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3 Desenvolvimento da memria em crianas escolares de classe mdia
3.1. Resumo
A Neuropsicologia estuda a memria, utilizando a avaliao
neuropsicolgica, considerando variveis como gnero e idade, e seguindo os
princpios de sistemas de memria (com caractersticas distintas no
desenvolvimento). Objetivo: verificar o desenvolvimento da memria na idade
escolar. Mtodos: avaliou-se 90 crianas de 6 a 10 anos, de nveis
socioeconmicos A e B, de escolas do municpio do Rio de Janeiro, excluindo
dificuldade de aprendizagem. Usou-se a uma bateria de testes neuropsicolgicos e
escalas comportamentais. Resultados: a ANOVA de duas vias revelou que houve
interao apenas na cpia da Figura de Rey (F= 2,836; p0,05). Diferenas
significativas entre gnero foram encontradas na lista A6 (F= 4,778; p0,05) e no
Vocabulrio (F= 3,815; p0,05). Houve diferenas de idade na avaliao da
memria episdica na lista A6 (F= 6,654; p0,01) e no reconhecimento (F=
2,438; p0,05) do RAVLT; na evocao da Figura de Rey (F= 9,951; p0,01). Na
memria semntica a diferena de idade foi em relao Fluncia Verbal
Semntica (F= 10,457; p0,01); nos subtestes Vocabulrio (F= 18,205; p0,01) e
Informao (F= 29,927; p0,01) do WISC. E na memria de trabalho na lista A1
do RAVLT (F= 3,596; p0,01); no subteste Dgitos do WISC (F= 5,620; p0,01)
e na cpia da Figura de Rey (F= 13,369; p0,01). Concluso: em geral foi
encontrado um desempenho pior aos 6 anos e poucas diferenas entre gnero. Os
dados mostram, como na literatura, distino na evoluo da memria e
acompanhamento da maturao neuronal.
Palavras-chave: neuropsicologia; infncia; desenvolvimento da memria.
3.2. Abstract
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Neuropsychology studies the memory, using neuropsychological
assessment, considering variables such as gender and age, and following the
principles of memory systems (with different features in development). Objective:
To check the memory development at school age. Methods: we evaluated 90
children, from 6 to10 years of socioeconomic levels A and B, from schools in the
municipality of Rio de Janeiro, excluding learning disability. It was used a battery
of neuropsychological tests and behavioral scales. Results: the two-way ANOVA
revealed significant interaction only in the copy of the Rey Figure (F = 2.836, p
0.05). Significant differences between gender were found in the list A6 (F =
4.778, p 0.05) and vocabulary (F = 3.815, p 0.05). There were age differences
in the assessment of episodic memory in the list A6 (F = 6.654, p 0.01) and
recognition (F = 2.438, p 0.05) of the RAVLT, the recall of the Rey Figure (F =
9.951 p 0.01). Semantic memory revealed age difference in the Semantic Verbal
Fluency (F = 10.457, p 0.01), the Vocabulary (F = 18.205, p 0.01) and
Information (F = 29.927, p 0 , 01) WISC subtests. And in working memory in
the list of the RAVLT A1 (F = 3.596, p 0.01), the Digits subtest of the WISC (F
= 5.620, p 0.01) and the copy of the Rey Figure (F = 13.369; p 0.01).
Conclusion: In general we found a worse performance at 6 years and few
differences between gender. The data show, as in literature, a distinction in the
evolution of memory together with the neuronal maturation.
Keywords: neuropsychology; childhood; memory development.
3.3. Introduo
A memria um fenmeno neurocognitivo que se apresenta em vrios
sistemas. Sua durao, ou seja, o tempo de reteno de uma informao, pode ser
muito rpido (sensorial), de curto e de longo prazo. A sensorial dura apenas
milissegundos. A memria de curto prazo se apresenta atravs do modelo da
memria de trabalho, ela dura apenas o tempo de se manter uma informao e
manipul-la por alguns segundos ou at um minuto. J a de longo prazo dura
alguns minutos, horas, dias, meses e anos (Cowan, 1988; Baddeley, 2002, 2009).
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Uma das formas de dividir a memria de longo prazo em tipos: memria
implcita, no consciente e memria declarativa ou explcita, consciente. A
implcita se caracteriza pelos hbitos, habilidades, processos automticos (Squire,
2009). Por sua vez, a memria explcita se subdivide em episdica (fatos e
experincias) e semntica (conceitos e teorias) (Squire, 2009; Fivush, 2011).
