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Cidade e Natureza

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EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Presidente Plinio Martins Filho (Pro-tempore)

Comissão Editorial Plinio Martins Filho (Presidente pro-tempore)

José Mindlin

Laura de Mello e Souza

Oswaldo Paulo Forattini

Tupã Gomes Corrêa

Diretora Editorial Silvana Biral

Diretora Comercial Eliana Urabayashi

Diretor Administrativo Renato Calbucci

Editora-assistente Cristina Fino

Reitor Jacques Marcovitch

Vice-reitor Adolpho José Melfi

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© 1999 Livros Studio Nobel Ltda.

Livros Studio Nobel Ltda.Rua Maria Antônia, 10801222-010 – São Paulo – SPFone/Fax: (11) 257-7599e-mail: [email protected]

Distribuição / VendasLivraria Nobel S.A.Rua da Balsa, 55902910-000 – São Paulo – SPFone: (11) 3931-2822Fax: (11) 3931-3988

Edusp – Editora da Universidade de São PauloAv. Prof. Luciano Gualberto, Travessa J, 3746º andar – Ed. da Antiga Reitoria – Cidade Universitária05508-900 – São Paulo – SP – Brasil Fax (0xx11) 818-4151Tel. (0xx11) 818-4008/818-4150www.usp.br/edusp – e-mail: [email protected]

É PROIBIDA A REPRODUÇÃO

Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida sem a permissão por escrito doseditores por qualquer meio: xerox, fotocópia, fotográfico, fotomecânico. Tampoucopoderá ser copiada ou transcrita, nem mesmo transmitida por meios eletrônicos ougravações. Os infratores serão punidos pela lei 5.988, de 14 de dezembro de 1973,artigos 122-130.

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

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em memória de meu pai

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Coordenação EditorialCarla Milano

Edição de TextoMartha Assis de Almeida Kuhl

CopydeskCláudia Jorge Cantarin Domingues

RevisãoCecília Santos

CapaMinoru Naruto

ComposiçãoCompLaser Studio Gráfico

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Marcondes, Maria José de AzevedoCidade e natureza: proteção dos mananciais e exclusão social / Maria José de

Azevedo Marcondes. — São Paulo : Studio Nobel : Editora da Universidade de SãoPaulo : Fapesp, 1999. — (Coleção cidade aberta)

Bibliografia.ISBN 85-85445-83-1

1. Desenvolvimento sustentável – São Paulo, Região Metropolitana 2.Guarapiranga, Bacia hidrográfica 3. Mananciais – Leis e legislação – São Paulo,Região Metropolitana4. Política ambiental – São Paulo, Região Metropolitana 5. Solo urbano – Uso–São Paulo, Região Metropolitana 6. Urbanização – Aspectos ambientais– SãoPaulo, Região Metropolitana I. Título. II. Série.

99-4178 CDD-711.420981611

Índices para catálogo sistemático:1. São Paulo : Região Metropolitana : Meio ambiente e urbanização : Planejamento

urbano 711.4209816112. São Paulo : Região Metropolitana : Urbanização e meio ambiente : Planejamento

urbano 711.420981611

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Sumário

Agradecimentos ................................................................................................ 11

Introdução .......................................................................................................... 13

Capítulo 1: Cidade e meio ambiente: revendo conceitos ............................ 19Da Escola de Chicago ao projeto de cidades sustentáveis, 24. A concepçãoecológica e a vertente neoclássica do espaço, 25. A produção social doespaço, 29. O espaço do pós-fordismo, o tema da sustentabilidade e oprojeto de cidades sustentáveis, 34. Da idéia de natureza à expressão “meioambiente”, 39. Meio ambiente e determinismo tecnológico, 42. Opensamento contemporâneo sobre meio ambiente, 44. O debate ambientaloficial e sua crítica, 45. O meio ambiente e a produção social do espaço, 50.Do antiurbanismo americano à pauta do saneamento urbano: a agenda doambientalismo, 52.

Capítulo 2: A cidade e as águas ..................................................................... 59Dos chafarizes à gestão das águas, 62. Cidade ideal e águas limpas: o debatesobre a proteção dos mananciais, 67. Os fundamentos da legislação: omodelo de proteção ambiental, 70. A visão do meio ambiente na legislação,87. A produção social do espaço e a lei, 92. A lei de mananciais, os espaçose os interesses privados, 101.

Capítulo 3: A cidade real e (in)sustentável ................................................ 115Controle ambiental e os vetores de expansão urbana, 132. A especificidadeda irregularidade e da clandestinidade nos mananciais, 155. O impacto docontrole ambiental na localização industrial, 176.

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Capítulo 4: Experiências e projetos sustentáveis: o Programa Guarapiranga193Guarapiranga: fronteira entre a cidade e a mata atlântica, 196. O ProgramaGuarapiranga: projetos sustentáveis e cidades insustentáveis, 202. O futurodas águas do Guarapiranga, 206.Capítulo 5: Cidade e natureza no limiar do século XXI. Possibilidades elimites de um urbanismo ecológico nos mananciais ................................ 217Referências bibliográficas ............................................................................. 225Índice das tabelas .......................................................................................... 237Índice das figuras .......................................................................................... 238

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Agradecimentos

Este livro é resultado de um percurso acadêmico e profissional em quebusquei interpretar uma realidade – a questão dos mananciais hídricos – na qualintervi durante dez anos. Essa trajetória foi sempre acompanhada por outros pro-fissionais e amigos, aos quais gostaria de agradecer aqui.

O tema deste livro é baseado na minha tese de doutorado defendida emmarço de 1996 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de SãoPaulo, intitulada Urbanização e meio ambiente: os mananciais da metrópolepaulista. Reitero aqui meu agradecimento ao arquiteto Cândido Malta CamposFilho, pelo trabalho de orientação da tese e pelo inestimável apoio para a pu-blicação deste livro.

Agradeço também as contribuições, nos capítulos referentes à tese de dou-torado, dos professores Daniel Joseph Hogan, da Unicamp; Carlos Celso Amarale Silva, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; FlávioMagalhães Villaça e Marta Dora Grostein, da Faculdade de Arquitetura e Urba-nismo da Universidade de São Paulo; e à professora Susana Pasternak Taschner,também da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo,pelo auxílio no manuseio dos indicadores sociais.

Aos pesquisadores, arquiteta Carol Golffield Lopes e arquiteto AlexandreA. Dallari Guerreiro, pelo trabalho de levantamento de dados e pela extensa tarefade planimetria das áreas urbanizadas; à arquiteta Ana Cristina Moraes Barbosa,pelo mapeamento do uso do solo, e ao estagiário Damiano Aimara MarcondesLeite, pela elaboração das tabelas.

À engenheira Maria Helena M. H. Cintra, ao engenheiro Horácio WagnerMatheus e à geógrafa Francisca Luiza Gimenes Cardieri, técnicos da Prefeitura

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do Município de São Paulo – Sehab-Resolo, da Secretaria do Estado do MeioAmbiente – Departamento do Uso do Solo Metropolitano e da Emplasa (EmpresaMetropolitana de Planejamento da Grande São Paulo), respectivamente –, peladisponibilidade de documentos e informes, e à equipe do Centro de Documen-tação Técnica da Emplasa, pela gentileza e atenção com que facilitaram meutrabalho de pesquisa.

Registro meus agradecimentos a todos os que compartilharam este trabalhode alguma forma, desde o início da década de 1980, quando atuei como coor-denadora da equipe de Terras da Assessoria de Habitação no âmbito da PrefeituraMunicipal de São Paulo, um período marcado por freqüentes ocupações de glebaspor movimentos populares de habitação nas áreas de mananciais da região suldo município, momento em que despertei para o conflito da cidade invadindo aságuas.

Agradeço, em especial, ao engenheiro Ivan Carlos Maglio, pelas ines-gotáveis discussões que travamos sobre o planejamento e gestão das águas, naocasião da formulação e implementação de programas de recuperação ambientalpara a bacia de Guarapiranga, de propostas de mitigação de impactos ambientaisde projetos nessa referida bacia, bem como da formulação e implementação doPrograma de Saneamento Ambiental desenvolvido pelo Governo do Estado deSão Paulo com o Banco Mundial e as prefeituras envolvidas, programa em queatuei como coordenadora na Secretaria de Estado do Meio Ambiente durantequatro anos.

Não poderia deixar de agradecer também às organizações não-governa-mentais, como o Instituto Socioambiental e a Fundação Mata Atlântica, espe-cialmente a João Paulo Capobianco e a Mário Mantovani, pela participação nadiscussão dos trabalhos de cooperação entre as organizações que atuam na baciado Guarapiranga e as entidades não-governamentais italianas, Legambiente, Pan-gea e Terra Nuova. Essa participação mantém vivos o diálogo e o contato coma problemática abordada neste livro.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico –CNPq, pelo auxílio financeiro concedido para a realização da pesquisa da tese quefundamenta este livro.

À Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo – Fapesp peloapoio financeiro que tornou viável a realização desta obra.

À arquiteta Carla Milano, editora da Studio Nobel, e à Edusp – Editora daUniversidade de São Paulo pela oportunidade desta publicação.

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Introdução

Este livro aborda a relação entre urbanização e meio ambiente, por meiodo estudo do impacto de uma legislação ambiental específica – a de proteção dosmananciais – nos processos de produção do espaço da metrópole paulista.

O texto busca refletir e expor questões em torno da relação cidade e natu-reza no limiar do século derivadas da inexorabilidade da urbanização dos terri-tórios e dos limites e da possibilidade de um urbanismo ecológico nos marcos daestrutura fundiária vigente e dos processos mais gerais que estruturam a produçãodos espaços – com uma leitura desses processos concretos – em que a naturezaé urbanizada, integrada aos espaços construídos das cidades.

Para os propósitos citados elegemos como estudo de caso a problemáticada proteção dos mananciais hídricos da metrópole paulista. Assim, constituem osobjetivos gerais deste trabalho o entendimento dos determinantes básicos dosprocessos de estruturação do espaço na metrópole, a análise do impacto da apli-cação da legislação de proteção dos mananciais promulgada em meados dadécada de 1970 e os horizontes possíveis de atuação por meio das normas e dire-trizes de recuperação e proteção dos mananciais recentemente promulgadas.

Ao analisar a configuração do espaço paulistano, consideramos especial-mente a especificidade da irregularidade e da clandestinidade evidenciadas nosprocessos de expansão na área urbanizada nos mananciais, o possível impacto docontrole ambiental na localização industrial e, ainda, o preconizado impacto daaplicação da legislação específica ao tema no direcionamento da expansão urbanada metrópole para os quadrantes leste-nordeste em detrimento aos vetores norte-sul, sudeste e sudoeste.

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A segunda vertente do trabalho centra-se na leitura dos chamados projetossustentáveis implantados em uma região emblemática, com ênfase nos problemasque se articulam a partir da interseção entre o processo de urbanização de umametrópole inserida no contexto das cidades globais – como é o caso de São Paulo,caracterizada por uma urbanização fragmentada e excludente – e a dinâmica dosrecursos hídricos existentes em seu território. Na região escolhida para tais inter-venções – a do Guarapiranga, no vetor sudoeste da metrópole –, a urbanizaçãode pequena parcela de sua superfície territorial (15%) gerou o aporte brutal decargas poluidoras na represa, colocando em evidência as possibilidades de perdade produção de água com qualidade compatível para o abastecimento públicocom tratamentos convencionais, bem como as formas perversas de urbanização vi-gentes.

Outro aspecto analisado diz respeito aos limites e às possibilidades de apli-cação dos novos instrumentos de gestão ambiental fundados em conceitos nalinha da desregulamentação, flexibilização das normas, compensação ambientale urbanização compartida, num novo cenário institucional a partir da proposta deproteção e recuperação ambiental do Plano de Desenvolvimento e Proteção Am-biental da Bacia do Guarapiranga, formulada no âmbito das novas diretrizes deproteção e recuperação dos mananciais do estado de São Paulo.

A nosso ver, a ampla extensão do território legislado – 53% da superfíciemetropolitana –, as especificações do instrumento de controle ambiental por meiodo uso e ocupação do solo adotado na década de 1970 e as diretrizes atuais deproteção ambiental levantam possibilidades diferenciadas de enfocar questõesreferentes à natureza da produção do espaço urbano e ao alcance de políticaspúblicas ambientais, apontando para os caminhos possíveis da relação entre ci-dade e meio ambiente nos dias de hoje.

Cabe ainda mencionar outro aspecto que motivou a análise do impacto dalegislação citada anteriormente nos processos recentes de produção e apropriaçãodo espaço metropolitano: a possibilidade de averiguar a proposição formulada noPlano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado – PMDI (Governo do Estadode São Paulo, 1970) –, segundo a qual a lei de proteção dos mananciais, intera-gindo com outras medidas estabelecidas no referido plano, objetivava redirecionaro crescimento da região metropolitana no vetor leste-nordeste e prover um sistemaintegrado metropolitano de grandes espaços abertos, com vistas a proteger osrecursos hídricos, consubstanciando um conjunto de estratégias de estruturaçãofísico-territorial, sob a égide do II Plano Nacional de Desenvolvimento – PND –,elaborado em 1974.

Nas últimas duas décadas, temos presenciado um vigoroso questionamentoda racionalidade exposta nas políticas de controle do espaço, emergindo um con-

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junto de novas referências a serem pesquisadas. O contexto atual, marcado pelafragmentação dos discursos e práticas e pela idéia de concretização de pactosterritoriais entre os vários atores sociais, em contraposição ao estabelecimento demodelos rígidos formulados pela tecnocracia do Estado, levanta novas questões,tanto no que diz respeito ao discurso neoliberal como no que se refere a setorescomprometidos com a questão socioambiental.

A proposição de estruturas de planejamento totalizantes foi amplamentequestionada após os anos sessenta, quando se deu a fragmentação dos discursose práticas, no bojo do questionamento do próprio pensamento moderno (Harvey,1993), de acordo com o qual se estruturam as práticas por nós estudadas e ocontexto no qual se insere este livro.

