3.Sobre Geoestatística e mapas.

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RESUMO A Geologia, até há bem pouco tempo, era freqüentemente considerada uma ciência baseada em interpretações puramente qualitativas dos fenômenos geológicos. Nos últimos 40 anos, porém, tem sido notável a mudança da fase descritiva para a utilização de métodos quantitativos, principalmente na área da Geologia Aplicada. Entre tantos temas relacionados com a quantificação em Geologia o assunto abordado neste artigo, que pretende ser de cunho didático, diz respeito à aplicação da Geoestatística na confecção de mapas geológicos. Na primeira parte do trabalho é feita uma introdução sobre os aspectos quantitativos na interpretação dos fenômenos geológicos, em seguida conceitos básicos sobre a metodologia geoestatística e, na última parte, uma aplicação clássica da geoestatística linear, baseada nos conceitos de estacionaridade da covariância e do variograma, para a confecção de mapas. PALAVRAS-CHAVE Geoestatística, krigagem ordinária, mapeamento ABSTRACT Until very time ago Geology was frequently considered a science based on purely qualitative interpretations of the geological phenomena. In the last 40 years, however, occurred a notable change from the descriptive phase to utilization of quantitative methods, mostly in the Applied Geology area. Among many related subjects to the quantification in Geology the boarded one in this paper concern the application of Geostatistics in geological mapping. In the first part of the article is introduced quantitative aspects in the interpretation of the geological phenomena, soon after basic concepts concerning geostatistical methodology and, finally, a classical application of lineal geostatistics, based on covariance and variogram stationary concepts, for spatial estimation and contouring. KEYWORDS Geostatistics, ordinary kriging, spatial estimation and contouring Paulo M. Barbosa Landim Departamento de. Geologia Aplicada Instituto de Geociência e Ciências Exatas Universidade Estadual Paulista – UNESP/Rio Claro [email protected] Sobre Geoestatística e mapas TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006 ARTIGO * Este documento deve ser referido como segue: Landim P.M.B. 2006. Sobre Geoestatística e mapas. Terræ Didatica, 2(1):19-33. <http://www.ige.unicamp.br/ terraedidatica/>

Transcript of 3.Sobre Geoestatística e mapas.

RESUMO A Geologia, até há bem pouco tempo, era freqüentemente

considerada uma ciência baseada em interpretações puramente qualitativas dos fenômenos

geológicos. Nos últimos 40 anos, porém, tem sido notável a mudança da fase descritiva

para a utilização de métodos quantitativos, principalmente na área da Geologia Aplicada.

Entre tantos temas relacionados com a quantificação em Geologia o assunto abordado

neste artigo, que pretende ser de cunho didático, diz respeito à aplicação da Geoestatística

na confecção de mapas geológicos. Na primeira parte do trabalho é feita uma introdução

sobre os aspectos quantitativos na interpretação dos fenômenos geológicos, em seguida

conceitos básicos sobre a metodologia geoestatística e, na última parte, uma aplicação

clássica da geoestatística linear, baseada nos conceitos de estacionaridade da covariância

e do variograma, para a confecção de mapas.

PALAVRAS-CHAVE Geoestatística, krigagem ordinária, mapeamento

ABSTRACT Until very time ago Geology was frequently considered a

science based on purely qualitative interpretations of the geological phenomena. In the

last 40 years, however, occurred a notable change from the descriptive phase to utilization

of quantitative methods, mostly in the Applied Geology area. Among many related

subjects to the quantification in Geology the boarded one in this paper concern the

application of Geostatistics in geological mapping. In the first part of the article is

introduced quantitative aspects in the interpretation of the geological phenomena, soon

after basic concepts concerning geostatistical methodology and, finally, a classical

application of lineal geostatistics, based on covariance and variogram stationary concepts,

for spatial estimation and contouring.

KEYWORDS Geostatistics, ordinary kriging, spatial estimation

and contouring

Paulo M. Barbosa Landim

Departamento de. Geologia Aplicada

Instituto de Geociência e Ciências Exatas

Universidade Estadual Paulista – UNESP/Rio Claro

[email protected]

Sobre Geoestatística e mapas

TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006

ARTIGO

* Este documento deve ser

referido como segue:

Landim P.M.B. 2006. Sobre

Geoestatística e mapas. Terræ

Didatica, 2(1):19-33.

<http://www.ige.unicamp.br/

terraedidatica/>

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Nesse sentido, é muito importante entender quea matemática é mais uma linguagem do que pro-priamente uma ciência. Ela é muito mais um mé-todo de comunicação para descrever quantitativa-mente uma série de eventos do que um conjuntode conhecimentos sobre esses eventos.

Seja um lago que está sendo assoreado e, por-tanto, as lâminas mais inferiores são as mais anti-gas e que a taxa de sedimentação é conhecida econstante. Isto significa que a idade das lâminas éproporcional à profundidade de soterramento e talrelação pode ser matematicamente expressa por:

Idade=k.profundidade, sendo k a taxa constan-te de sedimentação.

Isso também pode ser representado por I = k.pou mesmo i = k.π, ou ainda por caracteres hebreus,pictogramas chineses, hieróglifos egípcios. É tudouma questão de convenção para representar o mes-mo fenômeno e nesse sentido, por tradição, as le-tras gregas têm a preferência dos matemáticos.

Um outro exemplo refere-se à conhecida for-mula estatística usada como medida de tendênciacentral:

Ela tanto expressa num texto em português,como em inglês ou alemão, que a média de valoresde uma amostra (representada pela letra latina xcom um travessão superposto) é igual à somatóriados valores de 1 até n dessa amostra, dividida pelonúmero n de valores. A formula, em linguagemmatemática, é sempre a mesma.

Em muitas circunstâncias, a formulação mate-mática não oferece nada mais do que já se sabia arespeito do fenômeno, mas em muitas outras ve-zes o manuseio e a combinação de expressões ma-temáticas oferecem novas e mais claras visões so-bre o processo geológico, pois são consistentes for-necendo sempre os mesmos resultados quando usa-dos os mesmos dados. Podem, também, serem veri-ficadas para, caso estejam corretas, serem utiliza-das em previsões.

