94 - Gabinete de Estudos...

100
Um decreto de 21 de Novembro de 1903 determinou que a partir do dia 1 de Dezembro seguinte começasse a vigorar a barreira fiscal de Lisboa, que estava quase concluída, e que, a contar da referida data, a directriz da estrada de circunvalação fosse a seguinte: Desde Algés até encontrar a estrada militar em Benfic a - estrada fiscal; D esde Benf ica até ao desfiladeiro do Vale do F omo - estrada militar ; Passagem do desfiladeiro do Vale do Forno- caminho fiscal junto ao muro que o veda; Desde este desfiladeiro até ao de Carriche - caminho fiscal junt o aos mur os que o vedam, atravessando a Calçada de Carriche; Do desfiladeiro de Carriche até ao Casal Arruinado- estrada mil itar; Do Casa l Arruin ado até pr óxim o do Fort e da Ameixoeira - ser- ventia da estrada militar; Desde o F ort e da Ameixoeira até à Qu int a do Pi sa Pim enta- estrada fiscal ; Desde esta Quint a até à do Cabeço - estrada pública aproveitada para estrada fiscal; De sde a Quint a do Cabeço até à linha férrea em Mo scavide - es- trada fiscal, aproveitando tamb ém uma pequena parte da estrada pública; D esde este último ponto até Braço de Prat a- lado oriental da linha férr ea de Leste; Desde este ponto até à Azinhaga das Veigas - lado norte da linha f érrea de Cintura; Segue pela Azinhaga das Veigas, pela Rua de Marvila, em parte, desce pela Calçada do Duque de Lafões até enc ontrar a linha férrea de Leste, que acomp anha pelo lado oriental até Xabregas. Parte do caminho fiscal, entre Moscavide e Xabregas, era em terreno da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, 94 ou em terrenos de particulares, que foram expropriados.

Transcript of 94 - Gabinete de Estudos...

Page 1: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Um decreto de 21 de Novembro de 1903 determinou quea partir do dia 1 de Dezembro seguinte começasse a vigorara barreira fiscal de Lisboa, que estava quase concluída, e que, acontar da referida data, a directriz da estrada de circunvalaçãofosse a seguinte:

D esde Algés até encontrar a estrada militar em Benfica - estradafiscal;

D esde Benf ica até ao desfiladeiro do Vale do Fomo - estradamilitar ;

Passagem do desfiladeiro do Vale do Forno - caminho fiscal juntoao muro qu e o veda;

Desde este desfiladeiro até ao de Carriche - caminho fiscal juntoaos muros qu e o vedam, atravessando a Calçad a de Carriche;

Do desfiladeiro de Carriche até ao Ca sal Arruinado - estradamil itar;

D o Casa l Arruinado até próximo do Forte da Ameixoeira - ser­ventia da estrada militar;

D esde o Fort e da Ameixoeira até à Qu int a do Pi sa Pim enta­estrada fiscal ;

Desde esta Quinta até à do Cabeço - estrada pública aproveitadapara estrada fiscal;

De sde a Quinta do Cab eço até à linha férrea em Mo scavide - es­trada fiscal, aproveitando tamb ém uma pequena parte da estradapública;

D esde este último ponto até Braço de Prata - lado oriental dalinha férrea de Leste;

De sde este ponto até à Azinhaga das Veigas - lado norte da linhaférrea de Cintura;

Segue pela Azinhaga das Veigas, pela Rua de Marvila, em parte,desce pela Calçada do Duque de Lafões até encontrar a linha férreade Leste, qu e acomp anha pelo lado oriental até Xabregas.

Parte do caminho fiscal, entre Moscavide e Xabregas, eraem terreno da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses,

94 ou em terrenos de particulares, que foram expropriados.

Page 2: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

MAPA II

ESCALA 1 : 5 0. 0 00

CONVENÇõES- ECRETADA EM 1852.LIMITES DA CIRCUNVALAÇAO D

DECRETADOS EM 1885. ...."'XADA DESDELIMITES • DA ZON A lU' L ,LIMITES FISCAIS PROVISORIOS

--- - OS EM 1886.+ + + } LIMITES DECRETAD FIXADOS

- - - ( 1940) DA CIDADE-.-.- . - . - LIMITES ACTUAIS 1895 E 1903.

{ DECRETOS DE 1885,PELOS

kl O

Hm'

1.208,346.499, . o

90722, o

8.244, ..

PI R ES BA RROSO cor.70SÉ

ÁREAS( a p r ox i m a d as)

. . ... . . .EM 1852 .LEI DE 18-7-1885 .

DECRETO DE ~~~~~~~~~ ~ ii_Íl0_i90;DECRETOS DE

CONCELHO

194 0

87 E- 1905.18 AT.

EMLIS B OADEPLAN TA

Page 3: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Nesta linha de circunvalação, constituída ou adaptada paracumprimento do disposto nos decretos de 18 de Julho de 1885e 22 de Julho de 1886, começou a ter integral execução oserviço de fiscalização no dia 1 de Dezembro de 1903. Foio segundo período da ampliação da fiscalização aduaneira daCidade (21).

Para este serviço tornou-se necessano construir vanos edifí­cios para delegações aduaneiras, e postos fiscais ou quartéis paraas praças da Guarda Fiscal que foram encarregadas de guarnecera linha da circunvalação.

Os postos fiscais ficavam situados nos locais que vamos men­cionar, e marcámos com um asterisco aqueles que tinham tambémanexos, ou no mesmo edifício, os postos especiais ou de despacho,para a cobrança dos direitos de consumo (22).

Junto dos postos estavam as aberturas ou passagens queserviam de barreiras ou portas da cidade (bem que não possuíssemportas ).

C") Em consequência das reclamações aprese ntadas cont ra a ex­tensão da área fiscal, foram estudadas novas vari antes com o fimde a reduzir, e desses estudos result ou um a proposta de lei, apresen­tada ao parlamento em 16 de Agosto de 1905, pela qu al a área fiscalda Cidade de Lisboa era limitada, do lado do norte, por um caminhofiscal estabelecido proximamente ao long o das vias férreas de Cinturae de Sintra, ligando-se nas proximid ades da Buraca com a estr adada circunvalação existent e, que se apr oveitava até Algés, e seguindoda cerca do mosteiro de Ch eias a encontrar a antiga estrada de bar­reiras ( de 1852 ), e daí, pela mesma estrada, até às antigas portasda Cruz da Pedra. Esta proposta, que reduzia consideràvelmente aárea de Lisboa fiscal, não teve solução. - R elatorio, Propostas de L eie D ocumentos apresentados na Câmara dos S enh ores Deputados nasessão de 16 de A gosto de 1905 pelo Ministro dos N egócios da F a­zenda, Manuel Afonso de Espregueira, pág . 75.

(") Decreto de 21 de Novembr o de 1903 . 95

Page 4: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Indicamos também as aplicações que actualmente os edifíciospossuem ( veja-se o mapa II) :

LANço OESTE :

'* 1 - ALGÉS ; na estra da de Lisboa a Cascais (havia aqui doisedificios: casa dos oficiais e secreta ria do posto, ao sul, e pos to espe­cial de despa cho, ao norte; demolidos em 1940, par a a abertura daPraça de Algés, da en tra da ocidental da Cidade );

- QUARTÉIS DE ALGÉS ( são dois edificios; o do sul é um posto daGuarda Fi scal ; o do norte tem um a cava la riça, e alojamentos parapraças ) ;

2 - GRAVATO (está entregue ao M inistério da M arinha; nele fun­cionam vários serviços, e serve também de moradia a pessoal do postorádio-te1 egráfico do mesmo Ministério);

3 - PORTELA OU CASELAS ( pertence à Fazend a Pública ; está actual­mente arrendado à empresa M oniz da M aia, Ltd.' , construtora daauto-estrada; compõ e-se de dois edificios, um extramuros, e out rointramuros ) ;

* 4 - ESTRADA DE QUELUZ ; na estrada da Ajuda para Qu eluz( en tregue à Junta Autónoma das Estr ada s; no edif icio norte moramfamílias pobres; no do sul funcion a um a secção de conservação deestradas do D istrito de Lisboa );

5 - BOA VISTA (pertence à F azenda Pú blica, está-se em tr ansac­ções para ser entregue à Câmar a Municipal ; nele vivem famíl ias pob res );

6 - BURACA (vendido a um particul ar ) .

LANÇO NOROESTE:

* 7 - BENFICA; na estr ada de L isboa a Sintra (são dois edifícios ;o do sul está desocupado; no do norte fun ciona um posto sanitárioda Câmara Municipal);

8 - ARNEIROS ( entr egue ao Ministéri o da Guerra ; está habitadopor famílias de militares);

* 9 - P ONTINHA; na estrada- de A-da-Bej a e Caneças (entregue aoMinistério da Guerra; num dos edif ícios, intramuros, esteve a casade despacho; nesse, e no outro, extramuros, moram famíl ias militar es );

- QUARTEL DA PONTINHA (era o quartel do posto fiscal, e está aiinstalado o comando do Batalhão de Transmissões do Regimento de

96 Engenharia 2 ) ;

Page 5: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

10 - CoSTA DA Luz ( ent regue ao Ministério da Guerra; serve dehabitação a sargentos do Regiment o de Engenhar ia 2, e tem tambémum desta cam ento de praças do Regimento de Sapadores Mineiros, par aa conservação da estra da militar ) ;

11 - VALE DO F ORNO ( demolido) .

LANço NORTE ..

12 - ALCOUTINS ( demolido ) ;* 13 - CARRICHE; na estrada de Loures ( funcionava o posto em

casas alugadas, que foram entregues ao senho rio ) ;14 - ALTO DO CHAPELEIRO (demolido) ;15 - GRAFANIL ( ent regue ao Mini stério da Guerr a ; serve de colónia

de férias às edu can das do In stituto Feminino de Educação e Trabalh o);16 - FORTE DA AMEIXOEIRA (pertence ao Ministér io da Guerra, e

é habitado por pessoal militar ) ;* 17 - CHARNECA; na estrada par a Camara te ( o pos to fiscal foi

ent regue ao Ministério da Guerra, e serve de habitação a famílias demilitares; a casa de despa cho foi en tregue ao G overno Ci vil de Lisboa,e está ai ins ta lado um post o de polici a ) ;

18-PISA PIMENTA ( en tregue ao M inistério da Guerra; habitam-nofamíl ias de mil itar es ) ;

* 19 - ENCAR NAÇÃO; na estra da da Portela e S acav érn ( o postofiscal e a casa de despacho ficavam int ramuros, e fr onteiros à igrejada Enc arnação; foram demolidos em 1940, ass im como a igre ja, par aa abert ura da Praça da En carnação, da en tra da norte de Lisboa ) ;

20 - QUINTA DO CABEÇO ( entregue à Junta Autón oma das Est ra­das; nele está in stalada uma secção de conserva ção da s estradas ) ;

* 21 - M.OSCAVIDE ( tan to o posto fiscal como a casa de despachoestão em ru in as e desab itados ) .

LANÇO AO LONGO DA LINHA FÉRREA DO NORTE E LESTE E DE CINTURA:

* 22 - OLI VAIS ( estava em casa alugada na Ru a do Conselhei roM ari ano de Carvalho, n .n. 5 a 7 );

* 23 - CABO R UIVO (estava na casa da Ru a do Vale Form oso deBaixo, ao lad o da casa n." 198-A , em fr ente da passagem de nivel;demolido);

* 24-BRAÇO DE PRATA (estava situado na Rua do Vale Formosode Cima, nu m terreno ao norte e em frente do viaduto da linha férrea,conhecido por Arco das Panelas ; demolid o ) ; 97

Page 6: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

* 25 - BEATO OU CALÇADA DO DUQUE DE LAFÕES ( a casa de des­

pacho estava situada na estrada de Marvila, junto à embocadura, dolado oriental, da Calçada do Duque de Lafões; demolido; o posto

estava numa casa alugada na Rua de Marvila );'* 26 - XABREGAS (o posto fiscal e a casa de despacho estavam

situados num edificio único, na Rua de Xabregas, no largo ao sul da

Fábrica de Tabacos; demolidos ) .

o terceiro lanço definitivo da estrada fiscal, desde o Forteda Ameixoeira até à linha do caminho de ferro em Moscavide,mede 5.020"'.

A circunscrição fiscal foi abolida em virtude da lei n." 1.368,de 21 de Setembro de 1922, que extinguiu o imposto do realde água, e os direitos de consumo, que se cobravam nas barrei­ras de Lisboa, tornando-se efectiva essa extinção a partir de30 de Setembro (23 ) .

Logo no ano seguinte, em 1923, começaram a ser distri­buídos por diferentes entidades, os edifícios que haviam servidode postos fiscais e casas de despacho.

Tais eram os limites fiscais do Município de Lisboa, do ladoda terra. Os limites municipais eram e são actualmente um poucomaiores, porque abrangem também não só a faixa marginal desdeMoscavide a Xabregas, entre o caminho 'fiscal e o rio Tejo,mas o sítio do Casal do Falcão, perto da Pontinha, que estácercado por um saliente da estrada militar, sendo o caminhofiscal pelo troço rectilíneo da mesma estrada, à retaguardado Casal.

(''') Data do Diári o do Governo n." 205. I Série, em que foi pu­98 blicado o Decreto n." 8.403, de 26 do mesmo mês ( art. 34.").

Page 7: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Nos locais do Vale do Fomo e do desfiladeiro de Carriche,onde se constru íram os muros de vedação fiscal, à frente daestrada militar que nesses sítios passa, o decreto de 21 de Novem­bro de 1903 considerou incorporado na Cidade o território com­preendido entre os ditos muros e aquela estrada.

No sítio mais setentrional da Cidade, entre o Casal Arrui­nado e a Charneca, o território do Município passa para alémdos dois ramais de estradas , militar e fiscal, que convergemno Forte da Ameixoeira, segundo uma linha de marcos implan­tados no terreno . Mas como esta linha atravessa três quintas ,que por isso têm uma parte situada no Concelho de Loures,e ela não se acha intimamente relacionada com caminhos oucom acidentes naturais do terreno, considera-se provisória taldemarcação.

O território actual e os limites do Município de Lisboa sãoos que acabamos de descrever, e podem ver-se pormenoriza­damente nos mapas modernos da Cidade.

Às 33 freguesias que anteriormente tinha a Cidade foramadicionadas as seguintes, que, com excepção da do CampoGrande, são as da sua periferia do lado da terra, tendo algu­mas sido cortadas pela estrada de circunvalação, do que resul­tou ficarem com parte do seu território no concelho deLoures:

34 * -Belém;35'" -Ajuda;

- S. Pedro em Alcântara ( já con tada; é a n o" 13 ) ;

36 '" - Benfica;37 * - Carnide;38 '" - Lumiar;39 '" - Campo Grande ;40 * - Ameixoeira ;41 '''' - Charneca;42 * - Olivais;

- S. Bartolomeu do Beato ( já conta da , é a n o" 2 ) . 99

Page 8: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Foram desligadas dos concelhos de Belém e dos Olivais,e outrora haviam penencido ao Termo de Lisboa. A de S. Pedrofoi incorporada na parte que já tinha intramuros.

Nestes últimos tempo s foram criadas mais quatro freguesias:

43 * -Penha de Fran ça, em 1937 ;44 * - Santo Conde táv el, em 1934, pr ovisoriamente na Rua do

P atrocíni o;45 * - Santo António, em 1938, em Camp olide;46 * - N ossa Senhor a de Fát ima, em 1938, perto do Campo P e­

queno.

A de S. Julião tem actualmente ( 1940) a sua sede na ermidade Nossa Senhora da Oliveira , na Rua de S. Julião.

As 43 freguesias civis de Lisboa correspondem às ecle­siásticas n.O"1 a 43 *, apenas com mud ança de designação dealgumas (24) .

CONSIDERAÇÕES FINAIS E D ADOS r-.ruMÉRI CO S

Lisboa confina actualmente com os concelhos de Oeiras apoente, e de Loures a poente e a nort e, mas os limites efectivosno terreno não se acham completa e visivelmente defin idos edemarcados em toda a sua extensão.

Há, de fact o, na actual periferia, uns limites naturais, taiscomo muros divisórios e muro s de cais ; mas outros, conven­cionais, são definidos por meio de marcos divisórios de betão

c2<) São as seguintes:

Coração de J esus - freg. civil de Camões;S. Vicent e, S . T omé e Sa lvador - freg . civil das Escolas Gerais;S . P aulo - freg . civil do M arquês de Pombal ;Santa En grácia - freg, civil de M onte P edral ;Santa Justa - fr eg. civil dos Restaurador es;

100 Santo André e Santa M ar inh a - fr eg. civil da Graça .

Page 9: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

onde se acham inscritas em duas faces opostas as freguesias ouconcelhos que eles dividem; alguns foram implantados na linhade divisão do Município de Lisboa com o de Loures, mas sãoem pequeno número , e não caracterizam visivelmente o contornoda Cidade; a delimitação por esta forma, com o concelho deLoures, ainda não se iniciou.