O ponto de partida do trabalho consistiu na elaboração de uma resenha dodebate teórico sobre a produção do espaço urbano, desde as contribuições daEscola de Chicago, da década de 1920, passando pela teoria urbana francesa dadécada de 1970, até os projetos para uma cidade sustentável, concebidos porautores da atualidade. Com isso, pretendeu-se organizar questões no plano teóricoque pudessem aprofundar a análise dos processos concretos de produção do es-paço e da proteção ambiental.

Ainda com o mesmo propósito, faz-se a resenha de algumas abordagens dopensamento contemporâneo no que tange ao meio ambiente em torno das tesesconservacionistas e das várias concepções de desenvolvimento sustentado, natentativa de conduzir uma reflexão sobre a aparente oposição entre urbanizaçãoe natureza.

No segundo capítulo, analisa-se um dos recursos ambientais mais críticosem face dos processos de apropriação dos recursos naturais pela urbanização –as águas –, situando-o no quadro de indicadores de diversos países. Procuramosidentificar a problemática, a saber o conflito entre a proteção das águas e dosdemais recursos ambientais e o processo de urbanização, de modo a criar con-dições de estudo de outras áreas metropolitanas do país.

O caso de mananciais da metrópole paulista é analisado no contexto his-tórico: desde a construção de chafarizes para abastecimento no final do séculoXIX à desapropriação de áreas de proteção dos mananciais – que se constituemhoje nas nossas reservas florestais –, passando por uma intervenção mais incisivado Estado a partir da década de 1930 por intermédio da elaboração de medidasde controle da poluição até o modelo de gestão das águas adotado em 1993, quecontém a proposta atual em direção à adoção da experiência francesa das agênciasde bacias hidrográficas.

Nesse mesmo capítulo, são examinados os fundamentos da legislação am-biental de proteção dos mananciais editada na década de 1970 e a visão de espaço

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e meio ambiente que permeia os textos legais. O trabalho de pesquisa apoiou-sena leitura dos textos da legislação de proteção dos mananciais, nos de legislaçãoambiental e de zoneamento industrial, bem como nos documentos técnicos ela-borados pela Emplasa e, posteriormente, pela Secretaria de Estado do MeioAmbiente.

No capítulo em questão, concebeu-se a resenha das diferentes propostas derevisão da legislação de proteção dos mananciais metropolitanos, com assinala-mento das concepções de espaço e meio ambiente subjacentes.

A perspectiva dos diferentes setores da sociedade, no horizonte dos espaçose interesses privados e da mediação do Estado na questão, é enfatizada na análisedo período compreendido entre meados da década de 1980 e o início da décadade 1990, marcado por uma presença intensa do Estado no processo de regula-mentação da questão ambiental, tendo sido o território metropolitano redesenhadolegalmente por meio da promulgação de diversas unidades de conservação.Assim, buscamos organizar elementos que contribuíssem para a avaliação daespecialização e dos limites da atividade regulamentadora do Estado, nessas déca-das, e para a compreensão da dimensão, do significado e do impacto dessa nor-matização nos processos de estruturação do espaço metropolitano.

De fato, quanto ao contexto institucional presenciou-se uma ampliação dasatribuições do Estado na área em foco. Tal movimento é praticamente contrárioao verificado nos demais setores da sociedade, em que sua presença decresceu.Entretanto, o redirecionamento das funções do Estado, configurando-se num“Estado regulamentador”, evidencia-se na ampliação de suas funções, no que serefere à gestão dos recursos ambientais até meados da década de 1990. Hoje, suaatuação na área ambiental também está passando por um processo de redefinição.

Assim, na análise empreendida, partiu-se do ponto de vista de que a rees-truturação do sistema econômico internacional depois da crise dos anos setentaredefiniu formas de gestão então existentes, incorporando o discurso da qualidadede vida ambiental. Resta-nos indagar qual a amplitude e o significado do pa-radigma ambiental nos processos de estruturação urbano-industrial, no caso dametrópole paulista.

No terceiro capítulo, abordamos o processo recente de estruturação físico-territorial da Região Metropolitana de São Paulo e sua relação com a legislaçãoambiental. Procuramos resumir os resultados da pesquisa empírica realizada sobreas alterações no espaço físico-territorial metropolitano nas três últimas décadas,a partir dos indicadores urbanísticos, demográficos, econômicos e ambientais edos informes da aplicação da legislação específica, por exemplo, autuações eaprovações de empreendimentos. Deu-se ênfase às questões de expansão da man-cha urbana e a alguns aspectos da localização industrial.

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O caminho percorrido no plano empírico demandou um intenso trabalho delevantamento de dados acerca da evolução da mancha urbana citada anteriormentee do uso e ocupação do solo das áreas protegidas, bem como de indicadores am-bientais e socioeconômicos.

A análise realizada refere-se, sobretudo, aos processos urbano-regionais dametrópole. Para as áreas contidas nos limites de proteção dos mananciais, em-preendeu-se uma análise da dinâmica do uso e ocupação do solo.

A pesquisa cobre os anos de 1965 a 1991. Com o corte temporal propostobuscou-se avaliar o período imediatamente anterior à vigência da legislação,delimitando-se o ano de 1965 como marco inicial por caracterizar um novo qua-dro político-econômico, com reflexos intensos nos processos de urbanização dametrópole paulista.

Auxiliaram na delimitação desse período o levantamento aerofotogramé-trico do território metropolitano realizado em 1965 e os dados censitários exis-tentes. Foi feita a atualização apenas de alguns indicadores necessários ao enten-dimento do tema.

Para interpretar o material levantado, apoiamo-nos sobretudo em trabalhosque versavam sobre a alteração da estrutura espacial, política e econômica dametrópole a partir de 1965, quando esta passou a experimentar os efeitos do pro-fundo processo de concentração espacial e de renda, bem como do intenso ritmode investimentos que remodelaram radicalmente o espaço urbano.

Apoiamo-nos igualmente nas análises dos efeitos da crise econômica dosanos oitenta e dos reflexos da reestruturação em curso, traduzida no cenário mar-cado por processos caracterizados pela desconcentração industrial, ou seja, adiminuição do ritmo de crescimento industrial nas metrópoles em relação a outrasregiões e diminuição do ritmo de crescimento populacional metropolitano.

Buscamos também inserir questões relativas a uma nova discussão: comoos processos de reestruturação econômica no período que vem sendo denominadopós-fordismo e os processos de globalização da economia se refletem nos pro-cessos de produção dos espaços e dirigem os destinos ambientais das grandescidades, dentre as quais se inclui a cidade de São Paulo, objeto de nosso estudo.

No terceiro capítulo, pretendemos, portanto, a partir dos elementos em-píricos levantados, responder a estas questões: quais os fatores importantes naprodução do espaço? Que fatores contribuem para a expansão metropolitana?Qual sua relação com a produção do espaço? Qual a especificidade da produçãodo espaço na área de proteção dos mananciais e qual o impacto da legislaçãoambiental específica nesses processos?

No quarto capítulo são apresentados os conceitos e fundamentos que nor-tearam a proposta de intervenção na bacia de Guarapiranga, tema do programa

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desenvolvido pelo governo de São Paulo e o BIRD (Banco Internacional de Re-construção e Desenvolvimento), do qual participei como coordenadora da Secre-taria do Meio Ambiente até meados da década de 1990. A inclusão desse tópicovisa à leitura crítica da implementação dos chamados projetos sustentáveis, comuma avaliação do alcance das propostas de compatibilização entre urbanização eproteção ambiental a partir de uma experiência concreta.

Por fim, buscamos uma conclusão acerca das questões levantadas em tornoda relação entre cidade e meio ambiente no limiar do século XXI, tendo em vistaa inexorabilidade da urbanização dos territórios e os limites e possibilidades deum urbanismo ecológico.

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Capítulo 1Cidade e meio ambiente:revendo conceitos

A idéia de natureza tem permeado as formulações teóricas urbanas comdiferentes significados. Helen Rosenau (1988), no amplo mapeamento que fez dosmodelos de cidades ideais na teoria urbana, destaca que já em Vitrúvio (século Id.C.) existia a compreensão da relação entre o homem e o que a autora denominauniverso, conforme mostra o diagrama dos ventos para a localização das ruas nomodelo de cidade ideal por ele formulado.

A partir do Renascimento, vincula-se a imagem da natureza às preocupaçõessociais nos modelos de cidades ideais, com a incorporação preconizada deelementos naturais principalmente na questão das águas. Em Alberti (1401-72),essa imagem aparece do ponto de vista formal, manifestada no tratamento dasruas, as quais deveriam ser traçadas “à maneira de rios” (Rosenau, 1988). Nascidades fluviais sugeridas nos desenhos e descrições dos manuscritos do escultore arquiteto Antonio Averlino, conhecido como Filarete (1400-69), e, posterior-mente, nos projetos que se encontram no Manuscrito B do Instituto de França deLeonardo da Vinci (1452-1519), detectam-se as preocupações sociais do livreacesso dos trabalhadores e artesãos à água por intermédio da análise das ilus-trações de canais fluviais penetrando nas cidades.

No Alto Renascimento, Thomas More concebeu modelos utópicos de ci-dade publicados em sua obra A utopia, de 1516. Idealizando 54 tipos de cidadesna “ilha da Utopia”, descreveu, na principal delas, a presença das águas delimi-tando a cidade, os florescentes e abundantes jardins e o cinturão verde do campo.

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Nessa obra, segundo Choay, “é possível ler tanto a nostalgia de uma ordem pas-sada como a intuição futurista de transformações sociais futuras (…), na medidaem que propõe um modelo de organização do espaço suscetível de ser realizadoe com capacidade de transformar o mundo natural (…) e adota o conceito deespaço-modelo solidário de uma concepção da história e do trabalho apoiada porum sistema de valores” (1985, pp. 152-62). Vislumbra-se, pois, nessa leiturade A utopia de More a superação da idéia, presente no Renascimento, de umanatureza intocada associada ao mito do sagrado.

Choay assinala que o texto de More pôde e pode ser abordado por meiodas dimensões moral, religiosa, econômica e poética; porém, o que queremosdestacar é a vitalidade desse texto, ajustado às problemáticas das sociedades e dacultura ocidentais. Trata-se de uma obra que anuncia questões e proposições queecoaram nos autores utópicos posteriores: a limitação do tamanho das cidades, ocultivo de jardins em seu interior e a integração cidade-campo (Spirn, 1995).

No período maneirista, a preocupacão social que integrava o conceito decidade ideal renascentista foi substituída pelo formalismo, por uma preponde-rância do plano regular, geométrico, adequado à necessidade de cidades forti-ficadas, isolando, por conseguinte, o “mundo natural”. No barroco, as cidadesplanejadas de Versalhes na França e Karlsruhe na Alemanha apresentam o mesmocaráter formal com o traçado em leque, mas com possibilidades de expansãoilimitada na paisagem. Em ambos os períodos, entretanto, o tema da naturezaincorporado à estrutura urbana apresenta-se na forma de um “naturalismo con-solador, oratório e formativo, que durante toda a época que vai de 1600 a 1700tinha dominado a episódica narratividade das sistematizações barrocas”, Tafuri(1985, p. 14).

A partir do século XVIII, a idéia de natureza se faz presente na forma dasutopias antiurbanas. A propósito do tema, Tafuri afirma que “as utopias antiur-banas têm uma continuidade histórica, que vai das propostas do Iluminismo – e,a propósito, não se deve esquecer que as primeiras teorias anarquistas sobre anecesssidade de uma dissolução das cidades surgem precisamente na segundametade do século XVIII – à teoria da cidade-jardim, ao desurbanismo soviético,ao regionalismo da Regional Planning Association of America (RPAA), à Broad-acre-City de Frank Lloyd Wright”. Essas propostas muitas vezes apresentaram umconteúdo conservador, integrando um movimento nostálgico em contraposição àangústia da alienação metropolitana.

A evocação da idéia de natureza na construção dos modelos ideais de ci-dade foi amplamente enfatizada durante o Iluminismo. A partir dessa época pre-dominou a noção, presente até os dias atuais, do naturalismo urbano associado àrestauração de uma natureza perdida, ou, empregando os termos de Tafuri ao

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comentar a obra de Laugier sobre a cidade setecentista, “o apelo ao naturalismosignifica simultaneamente apelo à pureza original do ato de configuração do am-biente” (1985, p. 14). As propostas de Patte (1723), de incorporação de elementosnaturais à estrutura urbana; de Laugier (1753), da analogia da cidade como flo-resta; dos reformadores clássicos Boullée e Ledoux (1783 e 1775) para Paris eChaux, respectivamente, de um modelo de cidade implantada em um cenáriorural; e o plano de L’Enfant (1771) para Washington, configuram uma nova ma-neira de encarar a vida urbana.

Para Tafuri, porém, esse naturalismo urbano, presente nas propostas euro-péias com a inserção do pitoresco na arquitetura, e a valorização da cidade tendema negar a dicotomia entre cidade e campo. Tais propostas procuram adequara cidade às novas condições históricas e sociais e “naturalizar” o novo espaçoconstruído pela emergente classe social dominante.

O tema da natureza também esteve presente nas utopias urbanísticas deconteúdo social igualitárias do século XIX, momento em que o conceito clássicode cidade se desagregou, sendo estimulado o conceito de cidade-campo nos mo-delos comunais utópicos de que nos fala Françoise Choay (1979). A esse respeito,Choay menciona as propostas de Owen (1771-1858), em que os espaços verdessão concebidos a partir do isolamento das indústrias em cidades voltadas às ques-tões sanitárias; as de Fourier (1772-1837), que preconiza protótipos das edifi-cações comunitárias – as falanges –, dispostas em anéis concêntricos, separadospor relva ou plantações; e Cabet (1788-1856), cuja cidade foi elaborada com apresença abundante de vazios e do verde voltados à higiene e à salubridade.

