5. As Admoestações de Ipu-uer

60
5. As Admoestações de Ipu-uer

Transcript of 5. As Admoestações de Ipu-uer

Page 1: 5. As Admoestações de Ipu-uer

5. As Admoestações de Ipu-uer

Page 2: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

244

Page 3: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

245

5.1. Proveniência, datação e localização dos manuscritos. Sinopse

Page 4: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

246

Page 5: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

247

As Admoestações de Ipu-uer é um dos títulos que habitualmente é dado ao texto co-

nhecido através de um único manuscrito: o Papiro Leiden 344 recto. Pertenceu a Giovanni

Anastasi1 e, segundo ele próprio informou, terá sido descoberto em Mênfis, provavelmente

em Sakara. Em 1828 este manuscrito hierático foi vendido ao Museu de Antiguidades de Lei-

den, o seu actual proprietário. É uma cópia da XIX dinastia muito estragada e com um grande

número de passagens perdidas, nomeadamente o princípio, onde, à semelhança de outros tex-

tos, poderíamos encontrar as razões da sua existência, e o fim. O escriba parece ter copiado

uma versão anterior com muito pouco cuidado, tendo cometido alguns erros.

É um texto escrito em médio egípcio, tendo na ortografia, no vocabulário e em algu-

mas características gramaticais, óbvios paralelismos com outros textos do Império Médio,

nomeadamente com o Conto do Camponês Eloquente e os Ensinamentos de Amenemhat I ao

seu filho Senuseret ou com o Diálogo de um desesperado com o seu ba. É também posto em

paralelo com este tipo de textos do Império Médio o seu conteúdo filosófico e poético, expos-

to num longo discurso. Ainda que alguns se inclinem para a crença de que a guerra civil refe-

rida e a ocupação do Delta pelos Asiáticos indiquem o período dos Hicsos, considerandos

filológicos e paleográficos, bem como alguns detalhes administrativos2, entre outros, empur-

ram-nos para um período histórico entre os finais da VI e a X dinastias, isto é, para o Primeiro

Período Intermediário, e um período literário dos finais da XII dinastia. Além disso, a temáti-

ca deste texto é comparável à d’As Profecias de Neferti e às As Lamentações de Khakheperré-

seneb, dois textos que embora falem de grandes desgraças, anarquia e privações, parecem ter

sido escritos em períodos já de paz e prosperidade. Este apenas é maior e mais repetitivo.

1 Giovanni Anastasi (1780-1860) tinha origem grega, mas uma vez estabelecido em Alexandria desenvolveu uma

bem sucedida carreira de comerciante, no seu tempo um dos maiores do Egipto. Entre 1828 e 1857 desempe-nhou as funções de cônsul geral da Suécia e da Noruega no Egipto. Paralelamente a estas actividades, empe-nhou-se também no comércio de antiguidades. Com agentes em Sakara e Tebas, acabou por vender importan-tes colecções ao governo alemão em 1828 (provavelmente ao governo prussiano de Guilherme I, uma vez que a unidade alemã só se efectivaria em 1871), ao Museu Britânico em 1839 e em Paris em 1857. Os papiros as-sociados ao seu nome são diversos e importantes, estando hoje espalhados por Londres, Paris e Leiden (R. W. DAWSON, E. P. UPHILL e M. L. BIERBRIER, Who Was Who in Egyptology, p. 15).

2 Em 6,12 fala-se dos «seis grandes tribunais», o qnbt de Tebas, o supremo tribunal que controlava todos os outros tribunais do país, servindo em alguns casos de tribunal de apelação, que tratava directamente das ques-tões relacionadas com a «casa grande» (o «Estado») e os que lhes estavam próximo, embora seja admissível que as instâncias supremas pudessem ter variado em conformidade com a localização da capital de cada época. Contudo, é muito antes, com Niuserré, faraó da V dinastia, que aparecem atribuídos à mesma pessoa pela pri-meira vez o título de imy-r Hwt-wrt, «administrador do grande tribunal» e o título de imy-r Hwt-wrt 6, «admi-nistrador dos seis grandes tribunais». Ao contrário do primeiro título, que nunca era atribuído a um vizir, o se-gundo era sempre acumulado voluntariamente com outros títulos pelo vizir. Usado esporadicamente no Impé-rio Antigo, parece ter caído em desuso na primeira metade do Império Médio, reaparecendo depois no início da XII dinastia, provavelmente com a subida ao trono do vizir de Mentuhotep IV, o futuro Amenemhat I, surgindo em papiros da segunda metade do Império Médio como atribuído ao vizir (T. F. CANHÃO, «O meu caminho é bom». O Conto do Camponês Eloquente, pp. 178-182). Em 10,7 fala-se do «supervisor da cidade» como sendo um cargo exercido na cidade real, a partir do Palácio. Com o tempo, e com certeza após a XVIII dinastia, este título passou a ser apenas um epíteto do vizir (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage from a hieratic papyrus in Leiden, p. 18).

Page 6: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

248

Contudo, não é um poema histórico: basicamente é um diálogo reflexivo sobre o difícil exis-

tencialismo num mundo em mudança.

O que existe deste conto arruma-se em dezassete páginas de 18 cm de altura e 378

cm de comprimento. Cada página tem catorze linhas, aparentemente como excepção das pá-

ginas 10 e 11 que parece só terem tido treze linhas. Mesmo a primeira página parece ter per-

dido duas ou três linhas, pois só foi possível recuperar parte de onze linhas, não se sabendo ao

certo quantas se perderam. E dessas onze linhas, só o último terço de cada uma delas sobrevi-

veu. As páginas 2 a 7 têm poucas lacunas, mas o texto está totalmente sumido em diversos

locais. A página 8 tem uma grande lacuna que compreende o último quinto das últimas sete

linhas e a partir daqui o meio das restantes páginas está inteiramente ou parcialmente destruí-

do3. Um pequeno número de fórmulas introdutórias estereotipadas, sempre escritas a tinta

encarnada, aparece sistematicamente repetida a curtos intervalos introduzindo cada parágrafo,

sendo na transcrição de Gardiner substituídas por um traço de sublinhado. Através dessas

fórmulas é possível seccionar o texto em seis secções ou poemas, introduzidos por uma parte

em prosa. Foram utilizadas 221 linhas de dezassete páginas: 1ª página com onze linhas; treze

páginas com catorze linhas, duas páginas com treze linhas, última página com duas linhas.

O papiro está totalmente escrito de ambos os lados, mas o verso nada tem a ver com

este texto, compreendendo um conjunto de hinos a uma divindade solar, objecto de transcri-

ção, transliteração e publicação em 1886, por A. Massy4. Como falta o princípio ao nosso

conto, não sabemos o nome do faraó que convocou Ipu-uer, nem sabemos verdadeiramente

quem é Ipu-uer, pois também fomos espoliados dos seus títulos. Aliás, as oito últimas páginas

apenas apresentam cerca de metade de cada uma. Além disto, este texto mostra-se particular-

mente difícil porque o escriba responsável por ele (ou outros antes dele), cometeu numerosos

erros, como, por exemplo, a omissão de palavras inteiras que têm que ser subentendidas, a

omissão de um ou mais caracteres em certas palavras, concordâncias de género e número er-

radas, alterações na ordem mais comum dos determinativos e trocas de pronomes. Encontrá-

mos mesmo algumas palavras desconhecidas e inexistentes nos dicionários consultados.

O papiro apresenta-se muito escuro, sobretudo ao redor das áreas deterioradas, que

existem praticamente em todas as páginas, por isso não existem fotografias suas, com excep-

ção da fotografia da página 7, uma das duas únicas páginas pouco deterioradas e com condi-

ções mínimas para poderem ser fotografadas, que Gardiner apresenta na sua obra de 1909,

reimpressa em 19905. É esta a nossa fonte para este trabalho. Existe uma outra cópia fac-

-similada feita por T. Hooiberg e incluída em C. Leemans (ed.), Monumens égyptiens du Mu-

3 A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage from a hieratic papyrus in Leiden, p. 1. 4 A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage from a hieratic papyrus in Leiden, p. 1. 5 A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage from a hieratic papyrus in Leiden, p. 1.

Page 7: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

249

sée d’Antiquités des Pays-Bas à Leide (Leiden, 1841-82), II, pls. xv-cxIII6, à qual não tivemos

acesso. Existem também alguns artigos anteriores à publicação de Gardiner, nomeadamente

de Chabas, Lauth, Brugsch, Erman e Lange7 que se reflectem na obra de Gardiner.

Sinopse. Ipu-uer, provavelmente um nobre da corte que o parece rodear, dirige-se a

alguém que, aparentemente, só pode ser o rei, «o velho rei» que «vive pacificamente no seu

palácio»8. Wilson, por exemplo, julga que o rei, de quem nos falta a identificação, possa ser

um dos últimos faraós da VI dinastia ou de uma das confusas dinastias do Primeiro Período

Intermediário9, mas na opinião de Parkinson não é um rei específico mas «uma representação

generalizada da autoridade»10, que Ipu-uer trata ao mais alto nível por «senhor de tudo», título

partilhado pelo rei e pelo demiurgo. É descrita uma época catastrófica em que a idade de ouro

foi esquecida e substituída pela violência, a anarquia, o crime e o roubo. A hierarquia desapa-

receu e todos os valores foram invertidos. Os ritos deixaram de ser celebrados e deixaram de

se fazer oferendas às divindades. As leis foram espezinhadas e os segredos traídos. No meio

de uma crise de autoridade, o próprio palácio real estava em perigo. Contudo, no fim fica um

raio de esperança porque haverá alguns resistentes aos infortúnios descritos, e que se fizerem

renascer os verdadeiros valores permitirão que a esperança renasça. Mas para que a felicidade

regresse é necessário que o rei esteja consciente dos seus deveres. Faz a denúncia das condi-

ções sociais e políticas de determinada época com um ar de resistência patriótica, numa tenta-

tiva de dar força a um rei aparentemente enfraquecido, mas sempre protegido pelos deuses.

Acompanha-se uma organização do texto devidamente escalonada: primeiro o desespero pe-

rante a destruição e o caos de uma verdadeira revolução social, depois o desejo do regresso do

equilíbrio perdido e, por fim, a visão de um futuro normalizado.

6 A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage from a hieratic papyrus in Leiden, p. 4; J. A. WILSON,

«Egyptian Oracles and Prophecies», p. 441. 7 J. A. WILSON, «Egyptian Oracles and Prophecies», pp. 4-5. 8 A. ERMAN, Ancient Egyptian Poetry and Prose, p. 93. 9 J. A. WILSON, «Egyptian Oracles and Prophecies», p. 441. 10 R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe and Other Ancient Egyptian Poems, p. 166.

Page 8: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

250

Page 9: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

251

5.2. Texto hieroglífico, transliteração e tradução comentada

Page 10: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

252

Page 11: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

253

[... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... iryw]-aAw Hr [Dd] Sm.n HAq n.n

……………………………………… os guardiões da porta (disseram)1: «Vamos e pilhemos»2;

bnrytyw [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] n Dd rxtyw

os pasteleiros [deixaram de fabricar o pão]3; os lavadores (de minério) recusam-se4

fAt Atpw.f nayw ??[... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

a transportar a sua carga. ………………………………………5

grg Apdw Ts n.sn skw.[sn ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

os passarinheiros formaram companhias (para lutar)6; …………………………

[imyw i]dHw Xr ikmw atxw [... ... ... ... ...]

aqueles que estão dentro dos pântanos7 andam com escudos; os cervejeiros [deixaram de fabricar a cerveja]8;

[... ... ... ... ...] snm mAA s sA.f m xrwy.f shA

…………… está triste; um homem olha o seu filho como um inimigo; confunde-se9

[... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] swt ky mi Hr xpS wpwt

………………………………………contra outro, «Vinde com força!» é uma mensagem

[... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] nAyw SAtw n.tn m rk Hr

………………………………………10 predestinadas para ti no tempo de Hórus,

1,1 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,2 T

1,3T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,4T

- - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,5T

- - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,6 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,7 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

- - - - - - - - - ⅔ de linha

Page 12: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

254

m hA[w psDt... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... iw] Sm nb qd m irtyw

na era da Enéade; …………………………… . O homem virtuoso caminha com tristeza

m-a xprwt m tA iw Sm [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... iw] xAstyw xpr

por causa das transformações no país11. Agora que ………… caminha ……… ……… . Os habitantes do deserto12 transformaram-se

m rmTw m st nb iw-ms Hr aAdw [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

em Egípcios, em todo o lado. Na verdade13, o rosto está pálido …………………

tw srt.n tpw-a sprw r [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

esta … …14. O que os antepassados predisseram chegou até ……………………

iw-ms nn rww [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

Na verdade, ninguém escapa …………………………………………

tp tA Xr smAyw Sm s r skA mr m ikm.f

sobre a terra cheia de quadrilhas; um homem vai lavrar ligado com o seu escudo.

iw-ms sfw Hr Dd sny[-ib.i ... ... ... spdw] Hr.i m nty wn s

Na verdade, aquele que é doce de rosto diz: «O meu coração sofre …………»; … … pontiagudo de rosto15 é o que existe no homem16.

iw-ms Hr aAdw pDt grg aDAw m st nbt nn s n sf

Na verdade, os rostos estão pálidos, o archeiro está pronto e os malfeitores estão por todo o lado. Já não existe o homem de ontem17!

1,8 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,9 T

1,10T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

1,12 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 2 ou 3 linhas

2,2T

- - - - - - - - 1/5 de linha

1,11 T

⅔ de linha- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

2,1 T

Page 13: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

255

iw-ms HAqw Hr HaDA m st nbt bAk Xry iTt gmt.f

Na verdade, o saqueador rouba em todo o lado; aquele que é servo apanha o que encontra.

iw-ms Hapy Hr Hw n skA.tw n.f s nb Hr [Dd]

Na verdade, face à inundação do Nilo18 eles não trabalham para ela19. Cada homem diz:

n rx.n xprwt xt tA iw-ms Hmwt wSr n iwr.n.tw

«Nós não compreendemos o que aconteceu através do país.» Na verdade, as mulheres estão estéreis e não conseguem engravidar;

n qd.n Xnmw m-a sxrw tA iw-ms SmAw xpr m nbw Spssw

Khnum não fabrica mais20 por causa do estado do país. Na verdade, os pobres tornaram-se senhores opulentos21;

tm irit n.f tbwty m nb aHaw iw-ms Hmw iryw ib.sn snmw

aquele que não podia fazer para si próprio um par de sandálias possui (agora) todas as coisas. Na verdade, os dependentes têm o seu coração triste;

n sn.n wrw rmT.sn nhmw iw-ms [ib] sxm iAdt xt tA

os grandes já não confraternizam com o seu povo (quando) ele grita. Na verdade, o coração (dos homens) é violento: a pestilência está por todo o país,

snf m st nb(t) n qAn n mwt wnxyt Hr Dd n tkn im st

o sangue está por todo o lado; a morte não escasseia22, a roupa da múmia fala23 se não se aproximarem dela.

iw-ms mwt aSA qrs m itrw nwy m HAt

Na verdade, muitos mortos são sepultados no rio24. A inundação é uma sepultura,

2,3T

2,5T

2,4T

2,6 T

2,7 T

Page 14: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

256

xpr is wabt m nwy iw-ms Spsw m nxwt SwAw

de facto a inundação tornou-se uma tumba. Na verdade, os opulentos lamentam-se e os pobres25

Xr rSwt niwt nb(t) Hr [Dd] im m dr.n qnw mm.n iw-ms

estão alegres. Todas as cidades dizem: «Vamos eliminar 26 os poderosos de entre nós.» Na verdade,

rmTw mi gmtw sbw xt tA nn ms HD Hbsw m pA rk

a espécie humana é como as íbis negras27, a imundice está por todo o país; de facto, ninguém se veste de branco nestes tempos.

iw-ms tA Hr msnH mi irt nHp awAy m nb aHaw [ ... ] m HAqw

Na verdade, a terra gira como uma roda de oleiro; o ladrão possui todas as riquezas, o [homem rico] é o saqueador28.

iw-ms kfA-ib mi [... ... ... ... ...]?? nDs Hry iry.i m

Na verdade, os homens honrados estão como …………… O homem comum (diz): «É terrível! O que posso fazer?»29

iw-ms itrw m snfw swr.tw im.f nyw.tw m rmT

Na verdade, o rio é sangue e bebem dele; com ele afastam-se da sua qualidade de homens,

ibi.tw mw iw-ms sbxt wxAw Driwt Amm

têm sede de água. Na verdade, as portas, as colunas e as paredes ardem;

Drwt n nsw pr anx wDA snb mn rwd iw-ms swh(A) dpt rs

(mas) as paredes30 do palácio do rei, v. p. s.31, estão firmes e duráveis. Na verdade, o barco do Sul naufragou32;

2,9T

2,8T

2,10 T

2,11 T

Page 15: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

257

xbA niwt SmAw xpr m qAyt Swyw iw-ms msHw

as cidades são destruídas e o Alto Egipto transformou-se numa terra alta seca. Na verdade, os crocodilos

Hr bAfy pAw n iTt.n.sn Sm n.sn rmT Ds iry HD pw n tA tw

estão saciados com o peixe33 que têm capturado, (pois) os homens vão a eles deles mesmo34. Isto é a destruição deste país!

