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    DIREITOS HUMANOSCRIME DE DESACATO PODE SER CONSIDERADO ATPICO MESMO SEMMUDANA LEGISLATIVA

    05 de julho de 2014, 08:03h

    Por Eduardo Almendra Martins

    O Supremo Tribunal Federal j decidiu que a Conveno Interamerica de

    Direitos Humanos foi recepcionada com statusde supralegalidade o pacto

    foi incorporado ao ordenamento jurdico brasileiro pelo Decreto 678/1992 por

    todos os precedentes. Cite-se o RE 349.703, relatado pelo ministro Carlos

    Britto. Logo, passou-se a ter que se fazer referncia a esse tratado sempre que

    se quiser fazer um juzo de validade das normas jurdicas. Ou seja, a

    compatibilizao vertical entre normas possui mais um degrau, que a da

    suprelagalidade externada na CIDH.

    Muitos juristas ainda no utilizam as normas da CIDH como parmetro de

    aferio de validade das vrias normas que j existem e das que surgem

    continuamente, da porque no se v muita meno a to importante

    instrumento normativo por instncias monocrticas ou colegiadas. Acredita-se

    que a omisso se deve, ainda, pela rejeio do novo, ou mesmo pela

    dificuldade em acompanhar os julgamentos da Corte Interamericana de Direito

    Humanos, bem como pelas decises da Comisso Interamericana de DireitosHumanos.

    Mas no se pode olvidar que esse exerccio pendular de suma importncia,

    pois somente assim se poderia extrair a norma jurdica vlida a ser aplicada,

    isto [Quando] o juiz d uma interpretao lei conforme Constituio ou a

    reputa inconstitucional, ele cria uma norma jurdica para justificar a sua

    deciso[i]. H dentro desse raciocnio mais um parmetro a ser perpassado,

    na medida em que a CIDH deve ser utilizada para aferir a legitimidade da

    produo de normas jurdicas, logo tanto a lei (produto da atividade legislativado Estado) como a prpria produo do direito (produto da atividade do

    legislador e dos juzes) devem ter consonncia com a Constituio, assim

    como com o Direito Internacional dos Direitos Humanos[ii].

    No se olvide que, alm da compatibilidade da produo jurdica com a CIDH,

    h tambm a necessidade de os juzos monocrticos e colegiados de tribunais,

    excetuado o STF, observarem os precedentes advindos da CorteIDH, na

    medida em que h submisso da Repblica Federativa do Brasil aosprecedentes advindos dessa corte, segundo se observa do artigo 1, cabea,

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    do Decreto 4.463/2002, com a seguinte redao: reconhecida como

    obrigatria, de pleno direito e por prazo indeterminado, a competncia da Corte

    Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos

    interpretao ou aplicao da Conveno Americana de Direitos Humanos

    (Pacto de So Jos), de 22 de novembro de 1969, de acordo com art. 62 da

    citada Conveno, sob reserva de reciprocidade e para fatos posteriores a 10

    de dezembro de 1998. Podem ser extradas algumas concluses dessa

    submisso, devendo-se estabelecer, de antemo, a seguinte premissa: o

    Decreto 4.463/02 tambm possui eficcia supralegal na medida em que versa,

    tambm, sobre direitos humanos, tornando vinculante interpretaes da

    CorteIDH que versem sobre a CIDH.

    A primeira que as decises da CorteIDH possuem o mesmo efeito impositivodas decises do Superior Tribunal de Justia e do Supremo Tribunal Federal,

    na medida em que esses so tribunais de estabilizao das interpretaes das

    normas federais e constitucionais, respectivamente, logo a CorteIDH

    responsvel pela estabilizao das interpretaes da CIDH; da porque se dizer

    que usual o reconhecimento de maior fora impositiva ao entendimento

    consagrado nos tribunais, seja em virtude do grau de estabilidade que

    alcanou, seja ante a necessidade de promover a uniformizao das decises

    judiciais[iii].

    A segunda que os juzos monocrticos e colegiados podem afastar a

    aplicao de uma norma jurdica em virtude da inadequao supralegal dessa,

    afastando assim sua aplicao atravs de um juzo difuso de supralegalidade

    (ou convencionalidade), nesse sentido Gomes e Mazzuoli:

    (...) Devemos distinguir (doravante) com toda clareza o controle de

    constitucionalidade do controle de convencionalidade. No primeiro analisada

    a compatibilidade do texto legal com a Constituio. No segundo o que sevalore a compatibilidade do texto legal com os tratados internacionais de

    direitos humanos ratificados e em vigor no Pas. (...). Para realizar o controle de

    convencionalidade das leis, ostribunais locias no requerem qualquer

    autorizao internacional. Tal controle passa, doravante, a ter tambm carter

    difuso, a exemplo do controle difuso de constitucionalidade, em que qualquer

    juiz ou tribunal pode se manifestar a respeito[iv].

    Logo, as decises advindas da interpretao que a CorteIDH faz sobre asnormas da CIDH tm fora normativa na jurisdio brasileira, devendo ser

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    acatadas pelos juzos monocrticos e colegiados exclui-se o STF, na

    medida em que h um dilogo de complementariedade entre as cortes, onde

    uma influencia a outra em suas decises, no se podendo, a princpio e nessa

    sede, afirmar se h ou no uma prevalncia, e de quem.

