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Radiação de Hawking 45
2 Radiação de Hawking 2.1 Emissão de radiação por buracos negros Como já foi referido (Secção 1.2.8) existe uma forte analogia entre as Leis da
Termodinâmica e a mecânica dos buracos negros. Nessa analogia é possível atribuir ao
buraco negro uma temperatura proporcional à gravidade superficial do mesmo. Na
Relatividade Geral Clássica a temperatura de um buraco negro corresponde ao zero
absoluto não havendo qualquer relação física entre esta e a gravidade superficial. Por
essa razão a analogia entre as referidas leis era inicialmente vista como uma mera
curiosidade matemática despida de qualquer significado físico (e.g. Wald 1997).
Esta visão mudou dramaticamente quando Hawking (1974, 1975) provou que os
buracos negros não são realmente negros. Eles radiam energia continuamente em todos
os comprimentos de onda. Esta revelação é baseada na hipótese de que o campo
gravítico do buraco negro cria partículas emitindo-as para o infinito à mesma razão que
um corpo negro emitiria se tivesse uma temperatura igual à determinada pela gravidade
superficial do primeiro.
O espaço "vazio" não pode ser completamente vazio. Se uma dada região do
espaço fosse efectivamente vazia isso significaria que nessa região os campos, como por
exemplo o gravítico e o electromagnético, teriam de ser exactamente zero. Nesse caso
tanto o valor do campo, como a respectiva variação seriam conhecidos de forma exacta.
Esta situação contraria claramente o Princípio da Incerteza de Heisenberg (PIH; e.g.
Cohen-Tanoudji et al. 1977). Tem assim de existir uma quantidade mínima de incerteza
associada ao campo em qualquer ponto do espaço (e.g. Hawking 1994).
Podemos pensar nessa incerteza como flutuações de pares de partículas de luz ou
gravitação que, aparecendo juntas num dado momento, afastam-se e depois voltam a
juntar-se num momento posterior aniquilando-se mutuamente. Estas partículas não
podem ser observadas directamente através de qualquer detector e, por isso, dizem-se
virtuais. O PIH também prevê a formação de pares virtuais de partículas com massa
como, por exemplo, electrões. Neste caso o par será do tipo partícula-antipartícula. As
antipartículas de luz e de gravitação correspondem às respectivas partículas (e.g.
Hawking 1994).
Radiação de Hawking 46
Para obtenção dos seus resultados Hawking recorreu às técnicas da Teoria
Quântica do Campo. Podemos no entanto atingir o essencial dos mesmos a partir de
uma série de considerações mais elementares. Vamos então, nesta ordem de ideias,
seguir uma abordagem proposta por Schutz (1985). Essa abordagem visa apenas
apresentar os argumentos e ideias que estão por detrás dos resultados de Hawking, não
consistindo, de forma alguma, numa discussão rigorosa dos mesmos.
O PIH pode ser escrito na forma:
h=∆∆ tE (2.1)
onde ∆E é a incerteza associada à energia de uma partícula que fica num dado estado
quântico durante um intervalo de tempo ∆t.
Note-se que a criação de um par partícula-antipartícula viola a conservação da
energia. No entanto, se o tempo de vida do par for inferior ao intervalo ∆t dado por (2.1)
então não ocorre a violação de qualquer Lei Física. Podemos dizer que, ao passo que em
larga escala o Princípio da Conservação da Energia é sempre verificado, em pequena
escala o mesmo pode ser violado.
O espaço existente junto ao exterior do horizonte de acontecimentos de um buraco
negro é espaço ordinário e localmente plano. Assim, a formação de pares partícula-
antipartícula deve ocorrer também nessa região.
Considere-se então a formação de um par de fotões de energias +E e -E. No
espaço-tempo plano o fotão de energia negativa não se pode propagar livremente pelo
que terá de se reencontrar forçosamente com o seu companheiro de energia positiva por
forma a aniquilarem-se mutuamente. No entanto, se o par for produzido suficientemente
perto do horizonte de acontecimentos então o fotão de energia negativa tem uma
segunda alternativa a qual consiste na possibilidade de atravessar para a região interior
ao horizonte de acontecimentos antes que ocorra o aniquilamento (Figura 2.1).