Dd.tw m dgs aA mk sy Snw mk xnd.tw sxt mi rmw

Diz-se: «Não caminhes aqui. Vê, é uma armadilha!35 Vê, nós pisamos36 a nassa como os peixes!»

n tnw sw snD m Hry ib iw-ms rmT andw

O homem assustado não sabe o que diz por causa do terror no (seu) coração. Na verdade, os homens são poucos37.

dd sn.f m tA m st nbt mdw rxw xt war.f n wDfw

Aquele que atira o seu irmão por terra está por todo o lado; a palavra daquele (que) conhece as coisas foge sem demora38.

iw-ms sA s rx rn.f gAw siA.f xpr ms nbt.f m sA Hmt.f

Na verdade, ao filho de um homem conhecido faltará o reconhecimento do seu nome e a criança da sua mulher tornar-se-á no filho da sua dependente.

iw-ms dSrt xt tA spAwt xbA pDt rwty iit.ti n

Na verdade, o deserto estende-se a todo o país39; as províncias estão destruídas. Os estrangeiros do exterior vêm40 para o

kmt iw-ms sprw [... ... ... ... ...] nn ms wn rmT m st nb(t)

Egipto. Na verdade, [os estrangeiros]41 chegaram e, de facto, não há pessoas em nenhum lugar.

2,13T

2,12T

2,14 T

3,1 T

3,2T

Page 16: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

258

iw-ms nbw xsbd HD mfkAt HmAgt Hsmn

Na verdade, o ouro, o lápis-lazúli, a prata, a turquesa42, a cornalina, a ametista43,

ibht [ ... ... ... ... ] nbw mnxw r xx n Hmtw Spsswt xt tA

pedra ibehet e todas ………44 estão atadas com cordas ao pescoço das dependentes, (enquanto) as grandes damas erram pelo país.

nbwt prw Hr Dd HA n.n wnmw.ti n.n iw-ms bwt pw anx n HAtyw

As donas de casa dizem: «Pudéssemos nós ter alguma coisa para comer!» Na verdade, a vida é uma abominação para os corações

Spswt Haw.sn snmw m isywt ibw.sn btkw

das grandes damas, os seus corpos são dignos de pena nos andrajos, os seus corações cedem

Hr nD xrt.sn [... ...] iw-ms gmgm hnw nw hbny

por causa da sua condição45 …… . Na verdade, as caixas de ébano foram quebradas46,

ssnDmw Spst swA.tw.f m Atwt [... ... ... ...]?? [... ...].sn iw-ms

as madeiras preciosas e magníficas foram partidas em camas …………?? ……?? Na verdade,

qdw mrw xpr m aHwtyw wnw m dpt nTr nHbw [...]

os construtores de pirâmides transformam-se em lavradores. Aqueles que estão na barca sagrada estão oprimidos47 …

n ms xd.tw r kpny min pw-tri iri.ti.n r aSw n saHw.n

Nos dias de hoje não se pode navegar para Biblos. Agora48, como faremos para (obter) a madeira de cedro para as nossas múmias,

3,4 T

3,3 T

3,5 T

3,6T

3,7 T

Page 17: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

259

qrs.tw wabw m inw.sn sdwx.tw wrw m sft iry r-mn-m

com que produtos os sacerdotes puros os enterram e com que óleos embalsamarão os grandes, se eles vêm de tão longe quanto

kftyw n ii.n.sn HDi nbw qn [...] inyt nt kAwt nb(t)

Keftiu49? Eles não virão mais. O ouro foi destruído e acabaram-se os materiais para todos os trabalhos.

kfw.n.t[w] xt pr-nsw anx wDA snb wryw iw wHAtyw Xr Hbyt.sn

Pilharam50 os bens do palácio real, v. p. s. Como é grande51 quando os oasianos vêm com as suas oferendas para os festivais52:

tmAyw mskAw m rdmt wAD sgnnw nw Apdw

esteiras de junco e peles (de animais), juntamente com plantas redemet53 verdes e gordura de aves54

r ib irw HAwt iw-ms Abw Tny itrt Smat n bAk n

por55 (terem) consciência de que criavam a riqueza56. Na verdade, Abu e Tjni57, a autoridade do Alto Egipto58, não pagavam impostos por causa da

HAayt HDi waHw Dabt irtyw mAaw nwt

revolta. Estão destruídas as vagens de alfarroba, o carvão de lenha, os frutos irtiu59, a madeira maau, a madeira nut,

StAw kAt Hmw DArw mitw kmw aH

a madeira de arbustos60 (para) o trabalho dos artífices61. A necessidade ……………62 põem fim63 ao palácio.

iw pr-HD r-m m-xmt bAkw.f nfr is ib n nsw iw n.f mAawt

Para que serve uma casa do tesouro sem as suas receitas64? Feliz fica o coração do rei quando vêm até ele os presentes 65!

3,9 T

3,8T

3,10T

3,11 T

3,12T

Page 18: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

260

xr is Dd xAst nb mw.n pw wDA.n pw pw-tri iri.tn r swAw r Aqw

E então cada país estrangeiro poderá dizer: «Ele é a nossa água66! Ele é a nossa prosperidade!» (Mas) o que podeis fazer acerca disto? Tudo está em ruínas!

iw-ms sbit Aqw n iri.tw.f imt pw ntt xt tA Sbn Hr nxwt

Na verdade, (até) o riso é a ruína! Não o fazemos mais. Só há gemidos espalhados pelo país, misturados com lamentações.

iw-ms iwty nb m nty wn wnw m rmT [xpr m] kAwy di.tw Hr wAt

Na verdade, aquele que nada possuía (agora) é um possuidor; aqueles que eram egípcios tornaram-se estrangeiros e fizeram com que se pusessem a caminho.

iw-ms Snwy Srr n Hr nb n tni.n.tw sA s r iwty.n.f sw

Na verdade, o cabelo diminuiu sobre todos67; não podíamos mais distinguir o filho de um homem (de bem), do daquele que não era nada.

iw-ms idi.n.sn Hr xrw n aqA xrw m rnpwt nt xrw nn pHwy n xrw

Na verdade, eles ficaram surdos por causa do barulho. Nenhuma voz pode ser justa nos anos de barulho. Não há fim para o barulho!

iw-ms wr Sri [Hr Dd] mr.i mt.i Xrdw ktt Hr [Dd] tmw sw r

Na verdade, grandes e pequenos68 dizem69: «Eu desejo a minha morte»; as criancinhas dizem: «Ele70 nunca (me) devia ter

rdt anx iw-ms msw wrw Hwi.tw r sAwt Xrdw nw nHbt

dado a vida». Na verdade, as crianças dos grandes71 foram atiradas72 contra as paredes; as crianças de pescoço

di.[t]w Hr qAn-r tA iw-ms wnw m wabt di.tw Hr qAn-r tA

foram postas nas terras altas73. Na verdade, aqueles que estavam nos locais de purificação74 foram abandonados nas terras altas;

3,14 T

3,13 T

4,1T

4,2 T

4,3T

4,4 T

Page 19: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

261

sStAw pw n wtw Hr sxrw Hr.f iw-ms nfAy Aqw mAA sf

os segredos dos embalsamadores caíram por causa disso. Na verdade, aquilo que víamos ontem está arruinado75;

tA spw n gfnw.f mi wHAt mHyw iw-ms

a terra está abandonada à sua debilidade, como o linho quando é cortado. Na verdade,

idHw r-Dr.f nn dgy.tw.f mH ib n mHw m mtnw

não se pode ocultar todo o Delta76, o coração do Baixo Egipto está cheio de caminhos

Hwi pw tr nty tw r irt n xpr wart m st nbt xr.tw Dd.tw wAt r st

que (os invasores) podem percorrer. «Na realidade, o que podemos fazer? A fuga tornou-se impossível em todo o lado!», dizem. Dizem (também)77: «O caminho para o lugar

StAw mk sw m-a xmw sw mi rxw sw xAstyw

dos segredos, vejam, tanto está na posse daqueles que o ignoram78 como na posse dos que o conhecem!» Os estrangeiros

Hmw m kAt idHw iw-ms di.tw Xnmw Hr bnwyt Hbsy

estão peritos nos trabalhos (das terras pantanosas) do Delta. Na verdade, os servidores são postos a moer os cereais, aqueles que vestem

pAqt Hwi.tw m DAit tmy mAA hrw pri n xsf

de linho fino são espancados como malfeitores; aqueles que não vêem o dia saem sem restrições;

wnyw Hr Hnkyt nt h{A}iw.sn im m sDr.sn Hr Sdw

aquelas que estão na cama dos seus maridos: «Deixem-nas dormir em tábuas,

4,5T

4,6 T

4,7T

4,8T

4,9 T

4,10T

Page 20: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

262

wHmw Dd.i iw.f dns r.i r Sdw Xry antyw iwh st

continuadamente!79» (Se) eu digo80, «É pesado para mim, no que respeita às pranchas carregadas de mirra carregar isso»,

Xry anDw mH Xr Srt im m rx.sn qniw xr wbAw HD sw

sou carregado com jarros cheios de grãos. Assim, elas81 não conhecerão o palanquim e o camareiro faltar-lhe-á.

nfr pw pXrt iry snnw n.sn Spswt mi bAkwt xn{y}wt m mi atw

Que bom remédio para isto? As grandes damas sofrem como as dependentes. As mulheres músicas82 estão nos quartos

m-Xnw nAtw Hsit.sn n mrt m irtyw sDdw [... ... ... Hr]

no interior das salas de tecelagem83 e o que elas cantavam para Meret84 passaram a ser cantos fúnebres. Os contadores (de histórias) estão a

bnwyt iw-ms Hmwt nbt sxm rw.sn mdw Hnwt.sn dns pw

moer cereais. Na verdade, todas as dependentes têm poder com o que sai das suas bocas; o discurso das senhoras é fastidioso

r bAkw iw-ms nhwt ski gnw wnw iwd.n.i sw Hmw n pr.f

para as (suas) dependentes. Na verdade, as árvores são destruídas, os (seus) ramos desnudados, (pois) os dependentes separam-se da sua casa85.

iw rmT r Dd sDm.sn st HDi fqAw n HAw n Xrdw

As pessoas dirão quando ouvirem isto: «As recompensas de abundância para as crianças estão destruídas».

nn kAw nqawt Sbnw iw min dpt iry mi m min

(Já) não há figos de sicómoro, nem vários figos entalhados de sicómoro. Agora, qual é o sabor disso hoje?

4,11T

4,12 T

4,13 T

4,14T

5,1 T

5,2T

Page 21: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

263

iw-ms wrw Hqrw Hr swn Sms.tw Smswt st [... ... ... ... ...] Hr nxwt

Na verdade, os grandes têm fome e sofrem (enquanto) servem os seus servidores. … … … … … por causa das lamentações.

iw-ms tAw Hr Dd ir siA.i rx n.i nTr tn kA iry.i n.f

Na verdade, o homem de cabeça quente diz: «Se a minha percepção me fizesse saber onde o deus está, então eu agiria por ele!»

iw-ms mAat xt tA m rn.st pwy iw isft pw irr.sn Hr grg Hr st

Na verdade, o bem está por todo o país só em nome, pois o que eles fazem é o mal que eles (próprios) estabeleceram86.

iw-ms sxsw aHA Hr n Hnwt.f awAyt iTt.tw xt.f nbt

Na verdade, os mensageiros (dos ricos) lutam pelos seus bens; o ladrão tem todas as suas coisas tomadas.

iw-ms awt nbt ib.sn rmw mnmnt Hr imt m sxrw tA

Na verdade, todos os animais têm os seus corações a chorar; o gado geme por causa do estado do país.

iw-ms msw wrw Hwi{t}.tw r sAwt Xrdw nw nH[b]t di.tw Hr qAn-r tA

Na verdade, as crianças dos grandes foram atiradas contra as paredes; as crianças de colo foram abandonadas nas terras altas87.

Xnmw Hr imt Hr wrdw.f iw-ms Sad smA.st

Khnum lamenta-se porque está cansado88. Na verdade, o terror89 mata!

snDt Hr xsf irw r xftyw.tn iw grt andw twt tw wDAw Hr nty ktw

O homem tímido repele aqueles que agem contra os vossos inimigos. Agora, os homens pequenos90 usam poucas imagens divinas e amuletos.

5,3 T

5,4 T

5,5T

5,7 T

5,6 T

5,8T

Page 22: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

264

in iw m Sms n xnty Hna wda.f in iw m rxs n mAyw ASr n sDt

Está a servir Khenti e o homem que ele despedaçou? Está a matar em grande número para o Leão, queimando no fogo91?

in [iw] m iwH n ptH iTt inyt dd.tn n.f Hr-m

Está a molhar para Ptah, os materiais foram aceites92? Porque razão vós dais para ele?

n pH sw ind is pw dd.tn n.f iw-ms Hmw Hr HqA [... ...] xt tA

A miséria não o consegue alcançar com o que vós fazeis por ele? Na verdade, os servidores governam … … por todo o país.

nxt Hr hAb n bw nbw Hw s sn.f n mwt.f iSst pw irywt

A violência é enviada para todo o lado. Um homem espanca o seu irmão, (o filho) da sua mãe. O que é que foi feito93?

Dd.i n Aqw iw-ms wAwt xwiw mTnw sAw

Eu digo que foi o sofrimento! Na verdade, os caminhos estão vigiados e as estradas guardadas.

Hms.tw Hr bAwt r iit.tw xAwy r iTt Atpw.f

Sentam-se nos arbustos até que venha o viajante nocturno, de modo a apanhar-lhe a sua carga.

nHmw nty Hr.f xnmw m sxt nt xt Xdbw m nfw

O que ele carrega é roubado, é espancado com golpes de pau e morto injustamente.

iw-ms nfAy Aqw mAA sf tA spw n gnnwt.f

Na verdade, aquilo que víamos ontem está arruinado94; a terra está abandonada à sua debilidade,

5,9 T

5,10T

5,11 T

5,13 T

5,12T

Page 23: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

265

mi wHAw mHyw nDsw pryw nmtywt Hr swnw nbyw [...]

como o linho quando é cortado. Os homens de baixo nível saem e movimentam-se95 por causa da aflição. Os ourives …

[...] nw [...] HA rf grH pw m rmT n iwr n msit

… … isto … … Oxalá isto possa ser o fim da espécie humana, não se conceberá mais, nem se nascerá!

ix gr tA m xrw nn Xnnw iw-ms [wnm.tw] m smw

Então, a terra em barulho silenciar-se-á e não haverá mais distúrbios96. Na verdade, comem-se97 pastos,

samw.tw m mw n gmi.n.tw qAAyw smw Apdw

que se ingerem com água, pois não se encontram mais grãos, vegetais ou aves.

nHm.tw pryt m r n SAw n Hr [Dd.tw] an n.k st r.i xr Hqrw

Roubam-se (até) os frutos da boca dos porcos; não se dirá mais: «Isto é mais agradável para ti do que para mim», por causa da fome.

iw-ms it Aqw Hr wAwt nb(t) sHAiw m Hbsw XsAyt m mrHt

Na verdade, os cereais foram destruídos por todo o lado; despidos da (sua) roupagem e de grãos com óleo.

