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ESTUDOS DA LITERATURA PORTUGUESA

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ESTUDOS DA LITERATURA

PORTUGUESA

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ESTUDO DALITERATURA

PORTUGUESA

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Pedro Daltro Gusmão da Silva

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DO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERÍODO

DE GRANDES TRANSFORMAÇÕES LITERÁRIAS

DO ROMANTISMO À LITERATURA

CONTEMPORÂNEA

SumárioSumárioSumárioSumárioSumário

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A LITERATURA PORTUGUESA DA

IDADE MÉDIA AO ARCADISMO

DO TEATRO PORTUGUÊS AO ARCADISMO

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O Teatro Gil Vincente

A Novela de Cavalaria

A Formação de um Estado Independente: Portugal1ª Época Medieval

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Atividades Complementares

Classicismo

Barroco

AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES LITERÁRIAS EM PORTUGAL

2ª Época Medieval ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 17

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○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Arcadismo ou Neoclassicismo 33

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Atividade Complementar 37

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Romantismo: Contexto Histórico e 1ª Geração 39

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Romantismo: 2ª e 3ª Gerações

Realismo○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Simbolismo 54

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Atividade Complementar 59

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O MODERNISMO PORTUGUÊS E ALITERATURA CONTEMPORÂNEA ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

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Modernismo: Contexto Geral e a Geração Orfeu 61

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Fernando Pessoa e os Heterônimos

A Geração de Presença○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○José Saramago: O Nobel da Literatura 67

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○Atividade Complementar

Atividade Orientada

Glossário

Referências Bibliográficas

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Apresentação da Disciplina

Apresentamos, neste Módulo, uma visão geral da Literatura Portuguesa.O espírito que norteou nosso trabalho foi o de elaborar um material sério,consistente e agradável, que servirá como ponto de partida para o estudo daHistoriografia Literária de Portugal.

Quanto à apresentação dos assuntos, partimos do conceito de Estilo deÉpoca para estudar cada momento literário, no contexto em que foi produzido edifundido, visando que vocês, alunos, possam desenvolver, através desseaprendizado, um espírito crítico em relação à literatura em questão. A opção poresta divisão tem um cunho didático e funciona como uma síntese. É impossívelabarcarmos todo o conhecimento acerca de tudo o que chamamos de LiteraturaPortuguesa, porém, esperamos que o conteúdo disponibilizado aqui funcionecomo o início de uma longa e apaixonante viagem literária.

Longe de ser a única possibilidade de trabalho, este Módulo é uminstrumento que, utilizado como base de estudo, certamente contribuirá parapromover a reflexão e a autonomia do seu aprendizado. Como o ensino de literaturadeve estar sempre intimamente articulado com a leitura e a escrita, sugerimosque vocês, educandos, promovam momentos de leitura dos livros mencionadose elaborem resenhas dos capítulos estudados, procurando relacionar o conteúdodos textos a outras fontes de pesquisas, como a Internet, filmes, etc. E, se possível,socializando essa reflexão com alguns de seus colegas através de e-mails echats.

O material está organizado em 2 Blocos temáticos, subdividido em 4 Temase estes apresentados em 16 Conteúdos, nomeados de acordo com os assuntose objetivos abordados. No Bloco 01, estudaremos desde a origem da Literaturaem Língua Portuguesa ao Arcadismo. No Bloco 02, veremos o período quechamamos de “Romântico” até o que denominamos “Tendênciascontemporâneas”. No final de cada Tema acrescentamos questões para fixaçãodos assuntos estudados. Todas as atividades didático-pedagógicas deste Módulopartem da leitura do material impresso e da sua complementação virtual,disponível na home-page.

Esperamos que este material vá ao encontro das atuais necessidades docurso e do aprendizado sobre a literatura lusa.

Seja bem-vindo (a)!Roselana Trindade

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A Formatação de um Estado Independente: Portugal

Neste primeiro bloco, estudaremos as principais manifestações da LiteraturaPortuguesa, desde o Trovadorismo, na Idade Média, ao período denominado de Arcadismo,também conhecido como Neoclássico.

Veremos que os primeiros textos literários portugueses remontam ao século XII, ouseja, muitos séculos antes da chegada da frota comandada por Pedro Álvares de Cabralao território brasileiro. Veremos, portanto, que a Literatura Brasileira trás, em si, uma herançado período que estudaremos a seguir.

Contextualizando o Medievo Literário Português

O CONDADO PORTUCALENSE

A independência de Portugal foi conseguida de formagradativa, contra os reinos cristãos da Península Ibérica. Atranqüilidade conseguida com os casamentos reais1 (Reino de Leãoe Reino de Borgonha) foi abalada com a morte do Imperador AfonsoVI (final do Séc. XI) e a tênue unidade política se desfaz, ocorrendoas lutas entre os reinos cristãos.

Abdala Junior e Paschoalin2 assinalam que “apesar do processo de independênciade Portugal está ligado à diferenciação das atividades econômicas da região e às rivalidadesentre os grupos feudais. Foi, entretanto, o povo quem participou ativamente desse processo,através de organizações municipais, os Concelhos populares”. Os Concelhos (dentro dosistema feudal) propiciaram a D. Afonso Henriques (reconhecido Rei, pelo papa, em 1179),filho de Tareja, as forças militares necessárias para a independência.

O sistema vigente na Europa, o feudalismo, por predominargrupos sociais fechados, impossibilita a mobilidade de classes. Nestesistema social, competia aos servos trabalhar para, seus senhores; ànobreza feudal competia defender a sociedade; e à igreja, orar portoda a sociedade. Lembremos que em Portugal dentro dos “coutos”(propriedade da Igreja) ou da “honras” (propriedade da nobreza) ossenhores eram autoridade absoluta e só prestava obediência ao rei –que detinha os direitos de justiça suprema.

AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES LITERÁRIAS EM PORTUGAL

A LITERATURA PORTUGUESA DA IDADE

MÉDIA AO ARCADISMO

¹ Casamentos Reais:URRACA – Filha legítima e herdeira do trono casa-se com o conde Raimundo de Borgonha e recebe a região da Galícia.D. TAREJA – Filha ilegítima, casa-se com D. Henrique de Borgonha (primo do conde Raimundo de Borgonha) e recebe a regiãodenominada de Condado Portucalense, que abrange a área entre o Minho e o Tejo.² História Social da Literatura Portuguesa

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Temos, portanto, uma organização social fechada, que é reiterada peloespírito teocêntrico. A Igreja, rica senhora feudal, além de ensinar os mistériosda fé nas freqüentes missas e/ou em outras cerimônias religiosas, como asperegrinações ou romarias, era também responsável pela difusão da educação– o centro da instituição pública se localizava nas catedrais ou nas escolasepiscopais, nos conventos e mosteiros. Mediante a esse contexto, as grandesmassas adquiriam conhecimentos teóricos e práticos transmitidos por via oral.

Tradições populares, romances, sermões e provérbios tinham papel importante na formaçãodos indivíduos, fato observado desde o reinado de Sancho I, filho de Afonso Henrique.

Nas feiras circulavam a literatura oral, sendo divulgada por meio dos jograis,recitadores, cantores e músicos andarilhos. A poesia e a música estavam sempre ligadas,o trovador compunha o poema que era cantado pelo jogral, que percorria todo o reino,inclusive as peregrinações religiosas e as festas palacianas, acompanhado pelo menestrel,músico agregado a uma corte.

Essa produção cultural trovadoresca, chamada de literatura cantada e, por isso,conhecida como cantigas, sobrevive até hoje em coletâneas renascentistas registradas emcoleções, Os Cancioneiros. Infelizmente, as partituras das músicas se perderam quase todas,sobrando nos dias de hoje apenas cinco, escritas por Martim Codax.

A Literatura

De um modo geral pode dizer-se que apesar da Literatura portugue-sa ter expressãoliterária em todos os gêneros, predomina o lirismo em todas as suas formas até na épica,características aparentemente dominantes no temperamento nacional.

A primeira forma das literaturas ocidentais é a poesia e é oral: e compilada de formaescrita posteriormente, transcritos os poemas de memória. O verso com ritmo e rima émais fácil de memorizar e sobreviveu até ser registrado, o que não aconteceu com as estóriasque necessariamente existiram e poderiam ter caráter literário também.

A história da poesia moderna ocidental inicia-se com a poesia cavalheiresca daIdade Média. Depois de um período de três séculos em que a poesia provinha exclusivamentede monastérios, e tinha a religião como tema, a poesia cavalheiresca, em pleno teocentrismomedieval, tem como objeto o profano, o homem e os seus sentimentos, principalmente oamor.

O lirismo provençal irradiou-se por toda a Europa meridional e não se compreenderiaPetrarca e Dante sem ela como antecedente. É proveniente de Provença, região ao sul daFrança que tinha muita riqueza devido ao próspero comércio com a bacia mediterrânea e onorte de África de Massília, cidade fundada pelos romanos. Ali dominava a língua d’oc,doce e rica, enquanto no norte da Gália se falava a língua d’oil, rústica e veemente, que vema ser usada na prosa. Prosa essa que influenciará também as outras literaturas do mundoocidental com os romances do ciclo Bretão (rei Artur) e com as novelas do ciclo carolíngio(Carlos Magno e a demanda do Cálice Sagrado).

Os provençais foram, portanto, os mestres e iniciadores da poesia européia moderna.Como sua influência aconteceu em Portugal:

1 - Casamento dos três primeiros reis de Portugal com princesas do sul da Gália,que traziam em seu séquito jograis e trovadores.

2 - A primeira dinastia é chamada de Borgonha porque foi fundada pelo conde deBorgonha e foi toda ligada à França.

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3 - As romarias aos santuários famosos como o de Santiago de Compostela. Ocanto, a poesia e o drama litúrgico eram os meios com que o clero fomentava o interesse ea participação do povo. Esses foram evoluindo e expulsos para os adros. Vinham romeirosde França com seus cantares característicos. Nos santuários, vários povos confraternizavamculturalmente.

4 - O intercâmbio de várias espécies entre portugueses e provençais: relaçõescomerciais, vida comum entre os cruzados, as viagens dos cruzados lusitanos, etc.

Em toda a cristandade medieval, a Igreja viu-se obrigada primeiro a proibir a práticade ritos e festas pagãs que persistiam em cantos e danças eróticas de mulheres dentro dospróprios templos.

Depois expulsou estas manifestações que se davam nos adros (manifestaçãopersistente seria, por exemplo, as lavagens dos adros das Igrejas em Salvador.

Os costumes e as práticas populares medievais nos adros das igrejas ou por ocasiãode feiras de produtos é uma fonte de restauração das energias gastas no sacrifício e notrabalho durante o resto do ano. No momento da romaria, cessa o penoso trabalho de todosos dias, instaura-se o reino da abundância, da permissividade, da alegria; há trocasmateriais, culturais e afetivas; danças, cortejos triunfais, aproximação entre pessoas,encontros e fusões de grupos e categorias pela conjuntural cessação das proibições, tudoisto se sente ou se pressente na poesia trovadoresca.

Desde o fim do século XII, com a formação das cortes senhoriais, a produção culturalnobre diversifica-se: surge a poesia lírica e satírica, com as cantigas de amigo, de amor ede escárnio e maldizer. Assiste-se, então, a uma intensa atividade criativa, constantementerenovada pelos contatos e a competição com as cortes estrangeiras, que os cavaleirosjovens, idealistas, aventureiros e sem fortuna, visitavam freqüentemente, trazendo paraPortugal as influências culturalmente preponderantes na Europa da época: as influênciasprovençais.

Os poetas conseguem dar vivacidade aos diversos estados emocionais da mulherenamorada: a saudade, o ciúme, o ressentimento, os amuos, as ansiedades, asdesconfianças, a reivindicação da liberdade exigida à mãe são expressas de modo muitovivo; as mulheres ora são ingênuas ou sabidas ora compassivas ou calculistas e astutas,sensíveis ou indiferentes, ora se entregam ou se negam aproveitando-se dos seusnamorados. Os poetas trovadores mostram uma ampla experiência que a sua vidasentimental variada lhes proporcionou. Nas canções de amigo, de origem local, o amor nãoé experiência idílica, platônica, ela é realista, física.

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: O SÉTIMO SELO (Det Sjunde Inseglet, Suécia, 1957)

DIREÇÃO: Ingmar BergmanELENCO: Max von Sydow, Gunnar Bjomstrand, Bengt Ekerot, NilsPope, Bibi Anderson, Ingá Gill, Maud Hanson, Inga Landgre; 102min.O século XIV assinala o apogeu da crise do sistema feudal,representada pelo trinômio “guerra, peste e fome”, que juntamente

com a morte, compõem simbolicamente os “quatro cavaleiros do apocalipse”no final da Idade Média. Nesse contexto de transição do feudalismo para ocapitalismo, além do desenvolvimento do comércio monetário, notamostransformações sociais, com a projeção da burguesia, políticas, culturais e atéreligiosas com a Reforma Protestante e a Contra Reforma.

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1ª Época Medieval

A POESIA LÍRICA GALEGO-PORTUGUESA

O nascimento da produção literária portuguesaacontece quase simultaneamente à formação da naçãolusa. Apesar de seus primeiros representantes serem

todos ligados à corte, não devemos atribuir à primeira fase daLiteratura Portuguesa, a da lírica dos trovadores – também conhecidacomo poesia lírica galego-portuguesa –, um caráter nacional. Énecessário considerar que as fronteiras políticas e culturais naPenínsula Ibérica, nesse período, eram muito flexíveis, pois os laçosmatrimoniais entre os nobres de diferentes cortes eram comuns, fatoque favorecia a sua circulação.

Outro fator de grande importância para o seu desfronteiramento foi a utilização deuma língua única para as composições. A língua usada ainda não é o português, mas ogalego-português, um romanço (língua de origem latina) falada na costa da Península Ibérica.Apesar desta língua ser usada somente no Noroeste da Península, sua escolha não foialeatória. Lembremos que a região formava uma unidade política cultural que abrangia aGaliza e o território que se tornaria o reino português. Acontece que, mesmo depois dodesmembramento, Portugal continuou a manter relações culturais estreitas com a regiãogalega, transformando-se em uma região de importante intercâmbio cultural, principalmentecom as peregrinações a Santiago de Compostela.

Não é fácil datar com precisão as primeiras composições do período trovadorescoportuguês, seja pela escassez dos dados biográficos de muitos dos poetas, seja pela naturezaprópria a essa poesia: a da oralidade. Uma das mais antigas manifestações literáriasgalego-portuguesas que se tem notícia é a cantiga de maldizer feita por João Soares dePaiva “Ora faz ost’o Senhor de Navarra”, mas muitos consideram a Cantiga da Ribeirinha –também chamada de Cantiga da Garvaia – como a mais antiga, por ser esta a mais antigaregistrada. A Cantiga da Ribeirinha foi composta por Paio Soares de Taveirós, provavelmenteno ano de 1189 (ou 1198, há rasuras na datação). Como as datas não são claras e ascontrovérsias entre os estudiosos desse assunto são constantes e cabíveis, conveniou-sedatar, portanto, como marco inicial da Lírica Medieval Portuguesa, o último decênio do séculoXII. Ela se estende até o ano de 1418, quando se inicia, em Portugal, o Quinhentismo; e, naGaliza, os chamados Séculos Escuros.

A primeira geração histórica dos trovadores foi caracterizada pelopolicentrismo e a extrema mobilidade dos poetas. Depois, uma segundageração denominada “geração do meio” surge na corte de Fernando III,Afonso X de Leão e Castela e na do rei português D. Afonso III. A poesiadesta nova fase possuía um caráter dirigido, ou seja, os interlocutoresse apresentavam em forma de desafio, provocando, assim, a respostade outros trovadores. As cantigas de maldizer foram bastante favorecidaspelo grupo.

Embora este período seja de grande atividade poética, entra em declínio com a mortede Afonso X e, mesmo ainda existindo trovadores importantes, é a corte de D. Dinis quepassa a ser o centro dos trovadores, sendo ele próprio um grande poeta, mas faltou em suacorte um movimento poético que envolvesse a todos, como na geração anterior. Com a

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morte de D. Dinis poderíamos pensar no fim do lirismo trovadoresco, no entanto documentoscomprovam ter existido, ainda, uma pequena atividade poética patrocinada por seu filho Pedro.

As origens da poesia lírica:

Uma poesia com influência Provençal e/ou uma poesia de caráter popular?

A poesia trovadoresca Provençal surge no sul da França em fins doséculo XI, tem o seu apogeu no século XII, e declina no século XIII, quandoa crise dos senhores do sul obriga os trovadores a abandonarem a regiãoem busca de novos patrocinadores. É caracterizada por ser o primeirolirismo Ocidental em língua vernácula e pelo caráter inovador dessa poesia.Mesmo com toda a influência socio-cultural somada, ela representou umaruptura com o período clássico até então cultivado e, principalmente, umanova visão de mundo. Um jeito novo de fazer poesia valorizando o erotismo e apresentandouma outra forma de falar de amor, marcada pelo código de comportamento amoroso chamadofin’amors mais tarde conhecido como o “amor cortês”.

Esse código possivelmente tenha chegado filtrado em Portugal e na Espanha devidoà religiosidade vigente, pois Provença era considerada a corte da luxúria e a poesiaconsiderada demasiadamente erótica.

“““““ Podemos, então, dizer que o erotismoprovençal foi podado pelo moralismo religiosodos trovadores galego-portugueses?

A relação amorosa cantada pelos trovadores provençais é a transferência do sistemade vassalagem existente na Idade Média. Representado por um amor cortês no qual umhomem da baixa nobreza apaixona-se por uma dama de classe superior que, devido a estadiferença, não irá retribuir a esse amor, passando a existir uma vassalagem amorosa. Maso amado não quer possuir a amada, e sim gozar desse estado de não-possessão, emboraele sonhe com a retribuição por parte da amada, mesmo porque ela representa a suaascensão social. Percebemos ser o sentimento amoroso concebido numa tensão constantepelos trovadores desse período.

E foi esta a poesia difundida por toda a Europa Ocidental, em diferentes proporções,a depender da região. O norte da Itália e a Catalunha, por estarem mais próximas e possuíremcostumes parecidos aos da região Provençal, receberam uma influência mais direta,enquanto a Península Ibérica teve uma influência filtrada e menor.

Os Cancioneiros

As poesias trovadorescas galego-portuguesas são consideradas como LiteraturaRomânica e não são propriamente portuguesas, pois abrangia a península Ibérica (hojePortugal e Espanha). Foram, primeiramente, registradas pela oralidade e só depois dealgum tempo fixadas por escrito e transmitidas em três coletâneas:

Cancioneiro da Ajuda; copiado provavelmente na corte de D. Monso X. Contémapenas as cantigas de amor dos poetas mais antigos.

Cancioneiro da Vaticana; feito na Itália, inclui cantigas de amor, de amigo e deescárnio e maldizer.

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Cancioneiro da Biblioteca Nacional; é o mais completo.Contém a “Arte de Trovar”, tratado poético que possui instruções para osleitores quanto a arte de compor trovas.

Por falta de registros suficientes, não há como ter umamelhor compreensão do período dos trovadores. Inicialmente,por ser uma poesia destinada à oralidade, e esse motivotornava desnecessário um registro escrito, e também pelonão reconhecimento da importância de conservá-la. Acredita-se ter havido uma divulgação escrita dessas cantigas, porémem pequeno número.

Gêneros principais da poesia trovadoresca

A poesia trovadoresca apresenta dois gêneros principais: a lírico-amorosa e a sátira.A poesia lírico-amorosa divide-se em Cantiga de Amor e Cantiga de Amigo e a poesiasatírica divide-se em Cantiga de Escárnio e Cantiga de Maldizer.

Cantiga de amor

O homem canta o seu amor à amada, sendo ela uma dama da alta nobreza e ele declasse inferior. De origem provençal, embora tenha perdido um pouco da variação das formase da riqueza de expressão desta poesia. Isso porque, como já vimos, sofreu algumasmodificações para se adequar a Península Ibérica. Um outro fator que indica diferença dessacantiga de uma região para outra é que, enquanto na Provençal o amante nutre um desejode recompensa por parte da amada e ele vive com alegria esse amor platônico; o amanteda poesia galego-portuguesa se torna um coitado, vítima de um amor inacessível que sótraz lamento e desilusões e amar é um grande pesar que culmina com o desejo da morte.

Quanto à estrutura e regras formais, podemos dizer que embora a lírica galego-portuguesa não tenha desenvolvido tantos estilos como a Provençal, ela manifesta umagrande preocupação formal. As cantigas eram classificadas em dois tipos: cantigas derefrão e cantigas de mestria (sem refrão), e os trovadores utilizavam alguns recursosestilísticos para darem acabamento formal as suas cantigas.

Cantigas de amigo

Diferente das cantigas de amor, o eu-lírico desta é feminino. O trovador se expressapela voz da mulher – que tanto pode se dirigir ao amigo, como à sua mãe, irmãs ou mesmoa algum elemento da natureza. Podemos, então, dizer que essas cantigas podem serdivididas em dois tipos. O primeiro tipo, que se dirige a um amigo, é muito parecido com asde amor, pois elas apresentam o ponto de vista feminino do amor cortês se dando às vezesaté a substituição do vocábulo “amigo” por “mia senhor”. A semelhança era ainda maiorquando os trovadores desenvolvem o mesmo tema nos dois gêneros.

As características mais marcantes desse tipo de cantiga é o paralelismo, que consisteem montar uma composição com base em segmentos repetidos. Sendo este um recursopoético comum na chamada poesia tradicional, de cunho popular. Recurso que se tomoumuito importante para os trovadores, e se espalhou por todos os gêneros, inclusive ascantigas de amor, onde o paralelismo semântico é facilmente encontrado.

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Muitos estudiosos, ao se depararem com essas cantigas, se deslumbram não sópor seu caráter inovador, mas, principalmente, por pensarem estar diante de uma poesiapuramente popular. A origem dessa poesia pode ser explicada como sendo uma poesiafeminina pré-trovadoresca, o que é reforçado pelos materiais encontrados. Isso nos leva acrer que inicialmente esse tipo de cantiga tradicional não encontrou lugar entre os nobres,embora eles tenham com certeza apreendido um pouco do gênero. Mas não podemosesquecer que os textos das cantigas que possuímos são obras de poetas conhecidos, dentrode uma poética aristocrática.

Cantigas de escárnio e maldizer

Antes de tudo, é necessário estabelecer uma pequena diferença entre esses doistipos de cantiga. As cantigas de escárnio o trovador usa termos ambíguos que dificultam acompreensão imediata dos insultos, enquanto nas de maldizer o poeta usa palavras violentase diretas.

“““““REFLITA

Apesar das diferenças, as cantigas de escárnio e maldizer possuemalgo que as unem: ambas falam mal de alguém, além de pertenceremao gênero satírico, por vezes burlesco e obsceno, e serem muitoapreciadas pelos poetas galego-portugueses.

Devido a essas semelhanças, muitos estudiosos preferem uma classificação geraldessas cantigas por perceberem que em muitas poesias esses critérios se misturam.

Devido à linguagem utilizada e por tratar de temas obscenos, parece ser um gênerototalmente distante dos demais, no entanto, se fizermos uma analise mais minuciosa veremosque elas estão ligadas a começar pelos autores, são os mesmos das de amor e de amigoe, sobretudo, pela capacidade desse gênero em incidir nos demais, parodiando-os.

Um outro tipo de poesia é a Mariana, que existiu no século XIII, que são cantigasde Santa Maria. Por apresentarem temas e reflexões mais amplas e possuírem mais poesiasnarrativas que de louvor à virgem, muitos autores não as consideram quando analisam apoesia galego-portuguesa, todavia não se podem ignorar as pontes que ligam esse gêneroaos demais. O primeiro é o fato de ela ser escrita em galego-português e também sercomposta como uma unidade de música e poesia. Sem contar os traços líricos e satíricosencontrados em algumas dessas cantigas.

Para concluir, é preciso ressaltar que, embora as inúmeras críticas feitas à poesiagalego-portuguesa, muitas vezes vista como um ramo da poesia Provençal, é incontestávelsua importância para a formação de uma nova geração poética, que muito influenciou napoesia procedente. Além de retratar a sociedade da época de uma forma inovadora e devários ângulos sociais – a corte através das cantigas de amor, o ambiente mais simples ecampestre do povo com as cantigas de amigo e ainda uma crítica cômica de todo o sistemasocial com as cantigas de escárnio e maldizer.

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A Novela de Cavalaria

A Demanda do Santo Graal

Considerada pelos estudiosos como um dos assuntos mais espinhososda literatura medieval, devido a enorme quantidade de textos e as inúmerasversões de uma mesma obra, a “matéria da Bretanha” é também um dos temas

fascinantes do medievo, embora não seja nada fácil estudar esse período. Muitas vezes énecessário que o especialista recorra a um trabalho arqueológico e filológico das obrasexistentes para esclarecer datas, local de origem, etc.

O primeiro nó a desatar é quanto à originalidade da demandaportuguesa. O único documento existente é o códice 2594 daBiblioteca Nacional de Viena que é, na verdade, uma tradução deum outro original, possivelmente francês, cujo paradeiro édesconhecido. Um outro impasse é ter surgido nesta mesma época(1400-1438) uma outra versão castelhana do mesmo texto. Issodeu margem a inúmeras discussões acerca da prioridade de umasobre a outra. Mas estudos feitos por Rodrigues Lapa e D. CarolinaMichaeles de Vasconcelos demonstrou ser Portugal o responsávelpela tradução e adaptação da obra.

