3840-9441-1-SM

download 3840-9441-1-SM

of 20

Transcript of 3840-9441-1-SM

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    1/20

    A l f a , SoPaulo,34:195-214,1990

    GRAMTICA E S C O L A R LINGSTICA E A RENOVAODO E NSINO DE PORTUGUS

    JohnRobert S C H M I T Z *

    RESUMO: Afinalidadedestetrabalho analisar cinco livrosimportantesq ueabordama problemtica do ensino da Lngua Portuguesa no Brasil com ointuitode contribuir para estudoedebatesobre osproblemasdoensinoda lnguamaterna no pas.

    UNITERMOS: Normaculta; gramtica escolar;planejamento lingstico;reading; writing.

    muito salutar observar q u e n o s l t imo s anosforam publicados n o Bras i l v r io sl i v r o s sobre u m problema brasileiro de primeira ordem: o ensino d a g r am t ic a n a escola e a r e l a o d a g r a m t i c a escolar c o m a l i n g s t i c a . Trata-se de uma tentativa deredefinir o papel d a g r amt ica n as escolas p b l i c a s e particulares d o p a s , desde op r - p r i m r i o a t o n v e l superior. Os l iv ro s abaixo arroladosvisam a repensar agram t i c a e aredefinir os objetivos do ensino d a l n g u a p t r i a :

    Bechara, E . Ensino da Gramtica: Opresso? Liberdade? S o Paulo,Editora t i ca. 1985.Cunha, C . A Questo da Norma Culta Brasileira. Ri o d e Janeiro, E d i e s Tempo

    Brasileiro Ltd a. , 1985.L u f t , C . Lngua e Liberdade: Para U ma Nova Concepo da Lngua Materna.PortoAlegre, L & P M Editores Lt da . , 1985.P e r i n i , M . Para Uma Nova Gramtica do Portugus. S o Paulo, Editora t i c a ,1985.Soares, M .Linguagem e Escola: Um a Perspectiva Social. S o Paulo,Editora t i ca, 1986.

    * Departamento de LingsticaAplicada- InstitutodeEstudosdaLinguagem- UN IA MP - 13081 - Campi'nas-SP.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    2/20

    196N o que se segue,pretendo tecer c o m e n t r i o s sobreestescinco l i v r o s . M i n h a m o t i v a o para realizar esta tarefa se deve ao fato de que considero as i d i a s e coloca e s contidas nos referidos l iv ro s importantes no que diz respeito reforma do ensino do p o r t u g u s , todos elespontos de partida para r e f l e x o , a n l i s e edebate.Todosos autores e s t o preocupados com o ensino do p o r t u g u s . Para alguns (Cunha, Bechara) o ensino da norma culta deve ser enfatizado, para outros (Perini, L u f t ) estanorma culta considerada um conjunto de regras a r t i f i c ia i s , uma c o l e o de s a n s e so u p r o i b i e s que nada tm a ver com o uso corrente. Outra autora (Soares) v anorma culta como um instrumento que utilizado por um grupo dominante para imp o rseu controle sobre grupos dominados.D i v i d i r e i este trabalho em quatropartesde acordo com ostemas que parecem sur

    g i r dos cinco l iv ro s sob a p r e c i a o . Na primeira parte, estudarei a p r o b l e m t i c a dai d e n t i f i c a o de uma norma p a d r o e o papel que o referido p a d r odeve ou no ternas escolas p r i m r i a s , s e c u n d r i a s e inclusive nos estabelecimentos de ensino super io r . Nasegundaparte, examinarei os c o m e n t r i o sfeitos a respeito da p o l m i c a L i berdade versus O p r e s s o , c o n t r o v r s i a essa ocasionada por diferentes v i s e s daf u n o da linguagem na sociedade. Na terceira parte, deparar-me-ei com a v i s o daescoladesejadapelosautoresuma escola tradicional ou uma escola transformadora,r e v o l u c i o n r i ae inovadora.N o decorrer do trabalho pretendo examinar o que se quer dizer por t r a n s f o r m a o .N a quarta parte apresentarei uma s r ie de r e c o m e n d a e s que decorrem da minha

    leiturados cinco l iv ro s .

    1. N O R M A C U L T A , G R A M T I C AESCOLARE OENSINODE P O R T U G U SD e uma leitura do l i v r oA Questo da Norma Culta Brasileira, de autoria de C e l so Cunha, um dos poucos estudiosos do problema da norma no B r a s i l ,pode-secotej a r v r i o s sentidos do termo norma, tais como norma n i c a(p. 56), norma objetiva(p . 50), norma pescritiva (p. 44, 54) , norma arcaizante (p. 35), norma purista (p. 35,8 5 ) , norma i d i o m t i c a (p. 20, 78, 79), norma h i s t r i c o - I i t e r n a (p. 28), norma culta(p . 85), normas l i n g s t i c a s (p. 56), normas tradicionais (p. 27), norma e s t v e l (p.6 6 ) , norma s i n t t i c a(p. 37) e norma cultaoral(p. 23).Essegrande n m e r o de a c e p e s de norma mostra a complexidade do conceito,

    poisestapalavra significa coisasdiferentes para diferentes pessoas.A l i n g s t i c a est r u tu r a l , especialmente a escola norte-americana, no deu muitaa t e n o ao estudo danorma. Outras escolas, tais como a Escola de Praga, e em particular l i n g i s t a s comoMathesius, Hjelmslev e Coseriu dedicaram muito trabalho ao estudo da norma.Nos EstadosUnidos,Garvin1 4 um dos poucos l i n g i s t a s que divulga o trabalhodos l i n g i s t a sda Escola de Praga. Foi ele que traduziu do tcheco um trabalho importantedestaEscola,''General Principles for the Cultivation of Good Language''14.

    A l f a , SoPaulo,34:195-214, 1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    3/20

    197

    G r a a s p u b l i c a o recente de uma c o l e t n e a intituladaLa Norme Linguistique,uma grande lacuna na r e a de estudossobre a norma foi preenchida. Da autoria deB d a r d e Maurais3, o referido volume c o n t m mais de trinta trabalhos sobre a prob l e m t i c a da norma a t r a v s dos tempos e nos dias de hoje. Repleto de conhecimentosadvindos de c i n c i a sdo homem, tais como a sociologia, a antropologia e a l i n g s t i ca, o referido volume tem trabalhos sobre diversosaspectosda norma de Valdman3 0,Lara 1 9 , G. G a g n 1 3 e muitos outros.ParaLara1 9 no artigo Activit normative, an-glicismes e mots indignes dons le Dicionrio dei Espaol de Mxico , o referidoautor observa a polissemia da palavranorma. No primeiro sentido a norma o dever ser ; trata-seda regra que dirigea atividade, isto , o modelo de qualquer coisa.N o segundo sentido a norma representa o que corrente, costumeiro, o que,existe eo que descrito como tal sem estabelecer uma relao com sua regra (trad. nossa). A primeirad e f i n i o posta por Lara a c o n c e p o que Cunha temdeste termonorma . ParaCunha, a norma equivalente l n g u aculta. Cunha faz um apelo para a d i m i n u i o doestadode i g n o r n c i a no estudo da l n g u aculta pedindo que a l n gua cultasejamaisestudadae que sejam elaborados m t o d o s maisadequadosparao ensino da l n g u a culta.Pode-se perguntar o que realmente a l n g u a culta? Comoseriam os m t o d o sutilizados? E por que no se cogita de propor m t o d o s para o estudo dos dialetos regionais, a fala urbana p r o l e t r i a , a l n g u a coloquial ou informal?Cunha observa que existe c o n f u s o entre o que significa norma purista e normaculta (p. 85) , mas no h nenhuma tentativa dedefinirestestermos.

    U m a dificuldade com os estudos sobre a norma culta a expectativa de que falantes desta variedade sempre falam de uma maneira formal ou elaborada, nunca recorrendo g r i a e sempre obedecendo sregrasque se encontram nas g r a m t i c a s der e f e r n c i a .

    Quanto ao Projeto NURC (Projeto de Estudo Conjunto e Coordenado de NormaL i n g s t i c a OralCulta de Cinco das Principais Capitais Brasileiras), Cunha explicaque houve mal entendimento por parte de alguns professores, pois pensaram que afinalidade do Projeto fosse a f i x a o de normas, quando na realidade o objetivo doreferidoProjeto, de acordo com Cunha, a o b s e r v a o de normas quer na l n g u aescrita quer na l n g u afalada. Acho queestudossobre a linguagem culta so n e c e s s rios, mas t a m b m considero importante a e l a b o r a o de d e s c r i e s sobre a l n g u acoloquiale a l n g u apopular.

