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Rua das Mercês, 8 9000-420 – Funchal Telef (+351291)214970 Fax (+351291)223002 Email: [email protected] [email protected] http://www.madeira-edu.pt/ceha/ VIEIRA, Alberto (1997), S. Vicente- um século de vida municipal(1868-1974), COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto (1997), S. Vicente- um século de vida municipal(1868-1974), Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/1997-av- Svicente.pdf, data da visita: / / RECOMENDAÇÕES O utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras, usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprir escrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática, de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

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COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO:

VIEIRA, Alberto (1997), S. Vicente- um século de vida municipal(1868-1974), Funchal, CEHA-BibliotecaDigital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/1997-av-Svicente.pdf, data da visita: / /

RECOMENDAÇÕESO utilizador pode usar os livros digitais aqui apresentados como fonte das suas próprias obras,usando a norma de referência acima apresentada, assumindo as responsabilidades inerentes ao

rigoroso respeito pelas normas do Direito de Autor. O utilizador obriga-se, ainda, a cumprirescrupulosamente a legislação aplicável, nomeadamente, em matéria de criminalidade informática,de direitos de propriedade intelectual e de direitos de propriedade industrial, sendo exclusivamente

responsável pela infracção aos comandos aplicáveis.

S. VICENTE

UM SÉCULO DE VIDA MUNICIPAL

(1868-1874)

Região Autónoma da Madeira

S.VICENTE

UM SÉCULO DE VIDA MUNICIPAL (1868-1874)

Secretaria Regional do Turismo e Cultura

Centro de Estudos de História do Atlântico

TÍTULO S.VICENTE- UM SÉCULO DE VIDA MUNICIPAL(1868-1874) COLECÇÃO: Memórias 15 AUTOR Alberto Vieira FOTOGRAFIAS Museu de Photographia Vicentes: colecção Perestrelos e Vicentes, Duarte Gomes EDIÇÃO Secretaria Regional do Turismo e Cultura Centro de Estudos de História do Atlântico Rua dos Ferreiros, 165 9000-Funchal Telef.: (35191)229635 Fax.: (35191)230341 TIRAGEM: 2000 exemplares CAPA IMPRESSÃO DEPÓSITO LEGAL ISBN

INTRODUÇÃO

O Centro de Estudos de História do Atlântico, de acordo com plano estabelecido em 1989, decidiu avançar com um projecto de investigação sobre a História dos Municípios da Madeira. A ideia era envolver a sociedade civil e política com o passado histórico no sentido da valorização do último com benefício evidente para todos. Entretanto, foram muitos os entraves que se colocaram por elementos estranhos à sua prossecução e que fizeram surgir algumas falsas imitações. Hoje, passados mais de oito anos, não podemos considerar que o projecto tenha sido um logro, como afirmam certos sectores menos informadores, isto é, os profetas da desgraça e do proveito próprio. Senão vejamos. Em 1994, aproveitando-se a comemoração dos quatrocentos e cinquenta anos da criação do concelho, publicou-se um volume, que se apresentou já como uma amostra do projecto em marcha. No ano passado surgiu novo livro: Roteiro para uma visita e descoberta do concelho de S. Vicente. E fazemos todo o nosso esforço para que mais este seja dado à luz do dia. Afinal, a ambição de apenas um volume suplantou as nossas próprias expectativas e eis-nos com três e a esperança de que outros mais textos se seguirão. A história nunca deve ser considerada como um processo acabado, mas algo em permanente construção. Afinal, a síntese em História não se faz do nada, pois é a partir dos estudos parcelares que se torna possível o "puzzle" tão difícil de reconstrução do nosso discurso histórico. S.Vicente um século de vida Municipal (1868-1974) é um projecto inovador e ambicioso. É a primeira vez que se faz uma abordagem da evolução do município num dos períodos mais recentes e conturbados da nossa História. São mais de cem anos recheados de múltiplos acontecimentos que marcaram de forma evidente a contemporaneidade. Mas será que o eco disso se fez sentir nas encostas perdidas do norte da ilha ? Os vicentinos alhearam-se da política e agarraram-se à terra ou, pelo contrário, souberam fazer valer os seus interesses nos momentos de maior dificuldade ? Os tumultos de 1868 ou 1924 deverão ser entendidos como manifestações avulsas de um povo desordeiro ou antes a expressão de quem sabe o quer ? A estas e muitas mais questões, que pululam na mente de muitos de nós, espectadores presenciais ou seus conhecedores por memórias orais e escritas. Aqui, a História faz-se com acontecimentos ainda recentes. O vinte e cinco de Abril de 1974 inaugurou uma nova realidade que ainda é muito cedo para passar às páginas da memória histórica. São inúmeros os protagonistas vivos e a memória histórica ainda não amadureceu. Mas será que a sua experiência, por mais lúcida que seja, permitirá entender este processo ?. Quantas vezes nos envolvemos numa situação e fechamos olhos a tudo o que nos cerca. Certamente que a posição de afastamento poderá muitas vezes favorecer uma leitura desapaixonada e desencravar outra realidade ou então uma diferente visão.

Para nós modestos intervenientes neste processo desde a década de cinquenta, só a agora nos foi possível entender alguns episódios que marcaram de forma indelével a nossa infância. A descoberta do automóvel, as idas constantes à vila, as primeiras passagens pelo banco da escola nas Casas Novas, são elementos desconexos do puzzle da nossa memória que agora se compõem de forma perfeita. É a oportunidade de conciliação com o nosso passado e de catarse. Para muitos dos protagonistas que encontrarem o seu nome inscrito em qualquer das situações que dão corpo a este volume será a oportunidade de rememorar épocas passadas e esperámos que seja apenas isso que os mova na interpretação das nossas palavras. Não fazemos da escrita da História um tribunal para julgar quem quer seja. Move-nos apenas o empenho de trazer à memória do presente o passado e através das mútuas cambiantes e de tentar encadear um discurso inteligível. Aos poucos protagonistas vivos e aos muitos já falecidos aqui fica a nossa justa homenagem pela disponibilidade para o serviço público e o incansável labor de defesa e promoção do concelho. A evolução, os avanços e recuos do progresso são fruto deles e a nossa melhor homenagem é continuar a lutar com o mesmo espírito para que possamos merecer o mesmo testemunho dos vindouros. O futuro o dirá… São cinquenta e oito anos de conturbada vida política seguidos de outros quarenta e oito de regime ditatorial, definido pela omnipresença de um só grupo político, de um único modo de ver e moldar a realidade política. No total são cento e seis anos da nossa História Contemporânea recente. A razão de ter como ponto de partida o ano de 1868 prende-se com o facto de neste ano terem ocorrido alguns acontecimentos que ficaram a marcar de forma indelével a História do Concelho. A 12 de Abril de 1868 ocorreram tumultos na Vila de S. Vicente que levaram à total destruição de todos os documentos existentes no Arquivo Municipal, apagando-se desta forma a memória histórica do concelho. Face a esta situação torna-se difícil reconstituir o passado histórico do concelho entre 1744 e 1868. Os dados são avulsos e devem ser encontrados, qual agulha em palheiro, nos acervos documentais dos concelhos vizinhos, ou nos referentes aos fundos dos governadores gerais ou civis. Traçar o quotidiano do município através das actas da vereação é um projecto arriscado, pois sujeitamo-nos ao empenho ou não daqueles que de forma directa actuaram para fazer passar aos vindouros uma certa realidade. Nem tudo o que acontece no concelho tem debate obrigatório na sessão camarária e muitas das questões mais pertinentes dissolvem-se no diálogo quotidiano não institucional. Esse é apenas privilégio de memorial oral, hoje possivelmente reconstituído através da chamada História Oral. Analisados os cento e seis anos de vida municipal conclui-se que esta realidade dependerá sempre dos intervenientes,

mas de modo especial ao presidente, que dirige os trabalhos, e ao escrivão ou outro qualquer a quem seja acometida a tarefa de redigir as actas. São eles o espelho duma realidade que hoje apenas se mantêm na memória de alguns. O discurso indirecto nem sempre obedece aos requisitos e exigências do historiador. A opinião, o debate são falsas realidades nesta tribuna que deveria viver disso mesmo. Perante nós desfilam páginas e páginas de sessões, ou de transcrição sumária de petições, ofícios e requerimentos. A unanimidade parece ser a palavra de ordem nos últimos cinquenta anos. Para colmatar algumas das lacunas evidentes que prejudicam a definição da estrutura institucional na evolução e quotidiano concelhio confrontou-se as actas camarárias com outros dados conexos. Foi nossa intenção reconstituir as ambiências que dominaram o passado recente da História do Concelho. A intervenção do concelho é nesta altura cada vez mais abrangente e é isso que reflectem as actas. Pela mesa das sessões, por intervenção directa dos munícipes ou dos vereadores, passam não só os problemas do dia a dia do concelho, mas também as ambições de um progressivo desenvolvimento do concelho. Aqui olha-se para o presente mas também para o futuro. São os projectos de uma adequada rede viária, de instalações adequadas para as repartições públicas e da progressiva valorização das gentes com um plano adequado de escolas. A realidade de hoje evidencia que a luta não foi inglória. O progresso sempre presente na mira da vida municipal é hoje algo evidente porque os nossos avoengos lutaram por isso nos últimos cem anos. Os caminhos do presente delineiam-se no passado, mas os do futuro tem por palco o momento presente. Neste contexto é a rede viária que ontem como hoje traçará o rumo. Em 1914 a ligação do norte ao sul abriu uma nova era na História do Norte da Ilha. Agora que se avizinham novos projectos será de ambicionar por uma nova mudança, a esperança dos políticos, mas acima de tudo das populações. A concretização deste projecto só foi possível com a pronta adesão da actual vereação do Concelho de S. Vicente, primeiro sob a presidência de Gabriel Drumond, o primeiro presidente da autarquia na presente era, e hoje do Prof. Duarte Mendes, que nos facultaram de forma aberta e sem qualquer limite o acesso ao arquivo municipal. A todos o nosso sincero agradecimento e retribuição através destas páginas, que esperamos sejam um dado mais no fortalecimento da instituição municipal no final de século.

O MUNICIPIO

A criação do município em S. Vicente no ano de 1744 foi o princípio de uma nova realidade institucional na encosta Norte da ilha. A sua afirmação surge de acordo com a capacidade de intervenção dos munícipes e de adaptação às mudanças que a conjuntura política definiram para as instituições que lhe serviram de suporte. Para este período de pouco mais de um século são evidentes múltiplas alterações de fundo na estrutura do poder local e, por consequência, a necessidade de acompanhar o processo de mudança. Os códigos administrativos, as constituições são a sua expressão e denotam inacabada e insatisfeita opção de colocar as instituições ao serviço da causa geral ou dos interesses de alguns. As leis estabelecem as normativas mas o homem que as praticam molda-as em benefício próprio ou colectivo. Daqui resulta a necessidade de acompanhar estes agentes presentes ou encobertos na estrutura municipal e o dia à dia desta vivência para depois podermos defini-la. A Vereação, não obstante as vicissitudes a que a sua alçada esteve sujeita, é o princípio de tudo. Os vereadores, por sua vez, são os verdadeiros protagonistas dos múltiplos acontecimentos que definem o esqueleto da História municipal. Não tenhamos ilusões. Nem tudo o que acontece tem passagem obrigatória pela sala das sessões e tão pouco as actas podem ser consideradas o semanário das vivências do concelho. Reconstituir a realidade apenas pelo actas é submeter o passado aos crivos das contingências institucionais e do empenho individual do pequeno grupo que tem assento no concelho. Mesmo assim são uma das poucas vias possíveis e em alguns casos a única.

CRIAÇÃO E EVOLUÇÃO S. Vicente foi, desde o século XV, o principal e mais importante núcleo de povoamento do norte da Madeira, que, por isso mesmo, teve direito a capelania, estabelecida de acordo com o número de moradores. Em face desta evidência, só a pertinácia das autoridades municipais machiquenses conseguiu iludir a coroa das potencialidades da freguesia nortenha para assumir a condição de vila-sede de um novo município. O progresso social do município é acompanhado, inevitavelmente, pela valorização sócio-económica da área. A criação de uma vila na vertente norte era uma necessidade cada vez mais premente em face do desenvolvimento económico e social que ela vinha adquirindo com o surto da economia viti-vinicola. A dependência em termos administrativos da sede da capitania em Machico prejudicava em muito os direitos das gentes que tinham necessidade de aí se deslocarem para resolver as mais diversas questões. O acesso por terra ou por mar era difícil, quando não impossível, ficando assim as populações à mercê dos caprichos dos senhores de Machico. Deste modo a reivindicação do estatuto de vila para o lugar de S. Vicente ia ao encontro das cada vez mais incessantes solicitações. Era o único meio de responsabiliza-las no governo da sua área e de motiva-las para o progresso. A partir da constituição da nova estrutura institucional a vertente norte ficou provida da necessária autonomia municipal, abrindo-se uma brecha libertadora do excessivo centralismo e opressiva governação de Machico. Nova alteração na estrutura só se tornou possível nos alvores do regime liberal com a criação em 1832 dos concelhos de Santana e Porto do Moniz. Mas, S. Vicente continuou até a actualidade como o único lugar que mereceu, no antigo regime monárquico, o estatuto de vila na vertente norte.

Após a criação do concelho por alvará régio tardou algum tempo a sua instalação. A falta de fundos impediu a rápida construção da casa da Câmara, cadeia e o Pelourinhoi. Por isso, só em 1750 deverá ter entrado em pleno funcionamento o município. Note-se que a vereação de Machico após 1744 continuou a nomear o Juiz e o alcaide do lugar. O alvará foi apresentado à vereação de Machico no dia 23 de Janeiro de 1745 pelo capitão Caetano de França, um dos destacados promotores do projectoii. Da actividade do novo município pouco se sabe uma vez que se perderam, nos tumultos populares, as actas das vereações entre 1744 e 1868. A mais antiga que se conhece surge por acaso e é datada de 3 de Março de 1775iii. Depois disso só a partir de 1868 é possível acompanhar o dia a dia do município através das actas. Fica assim comprometido o conhecimento daquilo que foram os primeiros cem anos de actividade do município. A partir da Revolução Liberal abriu-se uma nova era na administração municipal, levada a cabo com a reforma de Mouzinho da Silveira. Assim, em 1835, o território é dividido em distritos, concelhos e freguesias. Daqui resultou para a Madeira, o aparecimento de novos municípios. Desta vez, foi de novo contemplada a costa norte da ilha com a criação dos municípios de Santana e Porto Moniz. Estamos perante uma aspiração há muito tempo reclamada, como se infere do requerimento dos moradores em 1825iv. O município nortenho perdeu a alçada sobre toda a extensa costa entre Porto Moniz e S. Jorge, ficando reduzido apenas a S. Vicente, Ponta Delgada e Boaventura. No caso do Porto Moniz estamos perante uma situação passageira, uma vez que o concelho foi extinto por duas vezes (1849, 1867) sendo as freguesias do Seixal e Porto Moniz incorporadas no de S. Vicente. O mesmo sucede em 1867 com Santana, de modo que as freguesias de S. Jorge e Arco de S. Jorge retornaram por algum tempo à alçada de S. Vicente. A actual distribuição do concelho em três freguesias é o resultado das mudanças operadas na estrutura municipal a partir da reforma liberal. Tenha-se em conta que desde 1830 a freguesia deixou de ser uma forma de divisão eclesiástica para assumir uma função na divisão administrativa, com apenas um hiato de 1842 a 1878. Esta nova realidade foi conseguida em pleno com o código de 1878. De acordo com o código de 1836, o território passou a estar dividido em distritos, concelhos e freguesias. Na estrutura eclesiástica as freguesias deram lugar às paróquias. Em 1927v foi presente à câmara um abaixo-assinado dos moradores da Achada do Til, Ribeira Grande, Vargem, Loural, Saramago, Ginjas e parte das Feiteiras em que solicitavam a criação de uma nova freguesia de Nossa Senhora do Rosário, o que nunca veio a acontecer.

A VILA Não se sabe ao certo onde começou edificação da primeira Vila, resultante da determinação do alvará de 1744 que criou o concelho. É muito provável que ela tenha sido traçada na margem esquerda da Ribeira, local abrigado do olhar cobiçoso vindo do mar, onde desde o século XV se assentara a nova igreja. O sítio nunca ofereceu grande segurança aos moradores, pela braveza da vizinha ribeira na época invernal. Já em 1684 o vigário referia a situação de temor, que terá afugentado os moradores que passaram a residir na Vargem, uma vez que as cheias de 1682 haviam posto em perigo a igreja. Mesmo assim os vicentinos não abdicaram deste recanto e enquanto tardava a construção o muro de protecção os moradores da vila viviam em permanente alerta na época invernal. O temor das cheias da ribeira que terá aumentado com as aluviões do princípio do século XIX, levou os moradores da vila a procurar sitio seguro. Em 1817 o retrato da Vila marcadamente desolador: as casas estavam arruinadas sem moradores que se haviam refugiado, de novo, na Vargem, por isso, Paulo Dias de Almeida atreve-se a sugerir que deve ser este lugar a sede da freguesia e que a vila deveria ser transferida para Ponta Delgada. Mas a solução imediata estava na construção de uma muralha a oeste da ribeira de modo a evitar que galgasse as margens e atingisse a vila. A reclamação de muralha é antiga e repete-se em pleno final do século XIX com as aluviões. Perante a ineficácia das autoridades, os moradores insistem na reclamação de medidas, em momentos de aflição. A 2 e 3 de Outubro de 1895 a vila ficou inundada sendo os prejuízos elevados. A Câmara do Funchal ocorreu em 200$000 rsvi. Já em 1901vii os moradores reclamam de novo a construção da muralha que desvie o curso da ribeira pois que "em todos os invernos é ameaçada, e por vezes tem arrastado para o mar algumas propriedades particulares, e tem posto em risco a igreja parochial, os edifícios das repartições públicas e as casas que formam a povoação..." O município decidiu-se pela elaboração de um novo plano urbanístico para a vila que contemplava a sua mudança para local mais apropriado. O plano foi divulgado no Diário de Notícias do Funchal a 21 de Março de 1929 e constava de um edifício cujo custo estava avaliado em 330 contos e três arruamentos. Em 1930viii dava-se conta do apertado recinto da vila não permitia a sua expansão de modo a torná-la moderna, com a construção dos paços do concelho. A vila nova ficaria implantada no Poiso, no actual espaço de implantação da escola, sendo a planta feita por António Agostinho da Câmara. Ao empenho dos munícipes opõem-se a falta de meios. O pouco ou nenhum apoio das autoridades distritais e do governo central fez com que os planos de uma nova vila e paços do concelho não passassem de uma esperança permanentemente adiada. A grande necessidade era a construção de um edifício para os paços do concelho, onde fosse possível reunir todas as repartições dispersas em edifícios impróprios e distantes da vila. Para isso buscava-se apoio do Governo Central, o que nunca deve ter sido atendido uma vez que em 1959ix se procedeu a um plano de urbanização da Vila a cargo do arquitecto Nunes Fernandes.

Os Paços do Concelho O concelho afirma-se por alguns elementos emblemáticos que lhe dão forma institucional e capacidade jurídica. Ao selo e à bandeira, juntam-se os paços que são a sua condigna sede. Em S. Vicente esta realidade tardou até à nossa presente centúria. Desde o início que permaneceu a reivindicação. Em 1876x foi presente em vereação um projecto de planta para casa dos Paços que a Câmara pretendia construir. Passados dez anosxi a Câmara do Funchal propõe-se elaborar o projecto dos novos paços do concelho, sendo apresentado em Vereação de 8 de Agosto. Para conseguir os meios financeiros para tal, a câmara fazendo valer os seus poderes legitimados no código administrativo decidiu em 1929xii aumentar a percentagem da contribuição predial. O empenho dos munícipes em ver a autarquia instalada em edifício condigno é evidente. Na mesma data, Caetano Rodrigues de Gouveia, do Lanço, diz ter encontrado na Serra da Caldeira paus de vinhático e os serrou à sua conta. "para oferecer à Câmara afim de serem aplicados na obra da nova casa para paços do concelho". O projecto foi aprovado mas não teve execuçãoxiii. Avançando-se com o do novo tribunal, a cargo do Engº Adriano A. Trigoxiv. Em 1928 parece que a Câmara estava decidida na mudança de Vila para o novo local no Poiso, conforme deliberação de 3 Março de 1928. Os planos foram levantados pelo capitão António Agostinho da Câmara, que recebeu dos seus trabalhos 2000$00xv. Sabe-se que o largo do município deveria ocupar uma área de 604 m2xvi. Ao arquitecto Carlos Ramos compete a tarefa de projectar o edifício, "visto o projecto existente não oferecer as condições necessárias e a estética indispensável a edifícios desta natureza"xvii. A 15 de Dezembro o projecto está concluído faltando a planta do local para delinear a posição dos edifícios. Na mesma data a Câmara convidou o Dr. Fernando Mendes Esmeraldo e Horácio Vergílio de Abreu para procederem à avaliação do terreno a expropriar. No ano imediato estava em fase adiantada o projecto de expropriação, tendo-se feito a demarcação em 1933xviii. E, uma vez que os terrenos já estavam cultivados os seus proprietáriosxix obrigou-os ao pagamento de uma renda em géneros, isto é a metade da colheita "como é de costume na terra, descontando a semente dada pelos cultivadores"xx. As batatas, o trigo e a cevada que competiam à Câmara na partilha deveriam ser vendidas em hasta pública, sendo os lucros destinados à construção do novo largo do município.xxi Ainda se providenciou um empréstimo de 200 contos para a construção dos paços do concelho, mas desde 7 de Janeiro de 1939 não se ouviu mais falar de semelhante projecto. Apenas em 1966xxii a Câmara reclamava de novo pelo elevado custo da renda das instalações e a má instalação dos serviços, por isso, decidiu-se adquirir um terreno na Vila por 250 contosxxiii. O projecto dos novos paços do concelho foi entregue ao arquitecto Adolfo Brazão Vieira. Todavia, em 5 de Janeiro de 1970 pediu a rescisão do contrato que havia assinado em 8 de Agosto de 1962, por não ter sido dado andamento ao projecto pela edilidade. O mesmo refere que a área em questão era insuficiente para instalar a Câmara, Tribunal, Repartição de Finanças, Registo Civil e Predial, Delegação de Saúde, Biblioteca e Cadeia. Assumiu o encargo o arquitecto Nereus Fernandes, mas a Câmara estava ainda à procura de meios para o concretizar. Assim solicitou ao Ministério da Justiça informação sobre qual seria o apoio técnico e financeiro a conceder ao novo edifício, tendo em conta que aí seriam instalados a Conservatória do Registo Civil, Predial e Cartório Notarial. Outras repartições do estado, como era o caso da cadeia e tribunal, não ofereciam condições. As mesmas estavam em terrenos do concelho e havendo espaço contíguo proceder à sua expropriação para aí fazer-se o edifício dos paços do concelho, tribunal, repartições e cadeira. De acordo com dados da vereação bastava o dinheiro de 20 anos de renda, isto é 2.700$000

réis para o seu pagamentoxxiv. Na verdade, os encargos da Câmara com a renda de prédio para as diversas repartições eram elevados. Por outro lado a situação era de permanente mudança, sem poder encontrar-se instalações adequadas. ANO SENHORIO RENDA ANUAL

1880 Vigário 120$0001896 D. Constantina Augusta de Gouveia 120$000

1899 Maria Amélia de Sousa 120$000

1911 Maria Cândida, viúva 120$000

1920 Manuel de Sousa Júnior 120$00

1926 António Maria de França 240$00

1964 Francisco de Andrade 500$00

No contrato de arrendamento celebrado em 25 de Fevereiro de 1911 com Júlio César de Gouveia, representante de Maria Cândida, viúva, refere-se que a Câmara ocupará o 1º andar do prédio, composto de 4 quartos, 3 corredores e uma retretexxv. Em 1920 os proprietários do prédio reclamam um aumento de renda, "atendendo a carestia de vida e dos materiaes", sendo a renda aumentada para o dobroxxvi, sofrendo idêntico aumento em 7 de Dezembro de 1922, cujo contrato acabou por ser anuladoxxvii. Em 1964xxviii os proprietários alegam a falta de actualização da renda há mais de trinta anos, situando-se esta em 300$00. Em resposta a Câmara decide o aumento para 500$00. Os encargos em rendas de prédios eram elevados e condicionavam o orçamento. REPARTIÇÃO 1914 1921 1926 Açougue 7$50 Estação Telegrafo Postal 24$00 24$00 Secretaria Finanças 75$00 75$00 150$00 Oficina afilar medidas 7$50 Registo Predial e Civil 50$00 50$00 100$00 Escolas do Concelho 205$00 Paços do Concelho 60$00 60$00 120$00 TOTAL...................................... 429$00 209$00 370$00 A inexistência de instalações próprias para as repartições do estado e do município levaram à dispersão por espaços fora do recinto da Vila devido à falta de edifícios disponíveis. Assim em 1932xxix a repartição de Finanças e a Tesouraria estavam instaladas na casa do Dr. Fernando Mendes Esmeraldo na Calçada, e pretende-se mudar para as Feiteiras, que se situa a 3 Km da Vila. Neste sentido aponta-se a necessidade de construção do edifício que sirva de logradoiro a todos os serviços.

A CONFIGURAÇÃO DOS PODERES Nos dois séculos que compreende esta abordagem o poder municipal foi alvo de várias transformações, sendo de assinalar as mudanças políticas ocorridas até 1926 que demarcaram inúmeras mudanças. Desde então e com a constituição de 1933 e o código de 1940 o regime de governo municipal estabilize até que o 25 de Abril de 1974 veio provocar nova e profunda mudança na sua estrutura. No período que decorre até 1933 os corpos administrativos da Câmara, são eleitos todavia estão sob a tutela de uma figura de nomeação de confiança do governo, isto é o administrador do concelho. A partir de 1933 muda a filosofia do governo municipal. extingue-se a figura do administrador do concelho, substituído pelo presidente que passa a ser de confiança do governo, sendo de nomeação, enquanto os Vereadores são eleitos, mas afectos ao poder político. Uma das alterações mais significativas, no período que decorre até 1933, tem lugar com as república. De acordo com a lei nº 88 de 7 de Agosto de 1913 estabeleceu-se a existência em cada concelho de uma Câmara Municipal eleita definida pelo senado municipal e comissão executiva. O primeiro era uma assembleia deliberativa e tinha a obrigação de reunir duas vezes no ano, enquanto a segunda era eleito pelo senado, sendo a substituta da Vereação a quem competia acudir ao expediente. A partir de 1926 com a mudança de regime repercute-se de forma evidente no poder autárquico. Foram criadas comissões administrativas a quem foi atribuído todo o poder municipal, no qual se integrou desde 1927 o administrador do concelho. De acordo com o código de 1940 os órgãos da administração do concelho passaram a ser os seguintes: o conselho municipal, a Câmara Municipal, o Presidente. O conselho Municipal sucede ao senado municipal com funções semelhantes, de que se destacam as funções de fiscalização e de eleição dos vereadores. É o órgão representativo das diversas corporações municipais. A Câmara, por sua vez, é composta pelo presidente, vice-presidente e vereadores: os dois primeiros são de nomeação e os seguintes de eleição pelo conselho municipal. O mandato do presidente da Câmara é de quatro anos, podendo ser reconduzido por duas vezes. De acordo com o decreto-lei nº 49268, de 26 de Setembro de 1969 ao presidente é permitido delegar competências, o que acontece com o Vice-presidente que, para além de o substituir nas ausências, assume a figura do antigo administrador do concelho com funções policiais. No caso da Madeira e dos Açores o estatuto dos distritos autónomos, aprovado pelo decreto-lei nº 31095 de 31 de dezembro de 1940 define algumas normativas especificas para os concelhos e freguesias, como foi o caso das ilhas do Porto Santo e Corvo, sem alterar a filosofia de base do código de 1933.

DIVERSAS FORMAS DE EXPRESSÃO DA ESTRUTURA MUNICIPAL O período que decorreu de 1868 a 1974 é definido por múltiplas mudanças na intervenção e organização da estrutura do poder municipal. A mais evidente mudança ocorre com o código administrativo de 18 de Março de 1842xxx, conhecido como cabralista, que põe fim a uma multissecular tradição de vida municipal. Aqui a grande novidade é o aparecimento de paróquia como circunscrição civil, sendo suportada por um conselho, um administrador e o pároco da freguesia, que serve de sede. Ao nível da estrutura municipal a grande novidade está conselho municipal, cujos vogais são recrutados de acordo com o valor do pagamento da décima. Aliás, neste último aspecto inaugura-se uma nova realidade que irá perdurar por muito tempo. As eleições demarcam todos os provimentos de cargos, estando na condição de eleitores todos os maiores de 25 anos de acordo com o valor de imposto pago. Para um concelho da categoria do de S. Vicente a Vereação era composta de cinco vereadores, eleitos de dois em dois anos por uma Assembleia de eleitores. As eleições decorriam no mês de Novembro, sendo a posse conferida a 2 de Janeiro do ano imediato, após chancela do Governo Civil. Aqui dos cinco vogais eleitos um presidente e outro vice-presidente. As eleições para a assembleia do concelho tinham lugar num domingo em cada uma das freguesias, sob a superintendência dos vereadoresxxxi. Escolhia-se um juiz eleito, de paz e de junta de paróquia. Vejamos o que sucedeu em 1869: FREGUESIAS JUÍZ ELEITO JUÍZ DE PAZ JUNTA PARÓQUIA

S. Vicente Francisco Manuel de Andrade Manuel Gomes Andrade Francisco Nunes Gouveia, Francisco Joaquim de França Jacinto, Caetano António Diniz, António João Francisco de Vasconcelos

Ponta Delgada Ricardo José Freitas Senior Joaquim José de Freitas Manuel Joaquim Góis, António Joaquim de Freitas

Boaventura José Maria Curado de Vasconcelos

Manuel António de França Carvalho

Manuel João de Freitas, Alexandre António de França Carvalho, José Joaquim de Freitas Galdo, Manuel Ribeiro Andrade

Na eleição para o conselho municipal fazia-se uma lista dos cinco maiores contribuintes por ordem decrescente, tal como o estabelecia a lei de 23 de Novembro de 1859. Para o biénio de 1872/1873 foram escolhidos os seguintes:

- Os cinco maiores contribuintes: Januário José de Aguiar, João de Sousa Brazão Júnior, António de Gouveia Brazão, João Maria Curado e Vasconcelos, Manuel João de Freitas Galdo. - Substitutos: Vigário António Joaquim Mendes de Freitas, João Vicente de Andrade, João José de Sousa, António Joaquim de Canha, António Fernandes Telles da Silvaxxxii. Os substitutos tinham lugar na ausência dos efectivos ou face às incompatibilidades detectadas. Em 1870xxxiii António de Gouveia Brazão não pode assumir o cargo para que foi eleito por ser devedor à Câmara. Já em 1872xxxiv Francisco Manuel de Andrade é incompatível com a posição de fiador do arrematador das rendas da Câmara.

Os contribuintes em questão eram convocados obrigatoriamente em Dezembro por carta do administrador do concelho e caso não justificassem a sua ausência sujeitavam-se a uma pena até 40$000 réisxxxv. Feita a eleição nova ordem era dada aos escolhidos para a tomada de posse no dia dois de Janeiro do ano imediatoxxxvi

Para atribuir maior solenidade ao acto eleitoral a Câmara decidiu construir em 1878xxxvii uma urna eleitoral que lhe custou 10.000 réis. O código de 1842 foi revogado a 1 de Janeiro de 1879 dando lugar ao novo aprovado em 1878. Aqui uniformizou-se os actos eleitorais e da lista de eleitores. Por outro lado para acabar com a sua assiduidade estabelecendo que os actos eleitorais teriam uma periodicidade quadrienal, sendo renovados de dois em dois anos. O exercício das funções era gratuito e obrigatório e por isso não se tornava muito cativante para a maioria dos munícipes, sendo portanto exercido por quem tinha meios suficientes para o seu sustento. Era afinal um serviço prestado ao município sem qualquer contrapartida. Ela a existir estava fundamentalmente no prestígio que atribuía aos seus intervenientes. Com o novo código aprovado a 17 de Julho de 1886 os mandatos são trienais, sendo os candidatos ao cargo alfabetizados. São ainda estatuídas normas para a nomeação do presidente e vice-presidente, eleitos por um escrutínio secreto, em sessão presidida pelo juiz mais velho. O Administrador do concelho assume-se como o delegado do Governo sendo nomeado pelo Governador Civilxxxviii. Entretanto este código, que havia sido reformado pelo decreto de 6 de Agosto de 1892, dá lugar a outro novo aprovado por diploma de 4 de Maio de 1896. O Concelho de S. Vicente criado em 1744 englobava as freguesias do actual concelho do Porto Moniz, que lhe foram retiradas em 1835 com a criação do novo concelho. Todavia este último foi alvo de inúmeras peripécias, tendo sido extinto por três vezes (1849, 1867, 1895). A última ocorreu em 18 de Novembro de 1895 ficando sob a alçada do de S. Vicentexxxix. Os Arquivos do Município e da Repartição da Fazenda foram transferidos em Junho tendo-se gasto 28$770 rsxl. Mas a situação foi passageira uma vez que em 13 de janeiro de 1898 é restabelecido por decreto o concelho, reinstalado a 13 de Fevereiro. Foi dissolvida a Câmara Municipal de S. Vicente, ficando uma comissão municipal em exercício até novas eleiçõesxli. O acto eleitoral que lhe sucedeu deve ter sido muito conturbado uma vez que o Governador enviou seis guardas "para policiarem esta vila por occasião das eleições municipaes"xlii

Em 1908 a Câmara esteve provisoriamente suspensa. Assim, de acordo com o decreto de 12 de Dezembro de 1907, o Governador Civil nomeou a 23 de Dezembro uma comissão administrativa que ficou a gerir os negócios do concelho após um prazo muito curto, uma vez que a 15 de Fevereiro de 1908 foi restabelecida e reassumiram as funções os Vereadores da Câmara dissolvidaxliii. Em 1910 com a República a estrutura camarária será alvo de novas mudanças. A lei de 13 de Outubro de 1910 retoma o código de 1878. Aqui ganha força a autonomia municipal, acabando-se com a figura do administrador do concelho, cujas funções passam para a alçada do presidente. De acordo com a lei nº 88, de 7 de Agosto de 1913, os mandatos eram trienais, sendo os vereadores eleitos pelos cidadãos com capacidade para isso. Assinala-se uma mudança significativa na estrutura municipal. A presidência da Câmara é assegurada por um presidente, vice-presidente, secretário e vice-secretário. A Vereação deu lugar à comissão executiva composta de cinco elementos, sendo um presidente, um vice-presidente um secretário e dois vogais. Esta tinha funções deliberativas e deveria reunir-se quatro vezes no decurso do ano civil. Eis um exemplo da estrutura para o ano de 1918xliv:

Presidência Presidente - Dr. Fernando Mendes Esmeraldo Vice-Presidente - Manuel Francisco Faria Secretário - Manuel Rodrigues de Sousa Vice-Secretário - António J. de Andrade de Oliveira

Comissão executiva: Presidente - José Maria Dinis de Andrade Vice-Presidente - João Martinho de Freitas Secretário - António Eleutério Caldeira Vogais - Jacinto Agostinho de Freitas //João de Andrade Junior A presidência era nomeada pelo Governador Civil, sendo de sua confiança, deste modo face à existência de novo Governador estava aberta a possibilidade de exoneração. Foi isso que aconteceu em 1912xlv. A 4 de Abril tomou posse o novo Governador e a Presidência da Câmara solicitou a sua exoneração passados seis dias, tendo este nomeado uma nova. A eleição da comissão executiva era feita por escrutínio secreto sob a superintendência do presidentexlvi. Em 1921xlvii os cargos de presidente, vice-presidente, secretário e vice-secretário eram estabelecidos por listas de escrutínio secreto retiradas da urna. A 2 de Fevereiro de 1924 a comissão executiva presidida pelo vogal Heliodoro Hermenegildo José de Sousa apresentou a demissão do cargo, acabando aqui a sua vigência, uma vez que a 9 de Fevereiro as eleições apenas contemplam a vereação. Passados dois anos ocorre nova mudança na estrutura municipal. O decreto-lei nº 11 875 de 13 de Julho de 1926 dissolve o sistema municipal ficando com o encargo do expediente o administrador do concelho. Entretanto o Governador Civil estava obrigado de num prazo de vinte dias indicar ao Ministério do Interior seis cidadãos, sendo três efectivos e três suplentes, para pertencerem à comissão administrativa. Em S. Vicente a posse foi conferida a 16 de Setembro de 1926 pelo administrador do concelho, sendo providos Daniel Maria de França, José Fernando Neves e Nuno Cecílio da Silva Branco. O Presidente, Daniel Brazão Machado foi exonerado a seu pedido em 1928xlviii, assumindo as suas funções Horácio Brazão Machado. O decreto de lei nº 19 694 de 5 de Maio de 1931 estabelece as normas que regem a eleição dos vogais da Câmara, dando-lhe um cariz corporativo ao estabelecer a eleição através das Juntas de Freguesia e corporações existentes no concelho. Entretanto, a partir de 1936 a figura do presidente assume uma desusada importância. Este, que é nomeado pelo governo, assume-se como o seu representante e acumula as funções policiais que havia sido do administrador. O município é assim definido pela figura do presidente, do conselho municipal e de Câmara Municipal. Para a Madeira foi definida uma situação especial que ficou exarada no estatuto aprovado em 1947xlix. Os mandatos do presidente e vice-presidente eram estabelecidos por quatro anos e ninguém se poderia escusar. Os vereadores eram eleitos pelo conselho para um mandato de três anos. O seu exercício era gratuito e obrigatório. Assim sucedeu em 1942l com o vogal Horácio Brazão Machado que não viu deferida a pretensão porque "as funções que exerce do referido cargo são obrigatórias". Somente ao fim de 12 anos poderia ser substituído, como sucedeu com Ernesto da Silva Branco em 11 de Outubro de 1973.

