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11 2º par craneano - nervo óptico A via óptica inicia-se na retina, sendo esta constituída por dois tipos de receptores celulares, os cones e os bastonetes. Estes foto-receptores assumem distribuições diferentes na retina, assim como exibem diferentes funções na via óptica. Os cones , encontrando-se em grande número na mácula central, estão vocacionados para a visão central, sendo esta importante na acuidade visual e na percepção da cor e dos detalhes finos visuais, enquanto que os bastonetes , distribuídos principalmente pela retina periférica, estão vocacionados para a visão periférica, assumindo esta um papel importante na visão nocturna e na percepção do movimento. A informação visual segue depois por fibras nervosas provenientes da retina nasal e temporal que se irão aglomerar no disco óptico , e que no seu conjunto irão formar o nervo óptico . A vascularização do globo ocular e do nervo óptico, está a cargo da artéria oftálmica , que por sua vez se divide em dois ramos: a artéria central da retina e a artéria ciliar posterior. A artéria central da retina irriga a camada de fibras nervosas e as camadas interiores da retina, nomeadamente as células ganglionares (a sua oclusão - oclusão da artéria central da retina - promove usualmente defeitos de campo altitudinais e a causa é normalmente embólica, visualizando-se edema da retina generalizado no segmento afectado). As artérias ciliares posteriores formam um plexo que irriga o disco óptico e camadas exteriores da retina, incluindo foto-receptores e coróide e em 50% da vezes também irriga a mácula (a oclusão destas artérias - neuropatia óptica isquémica anterior - promove defeitos de campo que também podem ser altitudinais, nomeadamente inferiores, mas a causa é agora vasculítica ou aterosclerótica, e a retina poderá não demonstrar alterações). As veias seguem grosseiramente o trajecto inverso das artérias. O nervo óptico tem depois um trajecto orbitário e segue em direcção ao quiasma óptico (as fibras intracanaliculares à saída da órbita estão sujeitas à compressão por um meningioma que não seja numa primeira instância evidente imagiologicamente, tendo em conta que num espaço tão exíguo, mesmo uma mínima lesão pode comprimir estas fibras). mácula disco óptico artéria central da retina veia central da retina fibras nervosas maculares fibras nervosas inferiores temporais e nasais fibras nervosas superiores temporais e nasais

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2º par craneano - nervo óptico A via óptica inicia-se na retina, sendo esta constituída por dois tipos de receptores celulares, os cones e os bastonetes. Estes foto-receptores assumem distribuições diferentes na retina, assim como exibem diferentes funções na via óptica. Os cones, encontrando-se em grande número na mácula central, estão vocacionados para a visão central, sendo esta importante na acuidade visual e na percepção da cor e dos detalhes finos visuais, enquanto que os bastonetes, distribuídos principalmente pela retina periférica, estão vocacionados para a visão periférica, assumindo esta um papel importante na visão nocturna e na percepção do movimento. A informação visual segue depois por fibras nervosas provenientes da retina nasal e temporal que se irão aglomerar no disco óptico, e que no seu conjunto irão formar o nervo óptico. A vascularização do globo ocular e do nervo óptico, está a cargo da artéria oftálmica, que por sua vez se divide em dois ramos: a artéria central da retina e a artéria ciliar posterior. A artéria central da retina irriga a camada de fibras nervosas e as camadas interiores da retina, nomeadamente as células ganglionares (a sua oclusão - oclusão da artéria central da retina - promove usualmente defeitos de campo altitudinais e a causa é normalmente embólica, visualizando-se edema da retina generalizado no segmento afectado). As artérias ciliares posteriores formam um plexo que irriga o disco óptico e camadas exteriores da retina, incluindo foto-receptores e coróide e em 50% da vezes também irriga a mácula (a oclusão destas artérias - neuropatia óptica isquémica anterior - promove defeitos de campo que também podem ser altitudinais, nomeadamente inferiores, mas a causa é agora vasculítica ou aterosclerótica, e a retina poderá não demonstrar alterações). As veias seguem grosseiramente o trajecto inverso das artérias. O nervo óptico tem depois um trajecto orbitário e segue em direcção ao quiasma óptico (as fibras intracanaliculares à saída da órbita estão sujeitas à compressão por um meningioma que não seja numa primeira instância evidente imagiologicamente, tendo em conta que num espaço tão exíguo, mesmo uma mínima lesão pode comprimir estas fibras).

