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3 A seção “Química e sociedade” apresenta artigos que focalizam aspectos importantes da interface ciência/sociedade, procurando sempre que possível analisar o potencial e as limitações da ciência na solução de problemas sociais. Este texto aborda o efeito de agentes de limpeza sobre os cabelos. Ao mesmo tempo, discute a composição química desses materiais, a estrutura básica do cabelo e as formas como a acidez e a alcalinidade de xampus afetam essa estrutura. xampu, sabões, detergentes, acidez e basicidade, pH QUÍMICA e SOCIEDADE André Borges Barbosa Roberto Ribeiro da Silva QUÍMICA NOVA NA ESCOLA Xampus N° 2, NOVEMBRO 1995 E stamos tão habituados, hoje em dia, com os produtos de limpeza e higiene pessoal que vêm sendo desenvolvidos com o correr dos anos, que sequer paramos para pensar no que acontece quando lavamos os cabelos com um xampu qualquer. Por que não usar um sabão comum ou outro produto de limpeza no lugar dessa coisa que se conven- cionou chamar xampu? E os condicio- nadores, para que servem? Para entender mais sobre xampus e outros detergentes semelhantes é preciso voltar um pouco no tempo e acompa- nhar o desenvolvimento do primeiro dos produtos de limpeza, o sabão comum. Um pouco de história Como o preparo de vinho a partir da fermentação de suco de uva, a produção de sabão é uma das mais antigas reações químicas conhecidas. Não se conhece sua origem, mas é provável que tenha sido descoberta por acidente quando, ao ferverem gor- dura animal contaminada com cinzas, nossos ancestrais perceberam uma espécie de ‘coalho’ branco flutuando sobre a mistura. O historiador romano Plínio, o Ve- lho (23-79 d.C.), já descreve a fabri- cação do sabão duro e do mole, mas somente a partir do século XIII este passou a ser produzido em grande escala. No princípio do século XIX ain- da se pensava que o sabão fosse uma simples mistura mecânica de gordura e álcali, até que o químico francês Michel-Eugène Chevreul (1786-1889) mostrou que sua formação era na realidade uma reação química. Gregos e romanos chegaram a co- nhecer o sabão. Nas ruínas de Pom- péia, destruída aproximadamente em 79 a.C. pela explosão do Vesúvio, ar- queólogos desenterraram uma fábrica de sabão. Ao que tudo indica, os romanos não o empregavam para a limpeza: a maior parte era misturada com aromatizantes para cabelos ou cosméticos e adicionada aos emplas- tros usados em queimaduras e feri- A reação de saponificação transforma um éster de um ácido graxo em um sal de um ácido caboxílico e um álcool, conforme a seguinte equação química: R-CO-OR’(s) + NaOH (aq) R-CO-O - Na + (aq) + R’-OH (l) éster base sal (sabão) álcool No caso específico dos lipídeos constituintes de óleos e gorduras, a reação é representada pela seguinte equação química: CH 2 -O-CO-R CH 2 -OH CH-O-CO-R (s) + 3 NaOH (aq) CH-OH (l) + 3 RCOO Na + (aq) CH 2 -O-CO-R CH 2 -OH glicerídeo base glicerol sal (sabão) cadeia carbônica apolar (lipofílica) extremidade carregada (hidrofílica) mentos. Só eventualmente se utilizava o sabão para limpeza, ao se lavar o corpo de pessoas homenageadas. Sabões, detergentes sintéticos e xampus Formados por ésteres, as gorduras animais e os óleos vegetais são insolúveis em água. Reagem com soluções alcalinas, de hidróxido de sódio ou potássio, produzindo sabão. Essa reação é um dos mais antigos processos orgânicos conhecidos e utilizados pelo homem, permitindo a conversão de gorduras animais e óleos vegetais em sabão. Por esta razão, ela é conhecida como ‘reação de saponificação’ (ver quadro abaixo). Um sabão tem a fórmula geral R- CO-ONa, onde R é usualmente uma cadeia carbônica contendo de 12 a 18 átomos de carbono. A característica estrutural mais importante de um sa- bão é que sua longa cadeia carbônica apresenta uma extremidade carrega- da (que é atraída pela água) e a outra não se solubiliza na água. Por exem- plo, o estearato de sódio, visto abaixo.