A planta de Lisboa levantada pela Câmara Munici pal res­tringe-se ao que no Município se considera o limite da sua juris­dição, mas não nos consta que exista diploma legal que a definapormenorizadamente.

D IMENSõES DA CIDADE DE LIS BOA EM D I F EREJ'ITES ÉPOCA S

M aiores dimensõe s, Per ímetro,em metros em me tros.

----------o o o

. ... :.Jt

E,gl , " '" ::!ii c e,_"O Super fí cie

L im ites ou diplomas q ue os fixaram E.g .g :luO <; s.~ C"'C o;;

ee ern H rn29~ ~ e ","O " :§ "O

I c: 1-0 o~ Ê ~ 'E z ~::;'5 '"

o.. " .. "O

ã ~,~ u", .. <5 ..!!!" " t"" ~~ ~ o0 -1:': o c 5 o O

cE"

------ ---

Cerca moura - 1147 ..... .. ..... 435 615 475 1.455 15,68Cerca fern andina - 1373-75 ... 1.700 925 1.950 3.220 101,63Decreto de 3 de Dezembro de

1755 .... .... .. ... .. ... ....... ..... 5.070 2.535 5.64 0 9.045 670,30Contorno no princípi o do sé-

culo XIX . o " 0 o • • o 0' 0 o • • o. o • • o o • ••• • 5.070 3.350 5.640 11.010 94 6,9 6Decreto de 11 de Setemb ro de

1852 ... ..... ..... ....... ....... ... 5.610 3.300 6.230 8.68 0 1.208 ,34Lei de 18 de Julho de 1885 o •• 12.200 8.850 6.230 23.400 6.499, . .Decreto-Lei de 22 de Julho de

1886 .... .... .. ...... ... ... .. .. .. . 16.050 9.500 19.330 25 .320 9.722, . .Decretos de 26 de Set embro

de 1895 e 21 de No vembrode 1903 .............. ....... ..... 14.650 9.500 17.290 21. 660 8.244, . .

101

Page 10: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Tem a Cidade uma orla fluvial, e nesta poderia ser consi-derada limite:

Nos cais: a aresta exterior dos seus muros;Nas docas: a linha que define a sua boca de entrada;

Nas rampas empedradas, escadas, e praias de areia ou de lodo:a linha dos máximos baixa-mares.

Da banda da terra poderia ser considerado limite:Na estrada ou caminho fiscal, e na estrada militar com para ­

peito e fosso: a aresta exterior do último, ou o seu alinhamentoonde o fosso se achar interrompido.

Na estrada ou caminho fiscal, ou na estrada militar semparapeito: o muro divisório, ou a aresta exterior da valetaexterior.

No quadro acima damos, não exactas, mas tão aproximadasquanto pudemos obtê-las, as dimensões do território da Cidadenas várias épocas de que tratámos, não incluindo as das fregue­sias extramuros que faziam pane da Cidade.

A medição que apresentamos da área actual da Cidade foibaseada numa planta da Câmara Municipal, na escala 1:5000,tomando por limites, do lado do rio, os que se acham marcadosna mesma planta, e que correspondem aproximadamente aosque acima deixamos apontados, e da banda da terra os defi­nidos pela valeta exterior da estrada de circunvalação fiscal emilitar.

Muito útil seria para efeitos administrativos, policiais e tribu­tários, e mesmo para evitar questões de propriedade e conflitode atribuições, que os limites no terreno fossem fixados por umdiploma oficial, que pormenorizadamente os definisse.

Eis como tem sido o desenvolvimento de Lisboa, no tempoe no espaço.

Lisboa, cuja origem se perde nas épocas pré-históricas, e102 que há 793 anos, quando passou a fazer parte do território

Page 11: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

do reino de Portugal, possuia uma área de 15H a',68, tem idocrescendo sucessivamente, medindo hoje cerca de 8.244H a' , ouseja 526 vezes a da Lisboa da época muçulmana.

No dizer de um estadista do século passado, constituía umacabeça demasiado grande para um corpo tão pequeno como éPortugal. Mas nesse tempo não se atendia a que Portugal senão restringe a uma estreita faixa ocidental da Península Ibérica,e a que por várias parte do globo tem espalhados valiosos terri­tórios, que muito contríbuem para a sua riqueza e prosperidade.Portugal tem uma história, uma civilização e uma tradição quese impõem a todo o mundo, e a Cidade de Lisboa, grande como é,não a devemos considerar desproporcionada se nos lembrarmosde que ela é não só a capital de Portugal, mas de todo o vastoImpério português.

103

Page 12: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 13: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

PROBLEMAS DE TOPONÍMIA

Page 14: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 15: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Problemas de toponímia (*)

Lisboa, 29 de Outubro de 1940. - .. . Sr. Director dos Ser­viços Centrais da Câmara Municipal de Lisboa: - Tendo ouvidohá dias uma opinião, publicamente expendida, sobre a redacçãodos dísticos ou letreiros das ruas, peço licença para tambémmanifestar a minha .

Versa sobre a preposição de nos nomes das vias públicas.Estavam antigamente os nomes das ruas intimamente rela­

cionados com circunstâncias das mesmas, ou com pessoas quenelas habitavam ou tinham propriedades. Assim, escrevia-se:

Rua dos Ourives da Prata ;Rua do Arco de D. Teresa ;Beco de Martim Alho;Calçada de S. Crispim;Largo do Marquês de Lavradio, etc.

u ltimamente tem-se generalizado a moda de dar às viaspúblicas nomes de pessoas mais ou menos ilustres, mas quenem nelas moraram, nem passaram, nem mesmo tiveram a ditade ainda serem deste mundo quando tais vias públicas foramabertas .

( * ) R evista Municipal, ano II, n ." 6, 1941 , págs. 29-31. 107

Page 16: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Quando não existe qualquer subordinação de ideia do nome,à rua, com que é baptizada, não vejo moti vo para interpor,entre a via pública e o nome, a preposição de, e por isso, naminha opinião, bem avisada acho que anda a vereação supri­mindo-a nos letreiros, como faziam vereações passadas, escre­vendo :

Rua Garrett ;Rua Alexandre Hercul ano;Rua Saraiva de Carvalho;Rua Capelo;Rua Paiva de Andrad e;Rua Castilho;Rua Borges Carneiro;Jardim Constantino, etc.

e sempre que se não dê a tal condição de subordinação ou depen­dência de ideia do nome à rua pública, deverá continuar aeliminar-se, como nos seguintes exemplos :

Rua Joaquina ;Rua jau;Rua Heróis de Quionga ;Rua Padre António Vieira;Rua Vinte de Abril ;Largo Júlio de Castilho ;Vivenda Rosalina;Avenida Marquês de Tomar, etc.

Pedindo a V. me releve o meter-me onde não fui chamado,subscrevo-me com estima e consideração. De V., At.v, Ven.",

108 m.'> os -, ( a) Augusto Vieira da Silva.

Page 17: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Lisboa, 31 de Dezembro de 1940. - .. . Sr. Director dos Ser­viços Centrais da Câmara Municipal de Lisboa: - Depois dehaver escrito a V. em 29 de Outubro, uma carta destinada aocesto dos papéis velhos, em que mostrava o meu modo de veracerca do emprego da preposição de nos nomes das vias públicasbaptizadas com nomes de pessoas ou de objectos que não têmrelação alguma com a rua ou local que com eles são distinguidas,chegou ao meu conhecimento que o assunto já havia sido tratado,com muita competência e erudição, num artigo publicado nojornal A Voz de 1 de Julho de 1938, assinado com as iniciais A. A.,que ocultam certamente um profundo conhecedor da línguaportuguesa.

Diz e demonstra, por uma forma elegante e convincente,o que eu já havia indicado de maneira singela, e só guiado pelaimpressão que causa ao meu espírito a construção da frase queexprime a denominação de vias públicas com ou sem o empregoda preposição de, emprego ou supressão que faz muitas vezesdar à frase sentidos ou significações diferentes.

Por exemplo: suprima-se ou adicione-se a preposição nosseguintes nomes de vias públicas de Lisboa:

Pátio do Calado; pátio do Quaresma ; pátio do Nobre;pátio do Cem;

Travessa da Ferrugenta; azinhaga da Flamenga;

Rua Cascais; Avenida Estados Unidos da América;

Rua Formosa e Beco da Formosa.

O artigo de A Voz é extenso, e por isso faço acompanharesta .apenas por um pequeno extracto, ao qual poderia acres­centar outros exemplos análogos aos que o articulista menciona,em que se mostra a forma popular, consagrada, ou oficial decertas denominações em que a preposição se acha omitida. 109

Page 18: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

110

Animais: cão Nero ; vaca Diana ;Barcos: nau Catrineta; aviso João de Lisboa ; palhabote

Maria Beleza;Prémios: taça Silva Porto ; taça D . Bernardo de Mesquitela ;Museus: museu Bordalo Pinheiro ; aquário Vasco da Gama;Animatógrafos: cinema Gil Vicente ; cinema Paris;Hotéis: hotel Borges; hotel Mondego ;Teatros; teatro Maria Vitória ; teatro Apolo ;Mercado 31 de Janeiro;Círculo Eça de Queirós;Maternidade Dr. Alfredo Costa ;Manicómio Miguel Bombarda;Biblioteca Conde de Castro Guimarães.

Pedindo mais uma vez a V. Ex." me perdoe a minha impor­tunidade, subscrevo-me, com estima e consideração. De V.,At.", Ven." e m.'> Ob.", (a) Augusto Vieira da Silva .

Page 19: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

A LIGAÇÃO COSTEIRA DA BAIXACOM A PARTE OCIDENTAL DA CIDADE

Page 20: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 21: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

A ligação coste ira da Baixa com a parte ocidentalda cidade (*)

PROJECTOS E SUGESTõES APRESENTADAS

NOTí C IA H ISTóR ICA

Quando, no últim o quartel do século XI V, a circunscriçãoda Cidade de Lisboa foi definida, no seu lado ocidenta l, poruma muralha que descia desde o actual Largo TrindadeCoelho até à Rua do Ferregial de Baixo, e daí até ao Largodo Corpo Santo , as saídas primitivas da Cidade para os arra­baldes ocidentais faziam-se apenas pelas portas de Santa Cata­rina, no actual Largo das D uas Igrejas, e pela de Cata-que­-farás, do Corpo Santo ou dos Coberto s, que ficava situadaa meio da nossa T ravessa do Cotovelo , e perpendicularmentea ela. N o mesmo lanço da mur alha abriram-se mais tarde ospostigos de S. Roque, da T rindade, do Du que de Bragançae dos Mártires.

As passagens principais continuaram, porém, a ser as duasprimeiras referidas, das quais a últi ma era a que estabeleciadirec tamente a comunicação costeira da parte Baixa da Cidade

( * ) R coista Municipal, ano II , n .''' 8-9, 19-1 1, p ágs, 3- 1-1 . 113

Page 22: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

com os arrabaldes ocidentais, ao longo de um caminho traçadona praia, que mais tarde se converte u nas nossas Ruas de S. Pauloe da Boa Vista , até ao Largo do Conde Barão.

A rua que da port a de Cata-que-farás nascia para o interiorda Cidade, chamada da T anoaria ou dos T anoeiros, ou dosCobertos ou do Arco dos Cobertos, tinha mui pouca largura,e os andares em sacada dos prédios que a ladeavam ainda maisa estreitavam e escureciam.

A praia para além da ermida de Nossa Senhora da Graça,que ficava no Largo do Corpo Santo, no começo inferior daactual Ca lçada do Ferrcgial, era na sua maior parte lograd ourode pescadores, e local de estalei ros de construções navais, e sóno alvore cer do século XVI é que prin cipiou a cascar-s e, e acobrir-se de ruas, em terrenos conquistados ao Tejo.

Só então começaria a fazer-se pela port a de Cata -que-fa rásuma circul ação mais intensa, mas a comun icação principal daCidade com o ocidente continuou, ainda por muito tempo, aser pelas portas, ou pelo sitio das portas de Santa Catarina.

Na beira do rio construi ram- se então muitas casas de habi­tação e alguns palácios, entre os quais teve o primeiro lugaro chamado do Corte-Real, começado a edificar em 1585, segundoconsta, e destruído pelo terremoto de 1755.

A top ografia do local ant es deste catacl ismo, que pode ver-seno M apa I, acha-se pormenorizadamente estudada em um out rotrabalho nosso, e por isso não nos ocupamos dela aqui.

Basta dizermos que o terremoto e o plano de reedificaçãoda Cidade modificaram completamente o aspecto do local, eem substitui ção das ruas estreitas e irregulares que aí existiam,rasgaram-se novas artérias perfeitamente alinhadas e com larguraconsiderável para a época.

o problema da circulação costeira entre a Baixa e o CorpoSant o, que se afigurou ao Ma rquês de Pombal resolvido com

114 a abert ura da larga ( !) Rua do Arsenal, achava-se, em pouco

Page 23: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

mais de um século, com o aumento sucessivamente crescenteda população e da circulação, novamente insatisfeito, e care­

cendo de urgente resolução.

Começou o assunto a ser atendido pelos meados do século XIX

nos planos de modificações da margem norte do Tejo, paramelhoramentos do porto de Lisboa , para que se começava aolhar com interesse.

De então par a cá têm sido sugerida s várias soluções, e apre­sentados muitos projectos, com o objectivo de facilitar a cir­culação entre o bairro cent ral ou a Baixa, e a parte ocidentalde Lisboa, pelo lado costeiro, isto é, entre o morro chamadode S. Francisco e a orla do Tejo.

Vamos mencionar resumidamente aquelas de que temosconhecimento, apenas para dar a saber aos nossos leitores o inte­resse que às instância s oficiais e a alguns particulares tem mere­cido a solução de um problema que tant o se relaciona com avida citadina, não entrando em pormenores, nem na critica técnicanem económica das referidas soluções, algumas das quais forampublicadas em livros, revistas Oll jornais, defendidas ou justi­ficadas pelos seus autores, ou apreciadas na imprensa, ou emdocumentos oficiais.

Essas soluções ou sugestões podem classificar-se em trêsmodalidades ou grupos:

1.0 - Alargamento da passagem da Rua do Arsenal ;

2." - Abertura de um túnel entre a Praça do Municípioe o Largo do Corpo Santo ;

3." - Construção de uma passagem ao sul da Rua doArsenal, entre a Praça do Comércio e a Praça do Duque daTerceira.

1.0_ ALARGAMENTO DA PASSAGEM P ELA RUA DO ARSENAL.

a) - Sugestão do engenheiro Miguel Pais, 1882. - Comocomplemento da obra de abertura do túnel, que este engenheiropreconizava, e de que adiante falaremos, entendia que se devia 115

Page 24: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

cortar, na extensão de 18m em cada face , forma ndo um pan

coup é, o prédio que form a a esquina da Ru a do Arsenal paraa Praça do Pelourinho.

De futuro, prevendo insuficientes estes meios, preconizavaa demolição de todos os prédios do lado norte da Rua do Arsenal,ent re o Pelourinho e o Corpo Santo, incluindo o que fica entreeste último e a Travessa do Cotovelo (1) .

b ) - U ma sugestão parecid a foi feita pelo engenheiro hidr á­grafo Per eira da Silva, em 1884. - Abertura de um túnelou galeria com 10111 de largura nos edifícios do lado norte daRua do Arsenal, ou fazer recuar 15111 a fachada dos mesmosedifícios (2) .

c) - Proposta apresem ada pelo conde do Restelo ; 1893 ­Em sessão de 5 de J unh o este president e da Câmara propôs,para serviç o de peões, o alargamento da Ru a do Arsenal, desdeo Largo do Corpo Sant o até defront e da T ravessa do Cotovelo,à custa de uma faixa do terreno ocupado pelas oficinas quecontinuam o edifício do Arsenal até aque le largo. e pro longara referida passagem por baixo do dito edifício, em arcada, atéà Praça do Municipio, com a qual se comunica ria pela port ado Arsenal, ficand o o actual passeio sul da rua incorpo rado nafaixa de rodagem para o trânsito geral C)

d ) - S olução do funcionário municipal Francisco M aria

Pereira H eitor de M acedo; 1906. Mapa II. - Consistia emconstruir um a galeri a em túnel no sítio da s lojas do lado norteda Rua do Arsenal , em toda a extensão desta rua, ficando osprimeiros and ares acessíveis por escadas e porras que abriamnessa galería.

\ ' ) M elhoram entos dc Lisboa c SC I I Port o, por M iguel Ca rlos Cor­reia P ais, vol , I, 1882, pág. 1l 9.

C) OS Portos M arítím os de Portugal c Ilhas A djacentes, por AdolfoLour eiro, vol. III, parte I, Li sboa, 1906, pág. 335 .

(') A ctas das S essões d,l C omiss ão Mun icipai, 110 anno de 1893,116 pág. 169 .

