102 14.09.10 Jurisdição Constitucional Dr. João Mendes

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Jurisdição Constitucional Dr. João Mendes Data: 14/09/10. Centro: Rua Buenos Aires, 56 - 2º, 3º e 5º andares – Tel.: (21)2223-1327 Barra: Shopping Downtown – Av. das Américas, 500 - bl. 21, salas 157 e 158 – Tel.: (21)2494-1888 www.enfasepraetorium.com.br 1/13 Assuntos tratados: 1º horário: - Jurisdição Constitucional: Conceito; Modelos: Americano e Europeu Continental; Quadro Comparativo dos Modelos Americano e Europeu Continental. - Natureza da Jurisdição Constitucional. Pontos Antagônicos entre Estado de Direito e Democracia. 2º horário: - Legitimidade da Jurisdição Constitucional. Tensões na Relação com o Legislador. - Pensamentos que ajudam a legitimar a jurisdição constitucional. JURISDIÇÂO CONSTITUCIONAL Indicações Bibliográficas sobre o tema: Livro do Gustavo Binenbojm – A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira. Editora Renovar Livro do José Adércio Leite Sampaio – A Constituição reinventada pela jurisdição constitucional (o livro é muito extenso, só vale a pena para quem quer o MPF) 1º Horário - Conceito de Jurisdição Constitucional: É o órgão ou conjunto de órgãos destinados a defesa da Constituição. Essa defesa se dá, especialmente, através do controle de constitucionalidade. - Modelos de Jurisdição Constitucional: Modelo americano e modelo austríaco-europeu (europeu continental) 1) Modelo Americano Para se entender o modelo de jurisdição constitucional americano faz-se necessária uma recordação histórica sobre a forma de colonização adotada pela Inglaterra. A Inglaterra, diversamente de Portugal e da Espanha, adotou o modelo da colonização de povoamento, ou seja, não houve uma exploração tão intensa quanto havia nas colônias daqueles países.

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Assuntos tratados:

1º horário:

- Jurisdição Constitucional: Conceito; Modelos: Americano e Europeu Continental; Quadro Comparativo dos Modelos Americano e Europeu Continental.

- Natureza da Jurisdição Constitucional. Pontos Antagônicos entre Estado de Direito e Democracia.

2º horário:

- Legitimidade da Jurisdição Constitucional. Tensões na Relação com o Legislador.

- Pensamentos que ajudam a legitimar a jurisdição constitucional.

JURISDIÇÂO CONSTITUCIONAL

Indicações Bibliográficas sobre o tema:

� Livro do Gustavo Binenbojm – A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira. Editora Renovar

� Livro do José Adércio Leite Sampaio – A Constituição reinventada pela jurisdição constitucional (o livro é muito extenso, só vale a pena para quem quer o MPF)

1º Horário

- Conceito de Jurisdição Constitucional:

É o órgão ou conjunto de órgãos destinados a defesa da Constituição. Essa defesa se dá, especialmente, através do controle de constitucionalidade.

- Modelos de Jurisdição Constitucional:

Modelo americano e modelo austríaco-europeu (europeu continental)

1) Modelo Americano

Para se entender o modelo de jurisdição constitucional americano faz-se necessária uma recordação histórica sobre a forma de colonização adotada pela Inglaterra.

A Inglaterra, diversamente de Portugal e da Espanha, adotou o modelo da colonização de povoamento, ou seja, não houve uma exploração tão intensa quanto havia nas colônias daqueles países.

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Os cristãos protestantes, especialmente os puritanos, vão para as colônias visando alcançar a liberdade religiosa e conquistar terras (busca da felicidade).

Quando a Inglaterra passa pela Revolução Gloriosa, na qual houve um fortalecimento da nobreza e conseqüentemente, um fortalecimento do Parlamento e enfraquecimento do rei, a Inglaterra passa a explorar mais intensamente as suas colônias, através da elaboração de leis que aumentavam a carga tributária. Ex.: Lei do Chá que aumentava intensamente a tributação sobre este produto.