No utopismo político da cidade oitocentista, a proposta mais contundentede integração entre cidade e natureza é o modelo de cidade-jardim idealizado porEbenezer Howard (1898), que retomou alguns dos aspectos das cidades utópicasrenascentistas de Thomas More e de Leonardo da Vinci, a eles acrescentando asindústrias e as ferrovias nos diagramas geométricos ilustrativos de seus esquemas,como observam Mumford (1982) e Spirn (1995).

A formulação de Howard constitui uma reação à aglomeração urbana doperíodo vitoriano, caracterizado por exacerbada admiração pelo campo e pela na-tureza em face das condições da vida nas cidades. Em sua proposta, cada cidade-jardim – limitada a 30 mil habitantes e rodeada por um cinturão verde – deveriafazer parte de uma constelação de cidades-jardins circundadas pelo campo.

As apropriações desse conceito foram inúmeras, destacando-se inicialmenteas aplicações do próprio Howard nas situações concretas de Welwyn e Letch-worth e, posteriormente, os esquemas teóricos das unidades de vizinhança nosEstados Unidos nos anos trinta de Clarence Stein e Henry Wright, bem como oPlano de Abercrombie e Forshaw (1946) na Londres do pós-guerra. Contudo, a

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integração dessas cidades com a natureza foi reduzida à incorporação de algunselementos naturais ao espaço urbano.

Ao lado dessas implantações concretas do ideário das cidades-jardins e dasutopias antiurbanas, o pensamento urbanístico neste século retoma e potencializao projeto racionalista da cidade industrial de Garnier (1869-1948), traduzido nostrabalhos de Le Corbusier (1922), Gropius (1926) e Mies van der Rohe (1927),cuja melhor definição é encontrada no termo “cidade-máquina” de Hilberseimer(1920). Em contraposição às visões do urbanismo moderno da cidade concebidacomo um grande parque e da aglomeração urbana tratada como uma cidade verde,Tafuri destaca no projeto de cidade-máquina a ausência do conceito de espaçoe de lugar e as expressões da idéia de natureza associadas ao antinaturalismo.

Na cidade-modelo de Le Corbusier, “a forma assume a função de tornarautêntico e natural o universo não-natural da precisão tecnológica e, na medidaem que esse universo tende a subjugar integralmente a natureza, num processocontínuo e co-envolvente de transformação, é a própria estrutura antropogeo-gráfica o sujeito sobre o qual irá incidir o ciclo reorganizado da construção deimóveis”, segundo Tafuri. No plano de Le Corbusier para Argel (1937), a di-mensão de suas intervenções é a própria paisagem, sendo a “reestruturação datotalidade do espaço urbano e paisagístico exigências da racionalização da orga-nização da máquina citadina” (Tafuri, 1985, pp. 86-8), em que o antinaturalismoadquire, segundo o autor, um valor simbólico para tal racionalização.

Em outros termos, no projeto de cidade-máquina a idéia de natureza pre-sente é a natureza racionalizada e artificializada.1 A esse respeito, Reis Filho(1967) desenvolve uma analogia dos planos do racionalismo dos anos trinta comos planos maneiristas do século XVII e a expressão destes na concepção da na-tureza:

Os planos racionalistas apresentam a mesma rigidez e o mesmo caráterideal dos planos maneiristas, no século XVII. São frutos de um conjuntode princípios teóricos, captados através da razão (…). Seus autores acei-tavam e valorizavam a verticalização e outras formas de centralização, alia-das, porém, à reconciliação do solo urbano com a natureza. Eram cidades-jardins verticais, onde as preocupações com a paisagem não se ligavammais a razões de ordem romântica – antiurbanas ou antiindustriais –, masa razões de ordem higiênica, como a insolação e a aeração dos edifícios(1967, pp. 44-6).Esse ideário da “natureza artificializada” é reiterado no zoneamento fun-

cionalista proposto pela Carta de Atenas,2 que domina o pensamento urbanísticoaté os anos sessenta do século XX, com vários desdobramentos nas intervençõesurbanísticas nas cidades neste século.

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Outra corrente importante no urbanismo moderno do século XX, que bus-cou a integração da cidade com o meio natural, foi a abordagem antiurbana queprosperou nos Estados Unidos em torno do modelo da Broadacre-City, com aspropostas de Frank Lloyd Wright na década de 1930. Entretanto, tais propostasnão consubstanciam a tão almejada integração entre cidade-natureza, pois “eli-minam não só a megalópolis, mas também a idéia de cidade em geral. A naturezavolta a ser ali um meio contínuo, no qual todas as funções urbanas estão dispersase isoladas sob a forma de unidades reduzidas”, de acordo com Choay.

A crítica ao projeto modernista é iniciada durante a Segunda Guerra Mun-dial. Após a década de 1960 surgiram abordagens da cidade como a do con-textualismo de Rossi (1971) e posteriormente o que Frampton (1997) denominouregionalismo crítico, que buscavam recuperar os conceitos ausentes no urbanismomoderno de espaço e de lugar. Esses movimentos, no entanto, diziam respeito àsdimensões da história e da cultura local, e não do ambiente natural.

Após a década de 1980, o tema ambiental permeou as formulações urba-nísticas não mais em soluções globalizantes para a cidade, mas fragmentada-mente, em torno de projetos objetivando megaintervenções urbanísticas em par-cerias estabelecidas entre o setor público e o privado, com a atribuição de umnovo papel às cidades no âmbito do chamado empresariamento da administraçãourbana (Hall, 1995; Harvey, 1996).

Tais intervenções buscam normalmente a revitalização de territórios degra-dados, com a incorporação de elementos naturais presentes no espaço “water-front”, reafirmando a relação cidade-água. Constituem exemplos emblemáticos,embora com diferentes abordagens e níveis de complexidade distintos, os projetosde Inner Harbor em Baltimore, Boston Waterfront em Boston, South StreetSeaport em Nova York, Rom Rijnmond em Rotterdam, Puerto Madero emBuenos Aires e Docklands em Londres. Contudo, a inserção dos elementosnaturais não pressupõe a integração entre cidade e meio ambiente, e sim incor-poração do meio natural ao projeto urbano, ou seja, a utilização da “natureza” deacordo com sua inserção no projeto urbano3.

A perspectiva de análise de um urbanismo ecológico iniciada por Geddes(1915) e a tentativa de Lewis Mumford (1982) de escrever uma história ecológicada urbanização devem ser resgatadas na historiografia urbana, com o propósitode esclarecer a relação entre cidade e natureza ao longo do tempo. Neste livrolevamos em consideração apenas os vários matizes dessa relação, destacando asdistintas interpretações e apropriações da idéia de natureza em cada momentohistórico, por meio de uma rápida incursão às análises críticas da teoria urbanaelaboradas por Rosenau (1988), Choay (1979, 1985), Tafuri (1985), Reis Filho(1967) e Mumford (1982).

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No presente, alguns autores têm questionado os vínculos entre o projeto ouo discurso de conteúdo ambientalista, que emergiu a partir dos anos setenta, notratamento de temas anteriormente recortados pela questão social e as reestru-turações que vêm se processando no bojo do sistema capitalista, com novas for-mas de abordar os processos produtivos e os de desregulação (Tapalov, 1992),questão que demanda outra linha de reflexão para a pesquisa urbana.

A análise desses conceitos será efetuada nos marcos da teoria urbana refe-rente à produção do espaço, desde as contribuições da Escola de Chicago dadécada de 1920, passando pelo debate sobre a produção social do espaço nos anosmais recentes, até as proposições sobre cidades sustentáveis formuladas na atua-lidade.

A fim de sustentar tais análises, discorreremos também sobre os matizes daexpressão meio ambiente, amplamente utilizada nos vários campos do conhe-cimento, e que substitui o conceito de natureza na história do pensamento urba-nístico ao longo do século XX.

Da Escola de Chicago ao projeto de cidades sustentáveis

O componente ideológico e as possibilidades efetivas de aplicação práticaque permearam a idealização do campo e da natureza nas formulações utópicasdo urbanismo devem ser objeto de reflexão, a fim de, por meio de seu enten-dimento e de sua dimensão histórica, referenciar o significado do paradigma am-biental e da expressão contemporânea do naturalismo, assim como as proposiçõesde autores da atualidade em direção a um projeto de cidades sustentáveis.

Os processos de produção do espaço urbano, entretanto, se deram à reveliadas utopias urbanísticas e dos paradigmas ambientais. A estrutura fundiária temsido determinante na relação entre cidade e meio ambiente, como expõe Spirn:

A magnitude da migração durante os séculos XIX e XX para os subúrbioslevou, finalmente, os problemas ambientais da cidade para o campo, crian-do um muro maciço de propriedades privadas entre aqueles que viviam nointerior da cidade e as áreas rurais mais além, um muro ainda mais efetivona separação da cidade em relação ao campo circundante do que as amplasfortificações dos séculos XVII e XVIII (1995, p. 51).

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Os processos de degradação e o alto grau de artificialização dos ecossis-temas naturais em decorrência dos processos de urbanização são bastante conhe-cidos e correntemente investigados na literatura contemporânea sobre o tema eatravés das teorias formuladas sobre o processo de urbanização, sobretudo nospaíses em desenvolvimento. Vale destacar que esses processos remontam a váriosperíodos históricos, embora o ritmo da deterioração ambiental tenha se acentuadona última metade do século XX.

Neste século, espaço humano passou a ser entendido como o espaço ur-bano, ainda que envolto na mística da idéia de natureza degradada nas grandescidades. A urbanização dos territórios assume proporções tão gigantescas, a pontode urbanistas como Argan (1992) falarem na possibilidade de unificação de todaa superfície terrestre por intermédio da utilização de um único sistema de infor-mação e comunicação.

A concepção ecológica e a vertente neoclássica do espaço

A teoria relativa à natureza do espaço urbano, defendida pela Escola deChicago, e as teorias econômicas neoclássicas da localização foram o estatutoteórico unificador das várias abordagens acerca dos conceitos de espaço urbano eurbanização do período entreguerras até meados da década de 1960, com vá-rios trabalhos acadêmicos e propostas efetivas de intervenção.

A pesquisa urbana no século XX foi profundamente marcada pela influên-cia norte-americana em duas épocas distintas: primeiro, no período entre duasguerras mundias, com o estudo, dirigido pela Escola de Chicago, dos mecanismosde integração e desorganização social nas grandes cidades em períodos de cres-cimento acentuado. O segundo período, imediatamente posterior à SegundaGuerra Mundial, é representado pelos trabalhos da Escola de Michigan, que tra-tam dos fenômenos de difusão urbana e de constituição de regiões metropolitanasinterdependentes e hierarquizadas (Castells, 1972).

O pensamento da Escola de Chicago, consolidado na publicação The Cityem 1925,4 que reunia os artigos de Robert Park, R. McKenzie e Ernest Burgess,tinha como base a questão urbana relacionada com a problemática da cidade, vistacomo um corpo social específico (costumes e tradições) que segue certas regrasde crescimento, caracterizada por uma determinada densidade de população e umsistema de valores e comportamentos.

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Para esses autores, urbanização consiste um processo organizado a partirde um modelo de interação entre os homens e o meio (Castells, 1972). É o cres-cimento urbano explicado com base nos paradigmas funcionalistas, conceitos que,embora suplantados há várias décadas no âmbito da teoria urbana, ainda integramo debate da questão ambiental, conforme veremos adiante.

Com vistas a detectar os elementos estruturantes do espaço, interessa-nosneste momento destacar aspectos da teoria ecológica da expansão metropolitana.

Ecólogos como Burgess (1923), Homer Hoyt (1939) e Harris e Ullman(1945) descreveram modelos da estrutura intra-urbana. O primeiro usou a estru-tura dos círculos concêntricos com densidades decrescentes; o segundo, a es-trutura por setores a partir do ponto central, separando níveis sociais; e Harris eUllman, o da polarização em torno de núcleos múltiplos de serviços. Foi o mo-delo de Burgess, porém, o que exerceu maior influência nas análises sobre ocrescimento urbano.

De fato, os tópicos componentes do modelo clássico preconizado por Bur-gess – de zona concêntrica e seu esquema interpretativo de crescimento urbanoapoiado na noção de centralidade (modelo de crescimento radioconcêntrico) –acabaram por se constituir nos organizadores fundamentais das teorias ortodoxasdo espaço no período do pós-guerra e nos da vertente sociológica, tal como arepresentada por Schnore, que estudou a adaptação do modelo de Burgess decentro-periferia para a América Latina (Schnore e Hauser, 1976).

A crítica à fragilidade do pensamento teórico da Escola de Chicago é am-plamente conhecida, tendo se iniciado no âmbito dos próprios ecologistas (ossocioculturais) com o reconhecimento da não-aplicabilidade universal do modelode Burgess.5 Contudo, a ruptura desse pensamento deu-se apenas nos anos ses-senta, quando Castells (1972), por meio de um levantamento amplo, concluiu,sobretudo, que os problemas urbanos não eram de integração, e sim de gestão dosistema social e, portanto, do conjunto urbano.

Nos anos cinqüenta, a teoria ecológica foi retomada por autores comoHawley, autor de Ecologia humana. Hawley, de acordo com Gottdiener (1993),manteve-se fiel à Escola de Chicago, buscando, porém, agregar os conceitos deinterdependência e localização, tal como formulados na obra de McKenzie.

Hawley recuperou ainda o quadro das zonas concêntricas de Burgess, cons-tituindo uma teoria do crescimento da comunidade, em que se destaca a impor-tância da tecnologia de transportes. As idéias desse autor, em conjunção com asteorias da economia e da geografia urbana na perspectiva neoclássica, compõema base da teoria da localização.