Com o objetivo de minimizar os problemas oriundos da diferença de datas entre ooriginal (século XIII) e a tradução (século XV) e também os de diferença cultural e aindadistingui-las das canções de gestas – cantigas medievais que celebravam os grandes feitosde heróis da época – é tradição dividir a ficção cavalaresca em três ciclos: o Carolíngio –que tem no imperador Carlos Magno e seus pares as figuras centrais; o Clássico – queabrange matéria da Antiguidade clássica, episódios e heróis das literaturas grega e latina;e aquele mais interessante para nós: o Bretão ou Arturiano – onde encontramos a figura doRei Artur e seus Cavaleiros na Bretanha, pois este é o único ciclo presente na prosaportuguesa.

Um esclarecimento muito importante a fazer é quanto àdistinção entre a lenda do Rei Artur e o mito do Graal. Apesar deaparecerem juntos na memória popular não são da mesma época,sendo o mito bem mais antigo que a lenda. O Rei Artur foiconsiderado um grande chefe guerreiro das Ilhas Britânicas, queentre os séculos VI e VII ficou célebre em perigosas batalhas contraos inimigos saxões, e teve suas histórias contadas principalmentepelos conteurs bretões (narradores de contos e fábulas folclóricasque passavam de pais para filhos). Observemos que este é umtema bélico por excelência, enquanto o tema do Graal eraessencialmente religioso.

Vendo por este ângulo, parece impossível a junção desses dois temas, no entantotemos textos históricos que traçam todo o caminho percorrido desde a primeira descriçãodos feitos do Rei Artur, com Nennius, até a união desses dois temas com Chrétien Troyesna obra Perceval ou le conte du Graal em que o autor vai além dos episódios amorosos,mergulhando em um universo místico, embora sem caracteres cristãos, é, com certeza, apartir daí que se dá a cristianização desse material.

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Se razões históricas e textuais explicam os laços entre o Graal e o Rei Artur, asafinidades temáticas parecem mais eloqüentes. A vida do rei Artur é totalmente envolvidapela magia de Merlin e pela proteção das fadas, pois foi ele gerado por meio da magia emesmo depois de morto foi levado pela fada Morgana à ilha de Avalon. E o povo ficou aesperar messianicamente a volta de Artur. Percebemos nitidamente a presença marcantedo misticismo não somente na vida do rei como também na vida do reino. São pormenoresque acrescentaram á biografia de Artur aquele halo espiritual responsável pela mitificaçãoda lenda.

A ligação do elemento guerreiro ao místico na configuração do Império adquiriu, naverdade, proporções gigantescas. Artur não era somente um chefe político, ele tornou-separa o povo também um chefe simbólico e a ambição de qualquer cavaleiro era tornar-semembro da ordem do Rei Artur, mesmo que para isso fosse preciso renunciar a toda família.Quando a “ordem arturiana” adquire tal magnitude – ao situar os homens num plano devalores em que o heroísmo guerreiro rivaliza com as qualidades morais, sempre cultivadaspor vias que exigem renúncias às vezes quase impossíveis, com vistas ao prêmio no fim dalonga caminhada, quando isso ocorre – a confluência na tradição do Graal parece inevitável:“o próprio Graal pode, no fundo, representar o elemento transcendente com que estacavalaria aspirava a completar-se”. Onde o fim justificava os meios, ou seja, a matança queocorreu na Demanda não era pecaminosa e sim demonstração de bravura para se alcançarà premiação.

Tendo em vista a importância da realidade histórica para toda e qualquer literaturanão podemos deixar de ressaltar alguns fatores que contribuíram para o surgimento edesenvolvimento da matéria ficcional da demanda:

A voga do neocetismo; com a conquista normanda, empreendida por Guilherme,abriu para o mundo as portas do folclore céltico-bretão, com seus inúmeros lutadores ferozese amantes insaciáveis protegidos pelo fantasioso mundo das fadas.

O movimento intenso das cruzadas, aproximando o Oriente e o Ocidente; como objetivo de proteger e recuperar os lugares sagrados e também “recuperar” fiéis para aigreja.

O surgimento da lírica trovadoresca; sendo o século XII considerado o século deouro da literatura da França, cuja importância é indiscutível como fonte de todo o lirismoeuropeu dos séculos posteriores.

A ascensão da cavalaria; que de simples organização militar começa a se transformarcom Carlos Magno (Século IX) numa espécie de confraria religiosa, exigindo do ingressantea observância de uma série de rituais.

Se aliarmos esses fatores ao intenso crescimento das cidades e surgimento dasuniversidades, teremos uma idéia do extraordinário choque de valores que caracterizou osséculos XII e XIII, onde a matança em nome de Cristo e a preservação dos valores da Igrejaeram sinônimo de obediência e valorização diante de Deus. E, as peregrinações eram umaforma de obter perdão dos pecados e reinstaurar a paz.

Inserida no centro dessas forças antagônicas, a Demanda do Santo Graal tornou-seo retrato definido da Idade Média mística e, ao mesmo tempo, o maior monumento literário

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que a época nos legou no campo da ficção. Quanto à estrutura, podemosdizer terem sido feitas em forma de novelas, o que permitia estruturar oscapítulos em contos independentes, com significado próprio.

Um dos pontos mais importante, quando analisamos a Demanda, épercebermos a influência da Igreja na sociedade da época. O remorso e aexpiação estão sempre presentes na vida dos cavaleiros. Na figura da “Besta

Ladrador” temos uma amostra da punição para aqueles que cometerem o crime do perjúrio,considerado pecado mortal. Sendo o juramento uma condição para ingressar na santa busca.Uma outra condição é não levar mulher na viagem, sob pena de, também, cometer pecadomortal. Pela proibição e a pena imposta, aqueles que desobedecessem – não conseguiriamchegar ao Graal –, percebemos que a Igreja não via com bons olhos a liberdade amorosacantada pelos trovadores e embalada pela fértil imaginação dos celtas.

Pobre de Lancelot, que embora seja considerado o cavaleiromais valente da corte arturiana é também o mais pecador. Como senão bastasse ser o pai bastardo de Galaaz, apaixonou-se pelaesposa do rei Artur, cometendo pecado duplo: adultério e traição, oque vai contra a moral da Igreja e a ética da cavalaria. Apesar deconhecedor da sua enorme culpa e de padecer com o remorso queela lhe causa, Lancelot não consegue deixar de amá-la e só aabandona depois que ela morre. Isso retrata a dualidade vivida porLancelot, de um lado o amor forte e inabalável pela rainha; do outro,o respeito, a admiração e a amizade por Artur, que apesar de tudo,ele continuava cultivando. Acontecimentos que o afasta das honrariasas quais os outros cavaleiros participam e, inclusive, da possibilidadede alcançar a conquista do Graal.

É nesse contexto que surge Galaaz como o “cavaleiro eleito”, “o puro dos puros”porque nunca pecou contra a castidade, passando, assim, a simbolizar um novo Cristo, quecom a conquista do Graal salvaria o reino do pecado e implantaria a tão sonhada paz.Mesmo com todos esses méritos, Galaaz não está livre da tentação, e como Jesus, foilevado ao “deserto” para ser tentado pelo Diabo, aqui simbolizado pela mulher: durante anoite Galaaz estava deitado quando a filha do rei penetra no seu quarto, porém ela o encontrausando um cinto de castidade e vendo seus planos frustrados, a donzela ameaça matar-se.Ele, desesperado, cede, mas já era tarde e ela havia morrido, mesmo assim ele foiconsolado e eximido de culpa por Boorz. Esse episódio prova que nem mesmo Galaaz, oescolhido, pode se descuidar e deixa claro as muitas provações encontradas peloscavaleiros. Todavia pensava-se que quanto mais difíceis os obstáculos, maiores as chancesde purificação e mais eminente o perdão de Deus.

“““““ Vamos reconsiderar os séculos XII e XIII?

A época é de conturbada polaridade; Deus e o Diabo estão como que lado a lado,com apelos igualmente sedutores; a Igreja e a cavalaria encontram na guerra santa e nomonge guerreiro uma forma de minimizar suas diferenças e, na literatura, o erotismotrovadoresco e combatido pelas hagiografias sobre a vida de santos e mártires. Divididosentre a oração e o pecado, o homem medieval vê nas cruzadas uma forma de adquirir operdão divino. Se confrontarmos essa realidade com a realidade dos Cavaleiros da TávolaRedonda e a Demanda perceberemos uma grande afinidade entre ambas, pois as aventuras

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existentes na busca do Graal eram formas de peregrinação. Sendo que na Demanda afantasia e a realidade se misturam, a ponto de não discernimos os limites entre esses doismundos.

Em suma, não é sem razão que a Demanda é considerada o maior monumentoliterário da Idade Média, pois além de ser uma obra coesa e extraordinariamente bemestruturada, ela também retoma elementos de crença heterodoxas, não para puni-los oucerceá-los, mas para revê-los e até absorvê-los, segundo os dogmas da Igreja.

2ª Época Medieval

As manifestações literárias da primeira época medieval caracterizavam-se pelopredomínio da oralidade e, por esta razão, as cantigas trovadorescas tiveram maior destaque.O século XV, segunda época medieval, representa um momento de transição entre a literaturatrovadoresca e o Renascimento do século XVI, é quando a prosa e o teatro ganham o primeiroplano. É um dos períodos mais dinâmicos da história portuguesa, pois, nesse século, alémde aumentar seus domínios, Portugal mostra para a Europa a força da coesão moral de umpovo solidário e fiel ao seu rei e uma unidade política inviolável, até então desconhecida.

Inicia-se em 1415, com a tomada de Celta, o período dosdescobrimentos e das conquistas marítimas. Durante mais de cem anos anação lusa se deteve no propósito mercantilista e a literatura acompanhouesse movimento, dando grande importância aos trabalhos históricos edidáticos: produção de textos de caráter documental, cuja finalidadeprimeira não seria exatamente literária e sim de doutrinação. Portanto,podemos deduzir que as grandes criações artísticas não encontravamespaço, e as canções, até então comum aos palácios, ficaram restritas àsreuniões familiares.

A prosa doutrinal encontra na família de Avis expoentes notáveis no séc. XV: O Livroda Montaria de D. João I, sobre a arte e os prazeres da caça; A Ensinança de Bem CavalgarToda a Sela e Leal Conselheiro, sobre a arte de montar e sobre a ética e a prática da vidaquotidiana, respectivamente, de D. Duarte; e Virtuosa Benfeitoria, adaptação de Sénecasobre os benefícios dos nobres, do Infante D. Pedro.

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: EXCALIBUR (Excalibur, inglaterra, 1981)

DIREÇÃO: John BoormanELENCO: Nigel Therry (Rei Arthur), Helen Mirren(Morgana),Nicholas Clay (Lancelot), Cherie Lunghi (Guinevere),Paul Geoffrey (Percival), Nicol Williamson (Merlin), Robert Addie

(Mordred), Gabriel Byrne (Uther Pendragon); 142 min.

Durante muitos séculos, historiadores consideraram Rei Arthur apenas ummito, mas a lenda, acredita-se, baseava-se em um herói real, dividido entresuas ambições pessoais e o dever para com o povo.

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O gosto dos desportos

Desde os meados do século XIV, a escola trovadoresca em Portugal,assim como o exercício da poesia, da imaginação e da sensibilidade começoua ser substituído pela cultura da força física. É Afonso IV que inicia

ostensivamente o predomínio do corpo sobre o espírito. Eram muitos os exercícios praticadosnaquela época, dentre os mais apreciados estavam as caçadas, a montaria, sem contar aslutas, os torneios, as justas, etc. Por conta dessa mudança no gosto da sociedade é quesurgiu uma literatura que refletia as preocupações dominantes da época. Um bom exemploé D. Fernando, ele trazia a casa cheia de falcões e encarregou seu falcoeiro Pero Meninode elaborar um tratado de mezinas para aplicar às doenças que atacavam os falcões. Estelivro, entre outros semelhantes, tem reduzido valor literário; o que não acontece com o Livroda Montaria, de D. João I, considerado um valioso documento da literatura desportivaportuguesa.

O livro da Ensinança de Bom Cavalgar

D. Duarte, ainda príncipe, começou este livro, levadopelo desejo de ensinar aos seus súditos a teoria de bemcavalgar. É uma obra original, não decalcada dos modelosclássicos, onde não abundavam livros destes, é um frutoda sua experiência. Todavia esse livro não pode serconsiderado apenas um ensinamento sobre equitação,pois ele transcende a esfera profissional e penetra nocampo psicológico, falando sobre o medo no aprendizadoda disciplina e recomenda a beleza das atitudes na prática dos exercícios. É a percepçãoestética do jogo clássico.

O Leal Conselheiro

Devemos a primeira edição deste livro aos esforços de dois portugueses, moradoresde Paris: o visconde de Santarém e José Inácio Roquette, o conhecido dicionarista. Nãotendo unidade de tempo nem de pensamento: é um tratado de recopilação enciclopédica,que versa as disciplinas mais variadas. D.Duarte, espírito exatíssimo, profundo observador,adquiriu cedo o costume de tomar apontamentos por escrito. Não confiava na memória. Olivro era dedicado a sua esposa, a rainha, e tinha, como o título indica, um fim educativo, eracomo que um guia de moral caseira.

O estilo de D. Duarte

Sem nenhum talento poético, D. Duarte empregava uma linguagem excessivamenteculta, prática pouco aceita no período medieval. Muito rigoroso no emprego dos vocábulos,chegava por vezes a discriminar as diferenças de sentido – É um dos primeiros em Portugalque não crêem na existência de sinônimos. Contudo, isso não deve ser atribuído ao seuinstinto literário, e sim a sua cultura moral e desejo de perfeição. Lia e traduzia o latim no

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desejo de se aproximar ao máximo do original e é este empenho de tradutor que dá ao seuestilo um caráter arrevesado e truncado, pois limitava-se a aplicar a sintaxe latina na fraseportuguesa.

O cronista Fernão LopesAo tempo em que D. Duarte compunha os últimos capítulos do

Leal Conselheiro, começa Fernão Lopes, arquivista das escriturasdesde 1417, a registrar em crônicas as estórias dos antigos reis dePortugal. Sua obra é fruto de um imenso trabalho, realizado em quinzeanos de busca fadigosa de documentos antigos de toda espécie e emvárias línguas. Compreendendo todas as crônicas, desde a do condeD. Enrique até à de D. João I. Inclusive, as crônicas dos reis antigos,que foram atribuídas a Rui de Pina – um furto literário denunciado porDamião de Góis com base, sobretudo, nas diferenças estilísticasexistentes.

Das crônicas que escreveu, só restam três:

a) Crônica de D. Pedro

Esta crônica abrange os dez anos de reinado de D. Pedro (1357 a 1367). É constituídapor um prólogo e quarenta e quatro capítulos. Tal como fez para as restantes crônicas,Fernão Lopes apoiou-se em fontes narrativas e diplomáticas, como é o caso dos documentosdos livros da chancelaria de D. Pedro.

História e mito tendem a se confundir no imaginário advindo do episódio que envolveInês de Castro e seu amante, o futuro rei de Portugal D. Pedro, filho de D. Afonso IV. Osprimeiros textos de que se tem notícia a enfocar o drama do “Romeu e Julieta português”(nas palavras de Alexandra MARTINS) são de Fernão LOPES (1380?-1460?), cronista queconduz a historiografia lusitana a novas perspectivas, ao filtrar as lendas dos fatos.

b) Crônica de D. Fernando

Esta crônica foi, provavelmente, redigida por volta de 1436. É constituída por umprólogo e cento e setenta e oito capítulos. Começa por relatar as peripécias de poucodepois da morte de D. Pedro, em março de 1367 e finda também pouco depois da mortede D. Fernando. Os últimos seis capítulos são de grande interesse, pois retratam a reaçãodo povo e de uma parte da nobreza, quando D. Leonor Teles se torna regente do Reino,substituindo a sua filha D. Beatriz, rainha de Castela.

c) Crônica de D. João I (1ª e 2ª partes)

Esta crônica é considerada a obra-prima de Fernão Lopes e, segundo algumasopiniões, é classificada como sendo mais épica do que Os Lusíadas e muito mais nacional.Em cronologia é a maior das crônicas, visto que abrange acontecimentos ocorridos durante28 anos. Na concepção de José Hermano Saraiva, a primeira parte da Crônica de D. JoãoI não é uma crônica no sentido rigoroso do termo, mas um livro de história, na acepção quehoje damos a esta expressão.

Trata-se do primeiro livro de História que se escreveu em Portugal e, durante muitotempo, o único. Nesta crônica, Fernão Lopes relata aquele que foi um dos momentos maisconturbados da história portuguesa: a crise de sucessão de 1383/85.

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O CANCIONEIRO GERAL

O fim do período de consolidação da língua (ou de utilização doportuguês arcaico) é marcado pela publicação do Cancioneiro Geral de Garciade Resende, em 1516, período no qual o Português tornou-se uma línguamadura, com uma tradição literária riquíssima, separando-se definitivamentedo galego (no séc XV, a língua na Galiza começou a ser influenciada pelo

Castelhano – basicamente o Espanhol moderno).

Tempo em que as guerras e a instabilidade da política nãorefrearam a aspiração de uma vida melhor, pelo contrário, a nobrezacompreendeu que só em volta do rei lhe restava viver para se abrigarda penúria e da opressão. A aristocracia começou a freqüentar ecultivar as reuniões e as maneiras do palácio. Nos tempos de D.João II, os serões tiveram grande esplendor, pois o rei prezava apoesia e sentindo que a sociabilidade poderia funcionar como umaobra de propaganda política, encontrou nesses encontros umamaneira de ter os fidalgos na mão. A corte, então, tornou-se oprincipal centro de produção cultural e literária, graças a essefortalecimento da casa real.

Freqüentador da corte, o risonho e inteligente Garcia de Resende, homem da criaçãode D. João II, teve a ótima idéia de compilar a produção poética do lirismo palaciano, obraque publicou em 1516, sob o nome de Cancioneiro Geral.

A moda de colecionar a poesia cortesã viera da Espanha, pois lá, a vida cortesã egalante começou mais cedo do que em Portugal, graças ao favor de reis como D. João II,grande agasalhador de poetas. O que resultou, na segunda metade do século XVI, umacusado predomínio da cultura e da língua castelhanas. Não é, pois, de se admirar quetopemos no Cancioneiro de Resende com numerosas composições em castelhano, e estehispanismo continuará pelo século de Quinhentos, favorecido já agora pela hegemonia políticade Espanha. Mas, acentuar-se, a maior e melhor parte do Cancioneiro está em línguaportuguesa.

É certo que há na poesia palaciana mais futilidade, já que a própria ocasionalidadeda inspiração dá um profundo acento a algumas composições feitas – lembremos que foramcompostas para serem recitadas e não para serem publicadas em livro. O fato maisinsignificante despertava a inspiração poética. E tudo isso se dava num ambiente deliberdade, característico da renascença.

A tradição lírica galego-portuguesa

Um dos fatos que devemos primeiramente destacar noCancioneiro é a persistência da antiga tradição lírica, não é clarosob o aspecto formal, pois há muito desaparecera o paralelismo dacantiga de amigo, mas pelo que se refere às tendências permanentesdo temperamento saudosista. O amor triste é ainda muito presenteno Cancioneiro de Resende.

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Mas o amor adquire aspectos novos, torna-se mais natural e mais atrevido. A damaaparece em acordo com a realidade e as relações afetivas são incrementadas por umtoque de ardência sensual. Havia, pois, um conflito aberto entre as duas concepções doamor: a tradicional, platônica, e aquela que já se respirava na atmosfera cálida e sensual darenascença.

A corrente satírica

Obedecendo ainda a uma corrente da antiga tradição, encontramos no Cancioneirofreqüentes exemplos do escárnio de amor; o poeta, despeitado dos rigores da dama, retrata-a em cores de fealdade física ou moral. Como modelo do poeta cômico, galhofeiro, que nãodesce ao fundo das coisas e se atém aos aspectos ridículos da vida, o Cancioneiro oferece-nos Henrique da Mota que, em certo modo, pode ser considerado um precursor de GilVicente, pois que as suas composições, dialogadas, são teatralizáveis e constituemverdadeiras farsas. As peças satíricas mais notáveis em alcance social são as trovas deÁlvaro de Brito Pestana a Luís Fogaça sobre os ares maus de Lisboa, as de Duarte daGama às desordens da vida portuguesa e as de Luís da Silveira e Garcia de Resende àmudança dos tempos.

Dantismo e petrarquismo

A influência dantesca aparece já no período galego-castelhano, mas vai-seacentuando cada vez mais, até que, no último quartel do século XV, dá lugar a uma formaespecial de poesia. Essa imitação de Dante de primeira mão deu-se primeiramente emEspanha e depois em a Portugal, por intermédio de Juan de Mena e do Marquês deSantilhana. A influência indireta de Dante foi igualada, senão até superada pela arte francesa,que era mais clara, superficial e acessível. Outra influência italiana e essa mais direta eprofunda, porque encontrava correspondência no nosso temperamento, foi a de Petrarca,que renovara no século XIV o lirismo dos velhos trovadores. A atitude petrarquista manifesta-se nas antíteses, nas imprecações dolorosas e na utilização artística da natureza comoespelho ou contraposição do estado de alma do poeta.

Temos, pois, que a dupla influência de Dante e de Petrarca despertou, ou melhor,renovou a sensibilidade romântica na poesia portuguesa: porque há uma verdadeiraantecipação romântica na poesia do Cancioneiro que se mostra nos contatos entre o poetae a natureza e ainda em o poeta procurar, numa saudade triste, os lugares em que viveu osseus antigos amores.

O espírito clássico

Já na poesia alegórica é evidente um certo estendal de erudição mitológica, mas sea forma denuncia já uma curiosidade renascentista, o fundo é ainda mais romântico-medieval.

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!!!!!

Esse mesmo espírito clássico provocou algumas tentativas falhadasde poesia épica. O ar andava, já então, carregado de inspirações heróicas.Simplesmente, ainda não chegara o tempo e o poeta que as havia decondensarem estrofes imortais. Um poeta de então, Luís Henriques, exercitarao verso maior em assuntos graves. Nem todos, porém, se deixaram ir nessacorrente. E um pequeno grupo de poetas, tocado de espírito horaciano,cultivando o conceito filosófico da mediania dourada, começou a reagir à

margem do bulício do palácio, contra as ambições do tempo. Esse pequeno núcleo aparecerepresentado no Cancioneiro por Diogo de Melo, Nuno Pereira e João Roiz de CasteloBranco.

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: 1492 - A CONQUISTA DO PARAÍSO(1492: Conquest of Paradise, ESP/FRA/ING, 1992)

DIREÇÃO: Ridley ScottELENCO:Gérard Depardieu, Sigourney Weaver, Armand Assante,Ângela Molina, Fernando Rey, Tcheky Kario, 150 min, Vídeo Arte.

A viagem de Cristóvão Colombo insere-se no cenário daexpansão ultramarina liderada por Portugal e Espanha entre os séculosXV e XVI. Portanto, para compreender a passagem da Idade Média paraa Idade Moderna, é necessário inseri-la no quadro das transformaçõespor que passou a Europa na Baixa Idade Média (século XII ao XV), durantea transição do feudalismo para o capitalismo comercial.

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AtividadesAtividadesAtividadesAtividadesAtividadesComplementaresComplementaresComplementaresComplementaresComplementares

O sentimento do eu-lírico ou eu-poético idealiza a mulher, elevando-a a um pedestal.Que versos expressam essa idealização?1.

Além de colocar nas mãos de Deus a possibilidade de ser feliz, o poeta atribui aEle a responsabilidade pela beleza da mulher. Que fragmento da cantiga expressa asegunda idéia?

2.

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O eu-lírico é masculino e tem um desejo.a) O que ele pede?

b) A quem ele dirige seus pedidos?

c) Se os pedidos não puderem ser atendidos, qual é a solução entrevista pelo eu-lírico?

3.

Nesse texto aparecem as características mais comuns da Cantiga de Amor. Traceum paralelo com o que você apreendeu sobre a Cantiga de amigo, confrontando asdiferenças e semelhanças entre elas.

4.

Alguns compositores se inspiram nesses tipos de cantiga para elaborar suascomposições. Nos dias atuais, que exemplos de Cantiga de Amor e de Cantiga de Amigopodemos extrair da música brasileira.

5.

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DO TEATRO PORTUGUÊS AO ARCADISMO

O Teatro de Gil Vincente

Durante a Idade Média surge em Portugal o Teatro Vicentino,representação que se caracteriza pelos temas, linguagem e atorespopulares. A carreira literária de Gil Vicente começa em 1502, quandorepresenta o Auto da Visitação, até o ano de 1536, ano darepresentação de sua última peça Floresta de Enganos. Durante osanos de sua trajetória teatral dedicou-se a escrever e representar teatropara o entretenimento da realeza e da fidalguia, são dezenas de peçasde temas variados. Escreveu cerca de 44 peças: 17 bilíngües, 16 emportuguês e 11 em espanhol. Na corte portuguesa usava-se, também,o idioma espanhol em razão da rainha Maria, segunda mulher de D.Manuel I, ser filha dos Reis Católicos da Espanha. Além disso, falarespanhol era sinal de distinção entre os nobres, pois o povo falavaapenas português.

Didaticamente, pode-se dividir em fazes o teatro vicentino. Temos três fazes principais:

1502-1514 – Sob influência de Juan del Encina.1515-1527 – Corresponde ao ápice da carreira dramática.1528-1539 – Teatro intelectualizado, sob influência do classicismo renascentista.

Quanto ao tema, pode ser dividido em:TradicionalPeças de caráter litúrgico, ligados ao teatro de Juan del Encina, aos assuntos bucólicos

e às novelas de cavalaria.AtualidadeCaracteriza-se pela presença de um retrato satírico do modo de viver do seu tempo,

e não perdoa nenhuma classe social, seja ela a fidalguia, a burguesia, o clero ou a plebe.

