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1 Efeitos da certificação UTZ para os cafeicultores do Brasil Fevereiro, 2015

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Efeitos da certificação

UTZ para os cafeicultores

do Brasil

Fevereiro, 2015

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Créditos:

Equipe de avaliação e autores:

Equipe responsável pela pesquisa:

Consórcio BSD Consulting e Ibi Êté

Consultoria Ltda. - Alice do Valle, Beat

Grüninger, Carolina Schiesari, Eduardo

Bluhm e João Mattos.

Apoio e orientação:

Equipe de monitoramento e avaliação

UTZ na Holanda - Henk Gilhuis

Representante da UTZ no Brasil -

Eduardo Sampaio

Coordenador da equipe de apoio da

UTZ no Brasil - Lucas Negri

Contato:

BSD Consulting

Rua José Maria Lisboa, 860, 7°andar

01423-001 São Paulo-SP

Brasil

Tel./Fax: +55 (11) 3051-4600

www.bsdconsulting.com

[email protected]

São Paulo, Fevereiro 2015

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Índice

1. Sumario Executivo ........................................................................................... 6

2. Introdução ..................................................................................................... 10

3. Metodologia .................................................................................................. 11

4. Sobre a UTZ ..................................................................................................... 15

5. Avaliação dos efeitos da certificação UTZ: Resultados ......................... 17

5.1 Tipologia do produtor UTZ ..................................................................... 17

5.2 Melhores métodos de produção e melhor acesso a mercados ... 21

5.3 Melhores condições de trabalho ........................................................ 29

5.4 Maior cuidado com a natureza .......................................................... 40

5.5 Maior cuidado e preocupação com a próxima geração ............. 44

5.6 Outras considerações dos produtores ............................................... 46

6. Conclusões ..................................................................................................... 50

7. Referências .................................................................................................... 55

8. Anexos ............................................................................................................ 56

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Quadro de Figuras

Figura 1: Apresentação das regiões de produção consideradas na pesquisa no campo

Figura 2: Workshop de validação com stakeholders no dia 18 de Novembro de 2014 em

Poços de Caldas

Figura 3: Teoria da Mudança UTZ (tradução livre)

Quadro de Tabelas

Tabela 1: Quantidade de CHs ativos no Brasil em 2014

Tabela 2: Quantidade de CHs por região no Brasil

Tabela 3: Panorama geral do café certificado UTZ no mundo

Tabela 4: Número total de Trabalhadores nas fazendas de café certificadas UTZ no Brasil

Tabela 5: Consolidação das confirmações e do grau do atendimento do efeito de

acordo com a Teoria da Mudança, na percepção dos autores e dos stakeholders.

Quadro de Gráficos

Gráfico 1: Função dos entrevistados nas propriedades

Gráfico 2: Classificação dos pesquisados por tamanho da fazenda

Gráfico 3: Classificação dos pesquisados por tipo de certificação

Gráfico 4: Classificação dos pesquisados por Estado

Gráfico 5: Outros tipos de certificações

Gráfico 6: Classificação dos pesquisado por idade

Gráfico 7: Tempo de certificação das fazendas analisadas

Gráfico 8: Percepção dos produtores sobre se ter a certificação UTZ vale a pena

Gráfico 9: Satisfação dos produtores entrevistados com a certificação UTZ

Gráfico 10: % de produtores que recomendam a certificação UTZ

Gráfico 11: Percepção dos produtores sobre melhorias ambientais

Gráfico 12: Percepção dos produtores sobre os custos da fazenda

Gráfico 13: Percepção dos produtores sobre a lucratividade da fazenda

Gráfico 14: Percepção dos produtores sobre maior custo da certificação UTZ

Gráfico 15: Percepção dos produtores sobre qualidade do café

Gráfico 16: Percepção dos produtores se a certificação UTZ contribuiu para maior a

estabilidade nas vendas

Gráfico 17: Percepção dos produtores se a UTZ possibilitou a diversificação de canais de

venda

Gráfico 18: Percepção dos produtores sobre relacionamento de longo prazo

Gráfico 19: Percepção dos produtores se a situação financeira da fazenda melhorou

devido a certificação UTZ

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Gráfico 20: Tipos de treinamentos realizados pelos trabalhadores

Gráfico 21: Percepção dos produtores se a certificação contribuiu para regularizar a

situação trabalhista dos trabalhadores

Gráfico 22: Satisfação dos Trabalhadores com as condições de trabalho

Gráfico 23: % dos Trabalhadores que sofreram acidentes no último ano

Gráfico 24: Percepção dos trabalhadores sobre aumento de acidentes de trabalho nos

últimos 2 anos

Gráfico 25: Percepção dos produtores se condições de saúde e segurança melhoraram

Gráfico 26: Percepção dos trabalhadores se a certificação trouxe benefícios

Gráfico 27: Percepção dos produtores sobre beneficiados pela certificação UTZ

Gráfico 28: Percepção dos produtores sobre melhorias das condições ambientais

Gráfico 29: Percepção dos produtores sobre melhorias na biodiversidade devido a

certificação UTZ

Gráfico 30: Percepção dos produtores sobre melhorias em relação a agrotóxicos

Gráfico 31: Percepção dos trabalhadores sobre incentivo a educação

Gráfico 32: Principais motivos para aderir a certificação UTZ

Gráfico 33: Principais benefícios que a certificação UTZ trouxe para fazenda

Gráfico 34: % de produtores que pretendem continuar com a certificação UTZ

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1. Sumario Executivo

Esse estudo fornece pela primeira vez uma avaliação da certificação UTZ na visão

dos produtores e outras partes interessadas (stakeholders) no Brasil. O programa

da certificação UTZ no Brasil foi lançado em 2002. Ao longo dos anos, o número

de produtores certificados cresceu significativamente, principalmente pela

adesão de médios e grandes produtores de café nas principais regiões

produtoras de café dos estados de Minas Gerais, São Paulo e Espírito Santo. A

maioria dos produtores adotou a certificação como parte da estratégia do

negócio para se diferenciar na qualidade do café, melhorar o acesso ao

mercado de exportação e obter um melhor preço. Os cafeicultores do Brasil

constituem um contingente importante para certificação UTZ, já que o volume

global de compra de café certificado UTZ gira em torno de 4 milhões de sacos

no ano, e o Brasil representa de 35 a 40% deste volume.

A certificação UTZ no Brasil até o momento foi adotada em sua maioria por

médios (20-100 ha) e grandes produtores (maior que 100 ha). Juntos eles

representam mais de 98% dos “Certificate Holders (CHs)” (Detentores da

Certificação UTZ) no Brasil. Os pequenos produtores (menor que 20 ha) estão

pouco representados, porém existem esforços de incluir esse grupo em maior

número na certificação por meio de projetos e parecerias com empresas e

órgãos do governo.

Essa pesquisa foi realizada entre os meses de Abril e Novembro de 2014 e incluiu

uma pesquisa eletrônica e entrevistas com produtores e stakeholders nas quatro

principais regiões de produção UTZ: Sul e Oeste de Minas Gerais, Cerrado, Zona

da Mata (também localizados no Estado de Minas Gerais) e Alta Mogiana no

Estado de São Paulo. A pesquisa envolveu 89 dos 203 produtores atualmente

registrados e ativos o que afere a esse estudo uma representatividade

significativa para respostas obtidas.

A abordagem da pesquisa foi guiada pela Teoria da Mudança UTZ (Theory of

Change - ToC) e a avaliação teve como foco identificar as percepções dos

produtores e trabalhadores em relação a certificação e os efeitos que ela causa,

além de identificar se a certificação UTZ alcançou seus principais objetivos, que

são:

1. Melhorar os métodos de produção;

2. Aumentar as receitas dos produtores e trabalhadores;

3. Ter um meio ambiente melhor e mais preservado;

4. Garantir melhores condições de vida para os produtores e

trabalhadores.

De maneira geral, podemos afirmar que a certificação - na percepção dos

principais usuários - tem gerado efeitos positivos nos quatro eixos acima citados,

porém com intensidade diferente. Enquanto no eixo 1 (Melhores métodos de

produção) a certificação deixou um rastro positivo em todos os casos que

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avaliamos, os efeitos percebidos nos eixos 2 até 4 são influenciados também pelo

contexto dos cafeicultores no Brasil e por fatores inerentes ao mercado mundial

de café. Os desafios de cumprir a legislação trabalhista e ambiental no Brasil

aumentaram devido a maior fiscalização nos últimos anos. Ao mesmo tempo, as

flutuações do preço mercado impactaram os resultados econômicos da

cafeicultura brasileira de uma maneira que o preço do café no mercado e o

câmbio tiveram evidentemente uma influência bem maior do que os prêmios

recebidos pelos produtores UTZ.

A pesquisa confirmou que o prêmio 1 é um tema que ainda preocupa os

produtores, que desejam ter maior transparência sobre sua aplicação. Porém, a

maioria dos produtores afirma ter obtido ganhos na fazenda através de uma

aplicação mais eficiente de recursos e com a maior organização que a

certificação trouxe para suas empresas. A maioria dos produtores constatou que,

devido às auditorias externas, a pressão de manter processos de gestão e

documentos atualizados proporcionou mais eficácia e menos vulnerabilidade

para eventuais passivos trabalhistas ou ambientais.

O uso melhor dos insumos e o tratamento adequado dos resíduos tiveram efeitos

positivos na redução de custos e passivos, e além disto ajudaram a equilibrar as

condições ambientais na fazenda. Interessantemente, os produtores alegaram

que a UTZ poderia aumentar o impacto ambiental, com maiores exigências e

orientações em termos de conservação do meio ambiente. Mas mesmo assim,

em muitos casos foi a certificação UTZ que ajudou os produtores a estabelecer

em tempo hábil as Áreas de Proteção Ambiental (APPs) exigidas pela legislação

ambiental brasileira.

Um dos pontos fortes citados tanto pelos produtores como pelos atores do

mercado é o sistema de rastreabilidade da UTZ. Embora foi constatado que a

certificação não foca na qualidade de café em si, é a rastreabilidade que, na

visão dos entrevistados, favorece o aumento da qualidade do produto, já que a

rastreabilidade mostra aonde está sendo produzido o melhor café, sendo possível

identificar e gerenciar os tratos no terreiro, processamento e embarque

diferenciados. Portanto, a rastreabilidade dentro da fazenda vem a criar as

condições para um gerenciamento diferenciado (por exemplo por talhões e

lotes) da produção e do processamento do café, o que repercute

favoravelmente nos custos, nas qualidades e nos preços dos cafés (plural!)

produzidos por uma mesma fazenda.

Para analisar o eixo 4 (Garantir melhores condições de vida para os produtores e

trabalhadores), entrevistas com um total de 57 trabalhadores também foram

realizadas durante as visitas nas fazendas. As respostas obtidas deixam claro que

as condições de saúde e segurança, através de fornecimento de treinamentos e

equipamentos de proteção, melhoraram nas fazendas certificadas de tal forma

que, de acordo com as entrevistas com stakeholders externos e produtores, elas

se diferenciam em muitos casos de outras fazendas não certificadas nos locais

1 Chamamos de “prêmio” o adicional de preço que é pago no mercado por café UTZ. Não se trata de um prêmio fixo, mas um aumento variável.

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pesquisados, que ainda sofrem de passivos trabalhistas e constantes fiscalizações

pelos agentes governamentais.

O registro correto dos trabalhadores com as funções de trabalho devidas evita

riscos de multas e aumenta a satisfação e lealdade dos trabalhadores. Embora

a satisfação dos trabalhadores com as condições de trabalho seja alta, não foi

constatado que os ganhos econômicos maiores das fazendas obtidos em vendas

no mercado UTZ resultaram em aumentos na folha de pagamento dos

trabalhadores. Economicamente, trabalhadores que moram nas fazendas tem

benefícios adicionais como habitação e energia fornecida, e assim uma situação

econômica melhor do que trabalhadores assalariados que moram nas cidades e

tem que arcar com custos de aluguel e de serviços básicos.

É claro que num ambiente como o Brasil, onde temos distâncias e diferenças

regionais, tanto os assuntos ambientais como sociais também precisam ser

abordados em níveis regionais, pois cada região tem características distintas: Em

regiões mais planas como Alta Mogiana e Cerrado, a mecanização é muito

maior do que em regiões mais montanhosas e consequentemente tanto fatores

ambientais como trabalhistas mostram diferenças.

De maneira geral, os produtores demonstraram satisfação tanto com o

atendimento pela UTZ como com os efeitos da certificação. Eles pretendem

mantê-la nos próximos anos, já que eles consideram a relação de custo e

benefício como favorável. Em relação ao mercado, eles desejam maior

visibilidade do selo perante o consumidor, principalmente no Brasil, onde o selo

não é reconhecido, e vários produtores que tem produtos no mercado local

poderiam se beneficiar localmente de uma maior divulgação da certificação no

Brasil.

Um outro desafio da certificação é a inclusão de pequenos produtores, que são

a grande maioria dos produtores de café no Brasil atualmente, já que a

certificação UTZ até o momento tem sido adotada principalmente por médias e

grandes fazendas. Iniciativas de inclusão que envolvem parceiros terceiros já

estão sendo realizadas, e devem ser ampliados nos próximos anos.

