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Anotações de Fisiologia Medicina UFES Anotações das aulas de Fisiologia ministradas aos alunos de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo. André Bortolon Bissoli 07/08/2010

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Anotações de Fisiologia Medicina UFES Anotações das aulas de Fisiologia ministradas aos alunos de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo. André Bortolon Bissoli 07/08/2010

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Apresentação

Este caderno é resultado da digitação das aulas de Fisiologia ao longo do primeiro semestre do ano de

2010. O autor o fez em tempo real, dando origem a documentos brutos que depois foram revisados,

editados e incrementados com figuras e informações de renomados livros-texto da área. Entre eles,

encontram-se o Tratado de Fisiologia Médica (Guyton & Hall), Fisiologia de Berne e Levy, de Ganong e

outros.

O autor também recebeu colaborações valiosas de colegas, como Luiz Guilherme Marchesi Mello, Michael

Frank Pereira, Shaira Ferrari Rodor e Vitor Angelo Ferreira, além de outros colaboradores.

É importante frisar que este caderno não constitui uma fonte confiável de estudo, sendo na verdade uma

forma de revisar e sintetizar os conhecimentos transmitidos durante as aulas. Conforme o apresentado

pelo seu texto, o conteúdo das aulas não é completo, e não tem a obrigação de sê-lo. Uma observação

atenta do conteúdo permite mostrar que as aulas tiveram qualidade crescente até o módulo de

cardiofisiologia, decrescendo a partir daí, possivelmente por não se encontrarem na área de pesquisa dos

professores de Fisiologia.

No mais, um bom estudo.

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Sumário Apresentação ................................................................................................................................................... 3

Neurofisiologia ................................................................................................................................................. 7

AULA 1 – COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS DO ORGANISMO/BIOELETROGÊNESE .......................................... 8

AULA 2 – CONTRAÇÃO MUSCULAR (ESQUELÉTICA E LISA) ......................................................................... 11

AULA 3 – COMUNICAÇÃO INTERCELULAR .................................................................................................. 15

AULA 4 – GÂNGLIOS DA BASE ..................................................................................................................... 19

AULA 5 – CEREBELO .................................................................................................................................... 23

AULA 6 – DOR ............................................................................................................................................. 26

AULA 7 – MEDULA ...................................................................................................................................... 29

AULA 8 – SISTEMA SOMATOSSENSORIAL ................................................................................................... 31

AULA 9 – OLFATO E GUSTAÇÃO.................................................................................................................. 36

AULA 10 – NÚCLEOS E VIAS MOTORAS DO TRONCO CEREBRAL................................................................. 39

AULA 11 – CÓRTEX MOTOR ........................................................................................................................ 43

AULA 12 – FISIOLOGIA DO MEDO ............................................................................................................... 45

AULA 13 – SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO .............................................................................................. 49

Cardiofisiologia ............................................................................................................................................... 53

AULA 14 – BIOELETROGÊNESE CARDÍACA .................................................................................................. 54

AULA 15 – REGULAÇÃO DA CONTRATILIDADE MIOCÁRDICA ..................................................................... 60

AULA 16 – O CICLO CARDÍACO ................................................................................................................... 66

AULA 17 – ELETROCARDIOGRAMA ............................................................................................................. 70

AULA 18 – BIOFÍSICA DA CIRCULAÇÃO ....................................................................................................... 76

AULA 19 – REGULAÇÃO HUMORAL DA PRESSÃO ARTERIAL ....................................................................... 80

AULA 20 – REGULAÇÃO DO DÉBITO CARDÍACO .......................................................................................... 85

AULA 21 – REGULAÇÃO NEURAL DA PRESSÃO ARTERIAL ........................................................................... 91

AULA 22 – MICROCIRCULAÇÃO .................................................................................................................. 97

AULA 23 – FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL ........................................................................ 101

AULA 24 – REGULAÇÃO DE FLUXO EM REGIÕES ESPECÍFICAS DO CORPO ................................................ 103

AULA 25 – RESPOSTA CARDIOVASCULAR AO EXERCÍCIO .......................................................................... 112

AULA 26 – GRANDES ARTÉRIAS ................................................................................................................ 116

Pneumofisiologia .......................................................................................................................................... 119

AULA 27 – RESPIRAÇÃO ............................................................................................................................ 120

AULA 28 - CIRCULAÇÃO PULMONAR E RELAÇÃO VENTILAÇÃO/PERFUSÃO ............................................. 124

AULA 29 – TROCA E TRANSPORTE DE GASES ............................................................................................ 129

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AULA 30 – CONTROLE NEURAL DA RESPIRAÇÃO ...................................................................................... 136

Nefrofisiologia .............................................................................................................................................. 140

AULA 31 – INTRODUÇÃO AO SISTEMA RENAL .......................................................................................... 141

AULA 32 – REABSORÇÃO E SECREÇÃO TUBULAR...................................................................................... 147

AULA 33 – EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE ......................................................................................................... 153

AULA 34 – OS RINS E A REGULAÇÃO DO VOLUME E DA TONICIDADE EXTRACELULARES ......................... 159

ANEXO – FIGURAS-RESUMO DA FUNÇÃO RENAL ..................................................................................... 165

Endocrinofisiologia ....................................................................................................................................... 166

AULA 35 – MECANISMOS GERAIS DE SÍNTESE E AÇÃO HORMONAL ........................................................ 167

AULA 36 – HORMÔNIO DO CRESCIMENTO OU SOMATOTROPINA ........................................................... 172

AULA 37 – TIREOIDE E PARATIREOIDE ...................................................................................................... 175

AULA 39 – HORMÔNIOS ADRENAIS .......................................................................................................... 181

AULA 40 – HORMÔNIOS REPRODUTIVOS FEMININO E MASCULINO ........................................................ 186

Fisiologia Digestiva ....................................................................................................................................... 191

AULA 41 – INTRODUÇÃO AO SISTEMA DIGESTÓRIO E MOTILIDADE GASTROINTESTINAL ........................ 192

AULA 42 – SECREÇÕES DO SISTEMA DIGESTÓRIO .................................................................................... 196

AULA 43 – SECREÇÃO PANCREÁTICA, BILIAR E INTESTINAL...................................................................... 202

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7 Anotações de Fisiologia

Parte 1

Neurofisiologia

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8 Neurofisiologia

AULA 1 – COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS DO ORGANISMO/BIOELETROGÊNESE

Professora: Ivanita

organismo humano tem 60% do seu peso corporal em água. Essa água está no líquido intracelular (40%) e extracelular (20%). Do lado de fora, o interstício tem 15% da água, e 5% ficam com o plasma. Mas, como se descobriu essas proporções?

- No caso de uma proporção total, a dos 60%, é só fazer a diferença entre o peso úmido e o peso seco do organismo ou de cada órgão. Mas isso ainda não explica as outras proporções.

- Usando a fórmula de concentração (massa de soluto sobre volume de solvente). Precisamos de uma massa conhecida, e medir a sua concentração, e encontramos o volume! Injeta-se algo, que se distribui igualmente pelo corpo, e tem sua concentração passível de medição. Na prática, isso é um pouco mais difícil. A substância tem de ser não-letal, solúvel, mais duradoura. Um bom candidato é o uso de isótopos de hidrogênio da água, como o D2O. Ele será usado para medir o volume total de água.

Para medir o volume extracelular, podemos usar o azul de Evans, que entra nas células. Para medir o volume do líquido intracelular, usamos algo que não adentra as células, como a inulina. Falta o intersticial, que se obtém subtraindo o líquido plasmático do líquido extracelular.

Dentro e fora das células, respectivamente, há concentrações iônicas maiores de potássio e de sódio. Dentro da célula, o potássio está numa concentração de 150 mEq/L, enquanto o sódio está numa concentração de 14 mEq/L e o cloreto, 10 mEq/L. Fora das células, essas medidas são de 5, 140 e 110 mEq/L. A concentração de bicarbonato fora da célula é de 25 mEq/L, e dentro dela é quase nula. A concentração de cálcio dentro das células é de 1 mM, sendo esse valor variável conforme o estado em que elas se encontram e o seu tipo celular.

É importante estudar as formas diferentes de transporte: ativo e passivo (secundário e primário).

- A água passa pelas membranas por difusão simples (via aquaporinas). No caso de um soluto apolar, passa pela membrana facilmente (exemplo do oxigênio). Solutos polares, se forem íons, passam por canais.

Esses canais iônicos podem ser acoplados a receptores (ROC), como os receptores para acetilcolina (nicotínicos). Esse receptor tem 5 subunidades protéicas, e dois sítios de ligação da Ach, que quando preenchido permite a passagem de sódio pelo canal. No entanto, a maioria dos canais iônicos é regulada por outros meios.

Os receptores para adrenalina e noradrenalina podem ser dos tipos α ou β. Estão ambos acoplados a sistemas de proteínas G (com adenilato ciclase, conversão de ATP em AMPc, ativação de uma quinase pelo AMPc, abertura de um canal iônico por ação de uma quinase). O receptor α usa fosfolipase C, formando inositol trifosfato e DAG, enquanto o receptor β forma AMPc a partir de ATP.

Alguns canais iônicos são regulados por voltagem, sem a necessidade de neurotransmissores. VOCh’s (voltage operated channels) são os canais de sódio, potássio, cálcio, entre outros. Esses canais têm gates (estruturas protéicas moduladas por moléculas ou voltagem) dos lados de fora, de dentro ou ambos os lados. O canal de sódio é assim, com dois gates. A tetrodotoxina (TTX), a toxina presente no baiacu, se liga a um sítio dentro do canal de sódio, inativando-o, o que leva a bloqueios das transmissões elétricas, e a pessoa pode morrer por parada respiratória. Essa toxina pode ser usada para fins terapêuticos em doses baixas, sendo no entanto substituída por drogas menos perigosas, como a xilocaína ou a lidocaína, que também bloqueiam canais de sódio ligando-se a sítios em seu interior.

O

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9 Anotações de Fisiologia

Os canais de cálcio podem ser dos tipos L e T. Os canais de potássio podem ser de muitos subtipos, sendo os mais variados entre os canais iônicos. Todos os canais voltagem-dependentes têm uma regulação pelo tempo, retornando a um estado inativo após certo tempo de ativação. No caso dos canais de sódio, há três estados:

- Repouso ou fechado;

- Aberto;

- Inativo;

A diferença dos estados inativo e fechado está no tempo que o primeiro leva para se abrir, mais lento que no caso do segundo. Os canais de cálcio só têm estados aberto e fechado.

Por último, há canais ativados mecanicamente, como os SACh’s (stretching activated channels), e os ativados por meios diversos, como luz. Enfim, deve-se ler os capítulos introdutórios do livro.

Comunicação entre as células

Através de sinais elétricos, por exemplo. Mais lentamente, através de neurotransmissores. No caso dos sinais elétricos, há alguns fenômenos que ocorrem nas células:

- Potencial de repouso. Amplitude variável.

- Potencial de receptor e sináptico. É decremental, ou seja, perde magnitude à medida que se afasta do centro do estímulo. Também pode passar pelo processo de somação.

- Potencial de ação. Único com atividade não-decremental, ou seja, nunca perde magnitude. Surge apenas a partir de um certo limiar de excitabilidade. Não sofre somação de potenciais.

- Potencial de membrana.

A maior concentração de íons positivos fora da célula gera uma carga relativamente negativa dentro da membrana, e outra positiva fora dela. A concentrações dos íons não se igualam, pois os canais iônicos continuam fechados, e a diferença de potencial não é anulada. Se os canais fossem abertos, a diferença de concentração e o gradiente elétrico controlariam a entrada ou saída de íons até o equilíbrio. Logo, há uma determinada voltagem na qual as diferenças de concentração se anulam, sendo essa voltagem não necessariamente igual a zero. Esse ponto é o potencial de equilíbrio.

A equação de Nernst calcula valores para o potencial de equilíbrio:

ENa= 61,5 x

= cerca de 60 mV.

Nessa voltagem, as concentrações de sódio estariam equilibradas. O valor para o potássio é de -90 mV, para o cálcio é de 200 mV e, para o cloreto, de -50 mV. Mais tarde, após Nernst, a ddp entre os meios intra e extracelular foi medida no repouso, em um axônio gigante de lula. O potencial de repouso, da membrana, girava em torno de -91 mV.

Nernst calculou o potencial de equilíbrio da membrana da célula, da seguinte forma:

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10 Neurofisiologia

O cálculo das permeabilidades é importante porque cada íons passa mais fácil ou dificilmente pela membrana. Nernst não conhecia as razão de seu cálculo diferir em poucos milivolts do experimento da lula: proteínas eletrogênicas, como as bombas de sódio e potássio. Feitas as correções, os cálculos acertam em cheio o valor do experimento.

Após receber um estímulo, a célula sai do potencial de repouso e os íons vão ao seu potencial de equilíbrio, gerando a chamada despolarização. Quando se movimentam íons rapidamente, gera-se corrente elétrica. Há voltagem, resistência da membrana e corrente, caracterizando o cálculo da Lei de Ohm.

Juntamos com o cálculo de condutância (ou permeabilidade), e calculamos a força propulsora dos íons. Força propulsora é a diferença de potencial entre o potencial de equilíbrio do íon e o de repouso da membrana. No caso do sódio, há uma enorme diferença entre os dois potenciais; para o potássio, essa diferença é praticamente nula. Isso significa que a força propulsora é maior para o sódio.

Os estímulos elétricos para essa ativação da despolarização podem ser sublimiares, ou seja, não atingindo o limiar de geração do potencial de ação. Para o sódio, a permeabilidade é baixa e a força propulsora é alta. Para o potássio, ocorre o contrário. Em uma célula inteira, há fluxo de vários íons, movidos por diferentes forças propulsoras.

A despolarização se deve ao aumento da condutância ao sódio, principalmente, e à saída dos íons potássio. A partir daí, há repolarização (movimentação de íons potássio e remoção dos íons sódio pela bomba de sódio e potássio). A partir de um ponto na despolarização, os canais de sódio ficam inativos, dando origem ao período refratário absoluto. Mais tarde, durante a hiperpolarização (entrada de potássio), está o período refratário relativo, onde os canais de sódio estão fechados em repouso. Todo o potencial de ação dura pouquíssimo tempo, o que nos permite gerar vários deles em um intervalo curto de tempo, gerando estímulos nervosos de maior ou menor intensidade (tato epicrítico ou protopático, pressão).

Os limiares de excitabilidade nem sempre são constantes. Uma forma de alterá-los é mudar a concentração de cálcio: se ela aumenta, o limiar de excitabilidade aumenta; se ela diminui, o limiar diminui. Assim ocorre a tetania hipocalcêmica, em que a sensibilidade dos canais VOCh de sódio aumenta, facilitando muito a sua abertura e gerando tetania hipocalcêmica.

Essa tetania ocorre em caso de alcalose, quando a concentração de OH- sanguíneo atrai o cálcio plasmático para o sangue. Assim, o limiar de excitabilidade do potencial de ação diminui, e mais impulsos motores são gerados.

Relembrando: importância da mielinização para a velocidade de condução dos impulsos nervosos. O diâmetro do axônio também diminui a resistência para a passagem do impulso nervoso.

Há neurônios que têm receptores tônicos, ou seja, geram respostas sempre iguais ao mesmo estímulo. Há outros receptores que são fásicos, que reduzem a resposta ao mesmo estímulo com a recepção freqüente (por isso perdemos objetos, quando nosso tato se acostuma).

Transmissão sináptica

Sinapses podem ser elétricas e químicas. As elétricas podem ser do tipo GAP junctions, mais rápidas para a passagem de íons. Nas químicas, há passagem de neurotransmissores.

ΔV = R x i

R =

i = ΔV x g Força propulsora, ou seja, o

diferencial entre Em e Eeq do íon.

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11 Anotações de Fisiologia

AULA 2 – CONTRAÇÃO MUSCULAR (ESQUELÉTICA E LISA)

Professora: Ivanita

O músculo cardíaco será abordado mais tarde, em cardiofisiologia.

músculo estriado esquelético é o tecido mais abundante do organismo, com 40 a 45% do peso

corporal. É formado por células com unidades funcionais, as miofibrilas. As miofibrilas são

divididas em sarcômeros, que são unidades contráteis. Invaginações da membrana (túbulos T) se

comunicam com o retículo sarcoplasmático, formando tríades ou díades para a entrada ou saída de íons.

A passagem do potencial de ação provoca a liberação de cálcio, dando início à contração muscular. O

retículo sarcoplasmático armazena grandes quantidades de íons cálcio, graças inclusive à ação de

calreticulina e calsequestrina. Há anos vem-se estudando os fatores que envolvem a saída e a entrada de

cálcio do retículo, pois o processo não é tão simples quanto parece.

As miofibrilas são formadas por três tipos protéicos principais: proteínas contráteis, regulatórias e

estruturais. Respectivamente, geram força para a contração (actina e miosina), ajudam a controlar o

mecanismo (tropomiosina, troponina I, C e T) e mantém o formato da miofibrila.

Distrofinas em falta podem provocar a distrofia muscular de Duchenne. São proteínas que mantêm a

estrutura do sarcolema, estando conectadas à actina, a proteínas transmembrana e a proteínas da matriz

extracelular.

O sarcômero é dividido pelos discos Z. Ancorados a eles, está a titina, que se liga à miosina e está entre um

e outro disco Z.

Proteínas contráteis

A miosina possui segmentos leve (cauda) e pesado (cabeças). As duas cabeças possuem “cadeias leves da

cabeça pesada da miosina”. No músculo liso, a contração só ocorre se essas cadeias forem fosforiladas,

sendo desfosforiladas para o relaxamento. No músculo esquelético, isso não é necessário, nem no cardíaco.

Essa fosforilação parece mais com uma atividade regulatória da força da contração.

Na cadeia leve da miosina há tropomiosina e troponinas C, T e I. A I tem papel inibitório quando ligada à

tropomiosina; quando a T se liga, permite a interação entre actina e miosina; a C tem locais de fixação para

cálcio (quatro deles):

Quando o nível de cálcio está baixo, no repouso, há dois sítios de alta afinidade pelo cálcio que estão

preenchidos. Para ativar o processo contrátil, o terceiro e o quarto sítios, de baixa afinidade, têm de ser

preenchidos por um aumento na concentração de cálcio (de 10-8 a 10-4 mol/L). Isso provoca uma mudança

conformacional, que troca a ligação da I pela ligação da T com a actina.

A teoria mais aceita diz que a cabeça da miosina não se liga à actina porque a troponina está ligada pelo

sítio I. Na ativação, a troponina C se liga à actina, permitindo a formação de um sítio de ligação da cabeça

de miosina. No entanto, esse modelo está incompletamente descrito, pois não se sabe se a interação da

miosina com a actina é mecânica ou eletrostática. Sabe-se, no entanto, que a miosina e a actina deslizam,

encurtando o sarcômero.

O

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12 Neurofisiologia

Para o relaxamento, precisa-se deslocar o cálcio. Aí, a alteração conformacional religará a troponina I,

retirando a miosina. Além disso, precisa-se colocar uma nova molécula de ATP na miosina, o que explica o

mecanismo do rigor mortis. A molécula de ATP causa repulsão entre as cadeias de miosina e actina.

O que dispara toda a contração é a entrada de cálcio, aumentando sua concentração intracelular. Esse

cálcio vem do retículo sarcoplasmático, onde está armazenado. O cálcio extracelular não é necessário à

contração do músculo esquelético. O potencial de ação sinaliza indiretamente a saída de cálcio do retículo.

No músculo cardíaco, há alta dependência do cálcio extracelular.

Na tetania hipocalcêmica, a baixa concentração de cálcio regula canais de sódio VOCh dos neurônios,

disparando potenciais de ação mais facilmente (reduz o limiar de excitação), e provocando contrações nos

músculos inervados por neurônios.

Na membrana sarcolemal, proteínas receptoras de diidropiridina (DHP) são canais de cálcio voltagem

dependentes (VOCh). Quando o potencial de ação passa pela membrana, o receptor de DHP é ativado, e

ativa um segundo receptor presente na membrana do retículo sarcoplasmático, o canal de rianodina (RYR).

Este também é um canal para cálcio, que quando ativado permite a saída desses íons (é modulado pela

rianodina). Este canal não permite a entrada, apenas a saída de íons cálcio do retículo. A célula é

literalmente encharcada por íons cálcio, em quantidade capaz de matar a célula caso eles não sejam

retirados rapidamente de volta para o retículo sarcoplasmático. Esse rebombeamento é realizado por uma

proteína chamada SERCA (uma bomba de cálcio ATPase do próprio retículo), que trabalha ativamente.

O funcionamento da SERCA só se inicia após o aumento da concentração de cálcio no meio intracelular,

pois ela possui uma proteína chamada de fosfolambam (PLB). Esta é uma proteína de caráter inibitório

sobre a SERCA, que só volta a funcionar quando a primeira for inibida, o que ocorre em grandes

concentrações de íons cálcio. A calmodulina, semelhante à troponina C, tem os quatro sítios de ligação ao

cálcio preenchidos, e fosforila uma quinase que fosforila a PLB, inativando-a. Logo, a SERCA volta a

funcionar e rebombeia o cálcio para dentro do retículo sarcoplasmático.

Podemos controlar a força que um músculo esquelético faz. A curto prazo, podemos aumentar ou diminuir

a força recrutando mais ou menos, respectivamente, unidades motoras; pode-se também somar as

contrações.

Toda vez que o músculo recebe um estímulo elétrico, ele se contrai, dando origem ao que se chama de

abalo. Se provocarmos novas contrações antes do relaxamento de uma primeira, ele novamente se contrai.

Se esse processo for repetido diversas vezes, a força total do impulso aumenta. Se a freqüência de impulsos

for suficientemente alta (sendo reenviados a cada vez que o potencial de ação chega ao período refratário

relativo), a contração se torna estável, dando origem ao tétano ou tetania. Como cada músculo tem sua

força limitada, por um instante há tetania e, depois, decai ao estado de fadiga muscular. O tempo que

precede a fadiga pode ser aumentado com a adaptação trazida pelo exercício físico.

Músculos posturais têm menos fadiga, ao contrário dos músculos da mão ou dos olhos. Logo, o tipo de

músculo influencia a fadiga.

Há fibras musculares dos tipos vermelha (tipo I) e branca (tipo II). As vermelhas têm mais mioglobinas, com

ATPases miosínicas mais lentas, com uso de vias oxidativas, trabalhando com contrações mais sustentadas

e com aporte maior de oxigênio, levando mais tempo para entrar em fadiga. As brancas usam mais a via

glicolítica, têm contração mais rápida e chegam mais rápido à fadiga. As do tipo I são tônicas, e têm mais

mitocôndrias. As do tipo II têm menos mioglobina, mitocôndrias, e seu suprimento capilar é menor que o

das fibras do tipo I. Os músculos têm os dois tipos em misturas de proporções diferentes.

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13 Anotações de Fisiologia

Músculo liso

Possuem uma organização diferente, com corpos densos onde está ancorada a rede de proteínas

estruturais que contrai o músculo liso. Sua contração requer cálcio, vindo tanto do meio intra quanto do

meio extracelular. Ele incorpora características de diversos músculos.

O cálcio, ao adentrar a célula, liga-se à calmodulina, formando um complexo cálcio-calmodulina. Esse

complexo ativa uma quinase, a quinase da cadeia leve da miosina (QCLM), que fosforila a cabeça da

miosina, e ocorre então a contração muscular. Para o relaxamento, há uma fosfatase, que inativa a

contração pela remoção do fosfato da cadeia leve da miosina.

Esse cálcio vem de dentro e de fora das células. Os mecanismos que regulam a ativação da entrada de

cálcio ativam a contração muscular. Essa ativação é dividida em partes farmacomecânica e eletromecânica.

A primeira depende da ligação de moléculas como hormônios, neurotransmissores, entre outros.

Receptores de membrana, ligados a proteínas G em sua maioria, ativam enzimas intracelulares (fosfolipase

C ou guanilato/adenilato ciclase) que geram segundos-mensageiros. A segunda pode ocorrer por stress de

cisalhamento (relacionado ao fluxo sanguíneo, em sentido longitudinal) ou por pressão intraluminal (que é

um stress circunferencial).

Na ativação farmacomecânica, os receptores de membrana são ativados por hormônios (noradrenalina,

adrenalina, angiotensina II), ativando segundos-mensageiros que aumentam a concentração de cálcio

intracelular.

O stress é uma situação de alerta, em que a atividade do SNA simpático é maior, com conseqüente

aumento da concentração de catecolaminas circulantes. Elas atuam sobre o músculo liso vascular, ligando-

se a receptores (geralmente do tipo α), que induzem ativação das fosfolipases C, aumentando por fim a

concentração de IP3 dentro das células.

No músculo liso, em seu retículo sarcoplasmático, prevalecem canais de cálcio de rianodina (como no

músculo esquelético) e de IP3, principalmente este último. Quando o IP3 se liga, abrem-se os canais de

cálcio, a contração é iniciada e o músculo liso vascular se contrai.

Extra:

Logo, o efeito de medicamentos de pressão diminui a contração do músculo liso

vascular, diminuindo a resistência oferecida à passagem do fluxo, o que reduz a pressão. Esses

medicamentos inibem a ação de receptores de angiotensina II.

Existem neurotransmissores que abrem canais de cálcio diretamente da membrana, antes do retículo

sarcoplasmático. O mecanismo eletromecânico pode funcionar assim. Se a pressão do sangue sobe, há um

stress circunferencial no vaso, e o músculo liso responde a ele produzindo uma resposta contrária, via

contração (uma questão de resistir ao esforço). Chama-se esse fenômeno de resposta miogênica do

músculo liso. No entanto, como essa reposta não acaba por ocluir o vaso, visto que a pressão também

aumenta mais? A solução para esse questionamento é a seguinte: o aumento de tensão despolariza a

membrana do músculo liso, fazendo com que os canais de cálcio se abram, gerando a contração; por outro

lado, quando a membrana é despolarizada, não somente se abrem os canais de cálcio, mas também os de

potássio. Assim, vai-se no sentido oposto ao da despolarização, equilibrando a contração. O próprio

aumento do cálcio também aumenta a condutância de canais de potássio ativados pela entrada de cálcio, o

que provoca saída ainda maior de potássio da célula. Está assim explicado.

Se a tensão na parede vascular aumenta, há resposta miogênica, porém com um mecanismo regulatório.

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14 Neurofisiologia

O músculo liso possui vários padrões diferenciados de contração. Há locais nos quais uma despolarização

sem potencial de ação já abre os canais de cálcio da sarcolema, diferente dos músculos estriados. Existem

músculos lisos que ficam o tempo todo relaxados, contraindo-se somente ao receberem um potencial de

ação (como no músculo detrusor da bexiga). Outros tipos permanecem contraídos, e ao receberem um

estímulo relaxam (esfíncter esofágico). Há os músculos lisos que ficam entre um e outro padrão, possuindo

um certo tônus muscular (em todos os territórios onde haja necessidade de controle de fluxo, como em

vasos e vias respiratórias traqueobrônquicas). Por fim, há células com atividade de marcapasso, ou seja,

contraem-se e relaxam constantemente (como no trato digestivo).

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15 Anotações de Fisiologia

AULA 3 – COMUNICAÇÃO INTERCELULAR

Professor: Roberto

inapse vem do grego, e quer dizer junção. À medida que os seres ficaram mais complexos, ao longo

do processo evolutivo, foram sendo criados meios de passagem para os nutrientes e formas de

comunicação entre as células.

A comunicação pode ser feita através de substâncias (via humoral) ou de impulsos nervosos (via nervosa).

Descobriu-se no século XIX que os neurônios tinham eletricidade. Com as colorações histológicas de prata,

foi possível ver os axônios, e descobriu-se que funcionavam como um fio elétrico. Mais tarde ainda, viu-se

que passavam impulsos nervosos e também subtâncias por dentro dos axônios.

Há muito poucas sinapses elétricas no organismo, sendo comunicações citoplasma-citoplasma via junções

comunicantes (junções GAP), com poros formados por conexinas. Isso está presente em musculaturas

como a extrínseca do olho e a cardíaca, tanto que se diz que a esta última é um sincício, ou seja, um

conjunto. O resto das sinapses são químicas, ou seja, um neurônio envia vesículas com substâncias que

serão recebidas por outros neurônios.

A sinapse é uma sinalização da célula neuronal, sendo que uma delas recebe cerca de mil sinapses (em

média, podendo chegar a 100000) e envia outras mil. As células podem convergir ou divergir as sinapses.

Essas comunicações podem ocorrer no corpo ou soma, nos dendritos ou no axônio, ou seja, em qualquer

lugar do neurônio.

As sinapses têm grande plasticidade, tanto funcional quanto estrutural, tendo sua densidade aumentada

com o passar dos anos. Isso está relacionado à inteligência (pessoas com síndrome de Down têm menor

densidade nas suas sinapses). Sua estrutura na verdade só pôde ser elucidada após os trabalhos com

microscopia eletrônica.

Podemos observar, dentro do botão sináptico, vesículas contendo neurotransmissores armazenados. Há

uma fenda sináptica, entre uma célula e outra. É ali que ocorrem vários fenômenos importantes na

fisiologia. Na membrana pós-sináptica, há receptores que reconhecem os neurotransmissores jogados na

fenda sináptica; na pré-sináptica, há fusão das vesículas numa zona ativa sofisticada do citoesqueleto, onde

uma sequência de eventos para expulsão do conteúdo.

As sinapses podem ser axodendríticas, axoaxonais e axossomáticas.

Liberação do Neurotransmissor

É um processo extremamente regulado pela presença de cálcio. Há translocação da vesícula, ancoramento

na membrana, agarramento físico com gasto de ATP, fusão e exocitose com a regulação de cálcio e

endocitose da vesícula. A quantidade de cálcio que entra no botão sináptico é proporcional ao potencial de

ação que chega até ali, sendo os canais de cálcio VOCh.

O ancoramento da vesícula envolve uma série de proteínas. As sinaptobrevinas, SNAP-25 e a sintaxinas

fazem parte desse processo. A toxina botulínica impede a formação desse complexo de ancoragem da

vesícula, gerando relaxamentos musculares localizados nos tratamentos cosméticos. Pode ser usada em

casos clínicos, para seqüelas de acidentes vasculares ou tiques. Já a toxina tetânica provoca a contração

S

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16 Neurofisiologia

forte e prolongada dos músculos, em função do cancelamento da função inibitória GABAérgica da medula

espinhal.

A transmissão sináptica produz, a princípio, uma resposta localizada, ou seja um potencial excitatório, que

aumenta a permeabilidade ao sódio. A sinapse pode ter também um potencial inibitório, gerando

hiperpolarização, aumentando a permeabilidade ao cloro e ao potássio. Numa situação qualquer, há

estímulos excitatórios e inibitórios. A ação que tomaremos será definida pela soma algébrica desses

estímulos.

Todo estímulo mais intenso, no sistema nervoso, gera uma freqüência de disparo maior. Logo, se algo dói

mais ou menos, por exemplo, está enviando mais ou menos impulsos. Num neurônio, há várias sinapses

ativas que, somadas, podem atingir o limiar de excitação para gerar o potencial de ação (chama-se

somação espacial). A somação temporal se dá pelo aumento da freqüência de disparo das sinapses

excitatórias, gerando despolarizações menores porém mais efetivas. As sinapses podem ser inibidas ou

facilitadas (a memória é formada por sinapses facilitadas).

Existe uma região no corpo do neurônio que é a primeira a se despolarizar: o cone de ativação, que possui a

maior concentração de canais de sódio.

A inibição sináptica pode ser dar por interneurônios inibitórios (a maioria deles é desse tipo, poucos são

excitatórios), liberadores de glicina. A glicina aumenta a permeabilidade dos canais de cloro. Num exemplo

da contração muscular, há agonistas e antagonistas, e há muita atividade inibitória. A inibição também

pode ser pré ou pós sináptica, respectivamente sobre o soma do neurônio ou sobre o botão sináptico

(muito usadas no sistema nervoso central).

Neurotransmissores

O principal é a acetilcolina, responsável pela transmissão neuromuscular, SNA parassimpático, SNA

simpático colinérgico, SNC, entre outros. É dona de sua própria classe de neurotransmissores.

No grupo das aminas, dopamina, epinefrina, norepinefrina, serotonina e histamina. No grupo dos

aminoácidos excitatórios, glutamato e aspartato. Nos aminoácidos inibitórios, glicina e ácido gama-

aminobutíricos (GABA).

Todos os hormônios do sistema digestório são neurotransmissores do SNC. Os fatores peptídicos

hipotalâmicos são neurotransmissores, assim como os opiáceos (parecidos com a morfina, como a

endorfina). Também as inibinas, angiotensina II, peptídio natriurético atrial, adenosina, ATP (sim, isso

mesmo), NO, CO e anandamida (lipídio endógeno).

O receptor de acetilcolina foi o primeiro a ter sua estrutura decifrada.

A síntese da acetilcolina é feita no botão sináptico, sendo que os componentes peptídicos são sintetizados

no corpo do neurônio. É feita a partir da junção de colina com acetil-coA, via enzima colina

acetiltransferase. Depois, é degradada na fenda sináptica pela acetilcolinesterase. Logo, se ela for inibida,

há hiperestimulação muscular e secretora, nos sítios que recebem acetilcolina. Casos de intoxicação por

organofosforados causam essa inibição, sendo que eles podem ser usados na dose certa para tratamentos

clínicos.

Para cada neurotransmissor, há uma quantidade enorme de receptores. Para a acetilcolina, há um receptor

nicotínico e cinco receptores muscarínicos. A atropina bloqueia recepções muscarínicas, e o curare

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17 Anotações de Fisiologia

bloqueia o receptor nicotínico. Cada receptor tem um sistema específico de segundos-mensageiros, e estes

têm efeitos sobre canais de íons.

A dopamina possui cinco tipos de receptor dopaminérgico; a norepinefrina tem receptores α e β. Remédios

para a asma devem atuar em receptores bronquiais, e não nos cardíacos, por exemplo. Logo, quanto mais

específica a droga para o subtipo de receptor, pode-se ter uma resposta mais pura e com menos efeitos

colaterais. A adrenalina é usada com um primeiro antialérgico, mas é menos específica.

A serotonina possui diversos neurorreceptores. Na depressão, o tratamento é feito usando inibidores de

recaptação de serotonina, como a paroxetina ou a fluoxetina, aumentando o tempo que ela fica na fenda

sináptica. Mulheres em torno dos 50 anos de idade têm uma queda na produção de serotonina, e podem

utilizar esses medicamentos para resolver os problemas de depressão.

Os receptores para o glutamato podem ser de dois tipos: metabotrópico ou ionotrópicos (AMPA, cainato e

NMDA). O glutamato pode causar morte de partes do cérebro pela entrada de maciças quantidades de

cálcio.

O GABA produz aumento da permeabilidade ao cloro. Quando atua na via do IP3/DAG, aumenta a

permabilidade ao potássio e diminui a permeabilidade ao cálcio.

A adrenalina e a noradrenalina têm um metabolismo complexo. A catecol-ortometiltransferase e a

monoaminotransferase são as duas principais enzimas desse metabolismo.

A inibição da recaptação é usada por muitas drogas. A cocaína inibe a recaptação de dopamina, aumenta a

disponibilidade de catecolaminas na fenda sináptica, e a pessoa fica ansiosa e paranóica. Por isso, alguns

usam álcool para reduzir essa paranóia.

Revisão da síntese de glutamato e GABA.

75% das sinapses excitatórias do cérebro são feitas de glutamato. Outra grande percentagem delas é feita

com GABA, no caso da inibição.

O nosso organismo possui receptores canabinóides, ou seja, específicos para o THC. A anandamida, um

lipídio endógeno, atua nesses receptores. O efeito da estimulação sobre o receptor canabinóide no

hipocampo e no hipotálamo produz muita fome; uma droga (o rimonabanto) inibe a ação de receptores DB,

retirando o apetite do indivíduo normal. No entanto, como o apetite é parte do sistema de recompensa, a

falta de apetite pode vir acompanhada de mau humor, e tendências suicidas. O rimonabanto foi proibido

nos Estados Unidos. Interessante notar que nas cirurgias bariátricas, em que também há diminuição de

apetite, não há esse tipo de entristecimento.

Receptores acoplados a proteínas G (que podem ser pequenas ou heterotriméricas, com subunidades alfa,

beta e gama). Um exemplo é o receptor β-adrenérgico e a rodopsina. Nas heterotriméricas, uma unidade se

liga ao NT, outra se liga ao GTP, e exerce atividade de GTPase. O receptor está ligado a um transdutor, que

está ligado a um efetor primário, que gera um segundo mensageiro, que ativa um segundo efetor.

Podemos revisitar o sistema do AMPc, no qual a norepinefrina age sobre um receptor β, que se liga a uma

proteína G, que ativa uma adenilato ciclase, que gera AMPc, que ativa uma quinase, que age dentro da

célula. Quando o receptor é muscarínico, age sobre proteína G, fosfolipase C, gerando DAG e IP3.

O sistema do ácido araquidônico possui proteína G e fosfolipase A, sob influência da histamina, formando

ácido araquidônico a partir de fosfolipídios. Ele dá substrato a lipoxigenases e à cicloxigenase.

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18 Neurofisiologia

Transmissão neuromuscular (músculo esquelético)

É colinérgica, e na membrana pós-sináptica há diversas invaginações com receptores de acetilcolina (as

fendas subneurais), para garantir a transmissão do impulso. No entanto, não há necessidade de somação,

pois o potencial de ação é gerado sempre que o neurotransmissor é jogado na fenda sináptica. A miastenia

gravis ocorre quando se tem imunidade contra o receptor de acetilcolina; para resolver o problema, retira-

se o timo, que está com tumor. Além disso, utiliza-se um inibidor da colinesterase e cortisona, para reduzir

a resposta imune. Os sintomas, no entanto, só aparecem quando se perde mais de 90% dos receptores. A

fonação muda, a musculatura proximal dos membros fica fraca, entre outros sintomas.

Nas fendas subneurais, há sempre um pouco de acetilcolina, que parece manter o músculo à parte de

atrofias totais. Tanto que, quando se retira completamente a inervação de um músculo, a atrofia é muito

maior.

Nervos e transmissão nervosa

A mielina é importante para a transmissão de impulsos nervosos com velocidade e energia suficientes. Em

fibras sem mielina, esses impulsos decaem. A condução é saltatória. Nascemos com o sistema nervoso

menos mielinizado, e o processo se completa mais tarde.

As fibras são divididas pelo seu diâmetro e velocidade de condução. As mais largas têm de 12 a 20 µm,

velocidade de condução altíssima (são do tipo α), e estão relacionadas à propriocepção. A fibras β são mais

lentas, para toque e pressão. As γ são motoras. As fibras simpáticas (tipo B) são as mais lentas.

As fibras tipo B são autonômicas, e as tipo C são de dor, temperatura, tatos grosseiros, etc.

A suscetibilidade a anestesias aumenta dos tipos A para C. A fibra mais sensível à pressão é o tipo A,

seguido pelos tipos B e C. A sensibilidade a hipóxia é maior nas fibras B, seguidas pelas fibras A e C.

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19 Anotações de Fisiologia

AULA 4 – GÂNGLIOS DA BASE

Professora: Cláudia Mendes

entro do estudo do sistema motor, há estruturas relacionadas à efetuação e à modulação do

movimento, numa certa hierarquia. No topo dela, está o córtex motor, depois o tronco encefálico

e a medula espinhal. Os movimentos podem ser reflexos, rítmicos ou voluntários.

Os movimentos reflexos são executados a partir do desencadeamento da resposta motora, sem

necessidade de um comando consciente. Os movimentos rítmicos são voluntários, porém efetuados com o

que se chama de automatismo, como a marcha. Os movimentos voluntários, que exigem a participação

efetiva das áreas motoras do córtex cerebral, demandam informações mais complexas, com maior uso de

áreas associativas. Dependem mais de um aprendizado, portanto.

O tálamo integra o sistema ao receber informações de todo o sistema nervoso e emitindo a informação

para áreas superiores. Além do planejamento motor, há a formatação adequada deste planejamento, antes

do movimento e durante sua ação. No caso dos movimentos iniciados por vontade própria, agem os

núcleos da base, que colhem as informações necessárias do ambiente e do corpo (visuais, proprioceptivas,

somatossensoriais). O cerebelo age durante os movimentos, recebendo informações de órgãos sensoriais

periféricos (como o sistema vestibular), a fim de garantir a execução perfeita do movimento. Ele manda

comandos via fibras descendentes e pelo tronco encefálico.

Os gânglios da base não recebem informações da periferia (sem vias aferentes), e sua saída é através do

tálamo, diretamente para as áreas corticais. Sua influência é indireta, porém ainda assim muito importante

para a correção do movimento. Os impulsos vindos desses gânglios vão, principalmente, para áreas de

processos associativos, de preparo do corpo para a realização do movimento e para a área motora

suplementar (planejamento e controle de padrões complexos do movimento muscular).

D

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20 Neurofisiologia

Esse gânglios controlam a intensidade relativa dos movimentos distintos, as suas direções e sequências,

quando são múltiplos, sucessivos e paralelos. Assim, eles nos permitem alcançar objetivos motores

complexos e específicos, como aqueles que mostram destreza e são realizados de maneira subconsciente.

Por exemplo: escrever, digitar, manipular tesoura, bater pregos, arremessar um objeto em um alvo,

vocalização, etc.

Esses dois sistemas de correção são o que se chama de alça motora do córtex aos núcleos da base, e alça

motora através do cerebelo. A primeira sai do córtex motor, passa pelos gânglios da base, pelo tálamo e

volta ao córtex. A segunda sai do córtex motor, passa pelo cerebelo, pelo tálamo e volta ao córtex.

Os gânglios da base são um sistema motor acessório, ou seja, não são independentes. Funcionam em

íntima associação com o córtex cerebral e o sistema motor córtico-espinhal. Recebem, portanto, aferências

de todo o córtex cerebral e enviam seus sinais de volta ao córtex, via tálamo. Há uma certa somatotopia no

tálamo, no globo pálido, nos núcleos subtalâmicos e no córtex, para tornar o controle mais refinado e

objetivo.

Os componentes dos núcleos da base são o núcleo caudado, o putame, o globo pálido (segmentos interno e

externo), a substância negra (suas duas partes) e o núcleo subtalâmico. Ficam, portanto, na posição lateral

e circunvizinha ao tálamo, ocupando assim grande parte das regiões inferiores de ambos os hemisférios

cerebrais.

Muitas doenças aparecem nessa região, com alterações motoras, inicialmente, e depois com outras

alterações.

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21 Anotações de Fisiologia

De várias regiões do córtex cerebral, vão circuitos para o putame e para o núcleo caudado, e de ambos para

o núcleo centromediano no tálamo. As saídas vêm do segmento interno do globo pálido e da parte

reticulada da substância negra, indo para o tálamo e para o colículo superior. Entre os gânglios da base, a

conexão mais conhecida é a que fica entre a substância negra e as duas regiões do estriado (via nigro-

estriatal, aquela afetada na doença de Parkinson). Há saídas do núcleo subtalamico para o globo pálido, e

um feedback daquele para este. O putame também manda fibras para o globo pálido, e que se continuam

para a porção reticulada da substância negra.

Os circuitos internos facilitam a passagem direta de informações. Os circuitos do putame são, na parte

aferente, compostos pelas fibras córtico-estriatais (vindas do córtex motor, somatossensorial, parietal

superior e pré-motor). De lá, as fibras saem, passam pelo globo pálido, depois pelo tálamo, retornando ao

córtex pré-motor com um número bem menor de fibras. Entre cada porção dessa alça formada, há núcleos

de fibras que formam os circuitos. Não há elos com o núcleo caudado. Os padrões motores, se alterados,

podem resultar em atetose, hemibalismo, coréias, tremores e a doença de Parkinson (distúrbio

hipocinético com tremor de repouso das extremidades – mãos, cabeça).

No Parkinson, há dificuldade de o indivíduo iniciar o movimento. Não somente em função de uma

deficiência motora, mas também um problema motivacional, de áreas dopaminérgicas.

Os circuitos do núcleo caudado são evidentemente relacionados com o putame. Saem fibras do córtex pré-

frontal, pré-motor e somatossensorial (áreas associativas, inclusive as superiores, sem córtex motor

primário), além de áreas límbicas, auditivas. Chegam ao caudado, algumas passam também pelo putame,

indo depois ao tálamo e retornando ao córtex.

Há uma integração importante entre o ato motor e as áreas de associação. Esses núcleos, para planejar o

ato motor adequadamente, precisam receber informações em quantidade suficiente dos dois lados. As

“alças” têm de estar completas.

A via direta facilita o movimento, enquanto

a via indireta dificulta o movimento. As

estimuladoras são via glutamato e

dopamina (com receptores D1), enquanto

as inibidoras usam GABA e dopamina (com

receptores D2). O esquema abaixo é auto-

explicativo.

O excesso de atividade na via indireta é o

principal fator dos sinais de Parkinsonismo.

Um desequilíbrio no mecanismo de

apoptose dos neurônios da substância

negra parece ser a causa primária dessa

síndrome. É controlável, sendo minimizada

pela administração de L-DOPA, um

precursor da dopamina capaz de cruzar a

barreira hematoencefálica. Os neurônios

sobreviventes se adaptam, e aumentam sua

atividade a fim de compensar a morte dos

outros. A degeneração, no entanto, é

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22 Neurofisiologia

progressiva, e o medicamento passa a não fazer efeito depois de um tempo.

A inserção de células-tronco parece ser uma boa saída, juntamente com fatores de crescimento, para

reconstituir esses gânglios da base afetados.

Já a falta de atividade na via indireta é o principal fator nos distúrbios hipercinéticos (coréia de Huntington).

A vida dos indivíduos afetados é bem reduzida. Um dos vilões da destruição destes núcleos parece ser o

GABA, que apesar de ser inibitório intermedeia processos de lises celulares. Um bom tratamento seria,

portanto, inibir os efeitos do GABA sobre essas células.

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23 Anotações de Fisiologia

+ -

AULA 5 – CEREBELO

Professora: Jonaína

nome do cerebelo vem do latim “pequeno cérebro”, conforme uma observação errônea da

antiguidade. Possui muitas eferências (principalmente) e aferências. Ajuda a planejar os

movimentos e a equilibrar o corpo.

O cerebelo está localizado abaixo do lobo occipital, atrás do tronco encefálico. À sua frente, está o quarto

ventrículo. Comunica-se com o tronco encefálico via três pedúnculos cerebelares: médio, superior e

inferior. Vascularizado pela artéria vertebral, que emite as artérias cerebelares superior, inferior e

posterior. Dividido em três lóbulos: anterior, posterior e flóculo-nodular.

Histologicamente, o cerebelo contém várias pregas (chamadas de fólios). É composto por um córtex

cerebelar e uma substância branca. Há três pares de núcleos profundos: fastigial, interpósito (núcleos

globoso e emboliforme) e denteado, o maior deles.

O córtex cerebelar é dividido em três camadas. A mais externa é a molecular, composta por células

estreladas e em cesto. A intermediária é a de células de Purkinje, que faz sinapses inibitórias via

neurotransmissor GABA. Essas células são as eferências do cerebelo. A camada mais interna é a granular,

onde estão células granulares, de Golgi e terminações das células musgosas (as três juntas formam o

glomérulo cerebelar). Contornando as células de Purkinje estão as fibras “trepadeiras”.

As células estreladas, em cesta e as de Purkinje são sempre inibitórias.

O cerebelo não funciona sozinho, e sim intimamente ligado ao sistema nervoso. Está relacionado ao órgão

vestibular, aos olhos (contribuem para a noção de equilíbrio e para a noção de postura corporal). Ele

precisa receber aferências e enviar eferências, que serão estudadas adiante.

As aferências podem ser de dois tipos: via fibras musgosas e via fibras trepadeiras. As musgosas estão em

maior quantidade, sendo que as fibras trepadeiras são mais potentes. As primeiras têm origem no núcleo

da medula espinhal e no tronco encefálico, levando informações periféricas e do córtex cerebral, fazendo

sinapses excitatórias com células granulares. Estas emitem fibras paralelas, que levam sinapses inibitórias

às células de Purkinje (são várias células musgosas para excitar uma única célula de Purkinje).

MUSGOSAS GRANULARES PURKINJE TREPADEIRAS

As fibras trepadeiras têm origem no núcleo olivar inferior, fazendo sinapses excitatórias diretamente com

as células de Purkinje, bastando apenas uma fibra para excitar uma dessas células. Essas aferências são

cruciais para que o cerebelo execute a função de planejamento motor.

Os axônios das células de Purkinje têm ação inibitória, utilizando o GABA como neurotransmissor sempre.

As suas fibras se projetam para os núcleos cerebelares profundos e para o núcleo vestíbulo-lateral, levando

informações reguladoras da freqüência, amplitude, força e direção do movimento. O equilíbrio, portanto, é

coordenado enquanto se realiza algum movimento.

O lóbulo flóculo-nodular e o vérmis são os responsáveis pelas aferências vestibulares. No centro do vérmis,

há uma área com aferências do ouvido interno. Há doenças em que essas regiões são afetadas, e o paciente

perde o equilíbrio com facilidade. Pessoas com deficiência visual não têm boa postura, pois perderam a

referência postural trazida pela visão.

O

+

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24 Neurofisiologia

Nas regiões intermediárias do hemisfério está a execução motora, e o planejamento motor está nas áreas

mais laterais. O lobo flóculo-nodular é o mais primitivo, estando relacionado ao equilíbrio, posição da

cabeça no espaço e movimentos dos olhos.

Qual a função do cerebelo no controle motor global?

Dividindo o cerebelo em três partes: vestíbulo-cerebelo (lóbulo flóculo-nudolar), espino-cerebelo (vérmis e

regiões intermediárias do hemisfério) e cérebro-cerebelo.

1. Vestibulo-cerebelo

Recebe informações no lóbulo-flóculo-nodular e no vérmis, dos canais semicirculares e órgãos otolíticos. As

células de Purkinje emitem fibras que se dirigem à formação reticular e ao núcleo lateral vestibular,

chegando à medula. Dali, podem ir às partes laterais e mediais, para gerar a resposta motora. O trato

vestibuloespinal medial controla musculatura axial da cabeça e movimentos oculares. O trato

vestibuloespinal lateral controla músculos extensores dos membros, assegurando equilíbrio durante a

postura e a deambulação.

2. Espino-cerebelo

Compreende o vérmis e os hemisférios intermediários. Divide-se num centro (núcleo fastigial) e laterais

(núcleo interpósito). O núcleo fastigial emite axônios que se dirigem bilateralmente à formação reticular e

núcleos vestibulares laterais, indo à medula espinhal. Outros axônios vão para o tálamo e, posteriormente,

para o córtex motor primário.

O núcleo interpósito tem axônios que se dirigem ao núcleo rubro contralateral, e outros que vão para o

núcleo ventral lateral do tálamo.

O vérmis afetado tem distúrbios do tronco. Se os hemisférios intermediários forem lesionados, haverá

distúrbios motores da musculatura axial dos membros, dificultando também os movimentos finos das

extremidades. Lesão específica no núcleo fastigial prejudica movimentos na boca, face, o equilíbrio e

controle postural. Lesão no núcleo interpósito, provocará hipotonia cerebelar, dificultando a precisão do

movimento (até pode ser feito, ainda, porém com mais dificuldade de força e controle).

3. Cérebro-cerebelo

Compreende as grandes zonas laterais dos hemisférios cerebelares, sendo a região filogeneticamente mais

nova. As informações mais completas que se tem são as sobre o núcleo denteado. Está relacionado ao

planejamento do movimento, emitindo axônios que se dirigem à porção ventral lateral do tálamo, a áreas

pré-motoras e motoras primárias. Pode também emitir axônios que se dirigem ao núcleo rubro

contralateral, ou que fazem uma alça de retroalimentação. Esta última é um retorno das fibras ao cerebelo,

sendo um centro de ensaio mental do movimento e de aprendizagem motora. Em reabilitações, é

importante criar um ensaio mental para depois conseguir criar um movimento harmonizado. O cerebelo

tem, portanto, grande plasticidade.

O cérebro-cerebelo está relacionado ao controle motor, planejamento de movimentos seqüenciais (ao

pegar um copo d’água e levar à boca, por exemplo) e temporização. Lesões prejudicam o planejamento

motor e o tempo de reação, gerando demoras na execução de movimentos seqüenciais.

O núcleo denteado está relacionado às tarefas manipulatórias e cognitivas, além das que envolvem um

equilíbrio mais complexo. Estudos mostaram que oclusões de artéria cerebelar geram déficits de cognição,

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25 Anotações de Fisiologia

o que corrobora a dificuldade de execução de tarefas cognitivas em pacientes com lesão no núcleo

denteado.

Anormalidades clínicas do cerebelo

Dismetria (falta de noção 3D);

Falha de planejamento de movimentos seqüenciais;

Deficiências de progressão (disdiadocinesia, ou a perda de movimentos alternados, e disartria, ou a

dificuldade na fala. A pessoa se perde no meio das frases que fala);

Tremor intencional ou tremor de reação. Tremor diferente do Parkinson, ocorrendo não em

repouso mas no final do movimento, em resultado de uma hipotonia. Se isso for visto numa lesão

cerebelar, saiba que é algo grave;

Hipotonia (nos núcleos denteado e interpósito);

Perda de equilíbrio (perda de orientação da cabeça, dos olhos, incapacidade de mover a

musculatura extensora dos membros);

Ataxia, ou incoordenação.

O que há de mais novo nos estudos de cerebelo é o seu envolvimento na aprendizagem motora e nas

funções cognitivas (associação de palavras, por exemplo).

As funções do cerebelo podem ser substituídas por outras partes do sistema nervoso, demonstrando a

grande plasticidade do organismo na manutenção de funções nervosas.

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26 Neurofisiologia

AULA 6 – DOR

Professor: Roberto

az-se importante a compreensão dos mecanismos fisiológicos da dor, inclusive porque é a maior

razão para idas aos consultórios médicos. Os animais mais evoluídos reagem a certos estímulos

incômodos com algo parecido com a dor, sendo que o homem cria sua visão própria da dor. As

queixas dolorosas do paciente devem ser inseridas no seu contexto, para que sua causa seja melhor

identificada (os mesmos quadros clínicos são sentidos de forma diferente pelas pessoas). A dor deve ser

sentida na mesma intensidade por todos, mas interpretada de forma diferente por cada indivíduo. A

capacidade de descrever a dor aumenta com o tempo: bebês choram, crianças reclamam (pode ser uma

náusea), e por aí vai.

A dor tem de ser descrita em intensidade, início e fim, existência ou não de sintomas acompanhantes,

localização, tipo, melhora ou piora com alguma coisa. É uma queixa universal. Com o tempo, podemos

saber o quanto a dor gera sofrimento no indivíduo, sem ele nem falar que a sente. A dor pode ser,

simplesmente, uma somatização de um sofrimento psicológico. Sobretudo, é uma defesa do organismo, a

fim de ter uma sensação desagradável e solucionar o problema encontrado.

A dor envolve destruição tecidual e liberação de uma série de mediadores, como a bradicinina, a histamina,

a prostaglandina, o potássio, a substância P, o CGRP. Pode ser produzida a partir de estímulos mecânicos,

térmicos ou químicos. Neste último caso, a injeção de células mortas no subcutâneo provoca muita dor

(porque elas liberam potássio e outros mediadores citados acima). Outra dor considerada química é a

isquêmica: colocar o esfigmomanômetro no braço com uma pressão acima da sistólica gera isquemia

(interrupção do fluxo sanguíneo), provocando a liberação de metabólitos (ácido láctico, glicogênio, entre

outros) que não serão lavados pelo sangue. Esse processo se agrava quando os músculos do membro

superior estão com as reservas de oxigênio em baixa.

As terminações nervosas livres são pouco especializadas, conduzindo o estímulo ao corno dorsal da

substância cinzenta da medula espinhal. Há dois tipos de dor: a primeira é aguda, rápida, bem definida,

lacinante, que gera reflexo (como quando nos queimamos ou batemos o martelo no dedo); a segunda é a

que permanece depois de uma martelada, mais difusa, menos definida e prolongada (podendo durar horas

e horas).

Dica: o esmagamento de unhas pode ser atenuado com a perfuração, e posterior retirada do sangue.

Se estimularmos a pele com temperatura, a partir de 43°C, sendo mais comum em 45°C e chegando a 47°C,

o estímulo de dor se inicia. A partir desse ponto, a pele se queima. O organismo sofre danos neurológicos a

partir de 42 graus na temperatura corporal.

Potássio (das células danificadas), serotonina (das plaquetas), bradicinina (cininogênio do plasma),

histamina (dos mastócitos), prostaglandinas, leucotrienos e substância P. Há dois tipos de fibras de

condução dolorosa: as fibas do tipo C (de dor lenta) e do tipo A-delta, fazendo sinapses em locais

diferentes. As fibras do tipo C fazem sinapse nas lâminas II e III, e as fibras A fazem sinapse nas colunas I, V

(A-delta) e IV (A-beta). As fibras rápidas têm caminhos específicos, assim como as lentas. Há três vias de

dor:

- Trato espinotalâmico (vai ao córtex): produz a consciência da dor, e por essa via passam a maioria dos

estímulos. Danos no tálamo em AVC’s podem provocar dores terríveis;

F

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27 Anotações de Fisiologia

- Trato espinoreticular (vai ao córtex);

- Trato espinomesencefálico (não vai ao córtex).

A dor rápida tem uma representação cortical importante. A sua via faz sinapse no complexo ventrobasal. A

via lenta passa pela formação reticular, por núcleos intralaminares do tálamo e via para o córtex, ali se

distribuindo de forma bastante inexpressiva. As fibras dolorosas, ao subirem, passam pela formação

reticular e deixam muita informação ali: a formação reticular pode, por exemplo, interromper o sono por

causa de alguma dor, por ser muito sensível a estímulos nociceptivos.

Pode existir dor referida, ou seja, a dor em certos órgãos pode ser sentida em outros lugares. Por exemplo,

num infarto ou numa cólica biliar, as dores podem aparecer em lugares diferentes. A inervação sensitiva

das vísceras é precária em termos de somatotopia: uma dor epigástrica pode ser por uma cólica biliar, um

infarto, uma pancreatite aguda, uma perfuração na aorta, entre outros. Uma apendicite pode gerar

hiperalgesia na pele, porque as informações somáticas e viscerais podem convergir para um mesmo

segmento da medula, gerando a tal dor referida.

O coração provoca dor, principalmente por isquemia. Essa dor é extremamente vaga, e se espalha (se

refere) para outras regiões, como o membro superior esquerdo. Isso porque as fibras sensitivas desse

membro entram na medula na mesma altura que as do coração. A dor do coração é compressiva e mais

difusa (podendo ser na mandíbula, no estômago). O infarto também pode ser indolor; há também sinais

como pele fria, suor viscoso, entre outros. A pericardite tem localização mais pontual, e melhora com a

posição encurvada para a frente (poupa o pericárdio parietal). O ombro direito e o diafragma também

chegam a uma mesma altura na medula.

A dor na apendicite é incialmente mal localizada, sendo localizada quando há mais de 24 horas de

evolução. A cirurgia de apendicite pode ser limpa ou com o apêndice roto, exigindo diversas lavagens para

limpeza da cavidade abdominal (perfuração). No primeiro caso, a dor é visceral (pois atinge o peritônio

visceral) e difusa. Depois de certa evolução, a dor também passa a ser parietal (pois atinge o peritônio

parietal), tornando-se localizada.

A sensação da dor não é absoluta. Isso depende da confluência de estímulos naquela região. Um estímulo

doloroso vindo de uma fibra C, entra na medula e produz uma ativação forte. Outra fibra A-beta é

estimulada (do tato, por exemplo), e estimula um neurônio inibitório, enquanto a fibra C inibe o neurônio

inibitório. Assim, a dor é diminuída realizando um estímulo cutâneo (táctil, ou térmico) para atenuar a dor.

É a Teoria dos Portões. Isso funciona em poucos casos de dor visceral, como nas cólicas renais. Há vísceras

que não têm capacidade de gerar dor. A vísceras ocas doem por distensão, por cólica ou por isquemia

(como em infartos mesentéricos). O fígado e o baço não geram dor, apenas suas cápsulas.

O peritônio, em casos de úlcera perfurada, recebe suco gástrico e gera muita dor.

Às vezes é importante sentir dor. Às vezes não. O SNC decide quais dores vão entrar na medula ou não, por

ordens do cérebro (sistema descendente de analgesia). Isso funciona assim:

Um grupo de neurônios na zona cinzenta periaquedutal e periventricular têm neurônios encefalinérgicos

(encefalina é um tipo de endorfina, uma morfina endógena), com receptores específicos. A encefalina é

produzida por eles, e estimula os núcleos da rafe magna, que são serotoninérgicos. Eles atuam nos

neurônios da coluna posterior da medula espinhal, que são novamente encefalinérgicos. Estes

interrompem, então, a entrada na medula de estímulos dolorosos (estes entram via fibras C). Fazem

inibição pré-sináptica nas vias dolorosas, e pós-sinápticas nas vias de projeção. Esse mecanismo é

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28 Neurofisiologia

importante em situações onde nossa atenção deve estar centrada em algo que não é a dor (situações

importantes para a vida). Por exemplo, durante o exercício físico ou o ato sexual. É importante lembrar que

essa analgesia tem um limite de ação.

Alguma substâncias de potencial analgésico são:

- Pró-ópio melanocortina (POMC);

- Pró-encefalina;

- Pró-dinorfina;

A leucina-encefalina é o mais poderoso analgésico; há também beta-endorfina e dinorfina, e outros mais.

A morfina atua nos corpos celulares de neurônios sensitivos e diretamente nos núcleos da ponte. O

problema é que gera vícios muito fortes. A morfina elimina a dor muito rapidamente, gerando uma

sensação de bem-estar.