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Outra concepção de espaço, cuja matriz teórica derivou da perspectiva eco-lógica, foi a do sistema de cidades, formulada a partir da teoria dos lugares cen-trais de Christaller (1933) e aprimorada por Berry e Thompson. Tais teorias tam-bém seguiram a orientação do ecologista McKenzie.6

Tanto em Estudos de urbanização como em Economia y PlanificaciónUrbanas e A produção social do espaço são combinados elementos de análisecomo interdependência funcional, perspectiva regional e a importância das ati-vidades econômicas numa rede hierarquizada, constituindo o que se denominasistema de cidades.

Essa abordagem, que predominou na geografia urbana até o final da décadade 1960, forneceu-nos instrumentos que subsidiaram uma análise crítica dos traba-lhos técnicos sobre a urbanização da metrópole paulista, produzidos pelos órgãosoficiais do período. Adicionalmente, propiciaram uma síntese de informaçõessobre o processo concreto de estruturação do espaço metropolitano.

Ainda no âmbito da ciência convencional, cabe apontar alguns aspectos quea análise da economia urbana neoclássica permite entrever e que se encaixam nospropósitos deste texto.

As teorias sobre a economia urbana surgiram com o desenvolvimento dasteorias do espaço econômico, que são essencialmente teorias da localização dasatividades econômicas, estruturadas em torno da atividade industrial, de serviços,ou ainda da atividade institucional, em virtude dos custos de transportes.

Essas teorias têm por base a ênfase no agente econômico – a empresa –,do qual se maximiza a utilidade – o lucro – por meio da escolha de uma insta-lação ótima num espaço homogêneo e indiferenciado.7

A teoria, segundo a qual o espaço é concebido como uma distância a sersuperada pelo transporte, foi desenvolvida por Weber em 1909 e retomada peloseconomistas neoclássicos nas décadas de 1960 e 1970, dentre os quais citaríamosLowdon Wingo (1961), Alonso (1964) e Mills (1972), que aperfeiçoaram os es-quemas teóricos, introduzindo novos aspectos e ampliando os modelos para outrosusos do solo, além do industrial.

Lowdon Wingo desenvolveu uma teoria sobre o mercado da terra e os cus-tos de transportes. Em seu esquema teórico, cada indivíduo trataria de maximizarsua renda, localizando-se mais perto do trabalho. Assim, criar-se-ia uma con-corrência por localizações próximas ao centro, o que elevaria o preço da terranessas regiões. Para esse autor, a densidade se eleva com o preço das terras: altano centro e tendendo a zero na periferia.

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William Alonso por sua vez preconizou um modelo de equilíbrio geralentre os diferentes usos da terra e desenvolveu pressupostos vários sobre o preçodesse bem, relacionando as variáveis crescimento demográfico, distância ao centroe melhoria nos transportes. Ao contrário de Wingo, para Alonso a melhoria nostransportes poderia reduzir o preço dos terrenos no centro, aumentando o valordos da periferia. Como efeito, ter-se-ia o aumento de terras a serem urbanizadase a conseqüente expansão do tecido urbano.

Já mais recentemente, nos anos setenta, Edwin Mills, partindo da hipótesede que a intensidade do uso do solo urbano é mais alta do que a do solo rural,apresentou uma multiplicidade de usos econômicos, considerando necessário inse-rir as rendas urbanas em um modelo capaz de descrever a demanda e a oferta dosolo para usos de natureza diversificada.

Quando transportadas para o contexto urbano, as teorias da localização naabordagem neoclássica, baseadas no princípio do mercado como mecanismo dedistribuição equilibrada das atividades no espaço, converteram-se em teorias daestrutura urbana, assentadas em variáveis tais como distância e densidades, porsua vez relacionadas com o comportamento dos preços. O eixo comum entreessas teorias é o interesse na maximização do uso de certas localizações paraindivíduos e firmas (Derycke, 1983, e Della Donne, 1983).

De acordo com Malta Campos Filho (1989), a teoria da localização neo-clássica apresenta várias contribuições para o estudo da forma urbana, apesar denão introduzir o conceito de espaço e de tempo na análise econômica, uma vezque é desenvolvida a partir do ponto de vista de uma firma ou de um consumidorhipotético e genérico, negligencia, pois, o papel do Estado.

O pressuposto de um determinismo tecnológico, com considerações sobretransportes e, mais recentemente, com inovações no plano das comunicaçõescomo elementos explicativos ou mesmo determinantes dos padrões espaciais, temsido um tema constante na pesquisa urbana, que abrange a geografia e a economiaurbana convencional.

Assim, o transporte em particular passa a explicar a desconcentração re-gional, a morfologia do desenvolvimento metropolitano para a geografia urbana(Borchert, 1967; Adams, 1970; Muller, 1976)8 e a dinâmica da economia da loca-lização, conceituada como a minimização dos custos de transportes para a eco-nomia urbana, conforme os economistas neoclássicos.

A contribuição desses trabalhos como modelos explicativos do papel daacessibilidade, decorrente do funcionamento do sistema de transportes, é inegávelpara a compreensão dos processos de estruturação do espaço metropolitano. Issoserá bem ilustrado pela pesquisa realizada na área de proteção dos mananciais,

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com referência à expansão da área urbanizada ao longo dos sistemas viários. Apartir dessas contribuições, podemos refletir sobre os impactos provocados pelaimplementação de vultosos projetos e por obras no sistema viário empreendidosatualmente no vetor sudoeste em direção aos mananciais.

A diversidade de situações encontradas no que tange aos processos de ex-pansão urbana e à existência de sistemas viários e de transportes aponta para oslimites explicativos da teoria neoclássica da localização, assinalando espe-cificações da produção social do espaço. Como exemplo, citaríamos a diferen-ciação entre o vetor norte da Região Metropolitana de São Paulo e os vetores sul,sudeste e sudoeste da metrópole.

Na década de 1980 foram produzidos alguns trabalhos cujo foco de aná-lise residia na crítica global à lógica da localização industrial, tal como propostapelos neoclássicos (Storper, 1994), sobretudo no tocante ao papel desempenhadopela tecnologia de transportes e de comunicações, aspectos que discutiremosadiante.

A produção social do espaço

No contexto da pesquisa urbana, a década de 1980 foi marcada por umvigoroso questionamento dos instrumentos globais de interpretação da sociedadepela utilização do método de análise estruturalista e por um retorno às abordagensempiristas, delineando uma fase de refluxo da intensa pesquisa urbana de ins-piração marxista desenvolvida nas décadas anteriores.9 Por outro lado, questionou-se a análise do papel do Estado na produção do espaço urbano – grande con-tribuição da abordagem marxista, ausente no pensamento ecológico e na escolaneoclássica – com o triunfo aparente do modelo explicativo neoliberal.

Foi nesse contexto de reinterpretação dos marxismos urbanos dos anossetenta que buscamos o ordenamento de questões que instrumentalizaram a aná-lise do espaço proposta neste texto. E por meio da discussão sobre as questõeslevantadas no final dos anos oitenta, com o emprego de padrões espaciais decor-rentes das alterações nos processos produtivos que tomaram lugar com o adventodo pós-fordismo e com o papel desempenhado pelo empresariamento da admi-nistração pública, em especial a urbana, abordaremos os novos padrões espaciaise a questão da gestão das águas na metrópole paulista que também se inscreveneste contexto.

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O tratamento da questão urbana no âmbito marxista teve como marco ini-cial a pesquisa produzida nos anos sessenta e setenta, sobretudo na França, tendosido desenvolvida posteriormente na Inglaterra, Espanha, Itália, Estados Unidose em países da América Latina.

No referencial teórico elaborado, buscou-se vincular a questão urbana àspráticas sociais, políticas e econômicas, como fizeram Castells (1972, sobre aquestão urbana enquanto consumo coletivo, hipótese revista em 1975 e ampliadapara condições gerais de produção); Lefebvre (1974, no estudo das relações entreespaço e sociedade); Lojkine (1979, 1981, sobre as políticas urbanas através daanálise do Estado); Topalov (1979, sobre empreendimentos imobiliários, pro-cessos e agentes envolvidos); Francis Godard e Edmond Preteceille (1980, sobreequipamentos coletivos); Lipietz (1982, sobre tributo fundiário urbano); e Harvey(1980, 1982, sobre o ambiente construído e o padrão de acumulação do capital).

O desenvolvimento da abordagem adotada deu-se em um período marcadopor intenso processo de expansão do capital, do ritmo de crescimento urbano ede investimentos no setor imobiliário, intermediados pelo Estado (no caso, oEstado centralizado francês) e pelos grandes interesses financeiros.

Gottdiener (1993) expõe de forma bastante concisa a contribuição da aná-lise marxista no que se refere à produção do espaço, basicamente em torno dateoria da localização estabelecida pela luta de classes e de necessidades do pro-cesso de acumulação, da especificação do papel do ambiente construído bemcomo do papel do Estado no aspecto urbano e da negação da reificação do con-ceito de lugar, substituindo-o pelo conceito de localização como sítio das relaçõesde produção, integradas por um sistema de acumulação capitalista e por um pro-cesso de produção em escala mundial, inclusive com uma divisão internacional dotrabalho.

As contribuições de Castells (1972, 1975), sobre as quais discorreremosagora, constituem-se no instrumental conceitual que subsidiou numerosos estudosde políticas urbanas.

Considerando a construção teórica do espaço o produto material de dadaformação social, Castells estruturou numerosas abordagens, trazendo à tona ele-mentos para a compreensão de situações concretas. Para ele, a teoria do espaçoconsiste em uma especificação de uma teoria geral da organização social:

Analisar o espaço como uma expressão da estrutura social equivale, pois,a estudar sua formação por elementos do sistema econômico, do sistemapolítico e do sistema ideológico (1975, p. 126).O esquema conceitual elaborado por Castells mostrou-se demasiadamente

formal ao lidar com realidades históricas delimitadas, com o detalhamento dossistemas e subsistemas empregados para a análise da questão urbana (PCIG =

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Produção, Consumo, Intercâmbio e Gestão), e sua concepção de urbano, vin-culada às condições de reprodução da força de trabalho, pilar de sua construçãoteórica, foi revista pelo próprio autor no posfácio à edição de sua A questão ur-bana (Castells, 1975).

A releitura da obra de Castells, cuja proposta metodológica para o estudode políticas urbanas enfatiza o modo primordial de intervenção do Estado com ateoria do consumo coletivo, com a distribuição desigual desses meios e com odesenvolvimento de conceitos como os de segregação social e espacial, constituiainda instrumento valioso de análise, ao depararmos com os aspectos da demandapor habitação ou com os do grau de adequação das áreas de mananciais para usosurbanos.

Ao travar diálogo, nas décadas de 1960 e 1970, com pesquisadores daAmérica Latina, Castells inseriu as questões das formas de urbanização em paísesdependentes nas análises do espaço que desenvolveu.

Outro trabalho que utilizamos como referência nesta abordagem foi o deLojkine (1979, 1981), que centra sua análise no processo de urbanização vin-culado ao modo de produção capitalista (monopolista) e na análise do papel doEstado no desenvolvimento urbano, num matiz teórico diverso do de Castells, queé fundado no estruturalismo althusseriano.

As análises empreendidas por Lojkine, apesar de se situarem em contextobastante diverso do nosso (o Welfare State consolidado no que tange às condiçõesgerais de produção), forneceram um instrumental metodológico para vários tra-balhos, articulando a perspectiva das análises estruturais do desenvolvimentoeconômico com o processo de urbanização capitalista. Suas análises foram pornós utilizadas na discussão da produção do espaço na metrópole paulista, adiante.

A perspectiva de Lojkine com relação à intervenção do Estado no aspectourbano destaca a primazia da base econômica na natureza da intervenção, expres-sando, portanto, os interesses econômicos da classe dominante por intermédio detrês dimensões da política urbana – planificadora, operacional e uma dimensãopropriamente urbanística.

A propósito, considera-se que as análises mais restritas do Estado, vin-culando-o diretamente aos interesses econômicos e isolando a autonomia relativadas instâncias políticas e ideológicas, tal como proposta por Lojkine, dificultam oentendimento da atuação dos aparatos institucionais na questão ambiental.

Destacamos, contudo, sua irrefutável contribuição ao debate da renda fun-diária urbana com a introdução do conceito de renda diferencial – renda da terraproduzida pela diferença dos investimentos urbanos – para o contexto urbano,10

tema que necessariamente se insere em nossa problemática de análise, pois, paranós, a teoria da renda da terra, tal como pensada por Lojkine, especialmente o

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conceito de renda diferencial, pode ser aplicada na análise da produção do espaçona área de mananciais de modo a explicar os processos de desvalorização dessasáreas por causa da ausência de inversões em infra-estrutura, de acordo com o quepreconiza a legislação de proteção dos mananciais editada na década de 1970.

Essa discussão, no entanto, é bastante complexa, uma vez que implica deli-mitar a nossa problemática no que diz respeito ao aspecto da determinação econô-mica da teoria do valor em áreas de conservação presentes em zonas urbanas,sobretudo, as áreas de proteção dos mananciais ou as protegidas pelo CódigoFlorestal.

Os trabalhos elaborados posteriormente com a abordagem marxista do espa-ço desenvolveram o argumento básico em torno das formas espaciais comoprodutos contingentes da articulação entre estruturas – que vêm a ser modo deprodução capitalista – e ação, entendida como a expressão dos interesses e con-flitos de classe ou frações de classe mediados pelo Estado (Topalov, 1979, 1988,e Gottdiener, 1993).

As políticas públicas urbanas, na perspectiva dos agentes e dos interessesenvolvidos na produção do espaço, têm sido o fio condutor de numerosos tra-balhos de pesquisa empírica, cujo objetivo consiste em entender a produção doespaço, por um lado, pelos determinantes estruturais do modo de produção capi-talista e, por outro, pela ação e os interesses de frações de classe, em especial acadeia de agentes que interagem no mercado da construção civil, do proprietáriofundiário ao incorporador, passando pelo empreiteiro de obras públicas.