O relatório aponta também alguns pontos de melhoria que poderão ser

implementados para atender expectativas dos produtores e melhorar a eficácia

da certificação. Em primeiro lugar, é recomendado apresentar de maneira mais

clara e transparente como o prêmio está sendo aplicado na cadeia de valor.

Identificamos neste aspecto, como um importante fator, que os intermediários,

como cooperativas e empresas exportadoras (“Traders”) façam um esforço de

melhorar a apresentação para os produtores de quais são os efetivos ganhos

com o café certificado.

Em relação ao monitoramento do impacto e das melhorias nas fazendas, seria

interessante implementar a partir do ano zero da certificação uma série de

indicadores de gestão que permitem ao produtor acompanhar o progresso e

criar planos de melhorias mais direcionados. Além disso, seminários regionais com

produtores e calibragem dos parâmetros aplicados pelos consultores e auditores

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são importantes medidas que poderiam alavancar os efeitos da certificação UTZ

no futuro.

Outro ponto que foi endereçado pelos próprios produtores é um

aprofundamento nas orientações de gestão e proteção ambiental, que se daria

com um detalhamento maior dos critérios ambientais, que até hoje ajudou os

produtores a cumprir a complexa legislação ambiental brasileira.

Um desafio existe ainda na inclusão dos trabalhadores na distribuição de maiores

ganhos, pois por enquanto não registramos um diferencial salarial nas fazendas

pesquisadas. Seria de grande utilidade se a UTZ participasse em pesquisas que

hoje estão sendo feitas por diferentes certificações sociais (como por exemplo a

Social Accountability International e a Fair Labor Association) que tentam definir

níveis de salários dignos2 no âmbito rural.

2 Traduzimos assim os “Living Wages”, que são centro de várias pesquisas no ambiente rural e urbano.

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2. Introdução

A UTZ Certified é um programa e um standard de sustentabilidade com base na

Holanda que visa uma produção agrícola sustentável e busca melhores

oportunidades paras os produtores, trabalhadores, suas famílias e meio ambiente.

Atualmente o standard UTZ é aplicado por produtores de café, cacau e chá em

mais de 20 países produtores. Mundialmente, 10% do café exportado é

certificado UTZ.

Essa pesquisa foi encomendada pela UTZ com o intuito de conhecer como os

produtores brasileiros certificados avaliam os efeitos da certificação. O Brasil é o

maior exportador de café com cerca de 45 milhões de sacos por ano e também

o maior produtor de café certificado UTZ, com cerca de 35% do volume mundial

total exportado com o selo UTZ. O programa da UTZ já existe a mais de 14 anos

nos principais polos produtores do Brasil.

Essa pesquisa também tem a pretensão de mapear, entender e interpretar os

efeitos da certificação no contexto dos agricultores e no contexto externo

setorial, que inclui questões que irão além do âmbito de decisão do produtor.

Uma questão que foi identificada de antemão em entrevistas com stakeholders

foi por exemplo o fato que uma parcela de produtores saiu do sistema ou não se

interessou de entrar devido a percepção de ausência de ganhos financeiros

sobre o preço da saca de café.

Além disso, a pesquisa tem como objetivo fazer recomendações para UTZ,

visando aumentar a sua eficácia e relevância no Brasil para os membros atuais e

futuros, e de apontar eventuais benefícios e custos para que a UTZ possa afinar e

atualizar a sua Teoria da Mudança e Código UTZ, que foram usados como base

metodológica da pesquisa.

Esse relatório apresenta os resultados quantitativos e qualitativos da pesquisa em

forma de gráficos e comentários coletados nas entrevistas. Adicionalmente, a

inclusão de depoimentos de stakeholders ajuda a detalhar a percepção dos

diferentes aspectos pesquisados.

O texto também reflete a análise dos autores, pois certas constatações

ganharam peso pela frequência com as quais foram encontradas nas entrevistas

e nas respostas da pesquisa eletrônica.

O trabalho foi realizado pelo consórcio das empresas BSD Consulting e Ibi Eté

Consultoria entre os meses Abril e Novembro de 2014. Os resultados foram

avaliados em um workshop de validação com stakeholders, no dia 18 de

Novembro de 2014, em Poços de Caldas - MG, e as considerações dos

participantes foram contempladas na edição desse relatório.

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3. Metodologia

A avaliação foi solicitada por uma necessidade de comprovar o grau de eficácia

da certificação e aprimorar o programa de certificação UTZ no Brasil. Dessa

forma, o estudo teve o objetivo de coletar dados quantitativos e qualitativos a

fim de descrever os resultados e efeitos da certificação nas três áreas de impacto:

social, ambiental e econômica, para três grupos: produtores/proprietários,

trabalhadores assalariados e comunidade. O foco da avaliação de efeitos da

certificação UTZ foram os médios e grandes produtores de café com

propriedades entre 50 ha a 1000 ha, pois estes, de acordo com escritório da UTZ

local no Brasil, representam mais de 80% das áreas certificadas UTZ no Brasil.

A avaliação foi guiada com um foco maior em dados qualitativos, seguindo o

critério “fit for purpose” (adequado à sua finalidade), pois o levantamento

qualitativo tem provado ser um método mais útil para os objetivos propostos (ao

invés do quantitativo). A abordagem foi guiada pela Teoria da Mudança da UTZ

(“ToC”) e ajudou a verificar se a UTZ alcançou seus principais objetivos, que são:

Ter melhores métodos de produção;

Aumentar as receitas dos produtores e trabalhadores;

Ter um meio ambiente melhor e mais preservado;

Garantir melhores condições de vida para os produtores e

trabalhadores;

A equipe de avaliação atuou de forma independente, por tanto este trabalho

representa a voz, a opinião qualificada e a avaliação da equipe.

No entanto esta metodologia possui algumas limitações, como a ausência de

linha de base, levando em consideração somente a percepção subjetiva de

produtores, trabalhadores e pessoas do setor. Porém, para mitigar os impactos

dessas desvantagens foi realizada uma análise triangular das informações,

verificando dados de produtores com dados de trabalhadores e com pessoas do

setor, afim de se chegar na conclusão mais adequada sobre a questão avaliada.

Além disso, para esse estudo não foram realizadas entrevistas com trabalhadores

temporários, e dessa forma as informações identificadas relacionadas a esse

grupo foram com base nas entrevistas com os outros grupos já mencionados.

A certificação em grupo no Brasil tem sido utilizada por produtores pequenos,

médios e grandes. Esta categoria de „certificate holders“ portanto, não

representa um determinado tipo de produtor.

A pesquisa foi dividida em quatro etapas:

1. E-survey com todos Certificate Holders (CHs)

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Como primeiro passo, realizamos uma pesquisa online por meio de

questionário padrão com produtores de café detentores da certificação

UTZ em todo Brasil. Esse questionário foi lançado para todos os 203 CHs3

registrados e ajudou a levantar dados estatisticamente relevantes. Além

disso, a análise dos questionários foi um dos critérios aplicados na seleção

das fazendas visitadas na pesquisa de campo. Outros critérios de seleção

foram o histórico de engajamento dos CH´s com o programa da UTZ (a

partir da avaliação da equipe local da UTZ), as características e a região

das fazendas. Ao todo, 66 CHs responderam a pesquisa online (nível de

respostas de 32,8%).

2. Pesquisa de campo: Entrevistas qualitativas e pesquisas com

trabalhadores

De acordo com os dados fornecidos pela UTZ Brasil, hoje existem 203

Certificate Holders no Brasil e 576 fazendas. Desses, 169 CHs estão no

Estado de Minas Gerais, 27 em São Paulo, 5 na Bahia, 1 no Paraná e 1 no

Espírito Santo (dados referentes a junho de 2014).

Tabela 1: Quantidade de CHs ativos no Brasil em 2014

Dessa forma a pesquisa de campo se concentrou nos estados de Minas

Gerais e São Paulo, já que a população dos Certificate Holders em outros

estados é mínima. Juntos estes dois estados representam 97% dos CHs.

A definição da região considerou as seguintes questões:

Quantidade de produtores na região contemplada.

Quantidade de produtores com diferente tempo de adesão a

certificação para conseguir captar a percepção tanto de produtores

que estão há mais tempo na certificação, como de outros mais novos

no programa. Dessa forma foi possível captar as motivações para a

entrada no programa UTZ, assim como as diferenças entre os

3 Certificate holders (CHs) são os donos de uma fazenda ou as pessoas respectivamente empresas que lideram uma certificação multi-site ou em grupo.

Certificate Holders Ativos (junho 2014)

# CHs #

Fazendas # Amostra

% da Amostra em relação ao total

Individual 108 108 64 59% dos CHs

Grupo 4 56 6 11% das fazendas

Multi site 91 412 19 21% dos CHs

Total 203 576 89 44% dos CHs

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resultados alcançados com a certificação que fornece elementos de

progresso contínuo.

Os tipos de certificações UTZ aplicáveis no Brasil são: individual; grupo;

e multi-site. Os Certificate Holders das regiões selecionadas detinham

os três tipos de certificação.

As regiões definidas para realizar a pesquisa de campo foram: Alta

Mogiana-SP, Sul de Minas-MG, Oeste de Minas-MG, Zona da Mata-MG e

Cerrado-MG e as seguintes práticas foram utilizadas na pesquisa de

campo:

36 entrevistas individuais com gerentes de fazendas ou

produtores. Essas entrevistas foram guiadas por meio de um

questionário padrão para cada categoria e teve como base

indicadores da ToC.

57 entrevistas individuais com trabalhadores das fazendas. Os

questionários para as entrevistas individuais foram elaboradas

com base na ToC e com base no capítulo 10 do Código de

Conduta UTZ (o questionário para os trabalhadores foi diferente

aos utilizados com os produtores).

Figura 1:

Apresentação das

regiões de produção

consideradas na

pesquisa de campo

A tabela abaixo demonstra a participação de produtores na pesquisa por

região. Uma tabela completa da amostra se encontra no Anexo I da

pesquisa:

Tabela 2: Quantidade de CHs por região no Brasil

Alta Mogiana

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Localização dos CHs # CH´s # Entrevistas com CHs realizadas por região

MG 169 67

SP 27 20

BA 5 1

PR 1 1

ES 1 0

Total 203 89

3. Consulta com outros stakeholders

Foram realizadas 17 entrevistas por telefone com outros atores do setor de

café no Brasil para identificar percepções externas sobre os produtores e

sobre o mercado de café na região, essas entrevistas também auxiliaram

na validação dos dados coletados com os produtores.

Os stakeholders entrevistados representaram as seguintes categorias:

Entidades do Governo ligados ao setor rural e do Café;

Representantes dos sindicatos de trabalhadores rurais;

Compradores e exportadores;

Torrefadores e baristas;

Representantes de Universidades;

Auditores e consultores de café;

Representantes da Cadeia de Custódia;

Representantes da indústria;

Especialistas do mercado.

As entrevistas tiveram um roteiro estruturado e adequado para cada

grupo de stakeholder. A lista completa dos entrevistados se encontra no

Anexo II.

4. Validação com stakeholders

Após a realização das entrevistas, os dados foram consolidados

juntamente com as respostas da pesquisa online e com as percepções

coletadas nas entrevistas com stakeholders externos. Essa etapa

aumentou a resposta qualitativa da pesquisa online de 66 para 89

respostas (13 entrevistados já tinham respondidos a pesquisa online antes).

Esse primeiro cruzamento de dados foi levado para uma validação e

discussão por meio de um painel com stakeholders identificados ao longo

do processo. O encontro aconteceu no dia 18 de Novembro em Poços de

Caldas com duração de 6 horas e teve o objetivo de apresentar os

principais resultados e destaques obtidos na pesquisa e fechar possíveis

pontos que não foram identificados no processo.

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Figura 2: Workshop de validação com stakeholders no dia 18 de Novembro de

2014 em Poços de Caldas.

4. Sobre a UTZ

A certificação UTZ está presente em mais de 20 países, com foco principalmente

na América Latina, África e Ásia. Os produtos que fazem parte do programa de

certificação UTZ são café, cacau e chá, mas o produto com maior volume

certificado hoje é o café. De acordo com o Relatório Anual de 2013 da UTZ o

volume total de café certificado UTZ era de 726.591 toneladas, e entre os 21

países produtores do café certificado, o Brasil era o maior produtor,

representando 31% desse volume.

Tabela 3: Panorama geral do café certificado UTZ no mundo

Volume de Café Certificado UTZ 2009 2010 476.903 2012 2013

Volume de café verde certificado UTZ (ton)

365.972 394.003 476.903 715.648 726.591

Volume de café verde certificado UTZ (sacas de 60 kg)

6.099.525 6.566.717 7.948.377 11.927.467 12.109.850

Média do prêmio pago (U$ cent/peso libra)

4,97 4,91 4,14 4,29 3,5

Número de países produtores 21 21 22 23 21

O programa UTZ está baseado na Teoria da Mudança UTZ. O modelo abaixo é

uma visualização gráfica simplificada da teoria da mudança UTZ. Ele representa

o elo entre as estratégias e o impacto desejado do programa UTZ, de acordo

com a missão.