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29 Anotações de Fisiologia

AULA 7 – MEDULA

Professor: Roberto

ual a definição de inteligência? É uma propriedade que um sistema tem de fazer uma leitura do

ambiente, processá-la e gerar uma resposta eficaz. Logo, uma planária tem alguma estrutura

inteligente. Nosso sistema nervoso é uma estrutura inteligente, e o que nos diferencia dos animais

é a capacidade de nos servir das experiências de nossos antepassados. O homem desenvolveu linguagens,

criou a história, e as gerações seguintes podem se valer dessas experiências registradas.

Muito da função motora e sensitiva está guardada na medula. Esta é extremamente densa em termos de

neurônios; não se deve pensar que o córtex é o único a mandar estímulos, tornando neurônios motores

apenas efetuadores. Na verdade, temos diversos programas prontos para executar movimentos.

Como geramos uma resposta?

A medula é extremamente rica em interneurônios, criando circuitos complexos.

Um arco reflexo é uma alça aferente, no qual um estímulo vem por uma fibra aferente, que faz sinapse com

uma fibra eferente, que por fim produz uma resposta apropriada. Arcos desse tipo são monossinápticos;

podem existir arcos reflexos polissinápticos.

Como descobrir se é mono ou polissináptico? Pelo tempo de passagem de uma sinapse! Vê-se a velocidade

de condução de cada fibra (aferente e eferente), e calcula-se pelo tempo a quantidade de sinapses que ali

existem.

Os fusos neuromusculares

Nos meridianos das fibras musculares, há os chamados fusos neuromusculares. Essas fibras musculares

modificadas têm uma inervação riquíssima, sendo capaz de medir o tamanho do músculo. Isso graças a um

tipo de “mola”, que sente as deformações (ativando canais iônicos) quando estirada, disparando potenciais

de ação. Há fibras mais sensíveis ao estiramento contínuo, e outras mais sensíveis à mudança de

comprimento.

As fibras aferentes podem estar no chamado “saco nuclear” e nos núcleos em cadeia. As do primeiro são

muito sensíveis ao momento da deformação do músculo (dinâmicas), enquanto as segundas sentem mais o

músculo já esticado (estáticas). Esses dois sensores informam se o músculo está se mexendo, além da

mudança de comprimento. Não há possibilidade de atividade motora se não soubermos onde está o

músculo.

Q

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30 Neurofisiologia

O córtex motor não sabe dosar o movimento; o cerebelo, no entanto, possui dois sistemas para realizar a

atividade motora, recebendo sinais do córtex e da periferia para calcular o quanto de força deve ser

aplicada para realização do movimento. A propriocepção é dada pelas articulações e, principalmente, pelo

fuso muscular. Se não houver movimento, ele não permite alterações no tamanho do músculo.

O exame do “martelinho” estira o tendão do quadríceps para dentro da fossa infrapatelar, estirando o

músculo. Os fusos neuromusculares sentem o estiramento e enviam uma resposta motora que culmina na

contração deste músculo. É o reflexo miotático ou de estiramento. Indivíduos com doenças cerebelares não

recebem informações de seus fusos, provocando o “titubear” na postura. A resposta motora depende

completamente dos fusos neuromusculares. Há, ainda, algumas fibras motoras (tipo γ), que aumentam a

sensibilidade do fuso neuromuscular, além da eferência α. Deve-se rever a coativação α-γ na

neuroanatomia (ver o caderno).

Outro reflexo é o gerado pelos órgãos tendinosos de Golgi. Estes estão nos tendões, gerando como

resposta um relaxamento frente a estiramentos muito fortes. Outra característica que o diferencia é o fato

de ele ser polissináptico, sendo mais lento. O reflexo de estiramento é monossináptico, e mais rápido.

Há o reflexo que inibe os músculos antagonistas para que o agonista possa agir. Reflexos de retirada, por

sua vez, são polissinápticos e cruzados: quando pisamos num prego, levantamos uma perna e fazemos

extensão da outra perna, para nos mantermos em pé. Esses circuitos ficam dentro da medula espinhal.

A marcha é um processo sofisticado, com todo o seu circuito inserido dentro da medula.

O reflexo de coçar é interrompido pela dor, e está inserido na medula assim como os movimentos de

cópula.

O principal trato motor na medula é o trato córtico-espinhal. AVC’s na cápsula interna podem lesar fibras

córtico-espinhais, que modulam os reflexos da medula (geralmente inibitórios). Os reflexos ficam liberados,

ou seja, hiperreflexia, e o tônus muscular é aumentado. Há alterações também em outro reflexo: se

passarmos um objeto pontudo com força, póstero-anteriormente, no pé de um indivíduo, haverá reflexos

cutâneo plantares. Se for de flexão, está normal. Se for de extensão, é sinal de lesão córtico-espinhal (sinal

de Babinski). Deve-se destacar que a extensão é normal em crianças recém-nascidas, pois as vias

córticoespinhais não estão completamente mielinizadas.

Em caso de paralisia de origem periférica, há hiporreflexia e hipotonia.

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31 Anotações de Fisiologia

AULA 8 – SISTEMA SOMATOSSENSORIAL

Professora: Alessandra

sta aula é complementada pelo conteúdo de Neuroanatomia (recomenda-se ler o caderno desta

matéria, então).

O sistema sensorial é o conjunto formado pelos receptores sensoriais (recebem estímulos), pelas

vias ascendentes (levam informação), os circuitos neurais e os centros superiores de integração (construção

perceptiva). Depois da integração, gera-se uma resposta motora para o estímulo.

Os receptores podem ser exteroceptivos (detectam dados do meio ambiente) e interoceptivos (receptores

dentro do organismo). Um exemplo dos últimos é o barorreceptor, que avisa as alterações de pressão

arterial.

Sensações exteroceptivas: somestesia, visão, audição, gustação, olfato e propriocepção. As interoceptivas

são as viscerais.

Os mecanorreceptores sentem deformações mecânicas (tato, pressão, estiramento de vísceras). Os

termorreceptores sentem alterações na temperatura. Os nociceptores detectam lesões teciduais

(estimulados pelos mediadores de dor). Os receptores eletromagnéticos detectam variações na luz que

chega aos olhos (são os cones e bastonetes). Os quimiorreceptores contribuem com os sentidos de

gustação e olfato, além de detectarem variações nos níveis de O2 e CO2 no sangue, e na osmolaridade

celular.

O sistema nervoso estabelece comunicações através de potenciais de ação. Os receptores atuam como

transdutores, captando estímulos de natureza diversa e convertendo-os (ou não) em estímulos elétricos,

despolarizando ou hiperpolarizando fibras sensitivas que levam a informação ao sistema nervoso central. É

bom lembrar que os receptores são específicos para determinados estímulos. As vias de sinalização

intracelular, no entanto, são bastante parecidas, usando ferramentas como proteínas G, fosfolipases,

segundos-mensageiros, entre outras.

No caso dos mecanorreceptores, o estiramento da membrana do receptor provoca a abertura de canais

para cátions, mudando o potencial de membrana e gerando um impulso elétrico. Proteínas de

citoesqueleto mantêm esses canais fechados, e elas são deslocadas durante um estiramento. O potencial

de ação gerado é proporcional à freqüência do estímulo. A sua transmissão tem intensidade determinada

por somações espaciais e/ou temporais, conforme visto há pouco.

Os receptores de juntas e fusos neuromusculares mantêm freqüências de impulsos mais altas por mais

tempo. Os receptores de bulbos capilares e corpúsculos de Pacini mantêm a alta freqüência de impulsos

por um tempo menor (isso ocorre com as vestimentas, cheiros em um ambiente, entre outros).

Os receptores de Meissner e de Pacini são receptores de adaptação rápida (fásicos), ou seja, paramos de

sentir o estímulo rapidamente. Os receptores de Merkel e Ruffini já têm adaptação lenta (tônicos), que

mantêm o estímulo para nos livrarmos dele o mais rápido possível. Nesse último caso, devemos ver a

situação dos pacientes que ficam deitados numa mesma posição por muito tempo, havendo a chance de

desenvolver escara (lesões necróticas que resultam da pressão exercida).

E

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32 Neurofisiologia

Geralmente, há uma certa quantidade de receptores de mesmo tipo (campo receptivo) inervados por uma

única fibra sensitiva (aferente), gerando a unidade sensorial. Quanto menor o campo receptivo, mais

preciso ele é, e maior é sua distribuição somatotópica no córtex sensitivo primário. Os campos receptivos

são circulares, sendo a região central excitatória e, a periférica, inibitória. Isso se chama inibição lateral, e

impede que o estímulo seja interpretado como ocorrendo e áreas muito extensas.

Nós fazemos discriminações diferentes entre estímulos dependendo da região do corpo. Nas pontas dos

dedos das mãos, diferenciamos dois estímulos, que parecem um só na região das costas.

Quando ativamos um receptor, existe um limiar chamado absoluto. No entanto, para sentir o estímulo,

necessitamos de mais potencial, o que é chamado de limiar sensorial. Por exemplo: um fóton já é capaz de

estimular um bastonete. No entanto, para percebermos este estímulo, ao menos sete bastonetes devem

ser ativados.

Se recebermos dois estímulos iguais em uma região, e daí aumentarmos um deles, só a partir de um ponto

sentiremos a diferença entre eles. Este é o limiar diferencial.

Depois, as informações sensitivas chegam aos centros superiores, que geram uma construção perceptiva e,

a partir disso, a resposta que pode ser motora ou vegetativa. Quanto às fibras aferentes, que levam o

impulso até lá, chegam à medula pelo corno dorsal. Essas fibras são diferentes em termos de diâmetro e

velocidade de condução. As mais rápidas são as de propriocepção (A-α), tato e pressão (β), dor e

temperatura (AΔ), além de temperatura, dor e prurido (C).

As vias que levam as informações sensitivas são duas: o sistema lemniscal e o sistema ântero-lateral. A via

lemniscal (via lemnisco medial) leva tato epicrítico, propriocepção e vibração. A outra via leva trato

protopático, dor e temperatura.

As aferências que vêm do sistema lemniscal chegam ao córtex somatossensorial primário. No sistema

Antero-lateral, chega por três vias:

1. Trato espino-talâmico (dor rápida e bem localizada);

2. Trato espino-reticular (formação reticular e pontina, levando ao tálamo e núcleos diencefálicos.

Não tem somatotopia exata, e a dor é lenta e difusa);

3. Trato espinomesencefálico (colículo superior e substância cinzenta periaquedutal. Relacionado à

analgesia);

(Rever no PowerPoint a relação do tálamo com o córtex)

A área ventral póstero-lateral manda estímulos para a parte do córtex relacionada ao corpo menos a

cabeça. A póstero-medial, relacionada à cabeça.

Mecanorreceptores cutâneos

Os mais superficiais são de Meissner e de Merkel (adaptação rápida elenta, respectivamente), enquanto os

de Pacini e de Ruffini são mais profundos (adaptação rápida e lenta, respectivamente). Os dois primeiros

dão sensação de tato; os dois últimos dão sensação de pressão. Já a sensação de vibração é dada pelo

conjunto de receptores.

As cócegas e as coceiras surgem por meio das terminações nervosas livres mecanoceptivas e rapidamente

adaptáveis. A transmissão se dá por fibras C amielínicas.

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33 Anotações de Fisiologia

As células de uma mesma coluna do córtex recebem sinais de uma mesma região da pele, dando fidelidade

ao estímulo no seu caminho até o córtex sensitivo.

Sensitividade térmica

Os receptores para frio agem de 10 a 30 graus Celsius; os para calor começam em 30 graus, chegando a 45

graus. A partir dali, a sensação é de dor. As proteínas TRP (transitory receptor potential) são sensíveis ao

frio e ao calor, conforme o tipo. As TRPs do tipo M8 são ativadas por frio e por mentol e eucaliptol,

enquanto as do tipo A1 são ativadas por frio nocivo à saúde. As do tipo V1 são sensíveis à capsaicina,

existentes na pimenta. Dependendo da pimenta, a sensação pode ser de dor mesmo.

Propriocepção

Fusos neuromusculares, órgãos tendinosos de Golgi e receptores articulares dão informações sobre

contração, direção, posicionamento, entre outras coordenadas. A aula passada possui mais detalhes sobre

estes receptores.

SEGUNDA PARTE – VISÃO

Natureza física da luz

A luz tem duas propriedades: freqüência e intensidade (brilho). O olho humano possui receptores que

detectam comprimentos de onda (λ) de 400 a 600 nm. Enxergamos três cores primárias, sendo elas o azul,

o verde e o vermelho.

Como o ambiente estrutura a luz

A luz pode ser absorvida ou refletida, ou mesmo refratada.

O olho

Possui três camadas, sendo a mais externa uma fibrosa (com córnea e esclera), uma vascular (corióide e

íris) e uma sensitiva (retina). O olho pode, grosseiramente, ser comparado a uma máquina fotográfica. O

cristalino é avascular, transparente, e mantido por ligamentos suspensores preso a processos ciliares. O

músculo ciliar controla a forma do cristalino. A sua contração relaxa os ligamentos suspensores, permitindo

focalizar objetos mais próximos (o cristalino fica mais esférico). O cristalino mantém as imagens sempre em

foco na região da fóvea central da retina. No adulto, a distância mínima para foco é de 10 cm, dobrando a

cada vinte anos.

A luz passa pela córnea e pelos humores aquoso e vítreo, sendo refratada de alguma forma. Para mais

informações sobre olhos, e também sobre órbita, é interessante ler o caderno de Neuroanatomia.

Na retina, há dois pontos de destaque. O primeiro é o disco óptico (ou ponto cego), onde não há

fotorreceptores. O segundo é a fóvea central, onde estão muitos cones (receptores para quando há mais

luz, são de maior resolução). No restante, há mais bastonetes (receptores para quando há menos luz, sendo

de mais baixa resolução). Temos muito mais bastonetes que cones. Na região da fóvea, algumas das

camadas estão lateralizadas para a luz atingir os cones e bastonetes. Recomenda-se relembrar as dez

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34 Neurofisiologia

camadas da retina, num livro de histologia. As células amácrinas e horizontais modulam a via indireta da

retina.

Há três tipos de cones (azul, verde e vermelho) e um tipo de bastonete, que não distingue cores. Nos

bastonetes, o pigmento visual é a rodopsina (formada por opsina e retinal, vindo da vitamina A). A ausência

de vitamina A gera um quadro conhecido como cegueira noturna.

O ciclo da rodopsina é o seguinte: ela é ativada por um fóton, sendo degradada e ativando a transducina

(um tipo de proteína G), que ativa a fosfodiesterase. Esta enzima converte GMPc em GMP, que é inativo,

levando a um fechamento dos canais de sódio da célula. Logo, o potencial gerador dos bastonetes é

hiperpolarizante, ao contrário dos receptores que vimos até agora. Se o receptor não for atingido pela luz,

o GMPc ativa os canais de sódio, e o bastonete permanece despolarizado. Além disso, os bastonetes

liberam glutamato quando estão inativos, ativando as células bipolares. Ativados, deixam de liberar

glutamato, o que “desativa” as células bipolares.

Nessa região da retina, não se formam potenciais de ação (a não ser nas células ganglionares), e sim

potenciais eletrotônicos. Assim se ativam as células ganglionares e bipolares, além das horizontais e

amácrinas.

Na adaptação à escuridão, desativam-se os cones e ativam-se os bastonetes (visão escotópica). A

sensibilidade destes últimos é aumentada e há maior síntese de rodopsina. Os cones se adaptam muito

rápido. Vale destacar que a distribuição de cones e bastonetes não é aleatória.

O daltonismo é uma cegueira para as cores verde e vermelhas. A capacidade protenópica é a perda de

sensibilidade ao vermelho. A deutenópica é para o verde.

A via direta do circuito retiniano sai dos cones e bastonetes, via células bipolares, chegando às células

ganglionares. A indireta é modulada pelas células horizontais e amácrinas. As células ganglionares têm

campos receptores pequenos na região da fóvea e um pouco maiores na periferia. O campo visual pode ser

dividido em nasal e temporal, sendo o primeiro mais rico em cones e o segundo, em bastonetes.

Quando a periferia de um campo receptivo (ânulo) é contrária a um estímulo produzida pela zona central,

ela é chamada de ânulo off/centro on. Isso pode ocorrer na situação inversa também. As células on são

ativadas pelo fotorreceptor, enquanto as do centro off são inibidas pelo fotorreceptor. Essa configuração

ajuda a definir o contorno dos objetos que refletem a luz até a retina. As células horizontais intensificam

esse processo, hiperpolarizando cones vizinhos.

As células ganglionares podem ser de três tipos:

1. W (40% das células): de transmissão mais lenta, são sensíveis a detecção de movimentos em

qualquer parte do campo visual. Constitui a visão grosseira dos bastonetes na escuridão.

2. X (55%): mais rápidas, recebem informações dos cones. Levam dados sobre acuidade visual.

3. Y (5%): as mais rápidas de todos, estão relacionadas à movimentação de objetos, detectando

mudanças rápidas na intensidade da luz.

As células ganglionares ainda estão ligadas ao sistema auditivo, para termos de referência espacial.

Quando o nervo óptico deixa a retina, leva fibras da retina nasal e temporal. O quiasma óptico promove o

cruzamento das fibras de retina nasal, e continuação das fibras de retina temporal. Formam-se tratos

ópticos com hemirretinas nasais contralaterais e hemirretinas temporais ipsilaterais. Isso é importante para

determinar os campos visuais prejudicados em cada ponto de lesão.

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35 Anotações de Fisiologia

As fibras do trato óptico podem chegar ao núcleo geniculado lateral, indo dali para o lobo occipital do

cérebro (estando a sensibilidade primária nas margens do sulco calcarino). Elas podem também terminar

na região hipotalâmica, relacionando-se ao círculo circadiano, regulando-o finamente. Por fim, podem ir à

área pré-tectal, passando pelos núcleos dos colículos superiores, fazendo parte dos reflexos visuais.

Sistema auditivo

As ondas sonoras são movimentos de compressão e descompressão, de amplitudes, freqüências e timbres.

Distinguimos freqüências sonoras que variam de 20 a 20000 Hz (os sons abaixo e acima disso são

chamados, respectivamente, de infra e ultrassom). Na verdade, os sons são misturas complexas de tons

puros. Os ruídos são misturas complexas de freqüências não-relacionadas.

Acima de 120 dB os sons são lesivos, podendo lesar estruturas nucleares. São dolorosos.

Para uma revisão de anatomia do ouvido, além do processo de condução do som, recomenda-se a leitura

do caderno de Neuroanatomia.

No órgão de Corti, sobre a membrana basilar, estão as células pilosas, que recebem as vibrações da

membrana tectória, que transmite a vibração para a membrana basilar (a única que se move). As vibrações

têm sua intensidade amplificada pelo ouvido médio.

Como a endolinfa é rica em potássio, o potencial extracelular é positivo. A transdução sensorial ocorre pela

inclinação dos cílios das células pilosas, aumentando a abertura dos canais para potássio. Nesse caso, há

um influxo de potássio, gerando um potencial despolarizante. Daí, abrem-se canais de cálcio, provocando a

liberação de vesículas com neurotransmissor excitatório, que estimula as fibras aferentes do nervo coclear

(NC VIII). De lá, os impulsos vão até os núcleos cocleares, pela oliva superior, pelo colículo inferior, pelo

tálamo e finalmente ao giro temporal transverso anterior.

A oliva superior compara os sons de lados diferentes, para sabermos onde está sua fonte. Os colículos

inferiores, então, geram o reflexo de virar a cabeça para essa fonte do som.

A membrana basilar tem organização tonatotópica, assim como o córtex auditivo primário. O córtex

auditivo secundário (giro temporal superior) nos ajuda a compreender a linguagem falada e escrita (área de

Wernicke). Para a expressão, existe a área de Broca, dentro da área motora primária.

As principais causas de perda de função auditiva:

- Sons intensos (rompimento de tímpano, ossículos e membrana basilar);

- Otites interna e média;

- Com a idade, o músculo estapédio vai se enrijecendo.

Há dois tipos de surdez: a de condutância, relacionada à parte dos receptores e o que vem antes deles

(tímpano, tuba auditiva, infecções nessas áreas). Esse tipo de surdez é reversível.

A surdez de percepção envolve problemas desde a transdução das células ciliadas até o cérebro. Isso inclui

ruído intenso, infecções bacterianas, tumores e surdez congênita.

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36 Neurofisiologia

AULA 9 – OLFATO E GUSTAÇÃO

Professora: Ivanita

PARTE 1 – Gustação

xistem quatro categorias clássicas de sabor: salgado, doce, azedo e amargo. Além destas, tem sido

acrescentada uma categoria chamada “Umami”, significando algo que traz uma sensação agradável.

Possivelmente, são aminoácidos que geram este estímulo, como glutamato. Uma sexta categoria

seria o sabor de água (sim, isso mesmo!), pois certos botões gustativos são acionados por líquido hipotônico.

A divisão da língua em áreas exclusivas para cada sabor é um pouco ultrapassada, pois na verdade há apenas

áreas mais ou menos específicas. Cada botão gustativo tem receptores de diferentes tipos: para sódio (2),

para potássio (2), cloreto, adenosina, inosina (1 cada), doce e amargo (2 cada), glutamato e hidrogênio (1

cada). O paladar é feito pela mistura dos impulsos desses receptores.

As substâncias têm índices relativos de geração de impulsos, sendo extremos o ácido clorídrico (azedo),

quinina (amargo), entre outros . As substâncias amargas geralmente são alcalóides, sendo o desgosto pelo

amargo uma forma evolutivamente favorável de defesa do organismo.

O botão gustativo, estruturalmente, é composto de células gustatórias e de sustentação, sendo que as

primeiras enviam sinais através de nervos (usando acetilcolina e serotonina como neurotransmissores) para

o sistema nervoso central.

Os receptores para salgado fazem uso de canais iônicos para sódio; para azedo, canais iônicos para sódio

com simporte de prótons. A entrada dos íons gera despolarização na membrana, permitindo a entrada de

cálcio (via canais voltagem-dependentes) na célula, que provoca a liberação de vesículas contendo os

neurotransmissores citados anteriormente. A amilorida é um bloqueador de canais de sódio, presente em

alguns medicamentos. Algumas pessoas têm mais apetite para o salgado que o normal, o que pode ter uma

causa hormonal. A aldosterona, por exemplo, altera o apetite para sal, a fim de acertar o equilíbrio

hidroeletrolítico e a pressão arterial: ela altera a sensibilidade, fazendo todas as comidas parecerem insossas

e aumentando a necessidade de sal. Os osmorreceptores do hipotálamo também nos fazem sentir mais sede

(efeito dipsogênico), e aumentam a secreção de ADH, tudo em prol da volemia.

Para o azedo, o próton que entra pelos canais fecha canais de potássio, despolarizando a membrana. Isso

abre canais de cálcio VOCh, provocando liberação de neurotransmissores excitatórios.

Para o doce, há duas formas. Uma é usando receptores para sacárides (sensação doce), e outras que usam

não-sacárides. No primeiro caso, há um receptor de membrana ligado a uma proteína G (chamada de

gustatina), cuja porção GTPásica ativa uma adenilato ciclase. O AMPc ativa uma proteína cinase A (PKA), que

fosforila um canal de potássio, inativando-o. O sacáride se liga, e é ativada uma fosfodiesterase que quebra o

AMPc, permitindo a geração do potencial de ação. No segundo caso, há uso da via da fosfolipase C. Em

ambos os casos, há entrada de cálcio, que permite a liberação de vesículas cheias de neurotransmissores.

Para o amargo, há ativação da fosfolipase C, gerando IP3, que permite a entrada de cálcio na célula. Daí, o

processo é o mesmo dos outros receptores.

Os potenciais gerados pelos receptores são transmitidos via nervos facial, glossofaríngeo e vago. Fazem

sinapse no núcleo do trato solitário (onde as informações são moduladas), e as fibras vão até o núcleo

E

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37 Anotações de Fisiologia

ventral póstero-medial do tálamo. Dali, passam pelas radiações talâmicas até as áreas sensitivas do córtex.

No trato solitário, também são utilizadas informações de tato, dor e temperatura, além do olfato, para gerar

o impulso levado ao córtex.

Alguns distúrbios relacionados ao sentido do paladar são:

a) Ageusia, que é a falta de paladar.

b) Hipogeusia. Pode ser causada por inibidores de ECA (como captopril), penicilinas e sulfidrilas:

c) Hipergeusia. Pode ocorrer na gravidez;

d) Disgeusia. Sensações gustativas sem presença do estímulo.

PARTE 2 – Olfato

É uma sensação mais primitiva e menos desenvolvida nos seres humanos. O ar, ao passar pela cavidade

nasal, ativa o epitélio olfatório (melhor revisar o caderno de neuroanatomia e histologia), composto por

células de sustentação, basais e receptoras. São banhadas por uma camada de muco, na qual as moléculas

que gerarão o impulso serão diluídas. Quanto mais hidrossolúvel, portanto, mais facilmente sentida será a

molécula.

Os neurônios olfatórios se renovam, sendo mitoticamente ativos durante toda a vida. Estão em contato

contínuo com moléculas perigosas, o que torna a renovação necessária. Mecanismos de proteção contra

dessecação e agentes infecciosos também ajudam.

A transdução olfativa se dá quando a molécula odorífera é transportada por uma proteína fixadora de

odoríferos (PFO). São proteínas lipofílicas que se ligam a proteínas G olfatórias, que ativam enzimas

intracelulares (como adenilato ciclase e fosfolipase C). Uma das respostas mediadas pelos segundos-

mensageiros é o processo de adaptação, sendo relativamente rápido. Um dos mecanismos de adaptação é o

da arrestina, que é ativada pela presença constante de segundos-mensageiros, bloqueando os impulsos

gerados pelos odoríferos.

Os odores podem ser classificados, primariamente, em:

a) Canforado;

b) Almiscarado;

c) Floral;

d) Mentolado;

e) Éter;

f) Picante;

g) Pútrido;

Detectamos moléculas diferentes que ativam mais de um tipo de receptor simultaneamente, daí a grande

variedade de odores que podem ser detectados pelo olfato humano. O olfato pode também ser utilizado

como instrumento de comunicação, principalmente em animais que não o ser humano. A região vômero-

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38 Neurofisiologia

nasal é ativada por feromônios (em animais da mesma espécie) e alomônios (em animais de espécies

diferentes). Em geral, considera-se tudo como feromônios. Há três classes:

a) Alarmogênicos: produzem respostas rápidas nas quais o comportamento é sempre de escape ou de

defesa.

b) Liberadoras: geram respostas comportamentais imediatas.

c) Preparadoras: geram respostas lentas.

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39 Anotações de Fisiologia

AULA 10 – NÚCLEOS E VIAS MOTORAS DO TRONCO CEREBRAL

Professor: Roberto

tronco cerebral envolve o bulbo, a ponte e o mesencéfalo. È uma grande via de passagem dos

feixes que vão do córtex à medula. Dentro dele, há núcleos importantíssimos para a atividade

motora. Quais as principais funções para essa atividade, no tronco cerebral?

As estruturas são antigas, evolutivamente, com um controle motor bastante rudimentar. A principal função

está relacionada à postura e ao equilíbrio. A postura se dá pela contração de músculos determinados, da

musculatura axial ou central, além da musculatura proximal dos membros. Outro grupo, o da musculatura

extensora, também nos permite manter a posição ereta (esse rearranjo foi fundamental no controle

postural). Novamente, o controle da extensão é feito no tronco cerebral, nos núcleos pontinos e bulbares

da formação reticular. Os núcleos pontinos reticulares têm um efeito excitatório, enquanto os bulbares

inibem a musculatura extensora (principalmente a das pernas). Os núcleos bulbares sofrem influência

estimulatória muito grande do córtex motor, o que nos permite, por exemplo, o movimento de sentar.

A rigidez de descerebração é provocada pela separação do córtex em relação à formação reticular bulbar,

retirando o efeito inibitório sobre a musculatura extensora. Assim, a formação reticular pontina ficará

sempre estimulando a contração dessa musculatura (hipertonia). O tônus é tão grande que, se a pessoa for

posta de pé, em coma, ela permanece assim. Um animal descerebrado desta forma faz flexão, ao invés de

extensão: a preguiça, que se mantém pela musculatura flexora ao invés da extensora.

Os sinais inibitórios ou excitatórios são enviados via tratos reticuloespinhal bulbar (sinais inibitórios) e

reticuloespinhal pontino (sinais excitatórios). Ao desligar a postura ereta, portanto, precisamos de sinais

inibitórios. Os gânglios da base também auxiliam esse desligamento, provocando hipertonia em caso de

doenças nessa região.

O tronco cerebral também possui os núcleos vestibulares, que na prática são núcleos cerebelares (estão

totalmente ligados ao cerebelo). Para manter o equilíbrio, entram em ação o cerebelo e as aferências que

ele recebe, estas passando pelos núcleos vestibulares para depois irem ao cerebelo. Aliás, os sintomas de

doenças cerebelares mais característicos vêm de lesão no vestíbulo-cerebelo, provocando movimentos

titubeantes. Tumores no cerebelo podem causar movimentos característicos de pessoas embriagadas, e a

fonação também fica prejudicada (“escandida”). A diadococinesia é a capacidade de exercer movimentos

alternados, sendo a disdiadococinesia o quadro defeituoso dessa característica.

A grande função dos núcleos vestibulares é receber informações contínuas sobre propriocepção e,

principalmente, sobre a posição da cabeça no espaço (mais que o corpo todo). Isso nos dá a noção do que

está para cima e o que está para baixo, além da direção em que a cabeça está sendo posta. O aparelho

vestibular está localizada no labirinto ósseo, formado por três canais semicirculares, somados ao sáculo e

ao utrículo (labirinto membranoso). É o sensor capaz de medir a posição e a direção da cabeça, a partir dos

movimentos da endolinfa, um líquido de baixa densidade que ativa estruturas especiais.

Nas ampolas, estão as cristas ampolares (no fim de cada canal semicircular); na mácula estão as

estatocônias. Em ambas as estruturas, há células ciliadas sobre as quais fica uma gelatina, sobre a qual

estão pequenas pedras de carbonato de cálcio (otólitos ou estatocônias). Assim, as células ciliadas são

movimentadas, gerando os estímulos que caminharão pelo nervo vestibular (parte do NC VIII). É um nervo

extremamente delicado, podendo ser lesado facilmente, o que provoca desconforto.

O

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40 Neurofisiologia

O utrículo detecta a inclinação da cabeça (aceleração linear horizontal). Isso acontece por movimentos de

líquido, captados por células sensíveis a movimentação em sentidos diferentes, que estão localizadas em

partes diferentes do utrículo. De lá, saem fibras de neurônios excitados ou inibidos, que criarão um mapa

somatotópico no cerebelo, para gerar reflexos que mantenham a postura. Logo, se uma pessoa tem a sua

cabeça empurrada para a frente, por exemplo, o cerebelo envia sinais de reflexo para nos mantermos de

pé. A estríola é uma região no utrículo que serve como marcador de posição.

O sáculo, por sua vez, detecta aceleração linear vertical, enviando fibras para o cerebelo, que gerará uma

resposta motora reflexa apropriada para a manutenção da postura.

Os canais semicirculares são pares funcionais, de forma que haja dois verticais com 45° entre si, dois

horizontais trabalhando de forma complementar. O posterior de um lado trabalha com o superior de outro.

Estes canais trabalham com a rotação da cabeça. O líquido, na verdade, não circula dentro dos canais

semicirculares, pois estes são interrompidos. A cabeça que se mexe, e como o líquido fica parado, este

atinge as células sensoriais da ampola. Um sentido vai ter despolarização, e outro vai ter hiperpolarização.

Obviamente, dependendo da natureza do movimento, haverá ativação de mais de um canal

simultaneamente (como horizontais e posteriores).

Lembramos que a nuca, as articulações e diversos sensores periféricos são também responsáveis pela

propriocepção, assim como a informação visual. Esta, no entanto, é lenta, pois há necessidade de

processamento demais. É interessante também perceber o enjôo após muita correção postural, como

viagens num barco ou numa estrada sinuosa, visto que as vias de náusea são ativadas simultaneamente

(chama-se cinetose ou motion sickness).

O reflexo vestíbulo-ocular é outro assunto interessante. O sistema vestibular está intimamente conectado à

musculatura extrínseca do olho, de forma que podemos manter o olhar enquanto a cabeça se move. Afinal,

a nossa orientação não pode depender de uma cabeça parada, o que é uma situação um tanto irreal no

cotidiano. Para cada desvio da cabeça, deve haver um desvio contralateral dos olhos. O canal semicircular

detecta o movimento; no núcleo vestibular, tem o origem o trato ascendente de Deters, que sobe até o

núcleo do NC III, de onde sai uma fibra para o olho ipsilateral e outra para o núcleo motor do músculo

contralateral. Há também estímulos inibitórios, que regulam os músculos antagonistas dos que estão

agindo no momento.

Para algumas pessoas, é difícil ler no ônibus, pois o ajuste ocular gera impulsos demais. Estes impulsos são

lentos e difusos. O ajuste de postura é influenciado por sons e imagens, além dos próprios estímulos de

prorpriocepção.

A labirintite pode ser um distúrbio em toda a via do sistema vestibular, com vertigem essencialmente

rotatória. A estreptomicina tem como efeito colateral a perda parcial do reflexo vestíbulo-ocular.

PARTE 2: CICLO SONO/VIGÍLIA

Por que dormimos? Dizia-se que era para evitar uma fadiga progressiva do córtex. No entanto, isso não

explica o sono, pois teríamos um processo progressivo, estando muito enérgicos de manhã e exaustos à

noite. O sono, porém, é súbito, ou rápido, não sendo explicado pela fadiga. Um pesquisador italiano nos

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41 Anotações de Fisiologia

anos 50 descobriu que, se uma certa região da formação reticular do mesencéfalo fosse estimulada, o

animal simplesmente despertaria. Se fosse cortada, entraria em sono contínuo.

A estrutura do cérebro mais sensível às variações de dia e noite é o núcleo supraquiasmático do

hipotálamo, que ativa a formação reticular para acordarmos, e a desliga para dormirmos. Os estímulos

externos que produzem sono são os zeitgebers, os doadores de tempo. O principal deles existente na

natureza é a luz. No entanto, alguns ciclos são controlados por instinto, como os ratos, que acordam à noite

e dormem de dia, para evitar predadores. Os zeitgebers podem ser artificiais, como o noticiário numa

televisão, dentro de um CTI.

Nosso ciclo dura cerca de 24 horas. Sem nenhum doador de tempo, o ciclo iria para algo em torno de 30

horas.

Sono é um estado de inconsciência do qual se pode ser despertado pela estimulação sensorial. O estado de

consicência, simplificando, seria acordado, sonolento (dormindo e pode ser acordado), torporoso

(geralmente patológico) e comatoso. O coma pode ser classificado numa escala de Glasgow, de acordo com

as diferentes respostas do organismo. No coma induzido, a medicação faz com o que o córtex cerebral seja

desligado temporariamente.

O sono de ondas lentas é do tipo profundo, repousante, caracterizado pela diminuição do tônus vascular

periférico, pressão snaguínea, da freqüência respiratória e do metabolismo. Podem ocorrer sonhos.

O REM (rapid eye movement) é o chamado sono paradoxal, pois o cérebro se encontra bastante ativo,

havendo contrações de músculos esqueléticos. Dura de 5 a 30 minutos, repetindo-se em intervalos de 90

minutos. Se a pessoa estiver muito cansada, o sono REM pode estar ausente, retornando quando a pessoa

estiver mais descansada. Quando acordado no meio de um sono REM, lembramos mais do sonho (inclusive

os sonhos eróticos, com os efeitos conhecidos). Usualmente, quando acordamos de manhã, estamos no

período REM. O tônus muscular é substancialmente deprimido, e a freqüência cardíaca e a respiração

tornam-se irregulares. O metabolismo cerebral é aumentado em cerca de 20%, sendo as ondas cerebrais

semelhantes às do estado de vigília (eletroencefalograma).

Não se comprovou a real importância da melatonina na mediação de processos do sono, por isso não

entraremos em detalhe. O peptídeo muramil se acumula na urina e no líquido cefalorraquidiano, e se for

injetado pode induzir o sono em minutos.

O sono REM é acentuado pelos agonistas colinérgicos, via projeções de neurônios colinérgicos da formação

reticular do mesencéfalo. Assim, ele se inicia, evitando os sistemas que iniciam o estado de vigília e o

sistema reticular ativador. O álcool diminui o tempo de sono REM, e geralmente os etilistas com

abstinência têm alucinações.

As ondas cerebrais são potenciais elétricos que se originam próximo à superfície do cérebro, medidas pelo

exame eletroencefalograma (EEG). Elas surgem de milhões de neurônios que disparam simultaneamente. A

sincronização do cérebro significa que a hora de dormir está próxima. Quando se quer produzir sono, é só

sincronizar a ação cerebral, portanto. Podem ser dos tipos:

- Alfa: rítmicas, freqüência de 8 a 12 Hz, com 50 microvolts. Encontradas em pessoas normais, despertas,

mas em repouso (“estar em alfa”).

- Beta: olhos abertos na luz. 14 a 80 Hz. Abaixo de 50 µV.

- Theta: 4 a 7 Hz. Mais comum em stress, estado degenerativo, e em crianças.

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42 Neurofisiologia

- Delta: sono de ondas lentas (mais profundo).

Os ciclos de sono são dos estágios 1 a 4, depois REM, e depois de 4 a 1. Isso se repete cerca de cinco vezes

por noite. O sono REM parece servir como se fosse um tipo de checagem das funções cerebrais. A

quantidade e a duração de sono REM variam em crianças, adultos e idosos, diminuindo com a idade.

Nestes, a sua duração é menor, inclusive no tempo total de sono (4 a 5 horas por dia). Adolescentes, no

entanto, dormem mais.

O frio é mais potente para impedir o sono. Há

pessoas que precisam de dormir com uma

televisõa ligada, o que reduz a atividade

cerebral.

O processo de adormecimento envolve uma

deaferentação, ou seja, uma eliminação de

estímulos. Por isso desligamos a luz, deixamos o

quarto em silêncio, entre outras ações. O

mecanismo do ciclo entre o sono e vigília é

explicado por um tipo de feedback. O córtex

estimula a formação reticular, que reestimula o

córtex, que reestimula a formação reticular.

A vigília prolongada é relacionada à lentidão de

pensamento, à irritabilidade e, até mesmo, ao

comportamento psicótico. O sono renova o

equilíbrio normal da atividade em muitas partes

do cérebro, desde os centros superiores

intelectuais do córtex até as funções mais vegetativas.

O que são dissonias?

A insônia pode ser inicial (ansiedade, maus hábitos), ou não (idade, mais comum em mulheres que em

homens). Sonambolismo também é um fenômeno comum, principalmente em mulheres. Põe a pessoa em

risco, o que felizmente pode ser interrompido acordando-o. Desaparece na puberdade, geralmente.

Pode haver também o sono com fala.

O terror noturno é outra forma de dissonia. A pessoa grita durante o sono; esse processo pode ser causado

como efeito colateral de remédios tranqüilizantes.

A narcolepsia é um distúrbio causado por mutação genética. Indivíduos com esse problema dormem diante

de situações de stress ou importantes. É um problema para condução de veículos, operação de máquinas,

entre outros.

A apnéia do sono se dá pela hipotonia da musculatura de sustentação da língua, associada a uma condição

de queixo pequeno, por exemplo. Isso aumenta a pressão arterial e o risco cardiovascular, sendo necessária

uma máscara de pressão contínua. Pode surgir com obesidade ou gravidez. Pode ser tratada também com

cirurgia, com acondicionador de mandíbula (que pode causar disfunção da ATM) ou com exercício da

musculatura que sustenta a língua.

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43 Anotações de Fisiologia

AULA 11 – CÓRTEX MOTOR

Professor: José Geraldo Mill

s neurônios motores ficam sempre no corno anterior da medula espinhal, podendo ser dos tipos α

(fibras de inervação da musculatura normal) e γ (modula a tensão das terminações anolospirais do

fuso neuromuscular). O córtex cerebral é o grande modulador de atividade dos nuerônios α,

estando o controle do outro motoneurônio em centros subcorticais.

O sistema motor pode ser dividido em medula espinhal, tronco cerebral e poucas partes do diencéfalo, e o

córtex. Os movimentos voluntários se originam no córtex, enquanto os involuntários (tônus muscular,

batimentos cardíacos, respiração) se originam no tronco encefálico. Depois, o movimento somático é

corrigido pelos mecanismos que estudamos nas aulas passadas, com processamento ligado a aferências.

Esses ajustes são aprendidos de maneira quase inconsciente

Os neurônios motores podem ser parte de dois sistemas:

1. Somático: controle dos músculos esqueléticos, via neurônios α e γ.

2. Visceral: pode ser vegetativo ou autônomo, controlando músculos liso e cardíaco, além de células

secretoras endócrinas e exócrinas. Sua via final se dá via neurônios motores do tipo C simpáticos

(noradrenérgicos) e parassimpáticos (colinérgicos). Hoje, no entanto, sabe-se que esse sistema

exerce controle também sobre componentes do sistema imunitário. As fibras parassimpáticas

podem ser também do tipo B.

No sistema motor somático, há quatro classes de movimentos:

a) Reflexos: gerados por estímulos internos (principalmente no SN visceral) ou externos

(principalmente SN somático) específicos. Os estímulos podem vir através de órgãos sensoriais com

células especializadas, como os cones e bastonetes, ou em quimiorreceptores. Os órgãos sensoriais

funcionam como transdutores de energia, gerando impulsos elétricos a partir dos estímulos. Os

impulsos serão analisados pelo órgão de análise, de onde sairá uma via eferente de resposta.

Alguns exemplos são o miotático ou de estiramento, flexor, de retirada, entre outros.

Indivíduos cadeirantes geralmente são hiperreflexos, bastando tentar esticar algum músculo para

uma resposta. O reflexo fotomotor é consensual. Em traumatismos cranianos, é importante

observar se esse reflexo está ativo (ou se está com midríase paralítica), para identificar possíveis

lesões no tronco encefálico. A pesquisa de reflexos é importante para identificar a localização de

lesões.

Os movimentos reflexos podem ter diferentes níveis de integração, como segmentares,

intersegmentares, do tronco cerebral. São gerados por estruturas chamadas de “arcos reflexos”.

b) Rítmicos: de geração automática, podem depender de aprendizado ou não. O mais primitivo que

temos é o da respiração, governado por motoneurônios do tronco cerebral sensíveis à

concentração de CO2 no sangue (neurônios inspiratórios). No nascimento, a criança passa a precisar

da respiração, e aí são ativados esses neurônios. Ele inspira, e ao expirar, chora. Se não houver

choro, é sinal de que não houve inspiração. Esse movimento rítmico já veio programado no

organismo; outros podem vir de um aprendizado, como andar, mastigar, nadar, pedalar, entre

outros.

O

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44 Neurofisiologia

Nos movimentos rítmicos, os circuitos neuronais são ativados dentro de um padrão temporal e

espacial definido, gerando movimentos altamente estereotipados e repetitivos. Podem ser pré-

programados ou não, atingindo diferentes níveis de integração. Sofrem influência do

desenvolvimento e aprendizado motor. São gerados em circuitos complexos, com todos os níveis

de organização morfofuncional do sistema nervoso. O aprendizado motor varia de pessoa para

pessoa.

c) Posturais: baseados no centro de gravidade da cabeça e do corpo, sendo ajustados pelo tronco

cerebral. Durante a execução, esses ajustes são realizados por circuitos mais complexos.

d) Voluntários: orientados pela “vontade”, sendo um comando consciente. Podem ocorrer durante a

inconsciência, como no caso de sono REM ou sonambulismo. Dependem de função cortical, sendo

gerados em neurônios de Betz (tipo gigante, nas camadas IV e V). Estes movimentos têm

integração complexa com ajustes posturais e equilíbrio, sendo executados para uma determinada

função. Requerem representações espaciais interna (propriocepção, cerebelo e tronco) e externa

(visão), além de uma representação temporal (percepção de movimento e audição).

A geração de padrões de movimentos complexos envolve um programa, que é acionado. Antes, são feitos

ajustes de postura, diminuindo o tônus em músculos agonistas e aumento do mesmo em músculos de

sustentação. O movimento propriamente dito se inicia com o comando cortical, sendo os erros corrigidos (a

partir do feedback de receptores somestésicos, da visão) pelo cerebelo, e por fim reprogramados. Os

núcleos cerebelares são bastante inibidos pelo álcool.

A preparação para o movimento é extremamente importante, pois paralisa as células de Betz, tornando-as

mais receptivas para novos estímulos e evitando conflitos de informação, para depois haver uma ação

eficaz. É uma inibição antecipatória.

Voltando aos reflexos, existe o conceito da encefalização de reflexos. Os controles motores estão divididos

em dois sistemas anatomo-funcionais distintos:

a) Sistema lateral: formado pela via córtico-espinhal lateral, correndo pelo funículo lateral da medula.

Controla os movimentos finos de extremidades. Existe o trato rubro-espinhal, saindo do núcleo

rubro para o córtex, excitando motoneurônios.

b) Sistema medial: envolve mais movimentos posturais. O trato tecto-espinhal sai do colículo superior,

mantendo a postura de cabea e pescoço. O trato vestíbulo-espinhal sai do ouvido interno e dos

núcleos vestibulares, controlando o movimento dos olhos, da cabeça e do pescoço. O trato

reticulo-espinhal sai da substância reticular do tronco, nas regiões pontina e mesencefálica (ver

aula anterior).

Os diferentes tratos têm uma predominância diferente em diferentes animais. No homem, são mais

desenvolvidos o córtico-espinhal, tegmental central, olivar. O núcleo rubro presente no homem é

predominantemente de células pequenas, quase não havendo células grandes. É considerado um vestígio

evolutivo.

O homúnculo de Penfield é uma representação somatotópica das áreas motoras primárias do córtex

cerebral, no giro pré-frontal. Mais de 50% dessa área é dedicada à musculatura das mãos. Essa divisão varia

nos primatas, o que pode explicar as grandes habilidades manuais do homem.

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45 Anotações de Fisiologia

AULA 12 – FISIOLOGIA DO MEDO

Professor: Luiz Carlos Schenberg

Estudos feitos por Cannon e Bart

studos iniciais do século 19. O medo, dada a sua importância tanto para a psiquiatria como a

sobrevivência da espécie, trouxe grandes estudos.A falsa ira foi dita como a reação de emergência.

Animais fixos estereotáxicos e anestesiados com clorofórmio, sem córtex, supostamente não

deveriam ter emoção. No entanto, apresentaram a reação de um animal intacto. Isso foi chamado de falsa

ira, pois um animal sem córtex não deveria ter consciência do estava sendo feito.

Esses experimentos foram importantes para mostrar que as emoções, uma coisa tão fascinante, podem

estar em lugares além do córtex: suas expressões estão também em regiões subcorticais. O estudo no

animal também demonstrou, por métodos rudimentares, o que hoje já pode ser bem explanado. Durante

uma reação de defesa há um aumento da pressão arterial, da freqüência cardíaca, do fluxo femoral (sangue

desviado para os músculos, tornando a luta possível), e a condutância muda. Já o fluxo renal não muda. Há

vasocontricção das vísceras e da pele acompanhada de suor frio, ou seja, o organismo “se torna músculo

estriado, cérebro e coração”, dando-se quase importância nenhuma a demais regiões.

Antes dos mecanimos atuais, havia oncômetros, que antecederam os aparelhos modernos. Cientistas

usavam gatos pegando um dos seus músculos, colocan-do dentro de uma bolsa de água, seguido pela

adição de um manômetro. Se o nível da água subisse, o órgão teria se dilatado; se a água descesse, teria

havido vasoconstricção. Isso é diferente para vísceras como rim e baço. A condutância (mm/min x mmHg) é

o fluxo dividido pela pressão arterial: isso nos diz se houve vasodilatação ou vasoconstricção. Tudo isso

deveria ser feito com o máximo cuidado, pois a fibra pós-ganglionar do simpático é vasodilatadora em

felinos. Daí veio a idéia de ajuste homeostático: todo o organismo se organiza para lidar com uma

determinada ação. Foi um desenvolvimento feito por Cannon através de suas pesquisas relacionadas à falsa

ira.

Cannon não tinha idéia do lugar no qual aconteciam tais variáveis fisiológicas; Bard fez experimentos

realizando secções em diversos níveis cerebrais, hipotalâmicos e tronco cerebral pra saber em que lugar

afetaria a reação de falsa ira. Os segmentos do teto do mesencéfalo ao nível dos corpos mamilares poriam

fim ao processo de falsa ira. A reação era, portanto, ao nível hipotalâmico.

Estudos de Waltes R. Hess foram grandes contribuintes para as pesquisas da falsa ira; estimulando ratos

com eletrodos, ele estudava comportamentos que eram influenciados por esses estímulos em animais

intactos. Não é mais falsa ira: aqui já está a reação efetiva de defesa em gatos. Observaram-se diversas

ações do animal em diferentes regiões do cérebro, principalmente nas várias partes do hipotálamo . Os

estudos de Hess coincidiram com os estudos de Cannon em suas secções, corroborando-as. Mais tarde Von

Holsi fez estímulos no hipotálamo da galinha, mostrando que a resposta era estereotipada com fuga,

alimentação e demais mecanismos que nem sempre eram relacionados com a raiva. Mas, com o aumento

do estímulo sobre o hipotálamo, a galinha apresentava diferentes reações de luta e fuga, mostrando que

além de aumentar a resposta ao estímulo externo (como a presença de um furão e as diferentes ações

sobre esse) ele influencia diretamente as suas próprias funções.

O conceito de estresse de Hans Selye foi utilizado pela primeira vez em 1936. O estresse é uma resposta

inespecífica do organismo a estímulos intensos inespecíficos, tanto interna quando externa, física ou

E

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46 Neurofisiologia

psicológica. Cannon e Selye discutiram muito na época, pois Cannon defendia a teoria do corpo buscar a

homeostasia e Selye defendia a pressão causada por esse estímulo inespecífico.

As reações inespecíficas aos estressores (ou síndrome geral de adaptação) são caracterizadas por:

a) Hipertrofia das adrenais;

b) Involução timo-linfática;

c) Ulcerações gastrointestinais;

O estresse ativa o SNA simpático, e este age sobre diversos órgãos:

Os glicocorticóides têm ação ampla sobre o organismo:

Aumentam a utilização de glicídeos e diminuindo a utilização de lipídeos. No entanto, se há

necessidade de utilização a posteriore de glicose, os glicídios têm seu uso restrito a determinados

órgãos.

Favorecem o aporte de carboidratos para coração e cérebro e diminuem sua utilização em demais

órgãos.

Favorecem a síntese de carboidratos através da gliconeogênese.

Exercem inibição do sistema imunológico (involução timo-linfática). Assim, o estresse influencia a

queda do sistema imune, que parece estar ligada ao bloqueio da captação de substâncias

nutritivas. Vale lembrar da utilização de corticóides nas doenças auto-imunes.

No medo existem três respostas: ficar congelado, fugir ou lutar. Cannon trabalhava em relação à função de

medo na sobrevivência, mas sabe-se que essa estimulação prolongada torna-se agressiva . O estresse

contínuo leva a diversos processos “patológicos”. Deve-se entender que o mesmo estresse leva à alostase,

ou seja, diferentes em diferentes pessoas, pois cada um tem capacidade diferente de lidar com a situação.

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47 Anotações de Fisiologia

A síndrome geral de adaptação se desenvolveria em 3 estágios:

O estresse muito prolongado leva a um

esgotamento dos glicocorticóides, levando o

organismo ao completo desgaste e exaustão.

O sentido de estresse hoje é um pouco diferente.

Vários tipos de estresse têm várias assinaturas

endócrinas, não havendo especificidade da

reação. A demanda intensa do organismo deixa-

o susceptível a diversas doenças.

Os pacientes com depressão têm níveis de

cortisol muito altos, provando que estímulos

internos causam a depressão endógena – o

estresse crônico pode levar à depressão.

Acredita-se que há uma hiperfunção genética do

eixo, levando ao processo.

Controle do hipotálamo nas respostas neuro-endócrinas

Zonas do hipotálamo:

1. Ao nível do fórnice: zona medial (defesa e reprodução);

2. Núcleos do hipotálamo: zona periventricular (controles viscerais);

3. Em contato com o córtex temporal: zona lateral (conjunto de grandes neurônios relacionados com

o ciclo sono-vigília);

4. Controle de cada região corporal

5. Reprodução, defesa, vigília e respostas viscerais

Aliados do hipotálamo

O hipotálamo não consegue realizar todos os estímulos sozinhos. Daí atua o sistema límbico, sendo uma

estrutura que tem uma conexão íntima com o hipotálamo. O grande lobo límbico ou lobo da orla é a

grande região de funcionamento do sistema límbico. Eis as principais vias do sistema límbico:

1. Vias primárias: circuito de Papez

Corpo mamilar tálamo anterior hipocampo hipotálamo (fórnice) componente pós-comissural

ou pré-comissural.

Papez demonstrou que o hipotálamo tem relações diretas com o córtex, e assim temos consciência das

atitudes que tomamos.

2. Vias secundárias: vias amigdalo-hipotalâmicas

Amígdala base do cérebro

Amigdala por cima dos gânglios da base mergulham na altura do hipotálamo e fazem conexão com o

núcleo paraventricular do hipotálamo. A amígdala participa da interface cognição-emoção, do preparo para

o medo, das respostas autonômicas emocionais e do controle dos padrões comportamentais.

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48 Neurofisiologia

3. Vias terciárias

Área septal habênula núcleo interpeduncularnúcleo central medial da rafe.

Vias serotonérgicos e monoaminérgicas têm uma profunda relação com esse sistema.

4. Vias quaternárias (monoaminérgicas)

5. Fascículo longitudinal dorsal de Schütz (vias hipotálamo-mesencefálcias)

Relaciona a matéria cinzenta periqaquedutal (MCPA) com o hipotálamo.

6. Portas do sistema límbico

O sistema de defesa

O hipotálamo, a amígdala e a substância cinzenta periaquedutal são estimuladas, nessa ordem,

constituindo a via de defesa. A estimulação da MCPA causa um congelamento (de início), seguido por um

comportamento de fuga natural (pela estimulção prolongada), levando a um crescimento da resposta e ao

desvio de obstáculo.

O sistema de recompensa

Há ligação de sistema dopaminérgicos que levam tanto ao prazer quanto tanto sexual quanto alimentar. A

área do núcleo accumbens tem na sua estimulação impulsos que levam ao prazer. Interessante notar que

essa ativação de núcleos de satisfação levam à repetição do estímulo.

O sistema de inibição comportamental

A ansiedade inibe o comportamento, e é mediada pelo sistema de inibição comportamental (SIC). A

geração do conflito pessoal leva a uma inibição comportamental. A ansiedade é gerada por sinais de

punição, remoção do reforço (frustração), estímulos novos e ameaças inatas. O SIC leva a uma inibição do

comportamento, aumento da vigília e da atenção.

Se os eventos correspondem às expectativas de normalidade e segurança, os comportamentais em curso

são mantidos. Contudo, na presença de eventos inéditos, removemos nosso comportamento. Esse

processo é mediado pelo checking mode. No entanto, se o evento é inédito, quem assume o controle é o

control mode.O SIC tem como substrato neural o sistema septo-hipocampal.

Sistema do medo condicionado e o paradigma

Condicionamento, por exemplo, consiste em associar um som a um choque elétrico, nos experimentos com

camundongos. Esse sistema está associado ao estresse pós-traumático. O hipotálamo medeia as respostas

autonômicas do medo, mas não é necessário para o congelamento. A lesão da substância cinzenta não

alterava as respostas viscerais, mas sim a de congelamento. A lesão da amígdala, por fim, lesa as duas

respostas.

Há diferença entre medo, ansiedade e estresse pós-traumático. Todas essas situações participam da nossa

vida normal. No entanto, elas devem ser sanadas de alguma forma.

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49 Anotações de Fisiologia

AULA 13 – SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO

Professor: Helder Mauad

omecemos com um pequeno histórico do sistema nervoso autônomo. O que ele é? Ora, o sistema é

dividido em partes somática e autonômica. A segunda parte é a de nosso interesse, que cuida do

funcionamento dos órgãos internos de forma automática, mantendo a homeostasia do organismo.

Assim, há uma regulação da função do sistema cardiovascular, sistema respiratório, sistema digestório. Já

foi chamado de sistema nervoso visceral, vegetativo e automático. Acima de diferentes nomes, é

importante saber que a sua função é manter estável o organismo frente às necessidades de adaptação aos

meios externos e internos.

O sistema nervoso autônomo tem componentes

simpático e parassimpático, os quais têm diferenças

na posição dos gânglios, no uso dos

neurotransmissores e nas ações finais. Na verdade, a

grande maioria dos órgãos recebe inervação

simpática e parassimpática (alguns não, como as

glândulas sudoríparas e os vasos, que só têm

inervação simpática). Engraçado o endotélio ter

receptores muscarínicos, no entanto.

Os sistemas simpático e parassimpático têm efeitos

antagônicos, provocando os exemplos já conhecidos

dos anos de estudo anteriores. Há, no entanto,

sempre um que predomina. Nossa freqüência

cardíaca é regulada principalmente pelo

parassimpático, por exemplo. A musculatura ciliar

tem regulação principalmente parassimpática

também.

O estresse é uma das respostas autonômicas mais complexas do organismo, sendo coordenada pela

atividade simpática. Há aumento da pressão arterial, do fluxo sanguíneo para os músculos ativos, o

metabolismo, a glicemia, a força muscular, a atividade mental e a velocidade de coagulação do sangue. É

como se uma resposta de luta ou de fuga estivesse sendo preparada. Essas respostas variam, de certo

modo, de pessoa para pessoa (o stress varia um pouco). Não há limites para o stress animal; as medidas do

stress humano se assemelham às do animal, em termos de taquicardia, boca seca, estômago

“embrulhado”, nervosismo, sobressaltos, micção freqüente, expectativa apreensiva, o “congelamento”

frente ao perigo.

Existe uma integração grande com áreas do sistema límbico, córtex cerebral, hipotálamo, formação

reticular do tronco cerebral e medula espinhal. Em todo esse mecanismo, há reflexos em vários sistemas do

organismo, por meio de uma hiperatividade simpática.

O sistema nervoso simpático tem centros geradores na medula espinhal, para que a resposta seja enviada a

todos os órgãos.

C

Sistema nervoso

periférico

Aferente Eferente

Visceral

Simpático Parassimpático

Somático

Page 50: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

50 Neurofisiologia

Vamos às características anatômicas dos componentes simpático e parassimpático:

- As fibras que partem da medula espinhal têm de fazer sinapse num gânglio, obrigatoriamente. Esse

gânglio varia de posição, estando na parede dos órgãos inervados pelas fibras parassimpáticas, ou nas

posições paravertebral ou pré-vertebral no caso do simpático. Isso faz com que tenhamos um neurônio

pré-ganglionar e outro neurônio pós-ganglionar; se a posição dos gânglios é diferente em cada sistema, os

neurônios terão comprimentos diferentes. As fibras pré-ganglionares simpáticas têm origem dos

segmentos de T1-L2 da medula espinhal, enquanto o parassimpático está nas regiões craniana (tronco

encefálico) e sacral.

- A neurotransmissão é igual nos neurônios pré-ganglionares, mas diferente nos pós-ganglionares e nos

receptores dentro dos órgãos. As sinapses são sempre químicas, havendo receptores pré e pós sinápticos,

com sinapses excitatórias e inibitórias.

- Algumas fibras partem da medula (segmento torácico, ou seja, parte simpática) e liberam

neurotransmissores caracteristicamente parassimpáticos. Chamam-se simpáticas colinérgicas. Inervam

alguns vasos sanguíneos e glândulas sudoríparas com acetilcolina.

Neurotransmissão

As fibras pré-ganglionares têm, em ambos os casos, liberação de acetilcolina. Os receptores pós-sinápticos

são do tipo nicotínico ganglionar. Os receptores autonômicos podem ser adrenoceptores ou

colinoceptores.

Os adrenoceptores podem ser dos tipos α (1 ou 2) e β (1 ou 3). Os colinoceptores podem ser muscarínicos

(M1, M2 ou M3) ou nicotínicos (ganglionares ou da placa motora). Os medicamentos bloqueadores de

receptores nicotínicos são mais valorizados no caso da placa motora, principalmente em cirurgia. Os

bloqueadores de muscarínicos e betabloqueadores têm grande importância terapêutica também.

Os neurotransmissores que estimulam esses receptores são:

- Para os adrenoceptores, epinefrina ou norepinefrina.

- Para os colinoceptores, a acetilcolina.

As fibras pós-ganglionares podem lançar noradrenalina (a adrenalina só pode ser lançada na circulação,

pela medula adrenal, junto com a noradrenalina), no caso do simpático, ou acetilcolina, no caso do

parassimpático.

Voltando aos receptores:

- No somático, há uso de receptores nicotínicos.

- Na inervação simpática da medula adrenal, a adrenalina é liberada no sangue.

- No simpático (neurônio pós) há receptores adrenérgicos.

- No parassimpático (neurônio pós) há receptores muscarínicos.

As diferenças entre o somático e o autonômico estão na presença ou não de gânglios, no tipo de estrutura

inervada e no caráter inibitório ou não do receptor.

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51 Anotações de Fisiologia

A acetilcolina possui uma valência positiva, tendo dificuldade de atravessar as membranas plasmáticas. A

noradrenalina é uma catecolamina, e a presença do anel catecol também reduz a sua permeabilização na

membrana plasmática. Como são neurotransmissores liberados em fendas sinápticas, não há perda de

eficiência. A sua síntese e degradação pode ser revista na aula de transmissão sináptica.

A manipulação da acetilcolinesterase tem propriedades terapêuticas, o que pode ser usado em miastenia

grave. O famoso “gás dos nervos” era um organofosforado que desativava acetilcolinesterases, o que

levava à contínua ativação dos receptores pós-sinápticos. Havia paralisia, e parada respiratória.

Os receptores adrenérgicos pré-sinápticos são geralmente do tipo α2, inibindo a liberação adicional de

noradrenalina. Ela será então recaptada ou difundida na fenda sináptica. A desativação da noradrenalina é

feita por enzimas catecol-ortometiltransferase (COMT), que só degradam catecolaminas (não degradam

simpatomiméticos).

