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10
SUMÁRIO
Resumo
Abstract
Dedicatória
Agradecimentos
Siglas e Abreviaturas
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 12
Capitulo I – A ANTROPOSOFIA E O DESENVOLVIMENTO DO SER HUMANO (RUDOLF
STEINER)............................................................................................................................................. 16
1. Breve Biografia de Rudolf Steiner.................................................................................................... 16
2. Antroposofia ..................................................................................................................................... 19
2.1. A especificidade da Antroposofia (ciência espiritual moderna) ................................................ 22
3. A Entidade Humana ......................................................................................................................... 24
3.1. A Natureza do Homem ............................................................................................................. 24
3.2. Corpo, Alma e Espírito.............................................................................................................. 27
3.3. O Eu Humano ........................................................................................................................... 32
4. O Homem em relação com o Universo ............................................................................................ 33
Capitulo II – EDUCAÇÃO E PEDAGOGIA WALDORF ....................................................................... 39
1. A Arte da Educação, segundo Rudolf Steiner ................................................................................. 39
1.1. A evolução do ser humano, desde a infância, numa perspectiva educacional........................ 41
2. A Pedagogia Waldorf ....................................................................................................................... 47
2.1. Valores e Crenças das Escolas Waldorf .................................................................................. 51
2.2. Os Professores e os Alunos na Pedagogia Waldorf ................................................................ 55
2.2.1. O Professor Waldorf .......................................................................................................... 66
2.2.2. A Relação Professor – Alunos .......................................................................................... 68
2.3. A Comunidade Escolar Waldorf................................................................................................ 69
2.4. A Estrutura formal da Escola Waldorf....................................................................................... 71
Capítulo III – ENSINO WALDORF NO MUNDO.................................................................................. 74
1. Waldorf no Mundo............................................................................................................................ 74
2. Waldorf em Portugal......................................................................................................................... 77
Capítulo IV – Fundamentação da Metodologia e procedimentos de investigação.............................. 93
11
1. Delimitação do Problema ................................................................................................................. 93
2. Objectivos do Estudo ....................................................................................................................... 93
3. Opções Metodológicas..................................................................................................................... 94
4. Caracterização da Amostra.............................................................................................................. 97
4.1. Caracterização contextual da “Escola das Virtudes Waldorf”, situada no Porto ...................... 97
4.2. “Jardim-de-Infância Waldorf”, em Alfragide ............................................................................ 100
5. Técnicas de Recolha de Dados ..................................................................................................... 101
6. Análise e Tratamento de Dados..................................................................................................... 102
Capítulo V – TESTEMUNHOS PARA A HISTÓRIA .......................................................................... 104
Introdução .......................................................................................................................................... 104
2. Análise Qualitativa.......................................................................................................................... 105
3. Considerações finais e perspectivas.............................................................................................. 122
CONCLUSÃO..................................................................................................................................... 129
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................. 138
ANEXOS ............................................................................................................................................ 152
ANEXO 1 – GUIÃO DA ENTREVISTA .............................................................................................. 153
ANEXO 2 – ENTREVISTA AO DIRECTOR EXECUTIVO DA “ESCOLA DAS VIRTUDES WALDORF”,
LOCALIZADA NO PORTO................................................................................................................. 154
ANEXO 3 – ENTREVISTA AO DOCENTE DO EXTINTO “PROJECTO WALDORF”, CRIADO PARA
AS CRIANÇAS................................................................................................................................... 158
ANEXO 4 – ENTREVISTA À DIRECTORA E EDUCADORA DO “JARDIM-DE-INFÃNCIA
WALDORF”, LOCALIZADO EM ALFRAGIDE ................................................................................... 164
ANEXO 5 – DISTRIBUIÇÃO DE ESCOLAS WALDORF NO MUNDO.............................................. 168
12
INTRODUÇÃO
A actual conjuntura apresenta muitos desafios, entre eles, o de reconfigurar a
educação, ousando-se reflectir sobre ela, nas diferentes vertentes, de forma a tentar
encontrar respostas reconfortantes e optimistas a anseios, insatisfações sentidas e
observadas, práticas vigentes, bem como a sonhos, projecções e idealismos, para
aqueles que depositam toda a sua fé e trabalho na educação, pesa embora as
vicissitudes que ela mesmo encerra.
Na incansável busca de utopias ligadas a práticas e ideais educativos quase
inexistentes, eis que se encontram muitos companheiros e, então, torna-se
perceptível que o desejo – de contribuir para uma sociedade mais consciente, mais
tolerante, mais responsável, mais humana, mais mergulhada na sua própria
essência – não é somente meu, mas de muitos outros professores/educadores.
O desejo de tornar reais essas utopias, ou por outro lado, de sentir a
necessidade de encontrar respostas passíveis de concretização de sonhos
presentes ou futuros, quer de âmbito profissional, quer de âmbito pessoal, levou à
realização deste trabalho de investigação.
Na procura de uma visão optimista de resposta/alternativa à crise
educacional sentida nas escolas portuguesas, principalmente pelos docentes que
delas fazem parte, no que concerne ao sentimento de desajuste do modelo de
escola actualmente preconizado perante a sociedade de informação, foi possível
encontrar um modelo de escola de cunho inovador que contém propostas
ideológicas, pedagógicas, filosóficas, … que incitam à sua análise e reflexão.
É comum falar-se muito sobre pedagogia e sobre a essência da educação.
Inúmeras pessoas, no âmbito das que têm a seu encargo educar e ensinar
crianças, falam da necessidade de impulsos reformistas, justamente em relação à
educação e ao ensino.
Sente-se o intelectualismo e a abstracção por toda a parte quando se afirma,
por exemplo, que as crianças não devem ser educadas simplesmente apelando-se
apenas ao seu intelecto; sendo o coração das crianças o que é premente educar
para que os afectos, a tolerância, os valores e as crenças, a liberdade e o espírito
crítico sejam valorizados.
Esta dissertação ousa despertar para uma nova forma de encarar a
educação, sendo que o grande desafio foi traduzir a crença de que educar é uma
13
tarefa, embora complexa, apaixonante e de que pode apresentar uma alternativa às
insatisfações sentidas no nosso sistema educativo actual.
A concepção de educação exercida pela observação íntima do ser criança e
das condições necessárias para o desenvolvimento infantil, é denominada por
Pedagogia Waldorf, concebida pelo pedagogo e filósofo austríaco Rudolf Steiner
(1861- 1925), em 1919.
Esta pedagogia situa-se, por outro lado, num contexto amplo e complexo da
cosmovisão que, de certa forma, constitui o seu envoltório espiritual – a
Antroposofia.
Assim, a Pedagogia Waldorf fundamenta-se no conhecimento do ser humano
e da sua relação com o meio, segundo a Antroposofia, a qual, também criada por
Rudolf Steiner, anuncia-se como uma Ciência, mais abrangente que a Ciência
Natural (por considerar os âmbitos físico e espiritual) e considera que o Homem,
como síntese da Natureza em estado elevado, tem responsabilidades, e não
prerrogativas, diante do que ele próprio é.
Deste modo, objectivando-se investigar como se apresenta a educação em
Portugal, desenvolveu-se um estudo comparativo que aborda os paradigmas
educacionais e modelos actualmente concebidos na generalidade das escolas
portuguesas, e a análise de um modelo de ensino alternativo (Pedagogia Waldorf)
que, dada a sua actualidade e relevância, possui cada vez mais seguidores, em que
Portugal não constitui excepção (embora ainda não haja uma escola pública básica
Waldorf, em Portugal já existem Jardins-escola, criados recentemente).
Neste contexto, emerge a pergunta de partida deste estudo: Que contributo
dá a Pedagogia Waldorf para a Educação em Portugal?
Importa, então, analisar se a Pedagogia Waldorf contribui para a promoção
da participação activa e criativa dos alunos e a livre iniciativa dos mesmos; para a
promoção do crescimento e responsabilização pessoal; para o desenvolvimento das
relações interpessoais; para a exploração do mundo das ideias, desenvolvendo o
seu conhecimento, capacidades e qualidades próprias; para o favorecimento da
integração social dos alunos/crianças; e, finalmente, para a promoção do espírito
comunitário.
O trabalho é simultaneamente histórico e prospectivo, resultado de um
levantamento e estudo bibliográfico de diferentes obras de autores especialistas em
Educação e das obras educacionais de Rudolf Steiner, bem como da análise e
14
reflexão dos testemunhos dos entrevistados de relevada pertinência para o estudo
em causa.
Esta investigação pretende contribuir para o enriquecimento da discussão em
torno de possibilidades de formação humana que compreendam as actuais
dinâmicas de relação entre o Homem, a Sociedade e a Educação, trazendo à
colação conhecimentos específicos de um contexto educacional alternativo e ainda
pouco explorado em Portugal.
Nesta linha de ideias, iniciar-se-ão, no primeiro capítulo, uma série de
reflexões em torno da visão da Vida por Rudolf Steiner e do conceito de
Antroposofia, por ele criado, como fenómeno histórico e como pano de fundo para
uma nova visão da História, em conceito amplo.
Após a explanação desta temática, será abordado o sistema de ensino
Waldorf e, seguidamente, esta pedagogia no mundo e particularmente em Portugal,
tendo-se iniciado no nosso país, como projecto de ensino formal, em 1982, com a
criação das cooperativas de “ensino artístico Waldorf”, dando seguimento ao
processo iniciado em 1980, no seio da “Cooperativa Waldorf”, de ensino informal.
A segunda parte desta dissertação passará ao estudo empírico, onde se
contará com entrevistas realizadas que visam fazer, ao mesmo tempo, um estudo
comparativo das práticas, das opiniões e das atitudes, dos profissionais ligados ao
ensino alternativo Waldorf, em diferentes projectos, funções e localidades. Contou-
se então com a colaboração dos entrevistados definidos como A, B e C, que têm
e/ou tiveram contacto directo com o modelo de ensino Waldorf.
Importa, com esta investigação, contribuir para que seja possível
redefinir/repensar a educação, de forma a fomentar a criação de um modelo
educativo alternativo mais preocupado com a formação de indivíduos mais
conscientes, mais humanos, mais inteiros, mergulhados na sua própria essência, e
menos preocupados com a actual epidemia política, impulsionada por poderosos
agentes globalizadores, de que a OCDE constitui o mais significativo think tank
mundial.
A educação, de facto, deve ser um direito social e de bem-estar individual e
público, num processo dinâmico, que assente no valor da pessoa humana – o
educando.
16
Capitulo I – A ANTROPOSOFIA E O DESENVOLVIMENTO DO SER HUMANO
(RUDOLF STEINER)
1. Breve Biografia de Rudolf Steiner
Será premente o percurso de vida de Rudolf Steiner, para que se possa
entender melhor as linhas filosofico-teóricas do pensamento do mesmo.
Steiner nasceu em 27 de Fevereiro de 1861, na divisa entre a Europa Central
e a Oriental, em Fraljevec, em Áustria-Hungria, hoje Eslovénia, tendo recebido o
baptismo cristão na Igreja Católica Romana, dois dias após o nascimento. A
polaridade entre Oriente e Ocidente acompanhou, como tensão, toda a sua vida.
Devido à profissão do pai – telegrafista – Steiner experimentava, desde os
primórdios da sua vida, a polaridade entre a natureza e a técnica.
Por causa das desavenças entre o mestre de escola e o seu pai, este
encarregou-se do ensino de Steiner, até ao seu 8º ano de idade, altura em que
mudaram de Pottschach para Newdorf (Hungria). Em Newdorf, frequentou,
inicialmente, a escola local, de cunho marcadamente oriental, onde existia uma
única sala de aula com cinco classes de meninos e meninas que eram ensinados
simultaneamente, sendo que o mestre raramente aparecia, fazendo-se representar
por um professor auxiliar.
Com apenas nove anos de idade, segundo Steiner “o professor auxiliar de
Neudorfl, com seu livro de Geometria, propiciava-me a justificativa do mundo
espiritual de que eu precisava naquela época” Hemleben (1989, p.20).
O professor auxiliar era também organista da igreja local, ajudando nos
serviços religiosos. Este facto, levou a que os seus alunos participassem, também,
nesses serviços (coro) e tivessem um contacto próximo com a Bíblia e o Catecismo,
os quais, para Steiner, tinham pouco valor, interessando-lhe, apenas, a forma como
era executado o culto, pela figura do sacerdote, mediando os mundos sensorial e
supra-sensível.
A partir do décimo ano de vida, Steiner frequentou o liceu em Wiener-
Neustadt (Baixa-Áustria). Nesta cidade, Steiner, uma vez que até então o contacto
com o campo era uma constante, sentia-se inseguro, tendo dificuldade em
17
encontrar uma relação igualmente segura com o mundo da cidade, bem como com
o seu mundo interior (Hemleben, 1989).
Dos doze aos dezoito anos, Steiner, pela instrução e pela autodidáctica
intensiva, adquire conhecimentos notáveis na geometria descritiva e no cálculo de
probabilidade, tendo conseguido a classificação de “excelente” a geometria, nunca
antes dada no colégio, e lendo obras de carácter filosófico, nomeadamente a
“Crítica da Razão Pura” de Kant, sendo que obteve o diploma Bacharel com
distinção. Ao longo do seu percurso académico, procurava integrar o pensamento
religioso (Eliade, 1999) no pensamento humano abrangente (Ibidem).
Entretanto, para possibilitar que Steiner estudasse na Academia Técnica de
Viena, transferiram-se de Neudörfl para Inzersdorf, onde se inscreveu nas
disciplinas de Biologia, Química, Física e Matemática como matérias regulares de
estudo. Porém, no intervalo entre a formatura no liceu e a entrada para a Academia
Técnica de Viena, Steiner adquirira uma série de obras dos grandes filósofos do
Idealismo Alemão: Fichte; Hegel; Schelhing e os seus discípulos e Darwin.
O autor em estudo, nunca questionou a existência de um mundo espiritual,
pois, desde a sua infância, manifestaram-se nele faculdades de “clarividência”. A
dúvida de Steiner era saber como se relacionavam os mundos físico e espiritual
(Hemleben, 1989).
Até aos seus dezoito anos, Steiner nunca divulgou essa sua faculdade.
Porém, nessa altura, conheceu um homem que colhia ervas medicinais no campo e
as vendia nas farmácias. A relação de Steiner com este homem, que possuía uma
sabedoria elementar adquirida da espiritualidade da Natureza, marcou a sua
posição:
Se queres pôr tua própria vivência interior do mundo espiritual
em harmonia com a consciência intelectual do teu meio
ambiente, de forma a possibilitar uma dominação eficaz do
materialismo cada vez mais expressivo como cosmovisão e
forma de vida, forçosamente deves adoptar primeiro a atitude
de consciência intelectual do homem do século XIX. Deves
enfiar-te na pele do dragão. Somente se dominares os
métodos do pensar científico-natural e discernires
perfeitamente o teor de verdade limitado da cosmovisão
científico-natural, poderás tornar eficaz, no Ocidente, uma
cosmovisão espiritual (Steiner, 1999, p.31).
18
Aos dezanove anos, Steiner sentiu-se cativado pela cadeira de Literatura
Alemã (desde Goethe e a Vida e Obra de Schiller), mais propriamente, pela forma
como era ministrada pelo seu professor Karl Julius Schröer, complementando as
suas leituras com o diálogo e amizade travados com o seu professor (Hemleben,
1989). Por esta altura, começa a levantar questões, como a do destino do homem,
da sua autonomia e dependência no cosmos: qual a sua missão? Que tarefa tem
ele, frente aos reinos da Natureza?
Steiner começa por refundir, a doutrina científica de Fichte, de forma a
clarificar a concepção, a congruência e a divergência com a sua doutrina, afirmando
o seguinte:
Antes, maçava-me em encontrar conceitos para os fenómenos da Natureza, a partir dos quais se pudesse achar um conceito para o “eu”. Agora eu queria, inversamente a partir do eu, penetrar no processo evolutivo da Natureza. Espírito e Natureza apresentavam-se naquele tempo em todo o seu contraste ante minha alma. Para mim, era observação directa o facto de que o eu, que de per si é espírito, vive num mundo de espíritos. Mas a Natureza não queria entrar no mundo espiritual vivenciado (Hamlebem1989, p.26).
Steiner, no auto-testemunho, registado por Hamlebem (Idem, p.32) afirmava:
“Eu tinha deveras a sensação, a cada vez sentado a sós com Schröer, de que uma
terceira entidade se fazia presente: o espírito de Goethe”.
Entretanto, Steiner travou conhecimento com uma jovem (16 anos) e talentosa
poetisa de nome Marie Eugenie delle Grazie que vivia em casa do padre católico e
professor de filosofia cristã Laurenz Müllner que, em 1894, exercia o cargo de Reitor
da Universidade de Viena. Os dois – Marie e Laurenz – formavam um dos centros
espirituais mais activos de Viena. Semanalmente, realizavam reuniões, cuja
atmosfera impressionava Steiner.
Encontrara, agora, um catolicismo culto que se mostrava avesso a Goethe.
Contudo, conforme esclarece Hemleben (Ibidem), essa aversão a Goethe não o
afectava, pelo contrário, fazia parte das máximas com que entrara na vida: “jamais
se comprometer com uma coisa ou com um espírito antes de se haver familiarizado
também com os seus antípodas”.
Foram várias as influências no pensamento de Steiner, levando a que este
trabalhasse na sua doutrina de conhecimento que, mais tarde, encontrou a sua
manifestação no livro intitulado “A Filosofia da Liberdade”. Na evolução do seu
pensamento são claras as influências de Haeckel e Nietzsche, sendo,
19
precisamente, através do materialismo e do haeckelianismo que Steiner chegou à
“teosofia” (doutrina religiosa que tem como objecto a união com a divindade)
“indiana” semelhante a um “cristianismo esotérico” para superar o materialismo
contemporâneo.
Foi secretário do grupo alemão da Sociedade Teosófica, da qual se separou,
em 1912, para fundar a Liga Antroposófica, mais tarde (1913) Sociedade
Antroposófica (Hemleben, 1989).
A Antroposofia de Steiner afirma a natureza espiritual do universo e
apresenta uma doutrina segundo a qual o homem se compõe de uma série de
princípios de ordem crescentemente espiritual: corpo físico, corpo etéreo, corpo
espiritual, eu, eu espiritual, espírito vital e homem espiritual. O princípio etéreo e o
princípio astral não acabam com a morte e contribuem para o aperfeiçoamento do
eu, que reencarna. Segundo a perspectiva do mesmo Steiner, o método científico
não é, de modo nenhum, incompatível com uma visão sobrenatural do mundo
(Idem).
A sua pedagogia foi posta em prática na “escola de ciência espiritual”, que
fundou em Dornach, onde experimentou processos para o desenvolvimento das
faculdades ocultas do espírito humano.
Ao mesmo tempo que afirmava a inteira autonomia da criança, Steiner (2000)
assinalava que o professor é sempre a referência moral determinante e a
autoridade.
2. Antroposofia
Baseada nas ideias da "ciência espiritual" de Rudolf Steiner, a antroposofia
(conhecimento do ser humano) é uma filosofia que surgiu no contexto do
movimento teosófico de Helena Blavatsky (Hemleben, 1989).
A Sociedade Antroposófica foi formada em 1912, depois que Steiner saiu da
Sociedade Teosófica Adyar devido a divergências com sua líder, Annie Besant. Ele
foi acompanhado por um grande número de membros da Secção Alemã da
Sociedade Teosófica, e tornou-se o presidente deste grupo. A antroposofia difere da
teosofia no seu foco prático, a sua ênfase no desenvolvimento de impulsos
artísticos, em ter como base teórica o esoterismo ocidental (mais do que o
20
esoterismo hindu ou budista), e pela sua visão positiva do Cristo que, contudo,
ainda é bastante diferente da visão Cristã comum (Idem).
Steiner definiu a antroposofia como "um caminho de conhecimento para guiar
o espiritual do ser humano ao espiritual do universo." Afirma que as pessoas não
são meramente observadoras, separadas do mundo externo. De acordo com
Steiner, a realidade surge somente na união do espiritual e do físico – i.e., "onde o
conceito e a percepção se encontram". O objectivo do antropósofo é tornar-se "mais
humano", ao aumentar a sua consciência e deliberar sobre os seus pensamentos e
acções. Pode-se atingir altos níveis de consciência pela meditação e observação
dos fenómenos da natureza e do próprio processo cognitivo. Steiner descreveu e
desenvolveu numerosos exercícios para a obtenção da capacidade de experienciar
o mundo supra-sensível (Lanz, 2002).
Os antropósofos vêem os seres humanos como que constituídos de três
membros inter-relacionados: o corpo, a alma e o espírito. Esta visão é
completamente desenvolvida nos livros de Steiner - “Teosofia” e “A ciência oculta”.
A base epistemológica da antroposofia está contida na obra “A filosofia da
liberdade”, assim como na sua tese de doutoramento, “Verdade e Ciência”. Estes e
vários outros livros de Steiner anteciparam a gradual superação do idealismo
cartesiano e do subjectivismo kantiano da filosofia do século XX. Assim como
Edmund Husserl e Ortega y Gasset, Steiner foi profundamente influenciado pelos
trabalhos de Franz Brentano, e havia lido Wilhelm Dilthey em detalhe. Pelos seus
primeiros livros, de cunho epistemológico e filosófico, Steiner tornou-se um dos
primeiros filósofos europeus a superar a ruptura entre sujeito e objecto que
Descartes, a física clássica, e várias forças históricas complexas gravaram na
mente humana ao longo de vários séculos (Ibidem).
Steiner também ministrou vários ciclos de palestras para médicos, a partir
dos quais surgiu um movimento de medicina antroposófica que se espalhou pelo
mundo e agora inclui milhares de médicos, psicólogos e terapeutas, e que possui os
seus próprios hospitais e universidades médicas.
Outras vertentes práticas, de acordo com Lanz (2002), da antroposofia
incluem: a arquitectura (Goetheanum), a agricultura biodinâmica, a educação infantil
e juvenil (pedagogia Waldorf), a farmácia homeopática (Wala, Weleda, Sirimim), a
filosofia ("A Filosofia da Liberdade”), a euritmia ("O movimento como verbo visível e
som visível"), e os centros para ajuda de crianças especiais (Vilas Camphill).
21
Contudo, a antroposofia possui detractores. Os críticos designaram-na como
um culto com similaridades em relação aos movimentos da Nova Era. Se for um
culto, contudo, é um que fortemente enfatiza a liberdade individual. Ainda, alguns
críticos sustentam que os antropósofos tendem a elevar as opiniões pessoais de
Steiner, muitas das quais são estranhas às visões das religiões ortodoxas, da
ciência e das humanidades, ao nível das verdades absolutas. Se existe alguma
verdade nesta crítica, a maior parte da culpa pertence não a Steiner, mas aos seus
estudantes. Steiner frequentemente estimulou os seus estudantes a testarem tudo o
que ele dizia, e em muitas ocasiões, até mesmo implorou-lhes que não tomassem
nada do que dissesse com base na fé ou autoridade (Hemleben, 1989).
Outra crítica afirma que alguns antropósofos parecem distanciar suas
actividades públicas da possível inferência de que a antroposofia é baseada sobre
elementos esotéricos religiosos, tendendo a apresentá-los ao público como uma
filosofia académica não-sectária. Uma dificuldade em avaliar essa crítica é que ela
contém um preconceito oculto porque ignora uma questão que a antroposofia
procurou levantar e responder: é possível para aquele que pensa ser tanto
cientificamente quanto espiritualmente cognitivo, ao mesmo tempo? A antroposofia
afirma que isso é possível. A crítica supra mencionada, por outro lado, assume que
não é possível, e portanto encontra uma contradição entre a afirmação de um não-
sectarismo e um embasamento na experiência supra-sensível (Ibidem).
Pode-se resumir a Antroposofia de Steiner, segundo Lanz (2002) como um
modo de alcance de um conhecimento supra-sensível da realidade do mundo e do
destino humano. Mas, o conteúdo desse resumo é complexo e remete a um estudo
de extremas profundidade e disciplina, aliadas a um método de exercícios
metódicos precisos, com o intuito de revelar no homem o divino que neste reside
adormecido. A Antroposofia, o corpo de conceitos derivados da Ciência Espiritual,
coloca o Antrophós (Homem) como participante efectivo do mundo espiritual através
dos seus corpos superiores, tornando assim evidente no mesmo o conceito do
Theós (Deus).
A Ciência Espiritual é o meio de experiência consciente directa com o mundo
espiritual, não se tratando, portanto, de uma forma de misticismo. É denominada
ciência pois os seus resultados podem ser verificados por qualquer um que se
dispõe a preparar-se neste sentido através do trabalho interior. Trata-se, por isso,
de um conhecimento exacto possível de ser acedido pelo pensar, desde que ele
22
seja desenvolvido para tal, através de um trabalho diário (exercício de
concentração, revisão da memória, acção pura, percepção pura, etc.).
2.1. A especificidade da Antroposofia (ciência espiritual moderna)
Rudolf Steiner (1861-1925) apresentou, entre 1886 e 1925, uma cosmovisão,
forma de observar e entender o mundo e o homem, que ele mesmo, depois de
1904, passou a chamar de Antroposofia. O termo Antroposofia já tinha sido usado
antes, embora com significado diferente, por outros filósofos no século XIX. Dada a
especificidade do pensamento de Steiner, apresentam-se, no quadro 01, algumas
características constitutivas da especificidade da Antroposofia (Lanz, 1999).
Quadro 01 – Características da Antroposofia
Características
Tipologia Incidência Observações
Abrangência Abrange:
- Toda a natureza -Toda a vida humana
Aplicável: - Em quase todas as áreas da vida. - Na educação, através da pedagogia
Waldorf.
Conceptualização - Edifício conceptual próprio, dado que é apresentada sobre a forma de conceitos
Pronuncia-se sobre: - A essência da entidade humana. - A evolução do Universo. - A evolução do homem.
Espiritualidade Forte espiritualismo
Concepção do mundo espiritual estruturado em vários níveis ou arquétipos: - Mundo Físico. - Vida. - Tudo quanto é anímico. - Relacionamento com outros mundos. - Fornecimento de impulsos para as
actividades.
Centralidade Antropocentrismo O homem é centro e ponto de partida para a compreensão do universo e de si próprio
Percepção Supra-sensorial
O mundo espiritual pode ser observado com a mesma clareza
com que se observa o mundo físico
Para a observação do mundo supra-sensorial é necessário o desenvolvimento de órgãos de
percepção, através do exercício
Características humanas
Consciência. Auto-consciência. Individualidade.
Liberdade
Premente o desenvolvimento destas quatro características
Cosmovisão Aberta Inexiste secretismo
Perspectiva histórica Continuidade histórica Quer sobre a evolução da terra, quer sobre o ser humano.
Ciência Renovação da pesquisa científica Tornando mais humana e mais coerente com a natureza
Moral Desenvolvimento moral assente no conhecimento da essência do
ser humano e do universo
Deve preservar a liberdade individual e o amor altruísta
Fonte: Adaptado de Lanz (1999)
23
De acordo com Barfield (2002), a Antroposofia, deriva dos termos gregos
“anthropos + sofia”, significando “conhecimento do ser humano” ou “sabedoria do
homem”. Em conformidade com o pedagogo e filósofo austríaco Rudolf Steiner,
pode ser caracterizada como um método de conhecimento da natureza do ser
humano universal.
A Ciência Espiritual Antroposófica, diverge dos conceitos sociológicos de
“religião” e de “seita religiosa”, distinguindo-se, também, da noção de “filosofia”,
dado o seu fundamento em factos concretos e verificáveis. Afasta-se, ainda, do
esoterismo, como o espiritismo, pelo facto do pesquisador, conservando-se dentro
dos métodos por ela preconizados, manter a sua plena consciência, sem qualquer
transe, mediunismo, estados extáticos ou de excitação artificial. Daí poder induzir-
se que Antroposofia é um tipo de conhecimento científico, visando ampliar,
humanizar a pesquisa científica, tornando-a mais coerente com a natureza (Ibidem).
Na Antroposofia existe o sentimento de que há um domínio não físico, impalpável,
mas cuja existência se percepciona através de uma certeza directa e inata, que a
Antroposofia (ou Ciência Espiritual Moderna) considera, permitindo conhecer algo
desse outro mundo, bem como investigá-lo, consciente e cientificamente, por meios
adequados, conservando-se a plena consciência, o espírito crítico e o raciocínio,
distanciando-se da simples crença (Lanz, 1999). Assim, por um lado ela é ciência
procurando ampliar o nosso campo de observação, e, por outro lado, é,
essencialmente, fonte de realizações práticas (Steiner, 1997).
A Ciência Espiritual Antroposófica ou Antroposofia é um conjunto, um edifício
completo e complexo, com muitas portas de acesso, acedendo-se a uma de cada
vez. No dizer de Steiner (Idem, p.4) “a Antroposofia só pode ser reconhecida por
aqueles que nela encontram aquilo que buscam a partir de sua sensibilidade.
Portanto, somente podem ser antropósofos pessoas que sentem como uma
necessidade de vida certas perguntas sobre a essência humana e do universo,
assim como se sente fome e sede”.
24
3. A Entidade Humana
3.1. A Natureza do Homem
Segundo Steiner (1997, p.12), o Homem é um ser físico, anímico e espiritual
que possui, na sua constituição essencial, quatro membros ou corpos intercalados,
dos quais apenas um é acessível aos nossos sentidos comuns e três são supra-
sensíveis (espirituais), sendo que “o que a observação sensória descobre no
homem, e a concepção materialista considera o único aspecto válido na sua
natureza, constitui para a pesquisa espiritual apenas uma parte, um membro da
entidade humana, ou seja, seu corpo físico”. O corpo físico do Homem é comum a
todos os reinos da Natureza (mineral, vegetal e animal), porém, seguindo a linha do
autor, paralelamente a tudo isto, existe uma força vital a permear os seres
orgânicos: o corpo etérico, o qual, não existe nos minerais, mas nas plantas, nos
animais e no homem (Steiner, 1924).
No dizer do pedagogo, enquanto o corpo físico é uma aglomeração
individualizada de substâncias químicas, o corpo etérico é um verdadeiro corpo que,
embora não sendo perceptível aos nossos sentidos comuns, é observado por
indivíduos que atingiram um certo grau de clarividência através de sentidos
chamados superiores, em estado latente, os quais podem ser despertados através
de treinos adequados (Steiner, 2000). A própria Antroposofia indica o caminho que
permite ao homem despertar esses sentidos superiores, pouco a pouco (Lanz,
2002).
Segundo a Antroposofia, ainda existe um terceiro corpo, para além do físico e
do etérico, que permeia o corpo visível do homem e do animal, participando no
“plano astral”, ou seja, acima do “corpo etérico” há – no Homem e nos animais – o
“corpo astral” ou das “sensações”, permitindo que estes seres tenham todos os
tipos de sensações, algo que, segundo Steiner (1997), nenhum tipo de planta tem.
No que concerne ao corpo astral humano, a clarividência revela que o seu
aspecto depende dos sentidos que prevalecem no indivíduo observado. Lanz (2002,
p.25) afirma que “quantos mais puros e menos egoístas os sentimentos mais claro e
brilhante o corpo astral, ao qual se dá também o nome de aura. Daí o costume de
representar o corpo ou a cabeça de pessoas santas envoltos em aura clara e
luminosa”.
25
Todas estas considerações fazem do homem, de acordo com a Antroposofia,
um ser diferente do animal, o que, de algum modo, diverge das teorias
evolucionistas que consideram que o homem descende, em linha directa, do animal.
O quarto e último membro descrito por Steiner (2000) é apenas próprio do
Homem “corpo do eu” ou somente “eu, portador da alma humana superior”. Para
aquele autor (Ibidem) “o corpo do eu” seria a parcela eterna da entidade humana,
permanecendo viva após a morte do “corpo físico” e a dissolução dos demais
corpos (que ocorre processualmente depois da morte física). Emerge,
vincadamente, o conceito de “individualidade”, sendo que cada homem é um ser
único, singelo, diferente de todos os outros, com consciência de si próprio, o que
pressupõe uma série de faculdades que não se encontram nos animais: só o
homem pode pensar, opor-se ao mundo numa relação sujeito-objecto. O homem
possui a durabilidade dos sentimentos para além da presença da causa, podendo
provocar, até, um sentimento por pura representação mental; só o homem pode ter
a liberdade de agir, de escolher conscientemente entre vários actos possíveis, com
sentido moral (Ibidem). Assim sendo, vemos que o homem possui uma autonomia
pessoal própria que constitui o âmago da sua essência e do qual ele tem uma
experiência directa e insofismável.
É o “eu” ou “ego” que o distingue do animal – o quarto elemento além e
acima dos três corpos inferiores (físico, etérico e astral). Ele é esse “eu” (ego), ao
qual os três corpos servem apenas de base ou envoltório. O modo como estes
quatro corpos se combinam e interagem, define outro componente da entidade
humana: os temperamentos, sendo, ao todo, em número de quatro: colérico,
sanguíneo, fleumático e melancólico. Eles são, como o nome indica, o tempero do
comportamento dos homens e relacionam-se respectivamente com os quatro
elementos da Natureza: fogo, ar, água e terra (Ibidem).
A existência de temperamentos humanos é considerada por alguns
pensadores desde a antiga Grécia. Hipócrates, nas suas orientações de intervenção
médica, relaciona os “humores” dos indivíduos com o desenvolvimento de
determinadas doenças (Hipócrates, 2002). Também Kant (1993, p.35), em
observações sobre o sentimento do belo e do sublime / Ensaio sobre as doenças
mentais, faz observações sobre as disposições dos Homens diante da vida, de
acordo com seus temperamentos. Na Antroposofia tal teoria foi acrescida de muitos
detalhes oriundos das observações de Steiner (sobretudo a respeito dos tipos
26
comportamentais e das orientações pedagógicas mais indicadas para cada tipo de
temperamento) e tornaram-se um dos referenciais utilizados pelos educadores
Waldorf, pelo que adquirem particular relevância todos os aspectos que vêm sendo
referenciados, para a compreensão dos princípios e actuação pelos quais se rege a
Pedagogia Waldorf, criada por Rudolf Steiner.
O homem participa do plano espiritual, superior ao corpo astral ou anímico, o
qual constitui o centro do seu ser. O “eu” confere ao homem a sua personalidade.
Ele pensa, sente e deseja através dos seus corpos inferiores, ama e odeia, cobiça e
renuncia, comete actos bons e maus, entre outros. Sendo um elemento espiritual
autónomo, o “eu” não está sujeito às limitações do espaço e do tempo, sendo
eterno, independente e alheio às características passageiras dos seus corpos
inferiores, os quais estão ao seu serviço, constituindo o seu veículo na vida terrena.
Através do “eu”, o homem é capaz de dominar e purificar os seus
sentimentos, instintos e paixões, contrariando, pelo espírito, o que é meramente
anímico, sendo que a ética pressupõe esta dualidade. Assim, a evolução do homem
dá-se pelo aperfeiçoamento das suas faculdades anímicas, mentais e morais.
Conforme explicita Steiner (1998, p.27), atribuem-se três formas de
existência, ao corpo humano: “mineral” (é aparentado por tudo quanto é visível);
“vegetal” (com todos os seres quando e se reproduzem); “animal” (com todos os
que percebem o mundo circundante e têm experiências interiores baseadas em
impressões exteriores). No entanto, “devemos atribuir-lhe ainda uma quarta, a
caracteristicamente humana (...) o homem constitui, já mesmo do ponto de vista
corpóreo, um reino por si” (Idem, p.29).
Tudo o que percepcionamos, é sentido de forma diferente, através dos
nossos órgãos. A mais simples das sensações, pertence ao mundo interior, ou seja,
a natureza anímica do homem constitui a sua impressão sensorial. Deste modo, o
homem, apreende o mundo e confere-lhe uma impressão própria, subjectiva,
reagindo, posteriormente, sobre o mundo exterior, imprimindo-lhe a sua entidade
interior, pelos actos, pela vontade... Juntando-se, assim, um terceiro mundo, a
“alma”, cujo conceito foi defendido por Steiner (Ibidem), dizendo expressamente
que:
Se contrapõe ao mundo exterior com aquilo que é próprio do homem. Este recebe os impulsos do mundo exterior; e, de acordo com esses impulsos, constrói um mundo próprio. A corporalidade torna-se fundamento basilar do anímico (…) A
27
corporalidade torna-se fundamento basilar do anímico, embora o anímico do homem não é somente determinado pelo corpo.