É um teatro baseado na espontaneidade e com intento de divertire organizava-se sob a lei do improviso. Supõe-se que Gil Vicente redigiaum roteiro básico, apenas para ordenar a encenação em uma seqüênciaverossímil. Lírico ou cômico, seus textos continham a predominância davisão medieval e de uma nostalgia de um tempo perdido. O grande méritodo autor é o seu talento de poeta, sobretudo de poeta dramático, é emconseqüência disso que o teatro vicentino se tornou um marco dentro daLiteratura Portuguesa.

VOCÊ SABIA QUE...

A obra literária vicentina possui uma linguagem arcaica, popular,não polida e sem termos eruditos? É que, mesmo escrita em linguagempopular, o vocabulário é rico, se adequando aos personagens, valendo-se ainda do latim eclesiástico e do baixo latim – usado pelo povo?

.

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Suas peças estão classificadas em obras de devoção, comédias,tragicomédias, farsas e obras miúdas, como monólogos e paráfrases desalmos e apresentam a seguinte divisão:

Os Autos: são composições religiosas, pastoris, nos quais se nota ainfluência do teatro pastoril de João de Encima, dramaturgo espanhol. Sãopeças de temática devota e moral, alegórica, que refletem os valores do mundo

medieval.

As comédias: trazem valores greco-romanos e mitológicas, contendo relatosromanescos como as novelas de cavalaria.

As farsas: preservam a mesma estrutura dos autos, traçando, porém, uma caricaturacontra os maus costumes, apresentando uma crítica social contundente, mordaz, carregadade alusões pessoais. De caráter pedagógico moral, há uma longa tradição na farsa medievalsobre o tema do adultério feminino.

Primeira fase: 1890 a 1198-1434

A criação literária portuguesa, no primeiro período medieval (1890 a 1198-1434),corresponde à floração trovadoresca e acontece quase simultaneamente à formação danação lusa. Essa produção cultural denominada também de cantigas era composta pelostrovadores e cantada pelos jograis que percorria todo o reino em ambientes diversos. A fimde preservar essa literatura, que era transmitida oralmente, fora fixada por escrito emcoletâneas denominadas cancioneiros.

A poesia trovadoresca é dividida em dois tipos: lírico-amorosa compreendendo àsCantigas de Amigo, associadas ao canto e à dança, impregnadas do realismo da vidacampesina, da sensualidade, queixume, euforia, amor popular e amor burguês; e as Cantigasde Amor de origem provençal, marcadas pela vassalagem amorosa, impregnadas peloidealismo, a “coita” de amor e idealização da mulher. O outro tipo é a satírica subdivida emescárnio, maldizer, seguir e tenção de briga. Os principais trovadores desse período foramPaio Soares de Taveirós D. Dinis, Martim Codax, Aires Nunes e João Garcia de Guilhade.Além poesia a época trovadoresca se caracteriza também pelo aparecimento da prosamedieval: novelas de cavalaria, retratando um heroísmo de influência religiosa e feudal,biografias, crônicas e livros de linhagem.

Segunda fase: 1434-1527

Período conhecido também como Humanismo, vai desde a nomeação de FernãoLopes como cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434, até o retorno de Francisco Sá deMiranda da Itália, quando introduziu uma nova estética, o Classicismo, em 1527. Teve comoprincipais características a divulgação dos mestres da Antiguidade greco-latina, o incentivoàs Universidades, a laicização da cultura e o Culto do Homem.

A prosa, no humanismo português, consistiu, principalmente, na crônica histórica eteve como principal expoente Fernão Lopes um cronista realista de técnica literária danarrativa, um criador de perfis psicológicos que tratou o povo como agente da história.Destacaram-se, também, Gomes Eanes de Zurara e Rui de Pina. Outro tipo de prosa

RESUMINDO...

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inaugurado pelo regime absolutista da dinastia de Avis foi a prosa doutrinária, direcionadapara a educação da realeza e da fidalguia, com o sentido de orientá-la no convívio social eno adestramento físico.

Além da prosa tivemos a poesia palaciana recolhidas por Garcia de Resende noCancioneiro Geral. São poesias já dissociadas de música, elaboradas para serem lidas erecitadas nas cortes. Surge também o Teatro popular de Gil Vicente produção literáriacaracterizada pela sátira à sociedade portuguesa e a visão religiosa medieval moralizadora.

Classicismo

O Renascimento e a Lírica Camoniana

Considerado o marco inicial da era moderna, o Renascimento é o mais importantemovimento de renovação cultural ocorrido na Europa durante os séculos XV e XVI. Ocrescimento gradativo da burguesia comercial e das atividades econômicas entre as cidadeseuropéias estimulou a vida urbana e o surgimento de um novo homem cujo reconhecimentode seu valor contribuiu para o enriquecimento do ambiente cultural, resultando na formaçãode um novo clima intelectual otimista e confiante na força do ser humano – que se torna ocentro do universo (antropocentrismo), manifestado pela ruptura com a tradição feudalque era marcadamente religiosa e teocêntrica.

A visão humanista é o primeiro impulso para o surgimento do Classicismo. Essemovimento literário surge em Portugal, em 1527. E, como resultado da mudança que ohomem tinha de si mesmo – sendo, portanto, uma continuação do Humanismo – sãotraduzidas e difundidas numerosas obras gregas e latinas, de assunto literário, filosófico ecientífico, com o objetivo de reviver os ideais da Antigüidade Clássica, influenciando assim,as artes, a cultura e a literatura.

Essa retomada à Antiguidade clássica influi diretamente na linguagem, na forma enos temas. A linguagem clássico-renascentista é a própria expressão das idéias e dossentimentos do homem do século XVI, sendo usada com clareza e objetividade, é sóbria,simples e precisa. A valorização da forma está expressa na preferência pelo soneto, comversos decassílabos distribuídos em duas quadras e três tercetos. Nesses versos é usadaa chamada medida nova em oposição à redondilha medieval, chamada de medida velha.Nos temas, presenciamos o uso da mitologia, do amor platônico, da exaltação dasfaculdades humanas (o herói nacional), do nacionalismo, do culto à beleza e da perfeição.

Temos, então, algumas características que individualizam o Classicismo:

HumanismoValorização da antiguidadeContenção líricaLocus AmoenusCarpe DiemVerossimilhançaAusência de Conflitos

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Estudoda LiteraturaPortuguesa“““““

VOCÊ SABIA QUE...

Entre os séculos XV e XVI, Portugal é um dos paísesmais importantes da Europa?

Portugal é, então, um dos países mais importantes da Europa e seencontra mergulhado no espírito aventureiro das viagens marítimas e dos descobrimentos.O espírito renascentista pode ser entendido como oposto ao que orientou o mundo medieval.O antropocentrismo toma o lugar do teocentrismo e o homem passa a valorizar oconhecimento, a filosofia e se volta para a razão.

Em Portugal, Luís de Camões é o homem-síntese, a expressãodo Renascimento. Camões inaugurou, em se tratando de linguagempoética, o Classicismo em terras Lusas. Considerado o poeta máximoda língua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lírica ea Épica. A épica tem n’Os Lusíadas a sua mais importante obraclassicista. A Lírica é representada pelos sonetos, mas tambémcontribuiu com canções e redondilhas. E, no gênero Dramático,escreveu Anfitriões, Filodemo e El rei Seleuco. Suas obras se situamentre o Classicismo e o Maneirismo.

Platão, Petrarca, Horácio, Virgílio entre outros do clássico grego e romano, assimcomo todo o Renascimento, pulsam na poesia de Camões, mas, dentre todas as influênciasrecebidas, Platão é considerado a principal, pois foi nas passagens da doutrina Platonianaque Camões soube ver uma forma de investigar as relações da palavra com seu referente,fazendo dele um exímio “manipulador” das mesmas.

[...]Que alma é tábua rasaQue com escrita doutrinaCeleste tanto imagina.Que voa da própria casaE sove a pátria divina [...]

Os sonetos contêm um grande lirismo. A preocupação técnica impressiona o maisparnasiano dos poetas, a mais comum das rimas de Camões possui os 14 versos emdecassílabo, distribuídos em 2 quartetos e 2 tercetos, de rima abba-abba-cde-cde. É declara descrição do ambiente, percebendo-se a presença de elementos pagãos e católicos.Os temas giram em torno do amor, abordado principalmente através da antítese amorplatônico x amor carnal; da busca da perfeição; do desconcerto do mundo; da pátria; deDeus; da figura feminina, na figura idealizada da mulher x beleza física; e da visão da natureza.

Infelizmente, dizem alguns estudiosos, que alguns sonetos que a ele são atribuídos,não são realmente de sua autoria, como por exemplo, um dos mais lidos e apreciados porseu lirismo de beleza universal:

Amor é fogo que arde sem se ver;É ferida que dói e não se sente;É um contentamento descontente;É dor que desatina sem doer; [...]

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O novo estilo de época que caracteriza o Renascimento é denominado de Classicismoe, em Portugal, é marcado pela convivência do feudalismo com o mercantilismo, pelasgrandes descobertas e por importantes transformações culturais. As principaiscaracterísticas do movimento foram a imitação dos clássicos gregos e latinos, o racionalismo,o antropocentrismo e o neoplatonismo.

Os autores de destaque foram Sá de Miranda, introdutor do movimento; BernardimRibeiro poeta e novelista; Antônio Ferreira que, além de poeta, era também dramaturgo, eLuís Vaz de Camões escritor mais representativo do Renascimento sendo também oprenunciador do Barroco. Além de poeta Camões era dramaturgo e cabe-lhe no queconcerne a linguagem poética a inauguração do movimento em terras Lusas. Consideradoo poeta máximo da língua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lírica e aÉpica.

No século XVI comparece, também, a prosa historiográfica tendo como principalrepresentante João de Barros, cuja concepção de história caracteriza-se pela preocupaçãode contribuir com o exemplo moral e superior dos heróis para a elevação dos espíritos.Outros historiadores desse período foram Gaspar Correia, Fernão Lopes de Castanheda,Damião de Góis e outros. A Novela de Cavalaria se nacionaliza com João de Barros quetraz como herói nessas narrativas os portugueses.

RESUMINDO...

BarrocoDois fatos importantes ocorridos em 1580, quando se inicia

o Barroco em Portugal, marcam a vida cultural e política do país, amorte de Camões e a de D. Sebastião na batalha de Alcácer-Quibir na África. Com o desaparecimento do rei, o trono portuguêsé passado para Felipe II, da Espanha, sendo Portugal anexado àEspanha e permanecendo sob seu domínio durante 60 anos.

Desse modo, o Barroco acontece em meio a uma crise de identidade do povoportuguês, que sob o julgo espanhol esforça-se em preservar sua cultura e sua língua, todaviapercebe a impossibilidade de ignorar as influências culturais espanholas. Ao mesmo tempoem que recebe forte influência da Contra-Reforma, de grande penetração nos países ibéricos.

Segundo Massaud Moisés1,o movimento Barroco – iniciado em Espanha eintroduzido em Portugal durante o reinado filipino – “é de instável contorno por correspondera uma profunda transformação cultural, cujas raízes constituem ainda objeto de polêmica.”Se tomarmos como base o aspecto literário, percebemos traços do Barroco já noRenascimento, no chamado Maneirismo.

O Barroco, no entender de alguns estudiosos, tornou-se a arte da Contra-Reforma, aqual teria absorvido a estética barroca fazendo dela uma espécie de estratégia decatequese, mesmo porque nesse período o ensino fica quase por completo a cargo dosjesuítas. A censura eclesiástica, nesse sentido representou um obstáculo a qualquer avançono campo científico cultural, por conta disso enquanto a Europa vivia um período deefervescência cultural a Península Ibérica permanecia um reduto da cultura medieval.

1 MOISES, Massaud. A literatura portuguesa, 3a edição, São Paulo: Cultrix, 1990.

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A estética barroca procurava sintetizar a visão de mundo medieval debase teocêntrica e a ideologia clássica renascentista, pagã, terrena eantropocêntrica. Era a tentativa de conciliar elementos opostos como o claroe o escuro, a matéria e o espírito, a luz e a sombra visando anular pelaunificação a dualidade do ser humano, dividido entre os apelos do corpo e osda alma. A arte assume, assim, uma tendência sensorial ligada ao mundofísico, ao mundo das percepções dando preferência às figuras de linguagem,

a um vocabulário rebuscado e aos jogos sonoros.

Como vimos, a dicotomia barroca servia como representante das confusões noespírito do homem da época. Esse embate entre os dois pólos radica no problema doconhecimento da realidade, que nessa perspectiva se faria de dois modos.

No primeiro modo, o conhecimento se faria pela descrição dos objetos, numestado de verdadeiro delírio cromático, em que se procurava saber o como das coisas.Conhecer seria descrever. Essa tendência recebe o nome de Gongorismo, por conta dainfluência do poeta espanhol Luís de Gôngora e seus adeptos, procuravam cultivar umalinguagem rebuscada, especiosa e rica e, para alcançá-la consideravam de bom tom oemprego de neologismos, hipérbatos, trocadilhos, dubiedades e todas as demais figurasde sintaxe que tornam o estilo pesado, tortuoso e alambicado. Expressão em forma depoesia.

No segundo modo, o conhecimento se faria pela análise dos objetos no sentidode lhes conhecer a essência, ou melhor, saber o que são, conceituá-los, para tanto, utilizam-se da inteligência e da razão sem prejuízo dos sentidos. Corrente denominada deconceptismo, expressa, sobretudo, em prosa, tinha como um dos principais representanteso espanhol Quevedo, do qual deriva o termo Quevedismo.

Não devemos pensar com isto que tais correntes jamais se cruzaram, mesmo porqueé comum encontrarmos numa mesma escritura traços tanto do Gongorismo como doConceptismo. Ambos obedecem a uma concepção pragmática de arte: o primeiro,enaltecendo as sinestesias, procura criar um clima de brincadeira verbal com o objetivo deentreter; o Gongorismo não raras vezes se propõe como espetáculo para o gozo dos sentidos,no qual se confundem poesia e prazer lúdico.

Não podemos esquecer que o Barroco começou nas artes plásticas, sendo essaépoca uma das mais importantes para as artes plásticas, embora não o seja para Portugal,onde poucas vezes alcançaram maior nível, relativamente ao resto da Europa, incluindo aEspanha aonde a arte barroca atingiu graus de primeira grandeza. Para Portugal estaliteratura não apresentou o brilho do século anterior. Faltou à época uma “atmosfera” comum,pois os intelectuais eram guiados por clichês ou padrões estéticos de alambicamento e deforçado sentido literário. Falta à época a conexão entre os homens, apenas aproximadospor coincidência.

Alguns representantes do Barroco

“““““VOCÊ SABIA QUE...

Padre Antônio Vieira também é estudado na Literatura Brasileira?

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Padre Antônio Vieira

O padre Antônio Vieira grande expressão do Barroco português ebrasileiro era assistido por grande dinamismo e boa oratória. Pensou muitadas questões candentes em seu tempo e procurou agir praticamente paralhes dá um rumo compatível com aquilo que julgava correto numa linha mentale política. Para o autor, o ato de pregar tinha como fim último a reafirmaçãodos dogmas da igreja, da redenção humana e da autoridade absoluta dopapa. Tendo sempre objetivos morais, Vieira procura convencer para ensinar,orientar, excitando os fiéis no entendimento das mensagens evangélicasque pretende transmitir.

Os sermões de Padre Antônio Vieira seguem a estrutura clássica que compreendeintróito (ou exórdio), em que o orador declara o plano a utilizar na análise do tema em pauta;desenvolvimento (ou argumento), em que apresenta o sermão propriamente dito; e aperoração em que finaliza conclamando os ouvintes a seguirem prática das virtudespropostas. Para Vieira os valores constituintes de um perfeito orador são três: ensinar,deleitar e mover. Diante disso, pregar é agir, falar não é apenas falar, e sim pensar e fazer.

Escreveu além de mais de quinhentas cartas, algumas delas em torno de importantesquestões da época, obras de profecia, mas é por seus sermões que Vieira é mais conhecido.De contorno dilemático, contraditório, feito de antíteses e oposições, instável como o próprioondular das idéias no esforço de orientar e persuadir, os sermões vieirianos correspondemà preocupação de anular a dicotomia radical existente no ser humano formado que é decorpo e alma. A característica comum às produções de Vieira é a união do tema religioso àquestão política, ofensivo, atacava tanto a inquisição portuguesa na perseguição aos judeus,quanto à escravidão que se imprimia à vida do indígena.

Barroco, conceptista e não gongórico, o padre Vieira parte sempre de um fato real,observado ou de flagrante presença para, de pronto, persuadir o ouvinte, chamando-o aodever de pensar e de reagir. Para ele, o sermão não era apenas pensamento e palavra, eranecessário pregar com gesto e voz. Voz forte, na tentativa de tirar o homem do tempo presentee projetá-lo para o futuro eterno.

Sóror Mariana Alcoforado

Sóror Mariana Alcoforado nasceu em Beja, onde professa cedo noConvento de Nossa Senhora da conceição. Em 1663 conhece Chamilly,oficial francês servindo em Portugal durante as guerras da Restauração.Enamoram-se. Um dia, porém, o militar regressa à França impelido porchamado superior, teriam trocado cartas, das quais só ficaram as escritaspela religiosa. Em 1969 publicam-se em Paris, pela primeira vez, as Lettresportugaises traduites em français. Naquele mesmo ano sai uma novaedição em Colônia e daí para frente foram lidas e traduzidas em váriaslínguas, sempre com progressivo interesse.

Embora existam muitas dúvidas acerca da autoria e da originalidade da mesma éinegável a importância destas cartas para a literatura portuguesa. Perpassa-as um soprode paixão incontrolada, insana, superior às inibições e convenções e ao impulso da vontadee da consciência moral. Paixão e não amor, pois o sentimento expresso contém na raiz um

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avassalador ímpeto carnal, explicável, inclusive, pelo quadro barroco em queo caso amoroso se desenrola. As cartas ganham maior relevo ainda comodocumento literário precisamente por não visarem a publicação nem a seremencaradas como peça literária.

Dispostas da forma como se apresentam, as cartas descrevem umacurva cujo ápice é marcado pela terceira carta na qual o sofrimento atinge o

limite máximo, graças à concentração de efeitos e sensações, apoiada numa linguagemprecisa, concisa, ao mesmo tempo em que suficientemente plástica para apreender o zigue-zague da paradoxal confissão.

Outros autores barrocos

No Barroco português, a prosa foi mais explorada. Tivemos além de Vieira, PadreManuel Bernardes, cuja produção é marcada pela clausura. O autor procura mostrar emseus textos que a relação com Deus é possível pelo culto das virtudes morais. D. FranciscoManuel de Melo produziu uma obra variada e numerosa que compreende poesia,historiografia, teatro polêmica, biografia e literatura moralista. Francisco Xavier de Oliveira(o Cavaleiro de Oliveira, como ele assinava) escreveu obras de observação e com propósitosdefinidos: realizar conquistas amorosas, defender-se dos ataques que lhe eram dirigidos esatirizar os costumes da época. O teatro foi representado por Antonio José da Silva, quetransforma a dramaturgia portuguesa. Escreveu suas peças em prosa utilizando-se deaspectos da sociedade de Lisboa para satirizar através do riso.

A poesia barroca

A poesia barroca portuguesa seguiu caminho diferente doda literatura doutrinária e moralista. Era poesia para entreter, valiapelo aspecto lúdico, pelo divertimento verbal, expresso nomalabarismo das imagens e das correlações sintáticas. Em síntesecorrespondia mais ao culto da forma, do verso, que do conteúdo.Apresenta-se em figuras isoladas e em antologias organizadascom o mesmo intuito das compilações dos cancioneirosmedievais. Sobressaem D. Francisco Manuel de Melo e FranciscoRodrigues Lobo, Gabriel Pereira de Castro, Vasco Mouzinho deQuevedo e Antônio de Souza de Macedo.

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: A MISSÃO (The Mission, ING, 1986)

DIREÇÃO: Roland JofféELENCO: Robert de Niro, Jeremy Irons, Lian Neeson, 121 min.,Flashstar

Ao longo dos séculos XVI e XVII várias missões católicas foram criadaspelos jesuítas na América do Sul. Surgidas no século XIII, com as ordensmendicantes, esse trabalho de evangelização e catequese, desenvolveu-se principalmente nos séculos XV e XVI, no contexto da expansão marítimaeuropéia. Embora o objetivo fosse a difusão da fé e a conversão dosnativos, as missões acabaram como mais um instrumento do colonialismo.

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RESUMINDO...

O início do Barroco em Portugal é marcado por dois fatos importantes que modificama vida cultural e política do país, a morte de Camões e a de D. Sebastião na batalha deAlcácer-Quibir na África. Este último evento acarreta a incorporação de Portugal ao domínioespanhol, sob o qual permanece durante 60 anos. Desse modo, o Barroco acontece emmeio ao fracasso econômico, estagnação cultural, recrudescimento da inquisição,Sebastianismo e patriotismo, além de uma crise de identidade do povo português que seesforça em preservar sua cultura e sua língua, embora perceba a impossibilidade de ignoraras influências culturais espanholas. Ao mesmo tempo em que recebe forte influência daContra-Reforma.

Podemos apontar como principais características do movimento o dualismo: razãoe emoção; o medievalismo e renascimento; o conceptismo e cultismo. O principalrepresentante desse movimento foi Padre Antônio Vieira que se dedicou a uma atividadeliterária bastante diversificada, compreendendo sermões, cartas e obras proféticas.Considerado o maior prosador barroco, pertence tanto à literatura portuguesa quanto àbrasileira, era conceptista e não apenas religioso, mas político e profético. É importantesalientar ainda a presença de outros escritores desse momento como D. Francisco Manuelde Meio, os historiadores de Alcobaça, Frei Luís de Sousa, Sóror Mariana Alcoforado eAntônio José da Silva.

Arcadismo ou NeoclassicismoO Arcadismo ou Neoclassicismo é o período que caracteriza principalmente a

segunda metade do século XVIII e deu as artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se,agora, o Século das Luzes, o Iluminismo burguês. Derivado do espírito crítico do Iluminismo,visa um retorno renovado aos gêneros, às formas, às técnicas e às expressões clássicas,que vingaram em Portugal no séc. XVI. O desenvolvimento das técnicas de produçãoacarretou a grande evolução das ciências naturais, pois se acredita que para expandir aprodução fazia-se necessário conhecer as propriedades da matéria. Neste período, osfilósofos passam a acreditar que a razão é a única fonte de conhecimento da natureza e davida em sociedade. Portanto, a religião e a Igreja são vistas como instrumentos de ignorânciae tirania. Assim, cientistas e filósofos não aceitam, no plano político, o Estado absolutistae suas instituições. São contra a constante intervenção do poder real na economia, poisisso limitava o direito da propriedade.

O Arcadismo é a expressão, na literatura, do momento ideológico que se impõe emmeados do século XVIII representando a crítica da burguesia culta ao modo de vida danobreza e do clero. De espírito reformista, pretendeu reformular o ensino os hábitos e ocomportamento social em prol dos ideais da burguesia em ascensão. Se no século XVIIPortugal esteve influenciado pela cultura espanhola, no século XVIII a influência veio daFrança, mas especificamente da burguesia francesa, politicamente forte e responsável pelodesenvolvimento da economia. Sua força política se manifesta a partir de 1750, nosconstantes ataques dos filósofos burgueses aos poderes real e clerical e na denúncia dacorrupção dos costumes.

Podemos perceber que era um tempo de transformações em toda a Europa,sobretudo na França. Mas Portugal, apesar de procurar seguir alguns dos passos dessastransformações convive ainda com o peso de uma tradição ideológica fundamentada emdogmas e princípios arraigados na cultura medieval, o que não significa ter o país seausentado por completo dessas mudanças. O século XVIII representou também para os

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portugueses o início de um processo de modernização nos setores econômico,político, administrativo, educacional e cultural.

A partir do reinado de D. José (1750-1777), o ministro Marques dePombal, apoiado por diversos intelectuais, em especial Pe. Antônio Verney,promove uma série de medidas que coloca Portugal num clima deefervescência cultural. Dentre as mudanças efetuadas, merece destaque a

proibição do ensino jesuítico e sua substituição por uma educação renovada e maisprogressista. Tais posturas originaram um amplo debate sobre a necessidade de renovar acultura portuguesa.

Em 1756, funda-se a Arcádia Lusitana por iniciativa de Antônio Dinis da Cruz, ManuelNicolau Esteves Negrão e Teotônio Gomes de Carvalho. Inicia-se, assim, uma nova etapaliterária empenhada em expressar o repúdio às coisas inúteis (inutilia truncat) queadornavam a poesia barroca. Acreditando que esta representou o desequilíbrio e adecadência dos valores clássicos, querem restabelecer a simplicidade da arte renascentista,para tanto, recuam no tempo até à Antiguidade greco-latina em busca da mitológica Arcádiae dos princípios norteadores da nova arte.

Características do movimento:

Empenhados em restaurar a literatura clássica e combater a arte barroca, o escritorárcade elegeu alguns princípios orientadores de sua escrita:

A arte devia ser regida pelo princípio da verossimilhança, devendo, portanto, serconstituída de imaginação, mas de uma imaginação que não se chocasse com a “naturezadas coisas”, pretendia-se, assim, atrelar a imaginação à razão.

Pregam a volta aos clássicos antigos (greco-latinos) e quinhentistasprincipalmente, Camões. Parte-se do pressuposto de que a beleza absoluta foi atingidapor estes escritores, nada mais restando aos posteriores do que seguir-lhes as pegadas.

Elogio da vida simples, sobretudo da natureza, no culto permanente das virtudesmorais, uma vida medíocre materialmente, mas rica em realizações espirituais (aureamediocritas).

Fuga da cidade para o campo (fugere urbem), pois a primeira é consideradafoco de mal-estar e corrupção, o campo, por sua vez, resguarda o homem mantendo-onatural, síntese de espontaneidade e simplicidade.

Desprezo ao luxo, à riqueza e à ambição, que enfraquecem o homem e elogioda vida serena, plácida pela superação dos desejos carnais.

