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O Social em Questão - Ano XIX - nº 36 - 2016 285 pg 285 - 310 Rede Socioassistencial do SUAS: configurações e desafios Peter Kevin Spink 1 Ana Marcia Fornaziero Ramos 2 Resumo A consolidação da Política de Assistência Social por meio do Sistema Único de Assistência Social requer uma rede socioassistencial de caráter público capaz de garantir o acesso universal a serviços com vistas à integralidade da proteção social a quem necessitar. Atual- mente, essa rede é formada pelas esferas estatais e não estatais. É importante refletir sobre essa configuração e seus desafios. Este artigo traz breve relato da trajetória da Assistência Social e sua relação com as Entidades Sociais. Apresenta a configuração da rede socioas- sistencial da Assistência Social no nível nacional e ao final analisa suas as potencialidades e seus desafios. Palavras Chaves Política de Assistência Social; Rede socioassistencial; Governo Municipal; Entidades de Assistência Social; Parceria. Providing services in Brazilian Social Assistance Policy: configurations and challenges Abstract The consolidation of the Social Assistance Policy through the UnifiedSocial Assistance System requires a social-network public able to provide services to poor andvulnerable portions of the population to guarantee universal access and to assure integrality of social protection. Currently this network is formed by state and non-state sectors. It is impor- tant to reflect on this configuration and its challenges. This article provides brief report of the history of Social Assistance and its relation to Social Entities. Shows the configuration of the social-network at the national level and at it analyzes the potential and the challen- ges this network. Keyswords Social Assistance Policy; Social assistance network; Local government. Entities of social assistance; Partnership

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Rede Socioassistencial do SUAS: configurações e desafios

Peter Kevin Spink1

Ana Marcia Fornaziero Ramos2

Resumo

A consolidação da Política de Assistência Social por meio do Sistema Único de Assistência Social requer uma rede socioassistencial de caráter público capaz de garantir o acesso universal a serviços com vistas à integralidade da proteção social a quem necessitar. Atual-mente, essa rede é formada pelas esferas estatais e não estatais. É importante refletir sobre essa configuração e seus desafios. Este artigo traz breve relato da trajetória da Assistência Social e sua relação com as Entidades Sociais. Apresenta a configuração da rede socioas-sistencial da Assistência Social no nível nacional e ao final analisa suas as potencialidades e seus desafios.

Palavras Chaves

Política de Assistência Social; Rede socioassistencial; Governo Municipal; Entidades de Assistência Social; Parceria.

Providing services in Brazilian Social Assistance Policy: configurations and challenges

Abstract

The consolidation of the Social Assistance Policy through the UnifiedSocial Assistance System requires a social-network public able to provide services to poor andvulnerable portions of the population to guarantee universal access and to assure integrality of social protection. Currently this network is formed by state and non-state sectors. It is impor-tant to reflect on this configuration and its challenges. This article provides brief report of the history of Social Assistance and its relation to Social Entities. Shows the configuration of the social-network at the national level and at it analyzes the potential and the challen-ges this network.

Keyswords

Social Assistance Policy; Social assistance network; Local government. Entities of social assistance; Partnership

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IntroduçãoEste artigo3 tem como interesse discutir como que as manifestações da

questão social4 advindas das inúmeras vulnerabilidades5 urbanas (institucio-nais, sociais, materiais, conjunturais) e, portanto, da exposição das pessoas a inúmeros riscos sociais, vêm sendo enfrentadas pelos governos municipais no campo da Assistência Social.

A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS/19936), a Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), o Sistema Único da Assistência Social (SUAS) e, consequentemente, suas Normas Operacionais Básicas, indicam que o enfrentamento da desigualdade social e o consequente atendimento das necessidades básicas da população devem ser tratadas por um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, com vistas à garantia da proteção social integral.

No que compete à Assistência Social, está prevista a oferta pública de uma rede continuada de serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social mediante articulação entre todas as unidades de provisão do SUAS, a qual é denominada rede socioassistencial.

O atendimento às demandas das populações mais vulneráveis tem sido re-alizado historicamente tanto por serviços executados diretamente pela esfera governamental, quanto por uma esfera não governamental e será por meio da integração desses serviços na configuração de uma rede de socioassistencial que se garantirá a complementariedade do atendimento às demandas da população, permitindo o acesso a direitos, sendo este um dos meios de enfrentamento das expressões das desigualdades sociais.

As normatizações vigentes prevêem o reconhecimento de uma rede socio-assistencial prestada por entidades e organizações sociais, a qual deve estar vin-culada ao SUAS por meio da adesão das entidades e organizações sociais ao Sis-tema. Indica-se assim, a necessidade de que as entidades e organizações sociais que historicamente vêm buscado respostas aos problemas sociais conforme suas crenças, as faça sob o novo paradigma da Assistência Social, concebida a par-tir da Constituição Federal de 1988 como política pública de proteção social, política de direitos, de responsabilidade estatal, composta pelo tripé Saúde, Previdência e Assistência Social. Nota-se, nesse caso, uma clara distinção entre a assistência social como política pública de direitos e a filantropia, campo da benemerência e da solidariedade (PAZ, 2010), sob os quais muitos dos atendi-mentos à população no passado foram feitos.

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No entanto, não tem sido fácil configurar uma rede socioassistencial que vise a garantia da integralidade da proteção social apenas pela integração dos serviços das duas esferas (pública estatal e privada).Integrar-se a uma rede, ini-cialmente, pode significar ser apenas mais um na somatória de recursos socio-assistenciais à disposição da população que deles necessitam. A princípio, não se trata de avaliar negativamente essa integração, uma vez que a Assistência Social necessita de grandes coberturas para atendimento as necessidades da popula-ção. No entanto, para que de fato as redes sejam complementares e seus autores sejam corresponsáveis no enfrentamento das expressões das desigualdades so-ciais e na busca de uma sociedade mais justa, é necessário que ambos, governo e entidades desenvolvam mecanismos de apropriação de toda a Política,sentindo--se mutuamente responsáveis pelo seu rumo, pela sua consolidação, pela garan-tia dos direitos à população de ser protegida, na sua integralidade.