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Para garantir que a teoria da mudança aconteça, o produtor recebe o Código

de Conduta da UTZ, no qual estão descritos todo os requisitos que o produtor

precisa seguir. Esses requisitos incluem Boas Práticas de Agricultura e Manejo da

Produção, Saúde e Segurança e Melhores Condições de Trabalho, Abolição ao

Trabalho Infantil e Proteção ao Meio Ambiente.

Para garantir que os requisitos sejam seguidos, os produtores e as fazendas são

monitorados anualmente por auditores independentes. A certificação UTZ

garante também a rastreabilidade do produto, das prateleiras até a produção

no campo. Todas as comercializações são registrados em um portal online da

própria UTZ.

O centro do modelo é o agricultor que representa uma agricultura sustentável,

evidenciando o objetivo do programa. O programa requer melhores métodos de

produção agrícolas; melhores condições de trabalho; maior preocupação e

cuidado com a natureza; e maior cuidado e preocupação com a próxima

geração. A partir desses critérios a certificação UTZ vai contribuir para melhores

cultivos, maiores receitas, meio ambiente melhor e condições de vida melhor.

Figura 3: Teoria da Mudança UTZ (tradução livre)

MELHORES

MÉTODOS DE

PRODUÇÃO

MELHORES

CONDIÇÕES DE

TRABALHO

MAIOR

PREOCUPAÇÃO E

CUIDADO COM A

NATUREZA

MAIOR CUIDADO E

PREOCUPAÇÃO COM

A PRÓXIMA

MELHORES CULTIVOS

MAIORES RECEITAS

MEIO AMBIENTE MELHOR

CONDIÇÕES DE VIDA

MELHOR

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5. Avaliação dos efeitos da certificação UTZ: Resultados

Ao todo foram coletadas informações de 89 pessoas que representaram os

detentores de certificação da UTZ, dessas pessoas 36 foram entrevistadas

presencialmente ou por telefone. Como hoje no Brasil existem 203 Detentores da

Certificação UTZ, pode-se dizer então que o número de pessoas consultadas

representa 44% dos CHs. Os detentores da certificação são considerados os

produtores de café, e as características gerais destes estão descritas abaixo, e

em seguida serão apresentados os resultados dos efeitos da certificação UTZ para

os produtores e trabalhadores de café envolvidos nessa avaliação.

5.1 Tipologia do produtor UTZ

A gestão da certificação UTZ fica a cargo de diferentes agentes da fazenda de

café, mas na maioria dos casos, o proprietário é a pessoa responsável pela

certificação.

Gráfico 1: Função dos entrevistados nas propriedades

O perfil dos produtores de café certificados UTZ no Brasil mostra que na sua

maioria são grandes produtores. O número de pequenos produtores ainda não é

muito significativo no programa da UTZ, estes estão presentes somente no modelo

de certificação em grupos atualmente.

Gráfico 2: Classificação dos pesquisados por tamanho da fazenda

41,6%

22,5%

11,2%

24,7%

Proprietário da fazenda

Gerente contratado da fazenda

Responsável contratado para gerenciar acertificação Utz

Outro (especifique)

1,2% 5,8%

93,0%

Pequeno produtor (0 - 50ha)

Médio produtor (51 - 100ha)

Grande produtor (maior que 100ha)

Page 18: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

18

A maioria dos consultados segue o modelo da certificação individual,

representando 72% do total, e a grande parte destes são localizados no Estado

de Minas Gerais com representatividade de 75%, seguido por São Paulo com

22,5%. Os outros estados, Espirito Santo, Paraná e Goiás, não são significativos no

programa de certificação UTZ, representando juntos somente 2,2% desta

pesquisa. No entanto, apesar de a maior representatividade ser de CHs

individuais, as características e efeitos da certificação não variam com o tipo da

certificação. Ou seja, o perfil e os efeitos identificados para os CHs individuais são

bastante similares aos efeitos identificados para os CHs multilocais e de grupo.

Gráfico 3: Classificação dos pesquisados por tipo de certificação

Gráfico 4: Classificação dos pesquisados por Estado

Mais de 90% dos CHs entrevistados possuem outras certificações além da

certificação UTZ. As certificações que mais apareceram são:

4C, considerada pelos entrevistados como de fácil obtenção;

Certifica Minas, que recentemente fechou uma parceria com UTZ e serve

como uma porta de entrada para o programa da UTZ4;

Rainforest Alliance por ser uma certificação bastante reconhecida pelos

produtores e compradores no mercado de café; e

4 A parceria é recente e o número da Certifica Minas poderá aumentar ainda mais, já que seu custo é praticamente nulo para os produtores já certificados UTZ.

6,7%

71,9%

21,3%Certificação de Grupo

Certificação individual

Certificação Multilocal (multi-site)

1,1%

75,3%

22,5%

1,1%

Bahia (BA)Minas Gerais (MG)São Paulo (SP)Espirito Santo (ES)Paraná (PR)Goiás (GO)

Page 19: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

19

Outras certificações também identificadas foram de empresas como AAA

(Nespresso) e Nucoffee5 (Syngenta);

Ou de outros esquemas de certificação internacionais, nacionais ou

regionais como: Caccer (Café do Cerrado), Alta Mogiana e Fairtrade.

Gráfico 5: Outros tipos de certificações

A grande maioria dos produtores são homens, correspondendo a 78,7%,

enquanto as mulheres representam apenas 21,3%. A maioria tem mais de 51 anos,

mas a classificação por idade é bem diversificada, se destacando que não foram

identificados jovens proprietários ou gerentes até 20 anos nas fazendas. Mais de

50% dos entrevistados estão com a certificação UTZ há mais de cinco anos, o que

mostra que a UTZ já está bastante consolidada no mercado brasileiro.

Gráfico 6: Classificação dos pesquisado por idade

Gráfico 7: Tempo de certificação das fazendas analisadas

5 Nucoffee é um modelo de troca de insumos com características próprias criado a partir da parceria entre a UTZ e Syngenta, conhecida como caminhos sustentia.

4C CertificaMinasCafé

Rainforest Outras(quais)

Fairtrade Nãopossui

Orgânico

42,7% 42,7%37,1%

24,7%

7,9% 6,7%0,0%

% dos entrevistados que possuem outra certificação

0,0%

19,1%

27,0%

24,7%

29,2%

Ate 20 anos

21 a 30 anos

31 a 40 anos

41 a 50 anos

Mais de 51 anos

Page 20: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

20

De forma geral a certificação UTZ é muito bem vista pelos produtores e partes

interessadas externas, mais de 90% dos produtores entrevistados estão satisfeitos

com a certificação UTZ e acreditam que a adesão ao programa valeu a pena,

além de recomendarem a certificação para outros produtores.

Gráfico 8: Percepção dos produtores sobre se ter a certificação UTZ vale a pena

Gráfico 9: Satisfação dos produtores entrevistados com a certificação UTZ

Gráfico 10: % de produtores que recomendam a certificação UTZ

2,2%4,5%

12,4%

18,0%

11,2%

51,7%

Menos que 1 ano

1 ano

2 anos

3 anos

4 anos

5 anos ou mais

92,6%

7,4% 0,0%

Sim

Não

Não sei

31,5%

61,8%

6,7%

Muito Satisfeito

Satisfeito

Insatisfeito

Muito Insatisfeito

Page 21: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

21

Conforme mencionado anteriormente, todos os resultados e características dos

CHs identificados não se diferenciam com base no tipo da certificação, ou seja

todas as respostas acima apresentadas e as que serão exibidas abaixo,

demonstram a opinião dos 3 tipos de produtores certificados UTZ no Brasil.

A seguir serão apresentados os resultados da avaliação dos efeitos da

certificação UTZ. Esses resultados serão exibidos com base na Teoria da Mudança

UTZ. Portanto, o capítulo será dividido em quatro categorias: Melhores métodos

de produção agrícolas; melhores condições de trabalho; maior preocupação e

cuidado com a natureza; e maior cuidado e preocupação com a próxima

geração.

Ordenamos os resultados por objetivo final da Teoria de Mudança, e em cada

capitulo agregamos citações de produtores e stakeholders para ilustrar melhor o

teor das respostas quantitativas obtidas. Na seguinte seção sobre os métodos de

produção, incluímos a análise de geração de maior valor no mercado, pois esses

aspectos estão intimamente ligados entre si. O formato original completo da

Teoria da Mudança UTZ está no Anexo III.

5.2 Melhores métodos de produção e melhor acesso a mercados

A Teoria da Mudança foca em grande parte em melhorias dos métodos de

produção agrícolas, que tem efeitos em diferentes níveis: No nível da gestão e

produtividade da fazenda, gerando um potencial de maior desempenho

econômico, mas também no nível ambiental que será o foco de outra seção

desse relatório (5.3).

Ficou claro que neste aspecto, a certificação UTZ teve sua maior contribuição.

Existe um consenso que a certificação proporcionou melhor organização da

produção e menores custos. Os produtores gostariam que essas melhorias

também tivessem uma repercussão maior no preço pago pelo mercado. Isto

ficou claro logo no início das análises. Porém, o efeito em termos de preço e

vendas não correspondeu à expectativa dos produtores.

93,2%

6,8%

Sim Não

Page 22: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

22

A categoria de “Melhores métodos de produção agrícolas” visa mostrar os

benefícios da certificação UTZ para a produção agrícola das fazendas, e para

isso ela está subdividida em cinco itens de análise:

Solo saudável;

Maior produtividade;

Maior eficiência da fazenda/da produção;

Qualidade para atender a demanda de mercado; e

Acesso a serviços e recursos.

Apresentamos em seguido os resultados por subdivisão. Para a questão do solo

saudável, agregamos diferentes dados com referência a práticas ambientais que

resultam em maior saúde dos solos.

Solos saudáveis

48,9% dos produtores afirmam ter adotado medidas para preservação do solo

para se qualificar para a certificação. Entendemos pelas entrevistas que esse

porcentual representa produtores que ainda não usavam práticas de

conservação anteriormente a certificação. O número total de produtores que

usa práticas de conservação de solo é bem maior do que essa porcentagem. A

conservação do solo é apenas uma dentre várias práticas que contribuem para

melhores condições ambientais e para um de produção mais sustentável.

O Gráfico 11 demonstra quais as práticas mais frequentes nas fazendas

certificadas. Em primeiro lugar encontramos práticas que contribuem para

melhores condições ambientais e resultam em economias de custo pelo uso mais

eficiente de recursos.

Gráfico 11: Percepção dos produtores sobre melhorias ambientais

71,6%

68,2%

62,5%

53,4%

48,9%

46,6%

39,8%

37,5%

18,2%

8,0%

1,1%

Disposição correta de resíduos

Uso consciente de fertilizantes inorgânicos

Eficiência no uso de recursos (Água e energia)

Conservação de biodiversidade

Adoção de práticas de preservação de solo

Melhoria na qualidade da Água

Melhor uso de fertilizantes orgânicos

Melhor manejo da terra

Adoção de técnicas de compostagem

Outros (Quais)

Nenhum

Quais são os principais fatores da certificação UTZ que contribuíram para as melhorias ambientais na fazenda?

Page 23: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

23

Maior produtividade e maior eficiência da produção

Mais de 60% dos produtores entrevistados afirmaram também que a certificação

contribuiu para redução de custos e assim, resultou em ganhos econômicos.

Porém, temos 14,8% dos produtores que consideram que a certificação

aumentou o custo para de produção na fazenda.

Gráfico 12: Percepção dos produtores sobre os custos da fazenda

A redução de custos contribuiu em pelo menos 48,9% dos casos analisados para

melhor lucratividade6. Isso deve ser considerado um resultado positivo, pois os

últimos cinco anos (desde a crise financeira) trouxeram um cenário complexo

para as vendas de café brasileiro, que sofreu com a baixa avaliação no mercado

e recentes perdas por causa da seca neste ano.

Gráfico 13: Percepção dos produtores sobre a lucratividade da fazenda

Os produtores explicaram nas visitas que o custo da certificação não é o maior

peso na balança, mas que principalmente os investimentos na fazenda para

cumprir com todas as exigências ambientais e trabalhistas foram os que mais

influenciaram no custo financeiro.

Esse custo afeta normalmente o caixa dos produtores mais no início do processo

e os custos são amortizados ao longo do tempo, já que um produtor com tudo

6 Seria interessante de criar indicadores para que os produtores monitorem esse efeito desde a implantação da certificação UTZ.

19,3%

40,9%

25,0%

14,8% A certificação ajudou bastante a baixar oscustosA certificação ajudou um pouco a baixar oscustosA certificação não fez diferença nos custos

Ao contrario, a certificação causou aumentodos custos de produção

48,9%

18,2%

18,2%

13,6%

1,1%

A fazenda/propriedade gerou lucro e acertificação UTZ contribuiuA fazenda/propriedade gerou lucro, mas acertificação UTZ não contribuiuA fazenda/propriedade não gerou lucro nemperdaA fazenda/propriedade sofreu perdas, apesar dacertificação UTZA fazenda/propriedade sofreu perdas, por causada certificação UTZ

Page 24: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

24

regularizado sofre menos risco de obter multas ou passivos devido a processos

trabalhistas, que podem causar custos muito altos.

Já o custo de manutenção das melhorias é considerado menos impactante do

que o custo da própria auditora e dos investimentos iniciais.