Steiner (1997, p.26) ressalva a importância do ser humano, na medida em
que este:
Reflectindo sobre as percepções consegue conhecimentos sobre as coisas; reflectindo sobre as suas acções, introduz na sua vida uma coerência racional. E sabe que a sua missão de homem só é cumprida dignamente se, tanto no conhecer quanto no agir, ele se conduz por pensamentos correctos.
Como tal, o homem encerra em si uma dupla necessidade, estando sujeito às
leis do corpo/metabolismo, como necessidade natural, e às leis que conduzem ao
pensamento correcto, às quais ele se submete por si mesmo, aderindo, desta
forma, a uma ordem superior à do seu corpo, designada por espiritual. “O anímico é
tão diverso do espiritual quanto o corpóreo é do anímico” (Idem). O elemento
anímico constitui a base para o espiritual, tal como o corpóreo constitui a base para
o anímico.
De acordo com o exposto, defendido por Steiner e pelos seus discípulos
(Lanz, Karl König, entre outros), corpo, alma e espírito, embora interligados,
constituem campos de investigação diferentes, de importância relevante para a
compreensão do ser humano na sua completude.
3.2. Corpo, Alma e Espírito
O homem toma consciência de si próprio quando reflecte sobre a natureza
humana e a sua importância. O corpo humano tem uma estrutura adequada ao
pensar, sendo que o cérebro constitui o seu instrumento corpóreo. Assim, o homem
percepciona o mundo que o rodeia pelos sentidos corpóreos: visão; audição;
olfacto; gosto e tacto. Aquilo que existe no mundo exterior passa a existir
igualmente para o próprio ser como percepção, como sensação.
Steiner (1998, p.32) refere que “as manifestações da força vital, o homem
não as percebe pelos sentidos comuns; ele vê as cores das plantas, cheira-lhes o
perfume; mas a força vital esquiva-se a esta forma de observação”. Tal como o
cego não pode negar a existência das cores, também não é lícito aos sentidos
ordinários negar a força vital. As cores passam a existir para o cego nato quando
operado; similarmente passam a existir para o homem, também como percepção,
28
não já apenas os indivíduos mas as espécies de plantas e animais plasmadas pela
força vital uma vez descerrado nele o órgão correspondente (Ibidem). Abre-se,
então, ao homem um mundo vasto, em que da percepção das cores,
aromas,....passa a perceber a própria vida destes seres vivos, ou seja, além da
forma física, o homem passa a perceber a forma espiritual plena de vida das plantas
e animais.
A essa forma espiritual, Rudolf Steiner (Ibidem) apelidou de “corpo etérico ou
corpo vital, tratando-se de uma entidade real e autónoma, mercê da qual as
supramencionadas matérias e forças são dotadas de vida...O corpo vital é uma
entidade por meio da qual, a cada momento da vida, o corpo físico vai sendo
preservado da desagregação”.
A existência desse corpo “etérico” admite-se por motivos lógicos, porém,
pode ser visualizada com os olhos espirituais despertos, tal e qual como os olhos
físicos podem visualizar as cores. Através do corpo físico, o homem pertence ao
mundo mineral, através do corpo etérico, pertence ao mundo vital. O termo corpo
designa o que dá a forma a um ser, sem o reduzir apenas à sua forma corpórea
material, mas antes designando também aquilo que assume forma anímica e
espiritual. No entanto, o corpo etérico é ainda algo exterior ao homem. Apenas com
as sensações, o seu interior do homem responde aos estímulos do mundo exterior.
Deste modo, qualquer sensação recebida surge dentro da alma do receptor.
A sensação surge como resposta às impressões recebidas do meio, através
dessa actividade, realizando-se uma vivência interior, sendo que aquela se designa
como alma da sensação, a qual é tão real como o corpo físico. Tal como acontece
no “corpo etérico”, a visualização da “alma da sensação” é possível apenas com
olhos espirituais despertos, neste caso, mediante um órgão ainda mais elevado,
transformando-se num género especial de “sensações supra – sensíveis”. O
homem “vê” as sensações.
De acordo com o mentor desta filosofia – Steiner (1998) – , o homem só
conhece o mundo de sensações como experiências interiores, como as veladas
vivências próprias da sua alma; no entanto, uma vez abertos os chamados ‘olhos
espirituais‘, reluz ante a vista espiritual externa aquilo que ordinariamente só vive
‘no íntimo’ do outro ser.
No homem, entre os corpos físico e etérico, de um lado, e a alma da
sensação, de outro, interpõe-se outro componente especial da entidade humana: o
29
corpo anímico ou da sensação. Poder-se-á afirmar, então, que uma parte do corpo
etérico é menos densa que a outra, constituindo uma unidade como a alma da
sensação, enquanto a parte mais densa constitui uma espécie de unidade como
corpo físico. Todavia, a alma da sensação ultrapassa o corpo anímico,
estabelecendo uma interacção não somente com o corpo mas também com o
pensar, com o espírito. Ela é, primordialmente, servida pelo pensar. O homem
forma pensamentos sobre as suas sensações, esclarecendo-se sobre o mundo
exterior.
O pensamento presta serviços à alma da sensação, permitindo a criação
daquilo a que chamamos de civilização material. Enormes quantidades de energia
mental são direccionadas para dar resposta ás necessidades da alma da sensação.
O homem satisfaz os seus impulsos, desejos e paixões, através da reflexão e
pensamento.
Pelo pensar, o homem transcende-se, lançando-se acima da sua vida
própria. Para ele é evidente a convicção de que as leis do pensamento se
harmonizam com as leis do Universo sendo esta harmonia que permite que o
homem tome conhecimento da sua própria natureza.
Segundo Steiner (1998), na sua alma, o homem porfia pela verdade e,
através desta verdade, exprimem-se não somente a alma, mas também as coisas
do mundo. O que pelo pensar é reconhecido como verdade possui um significado
independente, relativo às coisas deste mundo, e não somente à própria alma.
Por outro lado, ao captar a verdade, a alma associa-se a algo a que é
intrínseco o próprio valor. Valor este que nem desaparece com a sensação da alma
nem teve origem nela. O que efectivamente à verdade não nasce nem perece;
possui um significado que jamais se pode anular.
Embora os pensamentos sejam formas perecíveis das verdades eternas, a
verdade existe por si mesma. Emerge, então, a chamada “alma da consciência”
para designar o que de eterno refulge dentro da alma, ou seja, entende-se por alma
da consciência o cerne da consciência humana; a alma dentro do intelecto, uma vez
que esta se entrosa com as sensações, impulsos, afectos,... ao passo que a outra
se desprende de todo e qualquer ressaido de semelhantes simpatias ou antipatias
dos sentimentos, etc. Ou seja, “a verdade é verdadeira, e é verdadeira mesmo
quando todos os sentimentos pessoais se levantam contra ela” (Idem, p.39). Deste
modo, a alma, pressupõe a existência de três componentes: alma da sensação;
30
alma do intelecto e alma da consciência. Tal como “a corporalidade actua por baixo,
exercendo sobre a alma uma acção limitadora, a espiritualidade actua por cima,
exercendo uma acção dilatada. Pois quanto mais a alma se enche de verdade e
bondade, tanto mais eterno nela ganha em amplitude” (Ibidem).
Para aqueles que “vêem”, o esplendor da alma é tão real como é real para os
olhos, a luz de uma chama. O vulto, que envolve o corpo físico como que numa
nuvem, designa-se por “aura humana”, a qual vem enriquecer a essência do
homem.
Tudo isto importa para que se possa compreender a evolução/noção do
homem, desde a nascença. No decorrer da evolução infantil, o homem experimenta,
pela primeira vez, o momento em que se sente como ser autónomo, perante todo o
resto do mundo. Verifica-se que quando as crianças falam de si mesmas mostram
que ainda não se tornaram conscientes da sua entidade autónoma ou seja, ainda
não nasceu nelas a consciência de si mesmas: “Ana quer isto. Ana é amiga”.
Pela autoconsciência o homem designa-se como um ser autónomo,
separado de tudo o mais, como “eu”.
No “eu” o homem encerra tudo quanto experimenta como entidade corpórea
e anímica. Corpo e alma são portadores do “eu”; neles é que o “eu” actua. Porém, o
“eu” como entidade genuína do homem, permanece totalmente invisível. Esse “eu”
é, de facto, o próprio homem, o que lhe permite considerar esse “eu” como sua
verdadeira entidade.
O “eu” vive no corpo e na alma, porém, o espírito vive no “eu” e aquilo que do
espírito existe no “eu” é eterno. Vive na alma, inundando-a e exteriorizando o seu
efeito sobre o corpo.
Tal como se verifica a manifestação do mundo corpóreo, pela chamada
sensação, também existe a manifestação do mundo espiritual, a qual é denominada
por intuição. O mais simples pensamento humano é munido de intuições.
No dizer de Steiner (1998, p.43) “pelas intuições, o ’eu’ do homem que
desponta na alma capta as mensagens do alto, do mundo espiritual do mesmo
modo como, por meio das sensações recebe as mensagens do mundo físico”.
Para o homem, o espiritual constitui o alimento eterno. O homem nasce do
espírito pelas eternas leis do verdadeiro e do bom, porém, acha-se separado do
mundo espiritual circundante, tal como, sendo ser autónomo, se encontra separado
de todo o mundo físico.
31
A esta identidade espiritual independente Steiner (Idem) chamou de “homem-
espírito”, o qual possui uma espécie de derme espiritual que o separa do mundo
espiritual homogéneo, que se expande de modo contínuo como progressivo
desenvolvimento do homem, para que a individualidade espiritual do homem (o seu
invólucro espiritual ou áurico) seja capaz de um crescimento ilimitado.
É dentro desse invólucro espiritual que vive o “homem-espírito”, o qual é
edificado pela força vital espiritual, à semelhança do que acontece ao corpo físico
que é edificado pela força vital física.
Então, a entidade espiritual do homem compõe-se por três partes: “homem-
espírito; espírito vital e personalidade espiritual”.
A “aura” humana, por seu lado, compõe-se de duas partes que se
interpenetram. A existência física do homem é que dá a uma delas a sua cor e a
sua forma, enquanto a outra as recebe da sua vida espiritual.
O “eu” marca a separação entre ambas, porque o físico tem a característica
de entregar-se e constituir um corpo capaz de fazer despontar dentro se si uma
alma; e o “eu” presta-se a fazer surgir em si o espírito que, por sua vez, permeia a
alma, apontando-lhe a sua meta no mundo espiritual.
Concluindo, o “homem-espírito” encontra-se unido à “alma da consciência”,
do mesmo modo como o “corpo físico” se encontra ligado à “alma da sensação” no
“corpo anímico”. A “alma da consciência” e a “personalidade espiritual” formam uma
unidade.
A constituição do homem na sua completude, de acordo com Steiner (Ibidem,
p.48), pode-se resumir tipologicamente, da seguinte forma, no quadro 02:
Quadro 02 – Constituição do Homem - Tipologia de Steiner
Tipologia 1 Tipologia 2 Tipologia 3
A – Corpo Físico
B – Corpo Etérico ou Vital
C – Corpo Anímico
D – Alma da Sensação
E – Alma do Intelecto
F – Alma da Consciência
G – Personalidade Espiritual
H – Espírito Vital
I – Homem – Espírito
1- Corpo físico
2- Corpo Vital (ou etérico)
3- Corpo Astral
4- Eu, como cerne da alma
5- Personalidade espiritual, como corpo astral transformado
6- Espírito vital, como corpo vital transformado
7- Homem-espírito, como corpo físico transformado
- O corpo físico (fornece a matéria que permite que o homem participe no mundo físico)
- O corpo etérico (dá a vida ao homem e fornece o instrumento para o pensamento, a memória e outras faculdades)
- O corpo astral (o qual recebe os impulsos e impressões dos mundos físico e superiores. Com ele, o homem reage, pensa e entra em intercâmbio com a realidade)
- O eu (o indivíduo; o centro do seu ser)
Fonte: Adaptado de Steiner (1998)
32
As tipologias referenciadas e toda a contextualização anteriormente
desenvolvida, ajudarão a compreender melhor a pedagogia que Rudolf Steiner cria
e a importância que ele atribui ao conhecimento profundo do Ser. Deste modo, para
se conseguir perceber as indicações de Rudolf Steiner no que concerne à
Educação é premente que se considere a forma como ele concebia o Homem.
3.3. O Eu Humano
O Homem é detentor de um “eu”. Porém, só chegou ao seu “eu” actual
gradualmente. Primeiro, tal como os animais, ele possuía uma “alma grupal”,
posteriormente foi-se desenvolvendo a “alma individual”.
A “alma grupal” é sábia. No animal, o amor é individual mas a organização
sábia, a sabedoria do “eu grupal” ainda é vazia de amor. O Homem tem amor e
sabedoria unificados, enquanto que o animal tem amor na vida física, mas
sabedoria no plano astral. Assim sendo, as almas grupais dos animais estão
continuamente em movimento circular, em todas as alturas e direcções, em torno da
Terra. Elas são muito sábias mas falta-lhes algo, elas não conhecem o amor tal
como é chamado na Terra. Amor ligado à sabedoria só existe no homem, na
individualidade (Steiner, p.2007).
O Homem apresenta uma disposição própria para desenvolver a alma
individual. Cada vez mais, o homem se vai individualizando, desligando-se da alma
grupal que outrora era conduzida por entidades superiores, ficando, agora, entregue
à sua própria direcção, individualizando-se cada vez mais, pelo que as uniões entre
os homens têm vindo a dissipar-se. Antigamente, elas existias por meio por meio da
consanguinidade, das tribos e raças, porém, actualmente, o individualismo é
exarcebado, chegando-se ao ponto de cada um ter a sua própria religião, de
considerar a sua própria opinião como o ideal mais elevado, verificando-se, então, a
insustentabilidade das uniões espirituais. No entanto, quando os homens se unem
numa sabedoria superior, desce, de mundos superiores, uma alma grupal. Segundo
os antropósofos, os homens enriquecerão a vida terrena ao desenvolver algo que
faça descer estas entidades espirituais dos mundos superiores, sendo este o
objectivo da movimento da Ciência Espiritual. Por outro lado, se o homem se
desligar do espírito colectivo, tornar-se-á num ser elementar, pelo que, ainda à luz
33
da Ciência Espiritual, a humanidade precisa de procurar formas de actuação para
que as entidades superiores se inclinem para baixo, estabelecendo-se, assim,
relações vivas com as forças e entidades dos mundos superiores (Steiner, p.1998).
4. O Homem em relação com o Universo
A vida humana é uma constante oscilação entre a convivência com o devir
universal e ser individual. Conforme diz Steiner (2000, p.73), “o meu sujeito é uma
parte do mundo e é permeado por seu constante devir. Para o meu perceber estou
constantemente confinado aos limites da derme do meu corpo, mas o que está
dentro dessa derme pertence ao universo como um todo”.
Do ponto de vista anímico-corpóreo, o homem terrestre é uma entidade
tríplice: um ser pensante, um ser sensível e um ser volitivo. Focalizando tudo o que
se acha no âmbito do pensar, do sentir e do querer, abrange-se toda a medida da
participação do ser humano na vida da Terra. A natureza pensante proporciona ao
Homem a plena clareza acerca do mundo. O sentimento, que aparece como
obscuro e indefinido, frente ao pensar lúcido, e a vontade, que emana das
profundezas do ser, são inatingíveis para a observação comum. Assim, o querer
(vontade) aparece como o que há de mais inconsciente durante o nosso estado de
vigília, permanecendo, durante a actividade desperta, totalmente na escuridão e o
que se passa no querer partindo do pensar é análogo ao que ocorre entre o
adormecer e o acordar (Steiner, 1997, p.28).
O sentir está colocado entre o querer e o pensar, entre a vontade e a
representação, assumindo o carácter de uma representação indefinida e caótica, ou
seja, é um “sonhar acordado da alma”. Assim, do despertar ao adormecer, o
Homem abre-se ao mundo que o rodeia, permitindo que impressões sensórias
advenham, as quais se combinam com as representações mentais, chegando e
partindo, e deixando na alma as representações que paulatinamente se
transformam em recordações. Alguns autores, que praticam auto-observações,
constatam que muitas visões místicas a nada mais remontam senão a experiências
exteriores que se transformam com o tempo. Porém, Steiner defende não ser bom
buscar representações nas recordações, dado que todas as nossas representações
34
são acompanhadas de inúmeras impressões indefinidas, que poderão originar,
também, a busca de pensamentos passivos (Ibidem).
Steiner considera premente que o Homem aprenda a buscar pensamentos
activos através de exercícios meditativos, no sentido de uma autêntica actividade
interior, adjacente à vontade no âmbito do pensar, de forma a alcançar a evolução
do ser, a qual dependerá, segundo ele, da natureza da própria pessoa. Nesta
aprendizagem, seguindo o método da meditação, da evolução utilizando exercícios
específicos, segundo os antropósofos, o indivíduo transforma-se num ser totalmente
diferente, transformando o pensamento, aproximando-se da verdadeira essência do
que é. Assim, encontrar-se-á com maior nitidez, com o que chamam de mundo
espiritual ou supra-sensível, permitindo que os mundos físico e supra-sensível se
interpenetram constantemente. Se o Homem pudesse consciencializar-se das suas
vivências, teria a sensação de que o Universo pronuncia um veredicto a respeito do
que ele é devido aos seus actos bons e maus, e poderá sentir-se em sintonia com o
Cosmos através do seu próprio valor humano (Steiner, 1998).
Estudos de Hemleben (1989), sobre Steiner, revelam que este honrava o
Oriente, embora não esperasse dele uma solução dos problemas do Ocidente. Nos
nossos dias, a crescente oferta de sabedoria oriental (actividades físicas, como o
ioga, taichi, entre outras, bem como medicinas alternativas, como, por exemplo, a
acupunctura, osteopatia) representa, para o ocidental, o reconhecimento da
profundidade espiritualidade que almejam atingir. Desde tempos remotos que o
homem oriental é conhecido por experimentar o mundo em si mesmo (realidade
auto-criadora). O homem do Ocidente, por outro lado, fala do mundo das ideias, da
da aparência em que vive, e só de forma vaga, do que sente em saturada realidade,
com os seus sentidos como Natureza (realidade auto-suportada). Steiner considera
que se o oriental moderno encontrar na sua realidade espiritual a força para dar o
poder existencial e se o ocidental encontrar na sua realidade de natureza a vida
para descobrir na sua ideologia o espírito actuante, então chegará a haver
entendimento entre Ocidente e Oriente. O mesmo autor entende que o oriental não
possui um senso para o processo de “provar”. Ele experimenta contemplativamente
o conteúdo das suas verdades, e assim as conhece – o que se sabe não se prova.
O ocidental é, por tradição histórica e cultural, mais positivista, exige “provas”para
tudo. Ele alcança pensando o conteúdo das suas verdades, a partir da aparência
35
externa, e assim as interpreta (Steiner, 1998). Myong Won Suhr (1996, p. 227-228)
acrescenta:
Só compreendendo a lógica, o pensamento crítico e a curiosidade do Ocidente pelo desconhecido, os seus métodos experimentais para descobrir a verdade e a sua maneira objectiva de encarar os problemas é que poderemos apreciar a sua cultura. Embora no Oriente se cultive uma ideia contrária a este respeito, não é difícil encontrar, na cultura ocidental, abundantes exemplos do amor puramente desinteressado dos ocidentais à verdade (em especial à verdade científica), à ética e à lógica.
Assim, tendo em conta o referenciado, torna-se premente a compreensão
mútua entre Ocidente e Oriente a qual se tornará um factor relevante de
desenvolvimento cultural, assim como de prosperidade económica em todo o
mundo. Graças a isso, e por intermédio das organizações de cooperação com o
Ocidente, as nações do Oriente poderão contribuir, por sua vez, para a paz mundial
e para uma prosperidade partilhada com os seus vizinhos mais próximos. “Quer se
queira quer não, os povos do mundo têm de viver juntos. Todos devemos estar
conscientes disso e educar os futuros cidadãos do mundo nessa perspectiva”
(Idem).
Como consciente e responsável, o Homem possui o destino, ou parte dele,
nas suas mãos. Steiner, seguindo este lema, considera premente que a
Humanidade desenvolva, cada vez mais, o seu “eu”, a sua consciência, o seu “livre-
arbítrio”; que conheça, ame e domine a Terra, de acordo com o eticamente correcto.
Afirmar a autoconsciência da humanidade é, ao mesmo tempo, espiritualizá-la.
Actualmente a ciência e a tecnologia predominam em todas as áreas da vida e do
pensamento. No lema de Steiner (Idem), muitas actividades do homem actual
fazem-no esquecer que ele não é apenas um ser económico, político ou social, mas
também anímico e espiritual, revelando, como exemplo, a racionalização do
trabalho, que deveria ter por objecto libertar o homem da escravidão, dando-lhe o
tempo e as forças necessárias para que pudesse dedicar-se a actividades
superiores que visassem o seu verdadeiro bem-estar, tornando-se mais digno e
mais consciente das suas tarefas, aspirando a realizar valores novos e elevados.
Porém, quando pensa economizar tempo para si mesmo, o homem, antes procura
“matá-lo”, conforme tão bem se diz na linguagem do senso comum.
Deste modo, o próprio lazer/passatempo são subestimados, por, muitas
vezes, não serem utilizados de forma útil e correcta ao desenvolvimento do “eu”:
36
Tomado pelo pânico de ficar a sós consigo mesmo, de ter de concentrar o seu espírito em algo mais elevado, ele refugia-se nos passatempos: rádio; televisão; revistas, leituras superficiais de livros “cativantes”, festas, narcóticos, … Esquecer e fugir de si próprio, eis o lema de ser da indústria de passatempos, uma das maiores vergonhas da humanidade que tem por finalidade tornar o homem inconsciente ou semi-inconsciente, alienando-o da sua tarefa principal… uma geração inteira que se afunda na alienação de si mesma. (Lanz, 2002, p. 71)
O mesmo autor (Ibidem) considera como “diabólico” que as crianças sejam
inundadas, desde o nascimento, pelo “benefício” dessa indústria, perguntando-se
como poderá ser possível haver uma geração de homens maduros e conscientes
provenientes de crianças viciadas desde o berço. Tal como a televisão, também a
propaganda, sob todas as suas formas, constitui um atentado à consciência,
apelando habilmente aos instintos menos elevados – cobiça, vaidade, egoísmo,
sensualismo –, fazendo-o de modo sub-reptício, dirigindo-se ao subconsciente,
quando não trabalha traiçoeiramente com efeitos sublimares, num tempo em que
cada vez mais o homem deveria estar mais lúcido e consciente em todos os seus
pensamentos e decisões.
O homem moderno, é atraído pelos extremos do materialismo e da
abstracção, por um lado, e da embriaguez e da inconsciência da sua vida emotiva
por outro, faltando-lhe o ponto de equilíbrio. Segundo Steiner (1924), no nosso
planeta verifica-se nitidamente a polaridade existente entre Ocidente e Oriente,
constatando-se que o mundo oriental se caracteriza pelas emoções, pelo espírito de
comunidade (em detrimento do eu individual) e pelo idealismo extático, enquanto o
mundo ocidental é dominado pelo intelecto, pelo individualismo extremo (muitas
vezes em detrimento do amor ao próximo) e pelo utilitarismo.
A Antroposofia visa fomentar esta consciência no homem e despertá-lo para
as consequências de determinadas actuações, de forma a poder intervir no mundo
de maneira responsável e consciente, bem como evoluir dignamente, participando
activamente nesse processo.
Nanzhao (1996, p.231) reforça a ideia de Steiner, quando refere como uma
das características culturais que favorecem o desenvolvimento da educação e da
economia na Ásia, a “importância dada à dimensão espiritual do desenvolvimento,
mais do que a dimensão material (…) Em toda a região prevalece a ideia de que a
37
educação não pode abstrair dos valores, nem o futuro se compreende a não ser
através de um projecto implícito de ordem moral”.
Suhr (1996, p.228) remata, afirmando “o nosso tesouro comum de sabedoria
e de experiência pode levar-nos – e levará concerteza – a encontrar os meios de
aumentar o nosso bem-estar espiritual e material e de vivermos juntos em
harmonia”.
39
Capitulo II – EDUCAÇÃO E PEDAGOGIA WALDORF
1. A Arte da Educação, segundo Rudolf Steiner
Steiner reforça a importância da criação de uma pedagogia baseada na
Ciência Espiritual de orientação antroposófica, como uma necessidade premente da
sociedade ocidental actual. Pensar a educação de crianças e jovens pressupõe,
segundo Steiner (1997, p.12) “ter sempre em mente o facto de estarmos a plasmar
os sentimentos, as representações mentais e os impulsos volitivos da próxima
geração”, bem como estar cônscios de que nos cabe, a partir da época presente,
preparar a próxima geração para determinadas tarefas que devem ser realizadas no
futuro da humanidade, sendo que a sociedade actual, segundo o mesmo autor
(Idem), chegou a um ponto calamitoso porque se fez totalmente dependente da
forma específica como o homem ocidental costuma formar representações mentais
e sensações.
Steiner referencia as ideias do pedagogo Herbert Spencer (1884) como
explicação para a origem de tudo o que em matéria de pedagogia se encontra
sensato na Europa Central. Assim, considera-se que o ensino baseado na
observação deveria ser ministrado de forma a passar directamente às investigações
e pesquisas do cientista, ou seja, deveríamos ensinar as crianças de maneira tal
que, ao tornarem-se adultas e terem oportunidade de continuar o que houvesse
recebido na escola a respeito dos minerais, vegetais, animais, etc., elas pudessem
vir a ser autênticos cientistas ou filósofos.
De facto, muitas vezes, isso é contestado, porém, na prática, é costume
assumir-se a atitude descrita. Assim se age, quando se utilizam os livros didácticos
redigidos com esse intuito, não havendo procedimentos instituídos para modificar
ou abolir esses livros. Dever-se-ia almejar, de acordo com Steiner, exactamente o
oposto ao que Spencer considera como sendo princípio pedagógico actual:
Não podemos imaginar, no ensino das quatro primeiras séries, erro maior do que educar os alunos de acordo com um método de ensino em que uma matéria – por exemplo relativa a plantas e animais – possa ser continuada de maneira a, mais tarde, fazer do aluno um botânico ou um zoólogo. Ao contrário, atinge-se algo bem mais correcto do que o princípio de Spencer ao ministrar, sobre plantas e animais, um ensino que
40
evite as crianças de se transformarem em botânicos ou zoólogos…ninguém deveria tornar-se botânico ou zoólogo pelo que aprende no primeiro grau, e sim pela sua inclinação particular, que se manifestaria no decorrer da vida por meio da selecção no âmbito de uma arte pedagógica correcta… Essa escolha deverá também levar em conta o carma predeterminado, a lei do destino.(Steiner, 1997, p. 14).
Como tal, a arte pedagógica, de acordo com Steiner (1997) deveria partir da
vida e não de um pensamento científico abstracto. Só assim, segundo ele,
acontecerá uma efectiva melhoria social, a qual passa pela suficiente compreensão
da trimembração do organismo social dos povos ocidentais – concepção sociológica
de Steiner pela qual se reconhecem três áreas interagentes no organismo social: a
cultural-espiritual; a jurídico-administrativa e a económica. A arte pedagógica que
referencia deve ser erigida sobre uma autêntica sintonização dos sentimentos do
educador com a natureza infantil e basear-se, em sentido amplo, no conhecimento
do ser humano em desenvolvimento:
O professor necessita de uma verdadeira compreensão do que o homem realmente é e do que vem a ser enquanto se desenvolve no decorrer da infância… Naturalmente não poderemos educar ou leccionar se, ao fazê-lo, de certo modo não formos capazes de captar em espírito o ser global. (Steiner, 1987, pp. 18-25)
A questão pedagógica assume, actualmente, um papel relevante no que
respeita às questões humanas gerais, devendo ter, cada vez mais, um grande
significado social, a qual só chegará a isso se for concebida dessa forma, pelos
próprios professores. Na Pedagogia Waldorf a identificação do temperamento
predominante em cada aluno é fundamental para que se possa actuar no sentido do
seu equilíbrio. Além destes, outros elementos da entidade humana, segundo a
Antroposofia, são estudados pelos professores que desejam actuar nestas escolas.
De relevar que o estudo antroposófico considera que o Homem tem doze sentidos,
diferenciados no seu contexto: tacto, vida, movimento, equilíbrio, olfacto, paladar,
visão, calor (ou sentido térmico), audição, palavra, pensar e o “eu” (Steiner, 2007).
Steiner detalha cada uma das doze formas do Homem se relacionar com o
mundo e consigo mesmo e apresenta o estudo antroposófico sobre os sete
processos vitais que são a respiração, o aquecimento, a alimentação, a
segregação, a manutenção, o crescimento e a reprodução. Além dos quatro corpos,
dos temperamentos e dos doze sentidos, percebe que existem marcos na vida
humana que aparecem aproximadamente de sete em sete anos. A estes marcos
41
Steiner (2001) deu o nome de seténios, remontando à antiga cultura Grega em que
também se concebia uma divisão da vida humana em dez períodos de sete anos.
Não obstante, nos estudos de Steiner, o mesmo redigiu um relatório detalhado dos
acontecimentos físicos, anímicos e espirituais aos quais o Homem tende em cada
uma destas fases e, construiu um grande número de indicações pedagógicas
baseadas nessa teoria que, até os vinte e um anos, apresenta uma relação muito
intrínseca ao amadurecimento da qualidade quadrimembrada do ser humano. Deste
modo, a Antroposofia, enuncia que quando nascemos como seres humanos, já
possuímos os quatro corpos ou membros dos quais somos constituídos, entretanto,
cada corpo vai sendo liberado com o desenvolvimento humano, colocando à
disposição deste, novas possibilidades que estavam latentes (Steiner, 1997).
De acordo com o anteriormente referenciado, a educação passa por toda a
problemática ligada à prática pedagógica e em muito se deve aos profissionais
educativos a ela inerentes, dos quais se destaca a importância do papel do
professor que assume especial relevância no processo educativo. O sistema
pedagógico defendido por Steiner (Ibidem) procura basear-se numa observação
íntima do “ser criança” e das condições necessárias ao desenvolvimento infantil.
Sem esse conhecimento, o conteúdo da pedagogia por ele defendida (Pedagogia
Waldorf) e os princípios base que a sustenta (Antroposofia) não pode ser
compreendido.
Importa, então, compreender o contexto mais amplo e mais complexo da
cosmovisão que constitui o envoltório ao próprio conteúdo da Pedagogia Waldorf e
de tudo o inerente à mesma, como resposta às necessidades educacionais da
humanidade nos dias que correm e, em particular, do próprio Homem.
1.1. A evolução do ser humano, desde a infância, numa perspectiva
educacional.
Relativamente a este ponto, Steiner (1997) afirmou ser necessário discernir
as causas íntimas que agem actualmente na natureza humana, afim de integrar o
ser humano correctamente na vida social, como ser formado de corpo, alma e
espírito, acrescentando que não poderemos educar ou leccionar se, ao fazê-lo, de
certo modo não formos capazes de captar em espírito o ser humano global – pois
42
na época do desenvolvimento da criança esse ser humano global é ainda muito
mais importante do que mais tarde.
Como se viu anteriormente, esse ser humano global inclui o “eu, o corpo
astral, o corpo etérico e o corpo físico”. Esses quatro membros da natureza humana
não se acham desenvolvidos de maneira uniforme; eles desenvolvem-se das mais
diversas formas. Assim, as manifestações exteriores desse desenvolvimento
diferenciado aparecem ao longo do desenvolvimento do individuo, começando na
criança.
A questão do desenvolvimento evolutivo da criança é um princípio abordado
por várias correntes que opinam diferentemente. Uns há que defendem que o
homem se trata de uma espécie de recipiente vazio, uma “black box” na qual basta
introduzir uma série de estímulos, de solicitações, para se ter, de uma forma mais
ou menos automática e necessária, modificações do seu comportamento, sendo
que para os comportamentalistas, o ser do homem reduz-se a comportar-se.
Porém, os evolucionistas, como Piaget e os seus discípulos (1989), realizaram
estudos acerca do desabrochar da personalidade infantil e manifestações anímico-
mentais, reunindo uma quantidade de factos empíricos que comprovam a teoria que
defendem. No entanto, ao contrário da Antroposofia, não conseguiram observar,
com os recursos e métodos de que dispunham, o autêntico ser anímico-espiritual,
barrando-lhes o porquê dos fenómenos que observavam.
Segundo Lanz (2000, p.35), “para quem admite a realidade dos membros
supra-sensíveis, os factos empíricos coadunam harmoniosamente, pois constituem
projecções de um processo íntimo de desenvolvimento físico-espiritual que só a
Antroposofia descreve de forma completa”. Assim, o mesmo autor (Ibidem) defende
que a evolução da criança e do adolescente surge como efeito de uma lei, segundo
a qual, a própria constelação dos membros superiores da personalidade sofre, na
infância, transformações que, de certa forma, lembram as modificações sofridas
pelo homem, na sua evolução histórica, tratando-se de algo como a lei biogenética,
postulada pelo cientista-naturista alemão Ernest Haeckel (1990), para o
desenvolvimento do embrião.
Para Lanz (2000) não se pode, evidentemente, equiparar pura e
simplesmente a mentalidade de sociedades primitivas ou extintas com as da
criança, mas certos paralelos existem. Eles indicam que a infância e a juventude
aparecem como um processo de encarnação, como uma ‘descida’, um caminho que
43
conduz o homem da inconsciência à consciência. Deste modo, Steiner defende que
a vida humana não decorre de forma linear, mas em ciclos de aproximadamente
sete anos, sendo que a cada um desses ciclos desenvolve um determinado
membro da entidade humana, de maneira mais pronunciada, em que a
personalidade (o “eu”) ‘vive’ principalmente nesse membro.
A divisão em seténios pode ser observada durante a vida inteira, porém,
comummente, a educação limita-se aos primeiros vinte e um anos de vida, ou seja,
aos três primeiros seténios.
Nos primeiros sete anos, o homem já possui os quatro membros (os corpos
físico, etérico, astral e o eu), sendo que durante este tempo permanece envolvido
num processo de amadurecimento, durante o qual plasma intensamente o corpo
físico. Terminado o processo desses sete anos, o corpo etérico é libertado das suas
amarras (ligação com as forças etéricas universais), nasce e torna-se autónomo.
Esse término do seu trabalho plasmador sobre o corpo físico manifesta-se
exteriormente pela expulsão dos dentes de leite e pela formação da dentição
definitiva. Assim, é no momento, aproximado, dos sete anos de idade (com o
nascimento do corpo etérico) que novas forças (memória e raciocínio) estão
disponíveis para novas funções, sendo esta fase a que marca a entrada da criança
para a maturidade escolar. Segundo Lanz (Ibidem) a personalidade da criança
“desabrocha como centro de sentimentos e emoções; o pensar e o sentir dirigem-
se, sempre permeado de sentimentos, para o mundo; a memória desenvolve-se e
permite a assimilação de uma quantidade fabulosa de conhecimentos”.
É na idade escolar, entre os sete e os catorze anos, que se forma a
individualidade sentimental do jovem, até ao momento em que, por volta dos
catorze anos, o corpo astral, plenamente desenvolvido, torna-se autónomo, por sua
vez – trata-se da fase da puberdade, época de mudanças não menos incisivas.
Menos aparente é a evolução durante o terceiro seténio. Nesta fase, o
indivíduo, mais interiorizado e retraído, vive numa crise entre as forças do eu, que
se manifesta cada vez mais, e as forças anímica já existentes. O adolescente entra
em choque com o mundo exterior; nada escapa ao seu espírito crítico e ao seu
raciocínio (Steiner, 1999).
Segundo Lanz (2000, p.39):
É o eu que se desenvolve nessa luta penosa e turbulenta até alcançar uma certa maturidade intelectual e moral, ao redor dos 21 anos, idade em que as leis vigentes normalmente
44
conferem ao jovem o exercício dos direitos do cidadão, dando-lhe plena responsabilidade civil e criminal, assim como a qualidade de eleitor na maioria dos países democráticos.
