4 inclusao relacoes
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- 1. Incluso Social Relaestnico-raciais Secretaria Especial Ministriodos Direitos Humanos da Educao e de gnerokit3_CAPA_mod4.indd 2-310/3/2007 20:30:19
2. Presidente da RepblicaLuiz Incio Lula da SilvaMinistro da EducaoFernando HaddadSecretrio Especial de Direitos HumanosPaulo de Tarso Vannuchikit3_CAPA_mod4.indd 4 10/3/2007 20:30:19 3. Ministrio da Educao Secretaria de Educao Bsica Programa tica e Cidadaniaconstruindo valores na escola e na sociedadeRelaes tnico-raciais e de gnero Mdulo 4 Incluso Social Programa de DesenvolvimentoProfissional Continuado Braslia2007kit3_modulo4.indd 13/6/07 10:22:36 AM 4. Secretria de Educao Bsica - SEB/MECMaria do Pilar Lacerda Almeida e SilvaPresidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao - FNDE/MECDaniel da Silva BalabanDiretora de Polticas de Ensino Mdio - DPEM/SEB/MECLucia Helena Lodi Coordenao do Projeto Lucia Helena LodiEquipe Tcnica - DPEM/SEB/MECMaria Marismene GonzagaOrganizaoFAFE Fundao de Apoio Faculdade de Educao (USP)ConsultoresUlisses F. Arajo e Valria Amorim ArantesEquipe de elaboraoUlisses F. Arajo,Valria Amorim Arantes, Ana Maria Klein e Eliane Cndida PereiraRevisoMaria Helena Pereira Dias, Ana Lucia Santos (preparao)Coordenao de ArteRicardo PostacchiniDiagramaoCamila Fiorenza Crispino Tiragem 40 mil exemplares MINISTRIO DA EDUCAOSECRETARIA DE EDUCAO BSICAEsplanada dos Ministrios, Bloco L, sala 500 CEP: 70.047-900 - Braslia - DFTel. (61) 2104-8177/2104-8010 http://www.mec.gov.br Dados Internacionais de Catalagoo na Publicao (CIP) Programa tica e Cidadania : construindo valores na escola e na sociedade : relaes tnico-raciais ede gnero / organizao FAFE Fundao de Apoio Faculdade de Educao (USP) , equipe deelaborao Ulisses F. Arajo... [et al.]. Braslia : Ministrio da Educao, Secretaria de EducaoBsica, 2007.4 v.Programa de Desenvolvimento Profissional ContinuadoContedo: Relaes tnico-raciais e de gnero mdulo 1: tica mdulo 2: Convivncia Democrtica mdulo 3: Direitos Humanos mdulo 4: Incluso SocialISBN 978-85-98171-75-3 1. tica. 2. Cidadania. 3. Direitos humanos. 4. Incluso social. 5. Violncia na escola. 6. Relaes sociais na escola. 7. Igualdade de oportunidades. I. Fundao de Apoio Faculdade de Educao. II. Arajo, Ulisses F. III. Brasil. Secretaria de Educao Bsica. CDU 37.014.53kit3_modulo4.indd 2 3/6/07 10:22:36 AM 5. Incluso SocialMdulo 4 Relaestnico-raciais e de gnerokit3_modulo4.indd 33/6/07 10:22:36 AM 6. Sumrio Introduo ............................................................................................................... 05 Gnero e incluso escolar ......................................................................................... 09 Som da rua: incluso tnico-racial e de gnero ......................................................... 21 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana .............................. 29kit3_modulo4.indd 43/6/07 10:22:36 AM 7. Incluso SocialIntroduoRelaes tnico-raciaise de gnerokit3_modulo4.indd 53/6/07 10:22:36 AM 8. No artigo A educao inclusiva: um meio de construir escolaspara todos no sculo XXI1, a professora Pilar Arnaiz Snchezchama a ateno para o fato de que, inicialmente, a diversidade nocampo da educao inclusiva foi entendida como uma inovaona rea da educao especial. No entanto, gradualmente, passoua ser compreendida como uma tentativa de oferecer educao dequalidade para todos(as). Esse movimento inclusivo centra-se norespeito e na valorizao das diferenas como matria prima parauma educao de qualidade.No campo da incluso social, sem negar a existncia de muitosoutros grupos humanos que sofrem os processos de exclusosocial, os afro-descendentes e as mulheres so exemplos de gruposque, historicamente, foram alvo de discriminaes e preconceitosque acabaram por negar-lhes muitos dos direitos que asseguram aigualdade de condies e de oportunidades para a construo deuma vida digna.Como parte dos processos recentes de democratizao da sociedadebrasileira, muito se tem conseguido na conquista por polticaspblicas e por marcos legais que dem a esses grupos algumas dascondies socioeducacionais e ocupacionais necessrias melhoriade suas condies de vida. pouco, no entanto, diante dos sculosde excluso social a que foram submetidos, e muito ainda tem deser feito para se chegar a uma sociedade verdadeiramente inclusiva,que lhes assegure a igualdade de direitos e o respeito s diferenas.A escola, como instituio social responsvel pela formao ticae instruo das novas geraes, precisa assumir seu papel naconstruo de uma sociedade mais justa, equnime e solidria.A luta pela garantia de igualdade de condies e de oportunidadespara todas as pessoas passa, necessariamente, por uma educao em1 In: Incluso: Revista da educao especial. DF/SEESP/MEC, ano 1, n. 1,2005. 6kit3_modulo4.indd 63/6/07 10:22:40 AM 9. que o respeito mtuo, o respeito aos outros, o reconhecimento dasdiferenas e a possibilidade de trabalh-las sejam objeto de aescotidianas em todos os espaos e tempos educativos.Do reconhecimento desse quadro surge a importncia de se incluirnos currculos escolares um trabalho sistematizado e intencionalque leve alunos e alunas a compreender as razes histricas e sociaisde excluso da maioria dos afro-descendentes e das mulheres dodireito verdadeira cidadania.Este mdulo Incluso Social do Programa tica e Cidadania, aoabordar as temticas de relaes tnico-raciais e de gnero, procuratrazer textos, vdeos e bases conceituais de leis que tm comoobjetivo contribuir para que docentes e estudantes transformema realidade de seu entorno educacional, tomando conscincia dasrelaes veladas que perpetuam a injustia, a discriminao e ospreconceitos; e conhecendo experincias humanas que ajudam asuperar as barreiras scio-econmico-culturais que limitam a vidade uma parte considervel da populao.Para tanto, ser apresentado o texto Realidades silenciadas, umasrie de vdeos sobre o papel da msica como manifestao quepreserva e valoriza a cultura africana e fundamentos conceituaise filosficos que levaram formulao das Diretrizes CurricularesNacionais para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para oEnsino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana.7kit3_modulo4.indd 73/6/07 10:22:43 AM 10. kit3_modulo4.indd 8 3/6/07 10:22:43 AM 11. Incluso SocialGnero e incluso escolarRelaes tnico-raciaise de gnerokit3_modulo4.indd 9 3/6/07 10:22:43 AM 12. kit3_modulo4.indd 10 3/6/07 10:22:43 AM 13. As autoras Montserrat Moreno, Genoveva Sastre, Aurora Leal e Dolors Busquets trazem, no texto Realidades silenciadas, uma reflexo provocativa sobre a questo do gnero, chamando-nos ateno para o fato de, ainda hoje, imperar um sistema de ensino que, apesar de defender explicitamente a igualdade, pratica, implicitamente, a discriminao contra a mulher. Mais ainda, um sistema no qual se educa para a crena na igualdade de direitos e pratica-se a discriminao. Explorando os resultados de uma pesquisa emprica, realizada com meninos e meninas entre dez e doze anos de idade, cujo objetivo foi desvelar as repercusses que, para a formao dos estudantes, tem a interiorizao da discriminao praticada no cotidiano escolar, as autoras advertem-nos para aqueles mecanismos inconscientes atravs dos quais aceitamos e naturalizamos a moral sexista, presente nas instituies escolares. E o fazem instigando os leitores e as leitoras a se desprenderem de velhas crenas e a questionarem supostas verdades que nos so, explicitas ou implicitamente, impostas. Vale a pena embarcar na reflexo proposta! MORENO, Montserrat et al. Realidades silenciadas. In: Falemos de sentimentos: a afetividade como um tema transversal. So Paulo: Moderna, 1999. p. 17-25. Realidades silenciadas Imaginamos um mundo em que nossos desejos do forma realidade e adequamos nossas condutas, esperanas e crenas a um universo social que somente existe porque o imaginamos. Nossas convices podem facilmente nos levar a confundir o que com o que deveria ser. Diferenciar um e outro, sem perder, na tentativa, as iluses de fazer real aquilo que consideramos j feito, uma tarefa ao mesmo tempo sugestiva de novas possibilidades e tambm de difcil acesso. Em qualquer um dos casos, o caminho obrigatrio para entrar no complicado mundo da transmisso ideolgica que tem lugar no decorrer do processo educativo exige cautela. Um dos campos em que se d um desajuste maior entre o que se diz para fazer e o que se faz , sem dvida alguma, o da educao. Na educao, a utopia se aproxima da realidade. O enunciado de valores, a delimitao de objetivos e a explicitao de princpios gerais 11kit3_modulo4.indd 113/6/07 10:22:44 AM 14. so freqentemente confundidos com a prtica de pedagogias inovadoras que esto de acordo com os valores, objetivos e princpios utilizados em sua representao. A certeza de haver conseguido uma igualdade de oportunidades na educao de meninas e meninos impede-nos de constatar que, hoje, todavia, impera um ensino que, de maneira sutil, conduz as meninas para aceitao de uma pretendida superioridade masculina, que, por se considerar bvia, no questionada. A escola tem estado mais interessada em difundir seus objetivos do que em analisar suas realidades. Aceita que existe uma igualdade que mais a sensao de um desejo que a concretizao da realidade. Negar a existncia daquilo de que no se gosta no o caminho mais idneo para separ-la da sala de aula, porque assim que o sistema educativo se encontra, defendendo explicitamente a igualdade e praticando implicitamente a discriminao. Apenas a vontade de que haja transformao social no engendra essa mudana. Alm do mais, para torn-la realidade, necessrio ter um conhecimento profundo das resistncias que todo sistema social oferece em contrapartida. A convivncia diria com realidades regidas por ticas antagnicas faz dos seres humanos indivduos sumamente hbeis para perceber e priorizar, em cada contexto social, o fragmento da realidade que poder melhor se adequar a seus interesses em cada momento. Aliado a esse processo de atribuio de significado positivo relacionado parcela de realidade resultante de interesse, ocorre um processo complementar que permite ignorar o que incomoda. Enfatizar o significado de determinadas pautas sociais e relegar ao inconsciente os aspectos que se preferem ignorar permite ao individuo orientar-se em uma sociedade cheia de contradies, sem ao menos tomar conscincia delas. Assim, por exemplo, no nos surpreende a afirmao de que todos somos iguais quando o nmero de mulheres que realiza um trabalho