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LEITURA EM PERSPECTIVA DISCURSIVA: UMA ANÁLISE SOBRE A FUNÇÃO AUTORIA EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE
ALUNOS NO ENSINO MÉDIO
Edjane GOMES de Assis1
Marcela VIANA de Sousa²Myllena ARAUJO do Nascimento³
Resumo: A agenda das políticas educacionais do século XXI precisa atender demandas que buscam, entre outros aspectos, implementar múltiplos saberes e novos processos de formação do indivíduo. Empreender um olhar para a leitura em seus diferentes gêneros, constitui algumas das principais preocupações do ensino de língua portuguesa, sobretudo na Educação Básica. Com base nos pressupostos da Análise de Discurso de linha francesa, na esteira de teóricos como Pêcheux (2000), Foucault (1992; 2000; 2005; 2009) e Courtine (2000), nosso trabalho traz um relato de experiência sobre uma sequência didática desenvolvida dentro de um construto de atividades realizadas no Projeto de Extensão “A leitura verbo-visual em textos midiáticos: materiais didáticos para a sala de aula” - (PROBEX/UFPB/Edital de 2017). Nosso corpus é formado por três redações produzidas por alunos do 3º Ano do Ensino Médio de uma escola pública de João Pessoa/PB. Tomando como categoria de análise a função autoria, estudada na perspectiva discursiva (AD francesa), procuramos refletir sobre os posicionamentos do sujeito aluno quando convidado a argumentar sobre a temática “Espetacularização da violência na mídia”. Para fomentar a discussão, e posteriormente produção textual, utilizamos como textos motivadores dois gêneros da esfera jornalística (o artigo de opinião e a charge). Em uma análise preliminar, identificamos que os alunos, em sua função autor, deixam marcas de suas ideologias/verdades em seus textos, seja através das rasuras, ou da escolha dos enunciados, ou até mesmo no silenciamento (quando não utilizam todos os espaços – linhas - destinadas à produção). Defendemos, pois, que o discurso jornalístico, por lidar com o processos semiológicos verbo-visuais, além de informar os fatos, busca (in)formar o público mediante a pluralização de ideologias e valores que adquirem nuances de verdade. Deste modo, se faz necessário uma constante reflexão sobre a formação crítica do indivíduo sempre pensando no processo de democratização do conhecimento.
Palavras chave: Discurso. Jornalismo. Educação.
I – Introdução
O projeto de extensão “A leitura verbo-visual em textos midiáticos: materiais
didáticos para a sala de aula”, executado ao longo do ano de 2017 na UFPB
(Universidade Federal da Paraíba) tem como um dos objetivos, contribuir para o
1 ¹Professora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas (DLCV) da Universidade Federal da Paraíba, Campus I. Possui Mestrado e Doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL - UFPB). Desenvolve pesquisas em Análise do Discurso francesa com ênfase em textos midiáticos. Atua no grupo de pesquisa Observatório do discurso. Linha de pesquisa: Análise do discurso da mídia e suas interfaces. E-mail: [email protected]² Graduanda do curso de Letras-Português da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus I – João Pessoa/PB. Extensionista do projeto “Propostas metodológicas em periódicos online”. Atua no grupo de pesquisa Observatório do discurso. E-mail: [email protected]³ Graduanda do curso de Letras-Português da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus I – João Pessoa/PB. Extensionista do projeto A leitura verbo-visual em textos midiáticos: materiais didáticos para a sala de aula. Atua no grupo de pesquisa Observatório do discurso. E-mail: [email protected]
desenvolvimento da argumentação do aluno, não somente para o ENEM, mas para o
processo de formação da cidadania, através da análise crítica dos textos verbos-visuais
midiáticos, tendo em vista a dificuldade que os alunos do Ensino Médio revelam no
momento da produção e interpretação textual. O ENEM, bem como, outras avaliações
de âmbito nacional cobram que o aluno tenha conhecimento de assuntos atuais e que
possuam relevância social. Por isso, se faz necessário discutir temas que façam parte da
realidade social do sujeito aluno. Um destes temas compreende a maneira
espetacularizada como a violência é tratada cotidianamente na mídia.