Assim, é necessário refletir sobre a configuração atual da rede socioassisten-cial brasileira e discutir sobre o desenvolvimento de estratégias. Por um lado,de gestão governamental que viabilizem, de fato, a incorporação das entidades e organizações sociais no SUAS, como entidades e/ou organizações de Assistência Social7, fomentando e potencializando seu vínculo ao SUAS e, por outro lado, as próprias entidades de Assistência Social devem manifestar o desejo de estabelecer esse vínculo, definindo sua dimensão. É necessário que as entidades de assistência social definam até que ponto desejam ou conseguem incorporar-se ao SUAS, en-tendendo que seu completo vínculo depende de sua completa adesão ao sistema. Supõe-se que governo e entidades implementações integradas, superem as seg-mentações e fragmentações na atenção às necessidades da população.

Para contribuir com as reflexões, esse artigo apresenta uma breve revi-são da literatura que versa sobre a Política de Assistência Social no Brasil, sua trajetória histórica e configurações atuais, bem como sua relação com as entidades de Assistência Social, pois, historicamente, as Políticas Públi-cas de Assistência Social foram implementadas pelo Estado em conjunto com organizações de origem cívicas e religiosas, denominadas por muito tempo de Entidades Sociais8 (ES), o que trouxe para a Assistência Social marcas de benemerência e filantropia. Desde a aprovação da Constituição Brasileira de 1988 (CF/88), tem se buscado alterar essas marcas

O artigo parte do entendimento, conforme Constituição Brasileira de 1988, que cabem aos governos municipais a implementação e condução das políticas sociais e, assim, o atendimento das demandas sociais da população no seu âmbito,

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sendo o governo federal e o estadual corresponsáveis tanto pelo cofinanciamento dessas políticas, quanto pela cooperação técnica. No entanto, ser o condutor das políticas sociais não impede que os governos tenham parceiros tanto para a execu-ção dos serviços que advém dessas políticas, quanto para a construção conjunta de projetos societários que venham ao encontro de maior justiça e equidade social.

Ainda para essa reflexão, o artigo traz, de forma sintética, elementos de como tem se configurado a rede de serviços socioassistenciais no Brasil, a par-tir do estudo realizado por meio do CENSO SUAS 20149, mapeando quem tem protagonizado a rede socioassistencial brasileira. Tomou-se como foco as unidades de acolhimento; unidades de convivência nas diversas faixas etárias; unidades de atendimento às mulheres vítimas de violência e unidades de aten-dimento à pessoa com deficiência.

Ao final tecem-se as considerações.

Assistência Social: concepção, parceiros e desafiosA história brasileira nos mostra que por meio de uma relação complexa, e

muitas vezes confusa entre o público e o privado na prestação de serviços sociais, não houve, nem por parte do Estado, nem das chamadas Entidades Sociais (ES), uma preocupação em separar e definir papéis e responsabilidades no trato das demandas da população. (YAZBECK, 1995).

Embora o Estado tenha tido diferentes posturas diante das manifestações da questão social, em função dos diversos momentos políticos, sempre exerceu um papel de subsidiário das ES, fornecendo apoio financeiro para que as mesmas executassem serviços na área da Assistência Social, os quais, de fato, seriam de responsabilidade sua, fazendo com que algumas inclusive se tornassem dependen-tes do Estado e do financiamento governamental. (IAMAMOTO e CARVALHO, 1993); LANDIM, 1993; MESTRINER, 2001; RAICHELIS, 1997).

A partir da aprovação da Lei Orgânica da Assistência Social em 1993 (LOAS/1993), desencadeou-se um processo nacional de construção de um sis-tema descentralizado e participativo dos entes federados brasileiros com a im-plantação de conselhos, fundos e planos municipais, a realização de conferências nacionais, estaduais e municipais e a organização da sociedade civil por meio da constituição de fóruns municipais, estaduais e nacional.

A concepção de Assistência Social definida na LOAS e na Política Nacional de Assistência Social – PNAS de 2004, passa a ser a de uma Política de Proteção So-cial, com caráter público e não contributivo, com a primazia da responsabilidade

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do Estado na universalização de direitos e de acesso aos serviços (CHIACHIO, 2006; PAZ, 2010). Dessa forma, a Assistência Social passa a ter um novo para-digma, ultrapassando e rompendo com as noções de caridade, benemerência e doação, que teve no passado.

Em 2004, aprovou-se o Sistema Único de Assistência Social (SUAS)10, que visa reunir serviços, programas e benefícios para a população brasileira que dela necessitar. Assim, as diversas ações e iniciativas de atendimento à população “ca-rente” deixam o campo do voluntarismo e passam a operar sob a estrutura de uma política pública de Estado.

Com a aprovação da Política Nacional da Assistência Social de 2004 (PNAS), a forma de participação das entidades sociais também passou a ser mais claramen-te delineada. A PNAS incorporou as entidades prestadoras de Assistência Social que passaram a integrar o SUAS como prestadoras complementares de serviços socioassistenciais e como cogestoras e corresponsáveis na luta pela garantia dos direitos sociais dos usuários da Assistência Social (PAZ, 2010)

Tendo em vista a trajetória histórica brasileira da Assistência Social e a rela-ção estabelecida entre o Estado e as ES nesse campo, a integração das entidades ao sistema público de proteção social torna-se um grande desafio, pois a mesma não visa somente à garantia da oferta de serviços socioassistenciais a todos que necessitarem, mas também o aprimoramento da qualidade dos serviços ofer-tados. “... A articulação de ações e instituições públicas e privadas por meio da construção de uma rede socioassistencial é o caminho apontado pela PNAS para garantir a integralidade do atendimento dos usuários dos serviços socioas-sistenciais...” (JACCOUD, 2010, p. 79).

O processo de implantação do SUAS teve como base de sustentação ideopolí-tica a disseminação dos princípios que regem a Assistência Social como direito do cidadão e dever do Estado, emanados da Constituição Federal de 1988 e ratificados na LOAS. Assim, criaram-se referências estatais para possibilitar a identificação dos serviços prestados com primazia do Estado. Desta forma, a presença do SUAS nos municípios se dá pelo conjunto de serviços, programas, projetos e benefícios no âmbito da Assistência Social, ofertados diretamente nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS), vinculados à Proteção Social Básica e nos Centros de Re-ferência Especializado de Assistência Social (CREAS), vinculados à Proteção Social Especial, ou por meio de convênio com organizações sem fins lucrativos.

