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O que será tratado nesta aulaEsta aula trata do que é a inteligência humana. Partindo das definições de vigilância e tenacidade, aprofunda-se na capacidade de intelecção e apreensão de conceitos.

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A ‘inteligência’ mineral, vege-tal e animalOs manuais de psicopatologia falam

da inteligência como a função que mantém o sujeito atento, mencionando apenas dois aspectos: vigilância e tenacidade. Vigilância é a capacidade de mudar o foco da atenção, e tenacidade é a capacidade de aprofundar-se ou manter-se no foco escolhido; ambas podem apresentar-se aumentadas ou diminuídas (por exemplo, um sujeito hipervigil ou hipotenaz). No entanto, os manuais não definem direito o que é a inteligência. Alguns, inclusive, trazem erros conceituais. De modo geral, eles apontam testes para

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percebermos se o paciente está com a inteligência preservada ou diminuída.

Mas a inteligência não é apenas isso; é uma das faculdades humanas mais nobres. Por isso, é importante meditar sobre ela. Fazer o exercício de olhar para as pedras, um riacho, o mar e se perguntar se essas coisas são inteligentes; olhar para uma planta e fazer a mesma indagação. É possível entender que a pedra tem certo nível de inteligência por manter-se coesa, que uma árvore é inteligente por absorver os raios solares. Nesse caso, considera-se que existência e inteligência são sinônimos. A inteligência do reino mineral é manter-se em ordem, em passividade inerte. A inteligência do reino vegetal é articular os quatro elementos da natureza com uma passividade cinética, ou seja, movendo-se passivamente ao crescer.

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Se tomarmos o termo no mesmo sentido, os animais também têm inteligência. Eles têm uma presença, assim como os minerais e os vegetais, mas fazem operações alquímicas transubstanciais (ou seja, mudam a natureza das coisas, como uma vaca que transforma capim em carne ao comê-lo). Movem-se no espaço, não crescem apenas para cima; reconhecem padrões e têm instintos, isto é, capacidade para responder às demandas da natureza (por exemplo, cães pastores são capazes de identificar a proximidade de um fenômeno natural).

O homem e a mulher também têm presença e fazem operações alquímicas, mas têm poucos instintos de orientação no mundo. O instinto é uma resposta necessária a um estímulo vindo de fora. Por analogia, podemos dizer que o ser humano é dotado de instintos, mas se investigarmos

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a fundo, chegamos à conclusão de que isso é duvidoso. Não há nada que seja necessário ao ser humano, entendendo aqui a acepção técnica de necessidade: quando algo sempre acontece de tal modo.

Para o ser humano, comer é conveniente, mas não é necessário: pode-se decidir não comer. Quanto ao instinto de sobrevivência, ao longo da história houve mártires políticos e religiosos. Inclusive, o homem pode livremente abrir mão da própria vida, pode suicidar-se. A propósito do instinto sexual: diferente dos animais, para o ser humano não é suficiente que haja uma fêmea no período fértil e um macho viável para que eles copulem, ainda que os dois estejam unidos por um vínculo.

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A inteligência humana: abstração de conceitosA inteligência é o que há de mais

determinante no ser humano, que o distingue do resto das coisas materiais: o homem olha para a realidade, que entra por seus sentidos, e é capaz de formar conceitos.

O olho, que representa os cinco sentidos, recebe as informações do mundo material e estas são lançadas para o mundo do espelho, formando fantasmas, isto é, imagens difusas. Mas há algo que está acima das imagens. Não temos somente a

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lembrança do que já vimos, mas também o conceito do objeto, que não se refere a um objeto concreto. Precisamos do conceito para olhar para a realidade e dizer: “isto é um celular, um cachorro, um copo”.

O conceito é a forma necessária de ser. Para que um copo seja um copo, precisa obedecer a uma proporção e forma, ou seja, as coisas que se organizam materialmente têm de possuir uma forma específica. Algumas doenças psiquiátricas, como retardos graves, impedem as pessoas de conceitualizar.

Além das coisas materiais, o ser humano também consegue ter conceitos narrativos, de história, lealdade, justiça, vileza, crime, vingança. Por um lado, para saber o conceito de vingança, precisamos ter sido apresentados a histórias que a contenham. Por outro, uma vez que o conceito está

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formado, não se precisa da ocorrência de um ato material de vingança para saber e evocar o que ela é – um sujeito consegue orientar-se mesmo sem presenciá-la.

A inteligência aparece como a clareza na formação de conceitos narrativos. Ela consiste em extrair de histórias os seus princípios, o que é muito diferente de julgar. Uma pessoa inteligente consegue, a partir de poucas informações materiais, criar um universo interior repleto de pontos de referência estáveis. Isso acontece porque ela extraiu e apreendeu os conceitos dessas informações materiais. A partir dos elementos oferecidos, a pessoa inteligente identifica por trás daquela história algo de lealdade, de justiça, de vileza, de crime, etc. Uma das funções do terapeuta é fazer com que a pessoa seja inteligente, que consiga fazer a intelecção, e não fique

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desorientada no mundo material, uma vez que o ser humano se move nesses dois mundos: o da matéria, que lhe oferece poucas informações; e o dos conceitos, das imagens.O mundo material, do corpo, é uma presença de verbos e de ações. Esses verbos se conectam em uma história. Por isso, quando estamos diante de uma pessoa que é matéria, precisamos entender de que presença é a pessoa, que verbo ela evoca. A atitude e aparência da pessoa já devem evocar a presença de coisas para nós, cabendo-nos guardar isso para poder trabalhar em sequência.

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Extrair um conceito é proceder um exercício que somente o ser humano

consegue. Trata-se de dizer algo sobre a realidade, mas não de inventar. O conceito já estava na realidade e, para que a coisa seja real, tem de se organizar a partir dele. Um exemplo é o Teorema de Pitágoras (em um triângulo retângulo, a soma dos quadrados do catetos é igual ao quadrado da hipotenusa). Além de haver o triângulo real, e os meios materiais em que ele está (um quadro, um caderno), há o conceito, que é a

O mundo dos conceitos: anterior à matéria

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fórmula estável.

A fórmula não está na memória, pois continua existindo mesmo se houver perda da memória pessoal. Nem sempre houve a inteligência humana (tanto criacionistas quanto evolucionistas entendem assim); e não foi a inteligência humana que criou a fórmula, ela já existia. Precisamos meditar sobre isto: a existência consistente de coisas imateriais que antecedem a matéria, na ordem do existir e na ordem do ser.

A inteligência humana, portanto, é a faculdade que ultrapassa o mundo material e toca no mundo dos conceitos, imaterial, consistente e anterior à própria possibilidade de existência da matéria. O ser humano só faz isso porque consegue estar fora da matéria e do tempo. Dos reinos mineral, vegetal e animal há uma ascensão no domínio da matéria: a pedra é matéria,

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o vegetal coordena a matéria e o animal vence o movimento. O homem está acima disso tudo, tem a capacidade humana de ver além do agora, mas ver o todo, a projeção e a unidade da matéria.

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