remunerado inferior ao dos homens. Parece aceitvel que se professe uma ideologia de igualdade e no se modifique o fato de que, com o mesmo nvel de estudos, o salrio das mulheres seja inferior ao dos homens. Aceita-se, com naturalidade, que ter estudos universitrios seja maior garantia contra o desemprego para os homens do que para as mulheres. As relaes entre os direitos e as obrigaes que regulam a vida privada de homens e mulheres so tambm distintas. Assim, por exemplo, admite-se ingenuamente que os homens sejam biologicamente menos capacitados que as mulheres para cuidar das relaes interpessoais; conseqentemente, a ateno para com os vnculos afetivos em que se sustentam os ncleos familiares passa a ser de responsabilidade exclusiva das mulheres. Quando se contrape a discriminao subjacente aos fatos mencionados com o princpio de igualdade que teoricamente rege o sistema educativo, chega-se concluso de que se educa para a crena na igualdade de direitos e pratica-se a discriminao. As prticas sociais que regulam as aes e as que sistematizam as crenas no somente so distintas, mas se sustentam em princpios ticos opostos. Essa divergncia dificulta enormemente a socializao de alunos e alunas. A fora do costume faz com que se aceite com naturalidade que os textos escolares situem os homens e os meninos em um status social superior ao das mulheres e das meninas; faz com que os meninos sejam representados realizando atividades socialmente valorizadas enquanto se relegam s meninas atividades consideradas de segunda ordem. Tambm a fora do costume faz com que os rapazes sejam estimulados a se identificar com modelos de comportamento agressivo que dificultam sua entrada no mundo das relaes interpessoais 12kit3_modulo4.indd 123/6/07 10:22:45 AM 15. e dos vnculos afetivos; isso acaba condenando-os a resolver os problemas por caminhos violentos. Existe, portanto, uma importante discriminao por razes de gnero. A adequao entre os livros didticos e as estruturas sociais dominantes faz com que o carter claramente discriminatrio daqueles possa passar desapercebido pela maioria dos escolares que os usam. At mesmo textos de reas curriculares aparentemente neutras, como a Matemtica e as Cincias Naturais, apresentam os conhecimentos especficos de tais matrias intimamente entrelaados a contedos masculinos que, por serem habituais, poucas vezes so questionados. Com o propsito de desvelar as repercusses que, para a formao do alunado, tem a interiorizao desse tipo de discriminao, fizemos uma pesquisa na qual pedimos a meninas e meninos entre dez e doze anos de idade que realizassem as seguintes atividades: a) Inveno e escrita de problemas de aritmtica. b) Comentrio hipottico sobre a possvel discriminao por razes de gnero de seuslivros de Matemtica. c) Recepo de informao sobre as formas que esse tipo de discriminao adota nosseus livros de Matemtica e comentrio da informao recebida. d) Anlise sistemtica desses livros e valorizao moral da discriminao detectada. e) Emisso de hipteses sobre as possveis causas de tal discriminao. f ) Comentrio hipottico sobre a neutralidade ou o sexismo de seus livros deCincias. g) Comentrio sobre os textos escritos dos problemas inventados pelos alunos e pelasalunas. Partimos do postulado de que a transmisso de mensagens sociais de significados opostos eqidade e ordem hierrquica - coloca os alunos em situaes contraditrias e que os processos de socializao relacionados com a discriminao por razes de gnero so extremamente complexos. Por isso, ento, propusemos atividades similares a partir de enfoques distintos. As mudanas de pontos de vista sobre um mesmo fenmeno deveriam nos proteger contra qualquer tipo de reducionismo. O uso de textos discriminatrios desde o incio da escolaridade traz como conseqncia uma interiorizao androcntrica da cincia. Essa primeira identificao entre o cientfico e o masculino deveria refletir-se no texto dos problemas inventados pelos alunos. Os resultados confirmaram nossa hiptese. A maioria dos meninos (74%) e das meninas (54%) escreveu problemas cujos protagonistas eram homens e meninos que desenvolviam atividades socialmente codificadas como masculinas. Nessa fase da investigao, recolhemos e guardamos os textos dos alunos, sem fazer nenhum comentrio sobre as caractersticas do material que haviam produzido. Em seguida, iniciamos a explorao das idias dos alunos sobre os livros de Matemtica. Para isso, perguntamos a eles se pensavam que em seus livros, as pessoas de sexo diferente eram tratadas de maneira diferenciada. Suas respostas foram taxativas e unnimes; na opinio deles, os livros de Matemtica no tinham nada que ver, com a hiptese que lhes havamos proposto. Uma vez que tinham expressado e definido sua crena, explicamos a eles, de maneira neutra e objetiva, que havamos analisado seus livros didticos e tnhamos constatado que 13kit3_modulo4.indd 133/6/07 10:22:45 AM 16. o nmero de referncias a homens e meninos era superior ao nmero de vezes que se referiam a mulheres e meninas. Isso, obviamente, facilita a identificao dos meninos com os livros escolares e faz com que se sintam mais inseridos nos temas tratados do que as meninas. (A redao dos textos centrada no feminino, ao contrrio, faria com que os meninos se sentissem excludos dos livros didticos.) A confiana das crianas na neutralidade dos livros resistiu a um primeiro embate e resultou imune a nossas palavras. Sua incredulidade em relao equipe de investigao tornou-se.patente de imediato. Como ousvamos dizer algo que era inaceitvel? Eles e elas sabiam que seus livros eram bons! O material de apoio que levvamos serviu para acalmar os nimos e objetivara situao. A projeo, na tela, das ilustraes e textos escritos, retirados dos exerccios, explicaes e problemas de seus livros, garantiu a certeza de nossa incrvel verdade. Depois de mostrarmos aos alunos e s alunas as projees que reproduziam fragmentos de seus livros de Matemtica, pedimos-lhes que pegassem seus livros e comprovassem a veracidade do que havamos explicado. Em seguida, solicitamos que, em pequenos grupos mistos, comentassem os resultados de suas anlises. As discusses tiveram como eixo central a defesa da eqidade. Algumas das expresses usadas pelas meninas e pelos meninos para criticar uma prtica educativa que Ihes pareceu injustificvel foram:As mulheres tm os mesmos direitos que os homens.Tem que haver as mesmas oportunidades para ambos.Homens e mulheres somos todos iguais.As meninas tm os mesmos direitos.Ambos lemos os mesmos livros.Ns meninas somos to inteligentes quanto os meninos. As meninas tambm so importantes. Embora tanto as meninas quanto os meninos condenassem inicialmente a discriminao, quando lhes pedimos para valorar os livros, a semelhana entre os sexos se rompeu quando lhes pedimos que explorassem o fato de que os livros de Matemtica pareciam mais direcionados aos meninos do que s meninas. Vejamos, em primeiro lugar, algumas das respostas tpicas entre as meninas:Porque a sociedade foi feita mais para o homem do que para a mulher e issono direito!Porque h muitos anos j se tinha mais considerao pelo homem e aindahoje se tem essa mania.Porque so completamente machistas as pessoas que escrevem e ilustram oslivros. Para as meninas, quem faz os livros so os responsveis pela discriminao. Contrariamente, quase a metade de seus companheiros (47%) expressou, sem qualquer dissimulao, sua crena na superioridade masculina. A seguir citamos algumas de suas opinies:Os homens so mais inteligentes.Os homens trabalham e tm que estudar mais.O homem aparenta mais inteligncia e interesse pelas coisas,Os meninos so superiores s meninas.Pode ser que os homens gostem mais de Matemtica. 14kit3_modulo4.indd 14 3/6/07 10:22:45 AM 17. Esse tipo de argumentao implica a interiorizao de modelos sociais sumamente estereotipados. Como explicar que um nmero nada desprezvel de meninos, ao emitir um juzo de valor sobre a discriminao detectada em seus livros, rejeite a discriminao, exibindo-a, logo em seguida, em sua forma mais pura, quando se pem a explicar as possveis razes desse fato? No nosso modo de ver, essa diferena mostra que os meninos aceitam com mais gosto a igualdade de oportunidades quando se fala do que deveria ser do que quando tratam de analisar o que . No consideram correto que os livros didticos subvalorizem as meninas, porm, ao mesmo tempo, pensam que tm boas razes para faz-lo. Opinam que os livros so sexistas porque, teoricamente falando, em que pese ser mais adequado aplicar um tratamento eqitativo a meninos e meninas, elas talvez no gostem de matemtica; ou sejam menos inteligentes, ou a matemtica no lhes seja to necessria como para os meninos. Dizem que, se essas boas razes no existissem, quem faz os livros os faria de outra forma. De novo, d a impresso de que os processos mentais e afetivos que ocorrem ao se emitir a valorao de um princpio tico so de natureza distinta dos processos que se ativam ao julgar as causas subjacentes aos fatos que transgridem os valores sociais. No primeiro caso, emite-se um juzo sobre um fato considerado em termos absolutos; no segundo, ao se tentar inferir as causas que o produzem, ocorre, mentalmente, uma associao entre o fenmeno que se valora e o contexto social em que acontece; ambos se apresentam na mente como um todo. A anlise de uma prtica social transgressora de um dos princpios ticos fundamentais desloca o raciocnio de uma perspectiva de valores universais para um enfoque situacional. O que, em termos mais gerais, valorado negativamente pode, em alguns casos, ser considerado correto. Assim, por exemplo, podem ser condenados os princpios bsicos da discriminao e, em outro momento, serem aplicados pela fora das circunstncias, sem que o indivduo esteja consciente das contradies que isso implica. A eqidade mais vulnervel nos meninos do que nas meninas. Estas, uma vez que compreenderam e aceitaram que os livros de Matemtica no so neutros, continuam defendendo seu direito de ocupar, no sistema educativo, lugar equivalente ao dos meninos. Para as alunas, os livros do mais importncia para o masculino, no porque os meninos sejam superiores a elas, mas simplesmente porque foram concebidos injustamente. Tanto uns como outros, ao iniciar essa experincia, resistem em acreditar que os livros de Matemtica sejam tal como so. Meninas e meninos passam logo a criticar abertamente o sexismo; porm, logo em seguida, ao falar dos motivos pelos quais os livros se dirigem menos s meninas que aos meninos, apiam-se na imagem de uma pretendida superioridade masculina que a sociedade lhes vai transmitindo, por caminhos to sutis e diversos, ficando na encruzilhada que vai da igualdade terica prtica. Tambm a capacidade de generalizar as explicaes dadas a propsito da Matemtica parece superior nas meninas do que nos meninos. Uma vez que tomaram conscincia de que os livros de Matemtica no so como deveriam ser, elas transferem esse comportamento para os demais textos escolares com maior facilidade que seus companheiros. Depois de renunciar, pela fora dos fatos apresentados, utopia da igualdade, elas se manifestam mais criticas perante a injustia e mais cautelosas diante da realidade. Isso nos leva uma vez mais a considerar que, para os meninos, mais difcil estruturar um sistema de pensamento coerente em relao igualdade entre as pessoas de sexo diferente. O raciocnio dos meninos recebe, em relao a esse campo, interferncias socioafetivas mais fortes.15kit3_modulo4.indd 15 3/6/07 10:22:45 AM 18. Finalmente, parece-nos bastante relevante a nfase com que todo o alunado criticou um ensino que o havia levado a reproduzir, em suas escritas pessoais, a discriminao que explicitamente havia reprovado ao analisar os livros didticos. Nessa etapa da vida, esses meninos e essas meninas no dispem dos recursos necessrios para imaginar um mundo diferente daquele que a prtica social apresenta como o nico dos mundos possveis. A pobreza de recursos imaginativos leva-os a aceitar, inconscientemente, a moral sexista que impregna seus textos escolares. [...] 