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A seção “Química e sociedade” apresenta artigos que focalizamaspectos importantes da interface ciência/sociedade, procurandosempre que possível analisar o potencial e as limitações da ciênciana solução de problemas sociais.Este texto aborda o efeito de agentes de limpeza sobre os cabelos.Ao mesmo tempo, discute a composição química desses materiais,a estrutura básica do cabelo e as formas como a acidez e aalcalinidade de xampus afetam essa estrutura.

xampu, sabões, detergentes, acidez e basicidade, pH

QUÍMICA

e

SOCIEDADE

André Borges BarbosaRoberto Ribeiro da Silva

QUÍMICA NOVA NA ESCOLA Xampus N° 2, NOVEMBRO 1995

Estamos tão habituados, hojeem dia, com os produtos delimpeza e higiene pessoal que

vêm sendo desenvolvidos com ocorrer dos anos, que sequer paramospara pensar no que acontece quandolavamos os cabelos com um xampuqualquer. Por que não usar um sabãocomum ou outro produto de limpezano lugar dessa coisa que se conven-cionou chamar xampu? E os condicio-nadores, para que servem? Paraentender mais sobre xampus e outrosdetergentes semelhantes é precisovoltar um pouco no tempo e acompa-nhar o desenvolvimento do primeiro dosprodutos de limpeza, o sabão comum.

Um pouco de históriaComo o preparo de vinho a partir

da fermentação de suco de uva, aprodução de sabão é uma das maisantigas reações químicas conhecidas.Não se conhece sua origem, mas éprovável que tenha sido descobertapor acidente quando, ao ferverem gor-dura animal contaminada com cinzas,nossos ancestrais perceberam umaespécie de ‘coalho’ branco flutuandosobre a mistura.

O historiador romano Plínio, o Ve-lho (23-79 d.C.), já descreve a fabri-cação do sabão duro e do mole, massomente a partir do século XIII estepassou a ser produzido em grandeescala. No princípio do século XIX ain-da se pensava que o sabão fosse uma

simples mistura mecânica de gordurae álcali, até que o químico francêsMichel-Eugène Chevreul (1786-1889)mostrou que sua formação era narealidade uma reação química.

Gregos e romanos chegaram a co-nhecer o sabão. Nas ruínas de Pom-péia, destruída aproximadamente em79 a.C. pela explosão do Vesúvio, ar-queólogos desenterraram uma fábricade sabão. Ao que tudo indica, osromanos não o empregavam para alimpeza: a maior parte era misturadacom aromatizantes para cabelos oucosméticos e adicionada aos emplas-tros usados em queimaduras e feri-

A reação de saponificação transforma um éster de um ácido graxo em um sal de umácido caboxílico e um álcool, conforme a seguinte equação química:

R-CO-OR’(s) + NaOH (aq) → R-CO-O-Na+ (aq) + R’-OH (l) éster base sal (sabão) álcool

No caso específico dos lipídeos constituintes de óleos e gorduras, a reação érepresentada pela seguinte equação química:

CH2-O-CO-R CH2-OH ❘ ❘

CH-O-CO-R (s) + 3 NaOH (aq) → CH-OH (l) + 3 RCOO– Na+ (aq) ❘ ❘

CH2-O-CO-R CH2-OH

glicerídeo base glicerol sal (sabão)

cadeia carbônica apolar (lipofílica) extremidade carregada(hidrofílica)

mentos. Só eventualmente se utilizavao sabão para limpeza, ao se lavar ocorpo de pessoas homenageadas.

Sabões, detergentessintéticos e xampus

Formados por ésteres, as gordurasanimais e os óleos vegetais sãoinsolúveis em água. Reagem comsoluções alcalinas, de hidróxido desódio ou potássio, produzindo sabão.Essa reação é um dos mais antigosprocessos orgânicos conhecidos eutilizados pelo homem, permitindo aconversão de gorduras animais eóleos vegetais em sabão. Por estarazão, ela é conhecida como ‘reaçãode saponificação’ (ver quadro abaixo).