Todavia, os colonos ingleses estavam acostumados com um grau de liberdade relativamente alto em relação à Metrópole e por isso, apresentaram resistência a opressão do Parlamento, havendo uma série de revoltas que culminaram na Independência da colônia em 1776.

Alguns anos depois da Declaração de Independência, houve a elaboração da Constituição Americana (1787), que é considerada a primeira Constituição Moderna. No seu art. 6º, §2º ela apresenta a chamada cláusula de supremacia, ou seja, todas as leis deveriam ser elaboradas de forma compatível com a Constituição.

No entanto, não havia previsão na Constituição Americana sobre as conseqüências no caso de uma lei que desrespeitasse essa supremacia e nem qual seria o órgão responsável pelo controle de constitucionalidade.

Obs.: Quais são os pressupostos do Controle de Constitucionalidade?

Os pressupostos são a supremacia formal (rigidez da constituição), a supremacia material (o conteúdo da constituição é superior ao conteúdo de qualquer lei) e a existência de um órgão que faça esse controle)

Então, surgem três posições em relação a quem caberia fazer a análise da Constitucionalidade das normas.

1ª posição: Caberia ao juiz.

Crítica: A lei é elaborada pelo legislador que é o representante do povo, logo, a lei é fruto de uma vontade majoritária. Por outro lado, o juiz (especialmente o membro da Suprema Corte Americana) não é representante do povo, não tendo legitimidade popular (legitimidade democrática) para fazer esse controle.

2ª posição: Caberia ao legislador.

Crítica: Quem faz a lei é o legislador, logo ele seria parcial. Não poderia o legislador atuar como “juiz de si mesmo”.

3ª: Caberia ao chefe do Executivo.

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O chefe do executivo até teria legitimidade democrática, todavia haveria um risco de haver uma ditadura de um só, com um poder tirano. Não é bom concentrar o poder na mão de uma única pessoa.

Essa situação ficou indefinida até que chega a Suprema Corte o caso Marbury X Madinson (1803).

John Adams, até então presidente dos EUA, perdeu as eleições para Thomas Jefferson. Todavia, antes de deixar o poder o partido daquele consegue criar uma lei criando vários cargos.

John Marshall, secretário de Estado de John Adams, começa a nomear e dar posse a pessoas da confiança deles como forma de manter a influência política no governo. Todavia, algumas pessoas, entre as quais estava Marbury, foram nomeadas, mas não conseguiram tomar posse antes de haver a troca de poder político.

James Madison, novo secretário de Estado nomeado por Jefferson, se nega a dar posse para Marbury e por isso, este ajuíza uma ação contra aquele (Marbory X Madinson).

O Presidente da Suprema Corte era John Marshall e ele próprio resolve decidir o caso. Ao proferir a decisão ele a divide em três partes:

1ª parte: Marbory tem direito a tomar posse? Sim;

2ª parte: Marbory tem ação para proteger seu direito? Sim;

3ª parte: É a Suprema Corte competente para julgar essa ação?

Marshall analisa primeiro o mérito e depois a competência e quando do exame desta, ele identifica que Marbury ajuizou uma ação com base em uma lei que teria ampliado a competência da Suprema Corte e que tal lei estaria em conflito com a competência definida na Constituição para a Suprema Corte. Como a Constituição não tinha a solução para a questão, dois raciocínios são desenvolvidos:

1º - O juiz ao se deparar com uma lei contrária a Constituição, deveria aplicar a lei. Todavia, ao aplicar a lei o juiz estaria colocando a lei em posição superior a Constituição e consequentemente, o legislativo teria uma supremacia em relação aos outros dois poderes. Como o americano olha com desconfiança para o legislador, por causa da opressão realizada pelo Parlamento na época da colonização, essa solução não prospera, pois haveria o risco do legislador se tornar tirânico.

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2º - O juiz ao analisar a lei e a Constituição deve aplicar a Constituição. Sendo a lei inferior a constituição deve obediência a esta. Portanto, se uma lei desrespeitar a Constituição, a lei será nula ab ovo (desde o início).