Desse modo, espera-se que o processo de atri-buição de valores, de acordo com certas regras, aosdados de campo ou laboratório e o subseqüentetratamento matemático dessas observações, tragauma sensível melhoria nos seguintes campos deatividade em Geologia:

a) na amostragem, pelo fornecimento de critériossegundo os quais as amostras geológicas

Introdução

A tentativa de aplicação de métodos quantita-tivos em Geologia coincide com o seu estabeleci-mento como ciência moderna e um exemplo mar-cante é a subdivisão do Terciário, feita por Lyellem 1830, baseada na proporção de espécies recen-tes de moluscos presentes nos diversos estratos daBacia de Paris. Não alcançou, todavia, o mesmoestágio comparável àquele existente nas outrasCiências Naturais como a Física ou a Química. AGeologia, até a bem pouco tempo, era freqüente-mente considerada uma ciência qualitativa, isto é,descritiva. Nos últimos 40 anos, porém, tem sidonotável a mudança da fase puramente descritiva dosfenômenos geológicos para um enfoque quantita-tivo. Esse processo de transformação das Ciênciasda Terra baseia-se em três fatores principais: a intro-dução do conceito de modelos matemáticos para aexplicação de fenômenos geológicos, a procura daintegração dos diversos fenômenos geológicos atra-vés da Teoria da Deriva Continental e a facilidadede acesso a computadores digitais.

A aceitação por parte dos geólogos tem sido bemmaior no tocante à Tectônica Global, e isso pode serfacilmente constatado nos livros textos de Geologiabásica recentes, que apresentam e discutem tais con-ceitos. O mesmo não acontece com a aplicação demodelos quantitativos, utilizando-se ou não de com-putadores, e isso porque os geólogos acostumadoscom o método das múltiplas hipóteses julgam queconseguem lidar com fenômenos naturais apenas emtermos qualitativos, e acabam por criar uma barreiraentre os dados obtidos e seu manuseio. Um dos mo-tivos alegados, inclusive, é que os métodos quanti-tativos apresentados são tidos como extremamentecomplexos e numa linguagem matemática de difícilentendimento. As discussões geológicas geralmentetratam de questões sobre o que aconteceu no pas-sado e em que ordem cronológica. Por exemplo, senuma determinada bacia ocorreu deposição de sedi-mentos marinhos e estes se apresentam hoje em diaerodidos na sua parte superior isso implica que apósa deposição teria ocorrido uma regressão marinha.Todavia, para um estudo quantitativo, informaçõesnuméricas são exigidas sobre quão profunda era alâmina de água na época da deposição, por quantotempo demorou tal deposição, quando ocorreu aregressão marinha e com que taxa de soerguimentoregional. Em outras palavras, após entendida a se-qüência de fenômenos geológicos torna-se neces-sário estabelecer equações matemáticas que os re-presentem e talvez aqui resida a grande dificuldade.

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coletadas sejam representativas das populaçõessob estudo;

b) na análise de dados, pelo registro sistemático eordenado dos valores obtidos e pela representa-ção gráfica que resuma os resultados, e tam-bém pela identificação de tendências, agrupa-mentos e correlações;

c) na comprovação de hipóteses de trabalho, pelaverificação de conceitos ou modelos de pro-cessos geológicos;

d) na previsão quantitativa, quando da solução deproblemas específicos que envolvam interpo-lações e extrapolações.

Somente desse modo é que a Geologia conse-guirá, além da sua característica fundamental deciência que estuda o presente para interpretar opassado, passar a ser também uma ciência que en-tende o presente para prever o futuro.

Na área mineral, com destaque para a do pe-tróleo, onde a interpretação geológica, alem de es-tar fundamentada em conceitos científicos, preci-sa ter enfoque econômico, observa-se, felizmente,uma marcante tendência quantitativa que vem pos-sibilitando avanços importantes no uso de técni-cas espaciais. Ver a propósito Houlding (2000).

Em Geologia, onde normalmente os dados sãocoletados segundo um plano de amostragem comcoordenadas definidas, torna-se muito importante,quando de sua análise, que a configuração geométri-ca espacial seja considerada. Com freqüência, resul-tados devem ser apresentados sob a forma de mapas,o que exige uma metodologia específica. Entre tan-tos outros temas relacionados com a quantificaçãoem Geologia, este é o assunto a ser abordado nesteartigo, que pretende ser de cunho didático e endere-çado para servir de consulta inicial àqueles que de-sejam entender o significado da Geoestatística. Naprimeira parte do trabalho é feita uma introduçãosobre os aspectos quantitativos na interpretação dosfenômenos geológicos, em seguida conceitos básicossobre a metodologia geoestatística e, finalmente, umaaplicação clássica da geoestatística linear, baseadanos conceitos de estacionaridade da covariância edo variograma, para a confecção de mapas.

O que significa “Geoestatística”?Para muitos geólogos “geoestatística” significa

simplesmente a aplicação de métodos estatísticosem Geologia, o que não corresponde à definição dotermo. Na África do Sul, o engenheiro de minasDaniel G. Krige e o estatístico H.S. Sichel, desenvol-

veram empiricamente uma técnica própria de esti-mativa para o cálculo de reservas minerais, a qualposteriormente recebeu tratamento formal por G.Matheron, nos início dos anos 60 do século passado,na França com o nome Geoestatística, para o estudodas chamadas variáveis regionalizadas, ou seja, variáveiscom condicionamento espacial. O trabalho de Krigefoi publicado em 1951 e os primeiros trabalhos deMatheron foram realizados após sua viagem à Áfri-ca do Sul quando conheceu Krige. A primeira pu-blicação, descrevendo os resultados de Krige foi emco-autoria com Duval e L’evy em 1955. Nos anosseguintes vieram as obras mais completas deMatheron, já com o arcabouço completo da Geoes-tatística Linear (Matheron 1962, 1963 e 1965). EmChilés e Delfiner (1999) é apresentada uma revi-são histórica sobre a Geoestatística com uma sín-tese sobre o desenvolvimento de suas ferramentas.

A estimativa de reservas sempre se constituiuparte fundamental do planejamento mineiro. O co-nhecimento geológico que se tenha a respeito dobem mineral a ser explorado, as eficientes instala-ções na boca da mina, os detalhes precisos sobre acommoditie em questão são variáveis importantes,mas o que vai decidir se o empreendimento serálucrativo ou não, dentro de um intervalo de tem-po considerado, é a reserva medida com precisão.

No planejamento mineiro tal estimativa é reali-zada por meio de blocos onde as reservas minerá-veis são amalgamadas para produzir reservas glo-bais e curvas de teor/tonelagem. O processo todo,e para cada bloco, é baseado na coleta de amostraspontuais, ou seja, com volumes menores que osblocos. As amostras, com teores conhecidos, é queirão estimar o teor médio dos blocos, a duas ou atrês dimensões. Seja, portanto, um bloco a ser esti-mado a partir de 5 amostras (Fig. 1).

