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EDEMA PULMONAR AGUDO ACUTE PULMONARY EDEMA Renato Barroso Pereira de Castro Médico Assistente. Divisão de Cardiologia. Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto USP CORRESPONDÊNCIA: Divisão de Cardiologia. Hospital das Clínicas da FMRP-USP. Avenida Bandeirantes, 3.900 - CEP 14.048-900 Ribeirão Preto- SP. CASTRO RBP. Edema pulmonar agudo. Medicina, Ribeirão Preto, 36: 200-204, abr./dez. 2003. RESUMO - São revistos os conceitos fisiopatológicos, diagnósticos e terapêuticos do edema pulmonar agudo, com ênfase na etiologia cardiológica. O acúmulo de líquido, no espaço intersti- cial pulmonar, respeita a dinâmica observada em qualquer outro território e se faz, inicialmente, no espaço peribronquiolar e, posteriormente, na região perialveolar inundando, a seguir, a própria luz do alvéolo. A integridade da membrana alveolocapilar é fator fundamental e está mais ou menos comprometida, segundo a etiologia do edema. O diagnóstico é essencialmente clínico, mas a investigação adicional , por recursos diagnósticos vários, é fundamental. A terapêutica fundamen- ta-se no fornecimento de oxigênio em níveis suficientes, ao mesmo tempo em que se promove a normalização da função de hematose, reduzindo-se o líquido acumulado no interstício e restau- rando-se a integridade da barreira alveolocapilar. O pronto reconhecimento e o início do tratamento são fundamentais na tentativa de reduzirmos o prognóstico ominoso dessa entidade clínica. UNITERMOS - Edema Pulmonar Agudo. Insuficiência Respiratória Aguda. 200 Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS CARDIOLÓGICAS 36: 200-204, abr./dez. 2003 Capítulo VI 1- INTRODUÇÃO Edema pulmonar agudo constitui urgência clí- nica e motivo freqüente de internação hospitalar. O paciente apresenta-se extremamente dispnéico, cia- nótico e agitado, evoluindo com rápida deterioração para torpor, depressão respiratória e, eventualmente, apnéia com parada cardíaca. De diagnóstico essenci- almente clínico, é fundamental, portanto, que o socor- rista esteja habilitado a reconhecer e iniciar o trata- mento de tão grave entidade. 2- FISIOPATOLOGIA Os mecanismos mais freqüentes envolvem: 1) o desbalanço nas forças que regem as trocas de flui- do entre intravascular e interstício ou 2) a ruptura da membrana alveolocapilar; independente do mecanis- mo iniciante, uma vez que ocorra a inundação do al- véolo, sempre está presente algum grau de ruptura da mesma. (Ver Tabela I). A seqüência de acúmulo de líquido independe do mecanismo desencadeador, é sempre a mesma e pode ser dividida em três estágios: 1) aumento do fluxo de líquidos dos capilares para o interstício, sem que se detecte, ainda, aumento do volume intersticial pulmonar devido ao aumento paralelo, compensa- tório, da drenagem linfática; 2) o volume que é filtra- do pelos capilares ultrapassa a capacidade de drena- gem linfática máxima e inicia-se o acúmulo de líquido no interstício; inicialmente, este ocorre de modo pre- ferencial junto aos bronquíolos terminais, onde a ten- são intersticial é menor; 3) aumentos adicionais do volume, no interstício, terminam por distender os septos interalveolares e conseqüente inundação dos alvéolos.

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EDEMA PULMONAR AGUDO

ACUTE PULMONARY EDEMA

Renato Barroso Pereira de Castro

Médico Assistente. Divisão de Cardiologia. Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USPCORRESPONDÊNCIA: Divisão de Cardiologia. Hospital das Clínicas da FMRP-USP.Avenida Bandeirantes, 3.900 - CEP 14.048-900 Ribeirão Preto- SP.

CASTRO RBP. Edema pulmonar agudo. Medicina, Ribeirão Preto, 36 : 200-204, abr./dez. 2003.

