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  • Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Centro Tecnolgico (CTC) Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo (PPGEP) Laboratrio de Sistemas de Apoio Deciso (LABSAD)

    Campus Universitrio Trindade Caixa Postal 476, Florianpolis SC, BRASIL, CEP: 88040-900 Fone: ++55 (48) 3721-7065 Fax: ++55 (48) 3721-7066

    http://www.ijie.ufsc.br e-mail: [email protected]

    IJIE Iberoamerican Journal of Industrial Engineering / Revista Iberoamericana de Engenharia Industrial / Revista Iberoamericana de Ingeniera Industrial Peridico da rea de Engenharia Industrial e reas correlatas Editor responsvel: Nelson Casarotto Filho, Prof. Dr. Organizao responsvel: Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Processo de avaliao de artigos por pares Periodicidade: Semestral Florianpolis, SC, vol.1, n 2, p. 61-75, dez. 2009 ISSN 2175-8018 Artigo recebido em 20/11/2009 e aceito para publicao em 27/11/2009

    OPERADORES DE CALDEIRA LENHA E CARGA DE TRABALHO

    OPERATORS OF FIREWOOD KETTLE AND WORKLOAD

    Eduarda Tirelli Hennig* Engenheira de Produo e-mail: [email protected]

    Mnica Peruchi* Engenheira de Produo e-mail: [email protected]

    Lvia Rodrigues da Rosa* Mestranda em Engenharia de Produo e-mail: [email protected]

    Prof. Fernando Gonalves Amaral Doutor em Ergonomia e-mail: [email protected]

    *Universidade Federal do Rio Grande do Sul Programa de Ps-graduao em Engenharia de Produo

    Laboratrio de Otimizao de Produtos Processos Av. Osvaldo Aranha, 99 5 andar CEP: 90035-190 Porto Alegre RS, Brasil

    RESUMO: Este artigo apresenta o estudo da anlise ergonmica do trabalho na operao de caldeira lenha. O trabalho pesado foi analisado de forma qualitativa e quantitativa, atravs de documentos, observao direta, entrevistas, avaliaes de problemas posturais e medio da freqncia cardaca. Os resultados mostraram que as leses musculares e os acidentes de trabalho esto diretamente relacionados com o tempo de trabalho do operador e com a idade do mesmo. Alm disso, devido aos movimentos necessrios para a realizao da atividade, o lado direito o que apresenta maiores queixas de dores, independentemente da lateralidade do operador. As medies de frequncia cardaca indicaram que o trabalho apresenta carga de regular a alta, conforme as condies fsicas do operador. Treinamentos e alteraes no posto de trabalho so sugeridos preliminarmente para a melhoria das condies de trabalho.

    Palavras-chave: Ergonomia. Carga de Trabalho. Caldeira lenha.

    ABSTRACT: This paper presents an ergonomics work analysis study on firewood kettle operation. The workload was analyzed in qualitative and quantitative forms, by documents, direct observation, interviews, postural analysis and heart frequency. The results showed that musculoskeletal disorders and work accidents are related to the working time and operator

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    age. Besides, considering the movements performed to realize the activity, the major pain complaints concerns the right side independent to the dominant hand. Heart frequency measurements indicate a medium to high workload according to the physical conditions. Training and workstation changes are firstly suggested to improve work conditions.

    Keywords: Ergonomics. Workload. Firewood kettle.

    1. INTRODUO A ergonomia representa um campo fundamental para a melhoria das condies de

    trabalho nas mais diversas atividades profissionais, proporcionando conforto e segurana para o trabalhador e aumentando sua produtividade (SANTOS, 1997). As principais intervenes ergonmicas ocorrem nas questes relativas carga fsica de trabalho e ao trabalho pesado. Segundo Kroemer e Grandjean (2005), o trabalho pesado aquele que envolve o emprego de grande esforo fsico, consumindo muita energia, e fazendo grandes exigncias ao sistema cardiocirculatrio e pulmonar. Assim, uma das formas de avaliar a carga de trabalho atravs da avaliao da frequncia cardaca, j que essa alterada pela postura de trabalho, pelas condies fsicas da pessoa, pelo ambiente em que realizado o trabalho e pelo trabalho fsico muscular, o que acaba por reduzir a capacidade de trabalho (GUIMARES et al., 2003).