mácula disco óptico

artéria central da

retina

veia central

da retina

fibras nervosas maculares

fibras nervosas inferiores

temporais e nasais

fibras nervosas

superiores temporais e nasais

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No quiasma, as fibras nervosas nasais cruzam para o lado oposto, enquanto as fibras temporais se mantém ipsilateralmente. Ainda assim, as fibras nasais inferiores decussam anteriormente e as fibras nasais superiores decussam posteriormente, enquanto as fibras maculares decussam no centro do quiasma. As vias ópticas seguem depois na forma de tracto óptico, chegando ao gânglio geniculado lateral e transformando-se depois nas radiações ópticas até chegarem ao córtex occipital. Durante este trajectos a disposição topográfica das fibras nervosas vai variando consideravelmente, dando origem, quando lesadas, a diferentes tipos de defeitos campimétricos (por exemplo, as fibras nervosas que transportam a informação da retina mais periférica, assumem uma rotação interna no tracto óptico e no gânglio geniculado lateral enquanto na ansa de meyer, estas mesmas fibras estendem-se mais anteriormente que as fibras que transportam a informação da região central macular; as fibras maculares terão depois uma extensa representação no polo posterior occipital). O tracto óptico e o gânglio geniculado lateral têm uma extensa vascularização, através da artérias coroideia anterior, comunicante posterior, cerebral posterior e coroideia posterior lateral. A artéria cerebral média nutre o córtex parietal e temporal e a artéria cerebral posterior nutre o córtex occipital.

nervo óptico

quiasma

tracto óptico

fibras maculares fibras temporais fibras nasais

lobo occipital radiações

ópticas parietais e temporais

fibras periféricas

fibras nervosas maculares

fibras nervosas inferiores

temporais e nasais

fibras nervosas

superiores temporais e

nasais

radiações ópticas

parietais e temporais

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Na história clínica da avaliação da visão, do ponto de vista neurológico é extremamente importante indagar sobre o carácter unilateral (por exemplo, na nevrite óptica ou na neuropatia óptica isquémica) ou bilateral (por exemplo, num enfarte parieto-occipital) da perda de visão, assim como se torna fulcral saber se o início da perda foi súbito (por exemplo, neuropatia óptica isquémica), subagudo (por exemplo, nevrite óptica) ou crónico (por exemplo, neuropatia por défice vitamínico). Interessa igualmente saber se houve dor concomitante (por exemplo, nevrite óptica) com a perda de visão ou não (por exemplo, neuropatia óptica isquémica), assim como pode ser útil no diagnóstico diferencial a descrição do escotoma pelo doente (dentro das diferentes patologias do nervo óptico, um escotoma central favorece uma causa inflamatória enquanto que um escotoma altitudinal favorece uma causa vascular). A progressão do défice também poderá indicar um diagnóstico (perda irreparável do défice coaduna-se com uma causa vascular enquanto que o atingimento recorrente e uma recuperação parcial ou total do défice se correlaciona com uma causa inflamatória). Obviamente que os antecedentes do doente (idade, factores de risco vascular, traumatismo recente, história de tumor, história de surtos clínicos de um possível atingimento do sistema nervoso central, história familiar, etc.), assim como os sintomas associados (cefaleia progressiva, náuseas ou vómitos, défices motores e/ou sensitivos, etc.) poderão fazer pensar numa determinada patologia. A avaliação clínica da função visual compreende os seguintes parâmetros: Acuidade visual Será uma das funções da visão central, estando comprometida em lesões do nervo óptico (existirá um defeito da acuidade antes mesmo do aparecimento de um possível defeito de campo) e eventualmente lesões maculares extensas. Já em lesões do quiasma óptico, teria que haver um comprometimento simultâneo das fibras maculares cruzadas e não cruzadas para que ocorresse um défice da acuidade visual, o que não é muito frequente, assim como também em lesões occipitais, só através de uma lesão bilateral, comprometendo a extensa representação da área macular no lobo occipital posterior, poderíamos à partida obter um defeito da acuidade visual, o que também é raro tendo em conta a vascularização arterial bilateral do córtex occipital. A acuidade visual não está portanto usualmente comprometida em lesões retroquiasmáticas. A acuidade visual, grosso modo, melhora com um oclusor “pinhole” ou óculos, em erros de refracção ocular, enquanto em lesões do nervo óptico, o defeito mantêm-se, independentemente da correcção da refracção. Podemos avaliar grosseiramente a acuidade visual aferindo a capacidade de identificar pequenas letras pretas numa página. Ao doente presumivelmente funcional, pedir para olhar para a mão ou pedir para escrever o nome (exercícios que à partida um doente com real amaurose adquirida conseguirá fazer). Do ponto de vista neurológico, esta deve ser avaliada com a melhor correcção possível (óculos correntemente usados) Clinicamente podemos avaliar a acuidade visual através de um cartão de “snellen” de bolso, onde a última e mais pequena linha correctamente lida corresponderá então à acuidade visual do doente.

