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Revista de Imprensa28-07-2016

1. (PT) - Diário de Notícias, 28/07/2016, Reforço de 75 milhões para o setor social e solidário 1

2. (PT) - Jornal de Notícias, 28/07/2016, Hepatite C. Três mil salvos por fármaco inovador 2

3. (PT) - Público, 28/07/2016, Hepatite C. Mais de três mil vidas salvas em ano e meio 5

4. (PT) - Correio da Manhã, 28/07/2016, "Há doentes curados que deixam o Hospital" - Entrevista a EmíliaRodrigues

10

5. (PT) - Público, 28/07/2016, Hepatites virais, um diagnóstico fácil e necessário 11

6. (PT) - i, 28/07/2016, Saúde entra em greve na luta pelas 35 horas. Enfermeiros falam em incompreensão 12

7. (PT) - Correio da Manhã, 28/07/2016, Correio da saúde 15

8. (PT) - Público, 28/07/2016, Campeões sem condecoração 16

9. (PT) - Jornal de Notícias, 28/07/2016, Tribunal deverá julgar morte de Sara em setembro 17

10. (PT) - Diário de Notícias, 28/07/2016, Calor apertou em julho e pedidos de socorro para o INEMaumentaram

18

11. (PT) - Correio da Manhã, 28/07/2016, Cafeína afeta memória do medo 19

12. (PT) - Diário de Notícias, 28/07/2016, Identificados seis anticorpos do vírus zika 20

13. (PT) - Público, 28/07/2016, E se o combate a infecções graves estiver dentro do nosso nariz? 21

14. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Editorial 23

15. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Estratégia passa por um conjunto de metas 24

16. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Evolução 26

17. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Mudança de paradigma. O rastreio é essencial 28

18. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, O que são as hepatites? 31

19. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Testemunhos 33

20. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Uma questão de Saúde Pública 35

21. (PT) - Saúde (DN + JN), 28/07/2016, Verdeira bomba relógio viral 38

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Tiragem: 25772

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

Pág: 12

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Reforço de 75 milhões para o setor social e solidário APOIO O governo assinou ontem uma adenda ao Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, que prevê um au-mento do apoio financeiro do Estado em 1,3% às instituições com acordo de cooperação nas áreas da Segurança Social, Saúde e Educação. No total, o Estado português dis-ponibiliza 1426,5 milhões de euros para estas despesas, o que significa um reforço de 75 milhões de euros relativamen-te ao compromisso de 2015--2016. Na assinatura da aden-da estiveram presentes o mi-nistro da Segurança Social, Vieira da Silva, acompanhado pelo ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, pelo secretário de Estado ad-junto da Saúde, Fernando Araújo, e presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos.

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Tiragem: 69755

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

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Nacional

Plano para prevenir e controlar doenças

O Programa Nacicipal para as Hepa-tites Virais define estratégias de prevenção, controlo e monitorização dessas doenças, bem como a pro-moção de boas praticas na hepatite C, nomeadamente em pacientes in-ternados em estabelecimentos pri-sionais.

GAT defende preços mais baixos

O Grupo de Ativistas em Tratamento defende a renegociação do acordo com as farmacêuticas para tentar baixar os preços da medicação. A poupança permitiria libertar recur-sos para ações de prevenção, vigi-lancia epidemiolõgica, e reforço dos serviços de tratamento.

Tratamento Taxa de cura é de 96% e especialistas

pedem rastreio à população com mais de 50 anos

HEPATITE C 3005 doentes curados Sara Dias Unira saradiasouveiracals.pt

►Em pouco mais de ano e meio, houve uma revolução no tratamen-to da hepatite C: 7840 tratamentos iniciados, 3005 doentes curados,122 não curados. A taxa de cura é de 96%.

Hoje é o Dia Mundial das Hepati-tes e Portugal é um exemplo na luta contra a hepatite C. Medicação que cura, comparticipada a 100%, 40 milhões de euros gastos no ano pas-sado, 8 milhões previstos para 2016. Não há números oficiais da poupança, mas o Infarmed fala em custos significativos que são evita-dos com o tratamento das morbili-dades associadas à evolução da doença. "Ao tratarmos as pessoas com hepatite C. estamos a evitar que as mesmas venham a desenvol-ver cirrose hepática, carcinoma he-patocelular, com eventual necessi-dade de transplante de fígado, o que permite considerar estes medica-mentos inovadores como custo-efetivos", adianta ao IN.

Agora é simples, mas nem sem-pre foi assim. Até o anterior Gover-no desbloquear o acesso aos medi-camentos inovadores para todos, em fevereiro do ano passado. os doentes hepáticos necessitavam de autorização excecional e os crité-rios eram tão apertados que pou-cos beneficiavam da terapêutica. O então ministro da Saúde, Paulo Ma-cedo, negociou o preço e fechou o acordo com a farmacêutica norte--americana Gilead. E milhares de

doente respiraram de alivio com a chegada do Sofosbuvir. O acordo previa um gasto de cem milhões de euros em cinco anos, 20 milhões de euros por ano. Em 2015, gastou-se o dobro. O Governo volta às nego-ciações em fevereiro de 2017.

Persiste. no entanto, uma per-gunta que incomoda. Onde estão os infetados que não sabem que es-tão doentes? Guilherme Macedo. diretor do serviço de Gastrentero-logia do Hospital de S. João, Porto, defende um rastreio à população que nasceu entre 1945 e 1965. "Este é o grande caminho para a elimina-ção da infeção", refere. Um rastreio que. na sua opinião, devia fazer parte de uni plano nacional estra-tégico de combate à hepatite C. "É necessário identificar quem tem o vinis e não sabe que o tem. Saber onde andam essas pessoas para que sejam tratadas."

Emilia Rodrigues, presidente da SOS Hepatites, insiste nesse ponto. Afinal, é um caso de saúde pública. "Quem nasceu entre 1945 e 1965 devia fazer um rastreio. Os primei-ros apanharam a guerra do Ultra-mar, os segundos o boom das dro-gas nos anos 70", sustenta, acres-centando que "é fácil, é um exame que se pode pedir ao médico de fa milha". Nesse grupo de risco, estão ex-combatentes, quem contactou com transfusões de sangue antes dos anos 90, quem tem um histo-rial de comportamentos de risco como consumo de drogas, entre outros. •

Rui Reim.ào: "Última chance de recuperar" 1 Há um antes e um depois do me-dicamento milagre. o Sofosbuvir que derruba a hepatite C e chegou a Portugal. como presente, no mês de aniversário de Rui Reininho, em fevereiro do ano passado. Para quem, como o vocalista dos GNR, partilhou a vida com a doença du-rante 26 anos - com a doença e o cansaço, e as febres, e as injeções e a privação de quase tudo, sal, açú-car. álcool, carne vermelha, para não acicatar o vírus -. o fármaco da Gilead foi encarado como "a última chance de recuperar".

"Nunca adotei a posição de ka-mlkaze. mas estava muito cansado. As análises eram más, a morfologia do fígado um susto. Os tratamentos eram cada vez mais duros e mais de-sesperantes. A dada altura, o que de-via ser prioritário, revestiu-se de in-diferença Desinteressei-me. pensei: 'Que se lixe. Estava farto do proces-so". confessa agora. complçtamente

curado. com análises limpas, negati-vas, iguais às que tinha aos 20 anos.

Rui estava farto da doença, mas sobretudo "farto de saber que ha-via solução e não era disponibiliza - da". Entretanto, tentou tudo: absti-nência, ioga, acupuntura, tudo para recuperar. E investigou tudo, sabe tudcisobre hepatite C. Mas o vírus 'é demasiado inteligente" e. sozi-nho, não podia combaté-lo. Mesmo que estivesse na disposição, como equacionou, de fazer um transplan-te. "Quando se têm muitas cicatri-zes, não adianta tatuar por cima". Transplantar era tatuar.

A cura chegou em apenas um mês. Aos 60 anos, recuperou o ape-tite, o sono, a sensibilidade. Perdeu. pesadelos e sobressaltos. "Mas isto não acaba aqui", diz. "Continuo a es-tudar tudo. Quero ser o primeiro a saber o que pode acontecer daqui a dez anos, doenças associadas à me-dicação ou transformações físicas ou contágio à descendência." Enquanto nada há para descobrir, lamenta o es-tigma. "Antigamente. a tuberculose era doença de pobres. A hepatite é de gente que não é decente, associada a sexo, drogas, álcool e rock and roll."HuniA TEIXDRA DA SILVA

Graça quase monja com a cura à vista 2 "A política de contenção e auste-ridade do anterior ministro da Saú-de ia-me matando", afirmou Graça Palhares, 63 anos, empresária em Famalicão e curada de hepatite C. Foi a primeira doente do Hospital de S. João. no Porto, a tomar o mais recente medicamento contra a doença e, seis meses após a primei-ra toma, foi considerada curada.

"Continuo a ter consultas por-que tenho cirrose. mas nada de he-patite". garante Graça Palhares, sorridente. Aos 27 anos, grávida pela terceira vez, com "uma forte anemia". recebeu uma transfusão de sangue "que trazia um brinde": o vírus da doença. Após anos de so-frimento, em 2009, ouviu pela pri-meira vez falar na hepatite C. Em setembro de 2011. iniciou o trata - mento, mas não conseguiu aguen-tar mais de três meses. "Perdi a me-mória, andava deprimida e anémi -ca, caiu-me o cabelo. Tive que pa-

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País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

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85 milhões de euros É a quantia que o Ministério da Saúde pre-vê aplicar no tratamento dos doentes he-páticos durante 2016. Estima-se que en-tre 8 e 10% dos portugueses tenham pro-blemas do fígado. Cerca de 2000 morrem todos os anos com cirrose hepática.

7810 tratamentos iniciados Segundo numeros da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed), que reportam a 1 de julho deste ano, 7840 doentes inicia- ram tratamentos á hepatite C desde no- vembro de 2014 Mais de 30001,3 elimina- ram o vírus, 122 não estão curados.

Doente que pediu ao ministro para não morrer eliminou vírus

"0 vírus deixou de me fazer mal, está morto, caiu ao tapete" Jo-sé Carlos Saldanha foi o doente que pediu ao ex-ministro da Saúde que não o deixasse morrer, em fevereiro do ano passado, no Parlamento, pouco tempo antes do Governo chegar a acordo para disponibilizar o fármaco inovador a todos os pacientes. Fez o tratamento e eliminou o vírus Tem uma cirrose irreversível e continua em lista de espera para transplante. "Mas já consigo fazer a minha vida", disse ontem ao 1N

não a deixava sossegada. "Tinha crises de fígado e não havia expli-cações." Há 12 anos. começou a as-sociar o cansaço ao stress. Até que um dia não conseguiu comandar o corpo e as pernas não andaram. "O meu corpo foi-se abaixo". conta. Médico de família, análises, fun-ção hepática bastante alterada, he-patite C. Três meses de tratamen-to no hospital. "Foi horrível, o pior tratamento que fiz", recorda. E a pior sentença chegou pela voz de uma médica. Não havia nada a fa-zer. As lágrimas caíram-lhe pela cara ao mesmo tempo que alimen-tava a certeza de que não iria mor-rer da doença que lhe atacava o fí-gado. "Nunca fumei, nunca bebi álcool."

A esperança ganhou força na mensagem de um médico num programa de televisão. Marcou consulta e acreditou. "Até que che-gou aquele comprimido milagroso e em três meses fiquei curada."

Dez anos depois do diagnóstico, a cura. Voltou ao trabalho no inicio deste ano. Bastou um comprimido ao pequeno-almoço durante três meses para eliminar a hepatite C. "Foram 60 mil euros para o Estado. mas se fizermos as contas ao tem-po em que estive de baixa, não deve ter ficado mais barato." S.D.O.

rar com o tratamento porque os medicamentos estavam a matar--me", recorda. Passado meio ano, o vírus estava novamente "em ple-no" e Graça sem poder fazer trata-mento com os medicamentos exis-tentes em Portugal.

"No hospital e nos grupos de apoio, davam-nos esperança de que um novo medicamento iria surgir e que, esse sim, nos ia curar", recorda. Em 2015. a empresária não tinha condições de saúde para "es-perar mais". "Escrevi ao Infarmed, ao ministro da Saúde, ao laborató-rio e. juntamente com outros doen-tes. movemos uma providência cautelar contra o ministro."

Mesmo disposta a comprar o medicamento, suportando todos os custos, não conseguia aceder ao tratamento. "Eu estava a mor-rer, havia cura e não me davam nem me deixavam comprar o re-médio. Foi horrível", afirma. lá "quase sem esperança", recebeu um telefonema do hospital a dizer que já havia remédio. "Comecei a tomar e no fim do primeiro mês o marcador já estava negativo", sor-ri. O organismo aguentou o novo tratamento e os efeitos secunda-

1 Rui Relninho, 60 anos, cantor 2 Graça Palhares, 63 anos, empresária 3 Sérgio Oliveira, 47 anos, desempregado 4 Mónka Oliveira, 52 anos, educadora de infanda 5 Pedro Adão, 58 anos, desempregado

rios foram muito menores. "Re-nasci." EMILIA MONTEIRO

Sérgio esteve no fundo do poço e voltou à vida 3 Sérgio Oliveira, 47 anos, chegou a ter medo de não ver crescer os dois filhos pequenos. "Depois do que passei. pensava em tudo." O seu passado é pesado: 16 anos a consumir drogas, tuberculose, to-das as hepatites possíveis, cara a cara com overdoses. Tinha 17 anos quando contactou pela primeira vez com drogas duras. "E o fígado ia-se deteriorando."

Dois tratamentos, dois anos, nada resultava. "Comecei a ver a vida a andar para trás." Até que se começou a falar da medicação ino-vadora que combatia com sucesso a hepatite C. Seguiu com atenção as negociações do Governo, receou que não chegassem a bom porto. Tudo correu bem e a sua vida deu uma volta. Curou-se da hepatite C, mudou-se de Lisboa para Leiria.

está apto para voltar a trabalhar. Sérgio, ex-toxicodependente,

conta a sua história sem rodeios. "Se hoje estou vivo é porque houve pessoas que me ajudaram." E a he-patite foi-se embora. Seis meses de tratamento, as análises estão nega-tivas. "as células do fígado estão a regenerar-se". Seis meses de trata-mentos, seis frascos que custariam, viu nos rótulos. 120 mil euros. "Nunca na vida vou descontar o su-ficiente para pagar aquilo que me deram." É um sobrevivente agrade-cido pela chegada da medicação a Portugal. SARA DIAS OLIVEIRA

Mónica, fígado frágil/ esperança imbatível 4 Mónica Oliveira, 52 anos, educa-dora de infância. do Montijo. nun-ca perdeu a esperança. Agarrou-se à vida com unhas e dentes. Olhou a doença de frente e nunca baixou os braços. Emociona-se sempre que fala da sua história.