Os CRAS e CREAS11 devem ser referências ao usuário da Assistência Social e a rede de serviços, tanto públicos como privados, deve estar referenciada a essas

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unidades. Dessa forma, faz-se necessária a identificação, em cada município, da existência de uma rede de serviços socioassistenciais permanente e continuada, que deve ser integrada aos serviços públicos, bem como complementar e corres-ponsável entre as ações governamentais e não governamentais. Assim, prevê-se o estabelecimento de pactos com entidades sociais, visando a sua vinculação ao sistema e a seus princípios públicos.

No entanto não tem sido tarefa fácil concretizar um sistema articulado de res-postas às necessidades da população, diante da história que a área da Assistência Social apresenta e da complexidade dos problemas sociais a serem enfrentados.

A Assistência Social foi desenhada como uma política de benefícios e serviços. No entanto, a inexistência de serviços ou de atenções e/ou sua incapacidade de atender em número suficiente para garantia da universalidade de acesso gera uma situação em que a transferência de recursos públicos para as ES é a condição que o governo dispõe para ampliar o universo de atendimento (SPOSATI, 2010).

Segundo Mestriner (2001), é necessário considerar que a relação público--privado (ou para ser mais específica e empírica, a relação pública estatal – priva-do sem fins lucrativos) é a base de assentamento da política pública hoje. Assim, devem surgir novas forças sociais com novos referenciais, assumindo novas pos-turas. Não será, como a autora defende, por normatizações burocráticas, que se afiançarão direitos e cidadania à população que precisa dos serviços de Assistência Social. É necessário, de um lado, a conformação de um novo tipo de Estado, compromissado com a democracia e as causas sociais, e de outro, uma nova confi-guração da sociedade civil, onde as ES sejam, de fato, parceiras e compromissadas com a Política de Assistência Social. Assim, será possível criar novas formas de relação entre o Estado, as ES e a sociedade (DAGNINO, 2002; FARAH, 2000; FUNDAP, 1997; SPINK, 2002).

É necessário considerar que as Entidades de Assistência Social12, fazem parte de um universo amplo e bastante heterogêneo de organizações da sociedade civil. Por definição, são organizações sem fins lucrativos e de interesse público voltadas à prestação de serviços de proteção social, assessoria, promoção e defesa de di-reitos do público sujeito da assistência, devendo estarem comprometidas com o conceito democrático de fim público13 (ABONG, 2005).

Essas entidades, por sua heterogeneidade, apresentam diferentes naturezas e perfis organizacionais, sendo regidas por distintos instrumentos jurídicos. Evi-dentemente, essa heterogeneidade implica na existência (e no conflito) de inú-meros interesses políticos, econômicos e sociais, o que termina representando

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dificuldades de definições tanto conceituais como vinculação operacional a uma Política de Assistência nos padrões atualmente propostos.

Do mesmo modo, vale apontar que a Assistência Social teve sempre uma atu-ação direcionada: seja para a população em maior vulnerabilidade, seja para fases mais vulneráveis do ciclo de vida. Este foco acabou sendo interpretado como sendo uma atuação exclusiva e restrita para os carentes, necessitados, vulneráveis, miseráveis, excluídos, entre outras expressões estigmatizadoras. Como consequ-ência, vê-se a Assistência Social algumas vezes, não como política pública, parte integrante do sistema universal de Bem-Estar Social e direito de todos, mas como aquela que presta serviços gratuitos para os pobres e desprovidos, podendo ser realizada e executada por todos aqueles que têm compaixão, benemerência, vo-luntarismo e filantropia. Assim, abre-se possibilidade para todo tipo de contradi-ção e até de conflito entre gratuidade, parceria estatal-sociedade civil, obrigações estatais e ação comunitária(nota-se que, até hoje, parte da atuação em saúde e também em educação sofrem do mesmo preconceito: de serem serviços para as pessoas que não podem pagar).

A Assistência Social é política pública que, como as outras, necessita de com-plementariedade das demais. No entanto, seu campo de atuação é bem vasto. Ao trabalhar com as manifestações da questão social, atua tanto no campo da Proteção Social Básica, que prevê ações e serviços no campo da prevenção em situações de risco, bem como na Proteção Social Especial que prevê ações e ser-viços às famílias e indivíduos que tenham seus direitos violados e que estejam com seus vínculos familiares e comunitários fragilizados ou rompidos. Entre suas ações estão: 1) a inserção das famílias e indivíduos no CadÚnico; 2) o atendimento e acompanhamento das famílias e indivíduos que estão: a) em situação de vulnera-bilidade e risco, b) nos Programas de Transferência de Renda, principalmente as que estão fora das condicionalidades, c) as que estão com seus direitos violados. Oferta serviços com ênfase ao convívio, à profissionalização, ao cumprimento de medida sócio educativa, à defesa e proteção jurídico social e ao acolhimento institucional voltados à família e aos diversos segmentos populacionais tais como: crianças e adolescentes, juventude, idosos, população em situação de rua, mu-lheres, diversidade sexual e pessoa com deficiência. Como se pode perceber, é um campo heterogêneo, onde algumas questões estão claramente delineadas e, portanto, as ofertas já estão estruturadas, tem objetivos definidos e possui ações dirigidas. Entretanto, há questões cujo campo ainda está em construção, com dis-cussões sendo realizadas, conceitos sendo formados, como é o caso das questões

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ligadas à juventude, à mulher vítima de violência, à população em situação de rua e à diversidade sexual, para citar algumas, não se tendo total clareza dos caminhos e dos impactos das medidas tomadas.

Para buscar respostas a essas questões e a construção de estratégias e meca-nismosde gestão e atuação, tem-se, para além das normativas vigentes, tanto os profissionais que no cotidiano de sua ação se confrontam com a complexidade das demandas de seus usuários e buscam estratégias para esse enfrentamento, como também estudiosos do campo, pesquisadores e militantes da Assistência Social brasileira que têm focado atenção em diversos aspectos, examinando sob múltiplas e diversificadas questões a intricada relação ente Assistência Social e filantropia e a necessária consolidação de uma Política Pública de Direitos

Nesse sentido esse artigo se coloca também como uma contribuição para essa construção.