Gráfico 14: Percepção dos produtores sobre maior custo da certificação UTZ

Comentários dos Stakeholders:

A vida do produtor melhorou com a certificação, pois ele passa a ter melhor

organização, controle e gestão da fazenda. Os funcionários também sentem

melhorias, pois estão amparados pela legislação. (Auditor)

O principal benefício, de longe para os produtores, é a melhoria da gestão da

propriedade, que impacta na redução de custo na fazenda e num maior

controle das produções. (Consultor)

É possível identificar melhorias devido à certificação, principalmente na parte

da organização da empresa, na melhora visual (higiene e limpeza) e

documental. (Especialista)

Qualidade para atender o mercado

Embora uma maioria dos produtores alega que a qualidade do café não tem

uma relação direta com a certificação UTZ, uma parte dos produtores (43,2%)

considerou o maior cuidado com os lotes devido ao processo de rastreabilidade,

fator que permite separar o café de maior qualidade de lotes de menor

qualidade e tirar lotes com problemas fora da circulação. Essa maior consciência

e cuidado com a qualidade repercute positivamente no preço.

Além disso, exigências do código da UTZ, tais como a análise de risco, o controle

de umidade dos grãos e treinamentos para evitar fungos durante o processo de

pós-colheita influenciou positivamente em uma maior qualidade do produto

final. O que também ficou claro para muitos produtores e stakeholders externos

foi o fato que uma fazenda mais organizada e um terreiro mais limpo diminuem

os riscos de alguma impureza ou contaminação, o que afeta a qualidade dos

22,7%

50,0%

17,0%

10,2% Custo do certificado e auditorias

Custo de implementação da certificação (mudança deprocessos, contratação de funcionários, treinamentos,elaboração de documentos)

Custos de manutenção da certificação

Outros (especifique)

Page 25: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

25

grãos. Outro fator que influencia a qualidade do café é o treinamento dos

funcionários que são melhor preparados para o tratamento e processamento do

café.

Comentário produtor:

Algumas ações da certificação tem impacto na qualidade do café, tais como

as ações de higiene e segurança alimentar do café para o controle da

umidade e evitar mofo. No entanto, a qualidade tem ligação também com

fatores ambientais externos, como as questões climáticas.

Gráfico 15: Percepção dos produtores sobre qualidade do café

A melhor organização e limpeza das fazendas foi uma característica citado por

diferentes stakeholders externos. A introdução de processos de gestão não foi

somente uma consequência das auditorias, mas também fruto do engajamento

de uma rede de consultores que apoiam os produtores das cinco regiões e com

os quais a UTZ mantém um relacionamento estreito. Consultores externos foram

em muitos casos contratados pelos produtores para dar apoio a eles para

elaborar todo processo de gestão, já que não tinham conhecimento necessário

para realizar o processo.

O fato de contratar consultores foi visto por alguns produtores como um peso

financeiro que surge como uma necessidade após as auditorias. Foi alegado em

alguns casos que a UTZ somente passa o check-list sem maiores orientações e por

isso alguns produtores sentiram a necessidade de contratar consultores. Esse

custo é alto principalmente para pequenos produtores e diminui a maior inclusão

desse grupo por enquanto.

Apesar de demonstrar um efeito claramente visível na gestão das fazendas, o

impacto que os produtores esperavam obter no mercado não correspondeu

sempre às expectativas.

Agregação de valor no mercado

O item de efeitos na comercialização foi uma das questões mais comentadas

pelos produtores. Essa questão considera os assuntos relacionados ao mercado,

43,2%

34,1%

14,8%

8,0% Hoje o meu café tem maior qualidade, devidoprincipalmente a certificação Utz

Hoje o meu café tem maior qualidade, mas isso tempouca relação com a certificação Utz

Hoje o meu café tem maior qualidade, mas isso não temnenhuma relação com a certificação Utz

Hoje meu café não tem maior qualidade do que antes

Page 26: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

26

preço e prêmio, que são importantes para os produtores. Os principais resultados

da pesquisa para essa questão são resumidos nos próximos parágrafos.

A questão de acesso ao mercado e vendas inclui o tema do prêmio UTZ, que se

destacou como assunto mais controverso ao longo da pesquisa. Os produtores

se queixaram de não ter uma visão clara do prêmio7 e muitas interpretações

divergentes surgiram sobre o valor efetivo pago para o café, mostrando que o

prêmio hoje é parte de um processo de negociação onde os intermediários

(cooperativas e empresas de exportação) tem ainda uma influência maior do

que os próprios produtores.

Na opinião de mais de 60% dos produtores entrevistados, a certificação UTZ

contribuiu para uma maior estabilidade nas vendas do café. Essa porcentagem

é um pouco maior quando os produtores afirmam se a UTZ ajudou a diversificar

os canais das vendas. Mas vale destacar que uma parte significativa dos

produtores ainda não viu nenhum efeito neste sentido ou até contradiz,

afirmando que a UTZ não tinha contribuído para melhoria dos canais de vendas.

Esse fato reflete uma situação que merece atenção: O controle e a influência do

produtor UTZ sobre a cadeia de valor e sobre as decisões de venda do café ainda

é baixo. Existe ainda uma situação de dependência de intermediários, como

traders ou as cooperativas, exceto no caso de algumas empresas grandes que

exportam o café diretamente, sem apoio de armazéns ou cooperativas.

Gráfico 16: Percepção dos produtores se a certificação UTZ contribuiu para maior

a estabilidade nas vendas

Gráfico 17: Percepção dos produtores se a UTZ possibilitou a diversificação de

canais de venda

7 Em alguns casos, os participantes reconheceram o valor do prêmio como sendo R$ 3,00-5,00 por saca, mais acharam o valor muito baixo.

12,5%

47,7%

21,6%

11,4%

6,8%

Concordo fortemente

Concordo

Não concorde nem discordo

Discordo

Discordo fortemente

Page 27: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

27

Vale destacar que no quesito da lealdade dos compradores, não teve objeções

da parte dos entrevistados. 62,5% acreditam que a certificação trouxe

relacionamentos de longo prazo, e nas entrevistas os produtores deixaram claro

que na visão deles, a demanda de produtos certificados em sustentabilidade

cresce a cada ano, embora não seja decisivo se a certificação seja UTZ ou uma

das outras reconhecidas pelo mercado.

Gráfico 18: Percepção dos produtores sobre relacionamento de longo prazo

Outro ponto identificado foi em relação à situação financeira da fazenda. Pode-

se perceber que essa questão não é um consenso entre os CHs, pois 47,7% dos

produtores (soma dos que concordam fortemente e concordam) acreditam que

a certificação contribuiu de alguma forma na melhoria da situação financeira

da fazenda, mas 28,4% não concorda e nem discorda, e 23,8% não concorda

com a afirmação de que a certificação UTZ contribuiu para melhorar a situação

financeira das fazendas.

Nas visitas de campo foi possível aprofundar essa questão, e a conclusão a qual

se pode chegar é que a certificação UTZ contribuiu para controlar em alguns

casos os custos de produção, e isso colaborou para a melhoria da situação

financeira das fazendas (como foi constatado acima nessa seção). No entanto

10,2%

55,7%

10,2%

13,6%

10,2%Concordo fortemente

Concordo

Não concorde nem discordo

Discordo

Discordo fortemente

42,0%

20,5%

14,8%

22,7%

A certificação UTZ contribuiu fortemente para promover orelacionamento de longo prazo, pois a maioria dos meuscompradores estão comigo ha um tempo significativo

A certificação UTZ contribuiu parcialmente para promover orelacionamento de longo prazo, pois alguns doscompradores não estão mais comigo

A certificação UTZ não contribuiu para promover orelacionamento de longo prazo, pois a maioria doscompradores não estão comigo ha um tempo significativo

Nenhuma das opções apresentadas refletem a minharealidade

Page 28: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

28

não se pode dizer que a certificação UTZ aumentou as receitas das fazendas de

café de forma generalizada.

Gráfico 19: Percepção dos produtores se a situação financeira da fazenda

melhorou devido à certificação UTZ

Um dos principais pontos identificados que mostram a divergência de opiniões

apresentada acima, está relacionado à questão do prêmio. Este foi o assunto

mais polémico e apontado na grande maioria das entrevistas como principal

desafio para UTZ.

Em relação ao prêmio recebido com a venda do café certificado UTZ, para uma

grande parte não foi possível identificar qual é a quantia do prêmio, pois muitos

produtores não conseguem identificar esse valor, apesar de alguns produtores

terem lembrado um valor de R$ 3,00 por saca, enquanto outros falaram de R$

4,00 ou 5,00.

Muitos produtores apontaram que a negociação com intermediários

(cooperativas, corretoras e empresas exportadoras), ainda não é muito clara e

transparente. De acordo com os produtores, quando se fecha o valor da compra

com a cooperativa, corretora ou exportadora, fecha-se o valor final da compra

e não é apresentada a distinção do que é valor do prêmio e o que é valor pago

pelo café. No entanto, para aqueles que vendem diretamente para o

comprador, esse valor é perceptível e fácil de identificar.

Depoimentos de produtores em relação ao prêmio:

Não ficamos sabendo. A exportadora comercializa e nós não temos acesso a

esses dados.

O prêmio existe e é fácil de saber por que a venda é direta por meio de uma

empresa que faz parte do grupo da fazenda.

No começo não percebia o ágio, mas hoje tem. No entanto não sei qual é o valor

exato, não é muito claro na negociação.

Não sei ao certo, mas o prêmio é baixo. Quando vendemos pela cooperativa não

sabemos qual foi o valor agregado pela UTZ.

6,8%

40,9%

28,4%

13,6%

10,2%Concordo fortemente

Concordo

Não concorde nem discordo

Discordo

Discordo fortemente

Page 29: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

29

Não consegui identificar em 2013, o mercado estava muito abaixo. Em 2014, o

prêmio foi de 4 a 5 reais por sacas.

Vendemos o café todo como UTZ, com certeza a certificação UTZ nos ajudou a

abrir portas no mercado, mas não conseguimos prêmio, pois o preço do café

estava muito abaixo da média.

O valor de R$ 3,00 de prêmio não faz tanta diferença não, mesmo quando é um

pouco maior nas compras futuras. O que ganhamos com os prêmios não cobre

nem um programa implementado para os trabalhadores.

Hoje, o custo da certificação não garante um diferencial muito grande, pois estão

pagando pouco (ágio) pelo tanto que se exige.

Depoimento do representante da UTZ Certified em relação ao prêmio:

“Na teoria de mudança da UTZ o CH negocia o prêmio com o primeiro comprador.

Grande parte do comércio e exportação de volumes UTZ ocorre, dentro do que

chamamos de vendas a termo e futuras, aonde é dada a oportunidade de cobrir os

custos de produção para um dado produtor ou exportador, mas as questões do

hedging do câmbio e do diferencial de Nova York são complexas e logicamente

melhor dominadas pelos traders. Está é uma das razões que explicam que até mesmo

médios e grandes produtores não entendam estes mecanismos e julguem com pouca

transparência o repasse dos prêmios. Muitas vezes, a oportunidade de um bom preço

no mercado a termo é melhor que o prêmio em si, mas isto não é valorizado pelo

produtor.

A função principal da UTZ é gerar demanda por produtos sustentáveis além de

impactos da implementação da certificação em si. Entrar em certificação somente

pela ótica do prêmio é um dos maiores erros que tenho visto nos últimos 10 anos. Por

outro lado, conhecer seus custos de produção e exercer a venda baseado neles e

cobrir com margem de segurança estes custos, sem especular, além de sempre ser

chamado para mercado futuro, são os fatores mais importantes.

Nosso desafio aqui é de continuar a beneficiar o produtor pelos impactos e nos

tornarmos cada vez mais um código de gerenciamento e agronômico com melhores

práticas, além de reconhecer as entidades que trabalham com isto há algum tempo.”

5.3 Melhores condições de trabalho

A categoria “Melhores condições de trabalho” da Teoria de Mudança engloba

as questões:

Funcionários mais qualificados e motivados;

Direitos dos trabalhadores8

8 Inclui cumprimento legal nos contratos de trabalho, pagamento de horas extras, liberdade de associação e negociação coletiva assim como cumprimento com os salários mínimos legais e cobertos pelos acordos coletivos com os sindicatos de trabalhadores

Page 30: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

30

Qualidade de vida decente.

Nas fazendas certificadas UTZ no Brasil, até junho de 2014, existiam 25.480

trabalhadores, sendo 10.413 permanentes, 11.051 temporários e 4.016 morando

nas fazendas.

Tabela 4: Número total de Trabalhadores nas fazendas de café certificadas UTZ

no Brasil

Trabalhadores # Trabalhadores

Trabalhadores permanentes 10.413

Trabalhadores temporários (sazonais) 11.051

Trabalhadores on site 4.016

Total 25.480

Para a avaliação dos efeitos da certificação UTZ foram entrevistos 57

trabalhadores permanentes. O número de trabalhadores entrevistados não é

muito expressivo se comparado com o valor total de trabalhadores, no entanto

a opinião dos entrevistados foi bastante similar em todas as regiões, sendo

possível identificar conclusões e efeitos da certificação para os trabalhadores.