    A mecanizao hoje em dia vem reduzindo as demandas de fora do trabalhador em muitas empresas (KROEMER; GRANDJEAN, 2005). Entretanto, o abastecimento de lenha em caldeiras ainda realizado manualmente em muitas indstrias, o que envolve o carregamento de toras, que podem chegar a pesar mais de 50 kg. Devido ao trabalho pesado, trabalhadores desse setor apresentam frequentemente queixas de dores no corpo, principalmente nas costas. Neste contexto, segundo Kroemer e Grandjean (2005), os problemas de coluna, alm de serem dolorosos e reduzirem a mobilidade e vitalidade de uma pessoa, podem acarretar em ausncia no trabalho, sendo tambm uma das causas mais importantes de invalidez prematura na atualidade.

    Alm da submisso do operador a trabalhos pesados, outros riscos, como superaquecimento e exploses, esto associados operao de caldeira, visto que esses equipamentos so de vasos de presso. Assim, so necessrias boas condies de operao e conservao (ARAUJO, 1980). Ainda se deve considerar que, sendo uma mquina que normalmente opera 24 horas por dia, qualquer deficincia na operao reduzir a eficincia, acarretando prejuzos. devido a presena desses riscos que, no Brasil, a Norma Regulamentadora (NR) de nmero 13, da Portaria MTB n. 3.214 de 1978 (Brasil, 1995) trata das normas de segurana na operao de caldeiras e vasos de presso. Esta NR exige que os

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    operadores de caldeira recebam treinamento de segurana na operao, com currculo mnimo contemplando assuntos como: noes de grandezas fsicas e unidades; caldeiras - consideraes gerais; operao de caldeiras; tratamento de gua e manuteno de caldeiras; preveno contra exploses e outros riscos; legislao e normalizao.

    O objetivo deste artigo realizar uma anlise ergonmica do trabalho no setor de caldeira de uma empresa fabricante de papel, visando a realizao de melhorias. Para isso, necessrio avaliar as condies de trabalho utilizando dados no apenas qualitativos, como tambm quantitativos, para criar elementos de convencimento da gerncia em relao mudana (GUIMARES et al., 2003). A seguir, encontram-se a apresentao do referencial terico sobre trabalho pesado e modelos de medio de carga de fsica. Posteriormente, so descritos os procedimentos metodolgicos utilizados, bem como a empresa analisada e as tarefas envolvidas no posto de trabalho. Aps, so apresentados os dados levantados e os resultados analisados. Por fim, o artigo traz as concluses obtidas da pesquisa.

    2. TRABALHO FSICO Neste item so abordados assuntos sobre carga de trabalho fsico e modelos de medio

    do trabalho pesado.

    2.1 A carga de trabalho fsico Segundo Rio e Pires (2001, p. 194), a carga de trabalho, num sentido mais amplo, pode

    ser definida como a quantidade de exigncias que so impostas sobre as pessoas, a partir do seu trabalho. A carga de trabalho, alm de ser refletida pelo aumento do consumo de calorias, est tambm relacionada com nmero de msculos envolvidos e com o grau de exigncia de trabalho esttico da musculatura (KROEMER; GRANDJEAN, 2005). Para os autores, com um consumo igual de energia, um trabalho mais pesado quando envolve poucos msculos do que quando o mesmo trabalho realizado por muitos msculos.

    Para Iida (2005), o manuseio de cargas tem grande responsabilidade nos traumas musculares nos trabalhadores. Dul e Weerdmeester (2004) afirmam que o levantamento de cargas uma das maiores causas de dores nas costas nos trabalhadores, tambm conhecido como lombalgias. Bridger apud Iida (2005) confirmam essa afirmao atravs de uma pesquisa que comprova que o levantamento de cargas causa aproximadamente 60% dos problemas musculares nos trabalhadores. Alm da carga sobre os msculos, o desgaste da

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    coluna bastante grave, especialmente nos discos intervertebrais da regio lombar (KROEMER; GRANDJEAN, 2005).

    Devido a esses grandes esforos, Iida (2005), Dul e Weerdmeester (2004) recomendam para o levantamento de cargas algumas prticas como: manter as costas retas usando a musculatura das pernas; manter a carga prxima do corpo; a carga deve estar a uma altura intermediria para o trabalhador no ter que se abaixar nem se esticar; o deslocamento vertical deve ser pequeno; o tronco no pode ser torcido durante o levantamento; o caminho deve estar livre de obstculos; se possvel, a carga deve ter alas ou encaixe para os dedos, entre outros.