Idealização amorosa, neoplatonismo, convencionalismo amoroso.O gozo pleno da vida, minuto a minuto, (carpe diem) na contemplação da beleza

e da natureza.Racionalismo, a razão deve governar a emoção.

Quanto à estrutura literária ainda seguem os modelos antigos, defendem, portanto, aseparação de gêneros e a abolição da rima por considerá-la uma contrição para opensamento e o verso. Reivindicam também o emprego de metros simples e ressaltam aimportância da mitologia. Adotam pseudônimos pastoris para que o “fingimento” poéticoseja maior e imaginam-se vivendo num mundo habitado por deuses e ninfas, numa Naturezae num tempo fictícios, utópicos. Deve-se salientar que as características da estética arcádicadizem respeito exclusivamente à poesia, pois embora se cultivasse a prosa, esta não

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obedecia às regras rigorosas do arcadismo. Sendo um movimento de oposição aos exagerosdo Barroco, buscava-se, ainda, a clareza absoluta, o equilíbrio e a simplicidade formal e deconteúdo.

Representantes do movimento

Manuel Maria Barbosa du Bocage

Bocage é o pastor Elmano Sadino da Nova Arcádia, poeta quefoi consagrado pela imaginação popular como autor de piadas eanedotas picantes. Mas, além desse anedotário acrescido pelo gostopopular, Bocage possui vasta obra poética, legada pela tradiçãoliterária, em duas vertentes principais, a satírica e a lírica. A veia satíricade Bocage diferencia-se dos poetas anteriores por não ser impessoal,nem genérica, nem zombeteira, mas extremamente contundente,grosseira, feita de sarcasmo e ditada por um amor-próprio ferido,incapaz de perdoar. Inúmeros aspectos sociais da época não escapamà sua crítica mordaz, critica o poder, percebendo a estreita união

existente entre os dogmas da Igreja e o poder absolutista dos reis. Escritores, frades,mulheres esquivas, senhores todo-poderosos, nada escapa à crítica ou maledicência deBocage.

Mas, é a poesia lírica de Bocage, popularmente menos conhecida, a mais comentadapela critica literária que a considera sua produção superior. Nessas poesias revela-se aorientação do academicismo do século XVIII como a presença do pseudônimo pastoril, damitologia clássica, a ânsia do locus amenus, ilustrando o fugere urbem, a produção desonetos. Todavia, por sua originalidade e pessoalismo, particulariza, sobretudo nos sonetos,sua poesia, retratando nela o seu drama poético indissociável do seu drama pessoal; a suaobra, mais do que qualquer outra, é permeada de experiências pessoais, marca-lhe a vidacom suas grandezas, misérias, esperanças e desajustes. Sentimentos desmedidostransformam-se em matéria poética na qual perpassa a natural indisciplina do poeta, fontede uma permanente irritabilidade e orgulho desmedido e pressente-se a sua inconstânciaamorosa exacerbada por um temperamento impulsivo e inclinado a um ciúme delirante.

Escreveu em todos os gêneros literários em voga no seu tempo - idílios, odes,canções, epístolas, epigramas, fábulas - em todas elas, demonstrando a mesma qualidadede estilo, perfeito na adequação e no apuro do vocabulário, na fluência da dicção e nasedução melódica, mas nos sonetos surgem composições de tipos completamentediferentes: eróticos, morais e devotos, heróicos joviais, libertinos e satíricos e ainda filosóficos.Apesar de ser fortemente influenciado pelo estilo dominante em sua época é comumencontrar na poesia de Bocage, principalmente nos poemas escritos depois de sua prisão,uma luta constante entre a razão iluminista e a emoção. Nessa luta dolorosa e angustiante aemoção sobrepuja a razão, nas suas composições combina elementos neoclássicos como gosto pelo pré-romantismo como a solidão, o sofrimento, o amor-ciúme, a morte. Essastransgressões fazem de Bocage um poeta de transição entre o Neoclassicismo e oRomantismo, sua poesia anuncia os primeiros valores do Romantismo em Portugal, sendoo poeta, portanto, considerado por vários estudiosos como um poeta pré-romântico.

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Outros autores

Além de Bocage, outros autores participaram do movimento árcade,como Antônio Dinis da Cruz e Silva, Padre Antônio Correia Garção, Domingosdos Reis Quita pertencentes à Arcádia Lusitana; Domingos Caldas Barbosae padre José Agostinho de Macedo que faziam parte da Nova Arcádia. Algunspoetas, porém, renegaram a Arcádia ou fundaram grupos para combatê-la,

como Filinto Elísio pseudônimo do padre Francisco Manuel do Nascimento, que pretendiarenovar a linguagem literária, pré-romântico pelo tom confessional de alguns poemas, exerceuinfluência em muitos escritores do romantismo, inclusive Garrett e poetas brasileiros. Umoutro escritor que não participou de nenhuma academia foi Nicolau Tolentino de Almeida,grande representante da crítica aos costumes sua obra é constituída de sátiras e dehomenagens aos poderosos dos quais dependia, o curioso é que essas sátiras criticavamexatamente os poetas que viviam da mendicância de favores.

O Arcadismo ou Neoclassicismo caracteriza a segunda metade do século XVIII edeu às artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se, agora, o Iluminismo burguês e visa-seum retorno renovado aos gêneros, às formas, às técnicas e à expressão clássicas. Deespírito reformista, pretendeu reformular o ensino os hábitos e o comportamento social emprol dos ideais da burguesia em ascensão no país. Mas, embora Portugal tenha procuradoseguir alguns dos passos das transformações em voga, convive, ainda, com o peso de umatradição ideológica fundamentada em dogmas e princípios da cultura medieval. Apesardisso, esse século representou para os portugueses o início de um processo demodernização nos setores econômico, político (Despotismo Esclarecido), administrativo,educacional e cultural. Surgimento das Academias de Ciências e as Academias Literárias.

O Arcadismo é a expressão, na literatura, desse momento ideológico representandoa crítica da burguesia culta ao modo de vida da nobreza e do clero e teve como característicaso racionalismo, o princípio da verossimilhança, a imitação dos clássicos, o ideal de vidapastoril (locus amenus) e a oposição ao Barroco: inutilia truncat. Principais autores: NicolauTolentino de Almeida - poeta satírico; Manuel Maria Barbosa du Bocage - poeta satírico elírico considerado árcade e pré-romântico e Filinto Elísio que renovou linguagem literáriaem Portugal.

RESUMINDO...

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AtividadesAtividadesAtividadesAtividadesAtividadesComplementaresComplementaresComplementaresComplementaresComplementares

O jogo de oposição de idéias é típico do Barroco. Justifique essa afirmativa combase no texto acima.1.

A razão e o amor sempre foram discutidos pelos poetas e escritores. Veja um sonetode Camões com o mesmo tema do texto anterior e, a partir do que foi estudado, identifiqueas características próprias do estilo de época:

2.

O amor e a razão

Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos seteanos [...] nunca chega à idade de uso da razão. Usar de razão e amar sãoduas coisas que não se juntam. A alma de um menino que vem a ser?Uma vontade com afetos e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar.Tudo conquista o amor, quando conquista uma alma; porém o primeirorendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade febricitante, que nãotivesse o entendimento frenético. O amor deixará de variar, se for firme,mas não deixará de tresvariar, se é amor. Nunca o fogo abrasou a vontade,que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade nocoração, que não houvesse fraqueza no juízo.

(Pe. Antônio Vieira, Sermão do Mandato, In Sermões)

Sempre a Razão vencida foi de Amor, mas, porque assim o pedia o coração, quis Amor ser vencido da Razão. Ora que caso pode haver maior! Novo modo de morte, e nova dor! Estranheza de grande admiração, que perde suas forças a afeição, por que não perca a pena o seu rigor. Pois nunca houve fraqueza no querer, mas antes muito mais se esforça assim um contrário com outro por vencer. Mas a Razão, que a luta vence, enfim, não creio que é razão, mas há de ser inclinação que eu tenho contra mim.”

Luís de Camões, In rimas

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Ao analisar o texto, é possível dizer que ele revela traços em comumcom os cantares trovadorescos. Nesse caso, faça o que se pede:

Abandonada por vocêApaixonada por vocêEu vejo o vento te levarMas tenho estrelas pra sonharE ainda te espero todo o dia

(In Fafá: Pássaro sonhador.)

a) A que tipo de composição medieval relaciona-se o texto?

b) Justifique sua resposta.

Texto para as questões 4 e 5

3.

Oh! Maldito o primeiro que, no mundo,Nas ondas vela pôs em seco lenho!Digno da eterna pena do Profundo,Se é justa a justa Lei que sigo e tenho!Nunca juízo algum, alto e profundo,Nem cítara sonora ou vivo engenho,Te dê por isso fama nem memória,Mas contigo se acabe o nome e a glória.(Camões, Os Lusíadas)

Considerando este trecho da fala do velho do Restelo no contexto da obra a quepertence, explique os dois primeiros versos, esclarecendo o motivo da maldição que, neles,é lançada.

4.

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Nos quatro últimos versos, está implicada uma determinada concepção da funçãoda arte. Identifique essa concepção, explicando-a brevemente.5.

Romantismo: Contexto Histórico e 1ª Geração

DO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERÍODO DE GRANDES

TRANSFORMAÇÕES LITERÁRIAS

DO ROMANTISMO À LITERATURA

CONTEMPORÂNEA

O Romantismo corresponde não só a uma revolução literária, masdesigna, também, uma tendência geral de vida e de arte. Com essemovimento, abre-se um ciclo de cultura novo, correspondente àdiminuição do poder das oligarquias reinantes em prol das monarquiasconstitucionais ou das repúblicas federadas, e ao aparecimento doLiberalismo em política, moral, arte etc. O comportamento românticocaracteriza-se por uma atitude emotiva e subjetiva diante do mundo noqual o sujeito está imerso.

O romântico idealiza um universo melhor, defendendo a idéia da expressão do eu-lírico, no qual prevalece o tom melancólico e nostálgico. Enfim, o ideal romântico tentacolocar o universo presenciado de forma subjetiva. Nesse sentido, a expressão dosentimento não precisa obedecer a nenhuma regra, antes adorada pelos clássicos. Omovimento romântico recusa a cosmovisão racionalista e a estética neoclássica a ela ligada.

Contexto Histórico

O Romantismo é proveniente de dois acontecimentos marcantesna segunda metade do século XVIII na história européia: a RevoluçãoFrancesa e a Revolução Industrial, responsáveis pela abolição dasmonarquias aristocratas e pela introdução da burguesia que, então,dominava a vida política, econômica e social da época.

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REFLITA

Como as novas ideologias políticas, econômicas esociais intervêm em todos os campos da sociedade doséculo XIII, instaurando novos modos de expressão artísticae cultural?

Em Portugal, inicia-se, com as mudanças econômicasocorridas no Brasil a partir de 1807 provenientes da chegada da cortede D. João VI, uma nova fase moderna da vida econômica e social.Ainda com a família real fora de casa arrebenta em 1820, no Porto,uma revolução em defesa da implantação do liberalismo no país aqual com o auxílio de Lisboa e do resto do país saiu vitoriosa.

O rei D. João VI, que havia se refugiado no Brasil, então regressa. Todavia osproblemas em Portugal não terminam aí, a luta pelo trono português continua com veemênciagerando conturbação e desordem interna na nação. De um lado, D. João VI, representantedo liberalismo; de outro, D. Miguel, seu irmão absolutista. Depois da morte de D. João VI osabsolutistas apoderam-se do poder e iniciam uma perseguição aos liberais, levando muitosdeles a exilar-se em Inglaterra e França.

Diante de tantas turbulências, o processo de instauração do movimento românticono país foi lento e incerto. Enquanto o realismo tomava forma no horizonte parisiense, oromantismo português procurava ainda afirmar-se. Alguns autores chegam a assegurar queesta afirmação só houve como uma cultura de importação, pela via indireta dos exílios aque se sujeitaram Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Almeida Garrett acaba por exilar-se na Inglaterra, onde entra em contato com a Obra de Lord Byron e Scott. Ao mesmotempo, por estar presenciando o Romantismo inglês, envolve-se com o teatro de WilliamShakespeare. Em 1825, Garrett publica o poema Camões, que passa a ser considerado oponto de partida para a fixação da cronologia do romantismo português, que durou cercade 40 anos terminando por volta de 1865 com a Questão Coimbrã ou Questão do BomSenso e do Bom Gosto, encabeçada por Antero de Quental.

CaracterísticasO Romantismo foi uma forma de repúdio às regras que contornavam e preenchiam o

campo literário da época – o classicismo. Opondo-se às regras e modelos, os românticosbuscavam a total liberdade de criação, além de defender a mistura dos gêneros literários.Com o domínio burguês, ocorre a profissionalização do escritor, que recebe uma remuneraçãopara produzir a obra, enquanto o público paga para consumi-la. Dentre as característicasdo movimento destacam-se pela recorrência nas obras do período:

Subjetivismo, sentimentalismo, egocentrismo escapismo: O escritorromântico trata os assuntos de uma forma pessoal, de acordo com o que sente, aproximando-se da fantasia. Exaltam-se os sentidos, e tudo o que é provocado pelo impulso é permitido.Cultua-se o “eu” interior, numa atitude narcisista, em que o individualismo prevalece. O escritorromântico projetava-se para dentro de si, tendo como fonte o eu-lírico, numa espécie deescapismo por não aceitar a realidade que o cerca.

Idealização e culto ao fantástico: motivado pela fantasia e pela imaginação,o artista romântico passa a idealizar tudo; as coisas não são vistas como realmente são,mas como deveriam ser, segundo uma ótica pessoal. A natureza e a mulher são importantes

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pontos desse momento, o homem idealizava a mulher como uma deusa, algo divino. Recorriatambém à presença do mistério, do sobrenatural, representando o sonho, a imaginação;frutos da pura fantasia, que não carecem de fundamentação lógica, do uso da razão.

Liberdade de criação: O escritor romântico recusa formas poéticas, usa o versolivre e branco, libertando-se dos modelos greco-latinos, tão valorizados pelos clássicos, eaproximando-se da linguagem coloquial. O homem deve realizar-se na criatividade e nasensibilidade. A inspiração instantânea, a centelha intuitiva é o verdadeiro guia do escritorromântico. A métrica, a rima, não podem ser empecilhos para a explosão sentimental dopoeta. A sua criação é fruto da pura espontaneidade. Não pode nem deve ser retocada,torneada e acabada por critérios artesanais.

Medievalismo: Há um grande interesse dos românticos pelas origens de seupaís, de seu povo. Na Europa, retornam à Idade Média e cultuam seus valores, por ser umaépoca obscura.

Nativismo: Fascinação pela natureza. Muitas vezes, o nacionalismo românticoé exaltado através da natureza, da força da paisagem. Pode-se falar, também, em uminteresse romântico pelo exotismo e pelo indianismo, pois, estando no encalço do homemem estado “natural”, o romântico se põe a procurá-lo em outras regiões que se distinguiampela presença dos denominados “selvagem” ou “indígena” pela diferença acentuada de seumodo de “bárbaro” e “bizarro” em relação aos padrões europeus e ocidentais.

Luta entre o liberalismo e o absolutismo: Poder do povo X poder damonarquia. Até na escolha do herói, o romântico dificilmente optava por um nobre.Geralmente, adotava heróis grandiosos, muitas vezes personagens históricos, que foramde algum modo infelizes: vida trágica, amantes recusados, patriotas exilados.

Religiosidade: Como uma reação ao Racionalismo materialista dos clássicos,a vida espiritual e a crença em Deus são enfocadas como pontos de apoio ou válvulas deescape diante das frustrações do mundo real. Os românticos almejavam a reabilitação docristianismo praticado na Idade Média.

Nacionalismo: Também chamada de patriotismo é a exaltação da Pátria, deforma exagerada, em que somente as qualidades são enaltecidas.

Pessimismo: O artista vê-se diante da impossibilidade de realizar o sonho do“eu” e, desse modo, cai em profunda tristeza, angústia, solidão, inquietação, desespero,frustração. O romântico era pessimista também em relação à sociedade e à civilização.Não acredita nem em uma nem em outra, pregava a idéia de uma natureza humana primitiva,que, no entanto, vai sendo corrompida pela cultura. Sentem-se criaturas infelizes edesajustadas, que não conseguem enquadrar-se no contexto social e que tampouco queremfazê-lo porque a sociedade só iria cindi-las ainda mais. Decorem disso o sentimento deinadequação social, a aflição e a dor que induz o sujeito à busca de evasão da realidadepor meio de fugas ou, mesmo, suicídios.

A vitória das idéias românticas em Portugal não foi rápida nem do mesmo mododurante todo o período que compreende o movimento. Desse modo, podemos falar em trêsmomentos diferenciados tanto no que concerne às idéias preponderantes como aos autoresque se destacaram.

Primeira Geração

Atuante a partir de 1825 é ainda bastante ligado ao Classicismo, mas muito contribuiupara a consolidação do liberalismo em Portugal. Os ideais românticos dessa geração estãoembasados na pureza e originalidade, no nacionalismo, historicismo e medievalismo. Comotoda tendência nova, o Romantismo não veio implantar-se totalmente nos primeiros

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momentos em Portugal. Inicialmente, buscava-se, gradativamente, apagar osmodelos clássicos que ainda permeavam o meio sócio-econômico. Osescritores dessa época eram românticos em espírito, ideal e ação política eliterária, mas ainda clássicos em muitos aspectos.

Alexandre Herculano

Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo (1810-1877) foi um doslíderes do Romantismo português. Em decorrência da situação políticaem Portugal é obrigado a exilar-se na França, onde aprimora os estudos.Em 1833, tornou-se segundo-bibliotecário na Biblioteca Municipal doPorto, mas demitiu-se três anos depois por discordar dos políticosdominantes. Em 1839, foi nomeado bibliotecário na Biblioteca Real daAjuda. Editor de revista no meio tempo, Herculano escreveu poesia, prosae ensaios. Foi na prosa que se destacou, principalmente com Eurico, oPresbítero. Escreveu também muitos contos. Ficou conhecido por suasnarrativas históricas e tornou-se um intelectual atuante nos programas dereformas da vida portuguesa.

Na ficção de Herculano, prevalece o caráter histórico dos enredos, voltados para aIdade Média, enfocando as origens de Portugal como nação. Além disso, ocorrem muitostemas de caráter religioso. Quanto à sua obra não-ficcional, os críticos consideram querenovou a historiografia, uma vez que se baseia não mais em ações individuais, mas noconflito de classes sociais para explicar a dinâmica da história.

Almeida Garrett

João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett (1799-1854) foio introdutor do Romantismo em Portugal. Garrett foi educado nos Açores,já que sua família fugiu para lá pela ocasião da invasão de Portugal porNapoleão. Em 1816 voltou a Portugal para estudar em Coimbra. Cincoanos depois se mudou para Lisboa, onde se tornou funcionário público.Quando aconteceu a revolução de 1823, Garrett exilou-se na Inglaterrae depois na França. Voltou a Portugal mais tarde, mas retornou àInglaterra pela ocasião da subida ao poder de D. Miguel.

Em 1834, após a vitória dos liberais, passou a se dedicar ao teatro. Foi embaixador,ministro, parlamentar, jornalista, soldado (durante a luta contra o absolutista D. Miguel).Escreveu Camões (1825) inspirando-se na epopéia Os Lusíadas. A narrativa é uma biografiasentimental de Camões, poema considerado introdutor do Romantismo em Portugal, porapresentar características que viriam se firmar no espírito romântico: versos decassílabosbrancos, subjetivismo, nostalgia, melancolia, e a grande combinação dos gêneros literários.

Almeida Garrett teve uma obra extensa, que contempla desde o resgate do teatroportuguês – com seus grandes autores como Gil Vicente – a uma renovação da poesia eincursões na prosa. Garrett cultivou a oratória parlamentar, o pensamento pedagógico edoutrinário, o jornalismo, a poesia, a prosa de ficção e o teatro, o qual entrou em contatocom o de Shakespeare quando em exílio na Inglaterra. Teve uma vida sentimental bastanteatribulada em que se sobressai o seu romance adúltero com a viscondessa da Luz, a qualinspirou seus melhores poemas. Na vasta obra de Garrett encontramos, além de Camões,

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outros poemas como Retrato de Vênus (1821), Dona Branca (1826) e Lírica de João Mínimo(1829). Na prosa de ficção agrupam-se três obras: Viagens na minha terra, O arco deSant‘Ana e Helena. Em matéria de teatro produziu entre outras Um auto de Gil Vicente(1838) O Alfageme de Santarém (1842) Frei Luís de Sousa (1843) Dona Filipa Vilhena(1840).

Antônio Feliciano De Castilho

Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875) perdeu a visão quasecompletamente aos 6 anos. Contou com o apoio de seu irmão, AugustoFrederico de Castilho, que o incentivou a continuar a estudar. Com muitaforça de vontade conseguiu se formou em Direito na Universidade deCoimbra. Foi também tradutor. A partir de 1842, passou a dirigir a “RevistaUniversal Lisbonense”, o que lhe permitiu exercer influência sobre o meiocultural português. Teve como principal papel traduzir poetas clássicos.

Começou sua carreira como um poeta árcade, mas já na metade de sua vidaapresentava traços românticos bem acentuados. Sempre combativo, criticava as renovaçõesda Literatura Portuguesa e foi o iniciador da Questão Coimbra. Algumas de suas obras:Cartas de Eco a Narciso (1821), A Primavera (1822), Amor e Melancolia ou a NovíssimaHeloísa (1828) Tratado de Versificação Portuguesa (1851), Felicidade pela Instrução(1854), A Chave do Enigma (1861), O Outono (1863), dentre outras.

Romantismo: A 2ª e 3ª GeraçõesSegunda Geração

Também conhecido como Ultra-Romantismo, marcado pelo exagero, desequilíbrio,sentimentalismo, acontece entre os anos 1838 e 1860. Pode-se perceber a partir dessemomento maior emoção nas obras, dando maior ênfase ao tédio, melancolia, desespero,pessimismo, fantasia e liberdade de expressão. Neste momento, desfazem-se os enlacesarcádicos que ainda envolviam os escritores da época. Aqui, nota-se com plena facilidadeo domínio da estética e da ideologia romântica. Os escritores tomam atitudes extremas,transformando-se em românticos descabelados, caindo fatalmente no exagero, nos temassoturnos e fúnebres, tudo expresso numa linguagem fácil e comunicativa. Os poetas ultra-românicos reuniram-se em três grupos principais: o dos medievalistas, um segundo grupoliderado por João de Lemos de Seixas e Castelo Branco, e o grupo O Novo Trovador.

Camilo Castelo Branco

Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco (1825-1890) foi um escritorromântico e, a contragosto, um escritor realista depois (Ele muito criticou ese opôs a esta escola.). Camilo Castelo Branco impressiona, primeiro quetudo, pela vida aventuresca e trágica que levou. Órfão de pai e mãe casa-seaos 16 anos com uma aldeã que abandona em seguida com uma filha. Em1858, Ana Plácido, mulher casada, abandona o marido e vai viver comCamilo; o marido a processa por adultério. Em 1885, Ana Plácido morre;em 1890, deprimido pela cegueira iminente e a demência do filho, suicida-se com um tiro na cabeça. Tendia a escrever sobre situações ridículas eoriginais, novelas passionais, acontecimentos dramático e finais trágicos.

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Produziu obras ultra-românticas e satíricas. Escreveu em colaboraçãocom outros autores, traduziu, editou e foi jornalista; todavia, o eixo ao redor doqual gira toda a importância do autor é constituído pela novela passional. Autorde obra vastíssima, inicialmente romântica, aderiu ao realismo com A Brasileirade Prazins, em 1882, tendo escrito Eusébio Macário em 1879 ridicularizandoesta escola recém-introduzida. Sua obra mais importante é Amor de Perdição,que foi seguida por Amor de Salvação, mas não ficou restringido a estas

obras: publicou muitas novelas – com destaque para Maria Moisés – livros de poesias epeças de teatro.

Soares de Passos

Antônio Augusto Soares Passos (1826-1860) filho de família burguesaestudou na Universidade de Coimbra onde fundou o jornal “O Novo Trovador”.Nele, muitos poetas da época publicaram algo. Em 1856, Soares Passos reuniutodas essas poesias publicadas em um livro chamado “Poesias”. Mesmotendo uma vida curta, é considerado um dos poetas ultra-românticosportugueses mais importantes.

Soares de Passos constitui a encarnação mais significativa do “mal-do-século”.Vivendo na própria carne os devaneios de que se nutria a fértil imaginação de tuberculoso,sua vida e sua obra espelham claramente o prazer romântico do escapismo dasresponsabilidades sociais da época, acabando por cair em extremo pessimismo, um incríveldesalento derrotista, cultivava em suas obras a liberdade, exaltação cívica, confiante navitória do homem, poesia delicada, reflexo da dor pessoal. É desse dilema, impulsionadopor angústias metafísicas e religiosas que decorre a poesia do autor. Obra: Poesias (1855).

Terceira Geração

Acontece, aqui, um tardio florescimento literário que corresponde ao terceiro momentodo Romantismo, em fusão dos remanescentes do Ultra-Romantismo. Esse período émarcado pela presença de poetas, como João de Deus, Tomás Ribeiro, Bulhão Pato, Xavierde Novais, Pinheiro Chagas e Júlio Dinis, que purificam até o extremo as característicasromânticas.

Júlio Dinis

Pseudônimo de Joaquim Guilherme Gomes Coelho, nasceu em 1839 efaleceu em 1871. Visão detalhada do ambiente. Cultivou o romance do namoroambientados no campo. Os poemas de Júlio Dinis armam-se sobre uma tesemoral e teleológica, na medida em que pressupõem uma melhoria, emboraremota, para a espécie humana, frontalmente contrária à desesperação e aoamoralismo cético dos ultra-românticos, numa linguagem coerente, lírica e deimediata comunicabilidade.