Supondo que ocorra uma relação espacial en-tre os teores, ou seja, os valores serão muito

2

5

3

1

4

Figura 1 – Geometria do bloco a ser estimado a partirde 5 amostras

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próximos em dois pontos vizinhos e progressiva-mente mais diferentes à medida que os pontos vãoficando mais distantes, é intuitivo esperar que o teorda amostra 3 seja similar, porem não necessaria-mente idêntico, ao teor médio do bloco. Pode-seesperar que as amostras 1, 4 e 5 também apresen-tem teores similares ao valor médio do bloco, masnão tanto como o teor em 3. Finalmente, com rela-ção à amostra 2, situada mais distante, seria neces-sário um conhecimento melhor sobre a disposiçãoespacial de valores no depósito para decidir se elatem, ou não, relação com o valor médio do bloco.Em outras palavras, amostras situadas perto do blo-co deverão apresentar teores altamente relaciona-dos com ele e poderão, portanto, serem utilizadaspara estimar o seu valor médio, e à medida que sesituem a distâncias maiores o seu relacionamentodiminui até se tornar independente. O peso da in-fluência de cada amostra é, pois, inversamente cor-respondente à distância e essa noção pode ser apli-cada para a estimativa do valor médio do bloco uti-lizando para tanto amostras com valores conheci-dos, mas situadas a distancias julgadas “convenien-tes”. Quanto mais próximas estiverem maior seráo seu peso no processo de estimativa.

Nesta estimativa surgem, evidentemente, algu-mas questões: Até que distâncias devem ser con-sideradas as amostras? Quantas devem ser usadas?Aquela eventualmente colocada no centro do blo-co terá um peso maior que as demais? Se amostrasformarem grupos, qual a influência desses agru-pamentos? Como evitar que os resultados sejamsub ou super estimados? A relação espacial, em ter-mos geométricos, entre as amostras estimadoras eo bloco a ser estimado, tem importância? Essatécnica de estimativa pode ser utilizada indistinta-mente para depósitos do tipo cobre porfirítico,lateritas niquelíferas, veios de cassiterita, depósitosde urânio e outros?

Para responder a essas questões é que surgiu ageoestatística, a preocupar-se com o entendimen-to, por meio de análise matemática, da gênese eleis naturais que governam fenômenos interpreta-dos como regionais. Isso traz como conseqüênciadireta a estimativa das variáveis regionais usandoinformações e relações a partir de um conjuntodiscreto de amostras, juntamente com a avaliaçãodos erros de estimativa, para estabelecer o grau desegurança em previsões e os padrões ótimos deamostragem, que assegure que um erro máximode estimativa não seja excedido.

Inicialmente a aplicação era apenas para situa-ções em geologia mineira na lavra e prospecção e,

como exemplos, podem ser citados o livro clássicosobre o assunto de Journel e Huijbregts (1978) e asobras em português de Valente (1982) e Yamamoto(2001). Posteriormente se estendeu para outroscampos, especialmente nesses últimos anos, comaplicação em agricultura de precisão, cartografia,climatologia, geologia ambiental, geotecnia, hidro-geologia, pedologia, entre outros. Praticamentetodas as últimas versões de softwares para Confec-ção de Mapas ou Sistemas de Informações Geor-referenciadas apresentam métodos geoestatísticos.

Atualmente o termo Geoestatística acha-se consa-grado como um tópico especial da estatística aplica-da que trata de problemas referentes às variáveis re-

gionalizadas, as quais têm um comportamento espa-cial mostrando características intermediárias entreas variáveis verdadeiramente aleatórias e as total-mente determinísticas. Nesse sentido pode-se afir-mar que tal metodologia representa a grande con-tribuição da Geologia para a Estatística Aplicada.

As variáveis regionalizadas são constituídas porum duplo aspecto contraditório. Pela sua caracte-rística “aleatória” apresenta irregularidades e varia-ção imprevisível de um ponto para outro e pela suacaracterística “estrutural” apresenta relações exis-tentes entre os pontos no espaço motivadas pelasua gênese. Em outras palavras: é impossível pre-ver com exatidão o teor do minério num determi-nado ponto da jazida (aspecto aleatório), mas é pro-vável que se encontre minério rico perto de miné-rio rico (aspecto estrutural). No estudo do com-portamento das variáveis regionalizadas duas sãoas ferramentas fundamentais dos métodos geoes-tatísticos: o semivariograma e a krigagem.

O semivariograma

Seja uma variável regionalizada x(i) coletadaem diversos pontos i regularmente distribuídos porcerta região. O valor de cada ponto está relaciona-do de algum modo com valores obtidos a partir depontos situados a certa distância, sendo razoávelpensar que a influência é tanto maior quanto me-nor for a distância entre os pontos. Para expressaressa relação é definido o vetor de distância Δh

→ , oqual tem uma orientação específica. O grau de rela-ção entre pontos numa certa direção pode ser ex-presso pela covariância e, embora a covariância exis-ta entre todas as distâncias possíveis ao longo de h,pode ser estipulado que somente sejam considera-dos valores entre pontos regularmente espaçadospor múltiplos inteiros de Δh.

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A covariância entre valores encontrados nessas distâncias separadas por Δh ao longo de h é

onde m é a média da variável regionalizada x(i).

Isso significa que a covariância é igual à média dos produtos-cruzados dos valores x(i) encontrados nospontos i pelos valores x(i+h) nos pontos i+h, distantes a um intervalo Δh, subtraídos do quadrado damédia da variável regionalizada x(i); e n representa o número de pares de valores comparados. Como a cova-riância depende do tamanho do vetor h, se h=0, C(h) passará a representar a variância, representada por C(0).

Desse modo, pode-se calcular uma função, denominada semivariância, definida como metade davariância das diferenças.

Lembrando que Var[X]=E[X2]-E[X] 2 pode-se representar γ(h) por:

Como a média da variável regionalizada x(i) é também a média da variável regionalizada x(i+h), poisse trata da mesma variável, apenas tomadas em lugares i e em i+h, tem-se que:

e desenvolvendo o 1o termo:

e isso significa que γ(h) = C(0) - C(h).

Em outras palavras, o vetor Δh apresentando-se infinitamente pequeno faz com que a variânciaseja mínima e a covariância máxima. Haverá umvalor Δh para o qual ambas podem apresentar va-lores aproximadamente iguais, porém, à medidaque Δh aumenta a covariância diminui enquanto avariância aumenta, porque ocorre progressivamen-te maior independência entre os pontos a distânciascada vez maiores.