    Quando a carga muito pesada, aconselhvel manipul-la entre duas ou mais pessoas. Alm disso, ambos os autores afirmam que a capacidade de carga varia de pessoa para pessoa. Assim, deve-se respeitar o ritmo de trabalho do prprio trabalhador, intercalando os levantamentos manuais de cargas com outras atividades leves, e incluindo pequenas pausas durante o trabalho. Rio e Pires (2001), a melhor maneira de evitar lombalgias ainda a preveno. Assim, deve-se diminuir as cargas levantadas pelos trabalhadores, reduzindo as foras aplicadas sobre a coluna e diminuindo os microtraumas cumulativos.

    Iida (2005) tambm afirma que o transporte de carga provoca sobrecarga fisiolgica nos msculos da coluna e membros inferiores, alm de o contato entre a carga e o corpo poder causar estresse postural. Assim, Iida (2005), Dul e Weerdmeester (2004) recomendam o uso de carrinhos com rodas apropriadas, de preferncia grandes e largas, sendo ao menos duas delas giratrias, para se poder realizar uma boa manobra. Os carrinhos tambm devem ter pegas em formas de barras, de modo que as duas mos possam ser utilizadas para empurr-los ou pux-los.

    A fadiga outra consequncia da sobrecarga derivada de trabalho fsico pesado, como, por exemplo, sobrecarga muscular pelo carregamento de cargas (RIO; PIRES, 2001; KROEMER; GRANDJEAN, 2005; IIDA, 2005). Rio e Pires (2001, p. 65) conceituam a fadiga como diminuio reversvel da capacidade funcional de um rgo ou sistema a partir do seu uso acima de certos limites. Assim, a fadiga pode estar relacionada tambm com rudo, vibraes, temperatura ou iluminao inadequada do ambiente (IIDA, 2005). A sensao de cansao provocado pela fadiga generalizada est entre as principais causas de perda de produtividade (IIDA, 2005). Dessa forma, o autor aconselha pausas na jornada de trabalho para esse tipo de exposio, sendo pausas de 10 minutos a cada hora de trabalho suficientes para recuperar a fadiga.

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    2.2 Modelos de avaliao do trabalho pesado Na literatura, so apresentados diversos modelos para a avaliao do trabalho pesado.

    Entre os principais esto o questionrio nrdico, o diagrama de reas dolorosas, e a avaliao da frequncia cardaca.

    O questionrio nrdico consiste em um desenho dividindo o corpo humano em nove partes (pescoo, ombros, cotovelos, punhos e mos, coluna dorsal, coluna lombar, quadril ou coxas, joelhos, tornozelos ou ps), onde os trabalhadores devem responder sim ou no para trs situaes envolvendo essas partes: a ocorrncia de algum problema nos ltimos sete dias; a ocorrncia de algum problema nos ltimos doze meses; e, se houve a necessidade do trabalhador deixar o trabalho nos ltimos doze meses devido ao problema. Esse questionrio vlido quando se quer fazer um levantamento abrangente, rpido e de baixo custo, podendo ser utilizado para se fazer um levantamento inicial das situaes que requerem anlises mais profundas e medidas corretivas (IIDA, 2005).

    J no diagrama das reas dolorosas, o corpo humano dividido em vinte e quatro segmentos, onde os trabalhadores no final de uma jornada de trabalho devem apontar as regies onde sentem dores. A seguir, os mesmos devem avaliar subjetivamente o grau de desconforto que sentem em cada um dos segmentos, atravs de uma escala de zero a sete, que varia de sem desconforto at extremamente desconfortvel. Desta forma, pode-se identificar os pontos que merecem uma maior ateno para melhorar as condies do trabalho fsico.

    Outra forma de avaliar o trabalho pesado atravs da avaliao da frequncia cardaca, que considera o dispndio de energia necessrio para a realizao do trabalho (LAVILLE, 1977; RIO; PIRES, 2001; KROEMER; GRANDJEAN, 2005). Esse mtodo de fcil aferio e os conhecimentos a seu respeito tornam-o muito privilegiado (LAVILLE, 1977).

    Segundo Kroemer e Grandjean (2005), Rio e Pires (2001) e Laville (1977), existe uma relao linear entre a intensidade do trabalho muscular geral dinmico e a frequncia cardaca. Assim, estudos revelam que no incio do trabalho a freqncia cardaca vai aumentando progressivamente, sendo que quando o trabalho moderado, a frequncia rapidamente se torna estvel, enquanto que, quando o trabalho intenso, o estado estvel no aparece, e a frequncia cardaca continua aumentando at o esgotamento de trabalhador, com o trmino da atividade.