A VEREAÇÃO

A vereação é desde a origem o forum que corporiza a instituição municipal. Uma simples palavra resume tudo isso: o conjunto dos agentes do poder municipal, a vereação com funções deliberativas em que estes assumem as funções sob o olhar atento dos vizinhos. As sessões são a expressão máxima do funcionamento da instituição. OS VEREADORES Para este período de pouco mais de um século é evidente, que em qualquer das situações estabelecidas para a eleição ou nomeação dos vogais da Câmara, conclui-se pela pertença a um restrito grupo de vicentinos que no decurso do nosso século é maioritariamente da freguesia de S. Vicente. Situando-se o concelho numa das mais isoladas regiões da Madeira. São óbvias as dificuldades para encontrar vizinhos elegíveis e eleitores, isto é, sabendo ler e escrever, tal como preceituavam os códigos eleitorais. Note-se a evidente afirmação do analfabetismo e as insistentes dificuldades de uma adequada política de ensino, capaz de colmatar a situação. Incluso os oficiais camarários não escapam a isso como se poderá constatar em 1902li em que o Governo Civil devolve uma representação expedida pela câmara ao rei por “não estar em termos de seguir ao seu destino por conter muitos erros orthographicos”. Uma das famílias surge em evidência no grupo de vogais camarários porque os seus membros assumiram por diversas vezes a presidência. Referimo-nos aos Silva Branco do sítio do Lanço em S. Vicente. Em 1874 António Francisco da Silva Branco é feito presidente, retornando em 1886 como vogal. A este sucede-lhe Ernesto Firmino da Silva Branco, vogal e presidente em 1908, 1910 e 1934. Em 1926 aparece Nuno Cecílio de Silva Branco como vogal, que deu lugar a Ernesto Teotónio da Silva Branco, que foi entre 1962 a 1971 Vice-Presidente e no ano de 1972 exerceu as funções de presidente até ser substituído com 12 anos de serviço. Foram várias gerações que devotaram parte da sua vida ao serviço público do concelho. Outra família com uma presença evidente é a dos Sousas da Ginjas: João José de Sousa é vogal em 1876-77, 1882-87 e 1912, Francisco José de Sousa foi presidente em 1870-71, 1884-87, dando lugar ao Dr. Francisco José de Sousa de 1884-1889. Daqui se poderá deduzir que os sítios do Lanço e das Ginjas saíram personalidades influentes com uma capacidade e disponibilização para o serviço público, firmando uma desusada presença na Vereação desde 1870 até 1974. A vereação vicentina teve entre os seus membros alguns licenciados. O primeiro foi o Dr. Carlos José de Sousa, presidente entre 1910 e 1917, que deu lugar a outros três: entre 1886-1892 Dr. José Gregório da Silva, em 1918 Dr. Fernando Mendes Esmeraldo e em 1919 o Dr. Daniel Brasão Machado. Outros mais se seguiram: em 1924 Dr. Heliodoro H. de Sousa, em 1927 o Dr. Manuel da Conceição Escórcio, em 1956 e 1959 o Eng. agrónomo João da Cruz, Fidélio Canha em 1962, o Dr. Alcino Daniel Júlio Drumond e em 1971 o Eng. Narciso Laureano Branco. A evidência de que o Norte foi e continua a ser terra de gente ilustrada está

aqui bem documentada, na figura dos seus presidentes licenciados, originários ou não do concelho. Do doutor Alcino Drumond, que fez de S. Vicente a sua terra adoptiva, é considerado por Horácio Bento de Gouveia como um dos mais empreendedores presidentes que o concelho teve: “A prosperidade do Norte, a contribuição para o conhecimento de sua riqueza agrária e pecuária, a divulgação do povoado e das terras do concelho, a veemência com que falava das tradições, de seu folclore, o quase fanatismo pelo telúrico e as gentes, o seu afecto esbordante por tudo que fosse regionalismo ocupava a vanguarda de seu impulso.(…) Como Presidente da Câmara sempre teve ele uma ideia fundamental orientadora de acção em todo o seu mandato; o bem comum. Satisfazer as necessidades inadiáveis dos munícipes.” lii A ele pertencem algumas decisões significativas que ficaram a marcar os destinos e actualidade do concelho. É de salientar ainda a presença de quatro padres. Três foram presidentes (Pe. Frederico Augusto de Freitas 1898-1899 e Pe. Casemiro Augusto de Freitas Abreu 1905.1906, Pe. António de Silva Figueira (em 1923) e um vogal (Pe. Daniel Nicolau de Sousa). Note-se que a Vereação do ano de 1923 foi dominada pelo clero. À presidência estava o Pe. António da Silva Figueira, sendo vogal o Pe. Daniel Nicolau de Sousa. Note-se ainda a insistência de algumas personalidades à frente dos destinos de Vereação, o que poderá ser um indicativo do seu prestígio. Destes salientamos os seguintes: Dr. Carlos João de Sousa - 1886-1892 Daniel Brazão Machado - 1902, 1904, 1919 Ernesto Firmino da Silva Branco - 1908-10, 1934-36 Dr. João Gregório da Silva - 1914-1917 Horácio Brazão Machado - 1932-1934 Dr. Alcino Daniel Júlio Drumond - 1962-1971 O Concelho de S. Vicente foi assim terra de gente ilustrada que não se coibiu de intervir de forma directa nos destinos do concelho. A eles pertence a obra realizada. As falhas só são possíveis quando domina a incompreensão das autoridades distritais e centrais. Os parcos meios financeiros hipotecavam a capacidade de intervenção das autoridades locais e o pouco realizado era conseguido sempre com muito esforço. Aqui é de salientar que a presidência de um natural foi sempre mais eficaz e proveitosa para o concelho que a de um estranho, imposto de fora, quando assim o permitia a lei.

OS PELOUROS Os pelouros eram estabelecidos pelo presidente que fazia a distribuição entre os vogais. A sua existência e âmbito varia ao longo do tempo. Em 1868liii são estabelecidos apenas três pelouros: serras, obras públicas, transgressões e posturas. Todavia em 1874liv adiciona-se mais dois: inspecção das escolas primárias e inspecção de obras municipais. O século XX redobra as responsabilidades da Vereação, levando a uma mais eficaz distribuição da alçada dos diversos vogais da Câmara. Deste modo os pelouros para o ano de 1906lv ficaram assim distribuídos: Viação e florestas - Manuel Gouveia Brazão Fontes e Cemitérios - Valério Andrade Expostos, subsidiados, açougues e praça peixe - Cândido António Gonçalves Iluminação pública e afilamento medidas e pesos - Manuel de França Carvalho Com a República a estrutura mantém-se igual, sendo as competências derramadas nos seis vogais: Viação municipal - Vicente Teodoro de Freitas Fontes e iluminação - Manuel de Silva Gouveia Brazão Cemitérios - José Fernandes Neves Açougues, praças de peixe - Frederico César de Freitas Expostos e subsidiados - João José de Sousa Florestas, limpeza das ruas e edifícios públicoslvi- Maurício Ponte Machado Na década de vinte, de acordo com a nova estrutura, os pelouros ficaram assim distribuídos: - Ao presidente Dr. Heliodoro Hermenegildo de Sousa: Secretaria, fontes, cemitérios, açougues, mercado de peixe, subsidiados, iluminação do concelho e higiene.

- O Vice-Presidente, João Pestana Martinho: estradas, pontes, açougues e mercado do peixe em Boaventura e Ponta Delgada. - Secretário, Valério António Andrade: subsidiados, limpeza das ruas, reparos e conservação de edifícios públicoslvii

Nos anos sessenta a estrutura adapta-se à nova realidade municipal. Em 1964lviii temos os seguintes pelouros:

O Presidente, Dr. Alcino David Júlio Drumond: secretaria, obras, cultura, assistência e serviços policiais.

O Vogal, António Jordão Andrade Oliveira: salubridade pública, mercados e feiras. O Vogal, Manuel Maria Carvalho: Cemitérios, higiene e limpeza. AS ACTAS E AS SESSÕES A Vereação deveria reunir-se de acordo com a assiduidade determinada nos códigos. Tinham aí assento o presidente, os vogais, o procurador do concelho e o escrivão a quem ficava o encargo de elaborar as mesmas actas. Em 1968 os livros de actas eram enviados pelo Governo Civil que as numerava e rubricavalix.

O ano inicia-se em dois de Janeiro com a primeira sessão onde eram estabelecidas as formas de organização e funcionamento. Para o século XIX este era também o momento de eleição do presidente e vice-presidente, situação que se prolongou até ao código de 1933. A Vereação deveria reunir-se de acordo com a periodicidade exarada nos diversos códigos, sendo o dia estabelecido na primeira sessão do ano, que podia ocorrer em qualquer dia da semana, estabelecendo-se de acordo com a conveniência dos seus membroslx. O dia da semana que mais ganhou adeptos foi o sábadolxi e a quinta-feira. De acordo com as diversas regulamentações era "rigorosa obrigação de haver sessão uma vez cada semana"lxii. Mas num concelho como o de São Vicente, onde a população está dividida em três freguesias, a reunião dos oficiais camarários não era fácil. As sessões eram quase sempre convocadas para uma hora a meio do dia, no sentido de permitir a presença. Mesmo assim a reunião acabava sem a presença de todos. Em 1868lxiii o vereador João Joaquim de Canha, chegou já a sessão tinha começado. Por outro lado as invernias tão frequentes nesta encosta conduziam a que a vereação não mantivesse a assiduidade desejada. Em 1915lxiv a primeira ocorreu como era obrigação a 2 de janeiro, mas os vereadores não se puderam reunir até 26 de Março devido ao mau tempo. Noutros casos foi a falta de número suficiente de vogais para que a reunião tivesse lugar. Por este motivo três do mês Janeiro de 1869 não tiveram lugar. A 11 de Outubro de 1876 José Maria Curado de Vasconcellos alega a não comparência à sessão anterior por motivos de mau tempo. E na que esteve presente não se demorou muito mais, pois que a 13 h 30 pediu para se retirar devido ao tempo chuvoso e a moléstia de pessoa de sua casa, que distava da Vila duas léguas. Todas estas situações são evidentes no século XIX mas á medida que avança a rede viária e a locomoção automóvel, reduzem-se as distâncias, sendo difícil alegar motivos para a sua ausência. Daí a assiduidade dos vogais e as falta só acontecerá por razões de saúde. Deste modo o vereador Manuel Francisco Faria não compareceu nem justificou porque não esteve presente à sessão de 28 de Julho de 1966, sendo-lhe aplicada a multa de 20$00. A 11 de Agosto alegou a seu favor a avaria no carro. Não existiam regras precisas para a redacção das actas, a sua estrutura dependia da capacidade do escrivão. Somente a partir de 1872 sabemos da necessidade dessa de modo a que facilitasse a posterior consulta. Assim, a primeira parte era ocupada com o despacho do expediente referente aos ofícios recebidos e requerimentos apresentados pelos munícipes. Nos anos quarenta do nosso século, de acordo com o estatuto dos distritos autónomos, esta passará a ter uma estrutura rigorosa: primeiro o despacho dos ofícios presentes de diversas repartições. Depois os requerimentos, normalmente de obras, seguindo-se as deliberações das sessões e as contas presentes para pagamento. Concluído tudo isto a sessão era interrompida 15 minutos de modo a que fosse redigida a acta que depois seria assinada por todos os presenteslxv.

A ALÇADA

A alçada dos vereadores evolui ao longo do tempo e ajusta-se aquilo que os políticos pensam que deve ser a sua função. Em todos os casos a intervenção é evidente no dia à dia do concelho. RECRUTAMENTO MILITAR O recenseamento dos mancebos e o recrutamento para a prestação do serviço militar eram da competência das câmaras. Este era feito em Câmara anualmente na presença do vigário e do regedor da freguesia, que também compareciam depois ao acto de sorteio dos mancebos para o serviço militar, de acordo com o número estabelecido para o concelholxvi. Em 1882lxvii dos 354 recrutas vinte e dois eram do concelho, sendo sorteados seis para Boaventura, quatro para Ponta Delgada e uma dúzia de S. Vicente, dados estabelecidos de acordo com o número de recenseamento da população de 1878. A situação muda a partir de 1890 sendo o serviço prestado por uma comissão específica nomeada pela Câmaralxviii. Por edital era feito o anúncio do sorteio convocando todos os interessados a assistir, sendo os números retirados pelos parentes dos mancebos. Aos sorteados assistia o direito de reclamar, alegando os motivos permitidos de escusa. Em 1868lxix António de França Callaço reclama pela sorte do seu filho, por ser de sessenta anos, pobre e doente, sendo a sua mulher de 50 anos também doente, "presisando do seu filho para o seu arrumo". POSTURAS Uma das formas de intervenção do município acontecia com a definição do código de posturas. Nestas estabeleciam-se as normas de direito municipal que regulavam o quotidiano dos munícipes. Com os tumultos de 12 de Abril de 1868 foram destruídos os lançamentos e código de posturas, tornando-se necessário a elaboração de novoslxx. O projecto era da responsabilidade do presidente que depois deveria submetê-lo à aprovação da Câmara e conselho municipallxxi, sendo depois enviadas para o tribunal superior. Assim sucedeu em 5 de Outubro de 1870lxxii. Entretanto em 3 de Fevereiro de 1882 foi nomeada uma comissão para rever as posturas constituídas por cinco munícipes. Estas terão sido as impressas em 1897 pela Casa Minerva de Coimbra. Da edição fizeram-se 250 exemplares que custaram 16$800 réis. FUNCIONÁRIOS O funcionamento da instituição assentava num número reduzido de funcionários. Assinala-se apenas a presença do porteiro da Câmara, o amanuense, escrivão da Câmara. Aqui juntam-se outros com um estatuto diverso. Estão neste caso o zelador, o aferidor e o procurador da Câmara. Em 1929lxxiii, de acordo com regulamento interno, todos os funcionários deveriam assinar o ponto das onze às doze horas e no caso do apontador e zelador eram obrigados a comparecer todos os dias úteis até às doze horas na secretaria para assinar o livro de apresentação e

saberem do serviço. Entretanto o serviço de expediente da secretaria deveria permanecer aberto até às quinze horas. O administrador assume um papel fundamental no concelho. É ele quem desempenha as funções de representação do governo na administração geral na segurança pública concelhia. Juntamente com o regedor na freguesia são os magistrados administrativos. São os agentes de confiança do partido do governo que os nomeava, exercendo a tutela administrativa sobre os municípios e freguesias. Era ele quem, em nome do Governador Civil, dava posse aos Vereadoreslxxiv. A nomeação do administrador ocorria quase sempre com a nomeação de um novo governador. Assim aconteceu em 1897lxxv em que Daniel Brazão Machado toma o lugar de Fernando Mendes Esmeraldo. Todavia ao chegar ao seu gabinete nos paços do concelho deparou-se com um espectáculo inédito. A sala estava vazia, uma vez que a mesa de dois gavetas e armário com fechadura pertenciam ao administrador deposto que levou para a casa. A omnipresença do administrador do concelho teve início em 1836 com o código de Passos Manuel e manteve-se até à constituição de 1933. De acordo com a nova realidade o presidente da Câmara de nomeação pelo governo, passou a preencher as funções do administrador do concelho. Também o regedor perdeu quase todas as prerrogativas mantendo-se apenas com auxiliar da presidência da Câmara. Administrador do Concelho 1843 - Thaumaturgo Sousa Drumond 1846 - António Francisco da Silva Branco 1856 - Eloi João de França Mendes 1868 - João Maria cerrado Vasconcelos 1870 - Carlos João de Sousa 1876 - Fernando Mendes Esmeraldo 1894 - António Francisco de Silva Branco 1897 - Daniel Brazão Machado 1900 - Fernando Mendes Esmeraldo 1904 - Carlos João de Sousa 1906 - Fernando Mendes Esmeraldo Junior 1907 - António Francisco de Silva Branco 1908 - João Fidélio da Canha 1909 - Carlos João de Sousa Júnior 1910 - Manuel Cândido Andrade 1912 - Eduardo França Abreu 1913 - Manuel Cândido de Andrade 1921 - Agostinho Brazão Machado 1926 - António de Brito Figueiroa 1927 - António Brito Figueiroa AS CONTAS DA CÂMARA O exercício das funções dos vereadores estava na dependência directa das disponibilidades financeiras do município. Estas resultavam das receitas próprias resultantes dos impostos

indirectos, taxas e multas mas também das verbas e subsídios dados pelo governo, normalmente com fim determinado. Através das actas das Vereações é possível acompanhar as contas da Câmara, mas também o processo de lançamento de taxas e impostos indirectoslxxvi para colmatar a elevada despesa e subsidiar as obras concelhias. O orçamento era elaborado e aprovado em Dezembro ou Julho de cada ano em sessão pública da vereação que deveria contar com a presença do conselho municipallxxvii, formado pelos quarenta mais importantes contribuinteslxxviii. Depois disso o orçamento ficava exposto durante dez dias, seguindo depois para aprovação do conselho distritallxxix. Nas décadas de sessenta e setenta do século XIX são evidentes as dificuldades na elaboração por falta de receita própria. Em 1869lxxx o Governo Civil decidiu devolver o orçamento por a despesa exceder em muito a receita. Deste modo em 1871lxxxi a Vereação tardou a elaboração, pois aguardava-se a aprovação das posturas, na ânsia de uma maior receita. Todavia, o que se veio a confirmar foi a incompetência do escrivão Francisco Manuel Deniz que acabou exonerado em 1873lxxxii. O Governo Civil havia feito sentir desde 1871lxxxiii a falta de organização no orçamento e recomendava a Vereação para "empregar todos os meios a seo alcanse para fazer organizar sem demora as contas de receita e despeza"lxxxiv. Concluído o ano económico o tesoureiro deveria apresentar a conta em vereação para ser aprovada pelos oficiais. Assim, sucedia todos os anos no mês de Dezembro. Até 1879lxxxv o ano civil não coincidia com o ano económico, sendo por isso mesmo a conta apresentada depois de Julholxxxvi quando este terminava. Deste modo as contas deveriam dar entrada no conselho distrital no mês de Setembro, tal como o preceituavam as recomendações de 11 de Fevereiro de 1850. Em Vereação era apresentado apenas um balanço da conta. Desta temos conhecimento apenas da do ano económico de 1854 a 1855, publicada no jornal oficial do distritolxxxvii. O apuramento feito em Vereação acontecia do seguinte modo: Contas do ano económico de 1877-78 Receita 2.446$665 rs Despesa 2.052$490 Saldo 642$444 A isto juntavam-se os documentos de Receita não realizada 169$925 Em moeda insulana 474$874 Conta Geral do Município 410$449 Conta de viação 64$430 Saldo do cofre da Câmara 320$467 As contas da Câmara na segunda metade do século XIX são alvo de algumas irregularidades. Assim na tomada para o ano económico de 1875/76 refere-se a falta de adequada escrituração da receita e despesalxxxviii. A par disso a Câmara é devedora à fazenda pública em 11390$503 de empréstimos e contas até 1823lxxxix. Aliás, analisando os dados da conta para os anos de 1885 a 1889, nota-se a evidência da má gerência. Os dados da execução orçamental evidenciam isso. Senão vejamos: em 1888 contava-se com 7.077$696 réis e apenas se gastou 3.326$320 e no ano imediato de uma verba de 9.528$036 saiu do cofre apenas 4.398$732xc. Face a esta evidência tão frequente no último quartel do século XIX, não entendemos a opção da Vereação extraordinária convocada para o dia 18 de Novembro de 1878 com o objectivo de discutir a necessidade de aumentar a receita, através dos impostos indirectos, uma vez que os

encargos iam em crescendo. Na verdade, se na década de setenta o equilíbrio entre a receita e despesa era evidente, passado pouco tempo aumentou o fosso, sendo a situação resultado como vimos de má administração. A principal fonte de receita da Câmara estava nos impostos indirectos, estabelecidos sob a forma de taxa, sendo uma das prerrogativas emanadas nos diversos códigos administrativos. No final da década de sessenta do século XIX eles incidiam sobre a aguardente, o vinho artificial, a balança e pesos, as taxas de licenças a vendilhões ambulantesxci. No caso da aguardente a taxa representava um sétimo do preço de cada 3,5 litros, enquanto para o vinho era o mesmo valor mas sobre o preço de 49 litros, isto é a medida de um barrilxcii. A partir de 1874xciii temos o imposto sobre a venda de peixe fresco ou salgado que era de 20 réis a arroba de posta vendida ou réis ao milheiro, passando em 1939xciv para 4% do valor de venda e de 5 % em 1959xcv, já em 1898xcvi temos outro imposto sobre a carne verde que representava 15 réis ao Kg vendido. Acrescem ainda as taxas sobre os coiros e de matança do gadoxcvii. O imposto pelo uso da balança no mercado e praça era estabelecido de acordo com o género em causa. Em 1871xcviii esta taxa foi arrematada por Jacinto Gomes de Gouveia no valor de 41$000 rs, sendo a arrecadação feita do seguinte modo: 200 rs por carne de vaca ou boi 150 rs por vitela 50 rs por cabra ou ovelha 200 rs por milheiro de peixe 20 rs por cada 14,685 gramas que vender a retalho Em 1934xcix foi aprovado novo regime de taxas para os estabelecimentos comerciais e industriais a ser cobradas todos os anos nos meses de Julho a Setembro. Lojas de fazendas, mercearia e tabernas 80$00 Mercearias e lojas de bebidas 40$00 Padarias 50$00 Vendedores ambulantes 150$00 Postos de desnatação- nata para fora do concelho 30$00

nata batida no concelho 20$00 Fábricas de manteiga 50$00

Debulhadoras 20$00 Em 1946c foram adicionadas novas taxas. Quanto ao abate do gado temos: Bovino e suíno 15$00 Caprino e lanígero 2$50 Em 1873ci a arrematação dos rendimentos da Câmara ficou deserta pelo que a Câmara decidiu proceder à arrecadação por sua conta. O mesmo sucedeu em 1927cii, tendo a Câmara nomeado fiscais para a cobrança directa, um para cada freguesia. Cada fiscal auferia o ordenado de 40$00 mensais e tinha direito a 10% das cobranças. Quando a renda era arrematada o arrematador deveria assinar o auto em vereação e a apresentar um fiador. O pagamento deveria ocorrer de forma variada consoante as condições estabelecidas no auto. Em 1869ciii era uma prestação mensal, enquanto em 1888civ passou a trimestral. A forma de cobrança nunca foi uniforme, pois tanto poderia acontecer em separado ao produto, e freguesia ou na totalidade. A

última situação foi definida para o período que medeia os anos de 1902 a 1935cv, sendo resultado das mudanças estabelecidas na administração. Em 29 de Novembro de 1878 as câmaras da região haviam aprovado o imposto ad valorem de 3% sobre as mercadorias entradas na alfândega, que acabou suspenso por acórdão do Conselho do distrito de 28 de Maio de 1879. Enquanto se aguardava um despacho definitivo a câmara de S. Vicente com base no que preceituava o código administrativo decidiu estabelecer o imposto sobre todas as mercadorias nacionais e estrangeiras vendidas no concelhocvi. Em 1888cvii ficou regulamentado o imposto indirecto sobre os produtos importados, que até então eram cobrados pela alfândega do Funchal e que a partir de daqui têm cobrança local, uma vez que a câmara do Funchal pretendia apossar-se de 75% do total das feitas pela alfândega. A tabela de taxas era feita em consonância com a da Câmara do Funchal e mudava sempre que esta as alteravacviii. Com a Republica manteve-se o imposto sendo regulamentado em 1923cix pela comissão executiva. O imposto ad valorem incidia sobre os produtos produzidos no concelho e dele exportados. Isto é: aguardente, aves, batata(semilha), bordados, cana sacarina, carnes, cereais e legumes, couros e peles, gado, lenha, madeiras, manteiga, nata de leite, vimes, vinho. Para além dos impostos indirectos e das multas estabelecidas no código de posturas é de salientar ainda os foros que a Câmara recebia pelas terras foreiras. Temos conhecimento de quatro casos. Em 1868cx recebeu 8$000 réis de foro anual pago por Vicente Alexandre, João de Sousa d'Andrade e António de Sousa por terra no Cascalho junto da ribeira. Para 1899cxi temos dois foreiras: Maria Cândida na Vila e Cândido António Gonçalves no Pé do Passo que pagavam respectivamente 4$360 réis e 1$750 réis. A estes junta-se desde 1942cxii o prédio rústico no Poiso que adquirido para a construção dos paços do concelho, que estava arrendado primeiro a António Pestana Rochinha por 303$00 e depois Manuel Pestana Gavião por 1221$00. As despesas fixas do município eram elevadas sendo de realçar as referentes aos funcionários, de que os exemplos a seguir enunciados são elucidativos: 1876 meses de Julho a Setembro 120$294 1896 mês de Janeiro 228$765 1918 meses de Março e Abril 360$000 A despesa estava assim distribuída no 1º trimestre do ano de 1919cxiii

Apontador 45$00Empregados da Secretaria da Câmara 230$00Empregados da Administração do Concelho 319$95Facultativos Municipais 149$73Subdelegado de Saúde 35$25Chefe de secretaria expediente 122$00Secretaria da Administração do Concelho 50$00Tesoureiro da Câmara 50$00Carcereiro 15$00 Alguns dados avulsos espelham a evolução do salário destes funcionários: CARGO 1869 1876 1883 1916 1936 1939 Aferidor 5$000 15$000 - 12$00cxiv 250$00 -

Escrivão 5$000 - - - - - Tesoureiro - 34$434 - - 700$00 - Amanuense - - 54$000 - 650$00 - Apontador - - - - 350$00 - Zelador - - - - 250$00 - Fiscal matadouro - - - - - 48$00 Chefe secretaria - - - - 900$00 - Contínuo - - - - 300$00 - Chefe secção administrativa - - - - 700$00 - Médico - - - - 500$00 - Nalguns casos o vencimento era estabelecido em valor móvel de acordo com o ofício. Assim sucedia com o procurador da Câmara e zelador que eram aliciados desta forma para bem arrecadarem as dívidas ou os impostos. Para além desta despesa com os funcionários a Vereação tinha outros custos fixos elevados. Vejamos o quadro das despesas para apenas dois anos DESPESA 1876 1916 Funcionários e Professores 106$050 - Renda de edifícios 30$000 209$00 Iluminação - 100$00 Limpeza das ruas e edifícios 5$500 20$00 O procurador da Câmara, a quem estava acometido o encargo de arrecadar as dívidas e as coimas auferia 10% das cobranças, enquanto o zelador ou olheiro das estradas tinha direito a metade das coimas lançadascxv. Este último surge em 1934cxvi já com um soldo fixo de 250$00. Isto não coibia os mesmos de actuarem de forma dolosa. É o caso de António de Abreu que em 1828cxvii foi destituído do cargo de zelador por denúncias de que teria recebido dinheiro das partes, para não dar conta das coimas. Outro caso, mas de diversa índole ocorreu em 1877cxviii com João Inocêncio da Câmara. Ele acumulava indevidamente os cargos de escrivão da administração e da Câmara, pretendendo auferir por isso 94$944 réis de ordenado. Como esta situação era ilegal, de acordo com a portaria de 17 de Fevereiro de 1871, e o mesmo conservara indevidamente em seu poder várias quantias dos rendimentos camarários acabou por ser punido. ANO SALDO ANTERIOR RECEITA DESPESA SALDO

1870 332$637 207$819cxix

1874/5 1.244.312 1.144.575 18

1875/6 770.709 691.583

1876/7 2.623.490 1.932.124 691.366

1877/8 2.446.665 2.052.490 642.444

1878/9 2.334.385 1.744.734

1880 1.931.973 874.419 1.057.554

1880 2.653.371 1.921.466 731.905

1881 2.718.461 2.439.793 278.668

1882 3.550.315 2.846.854 703.461

1883 2.789.735 3.669.362 879.627

1884 3.168.737 2.483.255 685.482

1885 3.687.778 2.845.571 842.207

1886 5.802.970 3.392.194 443

1887 5.516.619 2.077.686

1888 7.077.696 3.326.320

1889 9.528.036 4.398.732 2.494.899

1891 5.336.087 4.717.709 618.378

1892 4.090.062 3.867.698 222.364

1893 4.531.451 3.393.881 1.137.570

1894 5.387.140 4.433.399 953.741

1957 1.342.316$10 1.258.010$70 89.99$50

1958 1.179.290$80 911.280$60 270.702$20

1959 1.803.364$10 1.620.227$30

1964 2.952.920$00

1965 277.319$90 1.521.844$00 1.675.427$20 123.737$20

1966 123.737$20 2.199.011$20 2.033.449$70 123.737$20

1967 289.298$70 1.841.998$10 1.803.062$40

1968 328.134$40 2.160.058$20 1.846.404$60

1969 641.788$00 2.066.642$00 1.641.957$00

1970 1.066.473$40 2.603.339$20 2.037.245$80

1971 1.632.566$80 2.798.568$00 2.042.350$30

1972 1.978.831$70 2.351.159$80

1973 2.016.456$40 3.153.600$10 4.432.643$80

1974 736.818$70 2.037.192$70 2.476.617$20

TUMULTOS: A POPULAÇÃO CONTRA OS IMPOSTOS Em São Vicente estão referenciados tumultos da população, tendo dois como origem o sistema de cobrança de impostos. O mais relevante ocorreu em 12 de Abril de 1868 e levou à destruição total do arquivo camarário. Os tumultos confundem-se com a convulsão política que ocorreu a 8 de Março de 1868, ficando conhecida como a revolta de pedrada. As eleições acirraram os ânimos entre os defensores dos partidos Popular e Fusionista e foi a conjuntura de

afrontamento que esteve na origem da revolta popular tendo como objectivo a aplicação do decreto sobre o sistema métrico decimal e a abolição do imposto indirecto sobre a eira e o lagar que foi substituído pela contribuição predial. O resultado disto foi a revolta popular que levou à queima de toda a documentação do Arquivo Municipal, perdendo-se irremediavelmente tudo o que estava aí depositado e a não concretização do acto eleitoral para as juntas de paróquia em Ponta Delgada e Boaventuracxx. A rebelião alastrou também às diversas autoridades das freguesias, referindo o presidente da Câmara a forma insólita como o regedor de Boaventura lhe dirigiu uma carta em 29 de Marçocxxi. Esta desavença causou muita agitação entre os populares mas a 16 de Abril parece que os ânimos haviam serenado uma vez que nada de novo havia já a noticiar ao governadorcxxii. Mesmo assim este decidiu em Agosto enviar uma força militar: primeiro desde Ponta de Sol que aí chegou pelas 12h do dia onzecxxiii, depois em Dezembro uma força que saiu do Funchal no dia sete e aqui chegou no dia 11cxxiv. Esta manteve-se por algum tempo no concelho sendo suportada pelo município. O maior problema daqui resultante foi a perda de documentação do arquivo municipal que teve implicações negativas na administração corrente dos anos imediatos. Em 1869 refere-se a necessidade de novo recenseamento da contribuição dos covatos "visto que o que existia foi incendiado nos tumultos que tiverão logar no dia 12 de Abril do ano preterito"cxxv. Na verdade, quase toda a documentação concelhia foi levada pela população enfurecida e devorada pelas chamas. Assim, de data anterior apenas restaram quatro livros de registo de testamentos (1801-1834) um livro de despesas do hospital provisório de S. Vicente, aquando da cólera-morbus (1856), quatro livros de correspondência para as diversas autoridades do concelho (1843-1867) quatro livros de correspondência expedida às autoridades superiores do distrito (1845-1866) e outros quatro de registo de testamentos (1842-1878). Quanto ao demais tudo se perdeu. Depois disto a população do concelho parece ter adquirido a fama de arruaceira. Em qualquer momento que se tomavam decisões com implicações directas na sua vida o temor das autoridades camarárias era evidente. Deste modo em 1897cxxvi a vereação ordenou ao Administrador do Concelho que fizesse um auto de investigação para apurar a verdade sobre certos boatos subversivos contra a câmara que falseavam as disposições das posturas “attribuindo-lhe providencias e lançamentos de impostos revoltantes, talvez com o fim de levar o povo à sublevação.” Sabe-se que na vizinha freguesia do Seixal havia ocorrido em Janeiro uma manifestação de desagravo pela revisão das matrizes, o que obrigou a comissão revisora a abandonar o serviçocxxvii. Certamente que em face disto a vereação fez sentir em 1899 a necessidade de três guardas civis para a repartição que apresentava tanto valor e “importância das loucuras dos contribuintes”, face “ a um concelho tão popolozo como este, que se acha escitado não só para praticarem os mesmos desatinos que os povos de Sant’anna, como talvez perdas da fazenda”cxxviii

Tantas cautelas da câmara não impediram que noutros momentos não resultassem tumultos, como os que sucederam em Abril de 1911 face às medidas governamentais que determinavam o encerramento das fábricas de aguardente. A câmara a 20 de Março apelara às autoridades para a necessidade de o revogar face aos receios da ira popular mas a resposta do governo foi o envio em segredo de uma força militar que não impediu que a revolta acontecesse. Resultado disto foi a prisão de dez dos revoltosos cabecilhas: Manuel de Sousa marinheiro, João José Serra, António Sebastião Costa, Vicente filho de Vicente Vieira, Gregório Fernandes, Francisco Fernandes, João António Gonçalves, Manuel Pereira, Manuel Gonçalves Bacalhau e Manuel Pestanacxxix.

Em 1880cxxx a Câmara decidiu lançar o imposto "ad-valorem" baseando-se a medida na "necessidade urgente de criar receita para satisfazer as despesas obrigatórias a que é mester attender a fim de conseguir-se o equilibrio do orçamento da receita e despeza municipal"cxxxi. O imposto incidia sobre todos os produtos exportados do concelho: vimes, cana, carne, coiros, peles, cereais, vinho aguardente, aves, batata, lenha, madeira, nata e manteiga, bordados. ANO VALOR PRODUTO 1922 5 010$00 ? 1923 13 400$00 ? 1924 14 830$00 Bordado 15 000$00 Vimes, cana, coiros, peles, cereais 10 000$00 Vinho, aguardente 10 000$00 Aves 8 000$00 Batata (semilha), lenha, madeira 10 000$00 Nata e manteigacxxxii

O imposto motivou de novo a ira popular sendo um primeiro indício disso as afirmações do comandante da guarda fiscal Manuel Filipe de Andrade que havia "afirmado que o imposto ad valorem foi lançado apenas com o intuito de com o rendimento dele os vereadores comerem jantares, ceias e galinhas, isto em S. Vicente, e de haver também escutado no Funchal que a actual Vereação e município era composta de malandros sabendo ainda a comissão que o dito fiscal nunca perde o ensejo de poder maldizer quer da Vereação quer dos seus actos"cxxxiii. A hecatombe eclodiu no dia 10 de Julho e levou a Vereação a revogar tal imposto. Eis a explicação para o sucedido: "...considerando que, a forma tumultuosa dos movimentos populares dos dias des e dose do corrente mês de Julho neste concelho e Vila, provou que a multidão por palavras e obras se revoltara com o intuito de não pagar impostos municipaes, nomeadamente o imposto ad-valorem e cuvatos; considerando de taes actos de rebelião cuibem e estes são a variação municipal duma acção proveitosa e util dos seus esforços em benefício do mesmo municipio"cxxxiv. A mesma Câmara deu um voto de louvor ao sargento Lumelino, chefe do destacamento militar por ter reestabelecido "a ordem sem derramamento de sangue e sem violências escusadas". Na verdade, no dia 10 de Julho um grupo de moradores de Boaventura marchou sobre a vila de S. Vicente onde chegou um grupo de mais de mil que em pouco tempo atingiu o dobro. O primeiro alvo da ira foi o Dr. Heliodoro de Sousa, oficial da repartição do Registo Civil e presidente da Comissão executiva da Câmara. Os populares acusavam-no de cobrar pelas cédulas estatuídas pelo decreto 9521 de 14 de Abril de 1924 um valor superior ao estabelecido. Cercados os edifícios públicos e as casas dos seus responsáveis que foram obrigados a fugir. Para serenar os ânimos o Governo enviou uma força no mesmo dia que cercou a vila. Alguns populares da Vargem e Ponta Delgada obrigaram algumas das personalidades locais mais influentes a os acompanharem à vila. Os tumultos alargaram-se à Ribeira Brava e Câmara de Lobos, municípios onde também se havia também lançado o referido imposto ad valorem, criado em 1920 para taxar as mercadorias de exportação para fora do concelho. A versão dos acontecimentos correu nos periódicos da cidade e despertou a atenção das autoridades. A 11 de julho o Diário de Notícias questiona a legitimidade das câmaras para sobrecarregar os seus munícipes com estes pesados encargos: “Não se capacitarão as câmaras municipais de que são mandatarias do povo e que, portanto, se elles impõe o dever de fiel e lealmente interpretarem o sentimento dos seus eleitores?”. Entretanto o Governador em

circular de 14 de Julho recomenda às câmaras a revisão deste imposto a exemplo do que sucedeu nos Açores. Todavia, a inevitável solução foi a sua extinção, que ocorreu a 11 de Julho na Ribeira Brava e só a 22 do mesmo mês em S. Vicente.