Hr nbw Hr [Dd] nn wn wDAw fk sAw.f pd r tA

E todos dizem: «Não há nada». Os armazéns estão vazios, os seus guardas estão estendidos no chão.

m smw m rwd pw n ib.i iw.i Dr rssy HA rf iri.n.i xrw.i

Será isto uma forte ajuda para o meu coração? Eu estou completamente acabado. Pudesse eu levantar a minha voz

5,14T

6,1T

6,2 T

6,4 T

6,3 T

6,5T

Page 24: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

266

m tAy At nHm.f wi m-a wxdt.i irwt im st iw-ms xnrt Dsr

neste momento e isso salvar-me-ia do sofrimento que faz ali isto. Na verdade, a câmara sagrada

Sdi sSw.f sHAw st StAw wnt iw-ms HkAw sHAw

foi privada dos seus escritos e o lugar dos segredos foi revelado98. Na verdade, as fórmulas mágicas foram reveladas;

Smw sxnw snHA tw Hr sxA st in rmT iw-ms wn xA[w]

presságios e encantamentos99 tornaram-se ineficazes por serem repetidas pelo povo100. Na verdade, os escritórios foram abertos,

Sdi wpt.sn xpr rmT Dt m nb Dt iw-ms sSw smA.tw

os seus inventários foram levados e as pessoas que eram servos tornaram-se senhores de servos. Na verdade, os escribas são mortos

Sdi sS.sn bin wy n.i n indw m rk iry iw-ms sSw nw tmA

e os seus escritos levados. Ah, como foi má para mim a miséria dessa época! Na verdade, aos escribas dos cadastros101

Drw sSw.sn anxt n[t] kmt m hAy.i int n.i iw-ms hpw

destroem-lhes os escritos; os grãos da vida do Egipto são (agora) uma propriedade (onde) eu desço e trago comigo102. Na verdade, as leis

nw xnrt dw r-xnty Sm.tw ms Hr.s m iwwyt Hwrw

da câmara do conselho103 são deitadas fora e, de facto, caminham sobre elas nos lugares públicos; os miseráveis

Hr ngt im m-Xnw mrwt iw-ms Hwrw spr r a

partem isso no interior das ruas104. Na verdade, o miserável atinge o braço

6,6 T

6,7 T

6,8T

6,10 T

6,9T

6,11 T

Page 25: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

267

psDt sHAw sSmw pf mabAyt iw-ms xnrt wr m pri hAi.f

da Enéade; aquele procedimento da «Casa dos Trinta»105 foi revelado. Na verdade, a «Câmara do Grande Conselho» está com (gente) que vai e vem

Hwrw Hr Smt iyt m Hwt-wryt iw-ms msw wrw

e os miseráveis vão e vêm das «Grandes Casas». Na verdade, as crianças dos grandes

xAa m mrwt rx Hr [Dd] tyw wxA Hr [Dd] m biAw

são atiradas para as ruas; o sábio diz «É assim!», o ignorante diz «Não é!»

nty n rx.f sy an m Hr.f iw-ms wnw m wabt di.tw Hr qAn-r tA

e aquilo de ele não saber nada é agradável para ele. Na verdade, aqueles que estavam nos locais de embalsamamento foram abandonados nas terras altas;

sStAw pw n wtw Hr sxrw Hr.f mtn is xt wAw.ti r qAi

os segredos dos embalsamadores caíram por causa disso106. Olhem, de facto o fogo há muito que se eleva,

pri wbdt.s r xftyw tA mtn is iri xt n pA xpr wAw

ele arde erguendo-se contra os inimigos do país. Olhem, de facto foram feitas coisas que nunca tinham acontecido antes:

Sdi nsw in Hwrw mtn qrs m bik{w} m Sfdywt

o rei foi roubado por miseráveis107. Olhem, aquele que foi enterrado como um falcão108 está (agora) num féretro de madeira109;

iw imnt.n mr Swt mtn is Hrw-r sSwAw tA m nswyt

o que a pirâmide ocultava está vazio. Olhem, de facto, além disso, o país foi privado da realeza,

6,12T

6,13 T

6,14T

7,2 T

7,1T

7,3 T

Page 26: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

268

in nhy n rmT xmw sxrw mtn is wA r sbiw Hr iarat

por alguns homens que ignoram conselhos. Olhem, de facto, aventuraram-se a cair em rebelião contra a iaret110,

nxt nt ra shr tAwy mtn sStAw n tA xmm Drw.f

o poder de Ré que pacifica as Duas Terras. Olhem, o segredo do país, cujos limites são desconhecidos,

sHAw Xny whn.n.f n wnwt mtn kmt wA.ti r stt mw

foi divulgado; a residência real111 foi derrubada num momento. Olhem, o Egipto pôs-se a verter água;

di mw r tA iTt.n.f nxt a m mAirw mtn Sdw qrHt

aquele que deitava água na terra conduziu o poderoso à miséria112. Olhem, o espírito da serpente113 foi tirado

m tpHt.s sHAw sStAw n nsyt bit mtn

do seu covil; os segredos dos reis do Alto e do Baixo Egipto foram desvendados. Olhem,

Xnw Hr snDt m gAwt nb tw rwd HAayt nn xsf-a

a residência real tem medo da miséria e o senhor114 lutará firmemente sem oposição.

mtn tA Ts n.f Xr smAyw qn Xsy Hr nHmw xt.f

Olhem, o país está em dificuldades sob o domínio de quadrilhas; ao homem corajoso, o cobarde roubou as suas propriedades.

mtn qrHt Hr mw mi nnyw tm iri n.f DbAt m nb HAt

Olhem, o espírito da serpente está na água como os mortos; aquele que nem um sarcófago podia fazer, é (agora) senhor de um túmulo.

7,4 T

7,5 T

7,7 T

7,6T

7,8T

Page 27: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

269

mtn nbw wabt dr Hr qAn-r tA tm iri n.f qrs m nb pr-HD

Olhem, os senhores dos lugares de embalsamamento foram expulsos para as terras altas; aquele que nem um caixão podia fazer, é (agora) senhor de um tesouro.

mtn is nA xprw rmT tmw qd.n.f at m nb(t) Driwt mtn qnbt nt tA

Olhem, de facto, para as transformações do povo! Aquele que não podia construir uma (simples) sala, tem (agora) todas as paredes. Olhem, os tribunais do país

dr.ti r-xt tA dr m prywt nsywt mtn Spswt Hr Sdw

foram reprimidos em todo o país; aquele que (antes) era reprimido está (agora) nas casas reais. Olhem, as grandes damas estão em jangadas;

wrw m Sna tm sDr Hr Drit m nb Hnkyt

os grandes estão no armazém115. Aquele que nem num quarto podia dormir é (agora) senhor de uma cama.

mtn nb xt sDr ibi dbH n.f tAHw.f m nb sxrw

Olhem, um senhor de posses passa a noite sequioso; aquele que pedia restos para si é (agora) um senhor de taças a transbordar.

mtn nbw DAywt m isywt tm sxt n.f m nb pAqt

Olhem, os senhores de túnica (agora andam) com farrapos; aquele que não podia tecer para si, é (agora) senhor de linho fino.

mtn tm mDHw n.f imw m nb aHaw nbt iry Hr gmH

Olhem, aquele que não podia construir para si próprio um barco, é (agora) senhor de barcos; os senhores disso olham

st nn st m-a.f mtn iwty Swyt.f m nb Swyt nbw Swyt m wxA

para isso e isso não está na sua mão. Olhem, aquele que não tinha a sua sombra116, é (agora) senhor de uma sombra; os senhores da sombra estão na rajada de vento

7,9 T

7,10T

7,12T

7,11T

7,13T

Page 28: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

270

n Daw mtn xm DADAt m nb bnt tm Hsy n.f

da tempestade. Olhem, aquele que ignorava a lira, é (agora) senhor de uma harpa; aquele que não cantava para si próprio

Hr swhi mrt mtn nbw wDHw m biA n wnxw hnw n wa im

(agora) exalta Meret117. Olhem, os senhores que tinham jarras de oferendas de bronze118, (agora) nenhuma jarra está vestida para um único deles.

mtn sDr xAry m gAw gm.f Spss tm n.f mAA

Olhem, aquele que dormia sem mulher porque não tinha, encontrou a abundância; aquele que não era visto

aHa Hr swdn mtn iwty xt.f m nb aHaw wr Hsy.tw.f

levanta-se porque (agora) está pesado 119. Olhem, aquele que não tinha bens é (agora) senhor de riquezas e o grande favorece-o.

mtn SwAw nw tA xpr m xwdw [nb] xt m iwty n.f

Olhem, os pobres de terra tornaram-se ricos e o senhor com posses (tornou-se) naquele que não tem nada.

mtn wdpw xpr m nbw wbAw wn m wpwty

Olhem, os cozinheiros tornaram-se senhores dos copeiros; aquele que era um mensageiro,

Hr hAb ky mtn iwty pat.f m nb mXr Hnt Sna.f

(agora) manda outro. Olhem, aquele que não tinha pão, (agora) é senhor de um celeiro; o seu armazém120 está cheio

m xwt ky mtn wSw Sny iwty mrHt.f xpr m nb xbbt

dos bens de outro. Olhem, aquele a quem cairam os cabelos e que não tinha o seu óleo, tornou-se senhor de jarros

8,1 T

8,3 T

8,2T

8,4T

7,14T

Page 29: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

271

antyw nDm mtn iwtt m pdsw.s m nbt Atp gmHt Hr.s

de mirra doce. Olhem, aquela que não tinha uma caixa, é agora senhora de um cofre121; aquela que via o seu rosto

m nw m nbt anx mtn isx mtn nfr s Hr wnmw kAw.f snm xt.k

na água, (agora) é senhora de um espelho122. Olhem, de facto olhem123! Um homem é feliz quando come a sua comida: «Consome o teu bem

m Aw ib nn n.k HnHn r.k Axw pw n s wnmw kAw.f wD sw nTr

na largura do coração e sem entraves!» É excelente quando um homem come a sua comida. Deus ordena

n Hsy n.f [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... mtn is xm] nTr.f Hr wdnw n.f

para aquele que o glorifica …………………………………… Olhem124 de facto, aquele que ignorava o seu deus, (agora) faz-lhe oferendas

m snTr n ky n rx.n.f mtn Spswt wrywt nbt Spssw

com incenso de outro, sem o seu conhecimento. Olhem, as mulheres ricas e as grandes damas, senhoras de grandes riquezas,

Hr rdi n msw.sn n Hnkyt mtn is s [... ... ... ... ...] Spst m Hmt

dão as suas crianças por uma cama. Olhem, de facto um homem ……………125 uma grande dama como esposa

nxw.n sw it.s iwty Hr smA.f mtn nsw qnbt m

o pai dela protegia-o, (agora) um indigente126 pode matá-lo. Olhem, as crianças dos magistrados estão em

is[ywt ... ... bHs] nw Htw.sn n HAqyw mtn nsyw

andrajos. Os bezerros das suas vacas127 …… para os ladrões. Olhem, os dependentes reais

8,6T

8,8T

8,5 T

8,7 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ⅓ de linha

8,9 T

- - - - - - - - -1/5 de linha

8,10 T

- - - - - - - - - 1/5 de linha

Page 30: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

272

Hr qnqn m iwAw mAi[r xpr m HA]qwy mtn

espancam o gado e os miseráveis tornam-se ladrões. Olhem,

Tm sft n.f Hr sft wnDw xm Hn Hr mAA

aquele que nunca abateu (gado) para si, (agora) mata touros128; aquele que nunca controlou a boca, contempla (agora)

[stpt m sxrw] nb mtn nsyw Hr qnqn m rw

todo o tipo de alimentos (bem) escolhidos. Olhem, os dependentes reais matam gansos

ddwt nTrw r DbAw iwAw mtn Hmwt [... ...]

e dão-nos aos deuses em recompensa dos touros de cornos largos129 Olhem, as dependentes ……

Hr wdnw ApHw Spswt iry [... ...] mtn Spswt

de oferendar aves130; as grandes damas ……131 Olhem, as grandes damas

Hr sxs[x] m rwwt wat [ibw].sn ptxw m snD n mwt [mtn] Hrw

estão a fugir de uma partida só; os seus corações lançam-se ao chão com medo da morte. Olhem, os chefes

nt tA Hr sxs[x] nn Hnt.n.sn m-a gAwt nb Hs[wt mtn]

do país132 fogem; eles não têm ocupação porque lhes falta um senhor que os elogie. Olhem,

nbw Hnkywt Hr sAtw sDr btkw rf m Adt n.f Sdw

os senhores que tinham camas (agora) estão no chão; aquele que passava a noite na imundice, pois (agora) prepararam-lhe um tapete de pele.

8,12 T

8,14 T

8,11T

- - - - - - - - - - 1/6 de linha

8,13 T

- - - - - - - -1/5 de linha

9,1 T

Page 31: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

273

mtn Spswt wAw r Hqrw nsyw sAit m irit.n.sn

Olhem, as grandes damas caem na fome; os dependentes reais estão saciados com o que foi preparado para eles.

mtn iAwt nbt nn st r st.s{t} mi idr tnbX nn sAw.f

Olhem, nenhuma função está no seu lugar133, como uma manada dispersa sem o seu guarda.

mtn kAw m wDyw nn nwyw st s nb Hr iniwt n.f Abw m rn.f

Olhem, os touros134 desencaminham-se sem ninguém que cuide deles. Cada homem agarra (os touros) para si e marca-o a fogo com o seu nome.

mtn smAw.tw s r-gs sn.f iw.f Hr hAi isk sw r mkt Haw.f

Olhem, um homem é morto ao lado do seu irmão; ele cai enquanto135 ele (o irmão) protege o seu (próprio) corpo.

mtn iwty Htr.f m nb m idr tm gmi n.f skA

Olhem, aquele que não tinha uma junta de bois sua, (agora) é senhor de uma manada. Aquele que não encontrava por si próprio bois para lavrar,

m nb mnmn(t) mtn iwty prt.f m nb Snwwt ini n.f TAbt

(agora) é senhor de gado. Olhem, aquele que não tinha grãos seus, (agora) é senhor de celeiros; aquele que tinha que ir buscar grãos,

m dd pri st mtn iwty sAHw.f m nb mrt wn wr

(agora) garante a sua saída. Olhem, aquele que não tinha dependentes, (agora) é senhor de servos. Aquele que era um grande,

m irr.f wpwt Ds.f mtn qnw nw tA n smi.n.sn xrw n rxyt

(agora) ele próprio faz as suas mensagens. Olhem, os homens poderosos da terra não são mais informados do estado136 das pessoas comuns.

9,3T

9,4 T

9,5 T

9,2 T

9,6T

Page 32: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

274

wAw r Aqw mtn Hmw nb n bAk.sn

Caem na ruína! Olhem, nenhum artesão trabalha;

sSwAw xftyww tA Hmwt.f [mtn sS] Smw

os inimigos do país esvaziaram-no de trabalho artesanal. Olhem, aquele que registava (os resultados) da colheita,

n rx.f im tm skA n.f [... ... ...] Hr xpr

(agora) não sabe nada acerca disso. Aquele que não podia trabalhar para si próprio ……… … acontece,

n smi.n.tw.f sS [bAgiw] awy.fy m Xnw.f HDi

mas já não pode ser anunciada. O escriba, com os seus braços frouxos, está em sua casa. Está destruído137

[... ... ... ... ... ... ...] .f m rk iry mAA s [n sn.f mi]

... ... ... ... seu ... ... ... naquele tempo. Um homem vê o seu irmão como

DAyw.f fn Hr int qbH [Hr tAw ... ... ... ...]

seu inimigo; (agora só) o homem fraco traz a calma em vez da cólera ... ... ... ...

[arr]yt snDw n [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] iw Hwrw

a porta do medo. Não ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... os pobres

[... ... ... ... ... ... ...] n tA Hd.s Hr.s HDi [... ... ... ... ... ... ...]

... ... ... ... ... ... e a terra não se ilumina por causa disso. Destruído está … … … …

kAw iry m-a.sn [... ... ... ... ...] snD n Hryt.f dbH nDs

a comida deles … … ... ... ... medo do seu terror; o homem comum pergunta

9,8 T

9,7 T

- - - - - - - - - - - 1/6 de linha

9,9T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ⅓ de linha

- - - - - - - - - - - ⅓ de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 5/6 de linha

9,10 T

9,11 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ⅓ de linha

- - - - - - - - - - - ⅓ de linha

9,12 T

- - - - - - - - - - - ¼ de linha

Page 33: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

275

[... ... ... ... ...] wpwty n is [... ... ...] rk itt.tw.f Atp

… … … … um mensageiro. Este não é … … … o momento. Apoderam-se dele carregado

m xt.f nHmw [... ... ... swA].tw Hr sbA.f [... ... ...] ?

com os seus bens, apropriam-se … … … passa-se à sua porta. … … … ?

HAy Drit m xA at Xry bikw nrwt [... ... ...]

do lado de fora dos muros, na oficina, e são as habitações quem têm falcões138 e abutres; … … …

[sSs]p in nDs rs.f tA HD Hr.f nn Hryt.tw.f sxs.tw Hr mAaw

fazer brilhar. O homem comum está vigilante? O dia nascerá sobre ele, sem ele ter medo disso. Correm sobre as têmporas139,

Xnkw m wryt tAyt m Xnw imAww pw ir(w).n.sn mi xAstyw

passam através de um pano que é uma mortalha dentro de casa140; eles fazem tendas como os estrangeiros141.

HDi irt hAb.tw Hr.s in Smsw m wpwtw nbw.sn

Destruídas estão as missões142 para as quais os servidores fiéis foram enviados (pelos) seus senhores

nn Hryt.sn mk 5 s pw Dd.sn Dd.sn Smw Hr wAt

e eles não têm medo. Olha, há cinco homens que falam! Eles dizem: «Vão pela estrada

rx.n.tn iw.n spr.wyn rmy rf tA-mHw Sna n nsw

que conheceis; nós chegámos». O Baixo Egipto chora. No armazém do rei

10,1 T

10,2T

10,3T

- - - - - - - - - - - ¼ de linha

- - - - - - 1/6 de linha

9,13T

9,14 T

- - - - - - - ¼ de linha

- - - - - - 1/6 de linha

1/6 de linha- - -

Page 34: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

276

hAy.i in.tw n.i n bw nbw iw pr-nsw anx wDA snb r-Dr.s xmt bAkw.f

«Eu acedo e trago» é tudo para todos. A casa real, v. p. s., na sua totalidade143, desconhece os seus rendimentos.

ntf it bty Apdw rmw ntf HDt pAqt biA mrHt ntf

Pertencem-lhe a cevada e o trigo, as aves e os peixes. Pertencem-lhe as roupas brancas de linho e o linho fino, o bronze e o óleo; pertencem-lhe

psS(t) qn sSnw qniw bAkw nb nfr ii.f irw irw

os tapetes e as esteiras, os lótus144 e os fardos145, todos os bons produtos que ele produzia146.