    Mller apud Kroemer e Grandjean (2005) prope algumas definies com relao s escalas de frequncia cardacas. Pulso de repouso a mdia da frequncia cardaca no

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    momento anterior ao incio do trabalho, estando o trabalhador na mesma posio de trabalho, por exemplo, de p. Pulso durante o trabalho a mdia de batimentos cardacos enquanto realizado o trabalho. E, finalmente, pulso de trabalho a diferena entre pulso durante o trabalho e pulso de repouso. Dessa forma, o limite mximo de trabalho contnuo durante oito horas seria atingir 30 batimentos por minuto de pulso de trabalho.

    Outro fator que deve ser considerado o calor. Este indica que o aumento da frequncia cardaca relacionado com o aumento da carga de trabalho maior quanto mais quente for o ambiente e menos msculos estiverem envolvidos. Neste caso, o corao, alm de ter que bombear sangue para os msculos, tambm ser responsvel em aumentar o bombeamento para transportar o calor do interior do corpo para a pele (KROEMER; GRANDJEAN, 2005). A considerao desse fator bastante relevante para o foco deste artigo, por se tratar da operao de caldeiras, que uma atividade inserida em um ambiente de temperaturas elevadas.

    3. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS Os procedimentos metodolgicos tiveram como base a anlise ergonmica do trabalho

    aplicada no setor de caldeira, visando a anlise aprofundada de um posto de trabalho. Desta forma, o estudo envolveu cinco etapas: anlise da demanda; anlise da tarefa; anlise da atividade; diagnstico e recomendaes (GURIN et al., 2001 apud IIDA, 2005).

    3.1 Anlise da demanda Nesta primeira etapa realizou-se uma anlise documental, atravs do PPRA (Programa

    de Preveno de Riscos Ambientais) da empresa. Desta forma, verificaram-se as condies ambientais referentes a calor, rudo, iluminao e contato com produtos qumicos. Alm disso, nesta etapa, realizou-se uma entrevista informal com a tcnica de segurana da empresa e os funcionrios da caldeira, a fim de levantar os principais problemas e queixas decorrentes da atividade.

    3.2 Anlise da tarefa A anlise da tarefa foi realizada atravs da observao in loco, das informaes

    oferecidas pela tcnica de segurana e pelos funcionrios da caldeira.

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    3.3 Anlise das atividades Para a anlise das atividades foram realizadas observaes diretas, filmagens e

    entrevistas com os operadores. Buscou-se identificar, tambm, o perfil dos mesmos, sua satisfao com o trabalho realizado, as principais queixas ou problemas presentes na atividade.

    3.4 Diagnstico O diagnstico das demandas fsicas do trabalho efetuado foi realizado de duas formas:

    pela avaliao dos problemas posturais e pela avaliao da carga de trabalho atravs de medies da frequncia cardaca. De outra forma, a avaliao dos problemas posturais teve como base as metodologias do diagrama de reas dolorosas e o questionrio nrdico para levantamento dos problemas msculo-esquelticos (IIDA, 2005). A partir dessas metodologias, desenvolveu-se um questionrio especfico, que foi aplicado aos oito funcionrios da caldeira (Anexo I).

    Paralelamente, foram realizadas medies de batimentos cardacos para avaliao da carga de trabalho. As medies foram realizadas com um monitor cardaco Polar com cinta transmissora torcica com elstico posicionado na regio abaixo dos msculos peitorais. Foram selecionados dois operadores para essa avaliao com idades de 28 e 59 anos. Desta forma, buscou-se verificar a possvel influncia da idade e das caractersticas fsicas na capacidade de trabalho da atividade de caldeira. As medies da frequncia cardaca foram realizadas com tomada de dados de dois em dois minutos, buscando-se analisar um ciclo de atividade dos operadores, desde um perodo de descanso, passando pela realizao da atividade, at o retorno ao repouso. O tempo para completar esse ciclo foi por volta de trinta minutos. Como as atividades na caldeira so variadas, deixou-se que os operadores realizassem o trabalho conforme a demanda, de forma a no interferir na dinmica do trabalho, para evitar ao mximo distores da realidade.

