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O DISCURSO PRESBITERIANO: A TEOLOGIA DE PRINCETON E SUA INFLUÊNCIA NA FORMAÇÃO DOS PASTORES NORDESTINOS Arival Dias Casimiro Mestre em Comunicação e Letras, licenciado em pedagogia, cursando o Programa de Doutorado em Língua Portuguesa na PUC-São Paulo, editor responsável da Revista de Educação Cristã e do Jornal Mediador, pastor da Igreja Presbiteriana de Pinheiros em São Paulo. 7 7

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  • O DISCURSO PRESBITERIANO: A TEOLOGIA DE PRINCETON E SUA

    INFLUNCIA NA FORMAO DOS PASTORES NORDESTINOS

    Arival Dias CasimiroMestre em Comunicao e Letras, licenciado em pedagogia, cursando o Programa de Doutorado em Lngua Portuguesa na PUC-So Paulo, editor responsvel da Revista de Educao Crist e do Jornal Mediador, pastor da Igreja Presbiteriana de Pinheiros em So Paulo.

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  • 159O discurso presbiteriano, p. 157-180Arival Dias Casimiro

    R E S U M OO presente trabalho visa detectar qual a matriz teolgica que determi-nou a formao dos ministros brasileiros, particularmente no Nordeste. Fixamo-nos historicamente nas obras do Rev. Boanerges Ribeiro; teolo-gicamente, em obras dos telogos de Princeton, de propriedade do Semi-nrio Presbiteriano do Norte. Usamos colees do jornal Norte Evanglico (1912-1923), cedidas pelo Rev. Enos Moura, cpia do livro The Princeton Theology (1812-1921), fornecida pelo Rev. Boanerges Ribeiro, e informa-es pessoais do princetoniano Rev. Oton Guanais Dourado, professor do seminrio P. do Norte, desde 1946.

    PA L AV R A S - C H AV EDiscurso presbiteriano; Teologia de Princeton; Formao de pastores; Calvinismo.

    A B S T R AC TThis research intends to detect the theological roots that determined Brazilian ministers` education, specially in the Northeast. We stablished as our historical mark, Rev. Boanerges Ribeiro`s works; the writings of Princetonian divines, owned by Seminrio Presbiteriano do Norte, were used as theological parameters. The newspaper Norte Evanglico`s collec-tion (1912-1923), were kindly made accessible by Rev. Emos Moura; a Xerox of The Princeton Theology (1812-1921), was made available by Rev. Boanerges Ribeiro. Finally, we had personal information from Rev. Oton Guanais Dourado, Princetonian and teacher at Seminrio Presbiteriano do Norte, since 1946.

    K E Y W O R D SPresbyterian discourse; Princetonian Theology; Ministers` education; Calvinism.

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    Aintroduo do Protestantismo no Brasil deu-se, de fato, com as misses denominacionais. Procedentes de igrejas norte-americanas, vieram os congregacionais (1855), os presbiterianos (1859), os metodistas (1867) e os batistas (1881). Todas essas misses eram unnimes quanto aos princpios centrais da Reforma, contudo diferentes na for-ma de governo e na sistematizao doutrinria.

    Os presbiterianos, caracterizados pelo governo demo-crtico-representativo e pela teologia calvinista com nfase na soberania de Deus, foram a primeira denominao protestan-te a atingir propores nacionais. J em 1888 os presbiteria-nos organizaram o Snodo da Igreja Presbiteriana do Brasil, que reunia igrejas do Nordeste, Centro-Leste e Sul do Brasil. Vinte missionrios norte-americanos e doze pastores nativos distribudos em igrejas que se espalhavam do Cear at o Rio Grande do Sul.

    Indiscutivelmente, a formao de pastores nativos foi uma das principais estratgias usadas pelos presbiterianos para promover o seu crescimento. O ato de formar implica possuir um discurso pedaggico: quem, a quem, onde, quando, o que e por que ensinar.

    O presente trabalho visa a detectar qual a matriz teo-lgica que determinou a formao dos ministros brasileiros, particularmente no Nordeste. Fixamo-nos historicamente nas obras do Rev. Boanerges Ribeiro; teologicamente, em obras dos telogos de Princeton, de propriedade do Seminrio Pres-biteriano do Norte. Usamos colees do jornal Norte Evan-glico (1912-1923), cedidas pelo Rev. Enos Moura, cpia do livro The Princeton Theology (1812-1921), fornecida pelo Rev. Boanerges Ribeiro, e informaes pessoais do princetoniano Rev. Oton Guanais Dourado, professor do Seminrio P. do Norte, desde 1946. A todos nossa gratido.

    1 . A T E O LO G I A D E P R I N C E TO N

    No incio do sculo XIX, pioneiros ocupavam o oeste norte-americano. Presbiterianos e congregacionais deseja-vam oferecer-lhes a religio evanglica. Porm esbarravam numa dificuldade: nenhuma das duas denominaes possua

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    recursos, de per se, para encetar tamanho empreendimento. A soluo foi aprovar um Plano de Unio.

    O Plano de Unio permitia livre eleio de pastores de qualquer das duas denominaes por igrejas locais da outra; admitia aos presbitrios, no apenas pastores congregacionais, mas delegados de igrejas locais mistas que no fossem presbteros ordenados. Tambm incentivou a fundao de sociedades voluntrias, no jurisdicionadas a qualquer das duas denominaes, para promoverem a Educao; as Misses, tanto Nacionais como Estrangeiras; ensejou a criao da Sociedade Bblica Americana (1816) e organizou programas comuns para as Escolas Domini-cais das duas denominaes (Ribeiro, 1991, p. 193).