RESUMO - São revistos os conceitos fisiopatológicos, diagnósticos e terapêuticos do edemapulmonar agudo, com ênfase na etiologia cardiológica. O acúmulo de líquido, no espaço intersti-cial pulmonar, respeita a dinâmica observada em qualquer outro território e se faz, inicialmente, noespaço peribronquiolar e, posteriormente, na região perialveolar inundando, a seguir, a própria luzdo alvéolo. A integridade da membrana alveolocapilar é fator fundamental e está mais ou menoscomprometida, segundo a etiologia do edema. O diagnóstico é essencialmente clínico, mas ainvestigação adicional , por recursos diagnósticos vários, é fundamental. A terapêutica fundamen-ta-se no fornecimento de oxigênio em níveis suficientes, ao mesmo tempo em que se promove anormalização da função de hematose, reduzindo-se o líquido acumulado no interstício e restau-rando-se a integridade da barreira alveolocapilar. O pronto reconhecimento e o início do tratamentosão fundamentais na tentativa de reduzirmos o prognóstico ominoso dessa entidade clínica.

UNITERMOS - Edema Pulmonar Agudo. Insuficiência Respiratória Aguda.

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Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio:URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS CARDIOLÓGICAS36: 200-204, abr./dez. 2003 Capítulo VI

1- INTRODUÇÃO

Edema pulmonar agudo constitui urgência clí-nica e motivo freqüente de internação hospitalar. Opaciente apresenta-se extremamente dispnéico, cia-nótico e agitado, evoluindo com rápida deterioraçãopara torpor, depressão respiratória e, eventualmente,apnéia com parada cardíaca. De diagnóstico essenci-almente clínico, é fundamental, portanto, que o socor-rista esteja habilitado a reconhecer e iniciar o trata-mento de tão grave entidade.

2- FISIOPATOLOGIA

Os mecanismos mais freqüentes envolvem: 1)o desbalanço nas forças que regem as trocas de flui-do entre intravascular e interstício ou 2) a ruptura damembrana alveolocapilar; independente do mecanis-

mo iniciante, uma vez que ocorra a inundação do al-véolo, sempre está presente algum grau de ruptura damesma. (Ver Tabela I).

A seqüência de acúmulo de líquido independedo mecanismo desencadeador, é sempre a mesmae pode ser dividida em três estágios: 1) aumento dofluxo de líquidos dos capilares para o interstício, semque se detecte, ainda, aumento do volume intersticialpulmonar devido ao aumento paralelo, compensa-tório, da drenagem linfática; 2) o volume que é filtra-do pelos capilares ultrapassa a capacidade de drena-gem linfática máxima e inicia-se o acúmulo de líquidono interstício; inicialmente, este ocorre de modo pre-ferencial junto aos bronquíolos terminais, onde a ten-são intersticial é menor; 3) aumentos adicionais dovolume, no interstício, terminam por distender osseptos interalveolares e conseqüente inundação dosalvéolos.

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O edema pulmonar se instala, quando o fluxode líquido do espaço intravascular, em direção ao in-terstício e alvéolos, supera o retorno do mesmo aointravascular e sua drenagem pelos linfáticos. Estesdesempenham importante papel na remoção de líqui-dos do interstício pulmonar: estima-se que um adulto

de 70 Kg tenha um fluxo linfático pulmonar de 20ml/he que este possa sofrer incrementos adaptativos, atin-gindo até 200ml/h. Para que isso seja observado, en-tretanto, é necessário que o aumento na pressão capi-lar pulmonar ocorra de modo gradual. Elevaçõesabruptas da mesma podem ser fatais num pacientenão pré-condicionado para hipertrofia do sistema lin-fático pulmonar. Causas freqüentes de edema pulmo-nar cardiogênico são: infarto miocárdico agudo ou exa-cerbação isquêmica de disfunção ventricular pré-exis-tente, sobrecargas agudas de volume para o ventrícu-lo esquerdo (insuficiências valvares, rotura do septointerventricular) e a estenose mitral.