Funcionários mais qualificados e motivados

Em relação a funcionários mais qualificados e motivados, 100% dos trabalhadores

mencionaram que sua capacidade técnica para realizar suas atividades

melhorou devido aos treinamentos. Ficou evidenciado também que a

certificação UTZ estimulou bastante a realização de treinamentos: Em 2013, 100%

dos trabalhadores realizaram os treinamento obrigatórios da UTZ, como

aplicação de defensivos, manuseio de equipamentos perigoso e primeiro

socorros.

Além disso, grande parte dos trabalhadores também realizaram outros tipos de

treinamentos como trabalho em espaço confinado, trabalho em altura, uso de

caldeiras, uso de ferramentas, entre outros. A maioria desses treinamentos são

realizados em parceria com o SENAR, entidade do governo bastante próxima e

acessível aos produtores e trabalhadores.

Page 31: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

31

Gráfico 20: Tipos de treinamentos realizados pelos trabalhadores

Direitos dos trabalhadores

Na a questão remuneração, os principais resultados encontrados apontaram que

a certificação UTZ não trouxe aumento direto de salários para os trabalhadores

das fazendas de café, tanto trabalhadores fixos como safristas. De acordo com

as entrevistas de campo, a maior parte dos trabalhadores temporários recebe

somente o salário mínimo como previstos para um trabalhador rural da região

local, e essa questão não se alterou nos últimos anos.

No entanto pode-se dizer que de forma indireta a certificação UTZ trouxe

aumentos nos salários dos trabalhadores devido às adequações salariais

conforme a lei, como por exemplo pagamento correto de horas extras e por tipos

de trabalho rural.

Qualidade de vida

Para a análise do tema qualidade de vida decente foram considerados três

aspectos:

- Regularização trabalhista através de emissão de carteira de trabalho9;

- Condições de saúde e segurança do trabalho10; e

- Benefícios da certificação UTZ.

9 Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS): documento que registra as atividades do cidadão enquanto trabalhador. É obrigatória a todos os trabalhadores, seja em atividades ligadas ao comércio, indústria, agricultura, pecuária ou de natureza doméstica. A Carteira de Trabalho garante ao cidadão os principais direitos trabalhistas. A CTPS pode ser solicitada por pessoas com idade a partir de 14 anos, considerando que a contratação de menores dos 14 aos 16 anos deve pertencer à categoria de aprendiz. 10 Condições de saúde e segurança do trabalho: A segurança do trabalho pode ser entendida como os conjuntos de medidas que são adotadas visando minimizar os acidentes de trabalho, doenças ocupacionais, bem como proteger a integridade e a capacidade de trabalho do trabalhador. No Brasil, a Legislação de Segurança do Trabalho compõe-se de Normas Regulamentadoras, leis complementares, como portarias e decretos e também as convenções Internacionais da Organização Internacional do Trabalho, ratificadas pelo Brasil.

Aplicação dedefensivos para

todos osaplicadores

Manuseio deequipamentos

perigosos(trator,

motosserra, etc)

Primeirossocorros

Outros Conscientizaçãosobre período de

carências paratodos os

funcionários

Nenhum

100% 100% 100%

46% 46%

0,0%

Tipos de treinamentos nos últimos 12 meses

Page 32: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

32

Essa questão foi mais focada nos trabalhadores das fazendas, pois para os

produtores, como são na maioria grandes produtores, essa questão já está bem

resolvida sendo a maioria donos de grandes propriedades com padrão de vida

avançado.

Portanto, para ampliar a visão do estudo, foram entrevistados também 57

trabalhadores fixos das fazendas. A maioria dos trabalhadores são homens,

representando 96,5% dos trabalhadores entrevistados, e todos entrevistados

mencionaram que conhecem a certificação UTZ.

Regularização trabalhista

O primeiro ponto de análise da questão “Qualidade de vida decente” é a

regularização trabalhista. Essa questão é bastante checada pelas autoridades

do governo, muitas fazendas são conferidas pelo Ministério Público do Trabalho

(MPT)11 em relação a norma NR3112. Essa norma aborda a questão de saúde e

segurança no trabalho rural. Para muitos, a regulamentação é bastante exigente

e é considerada umas das mais rigorosas do mundo.

Em primeiro lugar, constatamos que as auditorias ajudaram a regularizar as

relações de trabalho com os trabalhadores. Isso resultou no fato que 100% dos

trabalhadores entrevistados disseram que possuem carteira de trabalho

assinada.

Essa questão ficou bastante clara também para os produtores. Todos assinam a

carteira de trabalho de todos os funcionários, tanto dos fixos quanto dos safristas.

Essa regularização é exigida pela certificação UTZ, mas como é uma lei no Brasil

bastante fiscalizada pelo Ministério Público do Trabalho, alguns produtores

certificados UTZ destacaram que já estavam em conformidade com esse quesito

antes de aderir a certificação (gráfico 21).

Podemos dizer que a certificação “obrigou” as empresas a formalizarem as

relações trabalhistas assim como cumprir com as exigências de convenções

coletivas que antes não eram respeitadas. Com as constantes qualificações e

treinamentos realizados, certas funções e empregados da empresa se tornaram

imprescindíveis e com isso as empresas tiveram de adequar as condições salariais

11 Ministério Público do Trabalho (MPT): O Ministério Público do Trabalho, um dos ramos do Ministério Público da União, é uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do estado. O Ministério Público do Trabalho atua como árbitro e mediador em conflitos trabalhistas coletivos, que envolvem trabalhadores e empresas ou entidades sindicais que os representam. Também atua, por exemplo, no combate ao trabalho escravo e infantil, e na fiscalização do trabalho de adolescentes e índios. 12 A Norma Regulatório (NR) 31 é uma norma de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura: Estabelece os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades da agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura com a segurança e saúde e meio ambiente do trabalho.

Page 33: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

33

de acordo com a lei e tipo de trabalho e benefícios, afim de manter esta mão

de obra qualificada.

Na pesquisa de campo foi possível entender a opinião dos entrevistados sobre

esse assunto. Foi possível identificar que, apesar de 100% dos trabalhadores já

possuírem carteira de trabalho assinada antes da certificação, a UTZ ajudou as

fazendas em algumas questões, principalmente na organização e controle da

gestão trabalhista. Muitos produtores mencionaram que já seguiam a legislação

trabalhista, mas com a certificação UTZ, a documentação ficou mais atualizada

e organizada, ajudando no controle e registro de horas extras, dissídios e horas

“in itinere” (de trajeto). Além disso, foi mencionado que a certificação UTZ auxiliou

na divulgação de procedimentos do trabalho, ou seja, como o trabalho deve ser

executado com segurança, e ajudou no alinhamento necessário das questões

trabalhistas, como direitos dos trabalhadores em relação a salário, férias e

benefícios.

A divergência de opinião no gráfico abaixo ocorreu, porque a grande maioria

percebeu os benefícios mencionados acima quando aderiram à certificação

UTZ, no entanto para as fazendas maiores e mais estruturadas, essas questões

trabalhistas já estavam bem consolidadas antes de aderir à certificação.

Gráfico 21: Percepção dos produtores se a certificação contribuiu para

regularizar a situação trabalhista dos trabalhadores

No entanto, um ponto importante mencionado por muitos produtores e

stakeholders externos foi que no Brasil, apesar da lei ser bastante rígida, ainda

existem muitos problemas associados às questões trabalhistas no meio rural. Eles

confirmaram que muitas fazendas não certificadas não estão em conformidade

com a lei e são bastante autuadas pelo Ministério Público do Trabalho,

principalmente por não assinarem carteira de trabalho, ocorrendo com

frequência na época de safra.

Para os trabalhadores, a falta de um registro do trabalho na carteira, implica na

perda de uma série de benefícios como acesso a serviços de saúde públicos,

perda da contribuição ao seguro social e perda de diferentes diretos como

seguro-desemprego, fundo de garantia, férias e o pagamento de horas extras

pelo devido valor.

19,1%

38,2%13,5%

15,7%

13,5%Concordo fortemente

Concordo

Não concorde nem discordo

Discordo

Discordo fortemente

Page 34: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

34

Em relação a multas de ações trabalhistas, muitos produtores mencionaram que

nunca foram multados ou se foram, foi uma vez ou outra devido a uma questão

pequena relacionada à norma NR3113. Mas muitos entrevistados mencionaram

que sua credibilidade aumentou na região, principalmente em relação à

atuação das equipes do MPT, que hoje quase não visitam mais as fazendas

certificadas, pois sabem que a certificação exige que elas sigam a lei.

A percepção dos entrevistados em relação a ações trabalhistas14 é similar. Muitas

fazendas nunca tiveram ações trabalhistas, mas as que tiveram mencionaram

que a certificação UTZ auxilia no controle dessas ações e ainda contribuiu um

pouco na redução delas, principalmente em relação à horas “in itinere”, hora de

almoço e hora extra com os safristas, já que com a certificação estas questões

ficaram organizadas e controladas.

Comentários de stakeholders:

Em fazendas certificadas a situação trabalhista e adequação a NR31 estão

melhores e mais adequadas. Mas ainda existem questões que precisam ser

melhoradas em relação a NR31. De qualquer forma percebe-se uma diferença

em relação às condições trabalhistas entre as fazendas certificadas e as não

certificadas da região. (Consultor)

A situação trabalhista dos trabalhadores rurais, em fazendas que não são

certificadas, ainda não está de acordo com a lei, principalmente para os

safristas. As principais questões que não estão de acordo é assinatura de

carteira de trabalho (para os safristas) e uso de EPI. (Sindicato)

O trabalho infantil não existe mais na produção de café, o principal problema

mesmo é o registro de safristas na carteira de trabalho, mas isso ocorre nas

fazendas não certificadas. (Sindicato)

Não é possível afirmar que a certificação adequou as fazendas em relação às

leis trabalhistas, pois os produtores, quando entraram para a certificação, já

estavam adequados, mas é possível afirmar que a certificação ajuda a manter

a fazenda de acordo com a lei. (Auditor)

É possível perceber que em algumas regiões, fora da certificação UTZ há ainda

bastante fazendas que estão fora da lei trabalhista, com funcionários sem

carteira e sem uso de EPI15. (Consultor)

Com a certificação UTZ, os produtores conseguem demonstrar conformidade

para fiscais do trabalho. (Especialista)

13 Veja nota 8 sobre a NR31. Além da NR31 se aplica também a Consolidação das leis trabalhistas (CLT – veja nota 16) e a lei 5.889 sobre o trabalho rural. 14 Ação trabalhista: O processo trabalhista está relacionado com o incumprimento de alguma norma estabelecida pela legislação trabalhista. Algumas das normas estabelecidas pelo Código Civil são aplicadas no âmbito do trabalho, e quando alguma dessas normas é quebrada, pode ser instaurada uma ação trabalhista. 15 EPI: Equipamento de Proteção Individual.

Page 35: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

35

Do lado dos funcionários também existe uma maior conscientização, deixando

mais claro para eles quais as questões obrigatórias pela lei e quais os benefícios

aos quais eles tem direito.

Apesar de algumas vezes ocorrerem ações trabalhistas, 100% dos trabalhadores

entrevistados disseram que não existem necessidades para tratativa de questões

de direitos trabalhistas16 nas fazendas certificadas neste momento.

Comentários de stakeholders:

A certificação pode sim diminuir essas ações, pois a certificação é uma

garantia que a fazenda está seguindo a lei, então previne que questões como

essas ocorram. (Entidade do governo)

Após a certificação percebi uma diferença na forma que somos abordados

pelo MPT, além de receber bem menos visitas, pois o MPT sabe que na fazenda

está tudo em ordem. (Produtor)

Quando veem que a fazenda é certificada, tem-se a impressão de que ela está

fazendo tudo direitinho. (Consultor)

Fazendas certificadas são facilmente identificáveis quando são visitadas. O

grau de organização, a identificação das estruturas e das lavouras são

facilmente percebidos. (Especialista)

Condições de saúde e segurança de trabalho

Em relação a saúde e segurança do trabalho, foi identificado que 100% dos

trabalhadores consideram que as condições do ambiente de trabalho estão

adequadas, e que 100% dos trabalhadores também estão satisfeitos com as

condições de trabalho das fazendas.

As principais considerações apontadas por eles foram que a certificação UTZ

contribuiu muito para melhorar as condições do ambiente de trabalho,

principalmente na limpeza da fazenda, coleta seletiva, sinalização e instalações

das fazendas, como sanitários e refeitórios. Além desses pontos, muitos

trabalhadores afirmaram que a certificação colaborou bastante para melhoria

estrutural das casas dos funcionários, as quais foram reformadas e adequadas,

com - por exemplo - a construção de fossas sépticas.

16 Direitos Trabalhistas: principais direitos trabalhistas no Brasil: seguro-desemprego, benefícios da Previdência Social e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Page 36: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

36

Gráfico 22: Satisfação dos Trabalhadores com as condições de trabalho

Outro ponto bastante relevante de saúde e segurança foi que tanto para os

trabalhadores como para os produtores, a certificação UTZ contribuiu muito para

o uso dos Equipamentos de Proteção Individual, os EPIs. Isso pode ser

demonstrado pelo fato de que 100% dos trabalhadores afirmam utilizar o EPI

corretamente todas as vezes. De igual forma, mais de 95% dos trabalhadores

afirmam que o número de acidentes na fazenda diminuiu e que no último ano

não sofreram acidentes graves de trabalho.