Na métrica de Schwarzschild as órbitas exteriores ao horizonte e com energias
negativas correspondem a partículas deslocando-se no sentido do passado e por isso são
excluídas. O mesmo não acontece no interior do horizonte onde são também permitidas
órbitas com energias negativas. Quer isto dizer que, uma vez ultrapassado o horizonte
de acontecimentos o fotão de energia negativa pode propagar-se livremente como
qualquer outro fotão real.
Radiação de Hawking 47
Figura 2.1 - Formação de pares partícula-antipartícula junto ao horizonte de acontecimentos. A- o par
forma-se e desaparece sem atravessar o horizonte. B- o par forma-se do lado de fora e ambas as partículas
atravessam o horizonte. C- o par forma-se do lado de fora mas apenas a partícula de energia negativa
atravessa o horizonte.
Para entendermos o comportamento de um fotão no interior do horizonte de
acontecimentos é necessário considerar um observador local. Qualquer partícula livre,
no interior do horizonte de acontecimentos, está necessariamente em movimento no
sentido de r decrescente. Consideremos então que a 4-velocidade do nosso observador é,
por simplicidade, da forma:
( )0,0,U,0U r=r
Aplicando a condição de normalização:
1gUUU.U rrrr ==
rr
com grr=g11 dado por (1.4), resulta:
2m)(r 1r
m2U r <−−=
onde o sinal negativo indica que o movimento decorre no sentido de r decrescente.
Podemos agora então considerar o movimento de um fotão no interior do buraco negro.
Radiação de Hawking 48
A energia do fotão, para o observador local, que designaremos por E*, é dada por:
2/1r
rrrr* 1
r
m2PgUPU.PE
−
−−===rr
onde o momento radial Pr é dado por dr/dτ (expressão 1.10 escrita na forma
contravariante). Deve ser E*>0 pois só nessas condições é que a geodésica é permitida.
Desde que o fotão se desloque no sentido de r decrescente (Pr<0), como de resto
estamos a considerar, o resultado anterior conduz de facto a um valor positivo. Além
disso não são impostas quaisquer restrições ao sinal de E. Concluímos assim que os
fotões podem viajar no interior do horizonte de acontecimentos, quer tenham E>0 ou
E<0, desde que se desloquem para dentro (Pr<0). Este fenómeno surge como uma
consequência directa da inversão de papeis entre espaço e tempo quando é cruzado o
horizonte de acontecimentos.
No caso de o fotão de energia negativa escapar para o buraco negro então o seu
companheiro, de energia positiva, fica livre. Este fotão pode seguir o mesmo destino do
seu companheiro mas também tem a possibilidade de escapar para o infinito como uma
partícula de luz real. Esta segunda hipótese é particularmente interessante.
Com vista a determinar uma expressão para a energia deste fotão (E>0) vamos
analisar as flutuações quânticas a partir de um referencial em queda livre no exterior do
buraco negro. Neste tipo de referencial, onde o espaço-tempo é localmente plano, as
flutuações comportam-se como se não existisse curvatura. Consideremos então que o
nosso referencial, que pode ser encarado como uma partícula de matéria, é abandonado
a partir do repouso num ponto exterior ao horizonte de acontecimentos caracterizado
por r=2m+∆m (com ∆m<<2m). O referencial irá seguir uma geodésica radial que pode
ser descrita pela equação (1.12) com L=0 e δ=1. O integral da energia que aparece nesta
equação, que aqui será designado por E' (por forma a evitar qualquer confusão entre este
valor e a energia E do fotão), sendo uma constante, pode ser determinado em qualquer
ponto, particularmente em r=2m+∆m. Temos então:
m2
m∆
m∆m2
m21'E ≈
+−= (2.2)
Radiação de Hawking 49
O referencial (partícula) atinge o horizonte de acontecimentos num tempo próprio
finito dado, a partir da equação (1.12), por:
∫+
+−
−=m2
m∆m2
m∆m2m2
rm2
drτ∆
Integrando e considerando a aproximação até a primeira ordem em ∆m vem:
m∆m22τ∆ = (2.3)
Se interpretarmos este intervalo de tempo como correspondendo a uma flutuação
quântica do campo, podemos, substituindo (2.3) em (2.1), estimar o valor da energia do
fotão segundo o observador no referencial local. Essa energia é então dada por:
m∆m22τ∆ξ