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A avaliação da acuidade visual poderá ser estratificada e descrita da seguinte forma: 1º cartão de bolso a 180 cms 2º se não for possível identificar a letra maior do cartão de bolso ( acuidade visual < 1/20 ), contar dedos 3º se não for possível a contagem dos dedos, aferir sobre percepção de movimentos da mão do observador 4º se a última tarefa também não for possível, aferir sobre a percepção da luz através de um foco luminoso 5º finalmente, se tal não for conseguido, classificar como não havendo percepção da luz Contraste Outro dos parâmetros da visão central será o contraste. A sua alteração constitui uma queixa comum no caso de lesão do nervo óptico, nomeadamente sob a forma de “visão nebulada” (mesmo quando a acuidade visual regressa ao normal após um episódio de nevrite óptica, o défice de contraste poderá ainda ser observado). Trata-se portanto de um parâmetro que frequentemente se associa ao comprometimento da acuidade visual. A avaliação do contraste utiliza uma série de barras negras sobre um fundo branco. Percepção da cor Finalmente, dentro da avaliação da visão central, teremos a percepção da cor. São também aqui as lesões pré-quiasmáticas que podem mais frequentemente causar alterações deste parâmetro. Entrando no pormenor da sua avaliação, enquanto lesões do nervo óptico podem-se primeiro manifestar por perda de percepção da cor vermelha, doenças corioretinianas usualmente manifestam-se por perda da percepção da cor azul. Dentro das lesões do nervo óptico, o comprometimento da percepção da cor na neuropatia isquémica é proporcional ao comprometimento da acuidade visual, enquanto na nevrite óptica, a percepção da cor estará muito mais comprometida que a acuidade visual. Esta

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perda de percepção da cor relaciona-se com o sinal de Marcus Gunn (defeito pupilar relativo aferente), como se verá mais adiante. Num sentido mais amplo, a cor é definitivamente importante na alteração da função visual de causa neurológica, na medida em que um escotoma para a cor azul ou vermelha pode já ser notado mesmo quando ainda não são percepcionados defeitos de campo para alvos brancos. Para avaliar este parâmetro, poder-se-ão utilizar cartões de “Ishihara” para o efeito ou então, uma manobra simples será usar um alfinete com ponta vermelha perguntando ao doente se a cor é percepcionada igualmente pelos dois olhos, despistando assim discromatópsias grosseiras. Estratificando uma perda da percepção da cor, em termos de gravidade crescente da perda, o vermelho passará a laranja, depois a amarelo, até ser incolor Campos visuais Para avaliar a visão periférica (e também a central), teremos os campos visuais. Poderemos então encontrar defeitos centrais, cecocentrais, arqueados, radiados, em anel, altitudinais, hemianópicos, quadrantanópicos ou ainda reduções generalizadas dos campos visuais. Um escotoma é uma área pobre de visão rodeada por normal área de acuidade visual. Se positivo é negro ou provoca uma sensação de bloqueio da visão (sugere doença da retina, mácula ou coróide), senegativo implica ausência de visão (sugere doença do nervo óptico ou lesão posterior a este); escotomas arqueados no campo nasal indicam doença da retina ou do nervo óptico (se pequena lesão na camada exterior da retina, surgirá apenas um ponto no campo visual; se lesão maior, e atingindo as fibras mais internas do feixe de fibras nervosas, então surgirá um defeito arqueado com a ponta na lesão e a base a dirigir-se para o meridiano horizontal nasal, estando muitas vezes a origem da ponta no ponto cego); escotomas no campo temporal serão em forma de sector radiado; escotoma em anel, normalmente tendo a fóvea no seu centro, corresponderá a retinopatias – retinite pigmentosa, paraneoplásica, etc. - podendo ainda ser a manifestação tardia de um glaucoma, ou mais raramente devido a enfartes occipitais bilaterais; alargamento do ponto cego corresponderá a todo e qualquer processo que promova edema da papila; os defeitos altitudinais representam eventual compromisso isquémico do nervo óptico ou raramente lesão occipital, se bilaterais e congruentes; os defeitos hemianópicos heterónimos (defeitos nasais ou defeitos temporais, bilateralmente) representam patologia quiasmática enquanto os defeitos homónimos (defeito nasal num olho, defeito temporal no outro olho) representam patologia retroquiasmática.