DfAw skt st m pr-nsw anx wDA snb nn Swt m [... ...] nf

Se o aprovisionamento foi destruido147 na casa real, v. p. s., não evitam ... ... aquilo.

HD xftyw nw Xnw Spst sbq qnbt [... ... ...] im.f mi

Destruí os inimigos da magnífica residência real com esplêndidos magistrados ... ... ... com ele como

[... ... ... ... ... ...] Smw ms (i)m(y)-r niwt nn saSA n.f HD xftyw

… ... ... ... ... Aquele que dirige a cidade passeia sem uma escolta para si. Destruí148 os inimigos

nw Xnw Spst sbq [... ...] HD xftyw nw Xnw pf Spst

da magnífica residência real com esplêndidos ... ... Destruí os inimigos desta magnífica residência real

aSA hpw [... ... ... ... ... ...] ? [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

com numerosas leis; … ... ... ... ... ? … ... ... ... ... … ... ... ... ... … ... ... ... ...

10,7 T

10,5T

10,8 T

10,4T

10,6 T

- - - - - 1/7 de linha

¼ de linha - - - - - - - - -

- - - - - - - - - Uma linha

10,9 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ¼ de linha

Page 35: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

277

Hd xftyw nw Xnw pf Spst [... ... ... ... ... ...] ?

Destruí os inimigos desta magnífica residência real … ... ... ... ... ?

Hd xftyw nw Xnw pf Spst [... ... ... ...] nn aHa.n.tw [... ... ... ...]

Destruí os inimigos desta magnífica residência real … ... ... ... Não podemos manter-nos de pé … ... ... ...

Hd xftyw nw Xnw pfA Spst aSA xA{m}w iw-ms

Destruí os inimigos desta magnífica residência real, de numerosos escritórios149. Na verdade

[... ... ... ...] ? sXAw txb [... ... ...] wxdyw r mnt.f

… ... ... ... ? Lembrem-se150 de irrigar … ... ... ; alguém que sofre

Ha.f try n [... ...] Hr nTr.f mk.f r [... ... ...]

do seu corpo, o respeito de ... ... relativamente ao seu deus, guarda a (sua) boca ... ... ...

msw iry mtyw Hr Hwi wDnw sxAw sxwd Snwt

cujas crianças testemunham grandes espancamentos151. Lembrem-se de fazer subir152 o celeiro,

Spw m snTr xrpw mw m Hst m nhpw sxAw

sair perfumando com incenso153, de oferendar água num jarro logo ao. amanhecer Lembrem-se

rw Dd[A]w trpw stw wdnw Htpw-nTr n nTrw sxAw

(de trazer) gansos cinzentos gordos, gansos de cabeça branca e gansos do Nilo154 (para) oferecer oferendas divinas aos deuses. Lembrem-se

10,13T

11,2 T

10,10T

- - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

10,11T

1/6 de linha- - - - -

1/6 de linha- - - - -

10,12T

- - - - - 1/5 de linha

- - - - - - 1/4 de linha

11,1 T

Page 36: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

278

wSa Hsmn sspd tw HDw in s hrw iwH tp sHAw

do natrão mastigado155, da preparação dos pães brancos por um homem no dia em que se humedecer a cabeça156. Lembrem-se

saHa snw xti abA wab Hr twry r-prw Hwt-nTr

de erguer mastros de bandeiras e de esculpir mesas de oferendas, enquanto o sacerdote limpa os santuários, o templo

sqAHA.ti mi irTt snDm st Axt srwD pAwt

é emplastrado (de branco) como157 leite, se perfuma o horizonte158 e se perpetuam as oferendas de pão.

sxAw nDrw tp-rdw SbSb sww Sdt bs m wab(w)t

Lembrem-se da observância das regras159, da ordem correcta das datas (dos rituais), de impedir que alguém entre para o serviço do sacerdócio

r Xst Xt irt st pw m nf sswn ib pw [... ...] hrw xnty HH

com o corpo impuro160: fazer isto será errado e destrói o coração ... ... … do dia que está à cabeça da eternidade,

Abdt tn ip rnpwt rx sxAw sft iwAw [... ... ... ... ... ... ...]

os meses foram contados e os anos conhecidos161. Lembrem-se de sacrificar bois ... ... ... ... ... ... ...

m tp na[a]w.tn sxAw pri wxA s iaS n.tn rdt rw

do melhor das vossas aparências suaves. Lembrem-se de ir purificar o homem que vos invocou162, de pôr gansos cinzentos

Hr xt [... ... ... ... ... ... ...] wpwt dsy dr [...] mryt nt

no fogo ... ... ... ... ... ... ... mensagem, jarro. ... de suprimir ... das margens dos canais de

11,5T

11,4 T

11,3 T

11,7T

11,6 T

- - - - - - - - - - - - - ⅓ de linha

11,8T

- - - - - - - - - - - - - - ⅓ de linha

Page 37: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

279

nwy [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] ? nt Hmwt

irrigação ... ... ... ... ... ... ... ... ...... ...? das mulheres.

[... ...] [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] ? mnxwt [...]

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ? roupa ...

[... ... ... ...] rdit iAwt [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

... ... ... ... fazer adorações ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

r sHtp.tn [...] [... ... ... ...] m gAw rmT mi iw [...

para vos agradar. ... ... ... ... ... para sortilégio da humanidade. Faz vir ... ...

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] ? n ra wDw.n [...] [... ... ...] Hr try sw

... ... ... ... ... ... ... ... ... ? de Ré, ordenar … ... ... ... respeitá-lo

m naw r imntt r andw [... ...] in nTrw

na viagem para o Ocidente para alguns ... ... ao lado dos deuses.

mtn sw Hr Dar qd rmT Hr-ma n tny snDw r

Olhem, porque procura ele dar forma à humanidade163 sem distinguir o homem tímido do

sxmw ib iw ini n.f qbHw Hr tA iw Dd.tw sAw pw n bw-nbw

homem violento? Se ele for despejar água fria sobre a chama164, dizem: «Ele é o guardião de todos;

11,13T

12,1T

- - - 1/6 de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

11,9 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 7/8 de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

11,10 T

1/5 de linha - - - - - -

11,11 T

1/5 de linha- - - - - - - - - -

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

- - 1/8 de linha

11,12T

Page 38: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

280

nn bin m ib.f and iAdr.f iri.n.f is hrw r nw st xt n ib iry

o mal não existe no seu coração». Os seus animais165 são poucos, mas ele age (todo) o dia com isso e há fogo nos seus corações166.

HA aD.f bit.sn m Xt tpt kA Hwi.f sDbw

Ah! Se ele tivesse percebido as suas qualidades na primeira geração! Então ele poderia ter derrotado completamente o mal,

DAi.f a r.s sky.f mtwt iry iwat.sn Abb.tw mst r.s

podia ter estendido o seu braço contra ele e destruído o seu sémen e a sua hereditariedade. (Mas como) o seu nascimento foi desejado,

nHAt-ib xpr sAry Hr wAt nbt nfA pw n wni.f wn nA nTrw

a tristeza aparece e a miséria está por todo o lado. Assim foi! E não acabará (enquanto) os deuses

Hr-ib iry prr styt m Hmwt rmT n gmi.n.tw Hr wAt Hwi ny r Hr pri

não estiverem entre eles. A semente virá das mulheres da espécie humana; não será encontrada num caminho! Por causa disso os combates aparecerão

Dri.n iww m sxpr.n.sn n iaS-n-HAt m wnwt.sn in iw rf tny

e aquele que pune o mal é (agora) o seu criador. Não há piloto nas suas horas167! Onde está ele

min in iw.f tr sDr mtn n mAA.n.tw bAw iry

hoje? Estará neste momento a dormir? Olhem, o seu poder não se vê!

ir snm.n.tw n gmi.n.i tw n iaS.n.tw n.i m Sw Adyw r.s

Mas se nós estivéssemos tristes eu não te encontraria e ninguém me teria chamado em falta para ser agressivo contra eles168!

12,4T

12,6T

12,3 T

12,5 T

12,2 T

Page 39: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

281

sswn ib pw xnt grt Hry r n bw-nbw min is snD st r s HHw

O coração está destruído! Agora o assunto está em cima da boca de toda a gente e hoje169 o medo deles é maior do que de milhões

m rmT n mAA [... ...] r xftyw [... ... ... ... ... ... ...] Xnnw r

de humanos. Não se vê ... ... para os inimigos170;... ... ... ... ... ... ... tumultos no

xnty.f aq r Hwt-nTr [... ... ...] rmi n.f xntyw [... ... ... ... ...]

seu salão de entrada para o templo ... ... ... aqueles que presidem ... … choram. ... ... ... ...

pf iri shA Ddt.f pw [... ...] n xr tA [... ... ... ... ...]

Aquilo ... ... que fez o caos171; as suas palavras ... ... A terra não caiu ... ... ...

wbdt twtw ad iswy iry nwi [... ... ...]

as imagens arderam e os seus túmulos foram destruídos. Aquele que guarda ... ... ...

mAA.f hrw n [... ...] nb tm iri.n.f mH iwd

vê o dia ... … . O senhor do universo172 teve a preocupação de criar

pt r sAtw snD Hr Hr-nb in iw ir m iri.f st m pH.ti.n n ms.f r.s

o céu separado da terra, mas o medo está em cada rosto quando ele vem. Se ele faz isto quando nos ataca, quem nos estenderá a mão173 contra isto

msdd.k nHm Hw sai mAat Hna.k shA pw

se tu nos repudiares e fores embora174? Hu, Sia e Maat175 estão contigo, (mas) foi o caos

12,7 T

12,10T

- - - 1/6 de linha

- - - - - - - ¼ de linha

12,9T

- - - - - - - ¼ de linha1/5 de linha

- - - - -

12,8T

- - - - - - - - - - ⅓ de linha

- - 1/9 de linha

- - - - - 1/5 de linha

12,11 T

- - - 1/6 de linha

12,12T

Page 40: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

282

rdi.k xt tA Hna xrw Xnnw mk ky Hr wdi r ky

que tu espalhaste através da terra junto com o barulho do tumulto. Olhem, um homem agride outro homem;

sny.tw r wD.n.k ir Smt 3 s Hr wAt gmm.tw m 2 s in aSA

eles transgridem o que tu ordenaste. Se três homens caminharem por uma estrada, só dois homens poderão ser encontrados: o grande número

smAw andt in iw rf sAw mri mt xr kA wD.k iri.tw

mata o pequeno número. Deverá um guardião amar a morte? Sendo assim, poderás ordenar que se faça isto:

Sbi.n mrwt is pw wa msd ky and xprw.sn pw Hr wAt nbt

na verdade, substitua-se um (homem) que ama por outro que odeia e serão poucas as suas formas por todo o lado!

iri.n.k ist r sxpr nfA dD.n.k grg tA m kAkA sHtmw

Enquanto tu agias (assim) criaste isto! Tu falaste mentira e a terra encheu-se de ervas daninhas que destruiram

rmT n kAi.tw m anx nn r Aww n rnpwt m HAayw

a humanidade. Não se pode pensar que isto seja viver! Todos estes anos têm sido um estado de guerra:

Xdb.tw s Hr tp-Hwt.f iw.f rs.f m pr.f n TAS in qni.f

pode-se matar um homem debaixo do seu próprio tecto. Ele tem que estar atento ao limite da sua casa. Se ele for forte

nHm.f sw anx.f pw hAb.tw bAwt r nDsw Smt.f

salvar-se-á. Isto é a sua vida! Eles enviam emboscadas176 (mesmo) contra pessoas comuns! Ele irá

13,1 T

13,3 T

12,14T

13,2 T

12,13 T

13,4 T

Page 41: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

283

Hr mtnw r mAA.f wDnw itHw.tw wAt aHa.f snni

pelos caminhos até ter a inundação à vista! Eles submergem o caminho e ele fica em perigo.

nHm ntw Hr.f xnm m sx nt xt Xdbw m nfA

O que ele carrega é roubado! É espancado à paulada e morto injustamente177.

HA dpt.k m nhy n mAir iry kA Dd.k m xt

Se tu pudesses provar um pouco desta miséria! Então tu poderias dizer

[... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] ? .f m-ma ky m

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ? entre outro numa

inbw m HAw? [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

muralha de ? ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

? Smmw r Xt rnptw iri mdt [... ... ... ... ... ... ... ... ...

? quente para a humanidade ... ... ... anos ... ... fazer um discurso ... ... ... ... ... ... ...

... ... ... ... ... ... ... ...] [... ...] iw irf Hmw nfr aHaw

... ... ... ... ... ... ... De qualquer modo, é tão bom178 (quando) os barcos

Hr xnty [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] [... ... ...]

sobem o rio, ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

13,6T

13,5 T

13,7 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 3/5 de linha

13,8 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

13,9 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - 1/9 de linha

13,10 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

Page 42: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

284

Hr awAyt st iw irf Hmw nfr [... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

os rouba. De qualquer modo, é tão bom (quando) ... ... ... ... ... ... ... ...

iw irf Hmw nfr itHw iAdt mxA.tw Apdw

De qualquer modo, é tão bom (quando) puxamos a rede e prendemos os pássaros

m mSrw iw irf Hmw nfr [... ...] saHw n.sn

ao anoitecer. De qualquer modo, é tão bom (quando)... ... o respeito está nelas

mtnw Hr irt Smt iw irf Hmw nfr awy rmT sxw.sy sn

e as estradas foram feitas para andar. De qualquer modo, é tão bom (quando) as mãos dos homens constroem

mrw Sdi mrw iri.tw mnw m nhwt n nTrw iw irf Hmw nfr

pirâmides, cavam canais e fazem plantações de sicómoros para os deuses. De qualquer modo, é tão bom (quando)

rmT txw swri.sn myt ib.sn nfr iw irf Hmw nfr

as pessoas se embriagam179; quando elas bebem as suas bebidas180 os seus corações ficam felizes! De qualquer modo, é tão bom (quando)

nhm m rw iw bwAw nw spAt aHa(w) Hr mAA nhmw

a alegria está na boca (dos homens) e os notáveis dos distritos se mantêm de pé e contemplam a alegria

m pr.sn Hbsw m HAtyw twryt r HAt srwD m Hry-ib

das suas casas, vestidos de linho fino, a frente purificada e solidamente estabelecidos no interior181.

13,13 T

13,14T

13,11 T

14,1 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - ⅔ de linha

13,12T

1/9 de linha- - - - -

Page 43: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

285

iw irf Hmw nfr ATwtw Adt wrsw n wrw TAr

De qualquer modo, é tão bom (quando) as camas estão preparadas e os apoios de cabeça dos senhores estão firmes

m wDAw sArt nt s nb km.ty m ifdy m Swyt

na sua robustez; (quando) a necessidade de cada homem é satisfeita com um leito à sombra

aA xtmw Hr.f sDr m bAy iw irf Hmt nfr

e uma porta se fecha sobre aquele que dorme nos arbustos182. De qualquer modo é tão bom (quando)

pAqt sS.ti hrw wpt-rnpt [...] Hr wDbw pAqt m sS.ti HAtyw

o linho fino é aberto no dia de Ano Novo183; ... sobre as margens184, o linho fino é aberto e as roupas de linho

Hr stt imy-r HAtyw [...] ? [... ... ... ... ... ... ... ... ...

(estendidas) no chão. Os responsáveis pelas roupas ... ? ... ... ... ... ... ... ... ... ...