Desde miúda que o seu fígado

Pedro faz ioga e vai regressar às artes marciais 5 Pedro Adão. 58 ànos. de Lisboa. também está curado. Foi um dos primeiros doentes a ser tratado com a nova medicação "O trata-mento veio mesmo a calhar, resul-tou em cheio."Ao fim de duas se-manas. em seis meses de tratamen-to, as análises já vinham negativas.

1-lá um antes e um depois na sua vida. Tinha 20 anos quando rece-beu a má notícia, quando a doença ainda não estava catalogada como hepatite C. Em 2005. iniciou um tratamento de 48 semanas. "Foi muito violento e o vírus voltou." E o fígado não mais parou de se quei-xar. No ano passado. a saúde voltou a piorar até à chegada da boa noti-cia de que iria ser tratado. Tudo mudou depois disso. Faz corrida. caminhadas, ioga e em setembro vai retomar as artes marciais. Dei-xou de tomar medicação para a dia-betes. "As dores nas costas e nos os-sos desapareceram. a coisa norma-lizou". S.D.O.

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Hepatite C - Tres mil - salvos por fármaco inovador Rui Reininho começou a tomar medicamento no seu aniversario P 6t7

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Tiragem: 32680

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

Pág: 8

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Área: 25,70 x 30,85 cm²

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Mais de três mil doentes de hepatite C curados. É “a medicina da felicidade”

Num ano e meio, dos perto de oito

mil doentes que iniciaram tratamento

com medicamentos inovadores para

a hepatite C em Portugal, mais de três

mil estão ofi cialmente curados. “É a

medicina da felicidade”, sintetiza Rui

Tato Marinho, hepatologista e vice-

presidente da Sociedade Portuguesa

de Gastrenterologia que, desde 1989,

ano em que o vírus foi identifi cado e

surgiu o teste de diagnóstico, tratou

centenas de doentes, encaminhou

vários para transplante de fígado,

deu muitas más notícias, mas agora

já se habituou à sensação única de

poder dizer: “Está curado.”

“Portugal tem neste momento du-

as das melhores coisas do mundo: to-

da a gente tem acesso ao tratamento

[inovador], mesmo sem ter doença

grave, e o transplante de fígado che-

ga a cerca de 250 pessoas por ano”,

enfatiza o professor na Faculdade

de Medicina de Lisboa. Entretanto,

há mais medicamentos inovadores

a chegar ao mercado, substâncias

que prometem ser mais eficazes

num período de tempo mais redu-

zido e que em simultâneo são mais

baratas. Algumas poderão mesmo

representar uma esperança para a

estreita faixa de doentes que ainda

não se cura.

Chegar a este novo paradigma

não foi fácil, porém. O vocalista dos

GNR, Rui Reininho, esperou quase

três décadas pelos comprimidos que

se revelaram “milagrosos” e esteve

mesmo para desistir, depois de duas

penosas tentativas para eliminar este

vírus que vai destruindo o fígado e

pode degenerar em cirrose e cancro.

A poucos dias de fazer 60 anos, em

Fevereiro do ano passado, o autor de

Pronúncia do Norte começou a tera-

pia com as substâncias inovadoras do

laboratório que assinou acordo com

o Estado português (Gilead Sciences)

e negativou, como se diz na gíria mé-

dica. No fi nal de 2015 foi declarado

curado.

Tal como o vocalista dos GNR,

são cada vez mais os doentes que

em pouco tempo (12 semanas é o

padrão) conseguem eliminar o temi-

do vírus. Os dados da Autoridade Na-

cional do Medicamento (Infarmed)

são inequívocos: dos 7840 doentes

que tinham iniciado tratamento até

ao início deste mês, 3005 “foram

curados”. A taxa de cura é de 96%,

sublinha o Infarmed, que se recusa a

adiantar o montante da despesa com

os novos fármacos.

O acordo entre o Estado português

e a biofarmacêutica Gilead Sciences

— que comercializa o Solvadi (sofos-

buvir) e o Harvoni (associação en-

tre sofosbuvir e ledispavir) — “não

contempla a divulgação dos preços

praticados”, justifi ca o Infarmed. Os

dados dos doentes incluem não só

os tratamentos efectuados com os

mediáticos comprimidos da Gilead,

mas também com moléculas de ou-

tros laboratórios que foram testadas

em ensaios clínicos e que, por isso

mesmo, não representaram despesa

para o Estado.

Tempos de incertezaPara a história fi cam os tempos de

incerteza, de espera e de ansiedade

que deixaram alguns doentes e médi-

cos à beira de um ataque de nervos.

Em Portugal, foi necessário aguar-

dar um ano (depois de o Infarmed

aprovar o primeiro antivírico de ac-

ção directa a chegar ao mercado, o

sofosbuvir) para que o Ministério da

Saúde e o Infarmed assinassem um

acordo então considerado revolucio-

nário — o Estado português apenas

paga pelos doentes curados. Este

acordo vigora por dois anos, termi-

na em Fevereiro de 2017 e aplica-se

aos medicamentos da Gilead, mas o

actual ministro da Saúde já anunciou

que vai ser renegociado.

O preço inicialmente pedido, 48

mil euros por doente, foi classifi ca-

do de “completamente imoral” pelo

anterior ministro da Saúde, Paulo

Macedo, e por isso as negociações

foram-se arrastando. O acordo aca-

baria por ser assinado na semana

em que um doente interpelou de

forma emocionada o ministro no

Parlamento, pedindo-lhe que não o

deixasse morrer, e dias depois de ter

sido noticiada a morte de uma mu-

lher que aguardava pelo fármaco.

José Carlos Saldanha no dia em que pediu ao ministro que não o deixasse morrer: tudo mudou desde aí

Portugal tem “duas das melhores coisas do mundo”: acesso generalizado a inovação e transplantes de fígado que chegam a 250 pessoas por ano, realça médico. Hoje é Dia Mundial da Hepatite

SaúdeAlexandra Campos

Agora, os resultados provam uma

taxa de sucesso que ultrapassa os so-

nhos mais optimistas de médicos e de

doentes — que antes do acesso a es-

tes comprimidos eram tratados com

injecções de interferão conjugadas

outras substâncias, como a ribaviri-

na, com muitos efeitos secundários,

alguns tão difíceis de aguentar que

faziam com que vários pacientes de-

sistissem a meio.

Emília Rodrigues, cujo marido foi

diagnosticado com hepatite C após

uma peritonite complicada em 2002,

não se esquece dos terríveis efeitos

secundários dos fármacos usados

no passado. Em 2005, em conjun-

to com um doente, Lourival Neto,

Emília criou uma associação, a SOS

Hepatites, para apoio dos pacientes

que enfrentavam as mesmas “difi cul-

dades, dúvidas e solidão”.

Novos fármacos disponíveisLourival morreu em Dezembro desse

ano com um cancro de fígado e, des-

de essa altura e até aos fi nais de 2011,

recorda Emília, o tratamento para a

hepatite C consistia na conjugação

de injecções de interferão com riba-

virina. A média de cura oscilava en-

tão entre 50% a 60%, mas os efeitos

adversos eram difíceis de aguentar

para muitos doentes. A depressão

era o mais grave.

Até que, no fi nal de 2011, surgiram

Em Portugal, foi necessário aguardar um ano para que se assinasse um acordo então considerado revolucionário — o Estado português apenas paga pelos doentes curados

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os chamados “inibidores de protéa-

se” que impediam a replicação do

vírus e que, em conjunto com o tra-

tamento anterior, já proporciona-

vam entre 80% a 85% de hipóteses

de cura, mas com efeitos secundários

ainda difíceis de suportar. Mesmo as-

sim, estes fármacos só eram dispo-

nibilizados em Portugal aos doentes

mais graves e com autorizações de

utilização especial dadas caso a caso

pelo Infarmed, recorda a presidente

da SOS Hepatites.

Foi justamente a difi culdade na dis-

ponibilização destes medicamentos

que começou a criar “ansiedade” en-

tre os doentes, lembra Tato Marinho,

que, ainda antes do mediático acor-

DANIEL ROCHAdo com a empresa norte-americana,

conseguiu, tal como outros colegas,

curar dezenas de pacientes tratados

em ensaios clínicos com moléculas

desenvolvidas por vários laborató-

rios. Actualmente, aliás, são várias

as empresas farmacêuticas a com-

petir com a Gilead Sciences — pelo

menos mais quatro, como a AbbVie,

a Bristol-Myers Squibb, a Janssen e a

Merck, enumera.

13 mil doentes inscritosAinda recentemente, em Maio, os

cerca de mil doentes renais com he-

patite C e co-infectados com VIH —

que não respondiam ao tratamento-

padrão — passaram a ter acesso facili-

tado a uma combinação de fármacos

da Abbvie e o Infarmed assinou um

contrato com este laboratório que

“envolve os medicamentos Exviera e

Viekirax”. O pagamento passou a ser

feito então através de uma linha de

fi nanciamento própria, à semelhan-

ça do que acontece com os fármacos

da Gilead.

Agora, e se a taxa de cura dos do-

entes se mantiver a este ritmo, é de

prever que no início do próximo ano

já estejam livres da infecção mais de

metade dos pacientes inicialmente

inscritos nos hospitais públicos — cer-

ca de 13 mil. O desafi o actual é o de

fazer com que pessoas que estão in-

fectadas sem o saberem — a hepatite

C é uma doença silenciosa, sem sin-

tomas ao longo de muitos anos — se

submetam a testes de diagnóstico.

De resto, ninguém consegue preci-

sar quantas pessoas estarão infecta-

das em Portugal e as estimativas são

muito díspares, oscilando entre 50

mil, 100 mil e mesmo 150 mil pessoas

no país. “O esforço tem de continuar,

porque ainda existem muitos doen-

tes por diagnosticar e tratar”, assina-

la Armando Carvalho, do Núcleo de

Estudo das Doenças do Fígado, da

Sociedade Portuguesa de Medicina

Interna.

Satisfeita com os resultados que

mostram que Portugal caminha “em

direcção ao objectivo de eliminar a

hepatite C como problema de saúde

pública”, Raquel Chantre, relações

públicas da Gilead Sciences Portugal,

não se pronuncia sobre a renegocia-

ção do acordo nem comenta o preço

dos fármacos. Prefere recordar a esti-

mativa feita pelo Infarmed ainda em

2015 e que apontava para uma pou-

pança que “poderia chegar a 412,6

milhões de euros”, por se evitarem

as complicações da hepatite C nos

doentes curados, nomeadamente

em transplantes hepáticos e cancro

de fígado.

Rui Tato Marinho, vice-presidente

da Sociedade Portuguesa de

Gastrenterologia e médico

no Hospital de Santa maria

(Lisboa), admite que o preço dos

medicamentos é caro, mas lembra

que os novos fármacos salvam

vidas.

Quando ouviu falar do vírus

pela primeira vez?

Em 1974, num artigo publicado na

revista Lancet, um autor escreve

que deve haver um vírus que não

é nem A nem B, deve ser C. Só que

isto não pega, como em muitas

coisas da medicina. Passou então

a ser denominado “não-A não-B”.

Mas a história do tratamento já

tem 30 anos, fazíamos injecções

com interferão e a percentagem de

cura era de 6%. Até 1989 não havia

teste. Foi uma revolução quando se

descobriu o vírus e o teste.

Quantos doentes existem em

Portugal?

Neste momento só há dois

países com estatísticas fi áveis, os

EUA e França. Para Portugal há

estudos que apontam para 1% da

população. Mas apenas temos

dados concretos na população

de toxicodependentes. Nos cerca

de 30 mil em seguimento, dos

que consomem por via injectável,

81% estarão infectados, segundo

o SICAD. Há anos, foi criada uma

comissão de acompanhamento no

Infarmed, fi zeram-se inquéritos

nos hospitais que tratavam doentes

e foi então que surgiu o tal número

dos 13 mil [pacientes].

Foi um processo longo, a

negociação para a introdução

da inovação terapêutica?

Durante dois ou três anos houve

uma geração intermédia de

medicamentos que não foram

aprovados, o que gerou uma certa

ansiedade por parte dos doentes.

Mas isso passou. É importante

dizer que Portugal, neste

momento, tem duas das melhores

coisas do mundo: o transplante

de fígado, que chega para aí a 250

pessoas por ano, e o acesso de toda

a gente ao tratamento, mesmo que

não tenha doença grave.

Mas não acontece o mesmo

noutros países?

Não. Os espanhóis, por exemplo,

de uma maneira geral, só têm

para os casos mais graves e para as

mulheres grávidas.

Estes fármacos foram

revolucionários?

Sim, foram revolucionários. A

Gilead tomou a dianteira, mas

agora há vários, da BMS, da

AbbVie, da Janssen, da MSD,

os preços vão baixando. Neste

momento há cinco [laboratórios]

com fármacos comercializados.

Antes, a combinação de uma

injecção de interferão por semana,

que se prolongava por um ano,

um ano e meio, provocava efeitos

secundários, como cansaço,

irritabilidade, anemia, alterações

da tiróide, depressão, queda de

cabelo. Um terço dos doentes

[mais graves] deixava de trabalhar.

Alguns comparavam o tratamento

a quimioterapia.

Chegou a curar doentes

tratados em ensaios clínicos?

Sim, a primeira vez que ouvi

falar em comprimidos para tratar

hepatite C foi em 2010, quando

veio cá um americano da Abbvie.

Ele perguntou se acreditávamos

que fosse possível curar a hepatite

C sem interferão. Se você vem cá

do outro lado do Atlântico falar

com portuguesitos, é porque

sim, respondi. Os ensaios clínicos

foram entretanto aparecendo.

Em 2013, também foi um murro

no estômago, começámos a fazer

os comprimidos sem interferão.

Tive os primeiros resultados uma

semana ou 15 dias depois, andava

embasbacado pelos corredores do

hospital, os doentes estavam com

cargas víricas baixíssimas ou nulas.

Até se dizia então: isto é igual à

banha da cobra, cura tudo, não

tem efeitos secundários, apesar de

ser um bocadinho mais caro.

Por que é que os preços variam

consoante os países?

Os países andam a velocidades

diferentes. A Suíça tem uma

estratégia, está fora da União

Europeia, e aprovou logo. A

Alemanha quase não discute o

preço, tem os seguros. Nos EUA,

andava na altura toda a gente

muito feliz, porque estavam a curar

os doentes e era muito pior para

os seguros se tivessem de pagar

mortes. Porque isto salva vidas.

Houve muitas pessoas

que morreram enquanto

esperavam?