Um sabão tem a fórmula geral R-CO-ONa, onde R é usualmente umacadeia carbônica contendo de 12 a 18átomos de carbono. A característicaestrutural mais importante de um sa-bão é que sua longa cadeia carbônicaapresenta uma extremidade carrega-da (que é atraída pela água) e a outranão se solubiliza na água. Por exem-plo, o estearato de sódio, visto abaixo.

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Quando um sabão é agitado comágua, forma-se um sistema coloidalcontendo agregados denominadosmicelas. Numa micela, as cadeias decarbono (lipofílicas) ficam voltadaspara o centro e as partes com carga(hidrofílicas) ficam em contato com aágua. Os íons positivos (Na+) ficam naágua (Fig. 1).

Figura 1: Representação esquemática de umamicela contendo óleo em seu interior.

Em geral, o sabão comum é um salde sódio. Esses sais são solúveis emágua (formando a micela). Ao con-trário, os sais de Ca2+, Mg2+ ou Fe3+

são insolúveis em água. Dessa forma,um sabão não pode ser utilizado comeficiência num meio que contenhaesses íons (água dura); uma vez quenesse caso os sais insolúveis precipi-tam e aderem ao tecido que estásendo lavado (ou à beira da pia, dotanque, da banheira etc.). A equaçãoquímica que descreve este fenômenoé a seguinte:

2C17H35-CO-O–Na+(aq) + Ca2+(aq) →

→ (C17H35-CO-O)2Ca(s) + 2Na+(aq)

Os problemas relacionados aouso dos sabões comuns em águadura (formação de sais insolúveis)levaram ao desenvolvimento de de-tergentes sintéticos. Como os sa-bões, os detergentes contêm umaparte orgânica com um grupo comcarga na extremidade da cadeia.Quando os detergentes têm cadeiascom carga positiva, são denomina-dos catiônicos; quando a carga énegativa, são aniônicos; quando nãotêm carga são não-iônicos, e quan-do possuem uma carga negativa eoutra positiva são chamados deter-gentes anfóteros. O Quadro 1 re-

presenta esquematicamente essaspossibilidades.

Um detergente é qualquer com-posto que pode ser utilizado comoagente de limpeza. Embora o sabãoseja um detergente, esse termogeralmente é usado para designar ossubstitutos sintéticos do sabão. Onome genérico para essa classe decompostos é ‘agentes tensoativos’.Assim, agente tensoativo é qualquercomposto que reduz a tensão super-ficial da água1, permitindo que óleose gorduras possam ser emulsionados.

Os detergentes sintéticos aniô-nicos mais comumente empregadosem limpeza no Brasil contêm alquil-benzeno-sulfonatos de sódio, de ca-deia linear:

No mercado, são encontradoscomo uma mistura de alquil-benze-nos sulfunatos, sendo que o com-ponente principal dessa mistura é ododecilbenzenossulfonato de sódioque no Brasil é estabelecido comopadrão de detergente aniônico bio-degradável.

Outros tipos de detergentes sinté-ticos aniônicos utilizam os sulfatos dealquila, como por exemplo o sulfatosódico de laurila:

CH3-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-CH2-O-SO2

– Na+

Os sulfonatos de alquilbenzeno ouos sulfatos de alquila são superioresaos sabões comuns na ação delimpeza, principalmente por nãoformar sais insolúveis com íons Ca2+,Mg2+ ou Fe3+, como acontece com ossabões comuns.

Os detergentes sintéticos catiô-nicos são usados como condicio-nadores capilares (creme rinse) etambém como amaciantes de roupas.Os íons carregados positivamenteaderem aos fios dos cabelos (e tam-

bém aos tecidos), formando uma ca-mada uniforme. Essa camada temuma forte atração pela água, deixandoos fios mais úmidos, reduzindo africção entre os fios e, conseqüente-mente, a eletrização estática. Porconseguinte, os cabelos ficam maismacios e fáceis de pentear.

Alguns detergentes sintéticos anfó-teros possuem a propriedade de nãoirritar os olhos, além de formarem umaquantidade moderada de espuma. Poresta razão, são usados nos xampuspara bebês.