Segundo uma matéria publicada em Outubro de 2016 pela revista Exame2, entre
2011 e 2015, o Brasil teve um total de 278.839 assassinatos, superando a guerra na
Síria. Esses dados comprovam a violência generalizada no Brasil, uma realidade
histórica que já vem desde sua colonização feita pelos portugueses, até os dias atuais. E
a mídia, enquanto Quarto Poder, possui uma influência direta na opinião dos cidadãos,
abordando de forma espetacularizada e enviesada, a temática da violência, gerando
consequências drásticas na consciência e na vida da população brasileira. Mesmo com
essa consistente manipulação midiática, é dever dos educadores, como formadores de
cidadãos críticos, trabalhar os procedimentos argumentativos desses diversos
enunciados midiáticos em seus aspectos sócio-históricos-discursivos.
Sendo assim, o objetivo do nosso trabalho é relatar uma experiência vivenciada
em um dos momentos de intervenção na escola campo de atuação do projeto, em que
avaliamos três produções textuais de tipologia dissertativo-argumentativas, tendo como
tema “A espetacularização da violência na mídia”. Nosso relato de experiência está
sistematizado da seguinte forma: No primeiro momento, descrevemos nosso corpus
(redações dos alunos) que serviu de base para nosso trabalho, e no segundo momento
articulamos a análise fundamentada nos pressupostos teóricos a Análise de Discurso de
linha francesa, na esteira de teóricos como Pêcheux (2000), Foucault (1992; 2000; 2005;
2009), Courtine (2000) e Orlandi (2002). Ao longo da nossa análise abordamos alguns
aspectos que singularizam a função autoria em cada texto (redações dos alunos). Na
primeira produção textual, estudamos o silenciamento como materialidade significativa,
e na segunda, observamos o posicionamento discursivo compreendido no uso da 2 Fonte: Disponível em: https://exame.abril.com.br/brasil/violencia-brasil-mata-mais-guerra-siria/
primeira pessoa do singular, utilizado em um gênero discursivo no qual deve prevalecer
a impessoalidade; já na terceira produção, analisamos os efeitos de sentido na escolha
recorrente de algumas palavras com denotações extremamente subjetivas, possuindo
uma relação direta com o tema da redação.
2- A função autoria e a produção de sentidos
O ENEM3 (Exame Nacional de Ensino Médio) tem como finalidade avaliar as
competências que se pressupõe que foram desenvolvidas ao longo do processo de
escolaridade, dentre elas a leitura e a escrita. Estes dois pilares sustentam a formação
escolar do aluno, e, consequentemente, determinam o bom desempenho do candidato no
momento da produção textual. Um dos critérios de avaliação presentes na matriz de
correção é observar como o candidato faz uso dos mecanismos linguísticos e
extralinguísticos, assim nossa análise também observará como estas escolhas interferem
e influenciam na produção de sentidos das produções em análise.
Observemos aqui, a leitura como um processo que promove diversos efeitos de
sentidos, entretanto é necessário levar em consideração tanto o sujeito-autor, sujeito-
leitor e as condições de produção da determinada materialidade linguística. É necessário
também enxergar a leitura como um mecanismo propriamente dito de interação e que se
dá na relação entre os sujeitos. E é nessa relação, que se apresentam as rupturas
ideológicas, pois as lacunas presentes no texto não serão preenchidas, caso os sujeitos
presentes nesse processo dialógico não pertençam à mesma formação discursiva. Para
Pêcheux (2010), um discurso deve ser analisado com base em uma rede memória, ou
seja, essa rede de memórias permitirá a produção dos efeitos de sentidos, já que isso só
é possível porque esse mesmo discurso já foi produzido em outro momento da história,
o que ele denominou de interdiscurso. Isto quer dizer que o interdiscurso refere-se à
máxima de que não há discurso inédito, ele já foi dito em uma dada condição de
produção, por um sujeito atravessado pela história. Então, o enunciado ressurge
3 O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) atua em nosso país desde 1998, com o objetivo de avaliar os alunos que estão concluindo a Educação Básica. No entanto, também podem participar do concurso candidatos que já concluíram o Ensino Médio. O ENEM é utilizado como pré-requisito para os alunos concorrerem a uma bolsa no Programa Universidade para Todos o (ProUni) e também como forma de ingresso para o ensino superior por quase 500 universidades.