Não, não vou dizer isso. Prefi ro

ser positivo e olhar para o futuro.

Agora, estou a fazer ensaios com

medicamentos ainda sem nome.

Quanto mais se tem, mais se

quer. Gostávamos de encurtar o

tempo de tratamento para oito

semanas, tratar também pessoas

já com doença muito avançada.

Estudos internacionais indicam

que 20% dos doentes a aguardar

por transplante saem da lista de

espera, porque melhoram. Esta

história é um bocado parecida com

a da vacina da hepatite B. Quando

apareceu, em 1986, o Estado dizia

que era muito cara, que devia ser

só para grupos de risco. É como

os telemóveis: no princípio são

muito caros. Todo o negócio deste

mundo capitalista é assim.

“Antes, um terço dos doentes deixava de trabalhar”

EntrevistaAlexandra Campos

“Esta história é um bocado como os telemóveis: no princípio são muito caros. Todo o negócio deste mundo capitalista é assim”

“O esforço tem de continuar porque ainda existem muitos doentes por diagnosticar”Armando Carvalho, médico

NUNO COIMBRA

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Rui, Graça e Mónica: três histórias de doentes que escaparam à morte

“Tratamento salvou-me a vida, foi a minha prenda dos 60 anos”

Habituado a viver com o vírus da hepatite C ainda antes de a infecção ter sido baptizada com o

nome definitivo (“chamava-se então hepatite não-A, não-B”, lembra), o vocalista dos GNR, Rui Reininho, assume que esteve bem perto de ser mais uma das vítimas mortais da doença. Ao longo de 26 anos, foi aprendendo a viver com o vírus, obrigou-se a uma vida mais cuidada, até ao momento em que os médicos o avisaram de que estava quase no limite, na fronteira entre a vida e a morte.Em 2014, Rui Reininho nem sequer estava na lista de espera para transplante de fígado em Portugal, apesar de ter pensado nessa hipótese, seguindo o exemplo do que tinha feito anos antes Zé Pedro, dos Xutos & Pontapés, que se curou sem necessidade dos novos medicamentos. O

”Dizem que o coração não dói, mas o meu doía-me”

Nas centenas de vezes em que teve de se deslocar ao Hospital de S. João, no Porto, Graça Palhares

recusou sempre a companhia dos seus filhos. Mesmo nos dias em que lhe custava pôr um pé à frente do outro, fez questão de conduzir sozinha. “Foram uma única vez, mas depois eu não os consegui ter lá dentro comigo. Eles ainda se comoviam mais do que eu e eu não podia deixar-me arrastar com eles”, recorda.

Professora reformada, Graça Palhares, hoje com 63 anos e direito a uma esperança de vida como mandam as estatísticas, resistiu sempre à autocomiseração. “Sentia que se parasse seria pior. Nunca parei. Às vezes tinha dificuldade em levantar-me, mas metia-me no carro mesmo assim. E fiz questão de nunca me deixar ficar na cama. Sou Carneiro, teimosa.”

Era mãe sozinha de três filhos quando se descobriu portadora do vírus da hepatite C. “Cheguei lá por uma questão estética, em 2009. Eu tinha anemia, estava sempre doente, cansada, mas não sabia o que era. Até que um dia, na minha ginecologista, disse: ‘Ó doutora, nunca tive

autor de Pronúncia do Norte estava a aguardar, tal como os outros doentes, pela aprovação e disponibilização dos novos antivíricos, e sublinha que o homem que, no Parlamento, pediu ao ex-ministro Paulo Macedo para não o deixar morrer “foi bastante corajoso”.As novas substâncias chegaram assim para Reininho, que viu amigos e conhecidos a não resistir ao vírus enquanto esperavam, precisamente “na altura certa”. Faltavam alguns dias para completar 60 anos. “Foi a minha prenda”, brinca.Começou a tomar os comprimidos em 9 de Fevereiro de 2015 (ele faz anos a 28 desse mês) e, na primeira análise, em Março, já tinha “negativado”. Para quem tinha ponderado antes a hipótese de fazer um transplante de fígado e chegado a equacionar a possibilidade de ir à Índia comprar os medicamentos inovadores, ficar sem sinais do vírus em apenas de um mês representou “algo de extraordinário”. “Salvou-me a vida”, remata o vocalista dos GNR, que, no final de 2015, foi dado como curado.“Durante anos não tive manifestações da doença, daí o perigo. Um infectado é como uma bomba-relógio. Depois,

barriga e agora é isto, não gosto nada.’ Ela assustou-se e mandou-me fazer análises que deram positivo para hepatite C.”

Mas isso foi depois, quando já havia nome para a doença. Antes, grávida da filha mais nova, em 1980, recebeu cinco transfusões de sangue, por causa da anemia. Uns anos mais tarde, estranhou tanto cansaço nas pernas, inchadas e com manchas. “Fiz análises e detectaram-me hepatite não A e não B. Ainda não conheciam a C. E a médica de família disse: ‘Pronto, esteve em contacto com o vírus numa dessas transfusões e ficou imunizada.’”

Quando, aos 58 anos, lhe apontaram finalmente a hepatite C, começou a ser acompanhada no S. João, onde começou em 2011 o tratamento com interferão e ribavirina. “O cabelo caiu, claro, mas isso arreliava-me pouco. Era um mal menor, porque eu estava em risco de me caírem os dentes, de perder a tiróide e de ficar cega, porque tenho glaucoma. Aguentei três meses. Num dia cheguei ao hospital e quase não me segurava de pé. A médica olhou para mim e, mesmo antes de fazer análises, mandou-me parar imediatamente com o tratamento.”

Nos seis meses que se

tentei tratar-me. Negativizei por duas vezes, só que, passados meses, o vírus reapareceu.” Reininho experimentou na pele a dureza do tratamento com interferão. “Era violentíssimo”, com injecções três vezes por semana, associado à ribavirina e outras variantes, durante um processo que durava “um ano e três meses”. Sentia-se “permanentemente arrasado”.Em 2014, admite, ficou “desmoralizado” e pensou desistir. “Estava à espera há um ano.” Nessa altura via o futuro a desintegrar-se. Estava, sintomaticamente, a compor o álbum Caixa Negra — era essa a cor com que via o mundo. “Eu estava num limbo, reequacionei muita coisa. O disco sai numa altura em que me sentia ‘vai, não vai’”, descreve. “Mas também pensava: já vivi 60 anos, não me arrependo de quase nada a não ser da qualidade dos bagaços”, ironiza.Agora oficialmente curado, o lema do vocalista dos GNR é “nada de começar a estragar o fígado, de beber champanhe, acabou-se o bacalhau assado e os rojões”. Cortou completamente com o cloreto de sódio, com fritos, com carnes, tornou-se quase vegetariano. A dieta resultou. Se antes sentia “imensas dificuldades a nível orgânico”, agora consegue aguentar espectáculos “de hora e meia a duas horas com outra energia”. Os valores do fígado voltaram aos dos anos 1970. Ora, acontecer isto a alguém que tem 61 anos é fenomenal, até porque “os artistas não têm outras fontes de rendimento”, enfatiza.A um ano de completar 40 anos de actividade, o vocalista afirma-se assim muito responsável e sabe que, apesar de considerado curado, tem que continuar com a vigilância e a cuidar de si. Até porque está a usufruir de uma espécie de segunda vida. “Agora tenho que ter muito cuidado a atravessar a rua.”

Rui Reininho, 61 anos, vocalista dos GNR, conviveu 26 anos com o vírus da hepatite C

Graça Palhares, 63 anos, professora reformada, recusou render-se ao cansaço

DR

NELSON GARRIDO

130 Um total de 130 a 150 milhões de pessoas serão portadoras crónicas de hepatite C a nível mundial. Em Portugal, haverá entre 50 mil e 100 mil infectados

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”Querida, faz as malas porque estás quase a partir”

Mónica Oliveira costumava dizer que não tinha tempo para estar doente até que, aos 42 anos, se sentiu

empurrada de um precipício. “Tinha descoberto há pouco que era portadora de hepatite C e, ao fim de quatro meses de tratamento, a médica virou-se para mim e muito calmamente disse: ‘No seu caso não há nada a fazer, a senhora já sabia que o tratamento não funciona com toda a gente, vá a casa buscar os medicamentos que são muito caros e entregue-os na farmácia do hospital.’ Assim, como quem diz: ‘Querida, faz as malas porque estás quase a partir.’ Eu, que tenho medo de alturas, senti que me estavam a empurrar de um precipício e que só tinha algum tempo até chegar lá abaixo e morrer.”

Passaram-se dez anos. Mónica não só não morreu como está curada da doença. Graças ao sofosbuvir, mas também graças àquele que hoje aponta como “o homem da sua vida”, o hepatologista Fernando Ramalho, do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. “Tinha-o ouvido numa entrevista na RTP1 e, quando entrei no consultório dele, a primeira coisa que me disse foi: ‘Ainda bem que está aqui porque

podia ter morrido.’ Percebi depois que o tratamento que tinha feito durante quatro meses no Hospital do Barreiro não tinha feito mais do que aumentar-me a carga viral, de 60 mil vírus por litro de sangue para 120 milhões. No fundo, foram quatro meses a ‘alimentar o bichinho’.”

Estávamos em 2006. Numa altura, portanto, em que a terapêutica clássica para o vírus consistia numa injecção de interferão uma vez por semana e na toma diária de comprimidos de ribavirina, durante seis a 12 meses. “O cansaço que sentia era tal que queria andar e já não conseguia. Os efeitos secundários eram idênticos aos da quimioterapia. Caiu-me o cabelo e tudo”, recorda. Se a médica que a atendeu no Hospital do Barreiro lhe tivesse feito o estudo genético, teria percebido que Mónica tem uma mutação genética que torna o seu organismo resistente à quimioterapia.

No Hospital de Santa Maria, esse estudo foi das primeiras coisas a serem feitas. “O doutor Fernando Ramalho avisou-me logo que os tratamentos não iam curar-me. Mas a ideia era diminuir a carga viral para que o fígado aguentasse o maior número de meses e de anos, até que novos tratamentos fossem desenvolvidos. Ele era informado, tinha recebido formação nos EUA, sabia que isso era possível.”

Mónica andou assim vários anos a adiar a sua sentença de

seguiram, Graça já não estava sob medicação mas continuava com os sintomas. E com o vírus, claro. “Foi então que começámos a ouvir falar dos novos tratamentos. Mas o ministro não dava ordens para tratar os doentes e nós vivíamos num medo tremendo, porque havia gente a morrer e eu já tinha cirrose.” Enquanto José Carlos Saldanha pedia no Parlamento a Paulo Macedo que não o deixasse morrer, Graça escrevia cartas ao ministro e ao Infarmed. “Cheguei a pedir-lhes que me dessem os medicamentos que eu pagava. Cheguei a ponderar vender o meu apartamento.”

Não foi preciso. Em Março de 2015, iniciou o tratamento no S. João e, um mês depois, já tinha “negativado”. Bastou um ano para ser dada como curada. “Quase saltei para o colo do médico, senti uma alegria tão grande, tão grande, que ninguém faz ideia.” O médico é o hepatologista António Sarmento e Graça hoje ri-se quando se lembra da vez em que lhe ligou para o telemóvel aflita porque lhe doía o coração. “Dizem que o coração não dói, mas o meu doía-me. Disse-lhe que ia parar com a medicação porque sentia que ia morrer. Ele fez a diferença toda, porque, com toda a calma, disse-me: ‘Vai continuar com a medicação mas vai fazer um electrocardiograma para ver que não é nada.’ Lá fiz e, claro, era tudo ansiedade. Tenho-lhe um enorme respeito porque, está a ver, ele era chefe daquele serviço todo e vinha buscar os doentes à sala de espera, com uma humildade.”

Tanto que Graça já sente saudades. “Criam-se laços muito fortes. Agora só vou lá de seis em seis meses por causa da cirrose. Em Setembro terei de fazer uma endoscopia, para ver se tenho varizes esofágicas.” Independentemente do que vier a seguir, Graça diz que começou a ver a vida de outra maneira. “Sou muito agradecida, sinto-me abençoada, é um alívio enoooorme”, descreve.

Mónica Oliveira, 52 anos, educadora de infância: o médico diz-lhe agora que vai morrer, mas de velhice

morte. “Não foi fácil. A minha filha tinha 12 anos e passou a adolescência a ver a mãe doente, sempre deitada no sofá, o dinheiro a faltar.” O emprego como educadora de infância ficou em águas de bacalhau enquanto a doença fazia o seu caminho. O marido ficara entretanto desempregado. Para piorar o cenário, tinha ainda a cargo duas enteadas, uma das quais grávida de sete meses e que tinha sido abandonada pelo pai da criança.

“A minha sorte é que, como nunca tinha tido comportamentos de risco, ou seja, nunca gostei de fumar nem de beber, o fígado levou mais tempo a ser agredido pelo vírus. E houve outra coisa que me ajudou: nunca me senti discriminada, nunca vi um olhar de reprimenda, nem mesmo por trabalhar com crianças.”

O ponto de viragem aconteceu em Dezembro de 2015. “Foi quando me disseram: ‘Está curada.’ Tinha iniciado o tratamento em Junho desse ano e fi-lo durante três meses, mas, ao fim de duas semanas, já tinha o vírus indetectável.”

O tratamento provocava-lhe cansaço, mas nada a que não estivesse habituada. “Comparativamente com os tratamentos anteriores, que foram mesmo maus, este quase não teve efeitos secundários, a não ser o cansaço. Houve uma altura em que me esquecia das coisas, até achei que estava com Alzheimer, mas já estava tão habituada a sentir-me mal que desvalorizava as coisas. Depois, descobri que estava com falta de zinco. E agora também estou a fazer ferro injectável.”

Nada que se compare com uma sentença de morte a prazo. “O homem da minha vida, que como disse não é o meu pai nem o meu marido, é o doutor Fernando Ramalho. Agora, quando me vê, diz-me: ‘Você vai morrer mas é de velha.’”

ENRIC VIVES-RUBIO

O preço dos medicamentos da Gi-

lead Sciences desencadeou uma

enorme controvérsia. Nos EUA, o

sofosbuvir até fi cou conhecido como

o “comprimido dos mil dólares” (era

quanto custava então cada cápsu-

la) e chegou a ser classifi cado por

um economista como a terapêuti-

ca que estava “a levar a América à

falência”.

Sigiloso, o preço acordado variou

de país para país, oscilando entre os

mais de 80 mil dólares nos EUA e

cerca de 800 euros no Egipto, o país

com a maior prevalência de hepatite

C em todo o mundo.