Todas estas questões são fortemente relacionadas à certificação UTZ,

principalmente devido a cobrança do uso de EPI, adequação das questões de

segurança nas correias e máquinas e treinamentos e capacitações. Aqueles

produtores que tentaram implantar o uso de EPI por seus funcionários antes da

certificação, disseram que a certificação lhes conferiu maior credibilidade para

exigirem de seus funcionários o uso contínuo dos equipamentos de segurança.

Gráfico 23: % dos Trabalhadores que sofreram acidentes no último ano

47,4%

52,6%

0,0%0,0%

Muito Satisfeito

Satisfeito

Pouco Satisfeito

Insatisfeito

3,5%

96,5%

Sim

Não

Page 37: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

37

Gráfico 24: Percepção dos trabalhadores sobre aumento de acidentes de

trabalho nos últimos 2 anos

É importante dizer que todas estas questões também foram apontadas pelos

produtores, dos quais 46,1% concordaram fortemente e 50,6% concordaram com

a afirmação de que a certificação UTZ contribuiu para melhorar as condições de

saúde e segurança dos trabalhadores.

Gráfico 25: Percepção dos produtores se condições de saúde e segurança

melhoraram

As principais melhorias de Saúde e Segurança destacadas pelos entrevistados

foram aumento no uso de EPI, principalmente devido a conscientização dos

funcionários e respeito às regras, exames admissionais, exames médicos

periódicos, adequação das instalações e estruturas da fazenda como sanitários,

refeitórios, vestiários, lavatórios de EPI, cômodo de químicos, proteção das

correias e treinamento de funcionários no uso de equipamentos e máquinas.

Comentários dos stakeholders:

A certificação UTZ serviu de ferramenta para disseminação das informações

de saúde e segurança no trabalho. (Produtor)

Antes já existiam as condições necessárias para os funcionários, mas com a

certificação essa infraestrutura melhorou, teve ampliação das estruturas,

como higiene dos ambientes de trabalho. (Consultor)

A certificação ajudou muito a organizar a fazenda, que agora atende a

normativa de segurança, então possuímos refeitórios, sanitários, cômodos de

defensivos específicos, vestiários, ponto de caldas, proteção das correias,

polias, escadas e passarelas. (Produtor)

Com a certificação os trabalhadores passaram a usar mais EPI, e os donos das

fazendas tomam mais cuidado com uso correto dos EPI, e garantem a data

de validade. Antes eram mal usados e não tinham controle, hoje em todas as

0,0% 3,5%

96,5%

Aumentaram

Permaneceram igual

Diminuiram

46,1%

50,6%

0,0% 3,4%0,0%

Concordo fortemente

Concordo

Não concorde nem discordo

Discordo

Discordo fortemente

Page 38: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

38

atividades os trabalhadores usam EPI, até mesmo nas menos perigosas.

(Auditor)

A certificação traz mais força para monitoramento da segurança de trabalho,

os médios e grandes produtores possuem técnicos de saúde segurança e

programa de riscos de trabalho que monitoram o uso do EPI e de aspectos de

segurança nas fazendas. (Consultor)

As normas não vão além da legislação brasileira, mas a certificação contribui

e promove a adesão à legislação por estes fazendeiros. (Entidade do

governo)

Com a certificação o produtor conseguiu ter mais força para garantir o uso

do EPI, pois dizia que era uma obrigação ‘de fora’ da fazenda, um requisito

que precisava seguir para manter a certificação e caso o trabalhador não

quisesse usar, ele teria que deixar o trabalho na fazenda. (Produtor)

Antes da UTZ, os funcionários não tinham costume ou o compromisso de seguir

normas; achavam que não era importante. Mas agora, seguir as normas já

virou tradição. A implantação foi mais complicada, mas hoje em dia eles já

internalizaram o cumprimento das normas. (Produtor)

A certificação UTZ trouxe benefícios aos trabalhadores?

70% dos trabalhadores acreditam que a certificação UTZ trouxe bastante

benefícios para eles, e 30% dizem que a certificação trouxe alguns benefícios. Os

principais benéficos destacados foram as reformas nas casas dos trabalhadores

que moram nas fazendas, melhora das questões de saúde e segurança do

trabalho, como correias nas máquinas, sinalizações e aumento do uso de EPIs,

investimentos em equipamentos, realização de muitos treinamentos, adequação

das instalações da fazenda, como refeitório, sanitários e EPI adequados. Além

disso, a certificação UTZ ajudou na melhora da relação entre o dono da fazenda

e os trabalhadores, que ficaram mais próximos uns dos outros, melhorando a

convivência entre os funcionários, aumentando o conhecimento dos

trabalhadores sobre o trabalho e processos da fazenda.

Dessa forma, percebe-se que os benefícios para os trabalhadores estão bastante

ligados ao trabalho, voltados principalmente para questões de saúde e

segurança. A única questão mais associada ao bem estar do trabalhador e

qualidade de vida é a reforma das casas, mas isso ocorre somente para

funcionários que moram nas fazendas, que hoje é a minoria. Assim não se pode

afirmar que a certificação UTZ por si só garante condições de vida mais decentes

para todos os trabalhadores, mas que garante condições decentes de trabalho.

Gráfico 26: Percepção dos trabalhadores se a certificação trouxe benefícios

Page 39: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

39

A questão dos benefícios da certificação UTZ também foi colocada para os

produtores e para 94,4% deles, a certificação UTZ trouxe benefícios para os donos

das fazendas, para 93,3% trouxe benefícios para os trabalhadores fixos e para 64%

para os trabalhadores temporários.

Para os produtores, os benefícios da certificação relacionados aos trabalhadores

também estão bastante ligadas às questões de saúde e segurança do trabalho,

sendo considerados unanimes os mesmos pontos mencionados anteriormente

pelos trabalhadores. A diferença entre trabalhadores fixos e safristas é que os

safristas ficam pouco tempo nas fazendas e rodam muito de um ano para o

outro, e por isso não são tão atingidos pelos benefícios da certificação. Nos anos

recentes, atividades de controle mais intensos dos órgãos públicos ajudaram e

melhor cobrir os safristas e foi criada a modalidade de contrato de safra que

permite a contratação temporária de trabalhadores rurais e garante todos os

benefícios da CLT17 para eles durante o tempo da contratação.

Já para os produtores os principais benefícios identificados foram principalmente

a gestão do negócio e organização da fazenda. A grande maioria mencionou

que a certificação UTZ contribuiu para o produtor ter um maior controle do

negócio, possibilitando alcançar melhor qualidade do produto e gestão de

custo. Outros pontos bastante mencionados foram que a certificação trouxe

maior credibilidade perante aos órgãos fiscalizadores, contribuiu para

engajamento e profissionalização dos funcionários, conseguindo obter a

disciplina deles, além de criar um ambiente de trabalho e fazenda mais limpos.

No gráfico 27 abaixo, os grupos classificados como outros beneficiados são os

consumidores, devido á possibilidade de ter produtos com melhor qualidade no

mercado e mais confiáveis.

17 CLT - Legislação Trabalhista Brasileira: As leis trabalhistas no Brasil estão consolidadas na CLT (Consolidação das Leis do trabalho): São as normas que regulam as relações individuais e coletivas de trabalho. Os capítulos da CLT englobam: Segurança no local de trabalho; horas de trabalho, o salário mínimo e as férias; saúde do trabalhador; tutela do Trabalho; nacionalização do trabalho; proteção para as mulheres e crianças trabalhadoras; os contratos individuais de trabalho; negociações e organizações sindicais; contribuição Sindical. A CLT também fornece a estrutura para o sistema de tribunais de trabalho brasileiro e agências relacionadas e estabelece normas para processos trabalhistas.

70,2%

29,8%

0,0% 0,0%

Sim, bastante benefícios

Poucos benefícios

Não, nenhum benefício

Não sei

Page 40: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

40

Gráfico 27: Percepção dos produtores sobre beneficiados pela certificação UTZ

Comentários dos stakeholders:

Os trabalhadores fixos são os mais impactados, porque têm mais treinamentos.

(Produtor)

Em relação a questões sociais, os trabalhadores foram beneficiados pela

certificação, pois os ambientes de trabalho estão melhores e os funcionários

também passam por treinamentos, mas em relação a salários, a certificação

não garante um salário melhor para os trabalhadores. (Auditor)

Para o dono da fazenda, além da organização na estrutura da fazenda, o

produto dele torna-se mais competitivo, pois a certificação é um diferencial e

permite que ele negocie. (Especialista)

Para os trabalhadores, a certificação possibilita a qualificação da mão de

obra com treinamentos e as várias questões de saúde e segurança, tais como

uso do EPI, acesso a um profissional de medicina do trabalho, etc. (Consultor)

A melhoria nas condições para os trabalhadores é nítida nas questões da

segurança, na conduta e no uso de equipamentos. É outro mundo comparado

com as fazendas não certificadas. (Consultor)

5.4 Maior cuidado com a natureza

A categoria da Teoria de Mudança de “maior cuidado com a natureza” engloba

principalmente três questões:

- Biodiversidade mais protegida;

- Recursos Naturais protegidos; e

- Redução de emissões de GEE.

Apresentamos os resultados por subitem nas próximas seções.

Recursos naturais protegidos

94,4%

93,3%

64,0%

38,2%

9,0%

2,2%

Dono da fazenda/propriedade

Funcionários fixos da fazenda/propriedade

Funcionários temporários da fazenda/propriedade

Comunidade do entorno da fazenda

Outros (quais)

Nenhum deles

Page 41: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

41

Na questão de melhorias das condições ambientais, mais de 90% dos

entrevistados apontaram que a certificação UTZ ajudou de alguma forma na

contribuição de melhorias ambientais.

No entanto para esse tema é difícil de mensurar quantos desses efeitos são

causados somente devido a certificação UTZ, pois muitos dos produtores

possuem outras certificações que também cobram questões ambientais. Além

disso, os entrevistados deixaram claro que existe um grande potencial de

melhorar os aspectos ambientais da certificação e que a parte ambiental da UTZ

não é tão intensa como em outros sistemas de certificação.

Gráfico 28: Percepção dos produtores sobre melhorias das condições ambientais

Biodiversidade mais protegida

Para a questão de “Biodiversidade mais protegida” e “Recursos Naturais mais

protegidos”, os principais benefícios destacados pelos produtores foram em

relação a proteção das minas e nascentes, recuperação de mata ciliar, Área de

Proteção Permanente (APP) e Reserva Legal. O trabalho de adequação das

áreas de proteção está relacionado com o Código Florestal brasileiro: A

certificação exigiu que as empresas caminhassem em direção a conformidade

desta lei, assim como para realização do cadastro que serve como declaração

das áreas destinadas a proteção.

Dessa forma foi possível identificar que as melhoras ambientais estão bastante

relacionadas às questões de legislação do Brasil. No entanto, outros pontos

também foram levantados pelos entrevistados, como aumento da vegetação,

melhoria da qualidade do solo, retorno de animais, restauração de habitats

naturais e redução de resíduos.

Gráfico 29: Percepção dos produtores sobre melhorias na biodiversidade devido

a certificação UTZ

49,2%

44,3%

4,9% 1,6%

Houve melhorias significativas

Houve algumas melhorias

Houve poucas melhorias

Não houve nenhuma melhoria

Page 42: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

42

Redução de emissões GEE

Para os produtores entrevistados não é possível identificar de forma direta a

contribuição da UTZ para diminuição das emissões de GEE. No entanto percebeu-

se uma melhor gestão dos usos de insumos e fertilizantes, o que impacta

diretamente no volume de emissões, apesar de não ser possível ter o valor

quantitativo dessa redução.

Ainda na esfera ambiental, o uso mais consciente de agroquímicos e fertilizantes,

manuseio e estoque e descarte de embalagens foram os critérios ambientais

mais significativos que a certificação UTZ trouxe para as fazendas de café. Para

todos esses itens, mais de 70% dos entrevistados confirmaram esse benefício.

Enquanto o descarte correto de embalagens hoje é prescrito pela legislação, as

outras práticas são boas práticas agrícolas e foram incentivados pela

certificação UTZ. Vale a pena dizer que o melhor manuseio e a correta dosagem

tiveram impactos positivos nos custos da fazenda também.

Gráfico 30: Percepção dos produtores sobre melhorias em relação a agrotóxicos

35,7%

35,7%

32,1%

32,1%

32,1%

17,9%

7,1%

Aumenta da vegetação

Melhor qualidade da terra/solo

Retorno de animais ao redor

Restauração de habitats natural

Redução de resíduos

Nenhum

Outros (quais, especifique abaixo)

Page 43: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

43

Entre outros efeitos positivos ambientais, podemos inserir também a maior

eficiência no uso de agua e energia já constatado na seção 5.2, e a disposição

de correta de resíduos sólidos (ver Gráfico 11).