    3.5 Recomendaes ergonmicas Atravs das anlises e do diagnstico realizados nas etapas anteriores, buscou-se indicar

    as modificaes que podem ser realizadas no setor para melhorar as condies de trabalho e minimizar a carga fsica de trabalho dos funcionrios.

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    4. RESULTADOS O setor de caldeira na empresa estudada localizado numa rea de 816 m. A cobertura

    feita de estrutura metlica em alumnio e possui ventilao elica. O piso do setor de concreto. A rea possui trs lados do permetro com aberturas laterais e o nico lado que possui parede, construdo em alvenaria a vista. A iluminao do local durante o dia natural e a noite feita por 21 (vinte e um) luminrias fluorescentes instaladas.

    A caldeira da empresa do tipo flamotubular, ou seja, os gases de combusto atravessam a caldeira pelo interior dos tubos, cedendo calor gua contida no corpo envolvendo os tubos. A caldeira possui capacidade de gerao de 10.000 kg/h de vapor, trabalhando com presso de 10 kgf/cm e o combustvel utilizado a lenha.

    De acordo com o Plano de Preveno de Riscos Ambientais (PPRA) da empresa, a incidncia de rudo no ambiente da caldeira de 81,4 dB (A), nvel no considerado insalubre para at oito horas de exposio contnua, conforme a Norma Regulamentadora de nmero 15, da Portaria MTb n. 3.214 de 1978. A incidncia de calor na caldeira tambm no considerada insalubre, j que, conforme medies, atinge 19,5 IBUTG, enquanto o limite de tolerncia de 26,6 IBUTG para trabalho contnuo em condies moderadas, segundo a NR 15. Entretanto, os funcionrios desse setor recebem adicional de 20% no salrio devido ao manuseio de lcalis custicos utilizados no tratamento da gua de caldeira. O nvel de iluminncia no ambiente tambm atendido, conforme o PPRA, pois atinge 400 Lux, enquanto o mnimo recomendado de 300 Lux, segundo a NBR 5413 (ABNT, 1992). Ainda, segundo o PPRA, os EPIs obrigatrios nesse setor so o protetor auricular, calado de segurana, luvas de agentes trmicos, culos de segurana, uniforme e avental de couro.

    Neste setor trabalham oito funcionrios, sendo todos eles do sexo masculino. Eles trabalham em turnos, cada um composto por dois funcionrios: um operador de caldeira e um auxiliar. H no total quatro turnos: manh, tarde, noite e rotativo, durante seis dias e folgam dois; sendo que o turno rotativo trabalha dois dias de manh, dois dias de tarde, dois dias noite e folga dois dias. Conforme informaes da tcnica de segurana, somente o operador da caldeira recebe o treinamento segundo a NR 13. O auxiliar deve ser instrudo pelo seu colega de trabalho, quando admitido na empresa.

    A funo principal realizada pelos funcionrios da caldeira consiste em abastecer a caldeira com lenha. O fluxo das tarefas realizadas pode ser representado pelo esquema da Figura 1.

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    Figura 1 Fluxograma da tarefa principal Fonte: Elaborado pelos autores

    Alm do abastecimento da caldeira, o operador da caldeira e seu auxiliar so responsveis tambm pelo preenchimento de planilhas de controle; realizar a descarga de fundo e de nvel da caldeira; preparar produtos qumicos para o tratamento da gua; acionar e desacionar motores; abrir e fechar vlvulas; e, finalmente, realizar a limpeza da fornalha e da caldeira como um todo. O trabalho de alimentao da caldeira envolve muito esforo fsico por parte dos trabalhadores, pois estes tm que levantar toras de diferentes pesos. Alm disso, como as toras esto armazenadas em diferentes alturas, a postura do trabalhador acaba por ficar prejudicada, pois ele tem de flexionar o tronco muitas vezes ou pegar lenha acima da altura dos ombros.

    Durante o perodo de realizao deste estudo, um dos funcionrios com o cargo de auxiliar no setor estava afastado, devido a uma queimadura no tornozelo ocorrida durante a operao de limpeza da caldeira. Conforme a empresa, o funcionrio se queimou ao entrar em contato com gua aquecida misturada com cinzas, que tem um efeito custico quando em contato com a pele. Segundo informaes da tcnica de segurana, o funcionrio deveria estar usando botas de cano longo durante essa atividade, porm no seguiu essa recomendao e, consequentemente, com a utilizao de botas de cano curto, a gua infiltrou-se na perna, causando o dano. Devido a esse afastamento, esse trabalho foi realizado somente com os sete funcionrios da caldeira ativos durante o perodo do estudo.