    Mas logo surgiu um srio problema doutrinrio. O arminianismo, esconso na nomenclatura de teologia da Nova Inglaterra, se infiltrou e se alastrou em conclios e Igrejas Presbi-terianas locais. A tese era a mesma: a depravao parcial do ho-mem e seu livre poder decisrio para a salvao. Houve, ento, uma reao organizada dos calvinistas ortodoxos. Eles criam na depravao total do homem e na sua inabilidade para a salvao. Como resultado, criaram o Seminrio de Princeton, em 1812.

    Um dos objetivos do Seminrio era a formao de mi-nistros que pudessem propagar e defender a f crist autntica, nos moldes da Confisso de F de Westminster, dos Catecis-mos (Maior e Menor) e do Plano de Governo e Disciplina da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos da Amrica.

    A partir de ento, passaram a existir duas correntes bem distintas de teologia. A primeira, denominada Nova Escola, composta por congregacionalistas e presbiterianos no cal-vinistas. A segunda, chamada Velha Escola, composta por presbiterianos de estirpe escocs-irlandesa (Ribeiro, 1987, p. 185-186), calvinistas ortodoxos.

    Franois Turretini (1623-1687), pastor e telogo calvi-nista, foi a matriz teolgica de Princeton. A sua obra intitulada Instituto Teological Elenctias foi o primeiro livro-texto usado em Princeton, somente substitudo em 1870 pela Teologia Sis-temtica, de Charles Hodge (Noll, 1983, p. 27-30).

    Em maio de 1812, a Assemblia Geral da Igreja Pres-biteriana dos Estados Unidos elegeu Archibald Alexander (1772-1851) o primeiro professor do Seminrio de Princeton.

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    A cerimnia de inaugurao foi em 12 de agosto de 1812. Na oportunidade, A. Alexander pregou um belssimo sermo em Joo 5.39, intitulado Examinais as Escrituras (Noll, 1983, p. 72-91).

    Inegavelmente, durante mais de um sculo (1812-1921), o Seminrio de Princeton foi o principal centro de formao, defesa e difuso do calvinismo (velha escola) nas Amricas. Archibald Alexander (1772-1851), Charles Hodge (1797-1878), Archibald Alexander Hodge (1823-1886) e Benjamin B. Warfield (1851-1921) foram os mestres formu-ladores da Velha Teologia de Princeton. As nfases foram as da tradio reformada:

    Deus criou a humanidade boa; na Queda os seres humanos incorreram na ira de Deus e se fizeram culpados; o pecado de Ado imputado a toda a raa, que merece condenao; o peca-dor no dar a Deus a honra devida a menos que seja salvo pela soberana graa de Deus; o amor de Deus se exprime no Pacto de Redeno, entre o Pai e o Filho, e no pacto da Graa, entre Deus e seu povo; o amor de Deus que traz salvao os eleitos remanescentes da Queda, mas podem unir-se luta pelo reino de Deus (Noll, 1983, p. 28).

    A Teologia de Princeton modelou a dos missionrios pioneiros do Presbiterianismo no Brasil. Por intermdio deles, essa mesma teologia modelou os pastores nativos e, conseqentemente, o presbiterianismo nacional. Vejamos os principais elementos da Teologia de Princeton.

    1 . 1 . A AC E I TA O DA I N S P I R A O P L E N A DA B B L I A E A S UA I N FA L V E LAU TO R I DA D E

    A Teologia se divide em natural e revelada. Os prin-cetonianos consideravam a Bblia como a fonte da teologia revelada. A Bblia a revelao escrita de Deus. Nas palavras de Charles Hodge (1904, vol. I, p. 152):

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    O Antigo e o Novo Testamento so a Palavra de Deus, escrita sob a inspirao do Esprito Santo. Conseqentemente, infa-lvel, livre de todo erro quer de doutrina, ato ou preceito; a suprema autoridade divina em todos os assuntos de f e prtica. Ela compreende toda a revelao sobrenatural de Deus, o qual designou-a para ser o sistema de f e prtica da Sua Igreja. O seu contedo suficientemente claro para o entendimento das pessoas, que usando os recursos ordinrios e a ajuda do Esprito Santo, compreendero todos os assuntos necessrios f e prtica, sem a necessidade de qualquer intrprete infalvel.

    Por inspirao entende-se a influncia divina exercida sobre os escritores da Bblia, preservando-os de erros. Esta se estende de forma plenria e verbal a todas as partes da Bblia. Difere da revelao. O alvo da revelao a comunicao do conhecimento, enquanto o da inspirao assegurar a infali-bilidade no ensino. A infalibilidade e a divina autoridade da Bblia residem no fato de ser ela a Palavra de Deus; e ela a Palavra de Deus por causa da inspirao do Esprito Santo (Hodge, 1904, vol. I, p. 153-155).

    O presbiterianismo no Brasil, inclusive no Nordeste, foi estabelecido sobre dois moldes: o da reforma na religio ambiente, que resulta na adeso de catlicos ao protestantis-mo; e o missionrio, que consiste na importao de sistemas teolgicos e estruturas de igrejas da Europa e dos Estados Unidos. Em ambos os casos, a Bblia Sagrada era usada como fundamento e rbitro final. Os missionrios e os pregadores nativos distribuam Bblias, explicavam e expunham textos b-blicos e entravam em qualquer polmica, escrita ou oral, com a condio de que as posies em confronto fossem provadas pela Bblia (Ribeiro, 1991, p. 197).