Considerado pela crítica como pré-realista, conduz suas histórias, semprea um epílogo feliz, não considerando a heroína como “mulher demônio”, mas, sim, como“mulher anjo”. Escreveu romances, sendo As Pupilas do Senhor Reitor, sua principal obra,e também poesias e teatro.

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João de Deus

João de Deus Ramos (1830-1896), retoma a tradição líricaportuguesa. Foi admirado pelos realistas. Teófilo Braga foi quem reuniuseus poemas e publicou-os sob o título Campos de Flores (1893).

Escritor apenas de poesia, lírico de incomum vibração interior, pôs-se à margem dafalsa notoriedade e dos ruídos da vida literária e manteve-se fiel até o fim a um desígnioestético e humano que lhe transcendia a vontade e a vaidade. Contemplativo por excelência,sua poesia é a de um “exilado” na terra a mirar coisas vagas e, por vezes, a se deixarestimular concretamente. Considerado pela crítica como pré-realista, mantinha, no entantoem algumas obras, o idealismo amoroso e a visão espiritualizada da mulher. Sua poesiabiparte-se em lírico-amorosa e satírica, o amor é o motivo permanente de sua poesia.

RESUMINDO...

1. A introdução do Romantismo

O movimento romântico aparece vinculado a dois acontecimentos importantes dasegunda metade do século XVIII europeu: a Revolução Francesa e a Revolução Industrial,responsáveis pela abolição das monarquias aristocratas e pela introdução da burguesiaque então dominava a vida política, econômica e social da época. As novas ideologiaspolíticas, econômicas e sociais, intervêm em todos os campos da sociedade que instauranovos modos de expressão artística e cultural. Os autores desse movimento enfatizavam osubjetivismo, o sentimentalismo, o egocentrismo e escapismo, a idealização e culto aofantástico, a liberdade de criação, o medievalismo, o nativismo, a religiosidade, onacionalismo e o pessimismo.

Em Portugal inicia-se, com as mudanças econômicas ocorridas no Brasil a partir de1807 provenientes da chegada da corte de D. João VI, uma nova fase moderna da vidaeconômica e social. Ainda com a família real fora de casa, arrebenta em 1820, no Porto,uma revolução em defesa da implantação do liberalismo no país. Diante de tantas turbulênciaso processo de instauração do movimento romântico no país foi lento e incerto. O termo foiintroduzido em Portugal por Almeida Garrett, escritor de vida amorosa intensa e militantepolítico. Pertencia à tradição do Iluminismo, participando tanto do Arcadismo como doRomantismo. Suas principais produções foram na poesia “Retrato de Vênus” – obra queescandalizou os conservadores –, “Camões” – considerado o primeiro poema romântico

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: Don Juan DeMarco (Don Juan DeMarco, EUA, 1995)

DIREÇÃO: Francis Ford CoppolaELENCO: Marlon Brando; Johnny Depp; Faye Dunaway

A melhor parte do amor é perder todo senso de realidade. Don Juan é umpersonagem literário que se converte em mito. Don Juan visa o poder emsuas relações amorosas: sacrificar as mulheres à sua glória, pela glóriadominar os homens, e sua dominação se exerce de forma teatral.

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português e “Folhas Caídas” seus poemas mais românticos. Além de poemas,escreveu “Viagens na minha terra”, romance com grande observação darealidade e de denúncia da oligarquia; e “Frei Luís de Sousa”, uma obra-primado teatro romântico português. É de sua autoria ainda na prosa o “Romanceiro”uma Pesquisa de narrativas tradicionais.

Merece destaque também Alexandre Herculano, escritor liberalmoderado, formado dentro do Romantismo, de grande coerência política que

se empenhou em fazer uma pesquisa histórica para definir nacionalidade. Na ficção,preocupava-se com o problema da integração entre a matéria histórica e ficcional, desseestilo são as obras O bobo; Eurico, o presbítero; O monge de Cister e Lendas e narrativas.Na História, possuía um método objetivo de investigação e documentação. Suas principaisproduções foram História de Portugal; História da Origem e Estabelecimento da Inquisiçãoem Portugal. Escreveu, ainda, poesia e uma coleção documental - Portugaliae MonumentaHistórica.

2. O ultra-romantismo

O período considerado de transição para o Realismo é marcado pelo exagero,desequilíbrio, sentimentalismo, acontece entre os anos 1838 e 1860. Ênfase ao tédio,melancolia, desespero, pessimismo, fantasia e liberdade de expressão.

São considerados ultra-românicos o escritor Camilo Castelo Branco, um dos grandesprosadores em língua portuguesa. Dono da biografia paixão e desgraças, que apresentauma correlação com os temas de sua obra. Fez uso da técnica folhetinesca, tendo senotabilizado como autor de novelas, sendo as passionais as mais típicas. Suas principaisproduções foram as novelas de mistério ou terror Os mistérios de Lisboa e Livro negro depadre Dinis; as novelas históricas O judeu; O santo da montanha e A filha do regicida ; asnovelas passionais Amor de Perdição; Carlota Ângela; Amor de Salvação e A Doida doCandal; também as novelas satíricas Coração, cabeça, estômago e A queda dum anjoainda as novelas de influência realista EusébioMacário; A corja e A brasileira de PrazinsAs novelas do Minho.

Um outro escritor de destaque é Soares de Passos; considerado um paradigma dopoeta ultra-romântico, fora um escritor caricaturizado pelos escritores realistas e escreveu“Noivado do Sepulcro”.

3. A transição para o Realismo

Acontece, aqui, um tardio florescimento literário que corresponde ao terceiro momentodo Romantismo, em fusão dos remanescentes do Ultra-Romantismo. Esse período émarcado pela presença de poetas, como João de Deus, que atualiza as formas poéticasda tradição popular e tem como característica o espiritualismo e a criticidade, sua principalprodução literária é o Campo de Flores; Júlio Dinis, mais significativo na prosa de ficção,ligando-se à formação da consciência da classe média liberal-burguesa, afasta-se dopassionalismo ultra-romântico para enfocar as tensões psicológicas das personagensatreladas à situação sócio-econômica. Suas principais produções foram As Pupilas dosenhor reitor; Uma Família Inglesa; A Morgadinha dos Canaviais e Os Fidalgos da CasaMourisca. Além desses dois autores merecem destaque Tomás Ribeiro, Bulhão Pato, Xavierde Novais, Pinheiro Chagas.

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Realismo

Contextualizando o Realismo

A partir da segunda metade do século XIX, o ambiente sócio-cultural europeuapresenta significativas mudanças. A Revolução Industrial entra em uma nova fase, utilizandoagora, por exemplo, o petróleo, o aço, a eletricidade. É um período também de grandesdescobertas científicas, no qual a ciência passa a ser cada vez mais defendida: antes deexpor idéias é preciso prová-las cientificamente; era a defesa do pensamento científico. Acivilização burguesa industrial começa a se firmar e as idéias de liberalismo e democraciaganham dimensões cada vez maiores, as ciências naturais desenvolvem-se e os métodosde experimentação e observação da realidade passam a ser encarados como os únicoscapazes de explicar racionalmente o mundo físico. Diante de tantas mudanças, as exigênciasliterárias também passam a serem outras.

O desenvolvimento científico da época transformou a intelectualidade que, dascátedras universitárias aos bares boêmios, adere ao cientificismo e ao materialismo, opondo-se à metafísica, à religião, aderindo ao pensamento científico, às doutrinas filosóficas esociais e assumindo atitudes liberais e republicanas redimensionam a literatura da época.O Realismo foi um movimento de oposição à idealização e ao subjetivismo do Romantismo,acusado de abordar temas desligados da vida comum. Nesse sentido, o escritor realistairá enfatizar a localização precisa do ambiente descrito, a descrição de costumes eacontecimentos contemporâneos em seus mínimos detalhes, a reprodução da linguagemcoloquial, familiar e regional e a busca da objetividade na descrição e análise dospersonagens. Almejavam, ainda, técnicas narrativas e descritivas perfeitas, negando ahipérbole e a retórica, proferiam a realidade tal como ela era, ou melhor, a captavam,recriando-a através da narração ou da descrição, tornando a obra um espelho da realidade.Por conta disso, preferiam a expressão simples.

Motivados pelas teorias científicas e filosóficas da época, principalmente opositivismo, o determinismo e o darwinismo, os escritores realistas desejavam retratar ohomem e a sociedade em sua totalidade. Não bastava mostrar a face sonhadora e idealizadada vida como fizeram os românticos, era preciso mostrar a face que ainda não haviamrevelado: a do cotidiano massacrante, do amor adúltero, da falsidade e do egoísmo humano,da impotência do homem comum diante dos poderosos. Em lugar do egocentrismoromântico, verifica-se um enorme interesse em descrever, analisar e até criticar a realidade.A visão subjetiva e parcial da realidade é substituída pela visão que procura ser objetiva,fiel, sem distorções. Em lugar de fugir à realidade, os realistas procuram apontar suas falhascomo forma de estimular a mudança das instituições e dos comportamentos humanos. Emlugar de heróis, surgem pessoas comuns, cheias de problemas e limitações. Na Europa, orealismo teve início com a publicação do romance realista Madame Bovary (1857) de GustaveFlaubert.

Desdobramentos do movimento em Portugal

Os homens da chamada geração de 70 acabaram de se formar depois deinstitucionalizado e consolidado o liberalismo em Portugal. Mas, por outro lado, as novasinstituições inseriam-se numa sociedade que sob o ponto de vista tecnológico, econômicoe mesmo social pouco progredia. E, por falta de dinamismo econômico interno, por falta deuma expansão da produção nacional, o grupo político dirigente dependia cada vez mais do

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capital bancário interno ou externo. Emerge, então, uma massa dedescontentes formada pela pequena burguesia industrial e o resíduo doartesanato, assim como uma parte da burguesia comercial que tende a ficarfora do sistema, enquanto não se organiza o partido republicano. À base, oscamponeses, mudos, constituíam a massa de manobra dos partidosgovernantes, na dependência imediata dos poderosos locais.

É nessas condições que as novas idéias européias penetraram, embora tardiamente,mas ainda a tempo de criar certo mal-estar e gerar polêmicas entre realistas e românticosem Portugal. O movimento realista operou mudanças radicais na consciência literária e namentalidade dos intelectuais do país. Eclodiu com a chamada Questão Coimbrã, polêmicaliterária que opôs, de um lado, Antero de Quental, Teófilo Braga e a geração de escritoressurgida na década de 1860 e, de outro, os representantes da geração anterior, em 1871.Foram importantes também para a consolidação do movimento as Conferências do Casino,nesta nova manifestação da chamada Geração de 70. Os contornos do que seria o realismoapareceram com maior nitidez, especialmente através da conferência realizada por Eça deQueiroz intitulada “O realismo como nova expressão da arte”.

Sob a influência do Cenáculo, e da sua figura central de Antero de Quental, Eça deQueiroz funde as teorias de Taine, do determinismo social e da hereditariedade com asposições estético-sociais de Proudhon. Ataca, também, o estado das letras nacionais epropondo uma nova arte, uma arte revolucionária, que respondesse ao “espírito dos tempos”(zeitgeist), uma arte que agisse como regeneradora da consciência social, que pintasse oreal sem floreados. Para Eça, só uma arte que mostrasse efetivamente como era a realidade,mesmo que isso implicasse entrar em campos sórdidos, poderia fazer um diagnóstico domeio social, com vista à sua cura. Assim, reagia contra o espírito da arte pela arte, visandomostrar os problemas morais e dessa maneira contribuir para aperfeiçoar a humanidade.

“““““VOCÊ SABIA QUE...

O Realismo firmou-se em Portugal como resposta à artificialidade,formalidade, exageros e a sentimentalidade mórbida do Romantismo?

Para os representantes dessa nova literatura, o trabalho do escritor devia consistirna observação e experiência, na análise psicológica dos tipos, no esclarecimento dosproblemas humanos e sociais, no aperfeiçoamento da literatura, isentando-a da retórica,da fantasia. Pregavam uma arte revolucionária que reagisse contra o marasmo em quetinha caído o Romantismo. A obra literária passou a ser considerada utensílio, arma decombate, de reforma e ação social. Repudiando o reinado da “Arte pela Arte”, pregavam aarte comprometida com o social, ou seja, a arte engajada.

A estética literária realista caracterizava-se por um conteúdo ideológico profundo,pois, ao contrário do romantismo que parecia estar vazio de idéias, os escritores realistaspropunham uma literatura em que as teorias do positivismo, do socialismo e do hegelianismofossem visíveis. Acreditava-se que somente essas teorias poderiam exprimir a problemáticareal do Homem. Pretendiam, também, uma impassibilidade na análise do real, iam, portanto,contra todos os sentimentos exagerados dos românticos e preferiam a análise, a síntese ea exposição da realidade com uma verdade e neutralidade de emoções. A natureza deveriaser recriada com exatidão, como um retrato dessa mesma realidade, sem deturpações aliteratura deveria funcionar como espelho e por meio dela a sociedade burguesa do tempoveria patenteada sua decomposição moral.

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Os escritores realistas proclamavam uma religião sem dogmas, muito mais panteísta,com atitudes que chegavam a ser anticlericais. Demonstravam, também, um inconformismocom a tradição, muitos literatos consideravam que a sociedade portuguesa devia deixar deolhar constantemente para seu passado e começar a assentar novos princípios de justiça edinamismo. Pregavam a crítica social e de costumes por considerarem o passado estéril eo presente sem nada que se conseguisse aproveitar, desejavam fazer uma reforma dasociedade. Assim, começaram a ser feitos inúmeros ataques contra a alta e média burguesia,contra o clero, contra a política, a literatura do tempo, a educação, a economia, enfim contratoda a sociedade com o objetivo que esta pudesse melhorar. Além disso, para que a literaturapudesse revestir-se de certo teor científico, fazia-se necessário um esforço por analisar ascausas biológicas ou sociais do comportamento das personagens do romance. Acreditavamainda em uma supremacia da verdade física, considerada a única verdade válida. Toda acrença metafísica e moral era relegada ao universo das conjecturas, enquanto as novasteorias filosóficas eram tomadas como base para o movimento.

A implantação efetiva do Realismo em Portugal dá-se com a publicação do O Crimedo Padre Amaro (1875), seguida dois anos mais tarde pelo Primo Basílio (1876), obrasambas de Eça, que são caracterizadas por métodos de narração e descrição baseadosnuma minuciosa observação e análise dos tipos sociais, físicos e psicológicos, aparecendoos fatores como o meio, a educação e a hereditariedade a determinarem o caráter moraldas personagens. Em ambos os romances, a descrição minuciosa e a análise psicológicabaseada em princípios deterministas, nas idéias da hereditariedade e influência do meio,além da severa crítica de costumes, tomam nítida feição naturalista. São romances que têmafinidade com os de Émile Zola, com o intuito de crítica de costumes e de reforma social. Oprimeiro destes romances foi acolhido pelos críticos de então com um silêncio generalizado.O segundo provocou escândalo aberto.

A polêmica e a oposição entre Realismo e Romantismo instalam-se definitivamente.Pinheiro Chagas ataca Eça, considerando-o antipatriota, pelo modo como apresenta asociedade portuguesa. Chegaram a aparecer panfletos acusando os realistas de“desmoralização das famílias” (Carlos Alberto Freire de Andrade: “A escola realista, opúsculooferecido às mães”) Camilo Castelo Branco vai parodiar o Realismo com Eusébio Macário(1879) e voltando a parodiar com A Corja (1880). Mas, curiosamente, mesmo através daparódia, Camilo vai absorver a nova escola, como é nítido na novela A Brasileira de Prazins.(1882). Entretanto, Eça vai desorientar os seus seguidores ortodoxos com a publicação deO Mandarim. O que faz com que Silva Pinto (1848-1911), que tinha exposto a teoria daescola realista e elogiado Eça num panfleto intitulado Do Realismo na Arte, vai agora atacarEça em Realismos, ridicularizando o novo estilo deste. Reis Dâmaso, na “revista de estudoslivres” também insurgi contra a publicação de O Mandarim acusando Eça de ter atraiçoadoo movimento. Estas acusações não eram infundadas porque de fato Eça já estava a descolarde um realismo ortodoxo para o seu estilo mais pessoal onde o humor e a fantasia se aliamnum estilo único.

Desde a implantação do Realismo que o movimento logrou um núcleo de apoiantesque se empenhavam em explicar e defender o seu credo estético. Todavia esse núcleo seresvalou, regra geral, para uma posição mais extremamente realista, o Naturalismo,tornando-se ortodoxos e dogmáticos. Os defensores desta posição eram José Antônio dosReis Dâmaso (1850-1895) e Júlio Lourenço Pinto (1842-1907) autor da “Estética naturalista”,que pretendia ser um evangelho do naturalismo, todavia estes autores foram consideradosfracos do ponto de vista literário e esquecidos. Aqueles que não enveredaram por posiçõestão rígidas estão menos esquecidos como Luís de Magalhães com a obra O Brasileiro

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Soares (1886), prefaciado por Eça de Queiroz. Outros nomes são TrindadeCoelho, Fialho de Almeida e Teixeira de Queiroz. Por volta de 1890, oRealismo/Naturalismo tinha perdido o seu ímpeto em Portugal. Em 1893, opróprio Eça o declarava morto nas Notas Contemporâneas.

Embora por vezes doutrinariamente fraco e/ou confuso o Realismo emPortugal apresenta-se por isso mesmo, mais do que um movimentoconsistente, como uma tendência estética, um sentir novo, que se opôs ao

Idealismo e ao Romantismo. A sua conseqüência mais importante foi à introdução emPortugal das descobertas estrangeiras nos vários domínios do saber. Alargando as escolhasliterárias e renovando um meio literário que estava muito fechado sobre si mesmo. Assim,com a absorção de teorias estrangeiras, como a irreligiosidade de Loisy e Renun, asupremacia da verdade física, com o desenvolvimento das ciências exatas e experimentais,as novas teorias filosóficas - Idealismo de Hegel, Socialismo de Proudhon, Positivismo deComte, e Evolucionismo de Darwin e Lamark, que levam à crença nos princípios de justiçae igualdade; o materialismo otimista graças ao progresso técnico, que explica o atraso dopassado pela passividade do Homem e a sua crença nas forças sobrenaturais, provocandouma verdadeira revolução cultural: repensa e questiona toda a cultura portuguesa desde asorigens, fixando-se no ponto alto das descobertas; pretende-se assim preparar uma profundatransformação na ideologia política e estrutural social portuguesas isto é, a revoluçãorepublicana de 1910.

Como não podia deixar de ser, a obra construída pelos realistas apresenta váriosângulos, uma vez que estavam conscientes da necessidade de fornecer a cultura portuguesaexemplos significativos em cada setor da atividade intelectual. Explica-s, assim, que essageração, ao lado da poesia, do conto e do romance, ainda desenvolvesse, com igualconvicção, a literatura de combate e de idéias assim como a literatura de viagens, ahistoriografia e crítica literária e, em menor proporção, o teatro.

Principais autores

Guerra Junqueiro

Abílio Manuel Guerra Junqueiro (1850-1923), fez curso de Direitoem Coimbra, tendo sido deputado e embaixador. Quando mais jovem,acalentou idéias revolucionárias e participou de alguns movimentosreivindicatórios, o que resultou em alguns poemas de ataque ou protesto.Foi, sobretudo, um poeta e, ocasionalmente, prosador; sua obra inicialse caracteriza por um forte apelo revolucionário contra oconservadorismo católico lusitano. Associando a beatice ao próprioRomantismo, atacava duramente o movimento. Formalmente, contudo,o poeta ainda era bastante influenciado pelo próprio estilo que atacava.De fato, o arrebatamento e a eloqüência refletiam formas tardias dapoesia social do último período romântico, que teve no poeta francês,Victor Hugo, seu principal praticante.

As obras marcantes desse período são: A morte de D. João (1874) e A Velhice doPadre Eterno (1885). Nesta fase não é muito coerente com os postulados científicos quepassa a defender, talvez em conseqüência de sua formação religiosa ou temperamentopende entre os extremos.

A partir de Os simples (1892), o poeta deu novo rumo à sua poesia. Com o própriotítulo, voltou-se para a temática das pessoas humildes, refletindo uma visão lírica da vida

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rural portuguesa que, no entanto, não abandona o registro realista. Começa a repelir osrigorosos compromissos estético-científicos e a desfazer as contradições íntimas. Ossimples é dividido em várias partes, cada uma delas tratando de um tipo de trabalhadorportuguês. Nele, reúnem-se os elementos que, segundo a crítica, caracterizaram a poesiada Guerra Junqueiro: a linguagem direta e simples, a temática do trabalho, a visão fatalistada existência. Tais elementos que criam um lirismo de forte tonalidade social, marcado pelanota popular da repetição rítmica do lamento que, como um refrão, entremeia os versos.

Antero Tarquínio de Quental

Mais do que um poeta importante da literatura portuguesa e figuraímpar do final do século XIX, Antero Tarquínio de Quental (1842-189)constituiu-se líder intelectual da geração de 70. Poeta comprometidocom os problemas filosóficos e sociais do seu tempo, cultivou a poesiae a prosa polêmica e filosófica. A influência do Romantismo observa-senas primeiras obras: Raios de extinta luz e Primaveras românticas.Mas a publicação de Odes Modernas assinala a adesão plena do poetaaos ideais revolucionários dos novos tempos, a que se segue, maistarde, uma poesia marcadamente filosófica, angustiada por incertezasreligiosas e metafísicas, claramente presentes em seus Sonetos. Deixouainda inúmeras cartas e escritos filosóficos.

Podemos identificar três fases distintas na obra de Antero de Quental. A primeiradelas corresponde a uma poesia revolucionária e de entusiasmo juvenil, representada pelasOdes Modernas (1865), poemas que representam a fase do autor e sua adesão às idéiasde justiça social, igualdade e dignidade humanas. Para ele, o ato de escrever é um atorevolucionário, revelando nítida influência das idéias de Proudhon. Os poemas dessa faserefletem o drama social da segunda metade do século XIX. As crenças socialistas, asfilosóficas e as científicas congregam-se para criar uma poesia realista revolucionária ecompromissada.

A terceira fase documentada em Sonetos completos revela o poeta atormentado porquestões humanas, filosóficas e metafísicas, resultando uma poesia dilemática, angustiadae pessimista, envolvida com as idéias de morte e as tentativas de explicar e entender Deus.De certa forma, essa fase representa uma síntese das perturbações que ocupavam o poetadesde a juventude. Nela, Antero atinge o ponto alto de sua carreira, com um raro refinamentoartístico que une a força de reflexões filosóficas bem fundamentadas com beleza rítmica,criando frases imponentes e eloqüentes. Sua obra representa uma incessante busca doIdeal, isto é, a essência humana, corporificada em Deus, na Sociedade, ou no próprio Homem– dependendo das oscilações ideológicas pelas quais passou o poeta.

Cesário Verde

José Joaquim Cesário Verde nasceu em Lisboa em 1855, filho deum lavrador e comerciante, dedicou-se desde muito jovem a essasatividades. No ano de 1873, matriculou-se no curso de Letras daUniversidade de Coimbra, mas freqüentou o curso somente por algunsmeses. Nesse período, começou a publicar poesias no Diário de Notícias,no Diário da Tarde, no Ocidente e em alguns outros periódicos. Nessaépoca também surgem os sintomas mais agudos da tuberculose, doença

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que o levaria a morte em 18 de julho de 1886. No ano seguinte, Silva Pinto,seu amigo dos tempos de universidade, reúne seus poemas em um livrointitulado O Livro de Cesário Verde.

A poesia de Cesário Verde serviu de trânsito entre o Romantismo e oRealismo, de um lado, e de ponte de passagem para algumas das atitudesque estarão em moda na estética simbolista e na modernista. Tal caráter

transitivo explica sua posição em face do inconformismo revolucionário da geração de 70.Alheio às lutas ideológicas em curso, só de passagem o poeta se deixar envolver pelaatmosfera contemporânea. O pensamento socialista, que levava às atitudes de reformasocial, toca-lhe apenas de passagem a poesia, e assim mesmo, sem cor política. Em suaspoesias, a realidade objetiva funde-se com a realidade subjetiva. Dotado de umtemperamento anti-literário, o poeta projeta-se nas coisas exteriores com o peso de suavida interior, a fim de apreender a imagem fugaz das coisas, em perpétuo dinamismo. É,então, que nasce a poesia do cotidiano, do trivial, marca da poesia de Cesário Verde quese coloca numa zona limítrofe que compreende o impressionismo e o expressionismo.

Entre 1877 e 1880, Cesário enfocará a cidade e os seus mistérios: o cotidiano entra-lhe em cheio na poesia. Todavia, depois de 1881, aborrece-se da cidade e do gênero devida que chegou a admirar e seu amor à cidade transforma-se em amor ao campo. Nocontato com o ar livre, o poeta encontrava inspiração para sua poesia e como isso amodificava de modo que ao sombrio de antes, sucede agora a claridade; à morbidez, arobustez; à inação, a ação.

Eça de Queirós

José Maria Eça de Queirós (1845-1900) – Considerado o maisimportante prosador realista e da literatura portuguesa, Eça de Queirósdeixou uma imensa produção literária que muita influência exerceu sobre aevolução do próprio romance em língua portuguesa. Participou ativamentedas polêmicas de seu tempo por meio de escritos críticos (As Farpas), deconferências (participou dos debates e foi um dos palestrantes nasConferências Democráticas do Cassino Lisbonense), de sua copiosacorrespondência e, sobretudo, por meio das próprias obras de ficção.