hh == (2.4)
Esta energia pode ainda ser escrita em termos do 4-momento, Pr
, e da 4-
velocidade do observador local, ( )0,0,0,UU t=r
, como se mostra a seguir:
tttt gUPU.Pξ ==
rr (2.5)
Nesta expressão o momento Pt corresponde ao integral do movimento (do fotão)
dado pela expressão (1.8). O seu valor E, constante ao longo de toda a trajectória,
corresponde à energia atribuída ao fotão por um observador no infinito. Os valores de Ut
e de gtt podem ser avaliados no ponto de partida do fotão, ou seja, em r=2m+∆m. No
caso de gtt vem:
m∆
m2
rm2
1
1
g
1g
m∆m2r
tt
tt ≈
−==
+=
Radiação de Hawking 50
Para Ut que é, por definição, igual a dt/dτ, temos com a ajuda de (1.8) e de (2.2):
2/1
m∆m2r
t
m2
m∆
rm2
1
'EU
−
+=
≈
−=
Fica então:
m2
m∆gUU tt
tt ≈=
Face às considerações anteriores podemos escrever, a partir de (2.5), a expressão
que relaciona a energia do fotão no referencial local, ξ, com a energia do fotão no
infinito, E, na forma:
m2
m∆ξE =
Este último resultado pode ser combinado com (2.4) obtendo-se a seguinte
expressão para a energia do fotão ao atingir o infinito:
m8
h
m4E
π== h
(2.6)
É importante notar que a energia do fotão no infinito depende apenas da massa do
buraco negro e que quanto menor for essa massa mais energético será o fotão. O
resultado não apresenta qualquer dependência do ponto onde é originado o par de
fotões.
A temperatura de um gás de partículas clássicas pode relacionar-se com a energia
cinética de cada uma das partículas através da expressão:
kTπ2Ec = (2.7)
Radiação de Hawking 51
onde k é a constante de Boltzmann e a constante de proporcionalidade 2π foi
introduzida por conveniência. Considerando que os fotões são emitidos termicamente
vamos igualar a respectiva energia, dada por (2.6), à expressão (2.7). Fica então:
kmπ8T
h= (2.8)
Esta expressão, para a temperatura de um buraco negro de massa m, corresponde
ao resultado exacto encontrado por Hawking ao considerar o buraco negro como um
corpo negro. Na abordagem seguida anteriormente (Schutz 1985) não é possível mostrar
que assim é, de facto. No entanto, é facilmente aceitável que um buraco negro é, na sua
essência, um corpo negro, visto absorver toda a radiação incidente e emitir radiação
própria com origem em flutuações aleatórias.
A expressão (2.8) pode escrever-se em unidades não geometrizadas, substituindo
m por (1.2) e multiplicando tudo pela velocidade da luz. Obtemos então:
kGMπ8
cT
3h= (2.9)
onde a temperatura T é dada em graus Kelvin. Esta expressão pode ainda escrever-se de
uma forma mais sugestiva se substituirmos as constantes físicas pelos respectivos
valores e introduzirmos a massa solar M� . Temos assim (e.g. Demianski 1985):
( )K M
M102.6T 8 r−×≈ (2.10)
Verifica-se que a temperatura de um buraco negro será tanto menor quanto maior
for a sua massa. Um buraco negro de 1M� apresenta uma temperatura de apenas 6.2×10-
8 K.
Se um buraco negro emite radiação como um corpo negro então deve apresentar
um espectro de emissão contínuo com uma curva semelhante à que se representa na
Figura 2.2. A emissão ocorre para todos os comprimentos de onda, mas não com a
mesma intensidade. Para uma dada temperatura T existe um comprimento de onda λmax
para o qual a intensidade de emissão é máxima.
Radiação de Hawking 52
Figura 2.2 - Espectro da radiação do corpo negro em função do comprimento de onda, para várias
temperaturas. Note-se que, para cada temperatura existe um comprimento de onda máximo (λmax) para o
qual a curva tem um máximo. O valor de λmax, decresce com o aumento da temperatura e quanto maior o
valor desta mais alto é o pico da curva (Eisberg & Resnick 1985)
A temperatura T e o comprimento de onda λmax relacionam-se entre si, segundo a Lei de
Wien (e.g. Eisberg & Resnick 1985), pela expressão:
(Km) 10898.2λT 3max
−×= (2.11)
É assim possível associar a cada buraco negro um comprimento de onda
(máximo). A um buraco negro de Schwarzschild com 1.5M� , por exemplo, corresponde
uma temperatura de 4.1×10-8K e um comprimento de onda λmax≈70.6km. Trata-se
portanto de um buraco negro rádio-VLF (Figura 4.7).