    A Bibliografia de Princeton tornou-se a Bibliologia do Presbiterianismo brasileiro. O Rev. Jernimo Gueiros, minis-tro presbiteriano ordenado em 15 de setembro de 1901, pelo Presbitrio de Pernambuco, considerado o campeo da orto-doxia, afirma (1951, p. 250-251):

    A Bblia o conjunto de 66 livros, produto da cultura humana e da inspirao divina. A doutrina da inspirao pressupe o reconhecimento das seguintes verdades:

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    1. Existe Deus e ele uma pessoa onisciente e onipotente, capaz de intervir no curso ordinrio da natureza, para os altos fins do seu governo moral entre os homens.2. O homem um ser cado e incapaz de, por si mesmo, atingir aquela perfeio para qual o compelem suas tendncias superio-res, mas capaz de receber uma revelao extraordinria de Deus.3. So historicamente verdadeiros os livros que formam o c-non das Santas Escrituras.

    importante salientar que o Rev. Jernimo Gueiros foi professor de Teologia Sistemtica no Seminrio Presbiteriano do Norte, a partir do ano de 1907. O seu livro-texto foi Esbo-os de Teologia, de A. A. Hodge, traduzido para o portugus em 1895 por F. J. C. Schneider.

    1 . 2 . O M TO D O I N D U T I VO

    H vrios mtodos pelos quais se pode elaborar um sis-tema de teologia: especulativo ou dedutivo, mstico, indutivo, fenomenolgico, existencial etc. Princeton elegeu o indutivo para a sua sistematizao teolgica. Baseados na Filosofia Escocesa do Senso Comum, os princetonianos defenderam a possibilidade de se chegar verdade por meio da observao emprica e do raciocnio indutivo. Segundo eles, a teologia uma cincia que coleciona os fatos.

    A Bblia no um sistema de teologia, como a natureza no um sistema de qumica ou de mecnica. Encontramos na natureza os fatos que o cientista qumico ou mecnico ter de estudar, para deles concluir as leis que os regem. Tambm a Bblia contm as verdades que o telogo coligir, autenticar, ordenar e exibir na relao interna que mantm uns com os outros (Hodge, 1904, p. 61).

    Se o mtodo indutivo-emprico o da cincia natural, logo dever ser tambm o da teologia. A Bblia para a teolo-gia o que a natureza para o homem da cincia. Ela contm todos os fatos da teologia. Cabe, ento, ao telogo coletar, juntar e classificar os fatos bblicos, a fim de elaborar um siste-ma harmnico e coerente de teologia.

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    No Brasil, esse mtodo foi bastante utilizado, no para formular teologia nova, mas para elaborar sermes e defender teses polmicas.

    1 . 3 . O E N S I N O DA C I N C I AS U B O R D I N A D O T E O LO G I A

    Alm das questes denominacionais, o protestantismo norte-americano sofria com os ataques do liberalismo. A evoluo darwinista, a crtica bblica europia e o idealismo germnico tentavam desestabilizar a ortodoxia protestante (Cairns, 1984, p. 406-407). Os liberais negavam o sobrenatu-ralismo dos milagres de Jesus, o pecado original e o sacrifcio vicrio de Cristo. Horace Bushnell (1802-1876), pastor con-gregacional, exerceu uma forte influncia na educao, por meio de sua obra Christian Nurture (1846), em que defendia a idia de que a criana s poderia crescer na graa num am-biente religioso (Cairns, 1984, p. 407). Tambm ficou conhe-cido como o grande defensor da teoria moral da expiao.

    Com o apoio dos telogos Nova Escola, cientistas comearam a negar o ensino bblico em nome de suas desco-bertas. Em resposta, os telogos Velha Escola defenderam o ensino das cincias naturais como parte integrante da for-mao pastoral, com objetivos apologticos. Princeton ento, oficialmente, subordinou o estudo das cincias teologia. A. A. Hodge (1949, p. 17-19) sustenta o ensino das cincias au-xiliares como um captulo no estudo da teologia. As cincias auxiliares so: Histria Universal, Arqueologia, Etnologia, Filosofia Comparada, Cincia da Religio Comparada, Filo-sofia, Esttica, Cincias Fsicas e Estatstica.

    razovel concluir que por essa razo as cincias recebe-ram nfase na formao dos pastores brasileiros:

    Ao iniciar-se nossa Reforma, a Teologia de Princeton trouxe a Bblia infalvel, no quadro de referncias emprico-indutivo. Por isso mesmo, as cincias receberam nfase no preparo dos pastores, e ao abrir-se o Seminrio no Rio, com colees de comentrios da Bblia chegaram instrumentos para o ensino de astronomia e fsica, cincias entregues a Schneider, junta-mente com as matemticas (Ribeiro, 1991, p. 199).

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    No Nordeste no foi diferente. O ensino teolgico era dado simultaneamente ao das cincias. Os pastores preparados sob a tutoria dos missionrios J. R. Smith, G. Henderlite e G. Butler, alm das disciplinas Escrituras Sagradas, Teologia, Histria Eclesistica e Grego, estudavam Ingls, Latim, Portu-gus, Geografia e Geologia. Martinho Oliveira, fundador da Escola Teolgica em Garanhuns, ensinava, alm da Teologia de Hodge, Ingls, Francs, Latim, Portugus, Trigonometria, Geologia, Msica, Aritmtica e Geografia.

    1 . 4 . A P R E O C U PA O A P O LO G T I C A

    A Teologia de Princeton surgiu como uma reao doutri-nria de calvinistas contra arminianos. Velha Escola versus Nova Escola. Portanto, natural que se caracterizasse tambm como uma apologia doutrinria. Em Princeton, a Apologtica sempre foi considerada um departamento ou uma disciplina da Teolo-gia, a qual se responsabilizava em provar a existncia de Deus e a possibilidade de Seu conhecimento (Hodge, 1949, p. 17-19).