A semivariância distribui-se assim de zero,quando h=0, até um valor igual à variância dasobservações para um alto valor de h, se os dadosforem estacionários, isto é, não ocorrer a presençade tendência nos valores. Essas relações sãomostradas quando a função γ(h) é colocada emgráfico contra Δh para originar o semivariograma.A distancia segundo a qual γ(h) atinge um patamar,denominado soleira ou patamar (sill), igual àvariância à priori dos dados, é chamada de alcance

ou amplitude (range). Geralmente a soleira érepresentada por C e o alcance por a. A semiva-riância não é apenas igual à média das diferençasao quadrado entre pares de pontos espaçados asdistâncias h, mas também é igual à variância dessasdiferenças.

O semivariograma mostra a medida do graude dependência espacial entre amostras ao longode um suporte específico e, para sua construção,são usados simplesmente as diferenças ao quadra-do dos valores obtidos, assumindo-se uma estacio-naridade nos incrementos. Isso significa que o se-mivariograma é uma medida da variabilidade geo-lógica condicionada pela distância. Tal variabilida-de pode ser bastante diferente quando considera-das diferentes direções. Por exemplo, em estratossedimentares com inclinação ocorre maior correla-ção de valores na direção das camadas do que nosentido do mergulho das mesmas.

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Para construir um semivariograma é necessá-rio, portanto, dispor de um conjunto de valores ob-tidos a intervalos regulares dentro de um mesmosuporte geométrico. Sendo x(1), x(2), … x(i), …x(n), valores de uma variável regionalizada a se-guinte fórmula fornece uma estimativa não ten-denciosa da semivariância:

O estudo é feito em uma direção ao longo deuma linha ou ao longo de uma série de linhas pa-ralelas, utilizando n possíveis diferenças a interva-los Δh ou múltiplos de Δh.

Em lugar do termo semivariograma é muitocomum o uso mais simplificado da expressão va-riograma, porém, para o calculo é sempre levadoem consideração a divisão por 2n.

Em Clark 1979 é apresentada a construção deum semivariograma a partir de uma rede regular,com espaçamento entre os pontos de 100 pés (Fig.2). Trata-se de um depósito estratiforme de ferrocom valores em porcentagem por peso.

Para o cálculo dos semivariogramas, em diver-sas direções, são encontradas as somatórias dos qua-drados das diferenças e posterior divisão por duasvezes o número dessas diferenças. Assim para a di-reção Leste-Oeste inicia-se com o menor interva-lo possível, ou seja, 100 pés da seguinte maneira:

γ*(100) = [(40 - 42)2 + (42 - 40)2 + (40 - 39)2 +(39 - 37)2 + (37 - 36)2 + (43 - 42)2 + (42 -39)2 + (39 - 39)2 + (39 - 41)2 + (41 - 40)2 +(40 - 38)2 + (37 - 37)2 + (37 - 37)2 + (37 -35)2 + (35 - 38)2 + (38 - 37)2 + (37 – 37)2 +(37 - 33)2 + (33 - 34)2 + (35 - 38)2 + (35 -37)2 + (37 - 36)2 + (36 - 36)2 + (36 - 35)2 +(36 - 35)2 + (35 - 36)2 + (36 - 35)2 + (35 -34)2 + (34 - 33)2 + (33 - 32)2 + (32 - 29)2 +(29 - 28)2 + (38 - 37)2 + (37 - 35)2 + (29 -30)2 + (30 - 32)2 ] / [2 x 36] = 1,46

Para o intervalo de 200 pés:

γ*(200) = [ (44 - 40)2 + (40 - 40)2 + (42 - 39)2 +(40 - 37)2 + (39 - 36)2 + (42 - 43)2 + (43 -39)2 + (42 - 39)2 + (39 - 41)2 + (39 - 40)2 +(41 - 38)2 + (37 - 37)2 + (37 - 35)2 + (37 -38)2 + (35 - 37)2 + (38 - 37)2 + (37 – 33)2 +(37 - 34)2 + (38 - 35)2 + (35 - 36)2 + (37 -36)2 + (36 - 35)2 + (36 - 36)2 + (35 - 35)2 +(36 - 34)2 + (35 - 33)2 + (34 - 32)2 + (33 -29)2 + (32 - 28)2 + (38 - 35)2 + (35 - 30)2 +(30 - 29)2 + (29 – 32 ] / [2 x 33] = 3,30

E assim por diante, tanto para esta direção comopara a Norte-Sul. O resultado é apresentado na Ta-bela 1.

Estes resultados permitem a construção dossemivariogramas experimentais (Fig. 3), nas duasdireções consideradas, e o que se pode perceber éque há uma distinta diferença na estrutura dos da-dos, ou seja, a presença de uma anisotropia. Na di-reção Norte-Sul os valores aumentam muito maisrapidamente, sugerindo uma maior continuidadena direção Leste-Oeste.

Os semivariogramas expressam o comporta-mento espacial da variável regionalizada e mostram:

a) o tamanho da zona de influência em torno deuma amostra, pois toda amostra cuja distânciaao ponto a ser estimado for menor ou igual aoalcance, fornece informações sobre o ponto;

b) a anisotropia, quando os semivariogramas mos-tram diferentes comportamentos para diferen-tes direções de linhas de amostragem e de estu-do da variável; neste caso a anisotropia podeser geométrica quando o alcance varia deacordo com as diversas direções consideradas,mantendo constante a soleira e zonal quando

Leste-Oeste 100 1,46 36

200 3,30 33

300 4,31 27

400 6,70 23

Norte-Sul 100 5,35 36

200 9,87 27

300 18,88 21

DireçãoDireção Semivariograma Nº ParesDistância Semivariograma Nº ParesDistância

Tabela 1 – Valores da função semivariograma calculadospara as direções Leste-Oeste e Norte-Sul

6

5

4

3

2

1

0

-1

-1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

44 40 40 39 37 3642

42 39 39 38

38

3835 35 37 36 36 35

37 37 37 35

35 34 33 32 29 2835

3538 37 30 3229 30

3636

37 37 33 34

41 404342

Figura 2 – Mapa de localização dos teores de ferro(Clark 1979)

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o alcance permanece constante e a soleira variaconforme for modificada a direção;

c) continuidade, pela forma do semivariograma,em que para h ≅ 0, γ(h) já apresenta algum va-lor. Essa situação é conhecida como efeito pepi-ta (nugget effect) e é representada por C

0. O efei-

to pepita pode ser atribuído a erros de mediçãoou ao fato de que os dados não foram coletadosa intervalos suficientemente pequenos paramostrar o comportamento espacial subjacentedo fenômeno em estudo.

