2 ENERGIA ELÉTRICA E FONTES RENOVÁVEIS

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Eletrônica de Potência para Geração, Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica J. A. Pomilio http://www.fee.unicamp.br/dse/antenor 2-1 2 ENERGIA ELÉTRICA E FONTES RENOVÁVEIS Energia elétrica é o melhor vetor energético disponível na atualidade. Por vetor energético se entende uma modalidade de energia que pode ser transmitido de um local a outro e pode ser transformado em outra forma de energia. Como exemplo, o gás natural, para ser levado de um local a outro, necessita de um gasoduto. No local de uso, pode ser transformado em calor (por combustão), em movimento (em um motor de combustão interna) ou em luz (por uma combustão adequada). Já a eletricidade também pode ser facilmente convertida em energia mecânica, em energia térmica ou luminosa. Seu transporte é feito por condutores metálicos, ou seja, uma infraestrutura muito mais simples, segura e de menor custo que um gasoduto, por exemplo. Outras definições importantes se referem aos conceitos de energia renovável, de energia alternativa e de energia limpa. Por energia limpa se entende uma forma de energia que, para sua produção, não leve a emissão de gases ou outros resíduos nocivos, ou que contribuam para o chamado efeito estufa. Por energia renovável se entendem as formas de energia que ocorrem na natureza e que são produzidas continuamente em decorrência da energia absorvida do sol, a qual, para efeitos da Humanidade, é suposta de duração infinita. Enquadram-se na definição as energias vindas diretamente do sol (como a fotovoltaica), do vento, da biomassa, do movimento das águas em geral (maré, ondas, desníveis, etc.). Em contraposição, as energias não renováveis são aquelas disponíveis na natureza, cuja formação se deu em longos intervalos de tempo (eras geológicas), de modo que os materiais a que estão associadas não podem ser repostos com a velocidade exigida pelo consumo. Nesse caso tem- se o petróleo, gás natural, carvão mineral, urânio, etc. Por energia alternativa entende-se uma forma de energia que pode vir a substituir outra. Em geral é associada a fontes para as quais não se tem garantia de produção permanente (como a eólica), mas que, no entanto, podem (e devem) ser usadas quando disponíveis, evitando o consumo de energia proveniente de fontes não renováveis, ou mesmo de renováveis (como a hidrelétrica). O uso destas fontes alternativas não prescinde de que exista uma fonte perene disponível (despachável pelo operador do sistema) para ser utilizada quando necessário, permitindo a continuidade do fornecimento de eletricidade. 2.1 A Matriz Elétrica Brasileira e o custo da energia A figura 2.1 mostra a evolução da oferta Energética brasileira, indicando a participação das diversas fontes de energia. Há um crescimento absoluto de quase todos os tipos de energia, à exceção da lenha, carvão vegetal. Mais recentemente nota-se também uma redução relativa nos derivados de petróleo. A figura 2.2 mostra a participação relativa de cada fonte. Em termos relativos, a eletricidade contribui com pouco menos de 20% do total de energia consumida no país. Os valores são dados em tonelada equivalente de petróleo (tep). Os valores somados de álcool e de bagaço de cana praticamente igualam a energia elétrica. O maior insumo energético é o petróleo, usado para praticamente todo o sistema de transporte e, em boa parte, também para outras aplicações, como aquecimento e até mesmo em geração de eletricidade. Percebe-se, assim, importância da redução do consumo de petróleo. Isso tem como contrapartida a necessidade de um grande crescimento de produção de outras fontes de energia, de modo a suprir o que for reduzido em termos de combustíveis fósseis não renováveis. Por exemplo, com a eletrificação maciça da frota de veículos, a redução no consumo de petróleo para fins de mobilidade terá que ser compensada pela elevação acentuada na produção de eletricidade. Ao longo da última década não se nota alguma mudança significativa na participação relativa de diferentes recursos energéticos.

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2 ENERGIA ELÉTRICA E FONTES RENOVÁVEIS

Energia elétrica é o melhor vetor energético disponível na atualidade. Por vetor energético se

entende uma modalidade de energia que pode ser transmitido de um local a outro e pode ser

transformado em outra forma de energia.

Como exemplo, o gás natural, para ser levado de um local a outro, necessita de um gasoduto.

No local de uso, pode ser transformado em calor (por combustão), em movimento (em um motor

de combustão interna) ou em luz (por uma combustão adequada).

Já a eletricidade também pode ser facilmente convertida em energia mecânica, em energia

térmica ou luminosa. Seu transporte é feito por condutores metálicos, ou seja, uma infraestrutura

muito mais simples, segura e de menor custo que um gasoduto, por exemplo.

Outras definições importantes se referem aos conceitos de energia renovável, de energia

alternativa e de energia limpa.

Por energia limpa se entende uma forma de energia que, para sua produção, não leve a

emissão de gases ou outros resíduos nocivos, ou que contribuam para o chamado efeito estufa.

Por energia renovável se entendem as formas de energia que ocorrem na natureza e que são

produzidas continuamente em decorrência da energia absorvida do sol, a qual, para efeitos da

Humanidade, é suposta de duração infinita. Enquadram-se na definição as energias vindas

diretamente do sol (como a fotovoltaica), do vento, da biomassa, do movimento das águas em

geral (maré, ondas, desníveis, etc.).

Em contraposição, as energias não renováveis são aquelas disponíveis na natureza, cuja

formação se deu em longos intervalos de tempo (eras geológicas), de modo que os materiais a que

estão associadas não podem ser repostos com a velocidade exigida pelo consumo. Nesse caso tem-

se o petróleo, gás natural, carvão mineral, urânio, etc.

Por energia alternativa entende-se uma forma de energia que pode vir a substituir outra. Em

geral é associada a fontes para as quais não se tem garantia de produção permanente (como a

eólica), mas que, no entanto, podem (e devem) ser usadas quando disponíveis, evitando o consumo

de energia proveniente de fontes não renováveis, ou mesmo de renováveis (como a hidrelétrica). O

uso destas fontes alternativas não prescinde de que exista uma fonte perene disponível

(despachável pelo operador do sistema) para ser utilizada quando necessário, permitindo a

continuidade do fornecimento de eletricidade.

2.1 A Matriz Elétrica Brasileira e o custo da energia

A figura 2.1 mostra a evolução da oferta Energética brasileira, indicando a participação das

diversas fontes de energia. Há um crescimento absoluto de quase todos os tipos de energia, à

exceção da lenha, carvão vegetal. Mais recentemente nota-se também uma redução relativa nos

derivados de petróleo. A figura 2.2 mostra a participação relativa de cada fonte.

Em termos relativos, a eletricidade contribui com pouco menos de 20% do total de energia

consumida no país. Os valores são dados em tonelada equivalente de petróleo (tep). Os valores

somados de álcool e de bagaço de cana praticamente igualam a energia elétrica. O maior insumo

energético é o petróleo, usado para praticamente todo o sistema de transporte e, em boa parte,

também para outras aplicações, como aquecimento e até mesmo em geração de eletricidade.

Percebe-se, assim, importância da redução do consumo de petróleo. Isso tem como

contrapartida a necessidade de um grande crescimento de produção de outras fontes de energia, de

modo a suprir o que for reduzido em termos de combustíveis fósseis não renováveis. Por exemplo,

com a eletrificação maciça da frota de veículos, a redução no consumo de petróleo para fins de

mobilidade terá que ser compensada pela elevação acentuada na produção de eletricidade.

Ao longo da última década não se nota alguma mudança significativa na participação

relativa de diferentes recursos energéticos.

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Figura 2.1 Evolução da oferta de energia (por fonte de energia).

1

Figura 2.2 Evolução e consumo de energia (por fonte de energia).

2

1 https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-479/topico-528/BEN2020_sp.pdf .

Acesso em 2021. 2 https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-479/topico-

521/Relato%CC%81rio%20Si%CC%81ntese%20BEN%202020-ab%202019_Final.pdf Acesso em 2021.

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A figura 2.3 mostra a composição da Matriz Elétrica na região da América Latina e Caribe,

assim como a brasileira, em 2018 e 2019. Cerca de dois terços da eletricidade brasileira provém de

fonte hidráulica. A energia elétrica gerada a partir de fontes renováveis, em 2019 atingiu 83%. A

matriz brasileira, em comparação com as principais economias, é a mais “limpa” 3. O percentual

de energia eólica tem crescido constantemente ao longo da última década, com tendência de ser a

segunda fonte em geração de eletricidade a depender do despacho da geração térmica. De acordo

com a Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), a capacidade instalada no país

chegou a 16 GW no primeiro semestre de 2020, com 637 parques eólicos e 7.738 aerogeradores.

A pequena redução na participação hidráulica se deve ao crescimento relativo da geração

eólica, solar e por gás natural. A partir de 2015 até 2020 houve uma significativa redução do

volume de agua armazenado junto às centrais hidrelétricas, o que tem levado a uma maior

produção pelas centrais térmicas, em especial as alimentadas por gás natural.

Figura 2.3 Matriz elétrica América Latina e Caribe

4 (acima) e brasileira (abaixo).

Dados do Operador Nacional do Sistema (ONS) para 20215 indicam uma capacidade

instalada total de 170 GW. As fontes hidrelétricas somam 108 GW (63,9%). A capacidade eólica

atinge 18 GW (10,9%) enquanto a geração térmica a partir de gás e gás natural totaliza 15 GW

(8,9%). Geração térmica a partir de biomassa totaliza 14 GW (8,3%). Fontes fotovoltaicas atingem

4 GW (2,2%). Carvão, óleo combustível e diesel somados representam 7 GW (4,3%). A geração

nuclear se mantém em 2 GW (1,2%). Ainda segundo o ONS6, em 2020 houve produção de 679

TWh. Considerando a capacidade instalada e a efetiva produção de energia tem-se um

aproveitamento médio de 45%.

3 A questão da emissão de gases, principalmente metano, nos reservatórios das hidrelétricas que ocupam áreas florestais é um ponto

de divergência quando se discute o caráter “limpo” da energia de fonte hidráulica. 4 http://www.olade.org/wp-content/uploads/2021/01/Generacion-electrica-mundial-y-para-America-Latina-y-el-Caribe-ALC_01-

12-2020.pdf 5 http://www.ons.org.br/paginas/sobre-o-sin/o-sistema-em-numeros Acesso em fevereiro de 2021 6 http://www.ons.org.br/Paginas/resultados-da-operacao/historico-da-operacao/geracao_energia.aspx

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Os estudos oficiais sobre a evolução da matriz elétrica até 2030 indicam uma redução

relativa da fonte hidráulica (embora com aumento no valor absoluto) e um crescimento de outras

fontes renováveis, principalmente a biomassa e a eólica, resultando em um aumento no total de

fontes renováveis. Em termos absolutos, há a previsão de um aumento de todas as fontes,

incluindo a nuclear, gás natural e carvão.

Um conceito importante na concepção do sistema em geral é o de Garantia Física, que é a

energia que uma fonte geradora pode assegurar (antigamente denominada “energia assegurada”) a

um risco de 5%. Essa garantia é calculada por modelos de simulação da operação em base mensal

sobre séries sintéticas de vazões (no caso das hidrelétricas), ou de comportamento do vento (no

caso eólico) utilizando uma determinada política de despacho das usinas. Seguem alguns

exemplos, nos quais se pode comparar a garantia física de alguns tipos de geração 7.

Tabela 2.1

Tipo MW MW %

Itaipu UHE 12.600 8.612 68,3

Ilha Solteira UHE 3.444 1.949 56,6

Parque Eólico de Osório (RS) EOL 50 17,71 35,4

Canoa Quebrada (CE) EOL 57 20,53 36

Angra II UTN 1.350 1.204,70 89,2

Um aspecto determinante na efetiva implantação de aproveitamentos de fontes renováveis

de energia é seu custo. Conforme se verifica nas figuras 2.4 e 2.5, tem ocorrido uma importante

redução no custo dos sistemas eólicos e fotovoltaicos. Em especial no Brasil, verificou-se em anos

recentes uma tendência mais acentuada de redução de custos na geração eólica, sendo atualmente

(2019) o terceiro menor do mundo, com US$0.048/kWh (perdendo para Suécia - US$0.046/kWh e

China - US$0.047/kWh).