De maneira geral, constamos que existe uma oportunidade para UTZ de melhorar

ainda o desempenho na gestão ambiental. Os produtores hoje são direcionados

a cumprir normas legais, porém não se despertou de forma impactante que

produtores façam além do que a lei exige. Ou seja, o despertar da proteção

ambiental “de dentro para fora” ainda é um passo que a UTZ poderia alcançar.

Muitos produtores entrevistados afirmaram que seu comprometimento ambiental

está diretamente relacionado ao cumprimento da lei. Muitos produtores

indicaram que faziam somente o mínimo exigido e nada mais. Certamente há

produtores que fazem além do que a lei exige, porém foi notado durante as

entrevistas que este grupo é uma minoria.

Comentários de stakeholders:

Apesar de as leis ambientais serem muito rigorosas, os produtores têm

conseguido cumpri-las e a certificação os ajuda nisso. Dentro do seu código, a

UTZ estabelece critérios que fazem com que o produtor siga as normas (ex.

preservar nascentes, APPs etc.) (Comprador) Através do seguimento das normas da certificação, o produtor aumenta

invariavelmente a sua flora e fauna (expl. APPs, reservas legais, matas ciliares

etc.) (Consultor)

É possível perceber algumas melhorias ambientais, no entanto essa é uma

questão que a UTZ ainda não foca muito, o protocolo não cobra muito isso dos

produtores, este item poderia ser melhorado. (Auditor)

É tênue a ligação da UTZ com as questões ambientais. A certificação só

resolveu as questões de APP e reserva legal de nascente, mas não é o ponto

forte da UTZ, pois os pontos não são muito checados pela auditoria. (Consultor) É bastante claro que há uma melhoria nas questões ambientais quando a

fazenda é certificada num grau mais alto do que as fazendas não certificadas.

A norma obriga à propriedade propor projetos de melhoria em várias áreas.

(Entidade do governo)

74,1%

74,1%

70,4%

70,4%

66,7%

11,1%

0,0%

Nocividade

Descarte de embalagens

Dosagem correta de agrotóxico (volume por ha)

Manuseio e estoque

Praticas de aplicação (manual ou trator)

Outros (quais, especifique abaixo)

Nenhum

Page 44: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

44

A certificação ajuda na conservação da biodiversidade na medida em que

busca preservar áreas nativas, nascentes, formar corredores ecológicos – e na

medida que promove a manutenção ou reposição da vegetação nativa.

(Indústria) Além de todo o cuidado no uso, armazenamento e descarte dos produtos,

nota-se uma preocupação com o uso de produtos menos agressivos. A

certificação prima por usar produtos com menor grau de toxicologia.

(Especialista) Este ponto deve ser melhor trabalhado, pois o produtor deve entender que vai

aumentar a retenção de água no solo e economizará mais. (Organismo de

certificação)

Esta questão já está sendo aprimorada no novo código da UTZ, que terá mais

foco na questão da água e biodiversidade. (Organismo de certificação)

5.5 Maior cuidado e preocupação com a próxima geração

A categoria “Maior cuidado e preocupação com a próxima geração” engloba

três critérios:

- Crianças nas Escolas;

- Melhor Saúde; e

- Investimentos em serviços básicos.

No Brasil tanto a educação infantil quanto o acesso a serviços de saúde, são

oferecidos gratuitamente para a população. Dessa forma, para todas essas

questões não foi possível identificar efeitos significativos da certificação UTZ, já

que todos funcionários entrevistados utilizavam o serviço de saúde pública,

chamado Sistema Único de Saúde (SUS)18, e seus filhos tem acesso a educação

infantil nas escolas públicas das regiões.

Crianças nas escolas

Porém, ainda em relação a Crianças nas Escolas, os trabalhadores entrevistados

afirmam que, apesar de não ter ações concretas significativas de fomento à

educação por parte dos produtores, estes incentivam bastante os funcionários a

colocarem os filhos nas escolas públicas. Além disso, existe também uma atenção

destes com relação a temas de ordem trabalhista, como o trabalho infantil,

sempre foi uma questão primordial na gestão da fazenda.

Gráfico 31: Percepção dos trabalhadores sobre incentivo à educação

18 Sistema Único de Saúde (SUS): Sistema de saúde público brasileiro. O SUS foi criado pela Constituição Federal Brasileira em 1988 e é constituído pelo "conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público.

Page 45: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

45

Melhor saúde

Em relação a saúde, no Brasil todos os trabalhadores com carteira assinada tem

acesso a saúde pública gratuita, porém uma grande parte não tem assistência

em nível mais avançado e é de conhecimento geral que os serviços públicos são

precários no Brasil.

Essa constatação também ocorre na esfera dos produtores e trabalhadores das

fazendas de café. Todos os trabalhadores entrevistados possuem assistência

médica devido ao acesso a serviços públicos de saúde, e não devido à

certificação UTZ.

A oferta de benefícios adicionais a funcionários ainda está muito relacionada ao

desempenho financeiro da fazenda e políticas internas de remuneração, e não

a certificação UTZ.

Apesar de ser uma obrigatoriedade por lei no Brasil, a certificação UTZ ajudou em

algumas propriedades a fazer a instalação de fossas sépticas nas propriedades e

nas residências dos empregados. Além disso, incentivou também o processo de

separação e destinação de resíduos, trazendo melhorias nas condições de

higiene da fazenda.

Comentários de stakeholders:

Essa questão ainda não foi muito desenvolvida, ainda está no básico, precisam

melhorar muito nisso ainda, principalmente na região de Sul de Minas, que

ainda tem muito trabalho a ser feitos. (Consultor)

Uma forma para garantir isso seria o prêmio. Mas o investimento do prêmio é

visto de forma errônea ainda, o prêmio deveria ser revertido para o social, para

os funcionários ou comunidade do entorno. E hoje, grande parte dos produtores

investem na produção e compra de maquinas, trator e bens próprios da

propriedade. (Consultor)

É uma questão que está um pouco solta ainda, a UTZ precisaria dar um

direcionamento melhor para os produtores em relação ao que se espera com

isso. (Consultor)

A UTZ ainda não causa impacto na comunidade local e não fomenta a

educação para crianças. Para os produtores individuais, o impacto na

comunidade não existe. (Consultor)

70,2%

29,8%

% dos trabalhadores que percebem incentivo do proprietário da fazenda para que os filhos dos funcionários estudem

Sim

Não

Page 46: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

46

5.6 Outras considerações dos produtores

O único ponto que a certificação UTZ não atingiu as expectativas dos produtores

foi em relação ao preço do produto. Quase 70% dos produtores entraram no

programa da UTZ com a expectativa de obter um melhor preço para o café, no

entanto apensa 16% conseguiu atingir essa expectativa. Mesmo assim 86,4% dos

produtores pretendem continuar com a certificação.

Gráfico 32: Principais motivos para aderir a certificação UTZ

Gráfico 33: Principais benefícios que a certificação UTZ trouxe para fazenda

74,2%

69,7%

39,3%

30,3%

25,8%

7,9%

0,0%

Expectativa em obter melhorias na produção e gestãoda fazenda

Expectativa de melhor preço do café

Acesso ao mercado

Demanda dos clientes

Vantagem competitiva

Outros (Quais)

Não sei responder essa pergunta

Page 47: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

47

Os principais pontos destacados pelos entrevistados foram que a certificação UTZ

ajudou muito na gestão da fazenda e dos custos relacionados à produção, além

de ter conseguido agregar valor ao negócio devido a rastreabilidade do

produto.

Embora a questão que mais se destacou no Gráfico 33 seja a contribuição da

UTZ para as melhores condições de trabalho (mais de 60% dos entrevistados

reconheceram que a UTZ trouxe grandes ganhos nesse aspecto) fica nítido,

analisando nossas entrevistas com produtores e stakeholders, que o principal

benefício foi de fato da melhorar da gestão e organização das fazendas. Junto

com a melhoria da gestão, veiou em muitos casos a redução do custo e ganhos

econômicos adicionais.

O principal motivo dos produtores continuarem com a certificação UTZ está

relacionado aos grandes ganhos que a certificação trouxe principalmente para

a gestão da fazenda e controle do negócio. Muitos produtores afirmam que não

tem como sair da certificação, pois o mercado está cada vez mais competitivo

e a certificação gera valor para a fazenda.

Gráfico 34: % de produtores que pretendem continuar com a certificação UTZ

63,6%

58,0%

48,9%

35,2%

22,7%

17,0%

15,9%

9,1%

6,8%

6,8%

1,1%

0,0%

Melhoria nas condições de trabalho nas fazendas decafé

Rastreabilidade do processo produtivo

Melhor gestão dos custos da produção do café

Melhoria na preservação do meio ambiente

Abertura de novos mercados

Melhoria de qualidade do café produzido

Melhor preço para o café

Estabelecimento de relacionamento de longo prazo

Redução no custo de produção do café

Outros (Quais)

Nenhum

Aumento na produção de café

Page 48: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

48

Apesar da grande satisfação mostrada na pesquisa online, no campo foram

identificados alguns pontos de atenção em relação ao atendimento da UTZ.

Uma questão que foi levantada por alguns produtores e stakeholders foi a

acessibilidade às normas e práticas da UTZ, incluindo a dificuldade no uso do

novo portal UTZ e a dificuldade da linguagem utilizada nos formulários e normas,

exigindo a contratação de consultores externos e mantendo uma maior

dependência da equipe da UTZ.

Comentários de stakeholders:

O maior ganho para os produtores é a melhoria na gestão que tem impacto direto

no custo e receita, além do acesso a novos mercados e do ágio recebido.

(Indústria)

É nítida a organização das fazendas certificadas, especialmente em

comparação com as fazendas não certificadas. (Especialista)

Fazendas certificadas são facilmente identificáveis quando são visitadas. O grau

de organização, a identificação das estruturas e das lavouras são facilmente

vistos. Esta percepção vale para todas as certificações. (Especialista)

Pensa que hoje em dia a insatisfação da UTZ se dá pela sua popularização. As

fazendas certificadas não se sentem mais diferenciadas das demais. "muita gente

é certificada". Acha que poderiam ser pensadas novas formas de diferenciação.

(Auditor)

O ganho que os produtores têm com a certificação não é com o ágio e sim na

gestão na fazenda do café. Se perguntarem para eles qual o motivo de continuar

com a certificação a resposta vai ser a gestão da fazenda. (Consultor)

Um benefício é a segurança na produção, que vai muito além do uso de produtos

– inclui impactos nas pessoas, no meio ambiente e na qualidade do produto.

(Especialista)

Para endereçar os pontos críticos e acelerar seus efeitos positivos, a pesquisa

ofereceu uma gama de sugestões por parte de produtores sobre como a UTZ

poderia melhorar o seu sistema e sua vantagem competitiva. Na última seção

apresentamos algumas conclusões gerais e traduzimos os pontos identificados

em oportunidades de melhoria do programa.

86,4%

1,1%12,5%

Sim

Não

Não sei

Page 49: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

49

Comentário de produtores:

O portal da UTZ ficou muito complicado para usar.

A UTZ exige, mas não te dá o caminho das pedras. Ela só passa o check-list.

O check-list da UTZ deveria vir com uma linguagem mais didática, mais fácil de

entender. Eles complicam e fazem com que a fazenda dependa de um consultor

externo.

O objetivo em aderir à certificação foi agregar valor por meio da rastreabilidade

do produto. Mas, o que percebo agora é que isso virou uma coisa bastante

comercial. O intermediário está comprando o seu café, mas você não sabe se

estão usando a certificação ou não... Não há como saber ao certo. Todo o

processo é rastreado por papel e não é tão rigoroso. Não há uma descrição exata

do café que está vendendo na nota fiscal - não se sabe da sua qualidade, a

pessoa poderia muito bem pegar outro café e usar o seu certificado.

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50

6. Conclusões

Para fornecer uma visão mais consolidada, resumimos na tabela abaixo o

resultado geral das análises feitas. Em uma gama de quatro níveis (muito alto,

alto, médio e baixo) classificamos o grau de efeitos percebidos da certificação.

A classificação foi calibrada no workshop pelos stakeholders e ofereceu o

resultado apresentado abaixo na Tabela 5. As principais confirmações e desafios

que identificamos no estudo também estão inseridos na tabela.

Tabela 5: Consolidação das confirmações e do grau do atendimento do efeito

de acordo com a Teoria da Mudança, na percepção dos autores e dos

stakeholders.

Principais

impactos

UTZ

Grau de

atendimento

da ToC

Principais Confirmações Principais Desafios

Melhor

Produção/

Cultivo

MUITO

ALTO/ALTO

• Melhor gestão da

fazenda através de

processos e

procedimentos

organizados

• Melhor conservação do

solo através de cultivo

mais sustentável

• Melhor uso de insumos

agrícolas

• Calibragem de

padrões e exigências

em comparação com

outros países:

Produtores acham

que em outros países

fica mais fácil de se

certificar devido as

exigências mais altas

da legislação

brasileira

Maiores

Receitas MÈDIO

• Maior eficiência no uso

dos recursos leva a

redução de custos

• Recebimento do

prêmio UTZ gera maior

receita

• Compradores leais

• Dúvidas em relação

ao prêmio (valor

efetivo e

transparência)

• Falta de impacto no

salário médio dos

trabalhadores

Meio

ambiente

melhor

MÉDIO

• Melhor cumprimento

com a legislação

ambiental e menos

passivos ambientais

• Tratamento correto de

resíduos e proteção da

biodiversidade

• Falta de medidas mais

progressivas de

proteção do meio

ambiente

• Falta de orientações

mais detalhadas

Condições

de vida

melhor

ALTO/

MÈDIO

• Benefícios econômicos

para os produtores

• Poucas mudanças no

acesso a serviços

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51

• Condições de trabalho

mais seguros e

saudáveis

• Salários de acordo com

as funções mais

valorizadas

básicos para os

trabalhadores

A tabela novamente demonstra que o principal efeito da certificação é a

melhoria da gestão, que se transformou em melhorias na produção de cultivo, e

se refletiu nos outros eixos da Teoria da Mudança, oferecendo progresso na

gestão ambiental e nas condições de vida.