    Observa-se, guisa de exemplo, uma d e s c r i oda norma culta do Projeto NURCp o r parte de Castilho e Preti5 e um apelo para o estudo da l n g u a popular oral, porparte de A r a j o 1 .U m a a n l i s e dos dados apresentados por Castilho e Preti no l i v r o A Linguagem

    Falada Culta na Cidade de So Paulo ( v o l . i - e l o c u e s formais) mostra que falantesrotulados como cultos utilizamno seu p o r t u g u s estruturas como c a d o segundoano (p.63), A h, hoje tem prova (p. 63), Agora me diga uma coisa , O que agente encontra sodesenhos (p. 57), e n t o o pagamento um cara que ganha m i leduzentos e outro dez m i l (p. 40), Se ele no receber no dia seguinte (risos) e s t A l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    4/20

    198f r i t o (p. 53), estruturas essasque muitos relegariam a um p o r t u g u scoloquial.No uma q u e s t o de uma linguagem culta ou incult a , pois a s i t u a oou contexto ofator que determina otipode linguagem. A norma realmente uma q u e s t ode estilo;todos os falantes modificam o seu estilo, isto , a sua maneira de falar, dependendodo contexto ou da s i t u a ona qual se encontram.

    Numa s i t u a o f o r m a l , numa entrevista para um emprego, no f r u m ,numa reparti o p b l i c a , um determinado falante fala diferentemente do que falaria quando elee s t emcasacom os familiares ou numa cantina com amigos ou colegas.Cunha aceita a tesede Labov de que a escola i m p eum dialeto de p r e s t g i o queimpede oacesso ao ensino por parte de alunos carentes,falantes de variantes da l n gua no prestigiados pela sociedade. Todavia, Cunha conclui que a escola tem que

    ensinar a l n g u aculta, a l n g u a p a d r o ;ele insiste em que a l n g u acultaseja n e c e s s r i a para o progresso dos alunos. Cunhaparece lamentar o fato de que vivemos nummundo agitado onde tudo interligado, fatoesseque torna q u i m r i c a a m a n u t e n ode uma norma purista (p. 86). Em dois momentos no l i v r ode Cunha, o autor diz que um ato de patriotismo . . . zelar pelo enriquecimento, a p e r f e i o a m e n t o e d i f u s o dal n g u a portuguesa (p. 87) esugereque se deve acompanhar as normas da l n g u a escrita em seu a p e r f e i o a m e n t o (p. 23). Esta palavra chama a minha a t e n o , poislembramovimentos oucampanhaspara tornar a l n g u a mais pura ou mais clarapara ac o m u n i c a o semexplicitaro que tudo isso significa.

    U m apelo para um a p e r f e i o a m e n t o de uma l n g u alembra movimentos ou campanhas para tornar a l n g u a c a s t i a ; o bode e x p i a t r i o dessas cruzadas o granden m e r o de palavras estrangeiras usadasna l n g u aem lugar de palavras v e r n c u l a s .Observa-se, por exemplo, ac r t i c ade v r i o s g r a m t i c o ss palavras abajur, gafe, coqueluche e debutar feita alguns anos a t r s , em que as referidas palavras eram tachadas de v c i o s de linguagem ou barbarismos . A palavra aperfeioamento sugereque existem defeitos ou i m p e r f e i e s na l n g u a que precisam ser sanados.Quais soalguns exemplos destas i m p e r f e i e s e qual o c r i t r i opara considerar uma determinadaestrutura l i n g s t i c aum defeito?

    Se por a p e r f e i o a m e n t o se entendeuma a t u a l i z a o das regrasde sintaxe e deortografia, no percebo nenhum problema; mas se a p e r f e i o a m e n t o significa umapostura de defesa de formas eusosarcaicos e de cunho l i t e r r i oem particular, acreditoque tal postura no reflete o fato de que as l n g u a s mudam a t r a v sdo tempo.

    Quanto ao enriquecimento da l n g u a ,no sei como um programa de estudo sobre anorma culta vai t o r n - l a mais rica.Pode tornar esta variedade mais bem descrita eportanto mais bem conhecida. A meu ver, as l n g u a sse tornam mais ricas em contatoc o moutras; a variedade de p r e s t g i ode uma determinada l n g u ase renova em contato l t i m ocom a l n g u apopular.

    Outra maneira das l n g u a s se enriquecerem com novas i d i a s e conceitos, e portanto novos termos, o i n t e r c m b i o de i d i a s que ocorre quando l iv ro s de l n g u a Xs o traduzidos para a l n g u a Y e reciprocamente outros l i v r o s so vertidos de l n g u aYpara l n g u aX .A l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    5/20

    199

    N o que diz respeito d i f u s o do p o r t u g u s ,no tenho nenhuma o b j e o ,pois a n i c a coisa sugerida por Cunha que plenamente v i v e l e r e a l i z v e l ; v r i o s governos de p a s e s tais como a F r a n a , a G r - B r e t a n h a , e a R e p b l i c a Federal A l e m i nvestemsomaselevadasna d i v u l g a orespectiva de sua l n g u ae cultura.Cunha afirma que, no p o r t u g u s culto do B r a s i l , existe uma dualidade ou assimetria de normas (p. 66) que d i f i c u l t a p a d r e s para o ensino, pois a l n g u a faladai n f o r m a l diferente da l n g u a escrita f o r m a l . Nocasode Portugal, Cunha afirma queexiste uma norma relativamente e s t v e l (p. 66).Para Cunha esta v a c i l a o d i f i cultaa i d e n t i f i c a o de p a d r e s para o ensino apesarde atitudes radicais dos autores modernistas que... conseguiram, em alguns casos, d i m i n u i r o v c u o enorme queseparavaa e x p r e s s ofalada da escrita (p. 67). Quais seriam realmenteestasatitudes

    radicais dosautores modernistas?N o que diz respeito aos modernistas, no p r e f c i o do l i v r o de Barbadinho Neto2intituladoSobre a Norma Literria do Modernismo, F a l c oUchoa faz a seguinte obs e r v a o :

    C o m efeito, no se compreende como,antepesquisa realizada com tanta seriedade, v r i o s denossos g r a m t i c o s continuem depois se omi tindo ou adotando umaatitude de timidez quanto a fatos que se i m p e mpor si mesmos e emr e l a o aosquais no h outra alternativa s e n o a de a c e i t - l o s : o uso impessoal do verboter; o emprego da p r e p o s i o empara a i n d i c a oda m a t r i ade que uma coisa feita; a transitividade de muitos verbos ansiar, assistir ('estarpresente'), aspirar('pretender'),obedecer, reparar e outros, etc .

    Os nossosvalores, p r e f e r n c i a s e preconceitos fazem com que vejamos d i f e r e n a s( o u s e m e l h a n a s ) . Se considerarmos os autores brasileiros do s c u l o X I X comoexemplos do que norma ou p a d r oe se dermos grande valor ao estilo, aos tiposde estruturas s i n t t i c a s e ao v o c a b u l r i o usado por escritores deste p e r o d o e aomesmo tempo observarmos que a linguagem cotidiana (falada e escrita) diferentedaquela usada pelos autores do s c u l o passado,estes novos valores fazem com quecriemos um v c u o que noexistiria se e s c o l h s s e m o s ou d s s e m o s valor aos autoresmodernistas e c o n t e m p o r n e o s .A t r a v s das r e f e r n c i a s ao p o r t u g u s de Portugalpode-se detectar, em certos casos, uma p r e f e r n c i a ou at r e v e r n c i apara o variante europeu da l n g u a portuguesa.U m leitor sem conhecimento da literatura especializada sobre a h i s t r i a da L n g u aPortuguesa e sua e v o l u o l i n g s t i c a em diferentes partesdo mundo poderia in f e r i r

    c o m o termo norma relativamente e s t v e l que no existe v a r i a odialetal em Portugal. Teysier29 aponta a diversidade l i n g s t i c a no p a s na sua d e s c r i o das t r s r e a s dialetais: (i) Centro Sul, (ii) Zona I n t e r m e d i r i a do Nordeste-Centro Leste e(iii) a Zona Arcaica do Nordeste.

    A l mdisso no se deve esquecerque a literatura engloba uma gama muito grandede registros. A linguagem l i t e r r i anem sempre um espelho destamal definida no o de l n g u a culta falada , pois a literatura i n c l u i obras regionalistas de autoresA l f a , SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    6/20

    200tais como ocearenseManuel O l i v e i r aPaiva e o paulista C o r n l i oPires, que refletemna escrita a l n g u afalada regional.