O raciocínio adotado por Marshall foi no sentido de que havendo conflito entre lei e a Constituição, qualquer juiz poderia analisar o conflito (controle difuso e incidental, porque é exercido em um caso concreto).

Então, com essa decisão do caso Marbury X Madinson esse passou a ser o modelo americano de controle de constitucionalidade.

2) Modelo Europeu Continental

Hans Kelsen formula um modelo diferente do americano. Para ele quando uma norma é declarada inconstitucional, ela é expurgada da ordem jurídica. Essa atividade de retirar a norma do ordenamento jurídico seria uma atuação de legislador negativo e é exatamente essa a função exercida pela jurisdição constitucional.

Essa função de legislador negativo tem caráter político, não é dado ao juiz fazer esse controle, porque o juiz tem um dever de analisar casos concretos. Na visão de Kelsen, deveria haver um órgão jurisdicional específico com competência exclusiva para fazer o controle de constitucionalidade da norma em tese (Tribunal Constitucional).

Kelsen criou um modelo de controle de constitucionalidade concentrado e abstrato e para ele a norma inconstitucional não é nula, mas anulável (princípio da anulabilidade).

- Quadro Comparativo entre os Dois Modelos:

Modelo Americano Modelo Controle Difuso Controle Concentrado Controle Concreto Controle Abstrato Princípio da Nulidade Princípio da Anulabilidade

O STF está mais próximo de qual modelo? Do europeu (Fenômeno da objetivação).

Fenômeno da objetivação do processo – dá ao processo um caráter mais focado na coletividade e menos focado no interesse das partes. Ex. Repercussão Geral do Recurso Extraordinário, discussão de questões de alta relevância como a anencefalia e as células tronco.

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- Natureza da Jurisdição Constitucional

1ª corrente: A jurisdição constitucional possui natureza de órgão político, com função legislativa negativa; funciona como “uma segunda Câmara” ou “uma instância política suprema”, mesmo porque não há uma subsunção ou solução dos casos concretos (remete a idéia de poder moderador da Constituição Brasileira do Império)

2ª corrente: A jurisdição constitucional possui natureza jurisdicional. Kelsen defende essa natureza, mas apresenta pensamento cambiante quando fala que a jurisdição constitucional exerce função legislativa negativa.

Canotilho, na mesma linha de Kelsen, entende que possui natureza jurisdicional, mas não sem reconhecer “especificidades metódicas em relação à actividade jurisdicional desenvolvida por outros tribunais”.

Esse caráter específico se manifesta em uma dimensão política e numa dimensão interpretativa.

- Dimensão política: A jurisdição constitucional é chamada para atuar em questões políticas, a se converter em regulador político.

Quando o STF, por exemplo, tem que decidir se a pesquisa de células tronco é ou não permitida, essa decisão terá um caráter político, pois define a identidade de nosso país (se é um Estado fundado em direitos fundamentais etc).

- Dimensão interpretativa: A jurisdição constitucional culmina por impor a sua interpretação sobre os demais juízes.

• A Constituição tem que ser interpretada com base nela própria, pois não existe norma positivada superior a ela.

• A interpretação dessa constituição vai prevalecer sobre qualquer norma (princípio da interpretação conforme a Constituição)

• Existe um órgão superior que é o último intérprete (prevalecendo a sua interpretação).

• Não existe um rol fechado dos métodos corretos para se interpretar a Constituição, existem vários métodos para interpretá-la. Logo não há como dizer se decisão da Corte Suprema foi acertada ou não.

- Pontos Antagônicos entre Estado de Direito e Democracia

Estado de Direito – A idéia de Estado de Direito surge como uma reação a monarquia absolutista. O poder é limitado através de normas jurídicas. Há uma juridicização do poder.

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Democracia – Segundo entendimento clássico a democracia poderia ser traduzida como vontade da maioria.