Radiação de Hawking 53
2.2 Emissão de radiação de Hawking por buracos negros com carga eléctrica ou com rotação
A radiação de Hawking foi introduzida (na secção anterior), por simplicidade,
tendo por base o buraco negro de Schwarzschild. Assim, as expressões (2.8), (2.9) e
(2.10) são válidas apenas para buracos negros de Schwarzschild. Uma expressão mais
geral para a temperatura de buracos negros pode escrever-se, em unidades
geometrizadas, como (e.g. Wald 1984):
kπ2
κT
h= (2.12)
onde κ∼(∂m/∂A) é a gravidade superficial do buraco negro (Secção 1.2.8). No caso de
um buraco negro de Kerr-Newmann a gravidade superficial é dada por (e.g. Wald
1984):
2222
222
ε]εamm[m2
εamκ
−−−+−−= (2.13)
Substituindo (2.13) em (2.12) obtemos a expressão para a temperatura dos buracos
negros de Kerr-Newmann:
2/1
2
222
mεa
1mε
21
11
2
kmπ8kπ2
κT −
+−
−+
== hh
(2.14)
A partir daqui podemos tirar imediatamente as expressões para a temperatura de
buracos negros de Kerr e buracos negros de Reissner-Nordström. Por exemplo, para um
buraco negro de Kerr (a≠0, ε=0) temos:
Radiação de Hawking 54
2/12
ma
11
2
kmπ8T −
−+
= h
(2.15)
e para um buraco negro de Reissner-Nordström (a=0, ε≠0):
2/122
mε
1mε
21
11
2
kmπ8T −
−
−+
= h
(2.16)
No caso de um buraco negro de Schwarzschild a fracção mais à direita em cada
uma das expressões anteriores é igual à unidade pelo que recuperamos naturalmente a
expressão (2.8).
2.3 Emissão de radiação de Hawking por buracos negros uniformemente acelerados
O efeito de Unruh, consiste na "experiência pensada" da detecção de partículas por
um detector uniformemente acelerado no espaço-tempo de Minkowski (Unruh 1976).
Um observador uniformemente acelerado, também designado por observador de
Rindler, regista um banho térmico de partículas provenientes de um determinado
horizonte à sua volta. A temperatura associada a esse banho de partículas é dada pela
expressão (e.g. Wald 1984):
(K) A104T r25−×≈ (2.17)
onde Ar é a aceleração. Essas partículas são reais para observadores em aceleração não
existindo, contudo, para os restantes observadores. Um sistema uniformemente
acelerado pode ser visto como uma versão simplificada de um sistema em repouso no
exterior de um buraco negro. Estas considerações ilustram a ambiguidade existente na
definição de partícula no espaço-tempo curvo (e.g. Wald 1984, Ohnishi & Takagi
1992).
Radiação de Hawking 55
Figura 2.3 - Observador uniformemente acelerado no espaço-tempo de Minkowski. O ramo de hipérbole
χ=const. representa a linha do universo desse observador. Tanto no passado como no futuro do
observador existe um horizonte que não pode ser transposto. Esse horizonte, designado por horizonte de
aceleração, não encerra qualquer singularidade (adaptado de Kiefer 2002).
Considere-se um observador uniformemente acelerado ao longo do eixo XX' do
espaço-tempo de Minkowski. A linha do universo deste observador é uma hipérbole
como se mostra na Figura 2.3. Verifica-se que o observador encontra, no seu futuro, um
horizonte que não pode transpor. Esse horizonte que, ao contrário do horizonte de
acontecimentos de um buraco negro, não encerra qualquer singularidade, é designado
por horizonte de aceleração.