    N o percebo na minha leitura do trabalho de Cunha uma m o t i v a o para afirmarque a referida dualidade ou assimetria d i f i c u l t a a i d e n t i f i c a o de p a d r e spara o ensino.Uma p o s s v e l s o l u o seria a c o n s i d e r a o da literaturac o n t e m p o r n e acomo anorma.Garvin1 5 observa que os l i n g i s t a s da Escola de Praga, nabusca de um standardisto, norma ou p a d r o para a l n g u a tcheca, usaram a literatura tcheca dos diurnos c i n q e n t aanoscomo c r i t r i opara a f i x a o de um p a d r o .N a F r a n a , no s c u l o X V I I , Vaugelas, segundo B d a r d e Maurais3, foiv t i m a de

    seu p r p r i o sucesso,pois a norma por ele fixada na linguagem da Corte no foi modificada mais a p sa sua morte. Todavia,nestes c u l o ,Grevisse fez m o d i f i c a e s peridicas que aparecem nas diferentes e d i e sde sua g r a m t i c a .Qualquer planejamento l i n g s t i c o precisa i n c l u i rum programa de a d a p t a e s per i d i c a s no que diz respeito ao bom uso . Os g r a m t i c o s tradicionaisraras vezesapontam m o d i f i c a e s no uso, e falta uma tomada de p o s i o quanto a c o n s t r u e stais como assisti o cinema , entrei emcasa e c o n h e oela muito bem . No Bras i lurge teru ma d i s c u s s oampla sobre q u e s t e sde uso gramatical.Bechara (p. 6) t a m b mobserva uma grande d i s t n c i aentre a l n g u aescrita e a l n gua falada e receia que, se a s i t u a ode distanciamento entre a l n g u aescrita e a l n gua falada continuar, o Bras i l f i ca r parecido com a s i t u a o l i n g s t i c a na I t l i a eAlemanha, onde existem v r i o s dialetos regionais e a d i f e r e n a entre a l n g u a escrita

    cultae a l n g u afalada i n f o r m a l grande.A s i t u a o l i n g s t i c a no B r a s i l emnadase parececom a s i t u a o da I t l i a , ondese tmv r i o s dialetos e falares nas diferentes r e g i e s do p a s , a l m da e x i s t n c i a del n g u a sdistintas, tais como sardo, siciliano e c a l a b r s . G a l l ide Paratesi (12, p. 18) serefere i n c o n g r u n c i aentre a norma escrita e o uso cotidiano doitalianismo. Segundo a autora, as g r a m t i c a s de r e f e r n c i a tendem a ser toscaneggiantes , p r i v i l e giando a variedade de italiano falado na Toscana, postura essaque no reflete o usoescritoformal einformal ( n f a s e minha) em outraspartesdo p a s .Posner (24, p. 275) comenta que italianos que a l c a n a r a mum determinado n v e lde e s c o l a r i z a o emtodasas partesda I t l i afalam a l n g u a standart com facilidade,mas nos seus lares preferem usaro dialeto e s p e c f i c o da r e g i oonde habitam. A col o c a ode Bechara (p. 6),bastantealarmista, a meu ver, contraditap g i n a s adiante

    (p .29), quando o autor afirma que as variedades d i a t p i c a s(regionais) no B r a s i l somenos acentuadas do que em outros p a s e s onde existem v r i o s dialetos regionaisque concorrem com uma l n g u a standard.A s i t u a o l i n g s t i c a no B r a s i l realmente outra, pois,apesardas d i f e r e n a s regionais, h uma unidade em todo o p a s e nenhuma variedade de uma cidade ou reg i o e s p e c f i c a domina , como o casoda I t l i a , segundo G a l l i de Paratesi12 . Arespeitodestaunidade L i m aSobrinho (22, p.154) assim escreve:

    A l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    7/20

    201

    A concluso,pois a que no podemos fugir a que se temos o privilgio,apesarda vastido de nosso territrioe da variedade de fatores que concorrem para ad i versificao de nossosfalares, de nos entendermos facilmente de extremo a extremo do Brasil,devemo-lo aessa lngua portuguesa, que fo i ,desdea fase colonial,uma das forasdecisivas da unidade do pas .Evidncia adicionalde que a variao dialetal noimplica necessariamente a destruio de uma unidade lingstica vem de Valdman3 6 ; no seu estudo intitulado

    Normes Locales et Francophonie , o autorconclui que a existncia de diferentesregionalismos nos pases de fala francesa no est destruindo a unidade do francsstandard baseado no francs burgus cultivado da regio parisiense; a diversidadedas variedades locais do francs, de acordo comValdman,noestcontribuindopara a diviso do francs na Blgica, na Sua e em Qubec, numamultido de variedades inteligveis.

    A questo da identificao de uma norma ou padro para o ensino escolar umassunto polmico. Para alguns autores a nfase dada lngua oralem detrimento aoestudo tradicional da lngua literria cl ssi ca considerada uma atitude opressiva.Para outros autores libertadora aapresentao da lngua em todos os seus diferentes nveis estilsticos. Na segunda parte, que se segue, examinarei o assunto de l i -berdade versus opres so .

    2. O P R I M I R OUL I B E R T A R : O E N S I N ODA LNGUA CULTAO segundo tema que surge do cotejo de livros escolhidos para esta resenha aproblemtica da oposio Liberdade versus Opresso . Bechara encara a escolabrasileira como causadora desta opresso, pois vem prestigiando nos ltimos anosa lngua oral, trazendo, segundo ele, um desprestigiamento da lngua escritaculta. Aescola noestcumprindo o papel esperado por Bechara por no estar ensinando anormaculta.De acordo com o professor, a escola opressora, por um lado, quando obrigatodos os alunos a usarem exclusivamente a normacultae, por outro lado, quando obriga todos os alunos a, usarem exclusivamente a linguagemcoloquial. A posio deBechara contraditria porque ele conclui que a gramticanormativa deveria ser oobjeto central da escola (p. 7) , e acrescenta que a escola no tem necessidade de ensinar a lnguacoloquial,pois ela apresentada no lar e no convvio .Discordode Bechara, pois acho que o aluno, via de regra, realmente nosabe oslimites de cada tipo de linguagem, nosabedistinguir a linguagemcoloquial da l i n guagem formal.Ne m sempre o aluno temcritrios para identificar o que seria prprio na linguagem escrita. Vrios estudos tmmostrado que o aluno tende a transferir o seu conhe

    cimentoda lnguafalada para a escrita com resultadosinfelizess vezes.O estudo do estilo conversacional que em certoscasos contm expresses griescas

    A l f a ,SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    8/20

    202i d i o m t i c a s e a a n l i s e dos diferentes registros ( f o r m a l , i n f o r m a l e n t i m o ) so b s i cos para o discernimento das d i f e r e n a sgerais entre a fala e a escrita.

    Outradi ficuldade com a c o l o c a ode Bechara que ele considera a norma culta ea l n g u acoloquialcomoduas entidades distintas. O autor seesquecede que h umar e l a o n t i m a entre op o r t u g u s standard e op o r t u g u spopular. Lefebvre2 0, no a r t i go intitulado Le s Notions de Style , argumenta que a norma precisa ser def inidaem termos de estilo e n v e i sda linguagem. No se deve confundir o bom uso e anorma com a p r p r i a l n g u a .Em vez de considerar o coloquial um registro ou n v e lde estilo da l n g u a , Bechara o considera uma l n g u a ou modalidade . Os termosusadosno l i v r oEnsino da Gramtica: Opresso? Liberdade? tais como l n g u a f u n cional , l n g u aou modalidade coloquial , l n g u a cul ta devem ser definidos comr ig o rparapermitiruma a n l i s e c r t i c adoassuntode norma.

    Para Bechara uma escola que prestigia o oral opressora: a crise no ensino deorigeminstitucional,pois a l n g u a oral prestigiada pela escola. A c o l o c a o de Bechara c o n t r a d i t r i a .O autor diz que a escola p r i v i l e g i o u o e s p o n t n e oe o expressivo (p. 1) mas, p g i n a sadiante (p. 46), o autor m a n t m que o ensino l i n g s t i c ona escola d e v e r partir da atividadeoralpois o oralconstitui abasepara a a q u i s i oidealde quasetodasas c o m p e t n c i a s . A meu ver, a l n g u aescrita nunca foi desvalorizadapela escola, onde a c o b r a n ado aluno feitaem forma de provas escritas outestes nos quais o conhecimento da forma escrita i m p r e s c i n d v e l . No se deve esquecer o poderio, por bem ou por mal, dos Concursos Vestibulares e outros concursos p b l i c o sque contribuem para enfatizar e legitimar a escrita e justamente a variedadeprestigiada da l n g u a escrita.