Para Rousseau, o homem nasce livre e abre mão de uma parcela dessa liberdade, para formar um acordo (contrato social) e viver em comunidade, passando a ter uma liberdade cívica, liberdade gregária.

Se o indivíduo vive nessa comunidade como fruto de sua vontade, as decisões do “Estado” devem ser tomadas a partir da vontade da maioria dos indivíduos que formaram esse “Estado”. Portanto, para Rousseau se uma decisão é fruto de uma decisão majoritária, ela é soberana e legítima.

Se os conceitos de Estado de Direito e Democracia forem levados ao extremo, eles serão antagônicos, pois a exigência de juridicidade limita a formação de vontade da maioria, enquanto esta pode representar a subversão dos princípios jurídicos.

Esse debate entre Estado de Direito e Democracia, se manifesta de maneiras diferentes, mas no mesmo sentido. Ex.: Embate entre direitos humanos e soberania do Estado. Até que ponto o Estado sob o argumento de ser soberano pode praticar atos que ferem direitos humanos ou até que ponto os direitos fundamentais podem limitar a soberania do Estado.

O Constitucionalismo busca um ponto ótimo de equilíbrio institucional, intentando convergir o princípio majoritário com a prescrição de limites para o poder. Assim, as constituições modernas estabelecem conteúdos mínimos a serem respeitados pelos órgãos representativos da vontade majoritária, sem asfixiá-la.

2º Horário

- Legitimidade da Jurisdição Constitucional

O questionamento sobre a legitimidade da jurisdição constitucional se dá em razão de não haver um órgão de controle democrático das decisões e por não haver a eletividade dos julgadores.

- Ausência de controle democrático das decisões:

• A Jurisdição Constitucional é o último intérprete da Constituição.

• Os julgadores ordinários tem ampla margem de conformação como os da jurisdição constitucional, no entanto as decisões daqueles podem ser “reprogramadas” por uma decisão superior ou pela alteração da legislação ordinária, enquanto as decisões destes últimos só podem ser reprogramadas por Emenda à Constituição, e, mesmo assim, com

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ressalvas, posto que, as emendas, podem ser objeto de controle de constitucionalidade.

Ex.: Depois de determinada lei X ser declarada inconstitucional pelo STF, o legislador resolve fazer uma emenda a Constituição para mudar exatamente o ponto da constituição que conflitava com a lei. Essa emenda constitucional posterior não convalida a lei X, mas se o Congresso Nacional criar uma lei de idêntico conteúdo ao da lei X, depois da promulgação da EC, ela será válida.

Então poderia se argumentar que essa possibilidade de o Congresso Nacional fazer uma Emenda Constitucional superando uma decisão do STF, seria uma forma de Controle deste poder. Todavia, este suposto controle apresenta falhas, pois o Supremo continuará a ser o último intérprete da Constituição e poderá, por exemplo, declarar a EC inconstitucional se ela violar uma cláusula pétrea.

- A não eletividade dos julgadores

Nos EUA os juízes ordinários são eleitos, mas mesmo lá os membros da Suprema Corte não são eleitos pelo povo. Por isso, há a chamada dificuldade contra majoritária, ou seja, como o legislador é eleito pelo povo quando a jurisdição constitucional declara uma lei inconstitucional, ela está indo contra a vontade majoritária.

Obs.: Mesmo no caso do Brasil em que os membros do STF são escolhidos segundo a vontade dos representantes do povo não se poderia falar que eles possuem representatividade popular, pois não foram eleitos diretamente pelo povo.

- Tensões na Relação com o Legislador

Enunciado nº 394 da Súmula do STF: Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício.

O STF cancelou esse Enunciado, entendendo que o foro especial só deve perdurar, enquanto durar a função. Terminada a função, extingue-se o foro especial e os autos devem ser remetidos ao juiz ordinário. O legislador se opôs a isso e elaborou a Lei nº 10.628/02, que acrescentou os parágrafos 1º e 2º ao art. 84 do CP, sendo que o § 1º dizia exatamente aquele entendimento superado pelo STF, veja:

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§ 1o A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública.

