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Introdução

Durante décadas a Terapêutica Hormonal deSubstituição (THS) que inclui estrogénios (E) eprogesterona (P) foi utilizada na mulher paratratar os sintomas da menopausa, para prevenira osteoporose e por prováveis benefícios naprevenção da doença coronária (DC).A presença dos estrogénios na mulher antes damenopausa, a protecção óbvia que beneficiacontra eventos cardiovasculares e simultanea-mente a existência documentada de receptoresdos estrogénios nos cardiomiócitos e no tecidovascular dos homens e das mulheres, levou aogrande entusiasmo no uso da THS como medidade prevenção contra a doença cardíaca ateros-clerótica.Nos últimos anos vários estudos aleatorizadosvieram refutar a hipótese do papel protector dosestrogénios e demonstraram um aumento dorisco cardiovascular sobretudo no primeiro anoapós o início da terapêutica e simultaneamente oaumento do risco do cancro da mama, da doençatromboembólica e do acidente vascular cerebraldonde resultou a alteração das recomendaçõesno uso da THS.

Estrogénios - Menopausa - Sintomasda Menopausa

Os Estrogénios são responsáveis pelo desenvol-vimento e manutenção do sistema reprodutorda mulher e pelos caracteres sexuais secundá-rios. O Estradiol, o principal estrogénio humano,é produzido nos foliculos ováricos.

A menopausa resulta do declínio da secreção deestrogénios por perda da função ovárica relacio-nada com a idade. Acompanha-se de sintomascomplexos relacionados com a privação de estro-génios nomeadamente, a atrofia genito-urináriae a instabilidade vasomotora.Os sintomas vasomotores, aparecem 12 a 24meses após a última menstruação. Constituemum episódio agudo que inicialmente aparecevárias vezes por dia, muitas vezes durante osono e que se acompanha de sudorese e taqui-cardia. A THS é muito eficaz no alívio dos sinto-mas vasomotores e no tratamento dos sintomasresultantes da atrofia genito-urinária.

Estrogénios, efeitos no Sistema Cardiovascular

Os estrogénios actuam através da sua ligação areceptores nucleares existentes nos tecidos. Há 2tipos de receptores α e β. Os receptores α estãopresentes no endotélio e nas células musculareslisas. Os receptores β estão presentes nas artériase veias humanas e nas células miocárdicas.Os estrogénios têm efeitos benéficos e efeitosindesejáveis sobre o sistema cardiovascular esobre a progressão da doença aterosclerótica. Obalanço dos efeitos dos estrogénios resulta dosefeitos directos e indirectos vasculares, dos efeitoshemostáticos e dos efeitos no perfil lipídico.

Estrogénios. Perfil LipídicoA mulher jovem com níveis altos de estrogéniostem um perfil lipídico favorável.Após a menopausa a baixa do nível dos estro-

génios acompanha-se do aumento do ColesterolTotal, do Colesterol das LDL e da Lipoproteína,a ediminuição dos níveis do Colesterol das HDL.A THS vai reverter muitas destas alterações,diminui o Colesterol Total e das LDL e a Lipopro-teínaa e aumenta o Colesterol das HDL. Mas levatambém ao aumento dos Triglicéridos. Umfactor de risco independente na mulher para adoença aterosclerótica.

Estrogénios e Efeito VascularA nível vascular, nomeadamente ao nível dascoronárias, onde foram identificados receptoresdos estrogénios, estes causam relaxamentomuscular e melhoram a função endotelial.Parece estimularem a produção do Óxido Nítrico(NO), um potente vasodilatador e reduzirem a

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TEXTO_Graça Silva

Graça Silva

Especialista em Cardiologia pela Ordem dos Médicos. Directora do Serviço de Cardiologia do Hospital de Santarém. Competência em Ecocardiologia pelo

Colégio da Especialidade de Cardiologia da Ordem dos Médicos.

Resumo do artigo

A baixa incidência de DCV na mulher jovem, o aumento progressivo da doença após a menopausa e o efeito favorável de estrogénios sobre o perfil

lipídico, esteve na origem de conceito de que as hormonas femininas são protectoras do sistema cardiovascular (SCV).

Pensou-se que a terapêutica hormonal de substituição THS, utilizada para o tratamento dos sintomas vasomotores da menopausa e para prevenção e

tratamento da osteoporose, teria um papel protector do SCV.