Na construção do semivariograma, as soma-tórias necessárias para o cálculo de γ(h) devem serconstituídas por um número suficiente de pares, quetornem o resultado consistente. Como regra práticaadota-se para tanto um mínimo de 30 pares, o quepode ser conseguido se for escolhido como maiorΔh, a metade da maior distância existente entre ospontos. Isto significa que, para uma análise geo-estatística, exige-se que o número mínimo de pon-tos amostrados seja razoável, por volta de 30 a 40.

Uma outra consideração importante a ser feitaé determinar o grau de aleatoriedade presente nosdados pela fórmula E = C

0/C (Guerra 1988):

E<0,15: componente aleatória pequena;0,15 ≤ E ≤ 0,30: componente aleatória sig-nificante;E > 0,30: componente aleatória muito signi-ficativa.

O extremo dessa situação é o modelo de pepitapura, onde não ocorre covariância entre os valorese, portanto, a análise semivariográfica não se apli-ca, sendo sugerido o uso de outros métodos deinterpolação.

De posse do semivariograma experimental énecessário ajustá-lo a um modelo teórico, ou seja,

a uma função que definirá os parâmetros dosemivariograma, “efeito pepita”, “alcance” e “pa-tamar”. Entre os modelos disponíveis estes são osmais utilizados:

a) Modelos com patamar

a.1) Modelo esférico

para h < a

, para h ≥ a,

neste modelo a inclinação da tangente juntoà origem (h≅0) é 3C/2a; é o modelo maiscomum, podendo-se afirmar que equivaleà função de distribuição normal da estatís-tica clássica.

a.2) Modelo exponencial

neste modelo a inclinação da tangente juntoà origem é C/a; C é a assíntota de uma cur-va exponencial e pode ser equalizada juntoà soleira; “a” corresponde ao alcance práti-co igual à distância segundo a qual 95% dasoleira foi alcançada.

a.3) Modelo gaussiano

a curva é parabólica junto à origem e a tan-gente nesse ponto é horizontal, o que indi-ca pequena variabilidade para curtas distân-cias; “a” corresponde ao alcance práticoigual à distância segundo a qual 95% dasoleira foi alcançada.

b) Modelos sem patamar

b.1) Modelo potencial

γ(h)=Chα, com a potência α assumindovalores entre zero e próximo a 2;

quando α = 1 o modelo torna-se linear;

γ(h)= ph, sendo p a inclinação da reta;

é o modelo mais simples e representado poruma reta passando pela origem do gráfico.

Para dados que estão irregularmente distribuídosno espaço bidimensional não é possível, em princí-pio, encontrar pares de amostras suficientes com exa-tamente o mesmo espaçamento Δh para o cálculo

30

N-S

E-W

Distância entre pontos

0

0 100 200 300 400 500

5

10

15

20

25

Figura 3 – Semivariogramas experimentais calculadospara as direções Leste-Oeste e Norte-Sul

P.M.B. Landim TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006

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em uma determinada direção, como feito com da-dos dispostos em malha regular. Para contornar essasituação define-se uma distância de tolerância Δ’hpara o espaçamento Δh entre os pares de amostrasde um ângulo de tolerância Δ’α para a direcão αconsiderada. Assim, para o cálculo do semivario-grama de uma distribuição irregular de pontos aolongo de uma determinada direção α, consideram-se todas as amostras que se encontram no ângulo α± Δ’α, e, em seguida, classificam-se os pares deamostras em classes de distancia Δh ± Δ’h, 2Δh ±Δ’h, onde Δh é a distância básica (Fig. 4). As dire-ções consideradas e seus respectivos ângulos detolerância devem cobrir a área toda.

Para a estimativa do semivariograma experimen-tal, não se tendo certeza se o fenômeno sob estudoé isotrópico ou anisotrópico no espaço bidimen-sional, inicialmente consideram-se quatro direções,E-W, N-S, NE-SW e NW-SE, com um ângulo deabertura com tolerância de 45º. Quando se constatauma direção bem marcante de anisotropia deve-seadotar tal direção com um pequeno ângulo de tole-rância (α0 ± Δ’α0) para estimar o semivariogramanessa direção. Melhores estimativas são obtidasquando os modelos são baseados em semivariogra-mas experimentais que apresentam a menor razão“efeito pepita/patamar” e, também, o maior alcance.

Em resumo, para a utilização do semivariogra-ma as seguintes suposições básicas são requeridas:

a) as diferenças entre pares de valores de amos-tras são determinadas apenas pela orientação es-pacial relativa dessas amostras;

b) o interesse é enfocado apenas na média e navariância das diferenças, significando que es-ses dois parâmetros dependem unicamente daorientação;

c) por conveniência assume-se que os valores daárea de interesse não apresentam tendência que

possa afetar os resultados e, assim, a preocupa-ção é apenas com a variância das diferençasentre valores das amostras.

A modelagem, ou seja, o ajuste de um variogra-ma experimental a uma função é um passo funda-mental na análise variográfica, sendo um processoque envolve várias tentativas e na qual a experiênciapesa muito. Pode-se optar por um ajuste manualpor comparação visual, mais sujeito a erros, ou, como auxílio de algoritmos, para ajustes automáticoscomo apresentado, entre outros, em Pannatier(1996). Acrescentar, em seguida, a essa verificaçãoa “validação cruzada”. Nessa análise, depois deobtido o modelo variográfico, cada valor original éremovido do domínio espacial e, usando-se osdemais, um novo valor é estimado para esse pon-to. Desse modo, um gráfico pode ser construídomostrando a relação entre valores reais e estima-dos. A validação cruzada, porem, não prova que omodelo escolhido é o mais correto, mas sim que omesmo não é inteiramente incorreto. A melhorverificação, então, é aquela resultante do confrontoentre os valores estimados e a realidade de campo.

Distância básica

Direção

Ângulo detolerância

Intervalo detolerância

Z(X0)

X

Y

Figura 4 – Esquema para localização de pontos emdistribuições irregulares para cálculo devariogramas experimentais

0

5770

4327

2885

1442

0 141074

Distância “h”

Sem

ivar

iânc

ia

Valo

res

reai

s

648

579

510

442

373

579 648442373 510

Valores estimados

Figura 5 – Ajuste ao modelo esférico (0,548) e diagrama de dispersão da validação cruzada

27

TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006 P.M.B. Landim

Uma comparação entre os ajustes a um mode-lo esférico e a um modelo linear é apresentada aseguir e o ajuste é indicado, no gráfico, pela rela-ção entre a reta a 45º e a obtida pela análise (Figs. 5e 6). Um valor igual a 1,0 significa a indicação deajuste perfeito.