Rede Socioassistencial no Brasil a partir do Censo SUAS 2014Os estudos realizados por meio do Censo SUAS 2014 mostram que a rede

socioassistencial no Brasil tem sido executada tanto por unidades estatais quanto por Entidades de Assistência Social (ES). Em algumas modalidades de atendimen-to, os serviços são quase que exclusivamente executados pelas Entidades de As-sistência Social, principalmente aqueles ligados a Proteção Social Especial de Alta Complexidade, conforme poderá ser percebido pelo levantamento que foi feito.

Assim, apresentamos a seguir a configuração da rede socioassistencial no Brasil a partir do Censo SUAS 2014. Conforme levantamento na rede socioassistencial brasileira ligada à Proteção Social Básica14, 58,89% dos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), são prestados pelas Entidades de Assistência Social. Levantou-se que existem, ao menos, 4521 Unidades de Entidades de As-sistência Social (UES) trabalhando com esse tema, as quais são responsáveis pela prestação de 10.303 serviços. As Unidades Públicas Estatais (UPE) em número de 3361, respondem por 7193 serviços nesse campo da convivência. Apurou-se que, de um total de 3605 unidades, entre estatais e não estatais, que responderam ter outros serviços no campo da Proteção Social Básica, além do SCFV, 46,19% delas são Unidades pertencentes às Entidades de Assistência Social.

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Tabela 1 Rede de Atendimento Proteção Social Básica

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A rede socioassistencial da Proteção Social Especial de Média Complexida-de15, mostrou o seguinte resultado: para os serviços de média complexidade vol-tados para a população em situação de rua, 26,34% são executados pelas UES; para os serviços denominados Centro Dia, 49,12% são executados pelas UES; em relação aos serviços de Medida Sócio Educativa em Meio Aberto as UES respon-dem por 24,04% e outros serviços prestados dentro da concepção da Proteção Social Especial de Média Complexidade 69,99% ficaram ao cargo das UES.

Tabela 2. Rede de Atendimento Proteção Social Especial Média Complexidade

Fonte: CENSO SUAS 2014 Legenda: UPE - Unidade Pública Estatal - UES Unidade de Entidade de Assistência Social; Pop de Rua - Serviços para População em Situação de Rua; e MSE - Serviço de Medida Sócio Educativa em Meio Aberto

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Serviços Média Complexidade

Regiões Brasileiras

UPE Outros Serviços

UES Outros Serviços

%UnidadesESOutros Serviços

TotalunidadesOutrosServiços

Norte 36 24 40,00% 60

Nordeste 118 86 42,16% 204

Centro Oeste

47 88 65,19% 135

Sudeste 169 621 78,61% 790

Sul 103 284 73,39% 387

Total 473 1103 69,99% 1576

Fonte: CENSO SUAS 2014

No que se refere a rede socioassistencial da Proteção Social Especial de Alta Complexidade16, os resultados no território brasileiro foram os seguintes: 52,39% das unidades de acolhimento para crianças e adolescentes; 79,38% das unidades de acolhimento para jovens de 18 a 21 anos; 86,94% das unidades de acolhimento para pessoas idosas; 63,83% das unidades de acolhimento para pes-soa em situação de rua; 79,42% das unidades de acolhimento para pessoas com deficiência e 42,61% das unidades de acolhimento para mulheres vítimas de vio-lência são realizados pelas Entidades de Assistência Social.

Nota-se que na região Sudeste do país, os serviços de acolhimento são realiza-dos basicamente pelas Entidades de Assistência Social. Como exemplo podemos citar 88,37% de unidades de acolhimento para jovens; 92,41% para pessoa idosa; 71,04% para população em situação de rua; 89,33% para pessoa com deficiência; 55,17% para mulheres vítimas de violência e 60,92% para o acolhimento de crianças e adolescentes. Não muito diferente é a região Sul, com 80,77% de seus serviços prestados para o acolhimento de jovens realizados por UES ou 90,09% para acolhimento a pessoa idosa para citar como exemplo. Das 279 Unidades estatais e não estatais que responderam ter outros serviços da Proteção Social Es-pecial de Alta Complexidade, 75,99% ficam sob a responsabilidade das Entidades de Assistência Social.

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Tabela 3. Rede de Atendimento Proteção Social Especial Alta Complexidade

Fonte: CENSO SUAS 2014Legenda: UPE - Unidade Pública Estatal - UES Unidade de Entidade de Assistência Social; SAI Cça e Adol - Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes; SAI Jovens - Serviço Acolhimento Institucional para Jovens de 18 a 21 anos; e SAI Idoso - Serviço de Acolhimento para a pessoa idosa.

Serv

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Fonte: CENSO SUAS 2014Legenda: UPE - Unidade Pública Estatal - UES Unidade de Entidade de Assistência Social; SAI Pop de Rua - Serviço de Acolhimento Institucional para População em Situação de Rua; SAI Pes. c/Def - Serviço Acolhimento Institucional para Pessoas com Deficiência; e SAI Mulheres Vit Violência - Serviço de Acolhimento para Mulheres Vítimas deViolência

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937

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Serviços Média Complexidade

Regiões Brasileiras

UPE Outros Servs PSE AC

UES Outros Servs PSE AC

% UES Outros Servs PSE AC

Total uni. Outros Servs PSE AC

Norte 7 12 63,16% 19

Nordeste 15 22 59,46% 37

Centro oeste 5 12 70,59% 17

Sudeste 29 130 81,76% 159

Sul 11 36 76,60% 47

Total 67 212 75,99% 279

Fonte: CENSO SUAS 2014

A partir das tabelas apresentadas pode-se perceber que a rede socioassisten-cial formada pelas Entidades de Assistência Social concentra-se, fundamental-mente, nas regiões Sudeste e Sul, seguida pela região Centro Oeste, tendo menos presença nas regiões Norte e Nordeste.

Segundo levantamento realizado, nem todas as Entidades de Assistência Social recebem subsídios financeiros ou de outra espécie por parte do governo mu-nicipal para a execução dessa rede de atendimento. No rol das que recebem, foi verificado que há inúmeras formas de subsídios. Há a realização formal de convênio com o governo municipal e há também outras formas tais como: cessão de recursos humanos; cessão imobiliária; pagamento de aluguel; pagamento de conta de água, luz ou telefone; fornecimento de gêneros alimentícios; de mate-riais de limpeza e higiene, bem como de materiais pedagógicos; isenção de taxas ou tributos e, até mesmo, treinamento e capacitação para os trabalhadores das Entidades de Assistência Social. As Entidades de Assistência Social podem receber um ou mais de um desses subsídios para responderem pela execução dos serviços.