A região I, representada na Figura 2.3, é também designada por espaço-tempo de
Rindler. A métrica correspondente a este espaço-tempo, também designada por métrica
de Rindler, pode escrever-se, com duas das coordenadas espaciais suprimidas, como
(e.g. Kiefer 2002):
2222r
222 χdζdχAdxdtds −=−= (2.18)
onde as coordenadas (ζ,χ) relacionam-se com (t,x) pela transformação:
=
)ζAcosh(
)ζAsinh(χ
x
t
r
r
Radiação de Hawking 56
Um buraco negro em rotação e a deslocar-se com movimento uniformemente
acelerado pode ser descrito pela denominada métrica C, a qual se pode escrever na
forma (e.g. Yu 1995):
( ) ( )( ) ( ) }]dzaradt[Σ
xG
]dzx1adt[Σ
∆dx
xG
Σdr
∆
Σ{
f
1ds
222
22222
+−−
−−+−−= (2.19)
onde:
( )2rrxA1f += , 222 xarΣ +=
41
2r1
222 rγAγamr2rγ∆ −+−= (2.20)
( ) 41
2r
23r
221 xγAaxmA2xγγxG −−−=
2r
21 Aa1
1γ
+= ,
2r
2
2r
2
2 Aa1
Aa1γ
+−=
Aqui m, a e Ar são parâmetros que correspondem respectivamente à massa,
rotação e aceleração do buraco negro. Quando Ar=0 a métrica C reduz-se à métrica de
Kerr na forma de Boyer-Lindquist (1.24). Por outro lado considerando m=a=0 a métrica
C reduz-se ao elemento de linha de Rindler (2.18).
Os horizontes para um buraco negro com rotação uniformemente acelerado
obtêm-se igualando (2.20) a zero. Esta equação tem, no caso geral, quatro raízes. Uma
dessas raízes é sempre negativa e, por isso, não tem significado físico. As restantes
podem escrever-se na forma (Yu 1995):
REDr 1h ++−= ; REDr 2h +−= ; REDr 3h −+= (2.21)
onde:
Radiação de Hawking 57
−−= π3
1ψ
3
1Cosα1
A6
1D
r
+−= π3
1ψ
3
1Cosα1
A6
1E
r
+= ψ3
1Cosα1
A6
1R
r
e:
4r
42r
2 AaAa141α +−=
πψ0 com α
βArcCosψ
3<<
−=
( )22r
22r
26r
64r
42r
2 Aa1Am54AaAa33Aa331β +−−−+=
Quando a aceleração Ar tende para zero temos um buraco negro de Kerr. Nesse
caso rh1 diverge enquanto que rh2 e rh3 coincidem, respectivamente, com (1.28) e (1.29).
Quando a tende para zero estamos perante um buraco negro de Schwarzschild
uniformemente acelerado. Nesse limite os horizontes podem escrever-se na forma (Yu
1995):
→ Θ3
1Cos
A3
2r
r
1h (2.22)
+→ π3
1Θ
3
1Cos
A3
2r
r
2h (2.23)
0r 3h →
Radiação de Hawking 58
onde:
( )rmA33ArcCosΘ −= (2.24)
Se considerarmos ainda m a tender para zero obtemos, nesse limite, o seguinte:
r1h A
1r → , 0r 2h → e 0r 3h →
A análise dos resultados anteriores permite constatar que rh1 corresponde ao
horizonte de Rindler, rh2 ao horizonte exterior do buraco negro e rh3 ao respectivo
horizonte interior.
Podemos avaliar a temperatura sobre qualquer um dos três horizontes, dados por
(2.21), através da expressão (Yu 1995):
( )22hi
rrii ar
dr∆d
kπ4kπ2
κT hi
+== =hh
(2.25)
onde k é a contante de Boltzmann, κ é a gravidade superficial, a é a velocidade de
rotação do buraco negro e ∆ é dado pela expressão (2.20).
A aceleração de um buraco negro de Schwarzschild não pode assumir qualquer
valor. De facto a partir de (2.24) tiramos que deve ser:
m33
1A r ≤ (2.26)
No caso de um buraco negro de Kerr uniformemente acelerado o valor de Ar deve
respeitar a condição (Yu 1995):
( )( ) 0maAama33ma54ma27A
a2m27ma33Aam266
r62442444
r
44222r
22
>−+++−
−−+− (2.27)
Radiação de Hawking 59
2.4 Emissão de partículas com massa
Na radiação de Hawking também podem ser emitidas partículas com massa. Estas
resultam, como no caso dos fotões, da separação de pares partícula-antipartícula
originados pelas flutuações do campo. Neste caso, para que a separação se concretize, é
necessário que as forças de maré originadas pelo campo gravítico do buraco negro
provoquem um afastamento entre ambas as partículas da ordem do respectivo
comprimento de onda de Compton, λc (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). Este
comprimento de onda, característico para cada partícula com massa, é dado pela
expressão (e.g. Eisberg & Resnick 1985):
cm
hλ
0c = (2.28)
onde m0 é a massa da partícula.