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Os campos periféricos poderão ser avaliados à cabeceira do doente executando movimentos dos dedos provenientes da periferia com origem nos quatro quadrantes ou através da resposta à ameaça no caso de falta de colaboração. O campo central poderá ser avaliado com o doente a fixar a face do examinador sendo-lhe depois perguntado sobre a existência de um eventual escotoma sem que deixe de fixar o centro da face (pode também ser utilizada a grelha de “amsler”, com o intuito de detectar eventual escotoma central ou metamorfópsias, constituindo estas últimas uma distorção das formas, sendo usualmente causada por doença macular). o ponto cego fisiológico, correspondente à saída das fibras nervosas no disco óptico, e como tal um local desprovido de foto-receptores, poderá ser objectivado a 1 m, com a ajuda de um alfinete com ponta vermelha e terá as dimensões de 15-18 de altura e 9-12 de largura.

Então, sobre os defeitos de campo que podem surgir… defeito arqueado, por exemplo, patologia da retina temporal defeito radiado, por exemplo, patologia da retina nasal defeito central, por exemplo, patologia do nervo óptico ou macular defeito cecocentral, por exemplo, patologia inflamatória do nervo óptico e/ou feixe maculopapilar (feixe de fibras nervosas entre a mácula e o disco óptico)

ponto cego

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defeito altitudinal inferior, por exemplo, patologia vascular do nervo óptico alargamento do ponto cego, por hipertensão intracraneana defeitos bitemporais (heterónimos) incongruentes (diferentes entre si), por patologia quiasmática defeitos homónimos hemianópicos incongruentes incompletos (não preenchem em completo um quadrante ou um hemicampo), por exemplo, patologia do tracto óptico ou do gânglio geniculado lateral defeitos homónimos quadrantanópicos superiores incongruentes incompletos, por exemplo, patologia da radiação temporal defeitos homónimos quadrantanópicos inferiores congruentes, por exemplo, patologia da radiação parietal defeitos homónimos hemianópicos congruentes, que poupam a visão macular, por exemplo, patologia do lobo occipital Sobre os defeitos do campo visual, é possível dizer que: São cada vez mais congruentes à medida que a lesão é mais posterior; os bordos são regulares em lesões vasculares, sendo irregulares em tumores; são muito incompletos quando afectam o tracto óptico; a lesão do nervo óptico acarreta uma multiplicidade de defeitos de campo possíveis; exceptuando a lesão do nervo óptico, a visão macular é de um modo geral poupada. Uma avaliação mais objectiva deve ser sempre concretizada através da realização de campimetria.