No entanto, no ordenamento jurídico português e, globalmente, no mundo
ocidental, esta exigência aos jovens, acontece logo a partir dos dezoito anos.
Resumidamente, são considerados quatro nascimentos: o do corpo físico, ao
nascer; o do corpo etérico aos sete anos (escolaridade); o do corpo astral aos
catorze anos (puberdade) e o do eu aos vinte e um anos (maturidade). Porém, cada
um destes períodos de sete anos tem subdivisões menos visíveis, em que também
importantes mudanças se realizam.
A formação e desenvolvimento da consciência moral, foi objecto no século
XX, de importantes estudos, nomeadamente por Jean Piaget (Quadro 03) e
Lawrence Kohlberg (Quadro 04).
Quadro 03 – Estádios do Desenvolvimento Moral de Jean Piaget
Jean Piaget
A moralidade desenvolve-se paralelamente à inteligência, e há um progresso que vai da heteronomia à autonomia moral.
1ª.Etapa: Moral de Obrigação-heteronomia (entre os 2 e os 6 anos): a criança vive numa atitude unilateral de respeito absoluto com os mais velhos. As normas são totalmente exteriores à criança. 2ª. Etapa: Moral da Solidariedade entre iguais (entre os 7 e os 11 anos): O respeito unilateral é substituído pelo mútuo e a noção de igualdade entre todos. As normas aplicam-se de uma forma rígida. 3ª. Etapa: Moral de equidade-autonomia (a partir dos 12 anos): aparece o altruísmo, o interesse pelo outro e a compaixão. A moral torna-se autónoma. O respeito pelas normas colectivas faz-se de um modo pessoal.
Fonte: Adaptado de Piaget (1989)
45
Quadro 04 – Estádios do Desenvolvimento Moral de Kohlberg
L. Kohlberg
A consciência moral forma-se através de sucessivas adaptações do conhecimento às fases da aprendizagem social. Kohlberg identificou três níveis de desenvolvimento moral, sendo cada um deles caracterizado pelas considerações que o sujeito faz sobre questões no âmbito da justiça, tais como: a) a igualdade em termos de direitos e deveres e a extensão dos mesmos; b) a relatividade ou universalidade da justiça; c) as atenuantes ou agravantes em relação na concretização destes direitos e deveres; etc.
− Nível Pré-convencional (pré-moral): As normas sobre o que é bom ou mau são respeitadas atendendo às suas consequências (prémio ou castigo) e ao poder físico dos que as estabelecem.
− Nível Convencional: Vive-se identificado com um grupo e procura-se cumprir bem o próprio papel, respondendo às expectativas dos outros, mantendo a ordem estabelecida (a ordem convencional).
− Nível Pós-convencional (autónomo ou de princípios): Há um esforço para definir valores e princípios de validade universal, isto é, acima das convenções sociais e das pessoas que são autoridade nos grupos. O valor moral reside na conformidade com esses princípios, direitos e deveres que podem ser universais.
Fonte: Adaptado de Kohlberg (1975)
De entre as teorias do desenvolvimento cognitivo sobressai a teoria do
desenvolvimento moral de Kohlberg. A qual, inscrevendo-se num quadro teórico do
construtivismo de Piaget (Quadro 03), desenvolve três tipos diferentes de relação
entre o sujeito, as regras e as expectativas da sociedade. Com diferentes métodos
de análise de dados, elaborados ao longo de anos, Kohlberg distinguiu três grandes
níveis do desenvolvimento moral, cada um composto de dois estádios. O quadro 05
exemplificará melhor.
Quadro 05 – Estádios e Níveis do Desenvolvimento Moral de Kohlberg
Níveis
Estádios
I – Nível da Moralidade Pré-convencional
1 – Orientação Punitiva e obediência à autoridade.
2 – Orientação ingenuamente hedónica e instrumental.
II – Nível da Moralidade Convencional
3 – A orientação em função das relações interpessoais ou a moralidade do “tipo simpático” ou “bom rapaz”.
4 – Moralidade da autoridade e da manutenção social.
III – Nível da moralidade pós-convencional, da autonomia e dos princípios morais pessoais
5 – A moralidade do contrato social, dos direitos individuais e da lei democraticamente aceite.
6 – A orientação dos princípios éticos universais.
Fonte: Adaptado de Kohlberg (1975)
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O pensamento de Lawrence Kohlberg (1975) foi influenciado pelas ideias
iniciais de John Dewey (1916) e pela "teoria dos estádios" de Jean Piaget (1989).
Existem três ideias fundamentais na teoria de Kohlberg, que são a de
"Organização estrutural", "Sequência de desenvolvimento" e Interaccionismo".
"Organização estrutural", ao considerar que o modo como uma pessoa analisa e
interpreta os dados e toma decisões sobre problemas pessoais e sociais são um
elemento de crucial importância no desenvolvimento. "Sequência de
desenvolvimento", ao considerar que o desenvolvimento se processa de modo a ser
possível caracterizá-lo por estádios e que a progressão nestes é sequencial e
invariante. "Interaccionismo" refere-se ao processo como a estrutura cognitiva se
desenvolve, isto é, pela forma como a estrutura cognitiva se remodela para dar
sentido às novas experiências.
A abordagem chama-se cognitiva porque considera que a educação moral
tem as suas bases no pensamento activo do indivíduo e desenvolvimentista porque
vê o objectivo da educação moral como um movimento através de estádios morais.
Dewey tinha já considerado três níveis de desenvolvimento moral: 1) O nível
pré-moral ou pré-convencional em que o comportamento é motivado por impulsos
biológicos e sociais; 2) O nível convencional em que se aceitam as normas do
grupo; 3) O nível autónomo em que a conduta é guiada pela reflexão individual
sobre o que é bem.
Posteriormente, Piaget (1989) avançou também com a sua definição de
estádios do raciocínio moral da criança, a que chegou ao observar crianças a jogar
e ao entrevistá-las sobre as regras dos seus jogos, chamando-lhe estádios: 1) O
estádio pré-moral onde não há sentido de obrigação às regras; 2) O estádio
heterónimo onde há obrigação às regras e submissão ao poder e ao castigo; 3) O
estádio autónomo onde são considerados os fins e as consequências das regras e
a obrigação é baseada na reciprocidade e troca.
Assim, no âmbito educativo, deverá ter-se presente que, qualquer pedagogia,
lida com pessoas, seres humanos, em diferentes níveis de evolução ou de
maturidade, pelo que a sua adaptação, diversidade e respeito pelos níveis de
desenvolvimento, e por cada pessoa, na sua diferença particular, deverá ser uma
preocupação e uma realidade.
47
O acto educativo, sendo de carácter eminentemente pragmático não poderá
deixar de ter como suporte um elevado contexto teórico-documental, aliado à
situação concreta de cada aluno.
Foi a partir de 1955 que Kohlberg (1975) começou a definir e a validar,
através de estudos longitudinais e entre culturas diferentes, os níveis e estádios de
Dewey e Piaget. Estádios, em Piaget e Kohlberg, são sistemas estruturados que
formam uma sequência invariante em todas as condições, salvo em situações de
trauma, e são integrações hierárquicas, isto é, pensar num estádio superior
compreende o ser capaz de pensar em estádios inferiores.
Kohlberg (1975) identificou três níveis de desenvolvimento moral, cada um
dos quais subdividido em dois estádios, fazendo um total de seis estádios, conforme
foram descritos.
Uma questão importante a salientar é a de que os estádios morais são
estruturas de raciocínio moral e não de conteúdo moral, isto é, ao ser-se
confrontado com um dilema não importam tanto as escolhas que são feitas, mas o
tipo de raciocínio aduzido, para fazer não importa qual escolha.
Naturalmente, coloca-se a questão da relação entre o juízo moral e a acção
moral. Para Kohlberg (Idem), tal como o raciocínio lógico é condição necessária,
mas não suficiente para um juízo moral elevado, também um juízo moral maduro é
condição necessária mas não suficiente para uma acção moral madura. Pelo
contrário, pode-se racionar em termos de princípios e não se viver de acordo com
esses princípios, embora a probabilidade de o fazer seja maior.
2. A Pedagogia Waldorf
A Pedagogia Waldorf é um dos desenvolvimentos das teorias de Rudolf
Steiner, além da medicina antroposófica e da agricultura biodinâmica.
Introduzida por Rudolf Steiner em 1919, em Stuttgart, Alemanha, uma das
principais características da pedagogia é o embasamento na concepção de
desenvolvimento do ser humano, criada pelo próprio Rudolf Steiner, que leva em
conta as diferentes características das crianças e jovens, segundo sua idade
aproximada. Um mesmo assunto é abordado várias vezes durante o ciclo escolar,
48
mas nunca da mesma maneira, e sempre respeitando a capacidade de
compreensão da criança (Lanz, 2000).
Para atingir a formação do ser humano, a pedagogia actua no
desenvolvimento físico, anímico e espiritual do aluno, incentivando o querer (agir)
através meio da actividade corpórea das crianças em quase todas as aulas. O sentir
é estimulado na constante abordagem artística e nas actividades artesanais
específicas para cada idade. O pensar é cultivado paulatinamente, desde a
imaginação incentivada pelos contos, lendas e mitos – no início da escolaridade –,
até o pensar abstracto rigorosamente científico do Ensino Médio - colegial (Idem).
Uma das características marcantes da Pedagogia Waldorf em relação aos
outros métodos de ensino é o facto de não se exigir ou cultivar precocemente no
aluno o pensar abstracto (intelectual).
Almeja-se que todas as aulas sejam uma preparação para a vida real.
Procura-se desenvolver nos jovens as qualidades necessárias para que eles
saibam lidar e principalmente florescer neste mundo de constantes e velozes
mudanças, com criatividade, flexibilidade, responsabilidade e capacidade de
questionar.
O jovem, cada vez mais, precisa de ser articulado e capaz de se comunicar,
tanto abrindo-se para o que os outros têm a dizer como encontrando o caminho
certo para colocar os seus pensamentos no mundo. Por isso, a Pedagogia Waldorf
permanece revolucionária até os dias de hoje. Mas poucos sabem sobre ela e têm
acesso à sua história.
Assim, Waldorf é o nome da fábrica de cigarros, onde se criou a primeira
escola no âmbito desta pedagogia de ensino. Apesar de ser considerado, conforme
afirma Lanz (2000) o maior movimento pedagógico do mundo, poucas têm sido as
crianças com acesso à pedagogia Waldorf que, primeiramente, vê a criança como
ser pensante e artístico e só depois como ser actuante. É no sentido da liberdade
que Rudolf Steiner (1984) introduz, no princípio do século XX, a Pedagogia Waldorf,
que procura passar o conhecimento às crianças, primeiro através da experiência e
só depois através do conceito. Estava-se na Alemanha do Pós Primeira Guerra
Mundial e o caos social e económico alimentava as mentes criativas na busca de
soluções que fizessem renascer a Europa.
A Pedagogia Waldorf não se trata de uma mistura de ensino tradicional e
progressista. Este método de ensino tem objectivos claros: dar liberdade, criar
49
entusiasmo e encanto pela aprendizagem e respeitar a criança, dando-lhe tempo e
espaço suficientes para aprender, sem competição e sem pressas. A escola está ao
serviço da criança, e não vice-versa. A ideia é proteger a infância para que esta
possa ser plenamente gozada e respeitar cada criança como indivíduo, ajudando-a
a desenvolver as suas capacidades únicas e a encontrar formas de se integrar num
tecido social saudável. É a junção destes objectivos com o princípio básico do
movimento criado por Rudolf Steiner – a Antroposofia – o que deu origem à
Pedagogia Waldorf. Assim, é seguindo a ordem definida pela Antroposofia (corpo,
alma e espírito e com capacidades de pensar, sentir e agir) que o ensino começa
(Steiner, 2001).
A Antroposofia ainda procura desenvolver e equilibrar, através da educação,
as três actividades anímicas humanas (pensar, sentir, querer), sendo que todas são
concebidas com igual valor/importância pela teoria antroposófica.
Estas três actividades anímicas são meios de envolvimento do ser humano
com o mundo, sendo que o pensar corresponderia à actividade consciente, tendo o
seu oposto no querer que é a actividade inconsciente. O sentir como mediador
destes dois pólos corresponderia a uma consciência onírica (semelhante àquela
que temos quando estamos a sonhar).
Desta forma, o pensar seria atingido ou exercitado pela linguagem cognitiva,
lógica, o sentir por meio de imagens (que podem se dar por meio de uma linguagem
onírica, que se dirija à imaginação) e o querer pela linguagem do corpo, pela acção.
Corporalmente, o pensar estaria ligado ao sistema neuro-sensorial, o sentir com o
sistema cardíaco-respiratório e o querer ao sistema metabólico-motor (Idem).
Pensando-se numa pessoa, nas suas actividades diárias temos, de acordo
com a relação da configuração corporal com as actividades anímicas, a
compreensão de que uma nunca actua independentemente da outra. O que ocorre
é que em cada circunstância uma das actividades anímicas predomina sobre as
outras.
A actividade anímica do pensar não suporta repetições. Se ela absorve uma
informação, ficará sempre instigada por outra. Por outro lado, o querer (o seu pólo
oposto) vive da repetição (do ritmo), desta forma, só se pode aprender algo pela
insistência.
O verdadeiro campo de aplicação da Pedagogia Waldorf é o chamado ensino
obrigatório/fundamental, abrangendo a idade dos sete aos dezoito/vinte e um anos,
50
aproximadamente. Uma Escola Waldorf completa abrange doze séries, divididas em
dois ciclos, de oito e quatro séries, respectivamente. Em geral, existe um Jardim-de-
infância dividido em vários grupos e, às vezes, uma décima terceira série que serve
de ano preparatório para exames oficiais de conclusão de cursos de ensino médio,
nos países em que tais exames são necessários.
Clarificando, a pedagogia em estudo abrange doze séries, destinando-se a
crianças de qualquer classe social, religião e raça, baseando-se no princípio de que
todo o cidadão tem um direito inalienável a uma educação completa; o direito de
frequentar uma escola até à idade de dezoito anos, não podendo ser negado a
quem quer que seja.
Tudo começa no Jardim-de-infância, onde as crianças aprendem através da
imitação e imaginação. O objectivo do Jardim-de-infância é desenvolver o sentido
de encantamento pela aprendizagem e de reverência ou consideração pelos seres
vivos e pela natureza. As actividades dos Jardins-escola Waldorf incluem histórias,
marionetas, música, movimento, jogos, pintura, entre outras. Steiner (1999) criou
uma outra actividade essencial: a euritmia; isto é, o movimento que tenta dar
visibilidade ao tom e ao sentimento da música e do discurso, e se torna fundamental
para desenvolver a concentração, a autodisciplina e o sentimento da beleza da
criança. O ritmo do dia e da noite, das coisas e das pessoas é também muito
respeitado.
Mais tarde, nos primeiros anos de escola – que correspondem à escola de
1º, 2º e 3º ciclos – os estudantes são acompanhados por um professor durante oito
anos de escolaridade. O programa educativo contempla disciplinas como Inglês,
História, Ciências (que engloba áreas como Astronomia, Meteorologia ou
Geografia), Matemática, Farmácia, sem nunca abdicar da Educação Física,
Jardinagem e Artes Performativas e Decorativas. Nesta fase, os professores optam
por não usar manuais escolares. São os estudantes que, por si próprios, constroem
os livros pelos quais estudam. Os sistemas/meios de comunicação informatizados,
também são rejeitados até ao 3º ciclo, por considerarem que comprometem o
desenvolvimento saudável e livre (Steiner 1999).
Os seguidores desta Pedagogia Waldorf defendem que, até esta idade, os
estudantes devem ter a oportunidade de interagir livremente uns com os outros,
explorar o mundo das ideias, participar nos processos criativos, desenvolvendo o
51
seu conhecimento, capacidades e qualidades próprias, sem que isso atrase a sua
formação em relação aos estudantes do sistema de ensino oficial/público.
O sentido da Pedagogia Waldorf é bem definido: ela resulta da Antroposofia
em geral e, em particular, do que esta tem a dizer sobre o desenvolvimento da
criança. No entanto, isto não significa que se leccione Antroposofia nas Escolas
Waldorf. Ao contrário, todas as religiões podem ter o seu lugar nas escolas Waldorf.
Aliás, como referido anteriormente, a Antroposofia não é uma religião mas antes
uma visão do Universo e do Homem obtida segundo métodos científicos. Dessa
cosmovisão, decorrem a imagem do mundo, a própria existência das escolas
Waldorf e os trabalhos dos seus professores. Mas ela não é ensinada aos alunos:
respeita-se a liberdade espiritual destes e dos seus familiares (Lanz, 2000)
A Antroposofia elaborada por Rudolf Steiner tem por objecto o Homem como
indivíduo, mas a Pedagogia Waldorf não se limita a essa visão; baseia-se
fundamentalmente no encontro entre homens, sendo o objecto desta pedagogia a
relação professor-aluno.
2.1. Valores e Crenças das Escolas Waldorf
Em todo o contexto educativo das escolas de Rudolf Steiner, está presente a
Antroposofia. Esta é uma ciência que torna única cada escola Waldorf pois os
valores, tradições e símbolos que fazem parte da cultura da organização estão
directamente relacionados com os princípios projectados pela Antroposofia.
Relembremos que para a Antroposofia, o Homem não pode ser apenas
considerado como ser biológico, mas também como um ser espiritual para que
possa ser compreendido, ou seja, para que possam ser encontradas soluções para
“a crise da economia, da religião, do equilíbrio, da moral, das instituições políticas,
do ensino, da medicina, etc., uma vez que essas crises são na realidade, apenas
sintomáticas” que, quando agrupadas, se transformam numa só crise, “a crise do
Homem” (Lanz, 1999, p.41).
A Antroposofia procura, desta forma, perspectivar e entender a realidade
fornecendo uma explicação para a existência do Homem, sendo conhecedora das
causas relativas às crises por ele vivenciadas e tendo em atenção o seu
desenvolvimento e crescimento global. É com este pensamento mais amplo e
52
abrangente que a Antroposofia encontra soluções para o Universo do Homem e
para a situação em que vive a Humanidade (Ibidem).
Qualquer que seja o momento, o meio social deve moldar-se ao homem e
variar em função dele. A sociedade, no entender de Lanz (1986, p.149), não é
apenas a soma das partes (os serviços, os bens, os elementos que dela fazem
parte), é algo mais, uma vez que possui o seu “espírito próprio e as suas
instituições particulares, sempre em função dos seus membros”.
Apesar desta adaptação da sociedade ao indivíduo, este deverá conhecer o
meio em que vive para mais tarde se integrar mais facilmente dentro dele.
Steiner (1997) defendia uma Antroposofia orientada para o futuro onde o
Homem poderia vencer a crise em que vive a Humanidade através do livre-arbítrio.
Não estabelece rigidamente soluções, apenas pretende estimular o homem para a
reflexão da responsabilidade que possui ― formar a criança para que esta se
integre harmoniosamente na sociedade e na civilização ambientes.
Deste modo, Lanz (2000), partindo da ideia de que a educação humana
possui como objectivo principal o desenvolvimento da personalidade, sugere ser a
escola um lugar privilegiado nessa preparação.
Na escola Waldorf, o ideal que o Homem deve alcançar é o de “indivíduo
espiritual, anímico e físico; alguém que lute para realizar a sua imagem arquetípica”.
A entidade humana é formada por quatro elementos: “o corpo físico, o corpo
etérico” (o que mantém o corpo biológico vivo), “o corpo astral” (ligado à
luminosidade do ser e aos sentimentos) e “o eu espiritual” (consciência da moral).
Os primeiros sete anos da criança estão intimamente ligados ao desenvolvimento
do corpo físico “consolidando-o, estruturando-o e dotando-o de funcionamento
correcto”; o corpo etérico só se torna autónomo, aproximadamente aos sete anos,
quando a criança se prepara para entrar na escola (Lanz, 2002, pp.79-80).
O ser humano possui todas estas características dentro de si e a educação
deverá auxiliá-lo nas suas realizações. O próprio corpo e a vida anímica são
considerados como meros instrumentos para que a individualidade, considerada
como uma luta espiritual, possa atingir a sua meta suprema (Lanz, 1986).
A relação de convívio que o indivíduo tem com os outros é primordial, pois
facilitam o desenvolvimento e o bem-estar comum a todos.
Há uma outra face considerada fundamental na Antroposofia é o facto de
esta se encontrar em permanente evolução. Assim, os professores Waldorf têm de
53
procurar que o seu conhecimento e também a sua forma de leccionar não sejam
perenes, modificando-se e alargando-os sempre que possível. É com base neste
pensamento que se deve considerar a Antroposofia como uma ciência espiritual
viva, embora ela se apresente, hoje, como algo integralmente construído (Lanz,
1999).
Nas escolas seguidoras da pedagogia de Rudolf Steiner, não é leccionada a
disciplina de Antroposofia. Porém, esta encontra-se bem patente em toda a
organização e “é esta visão do Universo e do Homem resultante de métodos
científicos” projectados no desenvolvimento da criança que vive no coração dos
professores e dos alunos (Lanz, 1986, p.66).
O sistema educativo criado pelo mentor das Escolas Waldorf - Rudolf Steiner
- assume, como se pode constatar, o modelo paradigmático existencial, ligado ao
paradigma humanista da dimensão normativa educacional que, por sua vez,
pressupõe uma abordagem orgânica, na sua dimensão exemplar (Bertrand &
Valois, 1994).
O modelo educativo de Steiner assume uma concepção existencialista dado
conceber a pessoa como fim (sujeito) e não como objecto, bem como enfatiza a
extra-racionalidade, a intuição e a afectividade como significação global do
paradigma existencial (Ibidem).
A concepção da pessoa veiculada pelo paradigma existencial, inspira-se,
claramente, nas teorias da psicologia humanista que propõe uma concepção da
pessoa activa, a pessoa que age mais de forma consciente e responsável.
A pessoa do paradigma existencial caracteriza-se por ser capaz de estar à
escuta dela própria, de viver todos os seus sentimentos, de desenvolver todas as
suas possibilidades. Aberta ao mundo e à sua própria experiência, a pessoa confia
no seu organismo, adopta uma linha de comportamento em função de critérios
subjectivos e vê o seu poder de criação facilitado.
De acordo com Bertrand & Valois (Idem, p.131):
A vida e a evolução são concebidas de uma forma teleológica e que tudo o que existe se define no seu conjunto como um sistema de fins e de meios cuja finalidade última é exógena à pessoa humana. Esta possui a capacidade de se consciencializar da sua interacção com o ambiente biofísico, social, cultural, cósmico e espiritual.
54
Segundo os mesmos autores (1994), o crescimento individual é
essencialmente a finalidade da vida e constitui o seu valor por excelência.
Na Escola Waldorf, o humanismo, ou mais precisamente, aquilo a que
chamamos paradigma existencial, valoriza a filosofia da educação centrada no
aluno concebido como agente activo das suas aprendizagens.
O paradigma humanista da educação centra-se, prioritariamente, no
desenvolvimento da pessoa para que ela se sinta bem na sua pele e possa
funcionar plenamente e favorece a criação de uma sociedade centrada na pessoa,
promovendo uma concepção do conhecimento centrada na subjectividade e na
qualidade do ser, substituindo o saber ter, a aquisição de conhecimentos, pelo
saber ser e organicidade das aquisições (Ibidem).
Deste modo, é objectivo desta pedagogia, centrada numa visão humanista da
educação, a promoção da criatividade subjectiva, da expressão do eu, da
comunicação, da alegria, do amor, de uma nova imagem da pessoa, na qual ela é
livre interiormente para se movimentar em qualquer direcção e optar, livremente,
pelo processo transformador, possuindo um sentido de liberdade total.
Nas Escolas Waldorf está presente a abordagem orgânica, na medida em
que os conteúdos da formação são determinados pelo aluno, a aprendizagem faz-
se num clima caloroso, vivo e alegre, construído com base nas relações humanas
revalorizadas.
Por outro lado, o modelo Educativo Waldorf é orientado ao Cliente, dado
aspirar à restituição de uma dimensão humanista e personalista do acto educativo,
fazendo da exposição escolar uma experiência aprazível de vida, sujeita à
constante interpelação por parte do conjunto da comunidade que assim se assume
no papel de sociedade educativa (Carneiro, 2001).
O ciclo educativo orientado ao Cliente vê na instituição escolar, de acordo
com Carneiro (Idem, p.108) “um poderoso aliado na busca de um sentido para a
formação integral que é a antecâmara de uma cidadania participativa e consciente”.
De facto, o modelo educativo criado por Steiner preocupa-se com a
valorização dos quatro pilares da educação. O aprender a conhecer; o aprender a
fazer; o aprender a viver e o aprender a ser, pilares esses que serão
tratados/referenciados mais adiante.
55
2.2. Os Professores e os Alunos na Pedagogia Waldorf
Sendo a Antroposofia uma ciência e não uma religião, ela incorpora o
Universo e o Homem. É dessa cosmovisão que resulta a própria pedagogia de
Waldorf e o trabalho desenvolvido pelos professores. Todavia, esta pedagogia não
se restringe ao homem como ser individual, ela tem por base a união entre
indivíduos, ou seja, a relação professor-aluno (Lanz, 2000).
São os professores que representam a pedagogia, praticando-a, e cada
professor Waldorf encontra-se com os seus alunos a partir desse conceito geral.
De acordo com Lanz (1986, p.70), discípulo de Rudolf Steiner, a Pedagogia
Waldorf possui três princípios pelos quais se rege: “a imitação” que a criança exerce
no primeiro seténio (isto é, nos primeiros sete anos); “a autoridade baseada no
amor”, situando-se no segundo seténio e, por fim, “o juízo de valor” que a criança
estabelece no terceiro seténio, a partir da observação do mundo e da sua
experiência pessoal, de acordo com o Quadro 07, que serve como reforço.
Na verdade, a personalidade da criança é única e, por isso, não é
perfeitamente visível. Só no final do terceiro seténio é que a personalidade se
desabrochará para isso é necessário, explicita Lanz (2000), um enriquecimento da
vida sentimental que deverá decorrer entre os sete e os catorze anos.
No entender do mesmo autor (1986) os professores possuem uma função
fundamental. Para além de leccionarem a pedagogia de Waldorf, também a
praticam. Fazem-na com um sentimento especial de acordo com as exigências dos
alunos, com o seu carma e personalidade.
Deste conglomerado de ideias surge um professor que não é apenas alguém
que transmite conhecimentos, mas um homem, na sua essência forte e seguro, com
sentido de responsabilidade. “Ele sente o seu carma nas íntimas relações com os
carmas dos seus alunos, dos seus colegas e das comunidades maiores de que faz
parte” (Idem, p.68).
Por outras palavras, podemos referir que cabe ao Professor Waldorf,
desenvolver no aluno mecanismos e capacidades que o façam integrar-se no meio
social de forma segura, não esquecendo nunca as forças da natureza que
conduzem e operam na civilização, relacionadas com os princípios antroposóficos
(Lanz, 1999).
56
Este objectivo da pedagogia de Waldorf, sendo também finalidade da
educação em geral, pode parecer para o professor um trabalho impotente. No
entanto, na opinião do discípulo de Rudolf Steiner (Idem, p.69) desde que o docente
tenha planificado a aula com “boa intenção (tendo em conta a inteligência, os
sentimentos dos alunos, o seu desenvolvimento moral e espiritual, e a
harmonização do anímico-espiritual com o corpo), os seres superiores da natureza
poderão auxiliá-lo na sua actuação”.
Na perspectiva de Steiner (2001), os professores Waldorf têm ajudas
espirituais, uma delas transmite-se pelo conhecimento do homem e dos seus
corpos. Ou seja:
Sem um corpo etérico bem activo, o corpo físico definha; sem um corpo astral (sensação e sentimento), o corpo etérico adormece e, na falta de um eu bem desenvolvido (raciocínio e senso moral), o corpo astral faz com que instintos e paixões predominem (Lanz, 2000, p.81).
Os professores Waldorf têm, portanto, em vista a formação do ser humano,
desenvolver a criança em todos as suas partes, de forma harmoniosa. A
inteligência, a aquisição de conhecimentos, a vontade de saber, o sentimento, o
saber pensar, bem como, conhecer o seu ambiente social constituem aspectos do
desenvolvimento humano pertencente à arte do Professor Waldorf (Idem).
Neste sentido, a pedagogia Waldorf forma e informa, pois na sala de aula
não são só transmitidos os conhecimentos do currículo, mas esses saberes estão
incorporados no mundo prático. Além disso, é rejeitado todo o conhecimento inútil,
ou seja, aquele que não tem relação com objectos concretos da vida (Ibidem).
Esta pedagogia, de acordo com o mesmo autor (Idem, p.78), “fomenta a
moral, a personalidade global e a integração na sociedade. Prepara o aluno para
que este seja prático e consciente, capaz de enfrentar os seus problemas com
espírito crítico e criador”.
O nascimento da criança significa, então, a união definitiva entre os
elementos corpóreo e anímico-espiritual do novo indivíduo.
Durante os primeiros sete anos de vida, o corpo, a alma e o espírito formam
uma unidade na criança. Nessa fase, o corpo etérico constitui o elemento mais
importante.
Exercendo a sua influência a partir da cabeça, o corpo etérico plasma, pouco
a pouco, todo o organismo. Nesta fase, a criança é permeável a todas as influências
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do mundo ambiente e, por sua vez, transmite directamente a esse mundo tudo o
que se passa dentro dela. Isto significa que ela é como que um grande órgão
sensório.
Esta permeabilidade da criança é o que todo o educador deve ter em conta.
A criança absorve inconscientemente não só o que existe em seu redor, sob o
aspecto físico, mas também o clima emotivo que a circunda, o carácter e os
sentimentos das pessoas que a rodeiam. Sendo assim, as influências que emanam
do mundo ambiente exercem, consequentemente, efeitos profundos sobre a
organização física e psíquica da criança, os quais se farão sentir durante toda a
vida futura (Steiner, 2001).
Inconscientemente, a criança imita o que percebe ao seu redor. O seu
pequeno mundo baseia-se na identificação.
Ter em conta estes pressupostos (imitação, por exemplo), é o mesmo que ter
os motivos básicos de todo o comportamento infantil e, desta forma, tomar as
atitudes acertadas na educação da criança. Importa, então, saber conduzir a
criança, nesta fase, saber que para tal os educadores, inclusive os pais, devem
trabalhar constantemente sobre si mesmos, afim de eliminar unilateralidades, falhas
ou excessos que possam ter efeitos negativos sobre os seus educandos.
O bom educador conduzirá a criança, pouco a pouco, sem a inibir,
valorizando a infância e não apenas as actividades conscientes e intelectuais.
De acordo com o poeta alemão Jean Paul (1820), nos seus primeiros três
anos de vida, o homem aprende mais do que em todos os seus estudos
académicos. Tal como relata o poeta, na sua autobiografia:
Jamais esqueço o fenómeno ocorrido comigo - e ainda não relatado a ninguém - no momento em que assisti ao nascimento da minha autoconsciência, e até sei precisar a data e o lugar. Certa manhã, em minha tenra infância, encontrava-me sob a porta fronteira da minha casa e olhava para um monte de lenha à esquerda quando, repentinamente a visão interior “eu sou um eu” me golpeou como um relâmpago dos céus e desde então permaneceu indelevelmente impressa: o meu eu havia visto a si mesmo pela primeira vez e para sempre. Dificilmente se pensaria aqui em ilusões da memória, pois nenhum relato estranho poderia mesclar-se a um evento ocorrido simplesmente no mais sagrado recôndito do homem, evento que só por sua novidade pudesse ficar na memória, com todos os detalhes secundários das circunstâncias do momento.
De facto, conforme afirma Lanz (2000, p.44):
58
Se focalizarmos apenas o andar erecto, a fala e o pensar, conquistas que a criança realiza antes do término do seu terceiro ano de vida, teremos de reconhecer que essa aprendizagem é o fundamento de toda a existência humana, em oposição à vida animal. Essas três actividades só podem ser aprendidas em contacto com outros seres humanos.
Essas três conquistas correspondem, deste modo, às três virtudes básicas
que a criança vivencia inconscientemente: quando ela anda, segurando na mão de
um adulto, essa segurança é como que um símbolo do amor que une esses dois
seres. Quando ela fala, é importante que a criança pratique a honestidade: as
palavras devem exprimir a verdade. Nos pensamentos, (quando, por exemplo, se
dá uma ordem ou numa disposição tomada) deve-se ter em conta a coerência e a
clareza.
Estes pressupostos exigem a observação de muitas regras de conduta e de
auto-observação que os adultos devem seguir, se quiserem assumir o papel tão
difícil de educadores de crianças.
Importa saber-se que, à medida que a ligação do corpo etérico com o corpo
físico se encurta, a memória e a inteligência vão-se desenvolvendo até à época
incisiva em que a perda dos dentes de leite e outros factos indicam que está a ser
dado um passo importante para a escolaridade.
Segundo Lanz (Idem, p.45):
Até à metade do terceiro ano de vida, aproximadamente, o corpo etérico está inteiramente ligado ao corpo físico. Nesse momento, uma parte de corpo etérico, que corresponde à cabeça, começa a libertar-se e torna-se disponível para a memória e para uma certa inteligência.
Aqui, a criança passa a manifestar a primeira auto-afirmação do eu (em vez
de falar de si própria usando o seu nome, passa a empregar o pronome na primeira
pessoa), sendo, geralmente, o período em que a criança parece particularmente
teimosa e cheia de oposição.
Em geral, a primeira memória da criança, situada por volta dos três anos,
ainda é bastante rudimentar. Apenas entre os sete e os catorze anos de idade é
que adquirirá o carácter de imagens duradouras. Será entre os catorze e os vinte e
um anos que a memória se transformará em conceptual, altura em que o intelecto
dominar-se-á pela abstracção e pelo princípio da causalidade.
Dando seguimento ao supracitado, o princípio para uma regra muito
importante é reter que toda a aprendizagem deve dirigir-se, primeiramente à
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vontade, depois ao sentimento e, só no fim, chegar ao intelecto, mediante a
elaboração de conceitos.
Sumariamente e de acordo com o atrás referenciado, nesta altura, a criança,
tanto física como animicamente, apresenta sinais evidentes de que uma primeira
fase da vida terminou, e pela presença destes sinais, o educador verificará que a
criança está madura para começar a segunda etapa: a da escolaridade.
Após a libertação do corpo etérico, cuja actuação havia predominado no
primeiro seténio, é o corpo astral que assume uma espécie de liderança.
Assim, o educador deverá incidir a sua actuação, principalmente sobre o
corpo astral, pois através deste ele conseguirá atingir os corpos etérico e físico,
preparando o desabrochar do próprio eu.
O desenvolvimento do corpo astral processa-se gradualmente, e atravessa
várias fases, considerando-se importante que o educador as conheça
perfeitamente, para fazer jus ao seu aluno.
Assim, as diversas matérias do currículo e a metodologia do seu ensino são
poderosos adjuvantes para facilitar, em cada instante do desenvolvimento infantil, a
eclosão harmoniosa da personalidade.
Lanz (Ibidem) esclarece “se o ‘eu’ permear o ‘corpo astral’ e o resto do
organismo de uma forma excessiva, o jovem tornar-se-á materialista, em todos os
sentidos da palavra. Se não o fizer o bastante, o jovem será um sonhador desligado
da realidade”.
A harmonização entre estes dois extremos, no âmbito escolar, pode ser
obtida, dando-se maior ou menor ênfase a certas matérias. O mesmo autor (Ibidem)
clarifica:
Enquanto a geometria, a aritmética, a linguagem e, de forma geral, a ocupação com ideias abstractas favorecem a conscientização que resulta da permeação do corpo astral pelo eu, o desenho, a história, a geografia e as actividades artísticas tendem a incentivar uma vida sentimental menos realista.
Durante o primeiro seténio, o corpo etérico estava dedicado ao seu próprio
desenvolvimento e à actuação sobre o corpo físico. Só depois da sua libertação,
aos sete anos de idade, é que ele se transforma no instrumento do pensar e da
memória.
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Da mesma forma, durante o segundo seténio o corpo astral deveria limitar-se
ao próprio desenvolvimento e à actuação sobre o corpo etérico.