ressignificando em outra época, produzindo um novo efeito de sentido. Já o
intradiscurso, Gregolin trata como “O nível da formulação que se refere ao que o autor
denomina “estado terminal do discurso”, onde os enunciados manifestam certa
coerência visível horizontal” (GREGOLIN, 2006, p.37). Seria, assim, a realização de
uma das possibilidades determinadas pelo interdiscurso.
Sabemos que o sujeito da Análise do Discurso não é neutro, pois, “não há
discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia” (ORLANDI, 1975 apud
PÊCHEUX, 2002, p17), assim, é impossível pensar em leitura e produção textual
“neutra”. O ENEM espera que o candidato diante da proposta de produção textual
escreva um texto dissertativo-argumentativo, que é a tipologia que permite o aluno se
impor em sua produção textual, ou seja, trazer suas “verdades” para dentro do seu texto.
Porém, é necessário e indispensável sustentá-lo por meio de argumentos convincentes.
Desta forma, podemos inferir que não existe texto “neutro” e sem traços ideológicos de
quem o escreve. No momento em que o sujeito aluno ocupa a função de autor, traz para
a materialidade do texto marcas que criam uma identidade singular para sua produção,
tal fato acontece em virtude do lugar deste sujeito/candidato no ENEM, que acaba sendo
influenciado por sua historicidade, cultura, contexto social e outros fatores.
Conforme Cavalheiro (2008) a função autor, para Foucault, nos possibilita a
distinção dos diversos “eus” que os indivíduos ocupam numa obra. Ou seja, a partir da
escrita, o sujeito externa os diversos posicionamentos discursivos presentes ao longo de
sua construção sócio-histórica-cultural. Segundo Foucault (2000, p. 42-43) “o autor é
uma produção ideológica na medida em que temos uma representação invertida de sua
função histórica real. O autor é então, a figura ideológica pela qual se afasta a
proliferação do sentido”, isto é, para o filósofo a função autor - o movimento de junção
dos discursos enquanto verdade. Portanto, podemos dizer que o autor traz para seu texto
“verdades” que são construídas com base em suas convicções ideológicas, que são
atravessadas pela história.
Já o sentido para Análise do Discurso não se apresenta de forma linear, mas se
materializa de diversas formas e direções. O sentido está até mesmo no silêncio – que
não seria um vazio, mas apenas outra forma de produzir discursos. E o que entendemos,
portanto por discurso? Seria “efeito de sentidos entre locutores” (PÊCHEUX, 1975, p.
20 apud ORLANDI, 2002). Portanto, os efeitos de sentidos não se materializam de
forma estática e sim, nas relações históricas, sociais e ideológicas.
Nesta perspectiva discursiva, retomamos o pensamento de que o sujeito em sua
função autor, possui várias formas de se manifestar discursivamente, uma delas é
representada pelo silêncio, que “Não é o nada, não é o vazio sem história. É silêncio
significante” (ORLANDI, 2002, p. 23). Desta forma, o silêncio se comporta como o que
pode ou não ser dito dentro do texto - é o que a autora compreende como “silêncio
local” que é visto e analisado como aquilo que é cesurado em um determinado espaço
do dizer. O silêncio produz muitos efeitos de sentido, dentre eles, a resistência, tanto no
ato da leitura como no ato da escrita.