POLÍCIA, JUSTIÇA E INSTITUIÇÕES A evolução das instituições policial e da justiça evidenciam mais uma vez o abandono da vertente Norte, sujeitando os moradores a uma opressiva subordinação a áreas distantes como o Funchal ou Ponta de Sol. As funções policiais e de justiça estavam no início acometidas aos juizes ordinários, com assento na Vereação. Aos poucos a situação evoluiu para uma adequada estrutura institucional. A figura do procurador do concelho continuou até 1974 a exercer aqui um papel fundamental. A primeira tentativa de implantação de um serviço policial surgiu após a República. Foi em 1911cxxxv que o Governador Civil reclamou à Câmara uma casa para alojamento da força militar que serviria de núcleo à guarda republicana. A instalação tardou e só em 1920cxxxvi temos conhecimento da sua presença, composta de seis soldados e um cabo. Ninguém os aceitou, justificando-se a Vereação pelas dificuldades de instalação, porque "não tem casa despunivel nem mubiliario para tal fim e que o povo deste concelho é pasifico". Entretanto, em Maiocxxxvii o comandante estava já instalado no edifício da repartição de Finanças. Mas a sua vida foi efémera, sendo forçado em 1922 a sair do concelho e da ilha por iniciativa de reacção popular. As ameaças populares levaram a que tardasse muito tempo a presença de uma força militar na ilha. As situações de instabilidade social conduziram a que se optasse por intervenções pontuais das forças militares, através de um destacamento militar que permanecia no concelho o tempo suficiente para apaziguar os ânimos. Sucedeu assim com os tumultos de 1868 e 1924. A Vereação confrontada com uma crescente de criminalidade e com a incapacidade para atacá-la viu-se forçada em 1943cxxxviii a solicitar ao comandante da Polícia de Segurança Pública a criação de um serviço no concelho. O resultado disso foi o envio de um Subchefe da Polícia pago pelo orçamento do concelhocxxxix. Já em 1959cxl é o próprio comandante Geral da PSP a referir a intenção de acabar com este serviço no concelho, com a criação de um comando local, o que tardou algumas décadas a acontecer. Com a reforma judicial de 1832 a Madeira passou a dispor de duas comarcas, ocidental e oriental, instaladas em 1838 no Funchal. As freguesias de São Vicente, Ponta Delgada e Boaventura ficaram a constituir o quinto julgado dependente da comarca ocidental. A situação mudou em 1875 com a criação de novas comarcas fora do Funchal. Uma foi instalada em 16 de Novembro de 1876 na Vila de S. Vicente. A comarca de S. Vicente ficou assim constituída por cinco julgados: o de S. Vicente, Porto Moniz, Ponta Delgada, S. Jorge e Santana. O último julgado reclamava em 1881cxli a transferência da sede da comarca para Ponta Delgada, alegando as dificuldades no acesso à sede da freguesia. O Feiticeiro do Norte no retrato das freguesias da Madeira, define S. Vicente pela condição de sede de comarca:

S. Vicente onde há comarca com senhores de capote e galos de raça grande que faziam belo lote A comarca persistiu na sede do concelho até à suas extinção em 1926. Isto terá sido resultado da falta de condições oferecidas à presença dos magistrados. Em 1910cxlii o delegado do

procurador régio na comarca queixava-se de terem atirado alguns tiros de espingarda e arremessado pedras à sua janela. Já na década de vinte era a falta de habitação e condições condignas para que os magistrados exercessem a sua actividade que levou à extinção da comarca, passando S. Vicente a depender da Ponta de Solcxliii. A situação levou a insistentes reclamações da Câmara. Em 1928cxliv a Vereação reclamou junto do inspector judicial de visita à Vila, uma passagem pelo concelho afim de averiguar de "visu" a realidade e "os grandes sacrifícios para a população do norte da ilha que lhes troxe a extinção da comarca". Daqui resultou a criação do julgado municipal a 24 de Outubro de 1931. Esta reclamação continuou por muito tempo mas só em 1962 foi atendidacxlv. A Vereação de 17 de Janeiro de 1963 propõe um voto de regozijo da forma como o povo recebeu o novo juiz da comarca. O regozijo é manifesto e o presidente decidiu promover uma "festa de carácter popular por motivo da restauração da comarca"cxlvi. A habitação que havia sido uma óbice para a continuidade da comarca teve andamento imediato. A 28 de Março decidiu-se avançar com o projecto da casa dos magistrados que ficou concluída no ano imediatocxlvii. Sob a alçada da Câmara estava ainda a cadeia. Era a Vereação que assegurava a sua manutenção, procedendo aos reparos, à nomeação do carcereiro, aos serviços de limpeza e fornecimento de alimentação. Em 1876cxlviii houve necessidade de reparar o rombo deixado por os presos que se havia evadido e o longo dos tempos insiste-se nas condições precárias do estabelecimento, só solucionado no século vinte com a construção da nova cadeia. A limpeza da cadeia era assegurada em 1878cxlix pelo próprio carcereiro que recebia 455 réis por mês. A lavagem da roupa dos presos pobres era feita por uma lavadeira da Vila que recebia 200 réis ao mês, sendo em 1905 Maria Cândida que auferia 2$800 réis ao semestrecl. DESTACAMENTO MILITAR A Vila de S. Vicente, mercê da insurreição de 1868, teve de suportar um destacamento militar por mais de vinte anos. Estes militares foram destacados entre os que vieram apagar a insurreição popular sendo rendidos anualmente. O município deveria assegurar casa e alimentação dos soldadoscliO único serviço prestado era a sentinela na guarita da cadeiaclii. As despesas com o destacamento não eram aceites de ânimo leve pela Vereação. A quatro de Março de 1893, alguns dias antes da sua retirada, a Vereação face a um pedido de material refere que o não fará mais sem ser obrigada a tal, porque não tem orçamento no corrente ano. A decisão da retirada estava já tomada, todavia tardou algum tempo até à saída que ocorreu em meados de Marçocliii. Em 1918cliv temos notícia de novo destacamento em Ponta Delgada, com a função de vigilância da costa. Em 1940 foi manifesto o desinteresse na manutenção da força militar, o que levou ao desmantelamento da vigia da Terra Chãclv. A Guerra Mundial, devido à neutralidade portuguesa, não era uma ameaça militar para a ilha. Aquilo que estava em causa eram as sequelas económicas e o temor de uma opção política pelos beligerantes. Deste modo o governador em 1941clvi mandou notificar todos aqueles que possuíam rádio em lugares públicos "que não podem ouvir emissões de propaganda de países beligerantes".

A POLÍTICA E OS POLÍTICOS NO CONCELHO

A Vereação não era uma tribuna de debate político mas sabe-se que os seus elementos não eram alheios ou imunes ao processo político atribulado que marcou este século de História. Ao nível nacional tivemos três momentos de profundas alterações que se reflectiram na evolução da instituição e por conseguinte nas opções pessoais dos vereadores, o que presidiram à sua nomeação. A República em 1910, o Estado Novo em 1926 e o 25 de Abril de 1974 parece que não chegaram a S. Vicente. Apenas com a República encontramos uma manifestação de regozijo. A 13 de Outubro "deliberou a Câmara por unanimidade adherir ao novo regimen de República Portugueza, e que desta deliberação se desse immediatamente conhecimento pelo Telegrapho a S. Exa Governador Civil, aproveitando a occasião para o felicitar pela nomeação de Governador Civil". Estes haviam sido os mesmos que em 1908clvii se haviam manifestado pesarosos com a morte do rei e solidários com a aclamação do príncipe. Assim, a 24 de Novembro de 1910 tomou posse uma comissão administrativa, que nos termos do decreto de 13 de Outubro, deverá substituir a herança monárquica. A comissão presidida por Manuel Cândido de Andrade, era composta de mais cinco vogais, um dos quais era presidente. A República exigia lealdade da parte dos seus servidores. Assim em 1921clviii temos o pedido da professora Ida de Freitas Nascimento para que a Câmara "ateste a sua adesão às instituições republicanas e o respeito que presta à constituição e ás leis da República Portuguesa". Em 1937clix Gregório de Sousa Brazão solicita a mesma prova de adesão à República e de como em acatado as instituições políticas e sociais vigentes, merecendo de parte da vereação o testemunho de sua lealdade, uma vez "que sempre tem mostrado a mais franca adesão". Mera formalidade ou uma opção de vinculação política dos funcionários? Em 4 de Abril de 1931 eclodiu a Revolta da Madeira, que nem chegou a manter o poder nas mãos dos revolucionários durante um mês. Foi um intervalo de tempo sem qualquer actividade da Vereação. A 6 de Abril o advogado Manuel Francisco Sargo Júnior por ordem de 5 de Abril do comandante dos revoltosos, Adalberto Gastão de Sousa Dias tomou posse do cargo de presidente da comissão administrativa. A 4 de Maio estava de regresso a comissão anterior à revolta que considerou sem efeito a posse provisória do dia 8 de Abril. A primeira atitude da Vereação foi o envio de um telegrama ao Presidente da República e ao Governo "saudando-os pelo restabelecimento das verdadeiras liberdades indispensáveis ao ressurgimento de Portugal". O concelho foi local de deportação de apenas um dos intervenientes na Revolta. O Dr. Manuel Maria de França ficou com residência fixa no concelho por ordem do Comando Militar da Madeira, acompanhado de dois guardas civisclx. Quanto ao decreto nº 19595 que demitia todos os funcionários que tomaram parte no movimento revolucionário de 4 de Abril, não está documentado o seu efeito sobre quem quer que seja da Câmara. A Revolta foi apenas um movimento urbano e as gentes do Norte e os dirigentes municipais pautaram-se pela total abstenção. A partir daqui entra-se num novo ciclo conhecido como do Estado Novo, pautado por uma insistente divulgação dos seus valores, culto de personalidade do Prof. Oliveira Salazar e total lealdade das instituições, expressa nas diversas manifestações de apoio ou de adesão plena aos eventos que pautariam a propaganda e plena afirmação do regime, isto é, o 28 de Maio e o 1 de Dezembro.

Em 1934clxia nova vereação eleita, em telegrama ao governo, manifesta a "intensão firme de realizar uma obra seja um novo padrão a atestar o Estado Novo". No mesmo ano comemorou-se com elevada pompa e circunstância o 1 de Dezembro, data que evoca a restauração da monarquia portuguesa. Na Câmara houve uma sessão solene e as crianças das escolas das três freguesias desfilaram na Vila, sendo depois servido um lanche com doces da casa Indiana do Funchalclxii. A partir de 1939clxiii a cerimónia ficou a cargo da Mocidade Portuguesa. O culto a personalidade de Salazar está expresso na difusão da sua foto, que chega também a S. Vicenteclxiv, e nas múltiplas manifestações de apoio e homenagem que será alvo. O terceiro ano à parte de Presidência do Concelho é motivo para festejar, reunidos populares de S. Vicente e de Ponta Delgada, ponde à disposição uma camioneta para se deslocarem à vilaclxv. Em 1937 celebra-se pela primeira vez o 10 de Junho, considerado do jubileu da raça, com festas e actos públicos de "evocação histórica e exaltação patriótica, em homenagem ao genio de Camões". O início da década de quarenta é pautado por uma grande festa de exaltação do patriotismo. Em plena guerra mundial e face a uma grave crise económica o governo teima em levar por diante a grande festa nacional de exaltação, tendo como ponto de partida duas efemérides: a criação da monarquia de Portugal e a restauração da monarquia. As cerimónias tiveram lugar em Lisboa mas ecoou a todo o país através da propaganda da Emissora Nacional. Para isso foi instalado nos Paços do Concelho um aparelho de telefonia com a finalidade de transmitir ao povo as festas das comemorações centenáriasclxvi. Na década de sessenta o 28 de Maio era evocado através de inúmeras manifestações onde se incluíam as inaugurações de obras públicasclxvii. Assim, em 1968clxviii no plano destas, que decorreu de 27 de Abril a 28 de Maio, tivemos no concelho as seguintes obras: caminho municipal de S. Cristóvão, caminho municipal das Feiteiras ás Ginjas. No mesmo ano Salazar caiu da cadeira e entrou em recta final o seu mandato. A vereação proclama mais uma vez a fidelidade, com um voto de melhoras e saúda o seu substituto, o Dr. Marcelo Caetanoclxix. Já da morte não vimos nada. Uma imperdoável omissão? O silêncio é também a palavra de ordem para a Vereação que chega ao 25 de Abril de 1974. A reunião do mesmo dia decorreu dentro da normalidade sem qualquer referência ao momento que se vivia e repete-se na seguinte a 9 de Maio. Apenas a 23 a Câmara acusa a recepção da circular nº 1897 de 13 de Maio do Governo Autónomo do Distrito com o programa do Movimento das Forças Armadas e a recomendação de "que a actuação deste corpo administrativo se processe em rigorosa observância com os princípios nele claramente definidos". À vereação de 27 de Junho não compareceram o presidente e vice-presidente, sendo a presidência assegurada pelo vereador mais velho, Julião Maria de França Andrade. A 10 de Outubro é nomeada uma comissão presidida por José Damásio Caldeira. Dá-se aqui início a nova fase de mudança que ficou estatuída com a constituição de 1976 da qual somos hoje beneficiários. A 12 de Dezembro de 1976 tiveram lugar as primeiras eleições autárquicas sendo Gabriel Drumond o primeiro presidente eleito do novo regime e que aí permaneceu até 1996, altura em que renunciou ao mandato para assumir as funções de deputado à Assembleia Legislativa Regional. A presença das autoridades superiores do distrito ou do Governo Central era igualmente um movimento de propaganda ao regime, através das diversas manifestações que ocorreram. As visitas do Governador Civil foram mais assíduas estando documentadas as de 1868clxx, 1926clxxi,

1942clxxii, 1943clxxiii e 1949clxxiv. Somente na década de sessenta tivemos representantes do Governo Central em visita ao concelho. Em 1962 foi apoteótica a recepção ao Presidente da República, que mobilizou muitos munícipes à festa popular de recepçãoclxxv. Depois foi o Presidente do Conselho de Ministros, o Dr. Marcelo Caetano, a ser alvo de idêntica manifestaçãoclxxvi.

AS SINDICÂNCIAS

O século XX é marcado por duas situações de anormais que conduziram a uma sindicância. Em 8 de Agosto de 1930 o ajudante do registo Civil, João Nunes de Freitas tomou a seu cargo a comissão administrativa da Câmara e da conta de gerência. Estamos perante uma situação excepcional fundamentada nas graves irregularidades que haviam sido dadas a conhecer por Ramon Rodrigues, Vogal da Junta Geral, nomeado para tal. De acordo com o relatório da visita à Câmara no dia 5 de Agosto encontrou "os serviços da mesma num estado deprolavelmente desleixado e irregular" de que eram responsáveis os funcionários e a comissão administrativa. A última acta da Vereação está datada de 9 de Março de 1929clxxvii, os orçamentos de 1929 e 1930 não foram aprovados devidamente, não havia registo da correspondência desde 29 de Junho de 1929. Baseado em tudo isto propõe-se a imediata suspensão da comissão e alguns funcionários, pois caso contrário "proporá ao Governo Central a extinção imediata deste concelho". A nova comissão administrativa, composta de João Nunes de Freiras, Manuel Maria de França carvalho e António João Catanho promete "o esforço máximo.... para uma boa e honesta administração do município e uma boa regularização dos respectivos serviços". O resultado da sindicância aos funcionários ficou lavrado na Vereação de 16 de Fevereiro de 1931: o chefe da secretaria e o da secção administrativa foram aposentados compulsivamente, enquanto os dois amanuenses tiveram cinco meses de suspensão. Todavia um dos últimos foi alvo de processo judicial em 1931clxxviii por haver falsificado a assinatura nos recibos do imposto "ad-valorem" de 3% nos recibos de 1924 da manteiga da empresa Martins e Rebelo. Já na década de sessenta fala-se de novo em idênticos problemas com o chefe de secretaria que ficou suspensoclxxix até à conclusão do inquérito que levou à reforma compulsivaclxxx. A Vereação, talvez temerosa de ser atingida por mais este inquérito, dá conta da obra levada a cabo na construção de estradas e edifícios públicos "e tudo o mais que contribuiu para elevar o concelho de São Vicente a um dos mais progressivos da Madeira"clxxxi. São estas as ténues manchas negras num passado de dedicação à causa do concelho. São a excepção que apenas confirma a regra de que a vereação foi sempre entregue a personalidades combativas e empenhadas na causa comum.

COMPOSIÇÃO DA VEREAÇÃO 1868-1974

ANO PRESIDENTE VICEPRESIDENTE VOGAIS 1868-69 Caetano José Barbeito Andrade João José de Aguiar Faria João Joaquim de Canha, João Fernandes

Figueira, Manuel Gomes de Andrade 1870-71 Francisco José de Sousa João de Sousa Brazão Junior, António de

Gouveia Brazão, Joaquim dos Reis Pestana

1872-73 Valério José de Abreu Francisco Manuel de Andrade José Gomes Andrade, Caetano JoséBarbeito de Andrade, José Fernandes Figueira

1874-75 António Francisco da Silva Branco

Francisco Manuel de andrade Luís Joaquim de Freitas, Fidélio Joaquim Canha, José Gomes de Andrade

1876-77 Januário José Gomes Candido Lusitano França Andrade João José de Sousa, José Gomes Andrade, Luís Joaquim de Freitas

1878-81 Januário José de Aguiar António João Francisco de Vasconcelos

José Joaquim de Freitas França, Manuel Ribeiro de Andrade, Sebastião José de Faria dos Reis

1881-83 Januário José de Aguiar Francisco Manuel Andrade Manuel Nunes, José Joaquim de Freitas França, Manuel Joaquim de Gouveia Brazão, José Marques de Andrade

1882-85 José Maria Curado de Vasconcelos

Januário José de Aguiar João José de Sousa, José Joaquim de Freitas França, Manuel Nunes, Francisco Manuel Andrade

1884-87 Francisco José de Sousa António João Francisco de Vasconcelos, João de Sousa Brazão

João José de Sousa, José Joaquim e Freitas França, Manuel Francisco de Freitas, Manuel Ribeiro Andrade Junior

1886-89 Dr. Carlos João de Sousa Francisco José de Sousa, António Francisco de Silva Branco

António Francisco da Silva Branco, José Maria Figueira, José Francisco de Freitas Martins

1890-92 Dr. Carlos João de Sousa Manuel Joaquim de França Andrade Candido Mendes Dinis, Manuel Nunes, José de Andrade

1892 Manuel Joaquim de França José de Andrade Manuel Nunes, Carlos João de Sousa, Candido Manuel Dinis

1893 Candido Mendes Dinis João José Nunes António João Francisco de Vasconcelos, João José de Vasconcelos, Vicente José de Aguiar

1896 Pe. Frederico Augusto Freitas Valerio Martinho Abreu Manuel Nunes, Daniel de Sousa Brazão, Candido Lusitano de França Andrade Junior, Francisco Vicente das Canas, António José Figueiras

1898 Pe. Frederico Augusto Freitas Manuel Nunes Manuel José de Sousa, José Marques de Andrade, Valério António Andrade, José Maria Dinis Andrade

1899-1901

Caetano António José França João José Nunes Valério António Andrade, João Fidélio de Canha, José Maria Dinis de Andrade

1902-4 Daniel Brazão Machado José Fidélio de Canha João José Nunes, Manuel Maria da França Carvalho, Manuel Francisco de Freitas

1905-06 Pe. Casemiro Augusto Freitas Abreu

Valério António de Andrade Manuel Maria França de Carvalho, Candido António Gonçalves, Manuel Maria de Silva Gouveia Brazão

1907 Valério António de Andrade Candido António Gonçalves

1908 Valério de Silva Brazão Manuel Candido Andrade Ernesto Firmino da Silva Branco, Domingos António de Sousa Manuel Francisco de Andrade

1908-10 Ernesto Firmino da Silva Branco Frederico César de Freitas Manuel Candido Andrade, Domingos António Sousa

1910-11 Manuel Candido de Andrade Frederico César de Freitas Jacinto António Freitas, José Fernandes Nunes, Domingos António Sousa, Ernesto Firmino da Silva Branco

1912 Vicente Teodoro Freitas Mauricio de Ponte Machado Manuel Silva Brazão, João José de Sousa, Vicente Teodoro de Freitas, Frederico César de Freitas, José Fernandes Neves

1912-13 Dr. João Gregório da Silva António de Gouveia Brazão Manuel José da Silva, Manuel Pestana, António Nepomuceno Andrade, Manuel Francisco de Faria, Jacinto Agostinho Freitas

1913 Valério António Andrade Francisco Ribeiro Andrade Ricardo Silvestre Freitas França, Leandro Julio Drumond

1914 Dr. João Gregório de Silva Manuel Francisco de Faria Jacinto Agostinho Freitas, João de Andrade Junior, António Gouveia Brazão Junior

1916 Dr. João Gregório de Silva Jacinto Agostinho de Freitas João de Andrade Junior, João de Agrela Junior, António Eleutério Caldeira

1917 Dr. João gregório de Silva Leandro Julio Drumond João de Andrade Junior, Jacinto Agostinho de Freitas, Eleutério Caldeira

1918 Dr. Fernando Mendes Esmeraldo Manuel Francisco de Faria Manuel Rodrigues Sousa, António J. Andrade Oliveira

1919 Dr. Daniel Brasão Machado Manuel Maria de França Carvalho Manuel de Silva G. Brazão, João Gonçalvez Victal

1919-20 José Maria Dinis de Andrade Leandro Julio Drumond Jacinto Agostinho de Freitas, António Eleutério Caldeira, João Andrade Junior

1920 José Joaquim Viveiros Manuel Francisco de Faria António Jordão de Andrade Oliveira, João Andrade Junior

1921-22 Manuel Francisco de Faria Manuel Rodrigues Sousa António Jordão Andrade Oliveira, João de Andrade Junior

1923 Pe. António de Silva Figueira Francisco Maria de França Pe. Daniel Nicolau Sousa, António João Catanho

1924 Dr. Heliodoro H. de Sousa, Valério António de Andrade Junior

João Pestana Martinho Valério António Andrade, Manuel Rodrigues Gouveia, António João Catanho

1926 Manuel Nunes de Freitas, Daniel Maria de França

José Fernandes Neves, Nuno Cecilio Silva Branco

1927 Dr. José Maria de Conceição Carvalho

António Norberto Ornelas, Daniel Brazão Machado, Horácio, Brazão Machado

1930 João Nunes de Freitas Manuel Maria de França Carvalho António João Catanho

1932 Horácio Brazão Machado António João Catanho, Manuel Maria França Carvalho

1933 Horácio Brazão Machado António Norberto Ornelas

1934 Horácio Brazão Machado Fernando Gouveia Brazão, Bento Gomes Junior

1934 Ernesto F. de Silva Branco António França Abreu, Jacinto Agostinho Freitas

1937 Horácio de Sousa Brazão José Gabriel Brazão Andrade, António França Abreu

1939 Horácio de Sousa Brazão José Gabriel Brazão Machado António França Abreu

1942-46 Carlos Eduardo Rego, Jaime Ferdinando Pestanaclxxxii

João Sabino de Gouveia, Horácio Brazão Machado

1947-54 Dr. Manuel de Conceição Escórcio

António Jordão Andrade de Oliveira, Francisco de Assis de Freitas

1954-58 Engº João da Cruz Fidélio Canha António Jordão Andrade de Oliveiraclxxxiii

António Jordão Andrade de Oliveira Francisco Assis de Freitas Albino Sousa Dinis

1959-61 Eng. Agrónomo João da Cruz Fidelio Cunha

António Jordão Andrade, Manuel Maria Carvalho

1962-63 1964-67

Dr. Alcino Daniel Julio Drumond Ernesto Teotónio da Silva Branco António Jordão Andrade Oliveira, Manuel Maria Carvalho

1968-71 Dr. Alcino Daniel Julio Drumond Ernesto Teotónio da Silva Branco Manuel Maria Carvalho, Manuel Francisco Faria

1971 Engº Narciso Laureano Branco Ernesto Teotónio da Silva Branco Manuel Maria Carvalho, Manuel Francisco Faria

1972 Ernesto Teotónio da Silva Branco Manuel Maria Carvalho, Manuel Francisco Faria

1973 Manuel Francisco Faria Gabriel Paulo Drumond Esmeraldo Manuel Maria Carvalho, Julião Maria França Andrade

1974 Julião Maria de França Machadoclxxxiv

José Damasio Caldeiraclxxxv

Artur Correia da Silva, Manuel José

RENDIMENTOS DA CÂMARA EM IMPOSTOS

ANO AGUA

RDENTE

VINHO CARNE PEIXE CAÇA COIROS BALANÇA

TAXAS RENDA TERRA

IMP. INDIRECTOS

1869/ 1870

340.000 40.000 50.000 10.150 440$150

1870/71 41.600 398.550

1871/72 43.000 468.000

1876/77 353.600

1877 402.100

1878 165.100

1878 300.000

1880 403.600

1881 323.600

1882 521.000

1884 563.900

1885 511.00

1887 565.000

1888 434.320

1892 302.500

1894 351.700

1895 360.00

1896 806.200

1897 814.500

1898 222.000 15.120 60.200 601.100

1899 81.000 2.400 603.300

1900 2.450 6.110 680.100

1901 305.595 820.000

1902 6.420 990.000

1903 8.110 999.050

1904 8.110 100.000

1906 898.800

1907 865.100

1908 942.194

1909 895.140

1910 895.200

1911 913.100

1912 834.600

1913 926.100

1914 11.180$02

1915 1.350$50

1916 1.507$20

1917 1.187$00

1918 1.454$00

1919 1.348$30

1920 1.800$00

1921 997$30

1922 2.000$00

1923 5.010$00

1924 13.400$00

1925 2.468.00 14.036.63

1926 6.026$00

1929 5.505$00

1931/32 13.110$00

1932 15.000$00 450$00

1933 18.061$00

1934 15.480$00

1935 10208$00

1936 14.000$00 700$00

1937 7.512$00

1938 1.006$00

1939 16.910$00 1.014$00

1940 17.310$00 1.500$00

1941 18.660$00 2.000$00

1942 21.522$00 2.221$00 352$00

1943 2.650$00 2.206$00 303$00

1944 23.820$00 4.200$00 4.027$00 1.900$00 1.221$00

1945 28.000$00 4.700$00 3.555$00 2.200$00

1946 23.010$00 2.701$00

1948 20.110$00 2.000$00

1949 18.121$00 1.760$00 1.950$00 2.500$00

1950 20.100$00clxxxvi

1957 28.050$00 4.600$00 610$00

1958 58.104$00 14.310$00 9.111$00

1960 62.100$00 13.525$00 8.831$00 604$00

1963 48.000$00 10.040$00 2.500$00

1964 60.000$00 6.800$00

1965 78.000$00 15.050$00 10.000$00

i. Documento de 26 de Maio de 1771 refere-o (ARM, Notários, nº 1980, fl. 104). ii. ARM, C.M. de Machico, nº 117, fl. 2. iii. AHU. Documentos Avulsos não classificados. iv. Eduardo Castro e Almeida, Achivo de Marinha e Ultramar Madeira e Porto Santo, Vol. II, p. 165, Docs. nº 8311-316. v Vereação de 3 de Fevereiro vi. Vereação de 19 de Outubro de 1895. vii. Vereação de 1901 viii. Vereação de 22 de Setembro. ix. Vereação de 28 de Novembro, 16 de Janeiro e 9 de Abril de 1960. x. Vereação de 25 de Outubro. xi. Vereação de 14 de Março de 1896. xii. Vereação de 26 de Janeiro xiii. Vereação de 28 de Novembro de 1896, 13 de Janeiro de 1897. xiv. Vereação de 6 de Novembro de 1897. xv. Vereação de 10 de dezembro de 1928. xvi. Vereação de 17 de Novembro de 1930. xvii. Vereação de 16 de Fevereiro de 1931. xviii. Vereação de 8 de Junho de 1931 e 12 de Abril de 1934. xix. Eram proprietários: Georgina Teixeira Rebelo de Lima e Cunha, Henrique Gregório de Andrade, Gregório Pedro de Andrade. xx. Vereação de 19 de Abril de 1934. xxi. Vereação de 23 de Agosto de 1934. xxii. Vereação de 24 de Fevereiro. xxiii. Propriedade de José Damásio Caldeira, Maria Aurora de Silva Caldeira, Dr. Manuel Teodoro Caldeira. xxiv. Vereação de 18 de Janeiro de 1896. xxv. Vereação de 18 de Fevereiro de 1911. xxvi. Vereação de 18 de Novembro. xxvii. Vereação de 23 de Janeiro de 1923. xxviii. Vereação de 27 de Fevereiro. xxix. Vereação de 14 de Abril. xxx. Código Administrativo de 18 de Março de 1842, ed. anotada, Lisboa, 1865. xxxi. Vereação de 17 de Novembro de 1869, 1 e 15 de Dezembro de 1869. xxxii. Vereação de 30 de Janeiro de 1872. xxxiii. Vereação de 16 de Março de 1870. xxxiv. Vereação de 3 de Fevereiro de 1872. xxxv . CMSV, lº 6, fl. 49, 23 de Dezembro de 1891 xxxvi. CMSV, lº 4, fl.24, 29 de Dezembro de 1879, lº.5, fls. 58-58vº, 23 de Dezembro de 1885 xxxvii. Vereação de 24 de Outubro e 7 de Novembro de 1878. xxxviii. Cf. Código Administrativo aprovado por decreto com força de lei de 17 de Julho de 1886, Porto, 1886. xxxix. Vereação de 3 de Dezembro de 1895. xl. Vereação de 11 e 20 de Junho, 31 de Outubro de 1896. xli. Vereação de 12 de Fevereiro de 1898. xlii. Vereação de 19 de Novembro de 1898. xliii. Vereação de 2 de Janeiro e 27 de Fevereiro de 1908. xlivxliv. Vereação de 2 de Janeiro. xlv. Vereação de 25 de Abril. xlvi. Vereação de 2 de Janeiro de 1914. xlvii. Vereação de 21 de Janeiro de 1921. xlviii. Vereação de 26 de Maio de 1928. xlix. Estatutos dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1972 l. Vereação de 8 de Junho de 1942. li. Vereação de 15 de Março. lii. Horácio Bento de Gouveia, Crónicas do Norte, Ponta Delgada, 1994, p.156 liii. Vereação de 2 de Dezembro. liv. Vereação de 17 de Janeiro. lv. Vereação de 2 de Janeiro. lvi. Vereação de 24 de Novembro de 1910. lvii. Vereação de 2 de Janeiro de 1923. lviii. Vereação de 2 de Janeiro. lix Vereação de 19 de Julho lx. Em 26 de Março de 1876 as sessões ordinárias serão às terças-feiras, mas a 1 de Junho passou para a quinta-feira, e a 2 de Agosto para a quarta-feira. lxi. Vereação de 17 de Janeiro de 1874, 8 de Janeiro de 1898. lxii. Vereação de 8 de Junho de 1876. lxiii. Vereação de 23 de Setembro de 1868. lxiv. Vereação de 13, 20, 27 de Janeiro. lxv. Vereação de 2 de Janeiro de 1926. lxvi. Vereação de 9 de Novembro de 1868, 4 de Fevereiro de 1869, 30 de Março de 1870. lxvii. Vereação de 16 de Novembro. lxviii. Vereação de 11 de Novembro de 1893. lxix. Vereação de 9 de Novembro de 1868. lxx. Vereação de 7 e 19 de Outubro de 1870. lxxi. Vereação de 7 de Julho de 1869. lxxii. Vereação de 19 de Abril de 1871.

lxxiii Vereação de 26 de Janeiro lxxiv. Vereação de 27 de Fevereiro de 1908. lxxv. Vereação de 6 e 13 de Março. lxxvi. Vereação de 13 de Janeiro de 1966. lxxvii. Vereação de 2 de Dezembro de 1868. lxxviii. CMSV, lº 6, fls. 73vº-74, 26 de Março de 1892 lxxix. Vereação de 31 de Outubro de 1873. lxxx. Vereação de 10 de Novembro. lxxxi. Vereação de 11 de Outubro. lxxxii. Vereação de 4 de Janeiro. lxxxiii. Vereação de 29 de Abril. lxxxiv. Vereação de 11 de Outubro de 1871. lxxxv. Vereação de 6 de Novembro de 1879 e 22 de Abril de 1880. lxxxvi. Vereação de 7 de Setembro de 1872. lxxxvii. Semanário official, 13 de Janeiro de 1856. lxxxviii. Vereação de 27 de Julho de 1876. lxxxix. Vereação de 5 de Agosto de 1880, 6 de Fevereiro de 1875. xc. Vereação de 28 de Fevereiro de 1889, 22 de Fevereiro de 1890. xci. Vereação de 23 de Junho de 1869. xcii. Vereação de 21 de Setembro de 1870. xciii. Vereação de 18 de Abril de 1874. xciv. Vereação de 16 de Dezembro de 1939. xcv. Vereação de 15 de Novembro. xcvi. Vereação de 3 de Dezembro de 1898. xcvii. Vereação de 27 de Novembro de 1943, 27 de Novembro de 1948. xcviii. Vereação de 4 de Janeiro. xcix. Vereação de 15 de Fevereiro de 1934. c. Vereação de 3 de Agosto de 1946. ci. Vereação de 25 de Janeiro de 1873. cii. Vereação de 22 de Dezembro de 1927. ciii. Vereação de 23 de Junho. civ. Vereação de 21 de Janeiro. cv. Vereação de 13 de Dezembro de 1902, 27 de Junho de 1935. cvi . Vereação de 13 de Março de 1880 cvii Vereação de 29 de Setembro e seis de Outubro cviii . Vereação de 27 de Outubro de 1988 cix Vereação de 3 de Novembro cx. Vereação de 25 de Novembro de 1868. cxi. Vereação de 30 de Dezembro de 1899. cxii. Vereação de 5 de Dezembro de 1942, 27 de Novembro de 1943. cxiii. Vereação de 5 de Fevereiro e 30 de Setembro de 1920. cxiv. Por semestre. cxv. Vereação de 19 de Julho de 1868, 14 de Novembro de 1885. cxvi. Vereação de 7 de Junho de 1934. cxvii. Vereação de 11 de Maio de 1870. cxviii. Vereação de 2 de Maio de 1877. cxix .De 1 de Julho a 23 de Novembro cxx. Lº 7, fl. 72 carta de 20 de Maio de 1868. cxxi. Lº 6, fl. 7, carta de 7 de Abril de 1868. cxxii. Lº 7, fl. 70vº, carta de 16 de Abril de 1866. cxxiii. Lº 7, fl 92vº, carta de 20 de Agosto de 1868. cxxiv. Lº 7, fl. 106, carta de 11 de Dezembro de 1868. cxxv. Vereação de 10 de Março de 1869. cxxvi Vereação de 13 de Março cxxvii ACMSV, lº 13, fls. 25, 12 de Janeiro de 1897 cxxviii .Ibidem, fls. 60-60vº, 7 de Fevereiro cxxix .ACMSV, lº 13, fls. 31-33, 20 de Março, 22 e 29 de Abril de 1911 cxxx. Vereação de 13 de Maio de 1880. cxxxi. Vereação de 25 de Novembro de 1880. cxxxii. Vereação de 21 de Dezembro de 1921, 29 de Dezembro de 1923, 21 de Janeiro e 5 de Abril de 1924. cxxxiii. Vereação de 14 de Abril de 1923. cxxxiv. Vereação de 19 de Julho de 1924. cxxxv. Vereação de 9 de Janeiro de 1911. cxxxvi. Vereação de 11 de Março de 1920. cxxxvii. Vereação de 12 de Maio de 1921. cxxxviii. Vereação de 27 de Novembro de 1943. cxxxix. Vereação de 13 de Janeiro de 1951. cxl. Vereação de 19 de Outubro de 1959. cxli. Vereação de 5 de Janeiro de 1881. cxlii. Vereação de 31 de Março de 1910. cxliii. Vereação de 3 de Março de 1928. cxliv. Vereação de 28 de Janeiro de 1928. cxlv. Vereação de 23 de Dezembro de 1932, 7 de Março de 1935. cxlvi. Vereação de 17 de Janeiro de 1963. cxlvii. Vereação de 28 de Março, 16 de Agosto de 1963 e 5 de Novembro de 1964. cxlviii. Vereação de 30 de Março de 1878. cxlix. Vereação de 4 de Maio de 1878.

cl. Vereação de 30 de Março de 1878 e 6 de Julho de 1905. cli. Vereação de 1 de Setembro de 1869, 31 de Agosto de 1870, 21 de Julho de 1871, 14 de Janeiro de 1886, 21 de Outubro de 1893. clii. Vereação de 13 de Fevereiro de 1892. cliii. Vereação de 18 de Março de 1893. cliv. Vereação de 27 de Maio de 1918. clv. Vereação de 10 de Fevereiro de 1940. clvi. Vereação de 14 de Junho de 1941. clvii. Vereação de 6 de Fevereiro, 6 e 21 de Maio de 1908. clviii. Vereação de 30 de Junho de 1921. clix. Vereação de 18 de Dezembro. clx. Vereação de 4 de Maio de 1931. clxi. Vereação de 5 de Setembro. clxii. Vereação de 15 de Novembro e 13 de Dezembro de 1934. clxiii. Vereação de 25 de Novembro. clxiv. Vereação de 17 de Setembro de 1934. clxv. Vereação de 18 de Julho e 5 de Setembro de 1935. clxvi. Vereação de 27 de Janeiro, 8 de Junho e 14 de Setembro de 1940. clxvii. Vereação de 1 de Junho de 1967. clxviii.Vereação de 8 de Fevereiro de 1968. clxix. Vereação de 26 de Setembro de 1968. clxx. Vereação de 19 de Julho e 12 de Agosto de 1868. clxxi. Vereação de 29 de Maio. clxxii. Vereação de 29 de Agosto. clxxiii. Vereação de 2 de Outubro e 27 de Novembro. clxxiv. Vereação de 10 de Setembro de 1949. clxxv. Vereação de 25 de Julho, 16 de Agosto e 27 de Setembro de 1962. clxxvi. Vereação de 11 de Dezembro de 1969. clxxvii. Vereação de 8 de Agosto de 1930. Aliàs, o delegado do Governo Civil encarregado do inquérito encontrou o livro de actas abandonado "e sem quaisquer referências às sessões posteriores" (Vereação de 5 de Agosto de 1930). clxxviii. Vereação de 27 de Julho de 1931. clxxix. Vereação de 27 de Agosto de 1960. clxxx. Vereação de 7 de Janeiro de 1961. clxxxi. Vereação de 14 de Novembro de 1960. clxxxii. Desde 8 de Junho clxxxiii . De Abril a Agosto clxxxiv Posse a 8 de Agosto clxxxv Posse a 10 de Outubro

clxxxvi. Inclui peixe.O QUOTIDIANO

À mesa das sessões concelhias chegam também assuntos que fazem o dia à dia mais rotineiro dos munícipes. Por um lado é a necessidade de intervenção da vereação no sentido de padronizar comportamentos, de solidificar usos e costumes, a que se associam as insistentes reclamações ou denúncias de alguns dos residentes. Nesta dupla intervenção e participação faz-se o quotidiano do concelho de que são testemunho as actas da vereação e a memória oral. Reconstituir essa realidade, através dos poucos testemunhos que chegaram até nós através das vereações é o objectivo desta digressão pelo quotidiano de ontem no concelho de S. Vicente. A tarefa não é fácil, uma vez que nem tudo aquilo que define o dia à dia de uma vila opu concelho não passa obrigatoriamente pelas sessões da câmara. Aí só tem lugar o imprevisto, o desvio e, quando a vereação pretende ter uma activa intervenção nisso, os aspectos mais prementes que se podem submeter à intervenção institucional. Mesmo assim, à falta de memórias escritas daqueles que viveram e compuseram tais ambientes, esta continuará a ser uma das fontes possíveis do seu rastreio. Aqui, para as épocas mais recentes, o testemunho oral, compilado através das mediáticas técnicas da História Oral, prestam um inestimável serviço. Por agora deixamos de parte esta forma, esperando voltar a ela noutra oportunidade.