O Nurses Health Study revelou uma menor incidência do EM nas mulheres tratadas. Este estudo observacional esteve na origem da generalização da

utilização da THS para a prevenção da DCV.

Os resultados dos estudos clínicos HERS I, HERS II, WHI, ERA, WAVE que decorreram na década de 90, não evidenciaram benefício e os doentes tratados

tiveram maior incidência de eventos cardíacos, de tromboembolismo e de cancro da mama.

Actualmente, a THS não tem lugar na prevenção da doença cardiovascular na mulher.

As recomendações para a prevenção da DCV na mulher especificam que a THS não deve ser usada porque aumenta os riscos dos eventos

cardiovasculares.

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DOENCA CARDIOVASCULARNA MULHER

-

TERAPEUTICA HORMONAL E PROTECCAO HORMONALI PARTE

----

HDL

LDL Lpa

Triglycerides

Hepatic lipase activity

Apolipoprotein A - I

Enhanced synthesisHepatic lipase activityEnhanced synthesis

Upregulation of LDL receptors

Catabolism

Clearance

10-30% ≥20%

10-20%

25-50%

Fig. 1

Mayo Clinics Review, 2nd Ed., 2000

Estrogénios e perfil lipídico

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Ao contrário de que era esperado, os resultadosdos estudos aleatorizados que testaram aeficácia clínica da THS na prevenção da doençacardiovascular revelaram falta de benefícioshavendo mesmo aumento do risco de eventoscardiovasculares e aumento dos fenómenostromboembólicos.

Estudos aleatorizados - HERS, HERS II, WHI

Vários estudos foram desenhados para testar aeficácia clínica da THS na prevenção da doençacardiovascular. Os estudos HERS e HERS II (Heart andEstrogen/ Progestin Replacement Study) e o estudoWHI (Women Health Initiative) são estudos centraisno que respeita à definição dos riscos da THS.Os resultados dos estudos HERS e HERS IIrevelaram a falta de benefícios da THS namulher com risco cardiovascular elevado. O quefoi apoiado por dois estudos randomizados que

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produção de factores vasoconstritores, como aEndotelina-1. Bloqueiam também os canais deCálcio o que é um contributo adicional para oseu efeito vasodilatador.

Estrogénios e HemostaseOs estrogénios foram associados a mudanças favo-ráveis nos factores hemostáticos. A mulher pós-menopausica a fazer THS têm níveis mais baixos deFibrinogénio, do Inibidor do Activador do Plasmi-nogénio (PAI-I) e da Actividade do Plasminogéniotecidular (tPA) e há um aumento do potencionalfibrinolítico. Mas promovem a coagulação por au-mento do factor VII, do Fragmento da Protrombina1 e 2 (FP 1 e 2) e da Fibrinopeptideo A.

Estrogénios e Progressão da AteroscleroseOutros efeitos benéficos dos estrogénios sobrea progressão da aterosclerose:- suprimem a proliferação das células

do interstício e do músculo liso;- reduzem a deposição das plaquetas

e neutrófilos nas lesões arteriais;- aumentam os níveis de Prostaciclina;- reduzem os níveis do ACE (Angiotensin

Coverting Enzym);- homocisteína é 50% mais baixa nas

mulheres a fazer THS.- sem efeitos significativos na TA e no

aumento de peso.

Mas os estrogénios têm também efeitosdesfavoráveis sobre os biomarcadores do riscocardiovascular;- aumentam os níveis de triglicéridos;- promovem a coagulação por aumento do

Factor VII, do Fragmento da Protrombina 1e 2 (FP-1 e 2) e do Fibrinopeptideo A;

- aumentam o nível da Proteína C Reactiva(PCR), importante marcador da inflamaçãoque está na base da aterogénese.

THS e risco cardiovascular. Estudosobservacionais. Estudos aleatorizados

Na clínica a utilização da THS para diminuição dorisco cardiovascular teve resultados contraditórios.O estudo de Framingham revelou claramentediferenças específicas dos dois sexos nas mani-festações da doença coronária.