Com a publicação de O Crime do Padre Amaro, em 1875, Eça de Queirós inicia oromance realista em Portugal, apresentando nessa obra algumas características básicasde sua postura literária: crítica violenta da vida social portuguesa, denúncia da corrupção doclero e da hipocrisia dos valores burgueses. Essas características acentuam-se ainda maisno romance O Primo Basílio, impiedosa expressão da decadência da sociedade burguesa.Sua visão corrosiva e satírica, por outro lado, manifesta-se em O Mandarim e A Relíquia.Com Os Maias (1888) observa-se, porém, uma mudança nessa atitude irreverente edestruidora de Eça de Queirós. Segue-se, então, uma nova fase literária do autor, em que adescrença no progresso e nos ideais revolucionários se manifesta na expressão saudosada vida do campo e na valorização das virtudes nacionais. É o momento de obras como ACidade e as Serras e A Ilustre Casa de Ramires, de contos como Suave Milagre e debiografia religiosas. A crítica literária costuma identificar três fases distintas na obra de Eçade Queirós.

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A primeira fase compreende, basicamente, crônicas jornalísticas reunidasposteriormente em volume, sob o título de Prosas Bárbaras. Nessa fase, Eça escreveu umromance, O Mistério da Estrada de Sintra, em parceria com Ramalho Ortigão. Fase deindecisão, preparação e procura, percebe-se um realismo ainda incipiente que convivecom heranças românticas. A segunda fase tem início com a publicação do romance, OCrime do Padre Amaro, em 1875. Três anos depois, o autor daria continuidade a ela com OPrimo Basílio. Aderindo às teorias do Realismo, o autor coloca-se sob a bandeira daRepública e da Revolução, começa a escrever obras de combate às instituições vigentes(Monarquia, Igreja, Burguesia) e de ação e reforma social. A ironia utilizada nesses romancesdesmascara o comportamento hipócrita e ocioso da burguesia lisboeta. São algumas dasobras dessa fase que marcam o aparecimento do romance em Portugal.

A partir de 1880, com a publicação de Os Maias, percebe-se um escritor maisconfiante em seus próprios recursos expressivos, dando livre vazão ao seu lirismo.Escapando da rigidez das normas realistas-naturalistas, confere lugar de destaque à fantasia,sem abandonar o registro crítico realista. Em romances como A Relíquia (1887), A IlustreCasa de Ramires (1897) e A Cidade e as Serras (1901), o escritor se permite alguns vôosde imaginação. Acrescente-se a nota saudosista das tradições portuguesas. Sua linguagemvai assumindo um registro cada vez mais pessoal. Ao derrotismo e pessimismo analíticoda etapa anterior, sucede um momento de otimismo, de esperança e de fé.

RESUMINDO...O período histórico que marca os últimos anos do Romantismo em Portugal já indicava

uma sociedade em crise, pois, mesmo já estando institucionalizado e consolidado oliberalismo no país, as novas instituições inseriam-se numa sociedade que sob o ponto devista tecnológico, econômico e mesmo social pouco progredia. Emerge, então, uma massade descontentes formada pela pequena burguesia industrial e o resíduo do artesanato, assimcomo uma parte da burguesia comercial que tende a ficar fora do sistema, enquanto não seorganiza o partido republicano. Os camponeses, mudos, apareciam nesse cenário comomassa de manobra dos partidos governantes.

O movimento realista Eclodiu em Portugal em 1871 e firma-se como resposta àartificialidade, formalidade, exageros e à sentimentalidade mórbida do Romantismo. Osadeptos do realismo tinham como bases teóricas o determinismo de Taine, o positivismode Comte, o socialismo “utópico” de Proudhon, o evolucionismo de Darwin, o fisiologismode Claude Bernard e o anticlericalismo de Renan. Diante de tais idéias, ocupavam-se de

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DA MINISSERIE: Os Maias (Brasil, 2001)

DIREÇÃO: Luiz Fernando CarvalhoELENCO: Ana Paula Arósio , Fabio Assunção , Walmor Chagas

Uma produção muito cuidadosa da Globo com uma caracterização deépoca magnífica e com ótimas atuações de todo o (muito bem selecionado)elenco: “uma soberba adaptação que a TV Globo exibiu em 44 capítulos,podendo perfeitamente ser incluída num rol de produtos teledramatúrgicosde excelência artística, realizados pela nossa televisão”, diz Cristina Brandão.

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uma crítica à educação romântica, ao conservadorismo da Igreja, almejandoa reforma social, a representação da vida contemporânea e uma visão objetivada realidade. Para os representantes dessa nova literatura, o trabalho doescritor consistia na observação da experiência, na análise psicológica dostipos, no esclarecimento dos problemas humanos e sociais, noaperfeiçoamento da literatura, isentando-a da fantasia. Pregavam a artecomprometida com o social, ou seja, a arte engajada, prezavam também a

descrição de costumes e acontecimentos contemporâneos em seus mínimos detalhes e areprodução da linguagem coloquial, familiar e regional.

Sinteticamente, podemos vislumbrar três momentos do Realismo em Portugal: aeclosão com a Questão Coimbrã quando Castilho no Posfácio Poema da mocidade criticao estilo poético da “escola coimbrã cita os nomes de Antero Quintal, Teófilo Braga e VieiraCastro. As respostas vieram através dos folhetos Bom senso e bom gosto e A dignidadedas letras e as literaturas oficiais ambos de Antero de Quental, que recebeu também oapoio de Teófilo Braga em Teocracias Literárias. Um momento posterior seria o da afirmaçãocom o grupo do Cenáculo, nesse momento destacam-se As Farpas de Eça de Queirós eRamalho Ortigão e as conferências do Cassino. A última etapa ou a decadência marcadapela crise de desalento da “Geração de 70” que acabam formando o grupo dos “Vencidosda Vida” nesse período ocorre também o episódio do Ultimato e o suicídio de Antero deQuental.

Os principais escritores desse período foram o poeta Antero de Quental principallíder realista e que revela em sua ora e em suas atividades políticas as contradições domovimento em Portugal. Sua produção poética pode ser dividida em três fases: as poesiasda juventude – Sonetos; as de combate – Odes modernas e as Dilemáticas – Sonetoscompletos. Destacou-se também Eça de Queirós o escritor, cuja obra é a mais representativadas tensões ideológicas do realismo português, sendo também a mais importante do pontode vista da elaboração artística. Sua obra pode ser dividida em três Fases uma Neo-romântica com Notas marginais outra Realista-naturalista com O crime do padre Amaro ea última de Afastamento do Naturalismo com A ilustre casa de Ramires. Cesário Verdeoutro escritor importante registrou o processo de urbanização, tematizou o operariado, sendotambém o precursor do Modernismo. Temos, ainda, Guerra Junqueiro autor de uma poesiamilitante e popular que se afastava dos padrões realistas.

SimbolismoO Simbolismo é um movimento literário que surge em finais do século XIX tendo

Baudelaire como um dos mais influentes precursores. Esta arte sugestiva é teorizada em1886 por Jean Moréas quando publica no Figaro Um Manifeste Littéraire no qual define,pela primeira vez, o que denomina simbolismo. A este escritor juntam-se nomes comoRimbaud, Mallarmé, Paul Verlaine, Jules Laforgue, Gustave Kahn, Pierre Louys, entre outros.Em Portugal os primeiros sinais da escola Simbolista aparecem no ano de 1889 nas revistasBoémia Nova e Os Insubmissos, que contavam com a colaboração de Eugênio Castro eAntônio Nobre e divulgavam os grandes nomes contemporâneos das letras francesas, emespecial aqueles empenhados no movimento.

Com a publicação do livro de poemas Oaristos, de Eugênio de Castro, em 1890,inicia-se oficialmente o Simbolismo português, durando até 1915, época do surgimento dageração Orpheu, que desencadeia a revolução modernista no país, em muitos aspectosbaseada nas conquistas da nova estética. O termo Oaristo é de origem grega e significa“diálogo íntimo” ou “diálogo entre amantes”. Essa obra, além dos poemas, que tratam deum amor ardente e fatal, apresenta em seu prefácio o programa da estética Simbolista.

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Neste prefácio, o autor critica a poesia portuguesa da época afirmando ser esta repleta delugares comuns e pobre nas rimas e no vocabulário. Traz como proposta a liberdade doritmo e um vocabulário escolhido e variado e o uso de palavras menos vulgares. O términodo Simbolismo português se dá em 1915, já em meio à primeira guerra mundial, quandoMário de Sá Carneiro e Fernando Pessoa lançam a revista Orpheu e dão início ao movimentoModernista.

Durante os 25 anos de predomínio da estética Simbolista,Portugal foi governado por D. Carlos I, seguido por D. Manuel II e noano de 1910 acontece a Proclamação da República. Portugalatravessa um período muito conturbado, devido a grave criseeconômica e financeira e, para piorar a situação, a Inglaterra deu umultimato a Portugal, exigindo que fossem retirados os exércitos portugueses que seencontravam entre Angola e Moçambique, caso contrário a guerra seria declarada.

A tentativa de enfrentar os exércitos ingleses em qualquer tipo de batalha seriaconsiderado uma verdadeira loucura. Por isso, o governo português acabou cedendo, atitudeque deixou o povo português humilhado.

Aproveitando-se dessa crise que se instaurava na monarquia, os republicanos fizeramuma série de campanhas para a derrubada da monarquia e após muitas tentativas, em 5 deabril, a revolução, iniciada na madrugada do dia anterior em Lisboa, termina com a vitóriados republicanos apoiados pela Inglaterra. Foi estabelecido, então, um governo provisóriopresidido por Teófilo Braga. Em 1911 foi Promulgada a Constituição de 1911 e, ainda nessemesmo ano, foi eleito o primeiro presidente da República: Manuel de Arriaga. No final doseu mandato, Manuel de Arriaga, alarmado com as lutas políticas procedeu a um autênticogolpe de Estado: ele demitiu todo o governo e encarregou, em ditadura, o general Pimentade Castro de organizar um ministério, com o objetivo de pacificar a Nação e prepararpróximas eleições legislativas. A ditadura Pimenta Castro durou pouco. Ainda em 1914 opovo rebelou-se e a ditadura chegou ao fim com a renúncia de Manuel Arriaga. Mais umavez Teófilo Braga assume a Presidência da República até que se organizasse novas eleições.

Como pudemos perceber, o Simbolismo português surge num momento em que acrise espiritual e o decadentismo de certos meios filosóficos e artísticos europeus, do finaldo século, coincidem com o sentimento de pessimismo e frustração do povo português,relacionada com algumas causas históricas como o ultimatum da Inglaterra, a queda damonarquia e a instauração da república. Os poetas simbolistas portugueses vivenciam ummomento de intensa agitação social, política, cultural e artística.

Características

É uma corrente de reação contra o positivismo científico, o materialismo. Buscaa espiritualidade, a transcendência física e a imaginação, proclama o retorno à mentalidademística, a integração cósmica e valorização do espiritual para se conseguir a paz interior.

Interesse pelo noturno, pelo mistério e pela morte, assim como pelos momentosde transição como o amanhecer e o crepúsculo; interesse pela exploração das zonasdesconhecidas da mente humana.

Valorizava o conhecimento intuitivo e não-lógico, enfatizando a imaginação e afantasia, as concepções voltam-se ao místico e sobrenatural.

Maior ênfase pelo particular e individual do que pelo geral e universal, ossimbolistas se voltam para dentro de si à procura de zonas mais profundas.

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Utilização de substantivos abstratos, efêmeros, vagos eimprecisos. Os textos comumente retratam elementos como fumaça, gases,neve e imagens grandiosas para expressar a idéia de liberdade.

Pouco interesse pelo enredo e ação narrativa: pouquíssimostextos em prosa. Foi na poesia que o Simbolismo se firmou recebendoinfluências do formalismo parnasiano, dos motivos da poesia francesa e doneogarretismo, apegando-se ao tradicionalismo de base historicista e

folclórica.Linguagem vaga, fluida, sugestiva e não nominativa, ela devia ser ornada, colorida,

exótica, bem rebuscada e cheia de detalhes: as palavras são escolhidas pela sua sonoridade,num ritmo colorido, devendo evocar e não descrever, aludir e não definir.

Os procedimentos técnicos mais ligados ao Simbolismo são a sinestesia e amusicalidade. A sinestesia corresponde à mistura de sensações, provocada exatamentepara acionar no leitor uma série de sentidos. A musicalidade é obtida com a exploração dacamada sonora dos vocábulos.

Acredita-se na existência de um mundo que se supunha existir para além darealidade visível e concreta. Os objetos, as figuras humanas, enfim toda a realidade erafocalizada através de imagens vagas e imprecisas, que propositadamente dificultavam suacompreensão e interpretação.

A inovação na combinação de expressões conhecidas conduziu naturalmenteos simbolistas à criação de neologismos, isto é, novas palavras.

Alguns autores

Antônio Nobre

Antônio Nobre nasceu na cidade do Porto em 1867 e morreu em1990, vítima de tuberculose. Em 1888, matriculou-se no curso de Direito naUniversidade de Coimbra. Como os estudos lhe corressem mal, partiu paraParis onde freqüentou a Escola Livre de Ciências Políticas, licenciando-seem Ciências Jurídicas. Autor de grande e refinada sensibilidade, que tomadode um sentimento ambíguo e entristecedor por um lado a vida parece-lheum fio ininterrupto de dores, mas lastima abandoná-la.

Mesmo porque reconhece receber dela um gozo estético e afetivo, no amor da mulher,na contemplação da terra natal e no encontro com os familiares e no encontro de valoresespirituais. Entretanto ao debruçar-se em seu mundo interior o poeta realiza uma espéciede amarga reflexão sentimental de sua vida.

Sua principal contribuição para o Simbolismo português foi a alternância do vocabuláriorefinado dos Simbolistas com um outro mais coloquial. A princípio, sua poesia mostra certainfluência de Almeida Garret e de Júlio Dinis, porém, em uma segunda fase fica clara ainfluência do Simbolismo Francês. Obras poéticas: Só (publicada em Paris em 1892),Despedidas (1902) e Primeiros Versos (1921), ambas publicadas postumamente.

Eugênio de Castro

Eugênio de Castro e Almeida nasceu em Coimbra em 1869 e faleceuem 1944. Por volta de 1889 formou-se em Letras pela Faculdade de Coimbrae mais tarde veio a lecionar nessa faculdade. Colaborou com a publicaçãodas revistas “Os insubmissos” e “Boêmia nova”, ambas seguidoras do

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Simbolismo Francês. Em 1890, entrou para a história da literatura portuguesa com olançamento do livro de poemas “Oaristos”, marco inicial do Simbolismo em Portugal. Poetaque manifestava uma forte atração por um barroquismo de linguagem algo estranho à estéticasimbolista em voga.

A obra de Eugênio de Castro pode ser dividida em duas fases: Na primeira fase oufase Simbolista, que corresponde a sua produção poética até o final do século XIX, Eugêniode Castro definiu algumas características da Escola Simbolista, como, por exemplo, o usode rimas novas e raras, novas métricas, sinestesias, aliterações e vocabulário mais rico emusical. Na segunda fase ou neoclássica, que corresponde aos poemas escritos já noséculo XX, percebemos um poeta voltado à Antiguidade Clássica e ao passado português,revelando certo saudosismo, característico das primeiras décadas do século XX emPortugal. Além de Oaristos, podemos citar como obras do poeta Belkkiss (1894), Saudadesdo céu (1899), Constança (1900), O cavaleiro das mãos irresistíveis (1916), Últimos versos(1938), entre outras.

Camilo Pessanha

Poeta português, natural de Coimbra, nasceu filho ilegítimo de umestudante de Direito, oriundo de uma família aristocrática, e de uma mulherde condição social muito inferior. Acometido de tuberculose, morre em 1ºde março de 1926 em Macau. Sua poesia, que influenciou vários poetasmodernistas, mostra o mundo sob a ótica da ilusão, da dor e do pessimismo.O exílio do mundo e a desilusão em relação à Pátria também estão presentesem sua obra e passam a impressão de desintegração do seu ser. A suaobra mais famosa é Clepsidra, relógio de água, que contém poemas commusicalidade marcante e temas até certo ponto dramáticos.

Poeta notabilizado pela qualidade rítmica e musical dos versos e cultivando umaforma meticulosa, de grande equilíbrio e rigor, afastou-se do tradicional lirismo romântico edo sentimentalismo tão comuns na poesia portuguesa.

Camilo Pessanha é considerado o mais simbolista dos poetas da época e influencioua geração de Orpheu, que iniciou o Modernismo em Portugal. Considerado de difícil leitura,pois trabalha bem a linguagem. Em sua obra, Clepsidra (1926), distancia-se de uma situaçãoconcreta e pessoal, e sua poesia é pura abstração. Os seus poemas caracterizam-se porum forte poder de sugestão e ritmo, apresentando imagens estranhas, insólitas, não lineares,isto é, repletas de rupturas e cores – elementos tipicamente simbolistas. Em seus poemaspredomina o tema do estranhamento entre o eu e o corpo; o eu e a existência e o mundo,cujos elementos mais familiares, ao mesmo, tempo tornam-se esquivos, perante umasensibilidade poética fina e sutil, mas na qual não se encontra os derramamentos emocionaise a subjetividade egocêntrica. Além da obra citada, é também de sua autoria: China, estudose tradições (1944).

Raul Brandão

Autor de uma literatura forte e dramática. A sua melhor produção estána prosa de ficção: A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore (1926), AFarsa (1903), Os Pobres (906), Húmus, O Pobre de Pedir. O estilo de RaulBrandão aproxima-se mais da poesia que do romance, o que lhe acompanhanas diversas fases de sua carreira. Mais poeta que ficcionista graças à

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linguagem estruturalmente poética, pelo jogo das imagens, pelo metafórico,pelo ritmo, emociona e, sobretudo, pela liberdade expressiva. Consideradopela crítica como o escritor que melhor realizou a tendência fundamental daprosa simbolista, acabando por ser o mais importante prosador do Simbolismoportuguês.

O Simbolismo é um movimento literário que surge em finais do século XIX, tendoBaudelaire como um dos mais influentes precursores. Em Portugal, os primeiros sinais daescola Simbolista aparecem no ano de 1889 nas revistas Boémia Nova e Os Insubmissos.Todavia é em 1890 com a publicação do livro de poemas Oaristos, de Eugenio de Castro,que se inicia oficialmente o Simbolismo português, durando até 1915, época do surgimentoda geração Orpheu, que desencadeia a revolução modernista no país. Essa obra, além dospoemas, que tratam de um amor ardente e fatal, apresenta em seu prefácio o programa daestética Simbolista, no qual o autor critica a poesia portuguesa da época. Traz como propostaa liberdade do ritmo e um vocabulário escolhido e variado e o uso de palavras menosvulgares.

O movimento em portugal surge num momento em que a crise espiritual e odecadentismo de certos meios filosóficos e artísticos europeus, do final do século, coincidemcom o sentimento de pessimismo e frustração do povo português. Após o ultimatum daInglaterra e a queda da monarquia e a instauração da república, no país afirma-se umareação idealista contra o Realismo-Naturalismo, identificado com o progressismo burguêsque só beneficiava o grande capital. Diante disso, os poetas simbolistas portuguesesvivenciam um momento de intensa agitação social, política, cultural e artística.

As principais características do movimento foram o registro da decadência darealidade e produções bastante elaboradas; impressionismo com o registro de impressõesfugazes e indo contra a estandartização; afastamento do sensualismo impressionista;irracionalismo e espiritualismo; coexistência do neo-romantismo e construção artesanal dopoema. Reação ao positivismo científico e ao materialismo; valorizava do conhecimentointuitivo e não-lógico, enfatizando a imaginação e a fantasia. Maior ênfase pelo particular eindividual. Utilização de substantivos abstratos, efêmeros, vagos e imprecisos. Poucointeresse pelo enredo e ação narrativa: pouquíssimos textos em prosa. Linguagem vaga,fluida, sugestiva e não nominativa. Os procedimentos técnicos mais ligados ao Simbolismosão a sinestesia e a musicalidade. Acredita-se na existência de um mundo que se supunhaexistir para além da realidade visível e concreta.

É possível apontar três momentos do simbolismo em Portugal: a introdução, com asrevistas Boêmia Nova e Os Insubmissos, merecendo destaque o esteticismo de Eugêniode Castro com Oaristos; a busca da realidade enfatizando o neogarrettismo; o saudosismocom Antonio Nobre (Só) e Teixeira dos Pascoais que aproxima o Simbolismo do Modernismoe a maturidade artística com Camilo Pessanha na poesia e Raul Brandão na prosa.

Antônio Nobre autor de grande e refinada sensibilidade contribuiu alternando aovocabulário refinado dos Simbolistas um outro mais coloquial. A princípio, sua poesia mostracerta influência de Almeida Garret e de Júlio Dinis, porém, em uma segunda fase fica claraa influência do Simbolismo Francês. Temos, também, Eugênio de Castro e Almeida queentrou para a história da literatura portuguesa com o lançamento do livro de poemas“Oaristos”, marco inicial do Simbolismo português. Sua obra pode ser dividida em duas

RESUMINDO...

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fases: a fase simbolista, que corresponde a sua produção poética até o final do século XIXe a segunda fase ou neoclássica, que corresponde aos poemas escritos já no século XX,nos quais ele se volta para a Antiguidade Clássica e ao passado. É desse período aindaCamilo Pessanha, cuja poesia influenciou vários poetas modernistas e mostra o mundosob a ótica da ilusão, da dor e do pessimismo. É considerado o mais simbolista dos poetasda época e autor de apenas um livro: Clepsidra. Ainda faz parte dessa geração Raul Brandão,autor de uma literatura forte e dramática. A sua melhor produção está na prosa de ficção,seu estilo aproxima-se mais da poesia que do romance, o que lhe acompanha nas diversasfases de sua carreira.

AtividadesAtividadesAtividadesAtividadesAtividadesComplementaresComplementaresComplementaresComplementaresComplementares

Identifique as características do texto.1.

Texto para as questões 1 e 2

“Quero uma virgem com uma tez bem alva / pálida e pálida, amorosae mole / quero uma virgem, que convide os lábios / a beberem-lhe o amorgole por gole / Quero uma virgem que receie ainda / quebrar com um ai ofio dos pen-sares / quero uma virgem que me entenda todo / por um volverde místicos olhares / Quero assim minha virgem: pela terra /, louco, deito-me enfim a pro-curá-la / Um ente assim, Deus tê-lo-á formado / Guia-meanjo do amor que eu hei de achá-la”. (Junqueira Freire)

A que estilo de época pertence o texto a seguir?2.

Eu sou, pois associado a estes dois movimentos, e se ainda ignoroo que seja a idéia nova, sei pouco mais ou menos o que chamam aí aescola realista. Creio que em Portugal e no Brasil se chama realismo,termo já velho em 1840, ao movimento artístico que em França e emInglaterra é conhecido por “naturalismo” ou “arte experimental”. Aceitemos,porém, realismo, como a alcunha familiar e amiga pela qual o Brasil ePortugal conhecem uma certa fase na evolução da arte.

(…)Não – perdoem-me – não há escola realista. Escola é a imitação

sistemática dos processos dum mestre. Pressupõe uma origem individual,uma retórica ou uma maneira consagrada. Ora o naturalismo não nasceuda estética peculiar dum artista; é um movimento geral da arte, num certomomento da sua evolução. A sua maneira não está consagrada, porquecada temperamento individual tem a sua maneira própria: Daudet é tão

Idealismo e Realismo

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Independentemente das idéias de IDEALISMO apontada no texto, relate a suaconcepção acerca do idealismo.3.

diferente de Flaubert, como Zola é diferente de Dickens. Dizer “escolarealista” é tão grotesco como dizer “escola republicana”. O naturalismo é aforma científica que toma a arte, como a república é a forma política quetoma a democracia, como o positivismo é a forma experimental que tomaa filosofia. Tudo isto se prende e se reduz a esta fórmula geral: que fora daobservação dos factos e da experiência dos fenômenos, o espírito nãopode obter nenhuma soma de verdade. Outrora uma novela romântica,em lugar de estudar o homem, inventava-o. Hoje, o romance estuda-o nasua realidade social. Outrora no drama, no romance, concebia-se o jogodas paixões a priori; hoje, analisa-se a posteriori, por processos tão exactoscomo os da própria fisiologia. Desde que se descobriu que a lei que regeos corpos brutos é a mesma que rege os seres vivos, que a constituiçãointrínseca duma pedra obedeceu às mesmas leis que a constituição doespírito duma donzela, que há no mundo uma fenomenalidade única, quea lei que rege os movimentos dos mundos não difere da lei que rege aspaixões humanas, o romance, em lugar de imaginar, tinha simplesmentede observar. O verdadeiro autor do naturalismo não é, pois, Zola – é ClaudeBernard. A arte tornou-se o estudo dos fenômenos vivos e não a idealizaçãodas imaginações inatas…

(Eça de Queirós. Cartas Inéditas de Fradique Mendes. In: Obras de Eça de Queirós.)

Diante do que você já estudou anteriormente, como poderia ser definido oREALISMO?4.

Considerando que, em seu texto, Eça de Queirós defende e assume os princípiosmecanicistas e deterministas na composição literária, explique o que ele quer dizer com afrase seguinte sobre a técnica de composição da narrativa realista: “Outrora no drama, noromance, concebia-se o jogo das paixões a priori; hoje, analisa-se a posteriori, porprocessos tão exactos como os da própria fisiologia”.

4.

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Modernismo: Contexto Geral e a Geração Orfeu

O MODERNISMO PORTUGUÊS E A LITERATURA

CONTEMPORÂNEA

Contexto Histórico-Social

Gestadas no século anterior, profundas e amplas transformaçõesculturais e estéticas, que serviram de ensaio para alguma coisa de novo,só veio a declarar-se, explosivamente, na Europa nos primeiros anos noinício do século XX. Surgiram várias manifestações artísticas, sob adenominação genérica de correntes de vanguarda (do francês avant-garde,que significa “estar à frente, tomar a dianteira”). Esses diferentesmovimentos tinham – além do ismo em seus nomes – posições comunsem relação às artes: liberdade, interpretação pessoal da realidade,rebeldia, ilogicidade, busca de novas formas de expressão, etc. Assim,aparece o Futurismo de Marinetti (Itália), o Cubismo de Picasso (espanha),

o Dadaísmo suíço, o Expressionismo alemão e o Serrealismo francês. Portugal, então,procura adaptar-se ao ritmo da mudança européia e, ao mesmo tempo, busca beneficiar-se do progresso cultural em curso.