... ... ... ... ... ... ... ...] nhwt nDsw Hr [... ... ...] [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

... ... ... ... ... ... as árvores. Os homens comuns ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... …

sn sp HAq[w] [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] pXr iry mi styw

? acções de pilhagem ... ... ... ... ... ... ... ... ... …dando a volta a isso como os Asiáticos

[... ... ... ... ... ... ...] iw.tw Hr sxrw iry qn.sn n.sn nn gmi.n.tw nty

... ... ... ... ... ... Relativamente aos seus planos eles forneciam-se por eles. Ninguém encontrará quem

14,4 T

14,3 T

14,2T

14,5T

- - - - - 1/5 de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ½ de linha

- - - - - - ¼ de linha

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 4 linhas

14,6T

14,10 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 5/6 de linha

14,11T

14,12T

- - - - - - - - - - ⅓ de linha

Page 44: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

286

r aHaw Hr mkt st m THnw aAmw aHA s nb Hr snt.f

esteja destinado a levanter-se e a proteger isto185 dos Líbios e dos Asiáticos. Cada homem combate pela sua irmã

mki.f Haw.f in nHsyw kA iri.n mki.tn saSA aHAwty

e pela sua protecção dos seus próprios membros. São os Núbios? – pergunta-se. Possamos nós fazer a vossa protecção com numerosos guerreiros

r xsf pDt in iw sm TmHyw kA iri.n annw mDAyw

para repelir os estrangeiros! Serão os Líbios186? – pergunta-se. Possamos nós fazê-los recuar! Os Medjai187

nDmw Hna kmt mi m irf s nb Hr smA sn.f DAmw

estão satisfeitos com o Egipto. Como pode, então, qualquer homem matar o seu irmão? As tropas

Ts.n n.n xprw m pDtyw wAw r xbA xprt n.f im.f

que nós próprios comandámos tornaram-se archeiros prontos a destruir(-nos)! Isto deu origem a que

rdit rx styw sSmw n tA iw grt xAsty nb Xrt snDw.f

déssemos conhecimento aos Asiáticos do estado do país! Agora, todos os estrangeiros estão com medo dele188!

dpt n rxyt Hr [Dd] nn dit kmt Say nxt.s Hr Drw.s

A experiência do povo permite dizer: «O Egipto não pode ser dado à areia! Ele é forte por causa dos seus limites189».

[...] Dd r.tn m-xt rnpwt [... ... ... ...] Hr xbA sw Ds.f

... o que vos será dito daqui a uns anos ... ... ... ... como eles próprios se destruíram.

14,14T

14,13 T

15,1 T

15,3T

15,2T

Page 45: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

287

in spw sanx prw.sn [...] im r sanx msw.f wnn [... ...]

É o momento de preservar as suas casas para viver190; ... (quem está) aí faz as suas crianças viverem. Existe ... ...

iw [...] xprwt.tn [... ...] [...] Dd in DAmw [... ... ... ...]

? ... transformar-vos ... … os jovens disseram ... ... ... ...

[... ... ... ... ... ... ... ...] [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...... ... ... ... ... ... ... ... ... ...191

? [... ... ... ... ...] qmiw inHAst aryt [... ... ... ... ...]

... ... ... ... ... ... resina, folhas de lótus, grãos arit192 ... ... ... ... ... ...

m HAw n aqw [...] Ddt.n i-pw-wr wSb.f n Hm n nb r-Dr

pela abundância de provisões ... Foi o que disse Ipu-uer 193 quando respondeu à majestade do senhor de tudo:

[... ...] qmAwt nb xm st pw m nDmt Hr ib iw iri.n.k nfr Hr ib.sn sanx.n.k

«... ... toda a criação. De facto, ignorar isso é agradar ao coração. Tu fizeste o que agradava aos seus corações e mantiveste vivas

rmT im.sn iw Hbsw.sn xnty.sn n snD n dwAyt wn s pw

as pessoas com eles194, mas elas (continuam) a esconder as suas faces com medo do amanhã!» Era uma vez um homem195

Tni tp-a swDA.f iw sA.f m nxn n sArtw.f

idoso que estava quase a morrer e o seu filho era muito novo e não tinha os seus conhecimentos.

15,13 T

15,4T

1/8 de linha- -

1/5 de linha- - - - -

15,5T

- - 1/8 de linha

- - - - - 1/5 de linha

- - - - - - - - -

15,6T

3/5 de linha - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

6 linhas

⅓ de linha - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

⅓ de linha15,12

T

15,14 T

1/6 de linha - - -

16,1T

Page 46: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

288

SAa.n.f xsf Hr kAw.f [...] pw ? ? n wpw.f r.f mdw xr.tn

Ele começou a desabituá-lo da sua comida ... ... ... e ele não podia abrir a sua boca para falar convosco:

itt.tn sw m SAw n xpw rmw [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

vós conduziste-o a um destino de morte196. Chorar ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...197

[...] xt.tn wn tA [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] Hr wAt nbt

... depois de vós. A terra é ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... em todo o lado.

ir iAaS.tn n [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...] rmw rf ?

Se vos chamamos para ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... chorar ?

[...] ? .sn aq r Hwt-kAw niwt wbdw twt [... ... ...] XAtw

os seus ... , entrar nas capelas dos túmulos da cidade (dos mortos) e queimar as estátuas ... ... ... os cadáveres

nt saHw ? nty HAty-a [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

das múmias. ... que governador 198 ... ... ... ... ... ... ... ... ... ..

n xrp kAt [... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...]

para dirigir o trabalho199 ... ... ... ... ... ... ... ... ... ..

16,2 T

16,14 T

- - - - - 1/5 de linha

16,3T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - 9 linhas

17,1 T

4/5 de linha- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

16,12 T

4/5 de linha- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

16,13 T

½ de linha- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

17,2 T

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 4/5 de linha

Page 47: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

289

NOTAS: 1 A falta do início do texto, onde deveria haver uma introdução que nos diria quem era Ipu-uer e com quem é que ele

falava, leva-nos a tomar uma de duas opções: ou traduzimos os verbos no futuro na perspectiva da profecia, ou no presente e no passado, na perspectiva de que quem discursa está a descrever uma situação a que assistiu. É nesta última que nos integramos, como referimos anteriormente, tanto mais que há alguns elementos gramaticais que nos obrigam a isso (cfr. notas 75 e 77, por exemplo). Na primeira frase deu-se a elipse do verbo «dizer», o que, segundo Gardiner, referindo-se especificamente a cartas, acontece frequentemente em textos do início do Império Médio. Mas, noutro local da sua gramática, diz que «frequentemente Dd é idiomaticamente omitido de-pois de Hr» (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 246 e 366). É uma possível ajuda para a datação do origi-nal deste texto.

2 Aqueles que deviam garantir a segurança traem a confiança de quem os colocou naquela missão e tornam-se gatu-nos.

3 Hipótese de Fermat e Lapidus. O caracter isolado antes da frase seguinte, G. A1 ( ), não tem tradução (A. FER-

MAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, pp. 13 e 85). 4 A expressão n Dd significa «recusar» e deve ser seguida de infinitivo (A. H. GARDINER, The admonitions of an

Egyptian Sage, p. 20; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 325). 5 Só com dois caracteres não é possível saber qual a palavra que continuaria na linha seguinte, não sendo possível

por isso avançar com qualquer hipótese de reconstituição da frase que se encontraria neste local. 6 Esta reconstituição do início da quarta linha não tem nada de extraordinário, uma vez que faltam os dois últimos

determinativos normalmente encontrados no final do substantivo colectivo «tropas», «esquadrões» ou «compa-nhias», bem como o pronome sufixo, com função de pronome possessivo, na terceira pessoa do plural, para a frase estar gramaticalmente bem construída.

7 Isto é, «os habitantes do Delta». Os «pântanos» é uma forma de designar a região do Baixo Egipto correspondente ao delta do Nilo, tanto mais que tem o determinativo de região, de local, de cidade ou de país.

8 Hipótese de Fermat e Lapidus (A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, pp. 13 e 86). 9 Os caracteres tanto podem ser o início do substantivo «hostilidade», «ingratidão», shA, como o subs-

tantivo «confusão», o verbo intransitivo «estar em confusão», «ser desagradecido», ou o verbo transitivo «con-fundir», shA, ou ainda o causativo, terceira inflexão, «trazer para baixo», «fazer cair», shAi ou o substantivo «descarga» em sentido médico, shAt (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 237; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 383). As duas últimas, sobretudo a segunda, não parecem integrar este contexto, mas qualquer uma das duas primeiras poderia completar-se no início da linha se-guinte, pelo que a nossa opção de seguir a hipótese de Gardiner é meramente especulativa (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 19).

10 Estes seis caracteres, que se lêem nAyw, não formam qualquer palavra e sem o seu princípio foi-nos impossível determinar que palavra seria.

11 Como já fizemos referência noutros textos, também neste surge a troca dos dois últimos caracteres na palavra tA. 12 «Habitantes do deserto» no sentido de «estrangeiros», uma vez que para os Egípcios o Egipto era o vale do Nilo,

sendo as tribos do deserto consideradas forças hostis e perturbadoras da ordem natural. 13 É a primeira vez que aparece a palavra composta iw-ms, com o significado literal de «mas aí está», variante de ms,

que significa «na verdade» e que se prolongará até 6,14. Esta expressão aparecerá com duas grafias, ou , sendo sempre transliterada no singular. Está sempre escrita a tinta encarnada. Do princípio do texto até

1,9 seria a introdução e entre as linhas 1,9 e 6,14 constituiriam o primeiro poema (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 145 e 186).

14 Para terminar uma frase, este tw só pode ser um pronome demonstrativo de tipo clássico, que por estar no singular a sintaxe determina que venha depois do substantivo de que é determinante, concordando com ele em género (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 85-86).

15 Isto é, «com uma cara agressiva». 16 A tradução da expressão nty wn s não é segura. No Conto do Camponês Eloquente, B1, 120, traduzimos por

«aquele em quem (os grandes têm alguém que é o maior)»; em B1, 335, por «aquele que (tem na verdade a justi-ça)». Aqui parece-nos que o correcto seja: «aquilo que existe no homem», entendendo nós que o último caracter

Page 48: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

290

é a palavra «homem» e não um determinativo.

17 Esta frase expressa a ideia actual do «antigamente é que era bom», ou «no meu tempo é que era». Contudo, o seu significado na cultura egípcia faraónica é bem mais abrangente, tendo um profundo valor moral e sendo um pilar de toda a estrutura do seu pensamento religioso e social. Não significa simplesmente uma fixação a convenções ou hábitos, mas o respeito pela tradição que ensinava o modo correcto de agir. Aquele que se recordava do «on-tem» evitava o mal, aquele que se desligava dele estava destinado à prática do mal sob todas as formas. Quem não estava ligado ao «ontem» promoveria o caos e faria surgir a barbárie, o roubo e, em geral, o crime. Era a eterna luta entre maat e isefet. O «ontem» representava a necessidade de um permanente retorno à «primeira vez», onde tudo era calmo e ordenado. Como se diz no Conto do Camponês Eloquente: «Uma boa acção volta ao seu lugar de ontem» (B1, 140); as más acções eram fruto de quem vivia apenas o «hoje» sem qualquer memória do «ontem».

18 Aqui referenciado não só como rio mas, sobretudo, personificado como deus. 19 Ou seja, a agricultura dependia da inundação e da construção de diques, canais, comportas e outros trabalhos

hidráulicos que era necessário fazer antes dela chegar, para evitar que a inundação se transformasse em desastre impedindo de receber grande parte do seu benefício.

20 O deus Khnum é o criador dos homens, e dos seus kau, a partir do barro na sua roda de oleiro. Esta frase liga-se à anterior, uma vez que se as mulheres não podiam conceber era porque a acção divina fora interrompida.

21 Não é uma observação de regozijo, mas de demonstração do caos instalado. 22 O verbo nqAn não consta do dicionário de R. O. Faulkner, mas encontra-se no dicionário de Á. Sánchez Rodríguez

(Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 249). 23 R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 63 e 325; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egip-

cios, pp. 146 e 502. 24 Ao contrário do que foi escrito em 2,3, aqui o rio é designado por itrw. Neste caso não interessava a sua designa-

ção divina, mas antes a terrena, a física. É uma forma de banalizar a morte: aos mortos é destinada uma morte terrestre sem possibilidade de existência na Duat, uma vez que não há referência às águas celestes que consubs-tanciariam Hapi e davam forma às cheias anuais e à ideia associada de fecundidade e sobrevivência. O volume de mortos é de tal ordem que os rituais funerários acabam por ser abandonados, pondo em risco todo o sistema ideológico-religioso. O rio, que devia ser fonte de vida, passa a estar poluído e a ser lugar de morte. Quando o caos se instala, toda a conjuntura se altera: os homens sofrem e os deuses deixam de se manifestar.

25 A palavra SwAw tem os últimos determinativos trocados. 26 A partícula enclítica m é usada para manifestar um desejo (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 185). 27 As pessoas, tal como as íbis negras, escavavam a terra, sujando as suas roupas de linho branco, normalmente

imaculadas. 28 Segundo a opinião de Helck, é possível que aqui estivesse a palavra wsr (W. HELCK, «Die “Admonitions”

Pap. Leiden 1344 recto», p. 8). É nitidamente a caracterização de um período de caos, com uma grande confusão social em que as classes sociais sofriam alterações profundas, onde os mais pobres se aproveitavam das fraque-zas que impediam os mais ricos de defenderem os seus bens. É neste sentido que é usada a primeira expressão, tudo roda e invertem-se as posições. Não nos parece que esta frase tenha alguma relação com Khnum, uma vez que até já vimos que ele nestas circunstâncias estava inactivo.

29 O adjectivo Hr, «terrível», está mal escrito : tem um plural que não devia ter e uma concordância com imy, o determinativo y, depois do caracter com que deveria terminar. O escriba que escreveu este papiro não deveria ser grande profissional, pois, aparentemente, pretendeu criar, errada e desnecessariamente, um dual, acrescentando a desinência y a um plural mal escrito da palavra raiz. Esta palavra nem representa uma entidade dupla! É uma forma verbal; é um particípio prospectivo passivo, isto é, uma forma verbal do verbo iri que pro-jecta a acção para um futuro subjectivo ou próximo (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 536-537; B. ME-

NU, Petite Grammaire de l’Égytien Hiéroglyphique, p. 135). 30 O significado desta palavra não é totalmente seguro e só aparece no dicionário de Faulkner (R. O. FAULKNER,

Concise Dictionary, p. 324). 31 Cfr. nota 55 de Khufu e os Mágicos; cfr. nota 78 do Conto do Náufrago; cfr. nota 1 de As Profecias de Neferti. 32 Estamos perante uma metáfora: o «barco» é o «Estado» e o «Sul» o Alto Egipto. Entende-se desta frase, e do que

se segue, que houve um colapso no governo no Alto Egipto.

Page 49: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

291

33 O conjunto de caracteres é completamente desconhecido. Não aparecem em qualquer dicionário

consultado. Gardiner, que não transcreve o primeiro caracter, diz que Sethe os translitera por hfp ou Sfp e Fermat e Lapiduz seguem Helck que os translitera por bfp. O primeiro e os últimos, atendendo ao contexto, atribuem-lhe o significado de «saciados». Concordamos com o seu hipotético significado, mas não compreendemos as transli-terações propostas: os quatro últimos caracteres podem ser determinativos, apenas sendo transliterável a desi-nência do plural, podendo o antepenúltimo ser uma redundância, mas o segundo e o quarto devem ser translite-rados, ficando em dúvida o quinto que, em «group-writing», conjuntamente com o sexto, pode representar o ca-racter p. Contudo, provavelmente teremos duas palavras, conforme propomos, ou uma palavra composta. A se-gunda relacionada com peixes, cuja grafia é rmw, conforme surge a seguir. Em todo o caso, qualquer uma de significado desconhecido (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 29; W. HELCK, «Die “Admonitions” Pap. Leiden 1344 recto», p. 10; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte An-cienne, p. 100; A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 52 e 472).

34 Lembramos que neste contexto de desordem os mortos eram lançados ao rio. 35 Julgamos que a forma gráfica usada para chenu seja uma variante de Snw, que significa «rede», com a qual

os passarinheiros faziam armadilhas para apanhar pássaros e os pescadores para peixes (R. O. FAULKNER, Con-cise Dictionary, p. 268; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 425).

36 Como os peixes não pisam, preferiremos na antologia um «sinónimo» mais interpretativo. 37 Não é uma constatação quantitativa mas qualitativa: os homens conscienciosos, os homens de carácter. 38 São tempos em que ninguém ouve a voz da razão e da sabedoria. 39 Quer dizer que as terras de cultura estão ao abandono e sujeitas à desertificação. 40 Esta é uma forma verbal designada por Gardiner de «old perfective». Erman, que descobriu esta forma verbal,

chamava-lhe «pseudo-particípio», como ainda hoje acontece com os autores de língua francesa. É a única forma verbal sobrevivente no Egipto onde se mantiveram as terminações verbais semitas. No fundo é uma forma verbal semelhante à conjugação sDm.f, só que é feita com desinências pronominais específicas: .kwi, .ti, .w, etc. (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, pp. 234-242; G. LEFEBVRE, Grammaire de l’Égyptien Classique, pp. 167-182; B. MENU, Petite Grammaire de l’Égyptien Hiéroglyphique, pp. 141-146).

41 Não nos parece que seja a hipótese avançada por Gardiner, o «povo», uma vez que o povo era o povo egípcio, os Egípcios, como de imediato constataremos; nem a hipótese de Simpson: o «homem». É mais provável que pu-desse ser a hipótese de Fermat e Lapidus: «estrangeiros». Não só reforça a frase anterior, como contrapõe os que chegam aos que aí vivem, uma vez que «pessoas» se refere aos Egípcios (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 31; W. K. SIMPSON, The Literature of Ancient Egypt, p. 213; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 103).