Existem situações, entretanto, em que o acú-mulo de líquido e proteínas, na luz alveolar, não se deve,primariamente, à elevação da pressão na luz dos capi-lares pulmonares. O termo Síndrome da Angústia Res-piratória do Adulto (SARA) refere-se a vários pro-cessos pulmonares difusos, agudos ou sub-agudos, queresultam em hipoxemia severa. Representa a formamais grave de edema pulmonar, devido a lesão damembrana alveolocapilar. Dentre suas causas, pode-mos salientar aquelas de natureza local e as sistêmicas.As agressões primárias ou diretas à membranaalveolocapilar, geralmente, resultam da exposição aagentes químicos, infecciosos, líquido gástrico ou ga-ses tóxicos, sempre associados a destruição celularmaciça. Danos secundários associam-se, em geral, àativação de cascatas bioquímicas sistêmicas, com ge-ração de agentes oxidantes, mediadores inflamatóriose enzimas, com semelhante potencial destrutivo à mem-brana alveolocapilar, associados, por exemplo, apancreatite, trauma grave, politransfusões, etc. Des-crevem-se, em geral, três fases distintas, na instala-ção da SARA: 1) fase exsudativa, caracterizada poredema intersticial de alto teor protéico e rápida inva-são alveolar, associada a hemorragia e subseqüenteformação de membrana hialina; 2) proliferativa, ca-racterizada pela organização do exsudato fibrinoso e3) fibrosante, marcada pela regeneração do epitélioalveolar e espessamento dos septos interalveolares,resultando em graus variáveis de tecido cicatricial.Radiologicamente, observamos sinais iniciais de edemaintersticial, seguidos de velamento alveolar e bronco-gramas; em contraste com o edema de origem hidros-tática, tem distribuição mais periférica e nota-se a au-sência de achados típicos dele, como a cardiomegalia,redistribuição vascular e linhas B de Kerley. Com aevolução para a fase proliferativa, padrão de “vidrofosco” de distribuição não homogênea passa a se

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evidenciar; nessa fase, lesões císticas intra-parenqui-matosas e subpleurais podem acarretar pneumotórax.Episódios exsudativos recorrentes podem ocorrer nasfases proliferativa e fibrosante, resultando em padrõesradiológicos mistos, ocasionalmente exibindo caracte-rísticas comuns às três fases.

Pouco sintomática, nas etapas iniciais, a SARApode evoluir rapidamente para dispnéia progressiva,taquipnéia e cianose. A hipoxemia se instala, caracte-risticamente refratária à oxigenioterapia, devido aoshunt arteriovenoso. A ventilação mecânica com pres-são positiva expiratória final é freqüentemente neces-sária para adequada expansão do parênquima pulmo-nar e melhor difusão do oxigênio.

3- QUADRO CLÍNICO/ DIAGNÓSTICO

As manifestações dependem do estágio em quese encontra o paciente. Assim, na fase 1, apenas adispnéia de esforço costuma ser correlacionada; já,na fase 2, o acúmulo inicial de líquido, no interstíciopulmonar, pode comprometer as vias aéreas de pe-queno diâmetro (terminais), particularmente nas ba-ses pulmonares, associando-se a broncoespasmo re-flexo. A taquipnéia passa a ser observada, bem comoos sibilos expiratórios. É comum o diagnóstico indevidode doença pulmonar obstrutiva ou de asma, em paci-entes com manifestações iniciais de congestão pul-monar. Radiologicamente, a fase 2 é caracterizada porborramento peri-hilar bilateral e espessamento dosseptos interlobulares (linhas “B” de Kerley). Ortopnéiapode, ocasionalmente, ocorrer. Com o progredir doquadro (fase 3), o acúmulo de grandes quantidades delíquido no interstício pulmonar leva ao extravasamentopara a luz alveolar, presenciando-se, então, as mani-festações clínicas em toda a sua dramaticidade. O sériocomprometimento da hematose leva à dispnéia inten-sa, com o paciente nitidamente ansioso, assumindoposição ortostática e utilizando a musculatura respira-tória acessória; palidez cutânea, cianose e frialdadede extremidades, associadas a agitação e ansiedade,bem como respiração ruidosa facilitam o reconheci-mento dessa urgência clínica e obviam a necessidadede terapêutica imediata. Se ela for retardada, podemsurgir a obnubilação e o torpor, expressões clínicas doevento mais temido no contexto - a narcose – a qualpode prenunciar a parada respiratória e a morte. Oedema pulmonar agudo constitui experiência aterro-rizante para o paciente e para os circunstantes. Asvias aéreas, repletas de secreção causam a sensação