O STF declarou o referido dispositivo inconstitucional, fazendo prevalecer a sua posição em relação a do legislador:

“(...) admitir pudesse a lei ordinária inverter a leitura pelo Supremo Tribunal da Constituição seria dizer que a interpretação constitucional da Corte estaria sujeita ao referendo do legislador, ou seja, que a Constituição – como entendida pelo próprio órgão que ela própria erigiu em guarda da sua supremacia -, só constituiria o correto entendimento da Lei Suprema na medida da inteligência que lhe desse outro órgão constituído, o legislador ordinário, submetido aos seus ditames” (ADI 2.797 e ADI 2.860, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 15.9.05, DJ de 19.12.06)

A Lei nº 10.628/02 foi declarada eivada de inconstitucionalidade formal, pois cabe ao STF a última interpretação da Constituição.

Três aspectos geram este questionamento sobre a legitimidade da Jurisdição Constitucional:

a) Posição Institucional: A jurisdição constitucional culmina por ocupar uma função distinta do legislador ordinário (tradicional), e, em verdade, a exercer a posição de controle dos três poderes.

b) Abertura do texto constitucional: A plasticidade das normas (porosidade das normas) permite uma atuação criativa e positiva, o que pode conduzir a jurisdição constitucional à condição legislativa ou mesmo de mini-constituinte, por ter o poder de dizer por último o que é a própria constituição.

Ex.: O que é dignidade da pessoa humana? O que é moralidade Administrativa? São conceitos vagos, indeterminados.

c) Indefinição das técnicas de interpretação: Não há um cânon fechado sobre quais as regras que podem ou devem ser utilizadas. Acontece de o juiz constitucional se valer de técnicas distintas, conforme entende mais apta para fornecer a solução do embate constitucional.

- Pensamentos que ajudam a legitimar a jurisdição constitucional:

1) Positivismo Jurídico é uma variante do positivismo filosófico que adota um pensamento cientificista, ou seja, procura entender a sociedade a partir de uma perspectiva científica.

Essa variante no âmbito jurídico vai entender que o direito é uma ciência (tem que ter objeto definido de estudo e este apresenta características próprias).

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Se o direito é uma ciência, ele deve ser interpretado a partir de um objeto definido. Ele deve ser entendido de forma autônoma, de forma isolada, sem a interferência de outros ramos do conhecimento. O direito não deve ser interpretado a partir de valores morais, da ética, da política, de concepção de justiça etc.

Esse tipo de pensamento deu origem a um dos mais famosos livros de Hans Kelsen, o Teoria Pura do Direito, que pregava justamente o entendimento do direito de forma destacada de outros ramos do conhecimento.

Se o direito é uma ciência pura, pode o intérprete do direito dizer se a norma é justa ou injusta? Não, porque demandaria uma valoração por parte do intérprete, o que negaria a pureza do direito. A validade da norma, então, não poderá ser dita com base nos valores de justiça, mas sim com base no próprio direito (autopoiésis, ou seja, algo que é fundamentado em si mesmo).

Para dizer se uma norma é válida ou não, será necessário utilizar uma outra norma como parâmetro, será necessário verificar se a norma inferior é compatível com a norma superior. E a partir deste raciocínio Kelsen criou a Teoria do escalonamento da ordem jurídica (pirâmide de Kelsen).

Ex.: Uma sentença é válida porque está de acordo com a lei. A lei é válida se estiver de acordo com a Constituição.

Qual é a norma que fundamenta a Constituição?

A norma que fundamenta a Constituição é a norma hipotética fundamental.

A norma hipotética fundamental é direito pressuposto, não é direito posto, positivado. É uma pressuposição lógica, decorre da lógica.

O que é a norma hipotética fundamental? É uma ordem que diz que a constituição deve ser cumprida. Ela não tem caráter valorativo, a Constituição deve ser cumprida, não importando o que ela diga.

Para Kelsen, a análise quanto à justiça ou injustiça da decisão está fora do plano jurídico, estaria relacionado com a filosofia.