    Benjamin Warfield (1932, p. 13) dividiu a apologtica princetoniana em cinco partes:

    1) Apologtica Filosfica, responsvel em defender a exis-tncia de Deus, como ser espiritual, criador, preservador e governador de todas as coisas (Tesmo).

    2) Apologtica Psicolgica, pronta a defender a natureza religiosa do homem e seu senso religioso. Isso envolve Psicologia, Filosofia, Fenomenologia, Religies Compa-radas e Histria das Religies.

    3) Apologtica do Sobrenatural, defensora da ao sobrena-tural de Deus na Histria, a Sua maneira de se relacio-nar, governar e se auto-revelar ao homem.

    4) Apologtica Histrica, defensora da origem divina do cristianismo como religio revelada.

    5) Apologtica Bibliolgica, defensora da Bblia, sua origem divina (inspirao), sua natureza (revelao escrita) e seus autgrafos.

    Ser um apologeta da f crist um dever, segundo Prin-ceton. A formao pastoral tambm um preparo para a defe-

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    sa do ensino bblico autntico. O Presbiterianismo nacional assimilou bem a apologtica. No nordeste, a f foi defendida de vrias formas. Um destaque para a publicao de jornais. impressionante a quantidade de jornais impressos de 1873 a 1910: Salvao de Graa, 1875, Recife; O Evangelista, 1885, Macei; O Pastor, 1893, Natal; Evolucionista, 1894, Manaus; O Sculo, 1895, Natal; Norte Evanglico, 1909, Garanhuns. Todos foram instrumentos de propagao e defesa do Evan-gelho. Lendo os jornais Norte Evanglico, entre 1912-1923, chama-nos a ateno a quantidade de artigos combatendo o catolicismo romano, o espiritismo, o adventismo ou sabatismo e a heresia pentecostal recm-chegada dos Estados Unidos1.

    Entre os pastores, o grande destaque foi o pernambuca-no Jernimo Gueiros. A Eucaristia, a Pedra Fundamental da Igreja, a Bblia e a Cincia, Deus revelado, o Espiritismo Ana-lisado, a Heresia Pentecostal e outros, foram alguns trabalhos escritos no campo da controvrsia religiosa.

    1 . 5 . R E TO R N O AO C O N F E S S I O N A L I S M OR E F O R M A D O

    A Teologia de Princeton foi erigida sobre a tradio Re-formada. O calvinismo, a Confisso de f de Westminster e o Dogmatismo europeu do sculo XVII foram os componentes daquela tradio. O calvinismo ensinado foi segundo os mol-des de F. Turretini, que se baseava no Catecismo de Calvino, na Segunda Confisso Helvtica (1566) e nos Cnones de Dort (1619) (Noll, 1983, p. 29).

    Turretini refutou Armnio quanto ao livre arbtrio; Amyrant, quanto natureza da expiao; Lutero, quanto aos sacramentos; os catlicos romanos e os racionalistas, quanto autoridade da Bblia. Forneceu, tambm, subsdios conside-rveis a Charles Hodge para a elaborao de sua Teologia Sis-temtica, principalmente nos assuntos da Trindade, do Pacto, da Obra de Cristo, do Poder do Esprito Santo e da Ordem de Salvao (Noll, 1983, p. 29-30).

    O estudo dos sistemas doutrinrios (socinianismo, arminianismo, calvinismo etc.) e dos Credos e Confisses

    Damos especial destaque para os artigos escritos por Antonio Victalino e Sinzio Lyra.

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    (Nicia, Calcednia, Westminster etc.) era introdutrio ou, s vezes, simultneo ao estudo da teologia. A. A. Hodge estabele-ce isso nos seus Esboos de Teologia, captulos 6 e 7.

    O retorno ao confessionalismo reformado serviu para reforar o sentimento denominacional. O presbiterianismo implantado no Brasil a partir de 1859 comprova isso. Os primeiros livros publicados pelos pioneiros, para servir de referncia na consolidao do Evangelho no Brasil, atendiam a seu sistema denominacional de doutrina e governo: Histria Eclesistica, T. Wharey, 1873; Eptome da Forma de Governo e Disciplina, 1874; Confisso de F, 1976; Esboos de Teologia, A. A. Hodge, 1895 (Ribeiro, 1987, p. 10). razovel aceitarmos a tese de que a misso evanglica no Brasil foi uma tentativa de reformar o catolicismo. Entretanto, o modelo alternativo apresentado pelos missionrios era um transplante de sua de-nominao norte-americana.

    1 . 6 . A N E C E S S I DA D E D E U M AE X P E R I N C I A R E L I G I O S A

    Os princetonianos, que eram considerados pelos oposi-tores como escolsticos e racionalistas, surpreendentemente, defenderam o valor da experincia religiosa. Charles Hodge (1904, p. 16) definiu a experincia religiosa como o ensino interno do Esprito Santo. A verdade teolgica constituda pela afirmao bblica, que captada pelo intelecto, e pela certeza interna, que testemunho do Esprito Santo (Hodge, 1904, p. 16).

    Charles Hodge afirma:

    Argumentao apenas no produz convico ntima da verdade moral [...] dependem de nosso sentimento religioso as doutri-nas que aceitaremos como verdadeiras [...]. As reais opinies de um homem so expresses de seu carter [...]. O sistema arminiano a expresso natural de sentimentos menos marca-dos por grande reverncia a Deus, opinies menos humilhantes do homem e, em geral, menor importncia e profundidade do carter religioso (Noll, 1983, p. 108 et seq.).