Os adrenoceptores:

a) α1: causam vasoconstricção, venoconstricção, aumento da pressão arterial, midríase e contração do

esfíncter superior da bexiga.

b) α2: inibe a liberação de noradrenalina e de insulina.

c) β1: taquicardia, aumento da lipólise e aumento da contratilidade do miocárdio.

d) β2: provoca vasodilatação, diminui levemente a venoconstricção, causa broncodilatação, aumenta a

glicogenólise muscular e hepática, a liberação de glucagon, além de relaxar a musculatura lisa

uterina. Está localizado nos vasos da musculatura esquelética, daí a diferença dos efeitos.

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52 Neurofisiologia

Algumas terminologias novas:

a) Cronotropismo: refere-se à freqüência cardíaca.

b) Inotropismo: refere-se à medida da força contrátil do miocárdio.

c) Dromotropismo: velocidade de envio dos impulsos no nó atrioventricular.

Há receptores muscarínicos no endotélio, para receber o óxido nítrico (um vasodilatador), mesmo não

havendo regulação parassimpática ali. Os receptores muscarínicos M3, da musculatura lisa do trato

gastronintestinal e dos brônquios, são responsáveis pela contração.

Quanto às respostas intracelulares, é importante vermos que algo gera a atividade simpática, e que algo

gera uma ação a partir da ativação de seus receptores. Essa segunda lacuna é preenchida pelo uso de

segundos-mensageiros.

Os receptores nicotínicos são os únicos que estão ligados a canais iônicos, com efeitos de despolarização

por entrada de sódio. Os receptores B adrenérgicos e a2 são ligados a adenilato-ciclases. Os a1

adrenérgicos são ligados a DAG e IP3, sendo colinérgicos muscarínicos. Todos eles levam a respostas

intracelulares, em diferentes órgãos.

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53 Anotações de Fisiologia

Parte 2

Cardiofisiologia

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54 Cardiofisiologia

AULA 14 – BIOELETROGÊNESE CARDÍACA

Professor: José Geraldo Mill

s tecidos do corpo se dividem em excitáveis, como o nervoso, o muscular, glandular e sistemas

imunitários, e não excitáveis. Há hormônios que mantêm a taxa metabólica calibrada, mesmo em

ambientes diferentes. São os hormônios tireoidianos, que estimulam a expressão da cascata

enzimática de utilização de oxigênio na mitocôndria (cadeia respiratória). É um bom exemplo de sinalização

química que provoca uma manifestação genômica. Esta sinalização química pode ser de curto, médio ou longo

prazo.

Os processos de sinalização química são, em geral, lentos (demoram de 4 a 5 segundos para responder). Os

tecidos excitáveis podem gerar potenciais bioelétricos, de caráter local (impulsos eletrotônicos mesmo, cuja

amplitude decai em função da distância) ou mais distante. Nesse caso são usados potenciais de ação, cuja

amplitude não decai com a distância percorrida, sendo gerado em cada ponto da membrana, sem perder as

informações transmitidas ao longo do espaço.

No coração, as sinapses entre as células são formadas por junções de baixa resistência, o que torna seu tecido

um sincício elétrico. Cada célula tem apenas um ou dois núcleos, não constituindo em geral um sincício

verdadeiro. As do tecido muscular esquelético têm mais de um núcleo, constituindo um sincício verdadeiro. De

qualquer forma, o número de núcleos é proporcional ao volume de citoplasma daquela célula. Já o

entendimento da eletrofisiologia dos músculos lisos é mais complicado, pois o tecido varia conforme a área do

organismo em que está.

Esse tipo de propagação de estímulos elétricos é importante para a contração do músculo cardíaco. No

entanto, a contração não é anárquica, variando entre a dos átrios ou a dos ventrículos.

Feita uma revisão da bioeletrogênese comum, vemos que as concentrações de sódio e de potássio intra e

extracelulares também são diferentes no músculo cardíaco. A estrutura do canal de sódio e seu papel na

despolarização têm de ser revisitados também (portões M, mais externo, e H, mais interno). Isso, porém, fora

do coração.

Durante o potencial de ação comum, há mudanças nas condutâncias dos íons sódio, primeiro, e potássio

depois. O potencial de ação geralmente tem o mesmo formato em todas as células. Quanto maior a amplitude

do potencial de ação, além da sua velocidade de despolarização, maior é a sua velocidade de propagação. No

organismo, fibras tipo Ia chegam a transmitir a velocidades de 120 m/s, enquanto fibras C são mais lentas.

No corpo, em geral, são utilizados potenciais de ação rápidos, necessitando de fibras grossas e canais iônicos e

bombas capazes de mover rapidamente grande quantidade de íons sódio. Fibras deste tipo, ou seja, Ia, são

úteis em tecidos de demanda rápida de potenciais de ação. A bainha de mielina, surgida nos crustáceos, serviu

para aumentar ainda mais a velocidade dos impulsos nervosos.

A finalidade do potencial de ação no músculo cardíaco, porém, é diferente do tecido nervoso: estimular a

contração. Esta não tem de ser tão rápida no coração, pois o bombeamento do sangue tem de ser realizado de

forma eficiente. Isso se dá pela geração de pressão e de fluxo no sangue. O potencial de ação no coração,

portanto, tem uma fase rápida e outra lenta.

O

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Anotações de Fisiologia 55

Há dois tipos de fibras musculares cardíacas:

a) De potencial de repouso estável (mais negativas), encontradas no miocárdio atrial e ventricular. Nada

acontece a elas se não receberem potenciais de ação, como o vindo das células de função de

marcapasso. Têm resposta rápida.

b) De potencial de repouso instável (menos negativo), ou fibras marcapasso. Encontrada nos nódulos e

nas fibras de His/Purkinje. A atividade marcapasso permite que os potenciais de ação sejam

produzidos sem a necessidade de recepção de estímulos externos. Em geral, não se diz que estas

células possuam potencial de repouso. Têm resposta lenta.

O nó sinusal contém cerca de 200 a 400 mil células, ou 2 mm3 de massa celular. São células modificadas, sem o

aspecto alongado tradicional, que funcionam como o principal marcapasso do coração. No septo

interventricular está outro centro de envio de estímulos, o nó atrioventricular. Este dá origem às fibras de His

e de Purkinje, que são fibras musculares altamente acopladas em sentido longitudinal, de forma que um

constituem um feixe de condução rápida. Originam ramos para os ventrículos, e transmitem os impulsos no

menor tempo possível.

O potencial diastólico máximo é o ponto de maior despolarização no potencial de ação das células cardíacas. O

potencial nodal tem um “potencial de repouso” mais alto (no nó sinusal, -45 mV a -50 mV; no nó

atrioventricular, -55 mV a -65 mV) e apresenta sempre atividade espontânea. As fibras do nó sinusal geram um

potencial de ação mais fraco; ativam o nó atrioventricular, passando por fibras internodais com um potencial

de repouso intermediário.

O potencial do miocárdio e das fibras de condução rápida é o completo, possuindo uma fase 0, caracterizada

pela despolarização abrupta, seguida de repolarização (fases 1, 2 3 e 4). A fase 1 é de repolarização breve, a

fase 2 é um platô, a fase 3 é de repolarização e a 4 é de repouso. A lógica de fibras grossas de transmissão

veloz vale também para esse exemplo. Os feixes de His têm longas fases 1 e 2. As fibras de Purkinje têm uma

configuração diferente das nodais, pois sua descarga e repolarização (o potencial de ação como um todo) é

mais prolongada. O eletrocardiograma (ECG na figura acima) é capaz de registrar esse fenômeno de

transmissão de potenciais de ação.

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56 Cardiofisiologia

Vamos detalhar os potenciais de ação de resposta rápida:

a) Despolarização (fase 0)

Influxo abrupto de íons sódio, por aumento da condutância a

eles. Isso é resultado de uma pequena despolarização da

membrana até o limiar de excitação. O tempo entre a fase 0

e o seu pico é pequeno, porém esta corrente é de rápida

inativação

b) Repolarização inicial (fase 1)

Breve período antes do platô, ocorre por causa da corrente

transiente de efluxo (ito, ou transient outwards). São menos

presentes na região endocárdica do ventrículo esquerdo: nas

fibras ventriculares, a fase de inativação é mais lenta um

pouco. Os canais de potássio geralmente são retardados, pois

suas correntes se abrem tardiamente.

c) Platô (fase 2)

O cálcio entra nas células pelos canais para cálcio, ativados

mais lentamente que os canais de sódio. O influxo de cálcio é

contrabalançado pelo efluxo de potássio (correntes ito, ik e

ik1). . As correntes de cálcio entram através de dois canais:

de tipo T e de tipo L. Os de tipo T se ativam em potenciais

negativos, e são rápidos (transient); produzem uma corrente

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Anotações de Fisiologia 57

parecida com a de sódio. Os do tipo L (large) são ativados em potenciais mais próximos do platô (fase 2),

porém deixam passar mais íons cálcio por vez. O nível de cálcio no citosol é mantido baixo durante o repouso.

Canais tipo L são inativados por amlodipina e diltiazem.

O influxo de cálcio está envolvido com o acoplamento excitação-contração, que será visto na próxima aula.

Catecolaminas como norepinefrina e isoproterenol aumentam a condutância a esse íon, enquanto acetilcolina

a diminui. Assim, estimula-se ou inibe-se a contratilidade cardíaca.

A retificação para dentro é uma redução da condutância ao potássio para evitar sua perda excessiva. É feita

por canais ik1, quando o potencial de membrana fica acima de 0 mV. Já os canais retificadores tardios (ik)

podem ser do tipo rápido ou lento: ikr ou iks. Sua ativação aumenta durante a fase 2.

d) Repolarização final (fase 3)

O efluxo de potássio começa a exceder o de cálcio. As três correntes ito, ik e ik1 contribuem para isso. O início é

dado por ito e ik, determinantes também da extensão do platô. Os canais ik1 contribuem para a velocidade de

repolarização: a sua condutância aumenta e acelera a repolarização à medida que o potencial de membrana

fica mais negativo.

OBS.: as regiões do coração têm quantidades variáveis de canais ito e ik, por isso seus platôs têm duração

diferente.

e) Concentrações iônicas restauradas (fase 4)

Uma Na+/K+-ATPase remove íons sódio que ficam dentro da célula, trocando-os por potássio. Há também

bombas que trocam sódio por cálcio (razão 3:1), existindo também bombas de cálcio.

Dois canais geram as correntes despolarizantes da fase 0: as correntes rápida de sódio e lenta de cálcio (esta

última nos nodos SA e AV). A repolarização é feita pelas correntes de saída lenta de potássio (canal de potássio

retificador retardado). As fibras que têm canal TO (transient outwards) têm despolarização mais rápida. O

platô nessas fibras é mais baixo.

O período refratário relativo nas fibras de condução lenta se estende além da fase 3: refratariedade pós-

repolarização. A recuperação da excitabilidade total, ou seja, quando todos os canais estiverem na posição

inativa, é um processo mais lento. Não é possível enviar impulsos em alta freqüência.

Em resumo, as morfologias dos potenciais de ação do coração são diferentes. No nervo as fibras e o potencial

levam um sinal binário, enquanto no coração a cinética de contração e esforço é diferente. Isso é regulado

pelo tipo de canal e de potencial de ação, sendo o que realmente importa no coração. Diferentes toxinas

atuam nestes canais, servindo como venenos ou como medicamentos. Há bloqueadores de canais de cálcio, de

sódio (como TTX, que se liga ao portão M do canal de sódio e o inativa). O veneno de escorpião trava o portão

H na posição 1, ou seja, deixa-o aberto.

A eletrogênese nas células nodais é bem mais complexa. Nas fibras nodais o potencial de repouso é alto

(pouco negativo), o que implica a inativação dos canais de sódio (não funcionam). A grande diferença deles é,

além do canal de sódio inativado, a despolarização feita através das aberturas de canais de cálcio L e T.

As fibras His/Purkinje têm um potencial rápido, e os nódulos têm um potencial lento (1 a 5 cm/s). No átrio, 0,5

m/s. No nódulo AV, 10 cm/s. No sistema de His, 1 m/s, e no de Purkinje, 0,7 m/s. Onde o potencial de repouso

é mais baixo, a velocidade é mais baixa. O potencial cálcio-dependente é de velocidade e amplitude menores.

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58 Cardiofisiologia

O estímulo nasce no nódulo sinusal. Dali, propaga-se lentamente(porém no átrio a condução ainda é rápida). O

tempo de ativação dos dois átrios é de 100 ms. Depois, o nó atrioventrcular recebe o estímulo e lança o feixe

de His, que tem ramos esquerdo e direito. O tempo de ativação AV é de cerca de 80-120 ms, e os ventrículos

têm um tempo de ativação de 100ms. Estes últimos, porém, têm uma massa maior, o que indica uma maior

velocidade de condução. As fibras de His e de Purkinje têm condução rápida, assemelhando-se de alguma

forma a troncos nervosos. O impulso elétrico, então, espalha-se rapidamente pelos ventrículos.

No eletrocardiograma, a excitação atrial não aparece com muita nitidez. O decaimento da chamada onda P é

sinal de que o átrio esquerdo foi ativado. O potencial elétrico não é visto no eletrocardiograma quando

lançado pelo nodo AV (intervalo PR, que coincide com os potenciais de ação nesse nódulo). Depois, vêm ondas

rápidas e apiculadas, que correspondem à condução no ventrículo (complexo QRS). Esse complexo refere-se à

fase 0 do potencial de ação das fibras de His/Purkinje. Por fim, os platôs geram um novo intervalo sem

detecção. Em último lugar, pode haver uma pequena onda T, no fim do estímulo de contração, resultado do

fim do platô.

A quinidina é um bloqueador de canal de potássio, que aumenta a duração do potencial de ação. No

eletrocardiograma, isso será representado pela onda T mais afastada do complexo QRS. A lidocaína inibe

parcialmente os canais de sódio, o que diminui a amplitude e a velocidade de propagação dos canais de sódio:

no eletrocardiograma, isso demonstrará um tempo de ativação ventricular maior, com QRS mais alargado. O

eletrocardiograma é um registro, pelo qual podemos inferir o que acontece na via eletrogênica do coração.

No relaxamento, a câmara ventricular se enche. Logo, o relaxamento é tão importante quanto a contração.

Nos canais de sódio, há o que se chama de recuperação (retorno ao estado de repouso, a partir do inativo). Ela

é dependente de voltagem e de tempo, não sendo um fenômeno instantâneo a nível do conjunto de canais.

Isso permite que haja uma transição entre os estados, abrindo caminho para o relaxamento temporário do

músculo cardíaco. Relaxamento esse que cria espaço para o preenchimento das câmaras cardíacas pelo

sangue. O período refratário nas fibras tipo Ia dura cerca de 4 ms (quatro vezes o do potencial de ação),

dependendo da cinética de rearranjo dos portões M e H. Nas fibras de Purkinje, o potencial de ação dura 400

ms (assim como o período refratário absoluto), sendo que o período refratário dura mais do que isso

(refratariedade relativa), pois atua também durante a repolarização. Vale destacar que, conforme o momento

em que se inicia um novo potencial de ação durante o período refratário relativo, a intensidade do potencial

de ação pode variar, conforme a figura abaixo.

Podem aparecer, neste período,

diversas arritmias. As arritmias podem

ser causadas por mudanças na

sucessão dos potenciais de ação (num

ciclo).

A influência do potássio no potencial

de repouso: quanto maior a

permeabilidade ao potássio em

relação à permeabilidade ao sódio,

mais positivo será o potencial de

membrana. Na verdade, a

permeabilidade ao potássio é cerca de

100 vezes maior que aquela ao sódio.

Isso significa que o potencial de

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Anotações de Fisiologia 59

repouso é alto. A eletrogênese sódio dependente foi um ganho evolutivo.

Automatismo

A função cardíaca não requer inervação

intacta, ou seja, possui automatismo.

Apesar de sofrer influência do sistema

nervoso autônomo, é perfeitamente

possível um coração perfundido e

desnervado bater ritmicamente. As

células nos átrios e ventrículos que

iniciam as contrações são as dos

tecidos nodais e as das fibras de

condução.

O nó sinoatrial é o marcapasso principal do coração. Contém células nodais redondas e alongadas, sendo as

primeiras as de atividade de marcapasso. Existe uma artéria nodal para suprir o nodo SA. A tetrodotoxina não

tem ação sobre o potencial de ação aqui, pois a fase 0 e realizada pelo influxo de cálcio, e não de sódio. A

despolarização é lenta ao longo da fase 4, para depois atingir novamente a fase 0.

Essa despolarização lenta é mediada por correntes de efluxo de potássio (ik, que tende a repolarizar as células

depois), pela corrente de influxo de cálcio (iCa) e pela corrente intracelular induzida pela hiperpolarização (if).

As duas últimas correntes se opõem ao efeito repolarizante da primeira; no fim da repolarização, a corrente i i

é ativada, permitindo influxo de íons sódio. Depois, é ativada a corrente de cálcio, próximo ao fim da fase 4.

Os receptores adrenérgicos aumentam as correntes despolarizantes, acelerando o ciclo do marcapasso. A

acetilcolina, por sua vez, é liberada pelas terminações do nervo vago; ativa canais de potássio KAch e deprime

as correntes despolarizantes.

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60 Cardiofisiologia

AULA 15 – REGULAÇÃO DA CONTRATILIDADE MIOCÁRDICA

Professora: Ivanita

1. Ultraestrutura do miócito;

2. Acoplamento excitação-contração;

3. Teoria da regulação e da contração da contratilidade;

3.1. Regulação heterométrica e homeométrica.

Ultraestrutura do miócito

a aula passada, explicou-se como o impulso elétrico é gerado no nó sinoatrial, propagando-se até o

nódulo AV, passando pelos feixes de His-Purkinje. O coração funciona como um sincício elétrico,

ativando várias células ao mesmo tempo, de forma que a contração das câmaras é quase simultânea.

O termo sincício refere-se a um controle único, a um órgão com uma única célula.

Esse tipo de contração se dá pelo bom meio de propagação, permitindo a ativação praticamente de câmaras

inteiras. Como ela ocorre? Diferentemente do músculo esquelético, em que a força de cada unidade motora

pode ser regulada, não há somação de fibras. Todas as células, praticamente, contraem-se no mesmo padrão.

As fibras miocárdicas têm membrana sarcolemal, com invaginações de túbulos T, comunicando-se com o

retículo sarcoplasmático. Formam-se tríades e díades, por onde o potencial de ação provoca indiretamente a

liberação de íons cálcio no sarcoplasma. Na membrana, ainda há canais iônicos, receptores de

neurotransmissores que regulam os canais iônicos, as GAP juncitions. Estes poros permitem a passagem direta

de pequenas moléculas (ATP, por exemplo) e íons, diminuindo a resistência elétrica entre as células, e

acelerando a propagação do estímulo.

As proteínas nas miofibrilas podem ser:

a) Proteínas contráteis, que geram força durante a contração;

b) Reguladoras, ligam ou desligam o processo contrátil;

c) Estruturais, que mantêm filamentos alinhados, dando elasticidade e extensibilidade às miofibrilas.

Os sarcômeros têm discos Z, filamentos de titina, actina e miosina (com cadeias leves nas cabeças pesadas).

Essas cadeias, importantes na contração do músculo liso, não têm de ser fosforiladas para ocorrência da

contração no músculo cardíaco. Apenas fazem parte da modulação da contração do miocárdio. A ATPase

miosínica permanece na cabeça da miosina. Quanto à actina, os filamentos são semelhantes aos do músculo

liso, com presença de tropomiosina e troponinas.

O mecanismo de contração é semelhante ao do esquelético. É preciso que haja aumento do cálcio intracelular

(passa de 10-8 mol/L no repouso para 10-4 mol/L em ativação). Dois sítios para cálcio já estão ocupados na

troponina C, e apenas um deles precisa ser ocupado pelo cálcio para a ativação da contração. O quarto sítio

não precisa ser ocupado.

O cálcio ligado à troponina C leva a uma alteração conformacional, movendo a troponina I e a T, permitindo a

ligação da miosina à actina, o que leva ao deslizamento e encurtamento do sarcômero. Para o relaxamento, o

cálcio tem de ser recaptado de volta para o retículo sarcoplasmático, e uma nova molécula de ATP tem de ser

ligada à miosina para gerar a repulsão entre ela e a actina.

N

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Anotações de Fisiologia 61

Como a célula controla o aumento e redução das concentrações de cálcio, no músculo cardíaco? Afinal, não

pode estar elevada sempre, pois levaria à lesão celular.

Acoplamento excitação-contração

Há um acoplamento de um evento elétrico (potencial de ação) e um mecânico (contração). Como isso ocorre?

Até os anos 80, não se sabia como o mecanismo funcionava. Utilizavam-se corações de coelho para estudos.

Os corações batiam sozinhos, fora do corpo do coelho, por um certo tempo em meio à água destilada. O uso

de água rica em sais mineirais, principalmente cálcio, permitia um maior tempo de contração do músculo

cardíaco. Isso levantou a atenção para a importância do cálcio na contração do músculo cardíaco.

Acreditava-se que todo o cálcio vinha do meio extracelular, dele dependendo a contração. Canais iônicos

seriam a porta de entrada para esses íons. Em torno dos anos 1950, observou-se que a concentração do cálcio

do meio extracelular contribuía muito pouco para a contração, de forma que nos anos 1980 foi provado o

mecanismo real de controle das concentrações de cálcio.

Quando o potencial de ação passava, ativava alguma entrada de cálcio vindo do meio extracelular. Esse cálcio,

então, sinalizava a liberação de mais cálcio por parte do retículo sarcoplasmático. Na verdade, a grande

maioria do cálcio vem desta última fonte (cerca de 80 a 90%, dependendo da espécie). A inibição do retículo,

portanto, pode ser feita por drogas como a rianodina, ou pela retirada do cálcio extracelular.

Então, por que é necessária a presença do cálcio extracelular? Provou-se que na membrana existem

receptores voltagem-dependentes, de diidropiridina (DHP). Quando o potencial de ação passa, ativa os

receptores DHP, que estão próximos aos receptores de rianodina (RYR). O cálcio armazenado no retículo

sarcoplasmático, antes ligado à calsequestrina e outras proteínas, é liberado no sarcoplasma. No entanto, no

músculo cardíaco, a despolarização da membrana, somente, não é suficiente para a ativação da contração. É

necessário que o próprio cálcio que entra pelo DHP ative o receptor RYR. É o mecanismo de liberação de cálcio

induzida por cálcio.

Durante a fase do platô (fase 2), está a entrada de cálcio, sendo que parte dele é usada diretamente para a

contração, e parte indiretamente para ativação do retículo. Se retirarmos o cálcio vindo de fora da célula,

portanto, provocaremos a sua morte.

Quanto mais cálcio houver dentro do miócito, mais forte será a sua contração. Como medir essa

concentração? Utilizando um marcador proveniente dos animais marinhos bioluminescentes (aequorina), que

se liga ao cálcio. Mede-se a luminescência, e esta é correlacionada proporcionalmente à concentração de

cálcio. É necessário ter um sistema rápido e sensível o suficiente para detectar esta rápida luminescência.

Como o músculo cardíaco reage à hipocalcemia? A contratilidade deste, ao contrário da do esquelético, cai. O

músculo cardíaco tem sua força diminuída gradativamente; o músculo esquelético tem tetania, graças a uma

redução no limiar de excitação.

Vamos agora ao relaxamento, que exige a retirada do cálcio de volta para o retículo sarcoplasmático.

Novamente, é a SERCA 2ª que faz isso, controlada pela fosfolambam (PLB). Esta tem um papel inibitório sobre

a SERCA, deixando de realizá-lo quando é fosforilada pelo complexo cálcio-calmodulina (diante de alta

concentração de cálcio), de forma semelhante à do músculo esquelético. Esse complexo ativa uma quinase

que fosforila a PLB.

Outro meio de retirar cálcio é enviando-o para fora da célula, por dois importantes mecanismos. O primeiro é

o trocador Na+/Ca2+, no qual há retirada de um íon cálcio em troca da entrada de três íons sódio. A bomba de

sódio e potássio, por sua vez, joga dois íons sódio para fora, e traz dois íons potássio para dentro da célula. O

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62 Cardiofisiologia

potássio sai por canais de vazamento. O segundo mecanismo de extrusão de cálcio é a bomba do sarcolema

(cálcio ATPase). No entanto, apenas 1 a 2% do cálcio é eliminado por esse mecanismo.

Há dois tipos de canal de cálcio no músculo cardíaco:

a) Tipo L: canal de cálcio de longa duração. Quando é aberto, permanece neste estado por bastante

tempo, o que permite a entrada de correntes mais intensas de cálcio. São voltagem-dependentes,

existindo em maior quantidade nas membranas celulares.

b) Tipo T: abre e fecha mais cedo, permitindo a passagem de correntes iônicas menores. Possui uma

modulação do sistema nervoso autônomo simpático, que via neurotransmissores aumenta a

quantidade de AMPc, que ativa os canais do tipo T.

A fase do platô do potencial de ação é dominada por canais do tipo L, cuja abertura demora mais para

acontecer e permanece por mais tempo. Os canais do tipo T se abrem em menos tempo, e se fecham mais

rapidamente também.

Teorias de regulação da contração

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Anotações de Fisiologia 63

Mas, o que é contratilidade miocárdica? É o potencial do miocárdio de executar trabalho, ou o estado

inotrópico (atividade das fibras). O inotropismo é regulado por dois mecanismos: regulação heterométrica e

regulação homeométrica.

Devemos relembrar a contração dos músculos em duas formas, isométrica e isotônica. O componente que

gera tensão no músculo é o componente contrátil, que sempre está acoplado a um componente elástico em

série. Quando o músculo é estimulado, uma condição obrigatória para a contração é um encurtamento do

sarcômero, porém não necessariamente um encurtamento do músculo inteiro. Logo, pode haver geração de

força sem que o músculo tenha seu tamanho alterado (contração isométrica). Isso ocorre às custas do

estiramento dos componentes elásticos. O encurtamento do sarcômero pode passar de um certo ponto,

levando ao encurtamento também no músculo, mantendo a tensão constante. Logo, passa a ser uma

contração isotônica. O que fazer para estudar ambas as contrações separadamente?

Pega-se um pequeno pedaço de músculo, como o papilar do ventrículo esquerdo. De um lado, é preso a uma

mola, presa a um ponto fixo. Do outro lado, uma mola ligada a um transdutor de força. Aplica-se um estímulo

elétrico, que mimetiza o potencial de ação e que leva à contração. Esta é isométrica, e sua tensão é captada

pelo transdutor de força (que antes do experimento foi devidamente calibrado). A força é interpretada pela

amplitude das ondas descritas pelo transdutor. Para a contração isotônica, o músculo é atado a um peso,

tendo de gerar uma força suficiente para levantá-lo. Podemos assim medir seu deslocamento e cronometrar

seu progresso, obtendo sua velocidade (que é o parâmetro para contratilidade). É possível fazer uma

derivação da força sobre a derivação do tempo para obter a velocidade. Esta velocidade tem um custo: quanto

mais rápida a contração, mais oxigênio ela consome. O coração modula sua velocidade de contração conforme

a necessidade, sempre contrabalançando-a com o consumo de oxigênio.

Uma outra maneira de regular a contratilidade é avaliar o aspecto intracelular, independente de alterações no

comprimento. Podemos regulá-la via variações na concentração intracelular de cálcio, ou via variações na

sensibilidade da máquina contrátil ao cálcio. À medida que aumenta a concentração de cálcio intracelular, a

força contrátil também aumenta. Essa elevação tem um limite, a partir do qual o efeito inotrópico deixa de ser

positivo para ser negativo. Neste ponto reside a diferença entre a vida e a morte da célula, quando falamos de

concentração de cálcio: os mecanismos de controle não podem permitir que essa concentração passe dos

limites.

Fora da célula, há diversos mecanismos que controlam a concentração de cálcio, como o de PTH e calcitonina.

Afinal, o cálcio é importante para diversos processos extracelulares, como a coagulação.

A alteração da afinidade da maquinaria contrátil pelo cálcio é outro meio de controle de força. É um processo

vantajoso para a célula, visto que não há tanto consumo de energia para mover os íons de um lugar para

outro.

Os mecanismo homeométricos e heterométricos trabalham com esses dois mecanismos.

- O mecanismo heterométrico foi estudado no início do século XX, principalmente por Ernest H. Starling. Ele

estudava corações de cachorros, e percebeu que, isolados, contraíam mais conforme mais sangue passava por

eles. Havia um componente intrínseco que o próprio coração liberava para controlar a contratilidade, o que foi

batizado como “mecanismo intrínseco”. O alemão Otto Frank também fez estudos na área. A lei de Frank-

Starling, em homenagem a ambos, afirma que há um componente intrínseco capaz de alterar a contratilidade.

Foi observado que, quanto mais estirado o sarcômero estava, mais tensão ele fazia, até determinado

tamanho. Este é o comprimento máximo ou ideal, gerando em torno de 2,25 μm. À medida que chega mais

sangue ao coração, maior é a força contrátil do miocárdio, e mais força é gerada. Essa fase é chamada

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64 Cardiofisiologia

ascendente (da curva de Frank-Starling). Depois do comprimento ideal, chega-se à fase descendente da

mesma curva. Fisiologicamente, o coração nunca ultrapassa o comprimento máximo, pois o sangue não chega

em tal volume exagerado.

Por que a força aumenta? No início, o comprimento nem aumenta, pois há sobreposição dos filamentos, com

menos pontes entre actina e miosina. Com o aumento do comprimento, são formadas mais pontes actina-

miosina, até chegar a um nível perfeito de tensão. É o mecanismo de regulação heterométrica, na qual há

controle da contração cardíaca em função do comprimento inicial do sarcômero.

Num coração insuficiente, o efeito

heterométrico também existe, porém em

menor escala. Recentemente, a teoria de

pontes actina-miosina foi acompanhada

por outras teorias. Uma delas é o efeito

Lattes, que afirma que, quando há

estiramento, há distância menor entre

filamentos grossos e finos, o que facilita a

interação entre eles (envergam-se). Outra

é a hipótese de que a troponina C teria

uma afinidade ao cálcio diferente em cada

parte do sarcômero, sendo maior na linha

M. As que tiverem maior afinidade são

expostas primeiro no estiramento,

permitindo que com um mesmo nível de cálcio seja imposta mais força.

- Na regulação homeométrica, para um mesmo comprimento do sarcômero a força contrátil seria maior ou

menor. O mecanismo mais comum é pela regulação do sistema nervoso autônomo, que libera catecolaminas.

Elas ativam um maior nível de força no mesmo comprimento de antes, da seguinte forma:

Quando um receptor β1 recebe adrenalina ou noradrenalina, está acoplado ao sistema de proteínas Gs,

acopladas a adenilato-ciclases, que realizam hidrólise de ATP em AMPc. Este ativa diversas quinases, sendo

que uma delas fosforila canais de cálcio do tipo L e de rianodina (RYR), aumentando a condutância e, por

conseqüência, a concentração de cálcio intracelular e a força contrátil. Devemos observar que esse aumento

de força é momentâneo: há uma quinase que fosforila a troponina I, que por sua vez diminui a afinidade da

troponina C pelo cálcio. Logo, reduz o tempo de estimulação da contração, pois haverá relaxamento num

mesmo nível de cálcio. O efeito, além de acelerar a contração, acelera o relaxamento.

Uma outra quinase ativada por AMPc fosforila a fosfolambam (PLB), permitindo que a SERCA realize maior

recaptação de cálcio, e leva novamente ao relaxamento.

O efeito de aumento de força pelos receptores β-adrenérgicos é o inotrópico positivo. O relaxamento

acelerado é chamado de efeito lusitrópico positivo. Isso não explica o aumento de freqüência, apenas da força

de contração e da velocidade de contração e relaxamento. O aumento de freqüência cardíaca é pelo efeito

cronotrópico, por estímulos que vêm do nódulo sinoatrial.

Na fase 4 do potencial de ação, a despolarização diastólica lenta, há uma aceleração em função da recepção de

noradrenalina. Daí parte o aumento de freqüência, pelo aumento das concentrações de AMPc, da ativação de

quinases e da condutância para o cálcio. Essa DDL é definida pela corrente de cálcio, de potássio e If.

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Anotações de Fisiologia 65

Relembrando: há dois tipos de potencial elétrico no coração. Tipos rápido e lento. Os de tipo rápido ficam nos

ventrículos, nos átrios e no sistema de His/Purkinje. Os lentos ficam nos nodos SA e AV. O rápido possui uma

fase 0 (rápida, uma junção da corrente rápida e intensa de sódio, gerada por VOCh’s), unida à fase mais lenta

regulada por canais de cálcio do tipo L. Essa fase lenta possui fases 1, 2 (platô), 3 e 4 (despolarização). No nó

sinoatrial, as células têm potencial de repouso em torno de -55 mV. Despolarizam-se e repolarizam-se

espontaneamente.

Nos nós SA e AV, não há fases 1 e 2, e a fase 4 é mais instável que no ventrículo. A fase 0, aqui, não é por

canais para sódio, e sim para cálcio. O potencial de ação é mais lento, referindo-se à fase 0. Três correntes são

importantes aqui: a permeabilidade ao potássio aumenta , e os canais acabam por se inativar. Canais de cálcio

são simultaneamente ativados, auxiliando a despolarização diastólica lenta. A terceira corrente é a If (de

sódio), apesar de os VOCh’s de sódio deverem estar desativados, graças à pequena despolarização. Foi

chamada de corrente funny, graças ao seu caráter contraditório. Voltando...

Já a acetilcolina ativa receptores muscarínicos M2, que ativam guanilato ciclase. O GMPc gerado aumenta a

condutância de canais de potássio, permitindo sua saída e despolarizando a célula mais lentamente. A

freqüência cardíaca acaba por diminuir. Também atua em receptores acoplado a proteínas Gi, inibindo as

adenilato-ciclases e a produção de AMPc.

Ainda dentro da regulação homeométrica, há um efeito de escada positiva. Quando a freqüência aumenta, é

provocado um efeito inotrópico positivo. Se há mais íons cálcio no retículo, mais cálcio está disponível para a

contração.

Outro efeito é a potenciação pós-extrassistólica. Se há um batimento extra, fora da freqüência em que o

coração se encontrava, ele é potencializado. A magnitude dessa potencialização é determinada pela

precocidade da extrassístole. Ela é percebida como uma palpitação.

Page 66: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

66 Cardiofisiologia

AULA 16 – O CICLO CARDÍACO

Professora: Ivanita

emporalmente, o potencial de ação se inicia no nodo sinoatrial, cujas células são chamadas de

marcapasso. A atividade elétrica precede a atividade mecânica, e pode ser vista pelos potenciais de

ação medidos por eletrodos (visão intra e extracelular), ou pelo método do eletrocardiograma (que tem

um ponto de vista extracelular).

O ciclo cardíaco trata de alterações elétricas e mecânicas que ocorrem de forma cíclica no coração.

Didaticamente, é mais correto iniciar a explicação antes do potencial de ação no nodo sinoatrial: os átrios e

ventrículos ainda não foram ativados, e o sangue retorna passivamente ao coração (fase de enchimento). O

sangue sai passivamente do local de maior para o de menor pressão, chegando pelas veias cavas superior e

inferior (o que preenche 70% do volume ventricular). O átrio se contrai, empurrando uma quantidade de

sangue para a cavidade ventricular e deixando espaço para os 30% que ainda não entraram. Durante o

exercício, no entanto, o enchimento ventricular ocorre principalmente nessa segunda fase, com contribuição

superior a 30%. A pressão ventricular (força exercida pelos miócitos numa determinada área), após a

contração atrial, aumenta bastante.

A contração ventricular é, de início, isovolumétrica. A

pressão ainda é baixa, e o miocárdio ventricular está

começando a se contrair. No entanto, as válvulas

atriventriculares se fecham e as pulmonares ainda não

se abriram; o volume de sangue fica constante e o

miocárdio aumenta a força rapidamente, resultando

numa pressão cada vez mais alta. Essa pressão

ultrapassa a da artéria pulmonar (ventrículo direito) ou

da aorta (ventrículo esquerdo) e as válvulas

aórticas/pulmonares se abrem à força, dando início à

fase de ejeção. Após a ejeção, o ventrículo começa a

relaxar, e a pressão em seu interior fica menor que a das

válvulas supracitadas. É a fase de relaxamento

ventricular. Quando as válvulas estão fechadas, e o ventrículo se relaxa, está a fase de relaxamento ventricular

isovolumétrica. Após o relaxamento do ventrículo, a válvula atrioventricular se abre e o ciclo recomeça.

As fases de relaxamento são chamadas de diástole, enquanto as de contração são chamadas de sístole.

Enumerando o ciclo cardíaco:

1. Sístole atrial;

2. Contração ventricular isovolumétrica;

3. Ejeção ventricular rápida (70% do sangue ejetado);

4. Ejeção ventricular reduzida (30% do sangue ejetado);

5. Relaxamento ventricular isovolumétrico;

6. Enchimento ventricular rápido;

7. Enchimento ventricular reduzido (diástase);

T

Diástole

Sístole

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Anotações de Fisiologia 67

Nas lesões de válvulas, há alteração do ciclo cardíaco. Se a válvula aórtica estiver rígida e não se fechar direito,

por exemplo, haverá refluxo de sangue ventricular (diminuindo o débito cardíaco) e necessidade de

relaxamento do coração na hora errada. Haverá, também, sobrecarga de volume no coração, o que levará a

uma hipertrofia. A primeira bulha cardíaca se dá com o fechamento das válvulas atrioventriculares, enquanto a

segunda bulha cardíaca se dá pelo fechamento das válvulas aórtica/pulmonar. A terceira bulha não é

auscultável com o estetoscópio, e representa o enchimento ventricular.

Existe uma correlação muito grande entre as pressões de impulsão no ventrículo e as da aorta. O coração gera

fluxo intermitente, enquanto os vasos sanguíneos têm um fluxo contínuo. Como ocorre essa conversão? A

aorta é um vaso que, com sua elasticidade, amortece parte da pressão gerada no ventrículo na sístole. Parte

dessa energia absorvida volta como num verdadeiro elástico durante a diástole, mantendo o fluxo constante.

A queda de pressão no ventrículo, portanto, é mais rápida que na aorta.

A freqüência e a pressão arterial estão correlacionadas. A pressão na aorta sobe e começa a cair, até o início

de outro ciclo. Se a freqüência cardíaca diminui, a pressão aórtica continua a cair, tendo um valor final menor.

O contrário é válido da mesma forma. As curvas de pressão dos ventrículos direito e esquerdo são iguais. O

que muda entre elas é o que a pressão do VD é equivalente a um quinto da do VE.

A pressão sistólica na aorta é parecida com a ventricular; no ventrículo, a pressão diastólica está próxima de

zero. A incisura dicrótica* representa justamente o ponto em que a válvula aórtica se fecha, e existe devido a

um leve refluxo de sangue.

*

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68 Cardiofisiologia

Volume diastólico final

É o volume na cavidade ventricular ao final da diástole, que é exatamente o mesmo contido na fase de

contração ventricular isovolumétrica. Corresponde a cerca de 150 mL de sangue.

Débito sistólico

É o volume ejetado em cada contração ou sístole ventricular, ou seja, por batimento. É diferente de débito

cardíaco. O coração nunca ejeta todo o sangue, por maior que seja a contração. Saem, no máximo, 50% do

volume do sangue. O volume que fica pode ser chamado de volume sistólico final, ou seja, o que está contido

na cavidade ventricular ao final da sístole, sendo o mesmo que volume diastólico inicial. Pode se reduzir a 10

mL quando o coração se contrai fortemente.

Esses volumes podem ser chamados em termos de pressão gerada quando estão nas cavidades. Pressão

diastólica final é a da cavidade ventricular ao final da diástole (cerca de 5 mmHg); a pressão diastólica final

pode ser próxima de zero ou até negativa (como na inspiração). O volume de sangue, no entanto, não

determina sozinho a pressão, estando envolvida também a complacência da cavidade. Isso tem grande

significado em processos patológicos. Um paciente com cardiomegalia e alterações de colágeno tem pressão

diastólica inicial de até 20 mmHg.

Fração de ejeção

Avalia o quão eficiente está a ejeção cardíaca. Fração de ejeção =

. O valor normal é de

cerca de 50 ou 60%. Tentativas de ejetar percentualmente mais do que isso podem levar a um aumento da

freqüência cardíaca, por exemplo, em exercícios físicos.

Cálculo de trabalho cardíaco

A pressão inicial na cavidade ventricular era

próxima de zero. A entrada de sangue eleva

muito pouco a pressão, chegando a cerca de 5

mmHg, enquanto o volume aumenta, de 60

para 140 mL, o que nos leva a concluir que a

parede está complacente (seta I).

Depois, a contração isovolumétrica aumenta a

pressão, até o ponto em que ocorrer ejeção do

sangue (seta II). Na verdade, a pressão aumenta

até o término da fase de ejeção (seta III).

Depois, a pressão começa a cair, as válvulas se

fecham, há um relaxamento ventricular

isovolumétrico, queda de pressão e nenhuma

alteração no volume (seta IV). A área do gráfico

refere-se ao trabalho realizado pelo coração. Quanto maior a área deste gráfico, maior o volume bombeado.

Nos ventrículos direito e esquerdo, as diferenças ficam na oscilação de pressão. No direito, a oscilação é de um

quinto da que existe no esquerdo: a pressão sistólica é de no máximo 25 mmHg, enquanto no ventrículo

esquerdo é de 120 mmHg. Isso porque a câmara direita injeta sangue contra um sistema de resistência

hidráulica muito baixa, levando à conclusão de que, quanto maior a pressão do sistema hidráulico

Page 69: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

Anotações de Fisiologia 69

correspondente, maior pressão e trabalho têm de ser gerados para o fluxo ocorrer no sentido certo. Daí

também a razão das espessuras das paredes ventriculares.

As hipertrofias do coração podem ser excêntricas ou concêntricas, dependendo do tipo de agressão que ele

sofra (sobrecargas diversas, doenças).

O volume sistólico pode ser medido de forma direta, pela inserção de um cateter. Pode-se usar também

fluxômetros. Métodos não-invasivos como o ecocardiograma são mais viáveis para se chegar ao volume

sistólico, por meio de cálculos.

Pré-carga

É a carga imposta ao coração antes de ele se contrair (é o volume diastólico final). Pode ser alterada pela

variação do volume que chega ao coração, ou seja, do retorno venoso, como na realização de exercícios

físicos; As mudanças de pré-carga são a base para a lei de Frank-Starling, descrita anteriormente.

Pós-carga

A carga contra a qual o coração tem de ejetar o sangue. Quanto maior a pressão na aorta, maior a resistência

que o coração encontra para bombear o sangue. A resistência de abertura das válvulas também regula essa

pós-carga, aumentando em casos de estenose e enrijecimento.

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70 Cardiofisiologia

AULA 17 – ELETROCARDIOGRAMA

Professor: Roberto

A circulação é uma adaptação à necessidade de distribuir

nutrientes a todas as células, que são em gigantesco

número nos seres humanos. Planárias, por exemplo, não

necessitam de circulação.

William Harvey (1578-1657) foi o pai da circulação, por elaborar uma teoria de que o sangue circulava. Numa

época em que não havia mundo microscópico, a elaboração de uma teoria destas foi fundamental: o sangue ia

por canalículos microscópicos, voltava por veias ao coração, ia aos pulmões, voltava ao coração e era

bombeado ao corpo. O padre Tebesius também estudou circulação, elaborando a teoria sobre as válvulas

venosas, que apontavam sempre para o coração. Com o advento dos microscópios, a circulação pôde ser mais

bem estudada.

O ciclo cardíaco deve ser bem compreendido para podermos entender também o eletrocardiograma. Ele pode

ser consultado na aula anterior, inclusive no gráfico que o resume em diferentes aspectos.

É sabido que os tecidos do corpo possuem atividade elétrica, no caso de tecido neural central ou periférico

(eletroencefalograma/eletroneurografia), tecido muscular esquelético, tecido muscular cardíaco. Sabe-se

também que o eletrocadiograma tem uma onda P, um intervalo PQ, um complexo QRS, outro intervalo e a

onda T, por último.

Para o sangue encher o ventrículo, este tem de estar relaxado. A insuficiência cardíaca diastólica deixa o

ventrículo ainda contraído, de forma que o átrio fica sobre pressão. É possível viver sem átrio?

Completamente: desde que não seja necessária uma grande quantidade de sangue bombeado. Tanto que é

comum pessoas viverem com fibrilação atrial, e nem perceberem.

O coração é um sincício elétrico, como já foi visto

antes; o nó sinusal funciona como um marcapasso, e

manda impulsos ao nó atrioventricular, que é a única

comunicação elétrica entre o átrio e o ventrículo

(exceto quando a pessoa tem um feixe acessório: nesse

caso pode haver arritmia grave ou letal). Quando o

impulso passa do átrio para o ventrículo, há uma

espécie de atraso (provocado pelo nodo AV) para que o

átrio se contraia antes do ventrículo e a sincronia fique

perfeita. Quanto maior o sincronismo também entre os

ventrículos direito e esquerdo, melhor para a função

cardíaca.

Uma falha no ramo esquerdo dos feixes de His torna o

coração menos apto ao esforço, pois a contração do

ventrículo esquerdo estará prejudicada.

Do nó AV saem os feixes de His, e dele ramificam-se as

fibras de Purkinje. Elas têm a maior velocidade de condução entre todas as fibras.

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Anotações de Fisiologia 71

O eletrocardiograma é um registro da atividade elétrica do coração.

Vamos a alguns conceitos básicos:

Chama-se dipolo, em eletricidade, ao conjunto formado por duas cargas de mesmo módulo (valor numérico),

porém de sinais contrários separadas por um à distância d. Podem, ser representados por vetores (cauda na

parte negativa, enquanto a cabeça estava na parte positiva).

A atividade elétrica do coração vem do tecido de condução; se não houver estímulo, o eletrocardiograma

produz uma linha reta. A estimulação elétrica, porém, gera dipolos que são representados no

eletrocardiograma. Essa medida dos dipolos está apenas no compartimento extracelular, entre as partes ativas

e inativas das membranas. A corrente se dirige da zona em repouso para a zona estimulada (positivo para

negativo), apesar de o vetor estar apontando na

direção contrária (negativo para positivo).

Para calcular vetores, devemos lembrar da regra do

paralelogramo, que pode ser conferida em livros de

física do ensino médio. Para medir campo elétrico,

precisamos de dois pontos com uma diferença de

potencial entre eles, ligados a um galvanômetro.

Assim, espalhamos os tais dois pontos em partes do

coração, e extraímos dali os vetores; suas projeções

são utilizadas como derivações para medir as reais

intensidades.

Processo de despolarização do coração

Quando a onda de despolarização sai do coração, ela pode ser representada por um vetor resultante dos

vetores dos átrios direito e esquerdo. Esse vetor fica a cerca de 60° abaixo da linha horizontal, e apontado

póstero-anteriormente. Detalhando um pouco mais:

a) Átrio direito: para baixo, para frente e um pouco para a esquerda;

b) Átrio esquerdo: um pouco para baixo, para trás e para a esquerda;

Devemos observar que os diagnósticos que dependem desse vetor atrial são um pouco difíceis, visto que a

posição do coração muda de acordo com o tipo físico, idade, etc. A despolarização dos átrios é representada

pela onda P.

Representam-se quatro vetores da ativação ventricular:

a) Septo médio: para frente e para a direita. É o vetor septal;

b) Septo baixo: para frente, para a esquerda e para baixo;

c) Nas paredes livres dos ventrículos: para a esquerda e para trás, graças à grande massa do VE. É o vetor

de maior módulo;

d) Paredes póstero-lateral e basal dos ventrículos: para trás e para cima. É o vetor basal.

Essa divisão é didática, sendo que as despolarizações ocorrem de forma conectada, contínua. O módulo destes

vetores é dependente da massa muscular que conduz o estímulo. Pode-se perceber também que estes vetores

têm o mesmo sentido do processo de despolarização, e o sentido contrário ao do processo de repolarização.

Por quê?

Page 72: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

72 Cardiofisiologia

A primeira região a ser despolarizada é o miocárdio subendocárdico. Na repolarização, essa região

subendocárdica se atrasa, e a última região a ser despolarizada é a primeira se repolarizar. Assim, a

repolarização não ocorre em sentido contrário ao da despolarização, e o resultado é uma onda para cima no

eletrocardiograma (onda T). Acontração ventricular gera uma isquemia fisiológica, que impede a repolarização

do endocárdio, e o epicárdio se repolariza primeiro.Em situações de hipertrofia do miocárdio, o atraso

epicárdico é tanto que a região subendocárdica volta a ser a primeira a se repolarizar, e a onda T fica para

baixo no eletrocardiograma. Essa onda T é normalmente assimétrica, subindo mais devagar do que quando

descendo. Uma onda T simétrica é um sinal de distúrbio grave na despolarização.

Assim como num filme, em que várias câmeras filmam um mesmo processo, num eletrocardiograma são

espalhados doze eletrodos para monitorar o mesmo processo. Ou então, “doze cegos apalpando um elefante”.

Assim, há vários pontos de vista diferentes para o mesmo processo.

Quando um eletrodo encontra um campo elétrico apontando para ele, a deflexão é positiva (para cima). Se o

campo elétrico estiver se afastando, a deflexão é negativa (para baixo). Se o eletrodo encontra um campo

elétrico que passa a 90°, a deflexão será zero, pois não terá projeção naquela derivação que citamos antes. A

padronização deste processo eletrocardiográfico foi feita por Einthoven, criando o chamado triângulo de

Einthoven. Ele dizia que o coração estava no centro de um triangulo eqüilátero, aproximadamente, com os

dois braços e a perna esquerda como vértices. O meio

em que o coração estaria seria uma massa capaz de

conduzir eletricidade.

Os eletrodos dos vértices do triângulo podem ser

comparados um a um, da seguinte forma:

a) Braço esquerdo(+) – braço direito(-) = (D1)

b) Perna esquerda(+) – braço direito(-) = (D2)

c) Perna esquerda(+)– braço esquerdo(-) = (D3)

As derivações ão bipolares quando os dois eletrodos

medem potenciais de mesma grandeza, e unipolares

quando apenas um deles (o “explorador”) mede

potencial de ação. O outro eletrodo é o indiferente. Essas

duas expressões são utilizadas também para eletrodos

bipolares, sendo a primeira +, e a segunda, -.

Assim, obtêm-se a diferença de potencial, pelas

derivações bipolares.. Obs.: o eletrodo posto na perna

direita geralmente é o aterramento.

Por volta dos anos 30, foram introduzidas as derivações

conhecidas como aumentadas. Existe um ponto zero, no

qual a soma de todos o potenciais medidos é zero e no

qual podem ser feitas as novas derivações:

a) aVL = braço esquerdo – 0

b) aVR = braço direito – 0

c) aVF = perna esquerda – 0

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Anotações de Fisiologia 73

Temos então as seis derivações do plano frontal. Pode-se assim encontrar o eixo elétrico do coração.

Os vetores podem ser unidos para se encontrarem num mesmo ponto, D1 e D2 alongados e D3 movido

paralelamente para encontrá-los. Depois, podemos inserir mais derivações, com aVL, aVF e aVR. Entre cada

derivação, há 30°.

A parede inferior do coração é vista pelas derivações D2, D3 e AVF. Um infarto visto por D1 e AVL está na

parede lateral.

Um vetor, então, pode ser detectado em meio a essas referências da imagem ao lado; devemos projetar

sua imagem no eixo horizontal: se for à frente do eixo de 90 graus, é positiva. Se for para trás, é negativa.

Uma projeção que fique no zero pode ser representada no eletrocardiograma como uma linha reta, ou

então como um complexo QRS (constituindo uma resultante isodifásica). Devemos perceber também as

posições positivas e negativas de cada derivação, segundo o quadro, e a partir dali calcular onde está o eixo

elétrico, ou a posição de distúrbios no coração.

A despolarização geral do coração pode ser ter sua

orientação representada pelo eixo elétrico de QRS,

calculável a partir das seis derivações frontais.

Comumente, os complexos são positivos em D1 e em

aVF. Logo, ficam entre 0 e 90°. Precisamos restringir

mais essa faixa, para ter mais precisão. Se buscarmos

nas derivações que não passam por esse quadrante:

D3 e AVL. A partir delas, num indivíduo normal,

descobre-se o eixo elétrico do coração muitas vezes

em torno de 60°.

O eixo elétrico do coração geralmente acompanha a

sua anatomia; isso, devemos destacar, pode ser

alterado por distúrbios de condução. O valor médio

do eixo elétrico fica em torno de 120° a -30°. Em

indivíduos brevilíneos obesos, com aerogastria e

gestantes podem ter eixo elétrico com desvio para esquerda de até -30°. Também em expirações e quando

a pessoa se deita. Acima disso, são causados por lesões no hemifascículo anterior do ramo esquerdo.

Indivíduos longilíneos, astênicos e com coração em gota apresentam desvio para a direita de até 120°.

Também em inspirações e quando a pessoa se levanta. Acima disso, são causados por hipertrofia

ventricular direita, infartos da parede lateral alta e hemibloqueio

posterior esquerdo.

No plano horizontal, as seis derivações são unipolares (V1 a V6). São as

chamadas derivações precordiais. Elas formam três planos horizontais

(V1 e V2; V3; V4, V5 e V6), que podem ser aproximados para um só.

O complexo QRS

Podemos simplificar os quatro vetores de ativação ventricular em três.

Assim, explicaremos o porquê de Q, R e S. R é fácil, bastando ver que os

impulsos são positivos se vistos por D1. E quanto a Q e S?

A primeira deflexão no complexo QRS é negativa, representando o início

Page 74: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

74 Cardiofisiologia

da ativação ventricular, pelo vetor septo-medial, que aponta para a direita com pequena intensidade.

Depois, está o vetor de ativação da parede livre do ventrículo esquerdo, que tem uma grande deflexão

positiva. Por fim, está o vetor que ativa a base do coração, com uma projeção contrária à de D1, explicando

a deflexão S, negativa também.

No ponto de vista de D2

A maioria das pessoas tem o coração ao redor de 60°. D2 também está assim. Uma onda representada

melhor nessa derivação que nas outras é a onda P, que representa a ativação atrial.

No ponto de vista de D3

A ativação atrial (P) dá uma deflexão pequena em D3.

Em aVR

O eletrodo olha todos os processos “pela cauda da flecha”, ou seja, ao contrário de D1. Há um R pequeno, e

um grande S; as ondas P e T ficam invertidas.

Em aVL

A polaridade é vista próxima de zero, se forem feitas as devidas somas. Logo, o eixo elétrico do coração

está perpendicular ao eixo de aVL (que é -30°), estando a 60°.

O eletrocardiograma fica em um eixo cartesiano, estando representado no eixo x o tempo, e no eixo y a

amplitude das ondas. Temos a amplitude, a duração e a morfologia das ondas.

Constituição:

a) Uma onda P: representa a ativação ventricular;

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Anotações de Fisiologia 75

b) Um intervalo PR (ou PQ): pode ser alargado (acima de 0,21), denotando um aumento do atraso

nodal e caracterizando bloqueio atrioventricular de primeiro grau. Se o nodo AV é seccionado,

regiões do sistema de condução mais abaixo no coração assumem a função de marcapasso,

havendo também a necessidade de inserção de um marcapasso artificial. O átrio fica batendo a

freqüências altas, enquanto o ventrículo bate a freqüências muito baixas.

c) Um complexo QRS;

d) Um ponto J;

e) Um segmento ST: se estiver com supra-desnível no eletrocardiograma, é sinal de um infarto

gravíssimo e rápido. Significa que a parede anterior do coração está em sofrimento.

f) Uma onda T;

g) Uma onda U; é eventual, resultando provavelmente da repolarização dos músculos papilares.

Do QRS à onda T está o intervalo QT; drogas que o alteram podem matar.

Cada quadrado tem duração de 0,04 segundos, e amplitude de 0,1 mV (o chamado padrão N). A ordem de

medida das derivações é a que foi apresentada anteriormente; para descobrir a freqüência cardíaca

máxima, é só calcular quantos quadrados há entre dois R.

Anormalidades Atriais

Parte da onda P é composta pelo átrio direito, e parte pelo átrio esquerdo. Em V1, há uma parte positiva

(AD) e outra negativa (AE). Se o átrio direito crescer por hipertensão, a onda P fica apiculada e grande na

área correspondente (P pulmonari); se o esquerdo crescer, ficam duas ondas positivas, por problemas na

válvula mitral (P mitrali). (inserir a figura do PowerPoint);

Hipertrofia Ventricular Esquerda

O processo de despolarização é invertido, e a onda T fica invertida. A onda R nas derivações D1 fica

aumentada.

Os Bloqueios de Ramo

No lado direito, há uma nova onda (R’). O tecido de condução não funciona. Os bloqueios de ramo causam

alterações no eixo elétrico porque a despolarização dos dois ventrículos deixa de ser simultânea, e os

potenciais de ação deixam de ser iguais. Logo, um bloqueio de ramo esquerdo desvia o eixo para a

esquerda, pois esse ventrículo permanece ativado por mais tempo (o eixo elétrico chega a -50 graus).

Bloqueios Atrioventriculares

Quando há duas ondas P seguidas, com apenas um QRS, é um bloqueio 2 para 1.

Lesão subendocárdica e transmural

É o que se tenta imitar no teste de resistência física. O segmento ST abaixa, em caso de isquemia e lesão

subendocárdica; levanta em caso de lesão epicardial/transmural, por infarto agudo (fechamento de alguma

coronária). Após o infarto, fica uma cicatriz, que provoca aparecimento de um complexo QS no

eletrocardiograma. Isso porque, como há fibrose e necrose de células miocárdicas, forma-se uma janela

elétrica que permite um registro semelhante ao intracavitário, completamente negativo. O infarto agudo

tem aparência de um potencial de ação das fibras de Purkinje, por causa do supra-desnível do QRS.

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76 Cardiofisiologia

AULA 18 – BIOFÍSICA DA CIRCULAÇÃO

Professor: Roberto

circulação consiste em dois territórios distintos: um pulmonar e outro sistêmico, ligados em série.

Isso significa que o sangue que sai de um passa pelo outro, e depois retorna. O sangue tem origem

nos órgãos hematopoiéticos. Nos seres humanos adultos prevalece um só, a medula óssea.

O ventrículo esquerdo ejeta sangue para a circulação, mas somente sangue que ele recebe. Ele não cria

sangue, apenas transfere seu fluxo para os lados direito e esquerdo da circulação. A sua função, portanto, é

transmitir todo o sangue vindo do pulmão para a circulação sistêmica. Não se pode ejetar quantidades

diferentes de sangue entre os ventrículos direito e esquerdo, tratando-se de um fenômeno circulatório.

Essa circulação atende a diversos territórios. As taxas de consumo de oxigênio variam conforme os órgãos.

No cérebro, por exemplo, essa taxa é alta (mede-se a atividade cerebral pelo PETscan). Quando um

neurônio aumenta sua atividade, seu consumo de oxigênio aumenta. A fisiologia circulatória tem de ser

capaz de distribuir as quantidades corretas de sangue de acordo com as necessidades dos diferentes

tecidos (tira-se de um órgão para depositar em outro). Num susto muito grande, por exemplo, o sangue é

removido da superfície da pele e das vísceras e levado aos músculos, numa resposta de luta ou fuga. Pode-

se retornar à aula 12 para maior detalhamento desse fenômeno.

A pressão arterial não é o indicador mais importante, é apenas um instrumento que o organismo tem para

garantir o fluxo. Há casos em que a pressão é de 120 x 80 mmHg, mas não há perfusão para os tecidos, e o

indivíduo corre riscos da mesma maneira.

O que determina o fluxo de sangue entre dois pontos? Fluxo é o volume por tempo; o que importa,

portanto, é a quantidade de sangue, e de oxigênio, que chega a um tecido num determinado tempo,

dependendo disso o metabolismo energético.

A equação de Poiseuille calcula o fluxo:

Lei de Ohm dos vasos:

A diferença de pressão em

um vaso com valor de 100

mmHg produziria 1mL/min

de fluxo. Se o diâmetro

dobrar, haverá 16mL por

minuto. A relação entre

diâmetro e fluxo vascular,

portanto, está na quarta

potência. Assim, são usadas

no organismo variações no diâmetro dos vasos para

maior ou menor fluxo: artérias de condutância ou artérias de resistência.

A

Q = Fluxo

R = Resistência

L = Comprimento

η = Viscosidade

r = raio do vaso

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Anotações de Fisiologia 77

As artérias de resistência têm abaixo de 300 μm de diâmetro. Existe muita musculatura lisa, além de

receptores para metabólitos locais que provocam vasodilatação, permitindo maior aporte de oxigênio no

local onde ele é necessário.

A árvore circulatória passa por diferentes etapas. O coração é uma verdadeira bomba que produz variações

de pressão que vão de 0 a 120 mmHg. Essas oscilações são transmitidas às artérias elásticas (windkessels),

passando a ser de 80 a 120 mmHg. Isso se mantém até as artérias de resistência. Quando o sangue chega a

vasos mais apertados como esses, perde energia nas paredes das artérias, gerando calor e perdendo

pressão.

Chega-se ao nível dos esfíncteres pré-capilares, último estágio antes dos capilares e veias. Do início do

retorno venoso até a volta ao coração, a pressão chega a zero. Para o sangue voltar ao átrio, deve-se ter

um gradiente de pressão.

Velocidade do sangue

Vai aumentar e diminuir conforme o diâmetro dos vasos. A vazão, ou o fluxo total, é a mesma; o que varia é

a velocidade com que o sangue passa (comparar com uma mangueira na qual se obstrui com o dedo, para a

água sair mais rápido). Na aorta ascendente, a velocidade é de 63 cm/s. Na aorta descendente, é de 27

cm/s. Nos capilares, a velocidade é de 0,05 m/s. Isso pode parecer estranho de início. No entanto, se

somarmos a seção transversal dos capilares, será bem maior que a da aorta.