NASCER, SOBREVIVER E MORRER

No último quartel do século XIX é evidente um decréscimo da população, mais acentuado no período de 1878-90. Note-se que este foi um momento muito crítico para a ilha em que se fizeram sentir os reflexos do ataque da filoxera aos vinhedos e num concelho como o de S. Vicente em que era a cultura dominante da economia local o efeito foi imediato. Os dados sobre a população do concelho são escassos, pois tão pouco as actas das vereações serão o meio mais indicado. Todavia, por diversas razões à necessidade de apelar a esse valor, quer na distribuição dos recrutas, do dinheiro para o reparo dos caminhos e da criação de novos postos escolares. A dar razão ao que dizemos somos confrontados na vereação de 27 de Julho de 1876 com alguns dados significativos sobre a população do concelho:

FREGUESIA ALMAS RECRUTAS MENORES

S.VICENTE 4720 4 11 PONTA DELGADA 1345 1 3 BOAVENTURA 2455 3 5 Eis, ainda alguns dados avulsos que conseguimos reunir e que poderão elucidar sobre a evolução demográfica de S. Vicente em finais do século XIX: ANO Nascimentos casamentos óbitos emigrantes 1886 331 74 166 288 1887 344 54 110 107 1888 358 57 221 434 1889 302 71 237 154 1890 368 93 222 171 Para o ano de 1898clxxxvi é também possível definir a divisão da população nas três freguesias do concelho era de 8270 assim distribuída: Ponta Delgada: 1362 Boaventura: 2230 S. Vicente: 4678 A emigração acontece na encosta Norte a exemplo da Sul e tem os mesmos destinos.. Assim, em finais do século XIX, um dos momentos desusados do fenómeno o principal destino era o Brasil, com particular incidência para as cidades de Rio de Janeiro e Santos. Apenas para o período de 1888 a 1893 é possível reconstituir esse movimento através do único livro de registo de saídas para o Brasil, disponível no Arquivo Municipal.

DESTINO 1888 1889 1890 1891 1892 1893 S. Paulo 43 17 20 17 11 7Rio de Janeiro 14 13 10 4 1Santos 1 3 16 6 15BRASIL 30 3 2 8 12 1TOTAL 88 36 32 55 29 24 A distribuição por freguesias é a seguinte: FREGUESIA 1888 1889 1890 1891 1892 1892 1893 TOTALS. Vicente 42 21 25 38 1 1 2 130

Ponta Delgada 16 11 8 23 58Boaventura 7 5 4 1 17TOTAL 65 26 29 49 10 25 Um dos factos mais salientes é a emigração massiva de casais. Assim temos referência à saída de oitenta no período de 1888 a 1893. No presente século a evolução da população do concelho define-se por um crescimento acentuado até à década de sessenta, altura em que o movimento sofre o impacto do fenómeno emigratório, é evidente a partir de 1955.

S. Vicente Ponta Delgada Boaventura Total 1864 -- --- --- 7490 1900 4 896 1 291 1 934 8 121 1910 5 462 1 413 1 667 8 542 1920 5 426 1 521 2 199 9 146 1930 5 444 1 792 - 9 684 1940 6 383 2 033 - 11 474 1950 - - - 12 521 1960 - - - 11 603 É, na verdade, a partir de finais da década de quarenta o fenómeno emigratório ganha importância no concelho. As sequelas económicas da 2ª grande guerra mundial fizeram-se sentir no norte da ilha de modo que quando se abriram as portas da emigração na América, nomeadamente no Brasil, Venezuela e Curaçau. Para este último destino o recrutamento contou com o apoio do Governo Civilclxxxvi. Esta política manteve-se para todos os destinos carentes de mão-de-obra, como o Brasil e Venezuela, em que os consulados no Funchal actuavam como angariadores de potenciais emigrantesclxxxvi. No caso do Brasil apenas contavam as profissões recomendadas, havendo tolerância no de saber ler e escrever. A situação num concelho como S. Vicente pautado pelo analfabetismo terá sido muito saudado por muitos dos residentesclxxxvi. Na luta contra o tempo de busca de um destino para suprir as dificuldades sentidas na ilha. A esperança do "El Dourado" causou uma desusada movimentação de interessados em partir em busca de melhor destino. Os boatos tendenciosos procuram constar esta esperança ao afirmarem restrições a este movimento. O Governo Civil, um dos principais incentivadores da política prontifica-se a negá-loclxxxvi. Nos finais da década de cinquenta o principal destino era a Venezuela, tendo mesmo o cônsul ido ao concelho no seu automóvel a cativar os possíveis interessadosclxxxvi. A década seguinte é demarcada por um novo destino, a União Sul Africana, que também atraiu muitos vicentinosclxxxvi

As colónias portuguesas em África foram também um destino que cativou muitos dos vicentinos. Desde a década de quarentaclxxxvi que se emigrava para Angola mas foi nos anos sessenta que o governo promoveu a saída de famílias para Colonato, como o do Limpopoclxxxvi. Horácio Bento de Gouveia traça-nos em “O torna-viagem” o drama e aventura dos emigrantes do concelho. O cenário é a Achada do castanheiro em Boaventura, mas pode muito bem ser transferido a qualquer sítio do concelho. O acto de morrer, por muito entregue à igreja, passou a contar com a intervenção do município. A lei que determinou a criação dos cemitérios públicos e acaba com a prática dos

enterramentos no subsolo do adro e igreja é de 1835. Tardou muito tempo até que todas as paróquias fossem servidas. A resistência da igreja e das populações levaram a que se fossem adiando esta solução. No concelho primeiro lançavam-se os cemitérios da Vila e só em 1869clxxxvi o de Ponta Delgada e passados três anos o de Boaventuraclxxxvi. O último em 1875clxxxvi acusava já a exiguidade do espaço levando à construção de um novo em 1876clxxxvi. O serviço de transporte dos doentes e enterramento era assegurado pelo município. Na verdade o cemitério era património municipal, estando por isso sob a alçada da vereação que atribuía o terreno aos interessados para as campas e superintendia a acção do coveiroclxxxvi. Em 1888 clxxxvi tinha um soldo estabelecido de acordo com o serviço prestado. Assim aos pobres não cobrava nada sendo os demais sujeitos a uma taxa de enterramento de acordo como ele ocorria. Um morto com mais de 10 anos que fosse enterrado com caixão pagava 1$600 rs, sendo sem caixão baixava para metade. No caso dos menores de 10 anos os valores eram respectivamente, $600 e $200 réis. Daqui resulta que nem todos tinham meios para serem enterrados num caixão de madeira, sendo apenas envolvidos num lençol. Deste modo a Câmara viu-se obrigada a dispor de dois caixões em cada freguesia para transporte dos defuntos de casa até aos cemitério. Os de Boaventura custaram 197$80 réis no ano de 1923clxxxvi. O serviço dos coveiros no cemitério deu azo a frequentes queixas dos moradores e a permanente insatisfação da Câmara com serviços prestados pelo coveiro. Sucederam-se várias recomendações e regulamentos que estabeleciam a forma de funcionamento. O último regulamento é de 1942clxxxvi e estabelece a obrigatoriedade de existência de um coveiro em cada cemitério e o modo que deve reger a sua actividade. A par disso a Câmara terá três livros de registo de óbitos, um para cada cemitério. Enquanto o de S. Vicente ficará na Câmara os demais estarão a cargo dos regedores de cada freguesia.

A ARTE DE BEM VIVER CURAR E APOIAR

As condições de vida no norte da ilha não eram diferentes das do resto da ilha. A evolução acompanhou o demais, sendo pautada por um significativo progresso. Uma das medidas mais importantes a ter em conta na época prendia-se com a prevenção. As condições sanitárias das habitações e acima de tudo dos aglomerados como a Vila não eram as melhores. No último caso a época invernosa tornava as ruas da Vila num palco de imundice, sendo constante o apelo à limpeza das regadeiras e ao calcetamentoclxxxvi. Incluso junto ao adro da igreja estava um pardieiro que, para além de albergar todo o lixo local, era esconderijo de malfeitores que assaltavam de noite os transeuntes. A solução foi expropriar o terreno, ficando para momento oportuno os sanitários, o que só veio a ocorrer em 1964clxxxvi pelo valor de 95.188$00. As ruas da Vila eram limpas com assiduidade por Maria Cândida que em 1897 recebia 36$640 reis para executar tal tarefa. As melhorias significativas nas condições de vida dos munícipes são apenas visíveis a partir da década de trinta. A cobertura de palha cede lugar ao barro e adiciona-se nas proximidades um novo compartimento, que depois passará a fazer parte dos planos da casa. Note-se que, quer na construção da retrete, quer do palheiro para gado o médico municipal deveria informar da conveniência e localizaçãoclxxxvi.

De acordo com um edital de 1935clxxxvi todos aqueles que tivessem casa para construir deveria solicitar a referida licença e pagar uma taxa de 30$00, pois caso contrário sujeitavam-se á pena demolição. O mesmo sucedia com as reparações, sujeitando-se o arguido à pena de 500$00 réis e à sua demoliçãoclxxxvi. Foi o que sucedeu em 1966clxxxvi com a comissão fabriqueira da Igreja da Boaventura que procedeu ao arranjo do adro sem ter licença camarária. A preocupação do asseio incluía também a preservação dos edifícios. Deste modo em 1937clxxxvi todos os proprietários de prédios na Vila são intimados a caiar e pintar as fachadas sob pena de 150$00. A medida repete-se em 1946 e 1952, abrangendo também os prédios confinantes com as estradas nacionais e municipais clxxxvi. Já nos anos sessenta são as recomendações no sentido de cor a usar na pintura, que deveriam constar do pedidoclxxxvi. O período que decorre entre meados do século dezanove e as primeiras décadas do nosso século foram marcadas por inúmeras epidemias que alastraram a toda a ilha. Em 1856 a colera morbus levou à morte de 307 vicentinos. Passados vinte anos foi a vez da varíola que voltou de novo a vitimar muitos madeirenses. Em S. Vicente refere-se a 1 de Junho que a epidemia matou várias pessoas, o que leva a Câmara a reclamar apoio, pois "não temos um só facultativo a quem se recaira". A 15 de Julho estava em exercício um facultativo no concelho, António Fernandes Telles da Silva, que atestou o estado precário de saúde de Manuel José de Sousa, incapacitado para continuar a ser o tesoureiro da arca dos órfãos. A epidemia de varíola manteve-se activa por muito tempo, sentindo-se os reflexos em S. Vicente e Boaventura no ano de 1876clxxxvi, sendo o serviço redobrado. Deste modo o Governo Civil contribuiu com 90$200 réisclxxxvi, atingindo em Novembro mais de cinquenta mil reis, que englobavam as referentes aos medicamentos, farmácia e uso da redeclxxxvi. À varíola, que pouco atingiu o concelho, sucedeu a "influenza", que por um período limitado causou inúmeras dificuldades. Deste modo em 23 de Abril o administrador do concelho clama por providências e meios ao facultativo, pois a "epedemia se acha já grassando em grande escala nos differentes sítios desta freguezia”. O facultativo, Afonso Henriques de Freitas ignorou a situação, sendo por isso mesmo despedido pela vereação em 17 de Maio, sendo substituído a 31 de Outubro por Manuel Sardinha que residia na Ribeira Brava e que prestava serviço na Ponta do Sol. A vereação pontassolense não queria facilitar a saída mas as insistências do administrador do concelho junto do Governador, reclamando um médico capaz de attender á grande quantidade de doentes que se acham atacados de moléstia"clxxxvi, conduziu foi bem atendido e o concelho foi servido temporariamente de vários médicos. Em Janeiro e Fevereiro o Concelho tinha dois facultativos: Manuel Joaquim Ferreira, de Santa Cruzclxxxvi Manuel Sardinha e o farmacêutico Tomás Loureiro Machado. A 27 de Fevereiro a doença estava extinta procedendo a vereação ao pagamento das despesas. Ao facultativo Manuel Joaquim Ferreira e ao farmacêutico Tomás Ribeiro Machado por vinte e oito dias de trabalho intenso receberam, respectivamente, 280$000 e 84$00, enquanto Manuel Sardinha por apenas sete dias teve direito a 42$000 rsclxxxvi. Também as despesas com estadia e deslocação em rede no concelho corriam por conta da Câmaraclxxxvi. A varíola está de volta á ilha em 1907, mas sem atingir de forma significativa a corte do norte. As medidas profiláticas sucedem-se atempadamente por recomendação do Delegado de Saúde. Atente-se, por exemplo, às condições de sanidade das ruas da vila, com o tirar de regadeiras para a sua limpeza, tudo isto devido às "epidemias que ameação esta população"clxxxvi. No Funchal criou-se um lazareto hospital que contou também com o contributo da vereação vicentinaclxxxvi.

A constância destas epidemias condicionou a intervenção do município no apoio à assistência médica. Em 1876 era apenas um facultativo que o assegurava em todo o concelho. Para deslocar-se nas três freguesias a casa dos doentes dispunha de um serviço de rede com dois homensclxxxvi. Era comprovada a sua insuficiência ao ser assegurado apenas por um médico. Em 24 de Outubro de 1877 o procurador do concelho insiste na criação de mais um lugar de facultativo. Todavia isso demorou a acontecer, servindo-se a Câmara do auxílio de médicos de Santa Cruz ou Porto Moniz. Em 1895clxxxvi o médico cirurgião do Porto Moniz, José Leite Monteiro ofereceu-se para de 15 em 15 dias permanecer 24 horas no concelho e atender os doentes. Como não havia facultativo no concelho a Câmara acedeu, pagando-lhe 10$000 réis mensalmenteclxxxvi. Em Setembro abriu-se concurso para o lugar de facultativo que foi preenchido a 21 do mesmo mês pelo Dr. Gregório Joaquim Dinis, que será até à sua morte em 1931 o médico do concelho. Em menos de um ano de exercício já o médico solicitava à Câmara licença para se ausentar por doença de modo "a procurar socorros médicos e lenitivo aos seus padecimentos onde a sciencia melhor o entender". Mas a vereação desconfiada dos seus propósitos, referindo ser sua intenção arranjar trabalho noutro lugarclxxxvi. Mesmo assim acedeu face ao oferecimento do médico cirurgião, Júlio César de Gouveia para o substituir na sua ausência que durou até 13 de Fevereiro de 1897clxxxvi. Entretanto as populações de Boaventura e Ponta Delgada, servidas quinzenalmente pelo médico do Porto Moniz, José Leite Monteiro, reclamam pelo mau serviço. As ausências são muitas e causam grandes transtornos aos moradores, por isso reclamam para que seja assinalado um dia "afim de que as pessoas doentes que o esperam para consulta não saiam enganados de suas casas com grave risco de saúde e vidas e esperá-lo"clxxxvi. Em 8 de Maio de 1898 os moradores de Ponta Delgada e Boaventura representam à Câmara a necessidade de ser criado mais um local de facultativo, sendo contra o aumento do vencimento do que já existia. A Câmara aceita a reclamação dos moradores, representados em Vereação por José Marques Andrade. Todavia não foi de ânimo leve que isso aconteceu, pois dois vereadores eram contrários a isso alegando que o requerimento não deveria merecer crédito, uma vez que parte substancial das 106 assinaturas eram de crianças das escolas de Ponta Delgada, Boaventuraclxxxvi. Deste modo ficou expresso em acta de vereação esta desavença: "a Câmara obrigara os seus munícipes a fazerem valer os seus direitos onde chegarem as suas forças e mostrara em ocasião oportuna o seu desagrado de uma forma bem manifesta"clxxxvi. Só em 1901clxxxvi foi feito concurso para novo facultativo sendo provido no lugar o médico Daniel Brazão Machado, que foi substituído em 1904clxxxvi por João Maria S. Correia Macedo. O século vinte inaugura-se com melhorias na prestação médica. São dois os facultativos ao serviço do concelho e outros mais que se prestam a auxiliar quando necessário. Em 1901clxxxvi são referidos quatro facultativos. Mais tarde, em 1930clxxxvi o Dr. Fernando Mendes Esmeraldo estabelece consultório na Ribeira do Passo, Lombo, Fajã do Amo, Poiso, Terra Chã, Vila, Fajã da Areia e Cardais. Não aufere qualquer remuneração do concelho, apenas exigindo o pagamento dos medicamentos receitados aos pobres. Passados dois anos assume o lugar de Daniel Brazão Machado que havia solicitado a escusa de facultativo municipalclxxxvi. O lugar em Ponta Delgada foi preenchido em 1941 por Manuel de Conceição Escórcio. As infraestruturas concelhias de apoio à saúde foram sempre precárias. Em momentos de epidemia, como 1856, improvisavam-se hospitais. A par disso, por muito tempo, não existiu farmácia, sendo os medicamentos solicitados ao Funchal, com inevitáveis inconvenientes de custos e de perda de tempo. Para atalhar a isto houve uma preocupação por parte do município em favorecer o aparecimento de novos meios de apoio. Sabe-se que em 1949 já existia a Farmácia do Norte e que o ajudante de farmácia, Alberto Amâncio de Freitas abriu uma nova na Vilaclxxxvi. Por outro lado nos anos cinquenta o governador civil solicita o "imediato interesse

em que se poderia instalar neste concelho um pequeno estabelecimento hospitalar para atender os casos em que a gravidade da doença ou condições especiais de tratamento não exigissem uma hospitalização longa ou especializações médicas"clxxxvi. A aposta em infraestruturas de apoio seguia a bom ritmo. Em 1945 o Ministério da Saúde instalou em Boaventura um centro de sanidade rural e entre 1948 e 1968 foram criados os dispensários de S. Vicente(no Poiso), Ponta Delgada (nos Enxurros) e Boaventura (no Centro). Esta política de apoio à criança tem reflexos evidentes na taxa de mortalidade infantil que era então muito elevada. Note-se que em 1946 esta representava 19%, sendo em 1963 de apenas 2%. A Câmara assumiu o compromisso de pagar todas as despesas com os doentes pobres, que incluíam os medicamentos, o transporte ao hospital da misericórdia no Funchal, e a diária do período de internamento. Para que isso acontecesse o doente deveria ser acompanhado de um atestado de pobreza passado pela Câmaraclxxxvi. Em 1940 a Câmara pagou a António Francisco dos Reis, 15$00 pelo transporte de doentes nestas condições e aos doutores Fernando Mendes Esmeraldo de Gouveia e António de Silva Branco Camacho, respectivamente, 555$00 e 168$50 por despesas com medicamentos aos pobresclxxxvi. A situação não esteva isenta de problemas e aproveitamentos dos demais habitantes. Note-se que em 1911clxxxvi José Maria de Conceição Carvalho solicitara ao município um atestado de pobreza, mas a resposta foi taxativa: "é filho dum dos primeiros proprietários desta freguezia que se apresenta sempre trajando decentemente, trajando em rede apresentando-se como pessoa rica e abastada". A Vereação sentia-se obrigada a apoiar as famílias pobres, através de subsídios fixos ou eventuais. Assim em 1876clxxxvi Maria de Sousa do Lanço recebeu por nove meses um subsídio de 1$000 réis por "achar-se gravemente doente". Em 1940clxxxvi foi Vicente de Ponte do Cascalho que recebeu 100$00 por um incêndio ter ardido a casa onde morava e recheio "ficando assim reduzido à extrema miséria". Noutras circunstâncias as famílias pobres eram acudidas com milhoclxxxvi ou então géneros alimentícios de merceariaclxxxvi. Às crianças reservava o município dedicados apoios. Primeiro com o apoio e acolhimento indispensáveis à sobrevivência das crianças expostas. Depois no apoio às mães solteiras ou aquelas que não tinham posses para alimentação dos filhos recém-nascidos. As crianças expostas surgem ao lugar deste período nas mais diversas circunstâncias. Em 1869clxxxvi Maria Isabel notifica a Câmara do encontro de uma criança à porta de Vicente Pereira Rita, "dentro de uma cesta de verga branca, trazendo dois vestidos, um de chita e outro de caçada e arres, três camisas de pano de algudão coarado - cinco paninhos velhos - três paninhos de cabeça". A criança foi baptizada no dia 21 com o nome de Teresa sendo depois entregue a Maria César, que ficou como a ama. A 31 de março apareceu outra criança nas mesmas circunstâncias sendo apresentada por Maria Lúcia de Jesus. Ao município, mediante verba concedida pelo governo civilclxxxvi, estava acometido o encargo de assegurar a sobrevivência destas crianças. Os casos não são muitos, pois desde 1868 até 1905, temos apenas conhecimento de seis casos. Em termos administrativos estas crianças, que após baptizadas eram entregues a uma ama, eram conhecidas pelo número de registo no livro de expostos. Antero era o exposto nº 45 e estava entregue aos cuidados de Maria Quitéria. Em 1895clxxxvi tinha já sete anos e a ama clama pela continuidade do subsídio camarário uma vez que era pobre e "o mesmo exposto ser de fraca construcção e se não poder ocupar nos serviços de lavoura", de que viviam. Entretanto António Nunes, de Terra Chã, seu padrinho comprometia-

se "a criálo com todo o coidado e carinho", sendo aprovado pela Vereação que o obriga a apresentar todas vezes "afim de que esta conheça do bom ou mau tratamento que a criança estava tendo"clxxxvi. Em 1900clxxxvi tinha este exposto já 12 anos de idade mas manifestava-se incapaz para trabalhar de soldada, por ser doente e raquítico o que obrigaria a Câmara a recomendar a entrega ao asilo no Funchal. O mesmo não sucedia com António, o número 46, que por completar sete anos poderia ser posto de soldada, por "ter robustez suficiente para comessar a ganhar seu sustento", deste modo foi posto nesta circunstância na casa do Dr. Gregório Dinis com 5$000 rs ano. comida, vestuário e calçado, mas este não se agradou da mudança aceitando o convívio de ama com a mesma condiçãoclxxxvi. Outro exposto, por nome Mario e registado com o número 42, estava ao serviço do padre Manuel José de Sousa, mas acabou por ausentar-se de casa sem receber o soldo em dívida, que ficou nos cofres da Caixa Geral de Depósitos à guarda da Câmaraclxxxvi. Nem todas as crianças que nasciam no seio de famílias constituídas, tinha assegurada a sua sobrevivência. O estado de miséria condicionava a sobrevivência que só poderia ser assegurada mediante um apoio do município para a lactação. Este subsídio poderia ir até dois anos contemplava os filhos de mães solteiras ou outras que devido ao estado de pobreza ou "por ter secado do leite"clxxxvi não estavam em condições de garantir a sobrevivência. Este subsídio era atribuído, caso a caso mediante requerimento dos interessados à vereação. O valor era por norma distribuído mensalmente podendo oscilar entre os $800 e os 1$000 réis. Para o período de 1877 a 1928 temos conhecimento de 40 crianças nestas condições. São múltiplas as circunstâncias que legitimam este apoio. Em 1871clxxxvi Francisco, filho de Maria de Jesus das Ginjas, teve direito a 1$000 réis, "por esta ser pobre miserável e não poder alimentar aquelle seu filho". Para João Mendes do Poiso, o imprevisto de dois gémeos implicava a sua súplica, pois não tinha " meios para os poder sustentar"clxxxvi. Noutros casos a Vereação determinava retirar a criança do poder da mãe, como sucedeu com João filho de Jesuína Pestana das Feiteiras, "por não se achar em circunstâncias de o receber"clxxxvi. A Vereação estava responsável pela gerência deste apoio podendo retirá-lo a quem não oferecesse as condições merecidas. Assim Joaquina de Jesus, não obstante ser pobre e solteira, não teve o apoio que solicitou para o seu filho Leonel, uma vez "que se acha ella em estado de poder trabalharclxxxvi. Para Manuel da Costa Júnior o voltar atrás no subsídio já concedido resulta de o mesmo "não ser tão pobre como antes lhe disseram"clxxxvi.

DAR DE BEBER

O abastecimento de água é uma realidade de finais do século XIX. Até então o consumo fazia-se a partir das ribeiras e muitas levadas que circundavam as áreas agrícolas e tinham passagem obrigatória nos núcleos povoados. Em 1882clxxxvi havia apenas uma fonte em todo o concelho, estando sediada na Vila, mas que devido às invernias de Dezembro deixou de deitar água pelo que se decidiu avançar no ano imediato com a construção de um chafariz no Largo da Igreja por 120$00. Nos núcleos de maior povoamento, como as Feiteiras, deparam-se dificuldades no uso de água das levadas. Deste modo a Câmara decidiu construir um marco fontanário nas Feiteiras para evitar o uso de "águas menos puras de uma levada não só para beber como para uso doméstico. Que nesta levada lavam os habitantes daquelles sítios não só roupas como outros objectos que

damnificam as águas podendo dar causa ou origem a graves molestias".clxxxvi Tardou a construção uma vez que em 1899clxxxvi reclamavam os moradores pelo chafariz para fornecimento de água de uso doméstico. Na verdade a obra só se concretizou neste ano, sendo os trabalhos interrompidos em Dezembro devido ao mau tempo pelo que a conclusão ficou aprazada para 31 de Junho de 1900clxxxvi. O projecto da autoria do Eng. Adriano A. Trigo foi apresentado em Julhoclxxxvi à vereação e contemplava duas fases para a conclusão, sendo a arrematação do 1º traço até ao Livramento feita em 5 de Outubro por Francisco Marques do Lombo dos Aguiares por 592$000. O segundo troço entre o Livramento e as Feiteiras foi só arrematado a 11 de Maio do ano imediato ao mesmo pedreiro pelo valor de 506$900clxxxvi. Um dos grandes arautos deste serviço foi o médico Gregório Joaquim Dinis, subdelegado de saúde do concelho. É ele quem, em 1902clxxxvi, reclama a extensão do abastecimento de água potável aos sítios do Saramago e Passo. Ao mesmo tempo actua como olheiro do serviço, participando o roubo clandestino de água dos marcos fontanários por alguns moradores vizinhos. Em 1909clxxxvi o mesmo delegado de saúde reclama a reparação dos fontanários das Feiteiras e Livramento e alega a má qualidade da águaclxxxvi. A Câmara riposta, dizendo que a água que abastece os fontanários não é da ribeira mas de nascente e que o próprio reclamante serve-se dela em casa. Mais acusa o mesmo de ser responsável pela falta de águas nos referidos fontanários e disponibiliza-se para avançar com análises à água da nascente que servia há mais de 7 anos. É o mesmo delegado de saúde quem reclama em 1913clxxxvi medidas drásticas no abastecimento à Vila, com o encerramento dos marcos fontanários, "a bem da saúde pública". As freguesias de Ponta Delgada e Boaventura continuavam ainda sem o serviço. Deste modo em 1903clxxxvi reclama a canalização de água potável e a construção de marcos fontanários nos sítios do Ferreiro e Entrosa, na proximidade do adro da Igreja, a ser canalizada no Sítio da Fonte. Entretanto o Governador Civil em 1905clxxxvi recomendava alguns cuidados em termos de saúde pública. A Vereação informa do seu empenho nisso, através da construção de marcos fontanários, para os quais faltam recursos financeiros, reclamando à Junta Geral um subsídio de 600$00 para dois marcos fontanários na Boaventura e Fajã do Penedo e 1000$00 à Junta Agrícola para outro no Sítio da Igrejaclxxxvi. Este último foi construído pela Junta Geral mas não estava cumprindo bem o serviço, pois a água ficava "turva e aleitada" devido às regas, pelo que "não pode considerar-se potável e própria para o abastecimento, mas sim perigosa para a saúde pública e insalubre"clxxxvi. A situação não deverá ser alheia a deliberação da Junta em proceder à entrega dos fontanários que lhe pertenciamclxxxvi. O abastecimento de água a Boaventura não ficara solucionado e a partir da reclamação dos moradores parece que foi de pouco efeito o serviço prestado pela junta. Note-se que os moradores dos sítios da Igreja, Pastel e Serrão reclamavam da falta de água potável, sendo obrigados a abastecerem-se de águas insalubres e perigosas para a saúde ou procurá-las a grandes distânciasclxxxvi. A Câmara decide avançar com a referida canalização de água potável, contando que a oferta do projecto e das nascentes, cedidos por um grupo de moradoresclxxxvi. O plano tem como objectivo a construção de fontanários nos sítios do Pastel, Igreja, Serrão, Fajã do Penedo, Terceira Lombada e Falca. Em 1931clxxxvi estavam concluídos avançando-se com outros para a Falca e Fajã dos Vinháticos. Nos anos trinta o plano de construção de fontanários ficou reservado à freguesia de S. Vicente. Assim, em 1931clxxxvi foram os fontanários da Fajã do Amo, Barros e Ginjas. Seguem-se nos anos imediatos no Pé do Passoclxxxvi, Laranjalclxxxvi, Lançoclxxxvi, Ginjas- Caminho da

Madeiraclxxxvi, Achada do Tilclxxxvi e Rosárioclxxxvi. O abastecimento de água à Ginjas tornou-se problemático, pois a nascente mais próxima situava-se no Curral dos Burros, sendo oferecida por João Encarnação Gouveiaclxxxvi. Mas os moradores do Lanço, servidos por uma levada que vinha beber à nascente, reclamam os seus direitos só autorizando o aproveitamento para o fontanário, caso lhes fosse concedida parte da servidão da levada que pertence aos das Ginjasclxxxvi. O impasse deverá ter perdurado, pois em 1947clxxxvi o delegado de saúde refere que os fontanários em causa continuavam a ser alimentados com água das levadas. Em Ponta Delgada e Boaventura a rede alargava-se a todos os sítios com novos fontanários nos Enxurrosclxxxvi, Lombadaclxxxvi e Achada Grande, Fajã Grande e Travessa em Boaventuraclxxxvi. Se o abastecimento público através dos marcos fontanários pode ser considerado uma realidade do século XIX, o mesmo não sucederá com o domiciliário que data dos anos quarenta do nosso século. Até então o recurso era os fontanários, as levadas, ou a possibilidade, apenas para alguns, de aproveitamento dos sobejos das águas dos marcos fontanários. Este era apenas um privilégio daqueles que viviam próximo dos fontanários. Assim, em 1923 António Gonçalves está autorizado a aproveitar os sobejos da fonte da Vila, com a obrigação de conduzir água para a praça, açougue e matadouroclxxxvi. A par disso os senhorios do terreno onde se encontravam as nascentes e as ofereciam para o serviço público tinham direito aos sobejos. Assim, em 1931clxxxvi o Padre Plácido António Andrade oferece a água para o fontanário da Fajã do Amo, ficando com direito a dois meias penas. Idêntico foi o procedimento de Ernesto F. Branco do Lanço, então presidente da Câmara, que ofereceu o terreno e água para a construção do marco fontanário junto da casa de residênciaclxxxvi. Outros, como José Maria Banhos de Castro Rodrigues do Serrão (Boaventura) providenciavam o seu próprio abastecimento caseiroclxxxvi. A construção dos lavadoiros municipais enquadram-se na política de salubridade do concelho. Deste modo evitava-se o uso das levadas, que eram logradouro comum no serviço de água. É neste sentido que o município decidiu construir em 1938 três lavadoiros, sendo dois nas Feiteiras e o outro na Terra Chãclxxxvi. Aos demais vicentinos não servidos pela rede pública de fontanários restava o recurso da fonte ou então a disponibilidade de uma bilha e um copo para serviço de água como dispunha a secretaria da Câmaraclxxxvi. O simples gesto de abrir a torneira em casa é uma realidade apenas dos anos quarenta do nosso século. Desde 1947clxxxvi, à medida que o plano de canalização de água ao domicilio avança, sucedem-se os inúmeros pedidos de ligação por parte dos moradores abrangidos. O plano de abastecimento de água potável a S. Vicente e Ponta Delgada foi traçado em 1947 para ser levado a cabo a partir do ano imediatoclxxxvi. Todavia o de Ponta Delgada só foi adjudicado em 1950 a João Gomes Chamusca por 245.299$00clxxxvi. Quanto ao abastecimento de água a S. Vicente (aos sítios da Vila, Vargem, Loural, Saramago, Feiteiras, Passo e Poiso) a Câmara foi forçada a solicitar autorização ao governo para contrair um empréstimo de 388.000$00 junto da Caixa Geral de Depósitosclxxxvi. A obra foi adjudicada em 1951clxxxvi por Fernando pelo valor de 706.000$00. A rede aos poucos foi-se alargando. Em 1951clxxxvi foi a Fajã dos Vinháticos, adjudicada a António Francisco dos Reis por 64.900$00 e em 1959clxxxvi a 1ª fase de Boaventura ao mesmo empreiteiro no valor de 43.858$00. Nos anos sessenta aposta-se na remodelação da rede existente e na sua expansãoclxxxvi. No caso de S. Vicente a rede foi alargada à Fajã do Amo, Ginjas, Fajã da Areia e Cabo do Amoclxxxvi, enquanto em Boaventura contemplou a Achada do Castanheiro, Cabo da Ribeiraclxxxvi.

PLANO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA -FONTANÁRIOS

ANO FREGUESIA SÍTIO PREÇO EMPREITEIRO

1897 S. Vicente Feiteiras 506.900 Francisco Marques

S. Vicente Livramento 592.000 Francisco Marques

1914 Boaventura Fajã do Penedo 600$00

Boaventura Igreja 1000$00 1923 S. Vicente Fajã da Areia 400$00 1930 Boaventura Pastel pelo povo

Boaventura Igreja pelo povo

Boaventura Serrão pelo povo

Boaventura Fajã do penedo pelo povo

Boaventura Falca Administração directa

Boaventura 3ª Lombada Administração directa

1931 S. Vicente Fajã do Amo pelo povo

S. Vicente Lombo pelo povo

Barros

Boaventura Fajã dos Vinháticos Administração directa

1932 S. Vicente Pé do Passo Administração directa

1934 S. Vicente Laranjal Administração directa

S. Vicente Lanço 1935 S. Vicente Ginjas 1935 Ponta Delgada 2ª Lombada 1936 S. Vicente Ginjas(Caminho Madeira) 1947 S. Vicente Ginjas 360$00 Mestre José Rodrigues

1942 S. Vicente Poiso 145$00 pelo povo

1944 S. Vicente Achada do Til

Ponta Delgada Enxurros(2) 1946 S. Vicente Poiso

S. Vicente Vargem 1947 S. Vicente Passo

S. Vicente Saramago

S. Vicente Feiteiras (matadouro)

S. Vicente Achada do Til

S. Vicente Serrado

S. Vicente Rosário 1948 Ponta Delgada Lombada 24.600$00

Boaventura Achada Grande

Boaventura Achada

Boaventura Travessa 1951 S. Vicente Chão dos Louros 145$00

PLANO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA AO DOMICÍLIO

ANO FREGUESI

A SÍTIO PREÇO EMPREITEIRO

1950 Ponta Delgada

Ponta Delgada 245.299$00 João Gomes Chamusca

1951 S. Vicente Vargem , Loural, Saramago, Feiteiras Passo Fajã dos Vinháticos

706.000$00 64.900$00

Fernando Teodósio Ferreira António Francisco dos Reis

1959 Boaventura 1ª fase 43.858$00 António Francisco dos Reis

1968 S. Vicente Fajã do Amo e Ginjas 255.800$00 António Francisco dos Reis

1970 S. Vicente Fajã de Areia 1.040.000$00 António Francisco dos Reis

1972 Boaventura 2ª fase-Achada Castanheiro, Cabo Ribeira, Igreja

3.150.000$00 Cipriano da Cruz

DO ESCURO SE FEZ LUZ

Foi a 28 de Maio de 1956 que se inaugurou na freguesia de S. Vicente a primeira fase do projecto de electrificação do concelhoclxxxvi. Não era a primeira vez que os vicentinos tomavam contacto com este benéfico usufruto. O petróleo e a cera haviam já dado lugar em algumas casas pela invenção da electricidade. A mais antiga referência á iluminação pública é de 1896. Em Marçoclxxxvi deste ano a Câmara instalou 8 candeeiros e respectivo ferro nas ruas da Vila que custaram á Câmara 90$730clxxxvi. Os vidros e os ferros para os candeeiros vieram do Funchal para a Ribeira Brava, sendo daí transportados ás costas por Pedro Gonçalves da Costa que recebeu pelo serviço 6$000clxxxvi. No ano imediato o serviço alargou-se até à Terra Chãclxxxvi, seguindo-se depois em 1904 às freguesias de Ponta Delgada e Boaventura. A Câmara adquiriu 15 candeeiros no valor de 50$000, sendo 10 para Ponta Delgada e os restantes para Boaventuraclxxxvi. Ponta Delgada teve direito a mais oito para serviço da estrada que ligava ao portoclxxxvi. Em 1906clxxxvi a Câmara torna a investir 40$000 na iluminação de Ponta Delgada baseada no facto de que seria de "grande utilidade pública por occasião dos arraes que alli se realisam onde concorre grande

número de romeiros de rodas as freguezias da ilha, evitando assim muitos escandalos e desordens". Em 1910 instalou-se um novo candeeiro na Vila e no ano imediato a comissão municipal do Funchal oferece oito candeeiros que deixou de utilizar na iluminação pública da cidadeclxxxvi. Ainda em 1913clxxxvi adquiriram-se mais dois candeeiros para a Vila, mas as condições de iluminação continuavam a ser insuficientes pelo que em 1931clxxxvi a Câmara decidiu comprar um "petromax" de 1200 velas com o seu aparelho para montagem na beira da Terra Chã para iluminar a Vila. Montado o serviço de iluminação a petróleo era necessário pô-lo a funcionar e assegurar a sua manutenção. Neste sentido foi posto a concurso o serviço, mas como na primeira oferta ninguém apareceu a Câmara decidiu faze-lo por conta própria, mandando comprar o petróleo ao Funchal, por ser mais barato, e contratando uma pessoa de confiança para fazer a limpeza dos candeeiros, acendendo-os e apagando-os a horas competentesclxxxvi. No primeiro ano o serviço na Vila era prestado por Manuel Pereira que recebeu pelo serviço no primeiro trimestre 3$200clxxxvi, sendo já em 1904 encarregado de acender os ditos candeeiros Prefiro Pereira que auferia um salário de 12$000rsclxxxvi. A partir de 1908clxxxvi o encargo passou para António Faria que o manteve até 1916 altura em que foi posta a praça a iluminação das três freguesias do concelho, com o valor global de 140$00, dividido da seguinte forma: S. Vicente - 60$ Ponta Delgada - 30$ Boaventura - 30$ Já em 1914 as despesas de iluminação do concelho foram 170$00, assim distribuídas: S. Vicente - 70$00 Ponta Delgada - 60$00 Boaventura - 40$00 O recurso e benefício da energia eléctrica surgiu muito cedo na Madeira, pois data de 1897. Todavia, tardou muito tempo o seu alargamento a toda a ilha. Foi necessário chegarmos aos anos quarenta para que se avançasse com o plano, através da Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira, criada em 1943 mas que entrou em pleno exercício de funções no ano imediato. S.Vicente foi um concelho pioneiro na utilização do serviço, pois desde muito cedo tivemos algumas iniciativas particulares. A primeira tentativa data de 1917clxxxvi, altura em que Benjamim Teixeira de Aguiar e João Francisco de Andrade solicitaram à Câmara a cedência da água da levada velha das Feiteiras para montagem de uma turbina hidráulica para o fornecimento de energia eléctrica. A este junta-se o do Dr. Gregório Dinis, facultativo do concelho, que por esta altura deveria ter montado uma central hidroeléctrica no sítio do Pé de Corrida, com material importado directamente de Alemanha. A Central produzia energia para iluminação das ruas do sítio das Feiteiras a casa do proprietário e alguns vizinhos e serragem de Carlos França, que funcionava no sítio do Teatro, e outra do próprio dono junto da casa de habitação. Em Novembro de 1931clxxxvi a Vereação vicentina manifestava-se interessada numa instalação de energia eléctrica para iluminação da Vila. Na mira deveria estar a central do Dr. Gregório Dinis, que faleceu em 20 de Dezembro do ano. Tanto assim era que em Dezembro de 1932clxxxvi a Câmara decide negociar com a família e o Banco Nacional Ultramarino a compra. A 5 de Março de 1933 a Vereação, mediante proposta do presidente, João Nunes de Freitas, decidiu

adquirir a central hidroeléctrica do sítio da Corrida e a rede, solicitando para o efeito o apoio financeiro da Junta Geral, onde se salientava "a necessidade e vantagens de aproveitar uma tal oportunidade de realização de um tão grande benefício público". Para a compra a câmara necessitava de 100.000$00, mas a Junta Geral só avançou com um décimo pelo que o processo se foi atrasandoclxxxvi. Entretanto a central havia já sido tomada pelo Banco Nacional Ultramarino por hipoteca, decorrendo as negociações da venda com esta entidadeclxxxvi. A câmara em 1937clxxxvi ofereceu apenas 40.000$00 o que não satisfez os responsáveis do banco e levou ao desmantelamento e venda para a Ponta de Sol. Ainda, na freguesia de S. Vicente a tradição popular e alguns vestígios evidentes testemunham a existência de outras quatro pequenas centrais para usufruto privado: Cooperativa dos Lacticínios do Norte no Passassol, Manuel Filipe de Andrade no Passo, Manuel Francisco Faria na Vargem e José Martinho de Freitas nos Lameiros. Em Vereação apenas está documentada outra iniciativa mas em Boaventura para fornecimento de energia eléctrica à Igreja paroquial. Sabemos da existência pelo simples facto de a estrada municipal entre S. Cristóvão e a Achada do Castanheiro ter atravessado a conduta de águaclxxxvi. Isto obrigou a um desvio que reverteu numa quebra de rendimento na produção de energia, pelo que o pároco solicitou uma indemnizaçãoclxxxvi. A partir dos anos cinquenta chegou finalmente a energia eléctrica ao concelho e lançou-se a rede pública de abastecimento que foi inaugurada na freguesia de S. Vicente em 28 de Maio de 1956, sendo o primeiro resultado do contrato assinado em 12 de Novembro de 1955 entre o presidente da Câmara e a Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos de Madeiraclxxxvi. Concluídos os quatros postos de transformação avançou-se para as freguesias de Ponta Delgada e Boaventura. Na primeira a montagem da rede ficou pronta em Outubro de 1957clxxxvi, enquanto em Boaventura só ocorreu em Dezembro de 1959clxxxvi. Esta última obra adjudicada a António Francisco dos Reis foi inaugurada pelo Governador Civil com pompa e circunstância, tendo-se queimado fogo no valor de 1 530$00. As despesas com a iluminação pública eram da responsabilidade da Câmara, sendo os custos referentes ao mês de Dezembro de 1959 assim distribuídos: S. Vicente 1.893$90 Ponta Delgada 1.538$10 Boaventura 1.674$80 Total 5.106$80