Qual seria a diferença substancial entre a norma constitucional e uma lei?

A diferença entre a lei e a constituição seria a hierarquia, mas ontologicamente são a mesma coisa. Logo, a constituição e as leis serão interpretadas com as mesmas técnicas (histórico, gramatical, sistemático e teleológico).

Onde repousa a legitimidade da jurisdição constitucional?

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Na neutralidade do intérprete que não pode atuar de forma valorativa em relação à lei ou a Constituição. O intérprete será mera boca da lei.

Problema: Às vezes um determinado caso comporta duas soluções jurídicas. Qual solução escolher? Para o positivismo, a razão da escolha de uma ou outra solução não é objeto do direito. O intérprete poderá escolher qualquer uma delas. Para Kelsen, seria um ato volitivo do intérprete.

A decisão do juiz é ato cognitivo, mas, também, volitivo.

O positivismo jurídico realça a constituição formal, uma vez que ignora o seu conteúdo material (limitação do poder e proteção de direitos individuais).

A Constituição se define por sua superioridade (advinda da rigidez, que é um conjunto de óbices procedimentais para alteração da constituição) em relação às demais normas.

- Síntese do raciocínio silogístico do positivismo:

• A Constituição é norma jurídica superior às demais.

• Ao Judiciário cabe aplicar as normas jurídicas, zelando por sua imperatividade.

• Conclusão, ao Judiciário cabe aplicar diretamente as normas constitucionais, velando por sua prevalência sobre as demais normas jurídicas.

• Segundo o positivismo, a jurisdição constitucional não afeta a separação de poderes, uma vez que retira da própria Constituição a sua autoridade, é a constituição mesma que consagra o sistema de freios e contrapesos.

- Quanto ao princípio democrático:

• Juiz constitucional deve atuar de forma rigorosamente neutra, fazendo prevalecer à vontade da maioria constituinte sobre a vontade das maiorias ocasionais.

• A neutralidade do Juiz e o formalismo hermenêutico caracterizam, então, o positivismo.

- Críticas:

• A completude e a coerência sistêmica são ideais, nem sempre reais.

• Não se concebe uma interpretação que não sofra influência das impressões pessoais do intérprete (A formação pessoal do indivíduo afeta a sua interpretação).

• As normas constitucionais têm características que as particularizam em relação às demais normas, o que certamente determina a interpretação,

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a saber, a superioridade hierárquica, natureza da linguagem, conteúdo específico e caráter político.

• O normativismo jurídico de Kelsen representou a radicalização do positivismo e, simultaneamente, o seu esgotamento. Mesmo que a norma fale algo teratológico, ela deverá ser cumprida. Ex.: Quando os nazistas foram levados ao Tribunal de Noremberg eles justificaram que tudo que eles fizeram estava fundamentado na Constituição.

- Dilema de Kelsen – ver a sua própria tese sendo utilizada para fundamentar o nazismo.

Após a segunda Guerra Mundial surgem as correntes pós-positivistas (busca pela superação do positivismo clássico).

Crítica de Carl Schmitt a Kelsen:

• O controle de constitucionalidade sempre exibe uma feição política, fazendo uma avaliação discricionária da lei.

• Na verdade o Tribunal Constitucional não simplesmente diz o direito, antes, o faz.

• A Jurisdição Constitucional não é a juridicização da política, mas sim a politização da justiça, o que é indesejável.

• Para Schmitt o zelo da constituição cabia ao Presidente do Reich, que exerceria uma espécie de função moderadora.

- Questões de Concursos

1) Prova FCC - 2010 - DPE - SP - Defensor Público: Em sua Teoria Pura do Direito, Hans Kelsen concebe o Direito como uma "técnica social específica". Segundo o filósofo, na obra O que é justiça?, "esta técnica é caracterizada pelo fato de que a ordem social designada como 'Direito' tenta ocasionar certa conduta dos homens, considerada pelo legislador como desejável, provendo atos coercitivos como sanções no caso da conduta oposta". Tal concepção corresponde à definição kelseniana do Direito como a) uma ordem estatal facultativa. b) uma ordem axiológica que vincula a interioridade. c) um veículo de transformação social. d) uma ordem coercitiva. e) uma positivação da justiça natural.