42 Nas linhas 3,2 e 3,3 surgem completamente desgarrados quatro pontos encarnados (em todo o texto só aparece mais um em 3,10 e mal posicionado) que separam conjuntos de palavras gramaticalmente organizadas. Podiam ser usados como ajudas para a correcta respiração que uma boa leitura exige, mas estas marcas gráficas parecem ser mesmo marcas de versos, compostos por dois ou três cola cada uma vez que estamos a trabalhar num poema. Não se percebe é porque é que não foram colocadas outras marcas destas, ou porque é que elas não sobrevive-ram, uma vez que há outras passagens a tinta encarnada.

43 Há uma certa dúvida se esta palavra significa «bronze» ou «ametista». No contexto parece-nos que se enquadra melhor a segunda (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 31; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 173; W. K. SIMPSON, The Literature of Ancient Egypt, p. 213; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Pro-phéties de l’Égypte Ancienne, p. 103; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 152; A. ERMAN, Ancient Egyptian Poetry and Prose, p. 96; C. LALOUETTE, Textes Sacrés et Profanes de l'Ancienne Égypte, I, p. 213; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 178; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 306).

44 Provavelmente a palavra em falta seria «jóias» ou «minerais e pedras preciosas». 45 É interessante numa mesma frase podermos ver a diferença entre o «coração físico», que tem dificuldade em

aguentar tanta necessidade, tornando a saúde precária, e o «coração intelectual», sede do pensamento e dos sen-timentos, que as faz deixar de pensar correctamente.

46 Nesta frase e na próxima continua a descrição do mal que foi feito aos materiais domésticos requintados das mu-lheres nobres.

Page 50: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

292

47 Novamente a ideia de que os deuses estão inactivos. A ideia desta palavra é no sentido de «escravizados», «de

mãos atadas». 48 A partícula enclítica tr, que segue o demonstrativo pw aqui com valor interrogativo, pode significar «na verdade»,

mas para não se confundir com a introdução sistemática da palavra composta iw-ms, preferimos esta tradução. 49 Keftiu era a designação egípcia para Creta, que aqui aparece com o trilítero tyw ( ) duplicado. 50 O contexto aponta mais para que a palavra seja uma variante, ou uma corruptela, da palavra kf,

que significa «descobrir», «despir», «despojar», «limpar» e, portanto, «pilhar», da qual Faulkner apresenta como variantes , , , , e , do que da palavra kfA, cujo signifi-cado é «ser discreto», e cuja única variante apresentada é (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 285).

51 Neste contexto não nos parece que fique bem «é grande», «é importante». Sobre o valor interrogativo de wr cfr. R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 63 e A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 408.

52 Aparentemente o isolamento dos habitantes dos oásis preservava-os da penúria e do mal-estar social, ou pelo menos de grande parte deles, que se faziam sentir no Delta e no Vale.

53 Esta planta já apareceu no texto do Conto do Camponês Eloquente, na lista de produtos que ele carregou nos seus burros (R, 2,2).

54 A palavra sgnn é o substantivo «sebo» ou o verbo «ensebar», que aplicado a animais pode significar «engordar» (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 252). Aqui aparece no plural e com algumas redundâncias, podendo querer significar «pássaros gordos».

55 De facto, por cima da preposição «por» existe um pequeno círculo encarnado, como as habituais marcações de pontuação. Neste caso, a sua existência deslocada e praticamente isolada não faz qualquer sentido.

56 Na continuação do que dissemos na nota 52, esta frase transmite-nos uma certa consciência social e solidariedade dos habitantes dos oásis para com os habitantes do Vale, já que, depois de satisfeitos os rituais, as oferendas que estivessem em excesso em relação às necessidades dos templos, incluindo a alimentação dos sacerdotes, eram distribuídas pelos mais necessitados.

57 Elefantina e Tinis. 58 A tradução desta passagem, e até a transliteração, são duvidosas. Alto Egipto não aparece escrito como em qual-

quer das variantes conhecidas; esta será uma outra grafia a acrescentar. E para a parte deteriorada Gardiner pro-põe uma palavra, no singular, que traduz com ambiguidade: «domínio». Esta tanto pode significar um território como o exercício da autoridade. Na ausência de determinativos que nos induzam para o primeiro significado, julgamos estar na presença do segundo. Destacam-se aqui duas cidades: uma na fronteira sul do Egipto dessa época, importante comercial e militarmente – Elefantina; a outra uma cidade sagrada no Médio Egipto, ainda de localização incerta, e que parece ter sido preponderante sobretudo nas Épocas Pré-dinástica e Arcaica ou, exac-tamente, Tinita – Tinis. Com a desintegração do Egipto, as províncias mais afastadas do Sul começam a falhar com os seus compromissos. Provavelmente estas duas terão sido as primeiras a isentarem-se (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 34; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 174 e p. 192, nt. 23; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 108; I. SHAW e P. NICHOLSON, British Museum Dictionary of Ancient Egypt, p. 288).

59 Numa enumeração de géneros vegetais não nos parece lógico incluir um elemento do género mineral, «um mine-ral azul», conforme é proposto no dicionário de Faulkner. Mantemos por isso a sua denominação egípcia, tal como às outras espécies não identificadas como, aliás, outros tradutores (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 28; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 174; W. K. SIMPSON, The Literature of Ancient Egypt, p. 214; C. LALOUETTE, Textes Sacrés et Profanes de l'Ancienne Égypte, I, p. 214).

60 Estamos em crer que seja uma referência a varas flexíveis usadas em trabalhos entrançados que, genericamente, se designam em Portugal por vimes por serem originalmente provenientes de um arbusto chamado vimeiro, desig-nação comum a algumas árvores e arbustos do género salix, da família das salicáceas. Por extensão, aplica-se o termo a qualquer vara flexível. É neste sentido que usamos aqui esta palavra, uma vez que este tipo de arbustos não parece existir, ou ter existido, no Egipto (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, t. VI, p. 3707; Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. 36, p. 147).

61 Acumula-se a impressão de que, de facto, o escriba deste manuscrito não era um técnico muito qualificado. Há muitos erros e omissões. Aqui, por exemplo, parecem existir os dois casos: a grafia da palavra Hnm apresenta dois determinativos a mais e não tem a desinência do feminino; o contexto parece apontar para a ausência da

Page 51: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

293

preposição «para» ( ) antes de kAt (cfr. R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 170).

62 O restauro desta passagem do início da décima segunda linha é da nossa responsabilidade. A palavra mitw é des-conhecida. Dada a já referida fraca qualidade do escriba, é possível que aqui estejamos a ser suas vítimas. Apa-rentemente não falta nenhum caracter no início desta palavra, uma vez que o espaço existente só permite a con-clusão da palavra anterior. Mas, se por omissão do escriba, ela falta no meio? E se errou também no penúltimo caracter, ou se a transcrição do hierático para o hieroglífico permite a dúvida e o penúltimo caracter é G. W22 ( ) em vez de G. N33 ( )? Em Goedicke observam-se algumas semelhanças. Então a palavra poderia ser mint, isto é, «ração diária» e a frase ficar: «A necessidade de (uma) ração diária põe fim ao palácio». Esta frase já estaria a contexto (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 34; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 104; H. GOEDICKE, Old Hieratic Paleography, pp. 26a e 26b; 46a e 46b).

63 Cfr. R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 286. 64 Entre r-m e m-xmt há um caracter a mais. 65 Parece-nos ser a forma feminina da palavra mAaw, isto é, «presentes», «oferendas», mais do que «verdade», «justi-

ça», «integridade» ou «honestidade» (M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 152 e 161, nota 6; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 102).

66 A palavra água aparece aqui em sentido figurado. Associada às ideias de gerar, manter a vida e purificar, mas também à ideia do exemplo a seguir. Provavelmente teria o sentido de: «Ele é a nossa energia» ou «Ele é o nosso sucesso» mas, sobretudo, «Ele é o nosso caminho», o «bom caminho» (cfr. nota 65 da História de Sinuhe a pro-pósito da afirmação em B 74-75 do Papiro de Berlim 3022: «Ele não deixará de fazer bem a um país que está sobre a sua água»).

67 Não é uma percepção de calvície generalizada, mas a indicação de estatuto social, tal como podemos confirmar em pinturas e relevos: o povo andava normalmente de cabeça rapada e descoberta, e as pessoas mais importantes com perucas.

68 Uma vez que a palavra Sri também quer dizer «jovens», esta frase referir-se-á a «idosos e jovens», não devendo ser entendida como uma indicação do estatuto social de cada um.

69 Por vezes, tal como no princípio da frase seguinte, o verbo «dizer» era subentendido. 70 Ele refere-se ao pai. 71 Aqui já é uma referência ao estatuto social. Estes «grandes» são os nobres, pessoas bem nascidas ou de destaque

social. Uma vez que 4,3 e 4,4 são praticamente iguais a 5,6 e 5,7, resolvemos preencher a palavra msw, «crian-ças», exactamente da mesma maneira.

72 A palavra Hwi está escrita com um caracter inexistente em Gardiner, mas que faz parte da Hierogyphica, com a designação de Z 12 ( ), fazendo por isso parte do programa informático Glyph for Windows que usamos. Con-tudo, já antes víramos este caracter usado por Faulkner numa palavra homófona desta e na expressão Hw-ny-r-Hr (N. GRIMAL, J. HALLOF e D. VAN DER PLAS, Hieroglífica, p. 1Z-1; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 165).

73 Isto é, os bebés eram abandonados e entregues ao calor tórrido das colinas mais próximas. 74 Pela continuação da frase percebe-se que esse local era destinado à mumificação e as pessoas em causa eram os

defuntos que estavam a ser preparados para a vida no Além. 75 Novamente a ideia de passado (cfr. nota 17). De novo também o facto das linhas 4,4 e 4,5 serem praticamente

iguais às linhas 5,12 e 5,13. 76 Devido às condições propícias à agricultura e à sua localização geoestratégica, o Delta era a zona mais apetecida

pelos invasores. Esta frase pode significar que era uma região aberta à invasão estrangeira, aos Asiáticos e, no Império Novo, aos Povos do Mar, e que não tinha grandes hipóteses de se defender.

77 Existe, de facto, esta duplicação do verbo dizer. O verbo Dd, não levanta qualquer dúvida, mas xr também pode ser uma expressão parentética do mesmo verbo «dizer», referindo-se indiferentemente ao presente ou ao passado (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 195; A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 347-348).

78 Que ignoram que o caminho conduz ao local designado por «lugar dos segredos». Aparentemente, com base no último determinativo que aparece mal localizado na palavra StAw (são numerosos os casos em que há determi-nativos depois da desinência de plural), parece ser uma referência religiosa que está por identificar.

Page 52: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

294

79 Este conjunto de frases faz a apreciação das profundas alterações sociais que ocorreram com a ocupação do Delta.

Os ocupantes puseram os homens comuns a trabalhar para si moendo os cereais, maltrataram os de melhor con-dição social, liberalizaram a condição dos que viviam confinados aos seus postos de trabalho e impuseram às es-posas daqueles que dormissem em padiolas, em ataúdes, provavelmente à espera da morte. Na palavra Sdw, alte-rámos o determinativo final para , uma vez que Gardiner diz que lhe parece ser aquele, mas imperfeita-mente escrito. Em Goedicke confirmámos que o primeiro signo, G. P1, imperfeitamente escrito, se pode confun-dir com aquele pelo qual optámos, G. M3. A leitura é a mesma mas o significado é diferente, segundo Sánchez Rodríguez e Lichtheim. Observado o contexto, para nós faz mais sentido pôr as esposas a dormir em ataúdes do que em jangadas ou barcaças. Aliás, a palavra Sdw surge novamente na frase seguinte, indiscutivelmente bem es-crita, e Gardiner não a traduz, parecendo desconhecer o seu significado na altura em que publicou este seu estu-do (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, pp. 38-40; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 274; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 431; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 153 e 162, nota 10; H. GOEDICKE, Old Hieratic Paleography, pp. 20a e 20b; 30a e 30b).

80 Esta forma verbal não está correcta. Deveria ser: «se alguém diz», ou «aquelas que dizem» ou ainda «se elas di-zem». Este erro condiciona as duas frases seguintes. Depois voltamos às «senhoras bem-nascidas». Correcta-mente devia estar escrito: «Se elas dizem, “Estas pranchas com mirra são pesadas para mim”, (logo elas) são car-regadas com jarros cheios de grãos.» Há uma troca de pronomes sufixos: em vez da primeira pessoa do singular masculina, deveria estar a terceira pessoa plural feminina. A capacidade de concentração do escriba deixa muito a desejar!

81 O pronome sufixo na terceira pessoa do plural está erradamente escrito, apresentando um t no lugar do n. 82 A palavra xnwt tem dois erros: não só apresenta um y que não é usual, como o caracter G. G38 surge em vez do

habitual G. G41. Esta palavra bem escrita seria . 83 Mais um exemplo da confusão social existente: as mulheres que tinham a função de fazer música, por já não te-

rem os seus senhores a quem distrair, são desviadas para outras funções, no caso a tecelagem. 84 «A amada», deusa da música. Na realidade não havia uma, mas duas Meret: a Meret do Baixo Egipto e a Meret do

Alto Egipto. A distinção desta dualidade fazia-se com os símbolos do Baixo Egipto, o papiro ( ), e do Alto Egipto, o lótus ( ). Para além da designação hieroglífica, estas deusas aparecem nas barcas de vá-rias divindades, bem como em diversos relevos, normalmente acompanhadas por Hathor, também ela uma divin-dade protectora da música, distinguindo-se da mesma forma: usando na cabeça uma coroa de papiros ou de lótus (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 111; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 214; J. C. SALES, As Divindades Egípcias, pp. 336-337).

85 Estas árvores devem ser dos jardins dos senhores, agora abandonadas e destruídas, sem ninguém para cuidar delas uma vez que os dependentes que faziam esses serviços se foram embora.

86 A reconstituição da palavra maat na primeira destas duas frases é imposta pela presença da palavra isefet na se-gunda. Independentemente da complexidade destes dois conceitos, neste caso específico, o equilíbrio entre estas duas frases é dado pela oposição entre bem e mal.

87 Esta frase, embora com ligeiras diferenças de grafismo e até alguns erros, é igual a uma outra inserida em 4,3. Os erros são a existência de um t a mais no verbo Hwi e um w (G. Z7) em vez de um traço (G. Z1) em qAn-r e a falta do b (G. D58) em nHbt.

88 Khnum vê-se a «trabalhar» muito e para nada! Por mais crianças que ele crie, elas são mortas. 89 Esta palavra é homófona de Sad, que significa «cortar» e não consta do dicionário de Faulkner (Á. SÁN-

CHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 416). 90 É uma referência de estatuto social, em oposição aos «grandes» que são os «importantes». Os «pequenos», os de

estrato social inferior, estariam tradicionalmente mais ligados à superstição e à religião, na tentativa de melhora-rem a sua condição de vida por essas vias, uma vez que o dia-a-dia era duro e pouco eficaz para a maioria. Aliás, seguem-se algumas frases que tentam demonstrar a inutilidade desses comportamentos, face à terrível situação que se vivia. Fala-se do deus crocodilo Khenti que é simultaneamente um demónio da morte; do homem que ele despedaçou, merecedor também de culto e podendo interceder na Duat; de Sekhmet, a deusa leoa, outra divinda-de ligada à morte, a quem se oferece um sacrifício de incineração (o w na palavra mAyw deve ser um erro, não só porque o resto da frase está no singular, como pelo facto de no fim da palavra em vez da desinência de pluralida-de aparecer a desinência de unidade, ou marca de ideograma em relação ao signo anterior – G. F27 – usado para substituir o desenho de um leão e genericamente empregue como determinativo dos mamíferos); e de Ptah, deus criador de Mênfis, mas neste contexto consorte de Sekhmet.

Page 53: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

295

91 Ver nota anterior. 92 Supomos que sejam os «materiais» sacrificados aos deuses: animais incinerados e líquidos derramados em liba-

ções. Pergunta-se de imediato porque é que se tem esse gesto para com a divindade. 93 Segundo a transcrição de Gardiner há, de facto, a troca de G. X1 ( ) por G. Z4 ( ) nesta palavra (A. H. GARDI-

NER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 43 e pl. 5). 94 Novamente a ideia de passado (cfr. nota 17). Não é uma referência aos bens materiais ou hábitos, mas à tradição,

às práticas correctas, em última análise, a maat. Como já antes observámos na nota 73, as linhas 5,12 e 5,13 são praticamente iguais às linhas 4,4 e 4,5.