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    O presbiterianismo veio para o Brasil sob os moldes de Princeton e pela motivao dos reavivamentos espirituais. Simonton, Blackford, Schneider, Chamberlain, missionrios pioneiros, praticamente saram do reavivamento para a Mis-so no Brasil. Em nenhum deles observamos o dogma sendo transformado em objeto de f. Por influncia dos reaviva-mentos, eles criam numa experincia pessoal de converso. Essa experincia era atribuda visitao do Esprito sobre o indivduo, dando-lhe conscincia de pecado e necessidade da graa de Deus:

    Durante o reavivamento em Princeton senti-me interessado e esforcei-me para aumentar meu interesse no amor do Salva-dor. Mas logo o sentimento passou e fiquei como antes, ou pior. Agora, quando as reunies tiveram incio e eu vi outros tratando da salvao de sua alma imortal, decidi, confiado nas promessas da Palavra de Deus, fazer um esforo honesto; se fracassar, estou liquidado. No me sinto desusadamente emocionado, e a prova de que tenho que o Esprito Santo est trabalhando em mim o fato de que me levou a esta resoluo [...]. Esperei quieto durante muito tempo para ser convertido; agora resolvi, na fora por Deus prometida, marchar em frente e me esforar para servi-lo, brilhe ou no a luz em meu cami-nho; vou confessar diante dos homens meu desejo e resoluo de abandonar o mundo e procurar participar no sangue do Salvador [...] (Simonton, 1982, p. 90 ss.).

    Talvez encontremos aqui a base para uma prtica ino-vadora instalada na nascente igreja evanglica brasileira: a converso, o batismo e a pblica profisso de f como pr-requisitos comunho da Santa Ceia.

    2 . A I N F LU N C I A DA T E O LO G I AD E P R I N C E TO N N A F O R M A O

    D O S PA S TO R E S N O R D E S T I N O S

    Doze anos aps a chegada do Rev. A. G. Simonton ao Brasil, o presbiterianismo chegou ao Nordeste. A Bahia teve

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    precedncia, recebendo o primeiro missionrio, o Rev. C. J. Scheneider, em 1871. A partir da Bahia, o objetivo seria alcanar o Norte e o restante do Nordeste. Porm o presbi-terianismo abriu caminho para o norte de Minas e oeste da Bahia. Somente com a chegada de J. R. Smith a Pernambuco, em 1873, o trabalho ganhou vulto e proliferou pelo Norte e Nordeste, alcanando o seu objetivo inicial.

    Os missionrios que vieram para c eram todos da Velha Teologia de Princeton. Na sua maioria, procedentes da Igreja do Sul, Junta de Nashville. A principal estratgia usada pelos pioneiros foi a preparao de ministros nativos. O Rev. Simonton (1982, p. 207-215), pregando sobre Os meios necessrios e prprios para plantar o reino de Jesus Cristo no Brasil (lido perante o Presbitrio no Rio de Janeiro no dia 15 de julho de 1867), afirma:

    A vista da extenso do Brasil e das circunstncias em que a igreja evanglica se acha, como se h de achar ministros em nmero suficiente para que em toda a parte haja quem reparta o po da vida eterna? questo grave e difcil. Para Deus nada impossvel. Ele sempre acha os instrumentos de que carece. Se ele os quer de longe, no lhe faltar meios para traz-los. Porm a escolha e a vocao de Deus no tornam desnecessrios os nossos esforos. Se estes obreiros vm de pases estrangeiros so obrigados a aprender uma nova lngua e acostumar-se aos usos duma nova terra. Esse fato de per si faz crer que a maior parte dos obreiros no Brasil tm de ser do pas [...].

    Como escreveu o Rev. Oton G. Dourado (outubro, 1974), diversas etapas do preparo teolgico de ministros presbiterianos no norte do Brasil esto bem delineadas his-toricamente. So quatro etapas: (1) 1873-1899 preparo teolgico por iniciativa dos pioneiros no regime de tutoria; (2) 1899-1919 preparo teolgico na Escola Teolgica de Garanhuns, PE; (3) 1921-1923 preparo teolgico no Ins-tituto Ebenzer, em Recife, PE; (4) 1923 at os nossos dias preparo teolgico no Seminrio Presbiteriano do Norte.

    Do ponto de vista teolgico, a histria da formao pastoral presbiteriana est dividida em duas etapas: (1) 1873-1965, perodo em que predominou claramente a Velha Teolo-

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    gia de Princeton; (2) 1965 at hoje, com uma linha teolgica evanglica evangelical, com destaque para a teologia dogmti-ca de L. Berkhof, professor do Calvin Theological Seminary, EUA.

    Dentro do objetivo que propusemos nesta monografia, analisaremos o perodo em que a teologia de Princeton pre-ponderou, 1873-1965, isto , dos pioneiros (Smith e Hen-derlite) at Samuel Falco. Esclarecemos que o Rev. Joo Dias de Arajo foi substituto do Rev. Samuel Falco, fato que de certa forma esclarece em parte a mudana na linha teolgica do Seminrio do Norte.

    2 . 1 . FA S E D O S P I O N E I R O S ( 1 8 7 3 - 1 8 9 9 )

    O preparo de ministros nacionais surge, logo de incio, por meio da contribuio pessoal dos pioneiros. Procedente de Kentucky, EUA, John Rockwell Smith chegou ao Brasil em 1873. Graduado na Universidade de Virgnia e no Union Theological Seminary de Richmond, era de formao prince-toniana Velha Escola. Foi influenciado por Robert L. Dabney, professor de Teologia Sistemtica do Union, de 1853 a 1883.