Em Portugal, o custo acordado

terá sido da ordem dos 20 mil eu-

ros por doente, por um tratamento-

padrão de 12 semanas (há pacientes

que necessitam de mais tempo). Mas

a Autoridade Nacional do Medica-

mento (Infarmed) continua a recu-

sar-se a adiantar valores.

O preço já foi considerado eleva-

do, quando se contabilizam os cus-

tos de produção, que investigadores

ingleses calcularam oscilar entre 60

a 120 euros. Somando já os custos

da investigação e os do marketing,

deveria rondar os 300 euros, segun-

do outras contas de especialistas es-

panhóis.

O certo é que, apesar de não ter

sido dos primeiros a aprovar o tra-

tamento, Portugal é hoje um dos

países em que o acesso aos fárma-

cos inovadores é mais generalizado.

“Portugal tem um acesso à terapêu-

tica sem paralelo na Europa, com

o custo integralmente suportado

pelo Estado”, sublinha Armando

Carvalho, do Núcleo de Estudos de

Doenças do Fígado da Sociedade

Portuguesa de Medicina Interna.

O que se sabe é que, em 2015, fo-

ram gastos 40 milhões de euros com

o tratamento da hepatite C e, para

este ano, está prevista uma despesa

que ronda os 85 milhões de euros.

Em Março, o actual ministro da Saú-

de adiantou que o acordo seria re-

negociado, mas nem a tutela nem a

farmacêutica adiantam detalhes. O

segredo é a alma do negócio.

Renegociado acordo com laboratório

Alexandra Campos

7840doentes estavam em tratamento em Portugal até 1 de Julho. Ao todo foram já curadas 3005 pessoas, sendo a taxa de cura de 96%

20mil euros será o preço acordado com a farmacêutica Gilead para tratar cada doente no país. O Infarmed continua a recusar-se a adiantar os valores do acordo

45%Entre 15% e 45% das pessoas infectadas livram-se do vírus sem qualquer tratamento. Nos outros casos, a infecção evoluirá para a forma crónica da doença

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HEPATITE CMAIS DE TRÊS MIL VIDAS SALVASEM ANO E MEIO

PORTUGAL DUPLICA GASTOS COM NOVO TRATAMENTO EM 2016 Portugal, 8 a 11

ENRIC VIVES-RUBIO

Mónica Oliveira sobreviveu ao vírus que ataca o fígado e hoje está curada, graças à “medicina da felicidade”, diz hepatologista Rui Marinho

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DISCURSO DIRETO

Encalia Rodrigues: presidente da Associação SOS Hepatites sobre o tratamento de doentes

"HÁ DOENTES CURADOS QUE DEIXAM O HOSPITAL"

CM: Um total de 122 doentes de he-patite C fizeram o tratamento com medicamentos ino-vadores, mas não fi-caram curados. Têm acesso a outras terapêuticas ou há queixas na associação? Emília Rodrigues - Não te -mos queixas desses doentes porque, se não ficam cura -dos com os medicamentos inovadores, no âmbito do protocolo entre o Estado e o laboratório, há outros trata-mentos a que têm acesso e os médicos prescrevem - nos. - Contudo, houve mais de 7800 doentes curados. É um número considerável. - É, mas há um problema

que é o facto de ha -ver doentes curados que deixam o hospi -tal, abandonam o acompanhamento hospitalar. - Deixam de ir às

consultas? - Sim. Na associação temos alguns casos de doentes que ficaram curados do vírus e decidiram abandonar os cuidados hospitalares. Deixo o alerta aos doentes, porque não ficam curados de todo, só com alta hospitalar. - Ainda têm problemas? - Têm problemas com o fí -gado gordo, cirrose, proble -mas devido ao consumo de álcool e drogas. (Mais infor-mação na pág. 19). • C.S.

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Hepatites virais, um diagnóstico fácil e necessário

As hepatites virais são doenças

comuns na população mundial,

originadas pela penetração

no organismo humano de

vírus que, apesar de terem

características e agressividades

diferentes, têm em comum

o facto de provocarem

infl amação do fígado. Em

alguns casos, como mais

frequentemente acontece nas hepatites B

e C, se essa infl amação não for controlada

ou o vírus eliminado, desencadear-se-á

uma deterioração progressiva das funções

hepáticas originada por uma destruição

irreversível das suas células, que em alguns

casos só é possível de resolver com um

transplante hepático.

Vários vírus podem provocar hepatites,

de entre os quais se destacam o vírus da

hepatite B e da hepatite C. Estes são mais

focados do que os vírus da hepatite A,

D ou E, que são menos agressivos e/ou

menos frequentes, o primeiro e o último

habitualmente provocando infecções

autolimitadas e o segundo surgindo

sempre associado à infecção pelo vírus B

(e principalmente em grupos de risco bem

identifi cados). No referente à hepatite A, a

melhoria das condições higieno-sanitárias

decresceu o seu impacto e reduziu a sua

incidência comparativamente com a

realidade do passado. Portanto, hoje em

dia, devido à sua gravidade, as atenções

estão mais voltadas para as hepatites B e C.

Para a hepatite B possuímos hoje uma

vacina integrada no Programa Nacional de

Vacinação, muito efi caz, que tem permitido

baixar a sua incidência. Estima-se que

esta infecção possa afectar cerca de 1%

da população. A imigração africana e dos

países do Leste europeu poderão fazer

subir a prevalência. Em cerca de 20% dos

casos pode evoluir para a cronicidade,

com uma elevada taxa de transmissão

por via sexual, mas também através do

sangue e dos seus derivados, além da

transmissão vertical (de mãe para fi lho

quando do parto). Na maior parte dos casos

a infecção crónica é assintomática. Esta

é apenas detectável por simples análises

sanguíneas. Também cerca de 22% dos

cancros hepáticos a nível europeu estão

associados à existência de infecção pelo

vírus da hepatite B. Torna-se importante

a adequação dos cuidados necessários

nos doentes infectados (ausência de

partilha de instrumentos traumáticos ou

que possam ter contacto com sangue,

utilização sistemática de preservativo

quando de relação sexual com parceiros

não vacinados, vacinação do agregado

familiar). Os tratamentos disponíveis nas

consultas de gastrenterologia e hepatologia,

administrados por via oral, com

pouquíssimos efeitos colaterais, ainda que

raramente proporcionem a cura defi nitiva,

permitem um controlo da infl amação

com consequente diminuição do risco de

evolução para cirrose ou para cancro do

fígado.

No respeitante à

hepatite por vírus

C, a situação é

substancialmente

diferente. Existem

hoje tratamentos

muito efi cazes que

levam a que as taxas

de cura defi nitiva

sejam superiores

a 95%, isentos

de signifi cativos

efeitos colaterais. A

hepatite C poderá

infectar cerca de

1,0% da população

portuguesa, em

muito maior escala

nos consumidores

de drogas, entre

os quais infecta

mais de 80%.

Sabe-se que o

sangue infectado é

a principal via de

transmissão, sendo

rara a transmissão

por via sexual ou da

mãe para o bebe.

Mas num numero

importante de

cidadãos infectados

com este vírus

não é possível

MIGUEL MANSO

Debate Dia MundialJosé Cotter

identifi car a causa da transmissão, pelo

que, tendo em consideração que a infecção

decorre na maior parte das vezes de forma

silenciosa, a Sociedade Portuguesa de

Gastrenterologia vem sugerindo que pelo

menos uma vez na vida o cidadão faça

um rastreio desta hepatite, através de

uma simples analise sanguínea. Estima-

se que o número de mortes relacionados

com a infecção pelo vírus da hepatite C

em Portugal será de cerca da 1000/ano,

uma vez que a infecção não tratada pode

desencadear complicações graves, como

cirrose hepática em 30-40% dos casos ou

cancro do fígado.

Duas referências para o facto de o

diagnóstico das hepatites víricas ser fácil

de fazer, recorrendo-se apenas a simples

análises sanguíneas e também para a

necessidade de os doentes considerados

curados após tratamento, no caso de

terem tido infecções ao longo de anos ou

diagnóstico de cirrose associada, deverem

manter consultas regulares, pois algumas

alterações que se geraram no fígado podem

permanecer e em alguns casos desencadear

complicações.

A necessidade de uma precoce

referenciação dos doentes com hepatites

víricas a consultas especializadas de

gastrenterologia por parte dos médicos de

medicina geral e familiar afi gura-se muito

importante, para que atempadamente se

possa fazer a avaliação necessária e iniciar

o tratamento indicado, de forma a evitar

danos no fígado (por vezes irreversíveis) e

manter a qualidade de vida dos doentes.

Gastrenterologista e hepatologista, presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia

Uma precoce referenciação dos doentes com hepatites víricas a consultas especializadas de gastrente-rologia por parte dos médicos de medicina geral e familiar afigura-se muito importante

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O Radar //

Arranca hoje o calendário de greves na saúde. Nélson, Mauro e Gonçalo dizem que a frustração vai muito além de não terem direito às 35 horas

Enfermeiros em greve. "Ao menos que respeitassem o nosso sacrifício"

MARTA F.-REIS

marta. reis(Oottline. pt

Estão na casa dos 30 e são os três casados com enfermeiras. É coin-

cidência, mas a probabilidade de

encontrar casos como os deles

não será assim tão rara: sem fins de semana "normais", sem feria-

dos e a trabalhar por turnos, aca-ba por ser habitual casais em que

os dois são enfermeiros. Os ami-

gos fogem, explicam. Nélson. Gon-çalo e Mauro são enfermeiros com contratos individuais de trabalho

de 40 horas cm hospitais públi-

cos. O facto de a reposição das 35 horas na função pública não se

ter estendido a este tipo de vín-culo laborai fez disparar a tensão

entre sindicatos e tutela mas, no

caso da enfermagem, o caderno de reivindicações que levou à con-

vocação de greves a partir de hoje inclui problemas mais antigos. A progressão na carreira está con-gelada, faltam enfermeiros nos

serviços, as horas extra não são todas pagas e entram para ban-cos de horas que não podem gozar quando lhes apetece.

Não há soluções à vista e as ações de protesto, que incluem mais

greves, vão continuar até setem- bro, =Jou ao i Guadalupe Súi Iõrz,

do Sindicato dos Enfermeiros Por-tugueses. À margem destas nego-ciações entre sindicatos e tute-la, Nélson, Gonçalo e Mauro

fazem parte de um grupo infor-

mal de enfermeiros com con-

trato individual em diferentes

hospitais. O grupo foi criado ago-

ra para fazer passar mensagens

que acreditam que muitas vezes

passam ao lado do público e dos

decisores. Na linha da frente do

atendimento, levam com os pro-

testos dos doentes quando este corre menos bem, e também

por isso entendem que está na

altura de esclarecer e de os enfer-meiros se unirem.

Uma ideia errada, defendem,

é que ganham "muito dinheiro".

Gonçalo, dc 38 anos, explica que já teve muitas vezes de desfazer

esse mito. É enfermeiro desde 2002 e só no ano passado, com

a nivelação dos salários para o

primeiro escalão da função públi-ca, teve o primeiro aumento: pas-

sou a ganhar, como a maioria dos enfermeiros, 1201 euros bru-tos. Há enfermeiros com 20 anos de profissão a ganhar o mesmo

que recém-licenciados, tudo por-que a progressão de carreiras está parada. Alguns acumulam com trabalho no privado, mas são a minoria, argumenta.

Para explicar a frustração que

sente, é precisar ir ao início da história. "Quando comecei a tra-balhar, havia uma grande expe-tativa dc que finalmente, a pro-fissão ia progredir, ia haver ava-liação por mérito. Fizeram-se

Profissionais de saúde com contratos individuais de trabalho continuam a trabalhar 40 horas. São 25 mil pessoas no SNS

RI(ARIX, l ASITJ

Enfermeiros pedem equidade

entre. colegas e progressão

na carreira

Trabalho suplementar é pago

em folgas que não podem decidir

quando usar

promessas mas os sucessivos

governos foram quebrando as promessas que faziam."

NÃO É SÓ TRABALHAR MAIS UMA

HORA Gonçalo acabou este ano

a especialidade de pediatria e trabalha na urgência pediátrica do Centro Hospitalar de Leiria.

Antes esteve em Tomar e conta que já aí havia uma grande con-

fusão sobre o impacto de ter um horário de 40 horas quando se

trabalha por turnos. Na altura. com a empresarialização dos hospitais, os enfermeiros que

fizeram novos contratos foram forçados a assinar este tipo de vínculos - deixaram de ser fei-tos contratos em funções públi-

cas. "Lembro-me de um admi-nistrador dizer que não perce-bia o nosso problema, era só mais uma hora por dia", recorda o

enfermeiro. As contas que na altura teve de

explicar voltam a fazer sentido agora, quando 9500 enfermeiros

com contratos individuais de tra-balho mantém horários de 40 horas e os restantes regressaram

às 35, apesar de ganharem todos

o mesmo. "Não é mais uma hora

por dia, são mais dois turnos e meio por més, porque o dia con-

tinua a ter 24 horas e os turnos

continuam organizados da rires-

ma forma-ou seja, não se faz mais

uma hora por dia, somam-se as

horas por mês e vê-se quantos tur-nos dá. Se são mais dois turnos e

meio por mês, quando os serviços estão organizados em turnos dc

oito horas, dá menos duas folgas num mês e menos três folgas no

mês seguinte, explica Gonçalo. O impacto também é fácil de expli-car. "Com mais estes turnos, não

podemos fazer os descansos que estão protocolados e garantem a segurança dos doentes. Se com um horário de 35 horas é possível

folgar um dia depois de fazer uma noite, com 40 horas fazemos duas noites seguidas e só temos o perío-do do dia para descansar, quando isso é possível."

A profissão em si já supõe um

desgaste acima do normal, mas com serviços desfalcados de pes-

soal aumentam as exigências. O trabalho é ininterrupto, só param para comer e à pressa.

Nélson tem 34 anos e trabalha Página 12

Tiragem: 16000

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

Pág: 9

Cores: Cor

Área: 22,60 x 31,50 cm²

Corte: 2 de 3ID: 65466111 28-07-2016

Concentração em Lisboa desconvocada IOSE seaucl

SAÚDE

Sindicatos querem 35 horas para todos e contratações

no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho. Também tem um contrato individual de traba-lho de 40 horas, mas admite que o problema atinge todos os enfer-meiros: as horas normais de tra-balho não chegam para assegu-rar os serviços e têm de fazer 20 a 25 horas adicionais por mês, o que dá um ou dois turnos extra. No seu serviço, como noutros. não são pagas como trabalho suplementar, mas entram para um banco de horas. Até aqui. tudo mais ou menos bem, desde que houvesse liberdade para aceitar ou não fazê-las e depois pudes-sem gozá-las quando quisessem. Mas não é isso que acontece "São horas que podem tirar-se ou não consoante a disponibilidade da instituição. Não é o profissional que decide", diz o enfermeiro, que tem por esta altura 40 horas por gozar. mas admite que há colegas de outros hospitais com mais de cem. Quando se tem uma filha pequena em casa e a mãe também é enfermeira, a gestão torna-se dificiL "A menina ou fica no infantário ou fica com os avós, ou quase sempre no formato de

pais divorciados que não são divorciados mas mais parece, porque só está um de cada vez com ela. É continuamente frus-trante, mas quando se tem horas para gozar e se falta a alguma coisa onde gostaríamos de estar é ainda mais frustrante."

