou econômica poderão ser modificadas sem que isso represente afronta à impossibilidade de

supressão das cláusulas pétreas.

97 STF, 1ª T., AGRRE 428.815-0/AM, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 2005