No caso de um buraco negro de massa M, a força de maré, ao longo da distância
λc, é da ordem de (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983):
c30 λ
r
MGm
Para obter a ordem de grandeza do trabalho efectuado podemos multiplicar a
expressão anterior por λc. Por outro lado esse trabalho deve ser equivalente à energia
necessária para criar as duas partículas. Sendo assim podemos escrever:
20
2c3
0 cm2λr
MGm ≈
Considerando que a separação ocorre muito próximo do horizonte de
acontecimentos, onde o campo gravítico é mais forte, vamos substituir r pelo raio de
Schwarzschild (1.3). Substituindo também λc por (2.28) tiramos que:
Radiação de Hawking 60
0
2p
0 m
mM
Gm
chM ≤⇔≤ (2.29)
onde mp é a massa de Planck. Esta expressão indica a ordem de grandeza da massa que
o buraco negro deverá ter para que possam ser emitidas, via radiação de Hawking,
partículas de massa m0.
2.5 Evaporação de um buraco negro A luminosidade da radiação emitida por um corpo negro esférico é, segundo a Lei
de Stefan-Boltzmann, dada pela seguinte expressão (e.g. Harwit 1998):
42 Tr4L σπ= (2.30)
onde σ é a constante de Stefan-Boltzmann, r é o raio da superfície emissora e T a
respectiva temperatura. No caso do corpo negro ser um buraco negro de Schwarzschild
a superfície emissora corresponde ao horizonte de acontecimentos. Assim, r é dado pelo
raio de Schwarzschild (1.3) e T corresponde à temperatura de Hawking dada pela
expressão (2.9). Substituindo (1.3) e (2.9) em (2.30) vem:
( )W M
106.3
k4
c
MGπ
σL
2
3242
223BN
×≈
= h
(2.31)
Esta é a expressão para a luminosidade de um buraco negro de Schwarzschild
segundo um observador no infinito. Verifica-se que a energia responsável pela
luminosidade do buraco negro tem origem única e exclusivamente na respectiva massa.
A emissão de radiação por um buraco negro é, portanto, acompanhada por um
decréscimo da massa do mesmo.
Este decréscimo em massa pode entender-se como uma consequência do fluxo de
energia negativa que entra no buraco negro. De facto um fotão com uma energia
negativa tem a si associada uma massa também ela negativa (E=mc2). Assim, quando
Radiação de Hawking 61
um desses fotões penetra no buraco negro, a sua massa associada soma-se
algebricamente à massa (positiva) do buraco negro.
A expressão para a taxa da perda de massa pelo buraco negro pode ser escrita
como (e.g. Maki et al. 1996):
( ) ( )1-2
16
kgs M
Mf1034.5
dt
dM ×−= (2.32)
onde f é uma função que varia muito lentamente com a massa M do buraco negro. Para
M>>1014kg é f(M)≈1 (e.g. Maki et al. 1996) e para M<<108kg é f(M)≈15.4 (e.g.
Semikoz 1994).
O processo de perda de massa por um buraco negro é normalmente designado por
evaporação. O tempo de evaporação, para um buraco negro isolado, obtém-se a partir da
integração de (2.32). Tendo em conta que f varia muito lentamente com M (e.g. He &
Fang 2002) podemos considerar:
( ) ( )s Mf106.1
MMt
17
3f
3i
evap ×−≈ (2.33)
que corresponde ao intervalo de tempo necessário para que a massa do buraco negro
passe do valor inicial Mi para o valor final Mf.
Consideremos, como exemplo, o intervalo de tempo necessário para que um
buraco negro de 2M� , isolado, evapore reduzindo a sua massa para 1M� . Substituindo
estas massas em (2.33) e fazendo f(M)=1 obtemos tevap ≈ 3.4×1074s ≈ 1.1×1067 anos.
Acontece que este valor é muito superior à idade estimada para o Universo, a qual é da
ordem dos 1010 anos (e.g. Unsöld & Baschek 2002), o que significa que os buracos
negros de massa estelar e superior praticamente não são afectados pela evaporação.
O conceito de evaporação torna-se, contudo, particularmente útil e interessante
quando aplicado a buracos negros de massa subestelar. Esses buracos negros podem ter-
se formado nos primórdios do Universo (Secção 1.3.2). Uma vez formados podem ter
evoluído evaporando e/ou aumentando as respectivas massas através da acreção de
matéria (Secção1.4.1). Muitos deles podem já ter evaporado completamente enquanto
que outros podem estar em fases mais ou menos avançadas do processo de evaporação.