ARTE DE SABER LER ESCREVER E CONTAR

O ensino foi também um dos sectores privilegiados de intervenção do município, mas mesmo assim não foi capaz de os atacar com a força desejada. O principal problema prende-se desde o início com a falta de edifícios escolares. Deste modo havia necessidade de recorrer a edifícios de habitação sem quaisquer condições para esta função e situados, a maior parte das vezes, em locais pouco adequados. Acresce ainda que a separação das crianças por sexo e a proibição de mistura no recinto da escola aumentar as dificuldades de escola das instalações mais adequadas. As instalações, sua conservação e mobília, o pagamento do salário dos professores e casa eram da competência da Câmaraclxxxvi. Deste modo em 1877clxxxvi o comissário de estudo refere que o concurso para a nova escola régia da freguesia depende do facto de a Câmara dar a

mobília e casa. Apenas num lapso de tempo a responsabilidade ficou endossada às Juntas de Paróquia, de acordo com portaria de 6 de Dezembro de 1880clxxxvi. Nova lei fez retornar tal encargo às Câmaras. De acordo com isto os moradores de Boaventura reclamavam em 1888clxxxvi uma escola de ensino elementar do sexo masculino, oferecendo a casa e mobília. Por falta de pessoa habilitada a Câmara proveu interinamente o Padre António Alves Camacho, única pessoa habilitada para tal, no que foi confirmado pela junta escolar com ordenado de 100$000 ao anoclxxxvi Em 1928clxxxvi é a professora diplomada Ida Freitas Nascimento a propor à Câmara a criação da escola móvel nas Ginjas, oferecendo para o efeito casa e mobília, com a condição de ser nomeada professora. Em 1902clxxxvi insiste-se na precaridade das instalações escolares, e da necessidade de construção de edifícios para a escola e residência dos professores em Ponta Delgada. O edifício onde funcionava a escola do sexo masculino e feminino não oferecia condições pois tinha o "inconveniente mistura de sexos" devida a ter apenas uma entradaclxxxvi. A solução estava no desdobramento das escolas, acabando com as mistasclxxxvi. Esta e outras situações resultantes da falta de casas de aluguer levaram a Vereação a insistir na necessidade de construção de edifícios escolaresclxxxvi. Assim em 1915clxxxvi a Vereação insiste junto do Ministro da Instrução Pública na necessidade de dois novos edifícios para escola mista na Vila e Feiteiras. Em 1944clxxxvi a Câmara baseada na elevada renda avaliada em 35.000$00 que pagava com as escolas decide contrair um empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos no valor de 400.000$00 para executar as obras de construção das escolas primárias do concelho integradas no plano dos centenários de 1943. Em 1947clxxxvi a Junta Geral assumiu a responsabilidade, propondo a Câmara a construção dos seguintes edifícios: em S. Vicente nas Feiteiras e Poiso; em Boaventura na Fajã do Penedo e Ponta Delgada nas Terças. Passados dez anos avançou-se com novos edifícios na Falca, Terceira Lombada e Lameirosclxxxvi. Nos anos sessenta a quarta fase do plano dos centenários contempla novas escolas: Boaventura: Lombo do Urzal, Igreja, Fajã Grande; Ponta Delgada: Lombada; S. Vicente: Lanço. Todavia os projectos que estão em curso são os de Terceira Lombada, Serrado, Achada do Castanheiro e Igreja em Boaventura, Ribeira Grande em S. Vicente. Em 1942 o concelho de S. Vicente tinha 24 escolas em funcionamento sendo o plano de criação de 38, o que é indicativo de uma aposta preferencial do município no ensinoclxxxvi. Todavia a frequência escolar era ainda baixa uma vez que de 1503 crianças em idade escolar, apenas 883(isto é 59%) frequentavam a escola: M F total alunos matriculados 509 374 883 crianças em idade escolar 749 754 1503 Total 1258 1128 ---- O recenseamento das crianças em idade escolar era feito pelas Juntas de Paróquia nos primeiros quinze dias de Fevereiroclxxxvi. A matrícula tinha lugar entre os dias 1 e 15 de Outubro, após um mês de fériasclxxxvi. Em 1882clxxxvi o período escolar consistia de 5 horas diárias divididas pela manhã e tarde: 9h às 11h30m e 12h às 14h30m. Todavia em 1918clxxxvi o professor da escola da vila solicitou que o horário de abertura fosse atrasado de uma hora "em virtude de muitas crianças morarem distante da escola". O número de alunos suplantou sempre o desejável, nunca se conseguindo acompanhar o ritmo de crescimento populacional. Assim em 1878clxxxvi a escola da Vila apresentava-se com 39 alunas, mas o número subiu para 70 em 1894clxxxvi não havendo nas salas disponíveis lotação para mais de metade. Deste modo a Câmara reclama em 1890clxxxvi uma nova escola mista para

as Feiteiras, uma vez "que as escolas actuaes não são suficientes para o progresso e desenvolvimento da instrução pública". A situação conduziu a insistentes reclamações da Câmara para a construção de novas escolas na Vargem, Loural, Lameiros, Laranjal, Ginjas e Poiso em S. Vicente, Primeira Lombada em Ponta Delgada, Fajã do Penedo e Falca em Boaventura. As crianças em idade escolar no concelho eram em 1928clxxxvi de 1209 sendo 282 em Boaventura, 213 em Ponta Delgada e 714 em S. Vicente. Note-se que em 1927clxxxvi o professor oficial de escola das Feiteiras referia ser a escola muito frequentada por mais de 50 alunos e que apenas dispunha de 30 lugares. Em 1932clxxxvi a frequência de alunos à escola da Vila era superior a 60 alunos, tendo-se procedido ao desdobramento da escola mista. Nos anos cinquenta já não se proclama o elevado número de alunos. Muitos, por imposição familiar deixam de frequentar a escola, por isso a Direcção Escolar impôs multas aos pais dos faltosos no valor de 50$00clxxxvi. O empenho na alfabetização dos jovens era uma das grandes apostas da câmara que considerava como um passo fundamental para o progresso do concelho. Deste modo em 1923clxxxvi criou um prémio escolar para os melhores alunos e o necessário apoio para aqueles que não tendo posses pretendessem estudar. O serviço de assistência social às crianças só foi implementado na década de sessenta. Desde 1962clxxxvi que a Câmara assumiu o encargo da cantina escolar, sendo então criadas três, uma para cada freguesia. Em Novembro o Director do Distrito escolar reclamava um subsídio para a cantina escolar de 197 crianças "cujas famílias vivem em precárias condições económicas", sendo concedido 10.000$00clxxxvi. Note-se que já em 1902clxxxvi o professor da escola de S. Vicente reclamara perante a Câmara apoio para fato e calçado das crianças pobres que frequentavam a escola. O problema do analfabetismo entre os adultos era grave, situando-se em 1944clxxxvi em mais de 84% da população. Ademais é insistente esta denúncia da realidade sócio-cultural do Norte. Assim em 1903clxxxvi o professor de S. Vicente oferece-se para o ensino gratuito nocturno "para poder diminuir a onda de analfabetos que nos envergonha perante as nações cultas". Em 1902clxxxvi no pedido de uma escola móvel para o sítio da Vargem vêm de novo a denúncia a justificar a criação: "visto a grande quantidade de analfabetos de ambos os sexos que ha em todas as idades...". Na década de cinquenta apostou-se de novo na alfabetização de adultos, criando-se postos a partir de 16 de Março de 1953 nas escolas femininas da Fajã do Penedo, Falca, Serrado, Vargem e Vila, e masculinas da Fajã do Penedo, Lameiros, Vargem e Vilaclxxxvi. A realidade era também alvo de reclamação popular, o que denota a inexistência de absentismo mas sim a falta de condições político-governamentais para acabar com o problema. Em 1898clxxxvi face à inexistência de uma escola do sexo masculino a vereação reconhece os "clamores dos pais que desejam educar seus filhos". Para o combater existiam as escolas nocturnas de educação popular, conhecidas desde muito cedoclxxxvi. Sabe-se apenas que o referido curso nocturno funcionou em Boaventura, mediante uma despesa feita na compra de um candeeiro de iluminaçãoclxxxvi. Entretanto o professor de S. Vicente movido do objectivo de "diminuir a onda de analfabetos que nos envergonha perante as nações cultas" decidiu criar um curso nocturno, regendo de forma gratuita, sendo a única despesa da Câmara de apenas 40$000 nas instalaçõesclxxxvi. Uma vez que as escolas oficiais não eram suficientes, muitos pais socorriam-se de escolas particulares, quando as havia. Em 1890clxxxvi a professora Emília de França Doria era detentora de uma destas escolas de ensino primário nas Feiteiras, frequentada por 30 crianças. A Câmara

decidiu por isso mesmo atribuir-lhe um subsídio anual de 90$000. A primeira experiência conhecida de ensino secundário em S. Vicente, ocorreu em 1916clxxxvi, altura em que o professor oficial do sexo masculino solicitou à Câmara autorização para ensinar na escola fora da hora do expediente o 1ª ano do liceu. O vencimento que auferia era reduzido, não obstante ter direito a casa paga. ANO VENCIMENTO ANUAL 1878 10$000 rs 1884 120$000 rs 1889 175$000 rs Finalmente em 1964clxxxvi por proposta do Presidente da Câmara pretendia-se criar um colégio ou instituto de ensino secundário que beneficiava também os concelhos de Porto Moniz e Santana. Deste modo com base no nº 3 do artigo 48 do Código Administrativo a Vereação decidiu propor o Instituto ou Colégio Secundário Municipal, solicitando-se apoio à Fundação Calouste Gulbenkianclxxxvi o referido colégio foi instalado no edifício que até 1965 serviu de escola primáriaclxxxvi. Em 1906clxxxvi o Professor da freguesia de S. Vicente viu-se forçado a cultivar o terreno adjacente à escola, plantando algumas parreiras, no que não teve sorte, uma vez terminado o arrendamento camarário o senhorio cortou-as. O custeamento da residência fazia-se mediante a disponibilidade de casa ou então de uma quantia em dinheiro, ficando este com o encargo de buscá-la. A última situação poderia reverter em desfavor do beneficiário. Assim sucedeu em 1893clxxxvi com Francisco Augusto da Silva que ao solicitar 24$000 ano para as despesas de aluguer da casa de residência só recebeu da Câmara 18$000. A isto acrescem as gratificações resultantes do serviço de exames, que em 1882clxxxvi era de 1400 réis por aluno, e as referentes à participação em sessões de conferências pedagógicas no Funchal. A Câmara concedia-lhe ajudas de custo no valor de 1000 réis diários, incluídos os dias de ida e regressoclxxxvi. Esta participação, a ausência por qualquer motivo só poderia acontecer mediante prévia autorização da Câmara pois, caso contrário, o professor arriscava-se a perder o vencimento. Foi isso que aconteceu a Faustino Veríssimo Ornelas que em 1884clxxxvi foi multado em 8 000 rs por se ter ausentado 10 dias úteis. Em face disto acabou por pedir a exoneração sendo substituído por Daniel Maria de Françaclxxxvi. As despesas com o ensino contemplavam assim o arrendamento da casa para a escola e residência do professor, o material didáctico e a mobília, os vencimentos e ajudas de custo dos professores. De acordo com portaria de 6 de Dezembro de 1880 estas passaram para as Juntas de Paróquia, regressando às Câmaras com nova lei de 1897clxxxvi. Em 1900clxxxvi o orçamento camarário para a instrução primária contemplava 1 513$685 réis subindo passado dez anos para 2 114$800 clxxxvi e atingindo o dobro em 1911clxxxvi. Parte significativa deste valor era gasto no aluguer de casas. Para 1929clxxxvi a despesa com aluguer anual de casas distribuía-se da seguinte forma: FREGUESIA LOCAL DESCRIÇÃO RENDA Boaventura Igreja Escola 70$00 Beira Escola e residência 120$00Ponta Delgada Pico Escola 40$00 Terreiro Escola e residência 120$00S. Vicente Feiteiras Escola e residência 360$00

Em 1944clxxxvi era de 35 000$00 o pagamento feito pela Câmara aos senhorios proprietários de edifícios onde funcionavam as diversas escolas, o que tornava urgente uma política de construção de edifícios escolares. O encontro de um edifício para arrendamento era já um problema e quando se exigia dela algumas condições de uso e de localização então as hipóteses poderiam considerar-se nulas. Em 1902clxxxvi procurava-se um edifício para escola nas Feiteiras por ser um local central e acessível a todas as crianças de freguesia. A escolha recaiu numa casa de José Júlio Drumond Junior, que não oferecia todas as condições para a finalidade pretendida. Mesmo assim fez o contrato de arrendamento por nove anos no valor de 190$000 réis, mediante a imposição de alguns melhoramentos, como sejam duas sentinas. No contrato em questão o proprietário ficava obrigado à manutenção do edifício, que consistia no retalhar e arranjar o soalho, sendo a reposição dos vidros partidos das janelas por conta da Câmara. Na década de sessenta deu-se um passo decisivo no avanço do ensino em S. Vicente com a criação de uma escola secundária, que contribuiu para que muitos jovens do Norte da ilha conseguissem avançar nos estudos e chegar até à universidade. Assim em 1964clxxxvi a Câmara , sob proposta do presidente decidiu criar um instituto ou colégio secundário municipal, solicitando-se apoio à Fundação Calouste Gulbenkian. Ligado ao ensino está a disponibilidades de livros e por sua vez de bibliotecas que os tornem acessíveis aos leitores interessados. A primeira referência que temos à existência de uma biblioteca no concelho data de 1896clxxxvi altura em que a câmara adquiriu os livros “Portugal em Africa” e fez a assinatura do “Jornal de Engenharia e Architectura” para a Biblioteca Popular. Todavia em 1934clxxxvi o presidente insiste na falta de uma biblioteca pública no concelho, mas passados dois anos quando Ministério do Interior recomenda uma circular de 24 de Março da Direcção Geral de Administração Política e Civil em que se apontava a necessidade de melhorar as bibliotecas existentes e caso não fosse caso disso de instalar uma, pois “que embora modesta é sempre de grande cultura” os vereadores limitaram-se a tomar conhecimento.clxxxvi Somente em 1966clxxxvi foi instalada uma Biblioteca itinerante da Fundação Calouste Gulbenkian no rés do chão da casa do Dr. José Maria Gonçalves Vieira.

A ARTE DE BEM RECEBER

O Norte nunca teve o mesmo número e assiduidade de visitantes que ocorriam à vertente sul. Todavia alguns atreviam-se a rumar à descoberta do norte, seguindo os sinuosos caminhos que o ligam ao Funchal. Desde meados do século XIX são frequentes as visitas de estrangeiros que aceitam o sacrifício. A circulação a pé entre o Norte e o Sul fazia-se por íngremes caminhos e para isso era necessário estabelecer casas de abrigo para socorrer os viajantes. O percurso entre o Sul e o Norte pelo Paúl da Serra estava servido de uma casa nos Estanquinhos, o estado de ruína em 1895clxxxvi obrigava ao imediato reparo, "para que aquella casa preste aos transeuntes que fazem viagens por aquella serra o abrigo que lhes é indispensável...". A casa era pertença das Câmaras de S. Vicente, Calheta e Ponta do Sol, sendo por isso mesmo a despesa paga por todos. Aí permanecia um guarda, em 1897, João Gonçalves, que zelava pela missão de apoio aos visitantes necessitados de ajudaclxxxvi. O estado de ruína e quase

abandono continuará até ao nosso século, altura em que Daniel Maria de França Brazão da Vargem solicitou à Câmara o direito de exploração por 9 anos, a partir de 1 de Janeiro de 1906. O mesmo depois de referir que estes "abrigos, tão úteis e precisos às pessoas que transitam por aquellas paragens" prontifica-se a proceder às necessárias reparações e à sua exploração. À Câmara competiria pagar ao guarda um salário de 6.000 rsclxxxvi. A Câmara depois de ouvidas as congéneres aceitou o contratoclxxxvi; o dito auferia por isso mesmo um vencimento de 48 000 rs ao anoclxxxvi. Todavia, não melhorou o serviço da casa dos Estanquinhos. Primeiro, a da Calheta reclama que o guarda "tem por muitos e muitos dias abandonado o seu lugar"clxxxvi e o concessionário servia-se de todos os subterfúgios para furtar-se a despesasclxxxvi. Terminado o prazo de concessão foi-lhe renovado de novo, sendo o ordenado aumentado de 72$000 para 84$000clxxxvi. Em Fevereiro de 1919clxxxvi o concessionário alega que devido ao seu estado de saúde não pode continuar com a casa a partir de então, passando-se tal concessão para Manuel Maria da Silva. Mesmo assim não melhorou a condição da casa, uma vez que em 1920clxxxvi estava muito danificada e o seu concessionário não cumpria com as clausulas do contrato que o obrigavam ao reparo. Deste modo a Câmara suspendeu o pagamento mensal da verba de manutençãoclxxxvi. A partir desta data desaparecem as notícias sobre a casa. A funcionalidade perdeu-se com a presença do automóvel e a abertura de estradas que reduziram as distâncias e conduziram para segundo plano os caminhos rurais. A iniciativa particular também é assinalada na prestação do serviço. Os estrangeiros que nos visitaram são testemunho disso. Na década de cinquenta era possível encontrar acomodação: em S. Vicente na casa de Manuel Joaquim da Costa Andrade e no Hotel do Sr. Dinis, enquanto em Ponta Delgada era a casa de José de Abreuclxxxvi. Em Boaventura é assinalado apenas a venda de Manuel Carvalhoclxxxvi. A esta junta-se em 1896clxxxviManuel Pereira da Silva, morador no Lombo do Urzal refere que " presta em casa, que é a última próxima da serra, auxilio aos transeuntes que por ali passam, fornecendo-lhes comida e bebida...", por isso mesmo pede a isenção no pagamento dos impostos sobre as bebidas que vende pois, caso contrário, acabará com a venda. A Câmara sabendo da utilidade do serviço despachou de modo passível o pedido. Em 1912clxxxvi Carlos José de Sousa Júnior solicitou à Câmara um subsídio para "fundar e estabelecer um hotel na Villa com funcionamento regular". A decisão da Câmara é favorável "com as condições de alujar os officiaes da Junta de Inspecção debaixo do mesmo subsídio"clxxxvi. Deste modo deveria alojar os oficiais e sargentos do destacamento militar, para além de se comprometer em "receber e tratar convenientemente os hospedes"clxxxvi. Todavia a Junta Geral anula tal deliberação, que não tinha qualquer enquadramento legal.clxxxvi A pensão apresenta três classes de serviços diários aos clientes: 1ª Classe - 2$000 2ª Classe - 1$000 3ª Classe - $800 Note-se que nesta altura era reduzido ou quase nulo o apoio concedido aos visitantes. Assim para além da casa do Caramujo apenas se situa na vila a Casa Gonçalves junto da igreja, ficando o serviço de apoio aos transeuntes em Ponta Delgada e Boaventura dependente da disponibilidade dos párocosclxxxvi. Em 1947clxxxvi eram duas as pensões existentes na Vila e continuou assim por muito mais tempo. Todavia era cada vez mais evidente a valorização da encosta norte em termos de

turismo. O Chão dos Louros, um dos ex-libris do concelho, foi declarado como espaço de lazer desde 1937clxxxvi altura em que se mandou roçar o mato. Na década de sessenta tornou-se num importante polo de atracção e diversão. Em 1964clxxxvi João Fernandes de Castro, de Santo António, manifestou interesse à Câmara de aí colocar um pré-fabricado para explorar por 20 anos como restaurante bar e residência. Já em 1969clxxxvi é a extensão do arraial de Ponta Delgada a este local, com os pedidos de Manuel de Gouveia Brazão e Agostinho Gonçalves para aí instalarem, nos dias 6 e 8 de Setembro, barracas de bebidas. Nesta altura já existia a casa da Encumeada que foi obra de António Francisco dos Reis e Agostinho Abreu Paulino, de Serra de Água, autorizada pela Câmara em 1969clxxxvi. A construção da piscina de Ponta Delgada enquadra-se dentro deste espírito. A realização foi sugerida à câmara por uma comissão criada para o efeito que arrecadou 20 contosclxxxvi A obra só foi adjudicada em 1958clxxxvi à firma Leacock e Cº Lda por 60.486$90. Em 1961clxxxvi construiu-se um bar e estabeleceu-se como tarifa de entrada um escudo. Horácio Bento de Gouveia testemunha a realidade: “ A piscina da freguesia de Ponta Delgada que meu parente Dr. Henrique de Freitas concebeu, surge com o objectivo não simplesmente turístico, mas de valorização regional.(…) Vai para vinte anos. Lançada a ideia de realizar-se a obra almejada, procuram-se donativos. Há uma comissão organizadora que colocava o interesse geral acima do individual, e encrudeceu até no espírito da gente mais modesta o desejo de ver o plano tornado sensível. comparticipam da obra o Estado e a Junta Geral do distrito, assim como a câmara municipal de São Vicente com quantia correspondente às suas disponibilidades do momento. E a piscina foi uma realidade entre o calhau do sítio da Vigia e a igreja. Aprazia ao visitante a beleza da construção e a volúpia da água esbordando as muralhas, em permanente apelo aos corpos para a sua frescura.” O turismo era já uma actividade florescente. O encanto e assiduidade do visitante aguça o espirito empreendedor dos locais. Assim, em 1971 um agente da empresa Voyages Wirtz SA não se cansa de elogiar aquilo que viu na viagem de estudo, mostrando-se particularmente encantado com as belezas naturais, com a afável hospitalidade, e com o bom vinho e a boa carne da vila e concelho de São Vicente..." Em 1971clxxxviiniciou-se uma nova era em que a aposta preferencial será no turismo. Uma sociedade, composta por Gabriel Paulo Drumond Esmeraldo, Francisco Andrade Pereira e Germano Drumond turístico no Calhau, que mereceu aprovação favorável da Câmara em 13 de Maio. É o princípio de uma noiva era para o turismo da encosta norte da ilha, que deu os seus frutos alguns anos mais tarde.

ENFRENTAR A NATUREZA

A orografia da ilha condiciona de modo evidente a vida dos vicentinos, sendo agravada esta condição com as condições climáticas. A ilha foi assolada ao longo da história por inúmeros aluviõesclxxxvi. Ao norte mercê das encostas íngremes, da grande quantidade de água, a época invernosa foi sempre um quebra-cabeças para os moradores. Em 1876clxxxvi Joaquim Fernandes morador no Lanço reclama perante a vereação os prejuízos causados no seu sítio pelas chuvadas de 31 de Outubro. Os danos não se ficaram apenas pelos caminhos do Lanço pois atingiram todo o concelho, deixando-os quase intransitáveis, pelo que

a Vereação foi forçada a apelar ao Governador Civil no sentido de serem dados meios financeiros para a imediata reparação. A realidade repete-se ao longo do tempo e quase todos os anos é necessário, após o inverno, reparar os caminhos, refazer as pontes e levantar as quebradas. Foi assim em 1888clxxxvi, como em 1896clxxxvi, onde o presidente do município refere que o "alluvião de desgraça que ha um anno a esta parte se teem succedido em todo o concelho... onde a ribeira na sua impetuosa corrente levou para o mar, pontes, caminhos...". Todavia, graças à pronta colaboração de todos foi rápido o restabelecimento da circulação dos caminhos, ficando apenas a aguardar solução aquele que sobe na margem da ribeira junto á vila. As inundações que ocorreram a 2 e 3 de Outubro de 1895 provocaram grandes estragos nas freguesias de S. Vicente, Boaventura e Ponta Delgada, que ficaram incomunicáveis. Na Ribeira Grande em S. Vicente ficaram 25 famílias sem casa, enquanto nos Enxurros em Ponta Delgada uma quebrada provocou elevados estragosclxxxvi. A ponta da vila entupiu e fez transbordar a água que alagou a vila. A sorte foi que a armação de pedra não resistiu à força da água que a fez desabar. De tudo isto deixou o Feiticeiro do norte um retrato em “as inundações de 1895”:

Vejo os caminhos do norte que estão todos arrombados não se pode transitar nada, de lado p’ra lado Passa-se em rochas medonhas quais veredinhas de gado,

até parece vergonha do nosso excelente estado. Já em pleno século XX as chuvas continuaram a atormentar as gentes do norte. Logo em 1902 as chuvas fizeram elevados estragos, tornando intransitável a estrada real ao Saramago. Em 16 de Novembro de 1909clxxxvi os estragos causados nos caminhos e casas, nomeadamente no Laranjal e no Lanço, são elevados, o que levou a Vereação a um orçamento suplementar para cobrir a nova despesaclxxxvi. Na década de vinte esta realidade aumenta de intensidade. Em Fevereiro de 1921clxxxvi os estragos foram tantos em todo o conselho que passando mais de um ano ainda se aguardava a reparação. Em 1927clxxxvi o mês de Dezembro voltou a ser invernoso, causando elevados danos, de modo especial na principal estrada que liga pela Encumeada ao Funchal. Passados dois anos abateu-se uma grande calamidade sobre a freguesia. A 6 de Março pelas 10 h da manhã uma quebrada no alto da Vargem vitimou 29 famílias e causou danos, avaliados em mais de dois mil contos. Os dados assim o provam: 40 mortos, perda de 100 palheiros e igual número de cabeças de gado. O tema correu em toda a ilha e foi manchete, por algum tempo nos jornais locais, obrigando o Governador Civil a deslocar-se ao concelho a 8 de Março. Não parou aqui a fúria do tempo pois que em 28 de Outubro de 1934 e Janeiro de 1952 novas trombas de água se abateram sobre o concelho provocaram de novo elevados prejuízos materiais e a destruição de inúmeras estradas e pontes, que só foi possível recuperar com apoio de subsídios da Junta Geral e do Governo Central.

Termina aqui o medo do vicentino face às ribeiras. Desde então não mais estas transbordaram de forma violenta molestando os residentes, destruindo caminhos e pontes. O clima parece ter mudado com também a força do homem para enfrentar a natureza.

DEVOÇÃO E CULTO

Note-se que, não obstante surgirem referências à fixação de colonos na área a partir da segunda metade do século XV, somente na centúria seguinte os primeiros núcleos populacionais adquirem alguma importância, como se poderá verificar com o aparecimento das primeiras freguesias - S. Jorge (1517), P. Delgada (1552), Seixal (1552) -. A de São Vicente deverá ser mais antiga. Álvaro Rodrigues de Azevedo, com fundamento que desconhecemos, apresenta a data de 1440 como a da fundação. Os princípios do nosso século foram pautados por profundas remodelações nas igrejas paroquiais do concelho. A primeira a ser alvo desta situação foi a de Ponta Delgada mercê do típico incêndio que a atingiu em 1908clxxxvi. O facto de ser o local de uma das mais importantes romarias da ilha levou a um movimento da rápida recuperação com auxílio do Governo Central. Nos anos quarenta o pároco de S. Vicente, o padre Alfredo Teodoro de Ponte Lira aposta na renovação e ampliação das duas igrejas do concelho. Primeiro foi a reconstrução da igreja matriz da Vila com o aumento de uma nova nave para o Centro da Vilaclxxxvi seguindo-se depois a ampliação da de Nossa Senhora do Rosário em 1947clxxxvi com duas naves laterais tendo a Câmara construído o largo e jardinagem do largo junto da Capelaclxxxvi. Facto significativo foi a iniciativa de construção da Capela de Nossa Senhora de Fátima no Pico da Cova, que ocorreu na Vereação de 1946clxxxvi como forma de regozijo pelo fim da 2ª Grande Guerra Mundial. Com o bispo D. Frei David de Sousa a diocese do Funchal viu aumentar o número de paróquias, sendo de salientar as três novas do concelho: Lameiros, Feiteiras e Fajã do Penedo. Não obstante ter sido instalada a cripta em 1965 tardou alguns anos até que estas dispusessem do próprio templo. A iniciativa da construção da Igreja das Feiteiras bem como da casa paroquial do Rosárioclxxxvi partiram do Padre Manuel de Sousa Júnior. Seguindo uma secular tradição o concelho de S. Vicente organizava todos os anos a festa do Corpo de Deus que constava de um desfile nas ruas da Vila. Em 1873clxxxvi estiveram presentes e desfilaram na procissão o pároco de Ponta Delgada acompanhado da Confraria do Santíssimo Sacramento. As actividades do município marcavam também a presença, indo o juiz ordinário e juízes eleitos, o administrador do concelho acompanhados dos funcionários. O empenho da Vereação nesta cerimónia é apenas manifesta neste ano e em 1869clxxxvi, não existindo outra qualquer referência à concretização. Hoje, quando se fala na devoção religiosa das gentes do norte vêm-nos à memória, no imediato, as romarias do Senhor Bom Jesus (no primeiro domingo de Setembro) e de Nossa Senhora do Rosário (no primeiro Domingo de Outubro). Ontem como hoje as duas manifestações religiosas continuam a ser um dos momentos mais importantes da vivência

religiosa e folia. Ontem como hoje mantêm-se como festividades regionais que fazem atrair milhares de romeiros ou forasteiros. Santa Quitéria, São Vicente, Bom Jesus, são os padroeiros das igrejas matrizes das três freguesias que formam o Concelho de São Vicente. O último sustentado por um dos mais rijos arraiais de toda a ilha, o do Bom Jesus de Ponta Delgada, em Setembro, e onde acorrem centenas de forasteiros, noutros tempos ostentando, presa na fita do chapéu, estampa votiva do santo, impressa com a oração de indulgência "Encommendação a Jesus" O Senhor Bom Jesus e Nossa Senhora do Rosário firmaram-se desde muito cedo na devoção das gentes do norte e também de toda a ilha. O Senhor Bom Jesus é a devoção mais antiga e terá surgido na ilha desde 1466 com Manuel Afonso Sanha um colono oriundo de Braga que fez transplantar para a sesmaria na Ponta Delgada o seu patrono. Deste modo, a primeira ermida que também fez erguer foi em sua honra. Da devoção privada passou-se à de todas as gentes do local, da encosta norte, e, depois, de toda a ilha. Não sabemos como tudo se passou. Apenas podemos afirmar que já no último quartel do século XVI a festa do Senhor Bom Jesus fazia atrair muitos romeiros à encosta norte. Nos livros que regista as visitas do Bispo ou seu representante encontramos informações que apontam para um aumento da devoção ao Senhor Bom Jesus e de afluência dos romeiros nos séculos seguintes. Em 1657 e 1706 surgem queixas a propósito de o gado, no caso de caprino, pastar nas serras, sobranceiras às veredas, o que fazia perigar os transeuntes que se dirigiam à missa ou em romagem. E, no último ano, refere-se a morte de "muitas pessoas das contínuas romarias". Na verdade, neste século XVIII o Senhor Bom Jesus, não obstante estar colocado num local distante da encosta norte, era motivo de grande devoção, fazendo aumentar a afluência de romeiros. Desde finais do século XVI que está testemunhada a existência da confraria do Senhor Bom Jesus que através do número de legados perpétuos oriundos de gentes de diversas origens atesta que a devoção estava em crescente subida. A fama do Senhor Bom Jesus como milagreiro alastrou a toda a ilha e fez com que o norte, mais propriamente Ponta Delgada, se transformasse num dos principais centros de peregrinação. Desde o século XVII são evidentes os testemunhos da dominância da romaria na devoção popular. Assim, para além dos legados em género ou dinheiro, temos as obrigações de romaria ao Senhor Bom Jesus com missa e a presença do ente querido a quem foi pedida a intersecção do Senhor Bom Jesus. A promessa, ontem como hoje, não se ficava apenas pela ida em romaria a Ponta Delgada e entrega de uma esmola mas também pela alegria dos cantares. O testemunho das assíduas romagens está no facto de em 1646 Afonso Gomes ter deixado à fábrica da igreja de Ponta Delgada uma casa para os romeiros. A tradição prolongou-se no tempo chegando até nós. E, neste curso de cinco séculos, são evidentes os testemunhos desta viva tradição. Em 1817clxxxvi José Moniz de Câmara, vizinho da Fajã de Areia, declarava ao Padre Francisco Borges seu testamenteiro para cumprir os legados, entre os quais estava a obrigação de cumprir uma romaria ao Senhor Bom Jesus de Ponta Delgada, entrando de joelhos desde a porta principal até ao altar-mor seguido de uma missa. O culto está também patente na confraria com o mesmo nome, que domina os legados perpétuos a partir de 1645. A devoção atingia as gentes do lugar mas também as de São Vicente.

O facto da devoção se afirmar a partir de meados do século XVII deverá estar relacionado com a fama de milagreiro do Senhor Bom Jesus. Assim, em 1866 o presidente da Câmara de S. Vicente dá conta de que a festa contou com a afluência de muito povo, o que provocou uma desorganização junto da imagem, não intervindo o regedor do lugar porque estava ocupado a vender círiosclxxxvi

. No ano imediato foi ainda maior a presença de peregrinos: "no primeiro de Setembro teve lugar a grande romaria de Ponta Delgada, a qual foi bastante concorrida, pois "é a opinião geral de que a romaria deste ano excedia um terço dos anos anteriores"clxxxvi

. Tudo correu sem incidentes, havendo apenas a lamentar a morte de um barqueiro da Ribeira Brava que caiu embriagado nas fajãs de São Vicente. É evidente que o facto de Ponta Delgada ser o principal porto de desembarque e embarque no concelho favoreceu a presença de romeiros de diversas partes da ilha, que aí acolhiam por via marítima, a exemplo do que sucedia noutras freguesias da ilha. O fervor religioso justifica muitas vezes o sacrifício e não impediu que em 1908, a apenas dois meses do incêndio que vitimou a igreja a 12 de Julho, o arraial tivesse lugar. A afluência dos peregrinos ao local de romagem era grande e fazia-se através dos caminhos que ligavam o local ao sul da ilha, via Boaventura ou S. Vicente. Deste modo na última semana de Agosto era desusado o seu número que calcorreavam a pé as encostas íngremes. No século XX com a abertura das estradas de ligação entre S. Vicente e a Ribeira Brava e Ponta Delgada o movimento transferiu-se para a estrada. Não será de estranhar o facto de a romaria do Senhor Bom Jesus se estender à Encumeada, Caramujo e Estanquinhos. Assim em 1936clxxxvi o imposto sobre a carne e barracas montada nos locais nos dias 5 a 10 de Setembro era cobrado por Joaquim Nunes Brazão Machado A grande aposta em terrenos de devoção e diversão estava nos arraiais de Ponta Delgada e do Rosário. A referência a estas manifestações é ocasional e prende-se com os interesses e obrigações do próprio município. Em 1876clxxxvi a Vereação nomeou dois fiscais para as vendas ambulantes na festa de Ponta Delgada. Ainda de acordo com determinação da comissão reguladora do comércio do distrito do Funchal sabemos que em 1941clxxxvi podiam ser abatidas até 80 cabeças de gado. Os contributos da Câmara para as festas são poucos resumindo-se a assegurar as despesas com o policiamentoclxxxvi e apenas em 1937clxxxvi é declarado que o valor de 135$00 do imposto cobrado aos vendedores ambulantes no arraial do Rosário ficaria para as despesas do mesmo. A partir dos anos quarenta temos notícia de outro arraial em honra do orago do concelho. Desde 1947clxxxvi que temos referência à realização através do pedido de licença para a colocação de mastros na rua da Vila. Entretanto em 25 de Outubro de 1962 a Vereação, sob proposta do presidente decidiu considerar o dia 22 de Janeiro como feriado municipal, tendo em conta que era uma festa com grande tradição em honra do padroeiro da Vila e do concelho. A partir daqui há notícia do empenhamento da Vereação nesta festividade, tendo contribuído em 1970clxxxvi com 6 000$00. Em 1944 a Vereação decidiu comemorar outra efeméride evocativa da elevação do lugar de S. Vicente à categoria de Vila e de criação do concelho. A 15 de Julho decidiu-se celebrar os duzentos anos com uma festa, à qual compareceram as mais altas individualidades da região. A vila tornou-se no centro da ilha durante algum tempo. Fez-se uma exposição de gado e etnográfica. O acto foi aproveitado para uma homenagem ao Governador Civil, Gustavo Teixeira Dias, e ao Presidente da Junta Geral, Dr. João Abel de Freitas que foram agraciados

com o título de cidadão honorário do concelho. A Câmara gastou com as cerimónias 15.181$00clxxxvi. É evidente nesta época uma preocupação pela história e tradições do concelho, encarando a Vereação tal realidade. Em 1943clxxxvi havia-se convidado o Dr. Augusto da Silva Branco Camacho a fazer um estudo histórico sobre a vida do concelho, a data da criação e evolução administrativa, o que nunca concretizou. Depois, coincidindo com os 200 anos de criação da Vila foi aprovado pela comissão de heráldica a 28 de Junho o selo e a bandeira, que não existiamclxxxvi. Outra manifestação de carácter profano ocorreu em 1953clxxxvi. Pela primeira vez temos referência à festa das vindimas que aqui teve lugar no dia 13 de Setembro.