    A primeira etapa do seu trabalho no Brasil se deu no Nordeste. Tendo a cidade do Recife como seu quartel general durante dezenove anos (1873-1892), Smith foi o pioneiro do presbiterianismo no Norte e Nordeste. Aqui realizou grandes feitos: (1) organizou as primeiras igrejas: Primeira do Recife (1878) e Goiana (1880); (2) editou o primeiro jornal evan-glico e doutrinrio, intitulado Salvao de Graa (1875); (3) formou, sob o regime de tutoria, os primeiros pastores nordestinos: Joo Batista de Lima, Belmiro de Arajo Cesar, Jos Francisco Primnio (ordenados em 1887), W. C. Porter e Juventino Marinho (ordenados em 1889); (4) organizou o Presbitrio de Pernambuco (1888), com nove igrejas (Re-cife, Goiana, Joo Pessoa, Macei, Fortaleza, So Luiz, Po de Acar, Mossor e Monte Alegre), seis ministros (Smith, Wardlaw, Butler, Cesar, Lima e Primnio) e trs candidatos ao ministrio (Porter, J. Marinho e M. A. Guimares); (5) orga-nizou a The North Brazil Presbyterian Mission (1884), com os

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    missionrios W. C. Porter, Joseph Gausa, De Lacy Wardlaw e George Butler (Cortez, dezembro, 1956, p. 9).

    A formao dada por Smith aos primeiros pastores nor-destinos foi sob o regime de tutoria. Ele exercia a funo de professor-orientador de todas as disciplinas: Bblia, Vernculo, Teologia, Histria Eclesistica, Ingls e Grego. A durao do curso era de quatro anos. O local das aulas foi a sua prpria re-sidncia: rua do Imperador, 71, 1. andar, Recife, PE. A linha teolgica do curso era Velha Escola, a mesma que ele havia recebido no Union.

    Em depoimento pessoal, um dos seus alunos, Rev. Ju-ventino Marinho (dezembro, 1956), afirma:

    Deixei o comrcio e fui estudar como candidato ao ministrio, no Recife, por conta da Misso, tendo como professor o Dr. J. R. Smith (1886), com quem estudei o grego, teologia e outras matrias durante trs anos, de 1886-1888. Ao quarto ano, porm, quando devia terminar o curso teolgico, foi-me neces-srio residir em Fortaleza, Cear [...]. Como, entretanto, termi-nar o curso na ausncia do professor? A soluo deste problema encontrei nos livros a que recorri, autores reconhecidamente ortodoxos: Alexander Smith Paterson, Archibald A. Houdge, Fracis L. Patton, R.L. Dabney e T. C. Blake, trs destes indica-dos pelo Dr. Smith [...].

    Em 1892, por determinao do Snodo do Brasil, Smith deixa o Recife para ensinar no Seminrio do Sul (Nova Fribur-go?). At 1916, ele lecionou vrias disciplinas, com destaque para Teologia Sistemtica:

    Smith lecionou Teologia Sistemtica, alm de vrias outras disciplinas, fra (sic) aluno de Dabney, no Union, da Virgi-nia. Formou a intelligenzia presbiteriana brasileira sada do Seminrio em So Paulo e em Campinas [...] (Ribeiro, 1991, p. 204).

    O livro-texto usado por Smith como professor de Teolo-gia Sistemtica foi Syllabus and Notes of the Course of Systematic and Polemic Theology, de R. L. Dabney. Essa obra caracteriza-se como um roteiro de leituras e discusses teolgicas, que vo

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    da existncia de Deus at o conceito de relao Igreja-Estado. A sua matriz teolgica foi a Confisso de F de Westminster e a teologia Calvinista de Turrentini. A sua natureza era didti-ca, polmica e prtica. A partir dela se desenvolveu um novo mtodo de estudo, em que o professor orientava e o aluno aprendia:

    O sistema consiste na recitao (pelos estudantes) de lies que estudaram nos livros de texto, principalmente a Confisso de F e a Teologia Elenctita de Turrentini, de instrues e expla-naes orais pelo professor, de preparao e leitura de trabalhos escritos pelos alunos sobre tpicos em estudo, e, finalmente, reviso total por sabatinas orais. A inteno combinar, na medida do possvel, a livre assistncia do professor com o cultivo da capacidade da memria, comparao, julgamento, raciocnio e expresso do aluno, atravs de pesquisas feitas pe-los mesmos e pela solidificao dos conhecimentos adquiridos, por repeties de seus pontos de vista (Dabney, 1885, notas ao leitor).

    Portanto, diante do exposto, razovel concluirmos que os primeiros pastores formados no nordeste receberam a influncia Velha Escola. A razo bvia: a reproduo da formao recebida pelos missionrios.

    2 . 2 . A E S C O L A T E O L G I C A D EG A R A N H U N S ( 1 8 8 9 - 1 9 1 9 )

    Com a retirada do Dr. Smith para o Seminrio do Sul em 1892, entra em cena o Dr. Butler. Aps ter fundado a Igre-ja de Garanhuns (1895), o apstolo do serto busca uma so-luo para o problema da preparao dos pastores nordestinos. Ele mesmo e sua esposa, Da. Rena Butler, iniciaram a prepa-rao de dois ministros, Jernimo Gueiros e Joo dos Santos, ministrando-lhes aulas de ingls e geografia. Para ampliar esse preparo, convocou de Po de Acar, AL, o Rev. Martinho de Oliveira. Em 1899, Martinho organizou a Escola Teolgica, que seria mais tarde o Seminrio Presbiteriano. do Norte.

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    Quem foi Martinho de Oliveira? Foi um pastor, orador, evangelista, professor e empreendedor. Recebeu a sua forma-o do Rev. George Henderlite, na poca, pastor da Igreja em Joo Pessoa. Foi ordenado ao ministrio em 1896, pelo Presbi-trio de Pernambuco. Antes de ir para Garanhuns, pastoreou a Igreja de Po de Acar, AL.

    Que fez Martinho de Oliveira? Fundou a Escola Teol-gica de Garanhuns. O seu objetivo era estabelecer, no Norte do Brasil, um seminrio sobre bases nacionais e que atendesse realidade da Igreja brasileira (Ferreira, 1960, p. 401 ss.).