16kit3_modulo4.indd 163/6/07 10:22:46 AM 19. Sugestes deestratgias de trabalho O texto que compe este item do mdulo de Incluso Social do Programa tica e Cidadania permite vrias possibilidades de desenvolvimento de projetos nas escolas, tanto no mbito do Frum Escolar de tica e de Cidadania quanto nas salas de aulas. Vejamos, a seguir, sugestes de aes e projetos que visam construo da cidadania e da igualdade de oportunidades entre os gneros. Na reunio do Frum: Qual a representao de estudantes, docentes, comunidade, no que tange discriminao de gnero? Ter respostas para essa pergunta fundamental para que se iniciem aes envolvendo escola e comunidade, na busca de uma sociedade no-sexista e que, efetivamente, oferea igualdade de oportunidades para homens e mulheres. O texto Realidades Silenciadas traz a descrio sucinta de uma pesquisa realizada pelas autoras e que teve, como principal objetivo, identificar aquelas discriminaes que parecem ter sido, muitas vezes, de forma inconsciente e/ou desapercebida, interiorizadas pelos(as) estudantes. Tal descrio pode ser o ponto de partida para a reflexo a ser promovida, no mbito do Frum, bem como para os encaminhamentos a serem feitos pelo mesmo. A sugesto apresentada que, durante a organizao do Frum, os profissionais das escolas selecionem materiais diversos, utilizados no cotidiano de suas escolas, levando-os para a referida reunio para que sejam elementos de anlises e reflexes. Constam, como tal, livros, sites, panfletos, jornais, obras de arte, etc., que circularam, por exemplo, durante o ltimo ms nas instituies escolares. Como ponto de partida, pode-se dividir os(as) participantes do Frum, em subgrupos, e solicitar-lhes que analisem o material que lhes for entregue (cada grupo deve receber um tipo de material). Um trabalhar com determinados sites, outro com livros didticos, ou jornais, ou revistas, etc.). Para facilitar a sistematizao das reflexes promovidas, pode-se apresentar duas ou trs questes aos grupos. Por exemplo: 17kit3_modulo4.indd 173/6/07 10:22:46 AM 20. 1. No material analisado por vocs, foram identificados elementos discriminatrios porrazes de gnero? Quais?2. Por que vocs acham que isso aconteceu? Apresentem algumas explicaes plausveise/ou hipteses para o fato.3. Que alteraes poderiam ser feitas no referido material para que essas discriminaesfossem superadas?De posse desses registros, cada grupo deve apresent-los aos demais participantes doFrum, num momento de socializao e debate sobre os mesmos. Os resultados podemser disponibilizados no mural da escola ou, caso os participantes prefiram, podem serencaminhadas cpias a todos os integrantes do Frum.Aps discusso relacionada aos dados mais significativos apontados pelos grupos,o Frum pode montar uma comisso permanente para analisar, esporadicamente,materiais utilizados pela instituio escolar, bem como sugerir alteraes e/ou adaptaesnesses materiais, com vista superao do sexismo na escola e na sociedade. Nas salas de aula:O ponto de partida para o desenvolvimento de um projeto quevislumbre trazer para o cenrio da educao as questes de gnero podeser a reproduo da pesquisa desenvolvida pelas autoras e descrita no texto em questo.Para tanto, os docentes devem solicitar aos(s) estudantes que, em subgrupos, realizem asseguintes atividades:- Criao e escrita de trs problemas de aritmtica.- Anlise de seus livros de Matemtica, considerando uma possvel discriminao porrazes de gnero (se a identificam ou no).- Elaborao de hipteses sobre as possveis causas das discriminaes identificadas. interessante que cada subgrupo se dedique a fazer tais atividades, centrando-se em umadisciplina especfica. Assim, enquanto um grupo se dedica Matemtica (como sugeridoacima), outro trabalha com Cincias, outro com a Histria, etc. Com isso possvelter um panorama sobre as representaes dos(as) estudantes, considerando as diferentesareas do conhecimento. 18kit3_modulo4.indd 18 3/6/07 10:22:47 AM 21. Na seqncia, os subgrupos devem apresentar suas respostas e o(a) professor(a) poder explor-las, especialmente no sentido de denunciar aquelas idias que, de alguma maneira, trazem, explicitamente ou no, condutas discriminatrias e/ou preconceituosas. Para sistematizar tais respostas, sugere-se que os prprios estudantes as quantifiquem e as analisem. A sugesto que, nesse dia, o(a) professor(a) leve, para a sala de aula, materiais sexistas, para ilustrar como, muitas vezes, condutas preconceituosas aparecem veladas e dificilmente so identificadas. Tais materiais poderiam ser apresentados depois que a pesquisa fosse concluda. Por exemplo, seria interessante explorar um livro de Cincias que traga predominantemente a figura de um cientista, enquanto a mulher aparece, predominantemente, como uma pessoa que ocupa os espaos da vida privada. Tambm podem ser exploradas reportagens de jornais, nas quais a figura masculina atrelada violncia, enquanto figura feminina so reservadas caractersticas como sensibilidade, fragilidade, etc. As anlises e reflexes realizadas a partir dos dados obtidos podem gerar trabalhos contemplando vrias reas do conhecimento. Por exemplo, para mostrar como esse quadro no exclusivo da escola e est impregnado na nossa cultura, pode ser proposta a realizao de trilhas no bairro, que ajudem a identificar, na comunidade, espaos e situaes em que as mulheres so discriminadas ou no tm seus direitos garantidos. A realizao de visitas pelos estudantes aos postos de sade, delegacias, hospitais, lojas, etc., com o intuito de entrevistar mulheres que freqentam esses espaos, bem como seus(suas) funcionrios(as), pode produzir um rico material a ser trabalhado em aulas de Geografia, Histria, Lngua Portuguesa, Biologia e Matemtica. Dessa forma, uma vez mais os estudantes podem perceber seu papel no desenvolvimento de aes futuras, com o objetivo de transformar a cultura sexista, que gera injustias e afeta a construo da democracia, em nossa sociedade. 19kit3_modulo4.indd 193/6/07 10:22:47 AM 22. kit3_modulo4.indd 20 3/6/07 10:22:47 AM 23. Incluso Social Som da rua: incluso tnico-racial e de gneroRelaes tnico-raciaise de gnerokit3_modulo4.indd 213/6/07 10:22:47 AM 24. kit3_modulo4.indd 22 3/6/07 10:22:47 AM 25. A msica, com suas diversas formas de manifestao, pode ser um excelente veculo para preservar e valorizar as relaes tnico-raciais e de gnero na sociedade brasileira e resgatar a riqueza da cultura africana. Nesse sentido, h uma srie de curta-metragens que podem ser trabalhados em sala de aula, promovendo, de forma alegre e instigante, a compreenso e a produo de manifestaes culturais que ajudam a estudar a realidade brasileira, suas razes e a constituio de nosso povo e cultura. Da srie Som da rua foram escolhidos trs vdeos relacionados ao tema deste mdulo que apresentam, tambm, a incluso social de mulheres cegas e crianas negras. Todos eles tm durao mdia de 3 minutos. O vdeo Som da rua: trs mulheres cegas, mostra as irms Regina Barbosa, Maria Barbosa e Francisca da Conceio Barbosa, cegas de nascena que passaram a infncia e a juventude cantando nas feiras do interior dos estados de Pernambuco, Cear, Rio Grande do Norte e Alagoas e Paraba. Seu repertrio inclui vrios ritmos nordestinos e canes, mas a especialidade das Ceguinhas de Campina Grande o Coco de Embolada, que elas interpretam com os tradicionais ganzs. O vdeo Som da rua: crianas da casa grande narra a histria da Casa Grande, um centro cultural que estuda a arqueologia e a mitologia do Vale do Cariri, criado por Alembergue Quindins e Roseane em Nova Olinda, no Cear, divisa com Pernambuco. O centro surgiu como um projeto de pesquisa dos sons e das lendas da Chapada do Araripe. Uma antiga casa foi restaurada e tornou-se o Memorial do Homem Cariri. As crianas foram chegando, aprendendo as msicas e as histrias e hoje so responsveis pela manuteno da casa e pela direo das suas atividades, como mostra o curta-metragem. O vdeo Som da rua: ndios mostra que em 1991 um grupo de ndios caiaps da grande aldeia Gorotire formou uma dissidncia e partiu para fundar uma nova aldeia, a Juar,23kit3_modulo4.indd 23 3/6/07 10:22:47 AM 26. nos limites da reserva. O grupo acredita que os hbitos de consumo dos brancos haviamtomado conta da tribo, e por isso devia retirar-se para mais longe com suas famlias, eento retomar seus costumes ancestrais. O vdeo registra os cantos e danas com quecelebraram a fundao da nova aldeia.Vale a pena ressaltar que no portal www.portacurtas.com.br, patrocinado pela Petrobrs,existem mais de duas dezenas de curta-metragens da srie, dirigida por Roberto Berliner,que tambm podem ser teis para os objetivos anunciados neste mdulo do Programatica e Cidadania.Tambm, o documentrio Maracatu, maracatus, dirigido por Marcelo Gomes, com aparticipao do ator Jofre Soares em seu elenco indicado. Nesse trabalho, com bastantemsica e depoimentos, so discutidas as diferenas culturais entre as vrias geraes deintegrantes do maracatu rural, um ritual afro-indgena que tem suas origens nos engenhosde acar de Pernambuco.Vale a pena conferir. Som da rua: trs mulheres cegas Gnero: Documentrio Diretor: Roberto Berliner Ano: 1997 Durao: 3 min Cor: Colorido Pas: Brasil. Ficha Tcnica Co-produo: TvZero, TVE Brasil. Edio: Piu Gomes. Direo de Arte: Raul Mouro. Som: Paulo Ricardo Nunes. Direo de Produo: Rodrigo Lamounier. Assistente de Direo: Andrea Roscoe. Produo Executiva: Renato Pereira. Direo de Fotografia: Jacques Cheuiche. Colaborador Especial: Paola Vieira, Danielle Hoover, Noaldo Ney, Lula Queiroga. Prmios recebidos Meno Especial do Jri no Mostra Internacional do Filme Etnogrfico/RJ 1998 Sol de Prata no Rio Cine 1997. 