Num estudo geoestatístico, a parte fundamen-tal refere-se à determinação do semivariograma.Isso é importante e todo o cuidado deve ser toma-do na análise variografica para que possa obter umacriteriosa análise geoestatística.

Krigagem

Krigagem é um processo de estimativa de valo-res de variáveis distribuídas no espaço, e/ou no tem-po, a partir de valores adjacentes enquanto consi-derados como interdependentes pelo semivario-grama. Trata-se, em último caso, de um métodode estimativa por médias móveis. O termo, tradu-ção do francês krigeage, e do inglês kriging, foicunhado pela escola francesa de geoestatística emhomenagem ao engenheiro de minas sul-africanoe pioneiro na aplicação de técnicas estatísticas emavaliação mineira, Daniel G. Krige.

A krigagem pode ser usada, como algoritmoestimador, para:

a) previsão do valor pontual de uma variável regio-nalizada em um determinado local dentro docampo geométrico; é um procedimento de inter-polação exato que leva em consideração todosos valores observados, o qual pode ser a base paracartografia automática por computador quandose dispõe de valores de uma variável regiona-lizada dispostos por uma determinada área;

b) cálculo médio de uma variável regionalizadapara um volume maior que o suporte geomé-trico como, por exemplo, no cálculo do teor

médio de uma jazida a partir de informaçõesobtidas de testemunhas de sondagens;

Em todas essas situações o método fornece, alémdos valores estimados, o “erro” associado a tal esti-mativa, o que o distingue dos demais algoritmos àdisposição. A krigagem usa informações a partir dosemivariograma para encontrar os pesos ótimos aserem associados às amostras que irão estimar umponto, um área ou um bloco. Como o semivariogra-ma é uma função da distância entre locais de amos-tragens, mantendo o mesmo número de amostras,os pesos são diferentes de acordo com o seu arranjogeográfico. O uso do semivariograma para a estima-tiva por krigagem não exige que os dados tenhamdistribuição normal, mas a presença de distribuiçãoassimétrica, com muitos valores anômalos, deve serconsiderada, pois a krigagem é um estimador linear.

Krigagem ordinária

A metodologia geoestatística apresenta diver-sas técnicas de estimativas disponíveis e a mais usualé a krigagem ordinária

Seja um ponto que se deseja estimar, sendo ovalor real desconhecido representado por V. O va-lor estimado (V*) é calculado, utilizando n amos-tras localizadas segundo coordenadas conhecidas,com valores x1, x2, x3…xn (conjunto S), de formalinear, como por exemplo, através da técnica daponderação pelo inverso das distâncias.

V* = p1 x

1 + p

2x

2 + p

3x

3 + … + p

nx

n, onde

os pi são os pesos atributos a cada amostra i.

É evidente que existe associado a esse estimadorum erro ε=V-V* e que se, teoricamente, diversasestimativas forem feitas a média de erros é zero. Seos erros, portanto, apresentarem valores próximosa zero, o estimador é de confiança e isso pode ser

0

6093

4570

3047

1523

0 141074

Distância “h”

Sem

ivar

iânc

ia

Valo

res

reai

s

5870

4071

2271

471

-1328

4071 5870471-1328 2271

Valores estimados

Figura 6 – Ajuste ao modelo linear (0,004) e diagrama de dispersão da validação cruzada

P.M.B. Landim TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006

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verificado pela distribuição desses valores. A ma-neira mais simples de medir estatisticamente tal dis-tribuição é via o desvio padrão ou a variância. Nocaso em questão, porém, a variância não pode serobtida porque não se conhece o valor real que seesta estimando e, portanto, também não se sabe qualo erro associado.

Variância dos erros = = desvios ao qua-

drado em relação ao erro médio = médiade (V-V*)2.

Para encontro da variância pode-se, porém, uti-lizar o semivariograma, em que são medidas as dife-renças ao quadrado. Num semivariograma, previa-mente calculado, dada uma distância h entre ospontos, pode-se estimar a variância simplesmentelendo o valor no eixo dos γ’s e multiplicando-o por 2

Desse modo, para o processo de estimativa deum ponto utilizando o método da krigagem, pro-cede-se da seguinte maneira:

Se a soma dos pesos for igual a 1 e não ocorrertendência local dos valores, esse estimador é omelhor e não tendencioso, pois a partir dos pesosatribuídos a cada amostra, minimiza a estimativada variância.

,

Isso é obtido construindo-se um sistema de nequações com n incógnitas (λ

1, λ

2, λ

3, …λ

n) e ha-

vendo a restrição de que Σλi=1, passa-se a n+1equações. Como se tem apenas n incógnitas des-conhecidas, introduz-se uma outra, também des-conhecida, para balancear o sistema, ou seja, o cha-mado multiplicador de Lagrange, μ.

, se

O objetivo da krigagem é procurar pelo conjun-to ótimo de ponderadores de modo que a variânciado erro de estimativa seja a menor possível. Para tan-to, é organizado um sistema de equações com n+1incógnitas, para a estimativa de um ponto (So):

λ1 γ−(S

1,S

1) + λ

2 γ−(S

1,S

2)+ λ

3 γ−(S

1,S

3)+…+ μ =γ−(S

1,S

0)

λ1 γ−(S

2,S

1)+ λ

2 γ−(S

2,S

2)+ λ

3 γ−(S

2,S

3)+…+ μ =γ−(S

2,S

0)

λ1 γ−(S

n,S

1)+ λ

2 γ−(S

n,S

2)+ λ

3 γ−(S

n,S

3)+…+ μ =γ−(S

n,S

0)

λ1

+ λ2

+ λ3

+…+ 0 = 1

Estas equações constituem equações normaisa n+1 incógnitas, as quais podem ser resolvidas,para a obtenção dos coeficientes, por cálculomatricial, segundo:

[X][A]=[Y]

Multiplicando ambos os termos da equaçãopelo inverso de [X], isto é, [X]-1:

[X]-1. [X] . [A] = [X]-1 [Y];

como [X]-1.[X]=[I] (matriz de identida-de) e [I].[A]=[A],

[A].[X]-1 = [Y] .