Como o fluxo nos capilares é o mesmo, e a seção transversal é muito maior que a da aorta, a velocidade do

sangue será bem menor neles. A área de seção transversa dos capilares chega a 2500 cm², enquanto a da

aorta é de 2,5 cm².

OBS.: O ecocardiograma não mede fluxo, mede variações na velocidade de fluxo.

A força que determina o fluxo é a pressão. O débito cardíaco, tão citado, é uma medida de fluxo.

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78 Cardiofisiologia

Logo, para produzir vasodilatação, a pressão arterial tem de ser mantida ou aumentada para não reduzir o

débito cardíaco. Não se pode ter fluxo se não houver uma diferença de pressão. Também não se pode

provocar vasodilatação sem condições adequadas, pois reduzirá a resistência periférica, e não haverá força

o suficiente para impulsionar o sangue.

Num teste de esforço o débito cardíaco aumenta, assim como a pressão arterial, e a resistência periférica

não se altera tanto. Num choque séptico, o débito cardíaco aumenta, pois a resistência periférica diminui,

enquanto a pressão arterial ainda está fixa.

Pessoas com hipertireoidismo têm um débito cardíaco alto, e a resistência periférica fica baixa, enquanto

os mecanismos regulatórios da pressão estão normais. De qualquer forma, não há como aumentar o débito

cardíaco sem diminuir a resistência periférica. A volemia normal é de 5 litros, que passam uma vez por

minuto. Para passarem 10 L em um minuto, basta diminuir a resistência periférica. O débito cardíaco

aumenta bastante, assim como a velocidade de circulação do sangue.

Como o volume de sangue é distribuído?

20% nas artérias, 5% nos capilares e 75% nas veias. A maior parte do sangue das veias está nas

esplâncnicas, ou seja, na porção das vísceras. O intestino é um grande banco de sangue, assim como o

baço. Em exercícios e situações mais intensas, o gasto de energia remove sangue da porção esplâncnica.

Metade da volemia está nas pequenas veias, que também são bem inervadas. O SNA simpático pode fechar

essas veias e levar o sangue de volta para os músculos.

Diferença entre pressão e tensão

A tensão é pressão x raio do recipiente. A pressão estica a parede de uma bola de soprar, gerando tensão.

Melhor ainda é o exemplo de uma luva de látex cheia de ar. As porções para os dedos têm menor raio,

havendo nelas menor tensão. A porção para a palma da mão tem raio maior, havendo nela maior tensão.

Os vasos de um hipertenso são muito mais espessos, a fim de evitar que surja mais tensão sobre suas

paredes. O crescimento em espessura corrige a tensão. A dilatação aumenta a tensão. Há casos de

insuficiência cardíaca dessa forma, em que a cavidade está sob pressão muito alta. De inicio, há hipertrofia.

Depois, a cavidade cresce tanto que as paredes se afinam, não havendo correção da tensão e perda da

contratilidade. Quanto maior a artéria, maior a tensão à qual ela é submetida. A equação de Laplace serve

para calcular a tensão:

Obs.: Randas Batista foi um cirurgião que inventou um procedimento no qual se retirava um pedaço do

miocárdio, diminuindo o tamanho da cavidade (o seu raio) e, por conseqüência, a tensão em suas paredes.

Obteve sucesso temporário nos pacientes, e sua técnica acabou por cair em desuso.

As varizes são explicadas pela incompetência crônica das válvulas, na qual há refluxo de sangue venoso. As

veias têm sua parede deformada, então. São geneticamente determinadas, piorando com hormônios.

Número de Reynolds

É um número adimensional usado em mecânica dos fluidos para o cálculo do regime de escoamento de

determinado fluido sobre uma superfície. Mede a tendência para a ocorrência de turbilhonamento. Calcula

o fluxo laminar na aorta como 10³; acima deste valor, mesmo neste vaso grande e liso ainda há turbulência

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Anotações de Fisiologia 79

(o que acontece na sístole). Leva em conta a velocidade, densidade e viscosidade do sangue, e o diâmetro

do vaso.

Fluxo laminar

Misturando-se dois fluidos imiscíveis e com cores diferentes, quando postos em sentidos contrários, geram

uma lâmina . As moléculas em contato com as paredes perdem parte da energia, enquanto as que estão no

centro perdem menos. Para que haja essa organização, deve existir um determinado número de Reynolds,

ou seja, um número que mostra a possibilidade de desenvolver um turbilhão. É maior em artérias de

grande calibre, e menor nos capilares.

Um rio, por exemplo, se estiver correndo, não faz som

algum. O que faz som é o turbilhão gerado por pedras e

curvas. O mesmo acontece na circulação: o fluxo

laminar não gera som. Os turbilhões geram som, como

no coração.

Se colocarmos uma borracha em torno de uma artéria

braquial, com pressão superior à da artéria, o fluxo é

interrompido e não se ouve nada com o estetoscópio que pusermos no braço. Quando a pressão da

borracha for reduzida, ela vai ficar ligeiramente menor que a da artéria, e surgirá uma abertura. Depois, a

pressão diminuirá na artéria. Num novo batimento cardíaco, ela aumentará de novo. Assim, a cada

batimento cardíaco, será gerado um turbilhão, que poderá ser ouvido num estetoscópio. À medida que se

diminui a pressão na borracha, os turbilhões são gerados de forma menos intensa, até o ponto em que a

artéria retorna à sua pressão original. Lá, ela estará toda aberta, e o fluxo será novamente laminar.

Obs.: o inventor do método de mensuração da pressão arterial não utilizava o método auscultatório, e sim

o método palpatório. Este método só mede a pressão sistólica, e não a diastólica. Depois, foi Korotkoff que

descreveu os método auscultatório, com 4 sons diferentes perceptíveis. Inicialmente, são secos como

pancadas, passando depois à característica rítmica e áspera.

Stress de cisalhamento

O sangue, quando passa na artéria, produz um stress oblíquo

(shear stress, ou stress de cisalhamento) no endotélio. É o

estímulo mecânico mais sensível que existe, de forma que o endotélio produz uma série de substâncias (ver

Bogliolo Patologia Geral) para compensar as mudanças. O principal produto secretado é o óxido nítrico

(NO).

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80 Cardiofisiologia

AULA 19 – REGULAÇÃO HUMORAL DA PRESSÃO ARTERIAL

Professora: Alessandra

A pressão arterial fisiológica não sofre flutuações grandes durante o dia. Ela se mantém relativamente

constante, para manter o débito cardíaco adequado ao nosso comportamento. Novamente, pode-se definir

a pressão arterial como débito cardíaco x resistência vascular periférica. Para que a PA não mude de forma

brusca, há mecanismos reguladores:

a) Aumento do inotropismo cardíaco (intrínseco);

b) Aumento da volemia (por concentrações de sódio);

c) Fatores constritores e vasodilatadores (prostaciclina, cininas / angiotensina, catecolaminas);

d) Ativação simpática (altera a resistência periférica). Os vasos periféricos têm grande número de

receptores α-adrenérgicos, com efeito vasoconstritor, aumentando a resistência periférica.

e) O endotélio produz uma série de vasoconstrictores e vasodilatadores, alterando o fluxo sanguíneo

num determinado território ou mesmo a pressão arterial no corpo todo. A ação tem destaque nas

arteríolas do músculo esquelético, que se dilatarão para permitir maior oferta de oxigênio. Durante

a digestão, é o território esplâncnico que recebe maior oferta de oxigênio.

Para controlar a pressão arterial em indivíduos normais, temos fatores:

1. Locais;

2. Neurais (alterações nos drives simpático e parassimpático);

3. Humorais.

1 e 2 regulam a pressão praticamente momento a momento. No caso dos mecanismos neurais, a regulação

é de sístole em sístole. Os mecanismos humorais regulam a pressão arterial a médio e longo prazo

(minutos, horas ou até dias, no caso da aldosterona).Os mecanismos atuam entre si para regular a pressão

arterial. Ligam-se a coração, vasos sanguíneos e rins para exercer esse controle.

Dentro dos fatores humorais, estão:

a) Sistema RAA (renina-angiotensina-aldosterona);

b) Vasopressina;

c) ANP (peptídeo natriurético atrial);

d) Catecolaminas circulantes.

O sistema renina-angiotensina-aldosterona

A renina é sintetizada e liberada pelas células justaglomerulares da mácula densa, próximas das arteríolas

aferente e eferente. A redução de pressão arterial é sentida na arteríola aferente; a ativação simpática, a

hipovolemia e a depleção de sódio também contribuem para a síntese de renina. Essa síntese é inibida por

fatores opostos, ou seja, hipervolemia, hipernatremia e aumento da pressão arterial.

A renina estimula a formação de angiotensina II, que provoca vasoconstricção, promove maior absorção de

sódio a nível renal (e de água, junto com o sódio, no processo chamado de solvate dragging) e estimula o

córtex adrenal a liberar aldosterona. A angiotensina II ainda promove hipertrofia cardíaca e vascular

(contribui para o surgimento da hipertensão crônica), e estimula a adeno-hipófise a secretar hormônio

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Anotações de Fisiologia 81

antidiurético (ADH). A aldosterona atua diretamente na absorção de sódio nos rins, além de atuar nos

vasos.

A renina produzida é liberada na circulação, convertendo o angiotensinogênio vindo do fígado em

angiotensina I. O endotélio dos vasos sanguíneos, principalmente os pulmonares, possui grande quantidade

de enzima conversora de angiotensina (ECA), que converte a angiotensina I em angiotensina II. A

aldosterona, cuja produção é estimulada pela

angiotensina II, acaba por aumentar a pressão

arterial.

Em estado de hemorragia, a pressão arterial é mais

rapidamente recuperada com o sistema renina-

angiotensina-aldosterona, pois há recuperação mais

rápida da volemia. Devemos lembrar que a

hipovolemia, conforme dito antes, ativa a produção

de renina.

Medicamentos agem sobre a enzima conversora de

angiotensina (ECA) para combate à hipertensão,

sendo que a tolerância a eles é delimitada também por fatores raciais.

Algumas alterações patológicas que provocam aumento intravascular de renina:

- Cirrose com ascite (gera hiponatremia, e depois hipernatremia por compensação);

- Hemorragia;

- Diuréticos;

- Perda de fluido gastrointestinal;

- Falência cardíaca;

- Outros;

Mecanismos de liberação de renina

O indivíduo com hiponatremia tem automática liberação de renina pelas células justaglomerulares,

inclusive pela hipotensão na arteríola aferente. A ativação dos receptores β1 e dopaminérgicos também

aumenta a secreção. Os supressores de sua liberação são o ANP, o ADH e o próprio feedback negativo da

angiotensina II. Alguns fatores locais são as prostaglandinas e cininas, como estimulantes, e NO e adenosina

como inibidores da liberação de renina.

Via da bradicinina

Quando a ECA está estimulada, promove inativação da

bradicinina. Ao mesmo tempo que se potencializa um

efeito hipertensor, diminui-se um efeito hipotensor da

bradicinina. Um agente anti-hipertensivo inibidor da

ECA, então, potencializa o efeito vasodilatador da

bradicinina: o efeito é sempre duplo. A síntese de

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82 Cardiofisiologia

bradicinina pode ser revisada em livros de Patologia Geral.Enalapril, captopril e outros do seu gênero (-pril)

são inibidores da ECA.

Uma vez formada, a angiotensina II tem dois tipos de receptores. Existe o AT1, que provoca

vasoconstricção, aumento da reabsorção de sódio (e conseqüente aumento de PA) e ações proliferativas. É

bloqueado por losartan e outros. O receptor AT2, por sua vez, tem ações que contrabalançam os efeitos de

AT1, ou seja, é vasodilatador, e também tem ações antiproliferativas. O AT2 entra em ação se os AT1

estiverem já ativados por grandes quantidades de angiotensina II.

Outra via de formação de angiotensina II é pela enzima quimase. Se não for-lhe dada a devida atenção,

pode-se piorar a hipertensão.

Existe uma via alternativa para o SRAA. É um sistema local, localizado dentro de uma única célula cerebral,

cardíaca ou vascular. Mesmo que haja um bloqueia do SRAA sistêmico, a via local pode estar funcionando

normalmente. Esse sistema funciona da mesma forma que o sistema convencional até a angiotensina II.

Outros mediadores para essa via são metabolicamente ativos: proteases locais podem formar angiotensina

de tipos 1-7, 3 e 4. Essas angiotensinas diferentes agem em receptores AT também diferentes. Essas

proteases formam intermediários de angiotensina I (citados depois).

Ações da angiotensina II

Possui três ações: agudas, a médio e a longo prazo. As agudas são aquelas que agem imediatamente ao

aumento de resistência periférica, via receptores AT1. A médio prazo, altera funções renais de reabsorção

de sódio e água (via aldosterona ou não). A longo prazo, atua provocando hipertrofia e remodelamento

vascular/cardíaco.

Para alterar a resistência periférica, faz vasoconstricção direta. Também aumenta neurotransmissão

noradrenérgica periférica, reforçando a liberação e diminuindo a recaptação de noradrenalina. Aumenta

também a liberação de catecolaminas pela medula adrenal, e a descarga simpática como um todo.

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Anotações de Fisiologia 83

Nos rins, aumenta reabsorção de sódio (e de água, portanto). Também estimula a liberação de aldosterona,

elevando a reabsorção de sódio e a excreção de potássio no túbulo contorcido distal. Pode alterar a

hemodinâmica renal, provocando vasoconstricção renal direta, aumento da neurotransmissão

noradrenérgica e aumento no tônus simpático. O maior tônus na arteríola aferente gera, por maior

pressão, maior filtração.

No sistema cardiovascular, pode haver efeitos não hemodinamicamente mediados: aumento na expressão

de proto-oncogenes, aumento na produção de fatores de crescimento e aumento na síntese de proteínas

da matriz celular. Outros efeitos são hemodinamicamente mediados, como o aumento da pós-carga

(primeiro passo para insuficiência cardíaca) e aumento da tensão da parede vascular.

A angiotensina II, agindo em receptores AT1, age no coração aumentando a contratilidade e o débito

cardíaco. No músculo liso vascular, aumenta a constrição e a resistência periférica. No SNC, provoca sede e

apetite para o sal. Nos rins e no intestino, aumenta a reabsorção de sódio e água. No córtex adrenal,

provoca a liberação de aldosterona.

O downregulation de receptores AT1 ocorre após muito tempo de ativação contínua do SRAA. Isso serve

como um mecanismo regulatório/compensatório do organismo. Ocorre por meio de retirada dos

receptores da membrana e redução de transcrição gênica.

As sínteses de angiotensina III, IIV e 1-7 são realizadas por peptidases, endopeptidases e peptidases

neutras. A angiotensina 1-7 utiliza receptores MAS. Tem efeito anti-arrítmico e vasodilatador. Estimula a

natriurese e a diurese.

A dimerização é a capacidade de um receptor se transformar em outro, como AT1 em AT2, e vice-versa.

Não existe apenas ECA-1. Existe ECA-2, que converte angiotensina II em angiotensina 1-7. Esta enzima

ainda converte angiotensina I em angiotensina IX. Sua atividade aumenta quando os receptores AT1 estão

inibidos, onde haverá excesso de angiotensina II no sangue. A inibição da ECA-1 corta tudo o que a

angiotensina II ativava. Logo, estão inibidas as formações de aldosterona, de ADH e a vasoconstricção. A

bradicinina tem sua concentração aumentada, aumentando também a vasodilatação, naquele efeito duplo

citado antes.

A vasopressina é liberada pela neuro-hipófise, em situações onde há muita angiotensina II,

hiperosmolaridade e estimulação simpática. A vasopressina atua em receptores V1 e V2, distribuídos de

forma distinta nos vasos e nos túbulos renais, respectivamente. Nos vasos, provocam vasoconstricção,

contribuindo para aumento da PA. Nos túbulos renais, aumentam a reabsorção de água, aumentando a

volemia e a PA por conseqüência. A reabsorção de água é feita por aquaporinas.

Em presença do ADH, o volume urinário é mínimo. A cerveja reduz os efeitos do ADH, enquanto alimentos

salgados diminuem o volume urinário. Na neuro-hipófise, osmorreceptores são deformados pela

hiperosmolaridade, aumentando a secreção de ADH.

O ANP é liberado pelos miócitos atriais e ventriculares. Aumenta a natriurese, estimulado por aumento da

distensão atrial (ou seja, ou retorno venoso está aumentado, assim como a volemia). Diminui a resistência

e a pressão venosa central. Auxilia a alterar a pressão arterial, também por vasodilatação e pela diminuição

da resposta do músculo liso vascular às catecolaminas. É degradado por uma peptidase neutra. Serve,

portanto, para normalizar a pressão arterial.

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84 Cardiofisiologia

Por fim, existem catecolaminas adrenais no processo regulatório. A adrenalina é mais presente que a

noradrenalina (20%). A adrenalina atua em receptores α-1, promovendo vasoconstricção, e em receptores

β, promovendo vasodilatação. Os dois receptores coexistem numa mesma célula. No entanto, há mais

receptores α na circulação, enquanto há mais receptores β-2 na circulação do músculo esquelético. Isso

propicia um aumento de força durante uma possível reação de luta ou fuga.

A pressão de pulso é muito maior na presença de noradrenalina que na de adrenalina. Isso porque a

adrenalina tem afinidade por receptores beta, que são vasodilatadores, causando um certo déficit na

pressão de pulso.

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Anotações de Fisiologia 85

AULA 20 – REGULAÇÃO DO DÉBITO CARDÍACO

Professor: Roberto

“A atividade intelectual é carregar uma interrogação na mão.”

Débito cardíaco é a quantidade de sangue está circulando num determinado instante. Logo, varia conforme

as nossas necessidades de oxigênio, ou seja, conforme a nossa atividade. Observação: a biologia do ser

humano é baseada em ameaças e corridas constantes, de acordo com nossas origens nas savanas da África.

O débito cardíaco deve ser finamente regulado, portanto, para permitir mais oxigênio durante situações de

exercício físico ou stress.

Pode-se representar em mL/min ou pelo índice cardíaco,

usando a medida por metro quadrado de superfície corporal.

Na infância, inicia-se com 2,5L/min, chegando a 5L/min na

vida adulta. No envelhecimento, já diminui de novo, pois

menos fluxo é necessário.

O mecanismo que permite maior oferta de oxigênio conforme

o exercício se torna mais intenso, com o débito cardíaco

sendo aumentado, é controlado pelo “freguês”. Ou seja, as

próprias células da periferia (dos tecidos em geral) ditam a

quantidade de oxigênio necessária.

A resistência periférica é a soma das resistências de todos os

leitos arteriais presentes no organismo. O débito cardíaco é

inversamente proporcional à resistência periférica, caso a pressão arterial seja mantida fixa.

O SNA simpático também tem uma função de controle do fluxo de sangue para os tecidos, pelo aumento

do débito cardíaco. Ele fixa a pressão arterial, evitando sua queda pela vasoconstricção em alguns lugares

(vísceras) e vasodilatação em outros (músculo esquelético).

Se uma pessoa estiver com débito cardíaco reduzido, os batimentos muitas vezes podem estar normais.

Logo, uma alternativa viável para correção seria aumentar a freqüência cardíaca, certo? Errado: com o

aumento da freqüência de bombeamento, a quantidade de sangue impulsionado a cada batimento

(volume sistólico) diminui. É melhor controlar a periferia da circulação, aumentando o débito cardíaco por

ali. O aumento da freqüência cardíaca se dá quando o retorno venoso está aumentado, para bombear

sangue de forma eficiente. O coração transfere, do lado arterial, o fluxo de sangue que chega do lado

venoso. O condicionamento físico, por sua vez, é a capacidade que temos de aumentar o débito cardíaco.

Por que, durante o exercício, o débito cardíaco aumenta? A resistência periférica cai, principalmente pela

vasodilatação muscular (ação do SNA simpático colinérgico e dos próprios músculos). Há, no entanto,

situações clínicas nas quais o indivíduo, em repouso, tem aumento do débito cardíaco.

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86 Cardiofisiologia

Uma pessoa com septicemia por bactérias gram-negativas que produzem toxinas pode ter seu débito

cardíaco aumentado. Será o chamado “choque quente”. Outra situação é o hipertireoidismo, que provoca

uma redução da resistência periférica. Uma fístula AV (AV shunt) faz com que o débito cardíaco aumente,

pois diminui muito a resistência periférica. O débito cardíaco, nesse caso, aumenta na mesma proporção do

débito da fístula.

Uma situação, por exemplo, na qual uma pessoa leva

um tiro e ocorre hemorragia aguda: a pressão está

controlada, por mecanismos compensatórios, e a

resistência periférica está aumentada para conter a

pressão. O medo e o pânico também aumentam a

resistência periférica, da mesma forma que na

hemorragia: causam vasoconstricção (daí a palidez

característica desta situação).

A anemia também é uma causa de débito cardíaco

alto. Por quê? Um dos fatores de controle da

resistência periférica é a viscosidade do sangue. É

muito mais fácil o sangue passar quando estiver “fino”,

ou seja, com menos hemácias. Quanto mais baixo for o

hematócrito, mais sangue passará num mesmo

instante, e o débito cardíaco estará elevado. Além disso, a menor oxigenação das células leva à

vasodilatação.

O uso de hipotermia em grandes cirurgias e outros procedimentos clínicos diminui a atividade celular e o

consumo de oxigênio. Os tecidos são mais preservados em caso de falta momentânea de O2.

O dinitrofenol (DNP) é uma substância extremamente tóxica desacopladora da cadeia respiratória que

aumenta o metabolismo celular e provoca vasodilatação, por consequência. Se a pressão for controlada, o

débito cardíaco aumenta muito. Se a pressão arterial não

for controlada, ela cai. Algumas causas de débito

cardíaco baixo são perda de sangue, insuficiência

cardíaca, doença de Chagas e outras doenças do músculo

cardíaco, tamponamento cardíaco (compartimento cheio

de sangue entre os pericárdios visceral e parietal,

causando restrições de enchimento), valvulopatias, como

estenose mitral grave, estenose aórtica, entre outros. O

uso de cocaína provoca insuficiência cardíaca, assim

como o de álcool.

Como medir o débito cardíaco? Mede-se a quantidade

de sangue extraída pelos pulmões. A cada litro de

sangue, tem-se 160 mL de oxigênio no ventrículo direito,

enquanto se tem 200 mL de oxigênio por litro num

minuto no ventrículo esquerdo. A divisão de 200 pela diferença entre os dois ventrículos (40) dá o débito

cardíaco em litros. Logo, o débito cardíaco está em 5L de sangue.

Outra forma de medir o débito cardíaco é pela inserção de um cateter na artéria pulmonar. Quando ele não

puder mais avançar, infla-se um balão cuja pressão é parecida com a do átrio direito. Este método fornece

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Anotações de Fisiologia 87

débito cardíaco e mais outras medidas. Pode-se injetar soro ou água gelada no cateter, e medir o retorno

da temperatura numa curva para checar o débito

cardíaco. O cateter tem um sensor térmico. O

procedimento se chama termodiluição, sendo um

dos mais utilizados.

O débito cardíaco não é nada mais que o retorno

venoso ao coração. O fato de haver gradiente de

pressão pequeno entre a veia e o coração (no caso,

cerca de 5 a 7 mmHg) torna o sistema suscetível a

problemas, quando houver prejuízo no fluxo de

retorno venoso. Um exemplo é o de ficar parado

em pé: a gravidade aumenta a pressão nos vasos

mais distantes do coração; a pressão nas veias

passa para 80 mmHg, provocando perda de água dos vasos nas pernas (edema). A volemia diminui! Em

vôos internacionais, ocorre o mesmo. Para cada centímetro que nos afastamos do coração, contamos 1,13

mmHg a mais na pressão venosa. A alteração gravitacional da pressão explica o porquê de só medirmos a

pressão arterial na altura do coração (deve-se prestar muita atenção a este fator).

Na síncope (desmaio) pré-prandial, uma das causas é a vasodilatação desproporcional das vísceras, em

momentos antes da refeição, ao sentar-se à mesa.

A pressão normal pode variar muito entre as pessoas. O fato de medi-la muito, no entanto, não significa

que algum problema será sanado. Há situações do dia-a-dia em que se come muito sal, em que se está

estressado ou sob pressão, de forma que o melhor jeito para medir a pressão arterial é dentro de um

consultório médico, num ambiente médico.

Acima, está ilustrado o débito cardíaco em diferentes condições patológicas.

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88 Cardiofisiologia

Qual a relação entre a taxa metabólica de um determinado

tecido e o fluxo de sangue? Bem, o fluxo de sangue deve ser

regulado. Excesso de fluxo é ruim, assim como a sua falta. A

pressão que chega ao tecido deve ser compensada para não

produzir fluxo demais.

A regulação local do fluxo sanguíneo se dá pelos fatores:

a) Miogênico: se perfundirmos um tecido com excesso

de pressão, esta exerce uma força sobre as paredes

dos vasos, gerando uma resposta miogênica.

Provavelmente, existem mecanorreceptores nas

células musculares lisas da túnica média,

despolarizando as células e proporcionando contração (vasoconstricção). Isso não permite que o

excesso de pressão se transforme em hiperfluxo, o que seria fatal em alguns tecidos; além disso,

ocorre mesmo na ausência de influência neurológica.

As girafas são um exemplo de adaptação: geram pressões de até 400 mHg para o sangue conseguir

subir até a cabeça. Ao mesmo tempo, o sangue não pode chegar com essa pressão até os pés, ou até a

cabeça quando a girafa se abaixa para beber água. Logo, ela possui um mecanismo miogênico para

evitar a transmissão de pressões e fluxos muito altos à microcirculação. A microcirculação foi

desenhada para ter suas trocas em torno de 15 a 20 mmHg, não suportando níveis tão altos como os

enviados diretamente pelo coração.

Essa regulação é mais importante no excesso de pressão, o que não significa que ela deixe de agir em

casos de pressão baixa.

b) Metabólico: o sangue leva oxigênio e outros nutrientes às células, sendo que chegam por difusão

via interstício. Quanto maior o consumo de oxigênio (e o metabolismo), maior a extração de

oxigênio do sangue. Por isso, o interstício e o sangue terão menor pressão parcial de oxigênio.

Possivelmente, as células musculares lisas têm sensores para o abaixamento da pressão parcial de

oxigênio.

Os mediadores locais de metabolismo são oxigênio, dióxido de carbono, adenosina (possivelmente o mais

importante), potássio, temperatura e bradicinina. A falta de glicose também leva à vasodilatação. Por isso,

quando se faz um garrote no braço e movimentos com as mãos, elas ficam vermelhas. Há hiperemia

passiva, com aumento das concentrações de CO2, histamina, bradicinina, entre outros. A hiperemia reativa

é outra reação que acontece após desobstrução de vasos: há um forte efeito vasodilatador para compensar

a isquemia gerada.

A falta de oxigênio no tecido miocárdico, seja por obstrução ou por maior demanda, leva a um maior

consumo de ATP, e maior geração de metabólitos. Entre eles, a adenosina é o mais importante, por exercer

um forte efeito vasodilatador sobre as células musculares lisas das artérias coronárias. Assim, há uma

regulação compensatória da irrigação.

Durante o exercício, o potencial vasodilatador é dado pelo SNA simpático, inicialmente, e depois

principalmente pelo próprio metabolismo. Por isso que o próprio tecido indica quanto fluxo será necessário

para seu bom funcionamento. Isso se dá pela determinação do tônus arteriolar. Quando o organismo

inteiro estiver trabalhando, o débito cardíaco aumenta. Se for apenas uma pequena região ou estrutura, o

débito cardíaco nem se altera. Assim se explica a regulação local.

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Anotações de Fisiologia 89

Um outro fator importante é a atuação de

substâncias sobre o endotélio vascular (que

reveste todos os vasos do organismo, sendo o

maior órgão endócrino do corpo). Ele reage às

necessidades, mantendo o sangue fluido,

impedindo inflamação das artérias e garantindo a

hemodinâmica. Ganhou importância em 1980:

foi usado vasoconstrictor em concentrações

diferentes. Num determinado grau de

vasoconstricção, administrava-se acetilcolina

para relaxar o músculo liso vascular. No entanto,

quando o endotélio era lesado, a acetilcolina não

provocava mais o tal relaxamento, levando à

conclusão que as células endoteliais eram fundamentais para o controle do diâmetro das artérias.

A acetilcolina atua através do endotélio, promovendo a liberação de óxido nítrico e provocando, assim, a

vasodilatação. Isso se dá pela ativação da óxido-nítrico sintase endotelial (NOSE). O NO estimula uma

guanilato-ciclase na célula muscular lisa, convertendo GTP em GMPc e relaxando-a. As fosfodiesterases

degradam GMPc; logo, se pudéssemos inibir a ação das fosfodiesterases, manteríamos os efeitos do óxido

nítrico. Foi relatado, no interior de São Paulo, casos de aranhas cujas picadas provocavam ereção

prolongada (priapismo). Mais tarde, foi desenvolvida uma droga inibidora de fosfodiesterase (como o

Viagra®). É interessante notar que nitratos eram utilizados como vasodilatadores desde o século XIX, mas

nunca havia sido descoberta a sua síntese pelas células endoteliais.

OBS.: o relaxante muscular foi inicialmente chamado de EDRF (endothelium derived relaxing factor); depois,

confirmou-se que era óxido nítrico (NO).

Em pessoas com excesso de colesterol, fumantes, de idade mais avançada e outras, a capacidade do

endotélio de sintetizar óxido nítrico está prejudicada ou diminuída.

O shear stress, ou stress de cisalhamento, é extremamente forte sobre as paredes arteriais. Aumenta com a

velocidade e o fluxo do sangue. A artéria regula seu stress de cisalhamento da seguinte forma:

- Imagine que se comprima uma artéria braquial por cinco minutos seguidos, com um manguito. A dor

começa a aparecer. Quando se solta o fluxo novamente, ele chega às arteríolas da periferia antes

vasodilatada. O sangue passará, com o aumento de fluxo, a uma velocidade muito maior que antes. Haverá

aumento do stress de cisalhamento. O primeiro efeito será a dilatação da artéria braquial (dilatação

mediada por fluxo); o aumento de diâmetro, lembrando, é secundário ao aumento de fluxo. As células

endoteliais, portanto, são capazes de sentir o aumento de fluxo nas grandes artérias e provocar

vasodilatação. Esse teste é uma medida clínica da função endotelial.

O endotélio, cronicamente, pode produzir respostas tróficas na artéria de uma região mais utilizada. O

calibre será permanentemente maior. Em paraplégicos, onde há atrofia muscular, o fluxo para o tecido

diminui, e o endotélio provoca a diminuição permanente do diâmetro das grandes artérias das pernas. O

número de vasos pode aumentar também, em situações próprias. Nesse caso, são liberados VEGF (vascular

endothelium growth factor), FGF (fibroblast growth factor) e angiogenina,que regulam o crescimento.

Alguns esteróides podem ter o efeito contrário, de dissolução de vasos neoformados.

Por alguns estímulos, o endotélio aumenta a produção de radicais livres (superóxido), contribuindo para a

piora da doença. O superóxido compete com o óxido nítrico, reduzindo sua biodisponibilidade, mas não a

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90 Cardiofisiologia

sua produção. No diabetes e no tabagismo, há aumento da produção de radicais livres. O endotélio

também produz fatores trombolíticos e trombogênicos, como o PAI e o tPA, respectivamente. Na

hipercolesterolemia e aterosclerose, a síntese de NO diminui, a quantidade de tPA diminui em relação à de

PAI, e as moléculas de adesão estão mais expostas, aumentando a retenção de macrófagos e

polimorfonucleares.

OBS.: não se deve pensar que, pelo fato de uma pessoa ter 60% da coronária obstruída, ela corre mais

riscos que uma pessoa com 20%. Depende da estabilidade da placa ateromatosa que está causando a

obstrução.

As endotelinas são mediadores para quando o endotélio realiza vasoconstricção. São liberadas durante a

resposta vasoconstrictora das catecolaminas, da angiotensina, do LDL, do fator de cisalhamento, entre

outros. Sua secreção é inibida pelo NO, pelo ANP e por prostaglandinas.

Retomando a aula 19, os efeitos da angiotensina (vasoconstrictores e inflamatórios) se devem à interação

com o endotélio. As veias são mais sensíveis que as artérias aos efeitos hemodinâmicos das endotelinas. No

coração, há efeitos inotrópicos e cronotrópicos positivos no miocárdio; as coronárias sofrem

vasoconstricção. Os pulmões sofrem bronconstricção.

A bradicinina foi descoberta, e por causa dela foi descoberto o captopril. Ela é um potente vasodilatador,

tendo seus efeitos amplificados pelo veneno da jararaca. Havia, então, um fator potencializador da

bradicinina. Estudos posteriores demonstraram que o veneno da jararaca inibia a degradação da

bradicinina e a conversão de angiotensina I em angiotensina II. Na verdade, o veneno da jararaca foi o

primeiro inibidor de ECA descoberto. A bradicinina inibida tornou-se um mecanismo complementar.

Vasodilatadores

Bradicinina;

Histamina;

NO;

K+;

MG2+;

H+;

Acetato/citrato;

CO2;

Vasoconstritores

Norepinefrina;

Epinefrina;

Angiotensina;

ADH;

Endotelina;

Ca2+;

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Anotações de Fisiologia 91

AULA 21 – REGULAÇÃO NEURAL DA PRESSÃO ARTERIAL

Professor: Helder Mauad

Por que é necessário um controle sobre o nível de pressão arterial? Temos uma série de sensores que

regulam e mantêm a pressão arterial dentro de estreitos limites fisiológicos. Considerando os tecidos de

uma forma geral, a manutenção da homeostasia depende do que chega pela corrente sanguínea. Logo, são

necessários alguns parâmetros de diferença de pressão:

e também , sendo que . Essas

variáveis são modificadas para manter a pressão arterial.

Uma primeira diferença entre os mecanismos humorais e neurais é o local de secreção dos mediadores. Estes mecanismos agem, por exemplo, quando nossa postura muda. A pressão arterial na cabeça e nas partes superiores do corpo diminui, o que poderia povocar perda de consciência. O tratamento de hiper e hipotensões posturais pode surtir certos efeitos colaterais. Pode-se fazer a analogia com o controle da temperatura da sala de aula, mantida a 22°C, por exemplo. A temperatura vai variar. Se ligarmos um computador ao ar condicionado, ligando-o e desligando-o, ele o fará se a temperatura ambiente for informada por um determinado sensor. Assim, se estiver mais frio ou mais quente que a temperatura desejada, o ar condicionado vai desligar ou ligar (respectivamente). O nosso sistema sensorial manda informações por aferências ao sistema nervoso central ”computador”. As informações serão processadas a nível bulbar, e uma resposta será enviada via eferências aos órgãos específicos para a ação desejada (“ar condicionado”). Na pressão arterial, alterações são enviadas ao SNC; reguladas pela divisão autônoma, controlam a força de contração do coração, a resistência periférica, entre outras variáveis. De forma simplificada, há um mecanismo semelhante ao arco reflexo. Do lado sensorial, há quimiorreceptores (um pouco mais lentos), barorreceptores (os mais rápidos), receptores nas câmaras cardíacas. Além disso, há respostas isquêmicas muito rápidas, relaxamento por estresse, entre outros efeitos. O ganho máximo é uma medida de eficiência dos sistemas de correção do organismo. Alguns deles demoram mais de um dia (como o renal) para corrigir a pressão arterial. A pressão arterial poderia ser considerada uma entidade, um chefe de estado. Apesar da importância do débito cardíaco e da resistência periférica, os dois apenas são manipulados para manter a pressão arterial dentro de seus limites fisiológicos. Eles são controlados pelos sistemas neurais que são o tema desta aula.

PA = Pressão Arterial

Q = Fluxo

R(P) = Resistência (Periférica)

DC = Débito Cardíaco

VS = Volume Sistólico

FC = Frequência Cardíaca

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92 Cardiofisiologia

Como efetores do SNC para o coração, há o componente simpático para a inervação dos ventrículos (resposta inotrópica) e dos nodos (ativação cronotrópica positiva). O aumento da ativação simpática no coração aumenta a ativação simpática dos vasos sanguíneos. Tudo para atingir um certo objetivo. Na região bulbar, estão centros de ativação simpática e parassimpática (vagal). Quando há uma inibição do simpático, a frequência cardíaca diminui, assim como quando se ativa mais o SNA parassimpático. Da mesma forma, a estimulação simpática aumenta a freqüência cardíaca e o volume sistólico, aumentando a fração de ejeção. A freqüência e o volume sistólico contribuem para aumentar o débito cardíaco. O SNA simpático também aumenta a resistência periférica. Reflexos cardiovasculares

a) Barorreflexo Mecanismo que possui, ao nível dos grandes vasos, a localização dos seus sensores. São terminações nervosas livres na camada adventícea dos vasos, detectando alterações de pressão e deformações nas paredes dos vasos. Aumentos de pressão arterial aumentam também a tensão nas paredes dos vasos. AS terminações dos barorreceptores os despolarizam, gerando potenciais receptores que são enviados ao SNC. Podem ser divididos em dois componentes: ao nível do arco aórtico (aórticos) e nas bifurcações das carótidas (carotídeos). Estas informações geradas nos receptores aórticos caminham até o SNC via nervo vago (NC X), que é um nervo misto; as geradas nos barorreceptores carotídeos são levadas ao SNC pelo nervo glossofaríngeo (NC IX), via nervo de Hering. Os nervos do barorreceptor são um tipo de fibra nervosa bipolar (dois axônios saindo do corpo celular, uma para a artéria e outro no SNC). Os corpos celulares dos receptores aórticos estão nos gânglios nodosos. Os dos receptores carotídeos estão nos gânglios petrosos. No gráfico, é possível perceber a faixa de melhor atuação dos barorreceptores, onde a reta se encontra mais inclinada: para uma variação muito pequena de pressão, a variação no número de impulsos gerados é muito grande. Aqui, o ganho máximo é maior nesse nível de grande sensibilidade. Na hipertensão, a curva fica mais achatada, de forma que o ganho máximo dos barorreceptores está diminuído. Há uma certa diferença entre os receptores aórticos e carotídeos. Os carotídeos teriam um ganho um pouco maior que os aórticos. De qualquer forma, ambos são capazes de se adaptar a alterações lentas de pressão (como em hipertensos), assim como um receptor de Pacini se adapta ao toque. Os barorreceptores são mais sensíveis a alterações bruscas de pressão. Em níveis normais de pressão arterial, os impulsos são intermitentes; em pressões altas demais, há um impulso contínuo. É comum dizer que os barorreflexos estão ativos quando a pressão sobe ou desce, o que é um erro. Os barorreceptores são ativos quando a pressão sobe, mas não quando a pressão cai. Conforme pode ser visto no gráfico acima, eles não estão ativos abaixo de uma determinada pressão, não gerando potenciais de ação. A regulação autonômica pode se dar, porém, tanto pelo silêncio dos barorreceptores quanto pela sua manifestação exagerada. Os extremos levam a ativações autonômicas opostas: na baixa pressão, o simpático é estimulado e o parassimpático está inibido. Na alta pressão, o contrário ocorre. Como o barorreflexo é ativado quando a pressão sobe, pode ser considerado inibitório. Na verdade, os barorreceptores são tão sensíveis que, até nas fases do ciclo cardíaco onde a pressão arterial diminui (diastólicas) ele age. Atua batimento a batimento.

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Anotações de Fisiologia 93

Drogas vasopressoras (como a fenilefrina) aumentam a pressão arterial, ativando os barorreceptores. Drogas vasodepresssoras desativam o barorreflexo, permitindo que o sistema nervoso autônomo aumentem a pressão arterial e a freqüência cardíaca. Se os barorreceptores forem retirados de uma cobaia (desnervação sinoaórtica), haverá grande variabilidade da pressão arterial, tendendo a cair. A respiração também fica alterada. Isso mostra a importância do barorreflexo na constância da PA. Em outro gráfico, é possível perceber a quantidade de valores de pressão diferentes medidos para um mesmo número de batimentos.

b) Quimiorreflexo

Suas células detectam alterações dos gases respiratórios, localizadas na bifurcação carotídea (corpo carotídeo) e ao nível aórtico. Há também quimiorreceptores centrais, no SNC. São irrigadas por uma artéria exclusiva. São capazes de detectar hipoxia, hipercapnia e alterações do pH. Podem ser do tipo I, ou glômicas (quimiossensoras), ou do tipo II, de sustentação. Os impulsos são enviados pelo nervo glossofaríngeo (NC IX). Quando ativadas, as células do tipo II liberam um neurotransmissor (dopamina, provavelmente) que chega a um outro nervo (glossofaríngeo), que leva o impulso ao SNC. Existe uma relação entre a pressão parcial de oxigênio e o número de impulsos gerados pelos quimiorreceptores (maior pO2, menos impulsos); existe também relação entre os níveis de CO2 + pH e a ventilação alveolar, conforme a figura ao lado. As respostas podem ser cardiovasculares (aumento de pressão e bradicardia), respiratórias (taquipnéia e bradipnéia) e comportamentais (defesa, pois há correlação com áreas do gênero). Os quimiorreceptores periféricos são experimentalmente testados pelo cianeto de potássio (KCN), que simula uma situação de hipóxia. Há resposta pressora e bradicardia, além da taquipnéia e resposta comportamental. Por que não ocorre taquicardia, o que pareceria lógico? A bradicardia seria uma forma de reduzir as exigências energéticas do coração num momento de pouca oferta de oxigênio. Ao mesmo tempo, como há taquipnéia, há uma tentativa de compensação da baixa pressão parcial de oxigênio.

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94 Cardiofisiologia

Pode-se realizar uma ligadura na artéria específica para o corpo carotídeo (quimiorreceptor). Assim, pode-se simular uma retirada de corpo carotídeo. Isso nos permite demonstrar como o KCN ativa a resposta induzida pelos quimiorreceptores periféricos. Os quimiorreceptores fazem parte do problema da apnéia obstrutiva do sono. São provocados vários microdespertares que acabam por ativar quimiorreceptores, levando a aumento da atividade simpática. A apnéia do sono pode, então, participar da gênese da hipertensão arterial. O aumento da atividade simpática diminui a oferta de sangue (e de oxigênio) a alguns tecidos, gerando mais hipóxia, entrando num ciclo vicioso. No infarto agudo do miocárdio, nos primeiros segundos, o quimiorreflexo tem importância muito grande. Isso porque, frente a uma queda do débito cardíaco e da pressão arterial, ele provoca ativação do SNA simpático, aumentando a contratilidade, a freqüência e o débito cardíacos.

Obs.: O sistema nervoso central está integrado à divisão autônoma de tal forma que, numa ativação maior do sistema respiratório, há inibição do SNA parassimpático (efeito vagolítico). Além disso, o sistema nervoso autônomo, em caso de hipóxia, há ativação tanto simpática quanto parassimpática do coração. Como o efeito parassimpático prevalece, a freqüência diminui e o volume sistólico aumenta. O quimiorreflexo contribui para a manutenção normal da pressão arterial, mas sua retirada não implica aumento de pressão. O vago parece compensar essa retirada. O controle tônico (basal) da pressão arterial, portanto, parece estar nas mãos dos barorreceptores (por agirem mais rápido). Da mesma forma, no entanto, a retirada dos barorreceptores não significa que a pressão arterial se elevará permanentemente. O sistema de controle sempre buscará a regulação da pressão arterial, mesmo que não seja batimento a batimento, transferindo essa responsibilidade entre os reflexos. Vale destacar que, em situações de hipóxia ou patológicas, o quimiorreflexo mostra bem o seu papel.

c) Receptores cardiopulmonares Algumas áreas reflexogênicas localizadas no coração e pulmões eram estimuladas, gerando repercussões cardiovasculares. Existem aferências vagais que se projetam para as áreas bulbares e aferências simpáticas mielinizadas que se projetam para a medula espinhal. Podem estar a nível pulmonar, a nível ventricular, a nível do átrio com veias cavas, a nível da caixa, entre outros lugares. A participação desses receptores é um fato antigo na pesquisa, começando em 1867 (Bezold e Hirt): se uma estimulação por injeção de alcalóide fosse feita em um cão, gerava “curiosidades farmacológicas”. Não era o efeito da droga, e sim de receptores da câmara cardíaca. Em 1915, Bainbridge e seus colegas observaram que uma rápida infusão intravenosa de fluidos levou a uma resposta de taquicardia. Depois, outros pesquisadores especificaram que a distensão do átrio direito ao lado da veia cava gerava uma resposta taquicárdica. Trazendo as observações para os dias de hoje: quando aumenta o retorno venoso, o átrio é distendido, assim como os receptores nas junções. Os receptores mandam aferências para o SNC a fim de gerar taquicardia, aumentando o débito cardíaco. O reflexo taquicárdico recebeu o nome de “reflexo de Bainbridge”. Estudos subseqüentes mostraram tipos de receptores: A (ativados na sístole) e B (ativados na diástole). Os ventrículos também possuem receptores capazes de gerar respostas cardiovasculares, como os polimodais (estimulados pela expansão de volume ou pela serotonina). A fenilbiguanida, a nicotina, prostaglandinas e bradicininas também são capazes de ativar receptores ventriculares.

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Anotações de Fisiologia 95

Ao nível da artéria pulmonar, a distensão gera vasoconstricção. A congestão do leito vascular pulmonar leva a vasodilatação reflexa. Jarisch e Richter injetaram alcalóides do veratrum, gerando hipotensão e bradicardia. Não são, conforme foi dito antes por Bezold, “curiosidade farmacológica”. O reflexo Bezol-Jarisch, quando estimulado, gera bradicardia, hipotensão e apnéia, numa escala diretamente proporcional. A estimulação é parecida com a do barorreceptor, pois há inibição simpática e ativação parassimpática. Estes reflexos, mostrados em experimentos com cães, substituiriam a retirada dos barorreceptores. A vagotomia abole um conjunto de reflexos inibitórios, mas contribui pouco para o entendimento da regulação neural da pressão arterial. Controle central da pressão arterial Como mostrar a ativação simpática ou parassimpática pelo SNC quando ocorrem reflexos? Se existe um estado de pré-contração (tônus) das artérias, uma atividade basal das células cardíacas, entre outros fenômenos, significa que impulsos estão sendo mandados, a todo momento, a estes órgãos efetores. Isso permite a regulação pelo sistema nervoso central. Qual a origem destes impulsos nele? Os primeiros experimentos foram realizados observando os efeitos de diferentes secções em troncos cerebrais de coelhos nas artérias das orelhas. Entre muitas regiões do tronco cerebral cortadas sem efeito algum, o corte de uma área da região bulbar (a nível da saída do nervo C1) dilatou imediatamente as artérias, despencando as medidas pressão arterial. Existe, portanto, na área bulbar, estruturas que mantêm o calibre dos vasos e o nível de pressão arterial. Hoje, estas estruturas são chamadas de centros ativadores de atividade simpática, ou centros vasomotores. Existem estruturas hoje conhecidas a nível de: núcleo hipotalâmico paraventricular, grupo de células A5, área bulbar ventrolateral rostral, área bulbar ventromedial, núcleo caudal da rafe. Estas áreas estão relacionadas aos neurônios pré-ganglionares simpáticos, fazendo sinapse com seus corpos celulares na coluna lateral da medula espinhal. A área ventrolateral rostral desperta um interesse especial. As informações aferentes que vêm dos receptores pulmonares, cardiovasculares, respiratórios e gastrointestinais chegam ao núcleo do trato solitário (NTS). Esse núcleo se estende dentro da região dorsal da área bulbar. Dali, as informações vão para diferentes porções do sistema nervoso central (é a nossa grande porta de entrada). A distribuição do sinal leva à ativação do simpático/parassimpático. As vias de ativação simpática e parassimpática são independentes, permitindo a regulação neural. Via do Barorreceptor A regulação fica na área bulbar ventrolateral rostral. Em casos onde a pressão arterial está alta, ela inibe a atividade de neurônios de ativação espontânea. O NTS utiliza de uma via inibitória do centro gerador simpático que acaba por provocar relaxamento vascular. Ativa-se um interneurônio que ativa o núcleo

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96 Cardiofisiologia

ventrolateral rostral, que inativa os neurônios simpáticos pré-ganglionares. Para provocar a bradicardia, partem impulsos do núcleo ambiguus, acaba por ativar as fibras pré-ganglionares parassimpáticas. Porções fazem a inervação do coração, do trato gastrointestinal, do trato respiratório. Se houver queda súbita de pressão arterial, os barorreceptores são desativados. A projeção que inibe o centro gerador de atividade simpática está desativada. Via do Quimiorreceptor O núcleo rostral ventrolateral leva impulsos excitatórios aos centros geradores de atividade simpática. O isolamento de células do núcleo rostral ventrolateral mostrou que elas eram auto-despolarizantes, ou eram parte de um circuito reverberante: interneurônios conectados um ao outro, de forma que o estímulo fica circulando e gerando atividade simpática. O experimento marcou as células auto-despolarizantes com corante, e colocou microesferas de rodamina, que se transportavam retrogradamente até o corpo celular. Mostraram-se células que transmitiam o impulso à medula e estavam relacionadas ao controle vasomotor: retículo-espinhais. Se houver aumento de pressão, o impulso das células rostrais ventrolaterais cai. O núcleo ambíguo é formado por diversos pequenos núcleos; possui camadas compactas, subcompacta, formação externa (controle cardíaco), etc. Avaliou-se para onde as fibras dos sensores próximos aos nodos do coração chegavam a uma área próxima do núcleo dorsal motor do vago e do núcleo ambiguus. Essas áreas detêm o controle parassimpático do coração.

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Anotações de Fisiologia 97

AULA 22 – MICROCIRCULAÇÃO

Professor: Roberto

Falaremos da interface mais importante entre o sistema circulatório e seu cliente, as células. Todo o

sistema de bombeamento sofisticado é feito para a célula. Como ocorre a entrega de sangue?

A árvore arterial termina em capilares de estrutura extremamente delicada. É uma camada única de células

endoteliais, mantida coesa por uma membrana basal específica. Eles são a parte mais importante da

circulação, pois por ali passam oxigênio, nutrientes, metabólitos. A grande característica dos capilares,

porém, é sua heterogeneidade. Variam conforme o tecido em que estão.

A função primordial dos capilares é permitir a passagem de substâncias, dependendo do órgão. A demanda

por trocas é diferente em capilares cerebrais ou renais, por exemplo. O principal determinante da travessia

das substâncias entre células endoteliais é a solubilidade em lipídios, haja vista a constituição da membrana

plasmática. A substância que mais passa por entre as células, e por dentro delas, é o dióxido de carbono

(CO2). O oxigênio não passa tanto assim. De qualquer forma, ambos passam com intensidade suficiente

para promover trocas.

As fendas endoteliais estão nas junções das células endoteliais, regiões retorcidas onde há pontes formadas

por complexos juncionais. Quanto maior o peso molecular do que for passar pelo endotélio, menor é a

permeabilidade àquela substância. Água, glicose, sacarose, cloreto de sódio e uréia passam com facilidade,

enquanto albumina praticamente não passa.

Os esfíncteres pré-capilares respondem a estímulos locais, como a presença de NO, bradicinina, histamina,

CO2 e adenosina. Também são extremamente sensíveis à tensão de oxigênio (pO2): se cair, as células do

esfíncter se relaxam.

Os capilares possuem lado arterial e lado venoso. O

capilar arterial tem um diâmetro um pouco menor (5

µm). As hemácias, que têm 7µm de diâmetro, passam

uma a uma, deformando-se. Há doenças hematológicas

nas quais as hemácias são incapazes de se deformar.

Uma vez que o líquido cai no interstício, ele passa por

entre fibras colágenas e proteoglicanos (ácido

hialurônico), que dão uma certa solidez ao interstício.

Podem existir distúrbios patológicos de acúmulo de líquido no interstício. Os capilares sanguíneos não

trocam nada com as células, e sim com o interstício. No entanto, as características dos capilares acabam

por influenciar as trocas que as células realizam.

Os capilares são muito heterogêneos. No fígado, por exemplo, os capilares permitem a passagem de

proteínas. Nos rins, porém, a passagem de proteínas não é permitida, apesar da presença de fenestras. Os

rins possuem os capilares mais permeáveis à água. Pode-se medir a condutividade hidráulica de cada tipo

de capilar. Os cerebrais têm um valor 3, enquanto os da pele têm 100, os do músculo esquelético são 250,

os do coração são 860, os do trato gastrointestinal são 13000 e, nos rins, são 15000.

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98 Cardiofisiologia

A passagem de líquido pelo capilar é determinada por uma

constante, dependente do capilar, por um coeficiente de

filtração, pela pressão hidrostática do capilar, pela pressão

hidrostática do interstício, pela pressão coloidosmótica do

interstício e pela pressão coloidosmótica do capilar.

Pressão coloidosmótica se refere a proteínas, que fazem a

água caminhar de acordo com seu gradiente de concentração.

O interstício praticamente não tem pressão coloidosmótica.

Permitem a entrada de água no interstício:

pressão hidrostática do capilar + coloidosmótica

do interstício + pressão negativa do interstício.

Esta última é explicada pela abertura de espaços

que “sugam a água”

Permitem a saída de água do interstício: pressão

coloidosmótica do plasma e pressão do líquido

intersticial.

O balanço final de água é calculado, então:

A força de filtração se dá por apenas 0.3 mmHg, num cálculo aproximado. 24 L são enviados pelos capilares.

85% disso é reabsorvido pelos vasos linfáticos. Essa mágica dos capilares com o interstício só pode ser feita

se não for permitido o aumento da pressão intersticial (impediria a filtração). Alguém precisa remover

líquido intersticial o tempo todo: é o papel dos vasos linfáticos.

Os linfáticos têm motricidade, pois seu endotélio tem capacidade contrátil. A bomba linfática empurra

líquido para fora do interstício o tempo todo. Nos músculos esse mecanismo é importante; nos pulmões, é

vital. Em trocas gasosas, o ar tem que passar do alvéolo para o capilar. Se houver água ali, cria-se um

empecilho à passagem de oxigênio. O linfático remove a água dali. Possui também formação semelhante a

válvulas.

Os vasos linfáticos têm três funções: manter o interstício com

pressão negativa, remover restos de proteínas que vazam dos

capilares (evitando aumento da pressão coloidosmótica) e

absorver lipídeos no início da digestão. Doenças nas quais há

obstrução ou destruição dos linfáticos intestinais provocam

incapacidade absortiva grave. Há esteatorréia, além de a

qualidade de vida ser péssima.

O fluxo de linfa é proporcional, até certo ponto, à pressão

intersticial. De -6 mmHg a 0, há aumento máximo do fluxo de

linfa. O aumento da pressão intersticial é um sinal para o linfático

que está havendo acúmulo de líquido no interstício.

Se alguém está com inchaço frio no corpo, podem existir algumas

razões. Uma causa muito comum é o consumo de álcool em excesso, provocando hipoalbuminemia

(desnutrição protéica, visto que o álcool é calorigênico). Outra razão para a concentração de albumina

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Anotações de Fisiologia 99

Extremidade Venosa Extremidade Arterial

Equilíbrio de Starling

sérica é a cirrose hepática, ou talvez uma disfunção renal: quando passa albumina pelos glomérulos renais ,

há hipoalbuminemia, a pressão oncótica diminui, o volume de sangue diminui, há ativação do SRAA,

aumento da volemia, mais perda de água para o interstício, e o ciclo vicioso continua. É a síndrome

nefrótica, caracterizada por edema, ascite, perda renal de proteínas.

Outro edema comum por desnutrição é o antes

visto nas crianças desnutridas (kwashiorkor). Há

hipoproteinemia, com edema subseqüente. A

filariose é uma outra causa de edema, mas não

por causa da diminuição de pressão oncótica, e

sim pela obstrução de vasos linfáticos. Uma

causa de elefantíase, sem ser a filariose, é por

insuficiência venosa crônica. A pressão

aumentada nas veias passa para os capilares, e

há edema. A pele fica friável, e quaisquer

ferimentos são passíveis de infecção por

Estreptococcus. Provocam celulite, com febre forte (erisipela), com surto nos vasos linfáticos. Os edemas

passam a acumular mais e mais proteínas no interstício, com estímulo da matriz à fibrose intersticial difusa,

sem cura.

A erisipela de face é bem comum também, principalmente pelo uso de piercings. Muitas vezes nem se vê

muitas bolhas nas pernas.

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100 Cardiofisiologia

Outra causa de edema é comum, pela sobrecarga das veias, por exemplo, por insuficiência cardíaca

congestiva. O débito cardíaco diminui, e os rins tentam compensar aumentando a pressão arterial via

ativação do SRAA. De início há melhora. Porém, depois ocorre hipervolemia. O fígado ficará com mais

líquido, assim como as veias do membro inferior. Pode haver edema pulmonar e falta de ar, além de ascite.

A insuficiência venosa, somada à insuficiência cardíaca, leva ao edema.

Uma pericardite constrictiva pode ir apertando o coração de fora para dentro, diminuindo o retorno venoso

e provocando congestão. Essa congestão leva a edema. Outra causa é a síndrome de obstrução das veias

supra-hepáticas (ver Bogliolo Patologia Geral), levando também a edema.

Uma causa muito interessante é o edema provocado pelo uso de amlodipina, nos membros inferiores. Esse

remédio promove vasodilatação (o melhor para quando o paciente não tem edema) em arteríolas. Não

possui efeito sobre vênulas. Logo, há aumento da pressão intracapilar, que leva à saída de água para o

interstício. Pode-se associar esse remédio a bloqueadores de receptores da angiotensina, como o losartan,

que têm um efeito importante de vasodilatação venular. É importante dizer que o uso de diuréticos, nesse

caso, não funcionará, pois não há retenção de líquido nos rins e sim aumento da pressão intracapilar.

Corticóides podem causar edema, mas não é tão comum. Mixedema, por sua vez, é provocado no

hipotireoidismo. Existe acúmulo de substâncias no interstício, e ocorre edema. A pele fica com aspecto

endurecido, de casca de laranja; há perda de elasticidade.

Uma causa comum de edema que não é bem explicada são as variações cíclicas na retenção de líquido, em

função do ciclo mentrual Algumas pessoas têm mais, outras têm menos. Provocadas pelo balanço

estrogênio/progesterona. É comum também, após os 40 anos, confundir o ganho de peso com edema.

Por fim, o uso de espartilhos também provoca edema no membro inferior.

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Anotações de Fisiologia 101

AULA 23 – FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL

Professor: Roberto

Doença de Bright = acreditava-se que só pacientes com essa doença podiam possuir hipertensão arterial

até a metade do sec. XIX.

Hipertensão é um fator de risco para doenças coronarianas e cardiovasculares: pessoas com 90 x 60 mmHg

vivem mais que pessoas com 120 x 80 mmHg! Quando se trata pacientes com hipertensão, o objetivo é

diminuir o risco de outras doenças, como as cardiovasculares.

Hipertensão: São cifras tensionais (mais altas) nas quais há benefícios de serem tratados. Estão acima das

cifras nas quais não há benefícios de tratamento.

Benefícios e malefícios do tratamento

Os benefícios são a diminuição do risco de doença cardiovascular, debilidade e morte. Também diminuem

custos com hospitais e eventos catastróficos. Já os malefícios são assumir o risco psicológico de ser um

“paciente hipertensivo” e a interferência na qualidade de vida. Afinal, este processo requer mudanças no

estilo de vida.

Causas de hipertensão arterial

1. Fatores genéticos:

a) Pai e mãe hipertensos aumentam as chances de o filho possuir hipertensão.

b) Genes candidatos: aldosterona sintase; receptor tipo 1 de angio II; ECA; angiotensina; canal

epitelial de Na, entre outros tantos.

2. Obesidade e fatores metabólicos:

a) O obeso é mais sensível a variações na concentração de sal, quando este é eliminado na urina.

b) A perda de peso é mais importante do que a restrição ao sal na dieta.

3. Sistema Nervoso Autônomo: ainda não se conseguiu mostrar que hipertensos possuam uma maior

ativação do simpático, o que acarretaria vasoconstricção aumentada.

4. Fatores psicossociais:

Trata-se do estresse agudo, que provoca hipertensão transitória. Logo, são necessários outros fatores

associados para gerar um quadro de hipertensão crônica. Curioso que o próprio diagnóstico da hipertensão

pode causar estresse no paciente.

5. Fatores vasculares estruturais

6. Papel do Rim, SRAA e do Sal: o manuseio de sal pelo rins é a chave para o entendimento e,

principalmente, tratamento da maioria dos casos de hipertensão arterial. Afinal, os rins eliminam sódio e

água, diminuindo a volemia e, consequentemente, a pressão arterial.

Por isso, o rim permite o aparecimento da hipertensão arterial. Teria a volemia muita importância na

regulação da PA? Na verdade, nem sempre. Muitos hipertensos não são hipervolêmicos, tendo apenas a

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102 Cardiofisiologia

sua resistência periférica aumentada. Esse aumento de resistência periférica faz com que o rim comece a

excretar (desde que perceba a pressão arterial aumentada; se não estiver assim, ele simplesmente

continua a liberação de renina). Em excesso de sal, o rim do normotenso, excreta sal até a PA voltar ao

normal. O rim do hipertenso também, porém a PA que será atingida com a excreção de sal é maior que o

normal.

Na hora que a volemia aumenta, a liberação de renina (e de angiotensina) é interrompida, logo há excreção

de sal e água numa velocidade alta, não havendo aumento substancial da PA.

Interessante dizer que o transplante de um rim normotenso para um indivíduo hipertenso acaba com a

hipertensão. Isso porque o rim agora não permite o aparecimento da hipertensão, excretando

normalmente sal e água.

Síndrome de Liddle: há uma mutação na porção intracelular que se liga à clatrina, não havendo

internalização do recaptador de sódio nos rins. Assim, há maior reabsorção de sódio e aumento da PA.