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Oftalmoscopia Com a oftalmoscopia directa, poder-se-á de forma simples despistar um edema do disco e averiguar sobre a integridade da região peripapilar. Será mais difícil no entanto observar a restante retina, incluindo mácula, sendo nesse caso imprescindível a oftalmoscopia indirecta. Antes de entrar na descrição dos sinais patológicos que podemos encontrar na oftalmoscopia, é importante referir que é esperado, em termos fisiológicos, que o crescente temporal do bordo óptico seja normalmente pálido enquanto o crescente nasal do bordo óptico é normalmente elevado. Em termos patológicos podemos então encontrar edema do disco, ou seja, hiperémia, engurgitamento das veias e esbatimentos dos bordos. Os sinais associados ou as características que lhe estão subjacentes poderão fazer pensar numa ou noutra causa: atenuação das arteríolas retinianas favorece a oclusão da artéria central da retina ou a neuropatia isquémica em detrimento da nevrite óptica edema altitudinal é mais frequente na neuropatia isquémica que na nevrite óptica hemorragias retinianas marcadas são mais frequentes na neuropatia isquémica que na nevrite óptica edema pálido do disco é frequente na neuropatia isquémica de causa vasculítica células vítreas suspensas ou estrela macular (neurorretinite) devem fazer pensar, por exemplo, em nevrites inflamatórias infecciosas Com o decorrer da idade, a neuropatia isquémica torna-se mais frequente que a nevrite óptica. A dor ao movimento ocular (oculodinia) favorece a nevrite óptica em detrimento da neuropatia isquémica. É ainda muito importante referir que grande parte dos casos de nevrite óptica apresentam um fundo perfeitamente normal, visto tratar-se usualmente de uma inflamação retrobulbar, ao contrário da causa isquémica, usualmente anterior. Um outro sinal que podemos encontrar através da oftalmoscopia é a atrofia óptica, ou seja, um disco pequeno e pálido, que traduz simplesmente lesão prévia do nervo óptico. Também aqui determinadas características farão pensar numa etiologia em detrimento de outra: palidez sectorial temporal favorece entidades que envolvam as fibras da visão central em detrimento das fibras periféricas, como o são a nevrite óptica e neuropatias tóxicas palidez sectorial superior e inferior favorece a neuropatia isquémica, tendo em conta a irrigação arterial, também esta sectorial

edema do disco atrofia óptica

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Podemos ainda encontrar papiledema, quase sempre bilateral, ou seja edema do disco causado por hipertensão intracraneana, existindo então hiperémia, edema do disco, perda de pulsações venosas, apagamento dos bordos, e mais tarde hemorragias e exsudatos retinianos. Especial referência para o Síndrome de Foster Kennedy (atrofia óptica num olho e concomitante edema do disco no outro olho) que, quando “verdadeiro”, tem ainda anósmia associada, sendo causado por um meningioma frontal que promove compressão de um nervo óptico e concomitante hipertensão intracaniana; quando “falso”, presume nevrite óptica ou neuropatia isquémica bilaterais, cronologicamente separadas. De acordo com a técnica propriamente dita da oftalmoscopia, utilizar então a luz pequena para a pupila não dilatada, luz grande para a pupila dilatada, devendo existir penumbra na sala de modo a permitir a dilatação da pupila. O doente adopta o olhar na linha média, focando um ponto à distância, de modo a evitar o reflexo de acomodação, o que iria provocar a miose das pupilas. O oftalmoscópio deverá surgir a 15º lateral e inferiormente em relação à pupila. Depois, já próximo da córnea, e continuamente focando a imagem de modo a obter a nitidez do fundo ocular, seguir um vaso na direcção do seu maior calibre até chegar ao disco óptico.. Reflexo pupilar Com o reflexo pupilar pretende-se averiguar a integridade do arco aferente (nervo óptico se estímulo luminoso ou mesencéfalo se estímulo de acomodação) e do arco eferente (fibras parassimpáticas que fazem o seu trajecto no 3º par craneano). Um defeito relativo pupilar aferente (reflexo pupilar mais fraco e/ou menos veloz num dos olhos) traduz normalmente patologia do nervo óptico. Já em lesões do tracto óptico este será modesto e ocorrerá no olho contralateral (o que terá o defeito hemianópico temporal). De resto, em lesões posteriores ao tracto óptico, o reflexo pupilar estará preservado, sendo este um dado deveras importante quando estamos perante uma cegueira binocular e pretendemos

papiledema

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fazer a destrinça entre patologia bilateral do nervo óptico e patologia bilateral do córtex occipital, estando o reflexo pupilar preservado neste último grupo. Na doença macular, esta terá que ser relativamente extensa para poder provocar um defeito relativo pupilar aferente. Avalia-se então, com um foco luminoso, o reflexo directo (a reacção pupilar ipsilateral à luz), o reflexo consensual (a reacção pupilar contralateral concomitante, devido à conexão bilateral das fibras no mesencéfalo) e a simetria dos reflexos directos (tentando despistar um possível defeito pupilar relativo aferente, comparando a velocidade e amplitude dos reflexos…no espectro máximo desta alteração poderá até haver uma dilatação paradoxal no olho com doença do nervo óptico). O defeito pupilar relativo aferente é o também chamado sinal de de Marcus Gunn.