Page 25: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

PROJECTO .\ II G U EL VE:-':T U RA T ERRA

RU;1 do Ar sen al vista do Largo do Corpo S an to para a Praça do .\ i unici piomos tran do a g-al er ia p rojec tada- nos prédi o s d o lado nort e d a rua

Page 26: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

A galeria teria 21ll de largura livre, e 3 IU ,9 de altura ; e asfachadas dos prédios seriam substituídas, na altura do rés-do­-chão, por pilares de cantaria, sobre que se apoiariam arcosde suport e da fachada que lhes ficava superior; as larguras dosvãos desses arcos seriam um pouco variáveis, regulando por4"',2, e os pilares de suporte teriam om,9 X 1m,6 de frente C' ).

e) - Projecto do arquitecto Miguel Ventura Terra; 1908. ­Mapa II e gravura. - Consistia na abertura de uma galeriaem túnel que abrangesse as lojas e primeiros andares dos pré­dios dos dois quarteirões do lado norte da Rua do Arsenal.A galeria teria 3IU ,4 de largura livre, e 7m,7 de altura. Asfachadas, até ao piso do 2.° andar, seriam substituídas por pila­res com 01U,8 X 11U,1 de frente , os quais, sobre arcos de voltainteira, suportariam a parte conservada das fachadas dos andaressuperiores. Os arcos teriam 41ll,8 de vão, excepto os dos extremose os do centro dos dois quarteirões, que ficariam com cerca de2 IU ,4, sendo aí sobrepujados por óculos (5) .

1) - Sugestão do engenheiro industrial João Segurado;1927. - Consistia, como uma das sugestões dos engenheirosMiguel Pais e Pereira da Silva, em demolir todos os prédiosdo lado norte da Rua do Arsenal, fazendo a sua reconstrução10m a 151ll recuada. As novas edificações seriam destinadasexclusivamente a escritórios, armazéns, e outros estabelecimentoscomerciai s, com 6 a 8 andares, munidos com elevadores e monta­-cargas .

A rua poderia ser do tipo da Avenida 24 de Julho,com três faixas de rolagem, separadas por placas formandopasseios (1;) .

(') Projecto datado de 22 de Fevereiro de 1906, arquivado na Câ ­mara Municip al de Li sboa.

C) Projecto sem data, arquivado na Câ ma ra Municipal de Lisboa.A pr opo sta foi feita pelo autor em sessão cam arária de 3 de Dezembrode 1908, e desen volvida e explicada em um artigo da Lllnstração Portu ­guesa, n," 213, de 21 de M arço de 1910, pág. 973 .

(';) Diário de Noticias, de 20 de F evereiro de 1927 . 117

Page 27: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

2.° - TÚNEL ENTRE O CANTO NOROESTE DA PRAÇA DO MUNI­CÍPIO E A TRAVESSA DO COTOVELO OU O LARGO DO CORPOSANTO; Mapa II.

a) - Solução da Comissão nomeada por portaria do Minis­tério da Marinha, de 9 de S etembro de 1871,' 1873. - Estacomissão, nomeada para estudar os melhoramentos do portode Lisboa, entendeu ser de grande conveniência a construçãode um túnel entre o Largo do Pelourinho e o do Corpo Santo.O túnel teria 172m de comprimento, 9m de largura e 401 dealtura no fecho.

Propunha também recuar o pavilhão central do edificio doArsenal da Marinha até ao destorcimento com as alas ou corposlaterais do mesmo edifício, o que proporcionava mai s 2m à

entrada da dita rua .

b ) - Requerimento de Alfredo Pereira & C."; 1878. - Emsessão camarária de 26 de Agosto foi apresentado um reque­rimento da firma mencionada, para abrir um tún el ent re osLargos do Pelourinho e do Corpo Santo. Desconh ecemos ospormenores ( ') .

c ) - S olução do engenheiro M iguel Paes; 1882. - Esteengenheiro concordava com a solução da Comi ssão de 1871,mas além do corte em pan coupé do prédio que esquina da praçado Município para a Rua do Arsenal, a que já nos referimos,entendia que o túnel devia ter pelo menos 15m de largura,sendo 9'" para faixa de rodagem e 3m para passeios; a alturano fecho seria 601

, e o movimento dos veículos deveria efectuar-sesó num sentido (')

d ) - Projecto da Repartição T écnica da Câm ara Municipal.sem data. Dava ao túnel 14m de largura C) .

(') Archiv o Municipal de Lisboa, anno de 1878, pág. 4 88.

(6) M elhoram entos di' Li sboa e SelI Porto, por M. C . Co rreia Pais

vol, I , 1882, pág. 119.

118 (") Arquiva do na Câmara Municipal de L isboa.

)

Page 28: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Obsercação: - Todas as p lantas foram reduz idas à esca la 1:5 000 .•Mas como os originais de algumas não estavam rigorosos, a sob repos içãonão pôde fazer-se com exactidão.

MAPA!

PLA:--"TA PARCIAL ACTUAL DA C I DADE

Sobreposta, a tinta vermelha. a plan ta da me sm a região an te riorao te rremoto de 1755

Page 29: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

MAPA II

A TI N TA VERMELH A

AL AR G AM El'.'TO DA R U A D O ARSEl'o:AL

_ •• _ • • _ o ' _ Sol ução de Fr anci sco ...\ 1. Pereira H ei to r de ,\ \ac edo

_ . _ . _ . _ . __ Projecto de M iguel Ventur a T erra

T ú l'o:EL DO I' EL OURIl'.'H O AO COR PO SA !"T O

. . . . . . .. Projecto de F ranc isco de Paula Botelh o

. . Ou tros projectos ou su ges tões

Page 30: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

e) - Projecto de Ra fael Cru z Lazameta e D omingos Cru z

Lazameta; Agosto de 1899. - O túnel teria 160m de compri­ment o, 12m de largura ent re os encontros, e 5111,5 de altura,do solo ao fecho CD) .

1) - Projecto de Francisco Paula Botelho; 1907. - A embo­cadura do tún el, do lado do Corpo Santo, ficava ao meioda face norte desta praça, sendo comum com a dum outrotún el que ia findar no recanto sudoeste da Ru a L" deD ezembro ( 11).

g ) - Soluções idênticas de construção de um túnel forampropostas pelo falecido condutor S chiappa M onteiro, e pelovereador, tamb ém já falecido, Qu irino da Fonseca ( '") .

h ) - A nteprojecto do engenheiro A ntônio Emídio Abrant es;1927. - O túnel-galeria teria 165m de compriment o entre testas,13m de largura, e 611l de altura (13).

i ) - Projecto do engenheiro Antônio L eott e T avares)' Abr ilde 1928. - F ormava o tún el com dois alinhamentos em ângulomuito abert o; em parte com 1111l de largura e 711l de altura,e na part e restante com 12m de largura e 8m de altura.Na entrada do lad o da Praça do M unicípio a testa do tún elformaria 3 arcos monumentais, com a largura total de 1711\,82,incluindo os pilares. Dentro do tún el construir-se-iam 34 pequ e­nos estabeleciment os comerciais ( 1) .

3.° - C ONS TRUÇÃO DE UMA PASSAGEM PELO SU L DO EDI ­

FÍCIO DO AR SENAL DA M ARINH A EN TRE A P RAÇA DO C OM ÉRCIO

E A P RAÇA DO D UQUE DA T ERCEIRA.

('0) Arq uivado na Câmara Municipal de L isboa.(") Co nsta de um plano de melhor am ent os da cidade qu e foi pu­

blicado pela Sociedade P rop aganda de P or tugal, com o tít ulo: M elhora­men tos Ur gentes de Lisboa, plano geral, L isboa, 1907.

C") Ignor amos onde se acha m ou estão arquiva das .CH

) Arquivado na l ." R epart ição da Direcção dos Servi ços deU rban ização e Obras (foi apresen tad o em sessão camará ria de 8 deSetembro de 1927 ) .

C" ) A rqu ivado na Câmara Municipal de Li sboa, 121

Page 31: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Esta solução tem apresentado duas variantes: uma, conser­vando as instalações fabris, armazéns e docas do Arsenal; e outra,arrazando tudo e abrindo uma larga avenida pelos terrenos queessas instalações ocupam.

Desde que pelos meados do século passado se começou apensar nos melhoramentos do porto de Lisboa e da margemmarítima da cidade, a iniciativa individual e as entidades ofi­ciais sugeriram várias modalidades para esses melhoramentos,conquistando largos terrenos ao Tejo para diferentes fins ; e,pelo que respeita especialm ente à passagem costeira pelo suldo Arsenal da Marinha, se as soluções eram fáceis de traçarno papel, apresentavam pràticamente muitas dificuldades deexecução, tanto mais que pressupunham geralmente a conser­vação do Arsenal da Marinha onde se achava.

Este assunto, porém, já se acha completamente estudadoe compilado pelo ilustre e falecido engenheiro Adolfo Loureiro,e podem os vários projectos ser compulsados no atlas do vol. III

da sua monumental obra: Os Portos Marítimos de Portugal eIlhas Adjacentes (Lisboa, 1907 ); Iimitar-nos-ernos por ISso afazer aqui uma rápida resenha dos que constam do referidoatlas, que contenham alvitres para a comunicação entre o Caisdo Sodré e o Terreiro do Paço.

São principalmente os seguintes:

a) - Do Visconde de S. '[anu ário e engenheiro M endesGuerreiro; 1869.

b ) - De Thomé de Gaumond; 1870.

c) - Da Comissão nomeada em 9 de Setembro de 1871;1873.

d ) - Do engenheiro inglês '[ohn Coode; 1882.e ) - Do engenheiro hidrógrafo Francisc o Maria Pereira da

Silva; 1884.122 f) - Da Comissão nomeada em 16 de Março de 1883; 1884.

Page 32: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

MAPA IIIS olução patrocin ad a pela S ocied ade Prop agand a de Port ug al

Page 33: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

MAPA IVProjecto do engenheiro Ant ónio BeJ o

Page 34: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Projectos apresentados ao concurso para a constru ção dasobras do Port o de Lisboa :

g) - Do engen heiro construtor francês Pierre Hildenert H er-

sent; 1885.

h) - Do constru tor Frederico W illiam R eev es; 1885.

i) - D o G rupo Nacional ( 2 projectos) ; 1886.j ) - D o engenheiro francês Gu érard, 1886.

Alterações ulte riores nos projec tos em curso de execução:

k ) - Do eng enheiro João Verissimo M endes G uerreiro; 1836.

I) - D os eng enheiros João Joaqu im de M atos e Adolfo L ou­reiro; 1886 .

Todos os alvitres constantes destes projectos para a ligaçãoentre a Praça do Comércio e a Praça do Duque da T erceiraestão hoje postos de parte, visto ter sido resolvida a transfe­rência do Arsenal da Marinha para a outra margem do T ejo,e o rasgament o de uma larga rua ou avenida peJos terrenosque estiveram ocupados com as instalações dos serviços fabris,armazé ns, docas, etc ., do Arsenal, avenida que, começando roaPraça do Duque da T erceira, ou na que lhe fica em frent e(J ardim Roque Gameiro), vai terminar no canto sudoeste daPraça do Comé rcio, ao sul do torreão do Ministéri o da Gu erra .

São de dois tipos as soluções que mais modernamente têmsido ap resentadas: ou atravessando a avenida em diagonal osterrenos do Arsenal, começand o na Praça do Duque da T er­ceira, ou const ruindo-a paralelamente à Rua do Arsenal, come­çando no pro longamento da mencionada praça para o lado doTejo (Jardim Roque Gameiro), havendo neste caso mais ruaspa ralelas a ela, e out ras transve rsa is, corta ndo as prim eiras em

ângulo recto . 125

Page 35: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Estes pr ojectos obrigam, em geral, a alargar para o rio,

o terrapleno e o cais na frente sul do torr eão do Ministério

da Guerra, e bem assim a reconstruir, avançado sobre o Tejo,

a muralha e as escadarias do Cais das Colunas, do meio da Pr aça

do Comércio.

Obed ecendo ao primeiro tipo têm sido apresentados os se­

guintes pr ojectos:

a) - Patrocinado pela S ociedade Propaganda de Portug al;

Fevereiro de 1910; Ma pa III. A avenida a construir, com 25m

de largura, ficava no prolongamento da Rua 24 de Ju lho, e

tinha um traçado em curva tange nte ao torreão do M inistério

da Gu erra, e à ala da Sala do Risco, que se conservava.

Em frente do topo sul desta ala a avenida bifurcava-se,

dando um troço marginal que terminava no prolongame nto da

Pra ça do Duque da T erceira.

Além disso abria-se uma rua que contornava a Sala do

Risco pelo nascente, o edifíc io do Arsenal pelo sul, e o corpo

do edifício dos Min istérios pelo poente .

A actual entrada do Arsenal ficava passagem livre para

peões, e em frente da Travessa do Coto velo rasgava-se, ao

longo da fachada poente da Sala do Risco, uma larga rua até

à avenida pro jectada.

O terreno desde o Largo do Corpo Santo, compreendido

entre a avenida e as ruas mencionadas, seria aja rdinado ele') .

(" i ) Diári o de N oticias, de 20 de F evereiro de 1910. - Julgamosser esta a solução mai s int eressante de todas as propostas, não sópelo elegan te traçado da aveni da, mas pela conserva ção da ala daSala do R isco, casa cheia de tr adi ções e de memórias de factos glo ­riosos da no ssa história, relacionados alguns com as viagens dos nossos

126 exploradores e colonizadores do con tinente africano .

Page 36: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

M APA VProjecto do a rqui tecto ur ba ni sta H. AJfred Agache

Page 37: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

.\-\ AP A VI

Proje cto do arquitecto paisagi sta Jean C h a rles N icolas Forcsticr

Page 38: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

b) - Do engenheiro António Belo; 1921. Mapa IV.­A passagem pelo sul do edifício do Arsenal faz parte de umasérie de melhoramentos da margem do Tejo entre o Cais doSodré e a Alfândega, que aquele engenheiro estudou e projectouem 1921.

Além do estabelecimento de novas vias públicas, o projectotrata de cais de passageiros para grandes transatlânticos, de umaestação términus nos terrenos em frente da Alfândega, do paláciodos Correios e Telégrafos, de hotéis de I ." ordem, e de edifíciospara vários serviços públicos.

A avenida a construir, com 44m de largura e 3 faixas derodagem, nascia na Praça do Duque da Terceira, passava emdiagonal pelos terrenos do Arsenal, e saía no canto sudoesteda Praça do Comércio, entre o actual edifício dos Ministérios,que seria completado no seu canto sudoeste, e o palácio a cons­truir para os Correios e Telégrafos, em terreno conquistado aoTejo.

Além desta avenida, haveria uma alameda marginal ajardi­nada, com 30m de largura, e várias ruas transversais (16) .

C) - Do arquitecto urbanista francês B. Alfred Agache;sem data; Mapa V. - Este projecto traçava a avenida comdois tramas rectilíneos, com 18m e 20m respectivamente de lar­gura, formando um ângulo muito aberto. Começava no Caisdo Sodré, seguia obliquamente pelos terrenos do Arsenal, eformava seguidamente um tramo paralelo à Rua do Arsenal eterminando na Praça do Comércio. Ao longo da avenida haveriaduas placas longitudinais, que, assim como os passeios, seriamarborizadas .

(' lA) Publicado na Revista de Obras Publicas e Minas, volumede Janeiro a Dezembro de 1921, e em separata da mesma. 129

9

Page 39: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Duas ruas transvers ais cortavam perpendicularmente a ave­

nida ; uma no seguimento do Largo do Corpo Santo, e outrana continuação da Travessa do Cotovelo, que também se prolon­

garia para sul, atra vés do corpo do edifício do Arsenal.

A ala da Sala do Risco seria demolida, e o quarteirão decasas do Largo do Corpo Santo, que esquina para a Rua Ber­

nardino Costa, seria modificado e ampliado para obedecer aotra çado da avenida .

O espaço compreendido entre o muro de cais a construir,

sensivelmente paralelo à Rua do Arsenal, os corpos deste edifíciodo Estado, e a Praça do Duque da Terceira, seria aproveitado

em ruas, canteiros ajardinados, uma estação fluvial, prédios,armazéns, etc. (17).

Do segundo tipo, isto é, a avenida marginal paralela à Rua

do Arsenal, têm sido apresentados os seguintes projectos:

d) - Do arquitecto paisagista francês '[ean Charles Nicolas

For estier (18); Setembro de 1927; Mapa VI. - A avenida, com

499m de comprimento e 19m de largura, rasgava-se ao longo

do muro do cais a construir, sensivelmente paralelo à Rua do

Arsenal, e nascia na praça em frente da actual do Duque da

Terceira (no sítio do Jardim Roque Gameiro) .Além disso abria-se uma rua com 19m de largura, paralela

à do Arsenal, nascendo na Praça do Duque da Terceira, no

Cais do Sodré, e seguindo ao longo da fachada sul do edifício

do Arsenal, cuja Sala do Risco era demolida. Chegando ao

('1"/ ) O desenho do projecto está arquivado nos S erviç os da Plant ada C idade, da Câmara Municipal de Lisboa .

(18) Arquivado nos S erviços da Plant a da Cidade, da CâmaraMunicipal. O desenho do projecto foi publicado em vários jornais;por exemplo, em O S éculo, de 14 de Outubro de 1927 e no Diário

130 de N otícias, de 12 de Fevereiro de 1934 .