    A sua teologia era Velha Escola. Entretanto, os pastores eram preparados para atender realidade brasileira:

    claro que os homens que Martinho prepara no seriam ca-pazes de tomar conta da segunda igreja de Richmond ou da primeira igreja de Nashville, mas certo que sero pastores de congregaes ignorantes e pobres [...]. Alm do mais, Marti-nho os educa em linhas nativas, isto , no procura fazer deles norte-americanos ou ingleses. O princpio fundamental desta orientao que o moo, durante seu curso de seminrio, no deixa a farinha de mandioca, nem as redes nordestinas. Educa-dos para viver em meio diferente daquele em que eles tm de servir (Ferreira, 1960, p. 404).

    Martinho Oliveira morreu em 1903, de forma prema-tura e inesperada.

    Dois dias aps a morte de Martinho, George Henderlite pregou na Igreja de Garanhuns:

    Morreu Martinho Oliveira e seu corpo est num caixo no ce-mitrio, os princpios que ele representou no morreram. No morreu o evangelho [...]. No morreu o seminrio. O falecido irmo com grandes sacrifcios lanou os alicerces, e ser nosso trabalho erigir o edifcio segundo os planos que ele deixou (Ma-rinho b, 29.11.1912).

    Em 1903, G. Henderlite deixa a Igreja de Joo Pessoa e se transfere para Garanhuns, assumindo a direo do semi-nrio. Em 1905 apresentou ao Presbitrio de Pernambuco quatro homens para a ordenao: Mota Sobrinho, Antonio Almeida, Benjamin Marinho e outro no identificado.

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    Dr. George Henderlite era mestre em teologia e exegese bblica. A misso The North Brazil Presbyterian Mission, publicou, em 1954, Notas sobre as Epstolas de So Paulo aos Romanos e aos Glatas, de sua autoria. Nessa obra, observa-mos claramente que ele era de teologia Velha Escola e defensor do pr-milenismo. Na formao que deu aos alunos do semi-nrio em Garanhuns, o seu testemunho o seguinte:

    A preparao dos estudantes prossegue atravs do ano. Fizeram o melhor curso possvel, dadas as circunstncias. Todos tiveram de dominar a teologia de Alexandre Hodge. Conhecem quase de cor o livrinho do Dr. Reed O Evangelho de Calvino. Tomando os Esboos de Histria da Igreja como sntese e orientao l se foram por todo o curso que lhes foi imposto. Ficaram, afinal, com o livro traduzido e cheio de notas. No deixaram de fazer anlise de metade dos livros da Bblia: Ma-teus, Atos, Romanos, Glatas, Hebreus e Apocalipse, reunindo o melhor material de comentrios em ingls (Ferreira, 1960, p. 79).

    Durante vinte anos, 1899-1919, a Escola Teolgica ou o Seminrio de Garanhuns foi responsvel pela formao dos pastores presbiterianos no Norte e Nordeste do Brasil. Em ja-neiro de 1919, o Presbitrio de Pernambuco autorizou a trans-ferncia da Escola Teolgica para o Recife. Assim se encerra mais uma etapa da histria da formao pastoral.

    2 . 3 . I N S T I T U TO E B E N Z E R( 1 9 2 1 - 1 9 2 3 )

    Durante o ano de 1920 a Escola Teolgica entrou em recesso. Em 1921, o Rev. Antonio Almeida, recm chegado do Union Theological Seminary de Richmond, Virgnia, fundou em Recife o Instituto Ebenzer, ao qual foi anexada a Escola Teolgica. A primeira Igreja do Recife, pastoreada pelo Rev. Antonio Almeida, organizou a Liga Patrocinadora do Instituto Ebenzer, com a finalidade de levantar recursos para a manuten-o do Instituto Ebenzer (Norte Evanglico, 21.01.1921).

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    O Instituto Ebenzer caracterizou-se por sua natureza interdenominacional. Foram seus professores Dr. George Henderlite, Dr. Antonio Almeida, Rev. James Haldane, pastor congregacional, Rev. Jernimo Gueiros e Miss Eliza Reed. O corpo discente do Instituto no ano de 1922 contava com 22 alunos: 2 da Igreja Presbiteriana Independente, 5 da Igreja Congregacional e 15 da Igreja Presbiteriana do Brasil (Norte Evanglico, 11.05.1922).

    Apesar do pouco tempo de vida, o Instituto Ebenzer manteve a linha teolgica dos seus idealizadores: Velha Escola. O Rev. Antonio Almeida era um exegeta (Antigo Testamento), telogo, pastor, escritor e mestre por excelncia e vocao. Nas suas obras: Anotaes ao Livro de Gnesis, O Livro de Daniel, A Doutrina Bblica do Esprito Santo, Anotaes ao Livro Levtico (todas publicadas em portugus pela Editora Dois Irmos, Rio de Janeiro), Manual de Hermutica Sagrada e Curso de Doutrina Bblica (publicadas pela Casa Editora Presbiteriana, So Paulo), encontramos a Velha Teologia de Princeton. Nos comentrio que faz sobre a Confisso da F e os Catecismos Maior e Breve, o Rev. Antonio Almeida (1985, p. 79 et seq.) assume posio pr-milenistas adaptadas de C. I. Scofield:

    Sabemos, entretanto, que sua vinda ser pr-milenria (sic), isto , preceder o reinado de mil anos de justia e paz de que nos falam os profetas, tanto do Antigo Testamento como do Novo.

    Ele acreditava na restaurao da nao de Israel antes do milnio, em dois estgios da Segunda Vinda de Cristo e que a Igreja teve incio somente no Pentecostes (Almeida, 1985, p. 116).