A mulher jovem tem uma baixa incidência deDoença Cardiovascular (DCV) em relação aohomem. O aparecimento tardio das manifesta-ções da doença cardiovascular, 10 a 15 anos maistarde que no homem, e o aumento dasmanifestações da DCV após a menopausa, estãona origem do conceito de que a mulher estáprotegida pelos estrogénios. Muitos estudosobservacionais encontraram uma baixa incidênciada Doença Coronária (DC) na mulher que fazia THSem comparação com a mulher que não recebiaesta terapêutica. Este efeito protector contrastavagrandemente com o efeito dos ContraceptivosOrais (CO) que estavam associados a um aumentoda incidência do Enfarte do Miocárdio (EM)sobretudo nas mulheres mais velhas e fumadoras.O estudo prospectivo observacional cujosresultados tiveram maior impacto foi o “NursesHealth Study” que monitorizou cerca de 32.317enfermeiras americanas com idades entre os 30--55 anos, sobre factores de riscos e uso deestrogénios. Os end points foram Enfarte doMiocárdio (EM) fatal e não fatal, o follow up foide 10 anos. Houve uma redução de 40 a 50% dorisco de DC nas mulheres pós-menopáusicas quefaziam estrogénios. Este estudo foi feito atravésdum questionário enviado pelo correio edecorreu entre 1976 e 1980. O Risco Relativo(RR) de EM corrigido à idade e factores do riscopara DC foi de 0,56 nas mulheres que tomavamestrogénios, o RR de Acidente Vascular Cerebral(AVC) foi de 0,97. As mulheres que não tinhamfactores de risco beneficiaram com a medicação,mas esta associação benéfica entre os riscoscardiovasculares e os estrogénios, foi maior nasmulheres com DC. Se esta associação era causala terapêutica com estrogénios seria um métodoimportante para a prevenção da DCV da mulherapós a menopausa. Era necessário confirmaresta hipótese através de estudos aleatorizados.

Fig. 2

Fig. 3

Metabolismo Lipídico

↓ LDL Colesterol

↑ HDL Colesterol

Função Endotelial

Mantêm a integridade do endotélio

Restauram a função endotelia

Vasodilatador

Libertação do óxido nítrico

Canais de Cálcio e Potássio

Antiproliferativo; Antioxidante; Antiadesividade

Efeitos benéficos dos estrogéniosno perfil lipídico e sistema cardiovascular

Efeitos dos estrogénios quecontribuem para a progressão da aterosclerose

Efeitos Proinflamatórios dos estrogénios

Aumentam a PCR

Efeitos Protrombóticos dos estrogénios

Aumento da Protrombina

Aumento do Fibrinogénio

Diminuição da Antitrombina III

Fig. 4

Estudos Clínicos sobre a utilizaçãoda THS para a prevenção da DCV

Estudos Observacionais

Nurses Health Study

Estudos Aleatorizados

HERS

HERS II

WHI

Estudos Angiográficos

ERA

WAVE

Fig. 5

Objectivos Determinar se a terapêutica com Estrogéniose Progesterona em mulheres após a menopausacom doença coronária estabelecida altera o riscode eventos cardiovasculares

Desenho Estudo randomizado, cego, controlado com placebo.Estudo de prevenção secundária

Paricipantes 2.763 mulheres com doença coronária commenos de 80 anos (idade média 66,7 anos)

Intervenção EEC 0,625 mg + MPG 2,5 mg versus Placebo

Follow up 4,1 anos

Objectivos Primários Enfarte Agudo do Miocárdio não fatal;Morte cardiovascular

Objectivos Secundários Revascularização Coronária; Angina Instável;Insuficiência Cardíaca Congestiva; AVC; AcidenteIsquémico Transitório (AIT); Doença ArterialPeriférica (DAP); Mortalidade global.

Conclusões Durante 4,1 anos de terapêutica não houveredução da incidência de eventos cardiovascularesnas mulheres pós-menopausica com doençacoronária conhecida. O tratamento não aumentoua incidência de eventos tromboembólicos nem dedoença da vesícula biliar. Baseada na falta globaldos benefícios cardiovasculares e no aumento dorisco de eventos no primeiro ano os autores nãoaconselharam o início de terapêutica com oobjectivo da prevenção secundária da DCV.