Page 40: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

canto que forma o corpo principal do Arsenal com o edifíciodos Ministérios, a avenida voltava em ângulo recto para o sul,com 17m de largura , formava um novo ângulo recto para nas­cente, e, com 24m de largura, seguia paralelamente a este corpodo edifício, term inando em frente do torreão do Ministério daGuerra.

O projecto ainda previa uma larga passagem por baixo doArsenal, onde é a actual entrada monumental, estabelecendo acomunicação da Praça do Municipio com as novas ruas e avenidasa construir.

No espaço abrangido por estas novas avenidas e ruas, pelaPraça do Duque da T erceira, e pelo corpo do edifício dos Mi­nistérios, formar-se-ia um parqu e com ruas, arvoredo, fontes,

monumentos, etc.

e) - Do desenhador Eduardo Raposo Botelho; 1927.­A passagem costeira entre a Praça do Duque da Terceira e ado Comércio constitui parte de um estudo de em belezamento

da margem magna do T ejo, e assemelha-se à da solução anterior.

Pelo projecto rasgar-se-iam três vias ou alamedas paralelasà Rua do Arsenal, com 4üm de largura, sendo uma marginal,ao longo de um muro de cais a construir, desembocando noprolongamento para o sul, da Pra ça do Comércio ; outra, abrin­do-se na mesma praça ao sul do torreão do Ministério da Guerra ;

e a terceira seguindo ao longo da frente sul do corpo do edi­fício do Arsenal da Marinha, no prolongamento do Cais doSodré.

Haveria mais uma avenida longitudinal intermédia, e trêstransversais, sendo uma no seguimento e com a largura do Largodo Corpo Santo, e outra , com 37m de largura, nascendo nocanto sudoeste da Pra ça do Municipio ; a terceira, a meia dis­tância das anteriores.

O corpo do edifício dos Ministérios ficaria completado coma forma rectangular em planta , e ao longo da sua face sul, 131

Page 41: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

assim como na dos quarterroes de casas que ladeiam pelo nortea avenida marginal, contruir-se-iam arcadas idênticas às quecircundam a Praça do Comércio.

O terreno entre as duas alamedas marginais seria ajardinado,e o espaço restante ocupado com um hotel e outras edificações.

f) - Da Administração do Porto de Lisboa; 1941. MapaVII. - O projecto (19), elaborado pelos serviços de engenhariada Administração do Porto de Lisboa, é muito parecido como anterior, e as diferenças principais consistem em haver apenasuma alameda ou avenida marginal, em vez de duas paralelasseparadas por uma área ajardinada, e em serem cortadas asavenidas por quatro ruas transversais em lugar de três, ficandouma no prolongamento da Travessa do Cotovelo para o sul.

Para ligação por meio de túnel entre o Largo do CorpoSanto, e o recanto sudoeste da Rua 1.0 de Dezembro ou daPraça dos Restauradores, estabelecendo desta outra forma acomunicação da Baixa com os Bairros ocidentais de Lisboa,mas já segundo um traçado que se afasta da parte costeira daCidade, têm havido também algumas sugestões e projectos, mascomo saem fora do programa que nos tínhamos proposto, nãonos ocuparemos deles.

Assente que a ligação entre a Praça do Duque da Terceirae o Terreiro do Paço se deverá fazer pelos terrenos do lado sulda Rua do Arsenal, não se sabe ainda definitivamente de queforma, têm-se efectuado nesta orientação os trabalhos de de­molição dos pavilhões, oficinas e barracões do recinto do Ar­senal.

(9) Um extra cto do desenho do projecto foi-no s obsequiosamente

facultado pela Administr ação do Porto de Lisboa, o que mu ito agra­132 decemos.

Page 42: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

MAPA VIIProjecto elab or ad o na Exploração do Porto de Li sboa - 1941

Page 43: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

134

Algumas dessas edificações estão ainda aguardando a ordemde demolição, e no entretanto vão servindo de abrigo a serviçose repartições, que também esperam pela ocasião de se mudarem.

O terreno onde existiam aquelas construções ligeiras apre­senta por isso actualmente um aspecto desolador, parecendoque por ele passou uma razoura gigantesca, que tudo devastou.

É de esperar que brevemente o vejamos transformado e sul­cado por uma bela avenida, que tão necessária se torna paraa ligação costeira da Baixa com a parte ocidental da Cidade.

Agosto de 1941.

Page 44: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

F U R NAS D E S C O B E R T ASNO SíTIO DO POTE DE ÁGUA

Page 45: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 46: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Fumas descobertas no sítio do Pote de Água (*)

Em épocas muito remotas, que os geólogos classificam deperiodo terciário, grande extensão do território que faz actual­mente parte da Cidade de Lisboa estava submersa nas águasdo Oceano, as quais inundavam um grande golfo formado pelasbacias dos rios Tejo e Sado conjuntas, que constituía o que oscientistas denominam o golfo do Tejo.

Durante os tempos miocénicos, os mares que banhavam aregião oriental de Lisboa foram recuando lentamente, quer porlevantamento do terreno, quer pelo retrocesso das águas, e aspraias arenosas, formadas pelos processos ordinários de sedi­mentação, foram, devido a esse progressivo abaixamento donível das águas, ficando sucessivamente em seco, e dando origemaos actuais areeiros, alguns a cota relativamente alta sobre onível das águas do Oceano (1).

Os areeiros ao norte da cidade, especialmente em quintasdo vale de Cheias, da Charneca, do Campo Grande e do Lu­miar, têm sido explorados desde muito tempo para a extrac­ção de areias e saibro, para estradas e construções urbanas.

( *) Revista Municipal, ano II, n. " 10, 1941, págs. 35-36.(' ) Informações obsequiosamente fornecidas pelo nosso colega e

amigo engenheiro António Viana, chefe dos serviços geológicos doMinistério da Economia, a quem muito agradecemos. 137

Page 47: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

I !JJJnhftr';di!ifffirJJIe.d4;uapndPjtJl:~nclJllÚrlc/iM jadlÚM.t/RflIlld;;zf;r4Çálfp.J1ritJr~

'li'

MANICÓMIQ

ESC4L4 =/:2tJOO

A VE RMELHO - PLA!'-lA DAS GALERIAS EM DEZ&\1BRO DE 1941

Page 48: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

FRENTE DE DES MONTE CO.\ \ A ENTRADA DE DUAS GALERIAS

Page 49: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

AS PECTO I:-;T ERI OR DE DUAS GALER IAS

Page 50: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Antigamente essas explorações faziam-se pelo método deenfumamento ou de galerias de minas ; mas estando hoje proi­bido esse processo, faz-se o desmonte a céu aberto, mas à

areia continua a chamar-se-lhe areia de mina, em contrapo­sição à areia de praia .

Foi numa dessas saibreiras, na quinta das Retrozeiras oudo Quebra-Bilhas, de que é proprietário o sr. Sebastião Martins,sita na Rua do Fidié, próximo do Campo Grande, e do localconhecido por Pote de Água, a uma cota aproximadamente95m, que chegou ao conhecimento do nosso confrade e amigoLuís Pastor de Macedo, a descoberta de várias galerias demina, pelo que fomos convidados a visitá-las, em Dezembrodo ano passado.

Os serviços culturais da Câmara Municipal, aos quais foicomunicado o achado, mandaram tirar algumas fotografias, elevantar a planta do que ainda não havia sido destruído pelodesmonte da saibreira.

O local e a planta das galerias constam da página anterior;formavam, como se observa, uma rede de corredores longitu­dinais, com ramais de ligação, com a extensão aproximada deggm, na ocasião do levantamento da planta.

As paredes das galerias eram muito bem trabalhadas, e asua altura (cerca de 2m) e largura (cerca de o-,7) permitiam

a circulação franca dos trabalhadores.Em certos sítios, e especialmente nos topos dos ramais trans­

versais, estavam escavados nas paredes, a cerca de l m,6 dealtura sobre a soleira, pequenos nichos onde os mineiros colo­cavam as suas candeias, cujos fumos deixaram enegrecidos ostectos dos mesmos.

As galerias corriam sensivelmente de nivel, e a camada deareia superjacente variava naturalmente de espessura, regulandopor 4m,5.

A frente de ataque a céu aberto, na ocasião da nossa visita,tinha grande altura, cerca de 10m, e a exploração cessou cm 139

Page 51: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Junho do corrente ano, por ter sido atingido o limite do ter­reno arrendado para essa exploração, e hoje já coisa alguma

resta dessas galerias.

O motivo por que a exploração se fazia por galerias de

mina, e não a céu aberto, parece basear-se no facto de osantigos mineiros procurarem, por aquela forma, veios de areia

de melhor qualidade, e por conseguinte mais valiosos.

Seria porém este o verdadeiro motivo da abertura de tais

minas? Aqui fica a interrogação para quem souber responder.

Actualmente naquela saibreira, e nas outras da mesmaregião, tudo se escava e se aproveita, para macadames, arga­

massas, betões, rebocos, etc., ainda que muitas vezes as areiasusadas não sejam as mais próprias para as aplicações que

lhes dão .

Neste areeiro foram encontradas algumas moedas do rei­

nado de D. João III, pequenos ossos, e o maxilar direito como 2.° e 3.° molares, de um indivíduo adulto, que viveu noperiodo miocénico da espécie Mastodon Augustidens , para ali

arrastado naturalmente pelas correntes vindas das matas onde

estes gigantescos animais viviam.

O Grupo Amigos de Lisboa ofereceu o maxilar encontradoao Museu dos Serviços Geológicos, onde foi fazer companhia,

nos mostradores da sala de Geologia, a outros maxilares, ossos,e dentes de mastodontes, encontrados em areeiros também dosarredores de Lisboa, em niveis geológicos diferentes.

Nem as galerias têm valor arqueológico, nem o maxilarveio constituir um objecto de novidade. Mas pareceu conve­niente fazer-se este pequeno artigo para ficar consignada umanotícia que se prende com uma das modalidades pouco estu­dadas da história da Cidade de Lisboa: as suas galerias subter­

râneas .

140 Junho de 1942.

Page 52: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

ACÇÃO DO CASTELO DE LISBOANAS GUERRAS E REVOLUÇÕESE M P O R T U G A L

Page 53: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 54: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Acção do castelo de Lisboa nas guerras e revoluçõesem Portugal (*)

Quando em 1147 a Cidade de Lisboa passou a fazer partedo nascente reino de Portugal, era ela cercada por uma linhadefensiva contínua de muralhas com torres, construída por umdos vários povos que dominaram na península ibérica, nãose sabe qual, mas que, por já existir na época da dominaçãosarracena em Lisboa, se costuma chamar cerca moura.

Na sua parte mais alta, ocupando o cume do monte cha­mado do Castelo, havia um outro recinto fechado, que cons­tituía a Alcáçova ou Castelo de Lisboa, o qual abrangia a áreada nossa freguesia de Santa Cruz do Castelo.

Dentro da Alcáçova existe, no seu canto noroeste, um outrorecinto mais pequeno, fechado com muralhas, as quais, nosseus lados sul e oriental, ou já faziam parte da primitiva cons­trução da Alcáçova, ou foram construídas mais tarde, na épocade D. Afonso Henriques, na opinião do critico militar coronelCosta Veiga, ou na do rei D . Fernando, segundo o escritorolisiponiano Matos Sequeira.

A este último recinto passou a restringir-se a denominaçãode Castelo ou Castelo de Lisboa, e depois da consolidação da

(*) Revista Municipal, ano III, n .o. 11-12, 1942, págs. 13-20.­O mesmo assunto foi tratado pelo autor em sessão da Academia Por­tuguesa da História, de 26 de Junho de 1940, a propósito das come-morações centenárias da fundação e da restauração de Portugal. 143

Page 55: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

coroa na cabeça do Mestre de Avis, este dedicou-o ao santopatrono de Inglaterra, e passou a chamar-se-lhe Castelo de

S . Jorge.Durante a dominação filipina ( 1580-1640) começaram a

designá-lo, à espanhola, castelejo (pequeno castelo ) , e no sé­culo XIX denominavam-se quartéis dos mouros, ou quartéisvelhos, as edificações militares situadas dentro do referidorecinto.

A parte da freguesia de Santa Cruz do Castelo, exterior aorecinto do castelejo, continua a ser a Alcáçova, mas na lin­guagem popular a designação Castelo de S. Jorge ou simples­mente Castelo, aplica-se hoje tanto ao recinto fortificado doCastelejo, como a toda a área da freguesia de Santa Cruz doCastelo, em que aquele está incluído .

Conquanto o Castelo de Lisboa fosse uma das mais fortesconstruções militares erigidas em território lusitano na IdadeMédia, não teve contudo uma acção decisiva, nem mesmo deimportância primordial nas guerras em território português ;a sua actuação constituiu apenas meros episódios de batalhastravadas em mais extenso território, e com objectivos de maisampla envergadura.

Vamos aqui narrar, a título recordativo, qual foi a acçãodo Castelo nestas pugnas, entendendo resumidamente por estaexpressão, a actuação dos ocupantes da fortificação ou dos seusquartéis , em quatro épocas da nossa história , a saber: a fun­dação da nacionalidade portuguesa; a implantação da segundadinastia; a restauração de Portugal; o período agitado que seseguiu à implantação do regime republicano .

LA ÉPOCA - FUNDAÇÃO DA NACIONALIDADEPORTUGUESA

É do conhecimento de todos que foi a Cidade de Lisboatomada aos mouros pelo rei D . Afonso Henriques, auxiliado

144 com tropas de origens britânica, germânica, flamenga e outras.

Page 56: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

no dia 25 de Outubro de 1147, e tão grande foi a resistênciaoferecida pelos defensores, apoiada na fortaleza das muralhase torres da sua cerca defensiva, que as operações do assédioe conquista duraram dezassete semanas, apesar de os cruzadoscristãos disporem de excelentes milícias e dos mais aperfeiçoadosengenhos de guerra naqueles tempos usados.

As crónicas contemporâneas não mencionam senão escassosfeitos dos cavaleiros do rei. É certo que teve este uma acçãopreponderante e directiva nas operações do sítio; mas faltou-lheum escrevente que fosse registando as fases dos combates eoutros episódios do assédio, como tiveram outros participantesna luta, do lado dos cruzados .

Os sitiantes dirigiram alguns ataques contra os lanços demuralhas da cerca que desciam do Castelo até à orla do Tejo.Mas sabe-se que uma acção foi travada directamente contrao Castelo propriamente dito, e consistiu esta no derrubamentode uma pane das muralhas, no dia 15 de Outubro de 1147,em consequência de um trabalho de sapa e de mina feitodurante cerca de um mês pelos cruzados colonenses e flamengos,cujo acampamento ficava a oriente da cidade. Não se conhecequal a extensão da brecha aberta no pano da muralha der­rubada ( talvez 26m ) , nem mesmo onde era este situado; massegundo as conjecturas que expendemos num outro trabalhonosso, era ele o que ficava sobranceiro ao actual pátio deD. Fradique de Baixo, nas trazeiras das casas do lado orientalda Rua do Recolhimento .

A brecha aberta foi defendida pelos muçulmanos sitiados,durante 9 dias, com trincheiras e palissadas, e tão valorosa­mente que não permitiram o assalto ao Castelo; não se decidiuaí o resultado da peleja, nem a rendição da cidade. Esta sófoi resolvida quando os cruzados ingleses, tendo construído umatorre móvel de madeira, e feito-a avançar contra uma das torresdas muralhas, situada no saliente sudoeste da cerca moura,aproximadamente no local das trazeiras da Igreja da ConceiçãoVelha, fizeram baixar sobre a torre da muralha uma ponte 145

10

Page 57: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

de assalto, no dia 23 de Outubro, facultando assim a invasãoda cidade, e tirando aos sitiados as últimas esperanças deresistência.

Diz a tradição que Martim Moniz, um dos cavaleiros doexército de D. Afonso Henriques, cujo acampamento se situavapelo local onde mais tarde se construiu a igreja e conventoda Graça, a fim de facilitar a entrada das hostes do rei, seatravessou entre os batentes da porta que hoje se chama doMoniz ou de Martim Moniz, já no lanço norte das muralhasda Alcáçova, e porventura então, do próprio Castelo, se defacto o recinto do castelejo ainda não existia.

O facto não se acha comprovado por documentos contem­porâneos, mas é provável que alguma coisa se tivesse passadocom aquele cavaleiro, e que a tradição conservou. Os militantesdo exército de D. Afonso Henriques não deviam ter ficadoinactivos, a presenciarem somente as façanhas dos cruzadosseus auxiliares. Algumas acções deviam ter praticado, mas,como dissemos, faltaram-lhes noticiaristas para as transmitirà posteridade.

Cerca de um século depois de conquistada a cidade encon­tra-se em documentos referência à porta do Moniz, o que revelaa permanência da lembrança ou da tradição de qualquer feitomemorável ali praticado por aquele cavaleiro das hostes afon­sinas.

A tomada de Lisboa aos mouros foi de importância con­siderável para o aumento do território da nação portuguesa, epara prestígio das hostes do nosso primeiro rei, o Castelo sóteve interferência nessa conquista como elemento componenteda fortificação defensiva da cidade; o ataque foi feito contraa cidade e não só contra o Castelo.