    A p r e s e n a de c r n i c a s nos l i v r o s d i d t i c o s sugere,para Bechara, que a l n g u a escrita e s t sendo desvalorizada. Acho surpreendente esta a f i r m a o porque, no meuentender, as c r n i c a s so igualmente uma parte da p r o d u o escrita do p o r t u g u s ,como o romance, a poesia, o conto e inclusive as p e a sde teatro, que so escritas para serem lidas ouapresentadas publicamente. Um exame detalhado dos l i v r o s d i d t i cos publicados m o s t r a r que a c r n i c a somente umapequena parte dos tipos detextos com os quais os alunos do l- e 2- graustm contato. As c r n i c a sno oferecem, segundo o professor, um enriquecimento i d i o m t i c o (p. 6-7), enriquecimentoesse que somente pode ser realizado, segundo Bechara, em contato com a literaturac l s s i c a , que apresenta s u b s d i o s para o desenvolvimento s i n t t i c o e l x i c o , dosaprendizes. O l i v r o de Bechara realmente um apelo para um retorno .. . tarefa detransmitir os p a d r e s da l n g u aescrita a t r a v sdo aturado c o n v v i odos c l s s i c o s brasileiros e portugueses de todas as p o c a s (p. 62).Parece-mepreconceituosa estac r t i c a as c r n i c a s .No vejo por que as c r n i c a s de Rubem Braga, Fernando Sabino,Carlos Eduardo Novaes e L u sFernando V e r s s i m ono oferecem um enriquecimentoi d i o m t i c o . Nunca entendi por que muitos professores acreditam que a lei tura em side grandes c l s s i c o s vaicontribuirpara melhorar a r e d a o por parte dos alunos. Ocontato com ou autores c l s s i c o s nada garante que os alunos melhorem a sua reda o . O papel da literatura o de despertar o aluno para o mundo da i m a g i n a o e dasA l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    9/20

    203

    i d i a s . Todavia, antes de poder ler Os Sertes, O Ateneu, Macunama e O TristeFi m de Policarpo Quaresma, o aluno precisa adquirir um amadurecimento l i n g s t i co que somente pode ser conseguido com uma p r o g r a m a o graduada de diferentesautores de acordo com a dificuldadee s t i l s t i c a contextual e de cada obra. Sempre melhor, a meu ver, i n i c i a r o estudo de literatura com autores c o n t e m p o r n e o s deixando os autores do s c u l o XI X e momentos l i t e r r i o s anteriores aesse s c u l o paraas l t i m a s s r i e s do 2- grau.

    A dificuldade com a a n l i s e de Bechara o fato de que hngua culta ou bomuso confundido com o termonorma no sentido em que usadopor Coseriu (9, p.49-50),que assimescreve:A norma duma l n g u a representao seu e q u i l b r i o 'externo' (social regional), en

    tre as v r i a s r e a l i z a e s permitidas pelo sistema .O sistema uma gama de possibilidades, isto , o que se pode dizer , ao passoque norma tudo que se disse ou que se diz tradicionalmente numa comunidade determinada, de acordo com opensamentode Coseriu.Para Bechara, a l n g u a culta ou l n g u a escrita cul ta engloba a g r a m t i c anormativa escolar, comsuasregrase conjunto de e x c e e s ,a a n l i s e s i n t t i c acom asua taxionomia oracional e nomenclatura gramatical. Bechara considera a n e g l i g n c i apor parte da escola desta g r a m t i c a normativa uma q u e s t o de o p r e s s o . ParaLemle( 2 1 ,p. 87), a g r a m t i c a tradicionalexerce efeitos coercitivossobrea espontaneidade da e x p r e s s o .Creio que a c o e r o realmente se origina de fatos internos da p r p r i a linguagem.

    N o se trata na verdade de o p r e s s o / U b e r d a d e , poiscadatipo de texto produzidoi m p e as suas p r p r i a s regras. Um texto j u r d i c o c o n t mum formato p r p r i o ,um requerimento para uma r e p a r t i o p b l i c a tem outro formato, uma carta de amor, outro,e um bilhete para o leiteiro tem ainda outro.A norma s e encontra dentro (g r i fo de autor) de cada tipo de discurso. Um textoa c a d m i c o tem sua norma diferente de um texto c i e n t f i c oou de um texto que descreve uma c o m p e t i o esportiva.M u i t o diferente o uso da palavra liberdade na p u b l i c a o de L u f t , Lngua e

    Liberdade. A liberdade para esteautor no uma q u e s t ode sabermeras regras masde sabera l n g u a .O papel da escola levar o aluno a pensarcom clareza, a ordenaras i d i a s ,apensarsem medo, com liberdade (g r i fomeu), come s p ri t o c r t i c o (p.35).Inspirado na c r n i c a de L u s V e r s s i m o , O G i g o l das Palavras , L u f texplicita ai n t e n o de V e r s s i m o emescrevera referida c r n i c a . O s u b t t u l o do l i v r ode L u f t a Nova C o n c e p o da L n g u a Materna , c o n c e p o essa que repudia o que o professor chama de gramatiquice: um grande n m e r o de d e f i n i e s , regrasenumerosase x c e e s , c l a s s i f i c a e s de palavras e listas de anomalias (p. 34). O conceito del i berdade proposto por L u f t maior do que o proposto por Bechara. No que dizrespeito ao aluno, a liberdade i m p l i c a o desenvolvimento de sua criatividade.Parapoder redigir bem, segundo L u f t , o aluno precisa produzir muitos textos e ter estesA l f a ,SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    10/20

    204textos criticados e comentados (sem agressividade) pelo professor. Com um tipo deensino baseadoem muita regra e pouco texto , o aluno nunca c h e g a r aescreveradequadamente.

    Bechara l i m i t a o ensino de p o r t u g u s g r a m t i c anormativa, isto , a um conjuntode boasmaneiras no falar e noescrever, L u f t , a meu ver,abreo leque de possibilidades l i n g s t i c a s para o aluno, julgando mais procedente apresentar a linguagemna sua plenitude ou totalidade , que i n c l u i variedade de tempo, r e g i o ,classe, sex o e estilo (p. 35). Bechara se satisfaz com um ensino que ajuda a atender aosusos e s e l e e s esperadaspor umapessoacul ta (p. 51). Lamentavelmente Becharan o pormenoriza quais soestas s e l e e se no d c r i t r i o s para e s c o l h - l a s . Quemdetermina quem uma pessoa culta? Esta c o l o c a o insinua, no meuentender, queumapessoasemacesso i n s t r u ono falaadequadamentea sua p r p r i a l n g u a .A q u e s t o de o p r i m i r ou libertar com ou sem o a u x l i o da g r a m t i c a normativadeixa de ser um problema se a proposta de Perini for realmente levada a s r i o .No l i -v ro Para Uma Nova Gramtica do Portugus, Perini, vai direto ao m a g o da quest o , que fundamentalmente l i n g s t i c a . Qual deveria ser abasepara a i d e n t i f i c a oo u estabelecimento de uma norma, p a d r o , ou melhor d i t o , standard da L n g u a Portuguesa?

    Perini rejeita a literatura como a pedra basilar da l n g u a p a d r o , pois de acordoc o m esteautor a literaturaacusaumn m e r o de registros variados: linguagem fo rma l ,i n f o r m a l , n t i m a ,comum leque muito grande deusose s t i l s t i c o s . De acordo com Perini, o p a d r o culto deve ser baseado nos textos t c n i c o - j o r n a l s t i c o s , tais como revistas, jornais e trabalhos c i e n t f i c o s , pois nestes tipos de texto existe uma grandeuniformidade l i n g s t i c a seni as v a r i a e s regionais e de classe social que marcama literatura. E importante frisar que Perini noe s t dizendo que a literatura no devaser estudada;obviamente a literatura importante na f o r m a o intelectual e culturaldo aluno.

