14 - O Enforcado

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O Enforcado Quase no fim do auto, aparece-nos um ladrão a quem a Justiça condenou à forca, ainda com o baraço em volta do pescoço, que vem convencido de que irá para o Céu. Gil Vicente diz-nos que este foi intrujado por Garcia Moniz (tesoureiro da Casa da Moeda de Lisboa). Este teria convencido o ladrão enforcado de que iria para o Paraíso, visto ter-se já purificado dos pecados cometidos no purgatório do Limoeiro e que poder-se-ia considerar um “santo canonizado” por muito ter sofrido durante toda a sua vida. Contudo, o Enforcado, desiludido pelo Diabo, reconhece finalmente que não tem perdão possível e, tal como já fizera o Judeu, nem sequer vai pedir ao Anjo que o acolha. É nítida a intenção de Gil Vicente de satirizar mais a doutrina de Garcia Moniz do que o próprio ladrão enforcado. Esta personagem aparece aqui como vítima. Quem é verdadeiramente criticado é o tesoureiro por ter induzido em erro o ladrão, sabendo à partida que não havia salvação possível para ele. De novo, Gil Vicente põe-nos face a uma personagem com responsabilidade que engana os mais fracos. E o mais fraco, neste caso, é o Enforcado. O Enforcado é ingénuo, simples, confiante. É uma personagem sem vontade própria, que se deixa facilmente influenciar. Intenção crítica Exercícios 1. Assinala com V (verdadeira) ou F (falsa) as seguintes afirmações: a) Quando entra em cena, o enforcado tem a certeza de que irá para o paraíso. b) O baraço traduz a salvação e o Bem. c) O objectivo de Garcia Moniz, provavelmente, é animar, com base em ilusões, um criminoso que vai receber o castigo da forca. d) O enforcado não se dirige à Barca do Anjo, porque a sua religião não lho permitia. 2. Caracteriza o Enforcado. a) crédulo b) mentiroso c) tímido d) ignorante e) inocente f) revoltado g) autoritário h) incrédulo

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O Enforcado

Quase no fim do auto, aparece-nos um ladrão a quem a Justiça condenou à forca, ainda com o baraço em volta do pescoço, que vem convencido de que irá para o Céu. Gil Vicente diz-nos que este foi intrujado por Garcia Moniz (tesoureiro da Casa da Moeda de Lisboa). Este teria convencido o ladrão enforcado de que iria para o Paraíso, visto ter-se já purificado dos pecados cometidos no purgatório do Limoeiro e que poder-se-ia considerar um “santo canonizado” por muito ter sofrido durante toda a sua vida. Contudo, o Enforcado, desiludido pelo Diabo, reconhece finalmente que não tem perdão possível e, tal como já fizera o Judeu, nem sequer vai pedir ao Anjo que o acolha. É nítida a intenção de Gil Vicente de satirizar mais a doutrina de Garcia Moniz do que o próprio ladrão enforcado. Esta personagem aparece aqui como vítima. Quem é verdadeiramente criticado é o tesoureiro por ter induzido em erro o ladrão, sabendo à partida que não havia salvação possível para ele. De novo, Gil Vicente põe-nos face a uma personagem com responsabilidade que engana os mais fracos. E o mais fraco, neste caso, é o Enforcado. O Enforcado é ingénuo, simples, confiante. É uma personagem sem vontade própria, que se deixa facilmente influenciar.

Intenção crítica

Exercícios

1. Assinala com V (verdadeira) ou F (falsa) as seguintes afirmações:

a) Quando entra em cena, o enforcado tem a certeza de que irá para o paraíso.

b) O baraço traduz a salvação e o Bem.

c) O objectivo de Garcia Moniz, provavelmente, é animar, com base em ilusões,

um criminoso que vai receber o castigo da forca.

d) O enforcado não se dirige à Barca do Anjo, porque a sua religião não lho

permitia.

2. Caracteriza o Enforcado.

a) crédulo

b) mentiroso

c) tímido

d) ignorante

e) inocente

f) revoltado

g) autoritário

h) incrédulo

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Na cena do Enforcado, Gil Vicente satiriza a tese da salvação da alma e da

purificação dos pecados através da morte na forca. Garcia Moniz convence o

Enforcado de que já se teria libertado dos pecados no purgatório da prisão e,

como tinha sofrido muito na vida, era um “santo”. O Enforcado parece ser mais

uma vítima da sua ingenuidade do que propriamente culpado. Como até hoje não

se possuem dados documentais concretos sobre Garcia Moniz, esta cena continua

envolta em dúvida. Os espectadores da época fizeram, provavelmente, uma

interpretação diferente da nossa.

Abolição da pena de morte em Portugal

Portugal assumiu uma posição de vanguarda, comparativamente ao resto da

Europa, relativamente à abolição da pena de morte.

Portugal foi de facto, o primeiro país a adoptá-lo sob a forma de lei da Reforma

Penal de 1867, recebendo aplausos entusiastas de importantes figuras europeias.

As posições que Portugal assumiu relativamente a esta matéria são, em grande

parte, fruto da influência das doutrinas humanitaristas do italiano marquês de Beccaria,

a partir de 1764.

Salienta-se a acção de Pascoal José de Mello Freire que, por ordem da rainha D.