Como consequência da conquista de Lisboa, as outras 00­

voações fortificadas dos arredores da cidade, Almada, Sintrae Palmela, caíram ràpidamente nas mãos dos cristãos. Só Alcá­cer do Sal é que conseguiu manter-se ainda por mais setenta

146 anos, antes de passar para o domínio da coroa portuguesa.

Page 58: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

ZoA ÉPOCA -IMPLANTAÇÃO DA DINASTIA DE AVIS

Na narração dos factos relativos à acção do Castelo nostempos calamitosos que se seguiram à morte do conde de An­deiro (sucedida a 6 de Dezembro de 1383), em que não sesabia o destino que seguiria o reino de Portugal, encostar­-nos-emos à Crónica de Fernão Lopes, que, conquanto muitoconhecida, nos dá informações pormenorizadas sobre a parteque coube ao Castelo no movimento insurrecional.

Era então alcaide de Lisboa o conde D . João Afonso Telo,irmão da rainha D . Leonor Teles, e governador ou alcaidedo Castelo, Martim Afonso Valente, homem da confiança domencionado conde.

Após a morte do valido, retirou-se a rainha para Alenquer,com o conde seu irmão, e com vários fidalgos e adeptos, entreos quais um cavaleiro Afonso Eanes Nogueira, sobrinho porafinidade do alcaide do Castelo, Martim Valente .

A rainha resolveu mandar Afonso Nogueira, com outros cava­leiros, a Lisboa, para se apossarem do Castelo.

Assim que chegou à Capital e sondou os seus partidários,encontrou muitos já mudados para o partido do Mestre de Avis,futuro rei D . João I, e por isso resolveu tomar ele a iniciativade se apoderar da fortificação por surpresa . Acompanhado pordez ou doze escudeiros, subiu pela encosta do Castelo, por umavareda que então existia em direcção à porta da Traição, queainda lá se conserva no lanço norte das muralhas do castele]o,

e entrou neste.Espalhando-se a notícia do feito de Afonso Nogueira, o povo

da cidade levantou uma grande celeuma, gritando que queriammatar o Mestre, o qual nessa ocasião pousava nos paços dobispo de Lisboa, D. João Anes, situados dentro da Alcáçova,perto da igreja de Santa Cruz do Castelo, e junto do lançoda muralha da chamada, hoje, Praça Nova.

Armou-se muita gente que correu à pressa ao Castelo; masvendo que não havia ameaça imediata contra a vida do Mestre, 147

Page 59: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

os amotinados aquietaram-se, proclamando no entanto que fa­riam pagar caro a quem tal se atrevesse.

Entabularam-se então negociações junto do alcaide MartimAfonso Valente, para a entrega pacífica do Castelo à gentedo Mestre, alegando-lhe muitas razões, entre elas a que, comobom português, devia aceder ao que lhe era solicitado .

Não se rendendo o alcaide às razões apresentadas, os par­tidários do Mestre ameaçaram combater o Castelo, e atacaras suas muralhas com um engenho chamado gata ( I) .

Mas não só eles não tinham construído este engenho, maspara o manobrarem e o fazerem chegar à muralha a picar,tornava-se indispensável entulharem prim eiro o fosso ou a cavapouco profunda que então havia nas frentes do castelejo, enivelá-la com o terren o adjacente.

Os de fora diziam aos defensores do Castelo que o entre­gassem ao Mestre, porque de contrário poriam em cima do en­genho Constança Afonso, mãe de Afonso Eanes Nogueira ecunhada do alcaide Martim Afonso Valente, assim como asmulheres e filhos dos defensores; os de dentro, receosos, amea­çavam abandonar a defesa do Castelo, a terem de matar asmulheres e os filhos.

Foi Nuno Álvares Pereira parlamentar com o alcaide doCastelo, alegando muitas e boas razões para o entregar aoMestre.

Mas Martim Afonso Valente vendo todo o povo de Lisboaalvoroçado para combater e tomar o Castelo, e também o

( 1) Este engenho era cons ti tui do por um pesad o mad eiro com umaponteira de ferr o, suspenso horizontalm ent e por cord as, de uma ar­mação ou esqueleto de mad eira , mon ta do em rodas para a sua des­locação; a armação tinha um a cobertura ou tejadilho de ma deira comcouros ou outros materiais dificilment e combustiveis; os homen s qu econstituiam a guarnição da gata imprimiam ao ma deiro suspenso ummovimento de vai-vem, percutindo assim a muralha par a nela abri rem

148 brecha.

Page 60: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

desânimo que já lavrava entre os seus, e que se recusavam apelejar para não matarem as mulheres e os filhos - se bemque a cava não estivesse ainda entulhada, nem feita a gata­

disse que estava disposto a entregar o Castelo, mas somentedepois de a rainha ter disso conhecimento, e de ele se desligardo preito de homenagem que havia feito ao alcaide de Lisboa.Foi fixado o prazo de 40 horas para a entrega do castelo aoMestre, se no entanto não lhe viesse socorro, e dado como refémo sobrinho do alcaide, Afonso E. Nogueira, que Nuno Álvareslevou para a sua pousada.

Para entravarem a entrada de socorros, os cidadãos de Lis­boa puseram guardas em toda a cidade, e muitos dormiramem volta do Castelo com candeias acesas.

À pressa mandou o alcaide do Castelo um escudeiro aAlenquer, para informar o conde João Afonso Telo do quese projectava contra o Castelo, e da indisciplina dos seus defen­sores, e pedindo-lhe para o desligar da menagem que lhe haviafeito do governo do Castelo.

O conde falou com a rainha sua irmã, a qual, em vista daestreiteza do tempo concedido para o envio de socorros, e doestado de espírito da população de Lisboa, concedeu a auto­rização pedida para a entrega do Castelo, confiando em que,mais tarde, quando tivesse recuperado a cidade, também haveriao Castelo . . .

Voltando o escudeiro para Lisboa com a resposta, expiradoo prazo, foi o Castelo, no dia 30 de Dezembro de 1383,entregue ao Mestre, que mandou tirar-lhe as portas do ladoda cidade, e mais tarde encher de terra o fosso.

O alcaide Martim Afonso e o seu sobrinho Afonso EanesNogueira passaram para o partido do Mestre, a quem serviramdepois lealmente.

Os factos que se seguiram constituem uma página das maisbrilhantes e heróicas da História de Portugal, mas já saemfora do âmbito deste trabalho . 149

Page 61: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

3.A ÉPOCA - RESTAURAÇÃO DE PORTUGAL

Depois da morte do Cardeal-rei D. Henrique, e tendo opretendente D. António, Prior do Crato, vindo de Inglaterraem Maio de 1589, com tropas para a sua última tentativa daconquista do trono de Portugal, levantou-se o rumor de queos religiosos do Carmo pretendiam auxiliar a entrada dosingleses em Lisboa, para o que tinham escondido no convento6.000 arcabuzes; o governo do Cardeal-arquiduque Alberto,então Vice-rei deste reino, ordenou que a artilharia do Castelofosse assestada contra o Convento do Carmo, para o bom­bardear. Os receios dissiparam-se, e desta vez não teve o Cas­telo que intervir.

Cinquenta e um anos depois, em 1640, deram-se os acon­tecimentos que levaram à emancipação de Portugal do jugode Espanha, os quais estão demasiado divulgados . Vamos porisso recordar aqui apenas a parte que tomou o Castelo nestemovimento revolucionário e emancipador, extractando-a de umabem conhecida História de Portugal.

No dia 1 de Dezembro de 1640 governava o reino de Por­tugal em nome de Filipe IV de Espanha, a duquesa de Mânrua,Margarida de Áustria; era secretário de Estado Miguel de Vas­concelos; e comandava o Castelo de S. Jorge um general espa­nhol pouco inteligente e nada enérgico, D. Luís deI Campo.A guarnição do Castelo era formada por 500 soldados espanhóis,e em vários aquartelamentos da cidade havia mais 500 soldadoscastelhanos, da companhia de D. Diogo de Cardenas.

Morto Miguel de Vasconcelos no Paço da Ribeira, dirigi­ram-se os conjurados para os aposentos da duquesa de Mântua,também no mesmo Paço, nos quais havia sido obrigada arecolher-se. Desfeitos todos os assomas de resistência, a vice­-rainha passou a obedecer em tudo aos conjurados.

A guarnição castelhana da cidade constituía realmente um150 perigo se ela quisesse usar da sua força e jugular a revolução.

Page 62: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Os conjurados não o desconheciam, e resolveram aprovei­tar-se do grande prestígio que lhes dera a sua rápida acçãono Paço da Ribeira para fazerem redundar em seu proveitoa obediência do governador do Castelo às ordens da vice-rainha,

Estava então preso no Castelo, Matias de Albuquerque, oheróico defensor de Pernambuco, que havia sido condenado emMadrid como culpado de imperícia, e porventura de cobar­dia . Ouvindo o rumor da revolta, e ignorando o que se pas­sava, sentiu referver-lhe nas veias o sangue de velho militar,e vendo a indecisão e falta de energia do governador D . Luisdel Campo, assumiu a direcção da defesa do Castelo, man­dando fechar as portas, c chamar a guarnição a postos. Comeste procedimento ia fazendo periga r a revolução, que lhe haviade restituir a liberdade.

No Paço da Ribeira D . Antão de Almada arrancou àduquesa de Mântua uma ordem para o governador do Castelonão interferir em qualquer acção. Matias de Albuquerque, querecebeu esta ordem, percebeu que não se tratava de um simplesmotim popular, mas de uma sublevação muito séria, e porisso abandonou o comando, deixando o caso entregue às mãostíbias do governador D. Luís del Campo.

Este, reconhecendo que a revolução tomava um grande erápido incremento, e hesitante como sempre, limitou-se a obe­decer às ordens que considerava que lhe eram legitimamentetransmitidas.

Os conjurados, vendo o bom êxito da primeira tentativajunto do governador, obtiveram da duquesa, no dia seguinte,uma ordem para D. Luís del Campo entregar o Castelo aosportugueses. Ela, completamente abatida, assinou essa ordem,e o governador cumpriu-a .

Passou assim o Castelo para as mãos dos portugueses, to­mando dele posse D. Alvaro de Abranches, que soltou imedia­tamente Matias de Albuquerque e outros presos políticos queali se achavam. 151

Page 63: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Os soldados espanhóis da guramçao foram convidados aficar em Portugal , com promessa de boa paga, e muitos assimaceitaram. O governador, com os restantes, partiu para Es­panha, julgando que o cumprim ento das ordens da vice-rainhao punha a coberto de qualquer responsabilidade . Mas quandochegou a Madrid foi preso, e depois enlouqueceu.

A tomada do Castelo de S. Jorge foi o rastilho para a entregadas outras fortalezas dos arredores de Lisboa que tinham guar­nição Castelhana, a fidalgos portadores de ordens da duquesade Mântua.

4.A ÉPOCA - PRIMóRDIOS DO REGIME REPUBLICANO

Passaram-se mais de dois séculos e meio sem que o Castelointerviesse em qualquer acção militar, e a sua guarnição gozou,dentro das suas muralhas, de ininterrupta tranquilidade.

Proclamado em 5 de Outubro de 1910 o regime republicanoda Nação, originou-se, como é notório, um mal-estar políticoe social, que se traduziu em numerosas insurreições e revo­luções, umas simplesmente de militares, e outras mistas demilitares e civis, que muito perturbaram a vida social, econó­mica e politica da Nação.

A história dessas revoluções ou insurreições é de nossos dias,e não nos ocuparemos dela. Em Lisboa as lutas travaram-senos quartéi s das tropas e nas ruas, em zonas mais ou menosextensas da cidade, e nunca tiveram por objectivo a conquistado Castelo; mas como neste havia tropas e armamento, nãopôde ele deixar de tomar parte nalgumas dessas insurreições,quer como atacante, quer como defensor da situação políticaentão vigente.

Vamos mencionar, de todas as insurreições ou revoltas quese desencadearam em Lisboa, desde 1906 até 1936, aquelasem que intervieram as tropas da guarnição, ou aquarteladasou postadas no Castelo de S. Jorge, e a sua actuação activa

152 ou defensiva.

Page 64: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

8 de Janeiro de 1918. - Tendo-se revoltado o Quartel deMarinheiros, uma bateria de Artilharia, com as suas peças pos­tadas na Pra ça de Armas e na Bateria dos Morteiros do Cas­telo, e estando presente o presidente da República Dr. SidónioPais. disparou, pelas 11 horas, umas 70 a 80 granadas sobreo cruzador Vasco da Gama, que os revoltosos tinham ido buscarà doca de Alcântara, onde estava a consertar, o qual, cmconsequência das avarias sofridas, ràpidamente se rendeu, cercado meio-dia. O Castelo não sofreu prejuízos com os tiros depeça do cruzador, os quais nem sequer perto dele rebentaram.

10 de Janeiro de 1919. - Nesta data deu-se uma subleva­ção de parte do 3." bata lhão do regimento de Infantaria n.? 33,aquartelado no Castelo, depois de assaltado o quartel pelas18 horas e meia , de conivência com alguns oficiais do mesmobatalhão. O movimento revolucionário era contra o Governoe a Junta Militar do Norte, e chefiavam-no políticos demo­cráticos e comunistas. Um oficial estranho à unidade, alferesRui dos Santos Ribeiro, que fazia parte do grupo dos assal­tantes, disparou um tiro contra o comandante do batalhão,tenente-coronel Júlio Schiapa de Azevedo, ferindo-o no pescoço.Os soldados revoltados, quando viram o seu comandante ferido,e reconhecendo que haviam sido enganados, dispararam sobreo agressor, que veio a falecer em 7 de Maio de 1920, em con­sequência dos ferimentos recebidos. Fecharam-se as portas doquartel, tiraram-se as culatras às peças de artilharia, os assal­tantes restantes foram perseguidos a tiro, e a revolta foi domi­nada pelos oficiais não conjurados.

18 de Abril de 1925 - O 2.° batalhão do regimento n.? 16,aquartelado no Castelo, mantinha-se fiel ao governo democrá-tico, que então estava no poder. Este batalhão, juntamentecom duas peças de anilharia pesada postadas na Bateria dosMorteiros do Castelo, ajudou a dominar a revolta, de carácteressencialmente militar e conservador, contra o Governo, fazendo 153

Page 65: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

fogo sobre as tropas que estavam entrincheiradas no ParqueEduardo VII , chefiadas pelo tenente-coronel de engenharia RaulEsteves, capitão-de-fragata Filomena da Câmara e capitão deart ilharia Jaime Pereira Baptista.

2 de Fevereiro de 1926. - Uma bateria de Artilharia, pos­tada na Bateria dos Morteiros, do Castelo, ajudou a sufocar,fazendo fogo contra o forte de Almada, o movimento insurre­cional, com caracteristicas radicais, que denominaram revoltade Almada, chefiado por vários oficiais e paisanos. Uma gra­nada dos insurrectos explodiu perto da porta das armas doquartel , e outra no jardim da casa do comandante.

9 de Fevereiro de 1927. - Na tarde deste dia, uma divisãode Artilharia 2, de Alcobaça, que foi postada na Bateria dosMorteiros, do Castelo, fez nove tiros contra o Arsenal da Ma ­rinha, promovendo a sufocação da revolta de marinheiros e decivis que ali se haviam entrincheirado. A insurreição era contrao Estado Novo, e chefiada por militares e políticos, que pro­clamavam que pretendiam derrubar a ditadura militar e res­tabelecer a Constituição Política da República.

20 de Julho de 1928. - Pelas 18 horas e mela deste diasublevou-se o batalhão de Caçadores n.o 7 aquartelado no Cas­telo, sob a chefia de alguns oficiais inimigos da situação políticaem vigor, e a divisão de Artilharia que lá estava instalada,fez fogo, na manhã de 21, sobre as forças leais ao Governodo Estado Novo, que se encontravam no Parque Eduardo VII.O Castelo foi cercado por destacamentos mistos de forças fiéisao Governo, e, tendo as que estavam no Parque desencadeadoum forte bombardeamento do Castelo, os revoltosos deste ren­deram-se no dia 22, às 8 horas e meia . Uma granada atingiua residência do comandante de Caçadores n.? 7, originando

154 um principio de incêndio.

Page 66: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

26 de Agosto de 1931. - Quando, nesta data, pouco depoisdo toque de alvorada, se sublevaram, sob a chefia de oficiaisdescontentes, os regimentos de Artilharia Ligeira n.? 3 e deMetralhadoras n.? 1, cujos quartéis eram situados em Cam­políde, foi o Castelo novamente bombardeado com numerosasgranadas das tropas revoltosas . Duas companhias do batalhãode Caçadores n." 7, aquartelado no Castelo, saíram dele paratomarem posições de ataque , pelo que, apesar de muitas gra­nadas terem rebentado em cheio nos telhados e paredes doquartel causando prejuízos importantes, não houve mortos nemferidos. Um avião dos revoltosos ajudou a regular o tiro contrao quartel, mas a insurreição foi ràpidamente sufocada. Umagranada foi explodir contra uma das umbreiras da porta deMartim Moniz, no Castelo .