    Diante dessa constatao, faz-se necessrio olhar como a CorteCIDH vem

    entendendo a compatibilidade das leis de desacato com o artigo 13 da CIDH

    que protege a liberdade de expresso, cuja redao a seguinte:

    Artigo 13 - Liberdade de pensamento e de expresso.

    1. Toda pessoa tem o direito liberdade de pensamento e de expresso. Esse

    direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informaes e idias de

    qualquer natureza, sem consideraes de fronteiras, verbalmente ou por

    escrito, ou em forma impressa ou artstica, ou por qualquer meio de sua

    escolha.

    2. O exerccio do direito previsto no inciso precedente no pode estar sujeito

    censura prvia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser

    expressamente previstas em lei e que se faam necessrias para assegurar:

    a) o respeito dos direitos e da reputao das demais pessoas;

    b) a proteo da segurana nacional, da ordem pblica, ou da sade ou da

    moral pblicas.[v]

    A CorteIDH e a ComissoIDH j se manifestaram contrrias as leis de

    desacato de vrios pases signatrios da CIDH, cite-se como exemplo os

    casos: a) Palamara Iribarne Vs. Chile; b) Tristn Donoso Vs. Panam. Em

    ambos os casos, a CorteIDH, em juzo de ponderao, considerou que a

    liberdade de expresso deve possuir a mxima eficcia possvel dentro do

    ordenamento jurdico, devendo-se privilegiar o controle que os indivduos

    devem exercer sobre o poder, ou seja, no se pode permitir um blindagem

    queles que servem ao povo, ou blindar a crtica ao funcionrio pblico, pormais dura que ela seja.

    Sublinhando-se que, para a ComissoIDH, as justificativas apresentadas pelos

    Estados de que suas leis que buscam a proteo da ordem pblica no

    encontram sustento na CIDH, pois a liberdade de expresso base em que se

    sustenta um Estado Democrtico de Direito[vi].

    Podem ser reunidos os seguintes argumentos utilizados pela ComissoIDHpara rechaar as leis de desacato:

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    No ttulo dedicado aos crimes contra a Administrao Pblica, cabe destacar a

    descriminalizao do desacato (transformado em injria qualificada)[xi].

    A injria qualificada prevista no artigo 144, pargrafo 1, passa a ter a previso

    de iniciativa concorrente, ou seja, pode ser processada atravs de iniciativa

    priva ou condicionada a representao, como j previsto no enunciado 714 de

    smula do Supremo Tribunal Federal.

    Fica ento o questionamento: por que esperar at a aprovao do novo Cdigo

    Penal para considerar o crime de desacato atpico, ou na linguagem

    internacional de direitos humanos, inconvencional por perda de validade? Por

    que no se alega a inconvencionalidade hic et nunc?

    No se pode esperar a mudana legislativa se o ordenamento jurdico da

    Repblica Federativa do Brasil permite a alegao de invalidade do crime de

    desacato diante da sua incompatibilidade com as normas de direitos humanos

    recepcionadas pela CRFB.

    Eduardo Almendra Martins, Mestre em Direito Constitucional pela Universidade

    de Fortaleza UNIFOR, especialista em Funo Social do Direito: processo,

    constituio e novos direitos, pela Universidade do Sul de Santa Catarina

    UNISUL, Defensor Pblico do Estado do Cear

    [i]

    DIDIER JR, Fredie, BRAGA, Paula Sarno e OLIVEIRA, Rafael Alexandre

    de.Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatrio,

    ao probatria, deciso, precedente, coisa julgada e antecipao de

    tutela.Vol. 02. 8 Ed. Salvador: Editora Juspodivm, p. 318, 2013.

    [ii]GOMES, Luiz Flvio e MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direito

    supraconstitucional: do absolutismo ao estado constitucional e

    humanista de direito. Coleo direito e cincias criminais, vol. 05. So Paulo:

    Editora revista dos Tribunais, p.102, 2010.

    [iii]MELLO, Patrcia Perrone Campos. Precedentes O desenvolvimento

    judicial do direito no constitucionalismo contemporneo. So Paulo:

    Renovar. p 65, 2008.

    [iv]Ob.Cit.p. 117.

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    [v]Decreto 678 de 06 de novembro de 1992. Disponvel em: . Acessado em 10 de

    fevereiro de 2014.

    [vi]MARCO JURIDICO INTERAMERICANO SOBRE EL DERECHO A LA

    LIBERTAD DE EXPRESIN. Relatoria Especial para la Libertad de Expresin

    Comisin Interamericana de Derechos Humanos. OEA documentos oficiales. p.

    50, 2010.

    [vii]Ob.Cit. p. 50.

    [viii]Ob.Cit. p. 50.

    [ix]Ob. Cit. p. 50

    [x]Aprovado na comisso especial novo projeto do Cdigo Penal.

    Disponvel em: . Acessado em 30 de janeiro

    de 14.

    [xi]PARECER N , DE 2013 Da COMISSO TEMPORRIA DE ESTUDO DA

    REFORMA DO CDIGO PENAL, sobre o Projeto de Lei do Senado n 236,

    de 2012, que reforma o Cdigo Penal Brasileiro, e proposies anexadas .

    Disponvel em: < http://www12.senado.gov.br/noticias/Arquivos/2013/12/leia-a-

    integra-do-relatorio-final-sobre-a-reforma-do-codigo-penal>. Acessado em 30

    de janeiro de 2014.

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