Os xampus são materiais utilizadosna limpeza dos cabelos e contêm emsuas formulações um ou mais tipos dedetergentes sintéticos (além de outrassubstâncias, tais como perfumes,conservantes, espessantes etc) quetêm como função, como veremos aseguir, remover a gordura do cabelo.

Estrutura do cabelo

O poder limpante do xampu geral-mente refere-se a sua capacidadepara remover gordura, sujeira ematéria estranha do cabelo e do courocabeludo.

A gordura aparece no cabelo naforma de sebo, um material quecontém em sua composição, basi-camente, 50% de glicerídeos, 20%de cera, 10% de esqualeno, umhidrocarboneto de fórmula C30H50 e5% de ácidos graxos. O sebo exercealgumas funções importantes, comorevestir a cutícula (a camada maisexterna do cabelo), prevenindo aperda de água do interior do fiocapi lar — água que mantém ocabelo macio e brilhante. O revesti-mento também faz o cabelo parecerliso, além de prevenir o desenvol-vimento de bactérias. O sebo ésecretado pelas glândulas sebáceaslocalizadas no couro cabeludo e agenas cutículas por capilaridade no fiocapilar. O excesso e o acúmulo desebo podem dar ao cabelo uma

CH3(CH2)11OSO3-Na+

CH3(CH2)11N(CH3)3+ Cl-

CH3(CH2)11OCH2CH2OHCH3(CH2)11N(CH3)2

+CH2COO-

Quadro 1: Representação estrutural e esquemática de detergentes sintéticos

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Hoje aceitamos com naturalidade idéias como tomarbanho e lavar nossas rou-

pas com sabão. Historicamente,entretanto, esse é um costumerecente. Em toda a Idade Média,nem a aristocracia nem a classepobre tinha muita inclinação para obanho. A rainha Isabella (1451-1504) da Espanha orgulhava-se de ter tomado apenasdois banhos em toda asua vida: um quandonasceu e outro nodia de seu casa-mento. Já arainha Eliza-beth I (1558-1603) da Ingla-terra era uma entu-siasmada banhista.Precisasse ou não, to-mava um banho a cada trêsmeses.

Até meados do século XIX, obanho do corpo nu foi consideradopecado pela Igreja, tendo em vistaque esta era uma prática dospagãos gregos e romanos. Além dapressão religiosa, a falta de águaaquecida e de sabão tambémserviam de desencorajamento paraa prática do banho. Ainda nesteséculo, membros de certas ordensreligiosas continuavam a tomar ba-

nho com camisolas para evitar queseus corpos fossem despidos.

O ato de tomar banho com sa-bão e água aconteceu graças aoMovimento Sanitário iniciado emLondres como resposta à sujeiraonipresente — aos poucos reconhe-cida como uma das causas de cóle-

ra e de febre tifóide. Canais de es-gotos foram construídos, o lixo

foi transportado para longedos centros urbanos, be-

bedouros públicos fo-ram isolados de

locais contami-nados e aspessoas fo-ram encora-

jadas a tomarbanho e a lavar su-

as roupas. Em 1846, ogoverno britânico editou

uma lei que permitia a insta-lação de banheiros públicos e

lavanderias para a classe trabalha-dora de Londres. O movimento ex-pandiu-se pela Europa e logo seguiupara os Estados Unidos, e é por essareviravolta que o banho passou a serconsiderado uma prática saudávelpor milhões de pessoas.

Os colonizadores portuguesesrecém-chegados ao Brasil incorpo-raram o hábito de tomar banho imi-tando os índios brasileiros.

O banho, essa novidade

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Em condições ideais, a pele hu-mana tem uma camada naturalmenteácida, com pH entre3 e 5, enquanto opH do cabelo estáentre 4 e 5. A acidezdeve-se à produçãode ácidos graxospelas glândulas se-báceas. Assim, ouso de determina-dos tipos de xam-pus pode produzirno pH do cabelomudanças que pro-moverão alterações na estrutura capi-lar, como veremos a seguir.