Tais foram as acções, com feição bélica, em que tomouparte o Castelo de Lisboa.

Vê-se que não tiveram a importância que nas mesmas guer­ras tiveram as batalhas em Ourique e Valdevez , em Aljubar­rota e Valverde, e em Ameixial e Montes Claros.

Não falando na tomada de Lisboa aos mouros em 1147,em cuja acção o Castelo só interveio como constituinte dacerca que defendia a cidade, nas companhas do tempo deD . João I e de D. João IV, não houve assédios, nem sedefrontaram exércitos em luta próxima ou distante contra oCastelo; a sua missão foi mais política do que militar. Mas,pelo que narrámos, vê-se que naquelas lutas foi a posse doCastelo um dos factos que logo de princípio tranquilizou oespírito ainda tíbio dos patriotas daqueles dois períodos his­tóricos, e que mais os animou a prosseguirem no seu intento,incutindo-lhes esperanças na vitória da sua causa.

Nas guerras civis do presente século as refregas apresen­taram características diferentes. O Castelo não entrou nas lutascomo obra de fortificação ; não era um objectivo primordialde que dependesse a sorte das armas ; tinha o mesmo valor 155

Page 67: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

156

que qualquer outro quartel da guarruçao de Lisboa, como de­pósito de tropas e de armamento, e o que se pretendeu semprefoi a sua intervenção na luta geral que se travava em toda, ouem parte da área da cidade , para fazer triunfar um ou outropartido politico.

Depois de privado da sua guarnição militar, cujas últimastropas (batalhão de Caçadores 7) abandonaram os quartéis doCastelo em 18 de Julho de 1939, e de reconstituído ou restau­rado em 1939 e 1940, a propósito da comemoração dos cen­tenários da fundação e restauração de Portugal, passou a serum monumento digno do nosso respeito e carinho, não só comomodelo de uma obra de fortificação medieval, no coração dacidade, capital do Império Português, mas pela recordação,que nos aviva, da acção que desempenhou nas lutas travadaspara a consolidação da nacionalidade portuguesa, e para a suaemancipação, como Nação que queria seguir livre e indepen­dente o destino que a Providência lhe havia marcado.

Actualmente o Castelo faz parte do património da CâmaraMunicipal de Lisboa, em cuja posse entrou em 31 de Maiode 1942, e acha-se confiado à guarda da Legião Portuguesa.

Alimentamos por isso a maior esperança em que nunca maiso Castelo voltará a tomar parte em qualquer batalha, ou revo­lução, ou acção de natureza guerreira, e que a sua missão,qualquer que seja a aplicação que dele se faça, será todade paz, ao mesmo tempo que evocadora das brilhantes tra­dições da nobre alma portuguesa

Page 68: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

OS FORTES DE SANTA APOLÓNIAI

E DA CRUZ DA PEDRA

Page 69: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 70: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Os fortes de Santa Apolónia e da Cruz da Pedra (* )

Depois do rei D . Fernando ter em 1373-75 cercado Lisboacom uma muralha defensiva guarnecida com bastas torres, cpassados mais de três séculos em que não houve guerras emPortugal que ameaçassem directamente a Cidade de Lisboa,não se pensou em fazer obras que visassem a defesa da capita l,que muito se havia expandido para fora da cerca fernandina ,achando-se a povoação portanto aberta e indefesa.

No ano 1625, em pleno domínio filipino, com receio de umataque à cidade pelos ingleses auxiliares do pretendente D. An­tónio, Prior do Crato, pelos piratas argelinos, e pelas naçõescom que a Espanha andava indisposta, foram propostas, depoisde uma diligência ou vistoria feita às mura lhas, torres e portasda cerca de D. Fernando, várias providências, para, com pe­quena despesa, se poder pô-la em condições de resistência e ) ;alguma coisa se fez então, especialmente trincheiras na parteda marinha.

Mas depois da restaura ção de Portugal em 1640, e cmconsequência do estado de guerra com a Espanha, surgiu oreceio dum ataque directo a Lisboa, cuja tomada representaria,sem a menor dúvida, um golpe decisivo na nossa indepen­dência.

( *) R evista M unicipal, ano III, n ."' 11-12 , 1942, págs. 27-34 .C) El ementos, etc., por E. Freire de Oliveira, tomo III, pág. 162. 159

Page 71: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Pensou-se então novamente na necessidade de organiza r adefesa da capita l, mas, estando os cofres públicos depauperadospela longa sujeição a Espanha, ocorreu ver primeiramente sese poderia ainda aproveitar o recinto da cerca fernandina, con­sertado e melhorado, para satisfazer às necessidades de urnadefesa eficaz.

Fez-se em 1650 uma nova vistoria aos muros e portas dacerca (") , novas medidas de protecção foram propostas , levan­tou-se urna planta da cidade C), para se ver o que existiadas antigas fort ificações, e executaram-se alguns dos alvitresapresentados, tais como reparações nos muros e portas da cerca,e construção de trincheiras ao longo da margem do rio.

Mas a arte da guerra tinha avançado muito e as muraihastorreadas já não ofereciam defesa suficiente às povoações.

Estudou-se por isso a constru ção de um novo recinto forti­ficado, segundo a arte poliorcética daquela época, envolvendoa cidade, e adap tado, tanto quanto possível, aos acidentesdo terreno.

Esta linha de defesa, mandada construir por decreto de11 de Março de 1652 (' ) , era constituída, da banda da terra,por baluartes de alvenaria , ligados por entrincheiramentos deterra ou cortinas de alvenaria, com ameias ou plataformaspara peças, conforme as circunstâncias locais. Começava emAlcânta ra, onde se chegaram a construir dois baluartes, o doSacramento, do lado do rio, e o do Livramento, ao nortedaq uele, e terminava no sítio da Cruz da Pedra , onde seconstrui ram, talvez mais tarde, dois fortes, o da Cruz da Pedra,junto ao T ejo, e o de Santa Apolónia, ao norte do mesmo,

(') Elementos, etc., por E . Freire de Oliveira, tomo v, pág . 200 .(' ) Pelo arquitecto João Nunes T inoco, a qual é a planta de

Li sboa mais ant iga que se conhece .( ' ) D ecreto do principe D . T eodósio - Elementos, etc . tomo v ,

160 pág. 342.

Page 72: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

em pleno campo . São estes os nomes por que as duas últimasobras de fort ificação foram designados por João Baptista deCastro no seu Mappa de Portugal (5), e se acham em plantasantigas de Lisboa, e assim continuou a ser chamado o pri ­meiro até à actualidade, e o segundo até ao seu desapareci­mento, por 1860. O de Santa Apoló nia é também designado,nalguns documentos e mapas antigos (6) , por bateria do Ma ­

nique.O forte de Santa Apolónia tinha por missão defender o

acesso à cidade, de um inimigo vindo do lado oriental, pelasestradas de Cheias , e de Sacavém e Olivais ; e o da Cruz daPedra, dum ataque do rio, em colaboração com os outros damargem fluvial.

Ficavam distanciados cerca de 100111, e acham-se desenhados

no mapa da página seguinte, que mostra a sua localização naplanta de Lisboa actual.

O forte ou baluarte de Santa Apolónia está situado dentro

da quinta do Manique, que em 1755 era propriedade do desem­bargador Pedro Gonzaga Cord eiro C) ; pert enceu no mead o

do século XIX ao visconde de Manique, em seguida aos condes

de S. Vicente , e, depois de haver passado por mais outrosdonos , é hoje da firma G. & H. Hall, Lda.

A quinta do Manique apresentava, em planta, a formaaproximada de um tri ângulo isósceles, com o vért ice do ân-

(') L oc. cit., qu art a pa rte, ed. de 1749, pág. 200.( 6) Por exemplo, na platna qu e acom panha a obra Elogio Historico

do Senh01' R ei D . Pedro IV , pelo M arquês de Resende, Li sboa, 1867.(' ) Segundo um pro jecto do plano de urbanização da part e oriental

da cidade, logo a segui r ao terremoto de 1755, qu e existi u na extintaD irecção das Ob ra s do D istrit o de Lisboa, na ala oriental do T erreirodo P aço, e qu e ardeu em 4 de M aio de 1919. D essa planta, onde obal ua rte se acha represent ado, possuímos uma cóp ia em papel marioll . 161

11

Page 73: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

gula agudo para o sul, e era circundada, do poente pelaCalçada das Lajes, como hoje; do nascente pela Calçada daCruz da Pedra, e pela Estrada de Cheias, actualmente, nessetroço, chamada Estrada da Circunvalação ; e do norte peladesaparecida Travessa do Gargalaxo, que ligava a Calçada dasLajes com a Estrada de Chelas, e da qual resta um pequenovestígio, penetrando na propriedade pelo lado da calçada. Estatravessa separava-a da quinta do Borda de Água, de que umpequeno talhão foi incorporado na Quinta do Manique, do queresultou ter esta aumentado a sua área para o norte, onde tempor limite a antiga Estrada da Circunvalação, nesse sítio deno­minada Avenida D. Afonso III . A quinta é fechada em volta,e o muro de gola do baluarte faz parte do muro divisório dapropriedade.

o forte ou baluarte de Santa Apolónia tem a forma penta­gonal em planta, com a área de 8.044m" e a sua frente ficavoltada para a campanha ou para o oriente. Como não seconstruíram as muralhas ou cortinas que deviam ligá-lo comas outras obras do recinto fortificado, ou, se alguma coisa sefez, seria apenas um entrincheiramento de terra, hoje desapar e­cido, ligando-o com o forte da Cruz da Pedra, ficou ele coma forma de uma luneta, mas continua-se a chamar-lhe baluarte,ou simplesmente forte.

A face direita c b da frente mede 95m de comprimento, e aesquerda c d, que está inacabada em d, ou em parte demolida ,mediria, quando completa, 73m • As duas faces fazem um ân­

gulo de 127°.Os flancos, bem nítidos, inserem-se na gola, e medem 45rn

de extensão; o esquerdo e f está em parte arruinado ou incom­pleto. O muro de gola f a desapareceu, conservando apenas emcerca de 20m de extensão, junto do flanco direito , em a g, asua espessura primitiva; na parte restante f g, está reduzido a

162 um simples muro divisório da propriedade.

Page 74: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

FRAGMENTO DA PLANTA D E LISBOA QUE CONTÉM O SITIO DA CR UZ DA PEDRAESC ALA 1: I.000

Sobrepostas, a vermelho, as plantas do Balu arte de S. la Ap olón iae do de sap arecido Forte d a C ruz d a Pedra

Page 75: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

As muralhas são de alvenaria, com os paramentos revestidos

de cantaria nos sitios dos cunhais, onde se vêem ainda duas

guaritas, muito características e bem conservadas. A sua altura

é variável, regulando por 6m , a espessura é cerca de 2m ,3; O

jorramento mede aproximadamente 13 0/0; e conservam ainda

uma grande extensão do primitivo cordão de cantaria, ao nível

das plataformas ou do terrapleno interior.

Para acompanhar a inclinação do terreno exterior, a muralha

da face direita da frente apresenta dois ressaltos i, i. formando

três troços, cujo desnível se vence, do lado interior, por duas

escadas com 13 ou 14 degraus.

Os muros têm, no seu coroamento, guardas exteriores dealvenaria, na maior parte da sua extensão, e mostram, bem que

tapadas, 10 canhoneiras no troço médio da face direita da frente

i, j; na face esquerda l, c, e no troço norte da face direita c, i,acham-se construídos alegretes intervalados com assentos de

pedra; e no troço extremo sul j, b, desta face, e no flanco

esquerdo b, a, a cortina é moderna, e feita com tijolo sílico­-calcário,

O terrapleno interior acha-se de nível com o exterior na

região norte da obra; e ao mesmo nível que o caminho ou plata­

forma sobre a muralha, e portanto mais alto do que o terreno

exterior, na região sul.

O portão primitivo da obra, por onde se faziam as comu­nicações com a retaguarda, já não existe. Talvez que tivesse

sido onde está actualmente o portão de ferro h de entrada da

quinta, no n.? 6 da Calçada das Lajes, quase em frente da Tra­

vessa do Alto Varejão, que topeja na dita calçada.

Nas muralhas do baluarte podemos hoje ver dois portais m

e n, de feitura seiscentista; o primeiro no flanco direito, juntoda sua inserção no muro da gola; e o segundo ao meio da face

esquerda, quando completa, do muro da frente. Próximo daquela

conserva-se uma escada de pedra que nasce do terrapleno inte- 163

Page 76: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

rior, pela qual se sobe a um pequeno mirante construido sobreo maciço do muro do portal, mirante que fica de nivel com ocoroamento da muralha da gola, a qual mantém aí, como disse­mos, a espessura primitiva. Mas esses portais ficam voltadospara a campanha, e conquanto conservem ainda as disposiçõespara trancarem pelo lado de dentro da obra , as portas de madeiraque possuíram, são evidentemente ali enxertados em época pos­terior à da construção do forte, trazidos de qualquer parte poralgum dos antigos proprietários da quinta.

Quanto aos acessórios da obra de fortificação , ou desapa­receram, ou são difíceis de identificar.

a baluarte devia, na sua origem, ter tido um fosso de terra,mas, se chegou a fazer-se , a vida pacífica da obra permitiu queele fosse entulhado, aumentando-se assim o terreno arável da

quínta.

a abastecimento de água fazia-se de um poço p, que láestá ainda em serviço, agora com uma bomba actuada por ummotor eléctrico. A água era deitada num rerservatório próximoq, mas destina-se actualmente somente a regas.

Ao muro do portal da face esquerda da frente está contíguoum pequeno pavilhão ou miradouro r, com uma casa em baixo,e um reservatório de água em cima, para usos domésticos; epróximo dele fica um pequeno lado s.

Não se conhecem vestígios de paióis. É possível que nãose chegassem a fazer ou a concluir, ou que para esse fim se desti­nasse o reservatório q perto do poço, a que nos referimos.

É possível também que no sítio das casas que ficam do ladooposto da rua, na Quinta do Roma , que ocupam uma extensãocorrespondente ao comprimento do muro de gola da obra, eque já os mapas antigos nos mostram, fossem os quartéis daguarnição do forte , transformados actualmente num palacetecom capela, pertencente a D. Teresa Falcão Trigoso, e em case-

164 bres baixos.

Page 77: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

FO RTE DE SAJ'" rA AI'O Lô:-.' IA

Faces esque rda c di rei ta da fren te c gua·rita do cunh al das du as faces

Page 78: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

FORTE DE SA:-:TA AI'OLü:-': IA

A esque rda: po rtão da face esquerd a da frent e. ,\ d ireita: gua rira do ângulo do flanco d ir eit o e da face d irei ta da (rente

Page 79: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

o interior da obra está transformado numa linda vivenda,com uma esplêndida e desafogada vista sobre o Tejo e a Outr aBanda, e no meio de jardins erguem-se duas casas de habitaçãode dois dos donos da propriedade.

Acrescentaremos que a quinta é atravessada em túnel, agrande profundidade, pelo aqueduto das águas do Alviela,todo aberto aí em rocha, a qual aflora em vários pontos daquinta.

O forte da Cruz da Pedra ficava no sitio onde a Calçadada Cruz da Pedra se liga com a Rua da Madre de Deus, nolado sul, caindo sobre terrenos e oficinas da Companhia Portu­guesa dos Caminhos de Ferro.

Desapareceu por 1860 e tantos, em parte incorporado noster renos desta Companhia , e na parte alta substituído, maismodernamente, pelo prédio, n.O. 1 a 15 da calçada mencionada.Dele não resta o menor vestígio.

Quanto à sua estrutura pouco se sabe. Por uma planta quepossuímos, vê-se que ele devia ser uma bateria pouco elevadaacima da praia do Tejo, com uma frente maior ( 143m ) voltadapara o sueste, e outra menor (34m ) orientada para nordeste.

Do lado oposto da Calçada da Cruz da Pedra foi construída,no meado do século XIX, a casa da guarda das barreiras da cidade,para execução do decreto de 11 de Setembro de 1852 que refor­mou o Município de Lisboa. Essas barreiras foram suprimidasem 30 de Setembro de 1922, mantendo-se a casa, que serveagora de posto fiscal daquela área.

Entre o muro de gola deste forte e o da Quinta do Manique,no sítio do portão da rampa de acesso à fábrica de bebidasgasosas da firma proprietária da quinta, estava lançado sobrea rua, um passadiço ou arco, da Cruz da Pedra, que se vêem mapas antigos de Lisboa, e que provàvelmente foi cons­truído para estabelecer a comunicação privativa entre os dois 165

Page 80: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

fones, deixando livre a estrada para o serviço público (8) . A dat a

da sua construção deveria ser assim na segunda metad e do

século XVII, e a sua demolição foi em 1837 (9) .