    C o m o in tu i to de incentivar ae l a b o r a ode uma nova linguagem para a g r a m t i c ap e d a g g i c a , Perini coloca novos elementos na sua proposta para o ensino de P o r t u g u sque c o n t r i b u i r o ,a meu ver, para uma verdadeira r e n o v a odo ensino da l n g u a , torenovadora que oaspectodo p r p r i o l i v r o d i d t i c oe oc o n t e d o p r o g r a m t i c odos cursos de p o r t u g u s seriam diferentes. Elementos advindos da a n l i s e do discurso, dep r a g m t i c a , de s e m n t i c a representam na proposta de Perini uma i n o v a o no campoc o m i n t r a v i s e ssobred e n o t a o , d i x i s ,atosda fala e tratamento pronominal.A v i s o l i n g s t i c a apresentada por L u f t e Perini, que enfatizam a criatividade e

    liberdade de e x p r e s s o em vez de uma e s c r a v i d o a um conjunto deregrasno colocadasno uso cotidiano, lembra as c o l o c a e s de Bolinger4. Ump a d r o , variedade dep r e s t g i o oustandard, i n e v i t v e l enquanto falantes e escritores tm ao b r i g a o detomar conta das necessidadesedesejos de aprendizes e leitores (trad. do autor). Todavia, Bolinger rejeita um p a d r o imposto pelos que ele chama de shamans, isto ,tipos de sacerdotesou curandeiros que v i v e m impondoregrase legislando s a n e so u p r o i b i e s gramaticais. Bolinger prefere um tested standard, isto , um p a d r oA l f a , SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    11/20

    205

    negociado por umconsensopor parte dos u s u r i o s da l n g u a ;acima de tudo, B o l i n -ger faz apelo para uma ecologia da linguagem , que em vez de se preocupar com ai m p o s i o cega de regrinhas, visa aeliminar a verdadeira p o l u i o l i n g s t i c a nafala e na escrita que envolve a falta de clareza e l g i c a , a p r e s e n a de armadilhas,mentiras, p r e s s u p o s i e s falsas e preconceitos na p r o d u o de textos. M i l r o y& M i l -ro y apud Cameron7 observam que o tema de prescritivismoversus n o r m a t i z a o(standardization) noe s t recebendo muita a t e n o por parte dos l i n g i s t a s ;os referidos autores se referem ideologia de n o r m a t i z a o , ideologiaessaque arbritaria-mente aceita como correta uma determinadaforma s i n t t i c aentre as muitas formasd i s p o n v e i s . Estesautores acertam, a meu ver, quando afirmam que . . . a dissemina o da norma [standard) e sua u t i l i z a o como v e c u l o de i n s t r u ono pode ser levada a cabo com uma postura de e s t i g m a t i z a odas variedades n o - p a d r o e de i n d i f e r e n a s mesmas (7, p. 116).

    Considero importantedistinguir entre uma n o r m a t i z a o imposta e um tipode pad r o n i z a o (oustandardization), f ru to de estudo, a n l i s e e n e g o c i a o , comosugereBolinger (4), que, a meu ver, envolve pesquisa e planejamento. A p a d r o n i z a o positiva quando se trata da u n i f o r m i z a o de termos t c n i c o s e especializados quecontribuempara o desenvolvimento das c i n c i a s . A p a d r o n i z a o negativa quandose trata da i m p o s i o de uma variedade a r t i f i c i a lque no reflete mesmo o uso formale i n f o r m a l do segmento cul to da sociedade sem mencionar os membros da sociedadeque no tmacesso cultura e ao ensino. Carvalho (8)julga importante estudar apossibilidade de elaborar l i v r o s d i d t i c o s e s p e c f i c o s para diferentes r e g i e s do p a s ,a fim de f ac i l i t a r uma i n t e g r a onacional. A proposta interessante, embora p o l m i ca, e merece a n l i s e .

    Qual o papel do ensino de P o r t u g u s na escola? Que tipo de escola se querrealmente? Uma escola dominadora, a r b i t r r i a , interessada na i m p o s i ode um c d i go a r t i f i c ia l e e s t r i l ?Ou uma escola que conduz o aluno a ser c r t i c o ,original? Nap r x i m a parte, a seguir, farei c o m e n t r i o s sobre a terceira q u e s t o que aparece naa n l i s e destes l iv ro s .

    3 U M A E S C O L A T R A D I C I O N A L O U U M A E S C O L A T R A N S F O R M A D O R A ?

    Recorrendo Sociologia da E d u c a o , Soares p r o p e uma escola transformador a , isto , uma escola consciente de seu papel p o l t i c o na lutacontra as desigualdade sociais e e c o n m i c a s (p. 33). Esta escola teria o compromisso de fornecermeios para permitir scamadasmenos privilegiadas da sociedade a oportunidade, emprimeirolugar, de lutarem por uma p a r t i c i p a o p o l t i c amaior e, em segundo lugar,p o r uma d i s t r i b u i o i g u a l i t r i a dos bens materiais. Enquanto Bechara quer que oaluno seja umpoliglota de sua l n g u amaterna, dominando a norma culta e a l n g u acoloquial, Soares deseja implantar na escola um bidialectalismo, que realmente amesma proposta feita por Bechara, proposta essa que acarretaria, se fosse colocadaA l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    12/20

    206

    e m p r t i c a , uma metodologia de ensino na qual o dialeto de p r e s t g i oe o dialeto no-p a d r o seriam contrastados para f ac i l i t a r a aprendizagem do dialeto de p r e s t g i o porparte dos membros da sociedade falantes do dialeto n o - p a d r o . Camacho (6, p. 6)t a m b madvoga um ensinobidialetalnos moldes deSoarese de Bechara.Resta saberse compensaria a e l a b o r a ode g r a m t i ca s p e d a g g i c a scontrastivas do

    tipo a gente vamos, n i s vai , a gente vai, ns vamos com toda am i r a d ede diferen a s f o n o l g i c a s , m o r f o l g i c a s e s i n t t i c a s dos dialetos n o - p a d r o , considerandoo tempo e adespesan e c e s s r i o spara a i m p l a n t a ode umametodologiacontrastiva.Soaresargumenta que a escola como e s t estruturada atualmente serve aos interesses das classes dominantes, pois utilizadapelas elites para impor os seus p r p r i o sp a d r e s , enquanto os p a d r e s das classes dominadas so desprezados. Esta escola,

    controladapelas elites, marginaliza o povo transformando as d i f e r e n a s das classespopulares em d e f i c i n c i a s face sclassesdominantes. A autora considera a sociedadecapitalista r e s p o n s v e l pela referida t r a n s f o r m a o de d i f e r e n a s em d e f i c i n c i a s . Averdadeiracausada d i s c r i m i n a onuma sociedade declasse a desigual d i s t r i b u i ode riquezas, segundo Soares. Na a n l i s e proposta por Soares, o fracasso na escolados grupos populares realmente um fracasso por parte da p r p r i a escola. T r sideologias camuflamesteestadode coisas: a ideologia do dom, a ideologia da d e f i c i n c i a cultural e a ideologia das d i f e r e n a s culturais. Quanto primeiraideologia,Soaresobserva que a culpadesta v i s o das coisas se deve psicologia educacional,que legitima as desigualdades naturais de d i f e r e n a s individuais,isto , a psicologiaeducacional com sua p r e o c u p a o em a v a l i a o e m e n s u r a o do ensino cria o mitodas d i f e r e n a srotulando algunsestudantesde bons alunos e outros de maus oup s s i m o s alunos . Esta ideologiaembasadanos p r i n c p i o s da psicologia educacion a l coloca a culpa no aluno , pois se ele for mau aluno p o s s u i r e n t o desvantagens (identificadas pelos testes), acusandoum Q I baixo com pouca ou nenhuma aptid o para o r a c i o c n i o l g i c o ,verbal ou m a t e m t i co .Crouse (10, p. 195), num estudodas provas utilizadas para ingresso s universidades norte-americanas, o Scholastic

    Aptitude Test ( S A T ) , mostra queestasprovas nop r e v e mnem um bom desempenho a c a d m i c onem a garantia da c o n c l u s o dosestudosna universidade. Este estudotende a confirmar as c o l o c a e sa respeito da possibilidade dos testes educacionaisn o serem totalmente c o n f i v e i s .Achoque uma coisa criticarostesteseducacionais e tentar melhorar a fidelidadedas provas visando u t i l i z - l a s junto com outros dados e i n f o r m a e s a respeito dosalunos; outra coisa condenar os testese provas utilizadas pela Psicometria e Psi

    cologia Diferencial categoricamente. O cerne da q u e s t o realmente se as provas outesVscriam as d i f e r e n a s ou se as d i f e r e n a s apuradas pelas medidas educacionaisrealmente existem no ser humano. Os que querem negar a e x i s t n c i a de d i f e r e n a sindividuais tm a responsabilidade de apresentar dados e m p r i c o s . Os estudos nosmoldes de Crouse (10) e Slack & Porter (28) questionam o poder de p r e v i s o de sucessode candidatos s universidades: nada dizem a respeito de d i f e r e n a s individuaisl i n g t i c a s , a r t s t i c a soum a t e m t ic a sdos estudantes.A l f a , SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    13/20

    207

    Soares segue em linhas gerais o pensamento do socilogo francsBourdieu, quepropeuma sociologia educacional em sua teoria de reproduo cultural.ParaBourdieu as escolas nas sociedades capitalistas transmitem os valores e atitudes dos detentores do poder. A respeito do papel da escola na sociedade, Bourdieu(apud G i -roux, 17, p. 269) assim escreve:A s escolas tendem a legitimarcertas formas de conhecimento, modos de falar emaneiras de se relacionar com o mundo, permitindo que os alunos oriundos dasclasses dominantes tirem proveito das oportunidades e privilgios recebidos desuasfamliaserelaesde classe ,(trad. do autor)

    Segundo Bourdieu, a cultura, a experincia e o conhecimento da classe trabalhadora no so considerados pelos membros da classedominante como algo diferente e ao mesmo tempo igual ; aclasse detentora do poder v aexperinciae o conhecimento das camadasdominadas como algo diferente einferior.Bourdieu observaque certas prticas lingsticas e modos de discurso se tornamprivilgios dos membros das classes dominantes e servem para perpetuao dos p r i v i l g i o s . Outroespecialista, Rossi-Landi (30, p. 242), afirma que os grupos que no aprendem a falarcomo os outros ou ento falam uma lngua diferente do padro ou standard, simplesmente no so entendidos.