No levantamento feito apenas entre as ES17 que têm convênios formalizados, apurou-se que dos 5570 municípios brasileiros, 1999 desses têm convênios for-malizados com Entidades de Assistência Social, significando 35,88% do total dos municípios. Em número de ES, significa um montante de 9965 entidades conve-niadas com os governos municipais no território brasileiro. Nota-se que na região Sudeste, apurou-se que 56,29% dos seus municípios têm convênio firmado com as ES, significando 5627 ES. Na região Sul são 47,69%, significando 2478 ES.

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Tabela 4 - Municípios com convênios com Entidades de Assistência Social

Regiões Brasileiras

Nº de Municípios

Nº deMunicípioscomconvênio

%Municípios comconvênio

Nº de ES conveniadasnos Municípioscom convênio

Norte 450 65 14,44% 220

Nordeste 1.794 261 14,55% 926

Centro oeste 467 166 35,54% 714

Sudeste 1.668 939 56,29% 5.627

Sul 1.191 568 47,69% 2.478

Total 5.570 1.999 35,88% 9.965

Fonte: CENSO SUAS 2014

Pode-se afirmar por esses dados que a rede socioassistencial brasileira está sendo prestada tanto pela esfera governamental quanto pelas Entidades de As-sistência Social. Afirma-se, ainda, que em muitos dos casos ou estão divididas ou são majoritariamente prestadas por essas entidades. Deve-se considerar que as ES estão no cenário brasileiro desde longa data, trazendo, por um lado marcas de benemerência e filantropia como já dito, mas também anos de experiências, sa-beres, conhecimento das necessidades da população onde atua e estabelecimento de confiança e vínculo com a mesma. É sabido que as organizações sociais de base comunitária e de fé, incluindo aí as Entidades de Assistência Social, têm buscado profissionalizar-se, aprimorar seu atendimento, aproximar-se das políticas públi-cas as quais estão referenciadas visando conquistar espaços onde possa discutir suas ideias, suas crenças e seus projetos de trabalho.

Muitas vezes encontram-se em um campo de tensão com os governos os quais têm sua burocracia, seus ordenamentos jurídicos e seus princípios emanados da CF/88 que lhes atribuem deveres e responsabilidades. No caso da Assistência Social, cabe ao Estado a primazia na condução dessa Política Pública de forma a seguir o estabelecido no Sistema Único de Assistência Social, criado a partir da Política Nacional de Assistência Social, incorporado na LOAS e que estabelece, entre outras coisas, que a rede socioassistencial é composta, de fato e de direito, pelas esferas estatais e não estatais, sendo que as Entidades de Assistência Social, ao serem reconhecidas como tal, devem também seguir fielmente os ditames da

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Política. Embora tenhamos visto que a rede de fato está configurada como apre-goa o SUAS, ainda há relações tensas entre ambos atores. No entanto, o estudo do censo nos mostra que é mister encontrar mecanismos de ajustes, estratégias de trabalho para que uma rede seja complementar à outra, porque a mesma já está presente a Política de Assistência Social só se faz presente no cotidiano das pessoas em função do atendimento dessas duas redes.

Como último ponto de estudo sobre o Censo SUAS-2014 que se considera im-portante destacar aqui nesse artigo, é a questão da referência ao vínculo religioso que as ES podem ter e, portanto, considerado por alguns estudiosos no assunto da Assistência Social um fator preocupante para a prestação de serviços públicos, uma vez que esse vínculo poderia gerar ações com base na filantropia, benemerência e no assistencialismo, ao contrário de ações com vistas à garantia do acesso e exercício de direitos de cidadania18. Notou-se, na rede de atendimento da Proteção Social Básica, apenas 30,46% das unidades de Entidades de Assistência Social declararam algum vínculo religioso. Nos serviços de acolhimento institucional da Proteção Social Es-pecial (PSE) de alta complexidade, apurou-se que as ES com vínculos religiosos atuam com os segmentos pessoas idosas e famílias desabrigadas;correspondendo aos índices de 71,65% e 62,50, respectivamente. Nos demais segmentos para acolhi-mento, as ES sem vínculo religioso somam 51,29%.

Sobre o assunto, considera-se importante destacar alguns pontos. O fato da declaração de vínculo religioso não indica, necessariamente, que os serviços executados por essas organizações tenham caráter filantrópico e/ou de bene-merência. Por nossas observações e constatações, no território onde realizamos a pesquisa mencionada na inicial desse (zona sul de São Paulo)19, é clara a im-portância que as paróquias tiveram em termos de organização territorial, que garantiram atendimento a muitas demandas e promoveram “mínimos” de inclu-são durante períodos de total ausência de serviços públicos estatais e, portanto, completa ausência do Estado.

Percebe-se, atualmente, que as organizações de base de fé (Faith based orga-nizations) estão muito mais próximas e defensoras de valores que levam à bus-ca da garantia de direitos e autonomia das pessoas; que levam a uma sociedade mais igualitária com princípios de equidade e justiça, do que de valores morais. Considera-se que desde o início da atuação das mesmas no cenário brasileiro (pe-ríodo colonial, por exemplo), passando por vários momentos históricos de nossa sociedade, hoje as organizações estão mais independentes das doutrinas religiosas (sejam elas quais forem) quando estão atuando em serviços de caráter público.

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Conforme nossa revisão da literatura, não tem havido discussão suficiente sobre essas organizações de base de fé quando se fala de terceiro setor, ou ain-da quando se fala de entidades de Assistência Social, no sentido de estudar seus movimentos e sua trajetória. Consequentemente, ocorre a possibilidade de a tra-tarmos com base em estereótipos inadequados, que não correspondem, de forma alguma, às atuações que observamos durante nossa pesquisa.