Completament e se igno ra por quem foram planead as e exe­

cutadas estas duas obras de fort ificação. Os únicos documentos

que restam da quela época, e de que temos conhecimento, suscep­

tíveis de forn ecerem algumas indicações sobr e o assunto, são

um desenho das fortificações da cid ade devid o ao Engenheiro­

-mor Mestre de Campo, Nicolau de Langres (10), de que damos,

na página seguinte, um extracto da parte que respeita ao lad o

oriental da cidade, vários diplomas e consultas do Arqui vo da

Câmara Municipal, copiadas ou extractadas por Freir e de Oliveira

nos Elementos para a História do Município de L isboa (11),

e o que nos deixou escrito o padre João Baptista de Castro no

seu Mappa de Portugal (12).

Diz-nos este que houve doi s projectos de construção de um a

linha defensiva de Lisboa em seguida à restauração de Portugal.

( ') N ão supomos que ele tivesse sido algum dia porta da cidade,conqua nto figu re com tal designação num documento citado per L.Pastor de M acedo in L isboa de L és-a-Lés, (voI. III, 1942, pág . 64 ) .porque não conhecemos nenhum a linha de limitação da cidade anteriorao meado do século XLX qu e chegasse até ao local do arco.

(") Peregrinações em Lisboa, por N orberto de Araújo, livro xv,s/d ( 1939) , pág . 38.

('0) D esenhos Plantas de todas as Praças do R eino de Portugal.

Pelo T enent e-G eneral Nicolão de Langres t rances, que serviu ria G uerra

da A cclamação - Biblioteca N acional de Lisboa, Fundo G eral, n ." 7.445 ,desenho n. " 28, ( ano 1661 ) .

(") Especialmente nos tomos III, IV , V e V I.

(U) Edição de 1749, qu arta part e, p ágs, 204 a 209 , e edição de

166 1758, quinta parte, págs. 111 a 114.

Page 81: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

o primeiro, consistindo em 32 baluartes, foi devido aos enge­nheiros Carlos Legarte (Lasart ou Lagardat? ), francês, JoãoGilot, holandês (ou francês?) , e João Paschásio Cosmander,Jesuíta, natural de Bruxelas (ou de Lovaina ), e, por ordem doMarquês de Marialva , D. António Luis de Meneses, foi come­çado a executar.

Sobre este primeiro projecto o padre Castro dá alguns por­menores apenas da parte ocidental e noroeste da cidade, dizendoque foram construidos os fortes do Sacramento e do Livramentoc os entrincheiramentos e parapeitos até ao Alto do Carvalhão;da parte oriental apenas alude, de fugida, ao forte da Cruzda Pedra.

O marechal conde de Schomberg, diz o mesmo autor, fezver a considerável extensão que esta linha de fortificaçõesocupava, perante os escassos recursos, em homens e materialde guerra, com que poderia ser guarnecida, pelo que propôsa sua redução.

Daqui resultou a lembrança de um segundo estudo de orga­nização defensiva.

O engenheiro português Manuel Mexia da Silva, consultadosobre a redução a efectuar, encontrando maiores dificuldadesno remédio, não quis alterar a fortificação já executada; maso engenheiro francês João Gilot, que se achava em Lisboa em1652, apresentou ao príncipe herdeiro D. Teodósio, Governadordas Armas, uma nova planta, hoje perdida, mas que, em 1758,estava na posse do autor do Mappa de Portugal.

Segundo este projecto, o número de baluartes era metadedo do primeiro (isto é, 16) , e a linha de fortificações termi­nava, do lado oriental, um pouco mais para dentro de SantaApolónia.

Ora nem o desenho do album devido ao lápis de Langres(veja-se planta da página seguinte), nem aquilo que foi des­crito pelo padre Castro, correspondem inteiramente ao que estárealizado. 167

Page 82: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

ESCA L AI : 15 000 (ap roxim adam ent e)

A plan ta orig inal est á d esenhad aem escal a d u pla

LEGENDA( conforme o orig inal)

23 - O lorno d o Ti jo lo24 - N . S .- d a pen ha d e Fran ça.25 - Casa d e hum cone go.26 - do mesm o co nego .27 - Caz a d e M .e l Correa M on teiro .28 - Os Ca rda es d a Praça .29 - N .- Sr." do M on te .30 - S . Clara.31 - Caza d o Estanco d o T ab aco .32 - S .- Polon ia .38 - Caza do Carce reir o d a Cidad e.

II ,.....FRAG .\ IEI'o.'TO DA PLAI'o.'TA . F ORT IF ICAT IO N D E LlSBONN E»

Ex tr et o d o d esen ho n .v 28 d a obra

DES ENH OS I PLANTAS DE TODAS AS PRAÇAS DO REINO DE POR­T UGAL I PE LO I TENENT E GENERAL NICOL.\O DE LANGRES, I QUE

S ERVIU NA GUERRA DA ACLA- I MAÇÃO. s/d (1 661)

Biblioteca N acional de Lisboa - Fundo geral, 1t. 0 7 445.

Page 83: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

o desenho, muito incorrecto e insusceptível de se fazer coin­cidir com a planta actual da cidade, contém, além de obrasavançadas, 18 baluartes e 3 meios baluartes; mas nem os deAlcântara estão desenhados onde existiram, e em parte existem,os fortes daquele local, nem o último baluarte do lado oriental,que está representado entre as Ruas da Cruz de Santa Apolóniae a Calçada dos Barbadinhos, corresponde em planta e situação,aos fortes de Santa Apolónia e da Cruz da Pedra, que ali nãofiguram, e ficam realmente bastante distantes do sítio onde estádesenhado aquele último baluarte.

Não se compreende como é que este engenheiro, oferecendoao príncipe D. Teodósio em 1661, os desenhos de muitas praçasfortificadas e fortalezas de Portugal, tivesse incluído um desenhodas fortificações da capital com obras que não estavam cons­truídas , e com outras de diferente planta, ou fora do seu local,se já existiam naquele ano.

A planta desaparecida do engenheiro Gilot , que esteve naposse do padre Castro, e que serviu para ele bordar as suasexplicações, terminava a linha do segundo projecto antes deSanta Apolónia, o que corresponde à realidade, do que aqueleautor se poderia ter certificado se tivesse ido ao local onde obaluarte estava construído quando ele escrevia ( 1749) .

O que acabamos de dizer, bem como o facto do inacaba­mento do forte de Santa Apolónia, leva-nos a supor que as duasobras que temos estudado, ou pelo menos esta última , deveriamter sido construídas pouco antes de haver terminado a guerrada restauração ( 1668), ou nos primeiros anos da regência deD. Pedro II (13).

(") D o que diz o padr e Castro infere-se qu e o forte do Livr a­mento em Alcântar a ainda esta sendo construído no tempo de D . Pe-dro II. - M appa de Portugal, ed. de 1749, quarta parte, pág. 205. 169

Page 84: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

170

Estes fortes viveram uma vida apagada, e não nos constaque tivessem tomado parte em qualquer acção defensiva, nemmesmo durante a guerra civil do século passado ,entre os exér­citos de D. Pedro e D. Miguel.

Retirado dentro de uma quinta, num ambiente tranquilo eflorido, o baluarte de Santa Apolónia, conquanto sem valormilitar, mostra-nos um espécime da nossa arquitectura militardo século de seiscentos, e fazemos votos para que os seus futurospossuidores o saibam conservar e respeitar com o seu aspectode velho guerreiro, tão bem e com o mesmo carinho com quepor ele olham os seus actuais proprietários, a quem agradecemosa visita que se dignaram facultar-nos, e as informações que tãoamàvelmente nos prestaram.

Page 85: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

A EVOLUÇÃO PAROQUIAL DE LISBOA

Page 86: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte
Page 87: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

A evolução paroquial de Lisboa (*)

A PARÓQUIA OU FREGUESIA ECLESIASTICA

Das instituições destinadas ao exercício do culto tem o pri ­meiro e principal lugar a freguesia ou paróquia ( eclesiástica) .

Nos tempos mais antigos, à circunscrição territorial, da cidadeou do campo, em que viviam indivíduos todos sujeitos espiri ­tualmente à mesma autoridade eclesiástica, pároco, pastor oucura chama va-se collaçào (do latim collatio) .

A circunscrição territorial ou distrito da colação, tinha asua sede num templo ou igreja matriz.

Mais tarde passaram a denominar, e ainda hoje chamam,parrochia ou parochia ( paróquia ), tanto a igreja matriz ou sedeparoquial, como a sua circunscrição territorial ou colação.

Com a mesma significação, e simultâneamente, usou-se eusa-se a expressão freguesia, aplicada tanto ao distrito territorial,como à igreja matriz; aos moradores da freguesia dá-se indife­rentemente a designação de paroquianos ou de fregueses ( 1) .

( *) R evista Mumcipal, ano III, n o''' 13-14, 1942, págs, 3-5.(') V . V ocabulário Portu guez e L atino, pelo padre D . Raphael

Blutea u; verbos collação, [regues , [reguezia, parrochia e pan·oco. ­Na opin ião do falecido estu dioso Pedro A . de Azevedo, a palavr afreg uês vem de [ilius ecclesia, que, por corrupção na linguagem po­pular, passou a f ilegrês, [elgr ês, [reg uês - Freguesia form ou- se depois,sign ificando o conjunto de fregueses, assim como o local onde estes sereun iam par a o culto religioso. 173

Page 88: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

o que significava a paróquia como instituição social, e arazão do seu apreço, explica-o um apreciado escritor, infeliz­mente já falecido, J. J. Gome s de Brito, nuns brilhantes artigosque sobre as paróquias de Lisboa publicou em 1893 no Correio

Nacional.Diz este escritor, referindo-se à época do terremoto de 1755:

«Nesse tempo, os laços de inolvidada e afectuosa estima queligavam os paroquianos à sede das suas respectivas paróquias,eram mais apertados, mais persistentes; eram, pode dizer -se,indissolúveis.

«A pia baptismal, o altar da primeira comunhão, o confessio­nário através do qual passou a primeira absolvição de infantispecados, todo esse conjunto de imagens ingénuas do passado,que se corporizavam, santificadas pela crença, em outros tantossimulac ros respeitáveis, e respeitados, para acompanharem a vidado homem, agora já feito, e lhe assistirem, abençoando-o, aomais solene e jubiloso momento da sua existência, o do matri­mónio, tudo isso merecia veneração, merecia interesse, tudo issolhe merecia amor.

«De pois, a paróquia, repositono de juvenis afectos, de cren­ças pias, de memórias gratas e salutares para o espírito e parao coração, era também o paládio de tristes, e quantas vezes incon­soláveis recordações, inspiradas na sempre viva lembrança dosque haviam sido. A paróquia, se era a alegria das almas since­ramente religiosas, era também a urna funerária de todos osafectos que as haviam povoado .

«No adro da paróquia, ao longo das suas capelas, ou no chãoda igreja, atapetado de lajes mortuárias, dormiam o derradeirosono, pais, irmãos, filhos, esposas.

A paróquia era, ainda, deste modo, o campo santo, ondeem fraternal convívio, todos podiam cultivar a flor da saudadeque se inclina, beijando a campa, cada qual segundo a suador, cada qual segundo o seu afecto, cada qual conforme o seu

174 motivo.

Page 89: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

«Por isso então, como muito tempo depois, como ainda hoje,que nem tudo está de todo mirrado, não faltava a devoçãoparoquial.»

Esta apreciação é relativa ao meado do século XVIII ; ante­riormente, quando a religião era mais fervorosamente cultivada,mais apertados eram os laços que às freguesias ligavam os paro ­quianos, e por isso a freguesia apresentava os característicosde instituição extremamente estável e conservadora (2) .

Os párocos tinham, nas freguesias de Lisboa, várias deno­minações honoríficas ou predicamentos, a algumas das quaiscorrespondiam graus de hierarquia da dignidade eclesiástica :cura, v igário, prior e reitor. No acto da colação ou posse dolugar, o prelado dava ao beneficiado a denominação que entendia,mas em geral conservava a anterior.

As variadas denominações dos párocos de Lisboa foram extin­tas pelo decreto de 29 de Junho de 1859, assinado pelo Card eal­-Patriarca D. Manuel Bento Rodrigues, e substituídas pelo predi­camento único de prior.

Os párocos, para a sua nomeação pelo bispo ou arcebispode Lisboa , eram escolhidos ou apresentados pelas pessoas ouentidades padroeiras das igrejas, e alguns, mas raras vezes, eramprovidos mediante concurso C).

C) Ape sar do seu aspecto de sin geleza, a definição de paróquiatomou-se confusa, quando con siderada por vários ramos da administra ­ção pública. Qu ando se tratou da organização do Gemo de 1864 assen­tou-se qu e devia ser considerada paroquia, a circunscrição territoriale religiosa qu e tívesse registo paroqu ial, um paroco, qu er proprlo, queramovível, quer humilde, quer de elevada hierarquia - Gemo no 1.·de 'Janeiro de 1864, pág. 1 - Adiante veremo s como o actual CódigoAdministrativo define a paróquia civil.

(' ) Na obra Portu gal S acro-Profan o, etc ., por Paulo Dias de Niza,parte I, 1767, pág s. 321 e segs., vêm menci onados os titulos ou deno­mina ções que tinham os pároc os de Li sboa, e as pessoas e entidadesque se apresentavam nessa época. 175

Page 90: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Os decretos de 30 de Julho de 1832 e de 5 de Agosto de 1833

extinguiram todos os padroados eclesiásticos do Reino, e trans­

feri ram para o poder executivo a faculdade de nomear e apresentar

todas as dignidades e empregos eclesiásticos.

Depois da proclamação do regime republicano, o decreto

com força de lei de 20 de Abril de 1911, que separou as Igrejas

do Estado, fez implicitamente passar para a autoridade eclesiás­

tica todas as atribuições relativas aos provimentos das freguesias,

e desde então a nomeação e colocação dos priores de Lisboa

é feita pelo Cardeal-Patriarca, nos termos do Código de D ireito

Canónico (Canan 455 , § 1.0) (4) , sem qualquer interferência

do poder civil.

Anti gamente, eram as igrejas privativas ou mat rizes das fre­

guesias consideradas bens da igreja, propriedade dos padroeiros,

ou dos representantes de quem as tinha mandado construir, ou

das corpo rações fabriqueiras que as administravam e olhavam

pela sua conservação.

Depois do terremoto de 1755, tendo ficado muitas paro­

quiais derruídas total ou parcialmente pelo cataclismo e pelo

incêndio que lhe seguiu, foram os seus serviços instalar-se tem ­

porária e provisoriamente em barracas construídas na ocasião,

ou em ermidas, ou noutras igrejas, enquanto aguardaram o res­

tauro das suas próprias igrejas, ou a edificação de novos templos

privativos, ou ainda que lhes fosse fixado definitivamente o seu

novo local.

Depois da abolição do regime absoluto, o decreto de 5 de

Agosto de 1833 estabeleceu, em princípio, a supressão de todas

as Ordens Monásticas, tanto de Religiosos como de Religiosas,

(') Código promulgado em 27 de Maio de 1917 , e que começou176 a vigorar em 19 de Maio de 1918,

Page 91: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

e em virtude do mesmo começou-se a dar por extintos e profa­nados os conventos de frades, mediante sentença da Junta doMelhoramento Temporal das Ordens Religiosas.

Mas no ano seguinte promulgou-se o decreto de 28 de Maiode 1834 que extinguiu de vez os conventos, mosteiros, colégios,hospícios e mais Casas que eram propriedade de religiosos dasOrd ens Regulares, incorporando-se os edifícios e mais bens dessasOrd ens nos Próprios da Fazenda Nacional.

A extinção dos mosteiros de freiras foi mais lenta, e, já aliásprevista, até certo ponto, no breve do Papa Benedito XVI , expe­dido em 23 de Agosto de 1756, teve por base o citado decretode 1833, e a combinação deste com outros diplomas posterior­mente promulgados, especialmente os que decretaram a desa­mortização dos bens das Congregações Religiosas, levaram àinterpretação e resolução de se permitir às freiras que perma­necessem nos seus mosteiros até à morte da última, em seguidaao que estes se considerariam suprimidos ou extintos, entrandoos seus bens móveis e imóveis na posse efectiva do Estado (") .

Em virtude dessas providências governativas , o Estado, deposse das igrejas, dos conventos e dos mosteiros (6) , deu-lh es

(' ) T estemunhamos o nosso agradecimento aos D rs. António LuísGomes, directo r geral da Fazenda Pú blica e Alb erto Ribeiro Queirós,chefe da repart ição do Pat rimónio, pelas in formações que nos pres­taram, e pelas facil idades que nos facultaram para o exame dos do­cumentos das suas repart ições, e bem assim ao nosso particular amigoJosé da Cun ha Saraiva, direc tor do Ar qu ivo H istórico do Ministériodas F inanças, que, pelos seus estudo s e perfeito conhecimento dos do­cumentos do Arquivo a seu cargo, nos proporci onou elementos quevaliosamente contribuiram para o presente trabalho.

(6

) O pad re João Bapt ista de Cas tro aplica invari àvelment e a de­nominação de COI/v entos às Ca sas Religiosas habit adas por fr ades; em oste iros às ocupadas por fr eiras. P orém na linguagem popul ar, noslivros e crónic as antigas , e em documentos oficiais, indiferentementese usam estas du as denominações. Adoptaremos n este trabalho a dis-tinção feita pelo autor do M appa de Portu gal. 177

12

Page 92: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

destinos variados, e muitas de Lisboa foram aplicadas a templosparoquiais de freguesias que se achavam mal acomodadas emigrejas acanhadas, ou muito arruinadas.