A actividade do corpo etérico pode ser caracterizada como essencialmente
modeladora e plástica, porém, o verdadeiro movimento do corpo astral é a
musicalidade, sendo este termo considerado num sentido muito mais amplo do que
normalmente se chama de música. A acção plasmadora do corpo etérico exerce-se
no espaço. O elemento musical tem por campo o tempo e toda a vida sentimental
de um indivíduo. Estes são elementos essencialmente musicais, devido ao
elemento rítmico que lhes é inerente.
A pouco e pouco, esclarece Lanz (2000, p.47):
O elemento musical que parte do sistema rítmico do homem supera as forças plasmadoras que emanam originalmente da cabeça. Ele deve predominar na educação escolar, já que o ensino fundamental coincide aproximadamente com o segundo seténio.
Assim como a imitação do primeiro seténio, o segundo seténio reflecte, de
certa forma:
O anseio de identificação com uma realidade exterior, o prazer inato do jovem em cantar, ouvir música e fazer eurritmia (arte antroposófica do movimento, podendo ter carácter artístico, pedagógico ou terapêutico), lembra igualmente algo que aconteceu antes do nascimento: a vivência das harmonias espirituais chamadas, na mitologia grega, de música das esferas (Lanz, 2000, p.48).
Rudolf Steiner (2000, p.44) é peremptório quando afirma “toda a educação
que ignora esses anseios inconscientes da alma humana – ou seja, no caso, o
cultivo da musicalidade – desperdiça e causa a atrofia de forças preciosas, que
estão presentes no jovem, à espera de serem chamadas e aproveitadas”.
À luz desta teoria, a chave de ouro da educação durante o segundo seténio
consiste, pois, em trabalhar com os sentimentos da criança, em apelar à sua
fantasia criadora, e em aumentar essas forças com imagens que as fecundem e
elevem. Steiner (Idem, p.45) revela que:
Deve-se proteger o jovem contra todas as imagens perniciosas que possam vir de fora e, principalmente, contra tudo o que possa arrefecer a intensidade dos seus sentimentos… Todas as abstracções, conceitos sem vida e raciocínios intelectuais que não apelem à fantasia da criança, não só deixam de alimentar o seu manancial de forças sentimentais, como também as destroem e ressecam.
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A música, o canto, a fala, a euritmia, são actividades em que o elemento
musical se expressa mais directamente, no entanto, como refere Lanz (2000, p.49)
“há uma maneira mais subtil e discreta de incluir o elemento musical em todas as
matérias, em qualquer ensino – enfim, toda a relação entre o educador e o
discípulo”. O próprio corpo humano contém harmonias musicais.
Nas escolas Waldorf, as matérias adoptadas para a faixa dos nove aos onze
anos, actuam sobre os sistema muscular, e para a faixa dos onze aos catorze anos,
actuam sobre o sistema ósseo. Trata-se de uma actuação sobre a estrutura mais
subtil, sobre os seus ritmos e harmonias subjacentes.
Apesar da capacidade de aprender e a memória se encontrarem bem
desenvolvidas, após a libertação do corpo etérico (aos sete anos), isso não significa
que a assimilação de informações e o raciocínio possam funcionar sem que se leve
em conta a configuração toda especial da mente humana, durante o segundo
seténio. Essa configuração caracteriza-se pelo predomínio da vida sentimental.
A criança pode não pensar, aprender ou conhecer qualquer facto sem que
também esteja engajada emocionalmente, uma vez que acompanha tudo com
reacções sentimentais, no sentido de que o mundo fala à criança pelo seu aspecto
e pela configuração dos seus fenómenos. A criança quer imagens, por isso,
qualquer matéria escolar deve ser apresentada primeiro sob a forma de imagens.
Com o passar do tempo, a própria criança evolui em direcção a um pensar
cada vez mais abstracto, mas a transformação das imagens e fenómenos em
conceitos e regras deve processar-se paulatinamente.
Daí o imperativo absoluto de que todo o ensino, para que realmente atinja a
criança de maneira positiva, deve ser dado, não de forma abstracta e teórica, mas
partindo de fenómenos, de imagens que utilizem o manancial de forças de
sentimento e de fantasia presentes no ser infantil.
Lanz (Ibidem), explica:
Quando a criança está envolvida sentimentalmente no processo de aprendizagem, os conteúdos também se gravam mais rapidamente e profundamente na memória. Por esse motivo, enquanto é correcto exigir muito da capacidade intelectual e da memória, o caminho para isso deve ser aquele que utiliza as forças sentimentais e estéticas presentes.
Assim, emoções e vivências intensas devem acompanhar o ensino de todas
as matérias. O professor deve ser um artista no sentido mais amplo da palavra, e
todo o ensino deve ser uma obra de arte.
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Steiner (2000) refere, relativamente a isto, que a função do professor é,
basicamente, trazer o mundo para dentro da sala de aula. É esse o verdadeiro
ensino.
Cada dia de aula deveria ser, para os alunos, uma série de vivências que
lhes despertassem a admiração, o entusiasmo diante das maravilhas do mundo, da
história, da matemática, etc.
Por outro lado, importa considerar que as actividades do corpo e o esforço
mental provocam cansaço. Lanz (2000, p.51) clarifica:
A vontade e o intelecto não podem funcionar constantemente. A cabeça e os membros têm que descansar. O que nunca pára nem descansa é o sistema rítmico, isto é, a respiração e a circulação. Ora a vida sentimental está ligada ao sistema rítmico… Tudo o que se relaciona com os sentimentos é, portanto, um excelente harmonizador para as unilateralidades do trabalho mental e físico. A actividade artística não cansa, mas regenera.
Assim, um ensino que apele aos mesmos sentimentos que as artes e ainda
que contenha, no seu currículo, muitas actividades e matérias artísticas, não
cansará os alunos, mas “desenvolverá forças anímicas vivas, que, por sua vez,
fecundarão e harmonizarão as forças vitais do organismo. Um bom ensino pode – e
deve – ser uma terapia. Deve sê-lo mormemente quando uma civilização cansa,
esvazia e esclerosa o ser humano” (Steiner, 2000, p.50)
A época intermediária (dos sete aos catorze anos) é aquela de uma vivência
subjectiva do mundo, porém sempre por intermédio da personalidade do adulto.
Durante o segundo seténio, em particular, a educação, deve ter como
princípio pedagógico a autoridade.
Pais e mestres deveriam constituir para o jovem uma autoridade instituída e
indiscutível, guiando-se com mão firme, mas carinhosa, sendo que a autoridade
nunca deve ser imposta à força, devendo ser resultado natural de um
relacionamento baseado na veneração, no respeito e no reconhecimento
inconsciente das qualidades superiores do educador (Ibidem).
O professor, os pais e as demais figuras humanas que lidam com o jovem
deveriam ser figuras admiradas. Deste modo, não poderá haver educação
harmoniosa se o educador não for admirado e aceite como autoridade natural, com
base no amor.
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Perante o exposto, toda a educação no segundo seténio deve estear-se
nesse princípio da autoridade aceite e baseada na carinhosa admiração. Esse
princípio substitui o da imitação, que regeu o primeiro seténio.
Naturalmente, a primeira parte do segundo seténio terá, ainda, como base do
relacionamento, ao mesmo tempo, a autoridade e a imitação.
Depois dos nove aos doze anos, os julgamentos e opiniões do educador
serão aceites na base da simples autoridade, e o jovem identificar-se-á com eles.
Começando na idade de doze anos, o juízo próprio do aluno despertará, e
em grau cada vez maior, a autoridade será posta à prova e questionada, primeiro
inconscientemente e depois abertamente, até a crise da puberdade – quando, de
repente, para grande surpresa dos educadores desavisados, toda a sua autoridade
é constantemente desafiada e acaba por desmoronar.
No que concerne ao segundo seténio, se o professor souber aplicar
correctamente o princípio da autoridade, os alunos aceitam os seus juízos para
moldar o seu próprio pensar e querer. Neste período, a autoridade é ainda natural e
condizente com o grau de desenvolvimento do jovem.
Assim como a autoridade boa e responsável dos pais e professores dá
segurança ao jovem e marca-o para toda a vida futura, anti-ideais deixarão
igualmente um marco indelével, embora negativo, na personalidade do jovem que
anseia por encontrar figuras humanas em que se apoiar.
Até aos catorze anos, o jovem é um idealista. Ele espera encontrar ideais e vê-los realizados – em primeiro lugar, ideais humanos. Se deixarmos de corresponder a esse idealismo por esquecimento, ignorância ou cinismo, algo será definitivamente destruído na alma do jovem (Idem, p.56).
O segundo seténio culmina com a puberdade que traz uma profunda
transformação psíquica e mental, além do amadurecimento físico que é apenas um
dos seus aspectos.
Aproximando-se da puberdade, o jovem tende a ser dominado põe um certo
pudor e a fechar-se sobre si mesmo, dado ser uma fase em que o jovem sente a
personalidade sentimental a desabrochar.
Essa fase deve ser respeitada, porém:
Contrabalançá-la… atrair o interesse do jovem para a realidade da vida, para os deveres sociais e o mundo exterior (…) Um dos grandes males da nossa civilização é o facto vivermos rodeados de objectos e de processos cujo funcionamento desconhecemos. A educação escolar actualmente instituída pouco faz para acabar com tal
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esoterismo da tecnologia moderna. Essa ignorância gera no subconsciente das pessoas uma insegurança que afecta negativamente a sua autoafirmação como seres livres (Lanz, 2000, p.55).
Por volta dos catorze anos, segundo o mesmo autor (Idem), “o corpo astral
nasce e o eu começa a destacar-se cada vez mais. A expulsão da antiga
espiritualidade pré-natal está completa”.
Nessa idade, desperta a consciência do próprio corpo, pela atitude do amor
pelo mundo e por dois indivíduos do sexo oposto, sendo esta a expressão mais bela
do seu amadurecimento, sendo a sexualidade a projecção desse processo no corpo
etérico.
O erotismo acompanha como algo normal a plenitude dos sentimentos entre duas individualidades. Naturalmente, se essa plenitude não existe, se a riqueza da vida sentimental ficou atrofiada no jovem devido a uma educação mal dirigida, então o erotismo irrompe nesse vazio e assume uma importância doentia e anormal (Ibidem).
Já o terceiro seténio é caracterizado pelo período durante o qual o eu se
liberta dos seus vínculos com o corpo astral e com o resto do organismo, tornando-
se autónomo, tendo em conta que o período anterior ao da puberdade tenha sido
normal.
Essa autonomia do eu inclui o pleno desenvolvimento das faculdades
mentais e morais, que culminará no aflorar do chamado livre-arbítrio da
responsabilidade moral.
De acordo com Lanz (Ibidem):
O indivíduo pode e deve, no fim do terceiro seténio, usar o pensar e o querer sem interferência de motivações oriundas do seu corpo, dos seus sentimentos, do seu egoísmo. Ele torna-se capaz de emitir julgamentos objectivos e de agir segundo critérios éticos absolutos.
Neste período, realça-se a diferença de sexos. O sexo feminino caracteriza-
se por uma preponderância do corpo astral e o masculino por uma preponderância
do eu, porém os jovens de ambos os sexos revelam impertinência e agressividade,
embora manifestamente diferentes. Nas raparigas é o resultado da sua exuberância
astral (carácter mais sentimental), enquanto que nos rapazes é o resultado da
compensação da sua insegurança (o eu encontra-se, ainda, frágil).
Até à puberdade, o jovem viveu num estado de identificação, de participação
meio inconsciente em relação ao mundo. Intelectualmente ele sabia da existência
65
desse mundo, mas ao mesmo tempo a intensa vida sentimental fazia com que esse
mundo o absorvesse.
Nesta fase, o princípio pedagógico apropriado durante o segundo seténio (a
autoridade), não funciona. Assim, depois da puberdade, o princípio da autoridade
tem de ser substituído por outro que se trata do reconhecimento espontâneo, por
parte do aluno, de que o educador é uma personalidade de grandes qualidades, à
qual vale a pena submeter-se numa relação mestre-discípulo, ou seja, o mestre
deve ser “alguém”, e acima de tudo possuir a qualidade honestidade.
Conforme elucida Steiner (2000, pp.59-63):
O princípio pedagógico do terceiro seténio é o conhecimento das reais qualidades do educador, e em particular da sua capacidade intelectual e integridade moral (…) aqui, o professor deve harmonizar as qualidades dos seus alunos e almejar a perfeita integração deles no mundo… O bom educador saberá dosar, conforme a idade e a personalidade do aluno, quanta liberdade lhe poderá conceder. E, sobretudo, fará sentir ao jovem que a liberdade não é apenas um direito, mas implica em muitas responsabilidades; que existe a ‘liberdade de…’, mas também a ‘liberdade para’
Quadro 06 – Os Seténios
Faixa etária
Acontecimentos/Factores
Caracterização
De 0 a 07 anos
(maturidade escolar)
- A criança está aberta ao mundo; - Tem confiança ilimitada; - Recebe impressões sensoriais; - Não elabora julgamentos ou análises; - Está na fase do desenvolvimento motor; - As percepções inadequadas são armazenadas no inconsciente (não compreende o pensamento dos adultos); - Aprendizagem por imitação; - O educador Waldorf deve ser digno de ser imitado, pois nessa imitação inconsciente estará a fundamentar a sua moralidade futura.
Característica:
O bom.
De 07 a 14 anos
(maturidade
sexual)
- Desenvolvimento anímico; - Emancipação da vida corporal; - Interage e reage aos estímulos que recebe; - Necessita de explicações conceptuais; - Interesse pela admiração que as coisas causam; - Vivência na área dos sentimentos (sai sentido, entra sentimento); - Puberdade (12/14 anos) perturba a harmonia anímica; - O professor Waldorf deve saber o que é bom ou não para seu aluno e entusiasmá-lo, deve ter "autoridade amorosa".
Característica:
O belo.
De 14 a 21
anos
(maturidade
social)
- Liberdade das forças anímicas; - Desenvolvimento do lógico, analítico e sintético; - Separa-se do mundo (vê o mundo de fora); - Quer explicações conceituais e intelectuais; - Quer ser compreendido; - O professor Waldorf deve ser digno de respeito. C
aracterística:
O verdadeiro.
Fonte: Adaptado de Steiner (2000)
66
2.2.1. O Professor Waldorf
Na maioria das escolas, o professor é um funcionário público contratado para
ensinar. O corpo docente é a soma dos seus membros unidos por certos interesses
comuns.
No que concerne à escola Waldorf, o corpo docente é uma comunidade de
pedagogos autónomos, responsáveis apenas perante a sua própria consciência
pedagógica.
Lanz (2000, p.86) esclarece:
Eles são chamados de uma forma livre… o que vale para a sua escolha, são a sua personalidade, a sua capacidade pedagógica, os seus conhecimentos e a sua experiência de vida. Essa comunidade colegiada baseia-se na identidade da sua tarefa, conforme os princípios que resultam da Antroposofia de Steiner.
São os professores que representam a pedagogia Waldorf, praticando-a, e
cada professor Waldorf encontra-se com os seus alunos a partir desse conceito
geral.
Tendo em conta todo o contexto cármico, o professor Waldorf, sente-se
encarregado de uma tarefa especial diante de cada aluno, mormente quando este
apresenta problemas.
Cada professor deveria ter sempre em conta a evolução do indivíduo e da
humanidade, pois participa activamente de ambas.
Conforme Lanz (2000, p.80), o professor sabe que “cada matéria (da qual ele
é mensageiro para os seus alunos) está integrada num Cosmo total. Sabe também
que as ciências têm um lugar importante na visão geral do mundo, mas que não a
constituem exclusivamente”.
Deste modo, o papel do professor Waldorf é de grande responsabilidade. Ele
deve estar consciente do seu próprio trabalho, o qual não visa apenas o intelecto e
os sentimentos dos seus alunos, mas tem por meta última o seu desenvolvimento
espiritual e moral, bem como a harmonização do anímico-espiritual com o corpo.
Steiner (1999, p.81) clarifica que:
Cada membro da personalidade do educador actua principalmente sobre o membro imediatamente inferior da pessoa do discípulo. O corpo físico deste é, portanto, influenciado, nas suas funções mais íntimas, pelas forças que emanam do corpo etérico do professor; o corpo astral – isto é, as emoções e qualidades mais íntimas deste último – exerce uma influência sobre as suas funções orgânicas e sobre a sua índole em geral. Finalmente, a personalidade do professor
67
actua sobre os sentimentos e emoções dos alunos, ou seja, sobre a sua organização astral. O único membro do aluno que não recebe influência directa é o eu, e de facto a personalidade humana, potencialmente livre, deve seguir os seus próprios impulsos.
Como tal, o professor actua com o seu corpo etérico sobre o corpo físico do
aluno, justamente na altura em que o próprio corpo etérico do aluno também plasma
o corpo físico, isto é, durante o primeiro seténio.
Conclui-se, então, que é a maneira de ser do educador que actua sobre a
criança até aos sete anos de idade. No que concerne ao segundo seténio, é a vida
temperamental do professor, bem como as emoções que dela irradiam que agem
sobre o corpo etérico dos alunos. Já no terceiro seténio, o eu do educador, a sua
personalidade intelectual e moral provocam as reacções emocionais da astralidade
dos alunos.
Importa relembrar que como seténios se denomina as divisões da vida
humana de sete em sete anos. Portanto, quando se referenciam aos primeiros
seténios, está-se a referir às fases que vão dos zero aos sete anos de idade, dos
sete anos aos catorze, aproximadamente, e assim sucessivamente.
Deste modo, ao professor Waldorf são exigidas qualidades e capacidades
diferentes, de acordo com os seténios em que se encontra a leccionar.
Steiner elaborou três princípios pedagógicos que orientam o professor neste
âmbito: a imitação no primeiro seténio; a autoridade amorosa no segundo e o juízo
próprio, resultado da observação e da vivência própria, no terceiro.
Para os primeiros oito anos, se tudo corre normalmente, o ideal é o professor
acompanhar a classe (“professor de classe”) sendo que, ao longo desse tempo, o
professor deverá desenvolver-se para que a turma não se canse dele, e, por outro
lado, deverá assumir encargos fora do próprio ensino (participar em conferências,
reuniões, …).
A partir da nona série, o sistema de “professor de classe” termina, deixando
de existir, deste modo, a figura protectora do “professor de classe”, e todas as
matérias passam a ser dadas por professores especializados e cada classe possui,
ainda, o seu tutor (escolhido pelos próprios alunos, ele constitui o elemento de
ligação entre a classe e a escola, que assume a função de manter o contacto
pessoal com a classe, conhecer os seus problemas e ajudar na solução de
quaisquer problemas que possam surgir, bem como de centralizar as informações
68
de todos os professores que leccionam na sua classe e ser o elemento de ligação
com os pais dos alunos).
Com efeito, a partir da nona série, o professor não pode aplicar um método,
mas sim, deverá actuar como indivíduo, sendo que o seu ensino será cunhado da
sua personalidade. Serão as suas qualidades que conquistarão o respeito dos
alunos e não a aplicação de qualquer técnica ou método.
O professor é, nesta pedagogia, o próprio símbolo do espírito Waldorf.
A consideração de que a criança tem uma forma de apreender o mundo
diferente do adulto, não é uma exclusividade da visão antroposófica. Ela foi
construída – processual e historicamente – junto ao reconhecimento da
especificidade da infância (Áries, 1978) e ao estabelecimento da Pedagogia como
Ciência (Kohan, 2005).
No percurso desta história é importante ressaltar a contribuição de
Rousseau, um dos primeiros pensadores a considerar que a mente infantil opera
diferentemente da do adulto, ou seja, “a mente infantil não é nem carente, nem
insuficiente, mas se estrutura de outra forma” (Costa, 2000, p.36).
2.2.2. A Relação Professor – Alunos
Prezando a integração social dos alunos, o professor Waldorf deve
considerar como única a personalidade de cada criança. Cada um é aceite como
tal, sem preconceitos de raça, religião, sexo, ou outros (Lanz, 1986).
Tendo o professor esta grande responsabilidade para formar o aluno, Rudolf
Steiner procurou desenvolver uma medida que levasse o professor a encaminhar o
aluno durante oito anos (Idem).
Assim, a vida escolar do aluno desde o 1º ano de escolaridade é
acompanhada por um único professor (normalmente da primeira à oitava série -
monodocência) e este lecciona “linguagem, aritmética, geografia, histórica, física,
química e também disciplinas como trabalhos manuais e educação física” (Idem,
p.70).
Sabendo que tem oito anos para formar os alunos, o professor da classe
pode planear e dispor. De facto ele abrange o passado, o presente e o futuro, sendo
que a sua meta não é uma matéria, nem todas a matérias, mas a classe.
69
O professor da turma, nas escolas de Steiner, deve procurar saber um pouco
de tudo sem ser especialista em nenhuma matéria. Por isso, para leccionar não
utiliza o manual escolar, procura desenvolver vivências e proporcionar situações
práticas de aprendizagem para que as crianças com interesse e motivação melhor
as interiorizem (Steiner, 1999).
Isto não significa que os alunos não possam pesquisar e procurar informação
em manuais didácticos, especialmente os de anos mais avançados. Porém, a
norma é o professor não utilizar livros servindo-se das suas próprias palavras para
leccionar. Os alunos, por sua vez, registam a matéria nos seus cadernos e estes
são “bem caprichados e ilustrados, contendo o essencial de cada aula” (Lanz, 2000,
p.92).
Todavia, a monodocência termina quando os alunos passam para a nona
série. A partir daqui, professores especializados leccionam cada um, uma disciplina.
A turma continua a possuir um tutor, mas a imagem de protecção do professor
deixa de existir. Perante a transição, para o 9º ano de escolaridade, pode-se
estabelecer uma analogia com o período da adolescência. Uma situação da vida de
todos os jovens, um pouco confusa, cujos professores devem auxiliar no encontro
de si mesmos (Idem).
Assiste-se a uma familiaridade entre os professores e os alunos. Essa
relação enriquece-se fortemente e a proximidade, vai sendo cada vez maior. Ao
longo dos anos, as qualidades e os defeitos vão-se conhecendo e os problemas
particulares dos alunos e da própria família vão sendo partilhados (Lanz, 1986).
2.3. A Comunidade Escolar Waldorf
Ao conjunto de pessoas e membros de uma organização conscientes de que
estão interligados por uma finalidade comum, Sergiovanni (2004) designa este
fenómeno por comunidade.
Quando esta se torna mais próxima na escola, “os sentimentos de pertença,
de fazer parte de algo importante, de ter um objectivo comum” unem-se e os pais,
professores e alunos convivem em vizinhança e afinidade (Idem, p.35).
Os professores e os alunos são os constituintes fundamentais nas escolas de
Rudolf Steiner. Por esse motivo, nestas organizações os jovens recebem um
70
intenso preparo para uma responsabilidade social em conexão com a sua formação
pessoal (Lanz, 2000).
A turma é considerada uma autêntica comunidade social, um microcosmos,
traduzindo problemas, ansiedades, pressões, mas também esperanças e amizades.
A vivência diária, o convívio entre colegas e estes e o professor (ou os professores)
cria durante os anos escolares um sentimento fraterno com laços de amizade
indissociáveis.
Ela é formada por crianças da mesma idade, de diferentes religiões e com
mais ou menos dificuldades na aprendizagem. Essa unidade funcional não é
rompida ao longo dos anos, dado que “salvo raras excepções, o aluno não repete o
ano” (Lanz, 2000, p.78).
Nesta linha de pensamento, um aluno poderá ser matriculado num ano
inferior ao seu apenas se houver consenso por parte de pais, professores e
médicos da escola e se a criança sofrer de um atraso de inteligência ou ao nível
psíquico ou físico.
A própria avaliação dos alunos não é realizada pelo uso de testes ou
exames. Ela processa-se através de trabalhos escritos, pela riqueza de
sentimentos, do pensamento lógico dos alunos, da ortografia e pelos
conhecimentos que possuem. Os alunos são avaliados qualitativamente, mas sem a
atribuição de números. Como, regularmente, não há retenções, na opinião de
Rudolf Steiner evitam-se constrangimentos e traumas por parte do aluno por ser
estigmatizado porque não se encontrar integrado numa turma que corresponde à
sua idade (Lanz, 1986).
Na turma, há a compreensão dos colegas que possuem Necessidades
Educativas Especiais, tendo-se o cuidado de auxiliá-los no que mais precisam, seja
em termos de mobilidade ou de ensino (Idem).
Os pais dos alunos são também elementos essenciais nas escolas Waldorf,
pois criam unidade na educação. Eles, ao seleccionar uma destas escolas, já
sabem à partida que também eles têm de estudar para, assim, poderem educar os
seus educandos (Lanz, 2000).
Desta forma, conforme explicita Lanz (Idem, pp.186-187) os encarregados de
educação devem ser conhecedores da pedagogia Waldorf “a fim de se evitar a
situação dos filhos serem educados conforme um determinado sistema e segundo
71
uma escala de valores e, no lar, segundo os princípios totalmente diversos”, o que
seria pernicioso para as crianças.
Para cultivar o contacto entre a escola e os encarregados de educação os
professores convidam-nos a participarem regularmente em reuniões ou mesmo a
fazerem parte de actividades, como festas, espectáculos musicais, conferências e
passeios (Ibidem).
A permanência dos pais na escola conduz a que estes se formem enquanto
seres com consciência para os problemas, dificuldades e atributos dos filhos.
Assim, adquirem maior responsabilidade na sua educação. Por seu turno, o
professor colabora nessa aquisição e torna-se também mais cônscio do seu dever.
Estas são as condições ideais para o funcionamento de uma escola Waldorf.
Este espírito comunitário transporta consigo vantagens onde os maiores
beneficiários são as crianças, sentindo-se mais confiantes, seguras e orientadas
(Idem).
2.4. A Estrutura formal da Escola Waldorf
Sendo a Escola Waldorf uma comunidade, existem algumas interacções com
os professores da instituição e também com elementos jurídicos e económicos que
ela não deve descuidar (Lanz, 1986).
Durante os longos oito anos, em que o docente se encontra na turma, o
professor possui outros encargos, nomeadamente na administração da escola
fazendo parte de reuniões e conferências; e auxiliará outros colegas docentes
trocando opiniões, esclarecendo dúvidas e fornecendo conselhos (Lanz, 2000).
Todos os professores Waldorf reúnem-se uma vez por semana. A essa
reunião atribuíram o nome de Conferência Pedagógica cujo objectivo é fornecer
uma imagem da situação pedagógica real da escola, por meio de um debate onde
são discutidos alguns assuntos de interesse como o rendimento, as estratégias e
actividades desenvolvidas na turma ou com um aluno em particular. Através da
Conferência Pedagógica o professor consegue integrar-se facilmente na escola
(Lanz, 1986).
Para além desta, existe também a Conferência Interna que “é o órgão de
consciência e vontade da escola” (Lanz, 1986, p.166). Este órgão, segundo o
72
mesmo autor (1986) constitui o centro de decisões do corpo docente e é onde são
tratados problemas como a determinação de finalidades a alcançar, a autocrítica
dos professores, a divisão do número de alunos para a formação de turmas, a
distribuição de responsabilidades ou cargos pedagógicos e o estabelecimento de
contratos e imposição de cessação do serviço de professores
Na realidade, não é a Conferência Interna que trabalha afincadamente na
resolução destas situações. O trabalho é partilhado por diversas delegações
específicas que trabalham em determinada área como horários, matrículas de
alunos, etc. Um exemplo de uma delegação é o conselho de administração
constituído por três ou mais membros da Conferência Interna. Este tem como
função a representação da escola diante dos pais e de outros agentes envolvidos
na educação.
Devido à proximidade entre os pais e a escola, em certas organizações
Waldorf, os encarregados de educação reúnem-se em Conselho de Pais
defendendo interesses comuns e mantendo sempre o contacto com os órgãos da
escola (Ibidem).
As escolas Waldorf possuem ainda uma “Associação Mantenedora”. Ela,
como o próprio nome indica, “é uma comunidade de pessoas com responsabilidade
espiritual comum, mas também é uma instituição jurídica com uma Assembleia
Geral formada por sócios (professores; homens de negócios ligados à actividade
económica e jurídica) e uma directoria escolhida por estes” (Ibidem).
A directoria tem como função prestar assistência à escola em relação às
autoridades superiores de ensino e outras. Os seus membros não recebem
quaisquer rendimentos para exercerem esta função extra e os vencimentos dos
outros professores são organizados de acordo com o próprio corpo docente. Os
docentes podem, mesmo, estipular a sua remuneração (Idem, 2000).
Para além de todos estes aspectos, existe ainda outro essencial para o corpo
docente: a autonomia do professor.
Como o docente não está dependente de um director, uma vez que este
cargo não existe no sentido tradicional do termo, esta autonomia realizada pelos
professores apenas exige que eles veiculem uma direcção espiritual interligada aos
valores pedagógicos do ensino de Waldorf e, obviamente, aos princípios
antroposóficos (Ibidem).
74
Capítulo III – ENSINO WALDORF NO MUNDO
1. Waldorf no Mundo
A Pedagogia Waldorf, como se viu, baseia-se na Antroposofia (grego:
antropos = ser humano; sofia = sabedoria), ciência elaborada por Rudolf Steiner,
que estuda o ser humano nos seus três aspectos: o físico, a alma e o espírito.
A primeira Escola Waldorf surgiu em 1919 na fábrica Waldorf Astoria em
Stuttgart, Alemanha, após o pedido dos operários e a iniciativa do seu proprietário
Emil Molt.
Hoje, depois de 88 anos, existem 880 Escolas Waldorf no mundo, dezassete
das quais no Brasil, sendo que a primeira escola Waldorf no Brasil teve inicio em
São Paulo, no ano de 1956.
O foco principal da Pedagogia Waldorf é o de desenvolver seres humanos
capazes de, por eles próprios, darem sentido e direcção às suas vidas.
Tanto o aprimoramento cognitivo como o amadurecimento emocional e a
capacidade volitiva recebem igual atenção no dia-a-dia da escola.
O currículo, que se orienta pela lei básica da biografia humana, os seténios
(0-7 / 7-14 / 14-21 anos), oferece ricas vivências, alternando ritmicamente as
matérias do conhecimento (matemática, ciências etc.) com aquelas que se
direccionam ao sentir (artes) e ao agir (trabalhos manuais, desportos, etc.).
Além disso, todas as aulas são permeadas por uma atmosfera artística, a
exigir uma formação especial para o profissional Waldorf, que o torna um artista da
educação. O ensino teórico é sempre acompanhado pelo prático, com grande
enfoque nas actividades corpóreas (acção), artísticas e artesanais, de acordo com a
idade dos estudantes; o cultivo das actividades do pensar, inicia-se com o exercício
da imaginação, do conhecimento dos contos, lendas e mitos, até gradativamente
atingir-se o desenvolvimento do pensamento mais abstracto, teórico e
rigorosamente formal, mais ou menos na época de ensino médio. Essa não
exigência de actividades que necessitam de um pensar abstracto muito cedo é
também um dos grandes diferenciais em relação a outros métodos de ensino.
Nessa concepção, predomina o exercício e desenvolvimento de habilidades e não
75
do mero acumulo de informações, cultivando a ciência, a arte e os valores morais e
espirituais necessárias ao ser humano.
Como consequência, o jovem aluno tem grandes hipóteses de se tornar num
adulto saudável e equilibrado capaz de agir com segurança no mundo.
Pesquisas internacionais mostram que ex-alunos Waldorf são muito
procurados por empresas de grande porte, pelas suas boas auto-estima, grande
criatividade e capacidade de trabalhar em grupo.
As Escolas Waldorf formam hoje a rede independente que mais cresce no
mundo. São mais de 700 escolas, sendo que no Brasil existem 12 escolas filiadas e
várias outras em processo de filiação junto à Federação das Escolas Waldorf no
Brasil. A Pedagogia Waldorf, como é conhecida, foi idealizada pelo filósofo
austríaco Rudolf Steiner em 1919, na Alemanha, e apontada pela UNESCO como
sendo a pedagogia capaz de responder aos desafios educacionais, principalmente
nas áreas de grandes diferenças culturais.
É facto notório que, até recentemente, o sistema brasileiro de educação
mostrava-se incapaz de implementar o programa de inclusão de camadas mais
carentes da população, colocando o Brasil entre os países populosos com alto
índice de analfabetismo. Em 1990, sob os auspícios da UNESCO, Banco Mundial e
outros, realizou-se na Tailândia o encontro de ministros de educação destes países
com o objectivo de discutir a questão educacional e consolidou-se, na ocasião, a
proposta de universalização do ensino fundamental. Estes países reuniram-se
novamente em 1993, em Nova Delhi (Índia), de onde originou a carta de intenções
que explicita o plano decenal para a erradicação do analfabetismo nos países
signatários, entre os quais o Brasil é um deles. Em 1994, em Genebra (Suíça),
todas as linhas pedagógicas foram convidadas a apresentarem-se e a Pedagogia
Waldorf recebeu um destaque especial dos órgãos patrocinadores, graças à
actuação da Associação Amigos da Arte de Educar de Rudolf Steiner, resultando no
lançamento de um vídeo e de um encarte pela UNESCO sobre Pedagogia Waldorf.
Este encarte, editado em Outubro de 1994, em inglês e espanhol, pode ser
encontrado agora também em língua portuguesa, na biblioteca da Escola Waldorf
Rudolf Steiner, em São Paulo.
Após a promulgação da Constituição brasileira em 1988, grupos de
educadores e entidades ligadas à Educação começaram a organizar um projecto de
lei que viesse a substituir a LDB vigente na época. Este projecto que vinha sendo
76
formulado sobre uma concepção de democracia participativa, já tendo sido
aprovado na Câmara dos Deputados, foi substituído, no Senado, pelo projecto
Darcy Ribeiro, em Março de 1996. Tudo indica que o projecto, após algumas
modificações convertido na nova Lei de Directrizes e Bases da Educação Nacional,
teve a assessoria de pessoas que ocuparam ou ocupam cargos no Ministério de
Educação.
Esta nova LDB, chamada por alguns autores de "minimalista" por conter
poucas regulamentações, dá ampla liberdade às escolas no sentido de
apresentarem as suas Propostas Pedagógicas, além de ter incorporado alguns
conceitos inovadores para a maioria das escolas como a questão da progressão
continuada do aluno, o respeito pela relação idade/série, aspectos importantes e tão
familiares à Pedagogia Waldorf.
Para atender à legislação nova iniciou-se, em meados de 1997, com a
participação de representantes de todas as escolas Waldorf, a sistematização da
Proposta Educacional Waldorf que tinha dupla finalidade: a de produzir um
documento oficial das escolas Waldorf para apresentar à comunidade educacional e
a de servir como base para a elaboração do Regimento Escolar, que é o conjunto
de normas que viabilizam a execução da Proposta. A preocupação do grupo de
trabalho durante todo o processo foi a preservação da filosofia e da pedagogia
antroposófica tal como foram concebidas por Rudolf Steiner. Desta forma, tornou-se
possível mostrar às autoridades, os aspectos peculiares e notáveis sobretudo da
Pedagogia Waldorf e que permaneciam, na prática, restritos ao âmbito da
comunidade escolar como, por exemplo, o boletim descritivo. Com a aprovação do
Regimento Escolar, este boletim, que privilegia a avaliação qualitativa do processo
ensino aprendizagem, foi oficialmente reconhecido pelos órgãos da Secretaria da
Educação.
Paralelamente à elaboração da Proposta Educacional Waldorf, o Centro de
Formação de Professores Waldorf (Seminário) empenhou-se em oficializar-se como
curso Normal, o que aconteceu no início de 1998. O Conselho Estadual de
Educação do Estado de São Paulo pronunciou-se favoravelmente à criação do
curso fazendo referências à Federação como entidade organizadora de todas as
escolas que se orientam pela linha antroposófica.
Como consequência, em Abril de 1998 foi fundada a Federação das Escolas
Waldorf no Brasil, que hoje congrega as escolas Waldorf espalhadas pelo país, e
77
tem como um dos objectivos, consolidar a Pedagogia Waldorf na sociedade
brasileira.