Assim, as produções textuais dos alunos, em sua função autoria, “é o lugar da
manifestação das relações de força e sentidos que refletem os confrontos ideológicos”
(ORLANDI, 2002, p.21), visto que refletem a constituição dos sujeitos autores, pois
demonstram, com base nas suas formações discursivas, suas “verdades” a serem
defendidas de acordo com sua historicidade.
3 – Movimentos discursivos em produções textuais no Ensino Médio
Mediante estes aspectos levantados, o projeto “A leitura verbo-visual em textos
midiáticos: materiais didáticos para a sala de aula” buscou - conforme prescrevem os
documentos oficiais e as teorias do discurso - trazer para a sala de aula temáticas
contidas nos divergentes suportes midiáticos, com o intuito de despertar discussões nas
quais os alunos analisassem, criticamente, os efeitos de sentidos presentes nos textos
midiáticos, além de percebermos as múltiplas formações discursivas presentes nos
diversos sujeitos, pois de acordo com Orlandi (2002, p. 21) “Uma mesma coisa pode ter
diferentes sentidos para os sujeitos. E é aí que se manifesta a relação contraditória da
materialidade da língua e da história”.
Uma das temáticas expostas durante nossas intervenções, no 3º ano do Ensino
Médio, em uma escola pública de João Pessoa, foi “a espetacularização da violência na
mídia”, haja vista que é imprescindível que o aluno adquira um conhecimento crítico
acerca da maneira como a mídia brasileira expõe a violência. Após vários debates em
sala, os alunos foram convidados a produzirem um texto dissertativo-argumentativa
sobre o tema, tendo como textos motivadores um artigo de opinião e uma charge, além
da exigência das regras textuais-estruturais-gramaticais requeridas pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
Dentre as várias produções textuais orientadas durante nossos encontros,
selecionamos três que consideramos os aspectos discursivos significantes, tendo em
conta que as mesmas apresentam aspectos interessantes da função autoria desses três
sujeitos discursivos. Na primeira redação, em que transcrevemos para uma melhor
visualização, avaliaremos o silêncio e sua significância, pois para os analistas do
discurso, conforme Orlandi (2002, p. 23), “sempre se diz a partir do silêncio”.
Figura 1: Primeira redação sobre “A espetacularização da violência da mídia”.
Fonte: Acervo do projeto (PROBEX/2017)
A figura 1 representa uma produção textual na qual o aluno escreveu menos da
metade da quantidade de linhas permitidas pelo ENEM – apenas 8 (oito) linhas. Esse
silêncio concretizado nessas linhas em branco significam muito mais do que a ausência
de palavras, pois possui significância própria. Vejamos o que diz Orlandi sobre o
silêncio:
O silêncio não é pois, em nossa perspectiva, o “tudo” da linguagem. Ele é, sim, a possibilidade para o sujeito de trabalhar sua contradição constitutiva, a que o situa na relação do “um” com o “múltiplo”, a que aceita a reduplicação e o deslocamento que nos deixam ver que todo
Desde tempos remotos, populistas dominantes espetacularizavam a tragédia humana, para tirar proveito do interesse que o macabro despertam nas pessoas. Fatos violentos, reais ou fictícios, continuam sendo explorados como meio de atrair multidões, hoje, através da mídia, de modo efusivo. Para uns, são inequívocos os efeitos nocivos da violência social, no meio de comunicação da massa, nas interações sociais, restando discutir-se, entretando, a magnitude desses efeitos. Para outros, imputar a mídia a culpa pela violência social, não tem sido é desviar o foco do problema, para encobrir as verdadeiras causas.
discurso sempre remete a outro discurso que lhe dá realidade significativa. (ORLANDI, 2002, p.23)
Quando o aluno decide se manifestar através do silêncio, ele externa sua
formação discursiva, em “escrever” através do não-dito, mesmo em uma condição de
produção que exige do discente uma extensa produção textual.