Tabela 5 – Entidades de Assistência Social e vínculo religioso

Serviço Convivência Fortalecimento de Vínculos - Proteção Social Básica

Regiões Brasileiras

TotalUES - SCFV

%UES - SCFV comvínculo Religioso

%UES - SCFV semvínculo Religioso

Norte 65 56,92% 31,10%

Nordeste 460 47,61% 52,39%

Centro oeste 202 58,42% 41,58%

Sudeste 2.877 24,16% 75,84%

Sul 917 33,59% 66,41%

Serviço de Acolhimento Institucional Proteção Social Especial Alta Complexidade

Usuário Total UES SAI

UES - SAI com vinculo Religioso

UES - SAI sem vínculo Religioso

% UES - SAI com vinculo Religioso

% UES - SAI sem vínculo Religioso

Crianças eAdolescentes 1.408 693 715 49,22% 50,78%

Jovens 35 21 14 60,00% 40,00%

Crianças e Adolescentes com deficiência 41 16 25 39,02% 60,98%

Pessoas adultas com deficiência 160 62 98 38,75% 61,25%

População em situação de rua e/ou migrantes 398 204 194 51,26% 48,74%

Famílias desabrigadas 8 5 3 62,50% 37,50%

Mulheres em situação de violência 36 16 20 44,44% 55,56%

Pessoas Idosas 1.298 930 368 71,65% 28,35%

Total 3.384 1.947 1.437 57,54% 42,46%

Legenda: UES – SCFV Unidades de Entidades de Assistência Social - Serviço Convivência Fortalecimento de Vínculos; e UES - SAI Unidades de Entidades de Assistência Social - Serviço Acolhimento Institucional

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ConsideraçõesÀ primeira vista parece clara a resposta de que as manifestações da questão

social no campo da Assistência Social têm sido enfrentadas por meio de serviços e benefícios ofertados por uma rede socioassistencial implementada por unidades estatais CRAS, CREAS, Centro Pop20 em conjunto com entidades de Assistência Social. Foi visto que, nacionalmente, a rede socioassistencial é composta pela es-fera estatal e não estatal, apurando-se que determinados serviços são executados majoritariamente pelas entidades de Assistência Social e que nas regiões Sul e Sudeste elas são presenças marcantes.

No entanto, esse arranjo entre unidades estatais e entidades de Assistência Social tem trazido desafios para que a Política de Assistência Social possa ter uma rede de atendimento socioassistencial que seja a sua expressão e sua visibilidade em todos os territórios e, principalmente, no cotidiano das pessoas.

Pelos resultados finais da pesquisa21 mencionada no início desse, a qual moti-vou a elaboração desse artigo, os desafios passam tanto pela heterogeneidade que existe entre as Entidades de Assistência Social, tanto em tamanho, história, peso político, poder local, quanto pela adesão ao SUAS; passam também pelos diver-sos entendimentos e diversas visões que o poder púbico estatal tem das próprias entidades de Assistência Social. Ou seja, há grupos que as vêm como parceiras da política, outros como parceiros dos profissionais estatais, outros como mera executoras de serviços pelos quais são pagas pelo demandatário, que é o governo; passam pela própria posição do governo de ora se colocar à frente, como con-dutor da política de Assistência Social, ora se colocar apenas como expectador, deixando que as entidades desenvolvam as ações sem a sua presença; passam pelas formas de comunicação, ou melhor, não comunicação entre os atores que prota-gonizam essa rede socioassistencial pública estatal e não estatal.

Tem se ainda, na história brasileira da Assistência Social, marcas deixadas por uma trajetória de benemerência e filantropia protagonizada pelas Entidades Sociais, que fazem com que a relação entre governo e entidades de Assistência Social ainda hoje, em alguns lugares, acredita-se, esteja pautada pela subsidiariedade financeira.

É preciso que se entenda que a rede socioassistencial que nos referimos é uma rede de caráter público. Importante dizer que “rede pública” não se confunde com “rede estatal”. Portanto, a rede socioassistencial aqui estudada é uma rede formada tanto por esfera estatal quanto esfera não estatal, sendo que para ambos os sujeitos, o caráter dessa rede é pública, com cada um tendo seu papel e suas responsabilidades. No que se refere à execução das ofertas da rede socioassisten-

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cial, ambos devem compartilhar responsabilidades, devem pactuar compromissos e devem se comprometer com um projeto político de sociedade que vise à redu-ção da desigualdade social e a possibilidade de proteção social integral a todos.

Uma rede é pública quando podemos afirmar que ela é para toda população que dela necessitar; quando ela é de conhecimento de todos, havendo transparên-cia em suas ações, e divulgação ampla de suas atividades; é pública quando seus serviços são prestados como direito e não como favor e quando é passível de con-trole social. A rede socioassistencial tem caráter público porque deve favorecer e garantir o exercício de cidadania, entendendo que é um direito do indivíduo e de sua família receber o atendimento que está sendo executado, inclusive de participar efetivamente dos rumos e das ações que estão sendo propostas a eles. Segundo Wanderley (2013) uma rede é pública, quando se tem embutido nela o sentimento de uma cultura cívica. E ainda, uma rede tem caráter público quando ela tem sustentabilidade, isto é, quando ela é pensada e formada de maneira pla-nejada, com intencionalidade, não é pontual e nem fragmentada. A rede socioas-sistencial levantada pelo Censo SUAS 2014, deve ser entendida com esse caráter.

É possível que haja a necessidade de se prever qualificações técnicas para a execução das ofertas da rede socioassistencial para ambas as esferas (estatal e não estatal). No entanto, apenas pela existência do trabalho conjunto dessas duas esferas é possível dizer que por esse exercício já há o desenvolvimento natural de qualificação política, a qual envolve aprendizado para ambos, ou seja, a convivência direta com uma multiplicidade de atores portadores de concep-ções e interesses diversos. O reconhecimento da pluralidade e da legitimidade dos interlocutores é requisito não apenas da convivência democrática em geral, mas especialmente nos espaços públicos, enquanto espaços de conflito que tem a argumentação, a negociação, as alianças e a produção de consensos possíveis como seus procedimentos fundamentais. Assim, abrem-se caminhos para a con-figuração do interesse público.

Conforme Bresser Pereira (1998, p. 25):

O direito de que a propriedade do Estado seja pública, isto é, de todos e para todos, não-apropriada por uns poucos.O Estado deve ser público, as organizações não-estatais e sem fins lucrativos (ou organizações não-governamentais) devem ser públicas. Bens estritamente públi-cos, como um meio ambiente protegido, devem ser públicos. Direitos públicos são os direitos que nos asseguram que o patrimônio público, a res publica, enten-

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dido em sentido amplo, seja público - que seja de, e para, todos, em vez de ser objeto de rent-seeking, e de ser privatizada por grupos de interesse.