Essa abordagem possibilita o entendimento das formas de produção doespaço para o nosso caso. No entanto, é necessária uma reflexão tendo em vistauma perspectiva que contemple interesses socioespaciais baseados, por exemplo,na noção de território, que transcendam os interesses de classe, como é o caso domovimento ambientalista.

Outra vertente de pesquisa foi fornecida por Harvey (1980, 1982), ao ana-lisar o ambiente construído vinculado à dinâmica da acumulação, com ênfase paraa interconexão das frações de classe, a fim de explicar as transformações do es-paço.

Na obra de Harvey, os conceitos de urbano, urbanismo e urbanizaçãoestão intrinsecamente vinculados à perspectiva teórica do processo de acumulaçãodo capital, processo que explica o desenvolvimento da cidade ou a urbanização.Para o autor, urbanização é a manifestação espacial do processo de acumulação eurbanismo, um produto da circulação do excedente econômico. Contudo, aexemplo de Lefebvre, Harvey ressalta que “o papel específico que o espaço de-sempenha, tanto na organização da produção como na padronização das relaçõessociais (…), [é] expresso na estrutura urbana”. Em face disso, o urbanismo não

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é visto como algo decorrente simplesmente de outras estruturas (Harvey, 1980, p.265).

A contribuição mais significativa de Harvey diz respeito à da questão dadeterminação da renda da terra na perspectiva marxista para o caso urbano, temanão tratado pelos demais teóricos do espaço urbano, que discutiram o conceito delocalização como produto social que tem uma apropriação privada.

A construção teórica em torno da questão da renda fundiária urbana, nestaperspectiva, permite mostrar como a lei do valor no espaço é estruturada emanipulada pela classe dos proprietários fundiários e suas relações sociais, nointuito de produzir a renda absoluta e a renda de monopólio e seus feitos nocivossobre a trama urbana.

A análise de Harvey utiliza ainda o conceito de externalidade na produçãoda localização e nos mecanismos de desvalorização do espaço construído, nocircuito do capital.

Para nós, questões em torno do processo de formação e apropriação dasrendas fundiárias urbanas, de desvalorização do ambiente construído e de espaçosnaturais constituem a face mais visível da problemática dos mananciais.

A diversidade das formas de produção do espaço verificadas em áreas demananciais aponta, entretanto, segundo Gottdiener (1993), para o fato de quedeve-se buscar na base da teoria do valor a dimensão dos fatores culturais e nãosó dos fatores econômicos.

Acreditamos que espaços de unidades de conservação, outras áreas sobproteção ou atributos da paisagem11 devem ser considerados produtos sociais quecondensam o produto de trabalho humano. Porém, o âmbito dessas questões nãopode ser reduzido ao determinismo econômico da teoria do valor.

Na literatura mais recente, que busca avaliar a intensa produção da pesquisaurbana na vertente da análise neomarxista, têm sido apontadas razões para o de-clínio dessa linha de investigação urbana a partir de meados da década de 1970,em um cenário marcado pela diminuição do ritmo de crescimento urbano dasmetrópoles, por novas configurações territoriais e pela redefinição do papel doEstado na sociedade, colocando em questionamento os referenciais teóricos quesustentaram os vários trabalhos (Topalov, 1988, Gottdiener e Feagin, 1989 e 1993,e Harloe, 1989).

As críticas são centradas, sobretudo, no método estruturalista, em virtude dadificuldade que as teorias do espaço da sociologia urbana francesa das décadas de1960 e 1970 apresentaram em lidar com realidades históricas delimitadas e peloreducionismo dessas análises do espaço na perspectiva neomarxista.

Mais recentemente, as noções básicas introduzidas por Lefebvre (1974) têmsido resgatadas, com base no pressuposto de que o espaço e a organização política

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do espaço expressam relações sociais, bem como atuam nessas relações, conformeresenha elaborada por Soja (1993).

Nessa linha de trabalho que Soja (1993) denominou materialismo históricoe geográfico, as noções de localidade, território local e espaço físico ganham novasdimensões. A noção de espaço como produto material de relações mais amplasemerge hoje na teoria urbana nos termos de uma possibilidade dialéticasocioespacial, ou seja, as estruturas espaciais são reflexos de processos sociais maisamplos, embora sejam vistas também como elementos que interferem nessesprocessos.

Esse contexto ampliou o universo da investigação de temas pertinentes aomeio ambiente, nas análises da produção do espaço na perspectiva neomarxista.

O espaço do pós-fordismo, o tema da sustentabilidade e oprojeto de cidades sustentáveis

A partir do final dos anos oitenta a extensa literatura produzida colocou emdiscussão o modo com que a globalização da economia e os atuais processos deacumulação do capital, baseados na flexibilização da produção no período deno-minado pós-fordismo, interferem nos processos de produção dos espaços. A dis-cussão traz novos contornos a essa questão, permitindo-nos avançar na indagaçãoe no entendimento dos efeitos dessas novas formas de produção na relação entrea cidade e o meio ambiente.

A indagação principal se refere ao impacto no controle ou gestão ambientaldo espaço nas cidades globais – dentre as quais se insere a cidade de São Paulo,com o desaparecimento do modelo clássico de cidade industrial, em que se tem aperspectiva de uma urbanização periférica, de mobilidade ocupacional e flexi-bilidade gerencial, de maneira que unidades produtivas de uma região são trans-feridas para outra. Isso acarreta a formação de um vínculo cada vez mais tênueentre residência e trabalho, a formação de ilhas de exclusão social e a produção deum espaço onde o poder local tem cada vez menos participação, com as decisõessendo tomadas, às vezes, em um nível até mesmo trasnacional.

Para a discussão dessas questões é necessário retomarmos alguns aspectosligados às alterações da produção fordista – chamadas pós-fordismo. O exame dabibliografia mencionada revela grande diversidade e abordagens divergentes quan-

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to à extensão dos processos de transformação. Há consenso, entretanto, quanto àespecialização de certas cidades em atividades dominantes na economia ligadas àsfunções de comando e controle, ao mercado financeiro e ao desenvolvimento deuma cadeia de serviços ligados a tais atividades.

De maneira resumida, a discussão relativa ao pós-fordismo agrega algunselementos para a análise concreta tanto dos processos de produção do espaço dametrópole como daqueles voltados à normatização ou gestão dos recursos am-bientais.

O primeiro aspecto a ser assinalado refere-se ao surgimento de novos dis-tritos industriais em conseqüência dos avanços dos sistemas de comunicação e detransporte e, de outro lado, das novas formas de produção em resposta à crisevivida pelo fordismo, baseado na produção em série. Essas formas baseiam-se naflexibilidade tecnológica, na organização da produção e das estruturas institu-cionais, produzindo novos espaços fabris sobretudo na Europa e nos EstadosUnidos, fazendo uso de uma lógica totalmente distinta da empregada na loca-lização industrial nas fases anteriores do capitalismo.

De acordo com a perspectiva da escola da regulação (Aglietta, 1979), aprodução e a acumulação flexíveis são hoje dominantes, com a emergência deuma rede de empresas de pequeno e médio portes dentro de sistemas integrados desubcontratação, interdependência e intercâmbio, em contraposição à produçãofordista, na qual se priorizava a padronização dos produtos.

A propósito dessa questão, Saskia Sassen menciona que “finalmente boaparte do trabalho que no passado se caracterizava como produção em massa,padronizada, hoje se caracteriza cada vez mais pela especialização flexível, portrabalhos realizados mediante encomenda, por redes de subempreiteiros e pelainformalização que, em determinados momentos, inclui até mesmo o trabalhoindustrial realizado no próprio domicílio e em pequenas lojas” (1998, p. 131). Esseenfoque tem impactos significativos na nossa análise, cabendo-nos, no entanto,dimensionar a extensão de tais processos para a realidade local.

Outro ponto que se destaca na pesquisa contemporânea refere-se à análisedos processos de desconcentração urbana desenvolvida sobretudo por Gottdiener(1993). Para esse autor, no encadeamento das atividades no espaço regional hámodos hierárquicos de organização social ligados pelas telecomunicações, camposeletrônicos de processamento de informação, e pelo deslocamento de pessoas quese servem dos sistemas de transportes, configurando uma metrópole desconcen-trada, correspondente à forma fenomenal da corporação multinacional. Todavia, osprocessos analisados por Gottdiener restringem-se ao contexto norte-americano, apar das importantes inflexões deste processo com a questão da apropriação dosrecursos ambientais.

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Na análise desses novos padrões de produção, autores como Storper (1983,1984) questionam os conceitos da teoria da localização industrial, de urbano eurbanização centrados na premissa dos efeitos úteis da aglomeração da urba-nização capitalista. Na perspectiva de Storper, nos marcos da cidade industrial e nacrise do fordismo, tanto o trabalho como o capital ganharam mobilidade nasrelações sociais contemporâneas. Trata-se de questão importante na análise dospadrões de produção do espaço metropolitano na década de 1980.

As alterações na economia e no território, segundo o ponto de vista indus-trial de autores como Sassen (1991, 1998), reafirmam a importância da centra-lidade ao lado da dispersão das atividades econômicas nos processos de glo-balização da economia. A centralidade oferecida pelas grandes cidades é neces-sária para o cumprimento das atividades relativas ao gerenciamento no nível dosaltos escalões e ao controle das operações das transações transnacionais.

Na perspectiva acima delineada, as cidades pós-industriais simbolizam asnovas formas de globalização econômica, compostas pelas zonas de processa-mento das exportações, centros bancários offshore e cidades globais (Sassen,1998, p. 34). Afirma Sassen que “as cidades globais são os lugares-chaves para osserviços avançados e para as telecomunicações necessárias à implementação e aogerenciamento das operações econômicas globais”.

Ao papel estratégico de comando e gerenciamento presente na literaturasobre as cidades globais, essa autora acrescenta as funções de locais de produçãopara as atividades industriais, financeiras e de serviços especializados e, ainda, demercados multinacionais.

A visão da cidade pós-industrial centrada no terciário superior voltado ao“modo de produção informacional” foi desenvolvida também por Castells (1986),que analisou a relação entre a alta tecnologia, a reestruturação econômica e oprocesso urbano regional, que, segundo o autor, está na origem de uma novadivisão do trabalho em nível internacional, inter-regional e no interior das grandesáreas metropolitanas.

Entretanto, as transformações na estrutura econômica das grandes cidades,voltadas ao terciário superior e às funções de gestão e de comando em um cenáriopós-industrial, não se têm traduzido em cidades qualitativamente mais sustentáveisdo ponto de vista social ou ambiental, com o avanço da chamada “telemática” emcontraposição às antigas chaminés, efluentes líquidos e resíduos sólidoscontaminados das indústrias de outrora.

Os processos sociais resultantes apontam para o processo de dualizaçãourbana, em que os fenômenos brutais de exclusão social e de marginalização têmreflexos diretos nos padrões de ocupação do solo e da apropriação dos recursos

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ambientais, questões que interferem diretamente nas áreas de mananciais, comoveremos. Conforme Preteceille (1994), as cidades com maior ligação com o pro-cesso de globalização caracterizam-se pela existência de contrastes sociais espeta-culares: a concentração da propriedade e alterações na estrutura produtiva; citemoscomo exemplo o setor de empregos, no qual se verifica o aumento das categoriassuperiores em detrimento das menos qualificadas.

A transposição para o tema ambiental também se faz possível. MiltonSantos, em um texto sobre o significado da “redescoberta” da natureza, afirmaque “na fase atual, onde a economia se tornou mundializada, todas as sociedadesterminaram por adotar, de forma mais ou menos total, de maneira mais ou menosexplícita, um modelo técnico único que se sobrepõe à multiplicidade de recursosnaturais e humanos. É nessas condições que a mundialização do Planeta unifica aNatureza. (...) unificada pela história, em benefício de firmas, estados e classeshegemônicas” (1992, pp. 97-8).

A unificação não decorre, entretanto, da integração entre cidade e natureza,e sim reificação do urbano, da utilização da natureza de acordo com sua inserçãono urbano. Assim, é no espaço das cidades globais que incide o projeto ambien-talista, em direção à construção de cidades sustentáveis.

Essa discussão será retomada quando de nosso estudo dos mananciais dametrópole paulista, em que discorreremos sobre as ilhas de exclusão social quetêm sido produzidas nos mananciais e a ampliação da atividade industrial de menorporte (as microempresas, isentas de licenciamento ambiental), muitas delasintegrando o setor informal da economia. Quais as possibilidades de controleambiental nesse tipo de urbanização que vem se processando? Essa a questão aque procuraremos responder.

Quanto ao projeto de cidades sustentáveis, passou a ser o tema recorrente apartir da Agenda 21, aprovada pela Conferência das Nações Unidas sobre MeioAmbiente e Desenvolvimento realizada em 1992, em que se estabeleceu a questãodos assentamentos humanos, em especial dos assentamentos urbanos, como pro-blema ambiental, considerando que, na virada do século, a maioria da populaçãoestará vivendo nas cidades. Nesse documento se encontram circunscritos pro-blemas anteriormente incorporados em uma agenda social, como o da provisão desaneamento e habitação, com a inclusão de metas para a sustentabilidade ambien-tal por meio da adoção de tecnologias apropriadas.

Na elaboração da Agenda 21 buscou-se constituir um quadro de referênciaspara as políticas públicas, abrangendo mais de cem áreas programáticas, pro-tocoladas como compromissos entre os cento e oito países signatários. A reduzidaefetividade das ações necessárias para concretizar as diretrizes estabelecidas nessedocumento, no tocante à promoção dos assentamentos humanos sustentáveis, foi

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objeto de inúmeras avaliações, culminando na Conferência Rio Mais 5, realizadaem 1997. Deve-se assinalar porém, que ao difundir o paradigma das cidades sus-tentáveis, ela marcou uma nova pauta nas questões urbanas e ambientais.