Na verdade, o concelho de S. Vicente foi desde a década de trinta um importante local de diversão. Para isso contribuiu a inauguração a 27 de Setembro de 1931 do Teatro Gil Vicente, propriedade de Carlos França. Vários grupos de excursionistas deslocavam-se do Funchal para representar e assistir às inúmeras récitas que aí tiveram lugar.

A ECONOMIA DO CONCELHO

A economia do Concelho assenta de forma evidente em dois vectores. Por um lado o aproveitamento dos valiosos recursos do amplo espaço, que vão das lenhas e madeiras, aos recursos minerais, aos logradouros comuns como área de pastoreio e ao aproveitamento agrícola da pouco área arável. Construíram-se socalcos encosta acima que se transformaram em campos de cana, cereais, batatas e feijão. Foram estas as principais riquezas arrancadas à terra e que contribuíram para a magra economia dos vicentinos. A FLORESTA E AS MADEIRAS Se mais não progrediu esta terra foi porque a possibilidade de comunicação com o exterior, nomeadamente com a vertente sul, não era fácil. A orografia do terreno impossibilitou um maior desenvolvimento dos transportes terrestres, enquanto a braveza do mar delimitou o uso a apenas a algumas épocas do ano. A maior riqueza do espaço, que em 1744 assumiu a condição de concelho, foi, sem dúvida, as madeiras e a cultura da vinha. A existência de uma importante e densa floresta foi imprescindível para o desenvolvimento da cultura da cana-de-açúcar nos três primeiros séculos de ocupação da ilha. Daí se extraíam as madeiras para a construção dos engenhos e as lenhas que serviam de combustível à laboração do açúcar. O vinho sobressai como a mais destacada das riquezas do norte da ilha, demarcando-se como uma importante zona viti-vinicola da Madeira até a actualidade. A orografia da vertente norte e em especial da área circunscrita ao concelho de S. Vicente não configura grandes possibilidades agrícolas. A preparação do solo para o cultivo foi uma tarefa árdua. Por isso, no início da ocupação da ilha a área ficou abandonada a si própria e só ganhou

importância no segundo momento pela necessidade das madeiras e lenhas para os engenhos e a pressão do movimento demográfico que motivou a uma maior dispersão dos núcleos populacionais. É de salientar que em várias freguesias do concelho surgem localidades com o nome de Fajã do Eixo. A designação de Achada ou Caminho da Madeira é também comum. A abundância de madeira de pau-branco com que se faziam os eixos dos engenhos e carros de bois. Certamente que os eixos autorizados pela a câmara do Funchal em 1720 para exportação aos Açores, deveriam ser daqui. As espécies existentes - aderno, pau-branco, teixo, vinhático, til e cedro (...) - eram de grande utilidade, provocando o desenvolvimento de uma importante indústria de serração. Esta riqueza das madeiras está documentada na toponímia do concelho. Assim, temos a Fajã dos Vinháticos, Espigão do Louro, Achada do Louro, Loural, Achada das Faias, Sítio das Faias e Lombo das Faias, Rocha do Folhadal, Ribeiro dos Folhadais. A transformação dos troncos em tabuado era feita pelas serras de água. Este era um engenho mecânico movido a águaclxxxvi, com vantagens sobre o sistema manual no sentido de que era muito mais rápido e necessitava apenas de um só homem. As serras de água situavam-se junto às origens das levadas de modo a permitirem o melhor aproveitamento das águas para regadio ou uso múltiplo como força dos engenhos de açúcar e moinhos de água. Caso contrário sujeitavam-se no Verão à disponibilidade da água, agora desviada para o regadio. Em Ponta Delgada António Correia Henriques tinha que parar a serra no período de regadioclxxxvi. As serras de água surgiram junto dos cursos de água e das áreas onde existiam madeiras suficientes para a laboração ou então de fácil acesso. A toponímia testemunha ainda hoje o local onde funcionaram algumas. Em Boaventura temos o Lombo da Serra de Água, enquanto em S. Vicente o Lugar da Serra de Baixo e a Cova da Serra Velha. Gaspar Frutuoso, em finais do século XVI, refere uma no Faial e duas em Ponta Delgada. Todavia, pelo incremento que a partir da centúria teve a indústria o número de serras de água deveria ser mais elevado, nomeadamente na capitania de Machico, onde se incluía o espaço actual do município de S. Vicente. No início da ocupação da ilha a autorização para a construção dos engenhos era dada pelo capitão de Machico, depois a prerrogativa passou para a alçada da Câmara. Cada serra de água estava sujeita ao pagamento de um direito anual de uma dúzia ou dúzia e meia de tábuas. Em 1775 Manuel de França Andrade teve licença do senado da Câmara para construir no sítio do Farrobo da Vila uma com a obrigação de pagar uma dúzia de tabuado ou 2000 reis em dinheiro cada anoclxxxvi. A esta licença havia necessidade de outras para o corte da madeira, concedidas pelo município. A partir das autorizações conhecidas pode-se afirmar que nos anos que decorrem de 1737 a 1743 tivemos um desusado movimento de cortes, maioritariamente para tabuado, onde sobressai o til. A partir dos ancoradouros da costa saíam grandes quantidades, que levaram as autoridades a intervir, deste modo em 1905 este era marcado pelo guarda florestal do concelho.clxxxvi

Os recursos florestais foram por muito tempo uma das principais riquezas do concelho. A tradição do Norte como reserva florestal da ilha, dando lenhas e madeiras para a vertente Sul, necessária para a construção, laboração dos engenhos e combustível doméstico manteve-se

como uma realidade insofismável e um factor de aproximação. A isto somam-se os gancheiros, varas e tanchões para os trabalhos agrícolas. O corte de árvores e ou aproveitamento de madeira seca fazia-se mediante autorização do município, estando o requerente sujeito à autorização da Câmara, dada após uma consulta ao meirinho ou guarda florestalclxxxvi. Um exemplo apenas evidencia a forma de actuação. Em 1880clxxxviSebastião Figueira Dantas requereu o corte de madeira. O meirinho informou favoravelmente e procedeu-se à entrega do alvará mediante o pagamento de 300 réis por cada pau. Ainda, era obrigado a levantar a madeira num prazo de três meses. No caso de não proceder a serragem e ao levantamento no prazo estabelecido sujeitava-se à pena de apreensão da madeiraclxxxvi. Estas autorizações eram extensivas também em terrenos propriedade do requerente. Apenas o diferenciava daqueles que o procediam nas serras do concelho a isenção do pagamento da taxa. Senão vejamos: em 1928clxxxvi Paulo Vieira Betencourt, Manuel Fernandes e João Gomes dos Canhas pagaram por cada carro de lenha de uveira cortada abaixo dos Estanquinhos, 25$00, enquanto em 1932clxxxvi Manuel Francisco Gomes, José Firmino de Gouveia, Ermelinda Hilária Gomes, são autorizados a cortar 2000 varas de pinho e conduzir ao Funchal, não pagando taxa "por ser propriedade sua" ou então quando era para um melhoramento público, como sucedeu em 1938clxxxvi com dois tis solicitados pelo Padre Vigário Teodoro Ponte Lira, para as obras da igreja. Este era por vezes o estratagema usado para furtar-se ao pagamento da taxa. Assim, em 1896clxxxvi Francisco Lúcio Fernandes do Seixal solicita autorização para serrar 3 paus de til e vinhático em propriedades suas. A "Câmara attendendo a que nada tem com a propriedade alheia, mas desconfiando que o requerente a que o requerente a quer illudir pretendendo obter licença para fazer cortes de madeiras em terrenos communs..." deliberou indeferir o requerimento por não provar os paus estarem em terreno seu. De acordo com despacho de 1946clxxxvi toda a lenha cortada em serras e logradouros, destinada à exportação para fora do concelho, estava sujeita a uma taxa de 20$00 por tonelada. A taxa variava conforme a qualidade das madeiras. Assim, em 1950clxxxvi por cada til cortado nas serras o requerente sujeitava-se a pagar 250$00 por árvore. É a época de construção da levada do Norte, que conduziu ao desbaste de algumas árvores para traçar o seu risco. Todas as lenhas e madeiras derrubadas pela execução da obra são requeridas por Agostinho de Abreu Paulino da Serra de Águaclxxxvi. O despacho da vereação obriga a um depósito de mil escudos, e nega o aproveitamento dos tis. O levantamento das mesmas deveria ocorrer com conhecimento da Câmara. A par disso denota-se outro empenho da Câmara em fruir da riqueza, ao proceder à arrematação das lenhas e madeiras das árvores encontradas secas nas serras. A informação era dada pelos meirinhos ou guardas florestais e muitas vezes, os potenciais interessados no aproveitamento. Notificada a situação a Câmara mandava proceder à arrematação sendo dada a quem cobri-se com o lanço mais elevadoclxxxvi. As madeiras que mais atiçavam a cobiça de todos eram de til e vinhático. São inúmeros os pedidos para o corte ou o anúncio da existência de árvores secas. Assim, as lenhas e as madeiras doutras espécies arbóreas quando arrematadas ficavam desertasclxxxvi. O mesmo não sucedia com estasclxxxvi. Note-se que mesmo as madeiras resultantes do incêndio de 1872clxxxvi na serra dos Caimbros e Fajã da Madeira teve pronta resposta quando foi posta em praça, sendo arrematada por valor muito superior à base de licitaçãoclxxxvi. Por outro lado os requerimentos solicitando o aproveitamento das espécies raras da floresta local eram bem ponderados na decisão final, sendo muitas vezes indeferidosclxxxvi. Estas eram também as madeiras mais cobiçadas na exportação para fora do concelho, nomeadamente para o Funchal. E aqui de novo há uma intervenção do município no sentido de

regularizar o movimento de exportação. Em 1888clxxxvi Vicente José Alexandre dos Lameiros solicitou autorização para conduzir ao Funchal 100 peças de til, 100 de vinhático e 30 de pau branco. A Câmara através do Administrador do Concelho passou a necessária guia que abria as portas à saída para fora do concelho. As referidas madeiras deveriam ser marcadas para evitar qualquer fraudeclxxxvi. Todos os que não respeitassem as medidas sujeitavam-se à repreensão das madeirasclxxxvi, como sucedeu em 1899clxxxvi com Manuel Nunes do Laranjal que pretendia levar para fora do concelho madeira de til e vinhático, não obstante ser oriunda da sua propriedade. Facto particular sucedeu em 1930clxxxvi em que a Câmara solicitou o apoio da Junta Geral para combater à pratica que se havia generalizado do corte da casca de faia para uso nos curtumes. Com assiduidade vinham homens do Sul às serras do Paul e do Lanço buscar casca ” estragando o arvoredo”. Os fios de cargas eram preciosos auxiliares no transporte das lenhas e madeiras, contribuindo por isso mesmo, para acelerar o processo de desarborização das serrasclxxxvi. Mesmo assim continuaram a existir, pagando os promotores uma taxa anual. Outro recurso possível era o fabrico de carvão usado nas forjas locais ou exportado para o Funchal. A realização passava também por autorização camarária. Em finais do século o estado das serras era tal que a Câmara se viu forçada a interditar tal pratica. Assim, em 1898clxxxvi Vicente José Alexandre do Cascalho e César Gonçalves Jardim do Lanço não são autorizados a fabricar o carvão que pretendiam levar ao Funchal. Entretanto em 1899clxxxvi o regente florestal do distrito apela à Câmara para proibir o fabrico de carvão nos meses de Julho a Setembro, para impedir os constantes incêndios que provocavam. A população e a Câmara estavam já conscientes do perigo, como se pode constatar dum requerimento de alguns moradores a solicitar medidas face ao vandalismo dos carvoeirosclxxxvi. A consciência ecológica não é uma realidade só dos nossos dias e, por isso mesmo, não podemos acusar os nossos antepassados. A floresta era um bem comum, que servia de pasto, para aproveitamento das lenhas e madeiras. A preservação da importante reserva florestal concelhia é uma realidade de hoje e de ontem. A Vereação intervém sempre na defesa, quer através de posturas, quer de medidas pontuais. Em postura de 1899clxxxvi estabeleceu-se medidas de defesa das nascentes e das madeiras proibindo o corte uma vez que eram defesas: aderno, barbusano, cedro, til, vinhático, pau branco, teixo, louro, nogueira, amoreira. A área florestal era e é vasta, não sendo fácil a fiscalização. Assim, em Boaventura a reserva de til e vinhático estava a saque pelo que a vereação solicitou medidas por parte do Governo Civilclxxxvi. Na mesma sintonia estava a população pois em 1871clxxxvi alguns moradores de Ponta Delgada denunciam Lusitano de França Andrade por ter cortado paus de vinháticos a pouca distância de uma nascente de águasclxxxvi. A corroborar o estado calamitoso das serras temos uma reclamação do juiz eleito de Ponta Delgada, João Vicente de Andrade, que referiu estarem as serras destruídas pelo machado. A tudo isto acresce a destruição das faieiras para tirar-lhe a cascaclxxxvi. Esta ideia é corroborada pelo vereador Fidélio J. Canha que alude "um considerável estrago no arvoredo em lenhas, cortando louros, vinháticos, tis e outras árvores proibidas"clxxxvi. Em face disto a Câmara deliberou em 1886clxxxvi que, por "as serras do concelho se acham em parte destruídas pelos cortes a machado, resolver que se não authorizasse mais cortes sem que a mesma câmara reunida fosse vesitar os sítios indicados nos requerimentos..." Em informe do vereador José de Sousa Brazão evidencia a situação nas serras da Ribeira do Arvoredo, Caldeira, Lombo das Cruzes e Picos dos Lanços da Serra da Lombada das Vacasclxxxvi. Em face de tudo isto a

Câmara decidiu nomear dois guardas florestais: João Augusto de Macedo, da Ginjas, e Manuel de Freitas da Silva, da Vilaclxxxvi. Estes, para além da ronda obrigatória pelas serrasclxxxvi, informavam a Câmara aquando do pedido para cortes na Serraclxxxvi. As medidas em questão não eram suficientes para travar o surto de desflorestação pelo que o município se viu forçado a uma medida drástica de proibição total de qualquer corte de madeiras na serraclxxxvi. A mesma é secundada em 1898clxxxvi pelo regente florestal do distrito que recomenda o cerco aos infractores, no que a Câmara comenta "não poupar esforços para obstar ao desaparecimento de árvores das serras". No ano imediato são os munícipes a pedir o reforço das medidas no sentido de pôr termo ao vandalismo causado pelos carvoeiros e serradores nas matas e arvoredos do concelhoclxxxvi o que levou a Câmara a nomear dois zeladores, moradores no Loural: Manuel da Silva de Gouveia Brazão e Vicente José de Sousa. Por vezes eram os guardas florestais que se furtavam às suas funções, como sucedeu com Manuel de Freitas da Silva que, por não exercer a vigilância a que estava obrigado foi demitidoclxxxvi. Certamente que a ineficácia do ofício levou a Câmara a propor em 1907clxxxvi a extinção no que mereceu parecer desfavorável da comissão distrital. Todo este empenho não levou por bom caminho as florestas do concelho. O retrato traçado em 1926clxxxvi era negro. As serras apresentavam-se como um lamentável esqueleto, “porque havendo desde há anos na respectiva legislação florestal, ainda que antiquada, determinações que deveriam ter sido cumpridos; não haviam tão maldosamente, sido devastados; e, assim, executada a lei, imponha-se inacção o vandalismo desempenhado em nossos arvoredos: beneficiando-se nossos terrenos; nossa agricultura; caracterizando o encanto do nosso património florestal”. Outro contratempo com que se debatia a preservação da floresta eram os incêndios. Para os combater proibiu-se as queimadas e interditou-se o fabrico de carvão na época estival. A par disso toda e qualquer queimada em terrenos agrícolas deveria ser autorizada em vereação. Assim sucede com José de Agrela Júnior da Boaventura, a que a Câmara endossa "a responsabilidade por qualquer prejuízo".clxxxvi Muitos foram os incêndios que devastaram as serras do concelho, mas à vereação só chegaram notícia dos de 1872, 1895, 1919 e 1935clxxxvi. A missão de apagar o fogo estava acometida aos munícipes sob a coordenação dos guardas da serraclxxxvi e apenas em casos extremos se socorria dos militares, como sucedeu em Ponta Delgada em 1919clxxxvi. A ideia de uma corporação de bombeiros é muito recente, sendo resultado de uma recomendação do Director Geral de Administração Públicaclxxxvi. Todavia em 1968 a questão ainda continua em estudo de que resultou um informe onde se referia a falta de posses financeiras da Câmara para por si só montar um serviço de incêndiosclxxxvi. A cultura e indústria dos vimes teve um notável incremento a partir da segunda metade do século XIX. A Camacha, foi o primeiro e mais importante centro produtor e transformador. A Boaventura seguiu-lhe o exemplo e assumiu a segunda posição. O lugar dispunha de óptimas condições para tal: inúmeros regatos, nascentes, enfim abundância de água tão necessária aos vimeiros. O vime, depois de descascado era exportado em bruto ou então em obra para os Estados Unidos da América, Venezuela, África do Sul. A partir da década de sessenta do nosso século aumentou a concorrência de novos mercados, como a Jugoslávia, Hungria, Hong-Kong e Japão. As duas décadas seguintes foram marcadas pela dificuldade no seu escoamento, que

levaram ao abandono da maior parte dos vimeiros. Em Boaventura, tal como na Camacha ainda persiste a tradição do trabalhar o vime. Na década de setenta temos notícia da prosperidade do sector através do pedido apresentado ao município para ocupação da via pública com a secagem dos vimes. Em 1971clxxxvi foram feitos treze pedidos na maioria para Boaventura, pois apenas temos dois para S. Vicente e um para Ponta Delgada. Aliás, o Feiticeiro do Norte realça de forma evidente a actividade na freguesia de Boaventura: Boaventura tem água que rega muito vimeiro, muita moganga e feijão, que rende muito dinheiro A CAL UM RECURSO ESCASSO MAS SEMPRE PRESENTE Em termos geológicos a freguesia de S. Vicente apresenta uma particularidade em relação às demais, isto é, uma intercalação calcária marinha, que só tem caso parecido nas Ilhas de Santa Maria e Porto Santo. A exploração da pedreira calcária remonta a meados do século XVII. A pedreira fora adquirida pelo vigário de S. Vicente, Francisco Pestana, que depois a doou à Confraria do Santíssimo Sacramento. Foi ele quem iniciou a exploração, construindo nas imediações do filão um forno. No último quartel do século XVIII estão documentados dois fornos: um no cabo da Ribeira do Mato, propriedade de Manuel Pestana de Andrade e outro na Vila, nas proximidades da Igreja, pertença da Confraria do Santíssimo Sacramento. O filão calcário foi de grande importância no decurso dos séculos XVIII e XIX. As necessidades de cal para a construção, evidenciada com o delineamento, a partir de meados do século XVI, de uma linha de defesa, composta por diversas fortalezas e uma cortina de muralha, tornaram necessária a valorização das pedreiras do arquipélago, que apenas existiam no Porto Santo e S. Vicente. A falta de lenhas impediu o seu desenvolvimento no Porto Santo. S. Vicente, ao invés, dispunha da matéria-prima, necessária à laboração da cal -- a pedreira e as lenhas -- e, por isso mesmo, a industria teve grande incremento a partir de meados do século XVII. O seu desenvolvimento nas centúrias seguintes é atestado pela existência de três fornos de cal. A sua presença e valor económico permaneceu até à presente centúria, pois em 1903 temos um novo forno no sítio do Barrinho, propriedade de João Pedro Faria. Note-se que em 1888 Manuel da Costa Lira apontava a necessidade de traçar uma estrada desde a pedreira ao mar para facilitar o escoamento da cal. Isto demonstra o valor do recurso no comércio com o sul, nomeadamente o Funchal, onde a cal tinha maior procura. A par disso em 1888 aponta-se como um meio possível a explorar na economia nortenha da ilhaclxxxvi. Nos anos sessenta foi ainda o retorno à exploração do calcário, pois um parecer do Laboratório Minerológico e Geológico da Faculdade de Ciências de Lisboa informava que as amostras analisadas eram de óptima qualidade, sendo de grande interesse económico para o concelho a exploração, o que na realidade veio a acontecerclxxxvi. O GADO E O PASTOREIO

O concelho dispõe de um vasto espaço maioritariamente coberto de floresta. Deste modo a área agrícola é reduzida sendo complementada, em termos de recursos, pela utilização complementar da outra em termos do aproveitamento das madeiras e lenhas ou do pastoreio. A criação de gado na "serra" foi, por muito tempo, um recurso importante para as gentes do concelho. A economia familiar tinha na criação de gado um suplemento importante. Aqui, há a considerar aquele que era lançado na Serra - ovino e caprino - e o que era de estábulo - vacum - para o melhor aproveitamento dos recursos. O primeiro era regulamentado por uma licença do município. E, de acordo com estes, para o período de 1868 a 1889, sabe-se da existência de mais de uma centena de criadores, maioritariamente dos lugares vizinhos da Serra, isto é, Lanço, Ginjas, Vargem, Fajã dos Vinháticos, Ribeira do Passo, Achada do Til, Pouso, Lameiros, Lombo, Loural, Cascalho. Os terrenos baldios, pertença do município, eram entregues ao pastoreio de gado caprino e ovino mediante autorização camarária, que só os permitia em espaços delimitados por um bardo. O interessado solicitava à Câmara, mediante requerimento, a referida autorização que era dada em Vereação. A Câmara ao passar a licença recomendava o usufruto apenas do baldio comum, não podendo "comprehender dentro da tapada terrenos proprietários"clxxxvi. Temos notícia de dois pedidos: 1887 Abril 16 : Manuel Francisco, Poiso, tapada 1887 Novembro 12 : João José Nunes, João de Oliveira e Vicente de Sousa - bardo na Serra de Baixo (Achada do Til). A partir de 1913 com a lei das pastagens publicada no Diário do Governo de 23 de Julho, o usufruto dos pastos está sujeito ao pagamento de uma taxa, atribuída de acordo com a extensão do bardo. A primeira situação nestas condições surge em 1918clxxxvi com o pedido de Ernesto Firmino da Silva Branco morador no Lanço, que solicitou licença para fazer um bardo no sitio do Pardão. A Câmara autoriza-o mediante o pagamento de uma taxa e aconselha ao mesmo que o corte das árvores para o tapume fosse feito "de forma que não prejudique a serra nem as águas". A taxa era variável, sendo o espaço concedido sob a forma de arrendamento por um prazo determinado. Assim, em 1923clxxxvi Victor Dória Brazão e António de Sousa ao renovarem a licença são sujeitos à taxa de 10 escudos. No mesmo anoclxxxvi é concedido a José Mendes Miguel e João Mendes Júnior um baldio no Pedregal (Boaventura) por 19 anos com a taxa de 20$00. Até 1942 sucedem-se inúmeras autorizações: ANO REQUERENTES DESCRIÇÃO SÍTIO TAXA 1887 Manuel Franco Tapada Poiso João José Nunes, João de Oliveira, Vicente de Sousa bardo no sítio das

Gamelas Achada do Til

Manuel Francisco Tapada Poiso João José Nunes bardo das Gamelas Achada do Til 1918 Ernesto Firmino da Silva Branco bardo no Pardão Lanço José Maria Dinis serra d Espigão Feiteiras 1921 António Augusto Faria bardo para cabras Fajã da Areia 1923 João Isidoro Aluizio de Freitas bardo de cabras Ponta Delgada Victor Doria Brazão, António de Sousa Andrade bardo sítio do chiqueiro Loural 10$00 José Mendes Miguel e José Mendes Júnior Pedregal por 19 anos Falca 20$001937 João Nunes de Freitas serra por 9 anos Fajã Vinháticos 51$00 João Januário Oliveira Serra Lameiros 61$00 Manuel Pedro dos Santos, Manuel Tomé de Freitas Bardo Boaventura 60$001938 António Joaquim Barcelos Lanço 75$00

Manuel Andrade Ribeira Grande 51$00 António de Freitas Lombada Vacas 151$00 Manuel Doria Brazão Achada Grande 105$00 Horácio Brazão Machado Lamaceiros S. Vicente 75$00 Alexandrino dos Santos 1ª Lombada 25$00 João de Freitas Espigão S. Vicente 26$00 Manuel Vieira Garces Ribeira Grande 21$001939 Manuel Vicente serra Achada do Poço Falca 650$00 Em todos está subjacente as recomendações, que são referidas ocasionalmente, isto é, "zelar e manter o arvoredo em bom estado e deixando livre todas as servidões, tendo única e exclusivamente o direito de criar gado"clxxxvi. A partir de 1942clxxxvi, com o novo código foi definido um novo regulamento para as pastagens. Deste modo o gado lanígero estava sujeito a uma taxa anual por cabeça que não poderia ultrapassar os $50. Aqui estamos perante um bardo comum no Paul de Serra, logradouro também de Ponta Sol, Ribeira Brava e Calheta. O usufruto dos pastos comuns, através da criação de ovelhas e cabras surge apenas como beneficio de alguns. Mais importante era o sector do gado estabulado, bovino ou porcino. Neste caso existe uma perfeita articulação com a economia familiar e a forma de exploração agrícola. A importância do gado bovino no concelho é testemunhada pelas inúmeras doações e legados onde é frequente a sua presença. Também a toponímia o regista: Lombada das Vacas, Achada das Vacas. Maior interesse despertava o gado vacum pela dupla utilidade do estrume para fertilizar a terra e do leite para consumo doméstico ou venda. Neste último caso foi um importante suplemento da economia familiar. A venda do leite às cooperativas é uma tradição que se manteve até à actualidade. Por outro lado, tivemos a Cooperativa de Lacticínios do Norte com instalações no Sítio do Livramento, servindo-se de uma Central Eléctrica, para o efeito no Sítio do Cabouco. Com a fábrica iniciou-se a produção industrial de manteiga que há muito já se fazia ao nível caseiro. Note-se que em 1670clxxxvi Afonso Gonçalves e a sogra Quitéria Aguiar pagavam de foro a Leonardo de Ornelas Travassos 2 canadas de manteiga. De acordo com o arrolamento do gado da ilha em 1893 o concelho apresentava 1300 ha de pasto distribuído da seguinte formaclxxxvi:

Gado estabulado gado manadio S. Vicente Ponta Delgada Boaventura S. Vicente Ponta Delgada Boaventura

bovino 3903 634 1508 122 ovino 100 93 1417 305 161caprino 53 15 1667 715 450porcino 9292 2674 4060 884 De acordo com o arrolamento do gado em 1955 é possível entender-se a dimensão e evolução: 1940 1955 1963 Asinino 2 Bovino 1353 2209 1483 Ovino 269 334 Caprino 602 185 Suíno 804 2601 Galináceos 12 768 Patos 59 Perus 34 Pombos 173

Coelhos 286 O gado suíno apresenta apenas importância na economia familiar. Todavia sente-se os ecos da sua presença nos livros de vereação, uma vez que por diversas vezes foi solicitada autorização para construir chiqueiros junto das casas de habitação. A intervenção do município, através das recomendações do delegado de saúde, incidem sobre as necessárias medidas profilácticas. As preocupações com a higiene e sanidade não são apenas dos nossos dias. Era do porco que se extraía parte substancial do sustento da casa. A festa da matança do porco era um ritual obrigatório que acompanhava as vivências do Natal. Fora disso tempos conhecimento em 1943clxxxvi da montagem por Amandio Cristóvão Góis de uma fabrica de chouriço e banha no Terreiro em Ponta Delgada. O gado bovino alia-se à faina agrícola, sendo um elemento indispensável pela possibilidade de uso do estrume nas culturas. Entretanto o gado alimenta-se das ervas dos regatos, que crescem nas bermas dos poios, ou da folha da cana e vinha. Havia gado de engorda para fornecer os açougues locais e gado leiteiro. Do primeiro é referido em 1889clxxxvi como importante para economia local o que levou a Câmara a apoiá-lo retirando o imposto sobre a cana verde. Quanto ao gado leiteiro é de realçar o empenho da Câmara na promoção, ao apostar no apuramento e melhoria da raça através da aquisição de um touro de boa qualidade para procriaçãoclxxxvi. O objectivo era claro "...animando os lavradores a criarem gados que compensam as despezas da criação abundando os mercados e auxiliando o desenvolvimento da indústria e fabrico de manteiga". A estratégia segue de perto os planos distritais definidos com a exposição zoológica do Funchal do ano imediatoclxxxvi. Aliado a isso estão também as medidas controladoras da circulação dos novilhos. Assim em 1923clxxxvi estava proibida a saída do concelho daqueles com menos de 3 meses, enquanto em 1926clxxxvi a saída de vitelos fêmeas estava proibida, sujeitando-se os infractores, apanhados pelos cabos de polícia, à pena de 50$00 por cada cabeça. Enquadra-se neste plano a realização em Agosto de 1963 por iniciativa do Dr. Alcino Drumond, médico veterinário e por muito tempo o responsável da Secção do Fundo de Previdência Pecuária da Junta de Lacticínios da Madeira, da primeira feira de gado do concelho, que foi um grande sucessoclxxxvi. Ligado ao gado bovino estava o aproveitamento do leite, única e exclusivamente no fabrico de manteiga. No concelho existia a Cooperativa de Lacticínios do Norte que aproveitava o leite dos seus associados para fabrico de manteiga. Ao sítio do Livramento estava uma fábrica, movida a energia duma central hidro-eléctrica no sítio do Cabouco. O leite era desnatado nos diversos postos existentes na freguesia sendo depois as natas conduzidas à fábrica por homens. A criação dos postos de desnatação era solicitada pelos proprietários dos diversos sítios em requerimento dirigido à Câmara. Desde 4 de Abril de 1933 que estavam sujeitos a uma taxa, que foi anulada em 1942clxxxvi.

ANO LOCAL PROPRIETÁRIO1930.Outubro.13 Miradouro, Lanço, Poiso Abílio António Vieira

Dezembro.08 1ª Lombada (Ponta Delgada) Manuel Joaquim de Goes

1933.Junho.23 Lamaceiros Augusto Ribeiro Andrade

Junho.30 Achadinha(Boaventura) João de Almeida

Julho.14 Achada João de Almeida

Julho.28 Cascalho João de Andrade

1955.Agosto.01 Falca de Baixo Manuel Vicente

1963.Fevereiro.28 Pé do Passo João de Sousa Júnior

Para os anos de 1938 e 1939 temos o rastreio completo dos postos de desnatação em toda a ilha. A situação para o concelho de S. Vicente é a seguinte:

Freguesia Sítio Litros de leite recebido 1938 1939

S.VICENTE Feiteiras de Baixo 23433,30 56630,50 31521,50 Lanço 22525,50 60471,30 39985,80 Lombo 13543,40 Fajã do Amo 18423,30 48230,60 33427,30 Vargem 26603,50 Loural 21100,30 Rª Grande 26228,00 46925,90 25282,60 Ginjas 64105,40 118019,40 55258,60 Rª Passo 41418,30 27446,30 Vargem de Baixo 48456,60 37210,80 Ribeira Grande 46925,90 25282,60 Pé do Passo 53221,20 46729,10 Laranjal Corrida 31881,00 38372,90 Achada do Til 39056,60 37,855,50 Loural 50595,70 37855,50 Lameiros 78656,90 82792,90 Fajã Vinháticos 73958,20 82792,90 TOTAL 816473,50 841296,00 PONTA DELGADA Feiteiras 33646,00 32137,40 3ª Lombada 40745,70 42949,30 1ª Lombada 27687,60 42590,20 40683,50 25781,90 2ª Lombada 28503,90 30867,30 TOTAL 171266,70 174326,10 BOAVENTURA Pomar 53670,70 29679,30 23222,30 Lombadinha 38293,60 44927,40 Achada Castanheiro 63359,90 36839,40 27090,60 Fajã Penedo 66708,60 64933,80 Serra d’Agua 28762,30 26938,50 Lamaceiros 67341,20 68019,80

Lombo Urzal 31146,40 25736,30 Falca de Cima-Poço 101840,65 100923,80 Serrão 60780,00 61082,80 Silveira 46283,50 53341,50 TOTAL 558186,85 562735,50 Daqui resulta que o concelho finalizou a década de trinta com um aumento de dez postos de desnatação, cifrando-se o total em 39, o que deverá ser resultado do aumento do gado leiteiro. Aliás, os dados apontam para um crescimento evidente nas décadas seguintes. Tenha-se em conta que o ano de 1940 foi marcado por um forte vento de leste que destruiu culturas e ervas, sendo por isso mesmo de estrema dificuldade para a criação leiteira, que não se reflectiu em S. Vicente:

FREGUESIA 1938 1939 1940 1952 S.VICENTE 816473,50 841296,00 896943,00 1018845,70 PONTA DELGADA 171266,70 174326,10 198082,10 197891,00 BOAVENTURA 538186,85 562735,50 611735,80 664514,50 A evidência da importância na economia familiar está no dinheiro distribuído mensalmente aos lavradores. Mês S. Vicente Ponta Delgada Boaventura TOTAL

Nº postos 23 5 12 40

Janeiro 28099$47 6255§48 19663§21 54438$44

Fevereiro 29775$64 6710$74 19952$06 56430$44

Março 30057$34 6462$22 20270$92 56790$16

Abril 28895$52 5899$12 2397$49 55192$16

Maio 28633$42 5899$12 20397$49 55009$39

Junho 25813$72 4974$82 16888$69 47677$23

Julho 26200$36 4996$36 16229$24 47425$96

Agosto 27464$36 5767$85 17168$32 50400$53

Setembro 29002$34 6772$71 16356$72 54131$77

Outubro 31905$77 7794$88 20766$01 60.235$06

Novembro 33425$15 8520&95 24288$96 66235$06

Dezembro 34745$62 8560$04 27069$19 70374$85

Total 354018$74 78497$56 241644$39 674160$69

Proprietários 1110 275 590 1975

Média recebida por proprietário

31$89 28$54 40$95 341$34

Para o ano de 1943 é notificada a existência de 15 postos de desnatação no concelho, que transformaram 950.000 litros de leite em nata para o fabrico de manteiga. Na década de

sessenta é evidente um decréscimo no gado leiteiro do concelho, que continuou nos decénios seguintes. Proprietários Vacas leiteiras Total Gado bovino1940 1975 1725 25551960 1483 11105 3281 A AGRICULTURA O sistema de propriedade torna-se importante na definição das relações sociais que se estabeleceram em torno da agricultura. A origem fundamenta-se no sistema sesmarial que regeu a distribuição de terras a partir do século XV. A excessiva concentração das dadas de terra num pequeno grupo de sesmeiros levou ao aparecimento de formas características de propriedade. Primeiro foram as terras arroteadas vinculadas a que se associava o pagamento de um foro. Depois a necessidade de tornar agricultáveis as terras, de acordo com o contrato sesmarial. Em Ponta Delgada e Boaventura foi bastante evidente, a partir do século XVII, o domínio do contrato de colonia a materializar as relações sociais em torno da terra. E, por isso mesmo, tem “A Canga” de Horácio Bento de Gouveia um dos melhores retratos. Os mais destacados proprietários vêem-se na necessidade de ceder parcelas não arroteadas a quem estivesse interessado em as tornar aráveis fazendo as queimadas e erguendo paredes. Este último trabalho garantia-lhe uma forma de propriedade, isto é, a das benfeitorias aí realizadas. Daqui resultou dois tipos de proprietários: o proprietário da terra e o das benfeitorias. Os laços sociais que vinculavam o colono e o senhorio à terra regiam-se por normas específicas não exaradas nas ordens régias. O vínculo queria-se o mais duradouro possível e a própria estrutura do contrato, ao estabelecer uma forma de propriedade do colono, permitiu a sua quase perpetuação. A situação chegou até aos nossos dias e só o Decreto Legislativo Regional nº 13/77M veio a por termo a este contrato. Antes disso, já em Ponta Delgada nas Lombadas, se avançara em princípios do século com um pioneiro programa de extinção dos contratos de colonia aí existentes, propiciando ao colono a posse da terra e das benfeitorias, já herdadas dos parentesclxxxvi. A importância agrícola da vertente Norte assentou, no princípio, nas culturas de subsistência, que asseguravam as necessidades dos colonos aí instalados e um suplemento escoado para a vertente Sul. Era a principal actividade que ocupava e de sobrevivência dos naturais do concelho, produzindo-se para o consumo e elevado excedente que exportava às freguesias vizinhas ou ao Funchal. A rede de transportes, por mar e terra, era exígua e não contribuía em nada para a valorização da economia do Norte. São insistentes as reclamações do município para a melhoria do serviço do vapor costeiro que, por ser um "vaporzinho costeiro", não tinha capacidade de lotação para transporte dos produtos, como o gado e pipas de vinho e aguardenteclxxxvi. Somente nos anos trinta e quarenta, com o delineamento da rede viária, ficou solucionada de uma vez por todas a dificuldade. O vapor costeiro cedeu o lugar ao automóvel. Um dos aspectos essenciais para o avanço da área agrícola prendia-se com o alargamento da rede de irrigação. O concelho era rico em água, que corre o ano inteiro nas ribeiras, mas

devido à orografia não chegava com facilidade a todas as terras que era necessário irrigar. Não obstante, a abundância os vicentinos faziam valer os seus direitos. Deste modo em 1875clxxxvi levantou-se grande alvoroço entre os populares face ao requerimento de Roque Caetano e Araújo que pretendia tirar água do sítio dos Estanquinhos, mas a Câmara que diz ser "uma corporação que reprezente o povo do seu concelho", indeferiu o pedido uma vez que é aí a origem da Ribeira do Lanço "que pertence a vários proprietários desta freguezia". Os moradores dos diversos locais servidos pelas ribeiras e levadas tinham muita força junto da Vereação e juntavam-se em comissões para reivindicar os direitos de servidão. Assim sucedeu com a água da Ribeira da Vargem e da levada do Folhadal que provocou maior apoio e atenção na conservaçãoclxxxvi. A Câmara havia precavido antes isso ao prover anualmente um olheiro das águas de servidão pública. Temos apenas noticia de um em 1891clxxxvi que tinha ao seu cuidado a água das levadas das Feiteiras e Ginjas recebendo de soldo de 10 000 réis anuais. As reclamações dos moradores são legitimas e resultam do facto da levada ser um meio essencial ao dia a dia. Servia a irrigação dos terrenos, movimentava os moinhos e também o serviço doméstico. Em 1927clxxxvi informa o Dr. Gregório Dinis que uma quebrada destruiu no sítio do Saramago a levada velha das Feiteiras, privando os seus moradores há dois meses. "Esta levada além da irrigação que faz nestes sítios, tem a missão de servir para limpeza e egiene dos referidos sítios das Feiteiras e Saramago". Ainda não se havia lançado a rede pública de fontanários e de abastecimento de água e por isso mesmo a levada era merecedora de toda a atenção. A partir de 1944 é lançado um plano regional de aproveitamento hidráulico com a dupla finalidade de irrigação e produção de energia hidroeléctrica. A comissão de engenheiros foi recebida pela Vereação que lhe fez sentir a necessidade das levadas da Ribeira do Moinho (Boaventura) e Ribeira Grande(S. Vicente) clxxxvi. As culturas de grande rendimento económico foram sem dúvida a vinha e a cana sacarina. A vinha exigia-se com inúmeros cuidados, pois as condições climáticas locais aconselhavam a construção de latadas e a protecção com bardos de urze. Nas actas da Vereação sucedem-se os inúmeros pedidos para o corte de tanchões e de urzeclxxxvi. Em 1863 temos notícia de 12 lagares de vinho em todo o concelho, sendo sete em S. Vicente, três em Ponta Delgada e dois em Boaventura. Daqui se conclui do uso comum desta estrutura, tal como nos elucida Horácio Bento de Gouveia no pertinente retrato do norte lavrado em “A Canga”. O vinho era feito nas adegas do concelho e só depois conduzido para o Funchal. Todavia em 1909clxxxvi a agência de vapores Blandy não providenciou o despacho da cascadura, o que levou a Vereação a interceder junto do governador. O vinho depois de ter estagiado três meses na pipa era posto à venda ou conduzido ao Funchal. Neste último caso deveria ser acompanhado de uma nova guia, pois caso contrário não poderia ser despachado na Alfândega do Funchal. Foi isso que aconteceu em 1927clxxxvi com Francisco Sardinha que ao embarcar no navio Zarco o vinho o vogal da comissão de viticultura não quis assinar. Ao vinho que ficava no concelho era vendido nas tabernas, correndo sobe de uma taxaclxxxvi, ou então poderia ser feito pelo próprio viticultor, mediante autorização da Câmaraclxxxvi. A casta em maior evidência nas zonas ribeirinhas do concelho, desde finais do século dezanove era o jaquet. Ele conseguiu suplantar todas as europeias e afirmar-se como o

predilecto dos nortenhos. A capacidade de resistência à filoxera e a abundância dos luzidios cachos fascinaram os nortenhos. Deste modo a pretensão para acabar com isto levou a alguma apreensão no norte da ilha. Em 23 de Junho de 1928 a Vereação faz-se porta-voz das reclamações dos agricultores protestando em ofício dirigido ao Ministro da Agricultura, "contra o pedido das forças vivas reunidas na cidade do Funchal, em que pedem imediata substituição da vinha de jaquet na região da Madeira, por outras castas". Aliás, nos anos sessenta ele teve no Dr. Alcino Drumond um dos seus mais destacados defensores. Os dados referentes à produção são escassos e apenas podemos assinalar dois momentos que mesmo assim são elucidativos. No quinquénio de 1935 a 1939 temos os seguintes valores em litros: Concelhos Tinta Verdelho Moscatel Malvasia