    A teoria de Bourdieu realmente importante para uma compreenso das ideologias escondidas no currculoe emtodasas atividades extra-curriculares das escolas.

    O trabalho de Bourdieu, entretanto, tem sido crit icado nos ltimosanos,emparticularpor Giroux(17, p. 272), que apresentauma teoria de resistnciacomo alternativa teoria de reproduo do Bourdieu.Giroux argumenta que o modelo propostop o r Bourdieu no explica que existem nas sociedades capitalistas conflitos dentroe entre as diferentesclasses (g r i fodo autor).

    A teoria de Bourdieu elimina qualquer idia de luta ou diversidade. De acordoco m Giroux1 7 , a viso de ideologia proposta por Bourdieu parcial , pois na verdadeas ideologias so impostas, mas t a m b m , ao mesmo tempo, encontram r e s i s t n c i a s .Girouxrejeita a teoria de r e p r o d u o ,pois a referida teoria nopreva possibilidadedos membros de as classes dominadas terem a capacidade e a vontade de reconstruiras condies sob as quais eles vivem, trabalham e aprendem. Por ser algo simplista,Giroux rejeita a teoria de reproduode Bourdieu e prope uma pedagogia radical,que contmelementos de luta e solidariedade, que so , ao mesmo tempo, um desafioexercido e uma confirmaoda sua presenanas sociedadescapitalistas.

    O que faltano trabalho de Soarese tambmno deBourdieu umarefernciaao pap e l da linguagem nas sociedades socialistas. Gessinger & Gluck (16) dedicam umaparte de seu artigo, Historique et tat du Dbatsur la NormeLinguistiqueen A l l e -magne ao papel e funo da linguagem numpasmarxista, isto , Repbl icaDemocrtica A l e m ,onde as diferenas lingsticasno podem ser, como nospasescapitalistas, indicadores de fatores sociais, posto que o socialismo significa a e l i m i -Alfa , SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    14/20

    208n a o de uma sociedade declassese t a m b mnuma sociedade socialista as d i f e r e n a sn odevem ser a n t a g n i c a s , (trad.do autor)

    Todos os Estados, quer capitalistas quer socialistas procuram normalizar a t e r m i nologia t c n i c a ; as e x i g n c i a s das burocracias nos dois tipos de sociedade pedem umtipo de r e d a o uniformizada. Esta u n i f o r m i z a o pode at servir d e m o c r a t i z a ose as burocracias so obrigadas pelos membros da sociedade a u t i l i za r uma linguag em direta em vez de um oficiales .

    O l i v r ode Soares importante, pois creio que representa umam u d a n ade atitudequanto ao ensino de l n g u amaterna: a escola no deve destruir a linguagem das classes dominadas rotulando os alunos de deficientes ou ignorantes por no dominarem avariedade de p r e s t g i o .Deve-se levar em conta que as d i f e r e n a s dialetais, via de regra , so maiores nos n v e i s f o n o l g i c o s e lexicais do que no s i n t t i c o ;a escola, portanto,,no deve tentar eliminar d i f e r e n a s regionais e sociais, mas sim apresentar asintaxe da l n g u aescrita encontrada numa s e l e o representativa de l i v r o s ,jornais erevistas publicados nop a s ,como sugere Perini.Cabe mencionar aqui que outras n a e s , tais como a F r a n a e o C a n a d ,tm debatido o problema da norma e o ensino da l n g u a materna. Para G. G a g n (13), noartigo Norme et Enseignment de la Langue Maternalle ,existemduasatitudes paracom a norma e o ensino. Aprimeira se refere a uma pedagogia centrada no c d i g o ,isto , uma pdagogie de la langue , e a segunda se refere a uma pedagogia centrada na u t i l i z a o do c d i g o ,isto , uma pdagogie de laparole . Aprimeira v i so valorizaem formaabsoluta o uso escrito transposto diretamente para ooral; a segunda se baseia numa v i s o s o c i o l i n g u s t i c a dalinguagem. G a g n pensaque a escolad e v e r adotar uma atitude acolhedora a respeito das diferentes variedades do f r a n c s .N o campo de ensino do f r a n c s como l n g u a materna do C a n a d na P r o v n c i a deQ u b e c e t a m b m nas r e g i e s a n g l o - s a x n i c a s , usa-se a variedade do f r a n c s parisiense. Esteestado de coisas acarreta uma s r i e de problemas nasduascomunidadesd o p a s . G a g n conclui que o embasamento do ensino de f r a n c s na variedadeusadaem Paris no v i v e l para Q u b e c , onde existem algumas d i f e r e n a s s i n t t i c a simportantes, a l mde d i f e r e n a s nos n v e i s f o n o l g i c o e l x i c o .Das cinco p u b l i c a e s resenhadasaqui, o l i v r o de Soares o n i c o que p r o p em o d i f i c a e s debasenotipode escola existente.Soaresvisa a uma escola que transforma a sociedade. Precisa-seperguntar: Realmente o que significa transformar a sociedade ? Se realmente for p o s s v e l trans

    formar a sociedade, de onde surge a m u d a n a ? As escolas p r i m r i a s e s e c u n d r i a socasionam a t r a n s f o r m a o ? Ou s e r que as m u d a n a s ocorridas na sociedade se dev em ao papel das universidades? Concordo com Giroux(17, p. 293) que as escolasn o vo mudar as sociedades, nem as sociedades capitalistas nem as socialistas, mas p o s s v e l criar dentro das escolas r e a s de r e s i s t n c i a , pelo menos em certas sociedades, nas quais seria p o s s v e lconstruir modelos p e d a g g i c o s para novas formas deensino e aprendizagem.A l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    15/20

    209

    Creio que uma escolabaseadana teoria de r e s i s t n c i ade Girouxpossa criar parti-cularmente nas universidades um c l i m a intelectual n e c e s s r i o para debate e amplad i s c u s s o sobre as i m p l i c a e s p o l t i c a s , sociais, culturais e educacionais de umplanejamento l i n g s t i c o no Bras i l .4. C O N C L U S O : P A R A A R E N O V A O DO E N S I N O D E P O R T U G U S

    guisa de c o n c l u s o , gostaria de encerrar estas c o n s i d e r a es me referindo st r s partesdo t tu lodesta resenha,a saber (a) g r a m t i c a escolar ,(b) l i n g s t i c ae (c) r e n o v a o do ensino de p o r t u g u s .Todos os autores recenseados se referem a um tipo de g r a m t i c a que deve ser

    apresentada nas escolas. Para muitas pessoas, o papel da escola o de veicularnorma culta , que envolve um conjunto de t r a o s , um p o r t u g u s l i t e r r i o dos chamados bons autores , acoplada ao estudo da a n l i s e s i n t t i c a com a sua nomenclatura gramatical e s p e c f i c a .Wagner (31, p. 52), numa tentativa de repensar o papel da norma culta, mostra, ameu ver, claramente por que o ensino da norma culta, pelomenosno C h i l e ,no temdadocerto:

    Es obvio que no tiene mucho sentido proponer modelos de habla que ni suspropios propugnadores se atreveriam a usar en toda ocasin. Por lo dems, ellenguaje habitual en su variedad formal se manifesta tambm oralmente, cuestin que es simplesmente ignorada quando se plantea la lengua literaria comomodelo o lengua ejemplar .