nítida de afogamento; o esforço respiratório leva àsobrecarga adicional sobre o ventrículo esquerdo, oque, associado à piora da hipóxia, pode desencadearum círculo vicioso letal. A ausculta pulmonar, na fase3, revela a presença de estertores grossos, roncos esibilos, inicialmente restritos às bases pulmonares, mas,rapidamente, progressivos até os ápices pulmonares.A ausculta cardíaca, freqüentemente, é difícil, poden-do revelar, entretanto, a presença de terceira bulha ehiperfonese do componente pulmonar da segunda bu-lha. A pressão arterial, freqüentemente, está elevada,dada a intensa atividade adrenérgica; sua normaliza-ção ocorre, na maioria das vezes, com as medidasterapêuticas para o edema pulmonar. Quando a hiper-tensão arterial constituir fator desencadeador da con-gestão pulmonar, terapêuticas específicas para seucontrole estarão indicadas. Hipotensão e choque cir-culatório expressam falência grave do ventrículo es-querdo, agravando sobremaneira o prognóstico. Oquadro radiológico típico revela velamentos pulmona-res do tipo alveolar, em intensidades variáveis; a áreacardíaca pode ser normal (tipicamente, nos casos deinsuficiência coronariana aguda, sem disfunção ven-tricular prévia), ou aumentada, quando em presençade cardiopatias crônicas com dilatação de ventrículoesquerdo. A gasometria arterial revela níveis progres-sivos de hipóxia; nas fases iniciais, a hipocarbia é aregra, devido à hiperventilação e à maior difusibilidadedo gás carbônico através da barreira alveolocapilar.Como já referido, a detecção de hipercarbia pode serprenúncio de depressão respiratória e morte.

Em resumo, o diagnóstico do edema pulmonaragudo é essencialmente clínico. Os exames comple-mentares devem ser utilizados racionalmente, comosubsídios e para balizamento das condutas terapêuti-cas adotadas. Nunca é demais salientar a importânciada documentação adequada, principalmente a radio-lógica, de tão grave intercorrência na história clínicado paciente. Paralelamente ao diagnóstico e tratamentodo edema pulmonar, faz-se urgente elucidarmos aetiologia do mesmo. A correta identificação do meca-nismo desencadeador aumenta as chances de suces-so na terapia.

4- TERAPÊUTICA

(Restringir-nos-emos ao tratamento do edemapulmonar cardiogênico)

Medidas Gerais - É clássica a recomenda-ção do posicionamento do paciente; na verdade, ele

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próprio tende a assumir a posição sentada, freqüente-mente com os braços apoiados na beira do leito ousobre o encosto da cadeira e com as pernas penden-tes, o que permite o uso mais eficaz da musculaturaacessória, a diminuição do retorno venoso e o aumen-to da capacidade vital. O decúbito horizontal é sem-pre mal tolerado pelo paciente consciente. O uso detorniquetes em extremidades, visando à redução doretorno venoso, é muito pouco utilizado nos dias dehoje. Monitorização eletrocardiográfica, acesso venosoe oxigênio por máscara deverão ser imediatamenteprovidenciados. O oxímetro de pulso é um recurso útilna avaliação contínua da eficácia terapêutica; sua efi-ciência diminui nos casos de má perfusão periférica.O paciente em edema pulmonar agudo deve ser ob-servado em unidade apropriada, com recursos ade-quados ao atendimento de urgências cardiológicas ena presença constante de pessoal médico, até a esta-bilização do quadro.

Oxigênio - Uma máscara facial de oxigêniocom fluxo de 5 a 6 l/min deverá ser a opção inicial; senecessário, máscaras sem reinalação e com reserva-tório permitem concentrações de 90 a 100%. O usodo CPAP através de máscara especial ou no pacientejá entubado é bastante útil. Profissional treinado ementubação endotraqueal deverá estar disponível, bemcomo todo o material necessário, notadamente se: umaPaO2 > 60mmHg não for obtida, mesmo com másca-ras de 100%, se o paciente apresenta sinais de hipóxiacerebral (letargia ou obnubilação) ou se apresentaaumentos progressivos da PCO2 ou acidose.