95 Ainda que, aparentemente mal escrita, parece-nos que temos aqui a palavra nmtt, num plural com nisbe. A palavra correctamente escrita no singular seria , mas no plural, para além da forma ideográfica , ela seria comple-tamente diferente . A exptressão pryw nmtywt tem a primeira palavra no final de uma linha e a segunda no princípio da linha seguinte, pelo que nos parece que a nossa tradução possa ser mais correcta do que pry iwty, «vão e vêm», como apresentam Fermat e Lapidus. Não conseguimos vislumbrar a segunda destas palavras (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 44 e pl. 5; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 133-134; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 239; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 125)

96 A desordem é tal, que é mesmo avançada a hipótese de um retorno da humanidade à «primeira vez»: preconiza-se a destruição total da humanidade para um recomeço em equilíbrio.

97 O verbo «comer» e o pronome indefinido não constam, nem nunca constaram, do papiro. Não é, portanto, uma reconstituição, mas um acréscimo de Gardiner. A pouco mais de meia linha, num local intacto do papiro, após iw-ms, o escriba deixou, pura e simplesmente, um espaço em branco, como que para ver mais tarde o que deveria de escrever nele, mas nunca o fez. Nem ninguém por ele. Não saberia escrever a palavra que pretendia? E outras palavras que também não escreveu da melhor forma? Ou terá achado excessivamente desumano o que lhe veio ao pensamento, e teve algum tipo de receio de grafar o verbo com que reduzia o homem à sua condição mais animalesca, pondo-o a comer a própria comida dos animais? Isto, caso a culpa tenha sido do autor! Pois se foi do copista, pode ter sido simplesmente a impossibilidade de ler a palavra que se encontrava no papiro de onde copi-ava e falta de imaginação, ou qualquer outra razão, para preenchimento da lacuna.

98 A câmara sagrada e o lugar dos segredos deveriam ser lugares de acesso restrito, que guardariam arquivos religio-sos e legais, agora violados e vilipendiados por esta onda de anarquia que não se limitou a criar o caos de miséria e fome entre os homens, mas também atingiu profundamente a administração expondo muitos dos seus segredos (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 193, nt. 48).

99 Para o significado destas duas palavras Gardiner apresenta «encantamentos Sm» e «encantamentos sxn»; Faulkner dá a ambas o significado de «uma classe de encantamentos»; Sánchez Rodríguez diz que o primeiro é um «en-cantamento» e o segundo um «conjuro» ou um «encantamento»; Parkinson diz que o primeiro significa «pressá-gios» e o segundo «fórmulas de adivinhação» (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 47; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 242 e 266; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egip-cios, pp. 389 e 422; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 177).

100 Para o causativo snxA, que se forma da palavra nxA e tem o significado de «contrário», «perverso», «terrível», «anormal», alguns tradutores, como é o caso de Parkinson, avançam com a hipótese de significar «perigoso». Mas Faulkner atribui-lhe o significado de «frustrar» e Sánchez Rodríguez acrescenta a este o de «ser ineficaz». Parece-nos que manipuladas pelo povo, que não tinha outros conhecimentos mágicos e religiosos para as poder fazer actuar, elas seriam mais ineficazes do que perigosas (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, pp. 47-48; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 177; O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 233; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 378).

101 Provavelmente eram os funcionários da administração que faziam o levantamento das propriedades e respectivos cálculos para o pagamento dos impostos, como se deduz do que acerca do assunto é dito por Gardiner (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 49).

102 Uma forma de expressar o livre acesso e a livre colheita. Para o significado de hAy.i int n.i cfr. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 156.

103 Uma instituição que vigiava e fazia cumprir as leis do trabalho (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 194, nt. 50). Pelo que se segue no texto, deveria haver diversas instituições locais.

104 Na realidade o que está no manuscrito é , uma palavra incompreensível, desconhecida ou errada A. H.

Page 54: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

296

Gardiner diz que o que lá deveria de estar era mrrt, que se traduz por «rua» e que está no plural. Para conduzir o seu raciocínio apela para uma passagem do Ensinamento de Kheti sobre o barbeiro que andava de rua em rua à procura de clientes, onde surge , «de rua em rua», para dizer que o escriba que escreveu As Admoestações de Ipu-uer terá compreendido mal o determinativo ou . Este último sempre foi simplesmente um determinativo, o primeiro podia ser um determinativo ou o bilítero mr. No outro caso, podia ser o bilítero tA e o unilítero A. Portanto, a haver alguma confusão, ela deve ter partido da leitura do manuscri-to de onde foi feita a cópia, cujo cursivo podia ser de difícil leitura. Não é uma questão de oralidade como, por exemplo, parece ser o Ensinamento de Kheti (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 50; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 214; cfr. Ensinamento de Kheti, 5,4).

105 A ordem social, a começar no mais alto nível, o cósmico, está desfeita. As instituições judiciais, que deviam manter a ordem e a justiça, não escapam: a «casa dos trinta» era um tribunal; a «câmara do grande conselho» era a instituição que centralizava a vigilância e o cumprimento das leis do trabalho, supervisionando as «câmaras de conselho»; e as «grandes casas» são as «seis grandes casas», que era o supremo tribunal (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 194, nts. 51 e 52).

106 A linha 6,14 deve ser uma grande desatenção do escriba, pois é uma cópia praticamente igual à linha 4,4. Termi-na aqui a primeira parte, iniciando-se de imediato a segunda, com uma nova fórmula introdutória que se prolon-gará até 9,8.

107 É uma informação literária corroborada pelos conhecimentos arqueológicos: em períodos de crise nem as múmias reais estavam a salvo, sendo cobiçadas por bandos de assaltantes que pretendiam, sobretudo, apoderar-se dos te-souros com que os faraós eram enterrados, mas muitas vezes, para além de profanarem os seus túmulos, profa-navam também os próprios corpos mumificados, cobertos de riquezas.

108 A palavra bik apresenta um w a mais. 109 O divino foi profanado e vulgarizou-se. 110 Isto é, a serpente sagrada iaret, que os Gregos chamarão depois uraeus. 111 A palavra Xny é uma variante de Xnw ou Xnw (Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jero-

glíficos Egipcios, p. 339). 112 Há aqui um jogo de palavras. O camponês, «aquele que deitava água na terra», regava os campos mas já não o

faz levando à miséria o seu senhor, «o de braço poderoso». Deste modo, o potencial de vida do Egipto desperdi-ça-se. O Egipto ia desperdiçando a água, «o Egipto pôs-se a verter água», não aproveitando este bem essencial para a sua subsistência.

113 Na serpente vivia o espírito dos primeiros reis egípcios; o seu «covil» é o trono real. 114 O senhor é o rei (cfr. R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 128). O rei tudo fará para impedir que a miséria e

a necessidade atinjam o palácio real. 115 Gardiner refere que este armazém é mencionado noutros textos como o lugar onde são encerrados ou que empre-

ga os escravos capturados pelo faraó. Isto quer dizer que os nobres foram reduzidos à escravatura (A. H. GARDI-

NER, The admonitions of an Egyptian Sage, pp. 57-58). 116 O pronome dependente tw entre o substantivo Swyt e o pronome sufixo f é um erro. É gramaticalmente impossí-

vel. Tanto mais que até se referem a pessoas diferentes: o tw à segunda pessoa singular masculina do pronome dependente e o f à terceira pessoa singular masculina do pronome sufixo. Por este motivo não se translitera. Só há uma possibilidade de podermos encontrar esta sucessão, mas em vez de um substantivo temos que ter um ver-bo, como dgi.tw.f em 4.6 ou Hsy.tw.f em 8.2, que são a passiva da forma verbal sDm.f na 3ª pessoa masculina do singular, em que .tw é uma terminação inseparável do verbo, seguindo-se-lhe o pronome sufixo (A. H. GARDI-

NER, Egyptian Grammar, pp. 41-42). 117 Deusa da música, cfr. nota 84. 118 Há alguma incerteza na leitura desta palavra: biA ou Hmt? Também há dúvidas quanto ao seu significado: bronze

(Gardiner, Parkinson e Lichtheim) ou cobre (Erman, Simpson e Lalouette)? (A. H. GARDINER, Egyptian Gram-mar, p. 490; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 80 e 169; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jero-glíficos Egipcios, pp. 166 e 294; A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 60; R. B. PARKIN-

SON, The Tale of Sinuhe, p. 179; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 156; A. ERMAN, Ancient Egyptian Poetry and Prose, p. 102; W. K. SIMPSON, The Literature of Ancient Egypt, p. 220; C. LALOUETTE, Textes Sacrés et Profanes de l'Ancienne Égypte, I, p. 218).

Page 55: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

297

119 Embora mantenhamos a transliteração exacta do que está no texto hieroglífico, a palavra swdn não existe. Deve

ser mais um erro do escriba, que trocou os quatro primeiros caracteres. A palavra deveria ser , um plural de dns, que significa «pesado», «aborrecido», «opressivo», «sobrecarregado» (R. O. FAULKNER, Concise Dictio-nary, p. 314).

120 Para a leitura de como Sna, cfr. A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 460, R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 269 e Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 425.

121 Uma caixa simples de maquilhagem teria sido substituída por uma outra reforçada e bem decorada. 122 A frase significa que quem era pobre e apenas se podia ver no reflexo da água, agora tinha posses para adquirir

um espelho que reflectisse a sua imagem, um objecto primeiro de cobre e mais tarde de bronze, muito polido, «que ganhava vida» quando alguém ou alguma coisa se reflectia nele.

123 O terceiro caracter de isx deverá ser mais um erro; como noutras frases, a palavra correcta será is, pois isx não existe. Poderia ser is xm, faltando dois caracteres à segunda palavra ( ). Nesse caso poderia ser o princí-pio de uma frase incompleta. Contudo, ao contrário de Gardiner, não nos parece que o primeiro mtn, seguido de isx, seja o início de uma frase não concluída e omitida pelo escriba e o segundo mtn o início de outra frase. Jul-gamos que não falta nada e que o segundo mtn é um reforço do primeiro, uma vez introduzem uma espécie de provérbio, ou de ensinamento, para induzir as pessoas a consumirem normalmente o que é seu, subentendendo-se que se devem desviar do que é alheio. Neste local não há qualquer deterioração do papiro, tendo sido lido sem qualquer contrariedade. Os dois mtn encontram-se na mesma linha, escritos a encarnado, intervalados por isx, escrito a preto. Estar a escrever a preto, trocar de pincel e escrever uma palavra a encarnado, voltar a trocar de pincel e escrever outra palavra a preto, para trocar novamente de pincel e voltar a escrever a encarnado antes de regressar à tinta preta, mesmo que o trabalho tivesse sido interrompido neste local, parece-nos excessivamente grotesco que se «esqueça» uma frase inteira nestas condições.

124 Há um espaço de cerca de ⅓ de linha que nunca esteve preenchido. Provavelmente o escriba do manuscrito de Leiden, ou outro antes dele, encontrou aqui um conjunto de caracteres ilegíveis ou incompreensíveis, não tendo reconstituído o texto e mantendo o espaço em branco. Numa hipotética reconstituição do que se segue, para manter o ritmo antitético das frases, já antes interrompido com o duplo mtn, consideramos a hipótese de Gardi-ner, seguida, entre outros, por Parkinson ou Lichtheim, de que é muito provável que na sequência em falta esti-vesse o início de outra estância (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 62; R. B. PARKIN-

SON, The Tale of Sinuhe, p. 180; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 157; A. ERMAN, Ancient Egyptian Poetry and Prose, p. 103; W. K. SIMPSON, The Literature of Ancient Egypt, p. 221).

125 As linhas 8 a 14 da página 8 perderam a parte final, cerca de 1/5 em cada uma. Nalguns casos é possível fazer o restauro, noutros não.

126 A grafia mais correcta seria a que se encontra em 8.2, iwty n.f smA.f, contudo podemos traduzir deste modo o que literalmente é: «aquele que não tem é a causa da morte dele».

127 Deve ser outro erro. A palavra correcta seria iHwt. 128 Com maior precisão: «gado vacum de cornos pequenos» (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 63). Na escri-

ta cursiva, o caracter Z11 ( ) é igual ao caracter M42 ( ) (H. GOEDICKE, Old Hieratic Paleography, pp. 23a e 23b; 49a e 49b).

129 A anarquia chegou ao ponto de em vez de serem os sacerdotes, serem os dependentes reais a fazerem oferendas aos deuses que, viram os singelos gansos substituírem os prestigiados touros de cornos largos.

130 Tendo em conta a frase anterior, provavelmente é uma variante de Apd no plural (Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Dic-cionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 64).

131 Mais um espaço em branco, onde nada foi alguma vez escrito. Ver nota 118. 132 O genitivo indirecto em vez de ser o feminino singular nt deveria ser o masculino plural nw ou nw. 133 A palavra iAt no plural significa «ofício», «oficina», «função», podendo referir-se a cargos ou funções públicas ou

privadas, religiosas ou laicas. Ter cada função no seu próprio lugar é uma ideia basilar do pensamento egípcio. Só assim se consegue a maat; o contrário é sinónimo de caos (Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglí-ficos Egipcios, p. 73; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 7; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 152).

134 A única palavra com G.E1 em que este determinativo aparece como ideograma é kA, isto é, «touro», «boi» (R. O.

Page 56: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

298

FAULKNER, Concise Dictionary, p. 283).

135 Há um caracter errado na palavra isk ( ). 136 Mais uma troca de caracteres: deveria ser xrt ( ). 137 Termina aqui a segunda parte, iniciando-se de imediato a terceira, com uma nova fórmula introdutória para uma

série de estâncias bastante mais irregulares do que as anteriores. Haverá nova mudança em 10,12. 138 Neste caso, mesmo sendo um plural, estaria mal construído. 139 Uma passagem de interpretação um pouco complicada, uma vez que o pensamento residia no coração. Pensamos

que não faz sentido interpretar esta expressão como «correm precipitadamente» ou «correm imprudentemente» e que o autor queria dar mesmo a ideia de inversão no sentido físico, de «andam a fazer o pino».

140 É uma passagem de difícil tradução, sobretudo porque a palavra Xnkw, que Gardiner leu sXnk, é desconhecida, não constando em nenhum dos dicionários consultados (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 71). Contudo, Faulkner diz-nos que wryt é um pano para «coar», «filtrar», «espremer», ou «por onde se fazem passar» líquidos (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 64). Por seu lado, o determinativo de tAyt não nos in-dica que possamos estar a falar directamente da deusa Taiet, deusa da tecelagem, mas sim mesmo de uma morta-lha. Em todo o caso, implicitamente é uma referência à deusa, já que ela estava ligada ao enfaixamento dos de-funtos e ao embalsamamento, havendo na «Casa da Purificação», local onde se procedia às mumificações, uma cortina cujo trabalho de tecelagem lhe era atribuído (L. M. ARAÚJO, «Taiet», em Dicionário do Antigo Egipto, pp. 802-803; J. C. SALES, As Divindades Egípcias, p. 361).

141 Julgamos que toda esta passagem significa que tudo estava ao contrário: corriam de cabeça para baixo e compor-tavam-se como estrangeiros, vivendo e morrendo em tendas em vez de casas, sendo as suas «paredes de pano» autênticas mortalhas.

142 Aparentemente há a troca da grafia de tw por wt. Nós julgamos que é mesmo erro, mas Gardiner afirma que não pode ser lido como tw pelo facto desta alteração «disléxica» só aparecer na escrita hierática a partir da XXI ou da XXII dinastia (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 72).

143 O pronome sufixo da terceira pessoa do singular devia ser o masculino e não o feminino, para manter toda a frase no mesmo género gramatical.

144 O espaço degradado tem o tamanho exacto para a palavra sSnw, na sua variante , da qual só terão so-brevivido os últimos três caracteres, que indicam o tipo de planta e o seu plural. O lótus, nome do lírio de água, era uma das plantas mais significativas do Egipto faraónico: desde emblema do Alto Egipto, até símbolo do re-nascimento segundo alguns mitos da criação, o lótus, servia também como essência de perfumes, sendo igual-mente o emblema do deus Nefertum, senhor dos perfumes. Perpetuado na pedra das colunas de muitos templos, existia essencialmente em duas espécies: o azul e o branco. Acrescente-se que a parte inferior do caule de qual-quer uma delas era comestível (I. SHAW, P. NICHOLSON, British Museum Dictionary of Ancient Egypt, pp. 164-165; M. J. MACHADO, «Lótus», em Dicionário do Antigo Egipto, p. 518).

145 Eventualmente uma referência aos fardos de diversas plantas que se faziam após a colheita, destinadas a diversas utilizações, desde forragem até diversas indústrias como a produção de papiros ou a perfumaria. Para nós faz mais sentido esta tradução, a contexto com diversos produtos que se extraíam da terra ou se fabricavam artesa-nalmente, do que «palanquim», um meio de transporte, que a maioria de tradutores apresenta.

146 A segunda palavra irw pode ser uma corruptela ou variante de , que Sánchez Rodríguez, com base num exemplo de Ahmose 3 (Urk IV 2,3), nos diz significar «seus», «dele». Poderia ser «que ele produzia seus»! Em todo ocaso, para funcionar gramaticalmente como um pronome sufixo com função possessiva, a sua posição na frase nunca seria esta. O mais certo é ser a palavra que rege a frase seguinte. Mas este caso também é estranho, pois teremos um pronome sufixo com função possessiva com um comportamento gramatical dum pronome in-dependente, aparecendo no início da frase (Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 100).