Com a passagem às 35 horas e com falta de pessoal até pelo período de férias - portanto, uma contínua subtração de horas há outro impacto igualmente preocupante: reduz-se o núme-ro de enfermeiros nas escalas. "Como trabalho numa urgên-cia, não diminuem as camas dis-poníveis mas aumentam os tem-pos de espera", diz Gonçalo. O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses pede a contratação de mil enfermeiros nas suas rei-vindicações, mas ainda não hou-ve resposta da tutela.

Gonçalo diz que o sentimento geral é de injustiça e incom-preensão. "Se estou a sacrificar a minha vida pessoal e, traba-lhando por turnos, até vou ter menos anos de vida, ao menos que houvesse algum reconheci-mento", diz "Só queríamos que

o nosso sacrificio fosse respei-tado", acrescenta Nélson.

Mauro Germano, de 34 anos, trabalha no Hospital de São João e acredita que este problema. por resolver há anos, revela algo mais sintomático.

"Não percebo como é que nun-ca houve preocupação de unifor-mizar os regimes legais dos dife-rentes profissionais. de haver uma carreira, avaliação de desem-penho. Como se pode defender o SNS se não se tem isto em con-ta. se não se valoriza quem faz um mestrado para prestar melho-res cuidados à população'?" O brio profissional move muitos proje-tos, mas não pode ser conside-rado suficiente se se pretendem hospitais fortes, defende. "A fazer tudo por brio. aguentamos alguns anos, mas depois há contas para pagar, isto não é voluntariado. Claro que, na prática, é o que aca-ba por acontecer - não vamos prejudicar os doentes -, mas é aproveitarem-se da nossa boa vontade." O desejo não é fazer greve, mas que houvesse final-mente um acordo para a profis-são, conclui Gonçalo.

Greve mobiliza até às 24 horas do dia de hoje todos os trabalhadores da saúde

A par dos protestos dos enfer-meiros, a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalha-dores em Funções Públicas e Sociais convocou todos os tra-balhadores da saúde para faze-rem hoje um dia de greve con-tra a falta de cumprimento das promessas do gwerno na garan-tia do horário de 35 horas para todos os funcionários do Esta-do, e não apenas os que têm contratos de funções públicas. Além de 9500 enfermeiros com contratos individuais dc tra-balho, há mais 15 mil traba-lhadores no SNS com contra-tos individuais de 40 horas, entre os quais auxiliares e téc-nicos administrativos. Os sin-dicatos pedem igualdade na aplicação da lei, mas também a contratação de efetivas, denun-ciando que os profissionais que já passaram às 35 horas têm de continuar a fazer mais horas por falta de pessoal - trabalho suplementar que sofreu um corte de 50% nos últimos anos.

Do lado dos enfermeiros, a expetativa de que o governo venha a chegar a acordo, este ano, para passar todos os con-tratos individuais a horários de 35 horas é reduzida. Gua-dalupe Simões revelou ao i que o governo comunicou já não haver dotação orçamental. dado que isso implicaria mais con-tratações ou pagamento de tra-balho suplementar. Nesse sen-tido, o Sindicato dos Enfermei-ros Portugueses está a encetar

reuniões com conselhos dc administração para conseguir acordos locais. Outro proble-ma que está a surgir prende--se com o pagamento das horas extra que estão a ser pedidas mesmo a quem já passou às 35 horas: em alguns locais não estão a ser pagas, mas entram para os bancos de horas, que o sindicato considera serem ilegais, dado não existirem em mais nenhum grupo profissio-nal. O sindicato está mesmo a contabilizar o número de horas em dívida em cada serviço e pretende exigir o pagamento na íntegra à tutela. "São cente-nas de milhares de horas", ante-vê Guadalupe Simões. Inicial-mente estavam previstos para hoje e amanhã dois dias de gre-ve nacional, mas o SEP alterou esta semana o calendário do protesto. Hoje haverá greves distritais em cinco distritos (Viana do Castelo, Braga, Cas-telo Branco, Santarém e Faro), e amanhã greve nacional. Gua-dalupe Simões admite que o calendário foi alterado, em par-te, devido a uma primeira cedên-cia da tutela naquele que tinha sido um dos pontos para a con-vocação da greve: a proposta de lei que vai definir os atos dos diferentes grupos profis-sionais de saúde foi alterada para ir ao encontro das inten-ções dos enfermeiros, que se sentiam desvalorizados numa versão conhecida no início do mês. Mas a dirigente nega que haja uma menor mobilização: até setembro são convocados mais dias de greve - estraté-gia de convocar várias greves locais num curto espaço de tempo que o sindicato usou no passado.

Página 13

Tiragem: 16000

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

Pág: 1

Cores: Cor

Área: 5,37 x 4,22 cm²

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Saúde entra em greve na luta pelas 35 horas. Enfermeiros falam em incompreensão PÁGS. 8-9

Página 14

A15

Tiragem: 140038

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

Pág: 16

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CORREIO DA SAÚDE José Manuel Silva

BASTONÁRIO DAORDEM DOS M ICOS

Tribunal de Contas

Tribunal de Contas auditou os Cuida-dos de Saúde Pri-

mários e as Unidades de Saúde Familiares (USF).

Sempre elogiei o Tribunal de Contas (TC) e as suas im - portantes auditorias, mas já percebi que, na Saúde, apresentam inexplicáveis lacunas.

Por exemplo, para além do que já se conhecia sobre o passado, como pode o TC manifestar preoctção pela alegada reforfhà de 1761 Médicos de Família (MF) nos próximos seis anos, sem indagar quantos MF se formarão no mesmo período de tempo?

NA SAÜDE, AS SUAS AUDITORIAS TÊM INEXPLICÁVEIS

LACUNAS

Pois bem, serão mais de 2500! Logo, não há razões para apreensão... E a partir de 2025 reformar-se-ão menos de 100 MF por ano e continuarão a formar -se mais de 450 por ano!

Diz ainda o TC que, nas USF, um utente esperava 59 dias, em média, por uma consulta. Como é isto possí-vel se as USF, para o serem, estão obrigadas a dar res-posta no próprio dia a todas as situações agudas e a mar-car consulta a pedido do utente em cinco dias úteis? Na verdade, o TC confunde a boa prática da marcação de consultas programadas com 'tempos de espera'.

Os auditores do TC não são obrigados a saber tudo. Po rém, para preservar a sua 'infalibilidade', o TC deve ria ouvir todos os contrain teressados antes de extrair conclusões... •

o

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A16

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Campeões sem condecoração

Vinte de Julho de 1969, no mesmo

dia em que o homem pousava

na Lua, Alexandre Linhares

Furtado realizava a primeira

transplantação renal em Portugal:

uma doação de rim em vida de

irmã para irmão. Tardou até

1980 para que se retomasse a

transplantação em Portugal com

a colheita de dois rins em cadáver

em Coimbra, de novo por Linhares Furtado,

sendo um transplantado por ele em Coimbra

e outro em Lisboa por João Pena. Vamos já no

oitavo ano consecutivo em que na mesma data

do primeiro transplante se celebra a longa

história da transplantação feita de grandes

sucessos e de alguns retrocessos, mas com

um balanço muito positivo.

No último mês descobrimos que somos

um país de grandes campeões até com

justo direito a distintas condecorações. Mas

importa falar doutros campeões igualmente

importantes. Começo por referir o elo

mais importante da cadeia, o dador, e aqui

saliento o dador vivo como exemplo máximo

de altruísmo e de amor pelo próximo. São

os primeiros grandes campeões! Merecem

todas as condecorações imaginárias e o

nosso muito obrigado. Dão um pedaço de

si de forma desinteressada apenas como

grande expressão de amor incondicional,

melhoram e prolongam vida num receptor

preso a uma doença renal incapacitante ou a

uma máquina de diálise.

Uma nota de apreço para a sociedade

portuguesa que, mesmo em momentos de

grande dor, permite e aceita bem a colheita de

órgãos em cadáver, prolongando de alguma

forma a vida dos seus entes mais queridos

multiplicada noutras vidas que renascem

com a transplantação. Uma sociedade

pioneira no enquadramento legislativo do

dador presumido que permite que todos

sejamos dadores após morte, excepto se

expressarmos o contrário num registo de

não dadores. Uma sociedade justa e solidária

que aceita a doação e quase nunca recusa

tão nobre acto merece relevância.

Depois outros campeões devem ser

celebrados, os doentes com doenças

terminais de órgão em que só a

transplantação os pode salvar ou só a

transplantação lhes pode dar qualidade

de vida. Celebramos os que foram

transplantados, mas dirigimos o nosso

respeito e a nossa compaixão a todos aqueles

que não viram ainda a sua vez chegar e

principalmente àqueles que não tiveram a

sua oportunidade a tempo.

Infelizmente, longas listas de espera e

escassez de órgãos para transplantar fazem

com que um insufi ciente renal espere em

média quatro anos por um transplante

renal e alguns doentes morram em lista de

espera. Quem espera

um transplante

cardíaco, de fígado

ou de pulmão não

tem uma técnica

que lhe permita

sobreviver muitos

anos nessa espera

como acontece na

diálise para os que

esperam um rim.

Ao longo destes

anos em que

comemorámos

o dia do

transplante, muitos

acontecimentos,

uns melhores outros

piores, marcaram a

transplantação em

Portugal. Os números

tiveram altos e baixos

e recuperam agora

num ritmo que

desejo sinceramente

se mantenha

ascendente.

Portugal tem lugar

de destaque nos

números da doação

e da transplantação,

mas ainda assim

não chega, pois

a alta incidência

de doença renal

avançada que temos

precisa de mais transplantação renal.

Entre 2011 e 2014 os números afundaram-

se de forma dramática. Outras soluções

podem contribuir para inverter esta

tendência, como o aumento do transplante

renal de dador vivo e da colheita em

dadores em paragem cardiocirculatória. A

transplantação de rim de dador vivo permite

o maior sucesso clínico e pode aumentar as

taxas de transplantação renal, mas tem uma

expressão demasiado reduzida em Portugal.

A Sociedade Portuguesa de Transplantação

realizou a única grande campanha nacional

com o mote “Doar um rim faz bem ao

Portugal tem centros de referência de transplantação renal, hepática, cardíaca e pancreática, mas carece duma reorganização urgente da coordenação hospitalar para a doação e colheita de órgãos

ENRIC VIVES-RUBIO

Debate Transplantes e dadoresFernando Macário

coração”. É urgente relançar as campanhas

de informação sobre a doação em vida e cabe

ao Ministério da Saúde, em conjunto com as

sociedades científi cas, pegar neste assunto.

As equipas de coordenação, de colheita

de órgãos e também as de transplantação,

mantiveram sempre o seu esforço em prol

da actividade, muitas vezes com condições

longe das ideais e com difi culdades

acrescidas por mudanças ao sabor da

política e por reformas que tardam, mas

seguramente vêm a caminho. A experiência

adquirida das equipas no terreno permite

que Portugal mantenha um nível destacado

na transplantação dos diferentes órgãos

com uma qualidade técnica e científi ca

irrepreensível.

Portugal tem centros de referência de

transplantação renal, hepática, cardíaca e

pancreática, mas carece duma reorganização

urgente da coordenação hospitalar para a

doação e colheita de órgãos e da rede de

unidades de transplantação renal e cardíaca.

Os recursos humanos para a transplantação

são altamente especializados e face ao

crescente número de transplantados

precisam de reforço e incentivo.

Os direitos dos transplantados

consagrados na lei são irregularmente

cumpridos por algumas administrações

hospitalares, como ouvimos de viva voz

pelas suas associações. A descentralização

do seguimento dos transplantados renais

por serviços de nefrologia com competência

para tal tem de ser rapidamente regulada

e implementada. Os doentes não podem

continuar a deslocar-se fazendo enormes

distâncias para consultas de seguimento

em unidades de transplantação de hospitais

centrais completamente sobrelotadas.

Um esforço concertado de investimento

lúcido na transplantação em Portugal

permitirá a liderança não apenas nos

números, mas também na competência

científi ca e nos resultados clínicos. Podemos

continuar a ser campeões sem necessidade

de condecorações.

Assistente graduado de Nefrologia do Centro Hospitalar e Universit. de CoimbraPágina 16

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Tiragem: 69755

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

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Fátima Silva e Mário Moreira, pais de Sara, consideram que houve negligência

Paredes Inspeção-Geral das Atividades em Saúde diz que caso já prescreveu

Tribunal deverá julgar morte de Sara em setembro

Roberto Bessa Moreira [email protected]

>0 Tribunal Adminisativo e Fis-cal de Penaflel vai começar a julgar a ação administrativa em que a fa-mfila de Sara Moreira pede uma in-demnização ao Centro Hospitalar do Tãmega e Sousa (CHTS) pela morte desta jovem de Recarei, Pa-redes. após 11 idas à Urgência do Hospital Padre Américo, em Pena-fiel. É a própria advogada da famí-lia, Filomena Pereira. quem revela ao IN que já foi notificada para in-dicar cinco datas nas quais se pos-sa realizar a audiência preliminar. "Mas, devido às férias judiciais. isto só acontecerá em setembrõ. Será nessa audiência preliminar que se-rão respondidas as exceções invo-cadas pelo CHTS e que ficará defi-nida a matéria a ser julgada", expli ca a causidica.

Nessa altura já deverá ser conhe

cida a conclusão do parecer emiti-do pelo instituto Nacional de Medi-cina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) relativamente às causas da morte da jovem. Este documen-to foi solicitado pelo Ministério Pú-blico (MP) em janeiro de 2015. mas só foi concluído pelo Conselho Mé-dico Legal do INMLCF no passado

diagnóstico :

vezes foi Sara à Urgência do Hospital Padre Améri-co. O diagnóstico foi sem-pre o mesmo: ansiedade.

dia 13. Mesmo assim, sabe o 1N, na semana passada o parecer ainda não tinha sido anexado aos autos.

Paralelamente aos processos ju-diciais continua a decorrer o inqué-rito da Administração Regional de Saúde do Norte. "Contrariamente ao que foi avançado recentemente. esse inquérito não será arquivado", garantiu fonte deste organismo.