A Agenda 21 informou também a elaboração de propostas similares àsinstituídas nas políticas urbanas do Habitat II, conferência das Nações Unidas quese deu em Istambul, em 1996, ao lado de outros programas também de iniciativada ONU, como o Programa de Gestão Urbana, em direção ao projeto de cidadessustentáveis.

A pauta da sustentabilidade passou a indicar os contornos de políticas urba-nas, tendo sido transposta para a esfera política no contexto do papel estratégicoque assumem as cidades no período de globalização da economia, fundamen-tando, por exemplo, as propostas contidas no Livro verde do meio ambienteurbano, do Parlamento europeu.

O projeto em direção às cidades sustentáveis orientou também pesquisasacadêmicas, destacando-se os trabalhos de Scandurra (1995) e algumas pesquisasdesenvolvidas no âmbito das organizações não-governamentais, como a entidadeitaliana Legambiente, com referência aos trabalhos de Alberti, Solera e Tsetsi(1994), publicados em Milão.

Para discutir o tema da sustentabilidade, inicialmente é necessário esclarecero que vem a ser sustentabilidade. As apropriações desse conceito são as maisdistintas, porém há um consenso hoje das diferentes dimensões que essa noçãodeve conter – a da sustentabilidade ecológica, social, econômica, espacial e cultural(Sachs, 1993).

O conceito de sustentabilidade ecológica, no qual nos detivemos mais espe-cificamente, está geralmente vinculado às idéias da recomposição dos recursosrenováveis, à capacidade de absorção pelo meio ambiente das taxas de poluição eà garantia de manutenção dos recursos não-renováveis para as gerações futuras.

Os trabalhos de Scandurra e Alberti não contestam a cidade nem propõemum antiurbanismo, como na visão dos urbanistas culturalistas da história do ur-banismo. Trata-se porém de um modelo de gestão e de desenvolvimento urbanoem consonância com os princípios ecológicos e com uma convivência social justa.

No plano urbanístico, defende-se no trabalho em questão a existência decomunidades autogovernáveis e o zoneamento plurifuncional, entre outros prin-cípios, sem fazer uso, contudo, do quadro referencial das propostas do pensa-mento urbanístico racionalista formulado no século XX. Em contraposição aosesquemas formais rígidos, preconizam-se instrumentos de gestão, como o de ava-liação de impacto ambiental (VIA) e o específico para áreas urbanas (VIU), com oobjetivo de disciplinar o uso do território e do ambiente.

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Em suma, acreditamos que o projeto de cidades sustentáveis retoma pro-postas formuladas a partir do contextualismo cultural de Rossi (1971) e sua visãode cidade e da teoria de Odum (1988), que diz respeito ao conceito ecológico sempreconizar os modelos de cidades ideais, definidos em esquemas formais desde asutopias do século XIX ao projeto racionalista. Ao contrário, apresenta umaabordagem da cidade em que se faz presente a idéia de lugar, sendo definidos osusos do solo a partir de avaliações de impacto ambiental e da gestão ambiental, asquais buscam levar em consideração o espaço ou o ambiente de forma integrada.

A nosso ver, contudo, as propostas para uma ecologia urbana na Europadefendidas pelos autores citados devem ser analisadas sob diversos prismas, so-bretudo no contexto do pensamento urbanístico, tarefa que extrapola os limites eos propósitos deste livro.

Da idéia de natureza à expressão “meio ambiente”

Na história ocidental, a idéia de natureza contempla uma interpretação emcada momento histórico. A esse respeito, e buscando elaborar uma crítica da idéiade natureza apresentada como uma ilusão ancestral, Rosset (1989) fornece asexpressões modernas dessa idéia, agrupando-as em três grandes tendências dasquais destacamos a do naturalismo conservador, manifesta na idéia que a naturezaestava presente mas se degradou, sendo necessário protegê-la contra toda dete-rioração nova12.

Na historiografia urbana a idéia de natureza também foi manifestada dediferentes maneiras ao longo da história, estando normalmente implícitas as ex-pressões do naturalismo conservador, segundo Tafuri (1985) e Rosset (1989). Apropósito desse tema, Argan revela que a idéia de natureza, até os primórdios daIdade Moderna, estava vinculada ao mito do sagrado e era considerada em opo-sição à idéia de civilização representada pela cidade, conforme indica o textoabaixo:

O processo de desmistificação e de dessacralização de que tanto se fala,como se fosse o ponto de chegada do laicismo moderno, não é mais doque essa denegação da natureza como misteriosa região das potências incon-troláveis do mito e do sagrado (...).

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A verdade é que a região do mito e do sagrado, no passado não tão remotoassim – era a natureza. A natureza era o que se encontrava além dos murosda cidade, o espaço não protegido, não organizado, não construído. Aoredor do témenos urbano, do recinto sagrado da civilização ou da cidade –duas palavras que têm a mesma raiz – havia uma zona de fronteira, ocampo, habitada por seres cuja natureza parecia incerta e ambígua, entre ohumano e o animal: a gente dos campos que vivia segundo tradições an-tigas e se dedicava a técnicas arcaicas e quase rituais, ligadas aos ritmossazonais e aos ciclos lunares, tão diversas das técnicas civis, cultas e in-telectuais do artesanato urbano. No entanto, além dessa zona incerta, emque às vezes também o citadino ia procurar um momentâneo e regeneradorcontato com a grande mãe, começava a verdadeira natureza, a qual, aindano final do século XVIII e no princípio do XIX, era considerada inimiga,inacessível, inviolável, freqüentada apenas pelas feras, pelas águias – e,naturalmente, por Deus, pelos gênios do bem como pelo gênio do mal(pense-se em William Blake). Era o sublime e representava o limite, a fron-teira entre o habitado e o inabitável, entre a cidade e a selva, entre o espaçogeométrico ou mensurável do ser. E como se sabe que as estruturas doespaço não estão na realidade objetiva, mas no pensamento que a pensa, adedução é fácil: a cidade é a dimensão do distinto, do relativo, do crescente,do ego; a natureza sublime é a dimensão do transcendente, do absoluto, dosuperego (Argan, 1992, pp. 212-3).Thomas (1988) também menciona o significado de cidade na Renascença,

enquanto sinônimo de civilidade, em oposição à rudeza e rusticidade do campo eà brutalidade da natureza:

Tirar os homens das florestas e encerrá-los numa cidade era o mesmo quecivilizá-los. Como dizia um diálogo elisabetano, um fidalgo criado na cidadeseria mais “civilizado” do que um educado no campo (1988, p.290).Essa mesma visão, segundo Thomas, estava contida no avanço das fron-

teiras agrícolas nos séculos XVI e XVII, quando se buscava impor a ordemhumana ao mundo natural desordenado, sendo a simetria e a regularidade dostraços dos campos de cultivo elementos essenciais da boa agricultura.

Esmero, simetria e padrões formais sempre foram a maneira caracteris-ticamente humana de indicar a separação entre cultura e natureza. Mas atendência para o cultivo uniforme parece, no mínimo, ter aumentado noinício do período moderno (1988, p. 305).Porém, Thomas considera que no final do século XVIII, a relação do ho-

mem com a natureza, e particularmente com a natureza selvagem, se alterou. A

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reação à deterioração do ambiente urbano levou a uma admiração exacerbada pelocampo e pela natureza. Como assinala Thomas, “era cada vez mais freqüente sus-tentar que a cidade mais bela seria a de maior aparência rural; e a desruralizaçãodas cidades levou a uma crescente insatisfação com o ambiente urbano”.

Tafuri discorre sobre a variedade da natureza que é chamada a fazer parte daestrutura urbana e a preocupação com a configuração do ambiente original. Porém,o significado do naturalismo na cidade setecentista tem para ele outra conotação,conforme revela o texto a seguir:

O que significa, no plano ideológico, assimilar a cidade a um objeto na-tural? Por um lado, neste assunto transparece uma sublimação das teoriasfisiocráticas: a cidade não é vista como estrutura que determina, através dosseus próprios mecanismos de acumulação, a transformação dos processosde aproveitamento do solo e dos rendimentos agrícolas e fundiários. En-quanto fenômeno assimilável a um processo “natural”, não histórico porqueuniversal, é desvinculada de qualquer consideração de natureza estrutural.O “naturalismo” formal serve num primeiro momento para persuadirquanto à necessidade objetiva dos processos postos em movimento pelaburguesia pré-revolucionária; num segundo momento, para consolidar eproteger as conquistas adquiridas de qualquer transformação ulterior(1985, p. 15).A idealização da integração cidade-natureza, combinando as vantagens so-

ciais e econômicas da cidade com o ambiente físico do campo, é retomada umséculo depois por Howard (1898) e sua proposta de cidade-jardim.

Já no final do século XVIII tem-se a visão do homem como membro etransformador da natureza, difundindo-se o mito da dominação da natureza, comonos explica Milton Santos, no texto a seguir. A idéia, entretanto, era de que anatureza deveria ser domesticada, mas não suprimida:

A história do homem sobre a Terra é a história de uma ruptura progressivaentre o homem e o entorno. Esse processo se acelera quando, praticamenteao mesmo tempo, o homem se descobre como indivíduo e inicia a me-canização do Planeta, armando-se de novos instrumentos para tentar do-miná-lo. A Natureza artificializada marca uma grande mudança na históriahumana da Natureza (1992, pp. 96-7).Surgem os mais diversos pontos de vista acerca da relação do homem com

a natureza no século XIX, indo do enfoque evolucionista de Darwin ao de Marxe Engels, segundo os quais tal relação era pautada pelas relações sociais deprodução.

O aspecto que nos interessa destacar neste momento diz respeito ao enfoquetotalizante da relação entre homem e natureza, presente desde as propostas

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urbanísticas preconizadas pelos socialistas utópicos ou da emergente ciência eco-lógica a partir dos trabalhos de Haeckel, em 1869. Deste enfoque global sobrehomem-natureza-sociedade, assiste-se, no século XX, à abordagem fragmentadado tema.

A propósito do assunto, Hurtubia (in Sunkel e Gligo, 1980) delineou umpainel de evolução do pensamento ecológico a fim de descrever a passagem doenfoque global do tema homem-natureza e sociedade-natureza para uma abor-dagem específica. Esse tipo de abordagem foi adotado pelos vários domínios daciência no século XX, tendo-se delegado aos ramos das ciências biológicas odesenvolvimento dos conhecimentos gerados a partir do conceito de ecologia deHaeckel.

Em meados da década de 1960, a relação entre homem e natureza, pautapresente no pensamento do século XIX, emergiu com a denominação meio am-biente, tratada nos aspectos concernentes à problemática do desenvolvimento. Essetermo passou a designar uma pluralidade de questões abrangidas pela ter-minologia questão ambiental, abrigando desde o desmatamento de florestas (comoos da Amazônia e da Mata Atlântica), risco de extinção de espécies da flora e dafauna até os problemas permeados pela questão urbana, como a poluição de ma-nanciais hídricos ou dos resíduos sólidos.

Observe-se o que Milton Santos precisamente expõe em um texto sobre osignificado do tema da “redescoberta” da natureza, em 1992:

Quando o meio ambiente como Natureza espetáculo substitui a Naturezahistórica, lugar de trabalho de todos os homens, e quando a Natureza ci-bernética ou sintética substitui a Natureza analítica do passado, o processode ocultação do significado da história atinge o seu auge. É também, dessemodo, que se estabelece uma dolorosa confusão entre sistemas técnicos,Natureza, sociedade, cultura e moral (1992, p.102).Nas páginas seguintes buscamos apresentar os matizes teóricos da expressão

meio ambiente, tal como a temos no presente, e delimitar a problemática do pontode vista do nosso objeto de trabalho.

Meio ambiente e determinismo tecnológico

A concepção da inter-relação do homem e o meio ambiente neste séculotem suas origens na perspectiva funcionalista da Escola de Chicago, embora sobum prisma totalmente distinto.

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Para explicar o sistema urbano, Robert Park, utilizando o método analógico,empresta da Biologia os conceitos do estudo dos ecossistemas dos seres vivos,13

como a expansão-agregação e a invasão sucessão.A relação estabelecida entre homem, sociedade e natureza é colocada agora

nos termos do homem com seu meio, seja a natureza artificializada no sentidoexpresso por Santos (1992), seja a representada pela Chicago industrial dos anosvinte.

A retomada do pensamento ecológico na década de 1950 resgata a teoriaparkiana, pondo em questão o determinismo ambiental (Melnick, in Sunkel eGligo, 1980). Os principais expoentes dessa tendência são Hawley, Shnore eDuncan, autores que desenvolveram a idéia de interdependência entre quatro va-riáveis, a saber: população, meio ambiente, organização social e tecnologia.

O meio ambiente, nessa perspectiva, é apreendido como parte integrante datopografia e dos recursos naturais disponíveis. Segundo Schnore (in Hauser eSchnore, 1976), esses recursos são relevantes nos aspectos tocantes ao uso eco-nômico a ser estabelecido. A noção derivada dessa perspectiva é, portanto, bastantedistinta da atual.

Hawley formulou as bases da ecologia humana como disciplina que centrasua atenção na interdependência que se desenvolve na ação e relação entre apopulação e seu habitat. Apoia-se nas premissas do determinismo tecnológico,questionando as bases do determinismo ambiental, Hawley considerou que asespécies humanas não ocupam um lugar (nicho) definido ou preestabelecido nahierarquia ecológica. (Melnick, in Sunkel e Gligo, 1980).

Assim, a ecologia humana, pouco contribuiu para o avanço das questõesambientais ao focar o debate da relação entre homem e meio ambiente na vertentede análise oposta – a do determinismo social. A concepção do determinismo socialfoi predominante nos estudos do espaço urbano na década de 1950.

Por outro lado, os estudos referentes ao meio natural permaneceram restritosao campo das ciências biológicas, em um universo de pesquisa dominado pelaspreocupações com a extinção de espécies da flora e da fauna.