    Antes de perguntar por que importante estudara g r a m t i c a , cumpre perguntar oque significa o termo g r a m t i c a . H a r t w e l l 1 8 , baseando-se nos trabamos dos l i n g i s t a s F r e s (1927) e Francis (1954)*entreoutros, identif ica cinco a c e p e s do termo g r a m t i c a :Gramtica^ o conjunto de estruturas formais interiorizadas pelos falantes, nasquais as palavras de urna determinada l n g u a so organizadas para a c o m u n i c a o .Todos os falantes do p o r t u g u s , apesar da variedade social ou regional que eles fal a m , sabem u t i l i za r a o r g a n i z a o complexadesteconjunto sem sempresaber e x p l i car comsuasp r p r i a s palavras asregrasporelesusadas.Gramtica 2 se refere a uma disciplina que parteda c i n c i a l i n g s t i c a que visa a n l i s e , d e s c r i oe f o r m a l i z a o das estruturasinteriorizadas pelos falantes.Gramtica' a etiqueta ou pol idez l i n g s t i c a que envolve o uso de uma formaou outra, uma considerada prestigiosa e a outra, n o, tais como Este trabalho paraeu/mimfazer , Faz/Fazemcincoanosque moro aqui emPerdizes .

    * Osdadoscompletos dosautorescitados porHartwell (1985)so:C. C. Fries (1927) The Rules of the Com-mom School Grammars 42:221-237 eN .Francis (1954) Revolution in Grammar . Quartely Journal ofSpeech.40:299-312.A l f a ,S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    16/20

    210Gramtica* se refere justamente sregrasgramaticais ensinadas na escola, isto , ag r a m t i c a escolar. Muitas destasregrasso mera f i c o c i e n t f i c a , pois somenteexistem no l i v r ode g r a m t i c a : os u s u r i o s da l n g u ano obedecem a elas.G r a m t i c a * diz respeito aos processos r e t r i c o s n e c e s s r i o spara produzir textos estilisticamente s a t i s f a t r i o s . O problema comesta g r a m t i c a e s t i l s t i c a a subjetividade da n o ode texto estilisticamente s a t i s f a t r i o .

    C o m a ajuda destasd e f i n i e s , podemos responder primeira pergunta formulada:Por que importante ensinar g r a m t i c a ? A t r sdestapergunta existe o pressupostode que o ensino de g r a m t i c a(regras gramaticais junto com nomenclatura) contribuipara ajudar o aluno a redigir melhor. As pesquisas na r e a de e d u c a o * (Strom,1960; Bamberg, 1981;apud H a r t w e l l , 18) mostram que o ensino direto de regrasgramaticais no contribui para melhorar a r e d a o dos alunos. Nas palavras de umdestes pesquisadores:

    M t o d o s diretos de i n s t r u o ,focalizando atividades de r e d a o e a e s t r u t u r a ode i d i a s , so mais eficientes no ensino da estrutura da s e n t e n a , uso, p o n t u a o eoutrosassuntosrelacionados do que tais m t o d o scome x e r c c i o s sobre nomenclatura,d i a g r a m a o de o r a e s e p e r o d o s e m e m o r i z a o de regrasgramaticais . (Strom,1960: 13-14,apud Hartwe, 18)Saber que o enunciado Asestrelasparecem pequenaspor estarem muito distantes pode ser analisado como uma o r a o subordinada adverbial reduzida de i n f i n i t i v ocasual nosignificanecessariamentesaberproduzir uma o r a odeste tipo.Lemle ( 2 1 ,p.90) reconhece t a m b mque o conhecimento consciente da g r a m t i c an o nem suficiente nem n e c e s s r i opara o desenvolvimento dascapacidadesde com u n i c a o e e x p r e s s o . Todavia, elaacrescentaque a metalinguagem gramatical eo conhecimento gramatical so de fato n e c e s s r i o s como alicerce para a e x p r e s s o

    oral e escrita dos pensamentos por parte dos aprendizes. O l i v r odestalinguagemserve como ponte entre a l i n g s t i c a e osestudos gramaticais. preciso, a meu verconstruir pontes entre o ensino de r e d a o e a g r a m t i c a ,por um lado, e o ensino deleiturae a g r a m t i c a ,por outro lado, pois importante integraro ensino da gramtica com a redao e com a leitura. Casoco n t r r i o ,o ensino da g r a m t i c ase torna ume x e r c c i o e s t r i l , desprovido de utilidade para o aprendiz na sua vida d i r i a . Creioque por isso que o ensino da g r a m t i c a temfracassadonasescolas.

    Creio t a m b mque muito mais importante a escola se preocupar com a f o r m a ode bons leitores e de escritores competentes. Por bons leitores tenho em mente

    * Osautoresque fizerampesquisassobre o papel dagramtica noensino deredaoeml nguainglesa que temimplicaespara oportugus soos que seguem: I . M .Strom (1960) Research on Grammar and Usage anditsImplicationfor Teaching Wr i t ing ,BulletinoftheSchoolo fEducation.IndianaUniversity,36 : 13; J. S.Sherwin (1969)FourProblemsinTeachingEnglish:ACritiqueofResearch.Scranton, Perm: internationalTextbook;Betty Bamberg (1981) Compositioninthe SecondaryEnglishCurriculum:Some Current TrendsandDirectionsfor theEighties ,RT E257-266.A l f a , S oPaulo,34:195-214, 1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    17/20

    211

    leitores que entendem o que l e me que sabem tratar o texto escrito como adversario,questionando e criticando as a f i r m a e s e h i p t e s e s nele contidas. Por um escritorcompetente no tenho em mente um autor de renome mas um aluno escritor , quesaiba pr com clareza no papel assuas p r p r i a s i d i a s , sentimentos e p r e o c u p a e s .G r a m t i c a escolar, segundo a minhad e f i n i o , i m p l i c a uma atividade direta com al n g u aportuguesa, isto , a m a n i p u l a o dos v r i o s componentes doidioma- o l x i c o , o s i n t t i c o , o s e m n t i c o e o p r a g m t i c o . Nesta v i s o das coisas, aleitura ligada r e d a o .Lucas (23, p. 2) insiste na i m p o r t n c i a da leituracomo pedra basilar paraa p r o d u o de textos, tais como bilhetes, cartas, mensagens, d i l o g o s , resumos, ensaiose t a m b m temassobre diversosassuntos.Todasestasatividades de r e d a otmsua p r p r i a g r a m t i c a , g r a m t i c a essaque envolve registros diferentes, a i d e n t i f i

    c a o do escopo do trabalho, a o r g a n i z a o , a c o e s oe o controle da i n f o r m a o dotrabalho a ser elaborado. Franchi (11, p. 42) se refere s regras gramaticais nestestermos:Elas no so uma b i t o l a estreita mas umamultiplicidade de caminhos, abertos o p o , e mesmo r e v i s o e v i o l a o . Comodiziam os velhos r e t r i c o s , o queimporta osucessodo texto. Por isso, finalmente,elasno se 'aprendem' comose aprende uma tabuada mas se constroem em uma atividade social, partilhada,reciprocamente comprometida .

    N o que diz respeito segunda parte do t t u l odesta resenha, isto , l i n g s t i c a ,acredito que estadisciplina somente uma das disciplinas que fornece s u b s d i o s paraa melhoria do ensino do p o r t u g u s . Trabalhos importantes em l i n g s t i c a voltadospara o estudo da linguagem conversacional ( A l i e n & Guy, 1974;Goffman, 1972;Schegloff & Sacks, 1973; Schenkein, 1978; osatosdafalade Searle, 1969 e a a n l i se do discurso de Parisi & Castelfranchi, 1976; F i l l m o r e , 1974) apresentam materialque tm i m p l i c a e s para o ensino de p o r t u g u s e possivelmente para a e l a b o r a ode materiald i d t i c o * .

    D o s cinco l iv ro s resenhados, dois apresentam conhecimentos advindos da l i n g s tica, t e i s , a meu ver, para o melhoramento do ensino de p o r t u g u s : Asbases danova g r a m t i c a sugeridas porPerini(p. 42-84) e as p g i n a s dedicadas s c o m p e t n cias l i n g s t i c a spor parte de Bechara (p. 40-45) nas quaisesteautor se refere ao trabalho dos l i n g i s t a s italianosLo Caseio e Simone**.

    * Os trabalhos so: D.Allen& R. Guy (1974)ConversationalAnalysis:TheSociologyof TalkThe Hague:Mouton;E.Goffman (1976) Replies andResponses LanguageinSociety5(3):257-314; E.Schegloff andH .Sacks(1973) Opening up Closings ,Semitica8(4):289-327; J. Schenkein(1978)Studiesin the OrganizationofConversationalInteraction. NewYork:AcademicPress;J. Searle(1969)SpeechActs.Cambridge: CUP; D. Parisi & C. Castelfranchi (1976) La Conversazione comeAdozionedi Scopi , Roma:Institutodi Psicologia delCNR;C. J.Fillmore (1974) Pragmatics and theDescriptionof Discourse ,BerkelyStudiesinSyntax andSemantics.Todas as fontessocitadas emG .Berruto(1979) ProblemieMetodinelTAnalisi delDiscorso ,SILTAAnnoVIII,Nos.1-3.** As fontes doslingistasitalianos citados por Becharaso:V . L oCascio(1978) PerunRinnovamentodellaDidatticadellaLnguaMadre In:V. Lo Cascio (1978)Prospettivesulla Lngua Madre. Roma:InstitutodellaEnciclopediaItaliana;R. Simone ed. (1979)L'Educaone Lingstica.Firenze:LaNuova Itlia.