Em notação matricial:

A matriz [Si,S

i] contém os valores obtidos no

semivariograma referentes às distâncias entre asamostras estimadoras; o vetor [S

i,S

0] contém os

valores obtidos no semivariograma referentes àsdistâncias entre cada amostra e o ponto (So) a serestimado e o vetor [λ

i] contém os ponderadores a

serem calculados.Resolvido o sistema de equações, obtém-se os

pesos λi e o multiplicador de Lagrange, μ, segundo:

[λi] = [Si,Si]-1 · [Si,So]

Para o ponto S0 a ser estimado, obtém-se uma

combinação linear dos valores dos pontos vizinhose respectivos pesos

S0 = Σλ

iSi

Para o cálculo da variância (σ²) associada aovalor S

0 obtido por estimativa usa-se a expressão:

,

sendo [λi]’ = vetor transposto com os pesosλ

i e [Si,So] = vetor com os valores obtidos

no semivariograma referentes às distânciasentre cada amostra e o ponto (So) a serestimado.

29

TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006 P.M.B. Landim

Interpolação de pontos paraa confecção de mapas decontornos

Existe à disposição diversosalgoritmos para a estimativa depontos que são utilizados na in-terpolação para a confecção demapas, como o inverso ao qua-drado da distância, curvaturamínima, vizinho mais próximo,regressão polinomial, entre ou-tros, além da krigagem. A dife-rença entre os diversos métodosestá em como, a partir de valoresconhecidos, podem ser estima-dos os nós da rede regular. Alémdisso, a krigagem se destaca porlevar em consideração a variabi-lidade espacial dos dados.

Normalmente nesse tipo deestudo parte-se de uma série depontos irregularmente distribu-ídos com valores conhecidos e apartir deles procura-se por cons-truir uma rede regular de pon-tos interpolados (Fig. 7).

Seja uma situação hipotéti-ca (Fig. 8) em que 5 pontos foram amostrados parateores de U

3O

8 e se pretende a partir deles estimar

o valor no ponto A (Clark 1979).Aplicando, inicialmente, o método do in-

verso da distância, onde os pesos são corrigidos paraobter uma soma igual a um, é obtido o resultadoapresentado na Tabela 2.

Aplicando-se a equação da média ponderada,tem-se:

A = (0,319*400) + (0,137*380) + (0,217*450)+ (0,229*280) + (0,098*320) = 372,8 ppm

Neste caso, para estimar um valor desconhecidoa partir de valores conhecidos importa apenas as dis-tâncias euclidianas para a atribuição dos pesos e issoé válido para todos os outros algoritmos, com exce-ção da krigagem. Na krigagem há necessidade deencontrar, preliminarmente, a variabilidade espacialdos dados o que é conseguido por uma análise vario-gráfica. Em outras palavras, antes da aplicação dakrigagem é preciso calcular um semivariograma ex-perimental e em seguida modelá-lo. Tendo isso sidofeito encontrou-se um modelo esférico, com osseguintes parâmetros: amplitude de influência (a),

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

100

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

100

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

100

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

0 20 40 60 80 100

100

0

20

40

60

80

Figura 7 – Pontos de dados amostrais (superior esquerdo); malha regularsuperposta (superior direito); estimativa do bloco no ponto decoordenadas em vermelho (inferior esquerdo) e estimativa dospontos da malha regular (inferior direito)

Figura 8 – Configuração de pontos de amostragempara estimativa no ponto A

4070

2380

2370

2360

2350

2340

2330

2320

2310

2300

4080 4210420041904180417041604150414041304120411041004090

3

5 A 2

4

1

00.00

1 4170 2332 400 21,54 0,0464 0,319

2 4200 2340 380 50,00 0,0200 0,137

3 4160 2370 450 31,62 0,0316 0,217

4 4150 2310 280 30,00 0,0333 0,229

5 4080 2340 320 70,00 0,0143 0,098

A 4150 2340 ?

Pontos Pesos1/DDistânciasYX U O3 8Pontos Pesos1/DDistânciasYX U O3 8

Tabela 2 – Pesos calculados pelo inverso da distânciapara estimativa do ponto A

P.M.B. Landim TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006

30

De posse desses valores, pode-se organizar osistema de equações normais para o cálculo dospesos λ

i e do multiplicador de LaGrange μ:

DistânciasPontos DistânciasPontos

p1-A 21,54 322,67

p2-A 50 581,25

p3-A 31,62 420,94

p4-A 30 405,55

p5-A 70 714,95

p1-p2 31,05 415,53

p1-p3 39,29 491,35

p1-p4 29,73 402,99

p1-p5 90,35 790,55

p2-p3 50,00 581,25

p2-p4 58,31 642,86

p2-p5 120,00 800

p3-p4 60,83 659,92

p3-p5 85,44 778,82

p4-p5 76,16 745,06

100 pés; valor da soleira (C), 700 ppm e um efeitopepita(C0) da ordem de 100 ppm (Fig. 9).

Na krigagem para a estimativa de A são neces-sários não apenas os valores das distâncias de cadaum dos 5 pontos em relação a A, mas também asdistâncias entre os pontos. Não são as distânciaseuclidianas, porém, que são utilizadas, mas sim osvalores resultantes da análise espacial pelo vario-grama modelado. Isso pode ser obtido graficamentecolocando os valores no semivariograma ou analiti-camente utilizando a fórmula de um modelo, nocaso, esférico. A Figura 10 mostra as relações entreamostras (em preto) e entre as amostras e o pontoa ser estimado (em vermelho).

Assim a distância euclidiana entre o ponto 1, omais próximo, e A é de 21,54 pés, a qual cor-responde, pelo variograma modelado, ao valor322,7 (Fig. 11).

Esse valor também pode ser encontrado segundo:

(modelo esférico)

De modo idêntico são encontrados todos osdemais valores (Tab. 3):

Distância h0. 40. 80. 120. 160. 200.

Modelo esférico1000.

800.

600.

400.

200.

0.

0.

Figura 9 – Modelo de variograma para osdados da Figura 8

4070

2380

2370

2360

2350

2340

2330

2320

2310

2300

4080 4210420041904180417041604150414041304120411041004090

5 A

1

3

2

4

Figura 10 – Inter-relações entre amostras e ponto a serestimado para cálculo das equações de krigagem

Co+C

100

100 (Co)

800

5

4

A

3

21

21,54

322.7

21.54

Figura 11 – Esquema mostrando a transformação dadistância euclidiana (21,54 pés) em valor dafunção semivariograma (322,7 ppm)

Tabela 3 – Distâncias e valores das funçõessemivariograma para estimativa doponto A na Figura 8

31

TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006 P.M.B. Landim

Para o cálculo do teor em A:

A = (0,3760*400) + (-0,0347*380) + (0,3017*450) + (0,2668*280) + (0,0901*320) = 376,55 ppm

Este resultado é bastante próximo ao obtido pelo método do inverso da distância, mas ambos osvalores estão a indicar simplesmente aproximações com relação ao verdadeiro valor de A, havendo neces-sidade do estabelecimento de um intervalo de confiança.