É por meio das ofertas socioassistenciais, executadas tanto pelas esferas es-tatais quanto pelas não estatais, articuladas em rede de caráter público, que a Assistência Social se fará presente no cotidiano das pessoas.

A partir do entendimento que CRAS, CREAS e Centro Pop são unidades estatais e que ofertam os serviços PAIF e PAEFI e que a rede de serviços socio-assistenciais devem estar referenciada à essas unidades para que possam gerar a complementariedade dos atendimentos realizados no PAIF E PAEFI e possam também, no âmbito da Assistência Social, garantir a proteção social integral daqueles que necessitarem, é mister que os gestores da Assistência Social nos municípios desenvolvam estratégias e mecanismos para fomentar a vinculação das entidades de Assistência Social, já prestadoras de serviços socioassistenciais, ao SUAS. A presença da esfera estatal nos territórios onde os serviços são exe-cutados por essa rede gerida pelas entidades deve ser marcante. Assim, deve haver canais de participação tanto nos níveis centrais da gestão da Assistência Social quanto nos níveis locais de atuação onde as entidades de Assistência So-cial possam ter espaços de escutas e diálogos em relações horizontalizadas para, juntas com o governo municipal, construírem respostas viáveis e concretas de atendimento às demandas da população.

A construção da rede socioassistencial é um processo de articulação estratégi-ca entre sujeitos e cabe ao setor público a sua construção, aonde o trabalho com as entidades deve ser considerado como parte integrante.

É possível dizer que a política de Assistência Social tem sua condução decidida e executada no município. Assim, é preciso que, a partir dos princípios, objetivos e diretrizes gerais que a LOAS e PNAS trazem, se favoreça a liberdade de pen-sar em serviços que atendam as demandas da população localmente. Para isso, é necessário, que os atores (estatais e não estatais) possam se reunir em grupos, comissões, fóruns, encontros, ou outras formas que forem criadas, para que de-batam e construam respostas que possam ser implementadas pelo Governo, em parceria com os demais. É preciso que esta forma de gestão seja sistemática e que faça parte da agenda/programa do Governo.

Nesse artigo mencionamos que as entidades de Assistência Social precisam decidir e manifestar o desejo de estabelecer seu vínculo com o SUAS,definindo sua dimensão. Será necessário que as entidades ou organizações de assistência

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social definam até que ponto desejam ou conseguem incorporar-se ao SUAS, en-tendendo que seu completo vínculo depende de sua completa adesão ao sistema. É fato que a vinculação ao SUAS deve ser dada pelo órgão gestor da assistência social no nível municipal e ou no nível estadual quando for o caso, validado pelo nível federal, com a anuência da entidade ou organização de Assistência Social.No entanto,é necessário que se discuta parâmetros a serem nacionalmente constru-ídos e pactuados entre os entes federativos e as instâncias de pactuação e delibe-ração do SUAS em relação a como o vínculo deve ser formalizado, bem como é fundamental propor capacitações a conselheiros, trabalhadores do Poder Público e das Entidades ou Organizações de Assistência Social sobre as regulamentações decorrentes do vínculo SUAS, e por último, mas não menos importante, incluir as Entidades ou Organizações de Assistência Social nas discussões sobre o que este vínculo significa concretamente.

Para concluir deve-se pensar na rede socioassistencial, como esfera pública a ser constituída na gestão da política de assistência social, onde esfera estatal e não estatal compartilham das mesmas preocupações e desejos, embora com papéis diferentes.

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Notas

1 Professor Titular na Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Membro fundador do Centro de Estudos em Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio VargasCEAPG/FGV. Membro do conselho editorial das princi-pais revistas na área de Administração e membro de comitês assessores de Centros de Pesquisas Aplicadas no Brasil e no exterior. Possui graduação em Psicologia - University of London (1965), Doutorado em Psicologia Organizacional - Birkbeck College (1976) e Pós-doutorado - Faculty of Social and Political Sciences and Jesus College, University of Cambridge (1998). E-mail: [email protected]

2 Pesquisadora no Centro de Estudos em Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (CEAPG/FGV). Pós-Doutoranda em Administração Pública e Governo no Centro de Estudos em Administração Pública e Governo-FGV (CEAPG/FGV), 2016. Doutora em Ci-ências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) 2012. Mestre em Administração Pública pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo-FGV (EAESP/FGV) 2003. Bacharel em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) 1984. E-mail: [email protected]

3 Este artigo está baseado em parte de uma pesquisa de pós-doutorado realizada entre os anos de 2014 a 2016, a qual esteve inserida no programa As vulnerabilidades urbanas e os desafios para a ação pública, sob a coordenação do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo (CEAPG – FGV); Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde (GV-Saúde); do Nú-cleo de Práticas Discursivos e Produção de Sentidos (Programa de Pós-graduação em Psicolo-gia Social, PUC-SP). Tem parceria com pesquisadores da Faculdade de Psicologia da Universi-dade Federal de Alagoas (UFAL); Instituto de Ciência e Tecnologia Ambiental da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB) e da L.B. Johnson School of Public Affairs, da Universidade de Texas (UT-Austin).Os resultados da pesquisa basearam-se,tanto no CENSO/SUAS/2014 aqui exposto, na análise sobre o desenho da política de Assistência Social, baseada no SUAS, quanto na conectividade intergovernamental e nas entidades de Assistência Social; análise da participação das entidades de Assistência Social em fóruns de discussão da política na cidade de São Paulo e entrevistas com trabalhadores da Secretaria Municipal de Assistência Social de São Paulo nas instâncias centrais e regionais e com trabalhadores e representantes de entidades de Assistência Social conveniados com a secretaria citada. Ao todo, foram 15 entrevistas em serviços executados por entidades de Assistência Social. 28 entrevistas em SMADS na instância central e 40 entrevistas entre supervisões de Assistência Social, CRAS e CREAS.