    De fato a sua escatologia no compromete o restante da sua teologia. Pelo contrrio, serve para revelar a influncia que o Dr. George Henderlite (pr-milenista) exerceu sobre sua formao teolgica.

    Em 1923 o Presbitrio de Pernambuco extinguiu o Ins-tituto Ebenzer, aprovando o plano do Seminrio Evanglico do Norte, em Recife. O curso preparatrio seria feito no Co-lgio 15 de Novembro, que funcionava em Garanhuns desde 1908, mantido pela Misso de Nashville.

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    2 . 4 . S E M I N R I O P R E S B I T E R I A N OD O N O RT E ( 1 9 2 3 - 1 9 6 5 )

    Em 1923 o Rev. Antonio Almeida apresenta um novo plano de organizao para o Seminrio aos ministros pres-biterianos nos limites do snodo Setentrional. Em fevereiro de 1924, a Assemblia Geral da I.P.B. (Igreja Presbiteriana do Brasil) reconhece o Seminrio como instituio da Igre-ja nacional. O seminrio passa a ser chamado de Seminrio Evanglico do Norte, dando lugar cooperao de outras igrejas irms, sem contudo depender delas financeiramente. O Seminrio ganha tambm a sua sede prpria: uma chcara no Beco da Fbrica, Madalena.

    A linha teolgica do seminrio continua inaltervel: Velha Escola. O professor de Teologia continua sendo o Rev. Jernimo Gueiros, o qual se baseava nos Esboos de Teo-logia de A. A. Hodge. Em 1923 ele se afasta do Seminrio por questes de sade. O Rev. Samuel de Vasconcelos Falco assume o seu lugar.

    O Rev. Samuel Falco iniciou o seu estudo teolgico em 1922, no Instituto Ebenzer. Aprendeu aos ps dos Revs. Antonio de Almeida, George Henderlite, Jernimo Gueiros e Roberto Smith (filho do pioneiro). Concluiu o curso no Seminrio do Norte no ano de 1925, sendo ordenado pelo Presbitrio de Pernambuco em 1927. Ensinou no Seminrio de 1932 at 1965, ano da sua morte. Durante os anos de 1946 e 1947 estudou no Union Theological Seminary, Richmond, Virgnia, onde obteve o grau de Mestre em Teologia. A sua tese de mestrado foi Predestinao, obra prima escrita em ingls, que se acha traduzida para o portugus editada pela Casa Editora Presbiteriana. Das diversas obras que traduziu, uma merece destaque: Esboo de Teologia Sistemtica, de Da-vid S. Clark. Vejamos a apresentao feita pelo Rev. Samuel Falco:

    Desde quando comeamos a ensinar Teologia Sistemtica no Seminrio Presbiteriano do Norte (1932), sentimos a urgente necessidade de uma obra em portugus que servisse de base para o ensino desta importante matria aos nossos estudantes.

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    Afinal chegou-nos s mos a obra de David S. Clark, intitu-lada Syllabus of Systematic Theology, e tendo-a examinado atentamente traduzimo-la para o portugus, Clark ortodoxo, cem por cento calvinista, claro na exposio e s vezes realmen-te magistral, como, por exemplo, quando trata de Evoluo, Milagres, etc. Desde a publicao dos Esboos de Teologia de A. A. Hodge, em 1895, cremos ser a obra de Clark a primeira teologia de cunho calvinista e presbiteriano que vem a lume em nossa lngua. Cremos ser isto razo suficiente para public-la (Clark, 1988, p. 11-12).

    Clark dedicou a sua obra para os seus professores de teologia sistemtica: A. A. Hodge, Francis L. Patton e John Cairus, todos Velha Escola.

    O contedo do Compndio de Teologia Sistemtica (ttulo em portugus), de David S. Clark, est dividido em cinco partes: Bibliografia, Teologia (propriamente dita), An-tropologia, Soteriologia e Escatologia. A sua fonte a Bblia Sagrada, inspirada e infalvel; o seu mtodo o indutivo, que consiste na coleo e classificao de fatos extrados das Escrituras; a sua linha teolgica , indubitavelmente, Velha Escola.

    Portanto, necessrio concluir dizendo que os pastores formados pelo Seminrio Presbiteriano do Norte, de 1923-1965, foram moldados de acordo com a velha Teologia de Princeton.

    C O N C LU S O

    A matriz teolgica que formou os pastores nordestinos foi a Velha Teologia de Princeton. Desde o trabalho dos pio-neiros em 1873 at a morte do Rev. Samuel Falco em 1965, preponderou a teologia Velha Escola. Os missionrios da Igreja Presbiteriana do Sul dos Estados Unidos foram os res-ponsveis em traz-la para o Nordeste do Brasil. A sua difuso e manuteno foram feitas, principalmente, por meio de uma instituio educacional Escola Teolgica de Garanhuns, Instituto Ebenzer e Seminrio Presbiteriano do Norte. Os alunos que se destacavam recebiam bolsas para fazer especia-

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    lizao nos Estados Unidos. O Seminrio Unio, em Rich-mond, Virgnia, era o preferido. Antonio Almeida e Samuel Falco estudaram l.

    Conforme vimos no captulo sobre os elementos da Teologia de Princeton, a mesma produziu um protestantismo de natureza conservadora, dogmtica, apologtica e confessio-nal. Isso fez com que o protestantismo se tornasse uma cultura parte, dentro da cultura brasileira. O pastor era preparado para manter e difundir a subcultura protestante, que consistia: numa experincia de converso, numa tica de abstinncia (no fuma, no bebe, no joga etc.) e na confisso e defesa de certas doutrinas.

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