Então, de acordo com as alterações encontradas, o sítio da lesão poderá ser… Mácula perda da acuidade visual; escotoma central (classicamente sem envolvimento do feixe maculopapilar e ponto cego, o que seria mais a favor de lesão do nervo óptico); metamorfópsias, micrópsias; defeito relativo pupilar aferente inexistente (a não ser que lesão seja extensa); perda da percepção da cor (afectando mais o azul que o vermelho) Nervo óptico perda de acuidade visual; perda da percepção da cor (afectando mais o vermelho que o azul); escotoma cecocentral, paracentral ou central; defeito campimétrico altitudinal possível (normalmente inferior se neuropatia isquémica); defeito relativo pupilar aferente; disco normal (se nevrite inflamatória, normalmente retrobulbar, lesões compressivas intracanaliculares e intracranianas, etc.) ou edema do disco (neuropatia isquémica anterior, lesões compressivas da órbita, etc.) Quiasma óptico acuidade visual e percepção da cor preservadas (a não ser que exista comprometimento anterior do nervo óptico ou quiasma óptico posteriormente colocado); defeitos heterónimos, frequentemente apenas superiores; defeito relativo pupilar aferente inexistente (a não ser que exista comprometimento concomitante do nervo óptico); disco normal

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Tracto óptico acuidade visual e percepção da cor preservadas; defeitos homónimos incongruentes incompletos; defeito relativo pupilar aferente modesto, contralateral; fundo normal Gânglio geniculado lateral acuidade visual e percepção da cor preservadas; defeitos homónimos incongruentes ou não (os defeitos sectoriais são congruentes); defeito relativo pupilar aferente inexistente; fundo normal Lobo temporal acuidade visual preservada; defeitos quandrantanópicos superiores incongruentes; defeito relativo pupilar aferente inexistente; fundo normal Lobo parietal acuidade visual preservada; defeitos quadrantanópicos inferiores congruentes; defeito relativo pupilar aferente inexistente; disfunção cortical dominante / não dominante (ex. inatenção) associada; sem atrofia óptica Lobo occipital acuidade visual preservada; defeitos homónimos congruentes que normalmente poupam a mácula (se lesão bilateral posterior, poderá existir perda da acuidade visual) ou escotomas paracentrais; defeito relativo pupilar aferente inexistente; disfunção cortical dominante / não dominante (ex. palinópsia) associada; sem atrofia óptica Como considerações finais, há que realçar o papel fundamental da avaliação neuro-oftalmológica nas várias patologias do foro neurológico. O uso corrente de um cartão “snellen” de bolso (o modo mais simples, aliás, de detectar queixas subjectivas de perda da acuidade visual), de um ou dois alfinetes de ponta vermelha (ou em sua substituição, através de dois objectos com igual cor vermelha que, dispostos simetricamente no campo visual, possam fazer salientar um defeito de campo hemianópico que pelas manobras convencionais de avaliação dos campos visuais, não estaria a ser percepcionado), de um oftalmoscópio (de preferência um que consiga eficazmente demonstrar toda a região peripapilar), juntamente com a avaliação dos campos visuais, podem fazer a diferença no estudo de um doente neurológico. E principalmente nas diferentes patologias do nervo óptico, a demonstração de um defeito pupilar relativo aferente é fulcral para confirmar a suspeita de neuropatia, o que na ausência de um sinal de Marcus Gunn se torna pouco provável (a não ser que existam duas neuropatias concomitantes de igual gravidade, facto que “equilibraria” as respostas pupilares, ambas igualmente lentas neste caso, mas simétricas). Ainda sobre o reflexo pupilar será importante afirmar que a sua preservação aponta quase sempre para um problema retroquiasmático.

joão lemos

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