    Atravs das entrevistas com os operadores, constatou-se que a atividade diria causa algias disseminadas pelo corpo, devido ao carregamento excessivo de peso. Isso pode ser melhor verificado atravs da anlise quantitativa da pesquisa. A amostra estudada em tal anlise est caracterizada na Tabela 1.

    Tabela 1 Caracterizao da amostra por funo: relao com a lateralidade, mdia de idade, tempo de servio na caldeira e afastamento da atividade.

    Operador 4 2 2 49,25 5,5 2Auxiliar 3 2 1 38 0,8 1

    Canhoto

    Lateralidade

    Funo

    Mdia de tempo de servio na cadeira

    (anos)

    Mdia de idade (anos)

    Esteve afastado desde que realiza atividade no

    setor de caldeiraDestro

    Fonte: Elaborado pelos autores

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    Ao analisar as respostas sobre a freqncia de dores no corpo, pde-se perceber que estas estavam diretamente relacionadas com a idade do funcionrio e com o tempo de trabalho no setor de caldeira. As medianas das respostas obtidas por parte do corpo podem ser observadas nas Figuras 2 e 3.

    1,5 11,5 2,5 1 11,5 1

    2 11,5 2 1 11,5 11,5 2 1 1

    1,5 1,5 1 1

    1,5 1 1 1

    Abaixo de 40 anosAcima de 40 anos

    Figura 2 Medianas das frequncias de dores relacionada a idade do funcionrio Fonte: Elaborado pelos autores

    1 12 2 1 2

    1,5 12 1

    1,5 2 1 11,5 11,5 2 1 1

    2 2 1 1

    1,5 1 1 1

    Mais de 1 ano e 6 meses Menos de 1 ano e 6 meses

    Figura 3 Medianas das frequncias de dores relacionado com o tempo de trabalho na caldeira Fonte: Elaborado pelos autores

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    Como se pode observar nas Figuras 2 e 3, o lado que mais apresenta algias o direito. Ao se correlacionar com a lateralidade do funcionrio verificou-se que para destros e canhotos o lado direito sobrecarregado. Alm disso, pode-se observar que o carregamento exige um esforo do corpo como um todo, sobrecarregando especialmente o punho direito. Atravs da anlise dos questionrios, tambm se pode verificar que muitos operadores j estiverem afastados do trabalho devido a fraturas nos dedos dos ps e das mos por toras terem cado sobre eles. Isso ocorre devido s altas pilhas de lenha, j que para diminuir a altura das pilhas, os funcionrios empurram uma tora contra s outras a fim de escorregar as mais altas para alturas mais baixas. Esse procedimento pode acabar por derrubar algumas toras para fora da pilha.

    Quanto s medies de freqncia cardaca, estas foram realizadas nos operadores de 28 anos e 59 anos, conforme a Tabela 2.

    Tabela 2 Medies de frequncia cardaca

    Tempo (min) BPM* Atividade

    Tempo (min) BPM Atividade

    0 79 Parado de p 0 87 Parado de p2 88 Parado de p 2 100 Caminhando4 109 Carregando a fornalha 4 112 Caminhando6 111 Carregando a fornalha 6 141 Carregando fornalha8 104 Carregando a fornalha 8 119 Atendendo telefone10 104 Carregando a fornalha 10 145 Carregando fornalha12 108 Carregando a fornalha 12 111 Conversando de p14 118 Carregando a fornalha 14 101 Conversando de p16 109 Carregando a fornalha 16 97 Conversando de p18 112 Carregando a fornalha 18 109 Puxando carrinho vazio20 109 Carregando a fornalha 20 138 Carregando carrinho22 121 Carregando a fornalha 22 147 Carregando carrinho24 116 Carregando a fornalha 24 131 Empurrando carrinho cheio26 111 Carregando a fornalha 26 149 Carregando fornalha28 93 Preenchendo planilha. 28 149 Carregando fornalha30 76 Sentado, lendo jornal. 30 124 Sentando descansando

    32 101 Sentando descansando84 BPM* 34 92 Sentando descansando111 BPM* 36 91 Sentando descansando

    101 BPM*136 BPM**Batimentos por minuto

    Operador de 59 anos

    Mdia pulso repousoMdia pulso trabalho

    Operador de 28 anos

    Mdia pulso repousoMdia pulso trabalho

    Fonte: Elaborado pelos autores

    Como se pode observar na Tabela 2, o ciclo de atividades trabalho real dos dois operadores no coincidiu. Entretanto, como j afirmado, considerou-se relevante no interferir na demanda de trabalho dos mesmos, para se obterem resultados fiis realidade. Assim, a visualizao clara da sobreposio dos grficos da variao da frequncia cardaca no possvel. Apesar disso, apresenta-se na Figura 4 o grfico conjunto da variao da frequncia

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    cardaca, para demonstrar que o operador de 28 anos teve nveis de frequncia cardaca durante o trabalho inferiores ao operador de 59 anos.