7. Outros fatores:

a) Estresse;

b) Obesidade. O tecido adiposo produz leptina, um hormônio regulador do apetite capaz de ativar o

hipotálamo. Este estimula a secreção de adrenalina, que é lipolítica, pelas adrenais. A adrenalina é

vasoconstritora na maior parte do corpo, o que provoca aumento da pressão arterial;

c) Alcoolismo (mecanismo desconhecido);

d) Sal, retido nos rins;

e) Diabetes;

f) Colaboração hormonal dos rins;

g) Genética (40% determinada, os outros 60% são ambientais): ativação de fatores como o sist.

Renina-angiotensina;

h) Fatores químicos, aumento do DC, fatores raciais, idade. Negros, assim como pessoas idosas,

geralmente têm artérias mais rígidas, o que eleva sua pressão arterial.

OBS.: a perda de peso é mais importante que a diminuição de consumo de sal.

A redução de fluxo sanguíneo para os rins provoca aumento sistêmico da pressão arterial: eles “percebem”

menor pressão que chega via arteríolas aferentes, e secretam maior quantidade de renina, ativando com

maior intensidade o SRAA. Pode ser um efeito de coarctação da aorta, num nível próximo ao das artérias

renais: a parte superior do corpo fica com pressão elevada.

Na pré-eclâmpsia, as toxinas liberadas pela placenta isquêmica provocam disfunção endotelial e

vasoconstricção (por falta de NO) nos glomérulos. Isso reduz a pressão de filtração e a natriurese, o que

acaba por levar à hipertensão.

O tratamento da hipertensão crônica se dá pelo uso de fármacos vasodilatadores (inibidores de atividade

simpática, do SRAA ou relaxantes musculares) e diuréticos (reduzem o transporte ativo de sal e sua

reabsorção dos túbulos para o organismo, evitando aumento da osmolalidade).

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Anotações de Fisiologia 103

AULA 24 – REGULAÇÃO DE FLUXO EM REGIÕES ESPECÍFICAS DO CORPO

Professora: Ivanita

A circulação coronariana compreende vasos que irrigam cavidades ventriculares e átrios. Os mecanismos

de regulação são diferenciados em cada câmara. O fluxo coronariano é variável nas duas câmaras

principais, e também nas diferentes fases do ciclo cardíaco. Durante a diástole ventricular, a compressão

que existe do músculo sobre as artérias coronárias diminui. O fluxo sanguíneo coronariano é classicamente

fásico, ou seja, durante o período em que a pressão ventricular está mais baixa, este fluxo vai aumentando.

Concluindo, o fluxo coronariano máximo ocorre durante a diástole ventricular.

No ventrículo direito, o fluxo coronariano não é máximo durante a diástole, e sim durante a sístole. Isso

porque a pressão criada pelo VD é cinco vezes menor, em média, que a do VE. Como assim?

O que determina o fluxo são as grandezas de fluxo e resistência periférica. O fluxo de cada uma das

câmaras depende da pressão. Quando o VE ejeta sangue, o valor chega a 120 mmHg. Nessa pressão o

sangue sai das coronárias para irrigar as câmaras cardíacas. Esse sangue sai do VE e encontra uma câmara

com pressão de 120 mmHg (esquerda), que acaba por comprimir a parede do vaso. Na sístole ventricular,

portanto, é onde o fluxo coronariano é menor. Num período muito curto de tempo, pode chegar a zero. Há,

porém, outros fatores que não deixam o fluxo zerado o tempo todo, durante a sístole ventricular. De

qualquer forma, o maior fluxo ocorre durante a diástole.

Do lado direito, não é bem assim. A pressão sistólica do ventrículo direito não passa de 20 mmHg, o que

permite haver diferença de pressão sempre, entre a coronária e a parede ventricular. Durante a sístole, o

fluxo coronariano direito é maior.

O que influencia o fluxo coronariano,

além da pressão gerada pela parede

ventricular? A profundidade dos vasos

dentro do miocárdio também

influencia o fluxo. As coronárias

partem do subepicárdio para o

subendocárdio. Pode haver isquemia

fisiológica, provocada pela obstrução

de ramos das coronárias.

Relembrando:

Se a pressão for mantida

razoavelmente constante, o fluxo

varia em função de alterações na

resistência vascular. Se a resistência

for mantida constante, há variação de

pressão de perfusão em função do

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104 Cardiofisiologia

fluxo de sangue coronariano.

À medida que a pressão aumenta, o fluxo aumenta. A equação não é de 2º grau, devido à influência da

resistência e a um mecanismo de autorregulação do fluxo. O fluxo, em condições fisiológicas, nunca é

distribuído além ou aquém do das necessidades do organismo. A pressão, quando aumenta, eleva o fluxo

para maior perfusão coronariana. Se a pressão aumenta sem necessidade de maior perfusão, ou diminui

nas mesmas condições, o fluxo não a acompanha tão diretamente (para adequação às necessidades

fisiológicas do coração). Se o fluxo for aumentado além das necessidades metabólicas, entram em ação

mecanismos de autorregulação.

Se houve aumento de pressão (ocasionando aumento de fluxo), pode-se controlar a resistência periférica,

aumentando-a. Esse mecanismo é extremamente eficiente, de forma que os vasos sanguíneos controlam o

fluxo principalmente pela alteração do calibre arterial. É um mecanismo de fácil controle, seja neural,

humoral ou local, e de ação muito efetiva. Agem, portanto, ADH, ANP, estrogênio, sistema nervoso

autônomo, entre outros. Como determinar um ajuste tão eficiente?

Esses mecanismos têm dois grandes propósitos: adequar o fluxo coronariano à demanda metabólica do

miocárdio (é o que determina o fluxo). Depois, manter a pressão de perfusão capilar (forças de Starling)

relativamente constante, evitando edema. A oscilação de demanda metabólica é determinada por fatores

que controlam oscilações no consumo de oxigênio do miocárdio.

Não é possível retirar muito mais oxigênio de cada hemácia, ou seja, não dá para aumentar muito o

rendimento do sangue arterial. O sangue venoso do coração é, naturalmente, o mais dessaturado de O2 do

organismo. É preciso, portanto, maior fluxo de sangue. Este aumento é determinado por:

1. Tensão desenvolvida na parede do ventrículo.

Pela lei de Laplace, . A tensão calculada é circunferencial, ou seja, calcula-se

numa área de secção transversa. Quando a pressão na cavidade ventricular aumenta, a tensão nas suas

paredes também aumenta. A tensão pode ser vista como uma força que faria uma circunferência se

romper. É interessante lembrar o exemplo da luva de látex inflada, que se rompe mais facilmente quando

aplicamos pressão onde o raio é maior. Na sístole, a pressão está aumentada e o raio diminuído,

compensando-se. Em pessoas com cardiomegalia, o raio aumentado provoca aumento de tensão, com risco

de rompimento.

Eficiência de bomba pode ser avaliada pelo trabalho externo (sistólico) dividido pela energia total

consumida (trabalho externo + tensão de parede). Quando o coração desenvolve trabalho, ele consome

energia, para gerar pressão e ejetar um determinado volume de sangue. A eficiência do coração é maior à

medida que o consumo de energia se torna menor. Corações com diâmetros maiores desenvolvem o

mesmo trabalho, porém gastam maior energia com a tensão de parede. Seu consumo de oxigênio é alto,

necessitando de maior controle de fluxo e de mais fluxo no mesmo trabalho.

2. Contratilidade miocárdica

Poder de contração de um músculo, sendo uma grandeza proporcional ao consumo de oxigênio.

3. Frequência cardíaca.

Da mesma forma, proporcional ao consumo de oxigênio, de forma direta.

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Anotações de Fisiologia 105

Outros determinantes do aumento de fluxo sanguíneo são o efeito de Fenn, manutenção da viabilidade

celular no estado basal, despolarização, ativação, manutenção do estado ativo, efeito de catecolaminas e

aumento do consumo de ácidos graxos.

Além disso, a resistência é controlada nas coronárias por três mecanismos. Em ordem de importância,

estão a autorregulação coronariana, a regulação neuro-hormonal e as forças puramente mecânicas

(compressivas extravasculares).

1. Autorregulação coronariana

Não depende de fatores como regulação neural ou humoral. Divide-se, em ordem de importância, em

controle do metabolismo do miocárdio, mecanismo miogênico e controle endotelial (shear stress).

Controle do metabolismo do miocárdio

Os metabólitos agem sobre o músculo liso vascular coronariano, fazendo-o relaxar. A adenosina é o mais

importante deles, aumentando a quantidade de AMPc no músculo liso. Podem ser ativados canais de

potássio ATP-dependentes, provocando seu relaxamento: quando há ATP, fecham-se e a célula se

despolariza. Quando diminui a concentração de ATP, a célula muscular lisa se hiperpolariza, e não se

contrai (o músculo liso relaxa). Com isso, a resistência periférica diminui, e o fluxo aumenta.

OBS.: o músculo liso vascular, assim como o cardíaco, também gasta ATP, o que explica a viabilidade deste

mecanismo regulatório. Não se sabe bem o porquê, mas a atividade de ambos está diretamente

relacionada. A adenosina surge pela conversão de ATP em AMP. A adenosina é o produto metabólico

lançado para fora do miócito.

As pressões parciais de O2 e CO2 também influem na autorregulação. Se aumentar pCO2 e diminuir pO2, o

músculo liso relaxa, diminuindo a resistência periférica e aumentando o fluxo de sangue.

Mecanismo miogênico

Toda vez que a pressão no vaso aumenta, a

tensão na parede aumenta, e o músculo liso

vascular se contrai. Esse mecanismo depende

somente da musculatura lisa, conforme

estudos. Isso dá margem para uma indagação:

se a pressão aumenta e o vaso se contrai, a

resistência periférica aumenta, provocando um

novo aumento de pressão. Isso constituiria um

ciclo vicioso até que o vaso se fechasse? Após

algum tempo de desdém por essa teoria,

novos métodos de estudo mostraram o porquê

de os vasos não se ocluírem.

Quando a pressão aumenta (junto da tensão

circunferencial), é gerada uma despolarização

do músculo liso. Logo, canais de cálcio

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106 Cardiofisiologia

voltagem-dependentes se abrem, provocando contração da musculatura vascular. O vaso não se fecha

porque, ao mesmo tempo, a despolarização também provoca abertura de canais de potássio voltagem-

dependentes, que contrabalançam o processo. A própria corrente de cálcio também ativa canais de

potássio sensíveis ao cálcio, contribuindo para contrabalançar a despolarização. Se os dois canais de

potássio forem bloqueados, os vasos se fecham.

Controle endotelial (shear stress)

A velocidade do fluxo gera um arraste que ativa a liberação de óxido nítrico (NO), levando à vasodilatação.

O endotélio é mais que uma simples barreira, produzindo fatores de contração (TXA, PGH2, endotelina e

angiotensina) e de relaxamento (NO, PGI2 e fator hiperpolarizantes sintetizados pelo endotélio, ou EDHF)

derivados do endotélio, ou seja, EDRF e EDCF.

2. Regulação neuro-humoral

Controlada pelo SNA simpático, principalmente, com atuação da adrenalina e noradrenalina em receptores

dos tipos α 1 e 2 (provocando vasoconstricção coronariana), e em receptores β2 (provocando vasodilatação

coronariana). A distribuição destes receptores é desigual, conforme a região do coração. Receptores α1

estão em toda a microcirculação, enquanto os α2 estão em vasos com diâmetro menor que 100 µm.

Numa resposta simpática, há efeitos inotrópicos e lusitrópicos positivos. Isso leva à vasodilatação, sendo

necessária a ativação de receptores β2. A cocaína, por inibir a recaptação de noradrenalina, leva a níveis

altos desse neurotransmissor. Pode haver ativação de receptores vasoconstrictores, levando a infartos

grandes ou pequenos. O SNA parassimpático não tem grande influência sobre a circulação coronariana.

3. Forças compressivas extravasculares (puramente mecânicas)

A maior parte do fluxo coronariano do lado esquerdo ocorre durante a diástole, graças à menor pressão

intracavitária do VE nessa fase do ciclo cardíaco. Durante a sístole, há compressão das artérias no

subendocárdio. Os vasos mais próximos do subpericárdio já não sofrem tanta influência dessa pressão. Há

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Anotações de Fisiologia 107

também estreitamento vascular causado também pela compressão de pequenas arteríolas durante a

sístole, independentemente da região ventricular. O VD é menos atingido por esses dois fatores.

Integrando os mecanismos regulatórios, percebe-se que os vasos maiores têm maior controle por ação

endotelial (shear stress). Depois, à medida que o calibre diminui, o controle miogênico passa a ser mais

importante. Por fim, nas arteríolas menores predomina o controle metabólico.

PARTE 2 – CIRCULAÇÃO EM REGIÕES ESPECIAIS: CEREBRAL, ESPLÂNCNICA, ESQUELÉTICA E

CUTÂNEA.

Professora: Alessandra

Nós temos vários meios de controlar a resistência arteriolar, controlando o fluxo sanguíneo pelo território

corporal. São eles: locais, humorais, neurais e endoteliais. Os quatro predominam num mesmo território,

porém em porções diferentes dele.

O fígado tem mais de 25% do débito cardíaco direcionado para si. O cérebro tem 14%, a pele tem 8,6 %, o

músculo esquelético tem 15,6%. A proporção se dá pelo consumo de oxigênio de cada órgão. Vale destacar

que cérebro e coração não têm as suas porcentagens do débito cardíaco alteradas quando há maior ou

menor débito cardíaco total.

A circulação é um sistema fechado. Logo, a demanda de sangue de uma região diminui a circulação de

outra. Veremos primeiro a circulação cutânea.

1. Circulação cutânea.

Na circulação cutânea, a maior parte da demanda de sangue vem da geração de calor e manutenção da

temperatura corporal. Predomina a rede arterio-capilar-venular sem anastomoses, existindo também a que

tem anastomoses (nas palmas das mãos, plantas dos pés e face). O fator neural é o principal regulador na

circulação cutânea, provocando vasoconstricção ou vasodilatação de acordo com o ambiente e a

temperatura interna. Há muitos receptores α-adrenérgicos e terminações simpáticas.

A altas temperaturas, o fluxo aumenta, provocando vasodilatação (inativação simpática). A baixas

temperaturas há redução do fluxo, com aumento de atividade simpática e vasoconstricção. Nosso corpo

tem sensores cutâneos de temperatura, que por uma alça aferente ativam ou desativam a resposta

simpática eferente. Todos os vasos sanguíneos têm um tônus vascular, em função de uma ativação

simpática mínima. O que há é um aumento ou diminuição dessa ativação.

Termorreceptores cutâneos e hipotalâmicos levam à estimulação de α-receptores adrenérgicos. Isso

provoca vasoconstricção, reduzindo o fluxo sanguíneo e a perda de calor. Em situações de medo, ficamos

pálidos por ação generalizada do SNA simpático.

A baixas temperaturas, a temperatura reduzida da pele promove um efeito local (via endotelinas,

provocando vasoconstricção) e um efeito mais geral pela ativação de receptores α1. Aumenta-se a

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108 Cardiofisiologia

resistência vascular e diminui-se o fluxo sanguíneo cutâneo. No calor, há efeitos locais e ação de

bradicinina, incitando a liberação de NO e provocando vasodilatação.

Reflexos antidrômicos são liberações de substância P e CGRP pelas próprias fibras aferentes da pele em

situações de calor. A pimenta possui capsaicina, que provoca ativação das fibras aferentes para reflexos

antidrômicos. A substância P provoca hiperalgesia, favorecendo a ocorrência de dor.

2. Musculatura esquelética

Metade da massa corporal é formada por musculatura esquelética, sendo que essa quantidade é

influenciada por idade, sexo e atividade física. Logo, o débito cardíaco dessa musculatura varia (5L no

repouso a 25L no exercício pesado), e também entre os tipos de músculo. Os posturais possuem maior

densidade capilar, por exemplo. Durante o exercício, a demanda metabólica aumenta, e junto com ela o

fluxo. O sangue é retirado do leito mesentérico nessas situações.

O suprimento sanguíneo para a musculatura esquelética é adaptado para uma grande demanda de

oxigênio. Há três tipos de artérias para suprir a demanda:

a) Artérias maiores, paralelas às fibras musculares;

b) Arteríolas transversas, que penetram no músculo;

c) Arteríolas terminais que terminam nas fibras musculares, paralelas de novo. A regulação é

predominantemente metabólica.

Há três níveis de regulação no repouso: do SNA simpático (não há parassimpático), do stress de

cisalhamento e metabólica.

Toda vez que o músculo entra em atividade, há vasodilatação. No relaxamento, há vasoconstricção

novamente. Para que haja vasodilatação e aumento do fluxo, é provocada vasoconstricção de leitos

inativos. É necessária, portanto, redistribuição do débito cardíaco entre as regiões do corpo e aumento do

próprio débito.

Autorregulação metabólica

O aumento da atividade eleva a concentração de metabólitos. A

produção aumentada de CO2 diminui a pO2, o que ativa a

receptores que provocam a liberação de NO, prostaciclina (PGI2) e

fator hiperpolarizante derivado do endotélio (EDHF). Este último

pode ser representado por derivados do citocromo P450, pelo

próprio NO ou por outra substância. O EDHF, encontrado apenas

em artérias de resistência, ativa canais para potássio ativados

sensíveis ao cálcio, hiperpolarizando as células musculares lisas.

Ainda há vasodilatadores como a adenosina, que também

estimula a liberação de óxido nítrico, e as maiores concentrações

de potássio extracelular. A regulação metabólica ocorre nas arteríolas terminais.

A regulação endotelial, portanto, age junto à regulação metabólica.

Miogênica

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Anotações de Fisiologia 109

Ocorre nas arteríolas medianas. Toda vez que a pressão de perfusão é diminuída pela vasodilatação das

arteríolas terminais, há uma resposta de vasodilatação aqui, para manter o fluxo adequado. A queda de

resistência num nível acima ocorre por ação de vasodilatadores endoteliais, como o NO. Se não houver

atividade física, o tônus normal volta primeiro nas arteríolas terminais, sendo que o ajuste nas outras

artérias maiores vem em seguida. Em resumo, os fatores de resistência variam numa mesma direção, para

manter o fluxo constante.

Nas arteríolas ainda maiores, a regulação se dá por Stress de cisalhamento. A pressão de perfusão

aumentada, durante o exercício, aumenta o stress de cisalhamento, provocando a liberação de NO.

Percebe-se que o NO é liberado em todos os níveis, porém por razões diferentes. Nas artérias de maior

calibre, predomina a regulação simpática, mais ativa durante o stress físico. No repouso, a atividade

simpática é menor. Os mecanismos reduzem a resistência em todas as artérias do músculo esquelético, em

detrimento do grande fluxo em outras regiões.

A maior quantidade de sangue está no leito venoso. Quando o SNA simpático está ativado, o sangue sai das

veias para onde há maior demanda de oxigênio.

Vasodilatação pelo SNA simpático colinérgico

A acetilcolina atuando nas células endoteliais provoca a liberação, novamente, de NO. Além disso, há

inibição da liberação de noradrenalina. A adaptação à atividade física rotineira provoca vasodilatação nos

músculos antes de o exercício começar.

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110 Cardiofisiologia

Um teste de reatividade vascular é pela checagem das ações da acetilcolina no endotélio.

3. Cérebro

O fluxo sanguíneo cerebral tem de se manter constante ou numa faixa estreita. Em quedas de pressão, há

hipóxia, com perda de consciência em segundos e morte cerebral em minutos. Em aumentos de pressão

arterial, o sangue se acumularia no leito venoso, havendo extravasamento de liquido para o interstício e

aumento da pressão intracraniana.

O fluxo cerebral supre a alta demanda de oxigênio: a maior parte (80%) vai para a substância cinzenta. Os

capilares são revestidos por células gliais, que formam a barreira hematoencefálica. Esta é permeável ao

CO2 e ao propanolol, e impermeável ao H+ e ao atenolol. A glicose é transportada por vias específicas,

enquanto os derivados lipídicos atravessam mais facilmente. Logo, acidose cerebral só pode ser provocada

por excesso de CO2 na região. A barreira hematoencefálica também mantém a quantidade de sangue baixa

no interstício.

A inervação simpática e autonômica em geral é menos densa, estimulando somente os vasos extracerebrais

do espaço subaracnóideo. Se não fosse dessa forma, uma situação de exercício físico intenso levaria a

vasoconstricção e redução do fluxo cerebral. Os neurotransmissores simpáticos são noradrenalina e

Neuropeptídeo Y. Há neurônios serotoninérgicos (serotonina faz vasoconstricção) e nitrérgicos (NO faz

vasodilatação). Alguns neurônios, ainda, liberam CGRP. Quem realmente controla o fluxo sanguíneo

cerebral, no entanto, são os metabólitos.

Em condições de hipercapnia, há vasodilatação. A produção de PGI2 e NO é estimulada. O fluxo aumentado

permite maior troca gasosa, aumentando a pO2. Em hipocapnia, há vasoconstricção. Esses mecanismos

impedem variações bruscas de pH, sendo que a redução do pH causa diminuição da atividade neuronal.

Devemos lembrar que é necessária uma ação conjunta dos quimiorreceptores, pois não adiantaria

aumentar o fluxo sem aumentar a resposta ventilatória. Isso eleva a quantidade de trocas gasosas. A

adenosina também é liberada em situações de metabolismo alto, ativando a liberação de NO e PGI2.

Autorregulação pressão/fluxo

Se variações de pressão de perfusão estão entre 50-150 mmHg, não há prejuízos para o fluxo cerebral.

Pode haver resposta isquêmica do cérebro frente a aumentos bruscos de pressão arterial: quando um pico

de pressão não consegue ser segurado pelo mecanismo de autorregulação pressão/fluxo. Para evitar

rompimento e ocorrência de AVE’s, existe essa resposta isquêmica. Pode haver perda de consciência.

Se a pressão diminui, a liberação de endotelinas (ET-1) age provocando vasoconstricção no músculo liso

vascular (em receptores ETA) e vasodilatação no endotélio vascular (ETB), pelo estímulo à secreção de NO e

PGI2. A pressão aumentada provoca reflexo de liberação de CGRP.

4. Circulação esplâncnica

Inclui a circulação mesentérica, justamente o foco dessa parte da aula. A partir da aorta, há três vias de

irrigação das vísceras: tronco celíaco, artérias mesentéricas superior e inferior. Todas as confluências

venosas destes órgãos darão origem à veia porta, no trato digestivo. Em repouso, quase 25% do débito

cardíaco é direcionado a essa circulação, porém com baixo consumo de O2. Logo, o oxigênio pode ser

retirado dali, antes da redistribuição de débito cardíaco provocada pelo exercício, hipotensão ou choque.

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Anotações de Fisiologia 111

Predomina um tônus vasoconstrictor durante o jejum. O fluxo sanguíneo aumenta antes e depois do

momento de alimentação, sendo chamado de fluxo sanguíneos pré ou pós-prandial. Isso se dá pelo

aumento de atividade parassimpática. A acetilcolina ativa a liberação de NO pelo endotélio, provocando

vasodilatação.

Durante a digestão, o fluxo sanguineo é aumentado conforme o alimento caminha pelo tubo digestivo. A

vasodilatação seqüenciada e administrada pelo NO e CGRP (ação parassimpática), por substâncias

metabólicas vasodilatadores (adenosina e CO2), que estimulam a liberação de: peptídeo intestinal

vasoativo, gastrina, colecistoquinina e histamina.

O efeito geral é, portanto, uma vasodilatação que aumenta o fluxo sanguíneo.

Autorregulação pressão/fluxo

Funciona com níveis diferentes de pressão, entre 100-140 mmHg. Se a pressão cai, há liberação de

adenosina e histamina para vasodilatar e manter o fluxo constante.

O SNA simpático quase não age. Atinge receptores α1, provocando vasoconstricção transitória. Possui um

escape autorregulatório, a partir do momento em que a pressão parcial de oxigênio diminui. Nesse

momento, um ajuste metabólico provoca vasodilatação novamente. O SNA parassimpático é vasodilatador

por estimular a liberação de NO e CGRP,sendo este último por vias aferentes.

Essa circulação é importante no controle cardiovascular, principalmente em situações de hemorragia e

queda de pressão arterial. Ativa a ação de SNA simpático, para manter a pressão arterial. O mecanismo á

ativado por barorreceptores. Provoca-se vasoconstricção, reduzindo o fluxo e aumentando a resistência

periférica.

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112 Cardiofisiologia

AULA 25 – RESPOSTA CARDIOVASCULAR AO EXERCÍCIO

Professor: Sérgio Lamêgo Rodrigues

A doença do século é a obesidade, seja por falta de exercício físico ou pela ingestão excessiva de alimentos.

70% da população brasileira têm sobrepeso.

A grande importância do exercício é a sobrevivência; temos um imprint evolutivo, de uma época em que

tínhamos de correr para comer e para sobreviver. Precisamos de pouca comida para sobreviver.

Alguns dados de trabalhos demonstram que o risco de morte por exercício físico é pouco diferente entre

pessoas com ou sem doença cardiovascular (que estejam sedentárias). No entanto, o cardiopata bem

condicionado vive mais que o sedentário sem doença cardíaca. As pessoas com melhor condicionamento

físico têm menor risco de morte em hipertensão, dislipidemia, DPOC, tabagismo, entre outros.

Estar bem condicionado é ter um bom nível MET, ou consumo de oxigênio em repouso (3,5 mL/kg x min)

comparado ao do equivalente em exercício. Quanto mais oxigênio consumido durante o exercício, melhor o

condicionamento físico. Em repouso, temos o mesmo consumo de oxigênio por quilo de massa corporal.

O ser humano sedentário não apresenta os problemas que tem durante o repouso, e sim durante o

exercício. Logo, o exercício é utilizado como promoção de saúde (prevenção), recuperação (terapêutica) e

investigação da saúde (diagnóstico e prognóstico).

Atividade física é o movimento corporal produzido por movimento de músculo esquelético, acompanhado

de aumento substancial do gasto energético. Para ser efetiva, no entanto, deve ser um exercício, ou seja,

uma subclassse na qual os movimentos corporais são estruturados e repetitivos. Ele tem como objetivo

manter ou melhorar os componentes do condicionamento físico (capacidade aeróbia, força e resistência

muscular e flexibilidade).

Condicionamento físico é um conjunto de atributos relacionados à habilidade de desempenhar a atividade

física.

As respostas cardiovasculares são alterações funcionais, súbitas, temporárias e que desaparecem em

minutos ou horas. Bons exemplos são alterações hemodinâmicas. Adaptações são alterações funcionais ou

estruturais que se seguem a exposição freqüente ao exercício, permitindo maior resistência ao esforço

(podem ser centrais, periféricas e neuro-humorais). Cessado o estímulo, há retrocesso do efeito.

Funções do sistema cardiovascular

a) Liberação de oxigênio e nutrientes para células e tecidos;

b) Remoção CO2 e outros produtos de degradação metabólica das células;

c) Transporte de hormônios;

d) Manutenção da temperatura corporal e do pH do organismo;

e) Prevenção de desequilíbrios hidroeletrolíticos e infecções.

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Anotações de Fisiologia 113

Ciclo cardíaco

Inclui todos os eventos que ocorrem entre dois batimentos cardíacos sucessivos. Inclui fases de

relaxamento (diástole, mais longa, durando 0,5 segundos ou 62%) e de contração (sístole, mais curta,

durando 0,31 segundos ou 38%).

A diástole é longa. Se somada à sístole (que é curta), é ruim em indivíduos cardiopatas. Afinal, em situações

de freqüência cardíaca elevada menos sangue será bombeado.

Volume de ejeção sistólico: é o volume de sangue efetivamente ejetado velo ventrículo esquerdo. Num

ventrículo, de 100 mL, são ejetados 60 mL. Logo, a fração de ejeção é o volume ejetado sobre o volume

diastólico final (nesse caso, 60%). Corações com fração de ejeção pequena geram efeito retrógrado,

podendo provocar efeito retrógrado na circulação sistêmica e na pulmonar também; pode surgir um edema

agudo de pulmão.

O débito cardíaco é o volume de sangue bombeado por minuto: . Está diretamente

relacionado ao consumo de oxigênio e ao esforço. É interessante notar que o débito cardíaco e a

freqüência cardíaca aumentam com a carga de trabalho, porém o volume sistólico atinge um certo limite.

Logo, uma pessoa capaz de aumentar o débito cardíaco está bem condicionada, principalmente se a

freqüência cardíaca não aumentar demais.

Nossa sobrevivência dependeria somente da atividade física; o coração seria uma estação de passagem

entre a vida (oxigênio entrando pelos pulmões) e os músculos. Estes enviariam gás carbônico de volta aos

pulmões, também pelo coração. Para ter um bom condicionamento físico, precisamos de bons pulmões,

um bom coração (bombeando cada vez mais sangue por menos energia gasta, com freqüência cardíaca

menor). É necessária uma boa musculatura também, com mitocôndrias e metabolismo adequado, e uma

boa microcirculação, que facilita as trocas de gases, nutrientes e excretas.

A contratilidade é um determinante do débito cardíaco: uma pessoa com débito cardíaco alto pode ter

insuficiência cardíaca se o músculo não estiver contraindo adequadamente.

A pressão de enchimento e a complacência influenciam o volume diastólico final. A contratilidade e a pós-

carga influenciam o volume sistólico final. O VDF e o VDS acabam por influenciar o volume ejetado, que

junto à freqüência cardíaca define o débito cardíaco. O débito cardíaco pode aumentar 6 vezes,

multiplicando freqüência cardíaca por 3 e volume sistólico por 2.

Os controles extrínsecos do tônus vagal diminuem a freqüência cardíaca e a força de contração. O

treinamento físico aumenta o tônus parassimpático, freando a freqüência cardíaca e diminuindo os riscos

de morte súbita. Já os controles do SNA simpático têm efeitos contrários (liberam catecolaminas nervosas).

O sistema endócrino libera catecolaminas humorais, com efeito semelhante ao do simpático.

Os efeitos simpáticos sobre os vasos coronarianos provoca vasodilatação. Nos vasos sanguíneos em geral,

aumenta a pressão arterial, e provoca vasoconstricção quando necessário. Há vasodilatação no músculo

esquelético. Os rins são menos ativados. O cérebro tem seu fluxo de sangue diminuído. O aumento de fluxo

absurdo para o músculo aumenta o stress de cisalhamento, estimulando a produção de NO, benéfica para o

sistema cardiovascular.

Exercício isotônico ou dinâmico é tudo em que se realiza contração muscular com movimento. A carga é

proporcional à massa muscular recrutada e à intensidade do esforço. Exercício isométrico ou estático é

uma contração muscular sem movimento, impondo mais carga pressórica do que volume ao ventrículo

esquerdo. Os músculos comprimem as artérias e capilares. Aumenta muito a pressão arterial.

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114 Cardiofisiologia

Exercício de resistência é uma combinação de ambas as formas. O exercício ideal é o aeróbio de todos os

braços e pernas, com trabalho muscular e flexibilidade. Um bom exemplo seria a natação.

A freqüência cardíaca é um indicador muito simples e de fácil detecção. Num gráfico com velocidade de

esteira rolante, à medida que o esforço físico aumenta a freqüência cardíaca aumenta também (reflete a

quantidade de trabalho que o coração tem de realizar para satisfazer as demandas aumentadas). Atinge-se

uma freqüência cardíaca máxima. Quem estiver com freqüência cardíaca menor para uma mesma carga de

trabalho estará mais bem condicionado.

O coração “se liga” pela comando central. Nos primeiros segundos de exercício, retira-se o parassimpático.

Depois, o simpático toma conta. Ativam-se receptores articulares e musculares. A freqüência cardíaca de

atletas fica entre 28 a 40 bpm, principalmente pela maior ação parassimpática. Em sedentários de meia-

idade, passa de 100 bpm.

A freqüência cardíaca diminui com a idade, e aumenta com temperatura e altitude. Tende a se estabilizar

em taxas constantes de esforço, como corrida leve, por exemplo. A freqüência cardíaca máxima pode ser

feita subtraindo a idade de 220? Não! Existem muitas variações na população. O ideal é realizar um teste

de esforço. A freqüência cardíaca elevada diminui pouco o tempo de sístole, enquanto diminui muito o

tempo de diástole. Um coronariopata, que enche as coronárias do VE na diástole, tem menor capacidade

de nutrir o coração durante o exercício. Se além de coronariopata o indivíduo for hipertenso, o coração fará

ainda mais força na sístole e esmagará ainda mais as coronárias; o efeito é ainda pior.

Na corrida, a freqüência cardíaca chega a 190 bpm e o débito cardíaco é de 24,7 L/min. No ciclismo, o

volume de ejeção é menor por se estar sentado. A freqüência cardíaca na natação é mais baixa, porém o

retorno venoso é maior.

Não se pode confundir a freqüência cardíaca de repouso com a de pré-exercício: existe uma resposta

antecipatória.

O volume de ejeção é determinado pelo volume de retorno venoso, pela complacência ventricular e pela

contratilidade ventricular. Quanto menor a pressão arterial (pós-carga), maior o volume de ejeção. Logo, o

volume de ejeção diminui em situações de hipertensão, tabagismo, etc. Esse volume aumenta com o

esforço, tornando-se constante após certo ponto, chegando até mesmo a cair. Logo, essa medida é menos

elástica que a freqüência cardíaca. Aliás, a freqüência cardíaca alta diminui o volume de ejeção, diminuindo

o débito cardíaco. Por isso, pessoas treinadas e condicionadas ejetam mais sangue a uma mesma

freqüência cardíaca que pessoas mal condicionadas.

É mais fácil aumentar o volume de sangue que retorna ao coração em exercícios de posição supina

(deitada) do que em posição ortostática (de pé). Os volumes de ejeção são maiores, portanto, em posição

supina. Nela, o mecanismo de Frank-Starling funciona mais precocemente, enquanto na posição ortostática

a contratilidade aumenta com cargas maiores. O débito cardíaco é um pouco maior deitado do que em pé,

mas aumenta mesmo com o exercício.

O débito cardíaco aumenta conforme a velocidade na esteira, por exemplo. O de sedentários aumenta

menos que o dos atletas treinados.

O controle metabólico faz com que sejamos inundados por metabólitos que estimulam a vasodilatação e

maior aporte de oxigênio para os músculos. A estimulação simpática gera vasodilatação generalizada,

exceto em músculos, coronárias e cérebro (a vasoconstricção aumenta a pressão arterial e a resistência

vascular).

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Anotações de Fisiologia 115

O cérebro envia estímulos para o núcleo do trato solitário, que estimula o núcleo ambíguo, retirando o

parassimpático e provocando uma resposta simpática (núcleo caudal estimulado inibe o rostral). O

aumento da pressão arterial ativa pressoreceptores que ativam o núcleo do trato solitário, que estimula o

núcleo ambíguo, estimulando o parassimpático. Estimula-se também o núcleo bulbar ventrolateral caudal,

que inibe o núcleo bulbar ventrolateral rostral, que inibiria a ativação simpática (esta aumenta, então).

Não devemos comer e depois fazer exercício, pois o fluxo sanguíneo na região esplâncnica está aumentado.

Com o exercício, o sangue é desviado para os músculos, provocando congestões.

Conceito de VO2 max = FC x VS x (diferença artéria-veia na concentração de oxigênio)

OBS.: exercícios dinâmicos progressivos, como corrida, ciclismo ou natação, diminuem o volume diastólico

e aumentam o volume sistólico. Isso porque, apesar da ativação simpática, a ativação de vasodilatadores

numa grande massa muscular envolvida diminui a resistência periférica. Exercícios isométricos provocam

aumento de pressão sistólica e diastólica; a resistência periférica aumenta.

Exercícios de braço e de perna aumentam a pressão de forma diferente, pois os de perna recrutam mais

musculatura. Logo, para um mesmo esforço e consumo de oxigênio, a pressão aumenta mais nos de braço

(porque há menos vasodilatação).

OBS.: o duplo produto equivale a FC x PA. Quanto maior o duplo produto, maior o consumo de oxigênio do

miocárdio. No ciclo de braços, aumenta mais que no de pernas. Por isso, deve-se trabalhar a musculatura

de braços e pernas no exercício, a fim de condicionar todos os membros.

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116 Cardiofisiologia

AULA 26 – GRANDES ARTÉRIAS

Professor: Roberto

Em tese, existe uma diferença entre artérias de condutância e artérias de resistência. As primeiras são as

que levam o sangue sem despesa de energia. A resistência surge com um diâmetro, aparentemente, abaixo

de 400 micras. Até este ponto, os vasos são somente condutores. Depois, há condutância e resistência.

Não se pode achar, porém, que vasos de condutância só servem para conduzir. Stephen Hales considerava

as grandes artérias verdadeiros “carrinhos de bombeiro”, enviando o líquido bombeado intermitentemente

de forma contínua. As artérias funcionam como um recipiente de ar do carrinho, chamado windkessel

(câmara de ar que amortece a pulsação). Elas promovem um amortecimento da onda sistólica, por terem

propriedades elásticas. Depois, a força elástica é liberada, mantendo o fluxo constante mesmo durante a

fase de diástole. A maioria dos capilares não resiste, a longo prazo, a um aumento muito grande na

pulsatilidade. No cérebro, por exemplo, há perda de cognição.

Se as artérias de condução fossem rígidas, o coração precisaria ter 12 kg para gerar inércia suficiente no

sangue bombeado. Para efeito de comparação, as artérias são cerca de oito vezes menos distensíveis que

as veias.

As artérias podem ser comparadas a uma bola de soprar envolta por uma rede de barbantes. Possuem

elastina e colágeno. A relação pressão-volume ou pressão-diâmetro é curvilínea, chegando a um ponto de

distensão máxima. O aumento de volume se dá quase que exclusivamente de forma transversal. Existe um

ponto de transição no qual a elastina já está totalmente esticada, e o colágeno começa a ser esticado.

A complacência arterial é a variação de volume em relação à variação de pressão. Uma artéria mais

complacente tem grandes variações de volume para menores variações de pressão. O aço é muito mais

elástico que a borracha, ou seja, a força necessária para deformá-lo é maior. A elasticidade das artérias é

dada pela grande organização das fibras elásticas paralelamente em sua parede. No entanto, há fadiga

como em todo stress cíclico. O fenômeno de envelhecimento de artérias pode ser comparado ao de

polímeros, como o náilon (“teoria da escova de dentes”). A elastina não é renovável, estando fraturada e

desorganizada em muitos pontos. A capacidade de distensão sofre prejuízo progressivo.

A elasticidade de uma artéria pode ser medida da seguinte forma:

A complacência é calculada da seguinte forma:

Suponhamos duas artérias A e B. A primeira tem uma variação de pressão de 120-80 mmHG, ou seja, 40

mHg. O volume aumenta em 10 unidades. Logo, a complacência calculada é de 10/40=0,25. Se a artéria B

tiver volume de 200 e passar para 210, numa mesma variação de pressão, sua complacência será 0,25

mmHG. A mais distensível delas, no entanto, é a artéria A (seu volume aumentou em 10%).

h = espessura

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Anotações de Fisiologia 117

A distensibilidade é uma característica intrínseca da artéria. Existe uma relação entre ela e a pressão.

Quanto maior a pressão aplicada, menor a distensibilidade (é como um crédito que vai sendo gasto). Por

isso, os hipertensos não têm artérias mais “duras”, apenas menos distensíveis por causa da pressão.

A rigidez arterial pode ser medida por uma curva entre pressão e volume naquela artéria. A sua inclinação

demonstra a complacência e a distensibilidade. Para cada batimento, é gerada uma curva. Para medir a

pressão e a variação de volume ao mesmo tempo, seria necessário um cateter dentro da aorta e um

ecocardiograma simultaneamente, do lado de fora. Foi desenvolvido o Ecotracking, no qual uma sonda de

Doppler é inserida próxima à artéria que se deseja estudar. Se posicionada de forma perpendicular ao vaso,

escutam-se os batimentos. Se posicionada de forma oblíqua, os sinais captados por efeito Doppler podem

ser postos num osciloscópio. São usadas duas sondas, uma para parede anterior e outra para parede

posterior. Um terceiro computador processa as informações, calculando os diâmetros a cada sístole e

diástole. A pressão é medida em uma carótida de rato, e o diâmetro é medido na outra carótida.

Quais as consequências do aumento da rigidez sobre a função arterial? Cada vez que o coração ejeta

sangue, teremos uma onda de fluxo que será precedida por uma onda de pressão, que aumenta o

diâmetro. Essa onda de pressão (de pulso) trafega ao longo da artéria muito mais rapidamente que o

sangue em si. Geralmente, varia de 5 m/s em pessoas jovens a 30 m/s em pessoas mais velhas (graças ao

rompimento das fibras elásticas). Essa onda de pressão bate em um determinado estreitamento do leito

arterial e volta, havendo uma interferência positiva com as ondas de pressão que ainda estão chegando.

Legenda: h é espessura, E é elasticidade, R é raio, d é

distensibilidade e ρ é viscosidade. A velocidade da onda de pulso é

inversamente proporcional à distensibilidade. As curvas de onda de

pressão podem ser alteradas por estenose dos vasos, persistência

do canal arterial ou por insuficiência aórtica.

Se a onda de pressão estiver rápida demais, ela baterá na válvula

aórtica enquanto estiver aberta, e retornará somando-se à pressão

sistólica. O resultado final é um efeito de aumento de pressão

arterial, comum em pessoas de mais idade.

A velocidade da onda de pulso era medida por um polígrafo indicando eletrocardiograma e um tonógrafo

que mostrava a pressão na carótida. Media-se, então, o tempo entre a onda R (contração ventricular) e a

carótida, chamado de tempo 1. Da onda R até o pulso femoral, é o tempo 2. Subtraindo um do outro,

encontra-se a diferença de tempo para a distância entre a carótida e a femoral.

Uma idéia inovadora gerou um aparelho que colocava sensores acústicos na carótida e na femoral,

realizando os cálculos para encontrar a distância e depois o tempo. Chama-se Complior. A VOP normal é de

cerca de 8,65 m/s numa pessoa de 30 anos com 120 mmHg de pressão sistólica.

A VOP é influenciada pela idade, pela raça (negros têm maior velocidade de pulso numa idade menor), pela

pressão arterial, pelo consumo de sal, pelo diabetes, por existência ou não de insuficiência renal, pela

freqüência cardíaca, por hipertrofia ventricular esquerda e por ácido úrico.

Aterosclerose é uma forma de arteriosclerose na qual existem placas de gordura no interior das artérias.

Mesmo em populações que não possuem aterosclerose há um aumento de velocidade de onda de pulso.

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118 Cardiofisiologia

Na visão do clinico, a onda de pressão tem uma porção incidente, outro “morro” para a sístole, uma

incisura dicrótica e o decaimento depois. Por representações gráficas, pode-se ver como o aumento da

velocidade aumenta, em alguns casos, a pressão arterial, por reflexões cada vez mais precoces e intensas.

De qualquer forma, a curva de pressão se eleva com a idade: a partir dos 50 anos, a pressão sistólica

aumenta e a diastólica diminui. Uma conseqüência nefasta dessa fato é que a pressão diastólica diminuída

vai alimentar menos as coronárias (lembrar da aula de irrigação), possibilitando isquemia parcial.

A descoberta do ponto de reflexão no caminhar da onda de pressão foi difícil, exigindo diversos cálculos.

Há populações que têm aumento de pressão arterial mais precoce, como os negros americanos. A

hipertensão sistolo-diastólica é mais comum em pessoas mais jovens; a forma mais comum é aquela que

aparece após os 50 anos de idade, a sistólica isolada (pelo aumento de rigidez arterial). É também a mais

letal. Sabe-se que o maior número de eventos cardiovasculares se dá em pessoas com pressão diastólica

baixa.

Por que não se utiliza a pressão de pulso como parâmetro substituo de rigidez arterial? A pressão de pulso

só começa a aumentar após os 50 anos de idade. A VOP começa a aumentar, no entanto, aos 25 anos de

idade. As fibras elásticas vão se rompendo progressivamente. Sabe-se que a pressão de pulso na aorta é

menor do que na periferia (graças à maior complacência), e essa diferença diminui com a idade. A aorta

começa a envelhecer antes da artéria braquial, por exemplo. Logo, nos membros o aumento de pressão de

pulso só vai ser percebido mais tarde.

O tonômetro de aplanação é um tipo de transdutor de pressão. Se aplanarmos a artéria, a pressão que a

empurra é exercida também sobre o transdutor. Mede-se a artéria radial, e há reconstrução do pulso

aórtico. São visualizados picos de sístole (P1) e de diástole (P2); esses picos são diferentes na radial e na

aorta. Nesta última, o pico de diástole é mais alto que o de sístole por causa da reflexão antes citada. O

aparelho é capaz de fazer o registro da radial e reconstruir o desenho da curva na aorta.

Os efeitos centrais de vasodilatadores são subestimados pela pressão braquial. A pressão sistólica não

diminui tanto quanto na aorta, onde há eliminação do componente refletido. Na artéria braquial esse

componente é apenas diminuído. Não houve dilatação coronária.

Essa redução da pressão refletida pelos vasodilatadores foi descrita ainda no século XIX, por um médico

inglês, usando um esfigmógrafo.

Nos jovens, a onda incidente aumenta mais que a refletida. Isso porque há um aumento da ejeção, do

débito cardíaco. A pseudo-hipertensão pode ser notada quando a pressão radial é alta e a aórtica não. Isso

é muito visto em jovens que têm a musculatura dos braços bastante desenvolvida.

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Anotações de Fisiologia 119

Parte 3

Pneumofisiologia

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120 Pneumofisiologia

AULA 27 – RESPIRAÇÃO

Professor: Roberto

respiração começa no nariz. Ao contrário do que muitos pensam, o nariz é extremamente

importante no sistema respiratório (a nasofaringe em geral): umedecimento, aquecimento e

filtração do ar. O desenho do nariz está muito relacionado ao fato de um animal ser macro ou

micrósmico, ou seja, se o seu olfato é muito ou pouco desenvolvido. O homem, por sua vez, é um ser

micrósmico. No entanto, possui uma boa memória olfativa, estando o rinencéfalo associado à afetividade

ou à repulsa; o olfato é muito influente no sistema límbico. A acomodação ocorre nos primeiros anos de

vida, quando é definido o que cheira bem ou mal.

As conchas nasais são responsáveis por formar turbilhões no nariz, aumentando a superfície de contato.

Isso permite que sintamos melhor os odores. Nossa capacidade de filtrar é muito boa, chegando a

partículas de 10 µm.

Acima das cordas vocais, estão as vias aéreas superiores. Abaixo delas, estão as vias aéreas inferiores.

Controla-se a passagem de ar e alimentos da seguinte forma: quando se inicia a deglutição, fecham-se as

cordas vocais e o esôfago se abre. Em crianças muito jovens e em idosos com doenças neurodegenerativas,

há perda desse reflexo, com risco de engasgamentos ou de pneumonia por aspiração de líquido. Uma das

manobras mais importantes da vida médica é a inserção de um tubo (o famoso “entubar”). Faz-se uso de

um laringoscópio, visualiza-se a laringe e o tubo é inserido.

Depois da nasofaringe, o ar desce até os pulmões. Funcionalmente, os dois pulmões são um só. Existem, da

traquéia até os alvéolos, 23 gerações de vias de condução. A árvore respiratória tem brônquios, que vão

até bronquíolos terminais. Depois, vemos bronquíolos respiratórios, indo até ductos alveolares e alvéolos

Até a décima sexta divisão, só se conduz ar (bronquíolos terminais). A partir dos bronquíolos respiratórios,

trocam-se os gases também.

Os pulmões são estruturas muito ativas do ponto de vista

humoral. Também sofrem ação do sistema nervoso

autônomo: o simpático faz broncodilatação, e o

parassimpático faz broncoconstricção. Para resolver

problemas com asma, utiliza-se um agonista adrenérgico

somado a um antagonista colinérgico. A asma não envolve

apenas o SNA, no entanto, trazendo também consigo

mediadores inflamatórios que agem nas células musculares

lisas dos brônquios, levando à constrição. Na anafilaxia

aguda, aliás, há grande broncoconstricção e broncospasmo.

Há inervação e irrigação ricas, assim como há muitos vasos linfáticos no pulmão.

Os alvéolos tendem a acumular água; a sua tensão superficial cria uma tendência ao colabamento do

alvéolo, diminuindo seu diâmetro. Lembrando da lei de Laplace: se o alvéolo for pequeno em diâmetro,

muito mais pressão será necessária para que ele seja distendido. As células do epitélio alveolar secretam

surfactante, que é rico em lecitinas. Elas diminuem a tensão superficial no alvéolo. Vale destacar que, antes

de seis meses de vida fetal, a criança não sobrevive ao nascimento, pois o epitélio pulmonar ainda não

A

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Anotações de Fisiologia 121

produz surfactante. Se o nascimento for necessário, dá-se cortisona à mãe. Esse medicamento chega ao

feto, estimulando a produção de surfactante precocemente

nos pulmões do feto.

Para que se encha o pulmão, o que é necessário? Simples:

criar um gradiente de pressão, o que vai gerar fluxo. O

gradiente é criado pela expansão da caixa torácica, o que

diminui a pressão dentro dos alvéolos e permite a entrada de

ar. OBS.: em radiografias, pede-se ao examinado que inspire

bastante e prenda a respiração, tornando a imagem torácica

mais transparente.

O volume do tórax pode ser aumentado longitudinalmente ou transversalmente. No primeiro caso, pelo

diafragma. No segundo caso, pelas contrações de intercostais externos (inspiração); o volume pode ser

diminuído pelos internos (expiração). O primeiro músculo respiratório que existe na sequência nariz-

pulmões é o levantador da asa do nariz, que se ativa em situações de insuficiência respiratória iminente

(pode ser provocada por pneumonia). Outros músculos respiratórios menos mencionados são os

esternoclidomastóideos e os escalenos, que levantam os gradis costais. Podem ser muito úteis em

situações de lesão do nervo frênico, ou seja, quando o diafragma não funciona.

A inspiração é um processo ativo, sempre. Envolve intercostais externos e diafragma. A expiração envolve

intercostais internos e musculatura abdominal (retos, oblíquos, transversos). Em condições normais, a

musculatura expiratória não é utilizada; apenas em caso de maior necessidade respiratória, como no

exercício. O recolhimento elástico do tórax pode ser suficiente para a expiração, portanto. A respiração dos

recém-nascidos se dá pelo uso da musculatura abdominal, enquanto no adulto é principalmente torácica.

Existe uma respiração conhecida como de Kussmaul. Indivíduos

com cetoacidose diabética têm essa respiração intensa, às vezes

por 24 horas. A mobilização da musculatura expiratória é tão

grande que ela sofre fadiga, e até rabdomiólise. O hálito é

cetônico.

As vias aéreas têm uma parte de condução e outra respiratória.

A respiração tem de controlar a resistência até a quinta geração,

onde ela é máxima. Decai, depois, até a décima geração. A

resistência é maior na expiração, justamente onde o efeito de

broncoconstricção é maior. Na asma leve, a dificuldade está

justamente na expiração (distúrbio obstrutivo expiratório). A

área de superfície dos alvéolos equivale à de uma quadra de

tênis; nos capilares pulmonares, há cerca de 70 mL. Logo, a

relação entre a área de troca gasosa e o volume de sangue

mostra quão eficientes são os pulmões. É praticamente um

alvéolo por hemácia.

Para que o ar entre e saia dos pulmões, há variações de pressão

intermitentes com o ciclo respiratório. Quando o tórax se

expande, a pressão dentro do alvéolo vai para -1 mmHg. Na

expiração, essa pressão vai para + 1 mmHg. No espaço pleural

(que existe, apesar de ser virtual), é gerado um gradiente de -8

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122 Pneumofisiologia

mmHg durante a inspiração, o que expande os pulmões e permite a entrada de quase 500 mL de ar. A

pressão transpulmonar é justamente isso: arrasta o pulmão junto à parede do tórax. Se o pulmão não

seguir o tórax durante a expansão, pode ser que haja pneumotórax. Neste caso, a pressão negativa

intrapleural já não existe, e o ar ocupa espaço dentro da cavidade torácica. O pulmão não consegue mais se

expandir.

Uma situação ainda mais grave que o pneumotórax: uma costela fraturada pode furar o pulmão, num corte

em forma de bisel. Durante a inspiração, o ar entra. Na expiração, no entanto, o ar não sai, como num

mecanismo de válvula. Assim, a cada ciclo respiratório, a pressão de ar do pneumotórax aumenta. Pode-se

resolver um problema de pneumotórax com uma drenagem em selo d’água: um tubo que vai do

pneumotórax a uma garrafa com água. Quando o ar sai, faz bolhas na garrafa, e não volta mais ar para

dentro da cavidade torácica.

Volumes e capacidades pulmonares

Existe um volume corrente (VT), no adulto, de 500 mL, na respiração normal. Se o indivíduo inspirar o

máximo possível, será utilizado o volume de reserva inspiratória (IRV). Se ele expirar o máximo possível,

será observado o volume de reserva expiratória (ERV). A capacidade inspiratória (IC), portanto, é a soma do

volume de reserva inspiratória com o volume corrente. A capacidade vital (VC) é a soma dos volumes de

reserva inspiratória, volume corrente e de reserva inspiratória. Depois que se expira o máximo, sobre um

volume residual (RV) de 1200 mL. Este serve para manter certa tensão nos pulmões, facilitando a próxima

expansão inspiratória. Além disso, quando se inspira um gás nocivo, ele é diluído no volume residual. Por

fim, esse volume de reserva permite um tempo para agir quando a via respiratória é obstruída, por

exemplo, num engasgamento.

Quando se diz que, nas vias

respiratórias, há uma parte que

conduz o ar e outra que participa

das trocas gasosas, devemos nos

lembrar do espaço morto. Dos 500

mL de volume corrente, cerca de

150 mL não estão sofrendo trocas,

pois estão passando pelas vias de

condução.

Calcula-se a ventilação alveolar da

seguinte forma:

Quanto maior o espaço morto, maior o esforço regulatório para manter a ventilação alveolar. Isso é

importante, por exemplo, em casos onde se usa tubos mais longos para respiração.

Os pulmões, assim como os vasos, possuem curvas pressão-volume. São muito mais elásticos na inspiração

do que na expiração. São duas curvas diferentes. A uma pressão transpulmonar, varia a expansibilidade dos

pulmões de acordo com o quadro clínico. Pulmões fibrosados se expandem menos quando a pressão de ar

aumenta dentro deles. Isso ocorre em tuberculose, fibrose cística ou mesmo idiopática. No enfisema

pulmonar, ocorre o contrário: os alvéolos têm suas paredes destruídas, e os remanescentes são

hiperestendidos (o raio-x fica ainda mais escuro). Não adianta expandir tanto, já que a superfície de troca

com o ar diminui.

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Anotações de Fisiologia 123

O fluxo expiratório no primeiro segundo é medido na

espirometria, sendo uma escala bastante sensível para

demonstrar o diâmetro brônquico, pela sua

contratilidade. Se a curva estiver deprimida, pode ser

causada por broncospasmo ou obstrução alveolar. O pior

dos dois é a obstrução alveolar, sem dúvida. A curva

continua do primeiro segundo (FEV1) até a capacidade

vital (FVC).

O coração e a circulação sistêmica estão em série com a

circulação pulmonar. No ventrículo direito, a pressão

sistólica é de 25 mmHg (menor que no VE), graças à

menor resistência da circulação pulmonar, conforme visto

antes. O volume por minuto (débito) nos pulmões é de cinco

litros, também. Além disso, a circulação pulmonar é feita pela

artéria pulmonar (levando sangue venoso para ser oxigenado)

e pela aorta, via artérias brônquicas (irrigando o parênquima

pulmonar). Existe uma mistura arteriovenosa provocada pela

circulação brônquica, de forma que o sangue que chega ao

átrio esquerdo não é 100% oxigenado.

As curvas de pressão na aorta e na artéria pulmonar são

parecidas, sendo proporcionalmente menores no último caso.

A artéria pulmonar leva sangue venoso até os capilares

pulmonares, a partir dos quais a pressão é quase igual à do

átrio esquerdo.

Em casos de falência do ventrículo esquerdo, onde há infarto

com choque, o ideal é saber a pressão do átrio esquerdo, para

descobrir se há pouco ou muito volume no ventrículo. Pode-se

medir a pressão no capilar pulmonar, e assim inferir a pressão

atrial esquerda. Utiliza-se um cateter de Swan-Ganz, para

chegar de uma veia até as artérias pulmonares. Delas, vai-se até

perto dos capilares. Neles, infla-se um balão, e é possível

descobrir a pressão dos capilares pulmonares. Se esta estiver

alta, há falta de volume sanguíneo no ventrículo, e vice-versa.

Uma característica interessante nos pulmões é que eles

possuem uma reserva funcional muito grande. É possível

aumentar muito o fluxo de sangue que passa por eles no exercício. Vale notar que o aumento do fluxo no

ápices, na porção média e nas bases é uma curva paralela à normal. Isso demonstra, conforme o gráfico,

que o aumento nos ápices é mais significativo, seguido pelo da porção média e pelo das bases.

Existem três zonas do pulmão, levando em conta o tipo de fluxo nos capilares, que pode ser contínuo

durante todo o ciclo sístolo-diastólico. Na base pulmonar é assim: a pressão capilar é sempre maior que a

pressão alveolar (zona 3). Na zona 2, o capilar se abre mais durante a sístole,e se fecha durante a diástole.

Na zona 1, no repouso, os capilares estão sempre fechados. Essa última zona é um reservatório para

exercício intenso ou para doenças que comprometam a função pulmonar. Estas zonas serão melhor vistas

na próxima aula.

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124 Pneumofisiologia

AULA 28 - CIRCULAÇÃO PULMONAR E RELAÇÃO VENTILAÇÃO/PERFUSÃO

Professora: Priscila

circulação pulmonar faz parte de um tópico dentro das circulações regionais. Vai do coração para

os pulmões e de volta ao coração. Para compreender qualquer circulação, temos de entender que

existe uma analogia hemodinâmica com a lei de Ohm:

O coração funciona como um gerador, acoplado em série a resistências dispostas, entre si, em paralelo. São

os diversos sistemas do organismo. A corrente seria o débito cardíaco. A circulação pulmonar, assim como

o conjunto dos sistemas, é disposta em série.

A sua função é o fornecimento de oxigênio aos tecidos e a remoção do gás carbônico neles gerado,

aparentemente. As trocas propriamente ditas, no entanto, ocorrem nos tecidos. Nos pulmões, as trocas são

entre o sangue e a atmosfera. A circulação pulmonar funciona a uma baixa pressão hidrostática (15 mmHg),

cerca de sete vezes mais baixa que a pressão arterial sistêmica. O trabalho cardíaco direito, então, é um

pouco menor, forçando menos a saída de líquidos dos capilares. Isso atrapalharia a hematose. Faz-se

necessária uma breve revisão sobre as forças de Starling:

A pressão hidrostática do capilar (10 mmHg) e

a coloidosmótica do interstício (20 mmHg)

forçam a saída de líquidos para o interstício. A

pressão hidrostática do interstício (10 a -15

mmHg) e a coloidosmótica capilar (25 mmHg)

trazem o líquido de volta para dentro dos

capilares. Essas duas últimas medidas fazem

com que o capilar tenda mais à reabsorção do

líquido, o que torna o volume do fluido

intersticial alveolar praticamente nulo. Os

alvéolos ficam “secos”, facilitando a hematose

(criam-se menos barreiras).

As forças alveolares não permitem que o

alvéolo se feche. Isso graças a uma pressão

negativa do espaço pleural, à pressão positiva

do ar intra-alveolar e à tensão superficial da água e do surfactante. Este último é um fosfolipídeo do

epitélio alveolar, secretado pelos pneumócitos tipo II. Observação: a água tem grande tensão superficial, e

o surfactante a diminui. No entanto, isso não é suficiente para permitir o colabamento do alvéolo.

Não temos água preenchendo todo o alvéolo, obviamente. Ela está numa fina camada em suas paredes,

não prejudicando a hematose. Em situações de congestão pulmonar, porém, os alvéolos são realmente

preenchidos.

Edema agudo de pulmão

Há um grande aumento da pressão arterial sistêmica, geralmente em pessoas hipertensas. Há, então, um

aumento retrógrado da pressão arterial esquerda. A pressão da artéria pulmonar e de todos os seus ramos

A

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Anotações de Fisiologia 125

arteriais aumenta, inclusive a dos capilares. Acima

de 25 mHg, a pressão supera a coloidosmótica

capilar, e há franco extravasamento de líquido

para o interstício e para os alvéolos. Forma-se uma

barreira entre o capilar e os gases alveolares,

dificultando ou impedindo a hematose.

Seu início é súbito. Causa tosse, pois surge líquido

nos pulmões. Há dispnéia, crepitações na ausculta

pulmonar e expectoração espumosa com sangue

(rosada). No raio-x, há menos transparência, pois

há menos ar e mais líquido. O tratamento com

pressão positiva é benéfico: pode ser por

ventiladores mecânicos (invasivos ou não). No

caso dos não invasivos, pode ser do tipo CPAP ou

BIPAP, sendo que este último aplica pressões diferentes

na inspiração e na expiração. A maior pressão nos

alvéolos (10 a 12 centímetros de água) diminui a

distância entre eles e os capilares, facilitando a

hematose.

Medida da pressão capilar pulmonar

Via cateter de Swan-Ganz. Inserido na veia jugular,

acompanha seu trajeto pela cava superior, chega ao AD,

depois ao VD e, por fim, à artéria pulmonar. A medida

na artéria pulmonar é direta; pode-se medir a parte

venosa dos capilares de forma indireta.

Relação ventilação/perfusão do pulmão

Em virtude da posição ereta humana, existem alterações regionais na ventilação e perfusão dos pulmões.

Em ortostase, o fluxo sanguíneo aumenta do ápice para a base, enquanto em posição supina estes efeitos

gravitacionais desaparecem (a distância entre as porções agora superiores e inferiores é bem menor). O

pulmão repousa sobre a pleura diafragmática e está pendido sob a pleura apical, estando os alvéolos

inferiores mais comprimidos. Estes alvéolos podem, portanto, se expandir mais que os da porção apical do

pulmão.