24kit3_modulo4.indd 24 3/6/07 10:22:47 AM 27. Site onde o filme pode ser encontrado http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1822 www.mec.gov.br/seb Som da rua: crianas da casa grande Gnero: Documentrio Diretor: Roberto Berliner Ano: 1997 Durao: 3 min Cor: Colorido Pas: Brasil. Ficha Tcnica Co-produo: TvZero, TVE Brasil. Edio: Piu Gomes. Direo de Arte: Raul Mouro. Som: Paulo Ricardo Nunes. Direo de Produo: Rodrigo Lamounier. Assistente de Direo: Andrea Roscoe. Produo Executiva: Renato Pereira. Direo de Fotografia: Jacques Cheuiche. Colaborador Especial: Paola Vieira, Danielle Hoover, Noaldo Ney, Lula Queiroga. Prmios recebidos Meno Especial do Jri no Mostra Internacional do Filme Etnogrfico/RJ 1998 Sol de Prata no Rio Cine 1997. Site onde o filme pode ser encontrado http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1809 www.mec.gov.br/seb Som da rua: ndios Gnero: Documentrio Diretor: Roberto Berliner Ano: 1997 Durao: 3 min Cor: Colorido Pas: Brasil. Ficha Tcnica Edio: Piu Gomes. Direo de Arte: Raul Mouro. Som: Renato Pereira. Produo Executiva: Renato Pereira. Direo de Fotografia: Paulo Violeta.25kit3_modulo4.indd 25 3/6/07 10:22:48 AM 28. Prmios recebidos Meno Especial do Jri no Mostra Internacional do Filme Etnogrfico/RJ 1998 Sol de Prata no Rio Cine 1997. Site onde o filme pode ser encontrado http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1828 Maracatu, maracatus Gnero: Documentrio, fico Diretor: Marcelo Gomes Elenco: Alton Guerra, Jofre Soares, Meia-Noite Ano: 1995 Durao: 14 min Cor: Colorido Pas: Brasil. Ficha Tcnica Produo: Claudio Assis. Fotografia: Jane Malaquias. Roteiro: Marcelo Gomes. Edio: Vnia Debs. Trilha Original: Chico Science, Antnio Carlos Nbrega. Prmios recebidos Melhor Ator no Festival de Braslia 1995 Melhor Curta em 35mm no Festival de Braslia 1995 Melhor Som Direto no Festival de Braslia 1995 Melhor Fotografia no Festival de Cuiab 1995. Site onde o filme pode ser encontrado http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=791 www.mec.gov.br/seb 26kit3_modulo4.indd 263/6/07 10:22:48 AM 29. Sugestes de estratgias de trabalho 2 Os curta-metragens sugeridos neste mdulo do Programa tica e Cidadania ajudam a compreender que o dilogo com a pluralidade de linguagens e a valorizao das diferenas culturais constituem, alm de uma oportunidade mpar de alargamento dos horizontes pessoais, um exerccio profcuo de construo da cidadania e de fortalecimento da convivncia democrtica. Antes da apresentao dos vdeos sugeridos, a fim de conceituar o que cultura, junto a alunos e alunas, o(a) professor(a) pode organizar um projeto. No primeiro momento, divide-se a turma em pequenos grupos para que faam pesquisas em livros, dicionrios, revistas, junto comunidade escolar e, se possvel, na internet. Cada pequeno grupo dever expor ao grupo-classe as informaes coletadas nas pesquisas, contrapondo os posicionamentos apresentados pelos(as) colegas e professores(as) com os dados adquiridos nas outras fontes de pesquisa. Compreendido o conceito de cultura e sua diversidade, os alunos e as alunas devero produzir, individualmente, textos que apresentem concluses pessoais, elaboradas a partir do trabalho em grupo. Para dar seqncia ao projeto, cada um dos grupos dever identificar, na comunidade onde est localizada sua escola, pessoas de diferentes regies do Brasil, ou mesmo de outras nacionalidades. Em um primeiro momento devem entrevistar essas pessoas, enfocando, principalmente, questes sobre: Sua origem, tempo e as causas da migrao. Detalhes sobre costumes, crenas e hbitos da terra de origem, diferentes da comunidade onde vivem no momento. Dificuldades de adaptao nova realidade. Os sentimentos envolvidos na mudana. Eventuais preconceitos experienciados na nova comunidade, bem como seu enfrentamento. A situao atual. 2 Esta estratgia de trabalho foi baseada em atividade publicada no livro Os direitos humanos na sala de aula (Moderna, 2001), que contou com a colaborao de Janana Speglich Amorim na sua elaborao.27kit3_modulo4.indd 27 3/6/07 10:22:48 AM 30. Esta etapa encerra-se com uma grande feira, ou exposio, na qual cada grupo deverapresentar as entrevistas e produes culturais sobre a regio estudada. Nesse sentido,dependendo da disponibilidade e da realidade de cada grupo, podem ser apresentadasmanifestaes musicais, folclricas, culinrias e outros tipos de produes artsticas quelevem a turma a conhecer e a valorizar as diferenas culturais.Para atingir os objetivos do trabalho neste mdulo de Incluso Social do Programa ticae Cidadania e reforar a questo das relaes tnico-culturais e de gnero, um destaqueespecial deve ser dado a essas temticas durante a feira ou exposio. O convite a pessoasda comunidade e especialistas que tratem do tema para falar com os estudantes e famlias;a apresentao de bandas musicais de afro-reggae, por exemplo, ou de grupos folclricosde dana e de msica que se profissionalizaram pode ser um incentivo para que o(a)sjovens entendam que a cultura pode ser geradora de profisso e de renda, alm degarantir a preservao da histria e das razes de um povo. So sugestes, que devem serenriquecidas a partir das experincias de cada escola e cada comunidade. 28kit3_modulo4.indd 28 3/6/07 10:22:48 AM 31. Incluso Social Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino de Histria eCultura Afro-Brasileira e Africana Relaestnico-raciais e de gnerokit3_modulo4.indd 29 3/6/07 10:22:49 AM 32. kit3_modulo4.indd 30 3/6/07 10:22:49 AM 33. A seguir, trazemos o parecer CNE/CP n3/2004 aprovado em 10 de Maro de 2004 e homologado em 19 de Maio de 2004 , que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Tal parecer possui orientaes importantes no que tange ao respeito s relaes tnico-raciais, ao reconhecimento e valorizao da histria e cultura dos afro-brasileiros, diversidade da nao brasileira e ao igual direito a uma educao de qualidade para os afro-descendentes. Acreditamos que sua divulgao, anlise e debate no interior das instituies escolares um caminho profcuo para a promoo da cidadania e do apoio s populaes negras que vivem em situaes de vulnerabilidade social, com vistas construo de uma sociedade mais justa e democrtica. BRASIL. Conselho Nacional de Educao. Do parecer que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Parecer CNE/CP n 3/2004, aprovado em 10 de maro de 2004. Relatora: Petronilha Beatriz Gonalves e Silva. Disponvel em I RELATRIO Questes introdutrias O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na rea da educao, demanda da populao afrodescendente, no sentido de polticas de aes afirmativas, isto , de polticas de reparaes, e de reconhecimento e valorizao de sua histria, cultura, identidade. Trata, ele, de poltica curricular, fundada em dimenses histricas, sociais, antropolgicas oriundas da realidade brasileira, e busca combater o racismo e discriminaes que atingem particularmente os negros. Nesta perspectiva, prope a divulgao e produo de conhecimentos, a formao de atitudes, posturas e valores que eduquem cidados orgulhosos de seu pertencimento tnico-racial descendentes de africanos, povos indgenas, descendentes de europeus, de asiticos para interagirem na construo de uma nao democrtica, em que todos igualmente tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada. importante salientar que tais polticas tm como meta o direito dos negros se reconhecerem na cultura nacional, expressarem vises de mundo prprias, manifestarem com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos. necessrio sublinhar que tais polticas tm tambm como meta o direito de os negros, assim como de todos cidados brasileiros, cursarem cada um dos nveis de ensino, em escolas devidamente instaladas31kit3_modulo4.indd 31 3/6/07 10:22:49 AM 34. e equipadas, orientados por professores qualificados para o ensino das diferentes reas deconhecimentos; com formao para lidar com as tensas relaes produzidas pelo racismoe discriminaes, sensveis e capazes de conduzir a reeducao das relaes entre diferentesgrupos tnico-raciais, ou seja, entre descendentes de africanos, de europeus, de asiticos,e povos indgenas. Essas condies materiais das escolas e de formao de professores soindispensveis para uma educao de qualidade, para todos, assim como o o reconhecimentoe valorizao da histria, cultura e identidade dos descendentes de africanos.Polticas de Reparaes, de Reconhecimento e Valorizao, de AesAfirmativasA demanda por reparaes visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas para ressarciros descendentes de africanos negros dos danos psicolgicos, materiais, sociais, polticose educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das polticasexplcitas ou tcitas de branqueamento da populao, de manuteno de privilgiosexclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulao de polticas, nops-abolio. Visa tambm a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combateao racismo e a toda sorte de discriminaes.Cabe ao Estado promover e incentivar polticas de reparaes, no que cumpre aodisposto na Constituio Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de garantirindistintamente, por meio da educao, iguais direitos para o pleno desenvolvimentode todos e de cada um, enquanto pessoa, cidado ou profissional. Sem a interveno doEstado, os postos margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente, e as estatsticas omostram sem deixar dvidas, rompero o sistema meritocrtico que agrava desigualdadese gera injustia, ao reger-se por critrios de excluso, fundados em preconceitos emanuteno de privilgios para os sempre privilegiados.Polticas de reparaes voltadas para a educao dos negros devem oferecer garantias, aessa populao, de ingresso, permanncia e sucesso na educao escolar, de valorizaodo patrimnio histrico-cultural afro-brasileiro, de aquisio das competncias e dosconhecimentos tidos como indispensveis para continuidade nos estudos, de condiespara alcanar todos os requisitos tendo em vista a concluso de cada um dos nveisde ensino, bem como para atuar como cidados responsveis e participantes, alm dedesempenharem com qualificao uma profisso.A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorizao e afirmaode direitos, no que diz respeito educao, passou a ser particularmente apoiada coma promulgao da Lei 10639/2003, que alterou a Lei 9394/1996, estabelecendo aobrigatoriedade do ensino de histria e cultura afro-brasileira e africana.Reconhecimento implica justia e iguais direitos sociais, civis, culturais e econmicos,bem como valorizao da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros gruposque compem a populao brasileira. E isso requer mudana nos discursos, raciocnios,lgicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer tambm que seconhea a sua histria e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se especificamentedesconstruir o mito da democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde acrena de que, se os negros no atingem os mesmos patamares que os no negros, porfalta de competncia ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que aestrutura social hierrquica cria com prejuzos para os negros. 