Em Março de 2002, contavam-se as seguintes escolas Waldorf por
Continente, excluindo os jardins: seiscentas e trinta e uma escolas Waldorf na
Europa; vinte e duas escolas Waldorf em África; trinta e duas escolas na América
do Sul; cento e trinta e cinco escolas na América do Norte; dezoito no continente
Asiático e, finalmente, quarenta e duas escolas na Oceânia (quadro 08, em anexo).
Ou seja, seiscentas e trinta e uma escolas Waldorf no continente europeu e
duzentas e quarenta e nove escolas Waldorf fora do continente europeu.
Assim, no mundo existe a totalidade de oitocentas e oitenta escolas Waldorf.
2. Waldorf em Portugal
A Pedagogia Waldorf, foi introduzida em Portugal em 1982, mais
precisamente no centro histórico da cidade do Porto, num edifício de raiz
setecentista (com fachada prolongada por muro encimado por estatuetas em granito
atribuídas a Nicolau Nasoni) e voltada ao ocidente com o Atlântico no horizonte e o
Rio Douro a seus pés. Actualmente, esta Escola Waldorf prossegue a experiência
iniciada com a Cooperativa de Ensino Artístico que lhe deu existência e que,
durante mais de uma década, desenvolveu experiências alternativas de formação
na área das artes plásticas e do design, sob influência e como resultado da
“aventura” pedagógica ensaiada pelo movimento de artistas, professores e
intelectuais que, na década de sessenta, deu corpo à Cooperativa Waldorf do Porto,
que desenvolveu um projecto de ensino voltado para os mais novos, também
Waldorf, o qual apostava na liberdade de desenvolvimento das crianças,
valorizando nos primeiros sete anos de vida o aspecto sensorial, em detrimento do
intelectual.
Actualmente, existem apenas dois Jardins-de-infância portugueses que à
semelhança do que foi o projecto Waldorf no Porto, seguem o Ideário criado por
Rudolf Steiner. Estes jardins incluem actividades como modelar cera de abelhas,
costurar panos coloridos, amassar e cozer pão, trabalhar com materiais naturais,
como troncos de madeira, conchas e cortiça, ou tratar da horta e do jardim. Estas
são actividades que, segundo a corrente pedagógica Waldorf, desenvolvem os
78
sentidos das crianças, estimulam a imaginação, a vitalidade e a alegria de viver,
apostando sempre numa maior ligação e respeito pela Natureza.
A fundadora do Jardim-de-Infância Waldorf, em Alfragide, onde se encontram
crianças com idade inferior a 7 anos, introduziu esta pedagogia alternativa em
Portugal, em 1984. Segundo explica esta educadora, a abordagem que o método
Waldorf faz nos primeiros anos de vida centra-se mais no desenvolvimento motor e
sensorial da criança, deixando para segundo plano os aspectos intelectual e
cognitivo. É muito importante que as crianças brinquem livremente e que expressem
aquilo que elas realmente sentem, ou seja, não a partir das nossas agendas, mas a
partir daquilo que elas necessitam desenvolver e criar (Lacerda, 2002, pp. 39-41).
A formação Waldorf, de acordo com Lanz (2000) inclui as vertentes científica,
artística e estética., afirmando expressamente que a nossa prioridade é que a
criança se revele como um ser único, e portanto aquilo que lhe damos enquanto
ambiente educativo é para ela se desenvolver de acordo com a sua própria
vontade, com o que sente que precisa. Isso não quer dizer, no entanto, que ela não
tenha limites no seu processo de desenvolvimento.
A mentora do referido Jardim, em Alfragide, prefere usar a terminologia
processo de desenvolvimento do processo educativo, porque acredita que as
crianças não se educam, dado que há certos parâmetros que são comuns a todos
nós, mas há outros que são completamente individuais, que não são educáveis,
antes pelo contrário, são aquilo que cada criança traz. Um aspecto individual que é
único e com o qual todos nós também aprendemos (Lacerda, 2002, pp.39-41).
Mais a sul, no concelho Lagos, a educadora alemã, em 1992, um Jardim
Waldorf, em Barão de São João, que actualmente conta com 30 crianças.
Além da vertente artística, a educadora salienta, também, que a pedagogia
Waldorf está muito enraizada no respeito e na admiração pelo Mundo, incutindo nas
crianças a capacidade e a responsabilidade de intervir na preservação da Natureza.
Os pais que procuram o nosso jardim-de-infância desejam que os seus filhos
tenham uma formação com mais liberdade e em harmonia com a Natureza,
saudável para o corpo, a alma e o espírito (Ibidem).
Para a fundadora deste Jardim, o sistema Waldorf não é só uma pedagogia,
é também um método e uma atitude que tem a ver com uma forma global de
encarar o Mundo. No seu entender é importante dar tempo e espaço suficientes
para uma aprendizagem sem competição e sem pressas. A pedagogia Waldorf é
79
um movimento mundial com uma forte abordagem multicultural, que torna as
crianças mais autónomas e responsáveis, com consciência étnica e respeito pela
diversidade, procurando formas de se integrar e participar numa sociedade
saudável (Lacerda, 2002, pp.39-41).
No Jardim Waldorf, em Lagos, a alimentação é constituída por pratos
vegetarianos e o ambiente é internacional, mas Eva assegura que o ensino tem
como base a língua e a cultura portuguesas.
É precisamente nesta questão que se reflecte a única preocupação
relativamente a esta pedagogia manifestada pela, directora do Departamento de
Educação de Infância e Especializações Educativas da Escola Superior de
Educação de Lisboa. O modelo de Waldorf é interessante, nomeadamente porque é
contracorrente e procura uma pedagogia alternativa, mesmo ao nível da
alimentação. Mas, obviamente, não será indicada para todas as crianças, porque é
necessário que as próprias famílias também se encontrem inseridas nessa lógica de
pensamento, seguindo um estilo de vida alternativo, com menor consumismo e
maior ligação à Natureza (Ibidem).
A referida directora entende, também, que na aplicação ao contexto
português, a pedagogia de Waldorf deveria ultrapassar os aspectos específicos do
país de onde é originária (Alemanha). Deveria ser mais permeável à realidade
portuguesa e às nossas tradições, fazendo uma maior aculturação ao contexto
português.
Actualmente existem mais de setecentas escolas em todo o Mundo que
trabalham com a pedagogia de Waldorf, sendo que em Portugal os dois Jardins-de-
infância supramencionados, uma escola de educação especial, em Seia, e a Escola
Waldorf, no Porto, recorrem a esta pedagogia.
A LBSE estabelece o quadro geral do sistema educativo. Teoriza a
organização do sistema educativo, de modo a contribuir para a defesa da identidade
nacional e para o reforço da fidelidade à matriz histórica de Portugal, através da
consciencialização relativamente ao património cultural do povo português (Lei nº.
46/86, de 4 de Outubro, alínea e) do artigo 3º,).
O sistema escolar subordina-se aos propósitos educativos mais gerais,
estando reforçado pelo enunciado do ponto 2, o qual se refere ao direito
constitucional à educação segundo três sectores finalistas também
constitucionalmente prescritos: o desenvolvimento global da personalidade, o
80
progresso social e a democratização da sociedade, representando os fins últimos
que orientam todo o sistema educativo português.
O teor geral da Lei consagra uma forte componente estatal do sistema
educativo ainda que sujeita a uma tensão de sentido dinâmico entre um desejo
monopolizador da realização educativa por parte do Estado e a sua atribuição mais
repartida por outras entidades sociais.
É da responsabilidade de um único Ministério a coordenação de toda a
política relativa ao sistema educativo, independentemente das instituições e
entidades que o compõem. Em consequência, toda a iniciativa e instituição que se
deseje integrada no sistema educativo fica sujeita à coordenação do ministério
próprio, como é óbvio, do Ministério da Educação.
Assim, toda a educação, em todas as instituições, em todo o território, é
regulada pela acção politico-governamental mediada pelo Ministério da Educação.
As iniciativas e instituições que não se sujeitarem a esta coordenação, sejam quais
forem as razões e as especificidades em causa, não fazem parte do sistema
educativo definitivo e regulado na Lei. O sistema é único e uniforme para todo o
território nacional.
Os princípios consagrados ao longo da Lei, são de três tipos: os princípios
gerais, os princípios organizativos e os princípios específicos ou particulares.
O conjunto dos princípios gerais institucionaliza:
O direito à educação e à cultura; a democratização do ensino traduzida numa justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares; a liberdade de aprender e de ensinar; o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito critico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva (LBSE, Artigo 2º).
A LBSE procura definir um modelo de cidadão a ser educado, dando origem
à definição de correspondente modelo educativo. O cidadão ideal, de acordo com
os âmbitos e princípios da Lei de Bases do Sistema Educativo, deverá ser livre,
responsável, autónomo, solidário, possuidor de um espírito democrático e pluralista,
respeitador dos outros, das suas ideias e das suas culturas, aberto ao diálogo e à
livre troca de opiniões, crítico e criativo em relação ao meio social, capaz de uma
reflexão consciente sobre os valores espirituais, estéticos, morais e cívicos,
81
possuidor de capacidade para o trabalho e para a vida activa e ainda para a
utilização criativa dos tempos livres (Lindinho, 2003).
Porém, a mesma LBSE não define claramente, e de modo análogo, um
modelo de sociedade em que este cidadão se integra. No entanto, não só de um
modelo de cidadão se pode inferir o modelo de sociedade.
Na LBSE, há uma nítida valorização do homem como elemento essencial e
central da sociedade, sendo o centro do projecto educativo que é claramente
explicitado na Lei quando esta se refere à valorização de dimensão humana do
trabalho, isto é, fica subentendido que, na relação individuo/trabalho, aquele não se
subordina a este. Não se procura a formação do indivíduo com vista à sua
adequação ao trabalho, mas antes, este se deve adequar à dimensão humana.
Por outro lado, a LBSE consagra alguns princípios com implicação directa no
modelo organizativo do sistema educativo: assegurar a formação moral e cívica,
bem como para o trabalho; descentralizar, desconcentrar e diversificar as estruturas
e acções educativas; desenvolver a participação das populações nas acções
educativas, nomeadamente, dos alunos, docentes e famílias, na definição da
política educativa, na administração e gestão do sistema escolar e na experiência
pedagógica quotidiana; promover a correcção das assimetrias regionais no que
concerne aos benefícios da educação, da cultura e da ciência; assegurar a
existência de uma escolaridade de segunda oportunidade; assegurar a igualdade de
oportunidade para ambos os sexos (Ministério da Educação, 1998).
A LBSE determina, ainda no Artigo 2.º, alíneas f) e g), que, ao nível do
ensino básico, se assegure uma formação geral comum a todos os portugueses, na
qual sejam equilibradamente interrelacionados. A cultura escolar e a cultura do
quotidiano deverão ser a exemplificação deste equilíbrio inter-relacionado. Daí
estabelecer que se fomente a consciência nacional aberta à realidade concreta e se
desenvolva o conhecimento e o apreço pelos valores característicos da identidade,
língua, história e cultura portuguesas.
O sistema educativo organiza-se de forma a contribuir para a defesa da
identidade nacional e para o reforço da fidelidade à matriz histórica de Portugal,
através da consciencialização relativamente ao património cultural do povo
português, no quadro da tradição universalista europeia; contribuir para a realização
do educando, através do pleno desenvolvimento da personalidade, da formação do
carácter e da cidadania, preparando-o para uma reflexão consciente sobre os
82
valores espirituais, estéticos, morais e cívicos e proporcionando-lhe um equilibrado
desenvolvimento físico; assegurar a formação cívica e moral dos jovens; assegurar
o direito à diferença; desenvolver a capacidade para o trabalho; contribuir para a
realização pessoal e comunitária dos indivíduos; entre outros (LBSE, artigo 3º).
O desenvolvimento curricular do sistema educativo, de acordo com a LBSE,
terá em conta a promoção de uma equilibrada harmonia, nos planos horizontal e
vertical, entre os níveis de desenvolvimento físico e motor, cognitivo, afectivo,
estético, social e moral dos alunos, entre outros aspectos, atrás referenciados
(Conselho Nacional de Educação, 2002).
A mesma Lei prevê que façam parte integrante da rede escolar, todos os
estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que se enquadrem nos
princípios gerais, finalidades, estruturas e objectivos do sistema educativo, bem
como que seja possível, às instituições de ensino particular e cooperativo, o
exercício da liberdade de ensinar e aprender, seguir os planos curriculares e
conteúdos programáticos do ensino a cargo do Estado ou adoptar planos e
programas próprios, após criteriosa análise dos respectivos currículos e condições
pedagógicas da realização do ensino (Lindinho, 2003).
A lei estabelece a escolaridade obrigatória que coincide com o ensino básico
de nove anos, objectivando assegurar uma formação geral comum a todos os
portugueses. Como características essenciais, o ensino básico comporta três ciclos
sequenciais, com objectivos específicos de cada ciclo, subordinados aos objectivos
gerais que conferem a unidade global do ensino básico (Ministério da Educação,
1998).
O ensino básico conduz a uma formação, a qual é geral e não especializada,
sendo comum e não socialmente diferenciada e é destinada a todos os
portugueses, constituindo-se, assim, universal.
Em geral, preconizam-se objectivos em diferentes planos: no plano pessoal,
pretende-se a descoberta e o desenvolvimento: dos interesses e aptidões de cada
um; da capacidade de memória e de raciocínio; do espírito crítico e da criatividade;
do sentido moral e da sensibilidade estética; das aptidões físicas e motoras; no
plano de relacionamento social, procura-se: a realização individual em harmonia
com a solidariedade social; o desenvolvimento da maturidade cívica e sócio-
afectiva; a aquisição de atitudes autónomas, civicamente responsáveis e
democraticamente intervenientes; o desenvolvimento da consciência nacional,
83
numa perspectiva do humanismo universalista e da solidariedade e cooperação
internacional; o aprofundamento desta consciência nacional pelo desenvolvimento
da língua, da história e da cultura portuguesas; no plano das aquisições cognitivas,
procura-se: combinar o saber e o saber fazer, a teoria e a prática, a cultura escolar
e a cultura do quotidiano; promover o interesse pela actualização de conhecimentos
tendo em vista uma permanente valorização pessoal do saber; promover, no
desenvolvimento curricular, a valorização e a organização dos saberes, tendo em
vista a possibilidade de prosseguimento de estudos, da inserção em esquemas de
formação profissional, da aquisição de métodos e instrumentos de trabalho pessoal
e em grupo que levam à valorização da dimensão humana do trabalho; no plano do
comportamento institucional, deve a escola: criar condições de promoção escolar e
educativa para todos os alunos; colaborar com as famílias, pela participação no
processo de informação e orientação educacionais; dispensar atenção especial às
crianças com necessidades educativas específicas (Lindinho, 2003).
As instituições escolares responsáveis pelo ensino obrigatório, como
quaisquer outras, são meios ecológicos de socialização especializada, cuja
influência é complementada pela de outros ambientes: a família, o grupo de iguais,
os meios de comunicação.
A escola tem uma virtualidade socializadora limitada e é preciso reconhecer-
lhe não só o valor que o seu poder realmente tem, bem como o que se torna
necessário ao cumprimento da sua missão intelectual e formativa mais
especializada; é necessário que se torne explícito o apoio das demais instâncias
que com ela compartilham a responsabilidade de mostrar estilos de vida, valores e
práticas dignificantes do ser humano, que também melhoram a sociedade (Idem).
A escolaridade obrigatória, como projecto humanizado que é, reflectiu, e
continua a fazê-lo, uma aposta no progresso dos seres humanos e na sociedade. É
um projecto optimista que deve ser extensível a todos, visto que se apoia nos
valores da racionalidade e da democracia, que eleva a condição humana. Se é um
direito universal, não pode ser negado a ninguém.
Após a LBSE, surgiu o Decreto-Lei n.º 43/89, de 3 de Fevereiro, que, para
concretizar a autonomia das escolas exige a elaboração do Projecto Educativo:
A autonomia da Escola concretiza-se na elaboração de um projecto educativo próprio, constituído e executado de forma participada, dentro dos princípios da responsabilização dos vários intervenientes na vida escolar e adequação a características e recursos da Escola às solicitações e apoios
84
da comunidade em que se insere Decreto – Lei nº.43/89, de 3 de Fevereiro.
O conceito de Projecto Educativo advém, antes de mais, das primeiras
propostas apresentadas no âmbito da actividade da Comissão da Reforma do
Sistema Educativo (1987 – 1988), como uma das formas de garantia da Autonomia
das escolas. De acordo com Costa (1991), faz sentido conceber, elaborar e
construir o Projecto Educativo de Escola no âmbito da autonomia e para dar corpo a
essa mesma autonomia. Como tal, falamos de uma Escola ou, no dizer de
Formosinho (1999) comunidade educativa, quando existe uma autonomia
pedagógica e administrativa. O que garante a essência da escola é, porém, a
autonomia da mesma, a qual é assegurada pelo Projecto Educativo que se trata de
um instrumento fundamental para a mudança da Escola de Serviço Local dos
Estado, para Comunidade Educativa, isto é, para uma escola com autonomia e
personalidade próprias (Canário, 1992).
Nesta ordem de ideias, o Projecto Educativo é concebido como um
instrumento organizacional de expressão da vontade colectiva da Escola –
comunidade educativa –, um documento e instrumento ao serviço da nova escola.
A Escola, na sua caminhada autónoma, deverá definir uma linha de
orientação fundamental, que norteie as múltiplas actividades que ocorrem no seu
quotidiano. Daí que, dessa linha de orientação, deverão ocorrer objectivos amplos,
que sirvam de enquadramento à acção, opção pedagógica ou projecto educativo
que se pretenda implementar. Interessa, no Projecto Educativo da Escola, de
acordo com Costa (1991), uma perspectiva de desenvolvimento e qualidade que se
deseja para o produto da Escola. Claro que essa perspectiva não pode ser
incompatível com a política definida a nível local, regional e nacional, tendo sempre
em consideração as leis fundamentais do Sistema Educativo Nacional.
A Escola aparece, assim, como uma organização enquanto entidade social
complexa e onde se interrelacionam várias estruturas e múltiplos intervenientes:
alunos, pessoal docente, pessoal não docente, pais e comunidade em geral,
contribuindo todos para uma mesma finalidade e missão.
De facto, são várias as definições de Projecto Educativo, porém, todas elas
convergem para o carácter dinâmico e essencial de uma gestão estratégica voltada
para a Autonomia e identidade da escola que o concebe.
85
O Projecto Educativo da Escola surge quando se reconhece que a qualidade
da formação escolar passa pelo envolvimento das escolas e dos agentes
educativos na configuração de acções adequadas à população que as vão viver.
“Formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de
destrezas (Freire, 1997, p.15); por outras palavras, a escola é uma instituição
geradora de educação e não de mera instrução. E a realização deste processo
passa pelo reconhecimento da autonomia das escolas e pelo reconhecimento dos
professores não como meros consumidores do currículo (Leite, 2000).
Segundo Adelino Costa (1994, p. 36), o PEE “um documento de carácter
pedagógico que, elaborado com a participação da comunidade educativa,
estabelece a identidade própria de cada escola através da adequação do quadro
legal em vigor à sua situação concreta, apresenta um modelo geral de organização
e os objectivos pretendidos pela instituição e, enquanto instrumento de gestão, é
ponto de referência orientada na coerência e unidade da acção educativa”.
A organização escola tem três vertentes fundamentais que coincidem com as
principais áreas de gestão escolar: Pedagógico Didáctica; Gestão Administrativa e
Financeira e Gestão Funcional e dos Espaços.
A escola surge, deste modo, como uma organização enquanto entidade
social complexa (Costa, 1996), onde se interrelacionam várias estruturas e múltiplos
intervenientes: alunos, pessoal docente, pessoal não docente, pais e comunidade
em geral, contribuindo todos para uma mesma finalidade e missão.
A área da gestão pedagógico-didáctica enquadra todas as actividades,
projectos, recursos, órgãos e serviços relacionados directamente com o ensino e a
educação; a área que faz despoletar todo o potencial humano dos utentes de um
estabelecimento de ensino.
Sendo assim, o termo projecto tem, no âmbito da teoria pedagógica, uma
referência imediata: a chamada pedagogia do projecto. Uma perspectiva
pedagógica que faz do trabalho do projecto a metodologia fundamental do processo
educativo (Carvalho, 1998).
Sabe-se, por um lado, que existem órgãos próprios na Escola, com
competências e atribuições de índole didáctica e pedagógica. Todavia, o acto
educativo e o acto de ensinar e aprender não podem ser exclusivo deste ou daquele
serviço, ou órgão da Escola. Daí que, numa Escola, todos nós temos
86
responsabilidades: não só perante os alunos, como com a própria sociedade
(Gómez, 1998).
A pedagogia do projecto surge como defesa de uma escola viva, autónoma,
criativa, em desafio, da mudança, entre outras. Assim sendo, o Projecto Educativo,
bem como o Plano Anual de Actividades da Escola baseiam-se nas carências,
preocupações e anseios da Escola. Aliás, esta pedagogia do projecto identifica-se
com a própria especificidade do ser humano: a criança, o adolescente, o adulto são
seres em projecto e de projectos. Daí que, como corolário lógico, a pedagogia seja
um dos campos em que a existência do projecto personifique uma razão essencial
para a sua própria compreensão. Uma dinâmica rica e saudável duma Escola
perpassará, antes de mais, pelo envolvimento de todos, quer na inventariação dos
problemas, quer na partilha de responsabilidades para a sua resolução
(Formosinho, 1999).
No intróito do Decreto-Lei nº.115 – A/98, de 4 de Março, alterado pela Lei nº.
24/99, de 22 de Abril, pode-se ler:
A autonomia das Escolas e a descentralização constituem aspectos fundamentais de uma nova organização da Educação (…). O presente diploma dá especial atenção às escolas do 1º.Ciclo do Ensino Básico e aos Jardins de Infância, integrando-os, de pleno direito, numa organização coerente da autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos de educação (…).
Toda a dinâmica da Escola espelha-se, acima de tudo, no seu Projecto
Educativo e no Plano Anual de Actividades e revê-se na sua concretização.
A gestão Pedagógico – Didáctica incide, essencialmente, nas relações
interpessoais, inerentes ao acto e actividades educativas e nas relações ensino -
aprendizagem, inerentes à didáctica das disciplinas.
O Projecto Educativo constitui um documento que consagra a orientação
educativa da escola ou do agrupamento de escolas, elaborado e aprovado pelos
seus órgãos de administração e gestão, no qual se explicitam os princípios, os
valores, as metas e as estratégias, segundo os quais a instituição escolar propõe
cumprir a sua função educativa, tornando-se de grande importância, porque surge
com a participação empenhada de todos os utentes e organismos externos da
intervenção indirecta na vida da Escola e que, por isso, estabelece as linhas de
orientação da mesma, o que, aliás, ficou consagrado no n.º 1 do Art.º 2.º do
Decreto-Lei nº. 43/89, de 3 de Fevereiro, onde se estipulou que, pelo menos numa
87
perspectiva legal, a autonomia da Escola é “a capacidade de elaboração e
realização de um projecto educativo em benefício dos alunos e com a participação
de todos os intervenientes no processo educativo”.
Assim, o Projecto Educativo (Idem) surge como o documento vértice e o
ponto de referência, orientador de toda a actividade escolar, concretizado sempre
num plano de actividades escolares, e deverá desenvolver os seguintes tópicos:
“concepção de Educação e valores fundamentais a defender; caracterização geral
do meio físico, social, económico e cultural, onde a Escola se insere; objectivos
gerais de âmbito pedagógico, administrativo, financeiro, âmbito funcional e dos
espaços; prazo de duração do projecto educativo e formas de o avaliar e de o
rever”.
A elaboração do Projecto Educativo não é apenas um trabalho dos gestores
da Escola mas, sim, diz respeito a toda a comunidade educativa, através da
participação dos vários intervenientes no processo educativo: professores, alunos,
pais, pessoal não docente, comunidade local, através dos seus representantes.
No sentido da Escola poder dispor de margens suficientes de autonomia para
a definição e implemento do seu Projecto Educativo têm vindo a ser
descentralizadas e desconcentradas, de forma gradual e em crescendo, algumas
das competências de decisão e de níveis de administração, sendo que na LBSE a
distribuição de poderes aparece como um princípio orientador da organização do
sistema educativo, e como um princípio político, inerente à concepção do estado
democrático (Lima, 2002).
Há distribuição de competências entre os vários níveis de administração da
educação e, como tal, um suporte significativo ao desenvolvimento do sistema
administrativo de ensino, com base no princípio da descentralização.
Aqui, pressupõe-se, então a possibilidade da liberdade de acção no sentido
da implementação de um modelo científico-pedagógico descentralizado, ou seja,
passível de introduzir novas pedagogias, novas formas de acção e actuação
educativas, remetendo, então para a possibilidade da implementação da pedagogia
Waldorf nas escolas portuguesas.
Pesa embora, o conceito de autonomia se utilize em diversos campos de
aplicação de que resulta uma polissemia, de acordo com diferentes enfoques e
perspectivas, apresentando-se sobre variadas modalidades, importa, então, que a
mesma seja implementada pelos próprios membros da instituição.
88
Neste sentido, os serviços de educação e ensino integram-se no Estado –
Administração, ou seja, as funções técnicas da actividade administrativa do estado
requerem uma certa liberdade de acção, tal como Fernandes (1998, p.37) refere
quando afirma:
Não é susceptível de apreciação jurídica em termos de justo ou injusto, dado que a sua matéria e o seu modo de apreciação não são jurídicas. São matérias de natureza científica e pedagógica e é em termos científicos e pedagógicos que podem ser apreciadas ou valoradas.
Em suma, Fernandes (Idem, p.8) reforça a ideia, referindo que o conceito de
autonomia:
Tem uma natureza dimensional… caracteriza uma colectividade ou agrupamento territorial… significa descentralização… caracteriza as unidades orgânicas que dispõem de alguma margem de discricionariedade para regular a sua ordem social concreta sem prejuízo de esta poder vir a ser alterada ou definida de forma diferente pelos órgãos que dirigem essa colectividade ou agrupamento.
Porém, para que a autonomia das escolas seja uma realidade é premente
reforçar a necessidade de articulação em vários domínios no que concerne ao
processo de transferência de competências para as escolas. Barroso (1995, p.39)
chama essa atenção ao afirmar que o reforço de autonomia da escola:
Não pode ser definido de um modo isolado… deve ser articulado com medidas a tomar noutros domínios: reorganização e redefinição funcional do aparelho de Estado, a nível central e regional; processo de transferência de competências para as autarquias; corresponsabilização da sociedade local na prestação do serviço público… através de múltiplas parcerias de natureza sócio-educativa.
Na perspectiva deste autor, a autonomia das escolas tratar-se-á sempre de
uma autonomia relativa, dado estar sujeita aos poderes de superintendência e tutela
do Estado-Administração, ao qual cabe a função de garantir a coerência nacional, a
equidade dos serviços e democraticidade, preservando e aumentando o seu papel
regulador.
Formosinho (1998) torna presente que a autonomia diverge da
independência e permite desvios em relação às normas do sistema educativo.
Nesta linha, o Estado determina os objectivos, corrige os desequilíbrios e as
desigualdades, desempenhando um papel de acompanhamento, como um efectivo
parceiro educativo, distanciando-se do simples papel regulamentador.
89
Consequentemente, o conceito de autonomia apresenta um contexto diverso
do ponto de vista jurídico-administrativo, dependendo da natureza da actividade
sobre a qual incide, podendo falar-se em “autonomia política, autonomia
administrativa, autonomia financeira, autonomia pedagógica e autonomia científica”
(Idem, p.46), as quais representam as diferentes modalidades de autonomia. Neste
sentido, a autonomia dos estabelecimentos de ensino constitui um factor importante
no desenvolvimento de iniciativas locais, uma vez que permite maior liberdade no
trabalho dos professores. É revestida por diferentes aspectos, manifestando-se
primeiramente na gestão de recursos.
À luz do mesmo autor, a autonomia política consiste em dispor do poder de
orientação política, da criação de leis, da escolha dos governantes, implicando
necessariamente a descentralização. A autonomia administrativa surge do exercício
da função jurídica – administrativa que consiste na prática de diversos actos
administrativos, traduzindo-se no poder de regulamentar (produzir normas; gerar
receitas próprias e aplicá-las segundo um orçamento elaborado livremente; gerir
património e, finalmente, recrutar livremente pessoas para os seus serviços). A
autonomia científica refere a capacidade de criar currículos, pela sua livre escolha e
pela possibilidade de investigação e divulgação. A autonomia pedagógica inclui a
escolha dos métodos e técnicas de ensino-aprendizagem, bem como a escolha do
sistema de avaliação, dos órgãos de gestão intermédia, das estruturas pedagógicas
e da definição da sua composição e respectivas competências.
Pretende-se que o projecto educativo, tal como afirma Rocha (1996), possa
contribuir, de algum modo, para que a escola ganhe, finalmente, no nosso país, o
direito à cidadania organizacional e à centralidade efectiva na reforma educativa.
Como refere Delors (2005, p.148) a noção de “projecto de Escola”, em certos
países, mostra bem esta vontade de alcançar um conjunto de objectivos que
permitam melhorar a vida da instituição escolar e a qualidade de ensino”, garantindo
a sua autonomia, através da adopção de uma atitude aberta, perante a mudança.
Como se tem vindo a desenvolver, a educação, em geral, e o acto educativo,
em particular centram-se no desenvolvimento da pessoa humana, sendo que o
regime de autonomia permite que as escolas, através do seu Projecto, façam
opções educativas e pedagógicas, de acordo com a realidade local e os princípios
gerais das políticas educativas, como é normal no estado de direito.
90
Assim, na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) aprovada pela Lei n.º
46/86 de 14 de Outubro, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º
115/97, de 19.09, e pela Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto, tem-se presente uma
ideia específica de Homem, de Sociedade, de Educação, de Escola, de Professores
e de Alunos, que estão na génese dos seus princípios, sendo que a legislação
portuguesa aponta no sentido de convergência de sinergias para o
“desenvolvimento integral desta ideia de homem” (Lindinho, 2003).
A própria Constituição da República Portuguesa, em vigor, estipula que a
República Portuguesa se rege por princípios éticos, sendo que nos artigos 1.º e 73.º
se sustenta que ela “é baseada na dignidade da pessoa humana e que está
empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, devendo a
educação, a que todos têm direito, contribuir para o progresso social e para a
participação democrática na vida colectiva”. A mesma Constituição, ao logo do seu
articulado explicita diversos valores e/ou direitos, dos quais, pela sua relevância na
educação, se salientam: liberdade, justiça, paz, tolerância e compreensão mútua,
solidariedade, participação cívica, trabalho, família, maternidade e paternidade,
educação, saúde, património cultural, natureza e recursos naturais (Miranda, 1976).
Na mesma linha de valores, a LBSE explicita no n.º 2 do artigo 1.º e no n.º 1
do artigo 47.º que o desenvolvimento da personalidade deve ser integral,
contemplando os domínios cognitivo, afectivo, estético, físico e motor, social e
moral.
Analisando a LBSE, constata-se que, no seu articulado, estão explícitos
valores e atitudes que o Relatório da Comissão Executiva do grupo coordenador
para o estudo da Formação, Pessoas e Social, no quadro do Desenvolvimento
Curricular dos Ensinos Básico e Secundário (1989) considera quatro grupos de
atitudes, indissociáveis entre si, referidas ao “eu” em “si mesmo”, à “alteridade” do
“eu”, à “cidadania” do “eu” e à “universalidade” do “eu”, da forma que melhor
seguidamente se descreve:
a) Referidas ao “Eu em Si Mesmo”: sentido do ser autónomo livre e
responsável; sentido de iniciativa; sentido de realização pessoal; sentido
de trabalho como realização pessoal; confiança em si mesmo; descoberta
dos interesses e aptidões pessoais; curiosidade científica; espírito crítico
e reflexivo; disponibilidade à mudança; gosto pela actualização
permanente; abertura aos diferentes saberes; atitude reflexiva quanto a
91
valores espirituais, estéticos e morais; sentido de responsabilidade moral
e do carácter.
b) Referidas à “Alteridade do Eu”: respeito pelos outros – o conhecimento é
direito à diferença; abertura ao diálogo e livre troca de opiniões;
cooperação; solidariedade.
c) Referidas à “Cidadania do Eu”: sentido da responsabilidade social e
cívica; sentido da dimensão do trabalho; espírito crítico e criativo,
empenhado no progresso do país; apreço pelos valores de identidade
nacional (língua, cultura, história…).
d) Referidas à “Universalidade do Eu”: sentido da dimensão humana do
trabalho; sentido do humanismo; sentido da solidariedade e cooperação
internacionais; abertura às culturas dos diferentes povos.
A tudo o que foi dito, subjaz algo não dito, mas que, evidentemente, se tem
de pressupor, e todos devem fazê-lo, para que não falte inteligibilidade. O
pressuposto é a própria noção de valor. De facto, tudo isto só tem sentido se se
partir do princípio de que a cultura é um valor, a educação é um valor, o homem e a
pessoa são valores. Tudo isto só tem sentido para um ser que valorize, que crie
valores e aprecie segundo valores (Reboul, 2000).
E se a educação é um valor, um outro aspecto é saber que valores norteiam
a educação em Portugal. Em que valores se fundam e que valores se procuram
realizar? Ou, por outra, quais os objectivos, fins ou finalidades fundamentais que a
educação persegue e prossegue?
Em síntese, o ordenamento jurídico português permite, através do regime de
autonomia das escolas, e da construção do seu projecto educativo, a
implementação da pedagogia Waldorf, sendo certo que persistem muitas e diversas
resistências à mudança.
Partir-se-á, seguidamente à análise empírica que retrata as especificidades
pedagógico-funcionais no Ideário Waldorf, da Escola Artística Waldorf, localizada no
Porto e do Jardim-de-infância Waldorf, localizado em Alfragide.
93
Capítulo IV – Fundamentação da Metodologia e procedimentos de
investigação
1. Delimitação do Problema
“A Pedagogia Waldorf: um contributo para a Educação em Portugal” –
reveste-se de uma importância considerável, tendo em conta as dinâmicas globais
de educação, a lógica e as tensões internas da própria comunidade educativa e os
desafios com que a política educativa se confronta.
A revisão da literatura específica alerta para um conjunto de factores
determinantes de resposta/alternativa à crise educacional sentida nas escolas
portuguesas, principalmente pelos docentes que delas fazem parte, no que
concerne ao sentimento de desajuste do modelo de escola actualmente
preconizado perante a sociedade, tendo sido possível encontrar um modelo de
escola de cunho inovador que contém propostas ideológicas, pedagógicas,
filosóficas, … que incitam à sua análise e reflexão.
Julga-se, pois, de interesse, analisar o problema num contexto filosófico-
social e educativo que muito influi na actividade/atitude educativa de todos os
profissionais da educação.
Assim, à luz da definição do problema em estudo – Que contributo dá a
Pedagogia Waldorf para a Educação em Portugal? – propõe-se analisar a
importância do ensino Waldorf, como promotor da prática artística, dado que o
modelo pedagógico actualmente definido nas escolas, ainda funciona em termos
mecanicistas, assente na memória, no exame e na nota.
2. Objectivos do Estudo
Numa altura em que se busca uma visão optimista de resposta/alternativa à
crise educacional sentida nas escolas portuguesas, principalmente pelos docentes
que delas fazem parte, no que concerne ao sentimento de desajuste do modelo de
escola actualmente preconizado perante a sociedade de informação, julga-se
importante reflectir sobre o modelo de escola Waldorf, de cunho inovador com as
94
suas propostas ideológicas, pedagógicas, filosóficas, … que incitam à sua análise.
Deste modo, em consonância e à luz da definição do problema em estudo – Que
contributo dá a Pedagogia Waldorf para a Educação em Portugal? – propõe-se
prosseguir alguns objectivos:
● Compreender a Pedagogia Waldorf no seu todo
● Verificar o reconhecimento e o valor da pedagogia Waldorf
● Perceber a reacção da comunidade, em geral, face à existência desta
pedagogia
● Conhecer os contributos e as expectativas dos educadores Waldorf,
relativamente à pedagogia implementada;
● Conhecer o ideário desta pedagogia e o seu enquadramento na actual Lei
de Bases do Sistema Educativo;
● Conhecer as vantagens deste tipo de pedagogia
● Reflectir sobre a pertinência na implementação desta pedagogia no
sistema educativo português.