A pressão pleural é de -2,5 mmHg na porção mais inferior, e de -5 mmHg na porção apical.

As zonas de West são feitas considerando uma pessoa em posição ortostática; são delimitadas pela

perfusão de sangue, pressão intrapleural, entre outros fatores.

1. Zona 1

Está acima da raiz pulmonar. A pressão venosa é -5 mHg, a atrial direita é 5 mmHg, e a capilar é de 0

mmHg. A pressão alveolar é maior que a pressão da porção arterial dos capilares, que por sua vez é maior

que a pressão da porção venosa dos mesmos. Não há fluxo nos capilares dessa região, em condições de

repouso; a posição do hilo pulmonar é a principal razão para isso, visto que o sangue teria de vencer essa

diferença de altura. Os alvéolos estão mais distendidos. Em situações de exercício intenso ou de decúbito,

Page 126: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

126 Pneumofisiologia

por exemplo, os capilares se abrem. A nutrição nunca é afetada, graças à perfusão das artérias brônquicas,

não influenciadas por este mecanismo.

2. Zona 2

Está situada ao nível da raiz da artéria pulmonar. A pressão capilar arterial se sobrepõe à alveolar, mas

durante a inspiração o alvéolo tende a ter a pressão aumentada e a colapsar o capilar. Logo, o fluxo capilar

é intermitente. A pressão capilar venosa é menor que ambas.

3. Zona 3

Abaixo da raiz da artéria pulmonar. A pressão capilar arterial e venosa é maior que a alveolar sempre, pois

há um “favorecimento” gravitacional; isso mantém os capilares sempre abertos.

O tipo de decúbito influencia a

perfusão dos pulmões. Na

anamnese, é muitas vezes possível

indicar doenças pela preferência de

um lado para se deitar: as trocas

gasosas são preferencialmente

transferidas para o pulmão em

melhores condições. O lado

escolhido varia conforme as

condições de ventilação e de

perfusão, não sendo o diagnóstico

tão simples.

A base é proporcionalmente muito

mais perfundida do que ventilada,

ocorrendo o oposto no ápice (muito

mais ventilado do que perfundido).

Diante dos exercícios, a pessoa faz respiração forçada, aumentando a pressão alveolar. A pressão arterial

pulmonar também aumenta. Logo, há uma compensação para evitar hipertensão pulmonar. A circulação

pulmonar, assim como a do corpo como um todo, aumenta de quatro a oito vezes, dependendo do

condicionamento físico. Não existem mecanismos regulatórios. Com um aumento da demanda, aumenta

do débito cardíaco esquerdo e direito, e também a pressão arterial pulmonar. Como esta última é maior

que o aumento do débito cardíaco direito, é necessária uma certa complacência da rede pulmonar arterial.

Verificamos o fato numa curva ∆P/∆V.

Nos aumentos iniciais de volume e fluxo, ocorrem

pequenos aumentos de pressão. Depois, aumentos

pequenos de volume requerem grandes aumentos de

pressão, à medida que a curva cresce.

No exercício, há maior recrutamento de vasos no ápice

pulmonar, aumentando a superfície para hematose.

Também aumenta a ventilação pulmonar na base e no

ápice. Como a ventilação pulmonar e a perfusão aumentam

juntas, as diferenças entre as relações do ápice e da base

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Anotações de Fisiologia 127

diminuem, aproximando-se. A rede arterial pulmonar recebe inervação simpática, mas os mediadores

simpáticos (adrenalina e noradrenalina) são pouco ativos nesses vasos. O que mais determina o tônus

vascular é mesmo a pressão de oxigênio nos alvéolos. Ocorre o inverso do que existe na circulação

sistêmica: o oxigênio é vasodilatador nos pulmões, e a hipóxia é vasoconstritora.

Hipóxia localizada

Provoca vasoconstrição local (protegendo o pulmão) e direcionamento do fluxo para as áreas mais

ventiladas. Se a hipóxia for difusa, no entanto, o mecanismo compensatório simplesmente falha.

Hipóxia generalizada

Provoca vasoconstrição generalizada e, por conseqüência, hipertensão pulmonar.

Em posição ereta, não há ventilação nem perfusão uniformes, o que foi confirmado por estudos utilizando

gases nobres. A perfusão depende da gravidade, e a ventilação depende do peso dos pulmões sobre a

pleura.

A ventilação alveolar pode ser calculada conforme mostrado na aula passada. É de cerca de 4200 mL por

minuto. Como o débito cardíaco é de cerca de 4900 mL, a relação ventilação-perfusão é de cerca de 0,85.

Alterações da ventilação-perfusão podem ocorre em diversos processos patológicos. O efeito espaço-morto

mostra que uma área é ventilada e não-perfundida; o efeito shunt mostra que uma área é perfundida, mas

não é ventilada. Numa embolia pulmonar, por exemplo por trombo, há obstrução dos vasos e da perfusão.

Criam-se espaços sem perfusão, ou seja, há efeito “espaço-morto”. Em casos de DPOC, bronquite ou de

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128 Pneumofisiologia

obstrução de vias aéreas, há perfusão sem ventilação, o que se conhece como efeito shunt, ilustrado na

figura abaixo:

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Anotações de Fisiologia 129

AULA 29 – TROCA E TRANSPORTE DE GASES

Professora: Ivanita

gora, o foco está apenas no processo de trocas gasosas. O ar que respiramos é uma mistura de

vários gases, havendo cerca de 21% de oxigênio e 79% de nitrogênio. A pressão relativa dos gases

mantém uma mesma proporção, não importando a altitude da atmosfera em que o homem esteja.

A 760 mmHg, há uma pressão de oxigênio de cerca de 160 mmHg. De gás carbônico, cerca de 0,3 mmHg.

De água (vapor), 5,7 mmHg. Por fim, a pressão parcial de nitrogênio é de 594 mmHg. Quando se inspira, a

pressão de oxigênio cai, dentro dos alvéolos, para algo em torno de 100, e na expiração sobre um pouco,

para 116 mmHg. Esse retorno se deve à mistura do ar alveolar com o do espaço morto, que ainda tem uma

pressão de oxigênio alta.

A cada incursão e excursão respiratória, em repouso,

movimentamos cerca de 500 mL. Como 150 mL ficam

no espaço morto, parte do ar do alvéolo pode se

misturar a esse ar mais oxigenado durante a

expiração.

O sangue que chega ao alvéolo tem 40 mmHg de

oxigênio, e 46 mmHg de gás carbônico. O sangue já

arterializado tem uma pressão de oxigênio bem

próxima de 100 mmHg, e a de gás carbônico em torno

de 40 mmHg. Uma parte do sangue venoso (cerca de

2%), no entanto, não sofre trocas, unindo-se ao

sangue já oxigenado. O sangue que vem dos

bronquíolos e das veias de Tebesius (que

desembocam diretamente no ventrículo esquerdo) é

um bom exemplo. O sangue arterial que vai aos

grandes vasos já não tem 100 mHg de oxigênio, portanto, e sim 97 mmHg.

A difusão dos gases é feita pela passagem através de várias camadas. A primeira é de água, a segunda de

células do epitélio alveolar, a terceira é o interstício, a quarta é o endotélio dos capilares e a quinta é o

plasma. Por fim, os gases adentram as hemácias.

Como se calcula a velocidade de

difusão dos gases?

Precisamos lembrar da Lei de Fick,

em que a velocidade de difusão dos

gases é diretamente proporcional à

área de troca (próxima à de uma sala

grande), multiplicada por uma

constante de difusão (D) e pela

diferença de pressão entre os dois

meios. É inversamente proporcional

à espessura da parede. Essa

A

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130 Pneumofisiologia

constante é proporcional à solubilidade de um gás dividida pela raiz quadrada do peso molecular do

mesmo.

Na película de água, o oxigênio e o gás carbônico se difundem mal, pois são pouco solúveis nesse meio. Nas

membranas celulares, porém, a solubilidade é bem maior. A solubilidade do oxigênio em solução aquosa é

dez vezes menor que a do gás carbônico; os valores, no entanto, são parecidos em meio lipídico. Isso serve

como um equilíbrio ao fato de o peso molecular do gás carbônico ser maior que o do oxigênio. No fim das

contas, a velocidade de difusão dos dois gases é muito parecida, pois os meios de solubilização são

diferentes, assim como as diferenças de pressão entre os meios.

Após atravessar as barreiras, o oxigênio pode ser solubilizado no plasma ou ser transportado via hemácias.

A primeira opção não é boa, porque este gás não é muito solúvel em meio aquoso. Podemos utilizar a lei de

Henry, para determinar essa solubilidade:

Assim, a quantidade de um gás dissolvido em solução é igual ao produto da solubilidade desse gás

multiplicada pela pressão que ele exerce na solução, ou seja, a quantidade de choques aleatórios que as

moléculas deste gás geram no sangue. A pressão é determinada pela quantidade, a temperatura, a região,

entre outros. Os outros fatores são mais constantes, mas a pressão envolve principalmente o número de

moléculas que se chocam. A solubilidade do oxigênio é baixa em soluções aquosas (0,003 mL de O2/

mmHg/ dL de sangue). Logo, em cada decilitro de sangue, num mmHg de pressão, haverá 0,003 mL de

oxigênio livres, sem estar ligados à hemoglobina.

Se o débito cardíaco é de cinco litros de sangue num minuto, a quantidade de oxigênio livre no sangue seria

de 15 mL nesse mesmo intervalo de tempo. Essa quantidade é pequena para o organismo, já que o

consumo de oxigênio por minuto em repouso gira em torno de 200 mL. É o mesmo valor de gás carbônico

produzido (lembrar que este gás também é transportado por hemácias). Logo, é impossível depender

apenas do oxigênio solubilizado no sangue. Precisamos de hemoglobina e de hemácias.

Nas hemácias, o que define a ligação de

oxigênio? Cada molécula de hemoglobina

possui quatro grupos porfirínicos, onde

quatro moléculas de oxigênio se ligam.

Quando a primeira molécula se liga, cria

maior afinidade pela segunda, sendo

depois criada ainda mais afinidade,

sucessivamente. A curva de saturação da

hemoglobina em função da pressão

parcial de oxigênio tem formato

sigmoidal graças a isso.

A pressão de oxigênio não pode passar

de um certo ponto, pois a quantidade das

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Anotações de Fisiologia 131

moléculas ligadas à hemoglobina estaciona. Por que, então, há terapia hiperbárica? Para agir, por exemplo,

em situações de intoxicação por monóxido de carbono, em que há competição pela hemoglobina, ou em

grandes altitudes. Quanto do oxigênio é carreado por esse meio?

Temos, no sangue, 15 gramas de Hb por decilitro de sangue. Cada grama de hemoglobina carreia, segundo

cálculos estequiométricos de peso molecular, aproximadamente 1,39 mL de oxigênio. Logo, um litro de

sangue carrega, aproximadamente, 200 mL de oxigênio. Comparando com um débito cardíaco de cinco

litros por minutos, haveria 1000 mL de oxigênio a cada minuto, carreado pela hemoglobina. Essa

quantidade é, agora sim, mais que o suficiente para o consumo humano. Tal valor se deve a uma saturação

de 100% de hemoglobina, após as trocas nos pulmões.

Quando o sangue passa pelos tecidos, estes

removem, em média, uma molécula de oxigênio.

Assim, o sangue venoso que retorna ao coração e

vai aos pulmões tem 40 mmHg de oxigênio, o que

equivale a 75% de saturação. O P50 é a pressão

parcial de oxigênio na qual há 50% de saturação

de hemoglobina. Do ponto de vista fisiológico,

situações em que há menos de 50% de saturação

são críticas e demandam liberação mais fácil das

moléculas que restam ligadas à Hb.

Essa curva, portanto, pode ser alterada conforme

a necessidade do organismo durante o exercício

físico. Ela é deslocada para a direita, diminuindo

a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio. Isso sob influência de aumentos de temperatura, da

concentração de íons H+ (pH mais ácido), da pressão de CO2 e da concentração de 2,3-BPG. Situações

inversas, como alcalose, hipocapnia e diminuição de temperatura deslocam a curva para a esquerda,

aumentando a afinidade da Hb

pelo oxigênio.

A hemoglobina fetal (HbF) troca

cadeias α por γ, que não sofrem

influências do 2,3-BPG. Logo, sua

afinidade pelo oxigênio nunca é

inibida, sendo sempre alta.

Os tecidos liberam gás carbônico.

Parte dele é transportada direto

pelo sangue (10%). Nessa parte,

5% vão dissolvidos como CO2, 5%

vão na forma de bicarbonato

dissolvido e um percentual

pequeno (1%)forma compostos

carbamínicos. 89% vão para dentro

da hemácia, formando bicarbonato

sob ação da anidrase carbônica

(63%), ficando na forma livre de

CO2 (5%) ou unindo-se à

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132 Pneumofisiologia

hemoglobina em um sítio diferente do oxigênio(21%). Essa ligação do gás carbônico à Hb facilita a saída de

oxigênio. Nas hemácias, há troca dos íons bicarbonato (que saem) por cloreto (que entra). Chegando aos

pulmões, forma-se CO2 novamente pela ação da anidrase carbônica, e o mecanismo de troca pelo cloreto

se inverte.

Numa curva do conteúdo de CO2 em função de sua

pressão parcial, vemos que o bicarbonato é muito

mais presente que seu conteúdo dissolvido. Essa

curva não é sigmoidal, nem é uma reta. Os compostos

carbamínicos são uma parcela muito pequena.

A afirmação de que o sangue arterial é rico em

oxigênio e pobre em gás carbônico é um tanto

enganosa. A pressão parcial não significa a mesma

coisa que o conteúdo. Na verdade, há maior conteúdo

de CO2 que de O2. O conteúdo de oxigênio no sangue

arterial é de 20%, e o de CO2 é de 40% do volume.

Logo, o sangue arterial tem mais oxigênio que o

venoso.

Também existe uma curva de saturação da

hemoglobina por CO2, diferente daquela feita para o

oxigênio. Seu desenho é linear, e diretamente

relacionado à pCO2. Gás carbônico e oxigênio ligam-

se à hemoglobina em sítios diferentes, mas ainda

assim há diferenças entre a molécula oxigenada e

desoxigenada no que diz respeito à afinidade pelo

CO2, sendo que o sangue desoxigenado tem mais

afinidade. Chamamos isso de efeito Haldane.

Alguns dados sobre o gás carbônico:

Solubilidade do CO2 = 0,06

Lei de Henry para CO2: Quantidade = 40 x 0,06 = 2,4

PARTE 2 - HIPÓXIA

Professora: Ivanita

Hipóxia é uma deficiência de oxigênio nos tecidos, a qual provoca déficit da função. As causas que levam à

hipóxia podem ser divididas em diversas categorias. As categorias fisiológicas de hipóxia são divididas em

função das causas:

1. Anêmica. Há comprometimento da oferta de oxigênio aos tecidos, secundário à incapacidade de

carreação deste gás pelo sangue. Logo, a anemia, em que há déficit na produção de hemoglobina, é

uma boa causa. As hemorragias de grande porte e o envenenamento por monóxido de carbono são

outros fatores. No segundo caso, o CO se liga à hemoglobina no mesmo sítio do oxigênio,

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Anotações de Fisiologia 133

saturando-a a partir de baixíssimas concentrações.

A pressão de oxigênio no sangue está normal em

todas essas situações;

2. Estagnante. Redução local ou mesmo geral do fluxo

sanguíneo. Uma deficiência geral da circulação se

deve a um baixo débito cardíaco, ou a um espasmo

arterial (levando a infarto da região, como no

miocárdio; o comprometimento pode ser geral). A

pressão de oxigênio no sangue também está

normal.

3. Histotóxica. A pressão de oxigênio no sangue está normal, mas as células são incapazes de utilizá-

lo. A causa mais comum é a inibição das enzimas da cadeia respiratória, como na intoxicação com

CO ou com cianeto. O CO pode inibir a ligação da Hb com oxigênio, ou inibir a cadeia respiratória se

estiver em maiores quantidades.

Já o cianeto se liga à citocromo oxidase, impedindo a respiração aeróbia. Se ele for detectado

precocemente, pode-se aumentar a quantidade de meta-hemoglobina (hemoglobina com Fe3+, que

tem maior afinidade pelo cianeto, formando ciano-meta-hemoglobina). Aumenta-se a oxidação da

hemoglobina com nitrito/nitrato, e o efeito é menos tóxico que o do cianeto: transforma-se uma

hipóxia histotóxica em hipóxia anêmica.

4. Hipóxica. É a única das quatro categorias em que a hipóxia é decorrente de uma redução da

pressão de oxigênio no sangue. Se o indivíduo estiver ao nível do mar, será causada por causa de

defeitos nas trocas gasosas (pulmonares); a grandes altitudes, também poderá ser por rarefação do

ar. As causas pulmonares podem ser problemas no centro respiratório do bulbo, pneumonia,

pneumotórax, entre outros.

A queda de pressão pode ser gradual ou abrupta, como numa despressurização de cabine de avião:

dentro de 15 a 45 segundos, há perda imediata de consciência, seguida de morte cerebral em

poucos minutos. Já entre 3 a 4 mil metros, há cefaléia, fadiga e apatia dentro de poucas horas.

A cabine do piloto é a que deve, prioritariamente, estar pressurizada. A 2500 metros, sem pressurização, a

visão está a 83%; a memória, a 97%. A 5000 metros, esses níveis caem para abaixo da metade.

Adaptação à altitude

a) Ventilação, que aumenta numa escala temporal entre 7 a 10 dias. O controle respiratório passa do

CO2 para o O2 (dos quimiorreceptores centrais para os periféricos). Ao nível do mar, a pressão de

oxigênio nos alvéolos é de 100 mmHg, enquanto a 3000 m é de 50 mmHg. Os quimiorreceptores

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134 Pneumofisiologia

periféricos detectam a pO2 baixa e disparam, produzindo taquipnéia com hiperventilação. A

expiração de CO2 aumenta, de forma que a pCO2 diminui no sangue. Os quimiorreceptores centrais,

geralmente ativados pelo aumento da pressão de CO2, inativam-se ou até são inibidos. Assim, há

diminuição da taquipnéia e da ventilação. A alcalose do organismo não é generalizada (graças a

tampões plasmáticos), mas está presente no líquido cefalorraquidiano. Este libera bicarbonato para

o meio externo, corrigindo o pH, de forma que o quimiorreceptor central deixa de ser inibido.

Assim, apenas a resposta dos quimiorreceptores periféricos está ativa.

b) Hematócrito, que aumenta dentro de 7 dias. O volume plasmático diminui, inicialmente, e depois a

secreção de eritropoietina aumenta. Ambos têm a função de aumentar o hematócrito, ou seja, o

percentual de hemácias em relação ao volume de sangue. No primeiro mecanismo, há uma inibição

da secreção de hormônio antidiurético (ADH). No segundo, o sangue passa pelos capilares

tubulares e a baixa pressão de oxigênio estimula as células endoteliais do túbulos a produzir

eritropoietina, que induz a produção de mais eritrócitos. O resultado final é que mais hemácias

sempre estarão disponíveis para aporte de oxigênio aos tecidos.

O problema é que a viscosidade do sangue aumenta, o que aumenta a resistência periférica e, por

conseqüência, diminui o débito cardíaco. Felizmente, o débito sistólico e a freqüência cardíaca são

agudamente ativados por quimiorreceptores (dentro de 24 horas), aumentando o débito cardíaco.

c) Afinidade da hemoglobina (P50) ao oxigênio, que diminui dentro de 24 horas. O P50 é um índice que

demonstra a concentração ou a dose efetiva necessária para produzir 50% da resposta máxima,

avaliando assim a sensibilidade de algo em relação ao seu ligante. O P50 da hemoglobina, então,

seria a pressão de O2 na qual 50% da hemoglobina estaria ligada. Um maior P50 demonstra, então,

diminuição da afinidade da hemoglobina ao O2, pois uma maior pressão do gás seria necessária.

Uma menor afinidade ao oxigênio é causado por

aumento da pressão de CO2, diminuição do pH,

aumento da temperatura e aumento do 2,3-BPG.

Em termos de afinidade, a grandes altitudes, a

curva de afinidade será deslocada para a esquerda,

pois a pressão de CO2 diminui (em função da

taquipnéia). A hemoglobina prende mais oxigênio a

uma mesma pressão. No tecido, isso pode não ser

bom, pois haverá maior dificuldade de liberação de

O2. Nessas circunstâncias, aumenta a concentração

de 2,3-BPG, que compensa o desvio da curva,

equilibrando-a.

d) Densidade capilar aumenta.

Quais os males das grandes altitudes?

1. Doença aguda das montanhas. É a mais comum e a menos perigosa. Inclui dor de cabeça, insônia,

perda de apetite, náusea. Os sintomas aparecem logo após a chegada a grandes altitudes, e

desaparecem após um ou dois dias.

2. Edema pulmonar ou cerebral agudo. Os vasos sanguíneos cerebrais respondem à hipóxia fazendo

vasodilatação, o que provoca extravasamento de liquido e edema. Já os vasos pulmonares se

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Anotações de Fisiologia 135

contraem, evitando perda de O2 para o alvéolo. Isso pode levar a uma intensa hipertensão

pulmonar, provocando edema pulmonar agudo.

Cianose é quando se tem uma coloração azulada nas extremidades dos membros. Acontece em situações

de hemoglobina com baixas concentrações de oxigênio. No frio, por exemplo, o sangue passa mais devagar

pelos vasos, e os tecidos removem mais oxigênio do sangue, que fica com a hemoglobina pouco oxigenada.

Reduções muito grandes de temperatura aumentam muito a afinidade da hemoglobina ao CO2, de forma

que não há cianose. Os tecidos não conseguem remover oxigênio do sangue.

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136 Pneumofisiologia

AULA 30 – CONTROLE NEURAL DA RESPIRAÇÃO

Professora: Alessandra

omo o bulbo controla a parte involuntária da respiração, ou seja, 95% das vezes em que respiramos?

Os outros 5% são voluntários, dedicando-se a fonação, exercícios físicos, intrumentos de sopro,

entre outras atividades. Graças ao mecanismo automático de respiração, não conseguimos nos

asfixiar apenas por prender a respiração. O controle voluntário parte do córtex cerebral, via trato córtico-

espinhal. Podemos fazer hiper ou hipoventilação voluntária, mas sem alterar muito os níveis de pH. Senão,

o controle involuntário assume o comando. O controle involuntário nos mantém respirando a maior parte

do tempo, estando localizado na ponte e bulbo.

Respiramos para manter níveis ótimos de pO2 e

pCO2, mantendo constante o pH do organismo.

Isso é importante para a homeostase, inclusive do

cérebro. O oxigênio carreado via hemácias será

utilizado no metabolismo oxidativo: a regulação

estará no tronco cerebral (bulbo e ponte).

Os núcleos bulbares controlam a inspiração e a

expiração forçada. Há o grupo dorsal, no núcleo

do trato solitário, que basicamente controla o

processo de inspiração via ativação do nervo

frênico. O grupo ventral, no núcleo ambiguus,

possui núcleos inspiratórios e expiratórios. Na

ponte, temos o centro pneumotáxico, que faz as

interrupções da inspiração quando os pulmões

estiverem preenchidos. Ele mantém a freqüência

respiratória.

Paramos a inspiração por outro mecanismo, via

receptores de estiramento do parênquima

pulmonar (reflexo de Hering-Breuer). Isso é

importante em insuflações forçadas e,

principalmente, em crianças.

A pCO2 arterial é de cerca de 40 mmHg. Se ela

aumenta, a hipercapnia é corrigida pelo aumento

da ventilação pulmonar. Em indivíduos acordados,

essa resposta é muito mais ativa, ao contrário de

pessoas dormindo, ou sob efeito de barbitúricos e

anestésicos, ou com DPOC. Por isso a gasometria

do indivíduo tem de ser monitorada durante cirurgias. Na DPOC, a inspiração é forçada, e nesse caso a

expiração também, o que pode levar à morte. Indivíduos com acidose metabólica (em decorrência de

cirrose ou de diabetes, por exemplo) têm grande resposta à hipercapnia.

Assim como o coração tem seus marcapassos cardíacos, existe na região do bulbo um grupamento

neuronal que funciona como marcapasso. O complexo pré-Bötzinger fica bem próximo do núcleo dorsal, e

C

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Anotações de Fisiologia 137

é especulado como um lugar de células marcapasso para os impulsos inspiratórios. Esses impulsos são

enviados às células do grupo respiratório dorsal (no NTS). Essa ritmicidade pode ser alterada em diversas

situações:

O núcleo respiratório dorsal recebe impulsos de quimiorreceptores, aumentando ou diminuindo a

ritmicidade do diafragma e, por conseqüência, a ventilação. Também há impulsos dos barorreceptores,

receptores de irritação (detectam a inalação de poeira ou fumaça, provocando tosse ou espirro, ativados

pela musculatura expiratória) e outros receptores do pulmão. O reflexo de irritação está presente nas vias

respiratórias superiores e inferiores. A inspiração e a expiração têm de funcionar harmonicamente, a fim de

gerar um jato potente de ar: primeiro uma grande inspiração, depois uma expiração forte.

O bocejo nada mais é do que um aumento da ventilação após respiração lenta ou insuficiente.

Os receptores J ficam nos capilares justapulmonares, sendo ativados em caso de aumento de volume

intersticial (edema pulmonar). Ativa-se o grupo dorsal, aumentando a ventilação para tentar compensar a

diminuição de trocas gasosas.

O diafragma não é ativado rapidamente, e sim gradativamente. Isso tanto no início quanto no final da

respiração, mantendo a harmonia do processo. Chamamos isso de sinal inspiratório em rampa. Depois, há

uma pequena parada e um posterior desligamento do diafragma, permitindo expiração. Há também a

retração elástica da parede torácica e dos pulmões. Se controlamos o ponto de desligamento da rampa, via

centro pneumotáxico, a freqüência respiratória pode ser aumentada ou diminuída segundo o grau de

ativação do mesmo. Se for ativado anteriormente, a inspiração é mais rápida, com taquipnéia.

Novamente, o grupo dorsal

controla a inspiração, enquanto o

centro pneumotáxico controla a

ritmicidade da respiração.

O centro apnêustico não é muito

compreendido. O que se sabe é

que ele envia sinais ao grupo

dorsal para impedir ou retardar o

desligamento do sinal inspiratório

em rampa. Assim, controla-se a

intensidade da respiração.

Defeitos nesse centro podem

provocar momentos de apnéia, ou

respiração apnêustica: longos

períodos de inspiração sucedidos

por breves períodos de expiração.

O grupo ventral de neurônios possui uma parte caudal (realiza expiração, com musculaturas abdominal e

intercostal), uma rostral (realiza inspiração, com o diafragma) e o complexo de Bötzinger (realiza

expiração). A expiração tem de ser forçada para esse grupo agir; no repouso, estará inativo. Portanto, na

respiração de repouso, utiliza-se o grupamento dorsal (inspiração) apenas, sendo a expiração por

desativação diafragmática e retração elástica.

Na DPOC, em reflexos de espirro, tosse, na manobra de Valsalva ou em atividade física, há ativação das

áreas ventral, caudal e do complexo de Bötzinger, pois há também a expiração forçada. A manobra de

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138 Pneumofisiologia

Valsalva é a tentativa de expiração com a glote fechada. Ela serve para que a inspiração, após seu

acontecimento, aumente o retorno venoso.

Se os receptores de estiramento dos pulmões forem ativados por uma grande insuflação, eles enviarão

impulsos que desligarão o grupamento dorsal. O reflexo, chamado de Hering-Breuer, é mais presente em

crianças.

O reflexo do mergulho provoca o fechamento brusco da glote, quando receptores faciais ou nasais são

estimulados com água fria.

Os quimiorreceptores centrais, na zona quimiossensível do bulbo, são mais sensíveis às concentrações

hidrogeniônicas no líquor. O CO2 gera H2CO3, e depois H+. Aumentos de pCO2 tendem a reduzir o pH e

ativar as células quimiossensíveis centrais. Essa condição faz com que os quimiorreceptores enviem

impulsos aos grupamentos dorsal e ventral, aumentando a ativação dos músculos da respiração e, por fim,

a capacidade respiratória.

Os quimiorreceptores periféricos são mais sensíveis ao O2, trazido até eles pela artéria glômica. Podem ser

os aórticos ou os carotídeos. O tipo aórtico envia informações ao centro respiratório via nervo vago (NC X),

e o tipo carotídeo, via glossofaríngeo (NC IX). A resposta é semelhante à dos centrais.

Situações de Altitude

Em grandes altitudes, reduz-se a pO2, provocando hipoxemia. Há menos diferença de pressão, o que

diminui o fluxo de oxigênio para os pulmões. A resposta ventilatória é dada por quimiorreceptores

periféricos, reduzindo a pCO2. Isso acaba por provocar alcalose respiratória, o que diminui a capacidade

dos quimiorreceptores centrais de aumentar a ventilação. Em resumo, o aparelho respiratório ainda não

está regulado para essa situação. Após uma semana de aclimatação, há regulação renal, que elimina mais

íons bicarbonato e normaliza o pH sanguíneo, além do fato de esses íons atravessarem a barreira

hematoencefálica lentamente. Assim, o pH não é mais um fator antagônico no aumento da ventilação. Os

quimiorreceptores carotídeos aumentam a sensibilidade à pO2 arterial.

Uma permanência mais prolongada em grandes altitudes torna a hematopoiese de hemácias crônica.

Respiração periódica, ou de Cheyne-Stokes

Ocorre em grandes altitudes, uso de morfina, overdose de narcóticos, uso de drogas hipnóticas. O ciclo

respiratório é alterado, com paradas regulares de apnéia. As durações também são diferentes, com início

leve e progressão mais profunda e intensa. Causado por meningites, tumores e traumas na região do

tronco encefálico.

O indivíduo respira muito intensamente, diminuindo

bastante a pCO2. No entanto, o centro respiratório não

diminui os estímulos inspiratórios de imediato, permitindo

que surja uma leve alcalose respiratória. Logo, faz-se

necessária uma diminuição no ritmo respiratório, que

também é sentida muito lentamente, levando a uma

posterior acidose respiratória e taquipnéia.

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Anotações de Fisiologia 139

Ritmo de Cantani

Grandes inspirações e expirações profundas e ruidosas, sem fases de

apnéia. Se houver pausas de apnéia, é o ritmo de Kussmaul.

Respiração Suspirosa

A respiração é entrecortada por suspiros freqüentes, promovendo

desconforto e fadiga ao paciente. Tipicamente associada ao stress e

outros conflitos emocionais.

Síndrome do pânico

Algumas pessoas com esse quadro hiperventilam, atingindo um estado de alcalose. O cálcio ionizado

aumenta de concentração, estando menos fixado a proteínas plasmáticas. A pessoa atingida começa a

entrar em tetania, o que pode ser confundido, inclusive, com epilepsia. Pode-se resolver a situação com um

pequeno saco de papel, dentro do qual se respira: ali, a pressão de CO2 é maior, evitando elevação do pH.

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140 Anotações de Fisiologia

Parte 4

Nefrofisiologia

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Anotações de Fisiologia 141

AULA 31 – INTRODUÇÃO AO SISTEMA RENAL

Professor: Roberto

ma pergunta básica feita pelos primeiros fisiologistas era: se retirarmos algum órgão, a sua falta

matará o organismo? Se os dois rins fossem retirados, o animal realmente morria. A fisiologia

pensa dessa forma. Claude-Bernard, considerado o “fundador” da Fisiologia, afirmava que existia

um meio interno e outro externo. O segundo muda muito, conforme o local em que o organismo estivesse.

Essa mudança constante ameaça o meio interno o tempo todo. O que realmente importa é que esse meio

interno não pode mudar.

As reações biológicas ocorrem dentro de limites estreitos, sendo que serão comprometidas caso haja

variações grandes de temperatura, de concentrações iônicas, de pH. A fisiologia, portanto, é o estudo dos

mecanismos que mantêm o meio interior estável. A todo momento, estamos sujeitos a mudanças, que são

atenuadas ou eliminadas dentro de faixas bem reguladas.

Para termos uma idéia da importância dos rins: em perdas muito grandes da função, os indivíduos morrem

de hiperpotassemia. Vale a pena a tentativa de raciocinar com base nesta observação: Três dias sem função

renal aumentam a concentração de potássio, que leva a uma assistolia. Basta revisar os conceitos de

bioeletrogênese cardíaca.

Os mecanismos que mantêm o funcionamento constante do organismo são chamados de homeostase. Esta

é constituída por uma faixa de parâmetros que pode ser regulada. Com o envelhecimento, há

homeoestenose, ou seja, estreitamento das faixas de homeostase. Fica mais difícil manter a constância.

Na fisiologia renal, seria um erro dizer que os rins são apenas excretores. Na verdade, são importantes

reguladores.

Os principais íons do corpo são sódio, potássio, cloro, bicarbonato, hidrogênio. Existem outros cátions, bem

como proteínas carregadas. O rim participa da regulação de todos esses elementos. Evita, por exemplo, que

a albumina do sangue seja perdida. Os rins podem funcionar separadamente ou em conjunto. A função

renal é medida, geralmente, de forma conjunta. Boa parte da perda dessa função, em caso de infecções ou

obstruções, é compensada pelo rim saudável. Por isso, os rins podem, inclusive, ser doados com base nesse

princípio.

A medula renal se diferencia do córtex pela vasculatura, menos expressiva. O rim recebe, em proporção,

muito mais sangue do que outros órgãos, com 25% do débito cardíaco. Os vasos renais não oferecem

nenhuma resistência à passagem de sangue. Os glomérulos renais são tufos de capilares, revestidos pela

cápsula de Bowman. Esta tem porções visceral e parietal. Mais tarde, o glomérulo dá origem à arteríola

eferente, que dá origem aos vasos em torno dos túbulos.

Os néfrons, unidades funcionais do fígado, podem ser corticais ou justamedulares (na separação entre o

córtex e a medula). A grande diferença entre eles é que os justamedulares são irrigados por vasos retos,

após saída das arteríolas aferentes. Detalhando a estrutura dos néfrons, temos:

a) Túbulo contorcido proximal;

b) Alça de Henle (segmentos descendente fino, ascendente fino, ascendente grosso);

U

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142 Nefrofisiologia

c) Túbulo contorcido distal. Sua função mais importante é a conservação de sódio e de água.

d) Túbulo coletor.

Os túbulos contorcidos proximais têm um

enorme consumo de oxigênio, estando cheios

de mitocôndrias. Quando o rim sofre isquemia,

as primeiras células a serem prejudicadas são as

deste túbulo. Elas também têm borda em

escova, sinal de muito transporte de membrana.

Os segmentos da alça de Henle têm epitélio

mais achatado, assim como o túbulo contorcido

distal e os túbulos coletores.

O epitélio que envolve o capilar glomerular é a

cápsula visceral de Bowman. As células epiteliais

formam podócitos, que envolvem grande parte

da superfície do capilar. Existe um espaço entre

um pé e outro, onde se localizam fendas. Esses

podócitos são muito complexos, com

membranas basais que cobrem as fendas. Pela

membrana glomerular, são filtradas diversas

substâncias. Água, sódio, glicose e inulina têm permeabilidade máxima (1.0). A mioglobina é mais pesada,

com filtrabilidade 0,75. Por último, a albumina tem filtrabilidade 0,005. Não se trata só de um maior peso

molecular ou tamanho, e sim um carregamento negativo da albumina, que impede sua filtração. Caso este

mecanismo falhe, a albuminúria dá um aspecto espumante à urina.

Fazem-se, hoje em dia, dosagens de

microalbuminúria, descobrindo lesões

pequenas glomerulares que levam à

eliminação de albumina na urina. A

hipertensão e o diabetes têm esse

quadro, sendo que o diabetes tem

maior risco: ele lesa a membrana

glomerular. Se perdermos albumina na

urina, a pressão oncótica do sangue

diminuirá, havendo inchaço. O

diabetes pode ser causado por

doenças autoimunes.

Em animais com perda de massa renal, os glomérulos que sobram sofrem hiperfluxo, pois o débito cardíaco

se mantêm. É comprovado que uma dieta rica em proteínas acelera esse hiperfluxo, danoso à função renal.

As células musculares incorporam aminoácidos atendendo a demandas mecânicas ou a um ambiente

hormonal favorável. A simples ingesta de proteínas não produz, ao contrário do que muitos acreditam,

aumento de massa muscular. A filtração excessiva de aminoácidos realmente destrói a função renal.

Anticorpos contra podócitos podem causar descolamento, lesão na membrana e síndrome nefrótica. Essa

síndrome pode ser causada até por um tumor de tireóide, que provoca lesão mínima.

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Anotações de Fisiologia 143

Os capilares glomerulares são como quaisquer outros, feitos para filtrar. A pressão hidrostática de um

capilar sistêmico, porém, é de 20 mmHg, enquanto a dos capilares glomerulares é de 60 mmHg. A pressão

da aorta chega quase inalterada à pequena arteríola aferente, que então a diminui. O que tira a água dos

capilares é a própria pressão hidrostática e a pressão coloidosmótica da cápsula de Bowman (que é zero,

pois não há proteínas), enquanto o que faz essa água voltar é a pressão coloidosmótica principalmente das

proteínas do sangue. Existe também a pressão

hidrostática da cápsula de Bowman. O Kf é um

fator de correção que muda conforme o estado

das membranas basais (em doenças, por

exemplo).

Quando o sangue passa dentro do capilar, a

filtração tem início e a pressão coloidosmótica

aumenta. Chega um ponto em que há um

equilíbrio entre as forças que empurram a água

para fora e para dentro. Esse ponto, entre o

meio e o fim do capilar, pode variar conforme o

fluxo de sangue renal. Se ele aumentar, a

filtração glomerular segue o mesmo caminho, e

o ponto de equilíbrio é adiado para uma porção

mais distal do capilar. Isso não depende do

aumento de pressão.

Os rins são extremamente bem regulados. De 70 a 150

mmHg de pressão arterial, o fluxo de sangue

pelo rim é sempre o mesmo, assim como a

filtração glomerular. O rim é capaz de regular

essas duas variáveis graças a alguns fatores:

a) Arteríola aferente e suas respostas

miogênicas. Evita que o excesso de

pressão se transforme em excesso de

fluxo, fechando-se. A pressão

intraglomerular e a filtração diminuem

para os valores normais.

b) Arteríola eferente. Em casos de queda

de pressão arterial, há vasoconstricção

da arteríola eferente, o que eleva a

pressão dentro dos capilares

glomerulares. Essa constricção reduz

mais ainda o fluxo plasmático renal, mas

eleva a filtração glomerular.

c) Substâncias que influenciam a filtração:

catecolaminas e o SNAsimpático

produzem vasoconstricção, diminuindo a filtração glomerular. São importantes em situações de

perda de sangue, provocando vasoconstricção e evitando hemorragia. A angiotensina é o grande

Page 144: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

144 Nefrofisiologia

mediador que atua sobre a arteríola eferente, aumentando a filtração glomerular inicialmente, e

diminuindo-a após certo ponto. O NO e as prostaglandinas aumentam a filtração glomerular.

De forma geral, existe um equilíbrio entre o túbulo

e o glomérulo que mantém a filtração glomerular.

Os capilares que saem da cápsula de Bowman são

os peritubulares. Numa região entre a arteríola

eferente e o túbulo distal, estão as células da

mácula densa. Se a filtração glomerular diminuir, o

filtrado circulrá mais lentamente, haverá maior

absorção de sódio na parte proximal do néfron (é

obrigatória) e conseqüente menor absorção na

parte distal. A mácula densa, então, ativa o SRAA,

liberando renina e provocando vasoconstricção

eferente. Se a filtração glomerular aumenta, a

concentração de sódio nos túbulos aumenta, e a

mácula densa libera mais adenosina (provocando

vasoconstricção aferente). O SRAA é mais lento que

a adenosina em sua ação. Por fim, o túbulo

contorcido distal é o grande regulador da filtração.

Devemos ser cuidadosos com a ação diferenciada

da adenosina neste mecanismo (se necessário,

rever módulo de cardiofisiologia).

Se um indivíduo tiver estenose numa artéria renal, um dos rins receberá menos sangue. A mácula densa

perceberá a diminuição da filtração, ativando o SRAA. O tônus da arteríola eferente é aumentado,

mantendo a pressão de filtração; entretanto, a pressão arterial aumentará de forma generalizada. Um

exame para verificação de função renal é a cintilografia de artéria renal. Primeiro, injeta-se um contraste.

Depois verificam-se curvas de pressão com e sem captopril, mostrando a influência de angiotensina (e do

SRAA) na manutenção da filtração.

Administração de remédios inibidores de ECA em hipertensos seguida por insuficiência renal demonstra

estenose bilateral de artérias renais, portanto. Isso porque a pressão de filtração cai muito.

A filtração glomerular é modificada por:

Alterações no fluxo renal, na pressão capilar

hidrostática, na pressão arterial sistêmica, da

pressão hidrostática na cápsula de Bowman,

obstrução ureteral, desidratação,

hipoproteinemia, mudanças no coeficiente de

filtração (de permeabilidade ou de área de

filtração efetiva). Edemas e hematomas

aumentam a pressão sobre o parênquima renal,

comprimindo cápsulas de Bowman. A

Adenosina

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Anotações de Fisiologia 145

hipoproteinemia acaba por diminuir a filtração glomerular, graças à hipovolemia (pressão coloidosmótica

diminuída). O diabetes aumenta a filtração, inicialmente.

Uma substância, quando chega pelo sangue até o glomérulo, pode ser filtrada ou não. Se for filtrada, pode

ir direto para a urina (nada é acrescentado ou removido), pode ser reabsorvida, secretada ou parcialmente

reabsorvida. O rim filtra de tudo (menos proteínas), mas não pode enviar todo o filtrado à urina. Há

sistemas de transporte para o que é mais

importante, como aminoácidos, glicose,

bicarbonato, cálcio. A concentração de substâncias

não desejadas só aumenta ao longo dos túbulos.

180 gramas de glicose pura são filtrados, e tudo é

reabsorvido. O bicarbonato tem 99,9% de

reabsorção, enquanto o sódio tem 99,4%. Potássio

e cloreto também têm altos níveis de filtração.

50% da uréia e nada de creatinina são

reaborvidos.

Como poderíamos medir a filtração glomerular de

um indivíduo? Uma substância como a inulina é

filtrada e excretada diretamente, sem reabsorção.

A medição, no caso, se dá pela concentração da

substância no filtrado multiplicada pela taxa da

filtração glomerular. A sua quantidade na urina

será o fluxo de urina multiplicado por sua

concentração nesse fluido. A quantidade de

filtrado é igual à quantidade eliminada na urina.

No caso da glicose, a taxa de filtrado é menor que

a liberada na urina, graças à reabsorção. Já o ácido para-amino-hipúrico é inteiramente secretado na urina,

após injeção. Depois, veremos qual a vantagem disso.

Sabemos o fluxo de urina e a concentração da substância. Para descobrir a concentração da substância no

filtrado, basta saber a concentração da mesma no plasma sanguíneo. Sobra apenas a taxa de filtração

glomerular.

Pode-se usar creatinina ao invés de inulina nessa medição. Uma concentração de creatinina de 1,2 mg/ml

(variável ) gera , em 1440 ml de um dia, 1 ml a cada minuto (variável V). A creatinina está em 0,01

mg/ml no plasma (variável ). O cálculo dá, portanto, 120 mL por minuto. Devemos ser cuidadosos nas

unidades usadas no Clearance de Creatinina, ou seja, na medição da TFG.

Existe uma estimativa da TFG por fórmula, ou seja, o clearance estimado.

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146 Nefrofisiologia

Ainda é possível medir o fluxo plasmático do rim pela injeção de PAH. Ele é quase que completamente

depurado do plasma, ou seja, quase toda a quantidade injetada no sangue acaba na urina (90%):

O FPR real é FPR dividido por 0,9. Assumindo que a concentração de PAH na urina fosse de 14 mg/mL, que

o fluxo fosse de 0,9 mL/min e que a concentração de PAH no plasma fosse de 0,02 mg/mL, o cálculo de FPR

seria igual a 700 mL, já com a correção dos 10% que faltam.

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Anotações de Fisiologia 147

AULA 32 – REABSORÇÃO E SECREÇÃO TUBULAR

Professora: Ivanita

s néfrons podem ser corticais e justamedulares. Apesar de estarem em maior número, os corticais

ocupam menos espaço que os justamedulares. A primeira barreira da região do glomérulo é a das

células endoteliais fenestradas (do capilar), a segunda é a da membrana basal, e a terceira é a dos

podócitos. Existe uma grande quantidade de proteínas e de ácido siálico na membrana de filtração, o que

repele proteínas carregadas negativamente. O tamanho também determina a filtrabilidade da proteína.

O sangue, até chegar à arteríola aferente, tem a pressão semelhante à da aorta. As arteríolas aferente e

eferente são dois pontos de resistência hidráulica, que diminuem a pressão hidrostática do sangue. A

pressão coloidosmótica aumenta aos poucos, à medida que vai havendo filtração (a concentração das

proteínas do sangue aumenta gradativamente). A reabsorção se dá nos capilares peritubulares.

Diariamente, 1600 litros de sangue passam pelos rins. Desse volume, 50 a 55% são formados pela parte

líquida do sangue, devendo-se o resto ao hematócrito e a outros componentes. Portanto, cerca de 850

litros de plasma podem ser filtrados por dia. Nem todo esse volume, no entanto, é filtrado.

Aproximadamente 20% são realmente filtrados, quantidade que pode ser chamada de fração de filtração

(cerca de 180 litros de plasma/dia). Esse último volume é chamado de filtrado glomerular, geralmente

dado em ml/min. Calculando, vemos que chega a 120 ml/min.

Parte dos 180 litros serão excretados , e parte será absorvida. Substâncias como o PAH são totalmente

excretadas. Íons, como sódio, potássio, cloro e bicarbonato são parcialmente reabsorvidos. Proteínas

filtráveis e glicose são totalmente reabsorvidas numa pessoa normal.

Carga filtrada é o produto de uma determinada concentração plasmática de uma molécula qualquer

multiplicada pela taxa de filtração glomerular. À medida que a concentração plasmática de glicose

aumenta, por exemplo, a carga filtrada aumenta também, junto com a reabsorção. Existe, porém, um

transporte máximo de glicose, limitado pela cinética dos transportadores reabsortivos. Acima de uma

determinada concentração, a glicose passa a ser eliminada na urina, como no diabetes.

A carga filtrada de sódio, por sua vez, fica em torno de 25000 mM. Os rins têm de ser capazes de recuperar

grande parte dessa quantidade de sódio. Como somos capazes de reabsorver essa carga filtrada?

Há regiões dos túbulos renais capazes de reabsorver diferentes solutos:

1. Túbulo contorcido proximal, que pode ser dividido em três segmentos: S1 (reto), S2 (convoluto)

e S3 (descendente). É a região que mais reabsorve e mais secreta, com 67% de tudo o que foi

filtrado nos rins. Alguns elementos em particular são a glicose, com 100%, e o bicarbonato com

85%. A reabsorção de água acompanha a de solutos, o que permite a formação de urina (na

verdade, filtrado primário) isotônica. O fluido, quando termina de passar pelo fluido proximal,

está isosmótico (cerca de 290 mOsmol/L).

2. Alça de Henle, dividida em ramos descendente e ascendente. As células epiteliais do ramo

descendente possuem baixa permeabilidade passiva aos íons. O cloreto de sódio antes

reabsorvido agora não passa; à água, no entanto, tem elevada permeabilidade. O fluido vai

O

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148 Nefrofisiologia

gradativamente concentrando-se, à medida que se chega à medula renal. Aqui, a osmolaridade

chega a 1200 mOsmol/L. Já na porção ascendente, a permeabilidade passiva à água é muito

baixa, se é que existe. Na verdade, ela só começa a aparecer nas porções finais do túbulo

contornado distal ou do túbulo coletor, na dependência de ADH. Nunca passivamente.

Na porção ascendente da alça de Henle, sódio, cloreto e potássio são reabsorvidos num

simporte. A urina se torna hipotônica, em torno de 200 mOsmol/L.

3. Túbulo contorcido distal: 5% da reabsorção de sódio. Sua porção final, assim como o túbulo

coletor cortical, têm permeabilidades variadas a água, sódio e outros. A osmolaridade da urina

vai variar de hipotônica a hipertônica (50 a 1200 mOsmol/L), dependendo da presença do ADH.

A vasopressina ou ADH atua em receptores V1 e V2, sendo estes últimos nas porções

basolaterais das células dos túbulos contornados distais. O receptor V2 estimulado ativa

aquaporinas, que permitirão a entrada de água. Esse processo também ocorre ao logo dos

túbulos e ductos coletores.

Ratos do Deserto têm grande capacidade de concentrar urina e de preservar água, podendo passar a vida

inteira sem tomar água.

Devemos lembrar que, do córtex para a medula, existe um gradiente de concentração que aumenta

conforme a profundidade. Esse gradiente deve ser comparado à concentração do filtrado nos túbulos.

Vamos, agora, íon por íon:

1. Sódio

É o mais abundante íon da circulação.

a) Primeira metade do túbulo contorcido proximal

É muito bem reabsorvido nos segmentos S1 e S2, acoplado às moléculas de glicose, por transportadores

SGLT1 e SGLT2. Quando o sódio se liga, permite a entrada de glicose. Faz uso de um tipo secundário de

transporte ativo, pois a energia do gradiente eletroquímico do sódio é suficiente para o transporte de

ambos. Para sair das células do túbulo, o sódio é levado pela Na+/K--ATPase na membrana basolateral,

enquanto a glicose é transportada pelo GLUT-2. 100% da glicose é reabsorvida assim.

O tipo 1 de SGLT tem ligação de dois íons sódio e duas moléculas de glicose, enquanto o tipo 2 só tem

ligação de um íon sódio. A concentração de glicose luminal, no tipo 1, pode estar reduzida abaixo de 0,0001

da célula; no tipo 2, essa proporção é de 0,01.

A reabsorção de sódio pode ser conjunta à de aminoácidos, inclusive dipeptídeos e tripeptídeos. O dois

primeiros são os mais comuns. O mecanismo tem entrada do sódio, pelo seu gradiente eletroquímico, e

simporte do aminoácido. Este sai pela membrana basolateral pela ação de proteínas carreadoras

específicas, assim como as da glicose. Outra maneira de carrear os dipeptídeos é o simporte com H+. Uma

enzima quebra os dipeptídeos dentro da célula. Para que este mecanismo funcione, porém, é necessário

um antiporte sódio-hidrogênio, que remove H+ e gera um gradiente de concentração. Logo, a entrada de

sódio pode se dar com aminoácidos ou dipeptídeos. O sódio é novamente retirado pela Na+/K+-ATPase. As

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Anotações de Fisiologia 149

proteínas filtradas serão absorvidas após quebra em peptídeos menores, ou então serão pinocitadas e

lisadas dentro das células dos túbulos, dando origem a aminoácidos pequenos.

A entrada de sódio pode se dar junto aos ânions (como sulfato e fosfato), num mecanismo semelhante ao

da glicose. O íon bicarbonato, por sua vez, se liga ao H+ que sai pelo antiporte com o sódio, que entra (o

mesmo citado antes). Forma-se H2CO3 dentro das células, que na presença da anidrase carbônica gera H2O

e CO2. Ambos entram nas células, e dentro delas geram mais H+ e bicarbonato. Este último é trocado pelo

cloreto, num antiporte, e vai para o sangue, onde se junta a mais sódio. 85% do bicarbonato é reabsorvido

assim.

Alguns diuréticos são inibidores da anidrase carbônica. Um exemplo é a cetazolamida. Assim, interfere-se

no processo de decomposição de H2CO3, não deixando que entre água nas células. O volume da urina

aumenta.

Em todos esses processos, a reabsorção gera um grande gradiente osmótico, capaz de reabsorver grande

quantidade de água do filtrado glomerular.

b) Segunda metade do túbulo contorcido proximal

O cloreto, pouco visado antes, é reabsorvido por antiporte com ânions e por simporte com o sódio na via

paracelular no segmento S3 do túbulo contorcido proximal. O sódio também adentra a célula pelo simporte

com H+. Sempre há um acompanhamento osmótico de água. Depois, o sódio é removido pela Na+/K+-

ATPase, e o cloreto, pelo simporte com íons potássio.

Como muita água é reabsorvida junto ao sódio, a concentração deste íon permanece praticamente

constante ao longo do túbulo contorcido proximal. A reabsorção de água, em geral, ocorre por aquaporinas

e entre as junções de adesão das células tubulares. A pressão hidrostática do interstício aumenta, forçando

o que foi reabsorvido para dentro dos capilares peritubulares.

c) Alça de Henle

Existe reabsorção de NaCl nos segmentos ascendentes espesso e fino. No segmento descendente fino, há

apenas reabsorção de água por aquaporinas (AQPI). Os segmentos ascendentes são impermeáveis à água.

O cloreto de sódio é reabsorvido passivamente na

porção ascendente fina.

No segmento ascendente espesso, há novamente

Na+/K+-ATPases na membrana basolateral,

gerando um gradiente iônico. Um simporte

especial reabsorve não só sódio, mas cloreto e

potássio também, na proporção de 1:2:1. 25% do

sódio filtrado é reabsorvido aqui. Esse mecanismo

gera um gradiente tão eficiente que dele também

dependem a reabsorção de magnésio e de cálcio,

pela via paracelular. Existe um canal de potássio

que retorna esse íon, de baixa concentração

tubular, para a luz do néfron. Antiportes de sódio-

potássio e sódio-hidrogênio também existem

Page 150: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

150 Nefrofisiologia

nesse local. Em resumo, metade do transporte de NaCl é pela via transcelular, e metade pela via

paracelular.

A furosemida inibe o transporte desses íons, de forma que surge uma diurese osmótica intensa. Se outro

medicamento que já mexa com o potássio existir no organismo, pode surgir uma hipocalemia importante.

Devem ser utilizados, neste caso, diuréticos poupadores de potássio.

d) Túbulo contorcido distal e ducto coletor

Há canais de transporte passivo de sódio. É feito de canais controlados por tiazidas, como a

hidroclorotiazida.

No fim do néfron, a reabsorção de sódio é feita

somente pela influência da aldosterona.

Nos túbulos distal e coletor, há células

intercaladas dos tipos α e β. Estão relacionadas

ao mecanismo de equilíbrio ácido-base. As células

principais são aquelas nas quais a aldosterona

age, nas membranas basolaterais. É um hormônio

lipofílico, entrando facilmente na células, sem

necessidade de receptor. No citosol, é

reconhecida por um receptor de

mineralocorticóide, ativando a transcrição e

síntese de canais de entrada de sódio, junto com

a formação de mais bombas de sódio e potássio.

A entrada de sódio aumenta, jogando o íon no

sangue. Já o potássio que entra no lúmen do

túbulo pode sair por canais de vazamento.

Diuréticos poupadores de potássio inibem a

reabsorção de sódio e também a perda de

potássio. Um exemplo é a espironolactona. As

células intercaladas são muito importantes para a

manutenção do equilíbrio ácido-base do

organismo, visto que pode reabsorver ou secretar

quantidades variáveis de íons potássio e

bicarbonato.

A água adentra as células em presença de hormônio antidiurético (ADH), através de aquaporinas 2

(membrana luminal), 3 e 4 (membrana basolateral).

2. Potássio

É absorvido no intestino e vai para o sangue. De lá, como a concentração de potássio tem de ser baixa, ele

deve ser armazenado dentro das células. As principais com essa função são as hepáticas e as musculares. O

aumento de potássio plasmático induz, no córtex adrenal, a secreção de aldosterona. Esta, nas células,

ativa novamente o mecanismo supracitado, provocando a eliminação de sódio e a absorção do potássio.

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Anotações de Fisiologia 151

Aumentos na concentração deste íon também aumentam a secreção de insulina, que provoca seu

armazenamento. Injeções de insulina são acompanhadas por potássio, em geral.

A acidose metabólica aumenta a concentração plasmática de potássio, enquanto a alcalose, de forma geral,

a diminui. Isso porque o pH reduzido leva H+ para as células, sendo necessária a remoção de potássio para

manter a eletroneutralidade. Alguns simportes e a sódio-potássio ATPase são inibidos.

A quantidade de potássio

movimentada nos rins depende da

sua ingestão e da sua perda. 67% são

reabsorvidos no túbulo proximal e

20% no segmento espesso

ascendente da alça de Henle. O resto

é excretado na urina, em quantidade

variável.

Nas células principais dos ductos

coletores, o potássio é secretado

pelos mecanismos já citados. Nas

células intercaladas tipo α, existem

canais de antiporte H+/K+, além de

Na+/K+-ATPases e passagem livre.

3. Cálcio

99% do cálcio filtrado é reabsorvido pelo néfron. É mais reabsorvido no túbulo contorcido proximal (67%),

seguido pela porção espessa da alça de Henle (20%), pelo túbulo distal (9%) e pelo ducto coletor (1%). Na

membrana basolateral das células tubulares, há Na+/Ca2+-ATPases e Ca2+-ATPases. Ela cria um gradiente de

cálcio que permite a saída dos túbulos tanto pela via transcelular. Já a via paracelular representa 80% do

transporte.

No ramo ascendente espesso da alça de Henle,

os diuréticos de alça agem inibindo a reabsorção

de sódio, diminuindo a voltagem transtubular e,

com isso, a reabsorção paracelular de cálcio.

Esses diuréticos de alça, então, podem ser

usados em situações de hipercalcemia.

No túbulo distal, a reabsorção de cálcio é

totalmente transcelular, seja com ATPase de

cálcio ou num antiporte ATPásico com o sódio.

Os diuréticos tiazídicos inibem a reabsorção de

sódio e estimulam a de cálcio.

O PTH inibe, também, a reabsorção de sódio,

estimulando a de cálcio. Isso ocorre nos túbulos

proximal, distal e na alça de Henle. A calcitonina

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152 Nefrofisiologia

e o calcitriol têm efeitos semelhantes, porém mais fracos.

4. Fosfato

É reabsorvido no túbulo proximal (80%), 15% no final do segmento S3, estando a maioria nos segmentos S1

e S2. 10% são reabsorvidos no túbulo contorcido distal, e 10% são excretados. A via transcelular é a única. A

sua reabsorção é inibida pelo PTH e por glicocorticóides.

O mecanismo de transporte está demonstrado na figura ao lado.

5. Magnésio

Reabsorvido no ramo ascendente espesso da alça de Henle, num mecanismo do sódio-cloreto-potássio.

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Anotações de Fisiologia 153

AULA 33 – EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

Professor: Roberto

m assunto extremamente necessário para o médico, principalmente nas situações de urgência.

Inicialmente confuso, obedece a critérios lógicos, de forma que tudo passa a fazer sentido após

certo tempo. Serão estudados os mecanismos que mantêm a concentração de hidrogênio no

sangue dentro de níveis muito estreitos. O valor normal para essa concentração, normalmente, é de 40 nEq

por litro. Nossa faixa de pH fisiológico é muito estreita, pois o hidrogênio é muito reativo, inativando

enzimas e alterando o funcionamento de canais iônicos.

Os tecidos excitáveis, por esse princípio, são atingidos gravemente. Pode haver arritmia, coma,

hiperexcitabilidade do SNC causada por alcalose, entre outros tantos quadros possíveis.

A quantidade de hidrogênio no sangue não é regulada, e sim a concentração de hidrogênio livre, reativo. O

bicarbonato é o principal tampão do organismo, ao lado de proteínas (de forma geral). Os principais

tampões protéicos são albumina e hemoglobina, quantitativamente falando. Ainda podem ser citados a

matriz óssea e componentes do meio intracelular.

Obs.: a acidose crônica pode provocar desmineralização óssea. Em crianças, pode provocar anormalidades

esqueléticas graves. O cálcio depende do pH para ser solubilizado ou depositado: se abaixar, o cálcio se

solubiliza. Os ossos são bons aceptores de hidrogênio.

O bicarbonato é o melhor tampão, evolutivamente falando, porque sua parte ácida (ácido carbônico) é

extremamente volátil, podendo ser removida facilmente pelos pulmões. Seu poder de tamponamento não

é tão forte, no entanto. Devemos relembrar a equação de Henderson-Hasselbach:

Um dos pH mais baixos está em torno de 6,8. Abaixo disso, é certo que haverá coma. Na figura acima,

agressões ácidas ou básicas levam o sangue a variar muito, relativamente, o seu pH. Se houver um tampão,

como ilustrado abaixo, o pH fica entre as faixas de 7,3 e 7,42. Isso com a mesma concentração dos

“agressores”. Está confirmada a eficiência do tampão. Os pulmões, conforme dito antes, são absurdamente

rápidos na retirada de CO2, mas não repõem os íons bicarbonato. Quem corrige, realmente, o excesso de

ácido, são os rins.

Outra propriedade dos sistemas tampão é terem um

ponto pK, no qual está a maior capacidade de

“amortecimento”. É um logaritmo da constante de

dissociação, correspondente a um determinado pH: ali, as

variações são melhor amortecidas. Teoricamente, os

melhores sistemas-tampão são os que funcionam num

pH semelhante ao pK. O sistema do bicarbonato tem um

pK completamente fora da faixa fisiológica (6,1), sendo o

ideal 7,4. No entanto, a parte ácida muito volátil

U

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154 Nefrofisiologia

(eliminação de CO2 na respiração e de bicarbonatonos túbulos renais) e a abundância de bicarbonato

facilitam esse favoritismo.

Mas, qual a necessidade de ter um sistema tampão? Nosso equilíbrio é ameaçado, todo dia, por excesso de

ácidos, principalmente. Somos fabricantes de ácido, sob a forma de CO2 (advindo do metabolismo de

carboidratos e lipídeos) e ácido sulfúrico ou clorídrico. Neste segundo caso, a degradação protéica é a

responsável. Carnes são ricas em metionina e cisteína, aminoácidos com radicais de enxofre. Produzimos,

por dia, de 70 a 250 mEq de ácido sulfúrico. Indivíduos vegetarianos têm menor carga protéica e menor

produção de ácido, portanto.

