41 DEBATE-PAPO A traparia - cm-lisboa.pt
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Quarta-feira, 13 de Agosto de 1997
DEBATE-PAPO
A traparia de Baptista- Bastos
Ponto claríssimo: aqui não se mediram as palavras.
«A li teratura portuguesa actual», escrevia recentemente Baptista-Bastos, «parece um coito interrompido. E a crítica li te- · rária portuguesa não parece, é, uma ignóbil mascarada de critérios.» Não
sofre dúvida, as coisas entraram numa fase de-. sastrosa. Ignora-se, ainda por cima, o que deva considerar-se mais preocupante: se a «ignóbil mascarada de critérios», se o «coito interrompido». São percalços, ambos eles, que não se desejam a ninguém. Mas - pensando melhor - a interrupção da cópula pode revelar-se por vezes decisão sensata, e a frustração que daí houver é coisa remediável. Já a subversão dos critérios, sobretudo quando «ignóbil», nos deixa com uma ínfima vontade de endireitar o mundo. Não: se a situação da «literatura portuguesa» nos impede já de dormir tranquilos, a da «crítica literária portuguesa» é francamente desesperada. Literato português que se preze anda pelas esquinas, pelos bares, erguendo clamores de rasgar um coração. Não parece? É porque ainda não repararam. No caso de Baptista-Bastos, o bar das lamentações é, dizem-me, O Expresso, ali a São Roque. A esquina, conhecemo-la também. Chama-se «Páginas Amarelas» e fica, à sexta-feira, no «Diário Económico». ·Era aí que se encontravam, a 23 de Maio, aqueles inquietantes diagnósticos, em peça intitulada «A traparia e a grandeza literária». Magnânimo, o cronista não nos dava a culpa logo a todos. Dizia que «O autor», qualquer autor, chega hoje à boca dos palcos e, depois de se anunciar, declama: «ÜS outros, os que me antecederam, não prestam para nada! E, .dos actuais, além de mim, só há mais dois!» Evidentemente, uma cena chocante. No dizer gracioso de Baptista-Bastos, ela «apenas disseca uma insegurança psicofrénica». Para tais males não há cura à vista. Simplesmente, falando daqueles modos, ele apenas pretendia pregar-nos um susto. O medonho exórdio destinava-se a introduzir um, e só um, dos desgraçados, «um desses que poderia ter sido e não conseguiu ser». Quem? Não me perguntem nomes. Como referências, Baptista-Bastos indicava o cometimento, «ainda há dias», de «seis patéticas entrevistas, seis!» e de certos «ajustes post mortem com não sei quantos seus confrades». Pareceu-me excessivo tão intenso contacto com a imprensa (houveca aí, comentava o colunista, «uma majestosa técnica de marketing», e há que sublinhar a sugestão do adjectivo), mas seis entrevistas pareciam-me perdoáveis como despedida duma vida, !llesmo se as vinganças armadi lhadas nunca são as mais elegantes. Quem era, então? Também eu queria agora saber. Procurei mortos recentes. Nenhum correspondia ao perfil
dos entreténs de imprensa ou dos ajustes. Até que um pormenor, coisa àe nada, veio facilitar as buscas. Dizia o comentador: «Nem o Garrett escapou à fúria da enfadonha criatura.» Aí tinha eu a chave.
A lgo me estava dizendo que havia de ser ele. Dias antes, José Cardoso Pires confessara a Pulido Valente, em «0
Independente», coisas deveras estranhas. Quanto às entrevistas, eu próprio dera conta, eni pouco tempo, de quatro aos jornais e duas às televisões. Ficava esclarecido agora também aquele post mortem, que, não sendo simpático (Cardoso Pires sofrera doença particularmente grave), era mesmo assim de grande eloquência. Só uma coisa não percebia, e ainda hoje não percebo: como pudera Baptista-Bastos, cronista não de todo anónimo, dedicar quatro furibundos parágrafos a um colega escritor que nunca nomeava. Este silenciamento de nomes haveria de revelar-se, depois, procedimento normal. No «Diário Económico» de 4 de Julho, dávamos com nova
e trabalhosíssima alusão a Cardoso Pires. Dissertando sobre António Lobo Antunes (identificado aí como «um tal Antunes»), afirmava-se não possuir ele ideias, e ter de valer-se das de «um outro, que tanto o adula quanto o açula>>. Não sei se a coisa é verdade, se não é. Mas persiste a pergunta: se a gente sabe, ou acaba sempre por saber, de quem ali se trata, porquê calar o nome às pessoas? Será por coqueteria? Será por insegurança? Não consigo decidir-me. Mas, agora, uma coisa me escapa também. E é isto: que passa pela cabeça a um escritor famoso, e na idade do siso, para se produzirem enormidades como as confiadas por Cardoso Pires a «Ü Independente» de 16 de Maio? E, antes de avançar, saúde-se um momento único, esse mesmo, que reuniu, com certeza casualmente, os dois maiores artistas da nossa prosa actual: um clássico cronica.mente subversivo, José Cardoso Pires, e um anarquista enamorado do classicismo, Vasco Pulido Valente. Talvez que pouco eles tenham, um ao outro, a dizer-se. Pode até admitir-se que raramente se leiam. Mas, e é isso o principal, ambos são gentis ao ponto de se lembrarem da nossa existência.