Figura 2.4 Evolução do custo relativo de projetos eólicos

8

A geração fotovoltaica segue a mesma tendência de redução de custo. O valor por kWh

ainda é, em geral, um pouco maior do que o obtido nas fontes eólicas. O custo mínimo é da Índia,

com US$0.045/kWh, com a China apresentando US$0.054/kWh. O Brasil ainda não aparece

(2019) nessa estatística.

7 http://www.antoniolima.web.br.com/arquivos/tabelaassegurada.htm Acesso em 2017

8 https://www.irena.org/Statistics/View-Data-by-Topic/Costs/Wind-Costs

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Figura 2.5 Evolução de custo de geração fotovoltaica

9

A Figura 2.6 permite analisar o custo da eletricidade gerada por diferentes fontes

renováveis, comparando com combustíveis fósseis (faixa cinza na figura). Agregam-se todos os

custos, incluindo equipamentos, instalação, manutenção, depreciação, etc. Note que o custo de

geração hidroelétrica, apesar de um aumento entre 2010 e 2019, ainda permanece menor do que o

valor dado pelos combustíveis fósseis. As gerações de origem eólica on-shore e solar FV

apresentam grande redução de custo no período considerado e praticamente atingem o valor

mínimo do preço da eletricidade gerada a partir de combustíveis fósseis.

Figura 2.6 Evolução do custo da eletricidade de fontes renováveis

10

2.2 Energia Eólica

Energia Eólica está associada à energia cinética das massas de ar em movimento, ou seja, ao

vento. Seu aproveitamento é milenar, sendo utilizada na propulsão naval e, industrialmente,

principalmente em moinhos e no bombeamento de água.

O termo “eólico” provém da denominação do deus grego dos ventos, chamado Éolo, que

residia na ilha flutuante de Eolias11

.

9 https://www.irena.org/Statistics/View-Data-by-Topic/Costs/Solar-Costs

10 https://www.irena.org/publications/2020/Jun/Renewable-Power-Costs-in-2019

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O uso dos ventos para produção comercial de eletricidade se inicia na década de 70, na

Dinamarca, como consequência das crises de elevação do preço petróleo12

. Ao longo dos últimos

40 anos houve grande evolução tecnológica associada a todos os componentes de um sistema de

geração eólica, desde questões estruturais das torres, passando por aspectos aerodinâmicos, dos

sistemas eletroeletrônicos de potência e de controle e da injeção da energia no sistema elétrico.

Conforme13

, “para que a energia eólica seja considerada tecnicamente aproveitável, é

necessário que sua densidade seja maior ou igual a 500 W/m2, a uma altura de 50 m, o que requer

uma velocidade mínima do vento de 7 a 8 m/s14

. Segundo a Organização Mundial de

Meteorologia, em apenas 13% da superfície terrestre o vento apresenta velocidade média igual ou

superior a 7 m/s, a uma altura de 50 m. Essa proporção varia muito entre regiões e continentes,

chegando a 32% na Europa Ocidental”.

2.2.1 Potencial eólico

O potencial eólico brasileiro é mostrado na figura 2.7, segundo o Atlas de potencial eólico,

publicado em 2001, utilizando dados de medições de vento em todo território nacional,

incorporando fatores como a altitude (foi tomado o valor de 50 m como referência), rugosidade do

terreno e a variação dos ventos. Foi suposta uma ocupação conservativa de obtenção de 2

MW/km2. Considera os valores médios dos ventos (acima de 6 m/s) e sua distribuição,

identificando a extensão territorial em que ocorrem tais ventos, o que permite determinar a energia

eólica disponível. A estimativa utiliza o fator de capacidade (Cp) para determinar a energia elétrica

efetivamente disponível, bem como as curvas de eficiência dos sistemas mecânicos e de geração

de energia elétrica. Os sistemas foram considerados disponíveis 98% do tempo.

Figura 2.7 Potencial eólico brasileiro por regiões, segundo Atlas de 2001 (a 50 m de altura)

15

11

http://www.brasilescola.com/mitologia/eolo.htm 12

http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/pdf/06-Energia_Eolica(3).pdf 13

http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/energia_eolica/6_2.htm 14

Grubb M. and Meyer N. Wind energy: resources, systems, and regional strategies, chapter 4, pages 157–212. In

Johansson and Williams (1993), 1993 15

http://www.cresesb.cepel.br/publicacoes/download/atlas_eolico/Atlas%20do%20Potencial%20Eolico%20Brasileiro.pdf

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O mapa apresentado na figura 2.7 foi obtido desse conjunto de dados e resulta em um

potencial para produção de eletricidade de 143 GW (valor calculado em 2001, a 50 m de altura).

Estudos mais recentes16

, contabilizando a evolução da tecnologia que permite, dentre outros

fatores de aumento de produtividade, torres de maior altura, ampliam este potencial para algo em

torno de 900 GW 17

, com fator de capacidade que chegaria a 45%. A figura 2.8 mostra estudos de

simulação com dados de 2013, e cálculo a 100 m de altura.

O fator de capacidade (Cp) de energia eólica é a razão entre a potência média presente no

eixo da turbina e a máxima potência teoricamente disponível. Pode ser calculado para uma única

turbina, um parque eólico ou mesmo um país. Embora a localização geográfica determine, em

grande parte, o fator de capacidade de um parque eólico, o Cp é também uma questão de desenho

de turbinas. Para a realização do Atlas foram considerados os seguintes valores de Cp:

Tabela 2.2

Velocidade (m/s2) 6 a 6,5 6,5 a 7 7 a 7,5 7,5 a 8 8 a 8,5 >8,5

Cp 0,13 0,17 0,20 0,25 0,30 0,35

Figura 2.8 Mapa da densidade de potência a 100 m de altura.

Inúmeros avanços tecnológicos têm permitido ampliar a captação de energia, além do

simples aumento na altura das torres. Por exemplo, a adequação das pás das turbinas às

peculiaridades dos ventos no Brasil, que são diferentes dos ventos predominantes na Europa em

aspectos como distribuição de intensidade e variação de direção. A figura 2.9 ilustra tais

diferenças.

16

CEPEL, Atlas do Potencial Eólico Brasileiro - Simulações 2013, Publicado em agosto de 2017, disponível em:

http://novoatlas.cepel.br/wp-content/uploads/2017/03/NovoAtlasdoPotencialEolico_BrasileiroSIM_2013.pdf 17

http://www2.ctee.com.br/brazilwindpower/2016/zpublisher/materia/?url=potencial-eolico-onshore-brasileiro-pode-

ser-de-880-gw-indica-estudo-20161026

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Figura 2.9 Comparação entre características dos ventos no Brasil e na Europa

18

2.2.2 Potência eólica

Para o aproveitamento da energia contida no vento é preciso um fluxo permanente e

razoavelmente forte de vento. As turbinas modernas são projetadas para atingirem a potência

máxima para velocidades do vento da ordem de 10 a 15 m/s. A energia disponível para uma

turbina eólica é a energia cinética associada a uma massa de ar que se desloca a uma velocidade

uniforme e constante v (m/s). Em uma unidade de tempo, tal massa de ar, ao atravessar uma secção

plana transversal A (m2) delimitada pelo rotor da turbina, desloca uma massa Av (kg/s), em que

é a massa específica do ar (= 1,225 kg/m3)

, em condições de pressão e temperatura normais.

Esta potência não pode ser integralmente convertida em potência mecânica no eixo da

turbina, pois o ar, depois de atravessar o plano das pás, sai com velocidade não nula. Há um

máximo teórico para o rendimento da conversão eolo-mecânica cujo valor é 59,3%, conhecido por

Limite de Betz19

. O rendimento efetivo da conversão numa turbina eólica depende da velocidade

do vento e é dado por:

disp

mecp

P

P)v(C (2.1)

A potência a ser convertida em eletricidade (em Watts) é:

p

3CAv2

1P (2.2)

onde é o rendimento do processo de conversão mecânico-elétrico.

O comportamento dos ventos é o principal determinante para a efetiva produção de

eletricidade. A distribuição de longo prazo de velocidades de vento depende de fenômenos

meteorológicos, cuja duração é da ordem de décadas, como indica a figura 2.10. Fatores de

capacidade com base na produção anual, portanto, podem não refletir o potencial de longo prazo

de uma região.

18

Everaldo Alencar Feitosa, “Energia Eólica no Brasil: Situação Atual e Perspectivas”, disponível em

www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?down=1033 19 Albert Betz foi um físico alemão que em 1919 concluiu que nenhuma turbina eólica pode converter mais do que 16/27 (59.3%)

da energia cinética do vento em energia mecânica no rotor. Este limite tem a ver com a natureza das turbinas eólicas. Os

aerogeradores extraem energia ao freiar o vento. Para um aerogerador ser 100% eficiente precisaria provocar a parada total na

massa de ar, mas, nesse caso, em vez de pás seria necessário um corpo sólido cobrindo 100% da área de passagem e o rotor não

rodaria e não converteria a energia cinética em mecânica. No outro extremo, uma turbina com apenas uma pá, a maior parte do

vento passaria "sem obstáculo, mantendo toda a energia cinética. Entre estes dois extremos existe um ponto máximo de rendimento,

que é o limite de Betz. Fontes: http://www.aerogeradores.org/limitedebetz.php e http://en.wikipedia.org/wiki/Betz'_law

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Figura 2.10 Acima, índice mensal de vento na Dinamarca (em % da média de longo prazo) http://docs.wind-

watch.org/Boccard-Capacity-Factor-Of-Wind.pdf e

http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S030142150900144X

Abaixo, medições de vento na Dinamarca (média móvel mensal) e comparação com índice NAO (North Atlantic

Oscillation 20

). http://docs.wind-watch.org/Boccard-Capacity-Factor-Of-Wind.pdf

Todas as turbinas eólicas instaladas globalmente em 2019, totalizando 650 GW21

, teriam

capacidade de produzir mais de 5700 TWh de eletricidade, o que representa aproximadamente

25% do consumo global 22

. No entanto, dado que a eletricidade proveniente de fontes eólicas não é

produzida continuamente, sendo afetada pela intensidade dos ventos e por outros aspectos

climáticos, o efetivo aproveitamento de tal potencial é significativamente diminuído.

Os dados da Tabela 2.3 indicam as maiores capacidades instaladas em GW (à esquerda),

bem como o aproveitamento em termos da energia anual (TWh) nos países com maior produção.

A média mundial de aproveitamento da capacidade instalada é de 24,5%. Dentre os maiores

produtores, o Brasil tem, com folga, o maior aproveitamento, com 42,7%; os Estados Unidos vem

em seguida com 32,8%. Já a China, embora seja o país com a maior capacidade instalada e maior

produção, tem um aproveitamento baixo, de apenas 19,6%. Isso indica a qualidade excepcional

dos ventos no Brasil. A figura 2.11 mostra o comportamento médio mensal do fator de capacidade

por unidade da federação. Notem-se os valores muito elevados, em especial nos estados do

nordeste, bem como as diferentes sazonalidades a depender da localização.

Tabela 2.3

Países com maior capacidade instalada

(em 2019) 23

GW Produção e aproveitamento do

potencial instalado (2019)24

TWh %

China 236 China 406 19,6

Estados Unidos 105 Estados Unidos 302 32,8

Alemanha 61 Alemanha 126 23,6

Índia 37 Reino Unido 64 31,7

Espanha 25 Índia 63 19,4

Reino Unido 23 Brasil 56 42,7

França 17 Espanha 55 25,1

Brasil 15 França 34 22,8

Mundo 1400 24,5

20 Oscilação do Atlântico Norte (NAO) é um fenômeno climático, identificado em 1920, que se associa a flutuações na diferença de

pressão atmosférica ao nível do mar entre da Islândia e os Açores, levando a uma variação na força e na direção dos ventos de oeste

e se relaciona a tempestades sobre o Atlântico Norte. Sua variação ao longo do tempo, aparentemente, não tem periodicidade

específica. Fonte: Wikipedia. 21

https://library.wwindea.org/global-statistics/ (acesso 2021) 22

https://yearbook.enerdata.net/electricity-domestic-consumption-data-by-region.html (acesso 2021) 23

https://library.wwindea.org/global-statistics/ 24 https://ourworldindata.org/grapher/wind-generation

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Figura 2.11Variação sazonal do fator de capacidade no Brasil (média mensal) e por estado

25.