Babosa Izabela Herbemont Jacquez Total

S. Vicente 49.239 365 558 162 33 2.205 968.168 997.073Total da ilha

2.634.740 43.401 6.495 698.173 647.045 736.846 3.494.887 8.669.780

As castas americanas correspondem a 97% da produção do concelho, sendo dominadas pelo Jaquet, o que levou a que se considerasse S. Vicente como o concelho do Jaquet. Já em 1943 a situação está em decrescendo uma vez que o valor destas castas se situa agora em 84%, para voltar a subir na década de sessenta. Em 1966 os 313 viticultores do concelho produziam um total de 1.039.853 litros de vinho, sendo 30.618 litros de castas boas e o restante de vinho jaquet. Os anos cinquenta e sessenta foram os anos de ouro do jaquet, tal como provam os dados de produção ANO LITROS 1951 848.931 1952 974.964 1953 1.277.351 1954 1.217.498 1960 1.170.157 1966 1.039.853 O vinho jaquet manteve-se por muito tempo como o vinho de marca do concelho tendo no Dr. Alcino Drumond, um dos principais promotores. Ganhou fama o vinho saído das adegas que delicia aqueles que tiveram a oportunidade de conviver com ele e partilhar a sua degustação. Hoje o jaquet perdeu a fama e a ilha de norte a sul procura reconciliar-se com as castas tradicionais. O final do século XIX marca o regresso dos canaviais à ilha, alastrando a área de cultivo ao Norte da ilha. A vinha teve de competir com esta nova cultura, que por certo se apresentava mais rentável A promoção é encarada por todos como um meio para ultrapassar a crise económica que fizera perigar o principal factor económico que era a vinha. A presença da cana e engenhos no concelho estão documentados desde a década de cinquenta. O primeiro engenho surgiu em Ponta Delgada em 1858, a que seguiu em S. Vicente em 1860 e no ano imediato tivemos outro para a primeira freguesia. Em 1863clxxxvi são referidos apenas três engenhos sendo dois em Ponta Delgada e um em S. Vicente. O último situava-se no sítio do Passo e foram fundado em 1860 por Catanho António de Freitas e António Fernandes Telles, era movido a água, sendo de três cilindros. Nos quatro

meses de actividade moía 13320 Kg de cana e 77435 Kg de sorgo. Em Ponta Delgada surgem os do sítio da Fonte e do Açougue. O primeiro foi fundado em 1858 pelo Conde de Carvalhal, a cargo de um administrador, produz 98 hectolitros de aguardente. O segundo em 1861 por Candido Lusitano de França com 25 hectolitros a partir de 29400 Kg de sorgo. As autoridades assistem como os principais incentivadores da cultura. Em 1888clxxxvi o município intervém no processo de promoção da cana sacarina, comprando acções no valor de 350$000 réis de uma fábrica de destilação que se pretendia fazer. Passados onze anos Francisco Afonso de Abreu Cardoso foi autorizada a reparar a fábrica de moer cana e destilar aguardente da Ribeira do Porco em Boaventuraclxxxvi. O mesmo sucede em 1900 com Daniel Brazão Machado para um na Quinta em S. Vicente e passados dois anos com João Fidélio Canha para outro na Pedra Funda em Ponta Delgadaclxxxvi. De acordo com o levantamento industrial feito em 1907 por Victorino José dos Santosclxxxvi o concelho estava servido de 5 engenhos (três em S. Vicente, um em P. Delgada e outro em Boaventura), sendo apenas misto de vapor e água em Ponta Delgada, que moíam 1095000 Kg de cana, o que representava 2,4% da produção da ilha. Em vereação apenas temos notícia em 1908clxxxvi do de Augusto Joaquim de Abreu, do sítio do Açougue (Ponta Delgada) que pretende iniciar a laboração de aguardente na fábrica à Pedra Funda pelo que solicitava a aferição das medidas e respectiva licença. A 11 de Março de 1911 o Governo Central decidiu expropriar as fábricas de aguardente, o que levantou uma onda de protesto. Em 17 de Abril a Vereação vê-se aflita para conter a fúria popular e reclama ao Governador Civil providências para a abertura das fábricas de aguardente do concelho: "o povo se acha alterado, ameaçando as authoridades e a commissão municipal". Todavia nos anos vinte a situação não havia melhorado pois o rateio de 500.000 litros de aguardente por engenho levaria a que muita cana ficasse por colher. Por outro lado a proibição de circulação de aguardente do Norte no Sul era também uma medida nefasta. A cana do norte só poderia ser transformada em aguardente, não havendo engenho para fazer açúcar, daqui resultaria que "a maior parte da cana teria de ser arrancada" levando à ruína a região norte da ilhaclxxxvi. O município, sempre ao lado dos interesses dos munícipes, não podia estar de acordo com as medidas, reclamando a revogação do decreto sacarinoclxxxvi. A situação levou ao encerramento em 1939 de seis fábricas em todo o concelho. Em “Águas Mansas” Horácio Bento de Gouveia fixou o retrato da decadência na freguesia de Ponta Delgada. Anote-se no mesmo ano o pedido de abertura de uma nova por António Norberto de Ornelas em Ponta Delgadaclxxxvi. Horácio Bento de Gouveia descreve de forma perspicaz a situação de crise da cana na freguesia de Ponta Delgada: “O engenho de Custódio Filipe, reconstruído por mestre do Sul, fazia rebentar de inveja Luís da Feiteira. Nova roda de castanho e novos baldes, novos cilindros, novo alambique, dependência para escritório privativo de gerente, a fábrica apresentava um aspecto completamente diverso do velho casarão que fora pertença de antigos fidalgos da freguesia(…). O engenho da Fonte estava um cangalho. As paredes sem cal, todo o rosto para o lado da rua esburacado, os armazéns da garapa a abarrotarem de ponchos com os arcos comidos de ferrugem. O proprietário, Luís da Feiteira, desde que lera no Diário Popular que o governo ia mandar expropriar os engenhos do Norte, desinteressou-se da conservação do edifício. Agora,

o eixo da roda da água que movimenta a engrenagem dos cilindros, de tanto girar, tinha as extremidades por um fio”clxxxvi. Noutro romance, Águas Mansas(1971), o trama tem por palco os engenhos da freguesia, donde se presente a luta contra uma política de monopólio do governo e a competição desenfreada entre os dois engenhos do centro da freguesia. A situação está patente nos valores da produção de cana, como se poderá ver com os seguintes dados: Ano PRODUÇÃO em Kgs 1937 165000 1938 111000 1942 47502 1943 14517 1966 6491996 Os números da década de sessenta são fruto de uma campanha de apoio à cultura que levou ao alargamento da área de cultivo também na encosta norte. Na verdade a cana continuava a ser para muitos agricultores uma esperança e meio da valorizar o labor diário, que persistirá até 1976clxxxvi. O ciclo da riqueza agrícola culmina com o feijão. A produção dava para as necessidades locais e exportação dentro da ilha, sendo por muito tempo um factor das exportações do concelho. Em 1950 havia sido elevada e faltavam exportadores pelo que o vereador António Jordão Andrade de Oliveira reclamou a necessidade de solicitar ao Governador a exportação de vinte toneladas, "para que o agricultor não desanime, diminuindo as plantações deste produto, o que vem prejudicar muito a economia deste concelho". Os cereais continuaram a ter um peso fundamental na subsistência das populações do Norte. As terras de sequeiro estavam-lhe reservadas e por todo o lado o amarelo dos trigais coloria a paisagem na época estival. A faina da ceifa, a animação da eira definiam um momento vital da vida agrícola A entrada do cereal no circuito alimentar só poderia ser feita mediante a existência de meios à transformação. Para isso socorria-se da força motriz da água, com os moinhos de água, ou do próprio homem, com os moinhos de mão. Em 1863 o concelho dispunha de dezoito moinhos de água, sendo onze em S. Vicente, um em Ponta Delgada e seis em Boaventura. Estes laboravam oito meses no ano para moer 2484 hectolitros de trigo e milho. O mais antigo moinho que aparece referenciado em vereação surge em 1901clxxxvi em Ponta Delgada por iniciativa de João António Rego. Depois em 1940clxxxvi tivemos outros dois no sítio do Passo em S. Vicente, propriedade respectivamente de José de Abreu Júnior e Alcino Ébio de Freitas. Em 1960clxxxvi António Francisco dos Reis instalou uma moagem eléctrica nas Feiteiras. Da farinha fazia-se o pão em forno caseiro ou então nas padarias que sabemos da sua existência na década de quarenta. Em 1947 sabemos existirem três padarias, sendo uma nas Feiteiras (S. Vicente) e duas em Boaventura. Somente em 1960clxxxvi S. Vicente voltou a ter nova padaria nas Feiteiras. No Passo, Alcino Ébio de Freitas tinha construído um pequeno complexo industrial composta de um moinho e de uma fábrica de fazer massaclxxxvi.

AS CRISES DE SUBSISTÊNCIA S. Vicente era um concelho rico em termos agrícolas mas não poderia considerar-se auto suficienteclxxxvi. Em muitos aspectos dependia do exterior, estando por isso sujeito à conjuntura económica insular e internacional. O ano de 1888 o mês de Janeiroclxxxvi foi de verdadeira catástrofe. As culturas da cana e da vinha haviam sido perdidas pelo que se decidiu anular a contribuição predial. A crise era geral: não havia géneros alimentícios, nem trabalho, pelo que a Câmara decidiu dar andamento a alguns reparos nos caminhos a seu cargoclxxxvi. Na Fajã de Areia, face à catástrofe de 17 de Maio houve necessidade de atender a 200 famílias, tendo o Governador concedido um subsídio de 300$00clxxxvi.De acordo com a vereação tornava-se necessário atender aos mais necessitados, pois os mais abastados abasteciam-se directamente no Funchal. A fome será um apanágio da primeira metade do século. Em 1918clxxxvi houve necessidade de importar 1200 toneladas de milho de África "para enganar a fome da população". A distribuição dos produtos no concelho fazia-se através de uma comissão de abastecimento estabelecida de acordo com o decreto de 15 de Janeiro de 1921clxxxvi. Nos anos quarenta a guerra veio de novo causar idêntica situação de rotura sendo necessária a intervenção das autoridades administrativas. A distribuição de farinha era feita de forma racionada às padarias, enquanto o proprietário da fábrica de massas do Passo estava obrigado a distribuir 460 Kg para a venda a retalhoclxxxvi. AS INDUSTRIAS ARTESANAIS As indústrias tradicionais não adquirem grande importância no concelho mesmo assim é de assinalar em 1863 a existência de 13 teares, sendo cinco em S. Vicente, dois em Ponta Delgada e seis em Boaventura. Os teares laboravam durante o ano 4680 metros de pano de linho, 98 de estopa e 237 de linho e lã. Note-se que a produção de lã no concelho era de 478 kgs, vendendo-se a 310 réis ao kg. Nesta época o bordado não era ainda uma actividade importante, pois temos apenas registadas quatro bordadeiras, que recebiam ao ano cerca de 380$000 réis. Foi no século XX que esta actividade adquiriu importância, cifrando-se em 1952 esse valor em 47252 contos que eram distribuídos por 2465 famílias. Mais uma vez Horácio Bento de Gouveia, em “lágrimas correndo mundo” traça-nos o retrato da bordadeira do concelho. Ainda no concelho assinala-se desde 1850, que se mantinha em 1863, uma fábrica de curtumes, fundada por Joaquim da Silva Ganança no Sítio do Lombo dos Cabos em Boaventura, que curtia anualmente cerca de 100 couros. O mapa das actividades sócio-profissionais do concelho para 1863 é também elucidativo da forma como um concelho fechado como o de S. Vicente procurava assegurar a sua auto-suficiência: OFÍCIO S.VICENTE PONTA DELGADA BOAVENTURA TOTAL Alfaiates 1 1 Bordadeiras 4 4 Carpinteiros 5 2 7 Costureiras 3 2 2 7

Ferreiros 4 2 9 15 Gramadeiras 30 8 21 59 Lavradores 40 6 19 65 Marceneiros 1 1 Parteiras 6 2 1 9 Pedreiros 6 1 5 12 Pescadores 8 7 15 Sapateiros 10 4 6 20 Tanoeiros 1 1 Tecedeiras 5 2 6 13 Trabalhadores 400 130 340 870 O COMERCIO As produções locais alimentavam a economia e subsistência caseira, sendo os excedentes exportados para a cidade, freguesias e concelhos limítrofes. Primeiro pelos vapores de Ponta Delgada e depois pelo automóvel fazia-se chegar ao burgo o feijão, as batatas, o vinho, as madeiras e lenhas. Alguns dos estrangeiros que visitaram a encosta Norte referem a riqueza florestal, mas também agrícola. O povo humilde vive do trabalho da terra desconhecendo o uso do dinheiro no sistema de trocas que se mantêm assente no sistema tradicional. Ao Domingo havia um mercado na vila, após a missa, para troca de produtosclxxxvi. Mais uma vez Horácio Bento de Gouveia pressente a mudança que ocorreu na economia do concelho quando o automóvel substituiu o vapor pelo automóvel: “Se nos reportarmos à ilha que habitámos, podemos assinalar dois períodos no tocante aos mantimentos de que sempre viveu o ilhéu: o anterior à construção das estradas que ligam o Norte com o Sul, e o que lhe sucedeu e vem até à actualidade. O primeiro caracteriza-se pelo meio de transporte marítimo, o qual era incerto no comunicarem os barcos com os portos, sem consequência do estado do mar do Norte(…) faltando a mercadoria nas vendas e não sendo possível remeter para a cidade o feijão e semilha. Desta sorte a produção dos campos rara saía das freguesias, mesmo porque ainda não se tinha desenvolvido a psicologia do comerciante. O que a terra dava, na terra ficava. A jornada pedestre limitava-se à cesta, ao pequeno saco ou ao barreleiro de pequena dimensão. O segundo período distingue-se pela abertura da estrada à camioneta. Cessam as carreiras dos naviozinhos de cabotagem(…).Po outra parte, torna-se viável a qualquer levar para a cidade ou mandar à cidade em dia previsto, com mau tempo ou bom tempo, tudo que não excedesse a força do “carro”. E agora, a partir do segundo quartel do século, transforma-se a vida económica das freguesias. Intensifica-se a cultura das fazendas com intuito comercial”clxxxvi. Durante o século XIX as madeiras são a mais evidente exportação do concelho. São inúmeros os pedidos de licença de corte para esse fim. A Câmara para disciplinar o movimento estabeleceu a abrigatoriedade de marcar as madeiras saídas do concelho. Em 1898 encontravam-se no Calhau algumas madeiras prontas para serem levadas ao Funchal que eram de contrabando, uma vez que ostentavam a marca CMSV, quando a usada era CSVclxxxvi.

Os valores da estiva estabelecidos em KG para o ano de 1943 evidenciam a realidade:

PARA O FUNCHAL DO FUNCHAL Lenha 68700 Milho em grão 6870Madeira 75913 farinha 9900Vimes 7085 Massas 5239Batata e semilha 2245 Açúcar 6599Feijão 17905 Sal 86760canas 13898 Sabão 4562carga diversa 33268 Pipas vazias 12530vinho 93660 Adubo 10910 Enxofre 9090 Cimento 44800 Diversos 24942TOTAL 232674 TOTAL 554878 O transporte marítimo continua ainda a ser importante para o concelho nas relações com a cidade. Os produtos dominantes do trafico continuam a ser os tradicionais: as lenhas, madeiras e vinho que se trocam por produtos importados. A mudança ocorreu com a chegada do automóvel. A alteração sentiu-se a vários níveis no Norte. Foi o momento de despertar da encosta, até então abandonada, para as realidades urbanas do Sul e o progresso que com isso adveio para os lugares e as gentes. Na definição da economia do concelho através da circulação dos produtos deve ater-se às duas realidades. A intervenção do município quanto à actividade comercial tem incidência quase sempre na realidade local. O Açougue que serve de venda à carne, a praça para venda do pouco peixe e as vendas e tabernas que contribuíam para a distribuição e venda dos produtos importados da cidade ou do vinho da produção local. A PRAÇA E O AÇOUGUE O corte e venda de carne era um dos campos de assídua interferência da Vereação, estando estabelecida pela necessidade de assegurar o normal abastecimento. A Câmara constrói os açougues e nomeia os magarefes para o abate e corte da carne. O concelho dispunha de 3 açougues, um para cada freguesia. A situação data de 1867, pois que só neste ano a Boaventura teve açougue próprio em telheiro cedido para o efeito por Manuel António de França Carvalhoclxxxvi. Em S. Vicente, desde 1891, estavam em funcionamento dois açougues: Feiteiras e Vila. O último funcionava numa casa arrendada, sendo o gado abatido em plena via pública no Largo do Pelourinho. Contra este uso reclama o procurador do concelho solicitando um local apropriado para o abate. A Câmara deliberou e adquiriu um terreno para aí construir um novo açougueclxxxvi. Por postura de 1896clxxxvia Câmara proibiu o abate de gado nas ruas e lugares da vila, ao mesmo tempo que se interditava a venda de carne fora dos açougues. Para além da definição dos locais de abate e venda a Câmara foi alertada pelo delegado de saúde para a necessidade de fiscalização da carne pois vendia-se dela incapaz "por suspeita de moléstia perniciosa para a

saúde pública"clxxxvi. Aqui insiste-se na necessidade de uma normativa que obrigasse os magarefes a não abater as rezes sem antes serem examinadas pelo facultativo. Assim aconteceu a 14 de Junho ao estabelecer-se a obrigação, ficando o médico incumbido da fiscalização prévia do gado e, após a abertura, ao exame das vísceras. Tardou a construção de um açougue na Vila, mantendo-se a funcionar em condições precárias em prédios alugados. Assim em 1905clxxxvi reclama-se uma casa para o instalar, "visto que a actual é imprópria e prejudicial à conservação da carne por ter pouca ventilação", sendo mudada para uma loja na Rua Direita. A Câmara foi obrigada a optar por um novoclxxxvi. Em 1915clxxxvi a Vila passou a dispor de um novo matadouro e praça de peixe, tendo como fiscal para sua guarda Manuel Pestana do Poiso. A situação dos demais açougues não era melhor. O das Feiteiras foi encerrado em 1909clxxxvi pelo delegado de saúde devido ao estado de conservação, apostando a Câmara na reparação com uma verba de 49$000clxxxvi. Depois optou-se pela construção de um novo vendendo-se o actual edifício em hasta pública, para que a receita fosse usada na construção do novo edifícioclxxxvi. Em 8 de Agosto de 1932 a vereação decidiu-se o encerramento, mas apenas passados dez anos se iniciou a construção do outro, que foi adjudicado a 7 de Agosto de 1943 a Cândido Homem de Gouveia por 35.900$00. E só em Maio de 1944 as Feiteiras passou a dispor de novo açougue. Para Boaventura o novo açougue só ocorreu em 1957clxxxvi. Finalmente em 1968clxxxvi avançou-se com um estudo para a construção de um talho e praça de venda de peixe na Vargem. Para além da necessária definição dos espaços para abate, corte e venda de carne, a Câmara definiu um conjunto de regras reguladoras da actividade e assume o encargo de nomear os funcionários para o seu exercício e fiscalização. Em 1868clxxxvi existiam 3 cortadores de carne, sendo um para os açougues de Boaventura e Ponta Delgada e dois para a freguesia de S. Vicente. Eles estavam sob a alçada de um director em S. Vicente e Boaventura e de um fiscal em Ponta Delgada, que deveriam fiscalizar a actividade dos cortadores de carneclxxxvi. Em 1873clxxxvi o regedor de Ponta Delgada reclamava junto da vereação a falta de higiene no açougue, acusando o responsável de não obrigar os cortadores de carne "para os varrer e lavar todas as semanas". O exercício da actividade gerou alguns atritos entre a vereação e os cortadores de carne. Assim em 1868clxxxvi o vereador João Joaquim de Canha, como director do açougue de Boaventura impediu o cortador de vender a carne a mais de 120 rs ao Kg. Ainda o mesmo cortador é admoestado em 1872clxxxvi por vender carne fora do açougue, acabando demitido. Aliás, toda a infracção ao estipulado nas regras de funcionamento levava à demissão. Senão vejamos. Em 1892clxxxvi Manuel Francisco marchante das Feiteiras, porque não dava conta aos donos do dinheiro do gado que lhe era confiado para venda foi demitido. Ainda, neste mesmo açougue o magarefe José Gomes Medeiros segue o mesmo caminho por deixá-lo abandonado e sem carneclxxxvi. Durante os primeiros anos do nosso século não pressentimos qualquer anomalia no funcionamento dos açougues que chegasse à vereação. Parece ser um momento de penúria de gado para abate, pois em 1924clxxxvi a Vereação recomenda que sempre que quando fosse abatido gado num dos açougues da freguesia de S. Vicente deveria dar-se metade ao outro. Caricata foi a situação vivida no mesmo ano em Boaventura onde Manuel António Caldeira, entrou no açougue onde insultou e expulsou o magarefe, Afonso de França, assumindo a sua posiçãoclxxxvi.

A definição de um regulamento para os matadouros e talhos municipais é já de 1965clxxxvi e marca o início de uma nova forma de administração dos açougues. A partir de 1966clxxxvi o abate e abastecimento de carne aos açougues era feito por arrendamento em hasta pública. A renda tinha como base de licitação os 3.600$00 e deveria ser paga trimestralmente. Na primeira licitação ficou em aberto o de Boaventuraclxxxvi sendo os demais concedidos da seguinte forma: Vila- José de Oliveira e Freitas - 5.450$00 Feiteiras - 6.005$00 Ponta Delgada - Manuel José - 3.700$00 O peixe parece nunca ter adquirido grande importância na alimentação do concelho. Em 1892clxxxvi a venda fazia-se sem quaisquer condições pelas ruas da Vila, no que foi limitado pela vereação que estabelece para local de venda a praia junto ao porto da Vila, onde a Câmara pretendia concretizar uma praça. Tal objectivo foi concretizado em 1896. O projecto foi apresentado no ano anteriorclxxxvi, mas só em 18 de Maio foi adjudicada a obra a Carlos João de Sousa pelo valor de 400$000 que a deu por concluída em 19 de Setembro. Em 1897clxxxvi dava-se por concluída a praça, sendo baptizada de Mercado Mouzinho da Silveira como forma de “perpetuar neste concelho o nome dum illustre heroe que tanto se tem destinguido nas campanhas de Africa, causando admiração ao mundo, e assegurando o domínio português nas vastas regiões onde tem combatido...” Já em finais do século passado era corrente os pescadores socorrerem-se de bombas para matar o peixe, o que acarretava inúmeros prejuízos para os cobradores dos impostos que recaiam sobre o pescado. Assim o evidencia uma queixa do cobrador deste imposto em Porto Moniz em 1896clxxxvi, quando a freguesia estava sob alçada do concelho de S. Vicente. AS VENDAS E MERCEARIAS O abastecimento local fazia-se a partir das mercearias e tabernas. Aí vendia-se em simultâneo bebidas, nomeadamente o vinho da produção local, géneros alimentícios e artefactos locais ou de importação. As vendas ou mercearias são espaços privilegiados do mundo rural. Quase todas são definidas por dois espaços: a mercearia e a taberna. A última é um local importante de convívio. É o ponto de encontro dos homens após uma jorna de trabalho. Dentro da economia rural estes espaços assumem um papel fundamental no sentido de que distribuem os produtos de fora, mas também os locais que muitas vezes recebem por troca directa. Quem não se recorda do tempo em que ovo da galinha servia de moeda de troca ? A criação deste espaço obedece às possíveis solicitações da procura estando em razão directa dos agregados populacionais do concelho. Elas derramam-se por todos os sítios, surgindo uma maior concentração dos espaços de maior circulação de munícipes. O facto de a única paróquia da freguesia de S. Vicente se situar por muito na Vila, fez valorizar este espaço e aumentar a densidade de estabelecimentos no percurso que conduz os transeuntes a ela. Senão vejamos. A Vila surge ainda em 1965 com cinco a que se associam outras três do Poiso. No mesmo ano a freguesia de S. Vicente apresenta-se com quarenta e dois estabelecimentos registado, Ponta Delgada com treze e Boaventura com vinte e dois.

A abertura de um estabelecimento obrigava ao requerimento da licença que só poderia ocorrer depois da necessária autorização camarária e do pagamento de uma taxa. Ao infractor era atribuída uma pesada multa. Foi isso que sucedeu em 1886clxxxvi a Caetano Rodrigues de Gouveia, das Ginjas, que tinha aberto uma taberna no miradouro sem que para tal estivesse habilitado com a licença camarária. Acrescem ainda outros requisitos que foram regulamentados ao longo do tempo. Assim, em 1931clxxxvi a localização deveria estar a mais de 500 metros de distância das escolas. E antes havia-se estabelecido padrões de higiene e sanidade no funcionamento. De acordo com regulamento de 1946clxxxvi todos os estabelecimentos comerciais foram obrigados, num prazo de noventa dias, a ter água canalizada e pia, caso se situassem a mais de 100 metros da canalização pública a obrigação revestia-se na presença de um reservatório de barro com capacidade para 50 litros. Por outro lado os géneros alimentícios deveriam ser guardados em prateleiras envidraçadas ou caixas fechadas. Depois foi a proibição a partir do dia 1 de Junho de vender no mesmo compartimento os géneros alimentícios, tintas, óleos, guanos, sulfato de cobre e substâncias tóxicas ou nocivas à saúde. Aquele que infringisse a medida sujeitava-se a uma multa de 200$00. Disto foi feito um edital a 25 de Maio que obrigava os proprietários de mercearia a procederem aos adequados melhoramentos. Assim, na realidade sucedeu surgindo entre Junho e Agosto deste ano 53 pedidos para a realização de obras nos estabelecimentos. Concluídas as melhorias o proprietário deveria solicitar uma vistoria à Câmara, o que o habilitava após isso a abrir as portas. A correria ao mercado de materiais de construção levou a que se esgotassem os stocks. Deste modo em 28 de Setembro Cândido Homem de Gouveia, das Feiteiras, solicitou o adiamento na instalação da pia por falta no mercado. Mesmo assim o despacho da Câmara é incisivo: "deve manter encerrado o estabelecimento enquanto decorrem as obras, visto que não cumpriu, como devia as instruções fornecidas pela Câmara em edital de 25 de Maio findo"clxxxvi. O comércio de alguns produtos mais importantes, como o vinho, aguardente e carne, tinha um regulamento especial, onde se estabelecia a forma de lançamento e controle dos impostos municipais que sobre eles incidiam. O primeiro é de 1870, seguindo-se outros em 1880 e 1881clxxxvi. Aqui estava determinado a forma de circulação do produto e a sua venda. No caso da aguardente deverá ter 21 graus bartier e cada vendeiro só poderá ter um depósito de 15 litros. A partir do século XX a avaliação do imposto para venda fazia-se através de avença. A cobrança acontecia no mês de Maio e todos os comerciantes deviam declarar à Vereação o número de pipas de vinho para vendaclxxxvi. Normalmente o vendeiro apresentava um valor muito inferior ao que na realidade dispunha, mas a Câmara acabava por estabelecer um valor mais ajustado, que acabava quase sempre por ser mais mil pipasclxxxvi. Em 1949clxxxvi Carlos Silvestre de Sousa, das Feiteiras, declarou apenas 2 000 pipas de vinho mas no cômputo da Câmara foi taxado em 3 000 pipas. Já na década de sessenta as avenças eram solicitadas em requerimento à câmara, que os deferia depois de ter parecer favorável da fiscalização e do chefe da secretariaclxxxvi

Um dos problemas com que se debateram os merceeiros foi o horário de descanso semanal. Em 1907clxxxvi eles representaram à Câmara para que o dia de descanso semanal passasse do Domingo para a Quarta-feira, no que tiveram aprovação. Mas em 11 de Setembro de 1911 foi deliberado que todos os estabelecimentos deveriam encerrar ao domingo. Sucede que era o dia de maior actividade de vendagem. A missa dominical estabelecia uma pausa no trabalho do campo e obrigava os vicentinos a deslocarem-se à igreja ou capela mais próxima. No percurso

estavam as vendas e os vendeiros, por detrás do balcão ávidos de clientela. Perante isto encerrar aos domingos era matar o principal dia de negócio. Daí que a maioria dos industriais do concelho tenha solicitado que o descanso semanal seja à quarta-feira e nunca ao domingoclxxxvi. O próprio despacho da câmara afirma isso: ”Considerando mais que o Domingo é o dia em que o povo, não devendo trabalhar, vem comprindo o dever sagrado de ouvir a missa conventual aproveitar esse dia para tratar dos seu negócios unico em que com mais facilidade se pode reunir em pratica de seus contractos, favorecendo e facilitando assim o commercio local...”. A medida ficou dependente de uma autorização superior. Em 1948clxxxvi apenas estavam autorizados à abertura aos domingos das festas e romarias, mediante o pagamento de uma licença. De acordo com outro acórdão de 1952clxxxvi só poderiam funcionar ao Domingo e só até às 12 horas as tabernas e naqueles estabelecimentos mistos os que tinham separação da mercearia. As festas do Bom Jesus em Ponta Delgada e de Nossa Senhora do Rosário, porque movimentavam inúmeros forasteiros de toda a ilha, eram um dos momentos desejados para a aberturaclxxxvi. O mesmo sucedia nas vésperas de Natal e fim de anoclxxxvi. A par disso o regulamento de 1912clxxxvi havia estabelecido a obrigatoriedade de todos os assalariados terem direito ao descanso semanal de vinte e quatro horas ao Domingo, incorrendo os contraventores na multa de cinquenta a cem mil réis. Os preços de venda ao público dos diversos géneros de produção local eram estabelecidos em vereação. Todos os anos entre Outubro e Janeiro eram definidos os preços para todos os produtos colhidos no concelho: vinho, cereais, cebolas, feijão, favas, batata, carne, laranjas, limões, inhame, vimes, cana doceclxxxvi. Os dados que conseguimos reunir evidenciam que o concelho de S. Vicente era um concelho rico em termos agrícolas. A diversidade de culturas define uma perfeita auto subsistência, só dependente de poucos mas indispensáveis produtos como o sal e o açúcar. Mas, quando a falta era evidente, como sucedeu no período da 2ª Guerra Mundial, busca-se vias alternativas, como a água do mar e o mel. Foi esta capacidade de solução mesmo para os mais ínfimos pormenores que fez das gentes do Norte combativas contra as forças da natureza, as opressões das autoridades e as dificuldades geradas pela conjuntura política nacional ou internacional.