A variância associada à estimativa pela krigagem é:

S2

k = 0,3760(322,7) - 0,0347(581,3)+0,3017(420,9)+0,2668(405,5)+0,0901(714,9)+10,0816 = 410,8867

Sk = 20,27034

X

2,5% 2,5%

Usando este desvio padrão para estabelecer umintervalo de confiança e supondo que a distribui-ção dos valores da estimativa apresente distribui-ção normal em torno do valor real e que, portanto,95% dessa distribuição estão no intervalo de maisou menos 1,96 desvios padrão, tem-se que o inter-valo de confiança é da ordem de ± 19,77 * 1,96=39,73 (Fig. 12).

O verdadeiro valor do ponto A deve estar, por-tanto entre 336,82 e 416,28 ppm. Esse resultadopara o intervalo de confiança já era esperado tendoem vista que no modelo variográfico, no qual a kri-gagem foi baseada, o valor para o efeito pepita é de

Figura 12 – Intervalo de confiança em torno do valorestimado por krigagem ordinária

P.M.B. Landim TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006

32

100 pés. Pela equação do semivariogra-ma é de se esperar que o valor de λ

0 seja

zero, mas quando isso não ocorre é indí-cio de descontinuidade para distânciasmenores do que a menor distância entreos pontos e que parte dessa desconti-nuidade pode ser devida a erros de me-dição ou a variabilidade numa escala me-nor do que aquela amostrada. Quantomenor a proporção do efeito pepita parao patamar, menor a variância da estima-tiva e, portanto, maior a confiança quese pode ter na estimativa.

Esta medida do erro associado àestimativa é que distingue o método dakrigagem em relação aos demais algo-ritmos e, desse modo, quando da sua apli-cação sempre resultam dois mapas: umcom a distribuição dos valores inter-polados e outro com a variâncias, ou odesvios padrão, referentes aos valores es-timados. Nestes a localização dos meno-res valores coincide com as áreas commaior densidade de pontos.

Um exemplo é apresentado a seguirpara uma distribuição de 60 pontos(Fig. 13).

A análise variográfica indicou que omelhor modelo ajustado seria o expo-nencial com C= 11,84; a = 129,58 e C

0

= 4,8 (Fig. 14). Baseado nesse modelo, a krigagemordinária forneceu o mapa com valores estimados(Fig. 15) e o respectivo mapa com os valores dedesvios-padrão da krigagem (Fig. 16).

A krigagem, entendida como um estimador quese baseia em técnicas de análise de regressão, procu-

310.

260.

210.

160.4.500

6.000

7.500

9.000

10.500

12.000

13.500

15.000

16.500

1.500

.0

3.000

110.

250. 300. 350. 400. 450. 500.

0

2

4

6

8

10

12

14

16

0 20 40 60 80 100 120 140 160

|h|

(|h|)

ra minimizar a variância estimada a partir de ummodelo prévio que leva em conta a dependênciaestocástica entre os dados distribuídos no espaço.Com a krigagem é calculada a melhor estimativapossível para locais não amostrados, pela minimi-zação da variância do erro.

Figura 13 – Mapa de localização de pontos de amostragem

Figura 16 – Mapa de desvios-padrão da krigagemassociados aos valores estimados da Figura 15

Figura 15 – Mapa estimado pelo método da krigagemordinária para os dados do exemplo da Figura 13

Figura 14 – Modelo de variograma ajustado ao variogramaexperimental para os dados do exemplo da Figura 13

33

TERRÆ DIDATICA 2(1):19-33, 2006 P.M.B. Landim

Considerações finais

Neste texto foi dado ênfase a uma das pos-síveis aplicações da Geoestatística, ou seja, na ela-boração de mapas de contornos, os quais mostramlinhas que representam medidas interpoladas comiguais valores. Valores regionalizados esses quemudam de local para local e apresentam uma varia-bilidade espacial. Quando de um levantamento to-pográfico, o cartógrafo tem condições de ver o ter-reno e decidir coletar mais pontos nas regiões maisacidentadas, ou seja, com maior variabilidade, emenos nas regiões planas, com menor variabili-dade, com a intenção de melhor representar nomapa, em duas dimensões, a realidade em três di-mensões. É possível que, nesta circunstância, akrigagem nem seja de grande valia. Ela se torna,porem, importante para o mapeamento de super-fícies outras, que procuram modelar a distribuiçãode variáveis geoquímicas, geofísicas, hidrogeo-lógicas, geotécnicas, etc.

Mesmo sendo a krigagem o melhor estimadorlinear não tendencioso, o método apresenta, po-rém, limitações.

Isso porque o semivariograma mostra a medi-da do grau de dependência espacial entre valores eé uma medida da variabilidade em relação à dis-tância. A krigagem usa essas informações para en-contrar os pesos ótimos a serem associados às amos-tras que irão estimar um ponto e a variância dakrigagem é independente dos valores dos pontosusados para obter os estimadores Zi* e mede so-mente a configuração espacial dos dados.

Além disso, não há garantia que o mapa obtidopela krigagem tenha o mesmo histograma, a mes-ma variância e o mesmo semivariograma dos da-dos originais, pois trata-se, pela própria naturezado método, de um mapa com valores suavizados,sendo a suavização inversamente proporcional àdensidade dos pontos amostrados.

A Geoestatística, porém, não é apenas krigagem,como aqui apresentado. Existem também à dispo-sição as ferramentas da simulação, que permiteminfinitas realizações de mapas, cada qual com apro-ximadamente o mesmo semivariograma e a mes-ma variância que os dados originais. Teoricamentea média de um grande número de mapas simula-dos deve fornecer resultados mais reais e, conse-qüentemente, mais confiáveis para predições.Numa frase final: a simulação tenta atingir realis-mo e a estimativa por krigagem, acurácia.

Agradecimentos

Aos dois relatores que com suas críticas constru-tivas melhoraram, e muito, a qualidade deste texto.

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Submetido em 23 de fevereiro de 2006.

Aceito em 18 de julho de 2006.