147 Outra palavra desconhecida: skt ( ). Contudo existem os verbos sk ( ) e ski ( ) que signifi-cam, respectivamente, «limpar», «tirar» escombros e «destruir», «perecer». Julgamos poder interpretá-la como «destruição dos alimentos» ou «destruição dos aprovisionamentos» (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 250-251; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, pp. 399-400).

148 Há uma série de lacunas, correspondentes a dois enormes buracos no papiro que atingem as linhas sete a treze desta página, mas que em parte é possível reconstituir devido ao facto de os caracteres decifráveis nos permitir perceber que aqui o texto se tornou mais regular, isto é, repetitivo, e os espaços são à medida dessas reconstitui-

Page 57: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

299

ções (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 10).

149 Ou é uma palavra desconhecida, pois não consta nos dicionários consultados, ou pode haver aqui um erro e a letra m estar a mais. A palavra correctamente escrita seria xA ( ), escritórios (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 183; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 313).

150 Terminada a quarta parte, iniciando-se de imediato a quinta, com uma nova fórmula introdutória que se repetirá até 11,11.

151 A tradução da palavra wDnw não é certa. Faulkner não a refere e Sánchez Rodrigues apresenta para ela o signifi-cado de «inundação», «crescida» (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 76; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Dicci-onario de Jeroglíficos Egipcios, p. 161).

152 Provavelmente o w estará a mais neste causativo. 153 Por aqui se vê que este hábito é ancestral. 154 Eram as aves tradicionalmente oferendadas aos deuses: o ganso cinzento (Anser anser) largamente criado em

aviários; o ganso de cabeça branca (Anser albifrons), que apesar do nome apresentava na cabeça cinzenta apenas uma faixa branca que circundava todo o bico; e o ganso do Nilo (Alopochen aegyptiaca), o mais divulgado na ar-te egípcia (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 196; P. F. HOULIHAN, The Birds of Ancient Egypt, pp. 54-65; L. M. ARAÚJO, «Ganso», em Dicionário do Antigo Egipto, pp. 387-388).

155 O acto de mastigar fazia parte das cerimónias de purificação dos serviços sacerdotais (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 196).

156 Trata-se de uma cerimónia na qual a purificação se obtinha ungindo a cabeça. 157 De facto, em vez de mi está my, mas só pode ser um erro. 158 Isto é, o templo. Para ver este significado de snDm, cfr. Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos

Egipcios, p. 380. 159 Embora se escreva com a síncope do w, nDrw é um verbo da 4ª inflexão. Com início nesta linha e prolongando-se

até à décima segunda, há dois grandes buracos no papiro, que no seu máximo de largura fazem praticamente de-saparecer as linhas nove e dez (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 145; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccio-nario de Jeroglíficos Egipcios, p. 254-255).

160 Membros da elite social deveriam servir alguns meses como sacerdotes, sendo por isso fundamental a sua purifi-cação antes de ingressarem ciclicamente no templo. Mesmo os «servos do deus» que estavam dedicados ao sa-cerdócio com maior regularidade, não viviam em reclusão conventual, exercendo no exterior do templo outras funções e misturando-se com a população, fazendo com que as cerimónias de purificação tivessem que ser uma constante (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 196; L. M. ARAÚJO, «Sacerdotes», em Dicionário do Antigo Egipto, pp. 387-388).

161 Estes dias e meses são as datas rituais, as que mais importam na eternidade. O pequeno restauro que apresenta-mos, ip, é baseado em Parkinson. O restauro feito por Fermat e Lapidus, que, aliás, se deve a Helck, iAw, não nos parece correcto uma vez que não existem na cultura faraónica expressões literais para «ano novo» e «ano velho». De igual modo, não conhecemos a terminologia «novo/velho» aplicada a meses ou outra qualquer medição do tempo. Normalmente são expressões do tipo: «Abertura do ano» wpt-rnpt, «Ano bom, ano correcto, ano per-feito» rnpt nfrt, «Ano mau, ano incorrecto, ano imperfeito» rnpt gbt. Mais do que um res-tauro, parece-nos uma «modernização» desajustada (W. HELCK, «Die “Admonitions” Pap. Leiden 1344 recto», p. 51; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 167; R. B. PARKINSON, The Tale of Si-nuhe, pp. 184 e 196; cfr. T. F. CANHÃO, «O calendário egípcio: origem, estrutura e sobrevivências»).

162 Há uma valorização do próprio sacerdote ritualista, que não deve ser esquecido nas oferendas de cada um, pois é ele quem faz a união social e cósmica entre pessoas e deuses através das suas invocações.

163 Para além das estâncias se tornarem maiores e mais complexas, há nesta frase uma nova alteração da fórmula introdutória. Em relação às duas reconstituições aqui existentes, a primeira corresponde a um pedaço do papiro ilegível e a segunda a uma ausência de grafismo. Este último espaço estava mesmo em branco, mas as reconsti-tuições são praticamente seguras. Na interrogativa Hr-ma existe um w a mais (A. H. GARDINER, Egyptian Gram-mar, p. 406).

164 Isto é, «se ele tentar acalmar alguma situação ao rubro». 165 A palavra iAdr não consta em nenhum dos dicionários consultados, contudo, não sendo um erro, o determinativo

Page 58: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

300

e o contexto da frase parecem indicar que o seu significado seja «rebanho», «manada», «gado», «animais».

166 Isto é, «e eles sentem-se reconfortados». 167 Parece-nos uma metáfora em que o autor, ao usar o termo piloto, aquele que conhece o verdadeiro caminho para

guiar o barco que conduz, se refere ao demiurgo que, como se segue, parece adormecido, uma vez que não se sente o seu poder.

168 Aparentemente .s substitui o pronome sufixo da terceira pessoa do plural por omissão de parte da sua desinência (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 205 e Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 345). Nesta passagem, Ipu-uer dirige-se a alguém, provavelmente ao rei, que o terá chamado para se aconse-lhar face ao caos em que o Egipto mergulhara. Diz ainda duas outras coisas: só foi possível este encontro porque o demiurgo no momento da criação não fez a separação necessária entre os homens, o que parece ser uma crítica ao próprio rei, uma vez que não é natural que um sábio falasse contra si próprio; se os deuses não são capazes de equilibrar a situação, muito menos terá o rei capacidade para tal.

169 É a mesma palavra que aparece em 12.5, mas não apresente o determinativo. 170 Provavelmente seria «não se vêem protectores contra os inimigos», mas o restauro que Fermat e Lapidus apre-

sentam não nos convence e não conseguimos propor outra solução. Pelo menos com aquela grafia, que parece exceder bastante o espaço em falta no papiro (A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 174; A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 12).

171 A palavra shA apresenta aqui um caracter G. Z7 ( ) a mais (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 237). 172 É o demiurgo, é Atum. Cfr. R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, pp. 298-299. 173 No sentido de «quem nos protegerá». 174 Ipu-uer continua a insistir com o seu interlocutor para que ele reaja. 175 Estas três divindades representam a deificação de três conceitos: Hu personificava o poder da palavra com a qual

o demiurgo dava existência às coisas – a palavra criadora; Sia personificava o conhecimento, a percepção e a compreensão divina – a inteligência. Eram duas divindades associadas a Ptah: Sia, o génio que personificava o coração, pensava e Hu, personificando a língua, executava. Sobre Maat ver o Conto do Camponês Eloquente (J. C. SALES, As Divindades Egípcias, pp. 415-416).

176 A palavra bAwt é desconhecida, mesmo aparecendo registada no dicionário de Sánchez Rodrigues com o signifi-cado de «servidor». É uma proposta de Gardiner, feita com pouca convicção, mas seguida por Lichtheim e Fer-mat e Lapidus, com igual falta de convicção e que nós não partilhamos. Helck propõe a correcção da leitura para

btA, ou seja, «corredor», palavra formada a partir do verbo «abandonar», o que além de não nos convencer, apresenta um método que não utilizamos: altera por completo a grafia original. Partindo do princípio que não é um erro, a busca dum significado a contexto levou-nos à utilização, também com alguma incerteza (em vez do verbo hAb faria mais sentido estar o verbo rdi), da proposta de Parkinson, «emboscada», pois julga-mos que tem alguma lógica: com medo das emboscadas que lhe possam fazer, ele fugirá sem parar. Por outro la-do o determinativo aparece em palavras como , «interior» (de uma emboscada) ou , «lugar» (de uma emboscada), para além de poder ser o fonema bilítero pr no verbo pri, «partir», «sair», «fugir». Portanto, parece-nos poder fazer algum sentido a possibilidade de poder existir uma palavra com este significado e a utili-zação deste determinativo, que não vemos em palavras com o significado de «servidores», «criados». Por exem-plo: iHms, aqyt, wbAyt, wdpw, bAk, bAkt, mrw, mrt,

Hm, Hmt e Hnwty (Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 164; A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, pp. 85-86 e chapa 13; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Li-terature, I, p. 160; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 180; W. HELCK, «Die “Admonitions” Pap. Leiden 1344 recto», p. 59; R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 187; A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 492).

177 A mesma frase, com ligeiras diferenças de concordância, em 5.12. 178 Esta introdução com que se inicia outra parte do texto, agora afirmando que apesar de tudo o que se passa no

Egipto ainda é possível pensar em coisas boas, está ausente do papiro. Contudo, a parte final do pedaço em falta mostra sinais de tinta encarnada e é exactamente do tamanho dos exemplos que se seguem constituídos por estas palavras. Curiosamente todos a preto (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 87 e chapa 13).

179 A bebida e a embriaguez vistas com um valor positivo, provavelmente por serem manifestações que acompanha-vam muitas celebrações religiosas.

Page 59: 5. As Admoestações de Ipu-uer

As ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

301

180 A palavra myt não é traduzida por Gardiner e Lichtheim; Faulkner diz apenas «uma bebida»; Parkinson diz que é

«uma bebida forte»; Sánchez Rodríguez chama-lhe «licor»; Helck diz que se trata de «espumante»; e Fermat e Lapidus preferem «bebida inebriante» (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, p. 88; M. LICHTHEIM, Ancient Egyptian Literature, I, p. 160; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 104; R. B. PARKIN-

SON, The Tale of Sinuhe, p. 187; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 202; W. HELCK, «Die “Admonitions” Pap. Leiden 1344 recto», p. 61; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 184).

181 O autor sonha com o ideal de vida egípcio, por contraste com a anarquia existente. 182 Ou seja, quando a segurança existe para todos inclusivamente para aqueles que dormem ao relento. 183 Deveria ser um procedimento próprio das celebrações do Ano Novo. Em relação ao calendário agrícola, era um

dia que ficava no final da época das colheitas (Chemu) e dava início ao período da inundação (Akhet) (cfr. T. F. CANHÃO, «O calendário egípcio: origem, estrutura e sobrevivências»).

184 Provavelmente o que falta seria ou teria o sentido de «logo que o Nilo sobe…» 185 O Egipto. 186 A diferença entre esta e a frase sobre os Núbios, que aparece pouco antes apenas com a partícula interrogativa in,

é que in iw introduz na interrogativa uma certa surpresa. Não conseguimos perceber a presença de sm nesta fra-se, desconhecendo totalmente o seu significado (A. H. GARDINER, Egyptian Grammar, p. 403).

187 Numa enumeração de povos periféricos ao Egipto, não nos parece que esta palavra surja aqui com o seu signifi-cado futuro de «polícias do deserto», mas como a referência original dos povos da região de Medjai, que Fau-lkner diz ser uma região da Núbia. Contudo, essa não é a localização correcta desta região, conforme nos mostra Manley. A Núbia é a região a sul do Egipto entre a ilha de Elefantina e a confluência do Nilo com o Atbara, e Medjai fica a norte dessa região no Deserto Arábico. Incluindo a região dos montes do mar Vermelho, é uma re-gião delimitada de oeste para este pelo mar Vermelho e o rio Nilo, e de norte para sul entre o Uadi Hamamat e o Uadi el-Hudi. Aliás, no mapa da página 45 do atlas de Manley, que se intitula o «Egipto do Império Médio, de 1956 a 1080 a. C.», época provável da origem deste conto, era uma zona periférica ao Egipto que não se encon-trava sob o seu domínio (R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 123; B. MANLEY, Atlas historique de l’Égypte ancienne, pp. 27, 45 e 51; J. BAINES e J. MÁLEK, Egipto. Deuses, Templos e Faraós, pp. 12-13).

188 Do país, do Egipto. 189 A anarquia instalada assusta os estrangeiros vizinhos do Egipto que, inclusivamente, se sentem ameaçados. Mas

ficar sem fazer nada e deixar que a areia do deserto tome conta de tudo, também não é a solução. 190 O que parece ser um w ( ), aparentemente, está a mais, embora todas estas linhas até ao fim sejam de muito

difícil leitura (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 15). 191 As linhas 15,6 a 15,11 desapareceram quase na totalidade. Sobreviveram no tempo em que Gardiner as leu, aqui-

lo que parece ser a palavra int, «peixe», na linha 15,6, quatro ou cinco caracteres na linhas 15, 10 e pouco mais do que isso na linha seguinte, ambos hoje sem significado (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 15).

192 Trata-se de uma enumeração de produtos, sem que se entenda se faltam ou se existem. Contudo, em função do que será dito a seguir, parece que o faraó terá conseguido restabelecer a ordem e, portanto, é provável que sejam produtos que voltavam a circular novamente.

193 O nome Ipu-uer, que significa «Grande é aquele que fala», isto é, que diz as coisas com correcção, é o nome apropriado para um sábio que faz esta descrição. O «senhor de tudo» é o faraó, não um faraó específico mas qualquer faraó referenciado pelo seu epíteto mais divino, uma vez que esta designação era partilhada por si e pe-lo demiurgo. Ipu-uer dirige-se, portanto, de uma forma genérica, a todos quantos ocupem a cadeira do poder má-ximo. Não é um conto histórico, onde se identifique um rei, um acontecimento, ou algum local em particular, mas antes um conjunto de lamentações. É um monólogo, cujas partes em falta, quanto muito, poderiam provar ser um diálogo, onde se reflecte acerca das dificuldades da vida num Egipto em crise.

194 Isto é, com o que agradava ao coração. 195 A frase wn s pw lembra a primeira frase do Conto do Camponês Eloquente: s pw wn. Embora sejam gramatical-

mente diferentes, elas podem ser traduzidas da mesma forma. Pela posição na frase, wn é um verbo no primeiro caso (aliás, correctamente deveria ser wnn) que significa «ser», «estar» ou «existir», e um substantivo estativo que se refere ao passado ou ao futuro, conforme o contexto, no segundo. Literalmente, a frase daquele conto lê-

Page 60: 5. As Admoestações de Ipu-uer

AS ADMOESTAÇÕES DE IPU-UER

302

se «este homem era do passado» ou «este era um homem do passado» e, portanto, possibilitando a tradução mais interpretativa de «era uma vez um homem», numa construção substantivo + pw + estativo. Enquanto a frase que aqui encontramos se lê literalmente «havia este homem» ou «existia este homem» ou, ainda «este homem exis-tia», permitindo também uma tradução mais interpretativa de «era uma vez um homem», numa construção verbo + pw + substantivo.

196 Gardiner, tal como Fermat e Lapidus, atribui o significado de «destino» à palavra SAw. Encontrámos esta palavra com este significado nos dicionários, mas com uma grafia completamente diferente (A. H. GARDINER, The ad-monitions of an Egyptian Sage, p. 94; A. FERMAT e M. LAPIDUS, Les Prophéties de l’Égypte Ancienne, p. 193; R. O. FAULKNER, Concise Dictionary, p. 261; Á. SÁNCHEZ RODRÍGUEZ, Diccionario de Jeroglíficos Egipcios, p. 414).

197 As linhas 16,3 a 16,11 desapareceram quase na totalidade, havendo apenas três ou quatro hieróglifos, praticamen-te ilegíveis, na terceira linha. Até ao fim do que ainda existe não é possível estabelecer grande coerência textual (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 16).

198 Antes da parte destruída existe nesta linha uma pequena área em branco. É natural que faltem alguns caracteres no final da última linha da página anterior, pois há espaço para isso e os dois primeiros caracteres da linha 17,1, isolados ou em conjunto com os que se seguem, não constituem qualquer palavra conhecida. Contudo, os seguin-tes podem ser lidos da forma que apresentamos, ainda que possa ser uma leitura incorrecta por desconhecimento do resto do texto (A. H. GARDINER, The admonitions of an Egyptian Sage, chapa 16).

199 O resto do texto perdeu-se e não há qualquer elemento que nos permita saber a extensão da parte inexistente, embora os cálculos de Parkinson apontem que no papiro existente ainda haveria espaço para cerca de dez linhas manuscritas, ou seja, para cerca de 25 versos (R. B. PARKINSON, The Tale of Sinuhe, p. 199).