Em soluções fortemente ácidas,em que o pH está entre 1 e 2, ambas

as ligações de hi-drogênio e iônicasão quebradas, de-vido à protonaçãodos grupos carboxi-la e carbonila nascadeias de proteí-nas (ver Fig. 2). Asligações dissulfeto,entretanto, conse-guem manter as ca-deias de proteínasjuntas no fio de ca-

belo. Em soluções levemente alcalinas(pH 8,5), algumas ligações dissulfeto

Até meados do século XIX, obanho do corpo nu foi

considerado pecado pelaigreja, pois era uma prática

dos pagãos gregos eromanos. Ainda neste século,

membros de certas ordensreligiosas continuavam a

tomar banho vestindocamisola

aparência gordurosa e, por ser ummaterial pegajoso, acumula poeirae materiais estranhos ao cabelo.

Cada fio de cabelo é constituídobasicamente de proteínas formadaspor cadeias longas e paralelas deaminoácidos ligados entre si. Há trêsmodos pelos quais elas podem co-nectar-se umas às outras: por liga-ções de hidrogênio, por ligaçõesiônicas entre grupos ácidos e bási-cos e por ligações dissulfeto. Essestrês tipos são chamados de ‘liga-ções laterais de cadeia’ e são res-ponsáveis pelas interações inter eintracapilar (Fig. 2).

Figura 2: Representação esquemática dasligações laterais de cadeias em proteínas emcabelos.

Ação dos xampus sobre ocabelo

Como um sabão — ou um deter-gente sintético — consegue removera sujeira dos cabelos?

A maior parte da sujeira do cabeloadere na camada de sebo. Se o sebopuder ser removido, as partículassólidas de sujeira também o serão. Aágua fria, por si só, não consegue dis-solver gotículas de sebo (lipofílicas);na presença da micela do sabão oudo detergente sintético, contudo, aparte central apolar captura as gotí-culas de óleo, formando uma emulsão,pois as mesmas são solúveis nocentro apolar (Fig. 1).

Os detergentes sintéticos e ossabões envolvem em sua fabricaçãouma base forte (hidróxido de sódio oude potássio), e isso faz com que suasformulações apresentem um pH (me-dida da acidez e basicidade de um ma-terial) acima de 7 (alcalino). Além disso,os sabões podem reagir com a água,fazendo com que também o meio setorne alcalino (veja quadro à pag. 6).

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lino, mas, pelo que vimos, o ideal éque ele seja levemente ácido.

Os materiais não destinados àhigiene pessoal não devem ser usadoscom essa finalidade. O uso constantedesses materiais pode causar proble-mas de alergia na pele e danificar oscabelos, face sua alta alcalinidade.Usuários envolvidos em serviços delimpeza devem ser periodicamenteesclarecidas sobre o uso e manuseiodesses materiais, recomendando-sesempre que possível o uso de luvas.

Infelizmente, grande parte dapopulação brasileira não tem acessoaos produtos adequados à higienepessoal (sabonetes, xampus e condi-cionadores). Cabe aos químicos con-tribuir para o desenvolvimento e a fa-

A grande maioria dos agentesde limpeza utiliza detergentesaniônicos, todos apresentando pHfortemente alcalino. A legislaçãobrasileira (Lovato, 1995) estabelece,por exemplo, os seguintes limitespara o pH: detergente em pódoméstico, máximo 11,5 em solu-ção 1,00 cg/g; detergente em póprofissional, máximo 12,5 em solu-ção 1,00 cg/g; detergente líquidopara uso em copa e cozinha, 5,5 a8,5 em solução 1,00 cg/g; deter-gente líquido para limpeza em geral,sem amônia, máximo 12,0 semdiluição e 11,0 para solução diluídaa 1,00 cg/g; alvejantes a base decompostos contendo cloro, 13,5

sem diluição e 11,5 para soluçãodiluída a 1,00 cg/g; detergenteslíquidos para lavar tecidos comuns,11,5 para solução diluída 1,00 cg/g; detergentes para lavar tecidosfinos, 10,0 para solução 1,00 cg/g.Já para os sabões em barra, o limitedo pH é 11,5 para soluções 1,00 cg/g. Por outro lado, para os amacian-tes de roupas e condicionadores decabelos (detergentes catiônicos), olimite mínimo para o pH é 3,0(ácido). Os sabonetes e os sabõeslíquidos destinados à higiene pes-soal têm seu pH, em geral, ajustadopara valores próximos a 7,0 (6,5 a7,5), de modo a evitar reaçõesalérgicas nas mãos e no corpo.