A entrevista, portanto. Cardoso Pires aí dizia, com efeito, não se julgar ele «O único português que não tem especial admiração literária pelo Almeida Garrett». E aj untava: «Não gosto das Viagens na Minha Terra, acredite.» Ríamos, que merece. Não da opinião, respeitabilíssima, mas das ironias da história literária. Podemos ser sucintos: sem a inventiva prosa de Garrett, que tanto deprecia, José Cardoso Pires estaria hoje, na melhor das sortes, escrevendo _como Herculano. Não adianta recordar que o sólido Eurico foi livro de cabeceira de gerações. Releia-se-o, e digacse se a idefa não é um pesadelo.
M as, nessa conversa com o semanário, havia pior, bastante pio~. Interrogado sobre quem «Via» na literatura por
tuguesa depois de Carlos de Oliveira, o romancista afirmava não ver ninguém. Só a instâncias do entrevistador condesc·ende em produzir nomes. Eram eles António Lobo Antunes, Dinis Machado, Maria Velho da Costa. «Já não é mau», acrescenta, talvez surpreendido com a fortuna que nos calhou. Diante disto, podia perguntar-se: tinha o indignado Baptista-Bastos razão afinal? Vai-se ver que não. Ainda não há dois anos, figuravam, numa entrevista da revista «Ler», estes estranhos dizeres: «Tirando o caso do Pedro Paixão, na Noiva Judia, não me interessa nada o que se produz na bteratura portuguesa.» Era uma afirmação de Baptista-Bastos, em própria pessoa. Mais se nos infommva da mediana qualidade do «romancista» José Cardoso Pires e da nenhuma do «cronista». Mas havia esta ressalva: «Ü contista Cardoso Pires é um prosador absolutamente admirável.» Assentemos em duas ou três coisas. Primeiro, que dois anos são tempo suficiente para uma pessoa mudar de opinião, mesmo tão radicalmente como isto. Depois, que compartilho essa admiração desmedida pelo «contista» Cardoso Pires. Por fim , que julgo ouvir, na desvalo1ização do restante ficcionista, o castigo de uma dúzia de páginas efectivamente levianas. Numa coisa se igualam José Cardoso Pires e Baptista-Bastos: no indizível desprezo que nutrem pela produção li terária sua contemporânea. Um e outro, é a ferros que se lhes arranca um elogio, um nome. E se Baptista-Bastos se desautoriza censurando noutros uma apreciação que é também a sua, de um escritor de génio como Cardoso Pires não é menos indigna a sobranceria que aos confrades reserva.
Ea «Crítica literária portuguesa», onde se meteu a «ignóbil», tão retumbantemente anunciada? Escondeu-se, suponho. Es
gueirou-se, cosida com as sombras, no medo de ver-se maltratada. Mas dispensavam-se preocupações. O esfrangalhamento que BaptistaBastos prometia à «literatura portuguesa actual» não pôde fazer mais do que assustá-la. E estes, sim, são péssimos serviços: meter medo à pequena, e depois dar tão mau espectáculo.
PORTUGAL
FICÇÃO E POESIA
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JOSÉ CARDOSO PIRES De Profundis, V~!~~ :~~a (Dom Quixote)
LUÍS SEPÓLVEDA História da Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar (ASA)
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lÍv;;iái~:~tt~;;;- ii~;ata:'cáStn (Alvalade, Benlica1 CaStll.}, No.tícias (Rossio, Almada, Evora e Porto}, O Nome do Uvro? (Amadora) e Leituras (Porto)
BRASIL
FICÇÃO
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JOSTElN GAARD'ER O Mundo de Sofia JôsÓARES ..... . O Xangô de Baker Street
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MICHAEL CRJCHTON Armadilha Aérla
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