Existem, também, outras fontes de acido: metabolismo anaeróbio (ácido láctico), de triglicerídeos (com

acetoacetato ou hidroxibutirato) ou de proteínas do núcleo (ácido úrico).

Como eliminaremos 100 mEq de ácido, por dia, se temos

360 mEq de bicarbonato? O bicarbonato será consumido

em pouco tempo, permitindo o surgimento de acidose.

Temos de repô-lo, mas os glomérulos deixam passar o

bicarbonato com facilidade. Temos 24 meq por litro de

sangue, mas são filtrados 180 litros por dia. Perderíamos

todo o bicarbonato em pouquíssimo tempo, não fosse a

excelente recuperação promovida pelos néfrons. O

principal recuperador é o túbulo proximal (80%), com um

pocuo na parte espessa da alça de Henle, e outras

porcentagens menores mais adiante.

Esforços físicos excessivos podem provocar rabdomiólise,

com necrose do músculo. O indivíduo tem mioglobinúria,

insuficiência renal e conseqüente hiperpotassemia.

O bicarbonato não é reabsorvido diretamente. Ele é

filtrado livremente. O hidrogênio sai das células dos

túbulos, junta-se a ele, forma ácido carbônico, gera CO2

e água. O hidrogênio supracitado é produzido pela

dissociação de ácido carbônico, formado pela anidrase

carbônica (dentro da célula tubular) a partir de mais

CO2 e água. É gerado mais bicarbonato, que vai para a

circulação. Forma-se um ciclo, no qual se recupera um

bicarbonato a partir do mecanismo da anidrase

carbônica. As concentrações desta nos túbulos são as

maiores do corpo.

Para o tratamento de glaucoma, inibe-se a anidrase

carbônica do olho, o que diminui a produção de humor

aquoso. O efeito colateral é a acidose.

Como excretamos hidrogênio removido do sangue?

Quando é lançado muito hidrogênio na luz dos túbulos,

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Anotações de Fisiologia 155

o gradiente químico começa a impedir o transporte de mais íons. Assim, atinge-se uma espécie de

equilíbrio. O pior de tudo é que nesse lançamento já foi filtrado apenas 0,1% da carga ácida. Logo, são

necessários tampões da urina. O fosfato é um deles: recebe hidrogênio, não deixa o pH diminuir e permite

que o tal íon seja excretado. O problema ainda não está resolvido. Fosfato e outros ácidos fracos são

responsáveis por apensa 30 a 40% da eliminação de hidrogênio na urina, chamado de titulável.

O maior excretor de hidrogênio do organismo é a amônia. Afinal, é produzida de forma abundante nos rins,

pela desaminação da glutamina. Quando ela reage com o hidrogênio dos túbulos, transforma-se em íon

amônio, não passando pela membrana celular e permanecendo neles. A produção de amônia responde ao

pH do sangue: se cai, a enzima glutaminase aumenta sua atividade, gerando mais NH3. Caracteriza-se,

então, um elemento regulado.

Existe uma crise histérica que entorta os dedos: o pânico tem um componente hiperventilatório. Num pH

normal, 50% do cálcio está livre, e 50% estão ligados a proteínas (complexos). O cálcio que participa da

função de condução no organismo está ionizado, livre. Se o pH abaixar, mais cálcio será liberado, ocorrendo

o contrário no caso de alcalose. Hiperventilação gera alcalose respiratória, portanto, e menor concentração

de cálcio, o que permite espasmos musculares pelo corpo inteiro. A mão fica com o sinal de Trousseau, ou

“mão de parteiro”. O sinal anterior à tetania é a parestesia. Essa crise pode ser tratada com medicamentos

ou com um simples saco de papel, que mantém a concentração de CO2 mais alta, evitando alcalose.

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156 Nefrofisiologia

Quem tem epilepsia pode desencadear o processo por hiperventilação, pois este gera excitabilidade.

Outras origens de hiperventilação são dor, exercício físico, entre outras.

Distúrbios ácido-básicos

O normal para o organismo é um pH de 7,40,

pCO2 de 40 mmHg e 24 mEq de bicarbonato.

a) Alcalose respiratória.

A pCO2 cai de 40 para abaixo de 25 mmHg,

com concentração normal de bicarbonato,

indo o pH para 7,60. Se esse quadro tornar-

se crônico, o organismo pode tentar

adaptação pela eliminação forçada de

bicarbonato nos rins. Produz-se um princípio

de acidose metabólica. Na asma, indivíduos

têm acidose forte (pH 7). A correção desse

quadro específico com bicarbonato venoso é

desaconselhável, pois o excesso de

bicarbonato terá efeitos bons no início e

ruins no final: o bicarbonato não será

eliminado, trazendo alcalose de volta.

b) Acidose respiratória

Provocada por diminuição na ventilação, seja por comprometimento do centro respiratório ou por

dificuldades na troca de CO2 por O2. Neste último caso, podemos levar em conta obstrução de vias aéreas,

enfisema, pneumonia, edema pulmonar e outras causas.

c) Acidose metabólica

- Excesso de ácido láctico;

- Diabetes, por causa dos corpos cetônicos produzidos pelas células, como acetoacetato e hidroxibutirato,

gerando cetoacidose. Não há insulina para internalizar glicose, e as células provocam essa cetoacidose

diabética. A respiração de Kussmaul é uma característica marcante, assim como o hálito cetônico. O

tratamento se dá pela reposição de líquidos (com soro fisiológico, pois muita água foi perdida) e, em último

caso, injeção de bicarbonato. Os rins eliminarão o ácido. Administra-se insulina e um pouco de glicose no

soro, pois esta será consumida rapidamente após a crise.

- Acidoses tubulares renais. Existem defeitos na excreção de hidrogênio e na reabsorção de bicarbonato.

Pode ser provocada por insuficiência renal crônica, falta de aldosterona e problemas tubulares. Acidoses

crônicas desse tipo não deixam os ossos se formar direito em crianças;

- Inibidores de anidrase carbônica, como citado antes;

- Fístula biliar, ou salivar. As secreções eliminadas no tubo digestivo ou no ambiente são ricas em

bicarbonato;

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Anotações de Fisiologia 157

- Diarréias de grande porte. Há grande perda de bicarbonato nas fezes. Mais grave em crianças;

- Ingestão de ácidos, como aspirina e metanol, formador de ácido fórmico quando ionizado;

Distúrbios crônicos são mais complexos, por causa de compensações. Um exemplo seria a insuficiência

respiratória com pH normal, mas pCO2 em 68 mmHg. Provavelmente, a concentração de bicarbonato

estará em torno de 40 mEq por litro. Existe acidose respiratória crônica. O problema da insuficiência

respiratória num indivíduo desses é que a concentração de CO2 e de O2 não regula mais a respiração, e a

administração de oxigênio não é efetiva. O certo é sedar o paciente, usar broncodilatadores, usar remédios

para infecção e um respirador artificial para readaptar o paciente ao controle por concentração de

oxigênio.

Existe uma grande importância na leitura correta de gasometrias.

d) Alcalose metabólica

- Perda de suco gástrico no vômito, em grande escala;

- Administração de diuréticos, exceto os que inibem a anidrase carbônica. Mais sódio é absorvido, e mais

hidrogênio é lançado na luz dos túbulos. Mais bicarbonato é reabsorvido também;

- Excesso de aldosterona;

- Ingestão de substâncias alcalinas, como bicarbonato de sódio.

Existem agentes que estimulam a secreção de ácido pelos rins, após a sua neutralização por bicarbonato no

sangue. São os 100 mEq que restam. Os tais fatores são:

a) Aumento de pCO2 e redução de pH;

b) Cortisol;

c) Endotelina;

d) Diminuição do bicarbonato no líquido extracelular;

e) Redução da volemia, estimulando a secreção de hidrogênio no túbulo proximal;

f) Angiotensina II, também liberada na hipovolemia, aumenta a excreção de ácido;

g) Aldosterona;

h) Hipocalemia. O mecanismo exato não é bem conhecido.

Devemos perceber que, na hipovolemia, a ativação do SRAA entra em conjunto para a maior liberação de

hidrogênio. Por outro lado, diminuem a secreção de ácido pelo rim:

a) Aumento do bicarbonato sérico, o que permite neutralizar mais hidrogênio;

b) Diminuição da pCO2 arterial;

c) Hipoaldosteronismo;

d) Hipercalemia.

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158 Nefrofisiologia

O rim possui um mecanismo

secretor de bicarbonato, útil em

casos de alcalose.

Uma desordem ácido-base mista

pode ser levada em conta, quando

há mais de um problema

ocorrendo (um respiratório e um

renal, por exemplo).

À direita, pode-se ver um

quadro que detalha as

condições para o diagnóstico

dos diferentes tipos de acidose

e alcalose.

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Anotações de Fisiologia 159

AULA 34 – OS RINS E A REGULAÇÃO DO VOLUME E DA TONICIDADE EXTRACELULARES

Professora: Ágata

a regulação da tonicidade, teremos em vista a excreção e a ingestão de água. Os rins participam

dos sensores, das vias aferentes, eferentes, do controle a da excreção para a regulação do volume

e da tonicidade do líquido extracelular. A ingestão e a excreção de sódio são contrabalançadas,

sendo que uma é igual à outra. Se a ingestão aumentar bruscamente, os rins a princípio não conseguem

excretar a tal quantidade. O sódio se acumula no plasma, e a osmolaridade aumenta. Há secreção de ADH e

sensação de sede, até que se atinja o equilíbrio. A osmolaridade plasmática agora está normal. O volume

do líquido extracelular, porém, está aumentado. A normalização da osmolaridade, portanto, acontece às

custas do aumento do volume extracelular.

Se ocorrer queda do volume circulatório, é porque aconteceu o contrário. Essa queda será detectada por

barorreceptores e receptores cardiopulmonares, ativando o SNA simpático e a neurohipófise, que aumenta

a produção de ADH. O simpático modifica a hemodinâmica renal, para aumentar a reabsorção tubular de

sódio, e ativa o aparelho justaglomerular, para ativar o SRAA. A angiotensina II e a aldosterona aumentam a

reabsorção de sódio nos túbulos renais.

Os barorreceptores renais, diferentes daqueles que vão para o NTS, são de ação local, estando presentes na

arteríola aferente. Quando estirados, a sua concentração intracelular de cálcio diminui, e um impulso de

ativação é enviado. Se houver menor volemia, ativam o aparelho justaglomerular e, com isso, o SRAA. Esses

fatores em conjunto aumentam a reabsorção de sódio, diminuindo sua excreção. Por último, o átrio

diminuirá a secreção de ANP, diminuindo a excreção de sódio também. O volume circulatório efetivo volta

ao normal.

O sistema renina-angiotensina-aldosterona

Existem três estímulos principais para a secreção de renina, que acontecem quase sempre juntos:

a) Diminuição da pressão de perfusão renal;

b) Menor aporte de sódio na mácula densa. A pressão hidrostática dos capilares glomerulares cai, e

menos sódio vai ser filtrado. Os túbulos reabsorverão menos sódio, e essa deficiência atingirá a

mácula densa;

c) Estimulação de receptores β1 renais, pelo SNA simpático.

A vasoconstricção da angiotensina II nas arteríolas eferentes é maior que nas aferentes. O fluxo sanguíneo

renal diminui, mas a fração de filtração aumenta.

A renina é produzida pelas células justaglomerulares renais, clivando o angiotensinogênio do fígado em

angio I. A ECA converte-a em angio II, que aumenta a secreção de aldosterona pelo córtex adrenal.

O endotélio, neurônios, células mesangiais, tubulares e outros tipos celulares variados possuem seus

próprios SRAA’s. Esses sistemas teciduais são extremamente importantes para o funcionamento normal

dos seus respectivos tecidos. Existem vários tipos de angiotensina, como o 1-7. Ele se liga aos receptores

Mas, tendo efeitos contrários aos da angiotensina II. Podem surgir fármacos com base nesse efeito. A

N

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160 Nefrofisiologia

angiotensina II pode se ligar a receptores AT-1 ou AT-2, conforme visto antes no módulo de cardiofisiologia.

Quando fetos, possuímos muito mais AT-2 que AT-1. Essa proporção se inverte após o nascimento.

Uma queda na perfusão renal diminui a pressão de filtração, ativando a mácula densa, que ativa o SRAA. A

angiotensina II regula o volume circulatório realizando:

a) Vasoconstricção (aumentando a pressão arterial sistêmica e normalizando a perfusão renal);

b) Estimulando a liberação de ADH (retendo água e normalizando a volemia);

c) Estimulando o centro da sede no hipotálamo (mais importante que o ADH);

d) Aumentando a reabsorção de sódio (em várias partes dos túbulos, como os trocadores sódio-

hidrogênio na isoforma NHE3, regulando também o pH) e a secreção de aldosterona. Observa-se

que o aumento da reabsorção pode ser direto ou indireto.

Inervação simpática

Aumenta o volume do fluido extracelular pelo aumento da reabsorção de sódio, estimulando diretamente

os trocadores Na+/H+ e Na+/K+ ATPase, além do SRAA indiretamente.

A força motriz para a reabsorção de sódio é a bomba basolateral nos túbulos, que joga sódio para o

interstício, criando gradiente iônico suficiente para que ele seja reabsorvido na porção apical das células

tubulares. Existem cotransportes, mas essa força criada pela bomba de sódio e potássio é fundamental, daí

a importância da ativação simpática. Em situações basais, com pouca alteração do volume intersticial, a

ativação simpática é pouca. Com queda desse volume, porém, ela passa a ser fundamental. Se o volume

aumentar, o SNA simpático é retirado.

Peptídeos natriuréticos

Além do atrial, temos:

a) BNP. Cerebral, tem sido utilizado como marcador de insuficiência cardíaca. Na verdade, sua maior

produção é cardíaca, quando as paredes das cavidades do coração são distendidas;

b) CNP. Também conhecidos como de tipo C;

c) DNP, não produzido pela espécie humana, mas com efeitos sobre seu organismo em experimentos;

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Anotações de Fisiologia 161

d) VNP, ventricular).

Todos têm os mesmos efeitos. Seus

receptores podem ser de três tipos:

a) NPR-A, ativado por ANP e BNP.

Ativa via do GMPc,

provocando vasodilatação,

diurese, natriurese, etc.

b) NPR-B, que tem efeitos

semelhantes. Liga-se ao CNP;

c) NPR-C, que é um receptor de

clearance dos peptídeos

natriuréticos.

Os efeitos serão contrários aos do

SRAA. Reduzem o volume do fluido

extracelular pelo aumento da taxa de

filtração glomerular, via vasodilatação

renal e relaxamento das células

mesangiais. Se essas células se contraíssem, a TFG diminuiria. Esses receptores também inibem os efeitos

estimuladores da angiotensina II, a reabsorção de sódio no ducto coletor; reduzem a liberação de renina,

aldosterona e hormônio antidiurético (ADH).

Efeitos hemodinâmicos na excreção renal do sódio

A diurese e a natriurese pressórica são resultado do aumento da pressão arterial, após correção ou

manutenção dos níveis de sódio e de líquido no organismo. Após infusões de volume em cães, por

exemplo, o débito cardíaco aumenta inicialmente, mas a excreção urinária aumenta depois e retorna a

volemia ao normal. À medida que a pressão arterial aumenta, o volume urinário aumenta também,

compensando a pressão arterial. O aumento de resistência periférica não é uma boa alternativa, porque

diminui o débito cardíaco.

Existe um ponto de equilíbrio entre a ingestão e a excreção de

água e de sal, no qual a pressão arterial permanece em níveis

normais .Se a ingestão aumentar, a pressão arterial aumenta,

saindo do ponto de equilíbrio, indo para outra posição na curva.

A diurese e a natriurese pressóricas aumentarão também,

corrigindo a hipertensão. Uma situação contrária levará à

retenção de sódio e de água pelos mecanismos supracitados,

novamente normalizando o volume.

Os mecanismos que regulam a tonicidade estão mais

relacionados ao balanço da água. Se por acaso a saída de água

for maior que a entrada, a sede aumenta e a excreção de água diminui.

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162 Nefrofisiologia

Ingerimos água por diversas fontes diferentes, e a geramos no nosso próprio metabolismo. Perdemos água

pela respiração, pelos rins, pelas fezes, entre outros.

Hormônio antidiurético

É produzido nos núcleos supra-ópticos e paraventriculares do hipotálamo. Seus axônios dirigem-se para a

neurohipófise, levando vesículas que serão liberadas ali. Provoca alguma vasoconstrição, mas seu principal

efeito é diminuir a diurese.

Liberado em casos de diminuição da pressão arterial,

aumento da osmolaridade sanguínea e diminuição do

volume sanguíneo. São situações nas quais é necessária a

retenção de água. Delas, a mais importante é o aumento

da osmolaridade.

Os osmorreceptores do hipotálamo funcionam da seguinte

forma: a atividade basal do neurônio tem um certo nível

na osmolaridade normal. Se ele aumentar, diminui o

volume celular e deformando a estrutura neuronal. Canais

de sódio dependentes de estiramento são ativados, o

sódio flui para o meio intracelular e surgem potenciais de

ação. Sinais são enviados para as regiões produtoras de

ADH, já citadas. Barorreceptores e receptores

cardiopulmonares também sinalizam para a produção

desse hormônio.

O ADH age em receptores V1 e V2, sendo que o primeiro provoca vasoconstricção e o segundo aumenta a

absorção de água. O ADH se liga a um receptor V2, presente na membrana basolateral, ativando proteínas

G, que ativam adenilato ciclases. Assim, aumenta a concentração de AMPc, que ativa uma quinase A, que

ativa aquaporinas. Estas migram para a membrana, aumentando bastante a reabsorção de água. O volume

urinário diminui. O mecanismo é inibido no caso de hipoosmolaridade plasmática.

O diabetes insipidus não tem glicosúria. Pode ser que o indivíduo tenha o tipo central da doença, muito

raro e envolve pessoas que sofreram alguma trauma craniano. Nele, não há produção de ADH. O outro tipo

é o nefrogênico, nos quais o ADH ou o receptor V2 não funcionam corretamente. Os dois principais

sintomas são a poliúria (chegando a 20L de urina, quando o normal é de 1L) e a polidipsia. A pressão

arterial pode cair a níveis perigosos.

Mecanismo da sede

Foi pouco estudado. Sabe-se que são osmorreceptores na mesma área daqueles os estimuladores da

produção de ADH. São áreas desprovidas de barreira hematoencefálica, estimuladas pelo aumento da

osmolaridade sanguínea, pelo ADH e pela angiotensina II.

Como a sede passa na hora, logo depois de tomarmos água? Afinal, a água não chega tão imediatamente

aos rins. A solução para tal indagação é a existência de receptores na orofaringe e no trato gastrointestinal,

que enviam impulsos inibitórios aos centros da sede. No entanto, esses impulsos são transitórios, podendo

a sede retornar após pouco tempo.

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Anotações de Fisiologia 163

Em termos de conservação/excreção de água,

precisamos entender os mecanismos que

conservam água ou que produzem urina diluída.

Neste último caso, o filtrado glomerular é

isosmótico. Existem segmentos que separam os

solutos da água: os túbulos renais. À medida que os

líquidos descem pela alça de Henle, há perda de

água para o meio hipertônico. Quando sobem por

essa alça, ganham sódio, cloreto e outros íons. Mais adiante nesse segmento, há remoção desses íons.

Inicialmente, a osmolaridade da urina é de 100 mOsm. Ela aumenta até a metade da alça de Henle, onde

volta a diminuir. Na ausência de ADH, a osmolaridade está baixa. O líquido que está passando pelo túbulo

contorcido distal perde íons, que são reabsorvidos. A urina está ainda mais diluída, e é liberada com menos

de 50 mOsm.

Para gerar urina concentrada, precisamos de altos níveis de ADH e de uma medula renal hiperosmótica.

Vamos partir da primeira filtração: o líquido isosmótico é filtrado. Não perderá água pela alça de Henle,

pois não haverá diferença de concentração. Quando chega ao segmento ascendente, perde soluto, com

diminuição de osmolaridade; o líquido intersticial tem, porém, aumento de osmolaridade. Assim, surge a

maior concentração do interstício conhecida normalmente. Agora, a água se movimentará, tendendo a sair

do segmento descendente da alça de Henle. A reabsorção de solutos no segmento ascendente da alça de

Henle gera a osmolaridade que removerá água no segmento descendente da mesma. Os processos estão

acoplados.

O filtrado perde solutos no segmento descendente, ficando com maior osmolaridade. Depois, sofre

reabsorção de solutos e fica com menor osmolaridade de novo. O processo cria um equilíbrio, ficando a

maior concentração da alça de Henle em torno de 1200 mOsm. A formação de um interstício hiperosmótico

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164 Nefrofisiologia

favorece a reabsorção de água pela alça de Henle, sendo que, se esta for maior, maior será a osmolaridade

em seu interior. De qualquer forma, devemos lembrar que a saída de água e depois de solutos da alça de

Henle não controla a concentração da urina (mera reabsorção), sendo esse o papel do ADH.

O transporte de uréia tem grande importância

também. Se há grande osmolaridade no plasma,

aumenta a secreção de ADH. Não deixamos de

reabsorver solutos nos segmento da alça de Henle,

e reabsorvemos muito mais água também. Nos

túbulos coletores, há remoção de água e de uréia, e

a osmolaridade aumenta.

Existe um aumento da concentração de uréia ao

longo dos túbulos, portanto, pela saída de água e

pelo transporte passivo, nos túbulos coletores, para

o interstício. Parte da uréia, então, retorna ao

interstício, e outra parte é excretada. Ela é essencial

para que a urina seja concentrada. 50% da uréia é

reabsorvida no túbulo contorcido proximal, e

sobram 50%. Na alça de Henle, os outros 50% são

preenchidos pela uréia do interstício, da qual acabamos de falar.

O papel dos vasos retos

Quem mantém o interstício medular hiperosmótico

são os vasos retos. Seu líquido flui em direção

contrária à do filtrado. A taxa de solutos e de água

que eles retiram sai da alça de Henle. Existe,

portanto, um ciclo de solutos e de água girando no

interstício medular, o que caracteriza o mecanismo

de contracorrente.

No segmento descendente da alça de Henle, alguns

solutos entram nos vasos retos. Na porção

descendente, alguns solutos saem.

Alguns vasodilatadores são capazes de aumentar

bastante o fluxo dentro dos vasos retos,

aumentando a retirada de solutos do interstício

renal. A capacidade de concentração urinária diminui.

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Anotações de Fisiologia 165

ANEXO – FIGURAS-RESUMO DA FUNÇÃO RENAL

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166 Endocrinofisiologia

Parte 5

Endocrinofisiologia

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Anotações de Fisiologia 167

AULA 35 – MECANISMOS GERAIS DE SÍNTESE E AÇÃO HORMONAL

Professora: Alessandra

sistema endócrino é composto por glândulas endócrinas, que liberam os hormônios. Eles caem na

corrente sanguínea, atuando em tecidos específicos, onde suas ações serão manifestadas.

Hormônios, porém, podem não cair na corrente sanguínea, caracterizando-se como parácrinos,

autócrinos ou intrácrinos. Onde houver um receptor para sua atuação, eles atuarão.

Temos três tipos de hormônios: derivados da tirosina, derivados de colesterol e protéicos. Cada classe de

hormônio tem mecanismos de ação distintos, que serão explicados detalhadamente. Depois, veremos o

eixo hipotálamo-hipófise em relação a estes hormônios.

O ACTH (hormônio adrenocorticotrófico), por exemplo, é um hormônio produzido pela hipófise que possui

receptores principalmente no córtex adrenal. É importante dizer que as propriedades dos hormônios

dependem de seus receptores. Ao contrário do ACTH, o GH (hormônio do crescimento) possui receptores

em praticamente todas as células do organismo. Tudo depende, portanto, dos receptores e do local onde

são expressos.

Em teoria, os principais órgãos endócrinos do copo

estão no eixo hipotálamo-hipófise, glândula pineal,

tireóide, paratireóide, timo, adrenais (medula, com

adrenalina, e córtex, com hormônios esteróides),

pâncreas, ovários e testículos. Todos esses, com

exceção do pâncreas, estão sob controle do eixo

hipotálamo-hipófise. Problemas nesse eixo, portanto,

podem trazer problemas para o organismo como um

todo.

Existem outros órgãos, como a placenta, os miócitos

cardíacos (que liberam ANP) e as células

gastrointestinais. Estas liberam gastrina, que cai na

circulação e depois sobre elas mesmas, liberando

grelina e neuropeptídeo Y. A grelina, o NPYY, a leptina

(dos adipócitos) e a insulina são os controladores do

apetite.

Para efeito de curiosidade, o maior órgão endócrino do

corpo é o endotélio vascular.

Os hormônios são, classicamente, liberados na

corrente sanguínea, exercendo uma função metabólica

em outra célula. Podem ser, novamente, peptídicos,

protéicos e esteróides (derivados de colesterol),

produzidos por tecido neurossecretor ou por glândulas

endócrinas. O tipo de transporte sanguíneo varia

conforme a origem do hormônio. Podem ser degradados no fígado ou nos rins. Logo, alterações

principalmente hepáticas podem influenciar a concentração sanguínea desses hormônios.

O

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168 Endocrinofisiologia

Atuam na homeostasia, na modulação do comportamento, no crescimento e no processo reprodutivo.

Atuam na regulação da disponibilidade energética e na manutenção do meio interno também. A

reprodução também depende, além de estrogênio e progesterona, de T3 e T4. Logo, alterações de tireóide

podem alterar processos gestacionais. Um hormônio nunca atua sozinho numa determinada função.

Efeitos hormonais clássicos:

a) Endócrinos: cai na circulação e age numa célula distante de onde ele foi produzido;

b) Parácrina: a célula libera o hormônio no interstício e ele atua nas células vizinhas

c) Autócrina: atua, via interstício, na própria célula

d) Intrácrino: atua na própria célula sem sair para o interstício.

A cada dia se descobre um novo hormônio, sendo que todos são um pouco diferentes entre si, seja na

origem ou na formação. Vamos agora aos três tipos gerais de hormônios, sendo que cada um tem uma

qualidade de síntese e de secreção:

1. Hormônios protéicos

Os hormônios protéicos são derivados de aminoácidos, e são hidrossolúveis. Um mRNA é formado no

núcleo, migrando para o RER e sintetizando o pré-pró-hormônio, uma molécula enorme, que é depois

clivada em pró-hormônio. Ela é vesiculada e levada ao complexo de Golgi, que junto a outros pro-

hormônios serão levadas em vesículas maiores que, quando necessárias, serão exocitadas para a corrente

sanguínea.

A entrada de cálcio é o principal estímulo para a liberação de vesículas, que serão translocadas até próximo

da membrana plasmática, onde se fundirão. Existem enzimas dentro das vesículas que promoverão

glicosilação e clivagem, por exemplo, convertendo-os de pró-hormônios em hormônios. A terminação sinal

é clivada por essas enzimas; pode ser usada em medidas de níveis hormonais. Uma grande molécula que

perde essa terminação nem sempre forma um hormônio, e sim dois, três ou quatro deles. Um exemplo é a

pró-opiomelanocorticotrofina, gerando um opióide do ciclo circadiano e o ACTH, que estimula a liberação

de corticóides pelo córtex adrenal.

Ao contrário dos hormônios lipídicos, são hidrossolúveis e não estão acoplados a proteínas quando

circulantes no plasma. Temos, geralmente, picos diários desses hormônios. A insulina, por exemplo, é um

hormônio peptídico, liberado nos momentos em que a glicemia aumenta. Outros hormônios fazem parte

do ciclo circadiano, que controla a secreção diária. Também possuem picos de concentração. Sua

degradação é metabólica, sendo excretados na urina ou destruídos no fígado. Como hormônios peptídicos

não atravessam membranas plasmáticas, os receptores têm de ser transmembranosos. Ativam proteínas G,

na maioria das vezes. Estas ativam adenilato cilcases, cálcio-calmodulinas, fosfolipases C ou A2.

A proteína G é um trímero de subunidades α, β e γ. A primeira é a subunidade catalítica, enquanto a

segunda regula a afinidade do receptor. A αi diminui a atividade, enquant a αS é estimulatória. Se for uma

proteína G estimulatória for ativa, a subunidade α se desloca, indo encontrar uma adenilato ciclase na

membrana plasmática. Esta converte ATP em AMPc, que ativa uma proteína quinase A, capaz de fosforilar

diversas proteínas intracelulares de membrana. Se a proteína G for inibitória, a via anterior não progride.

Hormônios que ativam essa via são o ACTH, o FSH, o LH, o glucagon, o PTH, o TSH e a calcitonina.

O glucagon, por exemplo, age sobre o receptor acoplado a proteína GS. Aumenta o conteúdo de AMPc, que

ativa uma proteína quinase A, que fosforila diversas enzimas envolvidas na degradação do glicogênio,

aumentando a disponibilidade de glicose para a corrente sanguínea. Ou seja, se a glicemia começar a cair, o

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Anotações de Fisiologia 169

glucagon estimulará a degradação de glicogênio, liberando glicose para manter os seus níveis plasmáticos

normais.

Outros hormônios ativam a fosfolipase C, que também está ancorada na membrana plasmática. A

subunidade α cliva fosfatidilinositol bifosfato (PIP2) em DAG e inositol trifosfato (IP3). O DAG ativa proteína

quinase C, e o IP3 ativa o retículo endoplasmático, que pela liberação de cálcio provoca a liberação de

vesículas. Hormônios TRH (hormônio hipotalâmico que estimula a liberação de TSH), ADH, LHRH

catecolaminas e ocitocina utilizam a via supracitada.

2. Hormônios esteróides

Praticamente todos derivados do colesterol e seus ésteres. Eles ficam estocados nas células endócrinas,

que depois fabricam os tais hormônios e os liberam na circulação. A maior parte do colesterol para

hormônios provém do LDL, que tem aspecto esbranquiçado. Exemplos são hormônios sexuais,

corticosterona, cortisol e aldosterona. O que determina sua produção será a presença de enzimas que

degradam o colesterol até a finalização do processo.

Corticosterona pode ser feita a partir de progesterona,

desde que a célula tenha a enzima que faça essa reação. A

corticosterona pode se tornar aldosterona, bastando

também ter a enzima necessária. A via biossintética dos

hormônios esteroidais é comum, sendo que enzimas

específicas caminham ao longo dela para gerar hormônios

também específicos.

São moléculas lipossolúveis, necessitando de ligação a

proteínas plasmáticas para circular no plasma. Essas

proteínas são todas sintetizadas no fígado. Estes hormônios,

porém, agem na forma livre. Logo, se alguma situação

aumentar a concentração da forma livre dos hormônios,

maior será o efeito. No entanto, devemos lembrar que

existem mecanismos de feedback negativo ou positivo sobre

os órgãos endócrinos: eles são inibidos pelos hormônios que

produzem, a partir de um certo nível de concentração. Os

tecidos-alvo também podem produzir hormônios inibitórios

quando a atividade desejada tiver sido realizada.

A depuração geralmente é feita no fígado, tanto que

qualquer problema hepático pode levar a algumas

conseqüências. Pacientes com cirrose podem indiretamente

ter ginecomastia, por exemplo. A meia-vida destes hormônios é longa, já que estão ligados às proteínas

plasmáticas.

Como os hormônios esteróides são lipossolúveis, atravessam as membranas plasmáticas, estando seus

receptores no citoplasma ou no núcleo. Estão acoplados a HSP’s ou chaperonas, que os mantêm inibidos.

Quando o hormônio se liga ao receptor, as chaperonas os soltam, e os dois vão ao núcleo modificar a

expressão de um determinado gene. A aldosterona, por exemplo, aumenta a expressão de genes para a

bomba de sódio e potássio nas células tubulares renais, para reabsorver sódio. GH, T3 e T4 agem assim.

Estes dois últimos não são derivados de colesterol, mas o processo de iodização os torna aptos a atravessar

a membrana plasmática assim como os esteróides.

Page 170: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

170 Endocrinofisiologia

Tanto os hormônios peptídicos quanto

os lipídicos possuem mecanismos

regulatórios de feedback, tanto

negativo quanto positivo. Esse último é

exclusivo da ocitocina e do estrogênio

no 14º dia da menstruação. Existem

ainda o up-regulation e o down-

regulation, que modificam o número

de receptores e a sensibilidade dos

mesmos aos hormônios.

Dois exemplos de feedback negativo

são o da insulina e do. A insulina é

inibida quando a concentração de

glicose está alta, não dependendo da

concentração hormonal. (buscar o

outro exemplo)

Eixo hipotálamo-hipófise

É uma associação íntima entre o SNC e o sistema endócrino. Possuem uma ligação vascular (hipotálamo-

hipófise anterior) e uma ligação neural (hipotálamo-hipófise posterior). Existem neurônios hipotalâmicos

com terminações na eminência mediana que liberam hormônios hipofisiotrópicos (tecido neurossecretor),

estimuladores da ação hipofisária. Exemplos são:

a) O CRH, hormônio liberador de corticotrofina, que estimula a produção de ACTH, que estimula a

liberação de hormônios do córtex adrenal e mantém a função do mesmo.

b) TRH, hormônio liberador de tireotropina (TSH). O TSH age na tireóide mantendo o seu tamanho e

regulando a secreção de hormônios T3 e T4.

c) GnRH, liberador de gonadotrofinas (LH e FSH). Ambas agem sobre os ovários, que liberam

estrogênio e progesterona, e sobre os testículos, que liberam testosterona. Assim, regulam o

desenvolvimento, o crescimento, o amadurecimento puberal, os processos reprodutivos e a

secreção dos hormônios sexuais das gônadas de ambos os sexos.

d) GhRH, liberador de hormônio do crescimento. Este (GH) é liberado pela hipófise para todas as

células somáticas. Ajuda a manter a massa corporal magra em adultos, assim como a massa óssea

normal.

e) Somatostatina, que diminui a secreção de hormônio do crescimento.

f) Fator liberador de prolactina (PRF), que estimula a liberação de prolactina pela hipófise; talvez seja

o próprio TRH. A prolactina é o principal hormônio para a liberação de leite, participando também

do desenvolvimento das mamas. Em situações nas quais não há amamentação, a dopamina é o

hormônio dominante nessa sinalização.

g) Dopamina, que inibe a liberação de prolactina.

Os hormônios hipotalâmicos, portanto, atuam em células hipofisárias para a liberação dos hormônios que

controlam diversos processos do organismo. Podem surgir tumores nesses tipos diferentes de neurônios.

A puberdade pode ser influenciada por fatores genéticos e por comportamentos sexuais percebidos na

televisão ou na internet, ou mesmo na convivência diária.

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Anotações de Fisiologia 171

A via de sinalização da prolactina faz uso de um receptor autofosforilativo de tirosina-quinase. Estimula

fatores de transcrição para enzimas lactogênicas, promovendo a síntese de lipídeos e de lactose. O

principal estímulo para a lactogênese começar é o contato da primeira sucção.

A neurohipófise libera, e não sintetiza, ADH e ocitocina.

São sintetizados, repectivamente, nos núcleos supra-

óptico e paraventricular. São levados por neurofisinas

dentro dos axônios até a neuro-hipófise.

A ocitocina é liberada durante o parto, na verdade nos

minutos antecedentes. A ocitocina promove a

contração uterina, para expelir o feto, e o feedback

gerado é positivo, e não negativo. Assim, as

concentrações aumentam mais e mais. Além disso,

estimula a ejeção láctea na amamentação, pelas células

mioepiteliais. A própria sucção mamária estimula a liberação de ocitocina, e de prolactina. Após o parto, as

contrações uterinas continuam em menor escala, para expelir a placenta e os restos da gestação.

A ocitocina é liberada, também, em relações sexuais seguidas de orgasmo. As contrações uterinas

resultantes facilitam a chegada dos espermatozóides. Ela age sobre receptores ligados a proteínas Gs,

ativando fosfolipase C, IP3 e aumento nos níveis de cálcio, que leva à liberação de vesículas.

As ações do ADH podem ser melhor vistas no bloco de nefrofisiologia.

Doença de Graves: é auto-imune. Existe, nela, uma imunoglobulina que estimula constantemente o

receptor de TSH na tireóide, gerando bócio independente de TSH.

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172 Endocrinofisiologia

ANEXO 2 – QUADRO-RESUMO

AULA 36 – HORMÔNIO DO CRESCIMENTO OU SOMATOTROPINA

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Anotações de Fisiologia 173

Professora: Alessandra

m termos de crescimento, o hipotálamo produz os hormônios reguladores GhRH e somatostatina. O primeiro estimula a hipófise anterior a produzir o GH (hormônio do crescimento), enquanto o segundo inibe a produção de GH. Nisso, é interessante dizer que a grelina, liberada pelo estômago, também estimula produção de hormônio do crescimento.

O peptídeo liberador de hormônio de crescimento e a glicemia têm envolvimento com a liberação de GH.

Este vai agir diretamente no tecido muscular, no tecido adiposo e no fígado. Ele estimula síntese protéica e lipólise, o que dá base ao seu uso como anabolizante. Assim, surgiram diversos interessados nos seus efeitos, com finalidade estética. No entanto, quem faz uso descontrolado de GH pode desenvolver esteatose, pelo aumento do número de ácidos graxos circulantes.

O efeito do GH nos ossos é atribuído ao IGF (I e II), pois os pré-condrócitos são estimulados a liberar o IGF (insulin-like growth factor) que estimula o crescimento ósseo. A ação do IGF é parácrina e autócrina. O fígado e os pulmões também produzem IGF (estes últimos em menor escala), que chega até os ossos pelo sangue.

Existem pulsos de liberação de GH ao longo do dia. Você pode ter um pico de liberação ao meio-dia, outro à meia-noite, por exemplo.

O GH não é muito importante para o crescimento fetal. No feto, são mais importantes as IGF’s I e II liberadas pela insulina fetal. A partir da 36ª semana é que GH, T3 e T4 passam a ser importantes. A secreção de hormônio do crescimento atinge seu pico na puberdade; A somatopausa, por sua vez, ocorre ao fim da idade adulta.

Nosso crescimento total não depende só de GH. 30% derivam do GH, enquanto o restante é desencadeado por estrogênio, testosterona e hormônios tireoidianos.

O receptor de GH é ligado a tirosina quinase. Quando ele se liga ao receptor, este ativa a JUNK2, que ativa as STATs, que agem sobre o núcleo.

E

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174 Endocrinofisiologia

Ele aumenta o anabolismo protéico e estimula a atividade da lipase hormônio-sensível, causando quebra de gorduras, a fim de gerar energia. Aumenta também a degradação de glicogênio e a síntese de glicose pelo fígado. Tem efeito diabetogênico, diminuindo a captação de glicose pelas células (através da redução da sensibilidade à insulina).

Alguns livros chamam as IGFs de somatomedinas, sendo que este último nome está caindo em desuso. Independentemente disso, são fatores de crescimento polipeptídicos, que já foram mencionados anteriormente.

Tanto o GH quanto as IGF’s não circulam livremente no sangue, estando estas últimas ligadas às IGFBP. Existem proteases específicas para IGFBP, que também são capazes de estimular a produção de IGF.

O receptor do GHRH está ligado a uma proteína GS, e a somatostatina está ligada a uma proteína GI.

O GH está envolvido também com o crescimento de órgãos. A desnutrição inicialmente promove aumento do GH, mas a desnutrição crônica causa sua queda.

A grelina sinaliza a fome. Se o indivíduo está com fome, ele está com baixa glicemia. Embora os livros falem que é a grelina a responsável , acredita-se que na verdade a hipoglicemia seja a real causa da liberação de GH. De qualquer forma, esse processo permanece uma incógnita.

Alguns fatos:

A L-arginina também é estimulante da liberação de GH.

Andrógenos são os responsáveis pelo fechamento das epífises (puberdade precoce = crescimento rápido inicial, mas no fim, o adolescente fica menor que os normais).

T3 aumenta a sensibilidade dos receptores da adenohipófise pro GHRH.

Alguns distúrbios:

Pan-hipopituitarismo: secreção diminuta de todos os hormônios da adenohipófise anterior. Pode ocorrer pan-hipopituarismo no adulto, por tumor.

Nanismo: geralmente é resultado do pan-hipopituarismo. O pigmeu africano e os anões de Levi-Lorain têm deficiência nos receptores pra IGF.

O gigantismo é decorrente de tumor nas células somatotróficas antes da adolescência. Ocorre excesso de GH ou IGF’s. Mesmo com o excesso de GH, o indivíduo não ultrapassa 2,4 m. Já a acromegalia acontece quando o tumor surge após a adolescência.

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Anotações de Fisiologia 175

AULA 37 – TIREOIDE E PARATIREOIDE

Professora: Ivanita

s hormônios tireoideanos participam de processos vitais do organismo, tendo como funções

básicas a regulação do metabolismo geral e da diferenciação/crescimento celular. Também fazem

parte da regulação térmica corporal, da maturação do sistema nervoso central e da regulação do

sistema cardiovascular. A interferência na temperatura corporal foi comprovada mediante

pesquisa em camundongos com gene para hormônios tireoideanos, sendo colocados em ambientes frios.

Os do grupo controle sobreviveram, enquanto os “nocauteados” não suportaram.

São dois os hormônios tireoideanos, a triiodotironina (T3) e a tiroxina (T4). A tireoide secreta muito mais T4

que T3 (numa proporção aproximada de 9:1), sendo que 1% da secreção é do chamado T3 reverso, uma

forma inativa. Eles também são armazenados nessa mesma proporção. O efeito do T3, no entanto, é muito

mais potente que o do T4. As meias-vidas plasmáticas de um e de outro são, respectivamente, de um dia e

de sete dias.

A síntese dos hormônios tireoideanos é realizada pelas células epiteliais foliculares, nos chamados folículos

tireoideanos. Dentro deles, fica o colóide, um composto de hormônios tireoideanos ligados à tireoglobulina

(TBG). Na verdade, a TBG se liga a cerca de 70% dos hormônios tireoideanos, enquanto o resto deles se

divide entre transtiretina (TTR) e albumina, sendo que apenas uma minoria (3%) está ligada a lipoproteínas.

A TBG mantém um grande reservatório circulante de T4, que tampona alterações agudas na função

tireoideana.

Esta síntese tem três aspectos básicos:

é necessária uma grande quantidade de

iodo a ser fornecida pela dieta, nossa

única forma de obtenção de iodo. No

Brasil, a partir de 1954, o sal de cozinha

é iodado, o que diminuiu muito os

índices de hipotereoidismo. Em alguns

países distantes do mar, no entanto, o

problema persiste. Em segundo lugar, a

síntese hormonal é parcialmente

intracelular e extracelular, ocorrendo a

partir de aminoácidos e dando origem a

hormônios lipofílicos. O

armazenamento ocorre no colóide. O

terceiro aspecto é o predomínio do T4,

sendo que este não é a forma mais

ativa de hormônio tireoideano.

Dentro do folículo, a tireoglobulina é

sintetizada. Simultaneamente, ocorre

simporte de sódio e de iodeto, pelo

transportador NIS, graças a um gradiente criado pelas bombas de sódio e potássio. Em seguida, o iodeto é

oxidado a iodo molecular, na presença de peróxido de hidrogênio, a fim de ser organificado em

O

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176 Endocrinofisiologia

monoiodotirosina (MIT) e diiodotirosina (DIT). Ambos sofrem uma reação de acoplamento entre si,

formando T3 (MIT + DIT) ou T4 (DIT + DIT). No fim, DIT, MIT, T3 e T4 ficam ligados à TBG dentro do colóide.

Essa TBG ligada pode ser endocitada, conforme ilustrado pela figura, em que os componentes ligados são

separados, indo T3 e T4 para a circulação, enquanto MIT e DIT perdem seu iodo (atividade da enzima

deiodinase). A tirosina de ambos também é reciclada.

A regulação da síntese de hormônios tireoideanos vem do eixo hipotálamo-hipófise. Primeiro, o hipotálamo

sintetiza TRH, que estimula a síntese de TSH na adeno-hipófise. O hormônio tireoestimulante (ou TSH) age

aumentando a síntese dos hormônios tireoideanos, como já se sabe. Seu mecanismo de ação consiste na

ligação a um receptor acoplado a uma proteína G, que acaba por aumentar os níveis intracelulares de

AMPc , fosfatidilinositol e cálcio. Aumenta a síntese de material genético e a transcrição de proteínas nas

células foliculares, assim como seu tamanho e número. De uma forma geral, todas as etapas da síntese de

hormônios tireoideanos são estimuladas. No fim, há um mecanismo de feedback negativo e positivo para a

síntese destes hormônios.

Uma pessoa com grande quantidade de tecido adiposo tem grande liberação de leptina, a qual age nos

núcleos paraventricular (neurônios sintetizadores de TRH) e arqueado (hormônios anorexígenos),

aumentando a liberação de TRH e, por consequência, de TSH. Assim, há maior liberação de T3 e T4, que

acabam inibindo, por feedback negativo, a produção de leptina e de sinais anorexígenos, levando à

predominância de sinais orexígenos. Assim, o hipertireoidismo leva a aumento do apetite.

A auto-regulação dos hormônios tireoideanos é ativada pela diminuição na quantidade de iodeto

circulante, sendo diminuída pelo aumento da mesma. Esse fenômeno auto-regulatório é conhecido como

efeito de Wolff-Chaikoff. Em casos de hipertireoidismo, administra-se iodo para que, a fim de evitar uma

cirurgia, a atividade da tireóide diminua.

Em casos de insuficiência hepática, há menor síntese de TBG, albumina e transtiretina, permitindo aumento

da concentração de T3 e de T4 livres no sangue. A síntese de TSH pela hipófise é inibida, o que

posteriormente diminui a síntese dos próprios T3 e T4. Já na gravidez ou num tratamento com estrogênio,

a síntese de TBG está aumentada, o que diminui a quantidade de T3 e de T4 livres, provocando uma

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Anotações de Fisiologia 177

situação inversa à citada anteriormente. A TBG, além de formar um reservatório que tampona alterações

bruscas nas concentrações de T4, também previne a perda excessiva dele e de t3 na urina.

Como agem, então, os hormônios tireoideanos nas células?

Eles não agem na membrana,

atravessando-a e interagindo com

receptores intranucleares. Suas

ações, portanto, são genômicas.

Dentro das células, T4 é convertido

a T3 por uma enzima deiodinase,

ligando-se depois ao tal receptor

nuclear, estimulando a transcrição

gênica e síntese de componentes

da cadeia respiratória, sódio-

potássio ATPases, entre outros.

Como resultado, tem-se aumento

do metabolismo e do consumo de

oxigênio, com redução da

resistência vascular periférica e

aumento do débito cardíaco. A

freqüência cardíaca também é

aumentada, assim como a força

contrátil (por aumento do número

de receptores β-adrenérgicos). Há

também maior captação de cálcio e

maior atividade da SERCA,

provocando efeitos lusitrópico e

cronotrópico positivos. A

fosfolambam é inibida.

No metabolismo, além do consumo de oxigênio, a produção de calor também aumenta bastante, graças à

maior expressão dos genes para proteínas descopladoras, ou UCP’s. Este efeito é ausente no cérebro, nas

gônadas e no baço. Aumentos de temperatura não são ilimitados, visto que mecanismos compensatórios

de sudorese, fluxo sanguíneo e respiração mantêm a mesma numa determinada faixa.

A lipólise e a glicólise são aceleradas, assim como a reciclagem de seus metabólitos. A síntese de alguams

proteínas, assim como a degradação de outras, é estimulada. Existe um aumento da quantidade de

aminoácidos livres. As ações de catecolaminas, hormônio do crescimento e glucagon são potencializadas, o

que aumenta a taxa de processos por eles estimulados. Hormônios tieroideanos também aumentam a

síntese de colesterol e a liberação do mesmo na bile, levando a um decréscimo na concentração de LDL.

A freqüência respiratória em repouso é acelerada, assim como o fluxo respiratório. Isso porque se produz

mais CO2 numa taxa metabólica aumentada. Há leve aumento do hematócrito, graças a uma estimulação

da síntese de eritropoietina nos rins.

Os hormônios tireoideanos são muito importantes para o desenvolvimento fetal, tanto neurológico quanto

esquelético. O crescimento ósseo, em todos os sentidos, é estimulado, inclusive nos processos de

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178 Endocrinofisiologia

remodelação. Quantidades insuficientes de T3 e de T4, portanto, pode levar ao cretinismo, com retardo

mental irreversível e pouca estatura.

No sistema nervoso central, depende deles a maturação e o desenvolvimento. Em crianças, conforme dito

antes, a sua falta provoca cretinismo, enquanto em adultos provoca letargia. Um excesso leva à

irritabilidade. O SNC também aumenta sua liberação de catecolaminas e o número de receptores β-

adrenérgicos.

PARATIREÓIDE E SEUS HORMÔNIOS

Professora: Ivanita

As glândualas paratireóides liberam paratormônio (PTH), secretado pelas células principais. Ele regula a

concentração de cálcio na circulação. Se esta diminui, a síntese de PTH aumenta, e a situação retorna ao

normal, mantendo a concentração de cálcio numa faixa estreita e bem controlada.

Com uma concentração sanguínea de 10 mg/dL, o cálcio está sujeito a aumentos e diminuições na sua

quantidade. São circunstâncias conhecidas como hipo- e hipercalcemia. Elas ocorrem em função de

alterações na concentração de proteínas plasmáticas, de ânions e por distúrbios ácido-básicos. Isso porque

o cálcio do sangue possui uma fração livre (unida a fosfatos e sulfatos) e outra ligada a proteínas. Um

exemplo de distúrbio seria a alcalose respiratória, capaz de levar à hipocalcemia e, por conseqüência, à

tetania.

Voltemos agora ao paratormônio, um polipeptídeo sintetizado inicialmente como pré-pró-PTH, sendo

processado como pró-PTH no RE e depois como PTH no complexo de Golgi. A conversão ocorre toda antes

da secreção, diferentemente de hormônios como a insulina. Para que essa secreção seja estimulada,

existem receptores sensíveis ao cálcio (CaSR), que em situações de hipocalcemia aumentam a síntese de

PTH (param de inibi-la). Normalmente, estimulam proteínas GS ligadas a adenilato-ciclases, convertendo

ATP em AMPc, o que resulta em cascatas de fosforilação que impedem aumento da síntese de PTH.

Enquanto situações de hipocalcemia crônica aumentam o tamanho das paratireóides, a hipercalcemia

crônica acaba por liberar fragmentos inativos de PTH. Assim, mecanismos de compensação estão ativos em

ambos os casos.

O PTH age, principalmente, em ossos, rins e intestino, sendo que neste último sua ação é indireta. Nos rins,

aumenta a absorção de cálcio no túbulo contorcido distal, ao mesmo tempo em que inibe a absorção de

fosfato no túbulo contorcido proximal. Afinal, as células necessitam de cálcio livre, não ligado ao fosfato. O

PTH também estimula a síntese de vitamina D nos rins, a fim de que esta aja sobre a absorção intestinal de

cálcio, aumentando-a. Assim, proteínas como a calbindina e a calmodulina tornam-se mais numerosas

dentro das células intestinais, ligando-se a mais íons cálcio e impedindo a saída dos mesmos. Em resumo:

nos rins e nos ossos, a ação do PTH é direta, mediada por AMPc, enquanto é indireta no intestino, a partir

da vitamina D.

Nos ossos, mais especificamente, o PTH estimula a maturação de osteócitos e a formação de osteoclastos,

de forma que o uso de cálcio para síntese de MEC diminua e que a reabsorção desta aumente. O colágeno

tipo I da própria MEC também é reabsorvido, sendo que a hidroxiprolina é liberada na urina. Torna-se,

portanto, um bom indicador da ocorrência de reabsorção óssea.

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Anotações de Fisiologia 179

PARTE 3 – METABOLISMO DE CÁLCIO E FOSFATO

Professora: Ivanita

A calcitonina é um peptídeo de 32 aminoácidos sintetizado pelas células parafoliculares ou C das glândulas

tireóides, sendo sintetizada inicialmente como pré-pró-calcitonina. O principal estímulo para a sua secreção

se dá pelo aumento da concentração extracelular de cálcio iônico. Se recapitularmos a seção anterior desta

aula, veremos que seu efeito é antagônico ao do PTH, estimulando o armazenamento de cálcio nos ossos.

Basicamente, a calcitonina diminui a atividade absortiva dos

osteoclastos, além da formação desse tipo celular. Assim,

menos cálcio é movimentado para fora dos ossos,

desequilibrando o equilíbrio natural nas trocas deste íon com

o meio extracelular. Mais cálcio será depositado nos ossos.

Nos adultos, diferentemente dos jovens, o efeito da

calcitonina é pouco pronunciado. Isso se deve a uma

predominância do controle por parte do PTH e à redução nas

taxas de deposição e reabsorção de cálcio nos ossos. Uma

exceção é a doença de Paget, na qual a atividade

osteoclástica é intensa, e o controle da calcitonina se faz

necessário.

Agora, verificaremos o papel da vitamina D no metabolismo do cálcio e do fosfato. Junto ao PTH, é o

segundo hormônio responsável pela regulação instantânea da concentração destes íons, mantendo a

concentração de cálcio dentro dos níveis normais. No caso,

a vitamina D acelera a absorção intestinal de cálcio e a sua

reabsorção dos ossos, ao mesmo tempo em que estimula a

mineralização óssea.

A vitamina D, no entanto, não é a substância ativa. Apenas

sofre reações no fígado e nos rins. Antes disso, devemos

saber que é sintetizada na pele, a partir do colesterol: o 7-

desidrocolesterol é convertido, pela luz ultravioleta, em

colecalciferol (vitamina D3), que no fígado será convertida a

25-hidroxicolecalciferol. Este último processo é regulado

por um importante sistema de feedback. Nos rins, este

produto é convertido a 1,25-diidroxicolecalciferol (nos

túbulos proximais). Essa conversão requer a presença do

PTH. Pode haver formação de 24,25-diidroxicolecalciferol,

que é inativo.

Se a concentração de cálcio estiver normal, mais 24,25-

diidroxicolecalciferol será sintetizado. Se houver pouco

cálcio no líquido extracelular, o composto em sua forma

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180 Endocrinofisiologia

ativa é mais produzido. Para a sua síntese, é utilizada uma enzima 1α-hidroxilase, que necessita, conforme

dito antes, da presença do PTH.

No intestino, a vitamina D aumenta a expressão de canais de cálcio TRPV e de moléculas de calbindina, que

se ligam a 4 íons cálcio cada uma, no citoplasma dos enterócitos. Nos ossos, aumenta a reabsorção de

cálcio e de fosfato nas porções mais velhas, enquanto nas porções em remodelação estimula a

mineralização. O efeito da vitamina D parece estar mais relacionado, porém, à sua concentração no sangue:

se for muito alta, provoca reabsorção. Caso esteja baixa, estimula mineralização.

Em crianças, a falta de vitamina D leva ao raquitismo, caracterizado por falhas de crescimento e

deformidades ósseas. Pode haver até tetania. Já a deficiência de vitamina D em adultos provoca

osteomalacia.

Já na resistência a vitamina D, o rim é incapaz de

gerar 1,25-diidroxicolecalciferol, possivelmente

por falta de 1α-hidroxilase.

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Anotações de Fisiologia 181

AULA 39 – HORMÔNIOS ADRENAIS

Professora: Alessandra

porção da medula adrenal, conforme visto antes, é formada por tecido neurodérmico, ou seja,

uma especialização dos gânglios simpáticos. 80% da secreção é de adrenalina, e 20% de

noradrenalina, ambos já estudados na seção de SNA. Já a porção externa é formada pelo córtex

adrenal, derivado do mesoderma. Ali, são produzidos especialmente glicocorticóides, mineralocorticóides a

androgênios. Os dois primeiros serão o foco da aula.

Dividimos o córtex adrenal em zonas glomerulosa, fasciculada e reticulada. Todas elas têm verdadeiros

vacúolos lipídicos, que armazenam ésteres de colesterol em seu interior (a partir do LDL). As zonas formam

seus hormônios a partir desses ésteres de colesterol, sendo que as enzimas específicas de cada uma fazem

surgir os diferentes hormônios. Elas derivam do citocromo p450.

A

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182 Endocrinofisiologia

O LDL é captado e esterificado, sendo armazenado em vacúolos. Em baixos níveis de LDL circulante, pode-

se fazer colesterol a partir do acetato. As enzimas da zona glomerulosa, por exemplo, transformam o

colesterol em pregnenolona, tornando-se progesterona, desoxicorticosterona, corticosterona e

aldosterona. Isso tudo em sequência, sob ação de enzimas difernetes.

Aldosterona

A aldosterona é liberada em função do estímulo por angiotensina II. O esquema acima esclarece os

diferentes caminhos tomados pelos ésteres de colesterol, com as enzimas que interferem nesses caminhos.

Estímulos como redução de pressão arterial, menor captação de sódio na mácula densa e estimulação β-

adrenérgica fazem com que as células justaglomerulares produzam renina, convertendo angiotensinogênio

do fígado em angiotensina I, que é convertida pela ECA em angiotensina II. Via receptores AT1 da zona

glomerulosa, essa angiotensina II aumenta os níveis de cálcio intracelulares (pela via intracelular da PKC),

ativando enzimas aldosterona sintase. Assim, a corticosterona é transformada em aldosterona. A síntese de

aldosterona possui etapas intramitocondrial, no retículo endoplasmático e no citoplasma. Dentro das

mitocôndrias, há enzimas como a p450, transformando o colesterol em pregnenolona, que vai ao REL para

se tornar progesterona.

O ANP (peptídeo natriurético atrial) inibe a produção de aldosterona, pela redução nas concentrações de

AMPc e de sódio. Aumentos da concentração de potássio e de ACTH no plasma, ao contrário, aumentam a

sua síntese. Os receptores para aldosterona têm grande homologia com os de glicocorticóides, ou seja, são

intracitoplasmáticos e nucleares. É interessante destacar que em situações de hiperaldosteronismo, a

aldosterona pode se fixar tanto a receptores de glicocorticóides quanto de mineralocorticóides; o mesmo

vale para o cortisol.

A aldosterona circula ligada a proteínas do fígado, como a

CBG (globulina ligadora de corticosteróides) e albumina. Sua

meia-vida, determinada pelo receptor e pelas vias

intracelulares pós-receptor, é de 15 a 25 minutos. Sua

excreção se dá pela conjugação com ácido glicurônico ou

sulfatos, sendo eliminada na urina.

O principal efeito da aldosterona é aumentar a reabsorção de

sódio, principalmente no túbulo contorcido distal e nos

ductos coletores, em situações de hipovolemia ou queda de

pressão arterial. Isso se dá pela maior expressão gênica para

sódio-potássio ATPase, enviando mais potássio aos túbulos e

mais sódio aos capilares peritubulares. A carga de soluto é

aumentada, e por osmose aumenta também a volemia. Essa

via tem sua atividade diminuída pelos níveis maiores de ANP,

ADH e outros.

OBS.: no hiperaldosteronismo, o indivíduo pode entrar em

alcalose. O excesso de glicocorticóides pode promover

hipertensão, pelos mecanismos de aumento da volemia citados acima.

Nas zonas fasciculada e glomerulosa, predominam os glicocorticóides e os androgênios, respectivamente.

Nos homens, essa fonte de andrógenos é menos importante, predominando os testículos. Estas duas zonas

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Anotações de Fisiologia 183

respondem diferentemente ao ACTH, visto que a glomerulosa só responde a ele em maiores concentrações

no plasma.

Cortisol e similares

O cortisol tem em sua via de síntese a cortisona, que pode se transformar novamente em cortisol. Este

circula no plasma ligado a proteínas hepáticas, estando apenas uma pequena fração na forma livre.

Devemos lembrar que os hormônios esteróides possuem um reservatório circulatório. Enquanto hormônios

peptídicos e protéicos podem ficar em grânulos e vesículas dentro das células, os esteróides não são

guardados assim. No caso do cortisol, 75% a 80% vão ligados à transcortina, 15% à albumina e 5 a 10% vão

livres. Sua meia-vida é de cerca de setenta minutos, sendo depois metabolizado no fígado. A disfunção

hepática, portanto, pode alterar a influência dos hormônios sobre o organismo.

A regulação do cortisol, e de uma parte da aldosterona, é

pelo estímulo do ACTH, liberado na hipófise por estímulo

do CRH (produzido no hipotálamo). A própria regulação

circadiana gera picos e reduções de secreção ao longo do

dia. O pico se dá às 8 horas da manhã. Hipoglicemia,

infecções, stress, calor, frio e dor aumentam a secreção de

CRH.

O CRH, ao estimular a adenohipófise, provoca síntese e

hidrólise de POMC (proopiomelanocortina), gerando MSH,

β-endorfina (diminuindo a dor), β-lipotrofina e ACTH.

Quando o CRH estimula o ACTH, ele cai na circulação e

atua nas adrenais por receptores acoplados a proteínas Gs,

ativando vias de adenilato-ciclase. O AMPc ativa vias da

PKA, que ativa enzimas que convertem colesterol em

pregnenolona. Além disso, este hormônio estimula fatores

de crescimento, tendo ação trófica sobre as adrenais em

locais específicos.

Aumentos nos níveis plasmáticos de ACTH aumentam o

tamanho das adrenais, em longo prazo. Agudamente, ativa

todas as vias biossintéticas dos hormônios esteroidais.

A médio prazo, possui uma atuação genômica,

aumentando a transcrição gênica para enzimas do

citocromo p450 e para receptores de LDL.

O cortisol, ao ser liberado por estímulo do ACTH, liga-se a uma proteína circulante, indo atuar em células

como receptor para ele. Quase todas as células do corpo possuem esses receptores, que ativam vias ligadas

à função de cada tipo celular. Este hormônio atua no sistema imune, sendo imunossupressor; no fígado,

provocando gliconeogênese; nos músuclos, aumentando o catabolismo protéico; no tecido adiposo,

estimulando lipólise em alguns pontos e lipogênese em outros. O uso prolongado de corticosteróides

sintéticos diminui a gordura nos membros, e aumenta o percentual de gordura central.