Em 1890, o governo inglês lançou um ultimatum a Portugal: o país deveria abandonarimediatamente as colônias que ainda mantinha. A obediência a essa imposição encheu opovo português de vergonha e abalou profundamente a crença na monarquia, jádesacreditada por seu anacronismo. Neste período de grandes transformações se avolumouuma onda de insatisfação contra o regime monárquico que se mostrava incapaz de resolveros problemas mais urgentes da Nação e de oferecer um clima de tranqüilidade e progresso.A desordem e a sanguinolência generalizou-se quando o Rei D. Carlos foi assassinato porum homem do povo em 1908, ao voltar, em carruagem aberta, de uma de suas habituaisestações de caça em Vila Viçosa. Como no atentado também falecera o príncipe herdeiro,D. Luís Filipe, D. Manuel II –sobrevivente do morticínio no Terreiro do Paço – é imediatamentechamado a ocupar o trono. Ainda muito jovem ascende ao poder em clima de turbulênciase mantém o posto de monarca até 1910, quando, precisamente a 4 de outubro, se instala aRepública em Portugal.

A República, incapaz de resolver os problemas mais profundos do país, e semconseguir equacionar as diferenças existentes entre os próprios republicanos, acabou pordar lugar à ditadura salazarista, que durou cerca de cinqüenta anos, até a Revolução dosCravos, de caráter socialista, em 1975. Portanto, as mudanças sociais esperadas nãoaconteceram de forma a contentar os republicanos mais exacerbados. Na verdade, aRepública tinha como principal objetivo integrar Portugal no quadro do imperialismo europeu,sinônimo de modernização. Esse ambiente favoreceu a difusão das idéias modernistas.Assim, o Modernismo Português é um movimento estético que nasce em clima de tensasmudanças e é empreendido pela geração de Fernando Pessoa, M. Sá-Carneiro e Almada-Negreiros em conjunto com a arte e a literaturas Européia, expressando toda a umaparticularidade nacional. Foi na capital, Lisboa, em 1913, que se constituiu o núcleo dogrupo modernista. O Modernismo se tornara basicamente lisboeta, apenas com algumasadesões de Coimbra (o poeta e ficcionista Albino de Meneses, etc.) e ecos vagos noutrospontos da província. Nesse ano de 1913, escreveu Sá-Carneiro, aplaudido pelo seu amigoFernando Pessoa, os poemas de Dispersão; ambos nutriam o sonho duma revista.

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O Modernismo em Portugal

A “GERAÇÃO DE ORFEU”

Em 1915, os jovens modernistas e artistas devanguarda, estimulados pela aragem de atualidadevinda de Paris com Sá-Carneiro e Santa-Rita (Pintor),

adeptos do futurismo, aderiram ao projeto que Luís da Silva Ramos(Luís de Montalvor) acabava de trazer do Brasil: o lançamento dumarevista luso-brasileira. Cria-se, então, a revista Orpheu, marcoinaugural do Modernismo em Portugal. Através dela, as novaspropostas artísticas foram divulgadas e discutidas. A duração darevista foi efêmera, prejudicada pelo suicídio de Sá-Carneiro. Essesprimeiros modernistas ficaram conhecidos, exatamente em funçãoda revista, por “geração de Orpheu”.

A primeira atitude dos novos escritores foi de desprezar o “sentimentalismo falso”dos românticos, adotando uma participação ativa e primando pela originalidade de idéiase, na poesia, não deveriam se prender à rima e a métrica. Os autores modernos nãofundaram propriamente uma nova escola literária, com regras rígidas, pelo contrário,desvincularam-se das teorias das escolas anteriores e procuraram os fatos da vida atual ea realidade do país para transmitir suas emoções, de uma forma livre e descompromissada.Era preciso para isso esquecer o passado, comprometer-se com a nova realidade einterpretá-la cada um a seu modo.

A sociedade portuguesa vivia uma situação de crise aguda e de desagregação devalores. Os modernistas portugueses respondem a esse momento, agredindo o sistemacom escândalo e sarcasmo, investigando as regiões inexploradas e indefinidas doinconsciente e entregando-se à vertigem das sensações da vida moderna, da velocidade,da técnica, das máquinas.

Os modernistas portugueses tiraram proveito da herança simbolista, sem renegá-latotalmente. Assim, o saudosismo do poeta Antônio Nobre, que tinha fortes conotaçõesnacionalistas, ganhou força entre os membros da “geração de Orpheu”. Ao lado disso, aabsorção das conquistas futuristas que tomavam conta da Europa inteira, como a apologiada máquina e do progresso urbano, conduz o movimento à vanguarda. Assim, o que sedestaca, no panorama modernista português, nesse primeiro momento, é a forma deelaboração entre tradição e o novo. Com isso, eles conseguem retomar formar e temasarcaicos, enquadrando-os dentro de propostas modernistas.

Fernando Pessoa e os Heterônimos

“““““VOCÊ SABIA QUE...

Fernando Pessoa possui uma faceta rica, densa e intrigante e diz respeitoao fenômeno da heteronímia, ou seja, à sua capacidade de despersonalizar-se ereconstruir-se em outros personagens?

.

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Fernando Antônio Nogueira Pessoa (1888-1935) é um poeta que setransfigura em vários poetas, os seus heterônimos, e para cada um deles deuuma biografia, caracteres físicos, traços de personalidade, formação cultural,que resultam em diferentes maneiras de interpretar o mundo. Foi assim queFernando Pessoa “fez nascer” os poetas Alberto Caeiro, Ricardo Reis eÁlvaro de Campos.

OBSERVE: É importante não confundir heterônimo com pseudônimo.Pseudônimo é um nome falso, sob o qual alguém se oculta. O heterônimo vai além: é umoutro nome, uma outra personalidade, uma “outra individualidade”, diferente, portanto, dado criador. Como nos explica o próprio Fernando Pessoa:

“Por qualquer motivo temperamental que me não proponho analisar,nem importa que analise, construí dentro de mim várias personagensdistintas entre si e de mim, personagens essas a que atribuí poemasvários que não são como eu, nos meus sentimentos e idéias, os escreveria.Assim têm os poemas de Caeiro, os de Ricardo Reis e os de Álvaro deCampos que ser considerados. Não há que buscar em quaisquer delesidéias ou sentimentos meus, pois muitos deles exprimem idéias que nãoaceito, sentimentos que nunca tive. Há simplesmente que os ler comoestão, que é aliás como se deve ler”.

Fernando Pessoa - obra poética.

Foi um dos diretores da revista “Orpheu”, participando ativamente do Modernismoem Portugal. Queria ser absoluto e abrangente; universal, e talvez por isso, multiplicou-separa poder sentir os vários ângulos da realidade por meio da sua heteronímia. Tornou-se,então, vários poetas ao mesmo tempo, com características próprias, biografias próprias,etc. Quis reconstruir o mundo, organizar o caos.

Escreve como F. Pessoa - ele mesmo e seus heterônimos.

PERFIL DOS HETERÔNIMOS

Para que você conheça um pouco melhor esses “poetas”, apresentamos, a seguir,os heterônimos:

ALBERTO CAEIRO

Nasceu em Lisboa em 1889 e morreu tuberculoso, também emLisboa, no ano de 1915. Considerado o mestre dos outros heterônimos edo poeta ortônimo, Alberto Caeiro escreveu em versos livres (sem métricaregular) e brancos (sem rimas), de forma lírica, espontânea, instintiva, decandura e placidez ideais. Caeiro não teve profissão, nem educação quasealguma, só instrução primária, daí, algumas vezes, a simplicidade quaseinfantil do estilo. Órfão, é o heterônimo menos culto e complicado, e por tervivido no campo, escreve com a linguagem simples e o vocabulário limitadode um poeta camponês pouco ilustrado.

Ficou conhecido como o Poeta das sensações, pois considerava que a sensaçãoseria a única fonte válida do conhecimento. Assim sendo, a sua produção literária écompletamente entregue à infinita variedade do espetáculo das sensações, principalmenteas visuais. Para ele o real é a própria exterioridade - “tudo é como é, e assim é o que é”.

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Um rápido esboço de suas características:

Fuga para o campo - rural clássico reinventado.Pretende ser objetivo - o mundo não carece de subjetivismos.Sensacionismo - Objetiva o registro das sensações sem a

mediação do pensamento (objetivismo visualista): “pensar é estar doente dosolhos”

Proclama-se antimetafísico - pratica o realismo sensorial, numa atitude de rejeiçãoas elucubrações do Simbolismo.

Poeta-filósofo, fruto do seu contato direto com a realidade (influencia AntônioMora).

É um poeta por natureza - “um poeta e nada mais”.Agnóstico – nega qualquer forma de espiritualismo ou de transcendência.Paganismo – “pensar como os deuses, pelos pés, pela boca, pelo ouvido, pelos

olhos.”É (ou pretende ser) um homem franco, alegre, de visão ingênua. Bucólico.Prestava-se à descrição pictórica impressionista.

ÁLVARO CAMPOS

Nasce em Tavira, em 1890 e viveu em Lisboa na inatividade semconstar data da morte. Era alto, magro e corcunda. Intelectual, teve umaeducação vulgar de Liceu; depois foi mandado para a Escócia estudarEngenharia, primeiro a Mecânica e depois a Naval, mas não exerceu aprofissão. É todo emoções - É o heterônimo mais nervoso e emotivo, quepor vezes vai até à histeria. É considerado um poeta futurista.

Possui uma evolução literária caracterizada em 3 fases:

1ª Fase

Inicia-se como “decadente-simbolista” – Decadentismo (poemas aindametrificado e rimado).

Homem hiper-civilizado, é o poeta moderno cosmopolita, melancólico.Entediado com o mundo, fuma ópio para escapar da doença da vida (escapismo).

(OPIÁRIO)

2ª Fase

Ingressa no modernismo - na segunda fase - com a sua vitalidade transbordante,e o seu amor ao ar livre e ao belo feroz.

Sofre a influência de Alberto Caeiro (a quem toma como mestre)Passa a cultuar a energia e a força.Ele é, pelo tom e pelo estilo, um Sensacionalista – Explosão de emoções e vida.É o poeta que pretende sentir tudo de todas as maneiras”, ultrapassar a

fragmentaridade numa “histeria de sensações”.Subjetivista, Campos defende uma estética não aristotélica baseada na idéia

de força, na emotividade individual - Poesia de força e não de contemplação.Revolucionador das formas.

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Futurista da exaltação da energia, da velocidade e da força da civilizaçãomecânica (adotando um estilo febril, entre máquinas e a agitação da cidade).Entusiasta do mundo moderno.É um homem sujeito à máquina. É por meio da reflexão do homem inserido narealidade moderna e naquilo que gerará a progressão dela que Camposdesenvolve os problemas existenciais.Pela técnica, o homem pode abrir o seu caminho de regresso ao paraíso”.Vanguardista.Explora os aspectos fonéticos, onomatopaicos (dadaísmo).

3ª Fase

Por fim, amargurado, reflete de forma pessimista e desiludida sobre a existência.Volta ao vazio.Inadaptação às condutas sociais.Canta a angústia do homem de seu tempo e a crise de valores espirituais.Amargura angustiada.Desencontro do sujeito com o mundo e com a existência.Seu estilo é marcado pela oralidade e pela forma prolixa que se espalha emversos longos, próximos à prosa.Lirismo desencantado (aproximação com F. Pessoa, ortônimo).Para ele a metafísica é a pseudociência de se figurar mundos impossíveis.

RICARDO REIS

Nasce em Porto, em 1887, e não há registros de morte. Estudoucom os Jesuítas e se formou em Medicina. Discípulo de Caeiro, o segue noamor da vida rústica, junto da natureza. Reis é um ressentido que sofre evive o drama da transitoriedade, doendo-lhe o desprezo dos deuses.Afligem-no a imagem antecipada da Morte e a dureza do Fado, por isso éconsiderado um poeta fatalista, nos diz ele: “Acima de nós e dos deusesestá o fado (destino)”.

Seus poemas têm forte influência do poeta romano Horácio, sendo assim latinizanteno vocabulário e na sintaxe. O seu estilo é densamente trabalhado e revela ainda, muitoclaramente, o seu tributo à tradição clássica no uso de estrofes regulares, quase sempre dedecassílabos nas referências mitológicas, na freqüência do hipérbato, na contenção econcisão altamente expressivas e lúcidas. Considerava-se neoclássico, classicista naexpressão das emoções e sentimentos.

Um rápido esboço de suas características:

Monárquico, auto-exila-se no Brasil (1919).O pensamento como fator inerente à criação artística.Sensacionismo - Parte das sensações.A disciplina a serviço do pensamento.Busca da perfeição e do equilíbrio – disciplina mental.Clareza das idéias.Simboliza uma força humanista de ver o mundo.Busca o refúgio dum epicurismo temperado de algum estoicismo.

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Estoicismo – “Seremos mais felizes quanto menor forem nossasnecessidades”.Epicurismos – Necessidade de gozar o aqui e o agora.Versos elegantes e nostálgicos.Culto da ode.Um permanente convite ao amor, ao vinho, às flores.Culto ao paganismo - “pagão por caráter”.

A REVISTA PRESENÇA

Da revista Orpheu saíram, com efeito, dois números (os únicospublicados) em 1915; Feitos, em parte, para irritar o burguês, paraescandalizar, estes dois números alcançaram o proposto, tornando-sealvo das troças dos jornais; mas a empresa não pôde prosseguir porfalta de dinheiro. Na seqüência, surgiram duas outras revistas, dentroda mesma tendência: Centauro (1916) e Portugal Futurista (1919).

Em 1917 Almada-Negreiros, “o poeta do Orpheu e o Narciso doEgipto”, organizou no Teatro República (hoje São Luís) uma escandalosasessão futurista, ainda dentro da corrente modernista – definida como umanova concepção da literatura como linguagem que põe em causa as relaçõestradicionais entre autor e obra, e ao mesmo tempo suscita uma exploraçãomais ampla dos poderes e limites do Homem, o momento em que defrontaum mundo em crise, ou a crise duma imagem congruente do Homem e domundo.

Alguns anos mais tarde, em 1927, surgiu a revista Presença, que não só valorizou asobras dos artistas da Orpheu, como também as divulgou e deu continuidade a elas, adotandouma participação ativa e dentro da realidade da vida moderna. A revista Presença, aparecidaem 1927, não só deu a conhecer e valorizou criticamente as obras dos homens do Orpheu,como lhes herdou o espírito por intermédio de alguns dos presencistas, pertencentes já auma segunda geração modernista. Nela também colaborou Fernando Pessoa.

O modernismo português conheceu ainda mais uma geração estética:

O NEO-REALISMORejeitando a temática psicológica e metafísica que tinha dominado a geração anterior,

o Neo-realismo defende uma arte participativa, de temática social. Por sua postura de ataqueà burguesia, encontraram pontos de contato com o Realismo de Eça de Queirós. Masreceberam também forte influência do chamado Neo-realismo nordestino da literaturabrasileira (que incluía nomes como Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de QueirozJorge Amado, entre outros). Parte dos artistas alinhados no Neo-realismo derivara parauma literatura marcada pela exploração do fantástico e do absurdo. Seus principaisrepresentantes foram: Alves Redol, Vergílio Ferreira, Fernando Namora, Ferreira de Castro.

A Geração de Presença

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Características do Modernismo

Combate ao passadismo; contra os padrões clássicos e tradição.Irreverência contra o preestabelecido.Liberdade formal; versos livres; ausência de rima; liberação do ritmo; liberdadede estrofação.Linguagem coloquial, do dia-a-dia; regionalismo.Humor, ironia, paródia e poema-piada.Busca do novo, original, dinâmico refletindo a industrialização, máquinas, motores.Sem enfeites e rebuscamentos; a simplicidade.Abstenção de uma postura sentimentalóide.Preocupação com a observação e análise crítica da realidade.Consciência nacional.

Outros autores

MÁRIO DE SÁ – CARNEIRO

Nasceu em Lisboa em 1890 e cometeu suicídio em Paris, 1916.Em 1915 lançou a revista “Orpheu” junto com o amigo F. Pessoa.Profunda crise moral e financeira.Mostrou inadaptação ao mundo, deixava levar-se pelas emoções, pelamegalomania perdendo-se da realidade.Interiorizou-se, mostrando-se inseguro e egocêntrico.Principal obra: A Confissão de Lúcio.

Vimos que a trajetória da Literatura Portuguesa, ao longo do séculoXX, foi marcada por rupturas e confrontos efetuada pelos Modernistas daVanguarda, que se iniciou com a geração do Orfeu e da Presença. Nesteentremeio de tempo, o romance e a poesia seguiram caminhos por vezesdivergentes e foi o neo-realismo, nos anos 30 e 40, que se constituiu comomovimento ideológico e estético unificador.

Após a ruptura e a aceitação da diversidade de estilos e de processos literários, osanos sessenta corresponderão, então, à superação definitiva do Neo-realismo. Escritorescomo José Cardoso Pires, Vergílio Ferreira ou Almeida Faria, vão explorar toda uma gamade possibilidades estéticas do novo romance e “num cenário inteiramente renovado”, apartir de 1947, surge José Saramago, que em busca de uma singularidade própriaredescobre a História através da “efabulação” narrativa, quando publica o seu primeiro livro,o romance Terra do Pecado. A escrita de Saramago integra-se, portanto, nos novos caminhosdo romance em Portugal dos últimos anos, recriando os caminhos do fantástico.

“Uma escrita de subversão na subversão da escrita”

José Saramago assume para si um estilo de escrita aparentemente incorreta, poisusa a pontuação de uma maneira não convencional. Nos diálogos de seus personagensabole os travessões fazendo com que estes sejam inseridos nos próprios parágrafos queos antecedem: “este tipo de marcação das falas propicia uma forte sensação de fluxo deconsciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um certo diálogo foi real ou apenas

José Saramago: O Nobel da Literatura

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um pensamento”. Ele é conhecido também por utilizar-se de frases e períodoscompridos, sendo que suas sentenças, muitas vezes, ocupam mais de umapágina, pois usa as vírgulas onde normalmente se usaria pontos finais.Entretanto, seu estilo não torna a leitura mais difícil: seus leitores acostumam-se facilmente com seu ritmo. São características que tornam o estilo de

Saramago único na literatura contemporânea: é considerado por muitos críticos um mestreno tratamento da língua portuguesa.

“““““VOCÊ SABIA QUE...

José Saramago foi o primeiro escritor de língua portuguesa a recebero Prêmio Nobel de Literatura (1998)?

Mesclando o real e o imaginário, sua obra é uma das mais conhecidas e traduzidasda literatura portuguesa contemporânea e “aborda, freqüentemente, o fenômeno históricoem seus movimentos e contingências, enquanto investiga e recria situações que relatam eanalisam as ansiedades e esperanças humanas. Seu estilo se caracteriza por uma pequenainfluência barroca, temperada por refinada ironia”. Publicou desde poesia a peças teatrais,mas é como autor de romances que José Saramago mais se destacou.

Obras publicadas

PoesiaOs Poemas Possíveis, 1966Provavelmente Alegria, 1970O Ano de 1993, 1975

CrônicaDeste Mundo e do Outro, 1971A Bagagem do Viajante, 1973As Opiniões que o DL teve, 1974Os Apontamentos, 1976

Literatura de ViagemViagem a Portugal, 1981

TeatroA Noite, 1979Que Farei Com Este Livro?, 1980A Segunda Vida de Francisco de Assis, 1987In Nomine Dei, 1993Don Giovanni ou O dissoluto absolvido, 2005

ContosObjecto Quase, 1978Poética dos Cinco Sentidos - O Ouvido, 1979

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RomanceTerra do pecado, 1947Manual de pintura e caligrafia, 1977Levantado do chão, 1980Memorial do convento, 1982O ano da morte de Ricardo Reis, 1984A jangada de pedra, 1986História do cerco de Lisboa, 1989O Evangelho Segundo Jesus Cristo, 1991Ensaio sobre a cegueira, 1995Todos os nomes, 1997A caverna, 2001O homem duplicado, 2002Ensaio sobre a lucidez, 2004As intermitências da morte, 2005

RESUMINDO...

Modernismo é uma designação genérica para um variado grupo de correntesestéticas de vanguarda do século XX. No início do século XX. Surgiram várias manifestaçõesartísticas, sob a denominação genérica de correntes de vanguarda. Esses diferentesmovimentos tinham posições comuns em relação às artes: liberdade, interpretação pessoalda realidade, rebeldia, ilogicidade, busca de novas formas de expressão, etc. Assim, apareceo Futurismo de Marinetti, o Cubismo de Picasso, o Dadaísmo, o Expressionismo e oSerrealismo. Portugal, então, procura adaptar-se ao ritmo da mudança européia e, ao mesmotempo, busca beneficiar-se do progresso cultural em curso. As bases filosóficas domovimento eram a Filosofia de Nietzche o intuicionismo de Bergson e o anti-humanismo deHeidegger e os escritores modernos pregavam a irreverência contra o preestabelecido, aliberdade formal, a linguagem coloquial, o humor, a ironia, a paródia e o poema-piada. Alémda busca do novo, original e dinâmico e de uma preocupação com a observação e análisecrítica da realidade e uma consciência nacional.

DIREÇÃO: Victor LopesELENCO: Mia Couto; José Saramago; Martinho da Vila; JoãoUbaldo Ribeiro; Teresa Salgueiro; Edinho. 105 minutos

Retrata o cotidiano de 200 milhões de pessoas, de seis diferentespaíses, que falam a Língua Portuguesa. No documentário, a LínguaPortuguesa é apresentada como patrimônio imaterial, pelo qual, todos osdias, se revela a diversidade de costumes e valores de milhões de pessoasque expressam em português situações cotidianas, seja realizandonegócios, escrevendo poemas, brigando no trânsito ou declarando seusamores. Todo dia o Português nasce e renasce em bocas brasileiras,moçambicanas, goesas, angolanas, japonesas, cabo-verdianas,portuguesas e guineenses.

!!!!!Indicação de Filme

TÍTULO DO FILME: Lingua - Vidas em Português (BRA/POR, 2004)

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A jovem República portuguesa, encontrava-se num impasse, pois nãoconseguia resolver os problemas mais profundos do país, nem equacionar asdiferenças existentes entre os próprios republicanos. As mudanças sociaisesperadas não aconteciam de forma a contentar os republicanos maisexacerbados. Assim, nasce o primeiro modernismo português (o orfismo)associado à profunda instabilidade político-social da primeira república econstituindo uma resposta artística de setores sociais mais inovadores das

classes médias urbanas. Empreendido pela geração de Fernando Pessoa, M. Sá-Carneiroe Almada-Negreiros em consonância com a arte e a literatura européia, sem, contudo deixarde expressar uma particularidade nacional se constituiu o núcleo do grupo modernista nacapital Lisboa, em 1913.

A “Geração de Orfeu”

A revista Orpheu, marco inaugural do Modernismo em Portugal, é criada em 1915por jovens modernistas e artistas de vanguarda que estimulados pelas novidades trazidasde Paris por Sá-Carneiro e Santa-Rita, aderem ao projeto de Luís da Silva Ramos de lançaruma revista luso-brasileira, partir de então as novas propostas artísticas foram divulgadas ediscutidas. A primeira atitude dos novos escritores foi abandonar o “sentimentalismo falso”dos românticos, defender a originalidade de idéias e abolir a rima e a métrica na poesia.Esses autores não fundaram propriamente uma nova escola literária e sim se desvincularamdas teorias das escolas anteriores e procuraram os fatos da da realidade do país paratransmitir de forma livre e descompromissada suas emoções. Saíram da revista Orpheuapenas dois números em 1915, mas surgiram dentro da mesma tendência duas outrasrevistas: Centauro (1916) e Portugal Futurista (1919).

Fernando Pessoa foi um dos diretores da revista “Orpheu”, participando ativamentedo Modernismo em Portugal era um escritor de alto nível artístico e possuía a atitude-experiência, própria do futurismo e a ausência de síntese poética (descontinuidade). O autorteve como principais tendências artísticas o saudosismo, o paulismo, o sensacionismo, ofuturismo e o interseccionismo. Conhecido por suas “máscaras” poéticas é dono de umaobra ortônima/heterônica e faz uso da dialética fingimento/sinceridade. Seus heterônimosprincipais são: Alberto Caeiro - poeta bucólico; Ricardo Reis - poeta neoclássico e Álvarode Campos - poeta modernista.

Outros escritores de destaque foram Sá-Carneiro escritor herdeiro do decadentismo-simbolismo e Almada Negreiros propagandista do Modernismo fez a ponte entre Modernismoe tendências contemporâneas atuando em vários campos artísticos.

A Geração de Presença

Em 1927, um grupo de estudantes funda, edita e dirige em Coimbra a revistaPresença, que não só valorizou as obras dos artistas da Orpheu, como também as divulgoue deu continuidade a elas, adotando uma participação ativa e dentro da realidade da vidamoderna. Nela também colaborou Fernando Pessoa. Tinha como marca a oposição aoevasionismo, o grupo Presença procurava realizar simultaneamente à consolidação doModernismo e implantar um regime de rigor e severidade artística. Os escritores maissignificativos foram José Régio, Miguel Torga - prosador com literatura social Branquinhoda Fonseca - contista Edmundo de Bettencourt - precursor do Surrealismo Adolfo CasaisMonteiro - Poeta, ensaísta e professor de literatura no Brasil.