Gabarito:D

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2) Prova Objetiva do 19º Concurso para Procurador da República: Os princípios constitucionais de proteção aos direitos humanos no Estado Democrático de Direito: I – não podem ser considerados no dever do Estado de garantir a segurança pública, direito de todos, preservando a incolumidade das pessoas e do seu patrimônio; II – devem sempre ser respeitados, sem prejuízo da maior eficiência no combate à criminalidade e na preservação da ordem e da segurança pública sob a responsabilidade do Estado; III – asseguram aos presos o respeito à integridade física e moral e garantem que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei, devendo o preso ser informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe ainda garantida a assistência da família e de advogado. Analisando-se as assertivas acima, pode-se afirmar que: a) Todas estão corretas b) Somente as de números I e III estão corretas; c) Estão corretas as de números II e III; d) Apenas a de número I está correta. Gabarito:C

3) Prova: VUNESP - 2009 - TJ-MT - Juiz: Aponte a alternativa que corresponde aos respectivos autores ou defensores das seguintes idéias ou teorias do direito constitucional: conceito jurídico de constituição; poder constituinte; poder moderador; e controle judicial de constitucionalidade. a) Ferdinand Lassale; Konrad Hesse; D. Pedro I; e Montesquieu. b) Konrad Hesse; Ferdinand Lassale; Rui Barbosa; e Rudolf Von Ihering. c) Hans Kelsen; Emmanuel J Sieyès; Benjamin Constant; e John Marshal. d) Carl Schimidtt; Ferdinand Lassale; Clóvis Bevilaqua; e Immanuel Kant. e) Hans Kelsen; Emmanuel J. Sieyès; Benjamin Constant; e Ferdinand

Lassale.

Gabarito: C

4) Prova: CESPE/Juiz - Substituto-TJ-PI/2007: Em sentido essencialmente político, a constituição pode ser definida, conforme Hans Kelsen, como uma decisão política fundamental, dotada de um nítido caráter sociológico. Gabarito: Certo

5) Prova: CESPE/Analista-STF/2008: Considere a seguinte definição, elaborada por Kelsen e reproduzida, com adaptações, de José Afonso da Silva ( Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Atlas, p. 41… ). A constituição é considerada norma pura. A palavra constituição tem dois

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Jurisdição Constitucional

Dr. João Mendes

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sentidos: lógico-jurídico e jurídico-positivo. De acordo com o primeiro, constituição significa norma fundamental hipotética, cuja função é servir de fundamento lógico transcendental da validade da constituição jurídico-positiva, que equivale à norma positiva suprema, conjunto de normas que regula a criação de outras normas, lei nacional no seu mais alto grau. É correto afirmar que essa definição denota um conceito de constituição no seu sentido jurídico. Gabarito: Certo

6) Prova Subjetiva do 24º Concurso para Procurador da República: As

sentenças intermediárias de constitucionalidade violam o princípio da supremacia da constituição? Justifique. (máximo de 15 linhas).

7) Prova Subjetiva do 23º Concurso para Procurador da República:Descreva brevemente os mecanismos de controle jurisdicional de constitucionalidade difuso e concentrado no modelo brasileiro e seus vínculos com o Direito Comparado.

8) Prova Subjetiva do 20º Concurso para Procurador da República. Qual a missão constitucional do Ministério Público enquanto órgão do Estado, no Estado Democrático de Direito?

9) Prova: X Concurso para Juiz Substituto – TRF-2: Na fase do “império”, como ocorreu o desdobramento da jurisdição em Roma? (o que explica como se processou o julgamento de Jesus Cristo).

10) Prova: VII Concurso para Juiz Substituto – TRF-2: Em que consiste a cláusula de reserva de jurisdição? Aponte duas matérias em que ocorre sua incidência?