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    120

    140

    160

    0 5 10 15 20 25 30 35 40Tempo (min.)

    BPM 59 anos

    28 anos

    Figura 4 Grfico da variao de freqncia cardaca de operadores da caldeira Fonte: Elaborado pelos autores

    Segundo as medies de frequncia cardaca, Tabela 2, o trabalho pode ser considerado de carga regular para o operador de 28 anos, enquanto para o operador de 59 anos, a carga de trabalho considerada alta (Christensen apud Kroemer e Grandjean, 2005). Considerando-se o pulso de trabalho, no operador de 59 anos obteve-se 35 pulsos, enquanto no operador de 28 anos registrou-se 27 pulsos. Assim, para o operador mais velho, a carga mxima de trabalho est acima do limite aceitvel, enquanto para o operador mais novo, a carga est dentro deste nvel. Alm disso, nota-se que o operador mais velho descansa um maior nmero de vezes do que o operador mais novo durante a mesma tarefa (explicitado na Tabela 2 por conversando de p e sentado descansando).

    Como melhorias propostas para reduzir a demanda de carga fsica para os trabalhadores desse setor sugere-se que sejam adotados carrinhos com molas na base, que possibilitem a manuteno de uma altura mais ou menos constante para a retirada das toras. Quando o carrinho estivesse cheio, sua base, devido ao peso das toras, ficaria em uma altura mais baixa, e quando fossem sendo retiradas as toras a base fosse ficando mais alta atravs da movimentao das molas, fazendo com que o nvel de retirada no se alterasse.

    Alm disso, deve-se analisar a possibilidade de automatizar a alimentao da lenha na fornalha, atravs da utilizao de esteiras rolantes para o transporte das toras. Caso no seja possvel essa automatizao, refora-se a necessidade de que os funcionrios recebam treinamento para realizar as atividades com posturas corretas, minimizando o impacto da

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    atividade sobre o seu corpo. Para tanto, salienta-se a necessidade que os operadores se auxiliem mutuamente quando houver a necessidade carregar toras grandes. Alm disso, sugere-se a programao de pausas peridicas e a realizao de atividades intercaladas.

    5. CONCLUSES Este trabalho teve o objetivo de realizar uma anlise ergonmica do trabalho no setor de

    caldeira a lenha de uma empresa do setor industrial localizado no Estado do Rio Grande do Sul, com foco na anlise da carga fsica da atividade. Para tanto, os procedimentos metodolgicos consistiram na anlise documental, entrevistas, filmagens, avaliao de problemas posturais e medies de frequncia cardaca.

    Os resultados demonstraram que o tempo de servio do operador na atividade e sua idade aumentam as leses musculares e os acidentes de trabalho. Alm disso, independentemente da lateralidade do operador, o lado direito o que apresenta maiores queixas de dores, o que se deve, possivelmente, a maior utilizao desse lado no trabalho realizado. Com a anlise de frequncia cardaca foi possvel verificar que para o trabalhador de 59 anos a carga mxima de trabalho est acima da aceitvel, enquanto para o operador de 28 anos ela considerada dentro do limite aceitvel.

    Assim, a anlise ergonmica do trabalho no setor de caldeira da empresa estudada possibilitou a visualizao das penosas condies de trabalho nesse tipo de atividade. Como melhorias, salienta-se a importncia da realizao de treinamento consistente com esses trabalhadores para instru-los das posturas corretas durante o trabalho. Em relao s melhorias de cunho estrutural, prope-se a utilizao de carrinhos de molas para nivelar as alturas de retiradas das toras de lenha para carregamento da fornalha. Tambm se sugere que seja analisada a possibilidade de automatizar o processo de carregamento da fornalha, atravs da utilizao de esteiras rolantes.

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    Anexo I - Questionrio de avaliao dos problemas posturais.