2.2.3 Aerogeradores 26

Turbinas eólicas de eixo horizontal (HAWT, na sigla em inglês) têm o eixo do rotor

principal e gerador elétrico no topo de uma torre. Pequenas turbinas são apontadas na direção do

vento por um cata-vento simples. Turbinas grandes geralmente usam um sensor de vento acoplado

a um servomotor para acertar o direcionamento. A maioria tem uma caixa de engrenagens que

ajusta a rotação lenta das pás a uma rotação mais rápida, adequada ao gerador elétrico.

Turbinas usadas em parques eólicos para a produção comercial de energia elétrica são

geralmente de três pás. Apesar de os rotores com duas pás serem um pouco mais eficientes, são

mais instáveis e propensos a turbulências, trazendo risco à sua estrutura. Isso já não acontece nos

rotores de três pás que são muito mais estáveis, barateando o custo do sistema de suporte e

possibilitando a construção de aerogeradores de mais de 100 metros de altura e com capacidade de

geração de energia que atinge 10 MW.

Em um rotor com duas pás, quando uma passa pelo ponto mais elevado, estará submetida à

máxima força do vento, enquanto a pá inferior estará passando pela torre, ou seja, com a mínima

força. Isso produz um esforço adicional sobre o eixo e sobre a torre. Com o uso de três pás tal

situação de desequilíbrio não ocorre, dado o posicionamento a 120º entre elas.

Dado o diâmetro do rotor, a velocidade periférica das pás é elevada, em torno de 300 km/h.

As pás são geralmente leves de cor cinza para se mimetizar com as nuvens, com comprimento de

20 a 40 metros ou mais. As pás giram 22 a 10 rotações por minuto. Uma caixa engrenagens é

usada para elevar a velocidade de giro na conexão com o gerador. Alguns modelos operam a

velocidade constante, mas mais energia pode ser coletada por turbinas de velocidade variável,

empregando conversores eletrônicos de potência na interface com o sistema elétrico. Estas turbinas

são equipadas com recursos de proteção para evitar danos em velocidades de vento muito altas,

com controles de posicionamento das pás e sistemas de freio.

Turbinas eólicas de eixo vertical (VAWT, na sigla em inglês) têm o eixo do rotor principal

disposto verticalmente. A principal vantagem deste arranjo é que a turbina não precisa ser

apontada na direção do vento, o que é útil em locais onde a direção do vento é muito variável e em

ambientes urbanos. É aplicada principalmente em potência reduzida e em locais em que não são

viáveis torres de maior altura. A turbulência resultante no vento é mais severa e não permite

instalações de “wind farms”.

25

http://abeeolica.org.br/wp-content/uploads/2020/06/PT_Boletim-Anual-de-Gera%C3%A7%C3%A3o-2019.pdf 26

http://en.wikipedia.org/wiki/Wind_turbine

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http://www.fee.unicamp.br/dse/antenor 2-11

Figura 2.12 Turbinas de eixo vertical (esq.) e de eixo horizontal (dir.) Tassa_5KW_2_ElectronSolarEnergy2.jpg http://en.wikipedia.org/wiki/File:GreenMountainWindFarm_Fluvanna_2004.jpg

Com a estrutura de eixo vertical, gerador e caixa de engrenagem podem ser colocados perto

do chão, melhorando a acessibilidade para manutenção. Por apresentar baixa velocidade de

rotação, as VAWT têm torque elevado, o que implica em maiores relações na caixa de

engrenagens. A maior turbulência no fluxo de ar leva a um comportamento pulsante no torque. Há

uma maior dificuldade de modelar o fluxo de vento com precisão e, portanto, problemas para

analisar e projetar o sistema antes de fabricação de um protótipo.

As turbinas de eixo horizontal convertem mais energia eólica em mecânica porque as

lâminas são perpendiculares à direção do vento e captam a energia em toda amplitude de sua

rotação. Em comparação, as pás numa turbina de eixo vertical apresentam menor rendimento,

capturando energia do vento apenas na parte frontal; na posição traseira de sua rotação apenas se

movimentam de acordo com a rotação, mas não colaboram para o torque.

A potência das turbinas segue uma trajetória crescente há muitos anos, como ilustra a

figura 2.13. A conversão de maiores potências exige maior área coberta pelo giro das pás,

concomitantemente à maior altura das torres e, por conseguinte, colhendo ventos de maior

intensidade.

Figura 2.13 Dimensões e potências de sistemas eólicos, indicando a evolução nos últimos anos.

27

27 https://b-i.forbesimg.com/williampentland/files/2014/01/Wind_turbine_size_increase_1980-2011.png

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2.2.4 Conexão com a rede elétrica

Os procedimentos para a conexão de um gerador isolado ou de um conjunto de

aerogeradores (fazenda eólica – Wind farm) são previstos por normas específicas28

, como a

Resolução Normativa ANEEL 482/201229

com as modificações introduzidas pela REN ANEEL

687/201530

, a ANSI/IEEE 1021-198831

e a IEEE Std. 1094-199132

.

Com base na experiência da operação de sistemas de energia eólica de grande potência, têm

ocorrido modificações das normas para conexão e operação na rede de alta tensão. O objetivo

destas novas disposições é melhorar e estabilizar o comportamento das turbinas eólicas, diminuir a

quantidade de energia eólica perdida em distúrbios do sistema e permitir que as centrais eólicas

operem com características semelhantes àquelas do sistema de potência convencional. Os

requisitos mais comuns incluem capacidade ride-through33

, limites de variação para tensão e

frequência, regulação de potência ativa e reativa e controle de frequência, bem como do fator de

potência e a capacidade de regulação de tensão.

As normas atuais exigem que os grandes parques eólicos (especialmente aqueles ligados na

alta tensão) devam suportar quedas de tensão para uma determinada percentagem do valor

nominal, por um tempo especificado. Tais requisitos são conhecidos como FRT (Fault Ride

Through), denotando a imunidade mínima exigida da fonte para afundamentos de tensão. Como

exemplo, a figura 2.14 ilustra os limites utilizados nas normas norte-americana, canadense e

irlandesa. No caso ilustrado, a central eólica deve ser capaz de operar continuamente com 90% da

tensão nominal de linha, medida no lado de alta tensão do transformador da subestação.

Figura 2.14 Limite de suportabilidade de afundamento de tensão por uma planta de geração eólica

(tensão residual x tempo).

2.2.5 Estrutura interna de aerogerador

A figura 2.15 mostra os principais componentes de um aerogerador. Sistemas de pequeno

porte (até algumas dezenas de kVA) são, em geral, conectados à rede de distribuição em baixa

tensão. Para potências mais elevadas são utilizados transformadores acoplados ao sistema de

distribuição (em geral) no lado de média tensão. Parques eólicos podem ser conectados em níveis

mais altos de tensão.

Dado que a velocidade dos ventos varia, as turbinas eólicas são projetadas para trabalhar

em uma faixa de velocidade abaixo da máxima velocidade do local onde será instalada. Se

fosse projetada para trabalhar à máxima velocidade, seria necessária uma estrutura muito mais

robusta e haveria menor produção com velocidades menores.

28

M. Tsili S. Papathanassio, A review of grid code technical requirements for wind farms, IET Renew. Power Gener.,

2009, Vol. 3, Iss. 3, pp. 308–332, http://ieeexplore.ieee.org/stamp/stamp.jsp?tp=&arnumber=5237667 29

Resolução Normativa ANEEL 482 de 17/04/2012. http://www.aneel.gov.br/cedoc/bren2012482.pdf 30

REN ANEEL 687 de 24/11/2015 - http://www2.aneel.gov.br/cedoc/ren2015687.pdf 31

ANSI/IEEE 1021-1988, IEEE Recommended Practice for Utility Interconnection of Small Wind Energy Conversion

Systems 32

IEEE Std. 1094-1991, IEEE Recommended Practice for the Electrical Design and Operation of Windfarm

Generating Stations. 33

Capacidade de gerador elétrico permanecer conectado em períodos (curtos) de redução de tensão ocasionado por

falhas na rede elétrica externa.

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Figura 2.15 Componentes de aerogerador.

Existem diferentes modos de realizar o controle de potência nas turbinas. O mais simples é

o posicionamento do eixo de modo a se alinhar com a direção do vento e obter a máxima potência

(yaw control). Tal alinhamento pode ser feito de modo controlado por um servomotor, ou ocorrer

pelo próprio projeto da turbina. Como método de controle dinâmico da potência gerada, é

normalmente usado apenas em turbinas de baixa potência, uma vez que em potências maiores, tal

procedimento produziria grandes esforços no sistema.

Um sistema de controle ativo permite alterar o ângulo do passo (pitch) ao girar as pás em

seu eixo longitudinal, de forma a reduzir o ângulo de ataque, diminuindo a velocidade das pás. A

figura 2.16 ilustra os princípios aerodinâmicos associados ao controle de pitch.

Figura 2.16 Princípios do controle de alinhamento (yaw) e de passo (pitch)

34

34

National Instruments Tutorial on Wind Turbine Control Methods, http://zone.ni.com/devzone/cda/tut/p/id/8189

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Outro método consiste em um controle passivo (“stall” ou estol, em português) que se

baseia no projeto aerodinâmico das pás. Quando a velocidade do vento supera a velocidade

nominal, surgem regiões de turbulência entre o fluxo de ar e a superfície das pás, reduzindo a força

de sustentação e aumentando a força de arrasto. Devido a tal fenômeno, o sistema atua como um

freio aerodinâmico, controlando a potência produzida pela turbina. Para evitar que o estol ocorra

em todas as posições da pá ao mesmo tempo, o que reduziria drasticamente a potência do rotor, as

pás possuem uma torção longitudinal que leva a um suave desenvolvimento do estol. Sob todas as

condições de velocidade do vento superior à nominal, o fluxo em torno dos perfis das pás é, pelo

menos parcialmente, deslocado da superfície, produzindo sustentações menores e forças de arrasto

mais elevadas 35.

Uma variação do controle de estol e passo é o chamado “stall ativo” que se baseia na

alteração do eixo das pás (como no pitch), porém de forma a provocar “stall”.

Figura 2.17 Pás de aerogerador, cuja construção possibilita stall passivo.

http://en.wikipedia.org/wiki/File:WindPropBlade.jpg

A figura 2.18 ilustra o efeito dos diferentes controles em termos da característica de

produção de potência. A manutenção da potência em seu valor nominal à medida que aumenta a

velocidade do vento se deve ao posicionamento das pás, o que resulta em uma redução no

parâmetro Cp (eq. 2.2). Em velocidades muito elevadas o sistema é desligado para evitar danos.

Figura 2.18 Ações de controle de velocidade da turbina para controle da geração.

35

H. N. Monteiro Duarte, “UTILIZAÇÃO DA ENERGIA EÓLICA EM SISTEMASHÍBRIDOS DE GERAÇÃO DE

ENERGIA VISANDOPEQUENAS COMUNIDADES”, Monografia PUC-RS. 2004, disponível em http://pt.scribd.com/doc/70324452/21/Controle-por-estol

Velocidade

nominal do

vento

Potência

Potência

Nominal

Velocidade

do vento

Velocidade de

corte superior

Velocidade de

corte inferior

Controle

stall passivo

Controle stall ativo

Controle de passo

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2.2.6 Geradores elétricos

Há diversos tipos de geradores elétricos aplicáveis em turbinas eólicas. A escolha depende

de fatores que incluem a potência, a regulação de velocidade, a aplicação (isolada ou conectada à

rede), dentre outros. Serão apresentadas a seguir as configurações mais comuns, sem a pretensão

de que se esgote o tema. 36

As máquinas de indução são dispositivos muito utilizados como geradores em sistemas

eólicos, tanto na versão de rotor em gaiola, quanto na de rotor bobinado (que permite a

configuração DFIG – Double Fed Induction Generator).