Ao longo do desenvolvimento, a memria sofre diversas modificaes
(Carneiro, 2007). Quando se beb h indcios de memria, ainda que
rudimentar, uma vez que j h a capacidade de reproduzir e reconhecer estmulos
(Barr et al., 1996; Bauer, 2006). Antes de completar um ano, por exemplo, a
criana j consegue evocar novos eventos aps um intervalo de tempo (Mandler &
McDonough, 1995). Ao final do primeiro ano de vida existe a possibilidade de
que a memria de longo prazo comea a se desenvolver (Carver, Bauer, &
Nelson, 2000). Acompanhando o desenvolvimento da linguagem (Nelson &
Fivush, 2004) e o planejamento mental (Greenbaum & Graf, 1989), as crianas
pr-escolares j elaboram melhor a memria.
Greenbaum & Graf (1989) apontam que a memria implcita se torna
funcional antes da memria explcita, j que esta ltima requer uma traduo e um
planejamento das instrues do avaliador para armazenar as informaes, bem
como lembrar do seu plano e acessar a memria de acordo com isso. A melhora
em cada uma dessas etapas ajudar na sua evocao e elaborao de estratgias
mais robustas, o que torna a memria mais eficiente, obtendo um melhor
desempenho ao longo dos anos.
Na idade escolar, j possvel distinguir os processos de memria. Em
relao memria de trabalho, as crianas de 9 anos parecem apresentar um
desempenho melhor do que as de 7 anos. Alm disso, seriam mais rpidas, porm
no apresentam diferena na capacidade de armazenamento (span), apenas em
tarefa mais complexa (Conlin, Gathercole, & Adams, 2005). Tambm em outra
medida de memria de trabalho atravs de teste de adio aritmtica com crianas
de 6 a 12 anos, percebe-se que quanto mais velhas so as crianas, mais rpidas
so nas respostas, porm quanto mais difcil so as contas, seu desempenho se
torna mais lento. Observa-se tambm, que quanto mais rpidas, melhor seu span
(Adams & Hitch, 1997).
No que diz respeito memria de trabalho visual, medida no Teste da
Figura Complexa de Rey, as crianas mais velhas tendem a apresentar melhor
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desempenho tanto na cpia quanto na evocao devido a uma melhor organizao
e elaborao de estratgias do que outras habilidades (Frisk, Jakobson, Knight, &
Robertson, 2005). Essa melhora se d ao longo das idades, crianas de 7 e 8 anos
ainda apresentam pouca estratgia de organizao na cpia (Anderson, Anderson,
& Garth, 2001). Essa melhora ocorre nas idades quando se utiliza a estratgia de
passo a passo, at mesmo em crianas com 6 anos (Frisk, Jakobson, Knight, &
Robertson, 2005). Dessa forma, a memria imediata apresenta melhor
desempenho no Teste da Figura Complexa de Rey, quando a cpia feita
estruturada e bem planejada (Oliveira, Rigoni, Andretta, & Moraes, 2004).
Em relao memria episdica, por exemplo, quando se compara grupos
de idades diferentes observa-se que h efeito da idade no Teste de Aprendizagem
Auditivo-Verbal de Rey (RAVLT), sendo que de 8 a 17 anos as medidas no so
lineares, uma vez que de 8 a 10 anos h uma mudana maior do que de 11 a 17
anos (Vakil, Blachstein, & Sheinman, 1998). Em um estudo brasileiro, crianas
com 8 anos no mostraram diferena em relao aos mais novos (7 anos), nem aos
mais velhos (9 e 10 anos) (Oliveira & Charchat-Fichman, 2008).
Na tarefa de lista de palavras, h uma forte correlao positiva entre
evocao e reconhecimento. O reconhecimento mais fcil que a evocao, as
palavras reconhecidas costumam ser as evocadas (Tulving, 1985). H estudos que
demonstram uma diferena na habilidade entre meninos e meninas, sugerindo que
as meninas tm uma aprendizagem verbal melhor (Kramer, Delis, Kaplan,
O'Donnell, & Prifitera, 1997). Aos 10 anos, em tarefa de memria de
reconhecimento, as meninas apresentam um desempenho melhor do que os
meninos, porm, na memria visual, os meninos se saem um pouco melhor
quando a figura masculina, mostrando uma identificao (McGivern &
colaboradores, 1997).
Em estudo realizado com crianas de 4 e 7 anos, observou-se que as
menores evocaram menos dados de atividades treinadas aps uma semana do que
as mais velhas (Farrar & Coodman, 1992). Esses dados mostram que h um
critrio de idade relacionado ao desenvolvimento (Vakil e colaboradores, 1998),
uma vez que crianas mais velhas evocam mais palavras do que crianas mais
novas (Ceci & Howe, 1978) e h uma melhora com a idade no desempenho de
tarefas de memria (Dempster & Rohwer, Jr., 1983).
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Em relao diferena entre gnero, meninas apresentam melhor
desempenho em tarefas verbais e meninos em espaciais (Lowe, Mayfield, &
Reynolds, 2003). No RAVLT, tambm h uma diferena entr