Radiação de Hawking 62
Um buraco negro primordial com uma massa inicial de 1012kg estaria agora (admitindo
a idade do Universo igual a 1010 anos) na fase final da evaporação.
Acabamos de ver que durante o processo de evaporação o buraco negro perde
massa o que implica que a sua área, e portanto a sua entropia, diminua. Estamos perante
uma violação do Teorema da Área (Secção 1.2.8) ou, se quisermos, da Segunda Lei da
Termodinâmica para buracos negros. O Teorema da Área deve então ser substituído
pela (Bekenstein 1974):
Segunda Lei da Termodinâmica generalizada - Em qualquer
interacção, a soma das entropias de todos os buracos negros com a
entropia da matéria existente fora do buraco negro nunca decresce.
Um buraco negro estelar capta muito mais matéria, por acreção esférica (Secção
1.4.1), do que aquela que perde por evaporação. Por exemplo, um buraco negro de 1M�
tem, de acordo com (2.32), uma taxa de evaporação da ordem de 10-43kgs-1. O mesmo
buraco negro, mergulhado numa região HII, apresenta uma taxa de acreção de matéria
(em regime adiabático) da ordem de 107kgs-1 (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). Nestes
casos continua a ser perfeitamente aplicável o Teorema da Área (Secção 1.2.8). Apenas
para buracos negros mais pequenos (Secção 4.2), para os quais a evaporação é mais
rápida, podemos ter a situação contrária.
2.6 Explosões de buracos negros Na emissão de fotões, neutrinos, gravitões e leptões, por um buraco negro,
podemos assumir que essas partículas se comportam como se fossem pontuais. O
mesmo não se pode dizer dos hadrões (Page & Hawking 1976) pois quando estes
começam a ser emitidos a ordem de grandeza da dimensão do buraco negro é igual ou
inferior à do alcance da força nuclear forte (10-15m). Os mesões π0 (Anexo D), por
exemplo, passam a ser emitidos, de acordo com (2.29), quando a massa do buraco negro
é de ≈4.2×1011kg, ou seja, quando o respectivo raio, dado por (1.3), é de ≈6.2×10-16m.
Para explicar a emissão de hadrões é então necessário recorrer a modelos baseados
na Teoria da Cromodinâmica Quântica (quantum chromodynamics - QCD) (e.g. Cline
Radiação de Hawking 63
& Hong 1992; Semikoz 1994; Belyanin et. al. 1996). Esta teoria, desenvolvida com o
objectivo de quantificar as interacções fortes entre quarks e gluões, permite explicar a
produção de jactos de matéria hadrónica emitidos na fase final da evaporação de um
buraco negro.
A escala energética associada à teoria QCD, habitualmente designada por ΛQCD, é
da ordem de 0.3GeV (e.g. Semikoz 1994) ao que corresponde uma temperatura da
ordem de 1012K.
Quando a temperatura do buraco negro excede este valor passam a ser emitidos
quarks e gluões em vez de partículas compostas. Nos jactos, compostos por quarks e
gluões, acabam por formar-se hadrões com especial predominância para os mesões π.
Alguns bariões (exceptuando protões e neutrões) e mesões K desintegram-se pouco
depois fornecendo mais mesões π (Anexo D). A ordem de grandeza do fluxo de mesões
π, formados a partir dos jactos de quarks e gluões, pode estimar-se através da expressão
(Belyanin et al. 1996):
)(s T107.2dt
dN 1-5.16π ×≈ (2.34)
Todos os três tipos de mesões π surgem no jacto com igual probabilidade. Os
mesões π+ e π- acabam desintegrando-se em partículas como electrões, positrões e
neutrinos. Porventura mais interessante, do ponto de vista observacional, é a
desintegração dos mesões πo. Estes decaem em dois fotões gama cada qual
transportando metade da energia da partícula inicial (Semikoz 1994). Assim, podemos
escrever o fluxo de fotões gama, resultantes da decomposição de mesões π0, na forma:
dt
dN
3
2
dt
dNπγ = (2.35)
Mesmo depois de ultrapassado o limite a partir do qual as interacções fortes se
tornam importantes, o buraco negro continua a emitir directamente fotões gama
(Semikoz 1994). Designaremos por primários os raios gama emitidos directamente pelo
buraco negro e, por secundários os raios gama resultantes da desintegração dos mesões
πo.