32kit304_inclusao.indd 32 29.06.07 11:25:21 35. Reconhecimento requer a adoo de polticas educacionais e de estratgias pedaggicas de valorizao da diversidade, a fim de superar a desigualdade tnico-racial presente na educao escolar brasileira, nos diferentes nveis de ensino. Reconhecer exige que se questionem relaes tnico-raciais baseadas em preconceitos que desqualificam os negros e salientam esteretipos depreciativos, palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos de superioridade em relao aos negros, prprios de uma sociedade hierrquica e desigual. Reconhecer tambm valorizar, divulgar e respeitar os processos histricos de resistncia negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por seus descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais at as coletivas. Reconhecer exige a valorizao e respeito s pessoas negras, a sua descendncia africana, sua cultura e histria. Significa buscar compreender seus valores e lutas, ser sensvel ao sofrimento causado por tantas formas de desqualificao: apelidos depreciativos, brincadeiras, piadas de mau gosto sugerindo incapacidade, ridicularizando seus traos fsicos, a textura de seus cabelos, fazendo pouco das religies de raiz africana. Implica criar condies para que os estudantes negros no sejam rejeitados em virtude da cor da sua pele, menosprezados em virtude de antepassados seus terem sido explorados como escravos, no sejam desencorajados de prosseguir estudos, de estudar questes que dizem respeito comunidade negra. Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, freqentados em sua maioria por populao negra, contem com instalaes e equipamentos slidos, atualizados, com professores competentes no domnio dos contedos de ensino, comprometidos com a educao de negros e brancos, no sentido de que venham a relacionar-se com respeito, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes e palavras que impliquem desrespeito e discriminao. Polticas de reparaes e de reconhecimento formaro programas de aes afirmativas, isto , conjuntos de aes polticas dirigidas correo de desigualdades raciais e sociais, orientadas para oferta de tratamento diferenciado com vista a corrigir desvantagens e marginalizao criadas e mantidas por estrutura social excludente e discriminatria. Aes afirmativas atendem ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos1, bem como a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, com o objetivo de combate ao racismo e a discriminaes, tais como: a Conveno da UNESCO de 1960, direcionada ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como a Conferncia Mundial de Combate ao Racismo, Discriminao Racial, Xenofobia e Discriminaes Correlatas de 2001. Assim sendo, sistemas de ensino e estabelecimentos de diferentes nveis convertero as demandas dos afro-brasileiros em polticas pblicas de Estado ou institucionais, ao tomarem decises e iniciativas com vista a reparaes, reconhecimento e valorizao da histria e cultura dos afro-brasileiros, constituio de programas de aes afirmativas, medidas estas coerentes com um projeto de escola, de educao, de formao de cidados que explicitamente se esbocem nas relaes pedaggicas cotidianas. Medidas que, convm, sejam compartilhadas pelos sistemas de ensino, estabelecimentos, processos de formao de professores, comunidade, professores, alunos e seus pais. Medidas que repudiam, como prev a Constituio Federal em seu Art.3, IV, o preconceito de origem, raa, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao e reconhecem 33kit3_modulo4.indd 333/6/07 10:22:50 AM 36. que todos so portadores de singularidade irredutvel e que a formao escolar tem de estar atenta para o desenvolvimento de suas personalidades (Art.208, IV). Educao das relaes tnico-raciais O sucesso das polticas pblicas de Estado, institucionais e pedaggicas visando a reparaes, reconhecimento e valorizao da identidade, da cultura e da histria dos negros brasileiros depende necessariamente de condies fsicas, materiais, intelectuais, afetivas favorveis para o ensino e para aprendizagens; em outras palavras, todos os alunos negros e no negros, bem como seus professores precisam sentir-se valorizados e apoiados. Depende tambm, de maneira decisiva, da reeducao das relaes entre negros e brancos, o que aqui estamos designando como relaes tnico-raciais. Depende, ainda, de trabalho conjunto, de articulao entre processos educativos escolares, polticas pblicas, movimentos sociais, visto que as mudanas ticas, culturais, pedaggicas e polticas nas relaes tnico-raciais no se limitam escola. importante destacar que se entende por raa a construo social forjada nas tensas relaes entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biolgico de raa cunhado no sculo XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raa utilizado com freqncia nas relaes sociais brasileiras, para informar como determinadas caractersticas fsicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre outras, influenciam, interferem e at mesmo determinam o destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira. Contudo, o termo foi ressignificado pelo Movimento Negro que, em vrias situaes, o utiliza com um sentido poltico e de valorizao do legado deixado pelos africanos. importante tambm explicar que o emprego do termo tnico, na expresso tnico-racial, serve para marcar que essas relaes tensas devidas a diferenas na cor da pele e traos fisionmicos o so tambm devido raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que difere em viso de mundo, valores e princpios das de origem indgena, europia e asitica. Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padro esttico negro e africano e um padro esttico e cultural branco europeu. Porm, a presena da cultura negra e o fato de 45% da populao brasileira ser composta de negros (de acordo com o censo do IBGE) no tm sido suficientes para eliminar ideologias, desigualdades e esteretipos racistas. Ainda persiste em nosso pas um imaginrio tnico-racial que privilegia a brancura e valoriza principalmente as razes europias da sua cultura, ignorando ou pouco valorizando as outras, que so a indgena, a africana, a asitica. Os diferentes grupos, em sua diversidade, que constituem o Movimento Negro brasileiro, tm comprovado o quanto dura a experincia dos negros de ter julgados negativamente seu comportamento, idias e intenes antes mesmo de abrirem a boca ou tomarem qualquer iniciativa. Tm, eles, insistido no quanto alienante a experincia de fingir ser o que no para ser reconhecido, de quo dolorosa pode ser a experincia de deixar-se assimilar por uma viso de mundo, que pretende impor-se como superior e por isso universal e que obriga a negarem a da tradio do seu povo. Se no fcil ser descendente de seres humanos escravizados e forados condio de objetos utilitrios ou a semoventes, tambm difcil descobrir-se descendente dos escravizadores, temer, embora veladamente, revanche dos que, por cinco sculos, tm sido desprezados e massacrados. 34kit3_modulo4.indd 34 3/6/07 10:22:50 AM 37. Para reeducar as relaes tnico-raciais no Brasil necessrio fazer emergir as dores e medos que tm sido gerados. preciso entender que o sucesso de uns tem o preo da marginalizao e da desigualdade impostas a outros. E ento decidir que sociedade queremos construir daqui para frente. Como bem salientou Frantz Fanon2, os descendentes dos mercadores de escravos, dos senhores de ontem, no tm, hoje, de assumir culpa pelas desumanidades provocadas por seus antepassados. No entanto, tm eles a responsabilidade moral e poltica de combater o racismo, as discriminaes e juntamente com os que vm sendo mantidos margem, os negros, construir relaes raciais e sociais sadias, em que todos cresam e se realizem enquanto seres humanos e cidados. No fossem por essas razes, eles as teriam de assumir, pelo fato de usufrurem do muito que o trabalho escravo possibilitou ao pas. Assim sendo, a educao das relaes tnico-raciais impe aprendizagens entre brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianas, projeto conjunto para construo de uma sociedade, justa, igual, equnime. Combater o racismo, trabalhar pelo fim da desigualdade social e racial, empreender reeducao das relaes tnico-raciais no so tarefas exclusivas da escola. As formas de discriminao de qualquer natureza no tm o seu nascedouro na escola, porm o racismo, as desigualdades e discriminaes correntes na sociedade perpassam por ali. Para que as instituies de ensino desempenhem a contento o papel de educar, necessrio que se constituam em espao democrtico de produo e divulgao de conhecimentos e de posturas que visam a uma sociedade justa. A escola tem papel preponderante para eliminao das discriminaes e para emancipao dos grupos discriminados, ao proporcionar acesso aos conhecimentos cientficos, a registros culturais diferenciados, conquista de racionalidade que rege as relaes sociais e raciais, a conhecimentos avanados, indispensveis para consolidao e concerto das naes como espaos democrticos e igualitrios. Para obter xito, a escola e seus professores no podem improvisar. Tm de desfazer a mentalidade racista e discriminadora secular, superando o etnocentrismo europeu, reestruturando relaes tnico-raciais e sociais, desalienando processos pedaggicos. Isso no pode ficar reduzido a palavras e a raciocnios desvinculados da experincia de ser inferiorizados vivida