A partir do modelo monofásico simplificado, ilustrado na figura 2.19, pode-se deduzir a

equação torque x velocidade:

T

R V

s RR

s X X

dr s

s sr

s r

3 2

22

(2.3)

Vs

+

jX s

R s

jX r

R r

s

= I r

I s

m jX

I m

I s

Zi Figura 2.19 Modelo simplificado, por fase, de motor de indução.

Para operação como gerador, a máquina de indução deve trabalhar com escorregamento (s)

negativo, ou seja, acima da velocidade síncrona (s) conforme ilustra a figura 2.20. A faixa de

operação estável é estreita, em termos de velocidade, ocorrendo entre o escorregamento nulo e o

ponto no qual se tem o máximo torque (Tmr). Tipicamente esta faixa é de poucos porcento da

velocidade síncrona.

0

1 -0.5 0 0.5 1 1.5 2

Td

s

Generação Tração Reversão

-s s

T mr

m m

m

s

s m

s m

m s s s

Figura 2.20 Característica torque x velocidade de máquina de indução trifásica.

2.2.6.1 Turbinas de velocidade constante

Dado que uma mínima variação de velocidade leva a uma grande variação de potência, este

arranjo pode ser utilizado em conexões diretas do gerador à rede elétrica, como ilustra a figura

36

F. Blaabjerg and Z. C, “Power Electronics for Modern Wind Turbines”, Morgan & Claypool Publishers, 2006

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2.21. É necessário prever um suprimento de reativos para o gerador de indução (GI), evitando que

tal energia tenha que prover da rede. A vantagem deste arranjo é sua simplicidade e baixo custo.

No entanto, não há possibilidade de regulação do fluxo de potência ativa, o qual depende

exclusivamente da energia retirada do vento, o que leva a flutuações de tensão no ponto de

acoplamento. Além disso, variações no vento produzem torques pulsantes em todo sistema

mecânico. Tais arranjos são comuns em sistemas de menor potência.

Nesse caso estão sistemas que operam com velocidade constante e que, portanto, fazem uso

de dispositivos aerodinâmicos de regulação de potência, como os apresentados anteriormente

(controles de pitch ou de stall). O sistema deve prever um soft-starter, normalmente com tiristores,

para minimizar a corrente de inrush no momento em que a máquina é energizada, evitando

afundamentos de tensão na rede.

Caixa de

engrenagens

Tranformador Rede Gerador de Indução

Compensação

de reativos

Soft-starter

Figura 2.21 Conexão direta de GI à rede elétrica – operação com velocidade constante.

2.2.6.2 Turbinas de velocidade variável e conversores eletrônicos de potência reduzida

Nas máquinas de indução de rotor bobinado tem-se acesso ao enrolamento do rotor, sendo

possível modificar o valor da resistência rotórica, Rr, o que leva a uma alteração da curva de torque

de modo a se ter uma maior variação de velocidade dentro da faixa de excursão da potência,

conforme mostra a figura 2.22. Com variação da resistência do rotor é possível ampliar a faixa de

variação de velocidade para de 2 a 5%. O conversor que emula a resistência variável opera com

baixa tensão e alta corrente e processa uma pequena parcela da potência gerada. Sua ação permite

regular a potência ativa injetada na rede em situações de elevada velocidade do vento.

0

0.5

1 0 -0.8 -0.6 -0.4 -0.2

Td/Tmr

Rr

5Rr 10Rr

s Figura 2.22 Característica torque - velocidade para diferentes valores de resistência de rotor.

Caixa de

engrenagens

Tranformador Rede

Gerador de Indução

Compensação

de reativos

Controle eletrônico

da resistência do

rotor

SS

Figura 2.23 Conexão de GI com rotor bobinado – operação com velocidade variável.

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A figura 2.24 mostra outro arranjo, no qual o gerador de indução com rotor bobinado tem

aplicado no enrolamento do rotor uma tensão CA controlada. Quando o gerador opera acima da

velocidade síncrona, potência é enviada à rede tanto pelo enrolamento do estator (diretamente)

quanto pelo de rotor, através dos conversores CA/CC e CC/CA.

Abaixo da velocidade síncrona, injeta-se potência no motor através do enrolamento do

rotor, de modo que se tem controle sobre o campo girante da máquina (que é uma composição da

velocidade mecânica do eixo com o campo girante da corrente do rotor). Uma faixa de variação de

+30% da velocidade é possível com um conversor que processa aproximadamente 30% da

potência nominal do gerador. Além disso, é possível controlar tanto o fluxo de potência ativa

quando o de potência reativa, melhorando o comportamento na interconexão com a rede CA.

Este arranjo prescinde de procedimentos de partida suave e de fornecimento de reativos,

pois ambas as funções podem ser realizadas pelos conversores. Esta configuração é, naturalmente,

de maior custo que as anteriores, no entanto, torna-se possível uma maior produção de energia

elétrica e há menores esforços sobre a caixa de engrenagens.

Caixa de

engrenagens

Tranformador Rede Gerador de Indução

CA

CC

CC

CA

Pref Qref

Figura 2.24 Conexão de DFIG (Dual Fed Induction Generator)

2.2.6.3 Sistemas com processamento total da potência gerada

Neste caso, é possível capturar potência do gerador a qualquer velocidade do vento, dado

que há um total desacoplamento entre a tensão gerada e a rede.

Dado que a tensão de saída dos geradores é alternada, o processamento de toda potência

exige um retificador (conversor CA/CC, assunto do capítulo 3), levando à existência de um

barramento CC intermediário, a partir do qual se faz uma inversão (conversão CC-CA, assunto do

capítulo 4). Há inúmeros aspectos relacionados aos procedimentos para conexão com a rede, os

quais serão abordados oportunamente.

A figura 2.25 mostra uma estrutura que pode ser usada tanto com geradores de indução

com rotor em gaiola quanto com geradores de ímãs permanentes. O que se altera é a topologia e/ou

a estratégia de controle do retificador, de modo a proporcionar o melhor modo de operação para o

gerador, reduzindo perdas e/ou maximizando a extração de potência.

A figura 2.26 ilustra a situação com gerador síncrono, adicionando-se ao sistema um

retificador de baixa potência que faz o ajuste da excitação de campo do gerador.

As instalações devem estar em conformidade com exigências da concessionária local. Em

geral as normas repetem o conteúdo de legislações mais amplas, mas podem incluir aspectos

adicionais específicos. Por exemplo, de acordo com a regulamentação da CPFL, toda central de

microgeração37

distribuída conectada na rede de baixa tensão (BT), independentemente da

quantidade de fases e da potência que pode ser gerada, deverá sê-lo necessariamente por

37 Microgeração distribuída é uma central geradora de energia elétrica com potência instalada menor ou igual a 100 kW e que

utiliza fontes com base em energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, conforme regulamentação da

ANEEL (Resolução Normativa n° 235/2006, de 14/11/2006), conectada na rede de distribuição por meio de instalações de unidades

consumidoras.

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intermédio de inversores eletrônicos, qualquer que seja a fonte primária da energia. O uso de

transformador isolador é obrigatório para conexão em média tensão38

.

Caixa de

engrenagens

Tranformador Rede

Gerador de Indução

ou Gerador de Ímãs Permanentes (PM)

CA

CC

CC

CA

Pref Qref

Figura 2.25 Sistema com atuação assíncrona entre o gerador e a rede.

Caixa de

engrenagens

Tranformador Rede Gerador Síncrono

CA

CC

CC

CA

Pref Qref

CC

CA

Figura 2.26 Sistema com gerador síncrono, desacoplado da rede.

2.2.7 Aspectos ambientais 39

Claramente o uso da energia eólica para produção de eletricidade não acarreta emissão de

gases na atmosfera. O estudo ambiental, no entanto, deve ser completo, ou seja, analisar a

demanda de energia e a emissão de gases durante todo o processo de produção dos equipamentos,

sua instalação e posterior descarte. Assim, obviamente a energia a ser produzida por um sistema

tem que ser capaz de produzir mais energia do que a demandada para sua fabricação e descarte.

Este aspecto será aprofundado na sequência deste capítulo.

Existem ainda outros aspectos ambientais que não devem ser negligenciados. É importante

que os projetos sejam adequadamente integrados na paisagem e desenvolvidos em colaboração

com as comunidades locais, para manter o apoio da opinião pública a esta forma de energia.

Aspectos do balanço energético entre a produção e operação dos parques eólicos e a produção de

eletricidade serão considerados em seção posterior.

O ruído produzido pelas turbinas é também apontado como argumento contra o uso da

energia eólica. O ruído mecânico está associado à caixa de velocidades, ao gerador e aos motores

auxiliares. O ruído aerodinâmico está relacionado com o movimento das pás, que é inevitável,

principalmente a baixas velocidades do vento, uma vez que em altas velocidades o ruído de fundo

se sobrepõe ao das turbinas.

Tanto a interferência eletromagnética com sinais de comunicações, como os efeitos sobre a

vida animal, principalmente as aves migratórias, não são superiores aos de outras estruturas de

grande porte semelhantes, podendo ser evitados através da escolha criteriosa do local de

instalação. O uso do terreno para outras finalidades, como a agricultura ou a criação de animais,

não fica comprometido, uma vez que apenas uma pequena percentagem do espaço onde é instalado

o parque eólico fica efetivamente ocupada.

38

CPFL Energia, Conexão de Micro e Minigeração Distribuída sob Sistema de Compensação de Energia Elétrica, 2012. 39

Rui M. G. Castro, “Introdução à Energia Eólica”, Instituto Superior Técnico, Lisboa, Portugal, 2003.

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2.2.8 A questão da complementaridade

A sazonalidade da disponibilidade de energia eólica já foi discutida. Outro aspecto

relevante para a decisão de um parque eólico pode estar na correlação com outras fontes

renováveis, como a hídrica ou a solar, que também sofrem variações ao longo do tempo, seja em

um intervalo diário, seja de longo prazo.

A Fig. 2.27 ilustra, para o período anual, uma comparação entre a vazão do rio São

Francisco (da qual depende a capacidade de geração hidrelétrica) e a energia gerada pelos parques

eólicos alocados na região do vale do rio São Francisco. Os valores numéricos de geração estão

bastante desatualizados, mas isso não altera o aspecto da sazonalidade. Embora a capacidade

geradora eólica ainda seja inferior à capacidade instalada nas usinas hidrelétricas, é evidente que a

característica complementar indica que, quando ambas as capacidades se equilibrarem, é possível

obter uma produção de eletricidade em nível elevado ao longo de todo ano. Em 2019 todo o estado

da Bahia produziu 16,83 TWh40

. Já as hidrelétricas do rio São Francisco produziram, no mesmo

ano 19,3 TWh41

.

A figura 2.28 se refere à Alemanha, indicando a produção de energia elétrica a partir de

fontes eólica e solar. Também neste caso tem-se um importante efeito complementar, ou seja, nos

meses em que os ventos se tornam menos produtivos (verão no hemisfério norte) a produção a

partir da fonte solar cresce, e vice-versa, resultando uma produção razoavelmente constante no

decorrer do ano.