Factos prescreveram O mesmo já não se pode dizer da investigação que a Inspeção-Geral de Atividades em Saúde (IGAS) também tinha anunciado, após pe-dido do ministro da Saúde, Adal-berto Campos Fernandes.

Na resposta a um requerimento dos deputados do BE. a IGAS reve-la que "o prazo para se instaurar o procedimento de natureza discipli-nar encontra-se esgotado". Ou seja. "os factos ocorreram há mais de um ano" e o caso já prescreveu. "Assim, a IGAS não abriu inquérito a esta si-tuação. aguardando a posição do Ministério Público". lè-se, ainda.

Confrontado com esta situação. o bastonário da Ordem dos Médi-cos afirma que o Inquérito por si instaurado poderá ter o mesmo desfecho. "A lei é a mesma. Sei que as pessoas têm três anos para apre-sentar queixa e, se não o fizerem dentro desse prazo. o caso prescre-ve". declarou José Manuel Silva. "Mas ainda não tenho nenhuma in-dicação nesse sentido do Conselho Disciplinar do Norte", acrescenta.

Sara Moreira foi a primeira vez ao hospital em fevereiro de 2010. E morreu em janeiro de 2013. Em 11 idas ao hospital nunca foi detetado um tumor cerebral que seria reve-lado na autópsia. •

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Tiragem: 25772

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JOANA CAPUCHO

Escaldões, dores de cabeça e aler-gias são os sintomas que surgem com o calor e que fazem disparar as chamadas para a Linha de Saúde 24. De junho até agora, os enfer-meiros que ali trabalham recebe-ram mais de 800 chamadas asso-ciadas às temperaturas elevadas -não é de estranhar. O mês passado ficou na história como um dos mais quentes desdequehá registo (1880) e julho vai pelo mesmo caminho, já que as temperaturas registadas têm estado muito acima da média. Se-gundo apurou o DN, nos dias em que os termómetros subiram, re-gistaram-se mais chamadas de emergência para o INEM.

No relatório sobre as tempera-turas de julho, o Instituto Portu-guês do Mar e da Atmosfera revela que, em Portugal continental, a máxima do ar tem tido "valores muito elevados" e"muitosuperio-

res aos valores médios". E é preci-samente nos dias em que as máxi-mas estão mais altas e nos dias se-guintes que o INEM recebe mais telefonemas. Em julho do ano pas-sado, o dia em que se registaram mais chamadas foi o dia 20, com 3943 pedidos de ajuda. Este mês, contabilizam-se já oito dias com mais de quatro mil pedidos. Na se-gunda-feira, dia muito quente em todo o país, foram recebidos mais de 4200 pedidos de socorro.

Já a Linha da Saúde 24 atendeu, até ao dia 23, 310 chamadas por causa do calor, sendo que no perío-do homólogo do mês passado con-tabilizou 500. "Recebemos, em mé-dia, 2100 chamadas por dia. Os te-lefonemas relacionados com o calor estão dentro do que recebe-mos habitualmente nos outros anos", adiantou ao DN Sérgio Go-mes, responsável pela coordena-ção da linha.

Este mês, a Saúde 24 está a atender, em média, 13 chamadas

CONSELHOS

HIDRATAÇÃO > Beba bastante água, mesmo

que não tenha sede. Evite bebi-das alcoólicas e com muito açú-car. Opte por fazer refeições leves e mais frequentes. Tenha especial atenção aos mais vulne-ráveis. nomeadamente idosos, crianças e doentes crónicos.

VESTUÁRIO > Use roupas leves, claras e sol-tas, bem como chapéu e óculos de soL Nas horas de maior calor, evite atividades que exijam muito esforço físico. Use protetor solar.

ARREFECIMENTO > Em casa, feche as persianas ou portadas nas horas mais quen-tes. Deixe que o ar circule quan-do a temperatura no exterior for inferior à do interior.

por dia devido às temperaturas elevadas, "um número seme-lhante ao de 2015". Embora as temperaturas estejam mais ele-vadas, Sérgio Gomes acredita que não há mais chamadas, por-que "tem havido muita informa-ção sobre medidas de prevenção e alguma antecipação nos aler-tas". A maioria das chamadas re-cebidas este mês foi relacionada com o grupo dos 15 aos 64 anos (219 telefonemas) e, logo a seguir, com as crianças entre 1 e 14 anos (76 chamadas).

Nos dias 15 a 17 e nos dias 23 e 24, que coincidiram com os dois últimos fins de semana, mais de 90% do território registou tempe-raturas máximas superiores a 30 graus e 60% ultrapassou mesmo os 35. Em muitas zonas, as míni-mas não baixaram dos 20 graus. Segundo o relatório do IPMA, o facto de a temperatura não ter baixado muito à noite "pode ter originado desconforto térmico com impactos mais significativos na população mais vulnerável."

Embora o INEM não tenha da-dos que permitam relacionar o calor com o aumento de chama-das, nos referidos dias e naqueles que se seguiram, houve um au-mento do número de pedidos de socorro em Portugal. No dia 24, por exemplo, registaram-se 4030 chamadas e, no dia seguinte (se-gunda-feira), 4228.

Quanto à mortalidade, não hou-ve para já um aumento significati-vo. De acordo com o Sistema de In-formação dos Certificados de Óbi-to (SICO), no sábado passado registaram-se 249 mortes por vá-rias causas em Portugal, o mesmo

número que no ano passado. Já no domingo, morreram 267 pessoas, menos nove do que no ano passa-do. No entanto, na segunda-feira, o sistema registou 287 mortes e na terça 304, os valores mais elevados dos últimos sete anos para os dias 25 e 26 de julho.

"Há uma variação, mas está de acordo com o esperado pelo fenó-meno aleatório da mortalidade. O aumento está dentro da variabi-lidade que é esperada", explicou ao DN Graça Freitas, subdiretora-ge-ral da Saúde. No entanto, ressalva, "os efeitos do calor não se verificam de imediato", uma vez que a pessoa pode ter uma doença que se agra-ve, ser internada e só vir a falecer mais tarde. "Há uma diferença temporal entre o calor e a morte", adverte Graça Freitas.

Como as elevadas temperaturas que se fizeram sentir "podem ter um efeito tardio", só nos próximos dias será possível aferir se o calor provocou mais mortes do que o normaL Quanto ao número de pes-soas que recorreram às urgências, a subdiretora da Saúde diz que houve "um aumento muito ligeiro", mas "ainda não se sabe se foi devi-do ao calor ou ao acaso".

Contrariando a tendência des-te mês, o próximo fim de semana será mais fresco. Bruno Café. do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, adiantou ao DN que hoje é esperada "uma pequena su-bida de temperatura, em especial nas regiões do litoral oeste e no in-terior da região Sul" e amanhã "não há grande variação", mas no fim de semana está prevista uma descida das máximas e um au-mento de nebulosidade.

Calor apertou em julho e pedidos de socorro para o INEM aumentaram Verão. Temperaturas têm estado muito acima de valores médios, já há mais de oito dias que o INEM recebe 4000 chamadas diárias

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Tiragem: 140038

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Corte: 1 de 1ID: 65466286 28-07-2016

ESTUDO

Cafeína afeta memória do medo ['Cientistas da Universida-de de Coimbra e do instituto norte-americano MIT con-cluíram que o consumo re-gular e moderado de cafeína reduz a memória do medo e permite novas abordagens terapêuticas de controlo de fobias e depressão.

"Uma das bases do medo é a memória aversiva conti-nuada" e, em termos de saú-de pública, "o medo está as-sociado a fobias, stress pós--traumático e depressão", refere a Universidade de Coimbra. •

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A20

Tiragem: 25772

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Corte: 1 de 1ID: 65466086 28-07-2016

Identificados seis anticorpos do vírus zika CIÊNCIA investigadores norte--americanos conseguiram identi-ficar a natureza de anticorpos do vírus dita, o que pode servir para se fazer uma vacina ou chegar a um tratamento. "O que é mais im-portante é que alguns dos anti-corpos são capazes de neutrali-zar as estirpes africana, asiática e americana do ztka", disse Daved Fremont (à direita na imagem com o colega Alliched Diamond), coautor do estudo e pesquisador da Universidade de Washington. Estes investigadores identifica-ram os seis anticorpos -molécu-las capazes de reconhecer e se Ligar a certas estruturas biológi-cas - que se ligam fortemente ao vírus. Em teoria, podem servir tanto para fazer ume vacina con-tra o vírus e para melhorar a sen-sibiUdede e a velocidade de testes de diagnóstico, cuja hinção é de-bitar a presença do vírus_ Até agora, os investigadores só aper-feiçoaram estes anticorpos em ratos, mas os testes prosseguem.

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A21

Tiragem: 32680

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Corte: 1 de 2ID: 65465809 28-07-2016

E se o combate a infecções graves estiver dentro do nosso nariz?

O Sono, de Salvador Dalí (1937)

Afi nal, uma das possíveis soluções

para combater as preocupantes in-

fecções resistentes a antibióticos

pode ter estado sempre debaixo dos

nossos narizes. Ou, mais precisamen-

te, dentro dele. Trata-se de uma bac-

téria comensal, um tipo de bactérias

que vive no nosso organismo, se ali-

menta com ele mas não nos prejudi-

ca e, por vezes, até nos ajuda. Este é

o caso da Staphylococcus lugdunensis

que, segundo um artigo publicado

esta quinta-feira na revista Nature,

produz um composto que funciona

como um antibiótico, impedindo a

colonização do nariz por uma peri-

gosa bactéria patogénica que causa

infecções multirresistentes.

O nosso nariz é um verdadeiro

ecossistema que acolherá mais de

50 espécies de bactérias. Neste tipo

de “nichos” de bactérias (há outros

locais importantes como os intesti-

nos, a pele ou a cavidade oral), es-

tes organismos (conhecidos como

microbiota) competem uns com os

outros. Nessa luta, usam estratégias

para eliminar a concorrência que se

alimenta dos mesmos nutrientes.

Sabia-se que a perigosa bactéria

Staphylococcus aureus que pode pro-

vocar infecções multirresistentes —

nomeadamente a MRSA (Staphylo-

coccus aureus resistente à meticilina),

que é a principal causa de infecções

associadas aos cuidados de saúde em

todo o mundo — podia ser encontra-

da no nariz de 30% da população.

Não se sabia muito mais do que isto e

esse foi o ponto de partida da equipa

de investigadores da Universidade

de Tübingen, na Alemanha. O que

quiseram perceber foi o que é que

as restantes 70% das pessoas tinham

no nariz que era capaz de impedir a

colonização deste nicho por aquela

bactéria perigosa (que provoca in-

fecções no sangue, no coração e à

volta de próteses). E encontraram

outra bactéria: a Staphylococcus lug-

dunensis que produz um composto

que funciona como um antibiótico,

baptizado agora, em inglês, lugdunin,

contra a Staphylococcus aureus.

“Isto é algo completamente no-

vo. É um novo conceito. Foi com-

pletamente inesperado encontrar

uma bactéria humana a produzir

um antibiótico. E pode ser apenas

reus tinham a bactéria Staphylococcus

lugdunensis e que 34% não a tinham.

O que, argumentam, prova que esta

bactéria mantém a outra fora do ter-

ritório do nariz.

A viagem deste composto até à prá-

tica clínica começou agora. “Iden-

tifi cámos um novo composto que é

uma nova classe de antimicrobianos.

Estamos no início. Faltam anos de

mais investigação e muito dinheiro

para uma aplicação clínica. Preci-

samos, por exemplo, de parceiros

na indústria farmacêutica”, disse

Andreas Peschel. Sublinhando que

“nunca alguém encontrou nada as-

sim antes”, o investigador explicou

que até agora apenas “havia análises

que mostravam que genomas de bac-

térias que vivem no nosso organismo

contêm genes que podem servir para

potenciais produtos antibióticos”.

A defi nição de novas estratégias de

prevenção e a descoberta de novos

antibióticos para as infecções multir-

resistentes que estão a aumentar no

mundo são uma prioridade mundial.

No pior dos cenários e se nada for fei-

to para travar este problema, lembra

Andreas Peschel, dentro de poucos

anos as mortes provocadas por este

tipo de infecções vão ultrapassar as

causadas por cancro. O nosso micro-

bioma, as bactérias que vivem nos

nossos intestinos, na nossa pele, na

nossa cavidade oral ou no nosso na-

riz, pode ser uma das respostas. Para

já, os cientistas provaram que há pelo

menos uma promessa de novos anti-

bióticos debaixo do nosso nariz.

Um artigo na revista Nature revela que existe uma bactéria no nosso nariz que produz um antibiótico capaz de combater infecções graves. A descoberta pode ser útil para desenvolver novas terapias

MIcrobiologiaAndrea Cunha Freitas

detectada qualquer célula da bacté-

ria”, resumiu Bernhard Krismer, ou-

tro dos autores do artigo. O facto de

nem todos os ratinhos reagirem ao

tratamento terá uma explicação sim-

ples: “Não vimos uma cura total para

a infecção porque, como o composto

era aplicado topicamente na pele,

alguns animais lamberam-no.”

De resto o composto não parece

ser tóxico, abrange um espectro

alargado de estirpes da bactéria pa-

togénica e, por outro lado, a perigosa

Staphylococcus aureus não revelou

qualquer capacidade de desenvol-

ver uma resistência ao lugdunin. Os

investigadores também examinaram

amostras de 187 doentes hospitaliza-

dos e concluíram que apenas 5,9%

dos doentes com Staphylococcus au-

um primeiro exemplo. Vamos pro-

curar mais. Acreditamos que vamos

encontrar mais bactérias deste gé-

nero”, referiu Andreas Peschel na

conferência de imprensa da Nature

sobre o artigo. Assim, a busca de no-

vos antibióticos, muito centrada nos

microrganismos existentes no solo

e no ambiente, pode ser alargada e

focar-se agora no nosso organismo.

“Se calhar, não temos estado a olhar

para os sítios certos”, reconheceu

Andreas Peschel.

A equipa da universidade alemã

fez uma experiência com ratinhos

colonizados com a Staphylococcus

aureus, usando este composto co-

mo um tratamento tópico. “Houve

uma redução dramática depois do

tratamento. Nalguns animais não foi

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Tiragem: 32680

País: Portugal

Period.: Diária

Âmbito: Informação Geral

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Cores: Preto e Branco

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Há uma bactéria que produz um antibiótico capaz de combater infecção grave p26

A solução de uma infecção grave está dentro do nariz?