Implantado o regime republicano, logo em 8 de Outubrode 1910 foi promulgado um decreto, em virtude do qual passa­ram para o Estado os edifícios de corporações religiosas, umdos quais, em Lisboa, está servindo de igreja paroquial de umafreguesia, a de Santo António de Campolide.

Mais tarde, o decreto de 20 de Abril de 1911 determinouque as catedrais, igrejas, capelas, e mais bens mobiliários e imobi­liários aplicados ao culto público da religião cristã passassema propriedade do Estado e dos Corpos Administrativos, salvoo caso de serem propriedade de uma pessoa particular, ou deuma corporação com individualidade jurídica.

Para cumprimento de determinações deste decreto foramnomeadas Comissões para o arrolamento dos edifícios e maisbens aplicados ao culto e adstritos às igrejas, que não fossemaveriguadamente de particulares ou de instituições com carácterjurídico.

Pelo inquérito a que se procedeu verificou-se quais as igrejascuja propriedade se não podia comprovar, e que por isso foramdesde logo consideradas pertencentes ao Estado, e quais as quepossuíam título justificativo de serem de Irmandades ou Con­frarias, geralmente do Santíssimo Sacramento, ou de particulares.

A respeito de cada igreja paroquial mencionaremos, quandonão for do Estado, qual a entidade que se averiguou, pelo refe­rido inquérito, ser então a proprietária do templo.

As paroquiais que estavam abertas ao culto assim conti­nuaram, e posteriormente foram-se cedendo algumas outrasigrejas, a título precário, e depois com carácter já um tantoou quanto definitivo, a entidades que se encarregavam do exer­cício cultural.

A Concordata celebrada em 7 de Maio de 1940, entre aSanta Sé e o Governo Português, aprovada pela lei n.? 1.984

178 de 30 de Maio de 1940, e o seu regulamento de 25 de Julho

Page 93: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

do mesmo ano, reconheceram à igreja católica a propriedade,

sob certas reservas, dos bens que anteri ormente lhe pertenciam

e que estavam ainda na posse do Estado.

Deste modo o Estado reconheceu à Igreja a propriedade,

além de outros templos, das igrejas paroquiais e de outras onde

se achava exercendo o culto, e que de facto ela já estava fruindo

por meio das irmandades fabriqueiras e de outras corporações

encarregadas do serviço litúrgico C).

A maioria das igrejas paroquiais de Lisboa foi sõmente ben­

zida; mas algumas foram sagradas, isto é, dedicadas ao seu

titular ou orago, com várias solenidades litúrgicas ; são estas :

a dos Mártires, Sacramento, Santa Isabel, Estrela , Graça, natu­

ralmente a Sé, e consta que S. Vicente. As demolidas igrejas

de S. Julião, de Santa Marinha e dos Mártires consta que tam­

bém foram sagradas.

o que caracteriz a materialmente as igrejas paroquiais é a

existência da pia bapti smal, e do cart ório; este com os livros

de assentos dos baptismos, casamentos e óbitos dos paroquianos ,

e antigamente também com os de registo das perfilhações, eos róis dos confessados.

Pelo Código do Registo Civil de 18 de Fevereiro de 1911

foi determinada a transferência dos livros de registo paroquiais

para as Conservatórias do Registo Civil, criadas pelo referido

código, à medida que fossem desaparecendo ou fossem sendo

substituídos os párocos que então estavam à testa das freguesias.

(' ) A Constituição P olít ica da República, de 22 de Fevereiro de1933, já aliás tinha preceitu ado, no artigo 47.°, que nenhum templo,edifício ou objecto do culto afecto a uma religião, poderia ser destinadopelo Estado a out ro fim. 179

Page 94: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Os livros de registos continuaram a ser escriturados pelospárocos até 31 de Março de 1911, e depois começaram a passarpara as Conservatórias, onde, na presente data ( 1943) já seencontram todos os das freguesias de Lisboa, com excepção dosde Santa Catarina e S. Paulo .

Nestas repartições públicas praticam-se, com carácter civil,os actos e registos que eram efectuados nas igrejas pelos párocos ;apenas os registos de baptizados foram substituídos pelos denascimentos.

Nas freguesias iniciou-se então a escrituração de novos livros,para registo de bapti smos, casamentos e óbitos, mas unicamentepara efeitos eclesiásticos.

Uma disposição (art. 155.°) do actual Código do RegistoCivil, de 31 de Dezembro de 1932, determin ou que os livrosanteriores aos últimos 100 anos fossem remetidos para a Ins­pecção das Bibliotecas e Arquivos Erud itos, e por isso acham-seos mais antigos livros dos cartórios das paróquias de Lisboaguardados actualmente numa dependência do Arquivo da T orredo Tombo, no edifício do convento de S. Vicente.

Em Lisboa usou-se assinalar nas paredes dos préd ios os limi­tes de algumas freguesias ; uma dessas marcas ainda existe, e aoutra desapareceu quase nos nossos dias.

A primeira consiste numa lápid a com o feitio de um livroaberto, um pouco escachado, encastrada na linha dos prédiosn,OS 1 e 3 do Beco das Farinhas, e contém a seguinte inscrição :

FREGA

DE S

CH RIS

TOUAô

FREGADE S

LOURE~ÇO

..o\NNO MDCa.XX

A outra, de que conservamos a recordação, consistia numacruz esculpida em pedra , embebida na parede, por cima da

180 porta n." 93-A da Rua do Benformoso, no sítio do tubo de

Page 95: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

algeroz que está na prumada dessa porta. A haste da cruz eraindicativa dos limites das freguesias do Socorro e dos Anjos.

Outras marcas deviam ter existido, mas delas nem resta amemória.

Alguns párocos e outros escritores, especialmente da classeeclesiástica, levados pelo muito amor que professavam pelasfreguesias onde exerciam o seu ministério, ou cujo convívio cari­nhosamente cultivavam, empenharam-se em pesquisar nos res­pectivos cartórios todas as notícias que pudessem servir paraapurar a origem, a história, ou a nobilitação das suas freguesias.

São os estudos desses pacientes investigadores as fontes prin­cipais de que hoje se pode lançar mão para consignar o que setem averiguado sobre muitas, e especialmente sobre as maisantigas freguesias de Lisboa.

Julgamos, mesmo, que dificilmente se poderá acrescentarmais alguma coisa importante ao que esses escritores nos lega­ram sobre o assunto até ao seu tempo, não 5Ó porque eleso deixaram, por assim dizer, esgotado, mas porque muitos dosdocumentos originais ou se extraviaram no decurso do tempo,ou foram destruídos pelos incêndios e terremotos, e especial­mente pelo do 1.0 de Novembro de 1755.

ANTES DA RECONQUISTA CRISTÃ DA CIDADE EM 1147

Logo nos dois ou três primeiros séculos da era cristã, durantea dominação romana, teve o Cristianismo uma grande expan­são na Península Ibérica , como se infere das perseguições movi­das pelos imperadores romanos, do martírio de vários prelados,e da assistência de muitos bispos em vários concílios celebradosem terras da Península.

Foi aqui muito violenta a perseguição aos cristãos no tempodo imperador romano Diocleciano, sendo tradição corrente quenessa época (no ano 307) foram martirizados em Lisboa os 181

Page 96: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

irmãos Veríssimo, Máxima e Júlia, patronos da igreja de Santos­-o-Velho, em cujo local, acrescenta a tradição, os corpos daquelesmárt ires tiveram sepultura.

A história deixou também registados os nomes de váriosbispos de Lisboa (8), interrompendo-se a sua memória duranteos quat ro séculos do domínio muçulmano.

Porém este povo, como se sabe, era mui tolerante com oscristãos sujeitos ao seu jugo. A troco de certos encargos, goza­vam os moçárabes de alguma s regalias, que com o andardos tempos foram ainda aumentando, tornando quase insen­sível o jugo dos mouros sobre os seus inimigos de raça e decrença.

As igrejas e mosteiros, ao princípio em pequeno número,multiplicaram-se por toda a parte, e as antigas paróquiasornaram-se e ornamentaram-se com os primores da arteoriental (9) .

Não nos ficou, porém, notícia alguma de prelados da igrejalisbonense durante o período do domínio sarraceno, mas énatural que os houvesse, como sucedia noutras terras de Por­tugal sujeitas àquele domínio (Beja, Braga, Coimbra, Porto,Viseu) (10).

O cruzado Osberno, um dos cristãos da conquista de Lisboaem 1147, fala por duas vezes, sem nos dizer o nome, de umbispo que estava com os sitiados ( 11), bispo que foi assassinadona ocasião do saque à cidade pelos cruzados.

(') M appa de Portugal, por J. Bapt ista de Castro, tomo m, 1763,págs . 96 a 101.

(") M emorias para a Hi storia de um S cisma, por J. Augusto Fer­reira, 1917, pág . 67.

('0) Historia da Igreja em Portugal, por Fortunato de Almeida,tomo I, 1910, pág . 162.

( 11) Portugalia Monumenta Historica, S criptores, vol. I, pág . 398,182 col." 1.', pág. 404, col." 2.'.

Page 97: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

DA CONQUISTA CRISTÃ ATÉ AO FIM DO SÉCULO XIV

Tomada Lisboa, foi por D. Afonso Henriques investido nasfunções de prelado do novo ou restabelecido bispado, um sacer­dote inglês D. Gilberto, que vinha na armada com os cruzados.

D. Gilberto foi sagrado pelo arcebispo de Braga D. JoãoPeculiar, que fazia parte da comitiva do rei, tendo o novoprelado jurado obediência ao arcebispo de Braga, como Metro­polita (12) .

Quando entraram na cidade, os cristãos encontraram já umtemplo preparado e adaptado para o culto, não tendo carecidomais do que purificá-lo , para as primeiras acções de graçaspelo êxito da campanh a contra os infiéis ; era provàvelmentea mesquita, em seguida demolida, que existiu no local onde hojevemos a igreja da Sé.

Este templo foi então, no dizer de um cronista contempo­râneo, reparado e restituído às suas funções de sede episco­pal (13), o que revela que já anteriormente havia tido a mesmacategoria, e por conseguinte domínio espiritual sobre umapopulação cristã, e sobre as freguesias que porventura a cons­tituíam.

Talvez para apagar de todo o vestígio de haver servido detemplo de uma seita inimiga da religião que os conquistadoresprofessavam, ou por ser de acanhadas dimensões, apesar denele se terem encontrado, depois de entrada a cidade, mais de200 cadáveres acumulados, e mais de 800 doentes, foi delibe­rado, segundo todas as probabilidades, demoli-lo, e erigir umaigreja no mesmo sítio para as novas funções eclesiásticas, obede­cendo às regras e estilo arquitectónico então em uso.

( " ) H istoria da I greja em Portugal, por Fortunato de Almeida,tomo l, 1910, pág. 188.

(13) .• purijicatum est tem plum ab archiepiscopo et coepiscopisLlI I?" , et reparatur inhibi sedes episcopatus, - Portu galia M onumentoHistorica, S criptores, vol, I, 1856, pág. 405, col ," l.~. 183

Page 98: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Foi ele levantado, segundo dizem alguns autores, e con­forme comprovam os estudos críticos modernos, pelo reiD. Afonso Henriques, naturalmente por sugestão ou planos dobispo inglês D. Gilberto, acostumado às magnificências dostemplos que já enxameavam pelo seu país, e por outras terrasda Europa (14).

Além da Sé, é tradição, mas ignora-se o seu fundamento,que pela mesma ocasião foi também purificada, para servirpara o culto cristão, uma mesquita moura que teria existidono local da igreja que tem hoje a invocação de Santa Cruzdo Castelo (15).

Não há documentos dessa época que nos digam que igrejasparoquiais existiam na cidade conquistada e nos seus arredores,mas todos os autores antigos que sobre este assunto escreveramsão concordes em que o bispo D. Gilberto fundou , junto doscemitérios que os cruzados tinham instalado nos montes deS. Francisco (cemitérios dos ingleses) e de S. Vicente (dosflandrenses e colonenses), dois templos, que foram respecti­vamente as sedes ou os predecessores das paróquias dos Már­tires e de S. Vicente . O arcebispo D. Rodrigo da Cunha (16)adiciona a estas, não sabemos com que fundamento, uma terceirafundação paroquial pelo mesmo bispo, que foi a de Santa Justa.

Ainda alguns autores atribuem ao reinado de D. AfonsoHenriques a criação da freguesia de Santa Maria Maior no temploda Sé (em 1170? ).

Mas deveria D. Gilberto, nomeado bispo de Lisboa, exercera sua jurisdição sobre apenas as três ou quatro mencionadas

CH) Veja-se o artigo do arqui tecto A . Couto sobre a origem do

templo in: Lisboa Amiga, 2." parte, Bairros Orientais, por J. de Ca s­tilho, 2." ed., voI. v, 1936, pág. 131.

C'") Lisb oa Amiga, Bairros Orientais, 2." ed . vol. IV , 1936, pág. 19.('6) Historia Ecclesiastica da Igreja de Lisboa, 1.0 vol., 1642 ,

184 fi. 62, col." 2.".

Page 99: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

paróquias? Não haveria já no dilatado espaço que estas afas­tadas paróquias circunscreviam, numerosos núcleos paroquiais,dentro e fora da cerca moura, ou primitiva muralha de circun­valação da cidade, que, por serem notórios, se julgava desnecessá­rio lembrar?

Em breve voltaremos a tratar este assunto.

Passados 17 anos sobre a conquista, um documento men­ciona a existência da freguesia de Santa Maria Madalena (17 )( 1164), do lado poente da cerca moura, e alguns anos depois,em 1191, encontra-se menção de uma outra freguesia, deS. Pedro (de Alfama) (18), esta do lado oriental da referidacerca.

Um documento que existia em 1668 no Cartório do Con­vento de S. Vicente de Fora, e referente a um sínodo realizadoem 1191 pelo bispo D. Soeiro Anes na Sé Catedral de Lisboa,e de que nos dá notícia um dos cronistas daquele convento (19),menciona como existentes no referido ano as seguintes 6 igrejascolegiadas, sedes de freguesias:

a) EXTRAMUROS DA CERCA MOURA:

S. Vicente;Nossa Senhora dos Mártires;Santa Justa.

b) INTRAMUROS DA CERCA MOURA:

Santa Cruz da Alcáçova;S. Bartolomeu;S. Martinho;S. Jorge.

e') Mappa de Portugal, por J . Baptista de Castro, 2.' ed., 3.° vol.,1763, pág. 361.

(18) Historia Ecclesiastica da Igreja de Lisboa, por D. Rodrigoda Cunha, 1642, fi. 99, col." 1....

(39 ) Chronica da Ordem dos Conegos R egrant es do Patriarca SantoAgostinho, 2.' parte, pág . 145. 185

Page 100: 94 - Gabinete de Estudos Olisiponensesgeo.cm-lisboa.pt/fileadmin/GEO/Imagens/GEO/Livro_do_mes/Vieira_d… · MAPA II ESCALA 1: 5 0.0 00 CONVENÇõES ... de Cima, num terreno ao norte

Verifica-se assim que no final do século XII , o da conquistada cidade, havia nesta, com a maior probabilidade, subordi ­nadas ao bispado de Lisboa , as seguintes 10 freguesias:

1 - S . VICENTE;2 - NOSSA SENHORA DOS M ÁRTIRES;3 - S&' , A J USTA;4 - SANTA MARIA DA S É;5 - SAlIo, A MARIA MADALENA;6 - SANTA Csuz DO CASTELO;7 - S. BARTOLOMEU;8 - S. MARTINHO;9 -S.JORGE;

10 - S. P EDRO ( de Alfam a ).

No Arquivo Nacional da Torre do Tombo guarda-se umpergaminho datado da era 1247, emendada posteriormente para1267 eO) (anos de Cristo 1209 ou 1229), o que o faz remontarao reinado de D. Afonso II ou de D. Sancho II, que, além das10 freguesias paroquiais de Lisboa e arrabaldes acima citadosmenciona mais as 13 seguintes:

I l -S. J ULIÃO;12 - SANTA MARINHA DO O UTEIRO;13 - S. LOURENÇO;14 - S . NICOLAU;15 - SANTO ANDRÉ;16 - SANTO EsTÊVÃO ( de Al fama ) ;17 - S. MIGUEL ( de Alfama ) ;18 - SANTA j'viARIA DE ALCAMIM ( S . Cristóvão );19 - S . MAMEDE ;20 - S. J OÃo ( Bap tista ou da P raça );21 - S. T OMÉ ( do P en edo ) ;22 -S. JACOB ( S . Tiago ) ;23 - S . SALVADOR ( da M at a ) .

C·') O título do documento é R elação de cartas igrejas de quee/-Rei é padroeiro II OS bispados do Porto, Lamego; T'uy, Coim bra :eLisboa - Gaveta 19, maço 14, n. " 7 - Está tr anscrito no Livro das

186 Gavetas, gaveta 19, maço 14, fi. 186 v.",