Figura 2.27 Comportamento complementar de geração eólica e hídrica em período anual no vale

do rio São Francisco. http://www.cresesb.cepel.br/download/casasolar/casasolar2013.pdf

Figura 2.28 Comportamento complementar de geração eólica e solar em período anual na

Alemanha. https://www.iea.org/publications/freepublications/publication/NextGenerationWindandSolarPower.pdf

40

http://abeeolica.org.br/wp-content/uploads/2020/06/PT_Boletim-Anual-de-Gera%C3%A7%C3%A3o-2019.pdf 41

https://www.chesf.gov.br/_layouts/15/Chesf_Noticias_Farm/Noticia.aspx?IDNoticia=664

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Considerando o intervalo diário, a existência ou não do comportamento complementar

entre uma fonte eólica e a solar, sua ocorrência é fortemente dependente da localização e também

da época do ano. A Figura 2.29 ilustra uma situação em que ocorre maior produção eólica nos

períodos sem insolação, observado na Califórnia, no mês de junho de 2013. Estudos semelhantes

em outros locais podem não apresentar comportamento semelhante e cada situação deve ser

analisada individualmente.

Figura 2.29 Comportamento complementar de geração eólica e solar em período diário na

Califórnia, em julho de 2013. http://www.nerc.com/files/ivgtf_report_041609.pdf

2.3 Energia Solar Fotovoltaica

A conversão direta da energia solar em energia elétrica ocorre pelo efeito da incidência de

radiação sobre determinados materiais, particularmente os semicondutores. No efeito fotovoltaico

(FV) os fótons contidos na luz solar são convertidos em energia elétrica, por meio do uso de

células solares”42.

O efeito FV foi observado pela primeira vez por Alexandre-Edmond Becquerel em 1839 43

.

Os elétrons gerados a partir da incidência da radiação luminosa são transferidos entre diferentes

bandas de energia (i.e., das bandas de valência para bandas de condução44

) dentro do próprio

material, resultando no surgimento de uma diferença de potencial (ddp) entre dois eletrodos 45

.

Na maioria das aplicações fotovoltaicas a radiação incidente é a luz solar e, por esta razão,

os dispositivos de conversão são conhecidos como células solares. No caso de uma célula

solar de junção PN, a iluminação do material cria uma diferença de potencial à medida que os

elétrons excitados e as lacunas remanescentes são conduzidos em direções opostas pelo campo

elétrico da região de depleção, como ilustra a figura 2.30.

Semicondutor tipo N

Semicondutor tipo P

Diferença de

potencial

Radiação solar

-

+

eletrodos

Figura 2.30 Produção de ddp por ação de radiação solar em material semicondutor dopado e

imagem de célula FV comercial.

42

http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/pdf/03-Energia_Solar(3).pdf 43

http://pt.wikipedia.org/wiki/Alexandre-Edmond_Becquerel 44

Ver animação em https://en.wikipedia.org/wiki/File:Solargif1.gif Acesso em 2017 45

http://pt.wikipedia.org/wiki/Efeito_fotovoltaico

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Um grande impulso para o aproveitamento

fotovoltaico veio dos programas espaciais e de

telecomunicações via satélite. A eletricidade necessária ao

funcionamento dos circuitos eletrônicos, na maior parte dos

satélites, provém de células fotovoltaicas. No espaço, a

densidade de potência na distância entre a Terra e o Sol, é de

1353 W/m2. Na superfície do planeta, por conta da atmosfera,

considera-se uma densidade de potência de 1000 W/m2.

http://en.wikipedia.org/wiki/File:ROSSA.jpg

Mesmo sendo variável com a localização e com as condições atmosféricas, esse valor é

tomado pelos fabricantes de células para a caracterização dos dispositivos.

Além das condições atmosféricas, especialmente a nebulosidade, a disponibilidade de

radiação solar incidente sobre a superfície terrestre depende da latitude e, obviamente, da data e do

horário. Isso se deve aos movimentos de translação e de rotação da terra.

Para maximizar o aproveitamento da radiação solar deve-se ajustar a posição do painel

fotovoltaico de acordo com a latitude local e o período do ano em que se requer mais energia. No

Hemisfério Sul, nas latitudes do Brasil, por exemplo, um sistema fixo de captação deve ser

orientado para o Norte, com ângulo de inclinação próximo ao da latitude local.

A figura 2.31 ilustra a energia média que atinge a superfície do país a cada dia. Os valores,

na maior parte do país, estão na faixa de 15 a 20 MJ/m2.dia, o que significa de 4,1 a 5,5

kWh/m2.dia. Ou seja, se TODA energia incidente pudesse ser captada e convertida em

eletricidade, com 1 m2 de coletor seria possível obter a energia consumida em uma residência com

consumo mensal de 150 kWh. A quantidade média anual de horas em que cada região do Brasil

tem incidência direta de luz solar está mostrada na figura 2.32.

Figura 2.31 Radiação solar diária (média anual em MJ/m

2dia)

46

46

http://www.cresesb.cepel.br/publicacoes/download/Atlas_Solarimetrico_do_Brasil_2000.pdf

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Figura 2.32 Insolação Diária (Média anual em horas).

Apesar de valores tão expressivos, o fato é que o efetivo aproveitamento da energia recebida

do sol é muito menor e a principal razão é o relativamente baixo rendimento do processo de

conversão fotovoltaico, conforme mostra a tabela 2.4, para diferentes tecnologias de produção de

células fotovoltaicas. Pesquisas recentes não têm apontado melhorias expressivas nos valores de

eficiência de conversão 47

.

Dado que a incidência ocorre em um intervalo restrito do dia, em sistemas isolados do

sistema interligado torna-se necessário algum dispositivo que acumule a energia e a disponibilize

de acordo com a demanda. Os padrões de consumo residencial, infelizmente, não combinam com o

padrão de geração fotovoltaica, uma vez que o pico e a maior demanda ocorrem no período

noturno, como mostra a figura 2.33.

Tabela 2.4

Figura 2.33 Perfil típico de demanda ao longo do dia de consumidores residenciais (medição em

transformador de distribuição).

47

Martin A. Green, Keith Emery, Yoshihiro Hishikawa, Wilhelm Warta, Ewan D. Dunlop: “Solar cell efficiency

tables (version 48)”, First published: 17 June 2016, http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/pip.2788/full Acesso

em 2017.

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Mesmo considerando que a célula FV tenha uma eficiência (elevada) de 20%, e

adicionando os rendimentos dos processos de condicionamento da energia gerada (pois é

produzida energia em CC e o consumo é, tipicamente, em CA), tem-se um aproveitamento efetivo

de cerca de 15% da energia incidente. Isso significa que a área calculada anteriormente para suprir

uma demanda diária de 5 kWh deve ser algo em torno de 6,5 m2. A figura 2.34 ilustra,

simplificadamente, o conjunto de dispositivos necessários ao aproveitamento dessa energia.

Os aproveitamentos fotovoltaicos são, predominantemente, de baixa potência, na faixa de

kW, em termos de potência instalada e de uso residencial ou isolado. Instalações de maior porte,

na faixa de centenas de kW até alguns MW são conectados em nível mais elevado de tensão, por

meio de transformadores.

Figura 2.34 Sistema de aproveitamento de energia FV.

A presença de isolação elétrica (transformador) para a conexão à rede CA, não é

obrigatória (embora possa ser assim determinada por normas nacionais/locais específicas).

A inclusão da isolação galvânica entre os painéis FV e a rede pode ser feita em diferentes

pontos. É possível usar um transformador com núcleo de Fe-Si, operando em 50/60 Hz na saída do

inversor, ou seja, um dispositivo de massa e volume consideráveis. É possível fazer a isolação em

algum estágio intermediário, como no acoplamento entre o conversor CC-CC. Nesse caso, o

transformador opera em alta frequência, o que reduz sua massa e volume. O núcleo será,

possivelmente, de ferrite, dada a frequência de operação.

2.3.1 Modelo elétrico de uma célula fotovoltaica

Uma célula fotovoltaica pode ser bem representada por um circuito elétrico equivalente

como o mostrado na figura 2.35, o qual leva a uma curva característica I x V ilustrada na figura

2.36. Nessa figura se mostra a evolução da potência sobre a carga. Estas curvas são obtidas

alterando a resistência de carga (Rc).

VPV Rc

Ic IPV

Figura 2.35 Circuito equivalente de célula FV conectada a uma carga resistiva.

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Figura 2.36 Característica I x V de célula FV

48.

Os valores IMP e VMP correspondem ao ponto de máxima potência sobre a carga (neste

caso, 3,2 A e 0,52 V). VOC é a tensão de circuito aberto e ISC é a corrente de curto-circuito (3,5 A).

A corrente IPV, assim como a tensão VD, são supostas constantes. IPV depende fortemente da

potência incidente sobre a célula, como mostra a figura 2.37. O efeito térmico é também relevante

e afeta a tensão de circuito aberto, a qual se reduz à medida que a temperatura se eleva.

1000 W/m2

sem

iluminação

Figura 2.37 Efeito da iluminação e da temperatura sobre a curva I x V de célula FV

49.

http://en.wikipedia.org/wiki/File:I-V_Curve_T.png

2.3.2 Associações de painéis fotovoltaicos

Quando exposta à luz direta, uma célula de silício de seis centímetros de diâmetro produz

algo em torno de 0,5 A e 0,5 V, ou seja, cerca de 0,25 W. Como a tensão fornecida por uma célula

é reduzida, as aplicações exigem a associação de inúmeras células de modo a se obter níveis de

tensão e potência adequados. Tipicamente um painel solar é feito com a associação de algumas

dezenas de células, produzindo uma tensão terminal em torno de 30 V e uma potência de 50 a 250

W, ou seja, com correntes até 8 A. A Figura 2.38 ilustra um painel. A associação série e/ou

paralela de painéis cria um arranjo (array).

Especialmente para grandes arranjos, nos quais as condições de insolação podem ser muito

distintas, pode haver sombreamento em uma região e iluminação plena em outra. Nesse caso são

necessários cuidados adicionais para a conexão, para aproveitar ao máximo a energia incidente.

Ao se fazer uma conexão série, a corrente que pode circular pelo arranjo é limitada pela

célula que tiver a menor insolação, ou seja, a que produzir a menor corrente. Isso implica que não

é possível obter a máxima potência das demais, prejudicando o rendimento do conjunto.

48

http://da.wikipedia.org/wiki/Maximum_power_point_tracker 49

http://en.wikipedia.org/wiki/Theory_of_solar_cells

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Figura 2.38 Painel FV, composto pela associação de dezenas de células.

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/f/f3/SolarpanelBp.JPG/300px-SolarpanelBp.JPG

Para minimizar tal efeito (sombreamento parcial), nas montagens dos arranjos são

adicionados diodos de bypass, em paralelo com certo conjunto de células. A melhor solução seria

ter um diodo por célula, mas isso encareceria demasiadamente o produto. Além disso, o

sombreamento parcial é um efeito que ocorre em áreas relativamente distantes, de modo que é

aceitável ter diodos para agrupamentos de células, como mostra a figura 2.39.

O efeito sobre as curvas I-V e P-V são mostrados na figura 2.40. Nota-se que a presença

dos diodos de bypass permite que se obtenha a máxima potência de parte dos painéis do arranjo, e

a limitação da corrente por baixa insolação ocorre apenas parcialmente.

Figura 2.39 Arranjo de painéis FV com diodos de bypass.

Figura 2.40 Efeito sobre a característica I-V e sobre a curva P-V em caso de sombreamento.

http://sargosis.com/wp-content/uploads/2011/11/inverter_mpp_curves.jpg

2.3.3 Estratégias de MPPT (Maximum Power Point Tracking)

A extração de potência de um painel fotovoltaico normalmente é feita por meio de um

conversor CC-CC, que adéqua a tensão de saída do painel FV (normalmente baixa, na faixa de

dezenas de Volts) à necessidade da aplicação. Este conversor, além do ajuste da tensão,

normalmente é dotado de algum sistema que busca, continuamente, o ponto de máxima potência.

Tal recurso é de grande importância dada a alta variabilidade da energia incidente e, dessa forma,

sobre a característica I-V e P-V do sistema.

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Há diversos métodos possíveis de serem aplicados e seu estudo extrapola os objetivos deste

curso, razão pela qual apenas se indicam algumas referências 50

51

.