Diuréticos _ A furosemida tem sido conside-rada peça fundamental no esquema terapêutico doedema pulmonar. Tem uma ação bifásica: venodilataçãoimediata, com conseqüente aumento da capacitânciavenosa (nos primeiros 5 min), seguida de diurese, compico de efeito 30 e 60 min. As doses são variáveis ebaseiam-se na resposta terapêutica, que deverá seravaliada após os primeiros 20 min. A intensidade dadiurese deverá ser ditada pelo grau de retenção volê-mica observada e na função renal; lembrar que, nafalência ventricular esquerda aguda (isquêmica porexemplo), não se observa hipervolemia e a terapêuti-ca deverá priorizar a vasodilatação com conseqüenteredução da pós-carga do VE.

Morfina - O sulfato de morfina (2 a 8mg EV,se PA>100mmHg) permanece como recurso útil noedema pulmonar agudo. Tem ação venodilatadora,além de sedação ligeira, reduzindo o esforço respira-tório e a ansiedade. A preocupação de muitos profis-sionais com seu efeito sedativo e conseqüente risco

de depressão respiratória tem justificativa; pacientesde maior risco para a grave complicação do uso damorfina são aqueles com diminuição do nível de cons-ciência ou evidências laboratoriais de retenção de CO2.

Vasodilatadores - A a nitroglicerina endove-nosa tem sido considerada a droga mais efetiva noedema pulmonar cardiogênico; a venodilatação e con-seqüente redução da pré-carga do ventrículo esquer-do bem como a redução da resistência vascularsistêmica (pós-carga) são a base de sua utilização.Nao deverá ser utilizada, se a pressão arterial sistêmicafor inferior a 100 mmHg. A dose inicial endovenosarecomendada é de 10 a 20 mcg/min com incrementosde 5-10 mcg/min, a cada 5 a 10 min, até que se atinjaa resposta terapêutica ou hipotensão (PA<100mmHg).O uso de comprimidos sublinguais poderá ser útil atéque um acesso venoso tenha sido obtido.

O nitroprussiato de sódio tem ações semelhan-tes à nitroglicerina, com discreta superioridade na açãodilatadora arterial; está indicado nos casos com hiper-tensão arterial mais grave. A dose endovenosa reco-mendada é de 0,1 a 5,0 mcg/Kg/min. O limite pressóricomínimo, de 100 mmHg para que se possa iniciar o usodo vasodilatador, também deverá ser respeitado.

Inotrópicos - A associação de choque circula-tório e edema pulmonar agudo é uma das mais gravessituações com que nos deparamos na sala de urgên-cia. Nesses casos, se a pressão arterial sistólica esti-ver entre 70 e 100 mmHg, inicie dopamina na dose de2.5 a 20 mgc/Kg/min; se dose superior a esta for ne-cessária, acrescente norepinefrina e reduza a dose dedopamina para 10 mcg/Kg/min. A dobutamina, tam-bém na dose de 2,0 a 20 mcg/Kg/min, deverá ser re-servada para casos de hipotensão sem sinais de cho-que associados. A digitalização só está indicada nocontrole de taquiarritmias supraventriculares como afibrilação atrial de alta resposta ventricular; sua açãoinotrópica é muito retardada e não demonstra benefí-cios na reversão do edema pulmonar ou na estabiliza-ção hemodinâmica.

Outros recursos terapêuticos - A amrinone(dose de ataque de 0,75 mg/Kg em 2 a 3 min e manu-tenção de 2 a 20 mcg/Kg/min) associa efeitos inotró-picos e vasodilatadores. A aminofilina (dose de ata-que de 5mg/Kg em 10 a 20 min, seguida de manuten-ção de 0,5 a 0,7 mg/Kg/hora) é útil nos pacientes quese apresentam com componente de broncoespasmosignificante (“asma cardíaca”) salientando-se, entre-tanto, o seu potencial de agravar arritmias, notada-mente, no paciente portador de insuficiência corona-riana. Os trombolíticos podem ser úteis no paciente

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com infarto agudo do miocárdio e falência aguda doventrículo esquerdo; entretanto, nessa situação, dá-sepreferência à angioplastia, dada sua maior efetividadena reperfusão. O balão intra-aórtico constitui recur-so de suporte hemodinâmico útil no contexto, comomedida transitória (“ponte”) até que revascularizaçãoou melhora espontânea possam ocorrer.