Maria I, elabora um projecto de Código Criminal onde transparecem as doutrinas

preconizadas por Beccaria. É cauteloso quando aborda a questão da pena de morte,

porque não esquece que o país conservava muito arraigada a tradição do direito penal

clássico, considerando perigosa a aplicação daquela doutrina na sua total expressão. No

entanto, contém em si a semente da renovação.

Ribeiro dos Santos, outra das figuras de destaque, pode considerar-se o primeiro

abolicionista pelas opiniões que emite no seu estudo acerca desta matéria no Jornal de

Coimbra, em 1815, em defesa da desnecessidade e inconveniência da pena de morte.

Para além dos escritos teóricos, foram também publicadas algumas leis avulsas que

denotam uma certa permeabilidade à ideia de abolição, como é o caso do decreto

promulgado por D. João VI em 1801, que comuta a pena de morte dos condenados

noutros castigos, salvo os autores de crimes extremamente graves. Em 1772 ocorreu a

última condenação à pena de morte de uma mulher.

Assim, desde o reinado de D. Maria I que deixou de vigorar a pena de morte

aplicada a mulheres. Foi de facto com o movimento liberal que se caminhou para uma

resolução definitiva. Na Constituição de 1822, um dos artigos proclamava a abolição

das penas cruéis e infamantes, mas nada dizia acerca da pena de morte. No Código

Penal de 1837 continua-se a preconizar o seu uso. No entanto, a Reforma Judiciaria de

1832 introduzia uma novidade: a possibilidade do recurso à clemência régia. A última

execução capital ocorreu em Lagos, em 1846. o Acto Adicional de 1852 abolia a

pena de morte para delitos políticos. Em 1867 consagra-se na Reforma Penal e das

Prisões a abolição da pena de morte para todos os crimes.

Abolição da Pena de Morte em Portugal.

In Infopédia.

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Tipos de frase

As frases podem ser de quatro tipos diferentes dependendo da intenção do

seu emissor.

Atenta nos exemplos seguintes:

-“Que diz lá Garcia Moniz?”

O emissor faz uma pergunta.

- “Nom ê´ssa a nao que eu governo.”

O emissor dá uma informação.

-“Alto!”

O emissor exprime um sentimento de receio.

-“Ajudai ali a botar!”

O emissor dá uma ordem.

Tipos de Frase

Tipo

Intenção

Marcas

Exemplo

Interrogativo

Perguntar

Ponto de

interrogação

“Que diz lá Garcia

Moniz?”

Declarativo

Informar

Ponto final

Reticências

“Nom e´ssa a nao

que eu governo.

Exclamativo

Exprimir

sentimentos

Ponto de

exclamação

Interjeições

“Alto!”

Imperativo

Dar ordens,

aconselhar, pedir

Ponto de

exclamação, ponto

final, verbos no

imperativo

“Ajudai ali a botar!”

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FORMAS DA FRASE Formas da Frase

Cada tipo de frase pode assumir formas diferentes.

Activa / Passiva — No primeiro caso, o sujeito é apresentado como agente, no segundo

como paciente. A distinção implica o recurso a conjugações verbais diferenciadas: voz

activa ou voz passiva.

O carrasco executou o Enforcado.

O Enforcado foi executado pelo carrasco.

Afirmativa / Negativa — A acção ou processo expressos pelo verbo podem ser

afirmados ou negados, o que se traduz pela ausência ou presença de um advérbio de

negação.

Vou ao teatro.

Não vou ao teatro.

Neutra / Enfática — Algumas frases assumem uma forma enfática, caracterizada pela

presença de elementos que não introduzem informação nova, limitando-se a reforçar a

informação fornecida pelos restantes elementos da frase.

Ele sabe o que faz.

Ele é que sabe o que faz. (enfática)

Ele lá sabe o que faz. (enfática)

Como se depreende facilmente, essas formas são alternativas, isto é, a presença de uma

implica a impossibilidade da outra: uma frase ou é activa ou passiva, ou afirmativa ou

negativa, ou neutra ou enfática. Por outro lado, estas formas aplicam-se a todos os tipos

de frase, com excepção da forma passiva que não é possível nas frases imperativas.

Come pão, Enforcado.

O pão é comido pelo Enforcado. (Não tem valor imperativo)

Cumpre as minhas ordens, D. Anrique.

As minhas ordens são cumpridas por D. Anrique. (Não tem valor imperativo)

Como pudeste verificar as frases na forma passiva não têm valor imperativo.

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Exercício

1. Cada um dos quatro tipos de frase pode apresentar diferentes formas. Associa a

cada uma das seguintes frases do tipo declarativo, a forma que apresenta:

a) Foi o Enforcado que acreditou forma afirmativa activa

ir para o Paraíso

b) O Enforcado foi enganado por forma negativa activa

Garcia Moniz

c) O Enforcado não foi autorizado forma afirmativa passiva

a entrar na Barca do Paraíso.

d) Garcia Moniz enganou o forma negativa passiva

enforcado.

e) O Enforcado não foi para forma afirmativa activa e enfática

o Paraíso.

Repara

A forma enfática é composta por elementos que reforçam o conteúdo, como

“lá”, “é que”, “cá”, “mesmo”, entre outros. Trata-se de uma forma frequentemente

empregue no discurso oral de maneira a acentuar a expressão de determinadas ideias.

Prof. Maria Filomena Ruivo Ferreira