Pontos que enfraquecem a avaliação no eixo de “melhores receitas” são os

problemas identificados em relação à definição e aplicação do prêmio e no fato

de não ter parâmetros para mensurar melhorias nos salários para os

trabalhadores. Na questão do meio ambiente destacamos a melhoria do

atendimento a legislação, mas que poderia ser catalisada com uma orientação

mais detalhada e direcionada da UTZ neste aspecto.

No eixo de condições de vida melhor, podemos destacar as melhorias em saúde

e segurança e avanços econômicos favorecendo os produtores ao longo dos

anos, enquanto no nível dos trabalhadores, foram constadas melhorias de casas

e das questões de segurança do trabalho, mas não grandes progressos em

termos de acesso a serviços como planos de saúde mais avançados.

Um ponto interessante levantado pelos participantes foram os benefícios da

certificação que são mais difíceis de serem mensurados financeiramente, como

por exemplo o impacto na imagem da fazenda, o orgulho dos funcionários, maior

conscientização socioambiental dos trabalhadores e outros que geraram valor

agregados, não necessariamente trabalhados na análise econômica das

propriedades.

Comentários dos Stakeholders:

A gestão da propriedade é o fator mais forte no protocolo, mas concorda que

o produtor não consegue mensurar este benefício. Compartilha a ideia de ser

criado formas (talvez índices) para que ele consiga enxergar estes benefícios.

(Consultor)

Pensando no mercado local brasileiro, em nível de consumidor, ele não está

preparado para comprar UTZ, pois a certificação ainda é pouco reconhecida

e este consumidor não está disposto a pagar mais caro por isso. (Especialista) Diminuir a burocracia da certificação – diminuir o uso de papel, as

documentações que só servem para a UTZ. Esta questão torna-se um

empecilho para produtores entrarem na certificação, tem produtores que não

tem braço. Quem tem a certificação da UTZ são os produtores maiores, pois

Page 52: 2015 efeitos-da-certificacao-utz-no-brasil-pt

52

os pequenos produtores não conseguem fazer sozinhos a certificação.

Precisam de uma pessoa dedicada para fazer o acompanhamento das

anotações e cumprimento da certificação. E eles não conseguem arcar com

este custo. (Consultor)

O principal desafio é ter maior credibilidade perante o selo. O selo é forte e a

certificação é forte. Mas as empresas de auditoria não estão fazendo o

trabalho correto e isso passa uma imagem ruim do selo, “tipo pagou, passou”.

A UTZ precisa trabalhar em cima disso para não perder a certificação e se não

fizer alguma coisa, o programa vai acabar e vai ficar queimado. (Auditor)

Um desafio é sempre buscar “subir a régua”. A medida que o produtor

aumenta a qualidade, ele poderia ter uma diferenciação, mesmo entre os

próprios certificados. (Indústria)

Na sequência tentamos referenciar as principais ameaças que podem ser

transformados em oportunidades para certificação UTZ.

Entre as principais ameaças identificadas podemos mencionar:

- O esforço para obter o selo para os produtores é considerado maior no

Brasil do que em outros países. Os produtores alegam ter um desnível de

rigidez entre países com o Brasil, que possui uma legislação mais rígida do

que outros países produtores. O requisito do “legal compliance”

estabelece um patamar mais alto de entrada para a certificação UTZ num

país como o Brasil, comparado a países com uma legislação ambiental e

trabalhista menos exigentes.

- O valor do selo para o mercado está sendo questionado pelos produtores:

os compradores não fazem questão de qual tipo é a certificação,

enquanto a fazenda tem pelo menos alguma entre os diferentes tipos.

- Alguns stakeholders questionaram a qualidade das auditorias e

apontaram métodos desiguais entre os diferentes órgãos certificadoras.

- A insatisfação dos produtores por causa do prêmio pode causar um

problema para manutenção e expansão da certificação no Brasil e

ameaçar sua credibilidade. Produtores podem deixar a certificação, ou

podem também não se interessar mais em ingressar no sistema.

- A certificação em grupo oferecido por standards concorrentes pode

ameaçar o crescimento da UTZ no Brasil.

- Existe uma saturação de sistemas de certificação que pode levar que

diferentes produtores abrem mão da manutenção do selo.

- A questão de mudanças climáticas influencia em grandes proporções a

produção e as vendas dos produtores. Esse fato é fora do alcance da

certificação, mas pode ser endereçado dentro do trabalho da UTZ (veja

depoimentos abaixo).

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53

Comentários de stakeholders em relação a mudanças climáticas:

A questão do cuidado com água foi bem forte na certificação, da

necessidade de se manter as matas ciliares, de cercar as nascentes e

preservá-las. Fizemos isso e hoje não temos problemas com água, como nossos

vizinhos estão tendo por conta da seca. Estas mudanças eram exigências da

auditoria. (Produtor)

Há ainda muitas incertezas que dificultam a decisão do produtor de aderir, tal

como a insegurança em relação às questões climáticas, pois mesmo que

invistam e façam tudo certinho, se o clima não ajudar, eles perdem tudo.

Como em 2013, que choveu demais na época da colheita e teve impacto

direto na qualidade do produto. Já neste ano, não choveu o suficiente.

(Indústria)

Uma preocupação mais recente é conter a emissão de CO2. A legislação

brasileira é frágil nesta questão. A certificação poderia ter este papel de

promover técnicas que minimizem e mitiguem as emissões de CO2. Seria de

grande importância trazer esta questão para as discussões com os produtores

e trabalhar alguns exemplos como as práticas de manejo agro silvicultura,

manejo menos intenso dos solos para não expor tanto material orgânico, etc.

Isso precisa ainda ser trabalhado pela certificação. (Entidade do governo)

As principais oportunidades identificadas ao longo da pesquisa são na visão

dos autores:

- A UTZ poderá melhorar a divulgação da certificação UTZ no mercado

consumidor brasileiro, agregando assim mais valor para as fazendas que

torram e vendem cafés no mercado local.

- Com a maior inclusão dos pequenos produtores e sistemas de apoio, a

certificação conseguiria abraçar um grupo de produtores que necessita

de melhorias de gestão, pois muitos problemas ambientais e trabalhistas

se encontram ainda em menores propriedades, que são as que possuem

mais informalidade.

- A melhora do sistema do prêmio, aumentando a transparência, deixará a

UTZ mais atraente para os produtores e promoverá a competitividade do

selo em um ambiente disputado por diferentes certificações.

- O estreitamento do relacionamento entre produtor e comprador ajudará

o produtor a comercializar melhor o seu produto e evitar a grande

influência do intermediário nas vendas do seu café.

- Os próprios produtores apontaram que a UTZ poderia aumentar seu nível

de exigências nos quesitos ambientais, dando mais orientações para os

produtores que deveria ir além daquilo que a legislação exige como

mínimo.

- O desenvolvimento de soluções ou identificação de temas ambientais a

nível local e regional podem levar a uma percepção conjunta ou melhoria

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ambiental a nível local e que possam gerar critérios de cumprimento mais

específicos.

- A UTZ deve continuar com o aclamado baixo custo de auditoria da

certificação, porém é necessário prestar atenção na qualidade do

trabalho dos auditores.

- Com pequenos encontros e eventos regionais a UTZ poderá criar um senso

de “pertencer” a um grupo seleto de produtores, diferenciado da média

dos produtores pela excelência na sua gestão.

- É importante criar indicadores a partir do ano zero para os entrantes que

apoiem na mensuração de certos indicadores de desempenho

(performance). Isso vai ajudar as fazendas a quantificar seus ganhos e

melhorias de desempenho a partir da certificação UTZ

- É importante reforçar o engajamento do sistema da UTZ junto com os

grupos de trabalho internacionais e locais sobre definição de salário digno

e incluir como critério adicional a mensuração dos salários regionais versus

salários de fazendas UTZ.

Dentro dessas propostas, o mais importante nesse momento seria responder aos

anseios relativos ao prêmio e iniciar um trabalho de indicadores que ajudarão os

produtores de valorizar mais todas as melhorias que a certificação trouxe para

eles no âmbito da gestão e redução de custos, que foram evidenciados na

pesquisa.

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55

7. Referências

Teoria da Mudança UTZ: “UTZ Theory of Change Info graphic” (disponível no

website:

https://www.utzcertified.org/images/stories/site/pdf/downloads/impact/theory_

of_change_infographic_web.pdf)

UTZ Certified, Monitoring and Evaluation System, 2014

UTZ Certified, UTZ Certified Program indicators, 2014 (disponível no website:

https://www.utzcertified.org/images/stories/site/pdf/downloads/impact/4.%20utz

%20certified%20_program%20indicators%20version%202.pdf)

UTZ Certified, UTZ M&E FRAMEWORK: DEFINING THE INTENDED CHANGE (disponível

no website: https://www.utzcertified.org/images/stories/site/pdf/downloads/impact/3-utz-

m_e-framework.pdf)

UTZ Certified, Annual Report 2013: (disponível no website:

https://www.utzcertified.org/attachments/article/2074/utz-annual-report-

2013.pdf

UTZ Certified, Social, Economic and Environmental Results of UTZ Certification:

Case studies on UTZ CERTIFIED coffee farms in ASIA, AFRICA and LATIN AMERICA,

2010

UTZ Certified, Vietnam coffee: A COSA survey of UTZ certified farms, 2012

UTZ Certified, Code of Conduct: Coffee Module Version 1.0, 2014 (disponível no

website: http://www.utzcertified-

trainingcenter.com/home/images/stories/library_files/

EN_UTZ_Coffee_Module_2014.pdf)

UTZ Certified, UTZ CERTIFIED IMPACT REPORT: Combining results from 24 external

impact studies and data from UTZ Certified, 2014

UTZ Certified, ACHIEVEMENT STUDY: Brazil - Rancho Fundo, 2009

UTZ Certified, ACHIEVEMENT STUDY: Brazil – Porto Alegre, 2009

Monteiro, José L; Gonçalves, Fernando; Ortiz, Marcio; Amstalden, Daniel; Greisson,

José; Stabuli, Rodrigo; Mittenstainer, Renata; Jansen, Don; Utz Kapeh certification

of small scale coffee farmers in Brazil:lessons from Serra Negra, 2006

Portaria MTE, NR 31 - segurança e saúde no trabalho na agricultura, pecuária

silvicultura, exploração florestal e aquicultura, 2011

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8. Anexos

ANEXO I

Visão geral da amostra pesquisada

Detentores da Certificação Ativos

(jun 2014) # CHs # Fazendas

# Entrevistas com CHs realizadas (e-survey +

individuais)

Individual 108 108 64

Grupo 4 56 6

Multi site 91 412 19

Total 203 576 89

Localização dos CHs # Entrevistas com CHs realizadas por região

MG 169 67

SP 27 20

BA 5 1

PR 1 1

ES 1 0

Total 203 89

Tempo que está no programa UTZ # Entrevistas com CHs realizadas por tempo

no programa UTZ

Ano 1 ou menos 29 6

Ano 2 148 11

Ano 3 40 16

Ano 4 251 10

5 anos ou mais 108 46

Total 576 89

Trabalhadores # Trabalhadores # Entrevistas com

trabalhadores

Trabalhadores permanentes + residentes na fazenda

14.429 57

Trabalhadores temporários (sazonal)

11.051 0

Total 25.480 57

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ANEXO II

Lista dos Stakeholders externos entrevistados

Secretários de agricultura Secretaria da Agricultura Estadual de

Minas gerais

Traders e exportadores de café Cooperativa de Minas Gerais

Torrefadores Torrefadora de Cafés Especiais

Organismos de certificação Certificadora

Representantes de Indústria

Empresa de insumos agrícolas

Empresa de insumos agrícolas

Outros stakeholders Duas universidades da região de

Cafeicultura

Consultores de apoio da UTZ

Consultor

Consultor

Especialista do mercado de café Representante de Associação de

Cafés Especiais

Ministério Público do Trabalho Ministério Público do Trabalho

Stakeholders regionais

Sul de Minas Sindicato dos Trabalhadores

Cerrado Cooperativa dos Cafeicultores

Mogiana Sindicato rural dos empregados

Oeste de Minas

Sindicato dos Trabalhadores Rurais

Empresa de insumos agrícolas

Assistência técnica estadual

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ANEXO III

Versão Original da Teoria da Mudança UTZ

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59

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BSD Consulting

Rua José Maria Lisboa, 860, and. 7

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