Para além dos objectivos já apontados, relacionados com a pertinência e
actualidade do tema em questão, outros há, de natureza pessoal e profissional que
poderão constituir um incentivo à prossecução da tarefa em estudo,
nomeadamente: a auto-realização profissional; a realimentação da curiosidade
intelectual dos educadores/docentes pelos problemas educacionais e o alargar
conhecimento acerca da importância das pedagogias alternativas, tendo em conta
os princípios da Lei de Bases do Sistema Educativo, a própria Constituição da
República e os direitos do Homem, como pessoa e como cidadão.
3. Opções Metodológicas
Esta investigação enquadra-se no paradigma da investigação qualitativa,
com recurso à entrevista semi-directiva (ou clínica ou estruturada) em que o
inquiridor determina previamente os temas sobre os quais inquire, com uma ordem
e forma deixada ao seu critério. A expressão “investigação qualitativa” só começou
a ser usada depois de 1960 mas tem vindo a ganhar relevo como estratégia de
investigação, no estudo das questões educacionais. Tendo por base uma
95
perspectiva hermenêutica e interpretativa, ou seja, a partir da indução permite
compreender os fenómenos, nomeadamente os fenómenos educativos.
Segundo Ludke & André (1986, p.18) o estudo qualitativo desenvolve-se
“numa situação natural, é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível
e localiza a realidade de forma completa e contextualizada”. Neste contexto, torna-
se relevante conhecer os pareceres dos educadores, que ajudam a compreender a
vivência e visão educativa que possuem, as mudanças ocorridas dos diferentes
níveis e as suas relações interpessoais, contextualizadas num tempo e num espaço
real.
De acordo com Bogdan & Biklen (1994, p.47) a investigação qualitativa
apresenta cinco características fundamentais:
O ambiente natural constitui a fonte directa de dados, sendo o investigador o instrumento principal dessa recolha de dados; a sua principal preocupação é descrever e só secundariamente analisar, minuciosamente, os dados recolhidos; os investigadores interessam-se mais pelo processo do que pelo produto, ou seja a questão fundamental é todo o processo, o que aconteceu, como aconteceu, bem como o produto e o resultado final; os dados são analisados indutivamente, como se reunissem, em conjunto, todas as partes de um puzzle, e não com o objectivo de confirmar ou informar hipóteses construídas previamente; o significado das coisas, ou seja, o porquê, o quê e o como é vital na abordagem qualitativa.
No entanto, “nem todos os estudos que se consideraria qualitativos
patenteiam estas características com igual eloquência” (Ibidem).
Nesta linha de ideias, admite-se a existência de quatro fases na investigação
qualitativa, que se tornam fundamentais: uma fase de preparação, planificando e
reflectindo acerca das etapas seguintes; uma fase de trabalho de campo e, por fim,
uma fase analítica e informativa. Tendo em conta as fases anteriormente descritas,
constituiu uma preocupação a realização de uma pesquisa bibliográfica credível e
actual, que ajudasse a preparar as fases seguintes. Essa recolha serviu de apoio à
organização de um guião (em anexo), que serviu de base à realização das
entrevistas. Numa segunda fase, passou-se ao trabalho de campo, realizando as
entrevistas.
Considera-se que a entrevista é a que melhor se enquadra neste estudo,
pois, é através do discurso dos entrevistados que se busca o verdadeiro sentido por
eles atribuído à educação e particularmente à Pedagogia Waldorf. Por isso, é
assumida a posição de investigadora interpretativa, uma vez que procuramos
96
compreender, sem avaliar, as posições e argumentos apresentados pelos
entrevistados, para justificarem a sua opinião.
Tendo em conta que qualquer metodologia deve ser escolhida de acordo
com os objectivos traçados para a investigação, bem como, de acordo com o tipo
de resultados que se espera e o tipo de análise que se pretende efectuar,
considera-se que o recurso à entrevista semi-estruturada, entre outras, seria o mais
viável, uma vez que os entrevistados terão os mesmos pontos de referência. Além
disso, permite “alguma cumplicidade entre o entrevistador e o entrevistado,
facilitando o desenvolvimento da entrevista. Estas entrevistas permitem também
uma maior flexibilidade no desenvolvimento, uma vês que permitem, ao
entrevistado, exprimir-se com alguma profundidade” (Quivy & Campenhoudt, 1992,
p.194).
Tratando-se e uma processo bastante aprofundado e detalhado, fica-se com
“a certeza de obter dados comparáveis entre os vários sujeitos” (Bogdan & Biklen,
1994, p.135), permitindo aceder aos pensamentos dos entrevistados, através da
expressão, das “suas percepções de um acontecimento ou de uma situação, (d)as
suas interpretações ou (d)as suas experiências” (Quivy & Campenhoudt, 1992,
p.194).
Relativamente à entrevista, procedeu-se à sua estrutura, seleccionando os
temas a abordar, as escolas/jardins onde seria aplicada, o tempo disponível e o
universo dos entrevistados. Em sequência, elaborou-se um guião (anexo1)
constituído por um conjunto ordenado de questões semi-abertas, ou seja, parte da
resposta fixa e outra livre, contendo os assuntos a tratar.
No que concerne à preparação da entrevista, teve-se o cuidado de utilizar
uma linguagem acessível, as questões claras, simples e curtas, de modo a facilitar
a compreensão dos conceitos a abordar, os quais iam de encontro às realidades
vividas pelos entrevistados.
As entrevistas decorreram durante o mês de Julho, nos locais de trabalho
dos entrevistados, de forma individual, demorando, conforme os casos, entre 1 hora
a 3 horas. De forma a preservar o anonimato pessoal dos entrevistados e do próprio
local de trabalho, os nomes apresentados não corresponderão à realidade, apenas
as funções desempenhadas por eles. Atribuiu-se, então, como nomes dos
entrevistados as letras A, B, C e como instituições que representam, as seguintes
97
“Escola das Virtudes Waldorf”, “Projecto Waldorf” e “Jardim-de-Infância Waldorf”,
respectivamente.
4. Caracterização da Amostra
Encarando esta investigação como uma oportunidade para reflectir sobre o
papel da educação nos dias de hoje e sobre as respostas alternativas ao ensino
actualmente preconizado nas escolas públicas, circunscreve-se ao grupo
profissional que trabalha seguindo o ideário preconizado por Rudolf Steiner, nas
Escolas Waldorf.
Dadas as características deste estudo e tendo em conta a trajectória de
existência dos projectos Waldorf, optou-se por seleccionar três entrevistados,
identificados por A, B, C, seguindo os seguintes critérios:
− Ter experiência num projecto baseado nos princípios da Pedagogia
Waldorf.
− Ter desempenhado funções de educador/professor ou de direcção em
estabelecimentos de Pedagogia Waldorf.
− Interesse em serem entrevistados.
Decidiu-se que se deveria agrupar as diferentes entrevistas, tratando-se da
mesma questão, com o objectivo de se poder, sempre que possível, fazer ao
mesmo tempo um estudo comparativo das práticas, das opiniões e das atitudes,
dos profissionais ligados ao ensino alternativo Waldorf, em diferentes projectos,
funções e localidades. No próximo capítulo apresentar-se-ão as características dos
entrevistados e a consequente análise das entrevistas.
Salienta-se que foram cumpridos os critérios de selecção da amostra para o
presente estudo.
4.1. Caracterização contextual da “Escola das Virtudes Waldorf”, situada no
Porto
Implantada no centro histórico da cidade do Porto, num edifício de raiz
setecentista (com fachada prolongada por muro encimado por estatuetas em granito
98
atribuídas a Nicolau Nasoni) e voltada ao ocidente com o Atlântico no horizonte e o
Rio Douro a seus pés, a “Escola das Virtudes Waldorf" prossegue a experiência
iniciada em 1982 com a Cooperativa de Ensino Waldorf que lhe deu existência e
que, durante mais de uma década, desenvolveu experiências alternativas de
formação na área das artes plásticas e do design, sob influência e como resultado
da “aventura” pedagógica ensaiada pelo movimento de artistas, professores e
intelectuais que, na década de sessenta, deu corpo à Cooperativa Waldorf do Porto,
denominado comummente Ensino Waldorf: unidade e diversidade, experimentação
e abertura à inovação, aprendizagem em vez de burocracia, convívio contra a
indiferença, preocupação pelos problemas individuais, a todos os níveis, ousadia
artística no seio de rigor científico.
Esta “Escola das Virtudes Waldorf” mantém um relacionamento privilegiado e
de grande afinidade com a Escola Superior Artística do Porto, devido às
gratificantes experiências no recente passado comum, nomeadamente no sucesso
do Curso de Ingresso no Ensino Superior Artístico (C.I.E.S.A.) que deu origem à
Constituição da Cooperativa titular da Escola.
Mantendo em funcionamento cinco cursos profissionais para outros tantos
sectores de actividade com incidência artística, hoje, a “Escola das Virtudes
Waldorf”, enquadra-se perfeitamente neste sub-sistema de ensino tutelado pelo
Ministério da Educação. Numa clara perspectiva de formação para o
desenvolvimento de novas gerações de jovens técnicos e, fiel às suas ideias
fundadoras, a esta escola procura fazer do espaço-escola um lugar favorável ao
emergir das potencialidades de cada um para a afirmação da sua identidade e
autonomia, da criatividade individual e invenção colectiva, de rigor científico e
competência técnica.
A definição dos cursos da “Escola das Virtudes Waldorf”, o estabelecimento
dos seus currículos e a elaboração de grande parte dos programas das suas
disciplinas foram realizados no interior da mesma. Alguns programas das disciplinas
das áreas artística e técnica foram desenvolvidos pelos seus professores, tendo
mais tarde sido alargados a outras escolas com currículos semelhantes.
Uma nova atitude perante o ensino da arte foi sempre um princípio
fundamental deste Ensino que se estendeu à “Escola Profissional Waldorf”. O
conceito de que o desenho é algo que se aprende, e não apenas para que se tem
99
ou não jeito, aliado à estimulação da criatividade são a razão de ser do “Ensino
Profissional Waldorf”.
Assim, esta Escola, encontrando-se vocacionada inteiramente para a área
artística, aborda o ensino profissional numa perspectiva que privilegia o
desenvolvimento das capacidades criativas e das competências técnicas, aliada a
uma forte preparação pessoal e profissional numa perspectiva transdisciplinar e de
integração de saberes, com vista à formação de trabalhadores adaptados a um
mundo do trabalho em rápida mutação e, ao mesmo tempo, de cidadãos activos e
participativos na sociedade.
Procurando formar jovens que possam também dar continuidade aos seus
estudos no ensino superior, a “Escola das Virtudes Waldorf”, ao mesmo tempo que
atribui uma grande importância às disciplinas de carácter científico, procura que os
seus formandos obtenham uma formação técnica de qualidade, visando responder
às necessidades de formação do tecido social da região norte ao nível de quadros
médios, numa área que se reveste de particular significado na actualidade, visto
que o desenvolvimento da nossa região passa por uma grande aposta no design e
no desenho de projecto, vertentes mais carenciadas no tecido empresarial
envolvente.
Para além de uma formação em contexto de trabalho, e considerando que o
futuro dos profissionais que estamos a formar passa, não só pela angariação de um
emprego, mas pelo desenvolvimento da sua capacidade de trabalho que poderá ser
realizada sob a forma independente de prestação de serviços, procura-se dar
grande importância à informação e formação, pelo gabinete da Unidade de Inserção
na Vida Activa (UNIVA), com vista à associação de jovens para a criação de micro-
empresas ou cooperativas de prestação de serviços.
Na formação profissional desenvolvida na “Escola das Virtudes Waldorf”,
desempenha um papel importante a Prova de Aptidão Profissional (P.A.P.), cujos
trabalhos realizados pelos alunos e avaliados por um júri constituído não apenas
por professores mas, também, por técnicos ligados ao mundo empresarial e sócio-
profissional, são expostos no final do ano lectivo em local de grande público -
Mercado Ferreira Borges, Museu do Carro Eléctrico, Casa das Artes, Casa da
Companhia, Alfândega do Porto, nas instalações da “Escola das Virtudes Waldorf”,
a par de um Desfile de Moda que têm sido formas eficazes de evidenciar as
competências dos nossos alunos e, simultaneamente o melhor passaporte para o
100
mercado de trabalho, reconhecidas que têm sido a qualidade dos trabalhos
apresentados.
4.2. “Jardim-de-Infância Waldorf”, em Alfragide
O Jardim-de-infância Waldorf situa-se numa vivenda rodeada por um amplo
jardim com árvores. Para além de um grupo de Jardim-de-infância com 20 crianças,
compreendidas entre os 3 e os 6 anos, tem também um berçário com 6 bebés e um
grupo de creche com 10 crianças de idades compreendidas entre a aquisição da
marcha firme e os 3 anos.
Os ritmos do mundo e os ritmos da criança orientam o dia-a-dia do Jardim-
de-Infância Waldorf. Aqui, com base na pedagogia Waldorf, dá-se a maior
importância à imaginação que ao intelecto, aos brinquedos simples feitos com
materiais naturais do que às máquinas de plástico.
Neste espaço educativo, as crianças encontram um ambiente que lhes
permite desenvolver a imaginação, a confiança, a vontade, indispensáveis nesta
fase pré-escolar em que a experiência do mundo está ainda muito ligada ao seu
próprio ser.
Neste Jardim-de-infância acredita-se que o melhor ambiente para a criança
pequena se desenvolver é a atmosfera familiar onde a mãe cozinha, canta e cuida
com amor. Por isso, com uma família em que os pais e os educadores actuem em
sintonia na tarefa de sentir e entender a criança, estabelecendo laços de confiança
de modo a ajudá-la a desenvolver-se de forma integral e feliz.
O princípio básico é o da imitação: é o que a educadora faz e sobretudo a
forma como o faz que actua, decisivamente, como aspecto formador. Evitam-se
formas de autoridade exteriormente impostas (confronto, reprimenda directa),
contribuindo-se, desta forma para o fortalecimento da vontade da criança,
permitindo um clima de segurança afectiva e criando uma relação de confiança e
respeito mútuo.
Os ritmos da natureza – a noite e o dia e contracção e a expansão do pulmão
na respiração – são aplicados ao desenvolvimento da criança e à rotina diária do
Jardim-de-infância. As sequências repetem-se diariamente, mudando apenas o
conteúdo das aprendizagens modelagem em cera de abelhas, Euritmia, fabrico de
101
pão, pintura, limpeza/manutenção, sempre com a preocupação de não
sobrecarregar as crianças.
5. Técnicas de Recolha de Dados
Para a problemática em estudo, a entrevista foi o instrumento utilizado na
recolha de dados, sendo o mais adequado às circunstâncias.
Após o contacto directo com os educadores que satisfaziam as
características e os critérios definidos, convidou-se para uma entrevista. Foi-lhes,
então, comunicado que esta se inseria num estudo que se propôs realizar, com
vista à obtenção do mestrado e, através do qual procurar compreender o ensino
alternativo Waldorf e o contributo deste para a educação em Portugal, no sentido de
revelar os factores que mais se destacam na crise educacional dos dias de hoje.
Antes da realização das mesmas, recorreu-se à elaboração de um guião de
entrevista servindo de base à realização da mesma, constituído por um conjunto
ordenado de questões semi-abertas, ou seja, parte da resposta fixa e outra livre.
Depois de elaborado e organizado, procedeu-se à sua testagem, realizando-se uma
entrevista que serviu de pré-teste, o que permitiu ajustar a sequência, a pertinência
e a linguagem utilizada na formulação das questões.
Procedeu-se à marcação do tempo e do espaço onde iriam decorrer as
entrevistas. As mesmas tiveram de ser realizadas de forma faseada, uma vez que o
tempo era restrito, desenvolvendo uma parte num dia e outra no dia seguinte.
Como instrumento de recolha de dados usou-se os meios de comunicação
on-line, tendo sido de mútuo acordo.
Neste ambiente, sem perturbações, criou-se um clima de à vontade e
descontracção, estabelecendo-se uma relação de compreensão, empatia,
facilitação e abertura ao outro que, na opinião de Poirier (1999) se convertem em
condições importantes, a fim de criar um clima de confiança no entrevistado. De
facto, não se pode ignorar que o entrevistador, como pessoa, poderá sempre
influenciar naquilo que o entrevistado diz e como o diz, por isso, foi tida em conta
essa possível influência pelo cuidado com que foram feitas e redigidas as
perguntas.
102
6. Análise e Tratamento de Dados
Considerando a metodologia adoptada nesta investigação, é intenção optar
pelas verbalizações extraídas das entrevistas dos entrevistados.
Após as gravações, as entrevistas foram transcritas integralmente, “processo
cansativo e moroso, mas não menosprezável, pelo contrário, minucioso, embora
fragmentado, com discursos produzidos, e inegável utilidade na apreensão e na
penetração do sentido do discurso produzido” (Terrasêca, 1996, p.121). De seguida,
procede-se à leitura pormenorizada de cada entrevista, permitindo estabelecer um
“contacto com os documentos a analisar e conhecer o texto, deixando-se invadir por
impressões e orientações” (Idem, p.96). Nesta linha de ideias, Lopes (1993) ao
salientar a opinião de L’Écuyer (1990), considera que esta fase do trabalho, que
compreende a leitura integral de todos os dados disponíveis, é um passo muito
importante em todo o processo de análise. Posteriormente, deu-se oportunidade
aos entrevistados a possibilidade de, também eles, lerem e comentarem o seu
próprio trabalho.
Da pré-leitura e análise das entrevistas, resultou a formação de um corpus,
ou seja, “o conjunto dos documentos tidos em conta para serem submetidos aos
procedimentos analíticos” (Bardin, 1995, p.96), recorrendo, muitas vezes, a
escolhas e algumas regras, tais como, a exaustividade, a representatividade, a
homogeneidade e a pertinência.
Após uma leitura aprofundada e exaustiva do corpus, procedeu-se à
elaboração dos tópicos mais relevantes do discurso e à expressão de sentidos
contidos nos discursos dos entrevistados.
A análise dos dados será feita através da elaboração de alguns quadros,
sempre que se justifique, de acordo com os conteúdos traçados no guião e com
excertos das entrevistas, para ilustrar as expressões dos próprios entrevistados,
com o objectivo de permitir que se ouça a voz de cada um, visto que, ao trazer as
marcas da oralidade, acrescenta cor ao que é dito pela investigadora. Este
processo irá permitir estabelecer, sempre que possível, comparações entre os
educadores, seguidores da mesma pedagogia, de acordo com a amostra definida.
Sempre que seja oportuno, será estabelecida a comparação dos resultados obtidos
na investigação com outros obtidos por investigadores na respectiva área de
investigação.
104
Capítulo V – TESTEMUNHOS PARA A HISTÓRIA
Introdução
A escolha da amostra recaiu sobre o actual director executivo da “Escola das
Virtudes Waldorf”, localizada no Porto, sobre o professor do extinto “Projecto
Waldorf”, dirigido para as crianças, no mesmo local e sobre a directora pedagógica
e educadora do “Jardim-de-Infância Waldorf”, em Alfragide, por preencherem os
requisitos definidos nessa mesma amostra. Efectivamente as pessoas entrevistadas
ajustam-se ao perfil definido na escolha da amostra deste estudo empírico.
De salientar que, se tratam de três pessoas conhecedoras da Pedagogia
Waldorf, com papel activo nessa pedagogia o que é, também, uma mais valia, no
âmbito da prossecução dos objectivos deste trabalho.
Considerando a disponibilidade, a prontidão, a gentileza e a cordialidade com
que colaboraram na entrevista para este estudo, é pertinente manifestar o apreço e
agradecer essas atitudes, expressando, também, que continuem a desempenhar
com sucesso os seus papeis de profissionais empenhados na prestação de serviços
educativos às crianças e/ou à educação, na construção de uma sociedade melhor.
Dado a sua inovação e pioneirismo em Portugal, registaram-se e analisaram-
se, de seguida, os seus “testemunhos para a história”.
105
2. Análise Qualitativa
A análise de conteúdo é uma técnica de investigação que permite fazer
inferências válidas e replicáveis dos dados para o seu contexto (Vala, 2003).
No estudo das entrevistas recorreu-se à sua comparação. Analisou-se em
simultâneo a questão, a partir do guião comum a todas as entrevistas e as três
respostas atribuídas para essa mesma questão. Decidiu-se tratar os resultados
brutos e construir uma informação mais condensada o que permite uma análise
temática.
A apresentação dos dados compreende 4 conjuntos que representam os
blocos do guião A, B, C e D (Anexo 1).
Cada conjunto é formado por algumas perguntas, de acordo com as
respostas obtidas.
Como foram elaboradas três entrevistas, cada pergunta tem três respostas
que se identificam por A, B, C.
No sentido de preservar a identidade das instituições a que cada um dos
entrevistados pertencem ou pertenceram, foram criados nomes que não
correspondem à identidade real. Ressalve-se, porém, que todos têm a sua génese
nos princípios Waldorf, de acordo com a temática em estudo.
Caracterização dos entrevistados: foi possível, com os dados obtidos,
elaborar um quadro com a caracterização dos entrevistados (quadro 07)
Quadro 07 – Características dos Entrevistados
Nome Funções Projecto Waldorf Ano de
Implementação do Projecto
Entrevistado A
Director Executivo da Instituição Waldorf, situada no Porto
Escola Waldorf e do extinto projecto Waldorf, criado para crianças, localizados na cidade do Porto.
Como projecto de ensino formal, implementou-se em 1982, porém deu seguimento processo iniciado em 1980, como ensino informal.
Entrevistado B
Docente do Projecto Waldorf, actualmente
inexistente
Projecto Waldorf, criado para crianças, actualmente extinto.
Como projecto de ensino formal, implementou-se em 1982, porém deu seguimento processo iniciado em 1980, como ensino informal.
Entrevistada C
Directora Pedagógica
e Educadora do JI Waldorf, situado em
Alfragide.
Jardim-de-Infância Waldorf, localizado em Alfragide
Surgiu em 1984, pela iniciativa da Associação de Pais para o Desenvolvimento de um Ensino, segundo Rudolf Steiner.
106
BLOCO A – RAZÕES/ MOTIVAÇÕES DA PARTICIPAÇÃO NO PROJECTO
WALDORF
A1 – Como surgiu a Ideia do “Projecto/ JI Waldorf”?
A - Por proposta do Doutor Jacinto Rodrigues, quando se discutiam no seio da
“Cooperativa Waldorf” as formas de concretizar o projecto de formação humanística
pela via da arte, desde a pré-primária até ao ensino superior.
B - Eu trabalhei no período correspondente aos três últimos anos do “Projecto
Waldorf”, não estou, por isso, relacionado com a sua génese. Posso dizer, contudo,
que o “Projecto Waldorf” era, ao tempo, uma das três escolas com autonomia
pedagógica que lhe era reconhecida devido ao projecto que aí se animava. Isto
implicava que a escola tinha direito a subvenções financeiras, sendo os seus alunos
obrigados a realizar, por exemplo, exames no fim do 4º ano de escolaridade. Tal
autonomia devia-se ao facto do “Projecto Waldorf” atribuir um valor decisivo às
áreas de educação e de expressão artística, fruto do seu vínculo espiritual à
Pedagogia Waldorf. Assim, a par do trabalho nas denominadas áreas curriculares
tradicionais, havia um espaço e um tempo de intervenção equivalente em
actividades nos domínios da Informática, do Cinema de Animação, da Expressão
Plástica, da Expressão Dramática, etc. Estamos a falar de uma escola que
funcionou durante a década de 80 do século passado, que hoje seria uma «escola a
tempo inteiro», ainda que pudesse servir de referência a esse projecto, quer por via
da organização flexível que permitia respostas inusitadas que tinham em conta as
oportunidades educativas dos contextos e das situações, bem como as vivências e
alguns dos desejos de exploração das crianças, quer por via da qualificação das
pessoas que aí trabalhavam, quer por via do processo de animação pedagógica
que se animava.
C - A ideia deste projecto de surgiu de um grupo de professores e pais interessados
em desenvolver este tipo de pedagogia no nosso país. Os professores, tendo
adquirido formação em Pedagogia Waldorf no estrangeiro, nomeadamente em
Inglaterra, ambicionavam poder desenvolve-la cá; os pais, tendo vivido também no
107
estrangeiro (Alemanha) onde tomaram contacto com esta pedagogia, queriam uma
escola em Portugal para os seus filhos. Desses interesses que se
complementavam, surgiu em 1984 a “Associação de Pais para o Desenvolvimento
de um Ensino segundo Rudolf Steiner”.
Pode-se considerar que existe uniformidade de opiniões, dado que os
princípios da pedagogia Waldorf assentam na liberdade de ensino, privilegiando
também a componente artística como expressão da liberdade.
A2 – O que motivou a participação neste projecto? O que levou a
construir o JI nesta pedagogia?
A – O facto de possibilitar uma fusão entre o ensino formal e o ensino artístico.
B - O “Projecto Waldorf” era uma escola do Ensino Particular e Cooperativo,
integrada na “Escola das Virtudes Waldorf”.
C - Para além do que foi dito anteriormente, a convicção profunda de que a
Pedagogia Waldorf e a ideia de ser humano que lhe está subjacente são o caminho
para a formação de um ser humano verdadeiramente livre.
Esta questão vem complementar a anterior, reafirmando-se o valor de pessoa, por u
lado, e a formação pela/na arte.
BLOCO B – INÍCIO DO PROJECTO
B1 – Em que ano e contexto surgiu o Projecto Waldorf/ JI Waldorf?
A – Como projecto de ensino formal em 1982, com a criação das cooperativas de
“Ensino Artístico Waldorf”, dando seguimento ao processo iniciado em 1980 no seio
da “Cooperativa Waldorf”, de ensino informal.
B – Estamos a falar de uma escola que funcionou durante a década de 80 do
século passado, até aos princípios dos anos 90.
108
C – Surgiu em 1984 com a “Associação de Pais para o Desenvolvimento de um
Ensino segundo Rudolf Steiner”. Os professores, tendo adquirido formação em
Pedagogia Waldorf no estrangeiro, nomeadamente em Inglaterra, ambicionavam
poder desenvolve-la cá; os pais, tendo vivido também no estrangeiro (Alemanha)
onde tomaram contacto com esta pedagogia, queriam uma escola em Portugal para
os seus filhos.
Verifica-se que há conformidade na década em que iniciaram a educação Waldorf,
nas instituições em estudo, ou seja ambas tiveram início formal a partir de 1980,
pesa embora, actualmente apenas existir o “JI Waldorf”, fundado em 1984.
B2 – Para que público-alvo?
A - Crianças oriundas da classe média e classe média-alta, devido ao grau de
informação das suas famílias, e crianças com necessidades educativas especiais.
B – O “Projecto Waldorf” tinha crianças em idade pré-escolar e no que, hoje, se
designa por 1º Ciclo do Ensino Básico.
C – O público-alvo deste projecto foram as crianças das pessoas que o
impulsionaram, bem como todas as crianças cujos pais se encontravam
descontentes com o ensino oficial e procuravam uma visão mais “alternativa” da
educação. Ainda hoje é este o público-alvo.
Nesta questão, verifica-se que os pais/encarregados de educação possuíam algum
peso na criação do espaço educativo Waldorf, na medida em que eram eles que
buscavam este tipo de pedagogia alternativa, como resposta aos anseios que
tinham e às necessidades das suas crianças, as quais se encontravam com idades
compreendidas às que iniciam o pré-escolar, principalmente no caso de “JI Waldorf”
e do primeiro ciclo no “Projecto Waldorf”.
109
BLOCO C – DESENVOLVIMENTO DO PROJECTO
C1 – Quais os pontos fortes do “Projecto/ JI Waldorf”?
A – A comunicação entre as crianças e os jovens e adolescentes, em virtude da
partilha de espaços com o ensino secundário e o ensino superior.
B – Creio que no “Projecto Waldorf” o importante era o clima educativo que aí se
vivia. Um clima que permitia às crianças assumir um protagonismo raro, sem que
isso significasse que os educadores e os professores se demitissem quer de ser
adultos, quer de ser educadores e professores. Havia um clima de grande abertura
entre todos e de relacionamento positivo, sem que se abdicasse da exigência e do
rigor que, neste caso, não eram critérios externos aos alunos ou, apenas,
instrumentos de selecção académica. Era o rigor e a exigência necessários à
apropriação de um dado património cultural, o qual, neste caso, não se
circunscrevia somente à Matemática, à Língua Materna e ao Estudo do Meio, mas
também às vivências e experiências que as áreas de expressão artística permitem
potenciar. Era, também, um espaço intergeracional, onde conviviam as crianças
com os jovens que frequentavam os cursos que a Cooperativa desenvolvia (Design,
Animação Cultural, Teatro, etc.) e isto constituía um factor educacional relevante.
Outro factor a valorizar diz respeito ao facto de haver um projecto, nem sempre tão
explícito como o deveria ser, que encontrava em Rudolf Steiner e na Pedagogia
Waldorf uma das suas referências fundamentais. Não era a única, mas era
certamente uma das mais relevantes. As intenções educativas do “Projecto
Waldorf”, a sua organização, a sua proposta para o exterior estavam marcadas por
este facto.
C – Considero que um dos pontos fortes nesta pedagogia e neste Jardim-de-
infância seja o facto de cada criança poder expressar e manifestar a sua própria
individualidade, enquanto ser único no seu processo de desenvolvimento, onde o
medo e a dúvida não têm lugar.
O clima educativo deste tipo de pedagogia, baseada nos princípios defendidos por
Rudolf Steiner, é o que se destaca das opiniões dos três entrevistados, bem como a
manifestação da individualidade da criança, enquanto ser único. Por outro lado, os
110
entrevistados A e B realçam, comummente que o clima intergeracional era um
excelente e relevante factor educacional.
C2 – Quais as principais dificuldades/obstáculos sentidos? E que
dificuldades encontram na actual política educativa portuguesa?
A – Os parcos recursos materiais e as insuficiências de financiamento e a
incompreensão da tutela perante o projecto educativo.
No contexto em que o projecto foi vivido (entre 1982 e 1992), não havia ainda
condições subjectivas para a sua existência. O Ministério não foi capaz de
compreender a importância da partilha entre os diferentes sectores de ensino,
fazendo sair legislação a impedir a utilização comum dos espaços.
B – As dificuldades que íamos sentido são de diversos tipos. Tínhamos aquelas que
diziam respeito aos problemas financeiros da escola, na medida em que as
mensalidades estavam longe de cobrir as despesas com um corpo de educadores
tão amplo e variado. Tínhamos o problema da autonomia pedagógica que obrigava
os nossos alunos finalistas a terem que fazer o já referido exame no final do 4º ano.
Tínhamos, também, alguns problemas pedagógicos fruto de um conjunto de
equívocos sobre os quais vale a pena falar. O equívoco em torno das competências
da criatividade, pensando-se que estas eram desenvolvidas, sobretudo, pelas
actividades na área da Educação e das Expressões Artísticas. O equívoco em torno
da influência da Escola, a qual era pensada de uma forma excessivamente
determinista. Acreditava-se que aquele tipo de educação iria gerar adultos mais
vocacionados para as actividades artísticas, gente mais autónoma e capaz de
assumir um modo de estar no mundo diferente, como se a Escola tudo pudesse e
não houvesse outras fontes de influência sobre os nossos comportamentos. Por
outro o lado, havia questões do foro pedagógico, no domínio da escrita e da leitura,
da matemática e do Estudo do Meio que importava enfrentar, já que continuavam
reféns do que nós designamos por Pedagogia Tradicional. De resto era uma escola
com os problemas comuns a todas as escolas, problemas entre professores, que lá
se iam resolvendo, problemas com encarregados de educação que se iam gerindo,
problemas com a administração, problemas com alunos que nem sempre
aprendiam com nós gostaríamos que aprendessem. Tal como em muitas outras
111
escolas também nós, por vezes, parecíamos desejar que os alunos aprendessem
sozinhos, o que não deixa de ser um paradoxo, porque se isso acontecesse para
que é que precisariam de nós?
Por outro lado, tendo em conta a actual política educativa portuguesa, não é
possível comparar a década de 80/90 com o tempo em que hoje vivemos. Creio que
nessa altura possuíamos, para o melhor e para o pior, uma margem de manobra
que hoje se estreitou. Apesar de toda a conversa sobre autonomia, construção de
projectos educativos ou de projectos curriculares a profissão docente tende a
proletarizar-se, no momento em que as decisões que competem aos professores
tendem a ser assumidas por outros. Claro que os professores têm uma quota parte
de responsabilidade neste estado de coisas, já que delegam, muitas vezes, as suas
responsabilidades noutros actores da cena educativa. Nesse aspecto há coisas em
comum entre esse tempo e o tempo actual. As políticas educativas são um factor de
influência a considerar, mas não são tão determinantes como alguns nos querem
fazer crer. Há um espaço profissional que diz respeito aos professores e que estes
terão que entender como um espaço de afirmação. No caso do “Projecto Waldorf” a
autonomia pedagógica permitia-nos fazer coisas únicas e singulares, ainda que eu
acredite que mesmo sem esse contrato seria possível ter realizado uma parte
substancial do que, afinal, fomos realizando. Ou seja, não foi a política educativa
dos governos de então que nos impediu, bem pelo contrário, de fazer o que quer
que seja. Veja-se, por exemplo, a importância que assumiram as áreas de
Educação e Expressão Artísticas no programa educativo da escola. Havia um
programa e a valorização pública do mesmo. Hoje é que me parece que as coisas
são diferentes. Em nome da necessidade de se valorizarem as áreas das
expressões, fez-se tudo o que não se devia fazer com a estrutura que o ME propôs
para as Actividades de Enriquecimento Curricular.
C – As diferentes posturas face à infância por parte de outros agentes educativos.
Quanto à actual politica educativa portuguesa, a resposta é nenhumas. Somos
ainda um mundo à parte.
Relativamente a esta questão, o entrevistado A refere como principal obstáculo a
atitude ministerial que impediu a prossecução do “Projecto Waldorf”, ao impedir,
legalmente, a partilha entre os diferentes sectores de ensino, obrigando a fechar o
112
sector de ensino ligado às crianças, dada a proibição da partilha intergeracional que
se realizava. O entrevistado B refere que as dificuldades eram de diversa ordem, ou
seja, problemas financeiros, autonomia pedagógica que obrigava os alunos do 4º
ano a realizarem o exame final de ciclo, problemas de equívocos pedagógicos e de
aplicação metodológica por parte dos professores, essencialmente. Por outro lado,
ao contrário do entrevistado A, refere que a política educativa dos governos não
impediu o desenvolvimento deste ensino, dado que a autonomia pedagógica
permitia ao professores fazer coisas únicas e singulares.
No que concerne ao testemunho da entrevistada C, apenas referiu como obstáculos
a visão nada construtiva por parte de alguns agentes educativos.
Considera-se premente referenciar que, após pesquisas realizadas, no que
concerne ao “JI Waldorf”, os educadores receberam formação específica, no
estrangeiro, para implementar este tipo de pedagogia. Quanto ao Projecto Waldorf,
os educadores não tiveram essa formação, apenas eram escolhidos mediante o seu
perfil, enquanto profissionais apaixonados pela arte de educar.
C3 – Onde pensa que pode melhorar este tipo de pedagogia?
A – Actualmente, o “Projecto Waldorf” não existe. Mas, se nos fosse permitido
recriá-lo, iríamos reforçar o peso da educação informal, com a introdução de novas
artes no projecto e o alargamento para o domínio ambiental, que não foi
inicialmente concretizado por ausência de meios.
B – Sem resposta.
C – A possibilidade de melhorar está sempre na Auto-Educação. Quem promove e
aplica esta Pedagogia pode e deve sempre evoluir para melhor.
Sobre esta questão, o entrevistado B não se pronunciou. Já o entrevistado A
manifesta perspectivas na recriação do “Projecto Waldorf”, porém no que concerne
à introdução de novas artes e do domínio ambiental, enquanto que a entrevistada A
considera premente a melhoria das práticas, pela formação pessoal e continuada
dos agentes educativos Waldorf.
113
C4 – Qual a participação que os alunos têm/tiveram?
A – Na definição dos trabalhos a realizar, e na aprendizagem da responsabilidade.