2.4 Energia de produção x Produção de energia

Um aspecto frequentemente levantado em relação ao uso de fontes renováveis é o do

balanço energético que coteja a energia utilizada para a produção, instalação, manutenção e

descarte dos sistemas de geração com a energia produzida ao longo do tempo de operação de tais

sistemas. O que se deseja, obviamente, é que a energia total produzida seja maior que a utilizada.

Além do aspecto energético, do ponto de vista dos impactos climáticos, deve-se também

fazer o balanço das emissões de gases de efeito estufa e outros poluentes.

Segundo estudo da Universidade de Stanford52

(2013) a estimativa era que, dado o

crescimento de eficiência energética na produção dos sistemas PV, em 2012 se atingisse uma

produção de energia que compensasse a energia demandada (a partir de 2000) para o

desenvolvimento e a produção dos sistemas fotovoltaicos.

A figura 2.41 ilustra os diferentes estágios desde a obtenção do silício até a instalação de

uma planta fotovoltaica. Nota-se uma diferença importante entre o custo financeiro e a demanda

energética entre as diferentes fases. Verifica-se que a grande demanda de energia está na fase de

produção do cristal de silício a qual, por sua vez, representa o menor custo, indicando que se trata

de um processo maduro e otimizado, de ponto de vista industrial. Já a parte sistêmica, na qual se

integram ao painel fotovoltaico os sistemas eletrônicos necessários ao efetivo aproveitamento

energético, a energia associada à produção de todos os elementos é comparativamente menor do

que o custo do conjunto.

Uma análise pertinente consiste em comparar a energia demandada em todo processo

produtivo da tecnologia e a energia efetivamente produzida. Tal análise leva em conta o “passivo”

das fases iniciais, quando o rendimento energético se mostrava mais reduzido e, em um dado

momento, incapaz de gerar mais energia do que se consumia na produção dos equipamentos.

Figura 2.41 Do silício aos sistemas de produção de energia: etapas, custo financeiro

53 e demanda

de energia54

https://gcep.stanford.edu/pdfs/symposium2012/MikDale_Symp2012_web.pdf

50

de Brito, M.A.G.; Luigi, G.; Sampaio, L.P.; Canesin, C.A.; Avaliação das principais técnicas para obtenção de

MPPT de painéis fotovoltaicos, 9th IEEE/IAS International Conference on Industry Applications (INDUSCON), São

Paulo, 2010 51

CAVALVANTI, M. C. et al. Comparative Study of Maximum Power Point Tracking Techniques for Photovoltaic Systems.

Eletrônica de Potência, v. 12, n. 2, p. 163-171, 2007. 52

Michael Dale and Sally M. Benson: “Energy Balance of the Global Photovoltaic (PV) Industry - Is the PV Industry

a Net Electricity Producer?”, Environ. Sci. Technol. 2013, 47, 3482−3489, dx.doi.org/10.1021/es3038824

http://pubs.acs.org/doi/ipdf/10.1021/es3038824 53

Swanson, R. M. Solar's Learning Curve Paves Way to Competitive Costs. 2011.

http://energyseminar.stanford.edu/node/ 387

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http://www.fee.unicamp.br/dse/antenor 2-27

A figura 2.42 mostra a análise da evolução do total de energia consumida pela indústria de

sistemas PV e a produção efetiva dos equipamentos instalados. Nota-se que até 2010 o resultado

permanecia na faixa negativa. Segundo o artigo, a previsão era que em 2012 se entrasse na faixa

positiva, ou seja, que a produção acumulada superasse todo o dispêndio energético realizado até

então para a produção e instalação dos sistemas PV. Os valores representados na figura indicam a

média de produção das diferentes tecnologias de células fotovoltaicas. O resultado é dominado

pelos produtos baseados em cristais de silício, que são responsáveis por cerca de 90% dos sistemas

instalados. Algumas tecnologias, ainda de pouca penetração, apresentam resultados mais positivos

no aspecto energético, embora tenham uma menor penetração no mercado por conta de custos de

produção.

Figura 2.42 Evolução do total de energia consumida pela indústria de sistemas PV e a produção

efetiva dos sistemas instalados. https://gcep.stanford.edu/pdfs/symposium2012/MikDale_Symp2012_web.pdf

Enquanto essa visão sistêmica permite uma análise dos esforços no aprimoramento da

tecnologia, outra análise que pode ser feita é, com a tecnologia atual, do ponto de vista de um

produtor, como se dá tal balanço energético55

. De acordo com estudo do National Renewable

Energy Laboratory (NREL), com as tecnologias dominantes na atualidade (silício e filmes finos),

a compensação energética se dá entre quatro e três anos, respectivamente. O NREL estima o tempo

de operação do sistema PV em até 30 anos, o que permitiria um expressivo ganho para a produção

de energia.

Figura 2.43 Tempo para compensação energética de sistemas PV de uso doméstico

http://www.nrel.gov/docs/fy04osti/35489.pdf

54

Alsema, E. A. Energy pay-back time and CO2 emissions of PV systems. Prog. Photovoltaics 2000, 8, 17−25. 55

NREL Report No. NREL/FS-520-24619, http://www.nrel.gov/docs/fy99osti/24619.pdf (acesso em junho 2017)

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No que se refere às turbinas eólicas, análise semelhante pode ser feita. Nesse caso é usual

incluir os gastos energéticos de produção, transporte, instalação e manutenção, uma vez que todos

estes são relevantes ao longo dos anos em que a turbina permanece funcional (estimada em 30

anos, embora ainda não existam sistemas em operação há tanto tempo). Além disso, assim como

para os sistemas PV, as condições locais são determinantes, especialmente pelo fator de

capacidade, ou seja, o quanto efetivamente se produz de energia ao longo do tempo.

Diversos estudos apontam que o tempo de produção de energia para a compensação da

demanda de energia para produção e manutenção é inferior a um ano56

.

Uma comparação pertinente é com os sistemas térmicos baseados em carvão ou gás. Dado

que as máquinas térmicas sempre apresentam um rendimento menor do que 50%, a produção de

eletricidade sempre será menor do que a perda de energia, o que implica em um balanço sempre

negativo do ponto de vista da operação das centrais geradoras.

2.5 Conexão à rede CA

Embora sejam bastante comuns os sistemas isolados, seja para alimentação de equipamentos

remotos, seja em localidades sem acesso à rede de energia elétrica, o foco deste curso são as

aplicações conectadas à rede. Assim, serão vistas as exigências para que se realize a inserção

destas fontes na rede de distribuição, especialmente na baixa tensão de distribuição, embora

empreendimentos de maior potência façam a conexão em média ou alta tensão.

Em 2011 a ANEEL57

lançou um programa para incentivar a implantação de sistemas de

maior porte (com potência de pico entre 500 kW e 3 MW) como forma de criar no Brasil

experiências que viessem permitir a elaboração de normas e procedimentos adequados.

Um exemplo é a Usina Solar Tanquinho, em Campinas-SP, da Companhia Paulista de Força

e Luz (CPFL), com 1,1 MW de pico e 1,6 GWh de produção de energia anual.

A Usina Tanquinho utiliza diferentes tecnologias de células: silício policristalino, silício

amorfo monocristalino, “filmes finos”, como o telureto de Cádmio e o Cobre-Índio-Gálio-Selênio

(CIGS). São testados arranjos de painéis fixos e móveis (que acompanham o movimento do sol),

diferentes estruturas de inversores (micro inversores individuais por painel e inversores de maior

porte para agrupamentos de painéis), bem como a integração da geração solar com geração eólica,

através da inclusão de um aerogerador de pequeno porte. O projeto busca analisar o impacto da

conexão desse tipo de geração para o consumidor final em termos de qualidade, segurança,

confiabilidade e viabilidade econômica58

.

Figura 2.44 Painéis fotovoltaicos na Usina Tanquinho (CPFL)

http://brasileconomico.ig.com.br/public/uploads/articles/foto_pagina/usina_energia_solar_empresa_cemig_be_01.jpg

56

Karl R. Haapala and Preedanood Prempreeda, Comparative life cycle assessment of 2.0 MW wind turbines, Int. J.

Sustainable Manufacturing, Vol. 3, No. 2, 2014, Acesso em junho de 2017, http://www.ourenergypolicy.org/wp-

content/uploads/2014/06/turbines.pdf 57

ANEEL, chamada no 013/2011, projeto estratégico: “Arranjos técnicos e comerciais para inserção da geração solar

fotovoltaica na matriz energética brasileira”, Agosto de 2011. http://www.aneel.gov.br/arquivos/PDF/PeD_2011-

ChamadaPE13-2011.pdf 58

http://www.cpfl.com.br/SaladeImprensa/Releases/tabid/154/EntryId/639/CPFL-Energia-tera-geracao-solar-fotovoltaica-ate-2013.aspx

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2.5.1 Tarifação

A figura 2.45 ilustra um sistema com cargas CA, e conexão à rede. Uma questão que se

coloca é o da tarifação que está presente nos documentos que regem os procedimentos59,60

para

incentivar e regulamentar a implantação de sistemas de micro e minigeração.

Segundo estudo apresentado pela ANEEL, “pode-se considerar o Sistema de Compensação

de Energia como uma ação de eficiência energética, pois haverá redução de consumo e do

carregamento dos alimentadores em regiões com densidade alta de carga, com redução de perdas

e, em alguns casos, postergação de investimentos na expansão do sistema de distribuição”.

Um dos métodos é o chamado “net metering”, o qual “consiste na medição do fluxo de

energia em uma unidade consumidora dotada de pequena geração, por meio de medidores

bidirecionais. Assim, um único medidor é capaz de registrar a energia consumida e a energia

gerada em um ponto de conexão. Se a geração for maior que a carga, o consumidor receberá um

crédito em energia (isto é, em kWh e não em unidade monetária) na próxima fatura. Caso

contrário, o consumidor pagará a diferença entre a energia consumida e a gerada, mantido o custo

de disponibilidade”61

.

Figura 2.45 Sistema FV conectado à rede CA

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/9/95/PV-system_urban_home1.png/400px-PV-system_urban_home1.png

Propõe ainda que o medidor seja pago pelo consumidor e que haja um prazo de validade dos

créditos. Se a geração for maior do que o consumo, o consumidor paga apenas o custo de

disponibilidade e os créditos poderão ser utilizados nos meses subsequentes. Para consumidor com

tarifa horo sazonal, a energia gerada deve abater o consumo no mesmo posto horário. Se houver

excedente de geração, o montante será utilizado para compensar o consumo no outro posto

tarifário segundo a relação entre as tarifas de energia (ponta e fora de ponta). Os montantes de

energia gerada que não tenham sido compensados na própria unidade consumidora, podem ser

utilizados para compensar o consumo de outras unidades previamente cadastradas para esse fim,

atendidas pela mesma distribuidora, cujo titular seja o mesmo da unidade com sistema de

compensação de energia.

A regulamentação exige ainda alterações e complementações em outros documentos, como o

PRODIST 62

(Procedimentos de Distribuição).

Há outras possibilidades de tarifação como, por exemplo, o uso de medidores distintos para a

importação e para a exportação de energia, o que permite a aplicação de tarifas diferenciadas,

incentivando a geração por meio de um maior valor pago. 59

CPFL Energia, Conexão de Micro e Minigeração Distribuída sob Sistema de Compensação de Energia Elétrica, 2016. http://sites.cpfl.com.br/documentos-tecnicos/GED-15303.pdf 60

http://www.enersul.com.br/files/2012/12/Procedimento-de-Acesso-para-Microgera%C3%A7%C3%A3o-e-Minigera%C3%A7%C3%A3o-

Distribuida-ENERSUL.pdf 61

www.aneel.gov.br/aplicacoes/audiencia/arquivo/2011/042/documento/aviso_ap042_2011_dou_11.8.11_secao_3_pg_134.pdf 62

https://www.aneel.gov.br/modulo-8

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2.5.2 Requisitos para conexão à rede CA

A regulamentação específica se encontra em constante revisão em todo o mundo, frente aos

conhecimentos que vão se consolidando em termos da operação das fontes distribuídas. No Brasil

têm sido tomadas como referência normas de outros países, especialmente da IEC (International

Electrotechnical Comission) e as recomendações do IEEE (The Institute of Electrical and

Electronics Engineers). Aplica-se integralmente o estabelecido na Seção 8.1 do Módulo 8 –

Qualidade da Energia Elétrica, do PRODIST (Rev. 12, 2020). Existem inúmeras normas que

tratam do assunto 63

64

65

, envolvendo aspectos de equipamentos, de interligação, aterramento e

isolação, qualidade da energia, de proteção e segurança. Alguns aspectos são comentados a seguir.