Desenho e conclusões do estudo HERS

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testaram o efeito da THS na progressão daaterosclerose, ERA (Estrogene and Regreationof Atherosclerosis) e o estudo WAVE (Women’sAngiographic Vitamin and Estrogen). O estudoWHI que inclui mulheres saudáveis foi suspensoprecocemente ao fim de 5,2 anos por se ter

verificado que os riscos da THS continuada eramsuperiores aos benefícios. Houve um aumento dorisco de eventos cardiovasculares, de AVC, deproblemas tromboembólicos e de cancro invasivo

da mama. Estes dois estudos que decorreram nosEstados Unidos da América (EUA) utilizaram omesmo regime terapêutico: Estrogénios EquinoConjugado (EEC) na dose de 0,625 mg e acetatode MedroxiProgesteronA (MPA) na dose de 2,50mg. Não se estudaram outras combinações nemoutras dosagens, mas na ausência de outrosestudos deve assumir-se que os riscos sãosemelhantes, que isto seria um efeito de classe enão específico dos produtos utilizados.No estudo HERS houve um aumento do risco deacidentes cardiovascular no primeiro ano eredução do risco nos últimos anos do estudo o quelevou ao follow up de 2.321 mulheres (HERS II)em estudo aberto com o objectivo de determinarse esta redução de risco se mantinha ao longo dosanos subsequentes. O seguimento durou 2,7 anose confirmou-se que não havia redução do risco deeventos cardiovasculares com a terapêuticainstituída. Foi reafirmada a recomendação de nãoutilizar a THS para redução do risco de eventos emmulheres com doença coronária conhecida.O estudo WHI tem um índex global de balançodos riscos/benefícios que inclui EM não fatal emorte cardiovascular (CV), cancro invasivo damama, AVC, Embolia Pulmonar (EP), Cancro doEndométrio, Cancro Colo-Rectal, Morte de todasas causas. O estudo WHI teve outro braço em quea terapêutica foi só com estrogénios, mulhereshisterectomizada, os mesmo objectivos, parou1,7 anos antes do tempo previsto para o followup, foi neutro em relação à DCV. Houve aumentodo risco relativo de demência em 49%, de AVCem 39%, de EP em 34% e houve diminuição dorisco relativo de fractura da anca em 39%.

Graça Silva

Nota: A 2ª Parte deste trabalho será publicadono próximo número da Revista Factores de Risco.

Fig. 6

Objectivos Avaliar os benefícios e riscos da THS em mulheressaudáveis.

Desenho Estudo randomizado, cego, controlado com placeboPrevenção primária da DCV

Paricipantes 16.608 mulheres pós menopausa com idadesentre 50-79 anos.

Intervenção EEC 0,625 mg + MPG 2,5 mg versus Placebo

Follow up 8,5 anos

Objectivos Primários Enfarte do Miocárdio não fatal; Morte Cardiovascular;Cancro Invasivo da Mama como efeito adverso

Resultados Interrompido precocemente ao fim de 5,2 anos defollow up porque os risco globais excediam osbenefícios. A mortalidade global não foi afectada.Houve mais eventos coronários (RR 1,29), EmboliaPulmonar (RR 2,13), AVC (RR 1,41), Cancro Invasivoda Mama (RR 1,26). Houve redução do cancro colo-rectal (RR de 0,63), cancro do endométrio (RR de0,83) e da fractura da anca (RR de 0,66). O excessode risco de eventos no índice global foi de19/10.000 pessoas ano

Conclusões Em mulheres saudáveis pós menopausicas o uso daterapêutica combinada EEC + MPG durante 5,2 anos,levou a um aumento do risco que excedeu osbenefícios. Foi recomendado que este regimeterapêutico não deve ser iniciado ou continuado paraa prevenção primária da doença cardiovascular.

Desenho e conclusões do estudo WHI

Sociedade Portuguesa de CARDIOLOGIA

Grupo de Estudode Risco CardiovascularGERC

Risco Global e Risco Territorialna Doença AterotrombóticaAlfândega do Porto, 3 e 4 de Fevereiro de 2007

1ª SESSÃO

Sábado, 3 de Fevereiro de 20079:00 - 12:30 horas

Risco Global eAgregação de Factores de Risco

Moderadores:Cassiano Abreu Lima

Pedro von Hafe

2ª SESSÃO

Sábado, 3 de Fevereiro de 200714:00 - 18:00 horas

Risco Global eRisco Territorial

Moderadores :Carlos PerdigãoQuitéria Rato

3ª SESSÃO

Domingo, 4 de Fevereiro de 20079:00 – 13:00 horas

Atitudes pósSíndrome Coronária Aguda

Moderadores :Evangelista Rocha

Ana Camacho