VENDAS CRIADAS NO CONCELHO. 1886-1974

S. VICENTE PONTA DELGADA BOAVENTURA

LOCAL Nº LOCAL Nº LOCAL Nº

Cascalho 2 Falca 5 Açougue 2

Feiteiras 7 Fajã do Penedo 3 Rochinha 1

Fajã Vinháticos

2 Igreja 3 Terreiro 2

Ginjas 4 Fajã Grande 1 Lugar 1

Laranjal 1 Lombo Urzal 1 Pico 1

Lanço 2

Loural

2 Feiteiras 1

Pé de Corrida 1

Passo 2

Poiso 3

Vargem 3

Vila 3

Ribeira Grande

1

TOTAL 33 TOTAL 13 TOTAL 8

VENDAS, TABERNAS E MERCEARIAS DO CONCELHO

ANO TIPO FREGUESIA

Ponta Delgada

Boaventura S. Vicente

1886 Taverna Miradouro (Ginjas)

1939 Mercearia Poiso, Vargem

1940 " Igreja Lanço

1941 " Feiteiras, Achada do Til, Calhau, Ribeira Grande

1942 " Ginjas, Calhau

1943 " Ginjas, Vargem

1944 " Feiteiras Fajã do Penedo Rª Grande, Passo, Calhau, Laranjal(2), Lanço, Cascalho, Vargem, Vila, Rª do Passo, Passo, Feiteiras, Fajã dos Vinháticos

1945 " Açougue Fajã do Penedo(2), Fajã Grande, Falca, Levada

Feiteiras, Poiso, Rª do Passo, Cascalho

1946 Mercearia, Pastelaria

Feiteiras Fajã Grande Vila

1947 Vila

1951 Bebidas e Mercearia

Feiteiras

1952 Bar/Mercearia Fajã do Penedo, Nevada Ginjas(2), Rª Grande

1957 Bar Terra Chã

1959 Pico Guias, Igreja(2), Fajã Grande

Vargem, Feiteiras, Poiso

1960 Pastelaria/Bar Enxurros Igreja, Serrão Poiso, Ginjas, Vila(2),

Poiso 1961 Achadinha Feiteiras(2)

1962 1ª Lombada Igreja(3), Fajã Grande Feiteiras(2), Achada do Til

1963 Café-Restaurante

Vila

1964 Taberna Fajã Grande, Falca

1964 Pastelaria 1ª Lombada Fajã Grande, Falca, Fajã do Penedo

Laranjal(2)

1965 Bar/Mercearia Fajã do Amo

1966 " Feiteiras

1966 Taberna 1ª Lombada

1967 Bar/Mercearia Ginjas, Vargem

1967 Taberna Feiteiras

1968 " Vila, Cascalho

1968 Mercearia Falca Ginjas

1968 Pastelaria Vila

1969 Taberna 3ª Lombada

1969 Taberna/Mercearia

Rª Grande

1970 Mercearia Serrado S. Cristóvão Rª Grande, Ginjas

1971 Pastelaria Vila, Feiteiras

1971 Mercearia Açougue Vila

1972 Taberna Enxurros Igreja

1973 Pastelaria 2ª Lombada Serrão

1973 Taberna Ginjas

1974 Mercearia Vila

1974 Pastelaria Fajã da Areia

PREÇOS DE VENDA DE PRODUTOS

PRODUTO 1870 1872 1877 1881 1884 1886 1889 1961 1966 1970 1971 Vinho 3500 4000 3500 3500 3000 2000 400 9$90

clxxxvi3$70clxxxvi

6$00 8$

Trigo 700 500 600 700 480 800 4$00 3$50clxxxvi

4$00 4$50

Feijão 400 400 500 500/550 700 9$00 6$00 9$00

Centeio 400 400 500 400 500

Cevada 350 350 400 400 200 3$00 3$00 3$00 4$

Semilhas 200 200 300

Batata doce 150 150 150 300 1$25 $90 1$20 1$91

Inhame 150 150 100 300

Milho 400 400 500 400 250 500 2$50 2$50 2$50 3$

Tremoços 300 4$00 2$80 4$00 4$62

Cana doce 2000 300clxxxvi 200clxxxvi

Garrapa 400

Favas 350 350 500 400 280 500 4$00 3$00 4$00 4$25

Ervilhas 600/700 500 280 7$00 5$00 7$00 9$

Feijão vara 350 10$

Vimes 400clxxxvi

Vime verde $50 1$00clxxxvi

$50 1$

Vime seco 9$00 7$20 7$41 9$

Cebolas 2$70 2$30 3$33 5$

Lenha pinho $30 $40clxxxvi $30 $30

Laranjas 50$ 63$8clxxxvi

80$ 100$

Limões 100$ 50$ 76$66 95$

Madeira pinho 4$clxxxvi 3$00clxxxvi

4400 3$00

Carne porco 1ª 36$ 35$ 36$ 36$

Vaca 2ª 28$ 29 28$ 28$

Vaca 3ª 17$ 20$ 17$

Vitela-perna 35$

Vitela com osso 28$

Costeleta/lombo 25$

Pá/peito//abas/pescoço

20$

Carneiro/perna 22$

Carneiro/lombo/costeleta

20$

Carneiro/outro 17$

Cabra 17$

Batata 1$93 2$54

osso 4$00 4$

Sebo 5$00 5$

Frango 20$ 27$

Galinha 25$ 25$

Língua 28$

Fígado 28$ 28$

Rim 28$ 28$

IMPOSTO INDIRECTOS. AVENÇAS

VENDEIRO FREGUESIA SÍTIO 1965

António Gomes Júnior S.VICENTE Fajã da Areia * Eduardo Mendes S.VICENTE Feiteiras * José Correia BOAVENTURA Igreja * Augusto Apolinário BOAVENTURA Fajã do Penedo * José Martinho Gomes PONTA

DELGADA Igreja *

Manuel Pestana S.VICENTE Feiteiras * Manuel José PONTA

DELGADA Tanque *

José Agostinho Geraldo de Andrade BOAVENTURA Falca * Maria Leopoldina Rodrigues BOAVENTURA Fajã do Penedo * Ernesto Teotónio da Silva Branco S.VICENTE Passo * José Maria de Sousa S.VICENTE Poiso * João Eduardo Mendes S.VICENTE Fajã dos

Vinháticos *

Gastão de Sousa Jardim S.VICENTE Feiteiras * Manuel Fernandes Leça S.VICENTE Ribeira do Passo * Manuel Rodrigues Dias S.VICENTE Vila * Fernando de Gouveia Brazão S.VICENTE Vila * Marcos de Gouveia Brazão S.VICENTE Loural * Armando dos Santos S.VICENTE Ginjas * João Rodrigues Mendes S.VICENTE Ginjas * Maria Carolina de Jesus BOAVENTURA Falca * Manuel João Pereira da Silva BOAVENTURA Falca * Alvaro Gerardo de Andrade BOAVENTURA Falca * Manuel João Pereira da Silva BOAVENTURA Fajã do Penedo * Manuel Agostinho Gerardo BOAVENTURA Falca * António João Catanho BOAVENTURA Igreja * Manuel Pestana Francisco BOAVENTURA Cabo da Ribeira * Procópio José Vieira BOAVENTURA Igreja * Manuel Pestana Ribeiro BOAVENTURA Fajã do Penedo * João Gomes de Feitas BOAVENTURA Igreja * Manuel Ponte Júnior S.VICENTE Achada do Til * António Francisco dos Réis S.VICENTE Feiteiras * Agostinho Gonçalves S.VICENTE Vargem * José João de Sousa S.VICENTE Ginjas *

Manuel Batista de Andrade S.VICENTE Poiso * Manuel Francisco Faria S.VICENTE Vargem * Germano Drumond S.VICENTE Vila * António Francisco dos Reis S.VICENTE Laranjal * Armando Nunes S.VICENTE Ginjas * João Rodrigues Mendes S.VICENTE Feiteiras * Vicente Horácio Maria de Sousa S.VICENTE Laranjal * António Joaquim Júnior S.VICENTE Vila * Manuel Gouveia Brazão S.VICENTE Vargem * Humberto Vieira e Ernesto Pestana de Castro

S.VICENTE Vila *

Humberto Vieira S.VICENTE Lanço * António Mendes Neves S.VICENTE Fajã dos

Vinháticos *

António Henriques de Andrade PONTA DELGADA

Feiteiras *

António da Silva Júnior BOAVENTURA Serrão * Manuel Cipriano dos Santos BOAVENTURA Fajã Grande * Ivo Venâncio Vieira S.VICENTE Feiteiras * Manuel de França Barbosa BOAVENTURA Fajã Grande * Anibal de Cunha Jardim PONTA

DELGADA 1ª Lombada *

Manuel Maria Carvalho BOAVENTURA Igreja * Daniel Vieira da Silva S.VICENTE Vargem * Carlos Viveiros dos Santos S.VICENTE Ribeira Grande * Virginia Ferreira de Góis PONTA

DELGADA 1ª Lombada *

Manuel de Sousa Andrade S.VICENTE Cascalho * José de Oliveira e Freitas S.VICENTE Feiteiras * Albino de Sousa Diniz PONTA

DELGADA Açougue *

Gregório Januário de Oliveira S.VICENTE Lameiros * Manuel Francisco Joaquim PONTA

DELGADA Enxurros *

José de Sousa Andrade S.VICENTE Pé do Passo * António Olavo de Freitas PONTA

DELGADA Tanque *

Silvano Luís de Sousa BOAVENTURA Fajã do Penedo * José Vieira BOAVENTURA Serrão * José Luís do Monte PONTA

DELGADA Lugar *

João Caldeira Vicente Neves BOAVENTURA Igreja * Manuel Rodrigues de Andrade BOAVENTURA Fajã do Penedo * Empresa Automobilistica da Ribeira Brava

S.VICENTE Quinta *

João de Andrade Júnior S.VICENTE Laranjal * João Romão de Freitas PONTA

DELGADA Açougue *

Jacinto Amândio de Freitas PONTA

DELGADA Açougue *

Manuel Maria da Silva PONTA DELGADA

3ª Lombada *

João José Agostinho PONTA DELGADA

1ª Lombada *

Jorge de Andrade S.VICENTE Feiteiras * Luis Pestana de Castro S.VICENTE Poiso *

OS CAMINHOS DO FUTURO

A orografia da vertente norte da ilha associada às difíceis condições de aproximação da costa não facilitaram a circulação de homens e produtos arrancados à terra. Este factor condicionou de forma evidente a evolução das freguesias e concelhos do espaço. Em 1774 um dos grandes argumentos usados pelos moradores do norte para reivindicarem o novo município era a grande dificuldade de comunicação, por terra e mar, com Machico. Por terra traçaram-se veredas que, através do Curral das Freiras ou o Paúl da Serra, estabeleciam o contacto entre as duas vertentes. Somente em 1914 tivemos a primeira estrada de ligação ao Funchal pela Ribeira Brava que em 1928 foi alvo de um alargamento para se ajustar à circulação de viaturas. Hoje o sistema viário em progresso tende a esbater cada vez mais as distâncias. As veredas eram de difícil circulação para os homens e muito pior para as mercadorias. E, por isso mesmo, o recurso mais usual, até ao aparecimento da primeira viatura motorizada, foi o mar. Através dele traçou-se uma rede de comunicações entre as várias localidades. Os ditos "barcos de carreira" eram o elo de comunicação entre os diferentes portos costeiros. Esta deveria ter sido a irreversível opção dos primeiros colonos que se fixaram na costa norte. OS VAPORES COSTEIROS Até à abertura das estradas de ligação do concelho ao Funchal, que apenas ocorreu no nosso século, o meio mais rápido e seguro era o marítimo. Existia uma linha de vapores costeiros que ligavam os vários concelhos da região. O serviço foi contratado em Novembro de 1893 à empresa Insulana de Navegação que deveria realizar três viagens por semanaclxxxvi. Em S. Vicente o poiso mais adequado situava-se em Ponta Delgada, o que contribuiu para algum benefício do lugar. Os vapores transportavam pessoas e haveres, sendo desta forma que se procedia ao escoamento dos produtos agrícolas, para os senhores residentes no Funchal. Em 1898clxxxvi a câmara clama por um melhor serviço para o “vaporzinho costeiro”, que deverá tocar o concelho pelo menos duas vezes por semana e “ter maior lotação para satisfazer necessidades de transporte dos produtos” como seja o gado e pipas de vinho e aguardente. Horácio Bento de Gouveia recorda com saudade estes tempos: “para além de 30 anos a beira-mar, com seus portos, foi centro muito activo da gente do Norte(…)Era o mar a estrada por

onde se conduziam as mercadorias e se deslocavam, quando as condições marítimas favoreciam, aqueles que iam à cidade(…)Mas transcorreram os tempos. A estrada marítima foi substituída pela terrestre. Tomou a camioneta o lugar do vapor. Silenciaram os caminhos outrora tumultuosos, os caminhos para o embarcadoiro. Só as rochas conservam o apito de estridência melancólica do Açor, do Bútio, do Gavião e do Falcão.” Também, o Feiticeiro do Norte guarda a memória dos tempos e aproveita a realidade para caracterizar a freguesia. Ponta Delgada p’ra lapas tem boas praias de mar onde vapores costeiros fazem porto pr’a voltar ESTRADAS Na segunda metade do século XIX o estabelecimento de uma rede viária é considerado uma condição indispensável para o progresso económico da ilha. Em 1869clxxxvi a grande opção para o concelho de S. Vicente era a já começada estrada entre a Vila e a Encumeada, pois "a conclusão desta estrada é de grande utilidade para a comunicação deste concelho com as de Ponta de Sol e Câmara de Lobos". A rede viária completava-se com a estrada do Paul que estabelecia a comunicação com a Calheta, Porto Moniz e Ponta de Sol e a de Boaventura que ligava o concelho a Santana. Na época procurava-se facilitar a circulação de gentes, a pé, a cavalo ou de rede, pois o automóvel é para nós uma invenção do século XX. A rede viária que ligava a encosta norte à Sul, os chamados caminhos reais, eram incipiente e não oferecia qualquer segurança ao transeunte O caminho que ligava o Funchal ao concelho pelo Pico Ruivo era, segundo Carlos Fariaclxxxvi, “muito mau, mas muito interessante”. Aliás, o troço entre Boaventura e Ponta Delgada era muito perigoso e um quebra-cabeças para os estrangeiros, que gastavam mais de uma hora para o percorrerclxxxvi. A cavalo gastava-se cerca de 7 horas, sendo o custo diário da montada em 1909 de 3$500 réisclxxxvi. Em 1914 C. Powerclxxxvi dá conta dos percursos para uma visita ao concelho e o tarifário dos serviços de transporte:

PERCURSO REDE Barco CAVALO BOAVENTURA/FUNCHAL 10 dólares só

ida 20 a 30 ida e

volta S.VICENTE/PONTA DELGADA 2 a 6 S. VICENTE/RIBEIRA BRAVA 5 S.VICENTE/FUNCHAL 10 20 a 30 ida e

volta FUNCHAL/PONTA DELGADA 600 réis em

1ª classe

Nesta época os caminhos, ou estradas, conforme a designação vulgar da época, dividiam-se em reais e municipais, estando numerados. Esta era uma condição indispensável para que recebesse do concelho distrital dinheiro do cofre de viação municipal. Deste modo em 1875clxxxvi recomendava-se a classificação, pois de contrário não podia ser reparada. Em 1876 a Câmara avança com a classificação de alguns caminhos como municipais, englobando todos aqueles que ligam os principais sítios: Vargem, Loural, Ginjas, Passo, Lanço, Lombo, Ribeira do Passoclxxxvi. Em 1881clxxxvi a Câmara Municipal de Ponta de Sol, face à utilidade da estrada

que liga o Paul da Serra a S. Vicente, lembra a necessidade de classificação como real. Em 1905clxxxvi foi feito o ponto de situação das estradas municipais do concelho. "Mappa das estradas municipaes Ponta Delgada 1ª Estrada das Lombadas. Começa na estrada real nº 23 no Sítio do Açougue e atravessando as três Lombadas, termina na estrada real nº 23 no Sítio do Lombinho. 2ª Estrada da Igreja. Começa na estrada real nº 23 no Sítio do Pé do Passo, atravessa o ramal da estrada real que conduz ao porto no Sítio da Vigia e passando pela igreja termina no Sítio do Terreiro no ramal da estrada real que conduz ao porto. 3ª Estrada das Feiteiras. Começa na estrada real nº 23 no sítio das Covinhas, e termina no sítio do Terreiro na estrada da igreja. 4ª Estrada dos Enxurros. Começa na estrada real nº 23 no sítio dos Enxurros e termina no sitio da Fonte no ramal da estrada real que conduz ao porto. 5ª Estrada do Ladrilho. Começa na estrada real nº 23 no sítio dos Enxurros e termina no sítio do Ladrilho no ramal da estrada que conduz ao porto. Freguezia de Boaventura: 1ª Estrada da Achada do Castanheiro começa na estrada real nº 27 no sítio da Igreja e termina no sítio da Achada dos Judeus na freguezia de S. Vicente. 2ª Estrada do Cardo. Começa na estrada real nº 23 no sítio da Ribeira do Porco e termina na estrada real nº 27 no sítio da Corrida. 3ª Estrada da Fajã do Penedo. Começa na estrada real nº 27 no sítio da Tavessa e termina no sítio das Voltas, partilha da freguesia de S. Jorge. 4ª Estrada da Lombadinha. Começa na estrada real nº 23 no sítio da Ribeira do Moinho e termina no sítio do Passo, na mesma estrada real nº 23. 5ª Estrada da Achada Grande. Começa no sítio da Igreja na estrada real nº 27 e termina na mesma estrada real nº 27 no sítio da Falca de Cima. 6ª Estrada da Levada. Começa na estrada real nº 27 no sítio da Ribeira do Minho, e termina no sítio da Lombadinha na estrada municipal. 7ª Estrada de S. Cristóvão. Começa na estrada real nº 23 no sítio de S. Cristóvão e termina na estrada real nº 27 no sítio do Caboco. 8ª Estrada da Silveira. Começa na estrada real nº 27 no sítio da Côada e termina no sítio do Encontro na estrada municipal do Cardo”. Em 1872clxxxvi a Câmara estava empenhada nas obras de melhoramento da estrada da Ribeira à ponte do Pé da Corrida, conhecida como a estrada nº 57. A ligação à Vila fez-se com a nova obra da ponte posta em praça em 1873clxxxvi. Na década de noventa a aposta é na nova via que ligará a Vila ao Rosário, "destinada ao transito público, à condução de madeiras, transporte de carros". O "leito" da nova estrada era de "calçada portuguesa" e não de "macdam", "porque a não ser calçada em poucos tempos ficará arruinada e o estado terá de fazer novas despezas"clxxxvi. O século XX reserva-nos um novo plano viário que ainda continua em marcha. A intenção, ontem como hoje, é aproximar as gentes, abatendo as distâncias por meio de vias adequadas. À ilha que em 1901 dispunha apenas de 8 Km de estradas, na designação actual, é colocada a nova opção pelo seu desenvolvimento. É no período de 1913 a 1918 que a estrada que ligará Câmara de Lobos à Ribeira Brava e S. Vicente sofre um notável avanço. Neste momento as estradas que eram reais são já consideradas nacionais. Foi uma inovação da República. No concelho são referenciadas três: EN 23 - Seixal / S. Vicente / Ponta Delgada / Boaventura EN 25 - Encumeada / Vila EN 28 - Estanquinhos / Caramujo / Feiteiras

Desde os anos vinte coloca-se um novo desafio aos madeirenses, adequar as antigas estradas reais à circulação da nova invenção para os ilhéus, isto é o automóvel. O primeiro automóvel fez a aparição nas ruas do Funchal em 1904 e passados três anos já a Empreza Madeirense de Automóveis inicia a importação. Deste modo em 1928clxxxvi a Câmara oficia à Junta Geral "fazendo sentir a necessidade ao alargamento e calcetamento da estrada que vai da Vila à Vargem". Esta medida justifica-se pelo "pessimo estado actual da calçada e ao grande incremento da viação acelarada, em que só com praça nesta vila existem já 12 carros, sendo brevemente esperados mais alguns já encomendados, o que fas que a mesma viação se torne perigosa e inconveniente, obrigando quasi continuadamente os carros a fazerem marcha atrás e desviar-se fora da estrada causando até por veses estragos nas propriedades marginais". A partir da Vila era necessário dar continuidade à rede viária. Assim em 1912clxxxvi foi apresentado o projecto do caminho que liga a Vila ao porto em Água D’ Alto, de responsabilidade da Junta Geral. A este segue-se outro com destino a Ponta Delgada, que iniciou a construção em 1926 e que só terminou em 1938. Em 1930clxxxvi as obras prosseguiam a bom ritmo no troço Passo da Areia a Ponta Delgada, a parte mais difícil. A ideia era dar continuidade da estrada até Boaventura, "atendendo à grande extensão da freguesia, que é uma das de maior produção agrícola aos bons e apreciáveis frutos que ela produz e que ali se perdem pela dificuldade de saída rápida e económica, e ainda também por ser uma das freguesias da ilha muitíssimo apreciada pelos estrangeiros devido à exuberante vegetação e às surpreendentes paisagens que lhe faculta, sendo infelizmente, uma das menos visitadas, por sair caríssimo e sobretudo ruinosa uma visita até ela". Na década de sessenta procedeu-se a nova classificação das estradas municipais. O cuidado a ter com as estradas obrigava à existência de funcionários para a fiscalização. Assim, o município deveria ter um empregado dedicado a isso, pelo que a Câmara nomeou Norberto António de Ornelas como apontador geral e direito a 400 rs diários "durante o tempo que houver obras nas estradas deste concelho"clxxxvi. Na década de sessenta do nosso século o apontador é substituído pelo capataz, apoiado em dois zeladores. Estes são obrigados a zelar pelos caminhos, comunicando à Vereação os danos nas estradas e a necessidade de reparo. Uma das formas de manutenção dos caminhos municipais estava no imposto de trabalho ou roda de caminho. Assim, todo o chefe de família residente ou proprietário no concelho estava sujeito ao imposto que poderia ser pago em dinheiro ou em dias de trabalhoclxxxvi devendo declará-lo. Neste último caso era estabelecido um rol dos ditos que depois era entregue ao apontador ou aos fiscais nomeados em cada freguesia ou casa para o efeitoclxxxvi. Assim, em 1872clxxxvi todos os indivíduos de 18 a 60 anos estavam obrigados à contribuição de trabalho para obras de viação municipal de dois dias por cada membro da família ou seus domésticos. Esta obrigação poderia ser remida em dinheiro, sendo o valor da jorna de 200 réis. Os dias de trabalho eram decididos pela vereação devendo ocorrer todos os inscritos, pois caso contrário sujeitavam-se ao pagamento coercivo em dinheiroclxxxvi. De acordo com recenseamento feito em vereação no ano de 1906clxxxvi estava assim distribuído o número de contribuintes: S. Vicente - 830 Ponta Delgada - 264 Boaventura - 361 Para coordenar este serviço a Câmara nomeava apontadores. Em 1876clxxxvi foram escalados os seguintes:

S. Vicente: Manuel Joaquim Mendes //Epifânio António Mendes de Freitas Ponta Delgada: António Januário de Freitas //José Joaquim de Freitas Boaventura: João Joaquim de Canha // Manuel João de Freitas de Galdo A vereação abria os trabalhos de viação a 1 de Junho nomeando apontadores para coordenarem os trabalhos. A Câmara tinha o encargo de entregar a relação dos contribuintes ficando a eles o encargo de fiscalizar a presença nos trabalhosclxxxvi. Com este imposto a Câmara colmatava as dificuldades financeiras nos cuidados aos caminhos municipais. O reparo das estradas e caminhos municipais não se ficava por este serviço, havendo necessidade de recurso aos meios financeiros da Câmara para o realizar por empreitada ou administração directa. Assim em 1897clxxxvi, face ao aluvião de 2 de Outubro de 1895, houve necessidade de redobradas obras que ficaram a cargo do município. Note-se que a partir do nosso século foi estabelecida uma verba fixa para a reparação e construção das estradas municipais: 1914 1916 Boaventura 300$00 25$13 Ponta Delgada 200$00 25$00 S. Vicente 775$00 54$00 A iniciativa do povo era por vezes mais forte que as condições financeiras da Câmara, é o que sucedeu com o caminho que liga a Achada do Til à Ribeira Grande que estava a ser feito pelo povoclxxxvi. Também a conservação e limpeza implicava encargos para a Câmara. Deste modo em 1938clxxxvi o serviço na estrada municipal das Feiteiras ao Caramujo foi entregue a João Justino de Ponte com obrigatoriedade de trabalhar 4 dias por semana com o vencimento mensal de 130$00. A partir de 1953, constituída já a rede básica de estradas, o fundamental estava na manutenção. Para isso o Estado comparticipa nas despesas da responsabilidade da câmara. Desde 1959 o programa “plano de viação rural” permitiu a execução de pavimentos de macadame e betuminoso para os quais as câmaras deverão estar apetrechadas para assegurar a manutenção clxxxvi. O traçar de caminhos poderia ser fácil se as freguesias do concelho não fossem trespassadas de veios de água. Ribeiros e ribeiras, por onde circulam abundantes águas na época invernosa, são um grande obstáculo a transpor no traçado dos caminhos. A solução estava no traçado das pontes, que acabam quase sempre por serem de madeira. A precaridade do material obrigava a uma redobrada atenção naquelas que mereciam mais uso. Mesmo assim são poucas as que usam pedra e o cimento só será uma realidade já em pleno século XX. Uma das grandes preocupações da Câmara no decurso do século XIX prendeu-se com o reparo das diversas pontes que serviam os caminhos reais e municipais. São várias as ribeiras que sulcam o concelho, daí a necessidade de maior atenção. A ponte do Pé de Corrida foi em 1870clxxxvi sujeita reparos, avaliados em 40$000 réis, todavia no início do ano imediato abateuclxxxvi. Foi por isso que certamente optou-se em muitos dos casos pela construção de pontes em pedra. É o caso da que atravessava o ribeiro da Fajã do Penedo. A Câmara considerado o valor de 400$000 elevado e decidiu-se por uma de madeira, mas os moradores insistiram e contribuíram com trabalho e dinheiro para que se avançasse com o plano inicial.clxxxvi Partindo da situação e da muita utilidade da referida ponte decidiu-se em 1908clxxxvi por um projecto à altura. Assim, a ponte conta de uma parte hidráulica e outra de pedra e cal,

sendo reforçada com muros de suporte. A partir de 1886clxxxvi avançou-se com o projecto só ficou concluído em 1897clxxxvi, ficando aprazado o início das obras para Julho. A saber na intenção do município em 1874clxxxvi as ruas da vila deveriam ser de terra batida, o que seria um incómodo para os habitantes nas épocas de grandes invernias. Esta tentativa de valorização da vila levou o município a atribuir nomes aos arruamentos. Deste modo em 1896 o presidente ordenou o calcetamento do adro da igreja e proceder a alguns melhoramentos retirando um telheiro particular "que muito desfeitua o mesmo largo" onde as pessoas "costumão satisfazer as suas necessidades corporaesclxxxvi. O calcetamento foi feito com pedra do calhau, sendo o seu executor Maurício Ferreira de S. Gonçaloclxxxvi. A partir desta data a Câmara interveio de forma evidente no calcetamento dos caminhos municipais, o que prova a precaridade até então. Aos antigos que são redesenhados e melhorados com calçada portuguesaclxxxvi e pontes de pedra ou madeira, junta-se outros novos no sentido de aproximar as gentes dos diversos sítios do concelho e de permitir a circulação dos produtos agrícolas. Já no século XIX era necessário disciplinar a toponímia dos arruamentos da Vila. Deste modo a vereação decidiu em 1877clxxxvi que todas as ruas deveriam ter dísticos. Temos a Rua Nova a oeste, a da Fonte, a do cemitério que vai do adro para o Calhau, A Rua Direita e o Largo do Pelourinho. Entretanto em 1897clxxxvi a rua que ligava a ponte à praça do peixe ficou baptizada com o nome de Mouzinho de Albuquerque e em 1974clxxxvi o largo defronte da Câmara foi atribuído o nome de Largo da República em memória do 5 de Outubro de 1910. As exigências evoluem com os tempos. Assim, se neste momento os vicentinos se sentiam satisfeitos com as vias pedestres, hoje exigem mais dos autarcas proclamando a necessidade da rede viária para alívio do árduo trabalho no transporte dos produtos agrícolas. A abertura de estradas, como resultado do aparecimento do automóvel, veio a permitir um grande avanço na aproximação dos madeirenses com a consequente facilitação da circulação de pessoas e haveres. Até aos anos vinte do nosso século toda a circulação deveria ser feita a pé, de rede, ou nos vapores costeiros. Estes últimos tinham no porto de Ponta Delgada uma escala obrigatória para serviço do concelho. Sabe-se que em 1899clxxxvi a Vereação não estava satisfeita com o referido serviço, pois o vapor não oferece as condições estabelecidas no contrato. A lotação de carga e passageiros não satisfazia as necessidades das gentes do Norte, sendo os fretes elevados, no que causava elevados danos à agricultura. Também o percurso merece alguns reparos, propondo-se que a viagem pelo leste termine no Porto Moniz e a da via oeste em Ponta Delgada. A partir dos anos vinte o vapor costeiro perde importância em favor do automóvel. Em 1927clxxxvi a praça de S. Vicente apresentava-se com 5 carros com os números: 635, 687, 721, 749 e 800. Os mesmos estavam sujeitos a uma taxa de 10 centavos por cada passageiro transportado, "podendo a mesma taxa ser paga por avença feita com esta Câmara, ou com visto nos bilhetes". A mesma taxa era cobrada aos carros registados neste concelho, aquando da deslocação ao Funchal, pelo que a Câmara reclama a sua não cobrança, "visto estarem em transito... e sempre de regresso a este concelho". O pedido foi atendido e ficou sem efeito a taxa a partir de 17 de Janeiro de 1928clxxxvi. As regras de trânsito já estavam codificadas mas pouco conhecidas. O trânsito de viaturas não gerava ainda as dificuldades do dia de hoje. As normas eram relembradas pelo Governador Civil. Uma das primeiras foi a obrigatoriedade a partir de um de Junho de 1928 de os automobilistas darem sempre a esquerda aos que circulem em sentido contrário. A par disso existia na Quinta Vigia uma comissão técnica de inspecção a provas e exame de

automóvelclxxxvi. Não havia escolas de aprendizagem de condução. Aprendia-se com os condutores habilitados e depois sujeitava-se ao dito exame para ser encartado. Em 1929clxxxviJosé Martins Oliveira Reis, de 18 anos morador na Vargem, solicitou à Câmara licença para ter as competentes lições de modo a poder aprender a chaufer. Em 1932clxxxvi Abel António Maia de Vasconcellos, requereu à Câmara licença para aprendizagem de chaufeur no carro nº 941. A deliberação camarária assinala que o mesmo o faça nas ruas do costume. A partir dos anos 30 surgiu o serviço regular de camionetas, criando-se para o efeito um largo de viragem em Ponta Delgada, em terreno cedido por Maria de Conceição Abreuclxxxvi. Em 1958clxxxvi esta rede alargou-se ao Porto Moniz, estabelecendo a empresa automobilística da Ribeira Brava Lda. uma carreira regular entre o Porto Moniz e o Calhau. Não temos dados precisos sobre os fretes nos transportes rodoviários, mas alguns dados soltos elucidam-nos algo. Em 1897clxxxvi o transporte de um doente pobre do Porto Moniz custou 3000 rs. A partir dos anos vinte a rede cede lugar ao carro e em 1928clxxxviHorácio Virgílio Abreu faz-se pagar de 61$50 de serviços feitos à Câmara com o seu "carro automóvel". Em 1939clxxxviAntónio Joaquim Júnior cobrou à Câmara 220$00 pelo serviço de transporte de um doente pobre ao hospital no Funchal. Todavia em 1947clxxxvi Luís Xavier da Câmara que transportou o Presidente da Câmara desde o Funchal a S. Vicente cobrou 450$00. No ano imediato o transporte de 100 sacos de cimento pelo motorista António Francisco dos Reis Júnior, custou à Câmara 750$00clxxxvi. A circulação rodoviária implicava a presença de postos de abastecimento de combustível. A primeira autorização para colocar um depósito de gasolina para venda foi dada a António Francisco dos reis em 1950clxxxvi enquanto em 1962clxxxvi a Sacor apresentou plano de uma estação de serviço para Ponta Delgada. Os cabos aéreos eram óptimos auxiliares do homem no transporte da lenha, madeiras e areia. Com este último objectivo montou-se no sítio da casa da Queimada (Boaventura) para proceder ao transporte de areia desde o calhau. Foi seu promotor Luís da Trindade Jardim, do Lombinho no Seixalclxxxvi. A CIRCULAÇÃO DAS NOTÍCIAS E DO CORREIO É certo que a rede viária se torna fundamental na aproximação directa dos povos. Todavia deverá contar-se com outros meios e factores que favorecem a aproximação. A estação de correios, a linha telegráfica facilitam o imprescindível processo de comunicação. As estações de correio foram estabelecidas a partir de 1869 em todo o país e não sabemos a data da primeira existência em S. Vicente. Em 1879clxxxvi a vereação fazia sentir a necessidade de estabelecimento de uma linha telegráfica com o Funchal e oferece as instalações para tal e o alojamento à família do empregado. A linha só chegou à vila em 1889. Nova reclamação de novo em 1904clxxxvi mas desta feita para Ponta Delgada, alegando-se a favor o facto de ser porto de escala dos vapores costeiros. A par disso a estação de correios assume-se como uma necessidade premente em princípios do século tendo em conta o forte impacto da emigração. Deste modo em 1910clxxxvi insiste-se na necessidade de melhorar o itinerário das malas de correio de modo a que fosse recebido em S. Vicente no mesmo dia da sua expedição do Funchal. Nesta data o serviço fazia-se ainda por mensageiro pois as estradas para circular automóveis chegou quatro anos depois. A utilização

está documentada a partir de 1928clxxxvi, altura em que foi estabelecido um serviço de condução de mala postal feito pelos automóveis do concelho. O encarregado da estação exercia um papel importante na ligação do concelho com o exterior, devendo por isso mesmo ser alguém que inspirasse confiança, o que não sucedia em 1923clxxxvi com Frederico Augusto Faria dos Reis a que a câmara pediu à Administração Geral dos Correios e Telégraphos a sua substituição porque “ não inspirava confiança alguma nem à comissão, nem a grande maioria do publico”. Em 1911clxxxvi a grande aposta era o telefone, um novo meio que veio a facilitar as comunicações. A estação de Telegrafo Postal de S. Vicente face aos inúmeros pedidos decidiu criar uma rede telefónica, contribuindo a câmara com as instalações. Na câmara só temos conhecimento da presença do telefone em 1951clxxxvi, altura em que a câmara autorizou o pagamento de 91$00 da conta. O telefone cedo cativou a atenção de todos de modo que em 1953clxxxvi se avançou com o estudo para o estabelecimento de um traçado telefónico entre o Funchal e S. Vicente pelo interior da ilha.

PLANO VIÁRIO- PONTES

ANO FREGUES

IA SÍTIO PREÇO EMPREITEIRO OBS.

1869 S. Vicente Pé de Corrida 40.000$000 José Francisco de Abreu

Reparos

1873 Ilhéu

Ribeiro

1878 Boaventura Fajã do penedo 400$000

1881 S. Vicente Pé do Passo(Ponte de Pedra)

34$790

1886 S. Vicente " Reparo

Ribeiro Teixeira(Vila)

1905 S. Vicente Passo 125$.000 João Pedro Faria

1934 S. Vicente Ribeira Laje(Lanço)

1937 S. Vicente Passa-Sol

Falca

Estreito Vargem-Serrado

Pé do Passo

1938 Boaventura Serra de Água

1939 S. Vicente Achada do Til

PLANO VIÁRIO DO CONCELHO- ESTRADAS

ANO

FREGUESIA

SÍTIO PREÇO EMPREITEIRO OBS.

1869 S. Vicente Vila à

Encumeada

Paul-Calheta, Porto Moniz e Ponta Sol

Boaventura Estrada das Voltas

1872 S. Vicente Ribeira-Pé da Corrida

1897 S. Vicente Vila-Rosário

1912 S. Vicente Vila-Água dalto

1914 S. Vicente Poiso-Ladeira Lombo

300$00 João Pedro Faria

1931 Boaventura Rª Moinhos-Igreja

Calcetar

1934 S. Vicente Lanço Caminho

1935 Achada do Til, Ribeira Grande

Caminho

1947 S. Vicente Vila-Laranjal 522$58 Administração directa

1950 Ponta Delgada

Açougue 23.732$00 Calcetar

Estrada do Porto

227.999$00 Sociedade Serragens da Madeira

1952 Boaventura Fajã do Penedo 52.546$00 António Francisco dos Reis

Ponta Delgada

Igreja e Porto 60.400$00

S. Vicente Calhau-Fajã Eira(Seixal)

Manuel Figueira

1955 S. Vicente Vila 48030$00 António Fernandes da Silva

calcetamento entre igreja e estrada da Fonte

S. Vicente Terra Chã- 2ª fase

72500$00 António Francisco dos Réis

Pavimentação de 400 metros

S. Vicente Feiteiras 18970$00 António Francisco dos Réis

calcetamento ramal das Casas Novas

1956 S. Vicente Terra Chã António Francisco dos Reis

1957 S. Vicente EN40-Ginjas

Boaventura Escola-Cemitério

183.306$14 Arranjo

S. Vicente Terra Chã-Fajã do Amo

77.603400 Calcetar

Ponta

Delgada EN101-Lombada

209.451$00 1ª fase

1959 S. Vicente EN 24-Ginjas 135.000$00 António Francisco dos Reis

2ª fase

S. Vicente Laranjal-Rª Grande

100.000$00 Calcetar

1960 S. Vicente Vila-Terra Chã-Poiso-Rª do Passo

492.000$00 Construtora Duriense Lda.

3ª fase

1961 Ponta Delgada

Lombadas 216.000$00 Francisco Ferreira da Luz

2ª fase

Boaventura Achada Castanheiro-Igreja

470.000$00 António Francisco dos Reis

2ª fase

1965 S. Vicente Igreja Rosário-Estreito Vargem

565.000$00 António Francisco dos Reis

1967 Boaventura S. Cristóvão 238.000$00 António Francisco dos Reis

S. Vicente Ginjas-Miradouro

182.000$00 Cabrito de Freitas

1968 S. Vicente Feiteiras-Ginjas 635.000$00 António Francisco dos Reis

S. Vicente Rª Passo-Barro(Ginjas)

51.615$00 Francisco Ribeiro Pereira

Projecto

EN04-Laranjal-Faj ã Vinháticos-Lombo Faias

425.000$00 António Francisco dos Reis

1969 Ponte-Estreito Vargem

260.000$00 Sociedade Serragens Madeira

pavimentação

1970 S. Vicente Ginjas 582.000$00 Sociedade Serragens Madeira

4ª fase

Laranjal-Fajã Vinháticos

1.103.061$00 Cipriano Cruz

1971 S. Vicente EN 104-Lanço 32.589$00 Fernando Ribeiro Pereira

Projecto

1972 Ponta Delgada

EN101-Lombadas

905.676$20 Cipriano Cruz 3ª fase

1974 S. Vicente Vila 115.900$00 Fernando Ribeiro Pereira

Pavimentação, projecto

FONTES E BIBLIOGRAFIA 1. FONTES

Arquivo da Câmara Municipal de S. Vicente Livro de Actas da Câmara: 1868-1871, 1871-1876, 1876-1878, 1878-1882, 1882-1887, 1887-1888, 1889-1891, 1890-895, 1891-1893, 1895-1899, 1899, 1902, 1903-1909, 1909-1916, 1914-1925, 1916-1920, 1927-1929, 1930-1937, 1937-1939, 1939-1947, 1947-1949, 1950-1952, 1952-56, 1956-58, 1958-60, 1960-63, 1963-1966, 1966-1968, 1968-69, 1969-71, 1971-74, 1974-76. Livro Terceiro. Registo de correspondência, 1874-1878 Livro Primeiro. Correspondência expedida, 1924-1926 Livro Quarto. Registo de correspondência com as diferentes autoridades do concelho, 1878-1881 Livro Quinto. Registo de correspondência com diversas autoridades, 1878-1887 Livro Sexto. Registo de correspondências com as diversas repartições, 1888-1893 Livro Sétimo. Registo de Correspondência com diversas repartições, 1893-1898 Livro Oitavo. Registo de correspondência com diversas autoridades. 1898-1914 Livro Décimo Primeiro. Registo de correspondência oficial ao governador, 1885-1896 Livro Décimo Segundo. Registo de correspondência oficial ao governador, 1896-1909 Livro Décimo Terceiro. Registo dos oficiais com o Exmo Governador Civil. 1909-1911 2. BIBLIOGRAFIA GÓIS, Fernando F., Aspectos Económico-Sociais do meio rural madeirense. Colectânea de escritos (publicados na Imprensa Regional), Funchal, 1979 GONÇALVES, Manuel. Versos, Funchal, 1994 GOUVEIA, Horácio Bento, Ilhéus, Coimbra, 1949, 1959 Lágrimas correndo mundo, Coimbra, 1958 Águas mansas, Coimbra, 1963 Canga, Coimbra, 1978 Torna-Viagem, Funchal, 1979 Crónicas do Norte, S. Vicente, 1994 INFORMAÇÃO de estatística do Districto do Funchal, Lisboa, 1963 SARMENTO, A. A., Vila e Freguesia de S. Vicente, Ilha de Madeira, Funchal, 1959

VIEIRA, Alberto, A Vila de São Vicente. Evocação dos duzentos e cinquenta anos (1744-1994), S. Vicente, 1994 Roteiro para uma visita e descoberta do Concelho de S. Vicente, S. Vicente, 1996

INDICE

INTRODUÇÃO O Município 1. Criação e Evolução A Vila Os Paços do Concelho A configuração dos poderes Diversas formas de expressão de estrutura municipal 2. A Vereação Os Vereadores Os Pelouros As actas e as sessões A Alçada: Recrutamento militar, As Posturas, Os Funcionários, As Contas da Câmara Tumultos: a população contra os impostos Polícia, Justiça, Instituições Destacamento militar 3.A política e os políticos no Concelho 4.As sindicâncias O Quotidiano Nascer, viver morrer A arte de bem viver, curar e apoiar Dar de beber Do escuro se fez luz Arte de bem fazer ler escrever e contar A arte de bem receber Enfrentar a natureza Devoção e culto A ECONOMIA DO CONCELHO A floresta e as madeiras A cal um recurso escasso mas sempre presente O gado e o pastoreio Agricultura As crises de subsistência

As indústrias Artesanais O COMÉRCIO A praça e o açougue As vendas e as mercearias Os caminhos do futuro Os vapores costeiros Estradas A circulação das notícias e do correio Fontes e Bibliografia