6O Contrrio e o ContraditrioOs contrrios so termos divergentes que se negam, explico, branco e no-branco sem que haja intermedirios entre os dois. Se for branco no pode ser outra coisa seno o no-branco.Os contraditrios, por outro lado, comportam termos mdios, por exemplo, branco e preto so contraditrios, pois entre os dois existem gamas de cinza. Na literatura esses conceitos so bem proveitosos, preciso imaginar um exemplo...Esse pensamento lhe ocorreu enquanto cozinhava, nunca mais retomou o fio dessas reflexes.Movimentava-se bem na cozinha, as frutas j estavam sobre a mesa e a faca afiada junto tbua de fatiar frios; os pes, as passas, o peito de peru e a maionese a postos. Cortou as mas com cuidado, em fatias bem finas, separou as sementes e ps numa panela junto com o suco de meio limo e um pouco dgua para cozinhar em fogo brando. Enquanto isso abriu os pes franceses e retirou parte do miolo, acrescentando em seu lugar a maionese de seu agrado. Depois de alguns minutos observando a panela viu as mas perderem consistncia e ficarem molinhas, meio amarronzadas, liberando um aroma adocicado no ar. Retirou-as do fogo e as colocou nos pes, colocou trs fatias de peru em cada sanduche e acrescentou as uvas-passa. J podia sentir o sabor do resultado de sua brincadeira. Foi geladeira e trouxe o refrigerante, ia servir a Coca-cola com gelo picado e um pouco de suco de maracuj era uma de suas bebidas preferidas, mas optou por tomar vinho branco seco e gelado. Buscou duas taas no armrio da cozinha e serviu a mesa. Somente nesse instante se deu conta de que estava sozinho em casa. Seu filho havia feito uma viagem de frias e a esposa...Estava melhor assim, pensou. Levou a comida pra o quarto e se deitou em sua cama king-size, ligou a televiso e percebeu que no havia pago a TV a cabo. Olhou sua direita e viu as contas sobre criado mudo, decidiu pag-las, s iria terminar a taa de vinho que estava tomando, vestir uma camisa e calar os sapatos. Nesse momento seu olhar se deteve sobre os comprimidos que restavam na cartela sobre o mvel, ao lado das contas a pagar. Codena. Um analgsico poderosssimo. Provavelmente no fariam o mesmo efeito se tomados com vinho, e tomou.Uma hora depois na fila do banco se deu conta de que a droga no era to poderosa assim ou ele era resistente demais. Uma a uma as pessoas iam at os caixas eletrnicos e resolviam suas questes. Notou, tentando esboar um sorriso, que o ambiente estava plastificado, mas no uma plastificao qualquer, havia ondulaes no recinto e o som das vozes pareceu vir como se de fora dgua quando se est mergulhado na piscina. A dificuldade de caminhar ficou patente. Seu corpo pendia para a direita e tornava a procurar a centralidade, mas passava direto e arqueava para a esquerda. Sabia que todos ao redor percebiam seu estado de embriagus, no entanto forava para se desculpar dizendo de si para si que estava com labirintite e queria acreditar que seus companheiros no lugar tambm pensavam isso.Tentou falar com o encarregado de prestar auxlio aos velhos e aos ignorantes, que no sabiam se relacionar com as mquinas no banco, mas sua voz saiu frouxa, lnguida e drogadia. Misria.-- EuoU quEriiiaA faxir uown PAgamentuoo, me ajuDaaa.E mostrou a conta em suas mos.O rapaz no pareceu fazer julgamentos, conduziu-o at o caixa eletrnico e o auxiliou. Foi uma dificuldade digitar os nmeros de sua senha bancria. No retorno para casa eram apenas trs quarteires e cambaleou, quase caiu, arranhou o ombro na parede cascorenta da padaria e pronunciou em voz alta umas duas ou trs vezes o nome de sua ex-esposa. Levou uns 15 minutos para abrir o porto da residncia, entrou, deixou tudo aberto. Engatinhou pela escada at o piso superior onde estava o quarto, babava. No chegou at a cama, deu-se por satisfeito com o piso de sinteco de madeira ao lado da escrivaninha.No dia seguinte, mais de vinte e duas horas depois, os sanduches foram os mais saborosos que j comera em toda a sua vida e a Coca-cola sem gs com suco de maracuj lhe pareceu coisa de rei.