B – No «Projecto Waldorf» a participação dos alunos nas áreas de Expressão
Artística era um elemento decisivo do projecto. Não creio que se possa promover a
educação de quem quer que seja neste domínio se os alunos não tiverem espaço
para se exprimirem, para avaliarem o trabalho realizado, para partilharem. Isto não
significa que os professores não são decisivos. Claro que o são, mas são-no como
organizadores de ambientes, como interlocutores qualificados, como alguém que
não faz pelos outros aquilo que aos outros compete fazer.
C – Toda. As crianças vivem no presente e onde estão inteiras. A sua participação é
plena.
Se a pergunta se refere a que por vezes as crianças não aderem todas às mesmas
propostas, obviamente que nem sempre estão dispostas a tudo, pelas mais
variadas razões.
Verifica-se, pela análise das respostas, que todos os entrevistados partilham da
mesma opinião. Consideram a participação dos alunos plena, considerando a
liberdade de cada um.
C5 – Como é que tem sido a integração das crianças no primeiro ciclo
e/ou restantes?
A – Ocorreu sempre com naturalidade.
B – Não tenho dados objectivos para responder a essa pergunta. Hoje, os meus
alunos já terminaram a sua formação académica. A grande maioria foi bem
sucedida em áreas muito diferentes entre si. Há engenheiros, uma arquitecta, uma
astrofísica, psicólogos, gente ligada ao teatro e outros que não fizeram formação
universitária. Não descortino um padrão, a não ser o facto de todos serem crianças
oriundas de famílias de classe média, cujos pais valorizavam, de facto, as áreas da
educação artística como áreas de formação decisivas.
114
C – Depende de cada criança e depende do(a) professor(a) que cada criança
encontrar no seu percurso escolar. No entanto, normalmente as nossas crianças
estão ávidas de aprender e socialmente estão bem preparadas.
Em geral, a opinião dos três entrevistados é de que a integração posterior dos seus
alunos Waldorf é/foi feita naturalmente, sem problemas.
C6 – Que vantagens traz este tipo de pedagogia?
A – Uma educação mais completa e integral, com um acentuado desenvolvimento
da responsabilidade, da afectividade e da sensibilidade estética.
B – Não creio que, hoje, se possa valorizar a Pedagogia Waldorf como uma
resposta educativa exclusiva. Steiner tem uma obra e uma reflexão que podemos
aproveitar pela riqueza da mesma, mas não aceito que se possa propor um projecto
em torno da Antroposofia. Faz sentido, olhar com atenção para alguns dos
contributos desta corrente pedagógica, mas não me parece que continue a fazer
sentido uma visão pedocêntrica da educação, ainda que seja necessário afirmar a
necessidade de uma acção educativa que não se circunscreva a um
instrumentalismo que impede as crianças de serem crianças.
C – Muitas. Se esta pedagogia for bem aplicada, contribui para que o ser humano
se sinta seguro de si, com uma boa auto-estima, com capacidades criativas
notáveis, que servem muitas vezes para resolver problemas humanos de várias
ordens, com um bom espírito crítico em relação ao mundo, no sentido de se tornar
um ser livre!
As opiniões dos entrevistados A e B são comuns, dado que consideram este tipo de
educação como sendo o mais completo e integral, se bem aplicado. Já o
entrevistado B é de opinião que a pedagogia Waldorf não constitui o modelo de
educação exclusivamente melhor, dado achar que actualmente a “visão
pedocêntrica da educação”, não faz sentido.
115
C7 – Como foi/tem sido a aceitação deste tipo de ensino na
comunidade, em geral, e nos pais, em particular?
A – Os pais aceitavam bem, pois reconheciam os resultados da educação. A
comunidade em geral e o M.E. em particular, manifestavam algum estranhamento.
B – A Pedagogia Waldorf é de tal modo alternativa que não se pode responder a
esta questão. Aqueles que podem optar pela mesma fazem-no sabendo o que
pretendem. Não é uma proposta de massas, logo a ela aderem, apenas, aqueles
que a reconhecem de antemão como uma proposta pertinente.
C – Boa.
No que concerne a esta questão, é unânime que os pais aceitam bem este tipo de
ensino, porém isso deve-se ao facto serem estes que buscam este tipo de
pedagogia para os seus educandos. Quanto à comunidade em geral, dado a
especificidade educativa do modelo Waldorf, manifestam estranheza, perante este
ensino.
C8 – Caso não tenha tido continuidade (tenha cessado) o que falhou?
A – O financiamento. O impedimento de partilha comum dos espaços com os outros
níveis de ensino, levou à criação de um novo espaço específico para o “Projecto
Waldorf”, com o respectivo acréscimo de custos com funcionários, dado não ser
mais possível gerir uma partilha comum de recursos materiais e humanos. Visto
tratar-se de uma escola pequena, o disparar dos custos determinou a sua
inviabilização financeira.
B – O «Projecto Waldorf» acabou por razões relacionadas com uma deficiente
gestão financeira do projecto que impediu a sua consolidação e desenvolvimento.
C – Não se aplica, pois não cessou.
116
Esta questão aplica-se apenas aos entrevistados A e B, dada a inexistência actual
do “Projecto Waldorf”. Ambos referem como problema a inviabilização financeira
sentida na altura e o entrevistado A acrescenta ainda como factor a impossibilidade
de partilha comum dos espaços com os outros níveis de ensino, como tinha sido
criado inicialmente.
C9 – Quais as actividades privilegiadas?
A – As artes visuais (desenho, pintura, objectos tridimensionais, cinema de
animação).
B – Sem resposta.
C – Todas as que têm um verdadeiro sentido para as crianças. Actividades que
estejam ligadas aos diferentes ritmos vividos no jardim-de-infância, como as que
estão ligadas aos processos que culminam nas festividades (ritmo anual), por
exemplo.
Considero importante proporcionar um leque diversificado de experiências e
vivências boas, belas e verdadeiras que constituam um “bom alimento” para a
criança pequena.
Neste ponto, o entrevistado B não se manifestou. Já o entrevistado A realça as
actividades ligadas à arte como actividades privilegiadas, enquanto que a
entrevistada C realça a importância da existência de actividades diversificadas, com
sentido para as crianças.
C10 – As novas tecnologias também têm/tinham lugar, no processo
educativo dos alunos?
A – Não. Na época, as novas tecnologias da comunicação e informação davam
ainda os primeiros passos... não havia Internet. Se fosse hoje, teriam um papel
importante na vida da instituição, a exemplo do que acontece na formação inicial de
jovens. Contudo, fomos os primeiros a utilizar a tecnologia do cinema com crianças
do ensino primário, produzindo filmes de animação.
117
B – Sem resposta.
C – Não.
Rudolf Steiner considerava que nos primeiros anos de vida, até à fase da
adolescência, as tecnologias não deveriam entrar no processo de ensino das
crianças. O entrevistado A revela que na altura do “Projecto Waldorf”, as
tecnologias como o computador, etc. não faziam parte do ensino nas crianças,
porém admite que actualmente, teriam um papel importante, dada a sua evolução
na sociedade (verifica-se pois, uma variância da pedagogia Waldorf, tal como fora
criada por Steiner). A entrevistada C é peremptória ao afirmar que não faz parte da
educação das crianças a utilização das tecnologias, no ensino.
C11 – Qual a importância do ensino/inclusão das actividades música, o
canto, a fala, e euritmia nos primeiros anos de vida?
A – Considero que são fundamentais para a formação integral da pessoa humana.
No caso concreto do “Projecto Waldorf”, não as pudemos realizar inteiramente, por
dificuldades materiais.
B – Sem resposta.
C – Nos primeiros anos de vida o canto é dos mais importantes. Tocar Lira é bom
para os bebés também. A música e a Euritmia vêem posteriormente, a partir dos 3
anos. Constituem um grande contributo para a harmonização das forças da vontade
e do sentimento da criança do 1º seténio.
Apenas responderam a esta questão, os entrevistados A e C que consideram
importante a inclusão das actividades música, o canto, a fala, e euritmia nos
primeiros anos de vida. A entrevistada C vai mais além especificando a importância
destas actividades durante o primeiro seténio (dos 0 aos 7 anos, publico-alvo deste
JI).
118
C12 – Quais as perspectivas de futuro, quanto à implementação desta
pedagogia?
A – Parecem-nos boas, e penso que a maturidade alcançada pelo país, permite
agora uma maior abertura para projectos inovadores, de que é exemplo o sucesso
da Escola da Ponte.
B – A Pedagogia Waldorf é passado. Faz parte do património pedagógico de que,
hoje, dispomos mas não creio que possa ser mais do que isso. É mais importante
pela influência implícita que exerce, do que propriamente pela aceitação
entusiástica do programa que propõe. Falha pelo seu pedocentrismo e por uma
visão excessivamente determinista do desenvolvimento humano. Convém, no
entanto, não considerar a minha posição como uma falta de respeito e de
reconhecimento da obra de Steiner. Essa obra merecia até uma outra divulgação,
pode-nos ajudar, até, a pensar melhor algumas questões com que hoje nos
defrontamos, mas é uma proposta do início do séc. XX e nós estamos já no século
XXI. Nós, hoje, somos obrigados a saber que nenhuma proposta pedagógica pode
decidir por nós o projecto que teremos que desenvolver enquanto professores, daí
que a Pedagogia Waldorf só possa ser útil se contribuir para alargar o nosso campo
de reflexão sobre as possibilidades educativas de que dispomos.
C – Crescer, crescer, crescer. Crescer em consciência e em trabalho conjunto!
No que respeita a esta questão, verifica-se que os entrevistados A e C se
encontram em consonância, por considerarem boas e úteis as perspectivas que têm
sobre a educação Waldorf no futuro. Já o entrevistado B apenas considera a
pedagogia Waldorf útil se contribuir para o alargamento do campo de reflexão dos
educadores/professores, nada mais, dado tratar-se de uma proposta que deu inicio
no século XX.
119
BLOCO D – IDEÁRIO
D1 – Quais os valores, tradições e símbolos Waldorf, praticados?
A – A complementaridade da formação formal com a formação informal. No nosso
caso, a integração das artes visuais, dado não termos meios para mais.
B – Da Pedagogia Waldorf creio que só a valorização das áreas de expressão
artística é que pode ser considerada como o elemento que permaneceu no projecto
que o «Projecto Waldorf» constituiu. A relação com a Natureza, a visão de criança e
mesmo alguns dos rituais propostos por Steiner nunca constituíram elementos
relevantes e influentes.
C – Valores: o Amor, a Amizade, o Respeito, a Reverência, A Paz, o Cuidado pelo
Ambiente.
Tradições: as festividades adequadas a cada cultura.
Símbolos Waldorf: o próprio educador, constitui um símbolo Waldorf.
Analisando as respostas a esta questão, dos diferentes entrevistados, infere-se que
a resposta da entrevistada C vai mais de encontro aos propósitos definidos por
Rudolf Steiner, de acordo com as transformações anímico-espirituais no primeiro
seténio. O entrevistado B reconhece os princípios propostos por Rudolf Steiner
como de especial importância e implementação, porém revela que não foram
aplicados no “Projecto Waldorf”. Apenas a arte permaneceu no projecto. O
entrevistado A segue a mesma opinião do B.
120
Revela-se pertinente afirmar que as pessoas entrevistadas relevaram as
suas experiências os projectos educativos das escolas com Pedagogia Waldorf e a
autonomia pedagógica dessas mesmas escolas. Essa autonomia concedida pelas
políticas educativas, em Portugal, a partir de Abril de 1974, permitiu o surgimento de
tais projectos, no âmbito da Pedagogia Waldorf.
De relevar, também, que, de acordo com as entrevistas conseguidas, o
Jardim-de-infância Waldorf, em Alfragide, e o projecto Waldorf, no Porto, fruto do
seu vínculo à Pedagogia Waldorf, concedem um valor decisivo às áreas de
educação e de expressão artística, pelo que existe uma especificidade própria deste
tipo de pedagogia em relação às artes, a par do trabalho das denominadas áreas
curriculares tradicionais.
Os entrevistados referem a existência de actividades nos domínios da
Informática, do Cinema de Animação, da Expressão Plástica, da Expressão
Dramática, entre outras. De referir que no uso das tecnologias da informação estas
instituições distanciam-se dos ideais protagonizados pela Pedagogia Waldorf, o
que, se entende, dado que há a necessidade de preparar as crianças e os jovens
para a vida, sendo que na contemporaneidade as tecnologias da informação
adquiriram um papel preponderante. Tal situação não retira o contributo da
Pedagogia Waldorf no sentido de “educar a tempo inteiro” procurando o
“desenvolvimento pleno e harmonioso do ser humano”.
Um dos pontes fortes da Pedagogia Waldorf apontado é o clima educativo
vivido nas instituições, que permitia às crianças assumir um protagonismo raro na
sua educação, “sem que isso significasse que os educadores e os professores se
demitissem quer de ser adultos, quer de ser educadores e professores”.
A par do clima de “grande abertura entre todos e de relacionamento positivo”,
assumia-se a exigência e o rigor necessários à “apropriação de um dado património
cultural”, que para além da Matemática, da Língua Portuguesa e do Estudo do Meio,
abrangia as “vivências e experiências que as áreas de expressão artística permitem
potenciar”. No “Projecto Waldorf” constituía um factor relevante o “espaço
intergeracional, onde conviviam as crianças com os jovens que frequentavam os
cursos que a Cooperativa desenvolvia (Design, Animação Cultural, Teatro, etc.)”.
As dificuldades, de diversos tipos, levaram ao encerramento do “Projecto
Waldorf”, no entanto no ideário do estabelecimento de ensino que actualmente
funciona naquela mesma localidade, permanecem muitos dos traços da Pedagogia
121
Waldorf, o que demonstra o contributo que aquela pedagogia pode dar para a
educação.
As políticas educativas ao nível da concessão da autonomia, que obrigou os
alunos do 4.º Ano do “Projecto Waldorf” a exames e uma série de “equívocos” em
torno das competências da criatividade e da concepção da Escola de uma “forma
excessivamente determinista”, bem como a impossibilidade de manter no mesmo
edifício o Jardim-de-infância e outros níveis de ensino acabaram por ditar o
encerramento do “Projecto Waldorf”.
Na altura, anos 80 e 90 do século XX, acreditava-se que aquele tipo de
educação “iria gerar adultos mais vocacionados para as actividades artísticas”,
pessoas mais autónomas e capazes de assumir um modo de estar no mundo
diferente.
Cumpre ainda dizer que, de acordo com os entrevistados, da Pedagogia
Waldorf permaneceu sobretudo nestes projectos educativos a “valorização das
áreas de expressão artística”, sendo que a “relação com a Natureza, a visão de
criança e mesmo alguns dos rituais propostos por Steiner nunca constituíram
elementos relevantes e influentes”, pelo menos, no “Projecto Waldorf”. Sem dúvida
alguma foi, assim, havendo uma adaptação desta pedagogia às circunstâncias
concretas encontradas.
As políticas educativas têm permitido a existência destes projectos baseados
na Pedagogia Waldorf os quais poderão subsistir desde que sejam capazes de se
adaptar aos desafios que a contemporaneidade constantemente vai renovando.
Esta situação é central para que a gestão de um qualquer projecto educativo tenha
sucesso e se mantenha actualizado, para que a Pedagogia Waldorf não fique,
apenas, estática no passado, como um “património pedagógico” mas que possa
surgir um contributo importante para a educação e para a construção do ser
humano, sendo que para tanto terá de evoluir do que o Dr. Rui Trindade apelida na
entrevista concedida de “pedocentrismo” e de uma “visão excessivamente
determinista do desenvolvimento humano”.
Em síntese, os projectos educativos estudados em que desenvolveram uma
Pedagogia Waldorf revelaram-se respeitadores dos valores fundamentais
consagrados na Constituição e na LBSE, pelo que se pode inferir que aquela
pedagogia pode ser uma contributo válido e uma mais valia importante na
construção da autonomia das escolas e da liberdade de ensinar e de aprender.
122
3. Considerações finais e perspectivas
A Escola Waldorf de Rudolf Steiner, a exemplo das escolas Waldorf
espalhadas pelo Mundo, adopta um currículo comum e um método de ensino
baseado na Pedagogia Waldorf, que busca estimular o entusiasmo pelo
aprendizado e um desenvolvimento saudável, além de incentivar as faculdades
críticas e de julgamento que surgem com a adolescência. Apesar de
compartilharem a mesma prática educacional, cada escola Waldorf está inserida
numa cultura local, como ocorre com a de Rudolf Steiner, que actua em
conformidade com as determinações da lei de cada país.
Introduzida por Rudolf Steiner uma das principais características da
pedagogia é a concepção de desenvolvimento do ser humano, criada pelo próprio
Rudolf Steiner, que leva em conta as diferentes características das crianças e
jovens, segundo a sua idade aproximada. Um mesmo assunto é abordado várias
vezes durante o ciclo escolar, mas nunca da mesma maneira, e sempre respeitando
a capacidade de compreensão da criança.
Para atingir a formação do ser humano, a pedagogia actua no
desenvolvimento físico, anímico e espiritual do aluno, incentivando o querer (agir)
através da actividade corpórea das crianças em quase todas as aulas. O sentir é
estimulado na constante abordagem artística e nas actividades artesanais
específicas para cada idade. O pensar é cultivado paulatinamente, desde a
imaginação incentivada através de contos, lendas e mitos – no início da
escolaridade –, até ao pensar abstracto rigorosamente científico do Ensino Médio
(colegial).
Uma das características marcantes da Pedagogia Waldorf em relação a
outros métodos de ensino é o facto de não se exigir ou cultivar precocemente no
aluno o pensar abstracto.
Na Rudolf Steiner, almeja-se que todas as aulas sejam uma preparação para
a vida real. Procura-se desenvolver nos jovens as qualidades necessárias para que
eles saibam lidar e principalmente florescer neste mundo de constantes e velozes
mudanças, com criatividade, flexibilidade, responsabilidade e capacidade de
questionar.
O jovem, cada vez mais, precisa ser articulado e capaz de se comunicar,
tanto abrindo-se para o que os outros têm a dizer como encontrando o caminho
123
certo para colocar seus pensamentos no mundo. Por isso, a Pedagogia Waldorf
permanece revolucionária até os dias de hoje.
Steiner parte da hipótese de que o ser humano não está determinado
exclusivamente pela herança e pelo ambiente, mas também pela resposta que do
seu interior é capaz de realizar, em forma única e pessoal, a respeito das
impressões que recebe do mundo.
O homem é concebido como tendo uma existência material e transitória, já
que, nessa existência, encontra possibilidades de desenvolver uma identidade
espiritual própria e autónoma, pois que o ser humano não nasce com todas as suas
aptidões desenvolvidas, sendo portador de um potencial de predisposições e
capacidades que, ao longo de sua vida, lutam por desenvolver-se.
O processo pedagógico, através do ensino, actuando durante o
desenvolvimento desse ser humano, procura dar as condições, para quem o
vivência, de poder vir a definir sua própria vida.
É claro, que esse objectivo para o processo pedagógico pressupõe um
currículo concebido de forma diferente do currículo tradicional.
Não se trata de adaptar os alunos para viver em sociedade, às circunstâncias
colocadas por ela, e sim, um currículo que esteja voltado para as necessidades
evolutivas do ser humano como tal, preparando-o para ser ele mesmo, por isso o
pano de fundo desse currículo são as fases de desenvolvimento da criança.
Para tanto, as crianças e jovens, devem familiarizarem-se com a natureza e com
a história cultural, pois o presente não está acontecendo agora por factores pré
determinados. Os elementos constitutivos do presente podem ser encontrados no
passado, ajudando a entender o hoje, e portanto, propiciando condições, para que
cada um possa estabelecer o seu próprio rumo/caminho, pois encoraja-se a
criatividade, que alimenta a imaginação, procurando conduzir as crianças a um
pensamento livre, independente das forças económicas ou imposições de governos.
O ensino teórico é sempre acompanhado pelo prático, com grande enfoque
nas actividades corpóreas (acção), artísticas e artesanais, de acordo com a idade
dos estudantes; o cultivo das actividades do pensar, inicia-se com o exercício da
imaginação, do conhecimento dos contos, lendas e mitos, até gradativamente
atingir-se o desenvolvimento do pensamento mais abstracto, teórico e
rigorosamente formal, mais ou menos na época de ensino médio. Essa não
124
exigência de actividades que necessitam de um pensar abstracto muito cedo é
também um dos grandes diferenciais em relação a outros métodos de ensino.
Nessa concepção, predomina o exercício e desenvolvimento de habilidades e
não do mero acumulo de informações, cultivando a ciência, a arte e os valores
morais e espirituais, organizando os conteúdos curriculares no tempo e no ritmo
adequados à situação evolutiva específica.
O Saber, desta forma, não é a finalidade básica da educação, não é o fim
último a ser atingido, mas o meio para que o aluno alcance harmonia e estabilidade
no seu processo de auto-conhecimento e também do conhecimento da realidade
que o cerca.
A Pedagogia Waldorf encontra-se num limiar do seu desenvolvimento, num
momento em que se faz necessário criar-se novas imagens. Nos seguidores da
pedagogia criada por Steiner, vive a estrutura da escola Waldorf de 12 anos, da
forma que ele a instituiu, acalentando este ideal como a uma chama sagrada: todo
ser humano sobre a face da terra tem o direito de frequentar a escola até os 19
anos! Assim pois, muitas escolas Waldorf foram fundadas na Europa Central e
noutros países do mundo, com a pretensão e a promessa aos pais de conduzir os
alunos até a um curso superior, como fazia desde o início a escola-mãe de
Stuttgart. Hoje, vivencia-se o quão difícil é conduzir o ensino médio no verdadeiro
espírito da pedagogia antroposófica. Sim, muita coisa já se degenerou, corrompeu-
se perante a necessidade de se oferecer um certificado de conclusão, o ensino
tornou-se vazio, monótono. As escolas de educação de professores estão
sobrecarregadas e não encontram seguidores suficientes, nas novas gerações,
sendo que alguns seminários de professores estão quase vazios e finalmente já há
algum tempo tem vindo a ser diminuto o número de alunos que procuram a escola.
Será possível desprendermo-nos desta imagem primordial? Pode-se
desgarrar da luz fulgurante que provém da visão de Steiner e, com o olhar sobre as
condições de vida em transformação do país, perceber o vislumbre de uma outra
imagem que surge ao longe, provinda da escuridão?
De acordo com o entrevistado A “Escola das Virtudes Waldorf” move-se por
um conjunto de finalidades que têm em vista a formação de trabalhadores que, para
além de empenhados e competentes, são em primeiro lugar cidadãos conscientes e
participativos na vida social, baseados no reconhecimento do “outro” como pessoa
humana e no respeito da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
125
Partilhando das finalidades consignadas na Lei de Bases do Sistema
Educativo - que estabelece como fins a alcançar no ensino ministrado na “Escola
das Virtudes Waldorf”– procura-se ir mais além, com o estabelecimento do projecto
educativo da Escola em estudo.
Desde a sua constituição que a “Escola das Virtudes Waldorf”– Cooperativa
de Ensino Polivalente e Artístico, C.R.L. tem como objectivo a formação Humana
pela via da Arte. Neste sentido foi sempre sua preocupação o desenvolvimento
duma formação humanista centrada na conjugação dos valores estéticos e éticos. É
nesse sentido que a entidade titular da “Escola das Virtudes Waldorf” é membro
associado da UNESCO, procurando dar materialização às suas finalidades
fundamentais em torno da defesa dos valores do património cultural da
humanidade.
Estes desígnios da “Escola das Virtudes Waldorf”- Cooperativa de Ensino
Polivalente e Artístico, C.R.L., foram inteiramente assumidos por esta Escola.
A Liberdade, a Responsabilidade e a Tolerância são os valores éticos
fundamentais duma sociedade democrática que se procura transmitir aos alunos,
pela própria vivência desses valores. Liberdade de pensamento, expressão e
criação. Responsabilidade perante a sociedade, a humanidade e a própria vida -
pelos actos praticados e omitidos e o dever de participação efectiva e activa.
Tolerância para com os outros, para com as ideias e culturas diferentes, no respeito
e convivência sadia com outras formas de ser, estar, fazer, sentir e viver a vida
sócio-cultural, política, religiosa e artística.
O despertar da sensibilidade estética – o aprender a ver, a ouvir, a sentir e a
comunicar – são uma primeira razão de ser deste ensino, num processo de
estimulação contínua da actividade de criação dos nossos alunos.
O respeito pelo Património Cultural e Natural da Humanidade - numa cidade
considerada Património Mundial da Humanidade - é outro dos vectores de acção. A
sensibilização para a necessidade de participação activa na defesa e preservação
do ambiente social, natural e cultural é, para todos, um imperativo ético.
Pretendendo-se uma relação professor – aluno baseada na afectividade,
contra quaisquer preconceitos pedagógicos e assente na concepção de que a
escola é a vida e não apenas a preparação para a vida, a escola em estudo
privilegia a ideia segundo a qual tanto alunos como professores têm sempre algo a
aprender e a transmitir.
126
Uma nova pedagogia assente na experimentação é a preocupação
fundamental deste ensino. Uma verdadeira aprendizagem só se faz fazendo.
Reconhecendo o papel que a teoria desempenha, esta deve encontrar-se
perfeitamente articulada com a prática. Só procurando pôr em acção os conceitos
nos apercebemos das dificuldades e os apreendemos em plenitude. A troca de
experiências e o desenvolvimento de contactos com outros povos, outras culturas,
outras escolas são alguns dos objectivos, através da participação em projectos
comuns a outras escolas e de intercâmbios internacionais.
No ensino profissional, estão claramente presentes estas ideias-chave.
Procura-se formar cidadãos que podem optar pela continuidade dos seus
estudos ou pela via do mercado de trabalho, porque se encontram aptos para
desenvolver qualquer uma destas actividades. Cidadãos conscientes e
responsáveis aptos para assumir as suas responsabilidades sociais e profissionais,
na sociedade ou no emprego. Cidadãos aptos a expressarem a sua criação ou
execução artística. Cidadãos aptos a lutarem pela defesa do património cultural e
natural da sua região ou país. Cidadãos confiantes nas suas capacidades e aptos a
enfrentarem os grandes desafios do futuro.
O ensino profissional da “Escola das Virtudes Waldorf” é orientado para o
desenvolvimento de uma vocação artística. Assim sendo, conscientes de que é
necessário conhecer o processo produtivo para nos apercebermos dos problemas e
dificuldades de execução dos projectos concebidos, atribui-se uma grande
importância às práticas oficinais. Por isso, todos os trabalhos de P.A.P. são
inteiramente concebidos e executados pelos alunos desta escola, no espaço da
mesma.
Em conclusão pode-se afirmar que a “Escola das Virtudes Waldorf” presta
uma formação profissional assente nos seguintes vectores: Formação da cidadania,
baseada no respeito da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão,
na defesa da Liberdade e na prática da Tolerância; Formação artística assente no
desenvolvimento da criatividade e da capacidade de desenhar e experimentar;
Formação cultural e ambiental orientada para a preservação do Património Cultural
e do Ambiente Natural e Social, em conformidade com os objectivos da UNESCO e
de outras Organizações Não Governamentais; Prática pedagógica inovadora
assente numa perspectiva activa do aluno e no desenvolvimento de uma relação
127
afectiva professor-aluno; Formação profissional valorizadora das dimensões da
concepção artística e execução prática.
A pedagogia Waldorf encontra-se em desenvolvimento, um século passou-
se, desde a sua existência, mas ao qual outros se seguirão. Tudo aquilo que no
momento se lamenta e se encara como indícios de decadência da escola Waldorf,
deve-se em grande parte à pouca aposta do Ministério que tutela a Educação. È
esperado que os sintomas de crise possam, entretanto, gerar uma mudança, no
sentido da direcção ideológico-filosófica que todos procuramos e que vai de
encontro à dignificação do ser enquanto Homem e cidadão. O que é certo é que o
pão se multiplica!
129
CONCLUSÃO
Ao longo desta investigação, que teve como pano de fundo questionar que
contributo dá a Pedagogia Waldorf para a Educação em Portugal, foi possível traçar
alguns pressupostos que poderão constituir a base para o sucesso da integração
deste modelo educativo alternativo que preconiza uma sociedade tolerante,
consciente, responsável e humana, não sendo por acaso que o número de
instituições baseadas na pedagogia Waldorf têm vindo a aumentar em Portugal e no
mundo.
A reforma e o desenvolvimento do sistema educativo têm estado na agenda
política e social, desde 1986. Nos últimos anos, foi possível generalizar o acesso à
educação, criar condições de funcionamento das escolas, estabilizar e dignificar o
exercício da profissão docente, imprimir novas dinâmicas na prática de ensino e
aprendizagem, procurando-se criar as condições básicas para a consolidação da
reforma, de forma a promover a realização pessoal, social e ocupacional das
gerações mais jovens.
O conceito generalizado do que é preconizado para a educação nas escolas
em Portugal traduz-se por desenvolver a personalidade, o carácter e as
competências de cada um, ajudar a descobrir e a desenvolver os talentos, permitir a
cada um atingir o seu máximo potencial de realização pessoal, levar a melhorar a
qualidade das suas próprias vidas, por um lado, e integrar o indivíduo na sociedade,
prepará-lo para a vida activa, dando-lhe sentido de realização pessoal e tornando-o,
ao mesmo tempo, socialmente útil, por outro, corresponde um tanto ao ideal que se
espera que a escola realize. Afirma-se ser competência das escolas a promoção do
desenvolvimento do espírito democrático e pluralista.
Estes dois tipos de preparação para a vida – preparar o indivíduo para que
ele se realize enquanto pessoa, e fornecer-lhe as ferramentas para que ele seja um
elemento socialmente útil, mediante a aquisição de competências que têm uso no
domínio da actividade laboral e ocupacional – originam tipos diferentes de funções e
de comportamentos dentro da actividade escolar.
Por um lado, os agentes educativos proclamam que é função essencial da
escola educar para a igualdade, a liberdade, a responsabilidade, a autonomia, o
espírito democrático e pluralista, os valores espirituais, estéticos, morais e cívicos, a
livre troca de opiniões, a criatividade, entre outros, que fazem do ser humano, um
130
ser único e diferente, que deve ser respeitado desde o momento que nasce, daí o
reconhecimento de que a função da educação é a função mestra em relação à qual,
qualquer outra lhe deve estar subordinada.
Deste modo, a referida função assume-se, então, como nobre, razão de ser
da escola e da actividade dos seus agentes de educação e ensino.
Porém, a realidade mostra-nos que assim não acontece e que a certificação
domina, cada vez mais, a actividade escolar, se necessário mesmo em detrimento
da pura actividade educativa e das aprendizagens a realizar pelos alunos ao longo
do seu percurso escolar.
De facto, as interpretações sobre a crise escolar e as propostas para a sua
solução são efectivamente muito diversas. Deparamo-nos com uma grande
diversidade de situações no domínio da educação, como também noutros domínios
de funcionamento da sociedade.
A aceitação crescente da certificação escolar no mundo de trabalho contém,
implicitamente, o reconhecimento que a escola forma os seus alunos, e de que esta
formação é, pelo menos potencialmente, utilizável como capacidade para a
actividade ocupacional.
Assim, a educação foi-se despojando das paixões e da sensibilidade que a
deveriam caracterizar.
De facto, verifica-se que a educação infantil tende a privilegiar o estudo do
ensino das línguas, das ciências naturais, a problemática da avaliação e a política
educativa, constatando-se uma diminuição, na prática, da importância do estudo da
problemática do desenvolvimento psicológico e das dimensões relacionais das
práticas educativas, ao mesmo tempo que se tende a valorizar as suas dimensões
instrumentais (práticas de ensino e práticas avaliativas).
É inegável o apontar da educação, da formação e do conhecimento como as
chaves-mestras do desenvolvimento humano. A massificação da educação coincide
com uma mudança de forma da escola. A escola para todos, ao abrir as suas portas
a novos públicos escolares, em todos os ciclos de ensino, está a significar uma
realidade qualitativamente distinta, com a qual todos os intervenientes educativos
ainda demonstram dificuldade em lidar.
Assim, a escola e o nosso sistema escolar, parecem viver uma dupla crise.
De regulação, porque não cumpre eficazmente o seu papel de integração social. De
emancipação porque não produz a mobilidade social aguardada por diversas
131
camadas sociais para quem a frequência de um curso constituíam a melhor
ferramenta que podiam legar aos seus filhos.
Em Portugal, assim como noutros países europeus, procurou-se responder a
esta nova realidade com reformas educativas sucessivas que, paradoxalmente,
parecem gerar mais e maiores sinais de crise e de mal-estar, afectando seriamente
a credibilidade da escola e o valor das suas aprendizagens.
A reforma educativa, iniciada em 1986 com a publicação da Lei de Bases do
Sistema Educativo e terminada em 1995 com a generalização a todos os anos de
escolaridade de novos planos curriculares, tem vindo a testar um processo típico de
mudança, que, embora deixando uma sensação de frustração, conduziram, pelo
menos ao nível do discurso, a uma mudança de lógica, que foi abrindo espaço a
uma lógica de inovação.
Assim, procura, de facto, definir um modelo de cidadão a ser educado e que,
por isso, dará certamente origem à definição de correspondente modelo educativo.
Preconiza-se, então, a criação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos,
solidários, com espírito democrático e pluralista, respeitadores dos outros, das suas
ideias e das suas culturas, abertos ao diálogo e à livre troca de opiniões, críticos e
criativos em relação ao meio social, capaz de uma reflexão consciente sobre os
valores espirituais estéticos, morais e cívicos, possuidor de capacidade para o
trabalho e a vida activa e ainda para a utilização criativa dos tempos livres.
Verifica-se que a aposta na educação, é hoje, mais do que nunca, um
imperativo ético, cultural, social e político, mas é também uma questão de sentido
de Estado e de lucidez estrutural e conjuntural.
Nesta linha de ideias, comprova-se, pelo estudo realizado que a pedagogia
Waldorf contribui para a educação em Portugal, na medida em que promove a
participação activa e criativa dos alunos e a livre iniciativa dos mesmos; promove o
crescimento e responsabilização pessoal; desenvolve as relações interpessoais;
explora o mundo das ideias, desenvolvendo o seu conhecimento, capacidades e
qualidades próprias; favorece a integração social dos alunos/crianças; promove o
espírito comunitário.
A rápida evolução a que temos vindo a assistir em todos os domínios, impõe
necessariamente modificações a nível da educação formal, ou seja da própria
escola.
132
Como se sabe, o grande centro da educação é o educando, enquanto
realidade eminentemente digna e valiosa ao serviço da qual se ordena e realiza
todo o processo educativo.
Ora a dignidade e o valor da pessoa humana reduzem-se a palavras vãs se
não se reconhecerem como intrínsecas à pessoa a liberdade e a autonomia. O
homem em conquista permanente de espaços de liberdade, constitui o sujeito
transcendente de todo o processo educativo e a autonomia pessoal é a
consequência directa de todo um percurso de formação da personalidade humana.
A aposta mais complexa e mais nuclear da educação moderna é educar para a
liberdade e para a autonomia.
A marcha do Homem é, na sua própria essência, uma caminhada de
liberdade, de perfectibilidade, de procura da verdade que há em si próprio.
A verdade só pode surgir como resultado de uma busca e de uma luta que
cada um de nós tem que travar consigo próprio por sua conta e risco, é esse o
sentido da sentença délfica invocada por Sócrates: "Conhece-te a ti próprio...".
A educação deve ajudar a desenvolver as pessoas naquilo que mais as
caracteriza como pessoas, isto é na autonomia e na liberdade. A educação deve
permitir ao indivíduo abrir os seus horizontes e sentir-se plenamente membro da
comunidade humana. Neste sentido, será possível considerar o contrário, uma
verdadeira educação pois conduz o indivíduo ao isolamento, não permitindo o
desenvolvimento pleno da sua personalidade.
Objectiva-se, então a construção de novas competências por parte dos
professores, especificamente no plano de gestão do currículo, dado que os
professores sempre foram treinados a cumprir os programas nacionais das
disciplinas, fazendo-o através do manual escolar adoptado, segundo cargas
horárias determinadas superiormente.