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Saúde (DN + JN) Tiragem: 140793

País: Portugal

Period.: Ocasional

Âmbito: Saúde e Educação

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Cores: Preto e Branco

Área: 11,60 x 11,26 cm²

Corte: 1 de 1ID: 65466983 28-07-2016

EDITORIAL Assinala-se hoje o dia mundial das hepatites. Este dia

pretende chamar a atenção dos países sobre a importância

da consciencialização e do entendimento da população

sobre estas doenças

A hepatite é uma doença prioritária na saúde mundial, sendo que cerca de 350 milhões de pessoas no mundo apresentam infeções crónicas por hepatite B e 170 milhões de hepatite C. Uma em doze pessoas sofre de hepatite. Esta doença causa a morte a cerca de 1,4 milhões de pessoas por ano.

A hepatite é uma doença inflamatória do fígado, provocada tradicionalmente por uma infeção virai. Existem cinco tipos principais do vírus: A, B, C, 0 e E, que podem causar infeção e inflamação do fígado e levar a cirroses e ao cancro do fígado.

A hepatite tem uma boa hipótese de cura, se diagnosticada precocemente e tratada corretamente. Nesse sentido, o conhecimento dos sintomas e dos mé-todos de prevenção são a chave para diminuir o impacto da doença.

Neste Dossier Saúde dedicado às doenças hepáticas, a visão dos especialis-tas pretende ser um marco positivo no combate à proliferação das hepatites.

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Saúde (DN + JN) Tiragem: 140793

País: Portugal

Period.: Ocasional

Âmbito: Saúde e Educação

Pág: 8

Cores: Cor

Área: 17,40 x 22,70 cm²

Corte: 1 de 2ID: 65467022 28-07-2016

ESTRATÉGIA PASSA POR UM CONJUNTO DE METAS ce prevenção, ciagnóstico e tratamento

A Estratégia da Organização Mundial de Saúde (OMS) para

as hepatites vínicas inclui metas abrangentes e ambicio

sas de prevenção, diagnóstico e tratamento para todos

os paires, para reduzir as taxas de mortalidade anual e aumen-

tar significativamente o rastreio e o tratamento das hepatite B

e C. A OMS reconhece que as hepatites vincas constituem um

sério problema de saúde pública e que a verdadeira dimensão

ainda é pouco clara. A mesma entidade alerta para o facto de

que muitos doentes não estão ainda diagnosticados e que cl

acessibilidade à terapêutica é muito reduzida (<1%)

A Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF)

saúda a estratégia da OMS 2016-2021, para as hepatites vincas.

A hepatite vinca é um enorme desafio para a saúde pública, com-

parável ao de outras doenças transmissíveis, incluindo o vírus

da imunodeficiência humana, a tuberculose e a malária. Apesar

da carga significativa que coloca na comunidade em todas as

regiões do mundo, a hepatite vírica tem sido largamente ignora-

da como um problema de saúde prioritário, até recentemente.

Acreditamos que este assunto não irá mais permanecer oculto

A estratégia inclui um conjunto de metas de prevenção,

diagnóstico e tratamento as quais, se alcançadas, irão redu-

zir as infeções crónicas dos atuais 6.10 milhões de casos para

0,9 milhões e as mortes anuais atribuíveis ás hepatites vínicas de

1,4 milhões para menos de 0,5 milhões em 2030. Esta estratégia

explora novas oportunidades, nomeadamente os avanços no

diagnóstico e no tratamento, e especialmente a possibilidade

de cura na hepatite C

A implementação de planos nacionais será a chave para

atingir esta meta, juntamente com uma série de ações específi-

cas, desde um reforço das medidas de prevenção ao aumento

significativo de novos doentes diagnosticados e candidatos a

tratamento.

A APEF deseja que Portugal adote esta estratégia da OMS de

eliminação das hepatites vincas mas reconhece que:

1) É imprescindível conhecer a verdadeira dimensão do problema

em Portugal identificando o número de indivíduos infetados,

as regiões de maior prevalência da infeção e a importáncia de

grupos com comportamentos de risco;

2) Exige a mobilização de todas as competências entre a diver

sidade dos grupos profissionais e organizações decisores

políticos, profissionais de saúde, doentes e sociedade civil.

E todos os intervenientes devem ser envolvidos desde o início,

participar ativamente no processo e garantir a comunicação

e a monitorização a todos os níveis;

3) É necessária uma articulação robusta em cada nível de cuida-

dos, entre níveis e entre setores, no sentido de assegurar as

medidas de prevenção, de rastreio e de referenciação para

tratamento;

4) Uma atenção especial deve ser dada à necessidade de recur-

sos humanos disponíveis.

A eliminação da hepatite C é viável e alcançável, mas somente

se os governos aderirem à estratégia da OMS.

A estratégia representa um momento crucial para as hepa-

tites vínicas. A redução das taxas de mortalidade, a intervenção

precoce no diagnóstico e tratamento conduzirão obrigatoria-

mente a custos reduzidos, dado os sistemas de saúde não terem

que suportar um número significativo de pessoas com doença

hepática crónica avançada, cirrose ou cancro do fígado. Por ou-

tro lado, como referido no nosso Plano de Saúde, a equidade e

o acesso adequado aos cuidados de saúde resultam em ganhos

de saúde, garantem a coesão e a justiça social e promovem o

desenvolvimento de um país.

Estamos conscientes das dificuldades associadas à imple-

mentação desta estratégia, mas o âmbito e a dimensão do pro-

blema exigem que esta seja levada a bom porto.

Estamos preparados para assumir esta responsabilidade,

mas é imperativo que se promovam a integração e a sustenta-

bilidade das várias intervenções.

A APEF faz parte da história das hepatites vincas e acredi-

ta que em Portugal, em 2030, as hepatites B e C já não consti-

tuirão uma ameaça à saúde pública. E serão sim, uma história

de sucesso.

A eliminação da hepatite C é viável e alcançável, mas somente se os governos aderirem à estratégia da OMS

ISABEL PEDROTO MD,PhO Presidente da APET Diretora do Serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar do Porto Professora do Instituto de Ciëncias Biornedicas Abel Salazar

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Âmbito: Saúde e Educação

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Isabel Pedroto

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Âmbito: Saúde e Educação

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Área: 17,40 x 22,70 cm²

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EVOLUÇAO

DANIEL SIMÕES, LUIS MENDÃO

e LAETITIA, do Grupo de Ativistas em Tratamentos

O papel da Sociedade Civil na resposta às hepatites virais

Em 2014, no Dia Mundial das Hepa-tites, 17 organizações da Socieda-de Civil, lideradas pelo GAT, lança-

ram um apelo pelo acesso universal, a preços comportáveis, aos novos trata-mentos para a hepatite C em Portugal.

Embora o acordo que possibilitou este acesso alargado tivesse demorado mais seis meses a ser assinado, o diálo-go e pressão da Sociedade Civil sobre Governo e indústria farmacêutica ajuda-ram a que o resultado final fosse mais próximo do objetivo. Os preços por cura serão agora mais de dez vezes inferio-res aos inicialmente pedidos, podendo e devendo descer mais. Temos hoje a possibilidade de, em poucos anos, eli-minar a infeção no país e liderar a res-posta europeia.

Este é um papel fulcral das Organi-zações da Sociedade Civil: a defesa, em público e à porta fechada, dos direitos das pessoas afetadas por um proble-ma ou doença e da sustentabilidade do SNS, sem demagogia, sem exigir o impossível. É também dos mais difíceis. É um trabalho não financiado, que exige um equilíbrio entre o que sabemos ser correto e o que é possível em determi-nado momento, e que nos coloca no centro de um conjunto de interesses que vão além da saúde e dos direitos das pessoas. A independência, o conhe-cimento científico sólido e atualizado, e o esforço continuado são as chaves para algum sucesso que tem havido.

Não podemos, contudo, baixar a voz ou os braços perante um sucesso par-cial. Conhecemos bem a realidade: os mais atingidos pela doença, as pessoas que usam drogas e os reclusos, continu-am com níveis de acesso ao tratamento e à prevenção (troca de seringas nas pri-sões, salas de consumo seguro) muito abaixo da restante população, uma dis-criminação inaceitável. Remover barrei-ras no acesso de pessoas indocumenta-das ao diagnóstico e tratamento é outra questão por resolver. Continuaremos a pugnar pela resolução destes e outros problemas.

O nosso papel não se esgota ai, po-demos ir muito mais além; somos parte da solução, apesar das limitações de re-cursos. Há luga► para uma Sociedade Ci-vil capaz em todos os níveis da resposta: promover a prevenção eficaz, testar e encontrar parte das pessoas não diag-nosticadas, encaminhá-las e acompa-nhá-las para seguimento médico, au-mentar a sua literacia em saúde, ajudar a que estejam prontas para iniciar tra-tamento. acompanhar esse percurso, e garantir que tudo isto decorre com respeito pelos seus direitos

É preciso, porém, que os restantes atores reconheçam, respeitem e cola-borem com as organizações que estão no terreno, ou falharemos todos, com consequências para a saúde das pes-soas e o futuro do pais.

Remover barreiras no

acesso de pessoas indocumentadas

ao diagnóstico e tratamento é

outra questão por resolver

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Period.: Ocasional

Âmbito: Saúde e Educação

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Cores: Preto e Branco

Área: 4,35 x 1,17 cm²

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Dkiel 5imbeè Luís Mendão e Laetitia

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País: Portugal

Period.: Ocasional

Âmbito: Saúde e Educação

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Área: 17,40 x 22,70 cm²

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Susana Lopes Gastrenterologista no Centro Hospltalur

de 5. João e Secretária Geral

da Assolação Portuguesa para

o Estudo do Figado

M DA N ÇA DE O rastreio é essencial

Com as mudanças verificadas

no passado recente,

o panorama das hepatites

- em especial a hepatite C -

mudou drasticamente. Com

a cura tornada uma realidade,

o rastreio assume-se como a

prioridade

Ocrescente desenvolvimento e reconheci-mento da especificidade dos métodos e técnicas diagnósticas e terapêuticas na

Hepatologia, que é a área do conhecimento que se ocupa das doenças do fígado, bem como as re conhecidas necessidades assistenciais no nosso pais e o seu preocupante impacto social economi co, tem vindo a reclamar de forma cada vez mais premente a necessidade de se estruturar um plano de abordagem e combate a um problema especifico como é a hepatite C.

Porque ocupa atualmente a hepatite C o cer-ne destas preocupações? Porque o cenário que os médicos portugueses dispõem agora é radicalmen-te diferente do que até há poucos meses tinham com que lidar.

Agora sabemos que conseguimos curar até 98% destes doentes! Conseguiu-se a disponibilidade da medicação, simples, segura e cómoda, para todos

os doentes até agora identificados. Disponibilidade essa que passou por uma readaptação dos preços a suportar pelo SNS, de forma a garantir equida-de e racionalidade. A terapêutica da hepatite C em Portugal comportou-se assim como um modelo a replicar, de ampla sinergia entre protagonistas nesta batalha: médicos, doentes, tutela, indústria farma-cêutica. Enfim, um exemplo a seguir.

Persiste, no entanto, um grande problema: re-conhecendo-se que haverá ainda entre nós, deze-nas de milhares de doentes por identificar, a quem poderíamos propor a cura - geralmente em apenas 12 semanas de tratamento e que impediria que pro-gredissem para doença hepática avançada - cura essa também que já sabemos que promove uma tremenda poupança no erário publico a médio e longo prazo, como devemos então atuar? Como fazer para diagnosticar esses indivíduos infetados, com doença hepática crónica, que não o sabem,

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Âmbito: Saúde e Educação

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PARADIGMA

nem o adivinham, nem lhes ocorre presumir? Como revelar um vírus silencioso, numa doença silenciosa?

É aqui que o rastreio poderá ter um enorme papel, com grande impacto individual e social: iden-tificando os indivíduos com infeção pelo VHC, será possível resgatá-los para o Sistema de Saúde e pro-por o tratamento curativo.

A redução em grande escala do número de infe-tados é a única forma (ainda para mais na ausência de vacina) de tentar eliminar esta doença.

Rastrear quem? Não sendo economicamente viável nem sensato rastrear toda a população, se-guramente há que apontar baterias aos grupos tra-dicionalmente mais associados ao risco maior de contrair esta infeção (recrutáveis nas populações que consomem ou consumiram drogas injetáveis, ou no sistema prisional, por exemplo) tal como, à semelhança do que os nossos colegas americanos fazem, procurar ativamente em todos os indivíduos

com mais de 50 anos, isto é, nos nascidos antes de 1965 (grupo populacional designado como baby-boomers). Por diversas razões, este grupo etário no seu passado mais ou menos longínquo, contactou com produtos contaminados pelo VHC ( em deriva-dos de sangue, por uso de material não descartável, por menores cuidados de assepsia) o que os fez ex-por ao vírus sem que houvesse consciência pessoal, médica ou social, da presença ou noção do risco de contrair essa infeção nessa altura. É precisamente neste grupo etário, superior a 50 anos. que se en-contra o maior número de infetados desconhecidos. Diagnosticar, permitirá referenciar para tratamento, tratar fará a diferença em termos pessoais e coleti-vos: esse é o projeto que atualmente a Europa e os Estados Unidos pretendem abraçar, o da eliminação da infeção pelo VHC nas duas próximas décadas. O caminho passa por procurar, identificar, curar. Eis o desafio.

O rastreio poderá ter um enorme papel,

com grande impacto indivi-

dual e social

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Âmbito: Saúde e Educação

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S usa na

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O QUE SÃO AS HEPATITES?

Adélia Simão Assistente Hospitalar Graduada de Medicina Interna A do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Doutorada em Medicina Interna pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Vice-Presidente da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado

o grego Hepar, fígado e Ite, inflamação, he- patites são doenças inflamatórias do fíga- do com várias causas possíveis. Quando

são devidas a vírus, designam-se hepatites virais. Estas são um importante problema de saúde pú-blica a nível mundial e, em Portugal, constituem uma causa importante de doença hepática, sendo apenas suplantadas pelo álcool e pela esteatohe-patite não alcoólica.

A hepatite pode ter uma evolução aguda ou crónica, considerando-se crónica quando persiste mais de seis meses.

São conhecidos cinco vírus das hepatites (A, 13, C, D, E), diferentes na sua biologia molecular e nas formas de contágio, todos causando hepatite aguda e alguns também crónica (13, C, D e, exce-cionalmente, E em indivíduos transplantados ou imunodeprimidos).

Na prática, interessam-nos sobretudo os vírus das hepatites B e C. pela sua frequência e pelo ris-co de cronicidade.