5- PROGNÓSTICO

Apesar dos avanços diagnósticos e terapêuticos,o EAP continua a apresentar prognóstico sombrio, coma mortalidade intra-hospitalar relatada variando entre6 e 30%; em recente publicação, Roguin et al.(1), ob-servando 150 casos atendidos em um hospital geraluniversitário, relataram mortalidade intra-hospitalar de12% e de 40% no primeiro ano! Segundo o mesmo autor,foram preditores de mortalidade: a presença de cho-que/hipotensão associados, IAM associado, necessida-de de assistência ventilatória mecânica, bem como evi-dências ecocardiográficas de disfunção ventricular sis-tólica.

6- CONCLUSÃO

Representando uma das mais sérias urgênciasclínicas a desafiar o médico socorrista, o EAP neces-sita de diagnóstico e tratamento imediatos; a presen-ça constante ao lado do paciente até a completa re-versão do quadro é mandatória. Pelas sérias implica-ções prognósticas, todo o esforço deve ser envidadonão só no controle clínico da descompensação aguda,mas, também, na identificação de possíveis causasreversíveis, tais como isquemia miocárdica, taquiarrit-mias, defeitos valvares agudos, etc. Na eventualidadede disfunção ventricular crônica, o correto diagnósti-co do fator descompensador (interrupção da medica-ção, erros dietéticos, infecções sistêmicas, anemia,disfunções tireoideanas, etc.) deverá ser sempre lem-brado. Nunca será excessivo salientar a necessidadede evitarmos a evolução para a disfunção ventricularatravés da detecção precoce e do controle clínico deseus principais causadores, tais como a hipertensãoarterial sistêmica, a isquemia miocárdica e o diabetesmellitus.

edema. In: BRAUNWALD E; ZIPES D & LIBBY P, eds. Heartdisease: A textbook of cardiovascular disease , 6th ed,Saunders, Philadelphia, chapter 17, p. 534-561, 2001.

2- GUIMARÃES JI; MESQUITA ET; BOCCHI EA. Revisão das IIDiretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia para o diag-nóstico e tratamento da insuficiência cardíaca. Arq BrasCardiol 79 : 1-30, 2002. Supl. 4.

3 - BURGHUBER OC. Respiratory effects of systemic disease.In: GIBSON GJ; ed. Respiratory medicine ; 3a ed, p.1965-1974, Saunders, Philadelphia, 2003.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 - ROGUIN A; BEHAR D; BEN AMI H; REISNER SA; EDELSTEIN S;LINN S & EDOUTE Y. Long-term prognosis of acute pulmonaryoedema-an ominous outcome. Eur J Heart Fail 2 : 137-144,2000.

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

1 - GIVERTZ MM; COLUCCI WS & BRAUNWALD E. Clinical as-pects of heart failure: High output heart failure; pulmonary

CASTRO RBP. Acute pulmonary edema. Medicina, Ribeirão Preto, 36 : 200-204, apr./dec. 2003.

ABSTRACT - The physiopatologic, diagnostic and therapeutic aspects of acute pulmonaryedema are reviewed, with emphasis on the cardiologic etiology. The liquid accumulation in thepulmonary interstitium follow the principles observed in any other territory, beginning in theperibronquiolar space, progressing to the peri-alveolar region with the inundation of the alveolarspace in the end. The integrity of the alveolo-capilar membrane is damaged in different degreesaccording to the pathophysiological mechanism. The diagnosis is based mainly on clinicalaspects, but an additional investigation using various methods may be necessary. The treatmentis directed to offer oxygen and to normalize the hematosis function, diminishing the liquidaccumulated in the interstitium and reestabilishing the integrity of the alveolo-capilar membrane.The immediate diagnosis and treatment are fundamental to improve prognosis.

UNITERMS - Pulmonary Edema, Acute. Respiratory Insufficiency, Acute.