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4 Aqui entendido como um “... conjunto de expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura” (IAMAMOTO, 2001, p.16)

5 O conceito de vulnerabilidade tem sido discutido por alguns autores. Na Política Nacional de Assistência Social (PNAS,2004), são definidas as condições em que as pessoas estão consi-deradas em situação de vulnerabilidade social. Katzman (1999;2001) define que há graus de vulnerabilidade a depender dos ativos que indivíduos, famílias ou grupos dispõe para enfrentar determinadas situações de risco. Vignoli (2001) descreve como sendo o resultado negativo da relação entre a disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores, sejam eles indivíduos ou grupos, e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas e culturais que provêm do Estado, do mercado e da sociedade. Busso (2001), faz referência à possibilidade de uma deterioração no bem-estar como consequência de ficar exposto a riscos. Nesse trabalho fazemos menção à “vulnerabilidades urbanas” já que estamos nos referindo aos desafios que um município pode enfrentar advindos do agravamento de processos anteriores de adensamento populacional, impactados por mudanças em relação ao trabalho e meios de sustentação, pelos déficits habitacionais, falhas nas distribuições de serviços públicos considerados universais, pe-las mudanças climáticas, globais ou locais. Incluímos no conceito vulnerabilidades institucionais tanto instituições governamentais quanto não governamentais. Nos referimos às dificuldades institucionais das mais diversas, (RH, recursos financeiros, estruturas físicas, projetos mal ela-borados, mal dimensionados, inclusive determinantes políticos) enfrentadas para atender as demandas da população de um determinado território.

6 Alterada pela Lei nº 12.435 de 06 de julho de 2011.Disponível em: http://www.cfess.org.br/arquivos/Lei-12435.pdf acessado em 05.10.206.

7 As normativas vigentes qualificam as entidades e organizações sociais que executam serviços no campo da Assistência Social, como entidades ou organizações de Assistência Social. Sua con-ceituação está definida no art.3º da LOAS. É condição para a qualificação como entidade ou organização de Assistência Social a sua inscrição no Conselho Municipal de Assistência Social. Para a obtenção dessa inscrição segue-se os ditames do decreto 6.308 de 2007 e as resoluções do CNAS 27/2011 e 14/2014. A criação de um Sistema de Cadastro Nacional de entidades de Assistência Social (SCNEAS) está descrito na LOAS artº 19 incisos XI.

8 Atualmente chamadas de Entidades ou Organizações de Assistência Social. Nesse trabalho, as chamaremos de Entidades de Assistência Social

9 O Censo Suas é um processo de monitoramento que coleta dados por meio de um formulário eletrônico preenchido pelas secretarias de Assistência social, por serviços da rede socioassisten-cial e pelos conselhos de Assistência Social. É realizado anualmente desde 2007, por meio de uma ação integrada entre a Secretaria de Assistência Social e a Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação Disponível em: <http://aplicacoes.mds.gov.br/sagi/snas/vigilancia/index2.php> e http://mds.gov.br/assuntos/assistencia-social/gestao-do-suas/vigilancia-socioassis-tencial/censo-suas/censo-suas. Acessado em 05.10.2016

10 O Sistema Único de Assistência Social – SUAS é um sistema constituído pelo conjunto de ser-viços, programas, projetos e benefícios no âmbito da assistência social prestados diretamente – ou através de convênios com organizações sem fins lucrativos – por órgãos e instituições públi-cas federais, estaduais e municipais da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo poder público Deverá regular, em todo o território nacional, a hierarquia, os vínculos e as responsabilidades do sistema cidadão de serviços, benefícios e ações de assistência social, de

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caráter permanente ou eventual, executados e providos por pessoas jurídicas de direito público sob critério universal e lógica de ação em rede hierarquizada e em articulação com iniciativas da sociedade civil. Foi incluído na Lei Nº 12.435, de 06 de julho de 2011, a qual altera a LOAS e dispõe sobre a organização da Assistência Social.

11 O CRAS é uma unidade pública estatal descentralizada e localizada em áreas de maior vul-nerabilidade social. O objetivo é prevenir o risco social, fortalecendo os vínculos familiares e comunitários e promovendo a inclusão das famílias e dos cidadãos nas políticas públicas, no mercado de trabalho, na vida em comunidade. O CREAS é uma unidade pública estatal de média complexidade, de abrangência e gestão municipal, estadual ou regional, passando a ser referência para a proteção social especial desse nível de proteção. Destina-se à “... prestação de serviços a indivíduos e famílias que se encontram em situação de risco pessoal ou social, por violação de direitos ou contingência, que demandam intervenções especializadas da proteção social especial...” (Lei 12.435 de 06/07/2011).

12 Conforme dados informados em estudo realizado pelo IBGE (2012) em parceria com ABONG, IPEA e GIFE foram contabilizadosno Brasil 30.414 Entidades de Assistência Social (http://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=262841, acessado em 05.10.2016).No site do MDSA é possível verificar que 14.744 Entidades de Assistência Social, protocolaram processos para solicitar o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS, sendo que 8.105 Entidades de Assistência Social já obtiveram o referido cer-tificado (ver em: Processos de Certificação Protocolizadas no MDS disponível em http://mds.gov.br/assuntos/assistencia-social/entidade-de-assistencia-social/certificacao-de-entidades--de-assistencia-social, acessado em 05.10.2016). Na Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo há 2431 Entidades de Assistência Social incluídas nessa secretaria. (Ver: Relação de Entidades e Organizações de Assistência Social do Estado de São Paulo, cadastradas e ativas no sistema pró-social/instituições: disponível em: http://www.desenvolvimentosocial.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/1225.pdf acessado em 05.10.2016.

13 Definidas na LOAS art. 3º Consideram-se entidades e organizações de assistência social aquelas que prestam, sem fins lucrativos, atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta Lei, bem como as queatuam na defesa e garantia de seus direitos.

14 Ver Tabela 1 – Rede de Atendimento Proteção Social Básica

15 Ver Tabela 2 – Rede de Atendimento Proteção Social Especial Média Complexidade

16 Ver Tabela 3 – Rede de Atendimento Proteção Social Especial de Alta Complexidade

17 Ver Tabela 4 – Municípios com convênios com Entidades de Assistência Social

18 Ver Tabela 5 – Entidades de Assistência Social - % Vínculos Religiosos

19 Ver nota de rodapé nº 1.

20 Centro de Referência a População em situação de rua

21 Ver nota de rodapé nº1.

Artigo recebido em junho de 2016 e aceito para publicação em agosto de 2016.