De acordo com Hurtubia (in Sunkel e Gligo, 1980), os resultados dessesesforços foram muito pouco divulgados. Poderiam ser aplicados em diagnósticosda capacidade de suporte do meio físico e biológico nos padrões de desenvol-vimento econômico vigentes.

Historicamente, de 1869 a 1960, predominou a opinião do biólogo e deoutros setorialistas que mantiveram a ecologia ligada à biologia (...).Em outras palavras, a ecologia não aceitou os desafios fundamentais queimplicavam apresentar um esquema coerente, compreensível e aceitávelacerca do entendimento das leis naturais que fosse seguido pela sociedadeeconômica dominante, tal como formulado pelos naturalistas, filósofos e

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pensadores do final do século XIX. Tampouco concentrou seus esforços,muito menos as outras ciências, para demonstrar a necessidade de com-patibilizar o crescimento econômico com os princípios da cooperação e dasimbiose do homem com a natureza.Também não se deve deixar de mencionar que a estratégia da época para aecologia consistia em uma análise simples, recém-emergente, de claratendência conservacionista (preocupações pela extinção de espécies da florae fauna, habitat e paisagens) (1980, p. 170, tradução da autora).Também merece destaque o trabalho de Eugene Odum, publicado inicial-

mente em 1953, em que desenvolve conceitos relacionados com os ecossistemas,com os ciclos biogeoquímicos e, sobretudo, com os princípios da energia dossistemas ecológicos. O trabalho de Odum se refletiu na análise da capacidade desuporte do meio biogeoquímicos para a implantação de atividades econômicasapenas no final dos anos sessenta, influenciando principalmente McHarg (1969)em trabalhos de planejamento regional nos Estados Unidos.

O pensamento contemporâneo sobre meio ambiente

Embora a produção acadêmica no campo ambiental tenha sido intensa nasúltimas décadas, tem enfrentado uma questão pouco elaborada, sem paradigmasdeterminados. Ao contrário do pensamento sobre a questão urbana, que têm oitodécadas ininterruptas de trabalho teórico e empírico, a questão ambiental emergefora do âmbito acadêmico, exigindo esforços para a compreensão do tema, sobre-tudo no âmbito das ciências sociais.

O pensamento atual sobre o meio ambiente foi desenvolvido a partir de trêsvertentes: uma primeira, em que os assuntos foram apropriados de forma frag-mentada nos estudos sobre políticas públicas, movimentos sociais etc. A segundae mais importante vertente, em que a questão ambiental passou a ser compreen-dida como redefinidora das possibilidades de desenvolvimento humano. E umaterceira vertente, na qual os paradigmas existentes seguiram o caminho da cha-mada “ciência normal”, procurando estender os modelos, redefinir os conceitos eintroduzir novos pontos de vista a fim de dar conta da problemática iminente.

Como resultado da ampla difusão da temática ambiental, inúmeros estudosbuscando conceituar meio ambiente foram produzidos em conjunção com os co-nhecimentos oriundos da ecologia e da problemática social.

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Gallopin e Melnick (in Sunkel e Gligo, 1980) elaboraram um painel enfo-cando as diferentes abordagens conceituais existentes sobre o tema, bem como asnumerosas classificações estabelecidas para delimitar o conceito de meio am-biente.

Outro eixo de análise foi o da relação do tema ambiental com a proble-mática do desenvolvimento. Essa análise foi fundamentada, sobretudo, nos do-cumentos preparatórios às conferências organizadas pela ONU, como as de Founex(1971, Suíça), Cocoyoc (México, 1974) e Haia (Holanda, 1991), ou nos própriostextos oficiais das conferências da referida entidade – Estocolmo (1972) e Rio deJaneiro (1992). À ONU tem sido delegada a autoridade máxima nas questõesambientais, em contraposição aos Estados nacionais.

Diversos trabalhos foram produzidos mediante o estabelecimento de con-vênios entre universidades e governos locais, tais como os realizados pelo Institutode Tecnologia de Massachusetts para o conhecido informe do Clube de Roma,que antecedeu a fase das conferências mundiais, e posteriormente os da ÉcolePratique des Hautes Études e outras universidades. Cabe salientar que após 1972esses trabalhos foram subsidiados pelo Programa das Nações Unidas para o MeioAmbiente – PNUMA.

A problemática do desenvolvimento, redirecionada como ecodesenvolvi-mento (a partir da conferência de Estocolmo) ou como desenvolvimento sus-tentável no relatório da Comissão Brundtland (1988), nos documentos oficiais,suscitou um questionamento vigoroso. Também nos países socialistas, no períodoentre as duas conferências mundiais (1972 e 1992) sobre o tema, produziu-se umdebate acerca da questão ambiental (Brow, Emerson e Stoneman, 1978; Novik,1982; Guerásimov et al., 1983), ainda que os contornos apresentados tenham sidoalterados radicalmente.

O mapeamento das questões suscitadas por esses trabalhos obviamente estáfora dos propósitos deste trabalho. Importa-nos apenas a trajetória do debate ins-titucional promovido pela ONU e algumas reflexões sobre o movimento am-bientalista.

O debate ambiental oficial e sua crítica

O debate internacional sobre o tema do meio ambiente teve início com apublicação do documento do Clube de Roma14 em 1971. Nesse documento, pre-parado por um grupo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massa-

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chusetts, intitulado Os limites do crescimento, empregou-se uma concepção deanálise neomalthusiana, com um modelo de simulação baseado em cinco variá-veis: recursos naturais, alimentos por habitante, população, produção industrial porhabitante e índices de contaminação. Concluiu-se que o mundo enfrentaria oslimites de sua capacidade de sustentação em meados do próximo século, utilizandoos pressupostos tecnológicos mais otimistas.

Cabe evidenciar que as teses do esgotamento dos recursos naturais pautaramo debate internacional sobre meio ambiente e desenvolvimento no início da décadade 1970. Foi nesse contexto que a legislação de proteção dos mananciais e oPlano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado de São Paulo foram ela-borados.

Dessa perspectiva preservacionista, que preconizava a ausência de cres-cimento econômico e alertava sobre os limites ecológicos do desenvolvimentoeconômico, passou-se para a defesa de teses conservacionistas na Conferência deEstocolmo, em 1972. A partir de então, foram difundidas as idéias da conservaçãoe do ecodesenvolvimento em oposição ao debate de conteúdo preservacionista.15

No intuito de estender aos países em desenvolvimento o debate sobre o temaambiental, incentivando a inclusão deste em suas agendas políticas e econômicas,inseriu-se no documento produzido – a Declaração sobre o ambiente humano – ocritério da eqüidade social, segundo o qual os países deveriam empreender esforçosem direção ao próprio desenvolvimento.

A Conferência de Estocolmo marcou uma inflexão na evolução do conceitode meio ambiente, ao tratar politicamente o tema como ambiente humano, enfo-cando o homem e a perspectiva social como partes integrantes do problema, nabusca de um diálogo entre os países industrializados e os em desenvolvimento.Esse procedimento, entretanto, não reduziu a diferença de momentos históricosentre os países ricos e os pobres no que se refere à assimilação da questãoambiental.

O texto preparatório da conferência em questão, o Informe de Founex,16

ilustra os contornos da problemática no debate oficial, naquele momento:Os principais problemas ambientais dos países em desenvolvimento sãobasicamente diferentes dos que se percebem nos países industrializados.Trata-se sobretudo de problemas que têm sua raiz na pobreza e na própriafalta de desenvolvimento de sua sociedades. Em outras palavras, são pro-blemas de pobreza rural e urbana. Tanto nas cidades como no meio rural, oque está em perigo não são somente as condições de vida, mas a própriavida, devido às deficiências no abastecimento de água, à habitação ina-dequada, à falta de higiene, à desnutrição, às doenças e às catástrofes na-turais (...). É evidente que, em grande parte, os problemas ambientais que

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têm importância nos países em desenvolvimento são aqueles que podem sersuperados pelo próprio processo de desenvolvimento. Nos países maisavançados, é correto considerar o desenvolvimento uma das causas dos pro-blemas ambientais (...) a miséria que é o aspecto mais importante dosproblemas que afligem o meio ambiente na maior parte da humanidade[tradução da autora].A conceituação da questão ambiental estabelecida17 em Estocolmo circuns-

creveu a questão social subjacente ao modelo de desenvolvimento econômicoadotado como problemática ambiental, passando a ser o eixo dos debates emtemas que foram tratados anteriormente tendo em vista o aspecto social.

De fato, na bibliografia que utilizamos, é possível constatar que, no debateda questão ambiental nas últimas décadas, ficaram muito tênues as fronteiras nadefinição de problema ambiental e de problema social. Como observa Melnick(1980) ao comentar o Informe de Founex:

Não parece haver diferenças importantes entre o que se constituiu numproblema ambiental e num social. Certamente nesse sentido o informe éadequado, ambos não são independentes (...). Infelizmente, o conceito demeio humano foi elaborado de forma pobre, resultando inadequado comoorientação para análise de situações e sugestões de políticas concretas (inSunkel e Gligo, 1980, pp. 259-60, tradução da autora).Melnick mencionou os esforços posteriores empreendidos pela Comissão

Econômica para a América Latina das Nações Unidas – Cepal, visando a definiçãodo termo meio ambiente de forma a delimitar as fronteiras entre ambiental e sociale o próprio conceito de ambos. Para ele, fazia-se necessário estabelecer essadistinção com referência ao estilo e não em relação ao nível de desenvolvimentoadotado nos diferentes países. Melnick afirmou ainda que os esforços deviam serenvidados no sentido de analisar a intensidade da questão ambiental e a naturezados demais problemas que atuam simultaneamente no sistema.

Em face disso, a tônica dos trabalhos a partir do enfoque estabelecido pelaCepal passou a ser a do questionamento dos estilos de desenvolvimento e a pro-posição de estilos alternativos.

A definição de meio ambiente formulada pela Cepal restringe-se ao âmbitobiofísico natural e suas sucessivas transformações artificiais, assim como ao seudesenvolvimento espacial. Trata especificamente da energia solar, do ar, da água eda terra, da fauna, flora, minerais e espaço (no sentido de superfície disponívelpara a atividade humana). Trata ainda do meio ambiente construído ou artificia-lizado e das interações ecológicas entre todos esses elementos e entre eles a so-ciedade (Sunkel e Gligo, 1980, p. 14).

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O conceito de desenvolvimento sustentado a partir dos anos oitenta foi oque teve a mais ampla divulgação e utilização a partir de então e passou a constardos documentos produzidos entre as duas conferências promovidas pela ONU,como se pode verificar no informe Nosso futuro comum (Comissão Mundial sobreo Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1988) na Estratégia mundial para aconservação, elaborada pela União Internacional para a Conservação de Natureza– UICN,18 no documento Cuidando do planeta Terra (UICN), PNUMA, WWF,1992) e no trabalho Nossa própria agenda, da Comissão de desenvolvimento eMeio Ambiente da América Latina e Caribe (1990).

A definição mais conhecida, de acordo com Diegues (1992) é a utilizadapela Comissão Brundtland, no documento Nosso futuro comum (ONU, 1988):desenvolvimento sustentado é aquele que satisfaz as necessidades do presente semcomprometer as possibilidades de as gerações futuras satisfazerem as suaspróprias.

Dois princípios básicos permeiam o documento da Comissão Brundtalnd: aprioridade na satisfação das necessidades das camadas mais pobres da populaçãoe as limitações que o estado atual da tecnologia e da organização social impõemao meio ambiente.

Um dos esteios do conceito de desenvolvimento sustentado é a sua baseecológica. A conservação dos ecossistemas e dos recursos naturais é a condiçãobásica para o desenvolvimento, conforme o documento da UICN, que diz respeitoà manutenção dos processos ecológicos fundamentais, como a fotossíntese, osciclos hidrológicos e a reciclagem dos nutrientes, concepção que retomaremos nospróximos capítulos.

Nos capítulos seguintes discutiremos a delimitação entre questão social equestão urbana nos processos de ocupação irregular do solo e, ainda, a questãoambiental subjacente ao nosso objeto de estudo.

Na perspectiva da legislação brasileira (Lei 6.938/81), que visa regular asrelações entre o ambiente e as interferências da sociedade sobre o meio, este é oconceito de meio ambiente: “Conjunto de condições, leis, influências e interaçõesde ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todassuas formas” (Brasil, decretos, leis, 1981). Foram excluídos, portanto, os contornossociais na determinação do meio ambiente.

A Conferência do Rio de Janeiro de 1992 restabeleceu o enfoque do termomeio ambiente em sua relação com o desenvolvimento. O documento resultante daconferência, a Declaração do Rio sobre meio ambiente e desenvolvimento,19

manteve as teses de Estocolmo, propagando a idéia de direitos e responsabilidadesna questão ambiental entre os países e gerando uma agenda de compromissos, aAgenda 21, e a Declaração conjunta das cidades e autoridades locais, produzida

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em Curitiba também em 1992 por prefeitos e líderes de governos locais e auto-ridades metropolitanas.

A Agenda 21 é o documento mais abrangente e de maior alcance no queconcerne à questão ambiental e tem sido utilizada na discussão de políticas pú-blicas em seus aspectos de infra-estrutura, habitação e recursos hídricos. Resta-nosindagar sobre o significado efetivo dessas teses, sobretudo diante do modelo deEstado desenhado pelo projeto econômico neoliberal e do papel de mediador queo Estado desempenha nessa questão.