As regras, no Brasilsão quebradas. Conseqüentemente, acutícula apresenta um aspecto áspero.Essa aspereza deixa o cabelo semnivelamento, tornando-o opaco. Repe-tidas lavagens com xampus levementealcalinos prejudicarão o cabelo, poisquebrarão cada vez mais ligações dis-sulfeto, resultando em fios com mais deuma ponta. Em pH 12, uma soluçãofortemente alcalina, todos os três tiposde ligações são quebrados, ocasio-nando eventuais quedas de cabelos.

A maior parte dos xampus moder-nos, denominados xampus ácido-balanceados, contêm em suas formu-lações ingredientes ácidos cuja funçãoé manter o pH do cabelo lavadopróximo de seu pH natural. Este efeitoé obtido, por exemplo, adicionando-seà formulação do xampu o ácido cítrico,cuja função é neutralizar os efeitostemporários de xampus alcalinos1.

ConcluindoPelo que vimos, a finalidade de um

xampu é limpar os cabelos. Elesremovem o sebo, os componentes dosuor e a sujeira ambiental depositadano fio capilar. Entretanto, a remoçãode todo o sebo natural torna o cabeloopaco, áspero ao tato e sujeito à ele-tricidade estática, tornando-o difícil depentear. Tem se procurado compensaros efeitos negativos dos detergentescriando uma enorme variedade dexampus que, além de limpar, tambémembelezam os cabelos.

É preciso estar alerta, no entanto,para a quantidade enorme de propa-ganda envolvendo estes materiais. Ainclusão da nomenclatura oficial doscomponentes nos rótulos, obrigatóriapor lei, às vezes é usada para dar umaimagem de mais qualidade (ou status)ao xampu. Um exemplo é o anúnciodo xampu neutro e de suas possíveisvantagens. Um xampu neutro é de fatomelhor para os cabelos que um alca-

bricação de produtos adequados e depreço acessível.

Este é um bom tema para discus-são em nossas aulas de química e deciências.

Nota1. Para aumentar a superfície de um

líquido é necessário trazer mais moléculasdo interior do líquido para a superfície. Aenergia que deve ser fornecida ao líquidopara deslocar essas moléculas e, conse-qüentemente, aumentar a superfície do lí-quido, é chamada tensão superficial.

André Borges Barbosa é aluno do curso de ba-charelado em química da Universidade de Brasília.Roberto Ribeiro da Silva é doutor em químicaorgânica e professor adjunto do Departamento deQuímica da Universidade de Brasília.

Para saber mais

DRAELOS, Zoe Kececioglu. Cosméticos em dermatologia. Tradução porValquiria M. F. Settineri. Porto Alegre: Editora Artes Médicas, 1991. p. 76-87.

SHREVE, R. Norris & BRINK JÚNIOR, Joseph A. Indústria de processos químicos.Tradução por Horacio Macedo. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1980. p. 431-451.

SILVA, Roberto Ribeiro; BOCCHI, Nerilso & ROCHA-FILHO, Romeu Cardozo.Introdução à química experimental. São Paulo: McGraw-Hill, 1990. p. 222-231.

HART, Harold & SCHUETZ, Robert D. Química orgânica. Tradução por Regina S. V.Nascimento, João A.G. de Matos e Heloisa M. da C. Marques. Rio de Janeiro: EditoraCampus Ltda., 1983. p. 252-257.

BARBOSA, André Borges & SILVA, Roberto Ribeiro. Acidez e basicidade de xampus.Anais do III Seminário de Pesquisa da UnB. Brasilia: Univ. de Brasília. nov. 1993, p. 43.

LOVATO, Ambrósio José. Domissanitários em geral. Curitiba: Centro Federal deEducação Tecnológica do Paraná, 1995. 94p., Mimeo.

A inclusão danomenclatura oficial dos

componentes nosrótulos, obrigatória por

lei, às vezes é usadapara dar uma imagem de

mais qualidade (oustatus) ao xampu