O estímulo à gliconeogênese no fígado diminui o uso de glicose pelas células, além de diminuir a ação de

insulina nos tecidos periféricos. O efeito final é hiperglicemiante, útil no estado de jejum. Por isso, é útil

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184 Endocrinofisiologia

termos um pico de cortisol quando

acordamos. Indivíduos que usam cortisona em

longo prazo podem desenvolver diabetes

adrenal, reversível ou não, pela hiperglicemia

constante.

O balanço final no metabolismo protéico dos

músculos é catabólico, diminuindo o

anabolismo. Aumenta a síntese de proteínas

pelo fígado, e também a concentração de

aminoácidos circulantes.

No metabolismo lipídico, aumenta a lipólise no tecido adiposo de braços e pernas. Na região central do

tronco, o seu efeito é lipogênico. Por isso, a obesidade de usuários crônicos de corticosteróides é central.

No fígado, o excesso de ácidos graxos sanguíneo pode se refletir em esteatose.

No metabolismo mineral, provoca osteopenia e osteoporose, pois há ação inibitória sobre os osteoblastos.

Crianças não podem usar corticóides por mais do que alguns dias, sob o risco de afetar o crescimento. A

ação do cortisol é antagônica à do PTH, inibindo a absorção intestinal de cálcio e aumentando sua excreção

renal.

O efeito imunossupressor do cortisol é o mais citado. Na sua ausência, o corpo reagiria de forma excessiva

aos agentes inflamatórios: ele permite um equilíbrio. Estimula a síntese de lipocortina, inibidora da via da

fosfolipase A2, principalmente a porção que fica sob ação da COX 2, induzida. Assim, além de diminuir os

produtos da via da COX 2, diminui a liberação de enzimas lisossomais no local da lesão, a expressão de

moléculas de adesão, a liberação de histamina e a proliferação de fibroblastos, que depositariam fibrilas.

As prostaglandinas (PGI2), pertencentes ao grupo dos eicosanóides, estimulam a secreção de muco rico em

bicarbonato que reveste nosso estômago. Com o uso de corticóides, a produção de muco diminui,

predispondo o paciente a úlceras gástricas. É necessário usar um inibidor da bomba de hidrogênio, como

pantoprazol ou omeprazol, junto aos corticóides. Elas também estão envolvidas na hiperalgesia, na

vasodilatação e na vasoconstricção (dependente do local), além da broncoconstricção.

Quando há transplantes, o organismo receptor produziria uma resposta imune muito forte, não fosse o uso

de corticóides como imunossupressores. Em crises asmáticas e alergias, há broncoconstricção, que pode

ser inibida também por cortisol.

Este hormônio modula ações emocionais e facilita a formação de surfactante pelos pneumócitos tipo II

(sendo inclusive utilizado em recém-nascidos prematuros). Os efeitos cardíacos são ao aumento do número

de receptores β-adrenérgicos no coração e no tecido vascular, mantendo a pressão arterial e o volume

sanguíneo. O excesso de cortisol pode elevar, portanto, a pressão arterial. Usuários de glicocorticóides em

longo prazo podem ter hipertensão arterial. O hipocortisonismo, pelo contrário, acaba por diminuir o tônus

vascular, provocando hipotensão.

Andreogênios corticais

Produzidos pela zona reticulada, os DHEAs começam a aparecer na circulação aos 6 anos de idade

(adrenarca). Contribuem para o início da menarca, sendo menos importantes nos homens.

Os precursores androgênicos são os DHEAs e a androstenediona. Podem ser convertidos perifericamente,

no tecido adiposo, em androgênios ativos. Respondem por cerca de 50% do androgênio circulante nas

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Anotações de Fisiologia 185

mulheres. Essa fonte hormonal dá origem à distribuição de pêlos: seu excesso pode produzir

masculinização. A hiperfunção da supra-renal, então, pode produzir masculinização.

Os hormônios androgênicos circulam ligados a proteínas carreadoras, β-globulina, albumina (cerca de 40%),

SHBG (globulina de ligação a hormônios sexuais) e também na forma livre (cerca de 1%). É interessante

destacar que peso, resistência a insulina e a hiperinsulinemia alteram a quantidade de SHBG.

A dehidroepiandrosterona, DHEA, é cem vezes menos potente que a testosterona. Nas mulheres, provoca o

crescimento de pelos púbicos e axilares, além de manter a libido. Já os homens têm, por sua ação, o

desenvolvimento dos órgãos sexuais.

Síndrome de Cushing

Causada por uma hiperfunção do ACTH, o

que influencia positivamente a síntese de

cortisol e de androgênios. Isso leva a uma

obesidade central, com perda de massa

muscular e de tecido adiposo nos membros,

além do crescimento de pêlos na face. Há

manchas na pele, visto que aumenta a

produção de MSH junto à do ACTH. A face é

em lua, ou seja, o rosto está inchado, e a

suceptibiliade a infecções aumenta.

No aldosteronismo primário

Adenomas de zona glomerulosa podem

causá-lo. As absorções de sódio e de água

aumentam muito, levando a edemas

principalmente abdominais. Pode haver

também insuficiência cardíaca, pois a

aldosterona estimula indiretamente (por

aumento da volemia) e diretamente a

hipertrofia cardíaca a longo prazo. A

hipertensão maligna pode ser causada por

hiperaldosteronismo.

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186 Endocrinofisiologia

AULA 40 – HORMÔNIOS REPRODUTIVOS FEMININO E MASCULINO

Professora: Alessandra

té a quarta ou quinta semanas de gestação, as gônadas são indiferenciadas. A partir dali, os

organismos com cromossomos sexuais XX dão origem a ovogônias, circundadas por células da

granulosa e da teca. Não haverá liberação de androgênios nem de hormônio antimülleriano, dando

origem ao trato genital feminino. No homem, XY, o contrário ocorre, dando origem ao trato genital

masculino. Percebe-se, então, que a ausência de hormônio antimülleriano é a chave para a diferenciação

das gônadas, permitindo a permanência dos ductos de Müller nas mulheres e, ao contrário, dos de Wolff

nos homens.

A liberação de GnRH pelo hipotálamo estimula a liberação de FSH e LH na hipófise. Nas mulheres, estes

dois hormônios levam à oogênese e à liberação de hormônios sexuais; nos homens levam à

espermatogênese e ao resto que é o mesmo processo.

No período reprodutor adulto, há liberação pulsátil de GnRH pelo hipotálamo. Essa pulsatilidade dá entrada

à puberdade. Tanto nos homens quanto nas mulheres, e principalmente nestas últimas, há determinação

genética para o início da puberdade. No entanto, fatores ambientais podem antecipá-la, como a exposição

de crianças às diferentes exibições da mídia, ou à presença masculina constante desde um ponto que não a

primeira infância. Disfunções da adenohipófise ou até mesmo hipotalâmicas podem diminuir a secreção

dos hormônios sexuais.

O fechamento de epífises pode ser influenciado pela liberação de hormônios sexuais, sendo que a

puberdade precoce resulta em um indivíduo mais baixo em estatura no futuro.

O LH e o FSH iniciam a produção de testosterona no homem, o crescimento testicular, o crescimento de

órgãos acessórios e o surgimento de caracteres sexuais secundários. Nas mulheres, provomem o

crescimento ovariano, a secreção de estradiol e progesterona, o surgimento de órgãos acessórios e de

características sexuais secundárias.

O número de folículos ovarianos já é definido durante o desenvolvimento dos ovários. O tempo de vida

reprodutiva, portanto, já está definido. Nos homens, porém, a espermatogênse dura a vida inteira. A

principal função dos folículos é fornecer nutrientes para o desenvolvimento dos oócitos, e de liberar

hormônios para preparar o aparelho rerodutor feminino para uma possível gravidez. Em caso de gravidez, o

folículo é o gerador da função hormonal, até que a placenta entre em ação.

Na gestação aparecem os folículos primordiais. No nascimento, há cerca de 300000 folículos. Na primeira

menarca, porém, e a partir do ciclo menstrual, vários folículos são necessários, mesmo que só um seja

viável. A mulher ovula cerca de 450 vezes ao longo de sua vida. O tabagismo diminui a reserva de folículos,

assim como desbalanços que levam a duas ovulações por mês.

Durante toda a infância, os folículos permanecem na forma primordial. Depois, começam a evoluir para

folículos primários, com células granulosas cubóides que liberam nutrientes para o oócito). Nos folículos

secundários surgem o estroma e as células da teca, estando as células granulosas em várias camadas. Nos

folículos dominantes, as células granulosas têm receptores para FSH (estimulando o crescimento do

folículo), e as da teca têm receptores de LH (para estimular a produção de androgênios). Alguns folículos

têm mais receptores, dominando o ciclo mentrual. Os outros com menos receptores sofrem atresia.

A

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Anotações de Fisiologia 187

As células da teca sofrem ação do LH, estimulador de uma cascata intracelular para a biossíntese de

hormônios esteroidais. A androstenediona se difunde para dentro das células granulosas, e é transformada

em 17-β-estradiol (por influência do FSH), o principal estrogênio da mulher, pela enzima 17-β-HSD

(aromatase). A síntese de estrogênio pelas células granulosas, portanto, depende das células da teca e dos

hormônios FSH e LH.

No folículo desenvolvido, as células granulosas suprem os oócitos. Preparam as trompas e o útero para o

momento da fertilização. Estes folículos liberam, depois, os oócitos, e formam uma massa de células

produtoras de progesterona em caso de gravidez.

Para que haja ovulação, é necessário um pico ou um surto de LH. Num ciclo comum, de 28 dias, os

primeiros sete dias são marcados pelo desenvolvimento de vários folículos dominantes. A partir daí,

predomina o folículo com mais receptores para LH e FSH. De 7 a 14 dias, a fase é predominantemente

estrogênica. O folículo cresce ainda mais, os níveis plasmáticos de estrogênio sobem e, ao invés de um

feedback negativo, geram um feddback positivo sobre o hipotálamo. Isso provoca um pico de LH no 14º

dia, o que rompe o folículo dominante e provoca a liberação do óvulo (o chamado surto ovulatório). O

rompimento da parede do folículo é possível graças à liberação de citocinas inflamatórias e enzimas

hidrolíticas pelas células da teca e da granulosa.

As células foliculares remanescentes formam o corpo lúteo (amarelo, pelos depósitos de colesterol), que

secretará progesterona, e mantenerá sua secreção em caso de gravidez. A fase folicular é marcada, então,

pela liberação de progesterona pelo corpo lúteo, mantendo as camadas endometriais formadas, para a

sustntação de um eventual feto. Esta manutenção permanecerá por 14 dias, degenerando-se caso não haja

gestação (por queda dos níveis de progesterona). Depois disso, haverá outro ciclo ovulatório.

A progesterona aumenta a temperatura corporal na mulher, sendo que uma medida imprecisa para marcar

a ovulação e chance de engravidar é a medição da temperatura intravaginal. No meio do ciclo está o único

feedback positivo. Nos outros pontos, o feedback é negativo. Estrogênio, progesterona e inibinas (liberadas

pelas células granulosas e pelos testículos) diminuem a liberação de FSH e LH.

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188 Endocrinofisiologia

No sentido de preparar a mulher

para a fertilização, preparam as

camadas endometriais, ajudam a

formar e a manter as

caracterísiticas sexuais

secundárias, aumentam o

anabolismo protéico, diminuem

os níveis de colesterol no

sangue. Logo, o estrogênio tem

um efeito vasoprotetor: após os

50 anos, é normal haver

deposições de placas

ateromatosas; a entrada das

mulheres na menopausa diminui

a liberação de hormônios

sexuais femininos, com perda do

efeito protetor proporcionado

pelo estrogênio. Para que isso

seja evitado, faz-se reposição

hormonal.

Já a progesterona mantém o

endométrio hipertrofiado, e

ajuda a preparar as mamas para a amamentação. Por isso, na segunda fase do ciclo mestrual, as mamas

ficam mais doloridas. A relaxina, liberada pelo corpo lúteo, inibe contrações da musculatura lisa do útero,

durante a gravidez. Já a inibina, liberada pelo corpo lúteo, faz o feedback negativo na segunda parte do

ciclo mentrual.

Outras ações que independem de gravidez:

Na puberdade e na adolescência, estrogênio e progesterona promovem crescimento dos órgãos sexuais

externos e das mamas, crescimento dos quadris e dos ossos longos, surgimento de pêlos, deposição típica

de gordura e, por fim, libido. Na menopausa, provoca falência dos ovários e das suas secreções: a

menstruação é interrompida.

A reposição hormonal é uma espécie de “faca

de dois gumes”, visto que em tabagistas

aumenta bastante o risco de infartos. No

entanto, o mecanismo para essa constatação

é desconhecido. Alguns repositores, no

entanto, aumentam a produção de NO,

provocando efeito vasodilatador e

prevenindo infartos.

Pessoas que tiveram câncer no aparelho

reprodutor feminino não são aconselhadas a

fazer reposição hormonal, pois o estrogênio

provoca crescimento das células nesse

aparelho. No câncer de mama, a

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Anotações de Fisiologia 189

progesterona estimula células glandulares a se proliferar.

Por que a pílula inibe a ovulação? Os níveis constantes de estrogênio e progesterona impedem o feedback

positivo que promove a ovulação. Aumentam líquidos, facilitam trombose, reduzem a libido, entre outros

efeitos. Os óvulos não-liberados sofrem atresia. Alguns antibióticos podem diminuir a eficácia das pílulas,

assim como remédios para emagrecer.

PARTE 2 – APARELHO REPRODUTOR MASCULINO

Os testículos têm de ser mantidos dois graus abaixo da temperatura corporal, a fim de manter a

espermatogênese. Pessoas que nascem com os testículos dentro da cavidade abdominal (condição

conhecida como criptorquidia) têm problemas de fertilidade.

Nos túbulos seminíferos, o sistema hormonal é criptócrino, ou seja, funciona dentro de um tubo fechado.

Com o início da adrenarca, a diferenciação de espermatócitos primários em secundários tem início,

chegando às configurações de espermátide e espermatozóide. A espermátide forma uma cauda e um

acrossomo, no processo da espermiogênese. Na zona intermediária, há grandes quantidades de

mitocôndrias, para gerar energia suficiente para a movimentação do flagelo.

Há muitos canais de cálcio no flagelo, junto com filamentos de actina e miosina: há grande demanda por

locomoção. No epidídimo, essa capacidade é adquirida, num processo conhecido como capacitação.

Enzimas liberadas pela próstata diminuem a quantidade de colesterol dos espermatozóides, para que

nadem ainda mais rápido.

No líquido prostático, existe uma grande quantidade de prostaglandina, com efeito vasoconstritor. Isso

para que, na mulher, as camadas endometriais se contraiam e facilitem a subida dos espermatozóides até

as tubas uterinas.

O SNA parassimpático mantém a vasodilatação peniana e a ereção, além da produção de muco pelas

glândulas bulbouretrais (com função de limpeza da uretra e lubrificação). O SNA simpático promove

contração prostática, da vesícula seminal, do ducto deferente, da ampola e dos músculos isquiocavernoso e

bulbocavernoso, permitindo a ejaculação.

O Viagra trabalha na base da liberação de NO. (detalhar)

O LH estimula as células de Leydig a produzir testosterona, que tem um efeito parácrino sobre as células de

Sertoli, aumentando a espermatogênese. Elas liberam inibina, provocando um feeback negativo somente

do FSH. A testosterona se encarrega do feedback negativo do LH.

A testosterona tem várias funções, a ser resumidas abaixo:

Determinar a distribuição dos pêlos corporais;

Influenciar ou não o surgimento da calvície;

Provocar alterações no timbre da voz, após a puberdade;

Influência sobre a pele e desenvolvimento de acne, com aumento da secreção pelas glândulas

sebáceas na adolescência (em função de um pico de testosterona);

Alterações na formação de proteínas e desenvolvimento muscular, com efeito anabolizante;

Alterações do crescimento e retenção de cálcio, aumento da quantidade total de matriz óssea;

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190 Endocrinofisiologia

Alterações no metabolismo basal, com efeito indireto sobre o anabolismo protéico;

Aumento da produção de eritrócitos.

Devemos lembrar, no entanto, que nem todos os efeitos são atribuídos à testosterona, e sim à

diidrotestosterona. Qual a origem desta última? Algumas células-alvo da testosterona possuem uma

enzima 5-α-redutase, que a converte em diidrotestosterona. Esta age nos receptores nucleares, que

acabam por induzir manutenção da função dos órgãos sexuais.

Todo homem tem um certo crescimento prostático ao longo de sua vida. O crescimento pode ser

exacerbado, o que requer o uso de inibidores de 5-α-redutase (como o finasteride). O padrão da calvície

também é atribuído à diidrotestosterona.

Quando se toma testosterona exógena, a endógena sofre um feedback negativo, o que diminui a libido.

A obesidade leva à conversão da testosterona em estrogênio. Este, normalmente, ajuda a manter a

secreção de GnRH, a libido, entre outros. Por isso, em obesos, pode haver excesso de estrogênio a partir da

testosterona, levando à ginecomastia.

Por fim, a andropausa é a redução, com a idade, dos níveis de hormônios sexuais.

Anabolizantes à base de testosterona

Efeitos anabólicos e libido aumentada no início são a parte boa. No entanto, os efeitos contrários são

péssimos: o apetite sexual diminui, há infertilidade, pode haver descaracterização da silhueta em mulheres,

hipertrofia cardíaca (que não é acompanhada de um processo fisiológico, o que levará à insuficiência

cardíaca), entre outros efeitos.

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Anotações de Fisiologia 191

Parte 6

Fisiologia Digestiva

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192 Fisiologia Digestiva

AULA 41 – INTRODUÇÃO AO SISTEMA DIGESTÓRIO E MOTILIDADE GASTROINTESTINAL

Professora: Alessandra

os alimentos, encontramos mcronutrientes e macromoléculas que fornecerão combustível para as

atividades metabólicas do nosso organismo. Alguns nutrientes são não-absorvíveis, como os

carboidratos insolúveis. Temos proteínas, lipídios, carboidratos, sais mineirais, vitaminas e água.

Dividimos também os alimentos em energéticos, construtores e reguladores, de forma bastante elementar.

Uma classse mais recente de alimentos é a dos funcionais, ou seja, aqueles que têm propriedade de

maximizar algum processo, ou melhorar o ambiente interno. Exemplos são a ingestão de fibras para

melhorar a função intestinal, a de suplementos para metabolizar melhor proteínas, entre outros.

A função básica, então, do trato gastrointestinal, é absorver nutrientes para manter a homeostase. No

entanto, os alimentos trazem macromoléculas, que devem ser quebradas. Não absorvemos proteínas, e

sim aminoácidos; não absorvemos polissacarídeos, e sim dissacarídeos ou monossacarídeos. A motilidade

propele o alimento ao longo do trato gastrointestinal e promove movimentos de mistura e fragmentação,

aumentando a área de ação de enzimas disgestivas. O processo de digestão envolve a liberação de enzimas

que quebram as ligações até micronutrientes absorvíveis. Também há secreção de substâncias, como a de

íons hidrogênio, para manter o pH ácido e permitir ação otimizada da pepsina.

As alfa-amilases salivares são rapidamente inativadas pelo pH ácido do estômago, desnaturando-se. Este

último tem, em seu processo de degradação de proteínas, uma importância irrisória. Afinal, é no suco

pancreático que estão as proteases realmente importantes. O suco pancreático também auxilia a digestão

e absorção de proteínas, lipídeos e carboidratos. O estômago, portanto, tem a função principal de

armazenar alimento. Possui ainda funções endócrina e exócrina.

Após o alimento chegar à fase de micronutrientes, o intestino delgado e seu epitélio altamente absortivo

removem os produtos da digestão do tubo. A maioria da absorção de nutrientes se dá neste local. O

intestino grosso absorve a maior parte do líquido que passa pelo trato digestivo, incluindo o que estava

presente nos sucos secretados pelo próprio organismo.

O fígado sintetiza sais biliares, armazenados na vesícula biliar, para digestão de lipídeos. A presença de

lipídeos no estômago, por exemplo, sinaliza para a liberação de colecistoquinina, um hormônio que

estimula a liberação de sais biliares.

As estruturas que compõem o trato gastrointestinal são altamente comunicáveis a partir do sistema

nervoso entérico e também autocrinamente, paracrinamente e endocrinamente (sistema neuroendócrino).

Um exemplo é o reflexo gastrocólico, ou seja, a vontade de defecar após uma refeição: receptores na

região do estômago sinalizam para que as células da camada muscular do intestino grosso se contraiam, a

fim de eliminar as fezes. Isso mostra que as estruturas do trato vão se antecipando às etapas que virão

durante a digestão.

OBS.: há estudos que correlacionam a xerostomia, ou seja, a pouca umidificação da boca (por baixa

produção de saliva) com o diabetes mellitus, sem ter, no entanto, uma explicação conclusiva. Crê-se que

esteja relacionada ao controle glicêmico.

Na página seguinte, será detalhada a motilidade do tubo digestivo.

N

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Anotações de Fisiologia 193

Do terço inferior do esôfago até o fim do trato gastrointestinal, a composição fundamental da parede é

muito semelhante, variando apenas nas camadas de músculo liso e na mucosa. No piloro, por exemplo, a

camada muscular longitudinal é espessa, ao contrário do corpo do estômago: este tem camadas

musculares muito mais delgadas. Em resumo:

a) Camada epitelial (mucosa). Existem glândulas exócrinas e endócrinas, com diversas funções

conforme o segmento estudado. Podem ser de secreção de substâncias digestivas e hormônios ou

de absorção. O muco, por exemplo, tem função lubrificante e protetora.

b) Lâmina própria, com algumas glândulas e nódulos linfáticos (placas de Peyer).

c) Muscular da mucosa;

d) Submucosa, com algumas glândulas;

e) Muscular (subcamadas circular e longitudinal);

f) Camada externa, serosa ou adventícea.

Os plexos mioentérico (entre as camadas musculares) e submucoso (entre a submucosa e a muscular) agem

independentemente do SNC, sendo que o primeiro controla principalmente a motilidade e, o segundo, a

secreção e a circulação sanguínea.

Para que o sistema digestivo responda à presença do alimento no estômago, ele contém vários receptores

mecano e quimiossensíveis. A resposta a uma distensão, por exemplo, se dá por um aumento da peristalse.

Já os quimiorreceptores captam alterações do pH gástrico, do intestino delgado, entre outras porções. Por

fim, há receptores vanilóides, sensíveis à capsaicina (presente na pimenta).

As aferências dos receptores vão ao SNA e sistema nervoso entérico (SNE), com respostas de motilidade,

secreção e vasodilatação. Indivíduos com vagotomia ainda preservam uma certa função intestinal, graças à

independência do SNE. A parte motora do SNC controla apenas a musculatura estriada relacionada ao

trato gastrointestinal.

O pelxo mioentérico usa neurotransmissores ou neuro-hormônios excitatórios (acetilcolina e substância P)

e inibitórios (peptídeo intestinal vasoativo, ou VIP, e NO). Já o plexo submucoso participa do processo de

secreção pela liberação de acetilcolina, ou seja, apenas excitatoriamente.

A vagotomia poderia ser usada em pessoas com úlceras gástricas recorrentes. No entanto, a independência

do SNE ainda mostraria secreção ácida aumentada, inviabilizando a intervenção.

A inervação simpática modula vasoconstricção, por receptores α-1, provoca a contração da muscular da

mucosa, entre outros efeitos. A ingestão de simpatomiméticos durante refeições pode provocar estase

gástrica. O olmidrin é semelhante à atropina, com efeitos semelhantes ao do SNA simpático.

A inervação parassimpática possui um efeito estimulatório sobre os plexos nos processos digestivos. Tem

efeito negativo sobre a muscular da mucosa e positivo sobre a contratilidade dos esfínceteres. É excitatório

(colinérgico) sobre quase todas as estruturas, com exceção do SNA simpático não-colinérgico,

Reflexo vagovagal ocorre quando se tem alimento na boca: o estômago se relaxa, para receber o alimento.

Motilidade

São os movimentos da musculatura lisa do trato gastrointestinal, com mistura, trituração e progressão

cefalocaudal dos nutrientes e excreção dos produtos que não foram digeridos nem asorvidos. Os

esfíncteres mantêm suas contrações, abrindo-se mediante estímulos humorais e reflexos.

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194 Fisiologia Digestiva

Cafeína e nicotina diminuem a tonicidade do esfíncter esofágico, assim como o aumento da pressão

intraluminal. Logo, há maior chance de refluxo

Contração da musculatura lisa

Os filamentos de actina e miosina estão distribuídos ligados a corpos densos ao longo da célula, tanto no

citoplasma quanto na membrana plasmática. Eles se contraem em rede, o que diminui muito mais o

tamanho da célula. No músculo estriado, há dois filamentos de actina para dois de miosina; aqui, são de

doze a dezoito para um.

Os leiomiócitos são conectados por junções GAP, de forma que a atividade elétrica de uma célula acaba

sendo propagada para outras células adjacentes. O que ocorre, então, é que o tecido muscular liso funciona

como um sincício. A musculatura lisa, então, desenvolve mais força, proporcionalmente, que a musculatura

esquelética. Isso com menor consumo de ATP. No fim das contas, essa vantagem contrátil mostra-se

necessáia, por exemplo, para manter a contração da bexiga por horas.

A contração aqui depende do cálcio extracelular, em grande escala. Existem, no trato gastrointestinal,

células intersticiais de Cajal, que funcionam como marcapassos: disparam potenciais de ação

automaticamente, por não possuírem potencial de membrana estável.

O potencial de repouso na musculatura lisa fica em torno de -50 mV, menos negativo que na musculatura

esquelética. As células de cajal não geram potenciais de ação, e sim alterações nos potenciais de membrana

(ondas lentas). No pico das ondas lentas, se houver estimulação parassimpática, estiramento ou

acetilcolina, surgirão potenciais de ação. Estes serão transmitidos para as células musculares lisas, levando

à contração.

No intestino delgado, a freqüência das ondas lentas é maior, e a menor é sempre no estômago.

A contração gerada, ou seja, o inotropismo, pode ser modulado: alterações na temperatura corporal,

atividade metabólica aumentada aumentam-no. Acetilcolina e substância P também têm efeito

semelhante.

Relembrando a contração da musculatura lisa

Há receptores inibitórios e excitatórios para diversos hormônios na membrana plasmática, mas as células

musculares lisas tmabém reagem a mudanças de voltagem. Abrem-se canais de cálcio, que entra e se liga à

calmodulina. Cada calmodulina fixa até quatro moléculas de cálcio. Ligados, formam um complexo que

ativa uma quinas dependente de calmodulina, que fosforila a quinase da cadeia leve da miosina. Esta,

quando fosforilada, permite a interação das cadeias de actina e miosina. O desligamento das pontes

cruzadas depende da ativação da fosfatase da cadeia leve da miosina, em função da diminuição da

concentração intracelular de cálcio. A velocidade de fosforilação é dada também pela quantidade de

fosfatase.

Haverá dosi tipos principais de contração: os de mistura e de propulsão. Neste último caso, há contração

anterior e relaxamento anterior do tubo, numa direção cefalocaudal. No estômago, como funciona?

A primeira alteração da musculatura lisa se dá pelo relaxamento receptivo, principalmente no corpo do

estômago. No corpo, conforme dito, há muito menos músculo liso que no antro pilórico. Aqui age o reflexo

vagovagal, que permite uma acomodação do alimento sem aumentar a pressão intraluminal; se isso não

ocorresse, o vômito seria freqüente. Há também alguma trituração do alimento próximo ao piloro.

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Anotações de Fisiologia 195

Os movimentos de mistura e segmentação ocorrem quando a progressão do alimento no tubo é bloqueada

por um esfíncter. Essa segmentação tritura ainda mais o alimento, e ainda gera uma pequena propulsão do

mesmo. Quando os fragmentos tornarem-se ainda menores, ocorrem movimentos peristálticos para a

propulsão do alimento.

A irritação química ou física, e a estimulação parassimpática, aumentam muito a peristalse. Isso exige a

presença do plexo mioentérico ativo, tanto para contração (acetilcolina e substância P) quanto para

relaxamento (VIP e NO).

Após os movimentos, no período interdigestivo, existem certas “faxinas”. Formam-se complexos

migratórios mioelétricos, dependentes do hormônio motilina. A ingestão de alimentos inibe a ação dos

CMM.

Já os reflexos intrínsecos curtos, ou intramurais, são desencadeados por estimulação mecânica ou química.

As fibras colinérgicas provocam contrações acima (colinérgica) e relaxamento (VIP e NO) abaixo do ponto

de estimulação. Essa ativação não se dá por vias aferentes e eferentes, e sim por estimulação parácrina.

Motilidade esofágica

Quando se tem alimento na boca e o bolo alimentar é empurrado, existem três fases da deglutição que

serão detalhadas melhor na próxima aula.

Motilidade gástrica

O relaxamento receptivo do estômago é totalmente dependente do vago. A motilidade gástrica é

estimulada por acetilcoline e gastrina. A noradrenalina e neurotensina diminuem a contração

Motilidade do intestino delgado

Serve para aumentar a área de atuação da secreção pancreática, misturando-as com o quimo. Os

fragmentos alimentares são postos, então, em contato com a mucosa gástrica, sendo digeridos e

reabsorvidos no final. A propulsão se dá por peristalses curtas e pelo gradiente de pressão intramural.

Nos períodos interdigestivos, novamente amotilidade se dá pelo CMM, porém com freqüência maior que

no estômago. Isso previne a migração bacteriana.

No cólon, o alimento permanece por um certo tempo para a absorção de água e para a ação das bactérias

colônicas. Se estiver muito cheio, sinais mioentréricos podem inibir o peristaltismo.

Não possui função absortiva para nutrientes, apenas água e eletrólitos. A irritação nessa região leva a

diarréias, com perda de água e eletrólitros. Os movimentos de mistura aqui são chamados de haustrações,

facilitando a reabsorção de água. Dos sete litros de líquidos que percorrem o trato gastrointestinal durante

o dia, apenas 70 ml serão eliminados nas fezes. Uma vez que o alimento chega à região do reto, ele passa

por dois esfíncteres.

O vômito é reflexo de peristalse reversa, mediado pelo tronco cerebral. Crinaças que nascem com tumores

na região do tronco cerebral têm vômitos intermitentes. Possui aferências na faringe, fígado, vesícula

vilixar, vesícula, útero, rins, canais auditivos semicirculares.

Quimioterápicos, anestésicos, digitálicos (aumentadores de atividade cardíaca) e opióides ativam zonas de

gatilhos no assoalho do quarto ventrículo, ou seja, no centro do vômito. Os impulsos eferentes vão pelos

nervos trigêmeo, vago, fácil, glossofaríngeo e hipoglosso.

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196 Fisiologia Digestiva

AULA 42 – SECREÇÕES DO SISTEMA DIGESTÓRIO

Professor: Roberto

1. Secreção Salivar

Uma pessoa com essa função prejudicada vive mal. A principal causa de xerostomia, que é o nome dado a

essa condição, é a síndrome de Sjögren: uma reação autoimune ataca algumas glândulas exócrinas.

Provoca artrite e xeroftalmia, entre outros sintomas.

A saliva contém substâncias bacteriostáticas, impedindo a proliferação anormal da flora bucal. À noite, o

fluxo salivar é mínimo, o que permite um crescimento exponencial desta flora, resultando em mau hálito ao

amanhecer. Para isso, usamos cremes dentais que estimulam a salivação e, com isso, diminuem o mau

hálito. Uma das causas mais importantes da halitose é o jejum, pois nesse caso a produção de saliva

diminui. Podem existir outras doenças ligadas à saliva, como doença periodontal grave.

Além do processo digestivo, a saliva é importante para a fala, para a manutenção correta da flora

bacteriana oral, entre outras funções. Produzimos cerca de um litro de saliva por dia; em caso de tumores

de esôfago, salivamos ainda mais, e a capacidade de deglutição diminui. Com isso, perde-se muito líquido,

devendo o médico estar consciente desse fato.

Na saliva, existe água, lisozima, sódio, potássio, bicarbonato e os

outros íons comuns ao plasma. Os ácinos que produzem a saliva

são semelhantes aos do pâncreas, havendo ainda em comum a

produção de amilases (isoenzimas pancreática e salivar). À

medida que a secreção salivar passa pelos ductos das glândulas

secretoras, há remoção de sódio e cloro e secreção de potássio e

de bicarbonato. Se o fluxo de saliva aumentar, a quantidade de

íons sódio também aumenta, graças ao menor tempo para sua

reabsorção.

Podem existir cálculos salivares, visto que existe cálcio na saliva.

Alcoolistas têm maior propensão a essa lesão.

O fluxo de saliva responde a estímulos neurais, não existindo

controle hormonal. Os estímulos mais importantes vêm do SNA

parassimpático, em situações onde:

a) Pensa-se na comida (fase cefálica, muito famosa por causa do psicólogo russo Pavlov). Pavlov criou

o conceito de reflexo condicionado: com um cão, batia uma sineta toda vez que chegava a hora da

alimentação. Depois, toda vez que tocava a sineta, o cão começava a salivar, mesmo sem a comida.

b) É realizada a mastigação. Este é um tipo de ato reflexo, como o dos animais ruminantes, pois

quando a mandíbula é abaixada, o masseter sofre um reflexo de estiramento e contrai-se

novamente. De fato, a mastigação é o primeiro auxílio para a digestão.

Quando há extremo estímulo do SNA simpático, a secreção salivar pode simplesmente desaparecer.

Algumas pessoas, em situações de stress, ficam com a boca seca ou com mau hálito.

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Anotações de Fisiologia 197

2. Deglutição

Quando receptores são estimulados com um

alimento prazeroso, a deglutição é muito mais fácil.

O início da deglutição é voluntário; depois, o

alimento toca na faringe, há elevação do palato para

fechar a nasofaringe, os pilares formam uma fenda, a

faringe se contrai e o processo fica extremamente

delicado. A faringe tem de ser levantada para frente

e para cima, para que a entrada de ar se feche

(crianças e idosos não têm o reflexo de fechamento

de glote muito ativo, sendo melhor adicionar algum

espessante à comida, evitando engasgamento ou

pneumonias). Uma vez que a glote foi levantada, o

alimento passa até a parte superior do esôfago, que

realiza então uma série de ondas peristálticas. No

fim do esôfago, é proporcionado um relaxamento do

esfíncter esofágico inferior, que geralmente evita

refluxos alimentares. Existe também um esfíncter

esofágico superior, que abraça a laringe, fechando-a

e impedindo a entrada de ar. É menos definido que o

inferior.

O relaxamento receptivo, então, relaxa o fundo do

estômago e o esfíncter esofágico inferior. Uma

doença chamada calázio provoca megaesôfago, por

não permitir o relaxamento do esfíncter esofágico. A

doença de Chagas também proporciona esse quadro.

Quando o conteúdo gástrico vai para o esôfago, pode haver lesão do epitélio (esofagite de refluxo), úlcera

em função dessa lesão, aspiração do suco gástrico de refluxo. Pouca lesão pode provocar muitos sintomas.

Alguns alimentos provocam mais pirose do que outros, e é sabido que álcool provoca refluxo.

Existem dois tipos de peristalse: a primária, que acabou de ser citada, e a secundária. Esta última acontece

quando há muito alimento no esôfago, que ativa receptores de estiramento, levando a contrações locais

que removem o alimento do esôfago para o estômago.

Para conteúdos muito gordurosos, os esfíncteres não são muito eficientes (“escorrega”). O uso de

medicamentos como o Xenical, que bloqueiam a absorção de gordura, dificulta a eficiência dos esfíncteres.

3. Estômago

É possível viver sem estômago? Não: a ausência do fator intrínseco não permite a absorção de vitamina

B12, provocando anemia perniciosa ao longo dos anos.

As grandes funções do estômago são mistura, propulsão e armazenamento. O alimento, para chegar ao

duodeno em condições adequadas, precisa ser transformado ali. A principal função gástrica, no entanto,

seria principalmente a digestão de carnes, pois a pepsina atua sobre os revestimentos dos músculos. No

entanto, não tem tanto importância quanto se imaginava antes.

Page 198: 63828282 Anotacoes de Fisiologia Andre Bortolon Bissoli (2)

198 Fisiologia Digestiva

O estômago é heterogêneo, possuindo partes do fundo, do corpo e do antro. Os dois primeiros produzem

ácido e são mais fracos, enquanto o último não produz ácido e é muito mais desenvolvido. Na verdade, o

piloro e seu antro funcionam como uma bomba, lançando um fino jato de quimo no duodeno.

Há secreção de ácido, muco, pepsinogênios, lípase gástrica, fator intrínseco e bicarbonato. Tudo isso no

fundo e no corpo. Nas outras regiões, apenas muco e bicarbonato.

Existem quatro tipos de células na mucosa gástrica, em suas criptas: parietal (ácido clorídrico), principal

(pepsinogênio), heterocromafins e células G (hormônios).

As células parietais possuem, no repouso, diversas vesículas. Quando estimuladas, as vesículas se fundem e

formam diversos canalículos para a secreção de ácido. Esta é um processo ativo, sendo necessária uma

enorme quantidade de transportadores potássio-hidrogênio, que consomem muita energia com baixa

eficiência. Logo, a superfície secretora de ácido tem de ser grande para permitir sua liberação mais rápida.

Sai hidrogênio, voltam íons potássio e saem íons

cloro. O hidrogênio vem da dissociação do H2Co3. O

bicarbonato é trocado pelo cloreto, que depois acaba

saindo das células. Existem medicações que

bloqueiam a bomba protônica das células parietais,

como o omeprazol.

Existe um paradoxo no estômago: como produzir

ácido e enzimas proteolíticas sem digerir a si mesmo?

Simples: o muco produzido pelo estômago forma uma

defesa que agarra os íons bicarbonato, criando uma

espécie de “proteção alcalina”. Assim, o ácido pode

estar neutralizado.

Do mesmo jeito que a secreção salivar responde a um

estímulo, assim age a secreção gástrica: há fases cefálica, gástrica e intestinal.

A fase gástrica age por reflexos de estiramento da parede do estômago, reflexos vagais e estimulação por

gastrina e histamina. O estômago também sente a presença de aminoácidos e peptídeos, aumentando sua

produção de ácido. Já a fase intestinal, dependendo do tipo de comda que ali houver, pode ocorrer

estimulação ou inibição da secreção gástrica.

Logo após a refeição, há um pico da

secreção de ácido pelo estômago

(cerca de 1h30min depois). O

estímulo para essa secreção chega

por nervo vago, ou pela circulação

(quando for hormonal, produzido

pelas células G). Esse hormônio

forma gastrina, que estimula a

secreção ácida pelas parietais e

também a de histamina pelas

cromafins, constituindo um estímulo

parácrino. O estímulo neural, porém,

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Anotações de Fisiologia 199

ainda se destaca mais que os outros.

O vago atua sobre células do sistema nervoso intrínseco do estômago, que agora estimulam células

parietais. Portanto, os sinais sobre a secreção gástrica atuam em cascata, permitindo uma amplificação da

resposta a partir de estímulos moderados.

As células G possuem receptores GRP, as enterocromafins possuem receptores para acetilcolina, as

parietais possuem para histamina e acetilcolina. Um remédio que bloqueia receptores H2, para histamina,

inibe a secreção de ácido e diminui muito a ocorrência de úlcera.

Deve existir um estímulo negativo no estômago, para evitar o excesso de ácido: vem da célula D, que inibe

a célula G pela liberação de somatostatina. Logo, a liberação de gastrina é diminuída, o que reduz a

secreção do ácido.

O SNE tem mais neurônios do que a medula espinhal.

O que a histamina e a acetilcolina provocam dentro da célula parietal? Um aumento da conncetração

intracelular de cálcio, por meio de uma cascata de sinalização, que promove fusão das vesículas de ácido e

externalização do mesmo.

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200 Fisiologia Digestiva

O que ataca o muco? Álcool, por exemplo, ou antiinflamatórios. Outra causa de lesão é a infecção por

Helicobacter pylori, que acaba por lesar o revestimento mucoso e as células de revestimento, graças às suas

enzimas proteolíticas.

A contração do estômago é semelhante à do intestino, sendo que existe um ritmo elétrico básico (de 3 a 5

vezes por minuto). Se houver uma despolarização um pouco maior do potencial de repouso da membrana,

desencadeiam-se potenciais de ação capazes de levar à contração muscular, mais ou menos forte. Com a

chegada do alimento, existe um estímulo não só para a secreção, mas também para a motilidade. Forma-se

um anel de contração, cuja força aumenta na direção do antro pilórico. No jejum, o estômago pode se

contrair e provocar até dor: contrações rápidas, intensas e um pouco fora de ritmo. Faquires e indivíduos

em greve de fome têm essas contrações por um ou dois dias, até que elas desaparecem.

Durante o período de jejum, utilizamos a gliconeogênese principalmente para o cérebro, e lipólise para os

músculos. São gerados corpos cetônicos que levam ao enjôo, mesmo durante a fome.

Controle do esvaziamento gástrico

Se o estômago prepara o alimento para o duodeno, o que tem de ser feito? Afinal, o duodeno tem uma

eficiência absortiva muito grande. Como não exceder a quantidade dos alimentos que chegarão ao

duodeno?

O intestino tem sensores para a quantidade de gordura, para o estiramento, para açúcares. Se houver

muita gordura no intestino, o esvaziamento gástrico é praticamente interrompido (o que explica o

empazinamento após feijoadas no fim de semana). Um excesso da ingestão de açúcar, por outro lado, pode

permitir que ele chegue ao cólon, facilitando a proliferação de bactérias, produzindo gases.

Ingerir álcool em jejum é ruim, pois o piloro fica aberto e permite a absorção rápida do mesmo. Logo, a

ingestão de gorduras pode fechar o piloro, diminuindo a velocidade da absorção de álcool e evitando o

estado de bebedeira.

Úlcera

As cirurgias de úlcera no duodeno não podem ser feitas pela remoção da área ulcerada, pois há 100% de

recidiva. Uma alternativa seria realizar uma vagotomia, para diminuir a secreção de ácido: recidiva de 100%

novamente, pois o antro pilórico fica desnervado e permite estase do alimento na região do antro. Poderia

ser tentada uma vagotomia com piloroplastia, mas as recorrências ainda eram de número considerável. A

adição de antrotomia poderia ser útil também, mas haveria dumping por esvaziamento gástrico.

A técnica cirúrgica mais sofisticada era a vagotomia superseletiva: só era removido o vago que inervava o

corpo e o fundo. Tinha bons resultados. Depois, surgiram os antagonistas de receptores H2 (para

histamina). Aparecerem também os inibidores da bomba de hidrogênio-potássio, como o omeprazol,

pantoprazol, entre outros.

A úlcera tem uma lei, chamada de “no acid, no ulcer”. Logo, a quantidade de ácido simplesmente tem de

ser eliminada.

Seu aparecimento é favorecido pelo alcoolismo crônico e pelo cigarro, principalmente para úlceras agudas

com erosão. O uso de antiinflamatórios também é importante, porque diminui a formação de

prostaglandinas, diminuindo a secreção de muco.

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Anotações de Fisiologia 201

O uso de antiácidos era freqüente antigamente. Não poderiam ser absorvíveis, a fim de evitar alcalose

metabólica. A síndrome do leite alcalino foi descrita porque, numa ingestão de leite com bicarbonato, a

liberação de muito cálcio na urina pode formar cálculos. Isso porque bicarbonato de sódio era muito

utilizado como antiácido.

Hidróxido de alumínio provoca constipação intestinal, enquanto o hidróxido de magnésio provoca diarréia.

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202 Fisiologia Digestiva

AULA 43 – SECREÇÃO PANCREÁTICA, BILIAR E INTESTINAL

Professora: Alessandra

1. Secreção pancreática

10% do pâncreas é endócrino, liberando insulina e glugacon. 90% são exócrinos, com células acinares e

ductais, cuja secreção vai por ductos confluentes até chegar ao ducto pancreático comum. No fim do ducto

pancreático, há confluência com o ducto biliar, sendo que ambos desembocam no esfíncter de Oddi para o

duodeno. Obstruções neste nível comprometem vesícula biliar, fígado e pâncreas (como cálculos na

vesícula).

O pâncreas exócrino, em suas células acinares, libera um suco rico em enzimas que participam do processo

de digestão de carboidratos, lipídios e proteínas. Células ductais liberam um fluido isotônico rico em

bicarbonato, capaz de neutralizar a acidez do quimo vindo do estômago. Isso permite que as enzimas

atuem em pH ótimo no duodeno.

A regulação da secreção é dada pela secretina e pela

colecistoquinina. A primeira regula a liberação de

bicarbonato (células ductais), e a segunda, o suco

enzimático (células acinares). A gastrina estimula as

duas, a somatostatina inibe, e a acetilcolina também

estimula a secreção ductal por reflexos vasovagais.

O quimo ácido, ao chegar ao duodeno, estimula as

células S a liberar secretina, que estimula as células

ductais a liberar bicarbonato, neutralizando a acidez

do quimo. Já a colecistoquinina é liberada pelas

células I, estimuladas pela presença de glicerol,

peptídeos e carboidratos. Estimula a secreção das

células acinares. Enzimas são liberadas na forma de

proenzimas, com exceção da lipase, que atua sobre as

micelas ligada a uma colipase.

Lipases

Atuam digerindo os tri, bi e monoglicerídeos em glicerol e ácidos graxos. A colipase, por sua vez, fixa-se às

micelas permitindo a fixação da lipase. Assim, a ausência da colipase é capaz de impedir a digestão lipídica.

A colesterol éster hidrolase e a fosfolipase A2 são liberadas também, mas esta última é a única inativa

quando liberada. Lisa fosfolipídeos.

A lípase pancreática é a mais importante, pois os fosfolipídeos e o colesterol são absorvidos sem a

necessidade de um processo enzimático. Já os triglicerídeos obrigatoriamente têm de ser hidrolisados.

Amilase

Temos dois tipos de α-amilase: a salivar e a pancreática, que são a mesma enzima estruturalmente.

Rompem as ligações α das moléculas de amido, gerando maltose, maltodextrina e maltotriose. A glicose,

portanto, não é gerada de imediato. Tanto a salivar quanto a pancreática atuam em meio básico (a saliva

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Anotações de Fisiologia 203

tem pH neutro ou básico, por isso a isoforma salivar é desativada no estômago). No duodeno, graças à

basicidade do suco pancreático, a isoforma pancreática é capaz de atuar. De modo geral, todas as enzimas

liberadas são inativas, sendo ativadas no duodeno.

Proteases

Os tripsinogênios são liberados, e na membrana dos enteócitos existem enteroquinases capazes de

convertê-los a tripsina. Esta, por sua vez, é capaz de ativar enzimas diversas.

Existe também o quimotripsinogênio e as

procarboxipeptidases A e B, convertidos a

quimotripsina e carboxipeptidases.

A liberação dos sucos pancreátcos possui uma

fase cefálica e gástrica, além da fase

intestinal.

Na fase cefálica, a partir do cheiro, da visão e do

ciclo circadiano, é ativado o nervo vago. Através

do reflexo vagovagal, estimulam-se as célulass

ductais e acinares a liberar suas secreções. Na fase

gástrica, além da estimulação vagal, temos a

gastrina. Esta, através da circulação, age como um

hormônio estimulante da lieração de suco

pancreático. Na fase intestinal, além do reflexo

vagovagal, o quimo ácido estimula as células S a

liberar secretina, que estimula as células ductais a

liberar bicarbonato.

Os produtos da lipólise e proteólise estimulam as

células I a liberar colecistoquinina, estimuladora

das células acinares. Juntos, os dois primeiros

ativadores estimulam aferências vagais

(quimiorreceptores) a liberar acetilcolina no

reflexo vagovagal, nas células ductais.

Pancreatite

Se o conhecimento das secreções for unido à fisiopatologia, podem ser separados dois quadros: agudo e

crônico. A pancreatite crônica é uma inflamação prolongada na qual o tecido pancreático é substituído por

tecido fibroso. Já a pancreatite aguda vem em decorrência da obstrução do ducto pancreático. As enzimas

são liberadas no tecido pancreático, destruindo seu parênquima. É criado um processo de autólise local ou

mesmo sistêmico. Há diarréia osmótica, visto que nada é digerido, e esteatorréia.

2. Secreção hepática

O fígado tem, como única função digestiva, a síntese de sais biliares. As suas outras inúmeras funções não

são consideradas metabólicas.

A bile é formada por pigmentos biliares, colesterol, ácidos graxos, fosfolipídeos, sais inorgânicos e ácidos

biliares (os principais). A vesícula biliar possui um epitélio capaz de concentrar a bile, aumentando bastante

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204 Fisiologia Digestiva

a concentração dos próprios sais orgânicos.

Logo, se a bile não for liberada em função de

alguma obstrução, as concentrações de cálcio

ficam tão altas que surgem cálculos. O

colesterol também gera cálculos, num quadro

conhecido como colelitíase.

Mulheres obesas, com colesterol alto,

possuem síndrome 3F, com enorme

probabilidade de produzir cálculos biliares.

Os ácidos biliares são 50% da bile. Quimicamente, derivam do colesterol. Os mais comuns são o ácido

cólico, quenodeoxicólico, deoxicólico e litocólico. Os dois últimos vêm da taurina e glicina conjugadas no

intestino delgado, havendo recaptação, portanto, de componentes da bile. Isso se dá na circulação

enteroepática. Apenas 5% dos sais biliares são produzidos de novo.

Também fazem parte da bile: fosfolipídeos, compostos por lecitinas e solubilizados em micelas; colesterol,

também solubilizado em micelas.

Pigmentos biliares

2% são de bilirrubina, sendo em geral derivados das

porfirinas. Obstruções biliares podem levar a fezes claras e,

num maior tempo, icterícia. Possui formas conjugada

(hidrofílica) e não conjugada (hidrofóbica).

As micelas dos sais biliares têm os produtos da digestão

lipídica inseridos dentro de si, no intestino delgado. Essas

micelas não só agrupam os produtos da digestão lipídica, mas

também servem para atravessar a camada imóvel da luz

intestinal. Os lipídeos digeridos atravessam a parede por

difusão; recentemente, foram descobertos transportadores

de membrana para colesterol, que correspondem a uma

porção considerável desse transporte.

A camada imóvel é uma região de maior viscosidade e

espessura do conteúdo intestinal.

A colecistoquinina, além das funções anteriores, estimula as

contrações da musculatura da vesícula biliar e o relaxamento

do esfíncter de Oddi. Sua secreção, conforme dito antes, é estimulada pela presença de derivados da

digestão lipídica e protéica.

Os cálculos a base de colesterol são formados quando este se encontra em grandes concentrações. A

fração solúvel (ligada a sais biliares e lecitina) está insuficiente, e a parte solúvel forma monoidratos de

colesterol, ou seja, cálculos de colesterol. A bile com excesso de colesterol é chamada de litogênica.

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Anotações de Fisiologia 205

PARTE 2 – DIGESTÃO E ABSORÇÃO

Os alimentos são compostos por macronutrientes, que não são absorvidos pelo nosso epitélio intestinal.

Mas os produtos desses macronutrientes podem, sim, ser absorvidos. Para isso, temos enzimas

aminolíticas, proteolíticas e lipolíticas.

O epitélio intestinal, por sua vez, possui vilosidades e microvilosidades que aumentam a área absortiva

intestinal para até 250 m², ou seja, o tamanho de uma quadra de tênis. Por processos inflamatórios ou

doenças, como a doença celíaca, a área de absorção pode ser diminuída. As vilosidades são altamente

capilarizadas, visto que a digestão dos produtos tem de ser muito rápida. Os lipídios são uma exceção, visto

que vão para os vasos linfáticos.

Os principais carboidratos da dieta são o amido, o glicogênio, a sacarose, a lactose e a maltose. A digestão

do amido começa na boca, com a ação da α-amilase salivar. Ela rompe ligações α-1,4, formando maltose,

maltotriose e dextrina. As fibras, por sua vez, não são digeríveis, por terem ligações β.

As fibras podem ser divididas em classes insolúveis, como as de cereais (que aceleram o trânsito intestinal),

ou solúveis, formando um gel em contato com a água (como as de polpas de frutas).

A digestão do amido continua-se no duodeno, com a α-amilase pancreática, que assim como a insoforma

salivar, atua em pH básico. A maltose, a maltotriose e a dextrina são digeridas por enzimas mlatase,

presentes na borda em escova dos enterócitos: originam glicose. Já a lactose é digerida pela lactase,

também no duodeno, dando origem a galactose e glicose. A sacarose, assim como as outras, precisa de

enzimas da borda em escova para gerar glicose. 20 a 40% do amido é digerido na boca, sendo que a

isoforma pancreática finaliza a digestão.

A trealose é um carboidrato presente em alguns vegetais, para a qual temos enzimas específicas. Os

nordestinos geralmente têm maior presença deste tipo enzimático, graças à sua dieta característica.

Monossacarídeos glicose, frutose e galactose são reabsorvidos de maneiras diferentes pela borda em

escova. A glicose e a galactose entram num simporte com o sódio, enquanto a frutose entra por difusão

facilitada.

O cotransporte glicose-sódio ocorre por

transportadores SGLT1 e 2, na membrana

luminal. O GLUT-5 também fica na

membrana luminal, levando frutose. O

GLUT-2 fica na mebrana basolateral,

sendo independente de insulina para seu

funcionamento.

A doença mais comum em relação a

essas enzimas é a deficiência de

dissacaridases lactase. Os mamíferos, em

geral, diminuem a quantidade de lactase

ao longo do tempo. A deficência

congênita é rara, sendo percebida logo

na primeira mamada. A adquirida é

comum. O teste de tolerância à lactose dissolve esse dissacarídeo a 10%, para verificar as respostas do

paciente. Existem pessoas com deficiências do carreador de frutose.

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206 Fisiologia Digestiva

Proteínas

A digestão das proteínas tem início no estômago, com ação da pepsina. O recém-nascido libera um tipo de

renina no estômago capaz de digerir caseína (do leite). No duodeno, as enzimas pancreáticas clivam os

peptídeos, cujos resíduos são absorvidos na borda em escova.

As células principais liberam pepsinogênio, uma enzima na forma inativa. Ele precisa que o pH esteja ácido

para tornar-se ativo como pepsina, que promove a digestão das proteínas em oligopeptídeos.

No pâncreas, há conversão das enzimas inativas em ativas, pela ação da tripsina já citada. A diferença das

enzimas pancreáticas está nos pontos de hidrólise nas cadeias peptídicas. Carboxipeptidases clivam os

aminoácidos das extremidades, enquanto elastases digerem fibras elásticas que mantêm a carne unida.

Temos transportadores para

aminoácidos e di/tripeptídeos.

Enzimas proteolíticas convertem os

últimos no citosol dos enterócitos,

de forma que só aminoácidos sejam

transportados nas membranas

basolaterais para a corrente

sanguínea. A maioria dos

carreadores faz cotransportes

(antiporte) com sódio, mas existem

também simportes com hidrogênio.

Este último depende do antiporte

sódio hidrogênio para gerar um

gradiente de concentração, assim

como tudo depende da sódio-

potássio ATPase.

Sprue celíaco, ou doença celíaca, é

uma enteropatia sensível ao glúten.

Este gera, quando degradado, uma

proteína rica em prolinas chamada

de gliadina, para a qual algumas

pessoas têm anticorpos. Assim, cria-se uma reação inflamatória, com inabsorção e diarréia osmótica. A

mucosa do intestino delgado acumula linfócitos T CD8, assim como a lâmina própria acumula T CD4. As

citocinas liberadas por essas células t acabam por lesar os enterócitos. Geralmente, podem ser feitos

exames de anticorpos anti-gliadina ou biópsias.

Quando o indivíduo está no auge da doença, é necessário o uso de corticosteróides, a fim de diminuir a

resposta inflamatória.

Lipídeos

Existe uma lipase lingual, quase inefetiva, secretada pelas glândulas de Von Ebner. Existe também uma

forma gástrica. A digestão e hidrólise dos lipídeos, no entanto, ocorre efetivamente no duodeno. Lá, são

emulsificados pelos sais biiliares, a fim de aumentar a sua área de superfície. Triglicerídeos são degradados

pela hidrolase dos ésteres de glicerol em monoglicerídeos, assim como ésteres de colesterol são

convertidos por sua respectiva hidrolase em colesterol. Por fim, a fosfolipase A2 processa fosfolipídeos.

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Anotações de Fisiologia 207

Para que a lipase aja sobre os TAG’s emulsificados nas micelas, outra proteína é necessária. A colipase,

quando se liga às micelas, permite que a lipase se insira também. Junto à absorção e à inserção dos

produtos de digestão lipídica nas micelas, entram vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K).

Os sais biliares digerem a lipase, quando esta não está ligada à colipase. Estes sais não são absolutamente

necessários à digestão dos TAG’s, e sim à emulsificação do colesterol e de vitaminas lipossolúveis. Pessoas

que têm sua vesícula biliar retirada, então, não terão grandes problemas para absorver lipídeos, e sim para

absorver vitaminas lipossolúveis.

As micelas se difundem pela camada estacionária, liberando próximos da borda em escova os produtos da

digestão. Receptores de colesterol NPC 1/1 e MVM-FABP são capazes de absorver, respectivamente,

colesterol e ácidos graxos de cadeia longa. Pessoas em estado de caquexia necessitam de uma reposição de

acidos graxos de cadeia longa.

No citosol, os lipídeos reabsorvidos são reesterificados, a partir de ácidos graxos livres e glicerol. São

incorporados a quilomícrons, que são liberados em vasos linfáticos. Para que os quilomícrons fiquem

completos, são necessárias apolipoproteínas.

Os sais biliares podem ser reabsorvidos por conjugação com taurina e glicina, ou sem conjugação (por

difusão). As fibras reduzem a colesterolemia por diminuir a reabsorção de sais biliares, através do aumento

do fluxo intestinal. Mais colesterol será necessário, portanto, para produzir sais biliares.

Reabsorção de água

Nove litros de água passam, por dia, pelo trato

gastronintestinal. As distribuições são diferentes, conforme

a figura ao lado.

100 ml ficam para umidificar as fezes, sendo que o resto é

reabsorvido. No jejuno, onde há maior reabosrção de NaCl,

glicose e aminoácidos, há também maior reabsorção de

água. Issso porque é criado um gradiente osmótico. Essa

absorção se dá pelas vias paracelular e transcelular.

Na terapia de reidratação oral, deve existir sódio, glicose e

água. Senão, o liquido não é reabsorvido. A reabsorção de

potássio tem de ser altamente regulada, não só para manter

a osmolaridade, mas também para manter um bom

potencial de repouso nos músculos (como no coração e nos

músculos esqueléticos). Tanto o sódio quanto o potássio são

absorvidos no jejuno, principalmente, e no íleo. O potássio é

secretado no cólon. O cloreto é absorvido no jejuno, no íleo

e no cólon (em troca com bicarbonato, nestes dois últimos).

O bicarbonato ajuda a neutralizar ácidos gerados pelas

bactérias colonicas.

Curiosidade: liberamos, imperceptivelmente, dois litros de gases todos os dias. Interessante? Gases

promovem dor, devido à distensão das paredes intestinais, e provocam a sensação do desejo de defecação.

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208 Fisiologia Digestiva

A absorção de cálcio se dá pelos canais próprios na membrana luminal, com bombas de cálcio na

membrana basolateral. O cálcio se liga à calmodulina e calbindina, o que é capaz de criar um gradiente de

concentração. A vitamina D aumenta a atividade das bombas e canais de cálcio, além de aumentar a

expressão de calbindina.

Fatores que afetam a biodisponibilidade de cálcio são o fitato e o oxalato (diminuindo a sua absorção), o

fosfato (aumentando a entrada de fosfato e diminuindo a absorção de cálcio). O tomate tem muito oxalato,

que pode se precipitar nos rins formando cálculos renais. O fitato está presente no café e no chá preto.

O ferro absorvível para nosso organismo é o Fe2+, sendo que Fe 3+ precisa ser reduzido; vitamina C e pH

ácido aceleram essa redução. Assim, complexos para anemia possuem sulfato ferroso e vitamina C,

aumentando a biodisponibilidade de ferro no organismo. Em grávidas, prefere-se o ácido fólico. (ver quais

as melhores fontes do organismo).

No lúmen intestinal, temos o transportador DCT1, simportador de ferro com hidrogênio. Existe um

transportador de heme, e uma ferro-redutase que converte, de forma menos expressiva, o ferro de 2+ para 3+. Dentro das células, o Fe2+ é reoxidado por uma oxidase a Fe3+, estando acoplado a proteínas ligantes e à

ferritina. No sangue, é transportado junto à transferrina.

Os fatores que influenciam a disponibilidade de ferro negativamente são o pH alcalino, as proteínas do

leite, o fitato, o fosfato, o oxalato e o tempo rápido de trânsito intestinal. A deficiência de ferro gera

anemia ferropriva (microcítica hipocrômica), menor fixação de oxigênio pela hemoglobina, fraqueza, fadiga,

palidez, parestesia, entre outros.

A absorção de vitaminas lipossolúveis, por sua vez, se dá junto aos lipídeos da dieta, chegado pelos vasos

linfáticos ao fígado. A maioria, porém, é hidrossolúvel e absorvida de forma passiva no jejuno.

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Anotações de Fisiologia 209

A absorção de vitamina B12 merece atenção especial. Ocorre na região do íleo, dependendo do fator

intrínseco produzido no estômago para ocorrer. Geralmente, está ligada à proteína R; esta ligação é

rompida pela pepsina. O fator intrínseco ligado à vitamina B12 forma um complexo, que é recebido e

absorvido pelas células da mucosa intestinal. Logo, gastrectomias podem causar depleção de fator

intrínseco e hipovitaminose de B12.

O fósforo, combinado ao cálcio, forma hidroxiapatita, componente de ossos e dentes. Está também na

constituição de fosfolipídeos de membrana e do ATP; regula o equilíbrio ácido-base e ativa enzimas.

Presente em grãos e cereais, é absorvido por transporte ativo ao longo do intestino.

Para finalizar, o intestino grosso só é capaz de absorver líquidos vindos da ingestão de soluções

eletrolíticas. Bactérias ali presentes geram ácidos neutralizados pelo bicarbonato e pelo muco alcalino.