O texto é uma materialidade linguística onde sua significação é dada no espaço
determinado pelos interlocutores. Portanto, de acordo com Orlandi (2002, p. 79) “(...)o
texto não se esgota em um espaço fechado, o sujeito e o sentido também são
caracterizados pela sua incompletude”. Tanto o discente responsável pela redação
acima, quanto os possíveis leitores de seu texto, são sujeitos em constante formação
sócio-histórica-discursiva, por isso a interpretação desta determinada produção textual
se dará a partir dos múltiplos sentidos incorporados nos sujeitos.
Enquanto membros de uma sociedade, vivemos em uma relação de micro-
poderes que vão desde o âmbito mais particular, até o mais distante das relações sociais.
Sabendo disso, a comunidade linguística impõe regras que moldam as nossas práticas
enquanto falantes. No tocante à produção dos discursos, vejamos o que diz Foucault:
Em toda sociedade, a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que têm com função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade. (FOUCAULT, 2004, p. 8-9)
Este silenciamento configura muitos efeitos de sentido, é como uma forma de
resistência em não querer entrar na ordem, ou seja, o aluno não produz a redação, por
alguns fatores, tais como: dificuldade de argumentação, devido à falta de familiaridade
com a escrita e eventos de oralidade, ou por não gostar do tema em questão. O professor
deve estar atento a tais manifestações que surgem no evento de escrita –
produção/materialização do ideológico.
Sabemos que os exames avaliativos são mecanismos de controle da produção do
discurso, tendo em vista que os mesmos impõem regras de escrita aos alunos, e aqueles
que escrevem algo não condizente ao que determina tais exigências são punidos com
notas baixas e uma possível não aprovação para adentrar ao ensino superior. Vejamos a
seguinte produção:
Figura 2. Segunda redação sobre “A espetacularização da violência da mídia”.
Fonte: Acervo do projeto (PROBEX/2017)
Ao lermos o texto do(a) aluno(a), verificamos certa impessoalidade ao longo do
texto, tanto pelo uso da terceira pessoa do singular (Ele), quanto pela escolha lexical
objetiva. No entanto, no começo da proposta de intervenção, nosso sujeito em análise,
faz uso da primeira pessoa do singular (Eu), além desse uso vir acompanhado de um
enunciado que denota uma posição bem subjetiva do locutor. (Gregolin (in
SARGENTINE e NAVARRO), 2004, p. 21) diz que o que transforma uma frase, uma
proposição, um ato de linguagem em um enunciado é a função enunciativa. Logo, o uso
do Eu e a seguinte proposição que o acompanha é muito mais que uma sequência de
classes gramaticais, significa uma memória discursiva do sujeito que o possibilitou de
se posicionar dessa maneira, mesmo em condições de produção que inibem essa
posição. Desse modo, reafirmamos a identificação deste sujeito com a temática em
questão. Ele vai se desnudando e deixando marcas de sua historicidade que é construído
socialmente, mediante discursos outros. Verifica-se uma questão de identificação e
processo de subjetivação a partir da escrita.
Na seguinte produção textual, observamos o uso de palavras, que pelo seu cunho
sentimental, manifestam a subjetividade do sujeito e o seu respectivo cunho sentimental
perante o tema “a espetacularização da violência na mídia”.
A crescente onda de violência, faz parte de nosso cotidiano, com a modernização dos meios de comunicação, as notícias se propagam de maneira instantânea (...). Noticiários esses que informam a população que na maioria das vezes estão almoçando; a morte de adolescentes e jovens vítimas de dependência de drogas, ou protagonistas de assaltos ou mortes que raramente é descoberto quem mandou e quem executou (...). Acredito que se voltasse o tempo em que a censura na tv existia, e casos de homicídios fossem tratados com mais seriedade isso diminuiria e também tem que partir da consciência de cada um (...).
Figura 3: Terceira redação sobre “A espetacularização da violência da mídia”.