A necessidade de elaborar projectos curriculares de escola e de turma,
significa, inequivocamente, uma ruptura nas formas de gestão do currículo por parte
dos professores, dando-lhes maior autonomia mas transferindo para eles grande
parte das responsabilidades relativamente à qualidade das aprendizagens e ao
combate ao insucesso e abandono escolares.
Como tal, esta medida deveria ser acompanhada de muito perto por parte da
administração educativa, criando condições de formação aos professores
(principalmente, em contexto de trabalho) e fornecendo às escolas apoios
133
especializados no campo da organização e do desenvolvimento curricular,
permitindo também a criação de modelos educativos alternativos, uma escola
diferente, onde os objectivos preconizados na nossa Lei de Bases do Sistema
Educativo e na Constituição da Republica sejam concretizados e procurem dar
resposta aos anseios sentidos pelo homem, em particular e pela sociedade, em
geral.
Pela análise dos objectivos e repetidos discursos políticos, verifica-se que
existe uma clara preocupação no que concerne ao combate do atraso significativo
relativamente aos países centrais no espaço europeu e no primeiro mundo, o que
está a conduzir a uma mudança de forma da escola, ou seja, os valores
consolidados ao longo de mais de um século, as regras e os objectivos que
presidiram à construção da escola tal como foi sendo conhecida, ao longo dos
percursos escolares, estão definitivamente em crise. Daí que assistimos, cada vez
mais, que a agenda pública fixada pelos mass media, esteja particularmente
centrada em duas questões: a violência e a indisciplina escolares, verificada
sobretudo nas periferias das grandes cidades; e a qualidade das aprendizagens na
escola massificada dos nossos dias.
Tudo isto exige uma forte atenção dos responsáveis políticos e dos
investigadores do campo social.
Agora, ser professor tornou-se, ainda mais acentuadamente nos tempos que
correm, uma profissão de risco. Por outro lado, os alunos e a sociedade em geral
revelam-se insatisfeitos.
Alguns sociólogos consideram a existência de uma epidemia política,
impulsionada por poderosos agentes globalizadores, de que a OCDE constitui o
mais significativo think tank mundial. As reformas da educação tornaram-se uma
obsessão dos governos nos mais distintos lugares no sistema mundial, com
situações políticas e sociais bem distintas, dominando, neste contexto, a
competitividade, a prestação de contas e a performatividade. A continuar assim, a
escola/educação poderão por em causa os pilares verdadeiramente importantes na
criação de uma sociedade justa, participativa, democrática, solidária …. Fazendo
com que a educação deixe de ser um direito social e de bem-estar individual e
público.
No sentido de realçar a importância dos valores, do saber ser, do saber estar
com os outros, … e até de eliminar a frustração e desmotivação sentida pelos
134
professores, em que se tem constatado pela afirmação da maioria, que sentem que
nunca trabalharam tanto para ver tão poucos resultados no seu trabalho, mas antes
pelo contrário, valorizar o seu papel, em que sejam eles mesmos a querer e sentir
necessidade de (re)adaptarem-se às exigências da sociedade, procurando
formações, cursos, que os façam sentir mais úteis e com valor, e que entendam
para que servem, afinal, e qual o seu papel, em todo o processo educativo, buscou-
se na Escola Waldorf, criada por Rudolf Steiner, uma resposta a esta problemática.
A Escola Waldorf apresenta-se, então, como alternativa ao sistema/modelo
educativo vigente, tratando-se de um tipo de pedagogia que busca valorizar o ser,
bem como um regime de liberdade de ensino no que se refere às metas da
educação (deve haver a possibilidade de conceber essas metas da forma mais
ampla possível. A escola Waldorf pretende ser algo mais do que as escolas
tradicionais); ao método pedagógico (sendo pelo seu método que se distingue das
outras escolas); e ao currículo (não significando, com isto, que as matérias exigidas
pelos programas oficiais de ensino não sejam aí leccionadas, significa, pelo
contrário, que matérias/disciplinas adicionais possam ser incluídas no seu
programa, e sobretudo que cabe à escola determinar a época em que as matérias
devem ser ensinadas).
Verifica-se, assim, que nos três aspectos supracitados (metas da educação;
método pedagógico e currículo), cada escola Waldorf deve ser autónoma e não
sofrer a influência de qualquer órgão oficial, mas antes receber apoios e incentivos.
Toda a educação, em todas as instituições, em todo o território português, é
regulada pela acção político-governamental mediada pelo Ministério da Educação.
As iniciativas e instituições que não se sujeitarem a esta coordenação, seja quais
forem as razões e as especificidades em causa, não fazem parte do sistema
educativo definido e regulado na Lei, com todas as implicações previsíveis.
Deste modo, fica irrecusavelmente definida a impossibilidade legal da
existência de modelos educativos, nomeadamente escolares, de estrutura,
finalidades e conteúdos diferenciados regionalmente. O sistema assume-se como
único e uniforme para todo o território nacional, em que para os ensinos básico e
secundário os planos curriculares são nacionais, podendo, contudo, existir leves
variações regionais, bem como a permissão do ensino doméstico, no primeiro ciclo.
Encontram-se pontos convergentes na nossa Lei de Bases do Sistema
Educativo e nos princípios da Pedagogia Waldorf, nomeadamente no que se refere
135
à meta estabelecida por ambos: proporcionar à criança e ao jovem o desabrochar
harmonioso de todas as suas capacidades, considerando as esferas física,
emocional e espiritual do ser humano, com vista a um desenvolvimento integral.
Importa, pois, proporcionar à sociedade humana a formação de jovens
dotados de grande criatividade, discernimento e auto-consciência, capazes de
contribuir positivamente para os destinos do mundo, à medida que compreendam o
seu próprio sentido existencial.
Evidencia-se, como tal, a necessidade da reconfiguração das escolas como
organizações educativas e como lugares de formação e inovação, não só para os
alunos, mas também para os próprios professores.
"Ensinar é Amar". O amor não é apenas uma palavra, mas sim o
acontecimento soberano da vida humana, centro de toda e qualquer teoria
educativa.
O amor é o segredo da Pedagogia, pautando toda a sua actividade de
educador e de professor.
Importa analisar os perfis que os jovens apresentam à saída da escolaridade
obrigatória que cada um foi obrigado a frequentar, de acordo com as leis e
objectivos do seu país, independentemente da extensão desta escolaridade ou da
idade do jovem no final da formação de base.
Assim, torna-se premente optimizar as situações organizativas de trabalho
como potenciais contextos de formação e inovação, de modo que se propiciem
dinâmicas que possibilitem a mudança da organização.
A escola é, pois, o pilar central da melhoria, das paixões e da sensibilidade.
A escola cinzenta, fechada, estática, uniforme, conformista, deverá dar lugar
a uma escola aberta, criativa, humanizante, o que poderá ocorrer se formos
capazes de identificar as causas profundas que estão por trás de uma instituição
que, em muitos aspectos, deixou de ter condições para “competir” com os outros
“mecanismos” que inter-actuam com a criança e com o adolescente no seu
percurso escolar.
De facto, a educação é e será sempre uma aventura, onde se correm riscos,
porque é uma realização do homem na liberdade e na opção, mas é uma aventura
que vale a pena, pois é a procura do modelo mais adequado de homem para cada
momento e para cada cultura. Pressupõe uma antropologia e uma filosofia e nesse
sentido pode-se dizer que é um compromisso com o passado, o presente e o futuro.
136
Em síntese, a Pedagogia Waldorf contribui para a educação em Portugal,
enquanto modelo educativo inovador e promotor da liberdade, da responsabilidade,
do respeito pelo outro e por si mesmo. Efectivamente, a concepção de homem, que
temos actualmente, leva a um novo conceito de educação, tratando-se de uma
educação personalizada. Hoje, a educação não pode reduzir-se à transmissão e
aquisição de conhecimentos, mas tem que abarcar a pessoa toda, devendo ser uma
educação integral, que responda às necessidades do educando, no sentido do
desenvolvimento de todas as suas faculdades.
Não é esse o caminho que tem vindo a apontar a Lei de Bases do Sistema
Educativo Português (pelo menos teoricamente) e os artistas da educação – os
professores e os alunos – apaixonados pelo que fazem?
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Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto, (Segunda Alteração à Lei de Bases do Sistema
Educativo).
153
ANEXO 1 – GUIÃO DA ENTREVISTA
BLOCO A
Razões/motivações da participação no projecto Waldorf
1. Como surgiu a Ideia do “Projecto/ JI Waldorf”?
2. O que motivou a participação neste projecto? O que levou a construir o JI nesta pedagogia?
BLOCO B Inicio do projecto
1. Em que ano e contexto surgiu o Projecto Waldorf/ JI Waldorf?
2. Para que público-alvo?
BLOCO C Desenvolvimento do projecto
1. Quais os pontos fortes do “Projecto/ JI Waldorf”?
2. Quais as principais dificuldades/obstáculos sentidos? E que dificuldades encontram na actual política educativa portuguesa?
3. Onde pensa que pode melhorar este tipo de pedagogia?
4. Qual a participação que os alunos têm/tiveram?
5. Como é que tem sido a integração das crianças no primeiro ciclo e/ou restantes?
6. Que vantagens traz este tipo de pedagogia?
7. Como foi/tem sido a aceitação deste tipo de ensino na comunidade, em geral, e nos pais, em particular?
8. Caso não tenha tido continuidade (tenha cessado) o que falhou?
9. Quais as actividades privilegiadas?
10. As novas tecnologias também têm/tinham lugar, no processo educativo dos alunos?
11. Qual a importância do ensino/inclusão das actividades música, o canto, a fala, e euritmia nos primeiros anos de vida?
12. Quais as perspectivas de futuro, quanto à implementação desta pedagogia?
BLOCO D Ideário
1. Quais os valores, tradições e símbolos Waldorf, praticados?
154
ANEXO 2 – ENTREVISTA AO DIRECTOR EXECUTIVO DA “ESCOLA DAS VIRTUDES WALDORF”, LOCALIZADA NO PORTO
Em muito boa hora, foi definido para ser entrevistado, o director executivo da
“Escola das Virtudes Waldorf”, situada no Porto.
A pessoa entrevistada, com ligações, pedagógicas e de direcção à “Escola
das Virtudes Waldorf”, ajusta-se ao perfil definido na amostra do estudo empírico da
actual dissertação de Mestrado em Administração e Planificação da Educação, a
apresentar na Universidade Portucalense – Porto, intitulada “A Pedagogia Waldorf:
Um contributo para a Educação em Portugal”.
Caracterização do Entrevistado
Nome: Entrevistado A
Funções: Director Executivo e Vice-Presidente da Direcção da “Escola das Virtudes
Waldorf”, entidade proprietária do extinto “Projecto Waldorf”.
Situação Profissional: Director da “Escola das Virtudes Waldorf”
1. Como surgiu a ideia do projecto “Projecto Waldorf”?
Por proposta do Doutor Jacinto Rodrigues, quando se discutiam no seio da
Cooperativa Árvore as formas de concretizar o projecto de formação humanística
pela via da arte, desde a pré-primária até ao ensino superior.
2. Qual era o seu público-alvo?
Crianças oriundas da classe média e classe média-alta, devido ao grau de
informação das suas famílias, e crianças com necessidades educativas especiais.
3. Em que ano e contexto surgiu o “Projecto Waldorf”?
Como projecto de ensino formal em 1982, com a criação das “cooperativas de
ensino artístico Waldorf”, dando seguimento ao processo iniciado em 1980 no seio
da “Cooperativa Waldorf”, de ensino informal.
155
4. O que motivou este projecto? O que levou a construir o “Projecto Waldorf”,
nos princípios da Pedagogia Waldorf?
O facto de possibilitar uma fusão entre o ensino formal e o ensino artístico.
5. Quais os pontos fortes do “Projecto Waldorf”?
A comunicação entre as crianças e os jovens e adolescentes, em virtude da partilha
de espaços com o ensino secundário e o ensino superior.
6. E os pontos fracos?
Os parcos recursos materiais e as insuficiências de financiamento.
7. Quais as principais dificuldades/obstáculos sentidos? (angústia educativa).
A incompreensão da tutela perante o projecto educativo.
8. Que dificuldades se encontraram ou se encontram, tendo em conta a actual
politica educativa portuguesa?
No contexto em que o projecto foi vivido (entre 1982 e 1992), não havia ainda
condições subjectivas para a sua existência. O Ministério não foi capaz de
compreender a importância da partilha entre os diferentes sectores de ensino,
fazendo sair legislação a impedir a utilização comum dos espaços.
9. Onde pensa que pode melhorar este tipo de pedagogia?
Actualmente, o “Projecto Waldorf” não existe. Mas, se nos fosse permitido recriá-lo,
iríamos reforçar o peso da educação informal, com a introdução de novas artes no
projecto e o alargamento para o domínio ambiental, que não foi inicialmente
concretizado por ausência de meios.
10. Qual a participação que os alunos tinham?
156
Na definição dos trabalhos a realizar, e na aprendizagem da responsabilidade.
11. Quais eram as actividades privilegiadas pelo “Projecto Waldorf”?
As artes visuais (desenho, pintura, objectos tridimensionais, cinema de animação).
12. Em seu entender qual a importância do ensino/inclusão das actividades
música, o canto, a fala, e euritmia nos primeiros anos de vida?
Considero que são fundamentais para a formação integral da pessoa humana. No
caso concreto do “Projecto Waldorf”, não as pudemos realizar inteiramente, por
dificuldades materiais.
13. As novas tecnologias também tinham lugar, no processo educativo dos
alunos que frequentavam o “Projecto Waldorf”?
Não época, as novas tecnologias da comunicação e informação davam ainda os
primeiros passos... não havia Internet. Se fosse hoje, teriam um papel importante na
vida da instituição, a exemplo do que acontece na formação inicial de jovens.
Contudo, fomos os primeiros a utilizar a tecnologia do cinema com crianças do
ensino primário, produzindo filmes de animação.
14. Quais os valores, tradições e símbolos Waldorf seguidas no “Projecto
Waldorf”?
A complementaridade da formação formal com a formação informal. No nosso caso,
a integração das artes visuais, dado não termos meios para mais.
15. Como foi a integração das crianças no primeiro ciclo, comparativamente com
as outras?
Ocorreu sempre com naturalidade.
16. Que vantagens trouxe este tipo de pedagogia, no seu ponto de vista?
157
Uma educação mais completa e integral, com um acentuado desenvolvimento da
responsabilidade, da afectividade e da sensibilidade estética.
17. Como foi a aceitação deste tipo de ensino, na comunidade, em geral, e nos
pais, em particular?
Os pais aceitavam bem, pois reconheciam os resultados da educação. A
comunidade em geral e o M.E. em particular, manifestavam algum estranhamento.
18. Em Steiner, o programa educativo contempla disciplinas como Inglês,
História, Ciências (que engloba áreas como Astronomia, Meteorologia ou
Geografia), Matemática, Farmácia, sem nunca abdicar da Educação Física,
Jardinagem e Artes Performativas e Decorativas. O mesmo acontecia no ensino
outrora ministrado no “Projecto Waldorf”? Havia variâncias? Se sim, quais e
porquê?
Parcialmente. Como foi afirmado atrás, assentávamos a nossa acção em educação
no domínio das artes, com predominância das artes visuais e do cinema de
animação.
19. O que falhou no “Projecto Waldorf”, dado que actualmente não existe?
O financiamento. O impedimento de partilha comum dos espaços com os outros
níveis de ensino, levou à criação de um novo espaço específico para o “Projecto
Waldorf”, com o respectivo acréscimo de custos com funcionários, dado não ser
mais possível gerir uma partilha comum de recursos materiais e humanos. Visto
tratar-se de uma escola pequena, o disparar dos custos determinou a sua
inviabilização financeira.
20. Quais as perspectivas de futuro, quanto à implementação desta pedagogia?
Parecem-nos boas, e penso que a maturidade alcançada pelo país, permite agora
uma maior abertura para projectos inovadores, de que é exemplo o sucesso da
Escola da Ponte.
Muito obrigada pelo contributo e pela gentileza e cordialidade prestados na presente entrevista. Desejo que continue a desempenhar um papel de profissional correcto e a empenhar-se na prestação de serviços às crianças e/ou à educação, para que, tendo como este exemplo, outras instituições e pessoas saiam das suas comodidades e se multipliquem na busca pela construção de uma SOCIEDADE MAIS: saudável, feliz, fraterna, tolerante, responsável, … e democrática!
Ana Silva
158
ANEXO 3 – ENTREVISTA AO DOCENTE DO EXTINTO “PROJECTO WALDORF”, CRIADO PARA AS CRIANÇAS
Em muito boa hora, foi definido para ser entrevistado, o professor do extinto
“Projecto Waldorf”, outrora integrado na “Escola das Virtudes Waldorf”.
A pessoa entrevistada, com ligações, pedagógicas ao projecto referido,
ajusta-se ao perfil definido na amostra do estudo empírico da actual dissertação de
Mestrado em Administração e Planificação da Educação, a apresentar na
Universidade Portucalense – Porto, intitulada “A Pedagogia Waldorf: Um contributo
para a Educação em Portugal”.
Caracterização do Entrevistado
Nome: Entrevistado B
Funções no Projecto: Docente do extinto “Projecto Waldorf”, outrora integrado na
“Escola das Virtudes Waldorf”
1. Como surgiu a ideia do projecto “Projecto Waldorf”?
Eu trabalhei no período correspondente aos três últimos anos do «“Projecto
Waldorf”», não estou, por isso, relacionado com a sua génese. Posso dizer,
contudo, que o “Projecto Waldorf” era, ao tempo, uma das três escolas com
autonomia pedagógica que lhe era reconhecida devido ao projecto que aí se
animava. Isto implicava que a escola tinha direito a subvenções financeiras, sendo
os seus alunos obrigados a realizar, por exemplo, exames no fim do 4º ano de
escolaridade. Tal autonomia devia-se ao facto do “Projecto Waldorf” atribuir um
valor decisivo às áreas de educação e de expressão artística, fruto do seu vínculo
espiritual à «Pedagogia Waldorf». Assim, a par do trabalho nas denominadas áreas
curriculares tradicionais, havia um espaço e um tempo de intervenção equivalente
em actividades nos domínios da Informática, do Cinema de Animação, da
Expressão Plástica, da Expressão Dramática, etc. Estamos a falar de uma escola
que funcionou durante a década de 80 do século passado, que hoje seria uma
«escola a tempo inteiro», ainda que pudesse servir de referência a esse projecto,
quer por via da organização flexível que permitia respostas inusitadas que tinham
em conta as oportunidades educativas dos contextos e das situações, bem como as
vivências e alguns dos desejos de exploração das crianças, quer por via da
159
qualificação das pessoas que aí trabalhavam, quer por via do processo de
animação pedagógica que se animava.
2. Para que público-alvo surgiu?
O “Projecto Waldorf” tinha crianças em idade pré-escolar e no que, hoje, se designa
por 1º Ciclo do Ensino Básico.
3. O que motivou este projecto? O que levou a construir o “Projecto Waldorf”,
nos princípios da Pedagogia Waldorf?
O “Projecto Waldorf” era uma escola do Ensino Particular e Cooperativo, integrada
na “Escola das Virtudes Waldorf”.
4. Em que ano e contexto surgiu o “Projecto Waldorf”?
Estamos a falar de uma escola que funcionou durante a década de 80 do século
passado, até aos princípios dos anos 90.
5. Quais os pontos fortes do “Projecto Waldorf”?
Creio que no “Projecto Waldorf” o importante era o clima educativo que aí se vivia.
Um clima que permitia às crianças assumir um protagonismo raro, sem que isso
significasse que os educadores e os professores se demitissem quer de ser adultos,
quer de ser educadores e professores. Havia um clima de grande abertura entre
todos e de relacionamento positivo, sem que se abdicasse da exigência e do rigor
que, neste caso, não eram critérios externos aos alunos ou, apenas, instrumentos
de selecção académica. Era o rigor e a exigência necessários à apropriação de um
dado património cultural, o qual, neste caso, não se circunscrevia somente à
Matemática, à Língua Materna e ao Estudo do Meio, mas também às vivências e
experiências que as áreas de expressão artística permitem potenciar. Era, também,
um espaço intergeracional, onde conviviam as crianças com os jovens que
frequentavam os cursos que a Cooperativa desenvolvia (Design, Animação Cultural,
Teatro, etc.) e isto constituía um factor educacional relevante. Outro factor a
valorizar diz respeito ao facto de haver um projecto, nem sempre tão explícito como
o deveria ser, que encontrava em Rudolf Steiner e na Pedagogia Waldorf uma das
suas referências fundamentais. Não era a única, mas era certamente uma das mais
160
relevantes. As intenções educativas do «“Projecto Waldorf”», a sua organização, a
sua proposta para o exterior estavam marcadas por este facto.
6. Quais as principais dificuldades/obstáculos sentidos? (angústia educativa)
As dificuldades que íamos sentido são de diversos tipos. Tínhamos aquelas que
diziam respeito aos problemas financeiros da escola, na medida em que as
mensalidades estavam longe de cobrir as despesas com um corpo de educadores
tão amplo e variado. Tínhamos o problema da autonomia pedagógica que obrigava
os nossos alunos finalistas a terem que fazer o já referido exame no final do 4º ano.
Tínhamos, também, alguns problemas pedagógicos fruto de um conjunto de
equívocos sobre os quais vale a pena falar. O equívoco em torno das competências
da criatividade, pensando-se que estas eram desenvolvidas, sobretudo, pelas
actividades na área da Educação e das Expressões Artísticas. O equívoco em torno
da influência da Escola, a qual era pensada de uma forma excessivamente
determinista. Acreditava-se que aquele tipo de educação iria gerar adultos mais
vocacionados para as actividades artísticas, gente mais autónoma e capaz de
assumir um modo de estar no mundo diferente, como se a Escola tudo pudesse e
não houvesse outras fontes de influência sobre os nossos comportamentos. Por
outro o lado, havia questões do foro pedagógico, no domínio da escrita e da leitura,
da matemática e do Estudo do Meio que importava enfrentar, já que continuavam
reféns do que nós designamos por Pedagogia Tradicional. De resto era uma escola
com os problemas comuns a todas as escolas, problemas entre professores, que lá
se iam resolvendo, problemas com encarregados de educação que se iam gerindo,
problemas com a administração, problemas com alunos que nem sempre
aprendiam com nós gostaríamos que aprendessem. Tal como em muitas outras
escolas também nós, por vezes, parecíamos desejar que os alunos aprendessem
sozinhos, o que não deixa de ser um paradoxo, porque se isso acontecesse para
que é que precisariam de nós?
7. Que dificuldades se encontraram ou se encontram, tendo em conta a actual
politica educativa portuguesa?
Não é possível comparar a década de 80/90 com o tempo em que hoje vivemos.
Creio que nessa altura possuíamos, para o melhor e para o pior, uma margem de
manobra que hoje se estreitou. Apesar de toda a conversa sobre autonomia,
161
construção de projectos educativos ou de projectos curriculares a profissão docente
tende a proletarizar-se, no momento em que as decisões que competem aos
professores tendem a ser assumidas por outros. Claro que os professores têm uma
quota parte de responsabilidade neste estado de coisas, já que delegam, muitas
vezes, as suas responsabilidades noutros actores da cena educativa. Nesse
aspecto há coisas em comum entre esse tempo e o tempo actual. As políticas
educativas são um factor de influência a considerar, mas não são tão determinantes
como alguns nos querem fazer crer. Há um espaço profissional que diz respeito aos
professores e que estes terão que entender como um espaço de afirmação. No
caso do “Projecto Waldorf” a autonomia pedagógica permitia-nos fazer coisas
únicas e singulares, ainda que eu acredite que mesmo sem esse contrato seria
possível ter realizado uma parte substancial do que, afinal, fomos realizando. Ou
seja, não foi a política educativa dos governos de então que nos impediu, bem pelo
contrário, de fazer o que quer que seja. Veja-se, por exemplo, a importância que
assumiram as áreas de Educação e Expressão Artísticas no programa educativo da
escola. Havia um programa e a valorização pública do mesmo. Hoje é que me
parece que as coisas são diferentes. Em nome da necessidade de se valorizarem
as áreas das expressões, fez-se tudo o que não se devia fazer com a estrutura que
o ME propôs para as Actividades de Enriquecimento Curricular.
8. Onde pensa que pode melhorar este tipo de pedagogia?
------------
9. Qual a participação que os alunos têm?
No «Projecto Waldorf» a participação dos alunos nas áreas de Expressão Artística
era um elemento decisivo do projecto. Não creio que se possa promover a
educação de quem quer que seja neste domínio se os alunos não tiverem espaço
para se exprimirem, para avaliarem o trabalho realizado, para partilharem. Isto não
significa que os professores não são decisivos. Claro que o são, mas são-no como
organizadores de ambientes, como interlocutores qualificados, como alguém que
não faz pelos outros aquilo que aos outros compete fazer.
10. Quais foram os valores, tradições e símbolos Waldorf, no “Projecto Waldorf”?
Da Pedagogia Waldorf creio que só a valorização das áreas de expressão artística
é que pode ser considerada como o elemento que permaneceu no projecto que o
162
«Projecto Waldorf» constituiu. A relação com a Natureza, a visão de criança e
mesmo alguns dos rituais propostos por Steiner nunca constituíram elementos
relevantes e influentes.
11. Como é que foi a integração das crianças no primeiro ciclo,
comparativamente com as outras?
Não tenho dados objectivos para responder a essa pergunta. Hoje, os meus alunos
já terminaram a sua formação académica. A grande maioria foi bem sucedida em
áreas muito diferentes entre si. Há engenheiros, uma arquitecta, uma astrofísica,
psicólogos, gente ligada ao teatro e outros que não fizeram formação universitária.
Não descortino um padrão, a não ser o facto de todos serem crianças oriundas de
famílias de classe média, cujos pais valorizavam, de facto, as áreas da educação
artística como áreas de formação decisivas.
12. Que vantagens traz este tipo de pedagogia, no seu ponto de vista?
Não creio que, hoje, se possa valorizar a Pedagogia Waldorf como uma resposta
educativa exclusiva. Steiner tem uma obra e uma reflexão que podemos aproveitar
pela riqueza da mesma, mas não aceito que se possa propor um projecto em torno
da Antroposofia. Faz sentido, olhar com atenção para alguns dos contributos desta
corrente pedagógica, mas não me parece que continue a fazer sentido uma visão
pedocêntrica da educação, ainda que seja necessário afirmar a necessidade de
uma acção educativa que não se circunscreva a um instrumentalismo que impede
as crianças de serem crianças.
13. Como foi (tem sido) a aceitação deste tipo de ensino, na comunidade, em
geral, e nos pais, em particular?
A Pedagogia Waldorf é de tal modo alternativa que não se pode responder a esta
questão. Aqueles que podem optar pela mesma fazem-no sabendo o que
pretendem. Não é uma proposta de massas, logo a ela aderem, apenas, aqueles
que a reconhecem de antemão como uma proposta pertinente.
14. O que falhou no “Projecto Waldorf”, dado que actualmente não existe?
O «Projecto Waldorf» acabou por razões relacionadas com uma deficiente gestão
financeira do projecto que impediu a sua consolidação e desenvolvimento.
163
15. Quais as perspectivas de futuro, quanto à implementação desta pedagogia?
A Pedagogia Waldorf é passado. Faz parte do património pedagógico de que, hoje,
dispomos mas não creio que possa ser mais do que isso. É mais importante pela
influência implícita que exerce, do que propriamente pela aceitação entusiástica do
programa que propõe. Falha pelo seu pedocentrismo e por uma visão
excessivamente determinista do desenvolvimento humano. Convém, no entanto,
não considerar a minha posição como uma falta de respeito e de reconhecimento
da obra de Steiner. Essa obra merecia até uma outra divulgação, pode-nos ajudar,
até, a pensar melhor algumas questões com que hoje nos defrontamos, mas é uma
proposta do início do séc. XX e nós estamos já no século XXI. Nós, hoje, somos
obrigados a saber que nenhuma proposta pedagógica pode decidir por nós o
projecto que teremos que desenvolver enquanto professores, daí que a Pedagogia
Waldorf só possa ser útil se contribuir para alargar o nosso campo de reflexão sobre
as possibilidades educativas de que dispomos
Muito obrigada pelo contributo e pela gentileza e cordialidade prestados na presente entrevista. Desejo que continue a desempenhar um papel de profissional correcto e a empenhar-se na prestação de serviços às crianças e/ou à educação, para que, tendo como este exemplo, outras instituições e pessoas saiam das suas comodidades e se multipliquem na busca pela construção de uma SOCIEDADE MAIS: saudável, feliz, fraterna, tolerante, responsável, … e democrática!
Ana Silva
164
ANEXO 4 – ENTREVISTA À DIRECTORA E EDUCADORA DO “JARDIM-DE-INFÃNCIA WALDORF”, LOCALIZADO EM ALFRAGIDE
Em muito boa hora, foi definido para ser entrevistada, a directora pedagógica
do Jardim-de-infância Waldorf, em Alfragide.
A pessoa entrevistada, sendo educadora com responsabilidades na direcção
de um Jardim-de-Infância com pedagogia Waldorf, ajusta-se, na íntegra, ao perfil
definido na escolha da amostra para o estudo empírico da actual dissertação de
mestrado em Administração e Planificação da Educação, a apresentar na
Universidade Portucalense – Porto, intitulada “A Pedagogia Waldorf: Um contributo
para a Educação em Portugal”.
Caracterização do Entrevistado
Nome: Entrevistada A
Funções: Educadora e Directora Pedagógica do “JI Waldorf”, localizado em
Alfragide
1. Como surgiu a ideia do projecto “Jardim-de-infância Waldorf”?
A ideia deste projecto de surgiu de um grupo de professores e pais interessados em
desenvolver este tipo de pedagogia no nosso país. Os professores, tendo adquirido
formação em Pedagogia Waldorf no estrangeiro, nomeadamente em Inglaterra,
ambicionavam poder desenvolve-la cá; os pais, tendo vivido também no estrangeiro
(Alemanha) onde tomaram contacto com esta pedagogia, queriam uma escola em
Portugal para os seus filhos. Desses interesses que se complementavam, surgiu em
1984 a “Associação de Pais para o Desenvolvimento de um Ensino segundo Rudolf
Steiner”.
2. Para que público-alvo surgiu?
O público-alvo deste projecto foram as crianças das pessoas que o impulsionaram,
bem como todas as crianças cujos pais se encontravam descontentes com o ensino
oficial e procuravam uma visão mais “alternativa” da educação. Ainda hoje é este o
público-alvo.
3. O que motivou este projecto? O que levou a construir este Jardim, nos
princípios da Pedagogia Waldorf?
165
Para além do que foi dito anteriormente, a convicção profunda de que a Pedagogia
Waldorf e a ideia de ser humano que lhe está subjacente são o caminho para a
formação de um ser humano verdadeiramente livre.
4. Em que ano e contexto surgiu o “Jardim-de-infância Waldorf”?
(ver anteriores)
5. Quais os pontos fortes deste Jardim?
Considero que um dos pontos fortes nesta pedagogia e neste Jardim-de-infância
seja o facto de cada criança poder expressar e manifestar a sua própria
individualidade, enquanto ser único no seu processo de desenvolvimento, onde o
medo e a dúvida não têm lugar.
6. Quais as principais dificuldades/obstáculos sentidos?
As diferentes posturas face à Infância por parte de outros agentes educativos.
7. Que dificuldades se encontraram ou se encontram, tendo em conta a actual
politica educativa portuguesa?
Nenhumas. Somos ainda um mundo à parte.
8. Onde pensa que pode melhorar este tipo de pedagogia?
A possibilidade de melhorar está sempre na Auto-Educação…Quem promove e
aplica esta Pedagogia pode e deve sempre evoluir para melhor.
9. Quais são as actividades privilegiadas deste Jardim?
Todas as que têm um verdadeiro sentido para as crianças. Actividades que estejam
ligadas aos diferentes ritmos vividos no jardim-de-infância, como as que estão
ligadas aos processos que culminam nas festividades (ritmo anual), por exemplo.
10. As novas tecnologias também têm lugar, no processo educativo dos alunos
que frequentam o jardim?
Não.
166
11. Concorda com a divisão em seténios, tal como a concebe Steiner? Durante o
primeiro, que é que considera importante ensinar?
Concordo. Considero importante proporcionar um leque diversificado de
experiências e vivências boas, belas e verdadeiras que constituam um “bom
alimento” para a criança pequena.
12. Qual a importância do ensino/inclusão das actividades música, o canto, a
fala, e euritmia nos primeiros anos de vida?
Nos primeiros anos de vida o canto é dos mais importantes. Tocar Lira é bom para
os bebés também. A música e a Euritmia vêem posteriormente, a partir dos 3 anos.
Constituem um grande contributo para a harmonização das forças da vontade e do
sentimento da criança do 1º seténio.
13. Qual a participação que os alunos têm?
Toda. As crianças vivem no presente e onde estão inteiras. A sua participação é
plena.
Se a pergunta se refere a que por vezes as crianças não aderem todas às mesmas
propostas, obviamente que nem sempre estão dispostas a tudo, pelas mais
variadas razões.
14. Quais os valores, tradições e símbolos Waldorf no “Jardim-de-infância
Waldorf”?
Valores: o Amor, a Amizade, o Respeito, a Reverência, A Paz, o Cuidado pelo
Ambiente.
Tradições: as festividades adequadas a cada cultura.
Símbolos Waldorf: o próprio professor/ educador, constitui o símbolo Waldorf
15. Como é que tem sido a integração das crianças no primeiro ciclo,
comparativamente com as outras?
Depende de cada criança e depende do(a) professor(a) que cada criança encontrar
no seu percurso escolar. No entanto, normalmente as nossas crianças estão ávidas
de aprender e socialmente estão bem preparadas.
167
16. Que vantagens traz este tipo de pedagogia, no seu ponto de vista?
Muitas. Se esta pedagogia for bem aplicada, contribui para que o ser humano se
sinta seguro de si, com uma boa auto-estima, com capacidades criativas notáveis,
que servem muitas vezes para resolver problemas humanos de várias ordens, com
um bom espírito crítico em relação ao mundo, no sentido de se tornar um ser livre!
17. Como foi (tem sido) a aceitação deste tipo de ensino, na comunidade, em
geral, e nos pais, em particular?
Boa.
18. Quais as perspectivas de futuro, quanto à implementação desta pedagogia?
Crescer, crescer, crescer. Crescer em consciência e em trabalho conjunto!
Muito obrigada pelo contributo e pela gentileza e cordialidade prestados na presente entrevista. Desejo que continue a desempenhar um papel de profissional correcto e a empenhar-se na prestação de serviços às crianças e/ou à educação, para que, tendo como este exemplo, outras instituições e pessoas saiam das suas comodidades e se multipliquem na busca pela construção de uma SOCIEDADE MAIS: saudável, feliz, fraterna, tolerante, responsável, … e democrática!
Ana Silva
168
ANEXO 5 – DISTRIBUIÇÃO DE ESCOLAS WALDORF NO MUNDO
Quadro 08 – Distribuição de Escolas Waldorf, no Mundo
Continente Europeu
187
Áustria 14
Bélgica 21
Croácia 2
Dinamarca 18
Eslováquia 1
Eslovênia 1
Espanha 1
Estônia 9
Finlândia 21
França 12
Inglaterra 29
Holanda 92
Hungria 21
Irlanda 2
Islândia 2
Itália 27
Letônia 4
Lituânia 4
Luxemburgo 1
Moldávia 1
Noruega 36
Polônia 2
Liechtenstein 1
Rep Checa 10
Romênia 13
Rússia 16
Suécia 41
Suíça 35
Ucrânia 7
Fonte: Adaptado de Ferreira (2005)
Alemanha
169
África
África do Sul 18
Egito 1
Namíbia 1
Quênia 2
Fonte: Adaptado de Ferreira (2005)
América do Sul
Argentina 7
Brasil 17
Chile 2
Colômbia 3
Peru 2
Uruguai 1
Fonte: Adaptado de Ferreira (2005)
América do Norte
Canadá 17
Estados Unidos 113
México 5
Fonte: Adaptado de Ferreira (2005)
Ásia
Armênia 1
Cazaquistão 1
Filipinas 1
Geórgia 1
Índia 3
Israel 5
Japão 3
Nepal 1
Quirguizistão 1
Tailândia 1
Fonte: Adaptado de Ferreira (2005)