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Neo-Realismo: uma outra geração estética

Rejeitando a temática psicológica e metafísica que tinha dominado a geração anterior,o Neo-realismo defende uma arte participativa, de temática social. Por sua postura de ataqueà burguesia, encontraram pontos de contato com o Realismo de Eça de Queirós, masreceberam também forte influência do chamado Neo-realismo nordestino da literaturabrasileira. Parte dos artistas do Neo-realismo derivou para uma literatura marcada pelaexploração do fantástico e do absurdo. Seus principais representantes foram: Alves Redol,Vergílio Ferreira, Fernando Namora, Ferreira de Castro.

Superação do Neo-Realismo

Após a ruptura e a aceitação da diversidade de estilos e de processos literários, osanos sessenta correspondem à superação definitiva do Neo-realismo. Escritores como JoséCardoso Pires, Vergílio Ferreira ou Almeida Faria, vão explorar uma gama de possibilidadesestéticas do novo romance e “num cenário inteiramente renovado”.

A partir de 1947, surge José Saramago, que em busca de uma singularidaderedescobre a História através da “efabulação” narrativa, quando publica o seu primeiro livro,o romance Terra do Pecado. A escrita de Saramago recriando os caminhos do Fantásticointegra-se nos novos caminhos do romance em Portugal dos últimos anos. Saramagoassume para si um estilo de escrita aparentemente incorreta, pois usa a pontuação de umamaneira não convencional. É conhecido também por utilizar-se de frases e períodoscompridos, particularidade que não torna a leitura mais difícil: seus leitores acostumam-sefacilmente com seu ritmo, características que tornam o estilo desse autor único na literaturacontemporânea. Mesclando o real e o imaginário Saramago é autor de uma vasta produçãoliterária que compreende poesias, crônicas, literatura de Viagem, teatro, contos e romances.

AtividadesAtividadesAtividadesAtividadesAtividadesComplementaresComplementaresComplementaresComplementaresComplementares

O poema “Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro”, de José Paulo Paes, remete-nosao poema X de “O guardador de rebanhos”, de Alberto Caeiro (heterônimo de FernandoPessoa). Leia atentamente os dois poemas, transcritos a seguir, e identifique no poemade Alberto Caeiro as falas que, segundo o poema de José Paulo Paes, poderiam seratribuídas a Pessoa e a Caeiro, respectivamente. Justifique sua resposta.

Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro

[Pessoa] - a chuva me deixa triste...[Caeiro] - a mim me deixa molhado.

Poema X (O guardador de rebanhos)

“Olá, guardador de rebanhos,Ai à beira da estrada,Que te diz o vento que passa?”“Que é vento, e que passa,E que já passou antes,E que passará depois.E a ti, o que te diz?”

1.

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“Muita cousa mais do que isso,Fala-me de muitas outras cousasDe memórias e de saudadesE de cousas que nunca foram.”“Nunca ouviste passar o vento.O vento só fala do vento.O que lhe ouviste foi mentira,E a mentira está em ti”.

Qual a temática do poema?2.

Quem poderia estar sendo representado pelo guardador de rebanhos?3.

Quais as características desse poema?4.

Analisando o primeiro poema, que características podem ser extraídas dele?5.

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AtividadeAtividadeAtividadeAtividadeAtividade

OrientadaOrientadaOrientadaOrientadaOrientadaCaro aluno,

A atividade a seguir é de caráter obrigatório e tem por objetivo avaliar o seuaprendizado durante o curso. Para isso, você poderá utilizar todos os recursosdisponibilizados neste período e complementar com pesquisas em livros, revistas e sites. Aatividade deverá ser realizada em ambiente de tutoria e em equipe.

A proposta é criar um jornal/painel informativo-cultural acerca de um dos temasabordados nos quadros e textos a seguir.

Crónica Breve do Arquivo Nacional é uma narração bastante sumária da vida dosseis primeiros reis de Portugal, desde D. Afonso Henriques até D. Dinis. As Crónicas Brevesde Santa Cruz de Coimbra, ou Crónicas Avulsas, são quatro textos que foram compiladosno Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. Os manuscritos estão actualmente na BibliotecaPública Municipal do Porto. Datam a maior parte da segunda metade do século XV, sendopossível que a primeira redacção tenha ocorrido no século XIII. Todas estas crónicas forampublicadas por Alexandre Herculano nos Portugaliae Monumenta Historica, volumecorrespondente aos Scriptores, tendo algumas delas inspirado o mesmo autor na elaboraçãode certos textos de Lendas e Narrativas.

In: http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/index.html

D. Sebastião

‘Sperai! Caí no areal e na hora adversaQue Deus concede aos seusPara o intervalo em que esteja a alma imersaEm sonhos que são Deus. Que importa o areal e a morte e a desventuraSe com Deus me guardei?É O que me sonhei que eterno dura,É Esse que regressarei.

Fernando Pessoa, Mensagem

D. Sebastião, rei de Portugal

Louco, sim, louco, porque quis grandezaQual a Sorte a não dá.Não coube em mim minha certeza;Por isso onde o areal estáFicou meu ser que houve, não o que há. Minha loucura, outros que me a tomemCom o que nela ia.Sem a loucura que é o homemMais que a besta sadia,Cadáver adiado que procria?Fernando Pessoa, Mensagem

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O Sebastianismo

O Sebastianismo foi um movimento místico-secular que ocorreu em Portugal nasegunda metade do século XVI como conseqüência da morte do rei D. Sebastião na batalhade Alcácer-Quibir, em 1578. Por falta de herdeiros, o trono português terminou nas mãos dorei espanhol Felipe II. Apesar do corpo do rei ter sido removido para Belém, o povo nuncaaceitou o fato, divulgando a lenda de que o rei encontrava-se ainda vivo, apenas esperandoo momento certo para volver ao trono e afastar o domínio estrangeiro. Seu mais populardivulgador foi o poeta Bandarra que produziu incansáveis versos clamando pelo retorno doDesejado. Explorando a crendice popular vários oportunistas se apresentavam como o reioculto na tentativa de obter benefícios pessoais. O maior intelectual a aderir ao movimentofoi o Padre Vieira. Finalmente em 1640, pelo golpe restauracionista liderado pelosBraganças, no Porto, Portugal voltou a ser independente e o movimento começou a arrefecerno interior do Nordeste, também ser motivo da crença na chegada de um “rei bom”.Basicamente é um messianismo adaptado às condições lusas e depois nordestinas. Traduzuma inconformidade com a situação política vigente e uma expectativa de salvação, aindaque miraculosa, através da ressurreição de um morto ilustre.

In: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/500br/canudos7.htm

Barroco - Momento HistóricoLisboa era considerada a capital mundial da pimenta, a agricultura lusa era

abandonada. Com a decadência do comércio das especiarias orientais observa-se odeclínio da economia portuguesa. Paralelamente, Portugal vive uma crise dinástica: em1578 D. Sebastião desaparece em Alcácer-Quibir, na África; dois anos depois, Felipe II daEspanha consolida a unificação da Península Ibérica.

A perda da autonomia e o desaparecimento de D. Sebastião originam em Portugalo mito de Sebastianismo (crença segundo qual D. Sebastião voltaria e transformariaPortugal no Quinto Império). O mais ilustre sebastianista foi, sem dúvida, o Pe. AntônioVieira, que aproveitou a crença surgida nas “trovas” de um sapateiro chamado GonçaloAnes Bandarra.

In: http://members.tripod.com/~netopedia/Literatura/barroco.htm

“[...] Veio depois a derrota de Alcácer-Quibir e o desaparecimento do Rei (1578). Anação caiu sob o domínio castelhano. A literatura chorou, com a perda de D. Sebastião, odesfazer das esperanças desmedidas, a ruína dum povo que, havia pouco, deslumbrara omundo com os Descobrimentos e a criação de um grande Império. Vasco Mouzinho deQuevedo, por exemplo, recorda doridamente o Rei, «Sebastião cuja morte inda hoje é viva,/ Renovando-se sempre de ano em ano». Foi então que surgiu, como instintiva reacção, osebastianismo. Julgou-se que só a fé visionária poderia salvar-nos. Na primeira metade doséc. XVI vários pretensos profetas, desafiando os rigores da Inquisição, haviam aliciadoadeptos, nomeadamente cristãos novos. Entre esses «profetas» contava-se Gonçalo Anes,de alcunha «o Bandarra», sapateiro de Trancoso (Beira Alta), homem cujas trovas,largamente divulgadas, se tornariam «o evangelho do sebastianismo». O Bandarra (falecidoem 1545, segundo um epitáfio mandado gravar no séc. XVII) tinha-se inspirado na Bíblia

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para verberar a corrupção da época e fazer obscuras predições, entre as quais, parece,estavam a da conquista de Marrocos, a da derrota dos Turcos e a do Quinto Império. [...]

Durante o séc. XIX, o sebastianismo foi passando da esfera política para os domíniosliterário e culturológico. O sonho heróico de D. Sebastião, a sua morte na batalha, o mito doseu regresso e a quimera do Quinto Império inspiram poetas e prosadores. [...] No Frei Luísde Sousa de Garrett, é Telmo, o velho criado, quem associa à fé no retorno do Rei a convicçãode que D. João de Portugal, seu amado amo, um dia aparecerá.”

(Coelho, Jacinto do Prado, DICIONÁRIO DE LITERATURA)

Alexandre Herculano: em busca das origens

Um exército de homens, montados em cavalos e armados com lanças, atiradeiras eescudos, põe-se em fileira. Em suas bandeiras vêem-se brasões e o símbolo da cruz. À suafrente, coloca-se outro exército de homens de feições diferentes, com turbantes na cabeça,roupas compridas e largas, falando uma língua estranha e defendendo um deus diferente:Alá.

Não se trata de um filme da “sessão da tarde” na televisão, embora esse seja umtema de filmes de aventura. Trata-se de uma das situações criadas por Alexandre Herculano(1810--1877), escritor português que se interessou por temas históricos, principalmenteaqueles cujo cenário é a Idade Média, mundo de fantasias em que cavaleiros heróicoslutam contra o exército árabe e procuram salvar donzelas indefesas.

Embora também tenha cultivado a poesia, foi na prosa de ficção que AlexandreHerculano deixou sua maior contribuição. Nela o autor fez uso de seu largo conhecimentoda história de Portugal, particularmente a relativa à Idade Média, introduzindo o romancehistórico no país.

Esse gênero renovou e revigorou a prosa de ficção portuguesa, dado o desgastedas novelas de cavalaria e das novelas sentimentais. Herculano é autor dos romances Obobo (situado no século XII), Eurico, O presbítero (situado no século VIII) e O monge deCister (situado no século XVI).

Cereja & Magalhães, 1999:20

Os Lusíadas

Os Lusíadas são considerados aprincipal epopéia da época modernadevido à sua grandeza e universalidade.As realizações de Portugal desde oInfante D. Henrique até à união dinásticacom Espanha em 1580 são um marco naHistória, marcando a transição da IdadeMédia para a Época Moderna. A epopéianarra a história de Vasco da Gama e dosheróis portugueses que navegaram emtorno do Cabo da Boa Esperança eabriram uma nova rota para a Índia.

As armas e os barões assinaladosQue, da ocidental praia lusitana,Por mares nunca de antes navegadosPassaram ainda além da Taprobana,Em perigos e guerras esforçados,Mais do que prometia a força humana,E entre gente remota edificaramNovo reino, que tanto sublimaram.(...)Cantando espalharei por toda a parte,Se a tanto me ajudar o engenho e arte

Camões, Lusíadas, Canto I.

É uma epopéia humanista, mesmo nas suas contradições, na associação da mitologiapagã à visão cristã, nos sentimentos opostos sobre a guerra e o império, no gosto do repousoe no desejo de aventura, na apreciação do prazer e nas exigências de uma visão heróica.

In: http://pt.wikipedia.org

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D. SebastiãoDécimo sexto rei de Portugal, filho do príncipe D. João e de D.

Joana de Áustria, nasceu em Lisboa a 20 de Janeiro de 1554, e morreuem Alcácer Quibir, a 4 de Agosto de 1578. Sucedeu a seu avô D. JoãoIII, sendo o seu nascimento esperado com ansiedade, enchendo de júbiloo povo, pois a coroa corria o perigo de vir a ser herdada por outro netode D. João III, o príncipe D. Carlos, filho de Filipe II de Espanha.

De saúde precária, D. Sebastião mostrou desde muito cedo duasgrandes paixões: a guerra e o zelo religioso. Cresceu na convicção deque Deus o criara para grandes feitos, e, educado entre dois partidos palacianos deinteresses opostos - o de sua avó que pendia para a Espanha, e o do seu tio-avô o cardealD. Henrique favorável a uma orientação nacional -, D. Sebastião, desde a sua maioridade,afastou-se abertamente dum e doutro, aderindo ao partido dos validos, homens da suaidade, temerários a exaltados, que estavam sempre prontos a seguir as suasdeterminações.

Nunca ouviu conselhos de ninguém, e entregue ao sonho anacrónico de sujeitar a sitoda a Berbéria a trazer à sua soberania a veneranda Palestina, nunca se interessou pelopovo, nunca reuniu cortes nem visitou o País, só pensando em recrutar um exército a armá-lo, pedindo auxílio a Estados estrangeiros, contraindo empréstimos e arruinando os cofresdo reino, tendo o único fito de ir a África combater os mouros.

Chefe de um numeroso exército, na sua maioria aventureiros e miseráveis, partepara a África em junho de 1578; chega perto de Alcácer Quibir a 3 de Agosto e a 4, oexército português esfomeado a estafado pela marcha e pelo calor, e dirigido por um reiincapaz, foi completamente destroçado, figurando o próprio rei entre os mortos.

O QUINTO IMPÉRIO - Ontem como HojeRealizador - Manoel de OliveiraAno de Produção - 2004www.madragoafilmes.pt

SinopseEste filme a que dou o título de O QUINTO IMPÉRIO - ONTEM COMO HOJE, baseia-

se na peça teatral EL-REI SEBASTIÃO, de José Régio. José Régio (1900 a 1968) foicrítico, poeta, dramaturgo, romancista e ensaísta, figura cimeira do seu tempo e de hoje,que segundo uma sua própria declaração, pretendeu analisar o Rei, o Homem e a míticapersonagem. O rei Sebastião, depois da estrondosa derrota na batalha de Alcácer-Kibir(1578), mais conhecida pela Batalha dos Três Reis, e por jamais ter sido identificado o seucorpo após a batalha, se tornou no mito do encoberto ele que fora antes o desejado e odestinatário ao mito. Mito, aliás cantado e exaltado nos sermões do Padre António Vieira(Século XVII), pelo filósofo Sampaio Bruno (século XIX) e no século XX pelo poeta FernandoPessoa e pelo filósofo José Marinho, entre outros escritores e psicólogos portugueses,

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como ainda por estudiosos estrangeiros. Curiosamente, este mito também faz parte damitologia muçulmana com a mesma nomenclatura do encoberto e, tal como o rei Sebastião,é suposto vir a acontecer o mesmo com o Iman muçulmano (o da décima segunda geração)cuja crença comum é a de que virá num cavalo branco, em uma manhã de nevoeiro paraderrubar definitivamente o mal do mundo e estabelecer a concórdia entre os povos.

Alcácer Quibir battle.In: http://genealogia.netopia.pt/home/article.php?id=57

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Etapa 1Os acontecimentos da História de Portugal estão intimamente ligados

a sua produção literária. A fim de colher informações a respeito da atividadeproposta, observe os quadros e textos acima e escolha um dos temas, paraem seguida discutir o tema e criar as duas primeiras partes do jornal/painelinformativo-cultural: o editorial e a reportagem. Para isso veja algumas dicase sugestões.

PRODUZINDO UM EDITORIAL

Leve em conta as características de um editorial:Expressa a opinião do jornal sobre um assunto quase sempre polêmico;Tem intenção de persuadir os leitores, esclarecer ou alterar seus pontos

de vista, alertar a sociedade e, às vezes, até mobilizá-la;É uma tese ou ponto de vista fundamentado por comparações,

exemplificações, depoimentos, pesquisas e dados estatísticos, citações,retrospectiva histórica, etc.;

Possui uma estrutura convencionalmente organizada em três partes:introdução, desenvolvimento e conclusão;

Deve ter linguagem clara, objetiva e impessoal;

Com base nas informações colhidas, na pesquisa e no próprio conhecimento arespeito do tema elabore um editorial apresentando aos leitores os assuntos que serãoabordados. Sugere-se que o editorial possua entre 20 a 30 linhas, que seja empregado opadrão culto e formal da língua portuguesa, como é próprio desse gênero literário.

PRODUZINDO UMA REPORTAGEM

Leve em conta as características de uma reportagem:Normalmente, apresenta título, lead e, em seguida, desenvolve de modo

mais aprofunda- dos fatos que interessam ao público a que se destina o jornal ou arevista;

Costuma estabelecer conexões entre o fato central e fatos paralelos, pormeio de citações.

Trechos de entrevistas, boxes informativos, dados estatísticos, fotografias;Pode ter um caráter opinativo, questionando as causas e os efeitos dos

fatos, interpretan-do-os, orientando os leitores;Apresenta versões e opiniões diferentes sobre um mesmo fato;Predomínio da função referencial da linguagem;

Se necessário, busque informações em jornais, revistas e livros, além dos textosdisponibilizados. Escreva a reportagem, considerando as características do gênero e, sepossível, ilustre-a com fotografias, gravuras ou figuras. Dê-lhe um título que atraia a atençãodo leitor e, ao mesmo tempo, anuncie o assunto. Coloque um subtítulo, se julgar necessário.A linguagem deve ser impessoal, objetiva, direta, de acordo com o padrão culto da língua.

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Etapa 2Para complementar o jornal/painel informativo-cultural é necessário criar agora

algumas produções de caráter mais pessoal como a crônica e a crítica, conforme orientaçãoa seguir.

PRODUZINDO UMA CRÔNICA

Leve em conta as características de uma crônica:Texto publicado geralmente em jornais e revistas;Relata de forma artística e pessoal fatos colhidos no noticiário jornalístico

e no cotidiano;Consiste em um texto curto e leve;Tem por objetivo divertir e/ou refletir criticamente sobre a vida e os

comportamentos humanos;Pode apresentar os elementos básicos da narrativa: fatos, personagens,

tempo e lugar;O tempo e o espaço são normalmente limitados;Pode apresentar narrador-observador ou narrador-personagem; às vezes,

emprega a 2ºpessoa.

1ª Opção: Pensar em uma situação corriqueira, semelhante às narradas nos textosacima, que tenha sido presenciada por vocês no decorrer do curso, diretamente relacionadacom o estudo desse módulo. Escreva uma crônica sobre ela.

2ª Opção: Tomar como base um fato ocorrido e amplamente divulgado pela imprensaescrita (exemplificada nos textos). Elabore uma crônica que revele uma visão pessoal doacontecimento.

Aborde o fato ou a situação escolhida procurando ir além do circunstancial, narrandocom sensibilidade ou, se quiser, com humor. Terminando o texto, dê a ele um título sugestivo.Lembre-se que a linguagem, geralmente, está de acordo com o padrão culto e informal dalíngua.

PRODUZINDO UMA RESENHA CRÍTICA OU CRÍTICA LITERÁRIA

Leve em conta as características de uma crítica:Texto de natureza argumentativa, que tem por objetivo informar o leitor

sobre um objeto cultural e avaliar seus pontos positivos e negativos;Estrutura livre; normalmente se faz um resumo do texto, apresentando um

breve histórico de seu(s) autor(es) seguido de uma avaliação, na qual aponta osaspectos mais importantes, estabelecendo relações com outros textos e contextohistórico, comentando a sua importância e defendendo um ponto de vista.

Linguagem clara, objetiva e dinâmica, que procura prender a atenção doleitor até o fim;

Escolha um texto literário para fazer uma crítica: um livro, um conto, um poema, etc.de sua preferência, estudado durante o curso, tomando o cuidado de registrar: autor dotexto e a escola literária a qual pertence. Sugere-se que o texto possua entre 20 a 30 linhas.

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Etapa 3Agora é chegado o momento de reunir todas as produções criadas

nas etapas anteriores e montar o jornal/painel informativo-cultural. Para compora parte visual do jornal/painel, você poderá selecionar fotografias/figuras de

fontes diversas. Se houver entre vocês poetas e/ou contistas, seus textos serão bem vindospara serem integrados ao jornal, pois este terá, também, cunho cultural.

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ABSOLUTISMO – O chamado absolutismo, etimologicamente falando, é o ato degovernar à solta, isto é, sem limites internos, sem contra-poderes, travões ou forças debloqueio. a forma de governo na qual um chefe de estado goza de um poder sem controle esem limites.

ANTROPOCENTRISMO – Doutrina que coloca o homem no centro do universo emedida de todas as coisas. Necessidade inerente à raça humana de afirmar-se como criaturasuprema e acabada, o que algum dia fez com que o homem vinculasse sua imagem à dosdeuses.

BUCOLISMO – Tendência poética referente às obras que fazem o elogio da vidacampestre. Essas poesias são também chamadas de pastoris, porque nelas os pastoressão presenças constantes. O bucolismo foi uma das características da poesia arcádica.

CANTIGA DE REFRÃO – Forma poética caracterizada pela repetição de um oumais versos no final de cada estrofe, que corresponde à estrutura típica da cantiga peninsularmedieval.

CARPE DIEM – “Colhe o dia”, exortação de Horácio, poeta latino da época doImperador Augusto; foi o lema persuasivo do galanteio e da conquista dos corações femininos,na medida em que chama a atenção para a perecibilidade da beleza, da morte de tudo.

DICOTOMIA – Divisão em duas partes de alguma coisa.

EVOLUCIONISMO – A teoria da evolução, também chamada evolucionismo, afirmaque as espécies animais e vegetais existentes na Terra não são imutáveis, mas sofrem aolongo das gerações uma modificação gradual, que inclui a formação de raças e espéciesnovas.

FARSA – Modalidade teatral cômica que surgiu por volta do século XIV, e secaracteriza pelos personagens e situações exageradas, a farsa se distingue da comédiapropriamente dita por não observar regras de verossimilhança e difere da sátira ou daparódia por não pretender questionar valores. Geralmente desligada da reflexão a respeitoda beleza e de propósitos éticos ou didáticos, pretendendo assim, provocar o riso explorandosituações engraçadas, grotescas e ridículas da vida quotidiana, apelando para a caricaturae os exageros. Às vezes ganha conteúdo crítico ou de denúncia à revelia do autor. Não temoutra intenção a não ser provocar o riso.

FEUDALISMO – O feudalismo é um modo de produção típico de sociedadesagrárias, caracterizado por relações de servidão do trabalhador ao proprietário da terra,dividida em lotes produtivos (feudos). Predominou na Europa durante a Idade Média.

LAICIZAÇÃO – Da palavra laico - adjetivo que significa oposição a tudo o que tenhaqualquer ligação com a religião.

GlossárioGlossárioGlossárioGlossárioGlossário

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LUSA – Refere-se a Portugal

MEDIDA VELHA E MEDIDA NOVA – Duas técnicas versificatórias, no séc. XVI: aprimeira designa a tradicional (estruturas e metros utilizados pelos poetas do CancioneiroGeral, em redondilha menor ou maior); a segunda, a importada de Itália por Sá de Mirandae António Ferreira (com um novo verso, o decassílabo, e novas formas e sub-gêneros, comoo soneto, a canção, etc.).

PANTEÍSTA - Panteísmo é uma doutrina que identifica o universo (em grego: pan,tudo) com Deus (em grego: theos).

POSITIVISMO – O positivismo foi uma corrente filosófica cujo mentor e iniciadorprincipal foi Auguste Comte, no século XIX. Apareceu como reação ao idealismo, opondoao primado da razão, o primado da experiência sensível (e dos dados positivos). Propõe aideia de uma ciência sem teologia ou metafísica, baseada apenas no mundo físico/material.

REDONDILHA – São versos de cinco ou sete sílabas poéticas. O de cinco sílabas échamado de redondilha menor; o de sete, de redondilha maior.

ROMANCES – Do Romanceiro - Poesia Portuguesa e espanhola de carácter épico,anónima, destinada ao canto e transmitida por tradição oral, durante a Idade Média.Compilação desses poemas tradicionais, os romances.

TEOCENTRISMO – Baseia-se na concepção de que Deus é o centro do universo.Foi a corrente de pensamento predominante no período medieval.

TROVA – (Latim, tropare = inventar, compor tropos) Durante a Idade Média (galaico-portuguesa), o vocábulo “trova” era sinônimo de “cantiga”, e, portanto, designava toda aespécie de poema em que havia aliança entre letra e música. A partir do século XVI, com adesvinculação havida entre música e letra, o termo fixou-se como equivalente da quadrinha.

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ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasBibliográficasBibliográficasBibliográficasBibliográficasBibliográficas

ABDALA JR & PASCHOALIN, M. Aparecido. História social da literaturaportuguesa. São Paulo: Ática, 1982.

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo: Cultrix,1990.

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. 26 ed. (rev. e aum.), São Paulo: Cultrix,1991.

MOISÉS, Massaud (org.). A literatura portuguesa em perspectiva. São Paulo:Atlas, 1994, 4 vols.

SARAIVA, António José e LOPES, Óscar. História da literatura portuguesa. 10ed. Porto: Porto Editores, 1978.

SPINA, Segismundo. A Cultura Literária Medieval. São Paulo: Ateliê, 1997.

http://www.instituto-camoes.pthttp://www.secrel.com.brhttp://www.pt.wikipedia.orghttp://www.itaucultural.org.brhttp://www.vidaslusofonas.pthttp://www.mundocultural.com.brhttp://www.citi.pt

SITES CONSULTADOS:

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FTC - EaDFaculdade de Tecnologia e Ciências - Educação a Distância

Democratizando a Educação.www.ftc.br/ead

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