Fonte: Acervo do projeto (PROBEX/2017)
A escolha repetida do vocábulo “raiva” corrobora com o sentimento, ao longo de
toda a produção textual, de revolta do sujeito diante do tema. Sabe-se que a violência
afeta constantemente a população brasileira, e a maneira como a mídia expõe esse tema
enfurece muitos espectadores, no entanto o uso desse tipo de argumentação. Também
percebemos essa posição do sujeito diante da escolha de palavras como “fascista” e
“proíbam”, o que demonstra um sentimento de intolerância do locutor à mídia brasileira.
Vejamos o que diz Orlandi:
Compreender o que é efeito de sentidos é compreender que o sentido não está (alocado) em lugar nenhum mas se produz nas relações: dos sujeitos, dos sentidos, e isso só é possível, já que sujeito e sentido se constituem mutuamente, pela sua inscrição no jogo das múltiplas formações discursivas (...). (ORLANDI, 2002, p. 20)
As formações discursivas se constituem a partir da relação interdiscurso-
intradiscurso, que revela a heterogeneidade discursiva dos interlocutores. Portanto, a
escolha da palavra “raiva” é significante neste determinado contexto, pois ressalta a
posição ideológica do aluno sobre o tema. A recorrência deste enunciado não deve ser
desprezada pelo professor, pois há a reafirmação de um lugar. O caráter psicanalítico do
sujeito objetiva externalizar algo além da materialidade verbal presente, no entanto, as
condições de produção não permitem que ele se posicione conforme o desejado.
4 – Considerações Finais
O brasileiro em si é acostumado com a violência assiste programas sensacionalistas com a finalidade de se informar e acaba vendo uma ridicularização da midia como se fosse algo banal. A violência divulgada pela midia pode acarretar uma influência de raiva na população ou até que criãças sejam criados por essa midia fascista que ache que a violência é algo normal. (...) A onipresença da violência nas informações acaba estimulando a raiva nas pessoas trazendo-a cometer delitos, é necessário leis que proibam a circulação dessas noticias em horários nobres (...).
Nossa análise procurou demonstrar a função autoria em três produções textuais,
com o tema “a espetacularização da violência na mídia” do gênero dissertativo-
argumentativo. O conceito de função autoria foi mudando ao longo dos tempos e a
subjetividade de quem escreve mostrou-se relevante às análises discursivas, pois
conseguimos perceber os efeitos de sentido presentes através de determinadas marcas
textuais.
Procuramos analisar, conforme as três redações, os traços do silenciamento
como materialidade significativa, o posicionamento discursivo no uso da primeira
pessoa do singular - utilizado em um gênero discursivo no qual deve prevalecer a
impessoalidade - além dos efeitos de sentido na escolha recorrente de algumas palavras
com denotações extremamente subjetivas, possuindo uma relação direta com o tema da
redação. Percebemos a constante relação de poder e resistência, dos três sujeitos
discursivos, diante do tema e das particularidades do gênero discursivo. Sendo assim, é
essencial que o(a) professor(a) perceba a significância desses traços discursivos, tanto
para a correção da redação, quanto para o processo de formação estudantil dos
discentes.
REFERÊNCIAS
FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. 7 ed. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2004._________________. O que é um autor. São Paulo: Paisagens, 2000. (Trad. José A. Bragança).GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na Análise do Discurso: diálogos e duelos. 2. ed. São Carlos: Claraluz, 2006. 220p.Orlandi, Eni Puccinelli. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. – 5. ed. – Campinas. SP: Editora da UNICAMP, 2002. __________________ . Análise de discurso: princípios & procedimentos. 10. ed. Campinas: Pontes, 2012. 100p. PÊCHEUX, M. O papel da memória. In: ACHARD, P. et al. O papel da memória. Tradução de José Horta Nunes. 3. ed. Campinas: Pontes, 2010.SARGENTINI, Vanice; NAVARRO-BARBOSA, Pedro (orgs.). Michel Foucault e os domínios da linguagem - discurso, poder, subjetividade. São Carlos: Claraluz, 2004.