Deve realçar-se o carácter predominantemen-te assintomático, que faz com que a maioria dos ca-sos permaneça por diagnosticar e sem tratamento, até estádios avançados de cirrose ou mesmo de carcinoma hepatocelular, que é o principal tumor primário do fígado. Assim, para o diagnóstico pre-coce é necessário estar atento aos fatores de risco e/ou a alterações analíticas (muitas vezes deteta-das ocasionalmente).

A hepatite 8 pode transmitir-se por via sexual (contactos não protegidos), pela utilização de ma-terial contaminado usado para injeção de drogas, tatuagens ou piercings, pela partilha de objetos de uso pessoal (lâminas de barbear, escovas de den-tes), ou da mãe para o filho (via transplacentar, aquando do parto. aleitamento)

O principal modo de transmissão do vírus C (VHC) é através do sangue contaminado. Neste ví-rus a transmissão por via sexual é menos eficiente (encontrando-se infeção pelo VHC em cerca de 2 a 5% dos parceiros sexuais) do que na hepatite B.

As picadas acidentais também apresentam um ris-co baixo, de cerca de 3 a 5% (enquanto na hepatite B é de cerca de 30%) e a transmissão quando a mãe infetada dá à luz ronda também os 3%.

Atualmente, as transfusões são extremamente seguras, sendo os utilizadores de drogas por via endovenosa que estão em maior risco. O perigo de contágio existe não só na agulha mas também no restante material usado para preparação da droga (carica, colher, algodão, etc.). O uso de co-caína por via nasal também tem sido associado à transmissão deste tipo de hepatite.

No tratamento a evolução tem sido extrema-mente positiva, passando-se de uma atitude expe-tante para uma intervenção cada vez mais eficaz, incluindo meios medicamentosos e cirúrgicos, de-signadamente a terapêutica antiviral (resultando em supressão virai em mais de 90% dos casos, na hepatite B e na erradicação do vírus em mais de 95%, na hepatite C), e a transplantação hepática

A hepatite pode ter uma

evolução aguda ou crónica,

considerando-se crónica quando

persiste mais de seis meses

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EiSPECIA

P E C I A L DOSSIER

Este 5,4W:fletiu. faz parte Irrtegrr 'sio Diário de Nàj4,s e jornal de 'V.,' 9t 2015 t ',Lr., irsue ser rentnus Stkaiaritlift,

UMA INICIATIVA

LiSTRATEGIA As metas propostas para fazer frente às hepatites virais

ARTIGOS DE

José Carlos Saldanha I António Parente I Adéli Isabel Pedroto 1 Jorge Rodrigues I Rui Cernada Luis Mendão e Laetitia i Maria Antónia Alnieidc

Simão 1 Susan Simi5t11

nt 911/1. A D.

.4 4

'

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José Carlos Saldanha

António Parente

TESTEMUNHOS

1 S 1 enhor Ministro, não me deixe morrer, quero viver!" é uma das frases que fi- carão na memória de quem assistia a

uma audição na Comissão Parlamentar de Saúde,

um grito de desespero de José Carlos Saldanha que pode ter acelerado a mudança de rumo que

já urgia. Doente com hepatite C, chamou assim a aten-

ção do então Ministro da Saúde Paulo Macedo e

o desespero que sentia ecoou por muito tempo,

para lá das paredes do Parlamento. José Carlos esperava há meses pela autorização

para ter acesso ao medicamento para a hepatite C,

mostrou, inclusive, uma carta que tinha escrito di-rigida ao ministro a dizer que pagava metade do

tratamento até então sem resposta. Tardou, mas acabou por ver a sua situação bem resolvida e até recebeu um pedido de desculpas do ministro pela forma como foi conduzido todo o seu processo.

Hoje em dia, José Carlos vive dias mais tran-quilos e já sorri de novo à vida, mas 2015, o ano em que completou meio século, foi para esquecer,

"Depois de longos e penosos anos de um per-

curso de comportamentos desviantes que me le-

varam à condição de sem-abrigo, fui recolhido por um centro para pessoas sem-abrigo, destinado a ajudar a recuperar pessoas na mesma condição."

Para lidar constantemente com a doença arran-jou estratégias, "parei de imediato de utilizar qual-quer tipo de alterador de estado de espírito, o que englobava não só drogas como álcool, corte esse que fiz e mantenho até hoje com vontade férrea".

Para um doente com uma sentença de morte

assim a cada dia a vida parecia mais breve, a an-

siedade disparou, o medo instalou-se e cresceu como uma sombra que o perseguia e lhe toldava

as ideias: "Sabia que me deitava mas nunca sabia

se acordaria no dia seguinte, era uma angústia ter-rível e permanente."

José Carlos Saldanha, um perito de relógios de coleção, conquistou mais longevidade e já pisca o olho ao futuro. Parece ter renascido a cada minu-to por dentro e por fora "até no visual, com novo

corte de cabelo, mais animado, melhor aspeto e tudo", diz a brincar, sempre com a boa disposição demonstrada num sorriso franco que todos os dias mostra à filha, ainda menor, enquanto a ajuda a descobrir um mundo agora melhor.

Foi de uma conversa a dois, num grito de im-

potência e de desesperança que surgiu a ideia de avançarmos para a manifestação.

Só nos restava o transplante ou a morte. O GAT acedeu em apoiarmo-nos e as redes so-

ciais, outras instituições convidadas e os amigos

fizeram o resto. Naquele dia na Assembleia era o coração e o

sofrimento que nos saia pela boca e de forma bem expressa no pedido do José Carlos Saldanha ao Sr. Ministro da Saúde. "Não me deixe morrer" (sic)!

Este apelo ecoou nos órgãos de comunicação na-cionais e internacionais e, passados dias concluíram-

-se as negociações. Estas permitiram o acesso de 13 mil utentes ao tratamento.

Foi o regresso dos que tinham desistido do an-terior tratamento com Pegintron, e dos restantes que não estavam disponíveis para sofrer as seque-las nefastas do mesmo, com uma taxa de sucesso baixíssima.

Com a criação da Plataforma Hepatite C, assis-timos aos comentários dos que rejubilavam com o acesso ao novo medicamento e dos que desespe-rados colocavam as suas dúvidas, "quando chega a minha vez? "qual é o meu estadio, o que tenho de perguntar ao meu médico? O meu hospital ainda não está a distribuir, e agora? Para nós fundadores da Plataforma houve a necessidade da apreensão

A

de novos conhecimentos para podermos esclare-cer os doentes.

Contamos sempre com o apoio dos médicos, nossos aliados, que sempre se disponibilizaram seja para esclarecer, marcar uma consulta ou fa-zer um exame que fazia falta a um outro doente

que não conseguia do seu hospital de referência. O nosso muito Obrigado

Eu que tenho uma situação clínica agravada, com um F4 (estádio de cirrose), pensava que seria dos primeiros, mas uma série de burocracias adia-ram o meu tratamento cinco meses. Um tempo de luta pelos meus direitos, e de angústia, nunca mais

chegava o meu dia e, ninguém me sabia informar, havia sempre desculpas.

Finalmente chegou a aprovação, também eu partilhei a minha alegria. Seriam seis meses, e uma toma diária.

O problema foi que desde o início do tratamen-to que fiquei com insónias primárias, só adormecia perto da madrugada, não me receitaram nada, no último mês meti baixa, tal era o meu estado de fra-queza geral, mas mesmo assim consegui terminar. As análises confirmaram que me encontro curado.

Resta-me continuar a tratar bem o fígado a ní-vel alimentar e prosseguir a apoiar os que ainda não tiveram acesso ao tratamento e que lutam por esse direito.

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José Carlos Saldanha 1 António Parente

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Rui Cernadas Médico, ACES Espinho • Gaia

de Saúc e Púdica As hepatites víricas são ainda uma pandemia mundial. A Organização

Mundial de Saúde (OMS) propôs o combate à sua transmissão, a redução da

morbilidade e da mortalidade e a diminuição do impato socioeconómico sobre

pessoas e países

A té ,970, a hepatite A foi a forma predomi-

nante e a contaminação fecal das águas e dos alimentos será hoje, a par da falta de

condições de desenvolvimento social e económico,

a causa da sua persistência. Existe vacina específica, isolada ou em conjunto

com a da hepatite B. Os números, à volta da hepatite B, apontam a

nível global para mais de 350 milhões de pessoas,

com um número de óbitos anualmente a rondar

os 780 mil! A hepatite B é uma das doenças infeciosas mais

comuns à escala mundial, apesar da introdução da

vacina, na década de 1980 ter levado a um forte

declínio nos países em que os programas foram lançados e mantidos, Portugal incluído.

A hepatite B incide mais nos países pobres e nos

grupos sociais mais desfavorecidos, em regiões ur-

banizadas, nas chamadas minorias étnicas e em

indivíduos ligados aos comportamentos de risco,

sexual, dependências e picadas, tendo ainda trans-

missão vertical (ou seja de mãe para filho).

Desde o início do século XXI, assistiu-se ao de-

clínio da dimensão da infeção pelo vírus da hepatite

B em favor do vírus da hepatite C. A hepatite C e a

introdução dos testes de deteção e identificação do

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Em Portugal poderemos assumir cerca de 150 mil doentes infetados pelo vírus da hepatite C, uma pequeníssima parte do contingente a nível mundial estimado em mais de 160 milhões

agente infecioso ultrapassou largamente todas as previsões iniciais, logo a partir dos primeiros dados

disponíveis obtidos entre os dadores de sangue e os grupos de risco.

Em Portugal poderemos assumir cerca de 150 mil doentes infetados pelo vírus da hepatite C, uma pequeníssima parte do contingente a nível mundial estimado em mais de 160 milhões.

Deparamo-nos já com uma prevalência quatro vezes superior à do vírus da imunodeficiência hu-mana e com um número anual de mortes na casa do 0,5 milhão!

E o cenário é mais complexo considerando que, ao ano, estão a infetar-se pelo vírus da hepatite C mais três milhões de pessoas...

As complicações mais comuns incluem assim a cirrose e o carcinoma hepatocelular, apesar de os indivíduos infetados poderem não apresentar nem manifestar qualquer sintoma por uma, duas ou três décadas.

Estima-se que entre 60 e 70% do total de infe-tados, venham a desenvolver quadros de infeção crónica.

A hepatite C é primeira causa de doença he-pática crónica e de transplante de fígado, mas pa-radoxalmente é também a única infeção crónica vírica potencialmente curável, razão pela qual, o tratamento desta causa de doença hepática em todo o mundo visa obviamente a erradicação do vírus.

Há outras formas de hepatites, igualmente pre-ocupantes e tidas como questões de saúde públi-ca, mas que não cabem aqui.

Um dos grandes problemas clínicos na hepatite C está relacionado com o timing do diagnóstico e com a falta de informação à população.

A instituição do diagnóstico pode ser tardia e dado que a evolução é assintomática e insidiosa, onde aparentemente nem o paciente, nem os pro-fissionais de saúde se apercebem de nada, o pro-blema acentua-se.

É preciso definir uma estratégia para os cuida-dos primários, num contexto mais abrangente e envolvendo as dependências atuais ou passadas, trabalhadores do sexo, as passagens pelas prisões, as infeções por ViH, tuberculose e hepatites.

A articulação e continuidade de cuidados e o reforço do plano nacional de vacinação, à luz da posição dos médicos de família na cadeia assisten-cial do SNS exigem esta necessidade.

O curso da evolução aponta para dificuldades no tratamento individual dos doentes mais enve-lhecidos pelo aumento da longevidade e também pela associação de comorbilidades.

Na verdade, o problema das doenças crónicas constitui uma tragédia já reconhecida como tal pela OMS, face ao facto de representar uma mudança de paradigma na prática médica.

A gestão da doença crónica assume-se assim como o maior desafio das sociedades para o futu ro e as hepatites serão o melhor exemplo de uma mudança conseguida.

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VERDADEIRA, BOMBA RELOGIO VIRAL

MARIA ANTÓNIA

ALMEIDA

SANTOS, da Comissào Parlamentar de Saúde

O Parlamento Português,

nomeadamente a

Comissão de Saúde

aprovou a constituição

de um grupo de trabalho

de acompanhamento das

questões das hepatites

A hepatite C e as doenças do fí-gado representam um grave e preocupante problema de

saúde pública. A Global Commission on Drug Policy

considera que estamos perante uma verdadeira "bomba-relógio viral" a qual afeta cerca de 170 milhões de pessoas no mundo e causa 350 mil mortes.

Em Portugal a situação é preocu-pante. Morrem cerca de 900 pessoas devido a complicações desta doença. No que diz respeito ao impacto econó-mico, todos os anos o SNS gasta mais de 70 milhões de euros nas consequências desta doença e os próximos anos con-tinuarão a apresentar grandes desafios ao setor da saúde, desde logo porque não se prevê um aumento significativo de recursos disponíveis, o que implica encontrar novas formas de ter mais saúde com quase os mesmos recursos.

Mas uma certeza temos; os custos indiretos são muito superiores aos cus-tos diretos.

Há problemas de saúde pública para os quais infelizmente não temos resposta, há outros em que felizmente

temos resposta e, por Isso, é urgente agir. Portugal é dado como exemplo no exterior, pela estratégia para o trata-mento da hepatite C. Hoje, um indivíduo diagnosticado, é um indivíduo tratado. Foi um ano de trabalho árduo com os profissionais mais reputados, as asso, ciações de doentes foram fundamen-tais e os decisores políticos perceberam que a situação mesmo com fragilidades, permitia soluções. Apetece no entanto dizer, " e a luta contínua".

A Conferência Europeia sobre he-patites, realizada recentemente em Bru-xelas, onde estiveram multi-stokeholders , organizações científicas da hepatite B e C, o Comissário Europeu para a saú-de e muitas organizações não governa-

Por ano o SNS gasta mais de 70 milhões de euros nas consequências desta doença

mentais, conseguiu uma concordância no sentido da premencía de um plano de eliminação da hepatite C.

O diagnóstico está feito, o aces-so ao tratamento já é uma realida-de, temos agora de avançar para o plano de eliminação das hepatites. Não podem existir perceções erradas nem preconceitos que nos travem neste caminho que é uma medida estruturan-te de saúde pública. Afinal é a quinta causa de morte precoce em Portugal. Enquanto cidadãos, que gozamos de autonomia, devemos estar informados e prevenir a doença, fazendo o rastreio e acompanhando as boas notícias que surgiram com a possibilidade de cura destas doenças que tanto tem atormen-tado o mundo.

O Parlamento Português, nomeada-mente a Comissão de Saúde aprovou a constituição de um grupo de trabalho de acompanhamento das questões das hepatites.

Quanto maior for o empenho de to-dos, maior será o êxito do plano de eli-minação. Vamos ter um plano, vamos trabalhar para isso.

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Maria Antónia Alnleid.nf ]

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