pelos negros, tampouco das baixas classificaes que lhe so atribudas nas escalas de desigualdades sociais, econmicas, educativas e polticas. Dilogo com estudos que analisam essas realidades e fazem propostas, bem como grupos do Movimento Negro, presentes nas diferentes regies e estados, assim como inmeras cidades, so imprescindveis para que se venam discrepncias entre o que se sabe e a realidade, se compreendam concepes e aes, uns dos outros, se elabore projeto comum de combate ao racismo e a discriminaes. Temos, pois, pedagogias de combate ao racismo e a discriminaes por criar. claro que h experincias de professores e de algumas escolas, ainda isoladas, que muito vo ajudar. Para empreender a construo dessas pedagogias, fundamental que se desfaam alguns equvocos. Um deles diz respeito preocupao de professores no sentido de designar ou no seus alunos negros como negros ou como pretos, sem ofensas. Em primeiro lugar, importante esclarecer que ser negro no Brasil no se limita s caractersticas fsicas. Trata-se, tambm, de uma escolha poltica. Por isso, o quem assim se 35kit3_modulo4.indd 353/6/07 10:22:51 AM 38. define. Em segundo lugar, cabe lembrar que preto um dos quesitos utilizados pelo IBGE para classificar, ao lado dos outros branco, pardo, indgena - a cor da populao brasileira. Pesquisadores de diferentes reas, inclusive da educao, para fins de seus estudos, agregam dados relativos a pretos e pardos sob a categoria negros, j que ambos renem, conforme alerta o Movimento Negro, aqueles que reconhecem sua ascendncia africana. importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de construo da identidade negra em nosso pas. Processo esse, marcado por uma sociedade que, para discriminar os negros, utiliza-se tanto da desvalorizao da cultura de matriz africana como dos aspectos fsicos herdados pelos descendentes de africanos. Nesse processo complexo, possvel, no Brasil, que algumas pessoas de tez clara e traos fsicos europeus, em virtude de o pai ou a me ser negro(a), se designarem negros; que outros, com traos fsicos africanos, se digam brancos. preciso lembrar que o termo negro comeou a ser usado pelos senhores para designar pejorativamente os escravizados e esse sentido negativo da palavra se estende at hoje. Contudo, o Movimento Negro ressignificou esse termo dando-lhe um sentido poltico e positivo. Lembremos os motes muito utilizados no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980, 1990: Negro lindo! Negra, cor da raa brasileira! Negro que te quero negro! 100% Negro! No deixe sua cor passar em branco! Este ltimo utilizado na campanha do censo de 1990. Outro equvoco a enfrentar a afirmao de que os negros se discriminam entre si e que so racistas tambm. Essa constatao tem de ser analisada no quadro da ideologia do branqueamento que divulga a idia e o sentimento de que as pessoas brancas seriam mais humanas, teriam inteligncia superior e por isso teriam o direito de comandar e de dizer o que bom para todos. Cabe lembrar que no ps-abolio foram formuladas polticas que visavam ao branqueamento da populao, pela eliminao simblica e material da presena dos negros. Nesse sentido, possvel que pessoas negras sejam influenciadas pela ideologia do branqueamento e, assim, tendam a reproduzir o preconceito do qual so vtimas. O racismo imprime marcas negativas na subjetividade dos negros e tambm na dos que os discriminam. Mais um equvoco a superar a crena de que a discusso sobre a questo racial se limita ao Movimento Negro e a estudiosos do tema e no escola. A escola enquanto instituio social responsvel por assegurar o direito da educao a todo e qualquer cidado, dever se posicionar politicamente, como j vimos, contra toda e qualquer forma de discriminao. A luta pela superao do racismo e da discriminao racial , pois, tarefa de todo e qualquer educador, independentemente do seu pertencimento tnico-racial, crena religiosa ou posio poltica. O racismo, segundo o Artigo 5 da Constituio Brasileira, crime inafianvel e isso se aplica a todos os cidados e instituies, inclusive, a escola. Outro equvoco a esclarecer o de que o racismo, o mito da democracia racial e a ideologia do branqueamento s atingem os negros. Enquanto processos estruturantes e constituintes da formao histrica e social brasileira, estes esto arraigados no imaginrio social e atingem negros, brancos e outros grupos tnicoraciais. As formas, os nveis e os resultados desses processos incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e interpem diferentes dificuldades nas suas trajetrias de vida, escolares e sociais. Por isso, a construo de estratgias educacionais que visem ao combate ao racismo uma tarefa de todos os educadores, independentemente do seu pertencimento tnico-racial. Pedagogias de combate ao racismo e a discriminaes elaboradas com o objetivo de educao das relaes tnico/raciais positivas tm como objetivo fortalecer entre os 36kit3_modulo4.indd 36 3/6/07 10:22:52 AM 39. negros e despertar entre os brancos a conscincia negra. Entre os negros podero oferecer conhecimentos e segurana para orgulharem-se da sua origem africana; para os brancos podero permitir que identifiquem as influncias, a contribuio, a participao e a importncia da histria e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver, de se relacionar com as outras pessoas, notadamente as negras. Tambm faro parte de um processo de reconhecimento, por parte do Estado, da sociedade e da escola, da dvida social que tm em relao ao segmento negro da populao, possibilitando uma tomada de posio explcita contra o racismo e a discriminao racial e a construo de aes afirmativas nos diferentes nveis de ensino da educao brasileira. Tais pedagogias precisam estar atentas para que todos, negros e no negros, alm de ter acesso a conhecimentos bsicos tidos como fundamentais para a vida integrada sociedade, exerccio profissional competente, recebam formao que os capacite para forjar novas relaes tnico-raciais. Para tanto, h necessidade, como j vimos, de professores qualificados para o ensino das diferente reas de conhecimentos e alm disso sensveis e capazes de direcionar positivamente as relaes entre pessoas de diferentes pertencimentos tnico-raciais, no sentido do respeito e da correo de posturas, atitudes, palavras preconceituosas. Da a necessidade de se insistir e investir para que os professores, alm de slida formao na rea especfica de atuao, recebam formao que os capacite no s a compreender a importncia das questes relacionadas diversidade tnico-racial, mas a lidar positivamente com elas e sobretudo criar estratgias pedaggicas que possam auxiliar a reeduc-las. At aqui apresentaram-se orientaes que justificam e fundamentam as determinaes de carter normativo que seguem. Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana Determinaes A obrigatoriedade de incluso de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currculos da Educao Bsico trata-se de deciso poltica, com fortes repercusses pedaggicas, inclusive na formao de professores. Com esta medida, reconhece-se que, alm de garantir vagas para negros nos bancos escolares, preciso valorizar devidamente a histria e cultura de seu povo, buscando reparar danos, que se repetem h cinco sculos, a sua identidade e a direitos seus. A relevncia do estudo de temas decorrentes da histria e cultura afro-brasileira e africana no se restringem populao negra, ao contrrio dizem respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto cidados atuantes no seio de uma sociedade multicultural e pluritnica, capazes de construir uma nao democrtica. importante destacar que no se trata de mudar um foco etnocntrico marcadamente de raiz europia por um africano, mas de ampliar o foco dos currculos escolares para a diversidade cultural, racial, social e econmica brasileira. Nessa perspectiva, cabe s escolas incluir no contexto dos estudos e atividades que proporciona diariamente tambm as contribuies histrico-culturais dos povos indgenas e dos descendentes de asiticos, alm das de raiz africana e europia. preciso ter clareza que o Art. 26A, acrescido Lei 9394/1996, provoca bem mais do que incluso de novos contedos, exige que se repensem relaes tnico-raciais, sociais, pedaggicas, procedimentos de ensino, condies oferecidas para aprendizagem, objetivos tcitos e explcitos da educao oferecida pelas escolas. A autonomia dos estabelecimentos de ensino para compor os projetos pedaggicos, no cumprimento do exigido pelo Art. 26A da Lei 9394/1996, permite que se valham37kit3_modulo4.indd 37 3/6/07 10:22:52 AM 40. da colaborao das comunidades a que a escola serve, do apoio direto ou indireto de estudiosos e do Movimento Negro, com os quais estabelecero canais de comunicao, encontraro formas prprias de incluir nas vivncias promovidas pela escola, inclusive em contedos de disciplinas, as temticas em questo. Caber aos sistemas de ensino, s mantenedoras, coordenao pedaggica dos estabelecimentos de ensino e aos professores com base neste parecer, estabelecer contedos de ensino, unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes curriculares. Caber, aos administradores dos sistemas de ensino e das mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material bibliogrfico e de outros materiais didticos, alm de acompanhar os trabalhos desenvolvidos, a fim de evitar que questes to complexas, muito pouco tratadas, tanto na formao inicial como continuada de professores, sejam abordadas de maneira resumida, incompleta, com erros. Em outras palavras, aos estabelecimentos de ensino est sendo atribuda responsabilidade de acabar com o modo falso e reduzido de tratar a contribuio dos africanos escravizados e de seus descendentes para a construo da nao brasileira; de fiscalizar para que, no seu interior,os alunos negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que so vtimas. Sem dvidas, assumir essas responsabilidades implica compromisso com o entorno sociocultural da escola, da comunidade onde essa se encontra e a que serve, compromisso com a formao de cidados atuantes e democrticos, capazes de compreender as relaes sociais e tnico-raciais de que participam e ajudam a manter e/ou a reelaborar, capazes de decodificar palavras, fatos, situaes a partir de diferentes perspectivas, de desempenhar-se em reas de competncias que lhes permitam continuar e aprofundar estudos em diferentes nveis de formao. Precisa o Brasil, pas multi-tnico e pluricultural, de organizaes escolares em que todos se vejam includos, em que lhes seja garantido o direito de aprender e de ampliar