    A l f a , S oPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    18/20

    212Quanto terceira parte d o t tu lo desta resenha r e n o v a o d e ensino de portug u s , creio q u e t a l r e n o v a o deve c o m e a r c o m o professor. U m professor do t ipom q u i n a d e d a r aulas, m a l remunerado, sem tempo para estudar e fazer cursos dee s p e c i a l i z a o e d e reciclagem n o v a i poder se aproveitar d a s c o n t r i b u i e s d a c i n c ia l in g s t ica d e disciplinas conexas . U m professor deste t i p o n o t e m c o n d i e sde ex ig ir leitura e redao se ele mesmo n o l e n oescreve.D i s c u s s e s sobreo t i po de por tugus que sedeve ensinar(norma culta vs . dialeto regional/social),sobre oproblema de crase,sobre a d i s t i n o entreadjunto nominal e complemento nominal,e sobre as funes de qu e s o mera camuflagem que, a meu ver, escondem o verdadeiroproblema qu e precisa ser enfrentado: u ma p o l t i ca d e ensino qu e invista na carreira de um profissional bem remunerado co m tempoparaestudo e r e f l ex o . Ta l p o l t i c a , centrada no professor, teria u m retorno p o s i t iv o , pois quebraria de vez, com oc i c l o vicioso qu e ocorre em certossetores do ensino caracterizadopela m a s s i f i c a oe c o m e r c i a l i z a o . A f o r m a o d e alunos m a l preparados p o r professores t a m b mm a l preparados.

    A G R A D E C I M E N T O SMeusagradecimentos ProfessoraAngela K l ei m an d o D L A , I E L , U N I C A M P ,pela

    leiturac r t i c adestetrabalho. A responsabilidadepelasfalhas inteiramenteminha.

    SCHMITZ, J . R. - SchoolGrammar,Linguisticsand ReservaiTeachingofPortuguese. A l f a ,SoPaulo,34 : 195-214,1990.ABSTRACT: The objectiveof this paper is toanalyzefiveimportant booksthatdeaiwith the

    problemo fteaching Portuguese in Brazil. Themotivationfo r this reviewis tocontribute tofurtherstudya nddebate abouttheteachingof themothertongue in Brazil.

    KEY-WORDS: Prestigevariety;schoolgrammar;linguisticplanning;reading; writing.

    R E F E R N C I A S B I B L I O G R F I C A S1. A RA J O, W. - Gramtica da LnguaInculta,D. O. Leitura. 5(5)Dezembro, 1986.2 . B A R B A D I N H O N E T O , R. - Sobre aNormaLiterria doModernismo.Rio de Janeiro, A oLivro Tcnico, 1977.3 . B D A R D , E . & M A U R A I S , J . M . ,orgs.- La NormeLinguistique. Qu b ec ,Conseil de la

    LangueFranaise/Par is : LeRobert, 1983.4 . B OLINGER , D . - Language:The Loaded Weapon.London,Longman, 1980.5. CA STILH O, A . T . & PRETI , D . - ALinguagemFalada Culta na Cidade de So Paulo. SoPaulo,T . A .Queiroz, 1986.A l f a , S oPaulo,34: 195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    19/20

    2136 . CA MA CH O, R. G . - O SistemaEscolar e oEnsino da LnguaPortuguesa.Alfa, 29:1-7,1985.7 . C A M E R O N , D . - Review of J . M il roy & L . . Mil roy . - Author i ty in Language:Investigating Language: Prescription and Standardization, Journal of Literary

    Semantics.X V I I/ 2 : 149-51, August, 1988.8 . C A RV A LH O, N. - Po l tica do Livro Didtico e Produo Regional. Cincia e Cultura.

    41(1):48-52,Janeiro, 1989.9. COSERIU,E . - Sincronia, Diacronia e Histria. SoPauloPresena(1953), 1979.

    10. CROUSE, J. - Does the SAT HelpCollegesMakeBetter SelectionDecisions? HarvardEducational Review.55 :2, May,195-219, 1985.

    11 . F R A N C H I , C . - Criatividadee Gramtica . Trabalhos em Lingstica. 9:5-45,1987.12. G A L L I D E P A R A T E S I , N . - Normain Lingistica eSocio-LinguisticaeIncongrueze TraNorma e Uso Nell ' I tal iano D'Og gi. Lingistica, X X V I I I , 1988.1 3 . GAGN, G . - Norme et Enseigement de La Langue Maternelle. In : B D A R D , E . &M A U R A I S , J . M. ,orgs. - La NormeLinguistique. Qu b ec , Conseil de la LangueFranaise /Paris:LeRobert, 1983.14. G A R V I N P . V . - General Principles for the Cultivation of Good Language(Trad.). In:RUBIN J . & SHUY E. - Language Planning Current Issues and Research.Washington,D . C , Georgetown University Press, 1973.15. G A R V IN , P. V . - Le Rle des Linguistes de L'cole dePraguedansleDevelopmentde laNorme Linguistique Tch q u e . In . B D A R D , E . & M A U R A I S , J . M . ,orgs. - La

    NormeLinguistique. Qu b ec ,Conseilde laLangueFranaise /Paris:L eRobert, 1983.16. GESSINGER, J . & GLU CK , H . - HistoriqueeEtat du Dbat Sur laNormeLinguistique

    en Allemagne.In : B D A R D , E. & M A U R A I S , J . M . ,orgs.- LaNorme Linguistique.Qu b ec ,Conseilde laLangueFranaise /Paris:L eRobert, 1983.17 . GIRO UX , H . A . - Theories o f Reproduction and Resistance in the New Sociology o fEducation: A Cr i t ica lAnalysis.Harward Educational Review.53(3): August,257-93,1983.1 8 . HARTWELL, P . - Grammar and the Teaching o f Grammar. College English. 47(2):February, 105-27,1985.19 LA RA , L . F . - Ac t iv i tNormatives, Anglicismes et Mot Indignesdans le Dicionrio delEspaol de M xico . In ; B D A R D , E . & M A U R A I S , J . M . ,orgs. - La Norme

    Linguistique. Qubec,Conseilde laLangueFranaise /Paris:LeRobert, 1983.20. LEF EBR E, C . - Les Notionsde Style.In : B D A R D , E . & M A U R A I S , J . M . ,orgs.- La

    NormeLinguistique. Qu b ec ,Conseilde laLangueFranaise /Paris:L eTobert, 1983.2 1 . L E M L E , M . - Anlise Sinttica (Teoria Geral e Descr io do Por tugus) . So Paulo,Editora tica, 1984.22. L I M A SOB RINHO, B. - A Lngua Portuguesa e a Unidade do Brasil. Rio de Janeiro,Livraria Jos Olympio Editora/ InstitutoNacional do Livro, 1977.23 . LU CA S, F. - Escrever sem 1er, omodelobrasileiro.D. O . Leitura. 6(66),Novembro, 1987.24. POSNER, R. - TheRomanceLanguages: A Linguistic Introduction. Garden Ci ty , N . Y . ,AnchorBooks, 1966.A l f a , SoPaulo,34:195-214,1990.

  • 8/12/2019 3840-9441-1-SM

    20/20

    214

    25. PRETI, D. - Quemfalabem?D. O. Leitura. 4(37),junho.26. ROSSI-LANDI, F. - A linguagem como Trabalho e comoMercado. So Paulo, Difel(1968), 1987.27. RUBIN, J. & SHUY, R. orgs. - Language Planning: Current Issues and Research.Washington,D. C, GeorgetownUniversityPress, 1973.28. SLACK, W. V. & PORTER, D. - The Schoalastic Aptitude Test: A Critical Appraisal.

    Harvard Educational Review. 50(2): May, 154-75,1980.29. TEYSSEIR, P. - Histria da Lngua Portuguesa. Lisboa; Livraria S da CostaEditora,1984.30. V A L D A N , A. - Normes LocalesetFrancophonie.In:B DARD, E. & MAURAI S, J. M.,orgs. - La NormeLinguistique. Qubec,Conseil de laLangue Franaise / Paris:Le

    Robert, 1983.31 . WAGNER, C. - Redefniendo la Gramt icaNormativa.Estudos Filolgicos. 20:49-61.

    Alfa SaoPaulo 34:195-214 1990.