A regulamentação da CPFL especifica que toda central de minigeração distribuída com

potência entre 75 kW e 5 MW (3 mW se geração hídrica) deve ser conectada por intermédio de um

transformador de acoplamento, a cargo do acessante. Toda central de microgeração distribuída

conectada na rede de baixa tensão (BT), independentemente da quantidade de fases e da potência

que pode ser gerada, deverá sê-lo necessariamente por intermédio de inversores eletrônicos,

qualquer que seja a fonte primária da energia.

Os procedimentos definidos pela Light66

e Enersul67

, por sua vez, permitem que geradores

CA (síncrono ou de indução) sejam conectados diretamente à rede de BT, apenas com os

dispositivos de segurança apropriados.

2.5.2.1 Tensão de operação

De acordo com as normas vigentes, o inversor que se conecta à rede CA, em baixa tensão, é

responsável apenas pela injeção de potência ativa e não deve ter ação direta (intencional) sobre o

valor da tensão no PAC. São previstos valores máximo e mínimo da tensão e, dentro de tal

intervalo, o inversor deve operar normalmente.

Tabela 2.5 Limites de tensão PRODIST (< 1 kV)

Em situações que a tensão saia dos limites, o inversor deve se desconectar. O tempo de

desconexão depende do desvio da tensão, conforme as tabelas 2.6 e 2.7.

Este critério (uso exclusivo para injeção de potência ativa) impede o uso multifuncional do

inversor o que, do ponto de vista de estruturas de redes inteligentes (smart grid) é uma restrição

que subutiliza o potencial do conversor para realizar outras funções importantes, como a

compensação de harmônicas e de energia reativa.

63

IEEE1547, IEEE Standard for Interconnecting Distributed Resources with Electric Power Systems, 2003 64

IEC 61727, Characteristics of the utility interface 65

IEEE 929-2000, Recommended practice for utility interface of photovoltaic (PV) systems. 66

Procedimentos para a Conexão de Acessantes ao Sistema de Distribuição da Light SESA – Conexão em Baixa

Tensão, 2012, http://www.light.com.br/recon/energia_alternativa_12_12_12.pdf 67 Procedimento de Acesso para Microgeração e Minigeração Distribuída, Enersul, 2012

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Arranjo

fotovoltaico Conversor

CC/CC

Detector de

fuga de

corrente ao

terra Fusível

CC

Inversor

Fusível

CA

Seccionadora

com a rede

Painel de

conexão

Rede

CA

Figura 2.46 Componentes típicos de um sistema FV conectado à rede

68

Figura 2.47 Procedimentos de conexão definidos pela CPFL.

Tabela 2.6 IEC 61727

Faixa de tensão (% do valor nominal) Tempo para desconexão [s]

V<50 0,1 (5 ciclos de 50 Hz)

50<V<85 2,0

85<V<110 Operação normal

110<V<135 2,0

V>135 0,05 (2 ciclos e ½ de 50Hz)

Tabela 2.7 IEEE 1547

Faixa de tensão (% do valor nominal) Tempo para desconexão [s]

V<50 0,16 (10 ciclos de 60 Hz)

50<V<88 2,0

88<V<110 Operação normal

110<V<120 1,0

V>120 0,16

68 California Energy Commission, A GUIDE TO PHOTOVOLTAIC (PV) SYSTEM DESIGN AND INSTALLATION, 2001

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2.5.2.2 Frequência

A tensão e a corrente produzidas pelo inversor têm que estar sincronizadas com a rede.

Enquanto a frequência da rede estiver dentro de certos limites, isso é entendido como uma situação

normal. Ao sair da faixa permitida, o entendimento é que houve alguma perturbação e que,

portanto, o inversor deve desconectar o sistema de geração local. A IEC recomenda que o desvio

máximo seja de +1 Hz. Já o IEEE apresenta uma faixa entre 59,3 e 60,5 Hz.

De acordo com a regulamentação brasileira 69

, conforme ilustra a figura 2.48, quando a

frequência da rede ficar abaixo de 57,5 Hz ou acima de 62 Hz, a central deve cessar a injeção de

energia ativa à rede em no máximo 0,2 de segundo. Somente quando a frequência retornar a 59,9

Hz, após ter caído, ou retornar a 60,1 Hz, após ter subido, é que a central poderá voltar a injetar

energia ativa, em ambos os casos respeitando um tempo mínimo de 180 segundos após a volta das

condições normais de tensão e frequência na rede.

Figura 2.48 Injeção de potência pelo inversor em função da frequência da rede (NBR).

No caso de haver necessidade de corte de geração ou de carga, para permitir a recuperação

do equilíbrio carga-geração durante distúrbios na rede, a frequência:

• Não pode exceder 66 Hz ou ser inferior a 56,5 Hz em condições extremas;

• Pode permanecer acima de 62 Hz por no máximo 30 segundos e acima de 63,5 Hz por no

máximo 10 segundos;

• Pode permanecer abaixo de 58,5 Hz por no máximo 10 segundos e abaixo de 57,5 Hz por no

máximo 5 segundos.

2.5.2.3 Distorção da corrente e corrente CC

As normas (IEC e IEEE) coincidem e apontam uma Distorção Harmônica Total (DHT) de

5% e limites individuais segundo a Tabela 2.8. Algumas regulamentações nacionais de

concessionárias, como a COSERN70

, também apontam tais limites.

Tabela 2.8 Limites de componentes harmônicas da corrente

Harmônica Limite

3ª à 9ª 4%

11ª à 15ª 2%

17ª à 21ª 1,5%

23ª à 33ª 0,6%

Acima da 33ª 0,3%

Componentes pares ¼ dos valores acima

69

NBR 16149:2013 – Sistemas fotovoltaicos (FV) – Características da interface de conexão com a rede elétrica de

distribuição 70

Conexão de Microgeradores ao Sistema de Distribuição de Baixa Tensão da Cosern, 2012,

http://www.cosern.com.br/ARQUIVOS_EXTERNOS/Conexão de Microgeradores ao Sistema de Distribuição de

Baixa Tensão da Cosern;;20121214.pdf

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A norma da CPFL não faz referência específica à distorção da corrente produzida pelo

inversor. Em relação à tensão, repete os valores definidos no PRODIST, mostrados na Tabela 2.9.

Tabela 2.9 Valores de referência globais das distorções harmônicas totais (em porcentagem da

tensão fundamental) – PRODIST

A operação do inversor pode apresentar um pequeno desequilíbrio nas tensões produzidas

nos semiciclos positivo e negativo. Isso gera um nível CC de tensão o qual, por depender apenas

da resistência do circuito, pode levar a um elevado valor CC na corrente, que é algo muito

prejudicial a elementos eletromagnéticos na rede, como transformadores, devido ao desequilíbrio

que provoca na magnetização dos mesmos.

O IEEE admite até 0,5% da corrente nominal do conversor, enquanto a IEC aceita até 1%. A

NBR 16149 indica que, a menos que haja separação galvânica entre a central geradora e a rede por

meio de transformador de isolamento, o micro ou minigerador distribuído deverá cessar de

fornecer energia à rede em até 1 segundo após detectar que injeção de componente de corrente

contínua que exceda 0,5 % da corrente nominal da central geradora.

2.5.2.4 Aterramento e corrente de fuga

Deve ser possível conectar ao terra o terminal positivo ou negativo do painel ou do arranjo

fotovoltaico. A fuga de corrente pelo terra deve ser monitorada, o que é especialmente importante

nos sistemas que não utilizem transformador de isolação. Caso a fuga de corrente exceda um dado

limite, o sistema deve se desconectar.

2.5.2.5 Fator de Potência

A IEC 61727 estabelece que operando a partir de 10% do valor nominal da potência, o

fator de potência resultante da injeção de corrente deve ser indutivo e não pode ser inferior a 0,85.

Para potência acima de 50% do valor nominal, o FP não pode ser inferior a 0,9. O IEEE não traz

restrições nesse aspecto.

A regra CPFL indica que o fator de potência no ponto de conexão da unidade consumidora

com central de micro ou minigeração distribuída deverá estar compreendido entre 0,92 e 1

indutivo ou 1 e 0,92 capacitivo.

A COSERN, seguindo as definições da NBR, indica que o sistema de geração distribuída

deve ser capaz de operar dentro das seguintes faixas de fator de potência quando a potência ativa

injetada na rede for superior a 20% da potência nominal do gerador:

Sistemas de geração distribuída com potência nominal menor ou igual a 3 kW: fator de

potência igual a 1 com tolerância de trabalhar na faixa de 0,98 indutivo até 0,98 capacitivo;

Sistemas de geração distribuída com potência nominal maior que 3 kW e menor ou igual a

6 kW: fator de potência ajustável de 0,95 indutivo até 0,95 capacitivo;

Sistemas de geração distribuída com potência nominal maior que 6 kW: fator de potência

ajustável de 0,90 indutivo até 0,90 capacitivo.

Após uma mudança na potência ativa, o sistema de geração distribuída deve ser capaz de

ajustar a potência reativa de saída automaticamente para corresponder ao fator de potência

predefinido. Qualquer ponto operacional resultante destas definições/curvas deve ser atingido em,

no máximo, 10 segundos.

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2.5.2.6 Ilhamento e reconexão

Quando ocorre alguma perturbação na rede que acarrete a violação de limites de tensão e/ou

de frequência, conforme indicados anteriormente, o inversor deve se desconectar da rede.

Eventualmente pode manter a alimentação das cargas locais, dentro de sua disponibilidade de

potência, passando a atuar no modo stand-alone.

A desconexão é importante para impedir que o inversor tente “alimentar” a rede, para o que,

provavelmente, não teria capacidade, mas, principalmente, por razões de segurança. A manutenção

de operação do inversor manteria a rede alimentada, colocando em risco ações de manutenção,

além de poder produzir transitórios de energização muito perigosos, devido à assincronia entre a

fonte local e a externa.

O sistema local deve monitorar a presença, ou não, da rede externa. Ao detectá-la, deve

seguir um procedimento para a reconexão, fazendo um ajuste de frequência e de amplitude da

tensão, previamente à efetivação da conexão.

A IEEE 1547 indica que a conexão do inversor à rede pode ser feita desde que a tensão se

encontre na faixa de operação normal (88 a 110% do valor nominal) e que a frequência esteja entre

59,3 e 60,5 Hz. Não especifica em quanto tempo deve ser feita a conexão, uma vez atendidas essas

restrições.

Já a IEC 61727 indica a faixa de tensão entre 85 e 110% e frequência com desvio de + 1 Hz

em relação ao valor nominal da rede. A conexão só pode se dar após 3 minutos do retorno da

energia na rede no PAC.

2.5.3 Estruturas de conexão de inversores

Existem diferentes maneiras de se fazer a conexão de um painel ou de um arranjo á rede

elétrica. A figura 2.49 ilustra essas alternativas.