conhecimentos, sem ser obrigados a negar a si mesmos, ao grupo tnico/racial a que pertencem, a adotar costumes, idias, comportamentos que lhes so adversos. E esses certamente sero indicadores da qualidade da educao que estar sendo oferecida pelos estabelecimentos de ensino de diferentes nveis. Para conduzir suas aes, os sistemas de ensino, os estabelecimentos, os professores tero como referncia, entre outros pertinentes s bases filosficas e pedaggicas que assumem, os princpios a seguir explicitados. CONSCINCIA POLTICA E HISTRICA DA DIVERSIDADE Este princpio deve conduzir: - igualdade bsica de pessoa humana como sujeito de direitos; - compreenso de que a sociedade formada por pessoas que pertencem a grupos tnico-raciais distintos, que possuem cultura e histria prprias, igualmente valiosas e que em conjunto constroem, na nao brasileira, sua histria; - ao conhecimento e valorizao da histria dos povos africanos e da cultura afro- brasileira na construo histrica e cultural brasileira; - superao da indiferena, injustia e desqualificao com que os negros, os povos indgenas e tambm as classes populares s quais os negros, no geral, pertencem, so comumente tratados; 38kit3_modulo4.indd 383/6/07 10:22:53 AM 41. - desconstruo, por meio de questionamentos e anlises crticas, objetivando eliminar conceitos, idias, comportamentos veiculados pela ideologia do branqueamento, pelo mito da democracia racial, que tanto mal fazem a negros e brancos; - busca, da parte de pessoas, em particular de professores no familiarizados com a anlise das relaes tnico-raciais e sociais com o estudo de histria e cultura afro- brasileira e africana, de informaes e subsdios que lhes permitam formular concepes no baseadas em preconceitos e construir aes respeitosas; - ao dilogo, via fundamental para entendimento entre diferentes, com a finalidade de negociaes, tendo em vista objetivos comuns; visando a uma sociedade justa. FORTALECIMENTO DE IDENTIDADES E DE DIREITOS O princpio deve orientar para: - o desencadeamento de processo de afirmao de identidades, de historicidade negada ou distorcida; - o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de comunicao, contra os negros e os povos indgenas; - o esclarecimentos a respeito de equvocos quanto a uma identidade humana universal; - o combate privao e violao de direitos; - a ampliao do acesso a informaes sobre a diversidade da nao brasileira e sobre a recriao das identidades, provocada por relaes tnico-raciais; - as excelentes condies de formao e de instruo que precisam ser oferecidas, nos diferentes nveis e modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive os localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas rurais. Aes educativas de combate ao racismo e a discriminaes O princpio encaminha para: - a conexo dos objetivos, estratgias de ensino e atividades com a experincia de vida dos alunos e professores, valorizando aprendizagens vinculadas s suas relaes com pessoas negras, brancas, mestias, assim como as vinculadas s relaes entre negros, indgenas e brancos no conjunto da sociedade; - a crtica pelos coordenadores pedaggicos, orientadores educacionais, professores, das representaes dos negros e de outras minorias nos textos, materiais didticos, bem como providncias para corrigi-las; - condies para professores, alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo responsabilidade por relaes tnico-raciais positivas, enfrentando e superando discordncias, conflitos, contestaes, valorizando os contrastes das diferenas; - valorizao da oralidade, da corporeidade e da arte por exemplo como a dana, marcas da cultura de raiz africana, ao lado da escrita e da leitura; 39kit3_modulo4.indd 393/6/07 10:22:53 AM 42. - educao patrimonial, aprendizado a partir do patrimnio cultural afro-brasileiro, visando a preserv-lo e difundi-lo; - o cuidado para que se d um sentido construtivo participao dos diferentes grupos sociais, tnico-raciais na construo da nao brasileira, aos elos culturais e histricos entre diferentes grupos tnico-raciais, s alianas sociais; - participao de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem como da comunidade em que se insere a escola, sob a coordenao dos professores, na elaborao de projetos poltico-pedaggicos que contemplem a diversidade tnico-racial. Esses princpios e seus desdobramentos mostram exigncias de mudana de mentalidade, de maneiras de pensar e agir dos indivduos em particular, assim como das instituies e de suas tradies culturais. nesse sentido que se fazem as seguintes determinaes: - O ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando-se distores, envolver articulao entre passado, presente e futuro no mbito de experincias, construes e pensamentos produzidos em diferentes circunstncias e realidades do povo negro. meio privilegiado para a educao das relaes tnico-raciais e tm por objetivos o reconhecimento e valorizao da identidade, histria e cultura dos afro-brasileiros, garantia de seus direitos de cidados, reconhecimento e igual valorizao das razes africanas da nao brasileira, ao lado das indgenas, europias, asiticas. - O ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana se faro por diferentes meios, em atividades curriculares ou no, em que: - se explicite, busque compreender e interpretar, na perspectiva de quem o formule, diferentes formas de expresso e de organizao de raciocnios e pensamentos de raiz da cultura africana; - promovam-se oportunidades de dilogo em que se conheam, se ponham em comunicao diferentes sistemas simblicos e estruturas conceituais, bem como se busquem formas de convivncia respeitosa, alm da construo de projeto de sociedade em que todos se sintam encorajados a expor, defender sua especificidade tnico-racial e a buscar garantias para que todos o faam; - sejam incentivadas atividades em que pessoas estudantes, professores, servidores, integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de ensino de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente, respeitando os valores, vises de mundo, raciocnios e pensamentos de cada um. - O ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a educao das relaes tnico-raciais, tal como explicita o presente parecer, se desenvolvero no cotidiano das escolas, nos diferentes nveis e modalidades de ensino, como contedo de disciplinas3 particularmente Educao Artstica, Literatura e Histria do Brasil, sem prejuzo das demais4, em atividades curriculares ou no, trabalhos em salas de aula, nos laboratrios de cincias e de informtica, na utilizao de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, reas de recreao, quadra de esportes e outros ambientes escolares. - O ensino de Histria Afro-Brasileira abranger, entre outros contedos, iniciativas e organizaes negras, incluindo a histria de quilombos, a comear pelo de Palmares, e de remanescentes de quilombos, que tm contribudo para o desenvolvimento de comunidades, bairros, localidades, municpios, regies (Exemplos: associaes negras recreativas, culturais, educativas, artsticas, de assistncia, de pesquisa, irmandades religiosas, grupos do Movimento Negro). Ser dado destaque a acontecimentos, realizaes prprios de cada regio, localidade. 40kit3_modulo4.indd 403/6/07 10:22:53 AM 43. - Datas significativas para cada regio e localidade sero devidamente assinaladas. O 13 de maio, Dia Nacional de Luta contra o Racismo, ser tratado como o dia de denncia das repercusses das polticas de eliminao fsica e simblica da populao afro-brasileira no ps-abolio, e de divulgao dos significados da Lei urea para os negros. No 20 de novembro ser celebrado o Dia Nacional da Conscincia Negra, entendendo-se conscincia negra nos termos explicitados anteriormente neste parecer. Entre outras datas de significado histrico e poltico dever ser assinalado o 21 de maro, dia Internacional de Luta pela Eliminao da Discriminao Racial. - Em Histria da frica, tratada em perspectiva positiva, no s de denncia da misria e d iscrim in aes q u e atin gem o con tin en te, n os tp icos p ertin en tes se far articuladamente com a histria dos afrodescendentes no Brasil e sero abordados temas relativos: - ao papel dos ancios e dos griots como guardios da memria histrica; - histria da ancestralidade e religiosidade africana; - aos nbios e aos egpcios, como civilizaes que contriburam decisivamente para o desenvolvimento da humanidade; - s civilizaes e organizaes polticas pr-coloniais, como os reinos do Mali, do Congo e do Zimbabwe; - ao trfico e escravido do ponto de vista dos escravizados; - ao papel dos europeus, dos asiticos e tambm de africanos no trfico;- ocupao colonial na perspectiva dos africanos; - s lutas pela independncia poltica dos pases africanos; - s aes em prol da unio africana em nossos dias, bem como o papel da Unio Africana, para tanto; - s relaes entre as culturas e as histrias dos povos do continente africano e os da dispora; - formao compulsria da dispora, vida e existncia cultural e histrica dos africanos e seus descendentes fora da frica; - diversidade da dispora, hoje, nas Amricas, Caribe, Europa, sia; - aos acordos polticos, econmicos, educacionais e culturais entre frica, Brasil e outros pases do dispora. - O ensino de Cultura Afro-Brasileira destacar o jeito prprio de ser, viver e pensar manifestado tanto no dia a dia, quanto em celebraes como congadas, moambiques, ensaios, maracatus, rodas de samba, entre outras - O ensino de Cultura Africana abranger: - as contribuies do Egito para a cincia e filosofia ocidentais; - as universidades africanas Tambkotu, Gao, Djene que floresciam no sculo XVI; - as tecnologias de agricultura, de beneficiamento de cultivos, de minerao e de edificaes trazidas pelos escravizados, bem como a produo cientfica, artstica (artes plsticas, literatura, msica, dana, teatro) poltica, na atualidade - O ensino de Histria e de Cultura Afro-Brasileira, far-se- por diferentes meios, inclusive a realizao de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano letivo, com vista divulgao e estudo da participao dos africanos e de seus descendentes em episdios da histria do Brasil, na construo econmica, social e cultural da nao, destacando- se a atuao de negros em diferentes reas do conhecimento, de atuao profissional, de criao tecnolgica e artstica, de luta social (tais como: Zumbi, Luiza Nahim, Aleijadinho, Padre Maurcio, Luiz Gama, Cruz e Souza, Joo Cndido, Andr Rebouas, Teodoro Sampaio, Jos Correia Leite, Solano Trindade, Antonieta de Barros, Edison Carneiro, Llia Gonzles, Beatriz Nascimento, Milton Santos, Guerreiro Ramos, Clvis Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes Cunha, Tereza Santos, Emmanuel Arajo, Cuti, Alzira Rufino, Inaicyra Falco dos Santos, entre outros). - O ensino de Histria e Cultura Africana se far por diferentes meios, inclusive a realizao de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano letivo, com vista 41kit3_modulo4.indd 413/6/07 10:22:53 AM 44. divulgao e estudo da participao dos africanos e de seus descendentes na dispora, em episdios da histria mundial, na construo econmica, social e cultural das naes do continente africano e da dispora, destacando-se a atuao de negros em diferentes reas do conhecimento, de atuao profissional, de criao tecnolgica e artstica, de luta social (entre outros: rainha Nzinga, Toussaint-Louverture, Martin Luther King, Malcon X, Marcus Garvey, Aim Cesaire, Lopold Senghor, Mariama B, Amlcar Cabral, Cheik Anta Diop, Steve Biko, Nelson Mandela, Aminata Traor, Christiane Taubira). Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de educao bsica, nos nveis de educao infantil, ensino fundamental, ensino mdio, educao de jovens e adultos, educao superior, precisaro providenciar: - Registro da histria no contada dos negros brasileiros, tais como em remanescentes de quilombos, comunidades e territrios negros urbanos e rurais. - Apoio sistemtico aos professores, para elaborao de planos, projetos, seleo de contedos e mtodos de ensino, cujo foco seja Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana e a Educao das Relaes nico-Raciais. - Mapeamento e divulgao de experincias pedaggicas de escolas, estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educao, assim como levantamento das principais dvidas e dificuldades dos professores em relao ao trabalho com a questo racial na escola, e encaminhamento de medidas para resolv-las, feitos pela administrao dos sistemas de ensino e por Ncleo de Estudos Afro-Brasileiros. - Articulao entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino superior, centros de pesquisa, Ncleos de Estudos Afro-Brasileiros, escolas, comunidade e movimentos sociais, visando a formao de professores para a diversidade tnico/racial. - Instalao, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para discutir e coordenar planejamento e execuo da formao de professores para atender ao disposto neste parecer quanto Educao das Relaes tnico-Raciais e ao determinado nos Art. 26 e 26A da Lei 9394/1996, com o apoio do Sistema Nacional de Formao Continuada e Certificao de Professores do MEC. - Introduo, nos cursos de formao de professores e de outros profissionais da educao, de anlises das relaes sociais e raciais, no Brasil; de conceitos e de suas bases tericas, tais como racismo, discriminaes, intolerncia, preconceito, esteretipo, raa, etnia, cultura, classe social, diversidade, diferena, multiculturalismo; de prticas pedaggicas, de materiais e de textos didticos, na perspectiva da reeducao das relaes tnico-raciais e do ensino e aprendizagem da Histria e cultura dos Afro-brasileiros e dos Africanos. - Incluso de discusso da questo racial como parte integrante da matriz curricular, tanto dos cursos de licenciatura para educao infantil, os anos iniciais e finais do ensino fundamental, ensino mdio, educao de jovens e adultos, como de processos de formao continuada de professores, inclusive de docentes no ensino superior. - Incluso, respeitada a autonomia dos estabelecimentos do ensino superior, nos contedos de disciplinas e em atividades curriculares dos cursos que ministra, de Educao das Relaes tnico-Raciais, de conhecimentos de matriz africana e/ou que dizem respeito a populao 42kit3_modulo4.indd 42 3/6/07 10:22:53 AM 45. negra Por exemplo: - em Medicina , entre outras questes estudo da anemia falciforme, da problemtica da presso alta; - em Matemtica, contribuies de raiz africana, identificadas e descritas pela Etno-Matematica; em Filosofia, estudo da filosofia tradicional africana e de contribuies de filsofos africanos e afrodescendentes da atualidade. - Incluso de bibliografia relativa histria e cultura afro-brasileira e africana s relaes tnico-raciais, aos problemas desencadeados pelo racismo e por outras discriminaes, pedagogia anti-racista nos programas de concursos pblicos para admisso de professores. - Incluso, em documentos normativos e de planejamento dos estabelecimentos de ensino de todos os nveis - estatutos, regimentos, planos pedaggicos, planos de ensino de objetivos explcitos, assim como de procedimentos para sua consecuo, visando ao combate ao racismo, a discriminaes, ao reconhecimento, valorizao e respeito das histrias e culturas afro-brasileira e africana. - Previso, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e de outros rgo colegiados, do exame e encaminhamento de soluo para situaes de racismo e de discriminaes, buscando-se criar situaes educativas em que as vtimas recebam apoio requerido para superar o sofrimento, os agressores, orientao para que compreendam a dimenso do que praticaram e ambos, educao para o reconhecimento, valorizao e respeito mtuos. - Incluso de personagens negros, assim como de outros grupos tnico-raciais, em cartazes e outras ilustraes sobre qualquer tema abordado na escola, a no ser quando tratar de manifestaes culturais prprias de um determinado grupo tnico-racial. - Organizao de centros de documentao, bibliotecas, midiotecas, museus, exposies em que se divulguem valores, pensamentos, jeitos de ser e viver dos diferentes grupos tnico-raciais brasileiros, particularmentedos afrodescendentes. - Identificao, com o apoio dos Ncleos de Estudos Afro-Brasileiros, de fontes de conhecimentos de origem africana, a fim de selecionarem-se contedos e procedimentos de ensino e de aprendizagens. - Incentivo, pelos sistemas de ensino, a pesquisas sobre processos educativos orientados por valores, vises de mundo, conhecimentos afro-brasileiros e indgenas, com o objetivo de ampliao e fortalecimento de bases tericas para a educao brasileira. - Identificao, coleta, compilao de informaes sobre a populao negra, com vista formulao de polticas pblicas de Estado, comunitrias e institucionais. - Edio de livros e de materiais didticos, para diferentes nveis e modalidades de ensino, que atendam ao disposto neste parecer, em cumprimento ao disposto no Art. 26A da LDB, e para tanto abordem a pluralidade cultural e a diversidade tnico-racial da nao brasileira, corrijam distores e equvocos em obras j publicadas sobre a histria, a cultura, a identidade dos afrodescendentes, sob o incentivo e superviso dos programas de difuso de livros educacionais do MEC - Programa Nacional do Livro Didtico e Programa Nacional de Bibliotecas Escolares ( PNBE). - Divulgao, pelos sistemas de ensino e mantenedoras, com o apoio dos Ncleos de Estudos Afro-Brasileiros, de uma bibliografia afro-brasileira e de outros materiais como mapas da dispora, de frica, de quilombos brasileiros, fotografias de territrios negros43kit3_modulo4.indd 43 3/6/07 10:22:54 AM 46. urbanos e rurais, reproduo de obras de arte afro-brasileiras e africana a serem distribudos nas escolas de sua rede, com vistas formao de professores e alunos para o combate discriminao e ao racismo. - Oferta de educao bsica em reas de remanescentes de quilombos, contando as escolas com professores e pessoal administrativo que se disponham a conhecer fsica e culturalmente a comunidade e a formar-se para trabalhar com suas especificidades. - Garantia, pelos sistemas de ensino e entidades mantenedoras, de condies humanas, materiais e financeiras para execuo de projetos com o objetivo de Educao das Relaes tnico-raciais e estudo de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, assim como organizao de servios e atividades que controlem, avaliem e redimensionem sua consecuo, que exeram fiscalizao das polticas adotadas e providenciem correo de distores. - Realizao, pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, de atividades peridicas, com a participao das redes das escolas pblicas e privadas, de exposio, avaliao e divulgao dos xitos e dificuldades do ensino e aprendizagens de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educao das Relaes tnico-Raciais; assim como comunicao detalhada dos resultados obtidos ao Ministrio da Educao, Secretaria Especial de Promoo da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educao, e aos respectivos conselhos estaduais e municipais de educao, para que encaminhem providncias, quando for o caso. - Incluso, nos instrumentos de avaliao das condies de funcionamento de estabelecimentos de ensino de todos os nveis, nos aspectos relativos ao currculo, atendimento, aos alunos, de quesitos que avaliem a implantao e execuo do estabelecido neste parecer. - Disponibilizao deste parecer na sua ntegra para os professores de todos os nveis de ensino, responsveis pelo ensino de diferentes disciplinas e atividades educacionais, assim como para outros profissionais interessados a fim de que possam estudar, interpretar as orientaes, enriquecer, executar as determinaes aqui feitas e avaliar seu prprio trabalho e resultados obtidos por seus alunos, considerando princpios e critrios apontados. Notas 1 Belm Lei Municipal n 7.6985, de 17 de janeiro de 1994, que Dispe sobre a incluso, no currculo escolar da Rede Municipal de Ensino, na disciplina Histria, de contedo relativo ao estudo da Raa Negra na formao scio-cultural brasileira e d outras providncias Aracaju Lei Municipal n 2.251, de 30 de novembro de 1994, que Dispe sobre a incluso, no currculo escolar da rede municipal de ensino de 1 e 2 graus, contedos programticos relativos ao estudo da Raa Negra na formao scio-cultural brasileira e d outras providncias". So Paulo Lei Municipal n 11.973, de 4 de janeiro de 1996, que Dispe sobre a introduo nos currculos das escolas municipais de 1 e 2 graus de estudos contra a discriminao 2 FRANTZ, Fanon. Os Condenados da Terra. 2. ed. Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1979. 3 2, Art. 26A, Lei 9394/1996 : Os contedos referentes Histria e Cultura Afro- Brasileira sero ministrados no mbito de todo o currculo escolar, em especial nas reas de Educao Artstica e de Literatura e Histria Brasileiras. 4 Neste sentido, ver obra que pode ser solicitada ao MEC: MUNANGA, Kabengele (Org.). Superando o Racismo na Escola. Braslia, Ministrio da Educao, 2001. 44kit3_modulo4.indd 443/6/07 10:22:54 AM 47. Incluso Social Relaestnico-raciais Secretaria Especial Ministriodos Direitos Humanos da Educao e de gnerokit3_CAPA_mod4.indd 2-310/3/2007 20:30:19