Radiação de Hawking 64
Os raios gama secundários têm energias próximas dos 70MeV (metade da massa
do mesão π0) sendo este valor pouco dependente da temperatura do buraco negro
(Belyanin et al. 1996). Por seu turno os raios gama primários têm energias que serão
tanto maiores quanto mais avançada for a fase de evaporação do buraco negro (Secção
2.1).
O tempo de vida de um buraco negro na fase terminal da evaporação pode
determinar-se a partir da equação (2.33). Verifica-se que, por exemplo, um buraco negro
com uma massa de 107kg, evapora em cerca de 7 minutos. Quando a massa for 106kg o
tempo de evaporação será de apenas 0.4 segundos. Como são libertadas grandes
quantidades de fotões gama (cerca de 1030 no último caso) num curto intervalo de
tempo, ocorre uma espécie de explosão de raios gama (e.g. Semikoz 1994).
Desde os anos 70 que se observam na natureza explosões de raios gama (e.g.
Fishman & Meegan 1995) habitualmente designadas por GRBs (Gamma Ray Bursts).
Os GRBs observados têm durações que vão desde os 10-3s aos 103s sendo o
grosso da energia emitido entre 0.1MeV e 1.0MeV (e.g. Galama & Sari 2002). A
hipótese de que alguns dos GRBs observados estejam relacionados com a explosão de
buracos negros primordiais foi por diversas vezes equacionada (e.g. Page & Hawking
1976, Semikoz 1994, Belyanin et al. 1996).
Com o lançamento do satélite BeppoSAX (em 1996) tornou-se possível identificar
a posição dos GRBs de maior duração (>2s) com um erro de ≈3' (e.g. Vreeswijk et al.
2000). Foi então possível observar a emissão associada a esses GRBs noutras bandas do
espectro (rádio, óptico e raios X). A análise dos resultados veio revelar que estas
explosões ocorrem a distâncias da ordem dos Gpc (e.g. Galama & Sari 2002) não
podendo por isso ser atribuidas a explosões de buracos negros que seriam detectáveis
apenas a distâncias inferiores a 100AL (Secção 4.4.8).
Os GRBs de curta duração (<2s) nunca foram localizados com precisão suficiente
para que se possam efectuar observações dos mesmos noutras bandas do espectro pelo
que não são conhecidas as distâncias a que ocorrem (e.g. Galama & Sari 2002). Alguns
destes GRBs são consistentes com a explosão de buracos negros primordiais (e.g. Cline
et al. 1999).
Radiação de Hawking 65
2.7 Destino final de um buraco negro A descoberta da emissão de radiação por buracos negros veio mostrar que estes
não podem ser, como se poderia pensar, o produto final estável do colapso gravitacional
de um corpo celeste. Hawking (1974) considerou o espaço-tempo de Schwarzschild
como um cenário fixo onde se propagavam os campos quânticos. Neste modelo
semiclássico um buraco negro de Schwarzschild isolado evapora continuamente
acabando por explodir (Secção 2.6). O produto final seria, neste caso, uma singularidade
nua, ou seja, um singularidade sem um horizonte de acontecimentos à sua volta.
A existência de uma singularidade nua levanta o problema da entrada de
informação não previsível no nosso Universo uma vez que nesse ponto deixariam de ser
aplicáveis as Leis da Física tal como as conhecemos (e.g. Page 1986). A ocorrência de
uma singularidade nua é de tal forma problemática que foi introduzida, por Roger
Penrose, a ideia da existência de um Censor Cósmico que as proíbe (e.g. d'Inverno
1992).
A emissão da radiação de Hawking é, como vimos (Secção 2.5), acompanhada por
um decréscimo da massa do buraco negro. Isto significa que o espaço-tempo de um
buraco negro em evaporação não é estático. A radiação de Hawking, emitida pelo
buraco negro, deve ter algum efeito sobre a geometria do espaço-tempo (e.g. Balbinot
1984). Esse efeito, habitualmente designado por contra-reacção (backreaction), não foi
considerado de inicio por Hawking (1974).
A inclusão da contra-reacção poderá revelar qual o destino final de um buraco
negro em evaporação (e.g. evapora completamente, deixa uma singularidade nua, deixa
um resto de massa macroscópica, deixa um resto de massa Planckiana...). Embora
tenham sido efectuados nos últimos anos vários estudos sobre esta matéria (e.g.
Balbinot & Barletta 1989, Brout et al. 1995, Diba & Lowe 2002, Chen 2003) não
existem resultados concludentes.