CC

CA

Rede CA Rede CA

CC

CA

CC

CC

CC

CC

(a) (b)

Arranjo com conversor único (a) e com múltiplos conversores CC-CC (b)

Rede CA

CC

CA

CC

CA

Rede CA

CC

CA

CC

CA

CC

CA

CC

CA

(c) (d)

Arranjo em paralelo de inversores (c) e configuração com microinversores (d)

Figura 2.49 Estruturas de conexão de inversores à rede CA

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Pode-se fazer o arranjo de todos os painéis, de maneira a obter a tensão CC (painéis em

série) e a corrente/potência desejadas (que determina a quantidade de arranjos que serão colocados

em paralelo). Um único conversor processa toda a potência gerada (figura 2.49.a). Outra

possibilidade é dividir os painéis e conectar cada grupo a um conversor CC-CC (figura 2.49.b), de

modo que se torna possível extrair a máxima potência de cada arranjo, o que não é possível no

caso anterior. Os conversores CC-CC compartilham um barramento CC de saída, ao qual se

conecta um inversor único, que processa toda a potência. Caso haja falha no inversor, toda a

produção de energia é interrompida71,

72

.

A figura 2.49 mostra alternativas que modularizam os inversores, os quais são de menor

potência (em relação à figura 2.49.a). Nesse caso também é possível obter a máxima potência de

cada subarranjo. A operação dos inversores deve prever tal operação em paralelo, com o devido

controle da corrente de saída para evitar conflito entre os comandos dos conversores.

A figura 2.49.d ilustra o conceito dos microinversores, no qual cada painel já possui um

conversor CC-CA integrado, com capacidade para conexão direta na rede. O conceito leva-se a

modularidade ao extremo e garante a operação de parte do arranjo, mesmo em caso de falha de um

painel ou inversor.

2.6 Acumuladores de Energia

Conforme visto, tem-se significativa intermitência na geração de energia por parte das fontes

eólicas e fotovoltaicas. Além disso, deve-se levar em conta a diferença entre a geração e a

demanda, como ilustra a figura 2.50.

Figura 2.50 Comportamento típico de geração fotovoltaica e de consumo residencial.

Quando se tem um sistema conectado à rede de distribuição, esta pode ser vista como um

tipo de armazenador do excesso de energia gerada e que fornece a quantidade demandada pela

carga quando não houver disponibilidade local. Na verdade, o que ocorre é que o sistema elétrico,

ao deixar de fornecer energia à carga, não realizará produção de energia com fontes tradicionais

(hidrelétrica e termelétrica), poupando os combustíveis ou retendo água nos reservatórios.

Por outro lado, pode ser de interesse do produtor armazenar localmente o excesso da

energia. Uma razão para isso seria a tarifação horo sazonal, posto que a energia gerada seria

remunerada por um valor menor do que a consumida no horário de pico, em prejuízo do produtor.

Outra necessidade de se ter um estoque de energia local é para o atendimento de picos de potência.

Nos sistemas convencionais, com geradores eletromecânicos, a massa girante das máquinas

representa uma expressiva quantidade de energia cinética armazenada, a qual é capaz de suprir de

maneira instantânea a variação rápida de demanda. Em sistemas em que a geração é processada

71

Fritz Schimp, Lars E. Noru, Grid connected Converters for Photovoltaic, State of the Art, Ideas for Improvement of

Transformerless Inverters, NORPIE/2008, Nordic Workshop on Power and Industrial Electronics, June 9-11, 2008

http://www.elkraft.ntnu.no/eno/Papers2008/Schimpf-norpie08.pdf 72

Soeren B. Kjaer, John K. Pedersen and Frede Blaabjerg, A Review of Single-Phase Grid-Connected Inverters for

Photovoltaic Modules, IEEE Transactions on Industry Applications, Vol. 41, No. 5, Sep. 2005

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por conversores eletrônicos, não existe essa disponibilidade, de modo que é preciso algum outro

método para garantir o atendimento instantâneo da demanda. Outra razão da necessidade de

armazenamento local de energia é para a inicialização de uma rede isolada, de modo a ser possível

determinar o sincronismo ao qual os demais geradores irão se ajustar.

Embora a energia elétrica seja um excelente vetor energético, sua grande limitação é a

impossibilidade prática de seu armazenamento em quantidades razoáveis. Os acúmulos capacitivo

e indutivo não são adequados à retenção de quantidades maiores de energia, mesmo que utilizando

supercapacitores ou magnetos supercondutores, por razões de custo, principalmente.

Nesse cenário, diferentes formas de acúmulo da energia excedente devem ser consideradas.

Conforme indica a figura 2.51, com dados de 2010, praticamente toda capacidade instalada se

relaciona com armazenamento em forma de energia potencial através do bombeamento de água

para reservatórios elevados73

. Em quantidades muito menores tem-se o uso de compressão de ar e,

em escala ainda menor, as baterias. No entanto, principalmente com o crescimento da frota de

veículos elétricos, a expectativa é que em poucos anos a energia acumulada eletroquimicamente

iguale e venha a superar o armazenamento hídrico.

Figura 2.51 Formas de acúmulo de energia a partir de excedente de geração por fonte renovável

(dados de 2010) e evolução da capacidade de armazenamento de energia74

.

Quando o cenário é de um armazenamento no próprio local de geração, a opção mais

comum é o armazenamento de energia química, seja em baterias, seja na forma de hidrogênio para

posterior produção de eletricidade por meio de células a combustível.

A figura 2.52 mostra comparativamente os desempenhos em termos de potência e de

energia de diferentes dispositivos de acúmulo. Observa-se que capacitores e supercapacitores são

capazes de fornecer elevada potência, mas têm uma capacidade muito limitada de acumular

energia, o que é mais bem realizado pelas baterias e células a combustível.

Figura 2.52

Comportamento de capacidade de acúmulo de energia e disponibilização de potência

elétrica entre diferentes dispositivos 75

.

73

EPRI - Eletrical Power Research Institute, “Electricity Energy Storage Technology Options. A White Paper Primer

on Applications, Costs and Benefits.” 2010. https://www.epri.com/research/products/000000000001022261 74

https://www.energy.gov/sites/prod/files/2020/12/f81/Energy%20Storage%20Market%20Report%202020_0.pdf

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2.6.1 Células a Combustível

Células a combustível são conversores de energia química em elétrica através de uma

reação de combustão na qual o combustível, normalmente hidrogênio, é oxidado em um dos

eletrodos (o ânodo) e o oxigênio, usualmente obtido do ar, é reduzido no outro eletrodo (o cátodo).

Uma CaC do tipo PEM (Polymer Electrolyte Membrane)76

unitária consiste de três

elementos principais: um ânodo, tipicamente caracterizado por um catalisador contendo platina;

uma membrana que é uma folha polimérica sólida agindo como eletrólito; e um cátodo também

catalisado com platina.

A membrana polimérica somente pode ser atravessada por íons carregados com cargas

positivas, sendo impermeável para as cargas negativas. Dessa forma, os lados da membrana

resultam carregados como as placas de um capacitor. As cargas negativas podem chegar ao outro

lado da membrana fluindo pelo circuito externo, onde se dá a conversão em eletricidade. O

resultado deste processo é que cargas de sinais opostos devem ser constantemente geradas em

ambos os lados da membrana. Como subproduto tem-se água aquecida. Não há emissão de gases

nocivos.

O rendimento elétrico das CaC é muito mais elevado do que o que se obtém em qualquer

processo de combustão interna, situando-se na faixa de 50%. No entanto, para que se possa usar

uma CaC como armazenador de energia, é preciso dispor de hidrogênio. Isso pode ser feito, por

exemplo, por eletrólise da água, armazenando-se H2, o qual será consumido na CaC quando

necessário. Do ponto de vista energético, é preciso considerar todo o processo, desde a produção

do hidrogênio, até a conversão posterior em eletricidade.

É também possível obter hidrogênio pela reforma de gases, como o metano (CH4). Tais

procedimentos, no entanto, fogem do foco deste curso, em que tratamos de processos de

aproveitamento da eletricidade.

Figura 2.52 Esquema simplificado de operação de uma célula a combustível tipo PEM

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Fuel_cell_PT.svg

Atualmente, as CaCs estão disponíveis no mercado internacional e com capacidades

modularizadas que variam desde alguns kW até centenas de MW, sendo adequadas para o uso em

geração distribuída (GD) e aplicações de armazenamento (UPS).77

75

André Augusto Ferreira e José Antenor Pomilio: “Estado da Arte sobre a Aplicação de Supercapacitores em

Eletrônica de Potência”, Eletrônica de Potência, SOBRAEP, Vol.10, no.2, Novembro de 2005, pp. 25-32. ISSN 1414-

8862 76

http://www.fueleconomy.gov/feg/fcv_pem.shtml 77

Geomar Machado Martins: “Desenvolvimento de Conversor Comutado em Baixa Frequência para Aplicação em

Sistemas de Geração Distribuída Baseados em Células a Combustível”, Tese de Doutorado, FEEC-UNICAMP, 14 de

julho de 2006.

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ar

pilha de FC 2x500Watts

saída água

Reservatório

d'água

CC

CA

+

_

saída para os

componentes

auxiliares

banco de

baterias

+

+

-

saída CA

220 V

conversor CC/CC

inversor CC/CA

regulador de tensão

CC

CC

+

válvula solenóide para H2

regulador de pressão

água ar

combustível

H2

água fria

sistema reformador

exaustor

S

soprador

+ _

bomba d'água trocador de

calor

ventilador

ar

purga de H2

exaustão de ar

água

de

alimentação

S

S

Figura 2.53 Diagrama esquemático de um sistema de geração baseado em CaCs

78

A estrutura típica de uma geração baseada em CaCs é vista na figura a seguir e compreende

o conjunto de CaCs e os tanques de Combustível (hidrogênio e oxigênio). A eletricidade resultante

é em CC. Caso se deseje injetar tal energia na rede, isso é feito via um inversor CC/CA. Estes

conversores devem realizar o ajuste do ponto de operação do sistema, regulando a tensão e a

corrente das CaCs de forma a otimizar o rendimento da energia produzida ou estabelecer o

funcionamento no ponto de máxima potência. Baterias de armazenamento podem estar presentes

no barramento CC e neste caso um conversor CC/CC dedicado (carregador das baterias) se faz

necessário para controlar o regime de carga/descarga.

2.6.2 Baterias

A capacidade de carga das baterias é normalmente expressa na unidade Ampère-hora.

Dimensionalmente, essa grandeza equivale a Coulomb. Ao se multiplicar a capacidade pela

diferença de potencial presente nos terminais, tem-se a energia estocada no dispositivo.

Há diversos tipos de baterias, como as de chumbo-ácido, íons de lítio, níquel-cádmio,

hidretos metálicos, etc.

Destas, principalmente me razão de custo, as mais usadas nos sistemas estacionários de

energia são as de chumbo-ácido, adequadas a longos processos de descarga, operam bem mesmo

com descargas profundas (até 10% da carga plena) e apresentam mínima auto-descarga.

Embora com melhor desempenho em termos de ciclos de operação e perdas reduzidas,

outras tecnologias de baterias, como as de íons de Lítio ou de Níquel-Cádmio, por apresentarem

custo muito mais elevado, possuem menor aplicação para estocagem de energia em maiores

quantidades.

78 Farret, F. A., Pequenos Aproveitamentos Elétricos, livro. Editora da UFSM, 2002.

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http://www.fee.unicamp.br/dse/antenor 2-39

Referências adicionais

Além das citadas ao longo do texto, foram utilizadas informações e imagens disponibilizadas na

WEB:

http://www.mme.gov.br/mme/galerias/arquivos/publicacoes/BEN/2_-_BEN_-_Ano_Base/1_-_BEN_Portugues_-

_Inglxs_-_Completo.pdf

http://www.mme.gov.br/spe/galerias/arquivos/Publicacoes/matriz_energetica_nacional_2030/MatrizEnergeticaNacion

al2030.pdf

http://www.cresesb.cepel.br/publicacoes/download/Atlas_Solarimetrico_do_Brasil_2000.pdf

http://www.cresesb.cepel.br/publicacoes/download/atlas_eolico/Atlas%20do%20Potencial%20Eolico%20Brasileiro.p

df

http://www.eletrobras.gov.br

http://www.pmirs.org.br/seminario/iv_Seminario/download/pal18-EolicoJunqueira144_sec.pdf