As teses do desenvolvimento sustentado presentes nos documentos oficiaisdas conferências da ONU receberam várias críticas, como as elaboradas porRedclift (1984) e expostas na análise de Diegues. Tais críticas centram seus argu-mentos na própria concepção de desenvolvimento sustentado elaborada pelaComissão Brundtland, conforme o exposto abaixo:

“Alguns autores, entre os quais Redclift (1987), criticam a proposta daComissão Brundtland por não ter dado ênfase às condições internacionaisque o desenvolvimento sustentado deve enfrentar. Segundo esse autor, aproposta ignora as relações de forças internacionais, os interesses dos paísesindustrializados em dificultar o acesso dos países do Terceiro Mundo àtecnologia, as relações desiguais de comércio, desfavoráveis a estes últimos,e a oposição das multinacionais a propostas tecnológicas contrárias às suasestratégias globais. Além disso, o relatório Brundtland não leva em conta ascontradições internas dos países em desenvolvimento, que os impedem deatingir o desenvolvimento sustentado.O segundo aspecto criticado por Redclift é a crença muitas vezes velada, doRelatório Brundtland, nas forças de mercado para solucionar os problemasambientais. Nesse sentido o relatório adota uma posição próxima à eco-nomia neoclássica, para a qual os problemas ambientais são meras exter-nalidades nos projetos em desenvolvimento” (1992, pp. 27-28).Além das análises críticas mais recentes, desde a primeira conferência o

debate oficial sobre meio ambiente suscitou o questionamento das posições de-fendidas em Estocolmo em diversos trabalhos produzidos nos países do Lesteeuropeu (Novik, 1982; Guerásimov et al., 1983). A tese geral defendida nessestrabalhos era a de que o problema ambiental no mundo capitalista contemporâneoestava vinculado à própria crise desse sistema, em contraposição à planificação dasociedade e da economia nos países socialistas.

Na mesma linha de análise, podemos citar também os trabalhos de Coates,Jungk, Kapp, Stoneman e Caldewell (1976) e o de Brown, Emerson e Stoneman(1978). Em síntese, esses trabalhos criticam os modelos de desenvolvimento capi-talistas, propondo modelos alternativos no que tange ao desenvolvimento econô-

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mico e às formas de exploração da natureza, preconizando o desenvolvimento desetores não relacionados com o mercado e o estabelecimento de limites ao cres-cimento econômico.

Stoneman (1978), ao debater as formas capitalistas de exploração da natu-reza, assinalou dois aspectos:1. a destruição do meio ambiente pelo homem antecedeu o capitalismo;2. o fato de os socialistas não terem demonstrado, nem na teoria nem na prática,

soluções melhores para os problemas ambientais.Assim, sua análise resulta na busca da especificidade da questão ambiental

no capitalismo, tentando isentá-la dos dogmas presentes nas análises dos paísessocialistas na década de 1970.

A crítica empreendida pelos países socialistas ao debate oficial sobre meioambiente, no entanto, colocou oportunamente a tônica das questões referentes àsestruturas sociais, buscando as especificidades da questão ambiental.

Os contornos da questão foram redimensionados, porém, a partir da crise dosocialismo e dos desastres ambientais ocorridos nos países do Leste europeu.

Após a Conferência de Estocolmo, em 1972, a crítica ao debate oficialdeslocou-se do bloco de países do Leste europeu para os países do chamado eixosul, constituído pelos países em desenvolvimento. Criticavam-se as condiçõesdesiguais entre os países e a política ambiental de “exportação” da poluição emdireção aos países em desenvolvimento, como é o caso da relocação de indústriascom maior potencial de degradação ambiental (Gallopin, 1987; Redclift, 1987).

O meio ambiente e a produção social do espaço

Na literatura existente sobre meio ambiente e questão urbana encontramosuma bibliografia que focaliza os custos desiguais do preço da degradação am-biental e que procura examinar como a mesma estrutura social que limita o acessoaos bens da sociedade distribui de forma desigual os seus “males”, na linha dostrabalhos denominados “environmental justice”.

Castells abordou esse tema em sua Questão urbana, no capítulo intitulado“Espaço social e meio natural: a propósito do meio ambiente”.

Ampliando a abordagem dogmática do plano ideológico de Castells, outrosautores trataram dos problemas articulados aos diferentes processos da estru-turação social com efeitos específicos em determinadas classes sociais, comu-

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mente a classe social menos favorecida (Martine, 1993; Smolka, 1993; Kowarick,1980; Hogan, 1993). Em seus trabalhos analisaram o que poderíamos chamar deespoliação ambiental, estabelecendo-se um paralelo com os processos de espo-liação urbana, tal como formulado por Kowarick (1979).

Castells remeteu a análise sobre o meio ambiente às condições de existênciacotidiana, ou seja, às possibilidades oferecidas por um determinado modo deorganização do consumo; portanto, no âmbito do próprio conceito de urbano,circunscrevem as análises às condições de reprodução ampliada da força de tra-balho (meios coletivos de consumo).

Por meio de um discurso que trata das condições de realização do bem-estardo homem, Castells considera que a ideologia do meio ambiente se caracterizapela fusão de três aspectos, quais sejam:1. Uma ideologia global referente ao conjunto das relações sociais como relações

da espécie humana com seu meio de vida.2. Um conjunto de questões, designadas sob o termo ecologia, que remetem em

definitivo à utilização social dos recursos naturais. Essas questões concernem,pois, ao sistema geral das relações cultura/natureza, e não somente ao meioambiente urbano.

3. As contradições suscitadas pela reprodução ampliada da força de trabalho emsua dimensão biológica. Neste sentido, é onde existe relação entre um processodeterminado e os problemas de equipamentos e de organização do consumocoletivo no tocante às unidades urbanas: trata-se do famoso marco vital (1975,p. 237, tradução da autora).

Podemos concluir que, para Castells, na ideologia do meio ambiente o pro-gresso técnico é compreendido como a base de toda transformação, sendo a elevinculados os processos de industrialização, urbanização, adequação do meio ecusto social, tanto nos termos da debilidade do consumo como nos da tensãosocial que surge como decorrência.

Castells aborda também a naturalização das contradições sociais da ideologiado meio ambiente, em análise semelhante à empreendida por Tafuri (1985) para acidade do Iluminismo. Tal posição, porém, é tida como limitada na atualidade, naperspectiva do próprio diálogo marxista.

O aspecto mais relevante da ideologia do meio ambiente é a naturalizaçãodas contradições sociais, esta redução da história humana a uma relaçãodireta entre o homem, enquanto realidade eterna e indiferenciada, e a na-tureza, enquanto um conjunto de recursos preexistentes a ele. Tal relaçãoestá dirigida pela tecnologia e há que se vigiar, portanto, para que essadominação mais brutal que o necessário não destrua um dos termos (ou osdois) da disputa idealista assim delineada. Mais concretamente, a ideologia

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do meio ambiente é, com respeito à natureza, o equivalente à ideologia daalienação em relação ao homem (...) apolítica, humanista, universalista ecientificista, a ideologia do meio ambiente transforma a desigualdade socialem moléstias físicas e funde as classes sociais em um único exército deescoteiros (1975, p. 238, tradução da autora).Cabe ressaltar que, apesar da constante crítica à ideologia do meio am-

biente, Castells acreditava que a problemática ambiental, já em 1975, inseriaquestões extremamente concretas no debate entre as classes sociais e possibilitavaa análise de uma estrutura social e seus efeitos, como, por exemplo, a indagaçãosobre a lógica social da produção da nocividade do meio ambiente urbano.

Outra linha de reflexão nessa perspectiva consiste na indagação do sig-nificado da constituição do paradigma ambiental ou ecológico em substituição aparadigmas sociais anteriores no planejamento ou na formulação de políticaspúblicas. Como exemplo, citaríamos os trabalhos de Topalov (1992) na abordagemcrítica das questões suscitadas pelo Informe de Founex (1971).

Do antiurbanismo americano à pauta do saneamento urbano:a agenda do ambientalismo

O mapeamento da extensa discussão produzida no âmbito do ambientalismo,dos movimentos da sociedade civil ou dos partidos políticos extrapola os limitesdeste trabalho. Interessa-nos aqui tão-somente apontar essa perspectiva, a fim dereferenciar a discussão, no segundo capítulo, dos diferentes setores da sociedadecivil que interagem na problemática dos mananciais, sobretudo o chamadoecologismo popular.

A concepção de meio ambiente para o movimento ambientalista remonta àdécada de 1960, numa visão antiurbana ligada à noção do verde com a mística danatureza silvestre (Martinez-Alier, 1993). São resgatados os modelos naturalistasutópicos de cidade, principalmente nos Estados Unidos, onde a tradição antiurbanano pensamento urbanístico é forte e remonta às teorias de Thomas Jefferson doséculo XVIII, as quais influenciaram o urbanismo americano do século XX,sobretudo o urbanismo de Louis Sullivan e o modelo utópico da ideologia agráriade Frank Lloyd Wright, a Broadacre-City.

As utopias antiurbanas, como assinala Tafuri (1985), são detentoras de umacontinuidade histórica: desde as propostas européias do naturalismo no século das

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luzes à teoria da cidade-jardim e ao desurbanismo soviético. Nos Estados Unidos,a ideologia naturalista do urbanismo, introduzida no período dos Setecentos, en-controu um campo de explicação política nos vínculos estabelecidos entre a po-lítica agrária e antiurbana de Jefferson e o exercício da democracia, assim comona modelo da Broadacre-City de Lloyd Wright, que expressa um movimentonostálgico como reação à angústia da alienação metropolitana. Esse movimentoteve continuidade nas expressões do movimento ambientalista de cunho an-tiurbano que teve espaço entre as décadas de 1960 e 1980 nos Estados Unidos.

A propósito das utopias antiurbanas e do sentido da idéia de natureza, cita-ríamos também uma afirmação já bastante divulgada de Freud (1920), segundo oqual “a criação do domínio mental da fantasia tem reprodução na criação dereservas e parques naturais em lugares onde as incursões da agricultura, do trân-sito ou da indústria ameaçam transformar (...) rapidamente a terra em alguma coisairreconhecível. A reserva se destina a manter o velho estado das coisas que foramlamentavelmente sacrificadas à necessidade em todos os outros lugares; ali, tudopode crescer e expandir-se à vontade, inclusive o que é inútil e até prejudicial. Odomínio mental da fantasia é também uma reserva assim recuperada das invasõesdo princípio da realidade”.20

A agenda do ambientalismo no Primeiro Mundo ampliou-se com a difusão,sobretudo na Europa, de temas vinculados ao modelo ou ao estilo de desenvol-vimento econômico adotado nesses países de Primeiro Mundo, com uma pautaque Pádua (1991) e Viola (1991) denominaram pós-materialista. Mesmo nos Esta-dos Unidos, o tema avançou para a discussão dos projetos de desenvolvimento,ainda na década de 1960, com a aprovação de medidas como a Política Nacionalde Meio Ambiente em 1969. A partir de então, por pressão de grupos ambien-talistas, passou-se a exigir a Declaração de Impacto Ambiental (EnvironmentalImpact Statement) para a implantação de diferentes projetos.

Viola (1991) realizou uma análise sobre o papel organizador do ecolo-gismo, apontando cinco grandes setores no panorama internacional no âmbito domovimento ambientalista. Trata-se do ambientalismo conservacionista (que buscaa recuperação e a preservação do ambiente em compatibilidade com o sistemacapitalista); do ecologismo radical (Greenpeace e Earth First); da política verde(associações ecologistas, redes informais e partidos verdes); do ecologismo cam-ponês (como os movimentos da Ásia e da Amazônia Brasileira); e o ecologismode ação global, de forte base científica (Society for General Systems Research, oClube de Roma e o Worldwatch Institute).

Um aspecto evidenciado nas análises do ambientalismo diz respeito à com-plexidade da genealogia do projeto verde, bem como expressa Pádua (1991,p. 137): “O modelo de sociedade que está emergindo dos programas verdes, aliás,

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seria um tema interessante de análise, pois nele estão combinados elementos que,na história do pensamento político, se identificam com tradições diferentes, comoo conservadorismo, o liberalismo, o anarquismo e o marxismo”.

A complexidade do tema ambiental exige, portanto, uma reflexão que in-corpore aspectos superestruturais tais como a política e a cultura, numa visão demundo mais próxima à Escola de Frankfurt.

Em contraposição à análise do papel da ideologia do meio ambiente, talcomo a empreendida por Castells (1975), encontramos na bibliografia consultadao resgate de uma visão culturalista do papel a ser desempenhado pela chamadaconsciência ecológica nas formas de produção do espaço, como nas premissas dourbanismo ecológico de Argan (1992) ou na assertiva do filósofo Habermas(1987), que vê no emergente movimento ambientalista um papel a desempenharnas transformações de formas de vida, a partir do fim das utopias socialistas,conforme texto de sua autoria sobre a crise do estado do bem-estar social e oesgotamento das energias utópicas.21

O nascimento da política verde no Brasil foi diretamente influenciado peladifusão do exemplo europeu (Pádua, 1991), embora a receptividade à problemáticaambiental aqui, na opinião de autores como Viola (1992), tenha sido acrítica. Parao referido autor, no emergente ambientalismo, não se pensou na especificidade dadeterioração ambiental brasileira, principalmente no que se refere ao imenso déficitde saneamento básico, uma vez que essa questão não constava do programaambientalista dos países do Primeiro Mundo porque já havia sido resolvidaanteriormente. Pádua (1991), por outro lado, ressalta a incorporação da temáticaverde ao ecologismo popular na Amazônia e a apropriação de temas ecológicospor movimentos sociais.

Consideramos, entretanto, que após a Conferência da ONU no Rio deJaneiro, em 1992, os movimentos ambientalistas têm redirecionado sua pauta, nelaincluindo os temas urbanos. Isso se deu por causa da inflexão no trato da questãoambiental, ao incorporar a temática urbana nas diretrizes estabelecidas naDeclaração do Rio e da ampla divulgação da Agenda 21, que enfatiza questõescomo a dos assentamentos urbanos (Capítulo 7), dos resíduos sólidos (Capí-tulo 21) e dos recursos hídricos (Capítulo 18).

A elaboração e a promoção da Agenda 21 local foram delegadas às or-ganizações não-governamentais ambientalistas, que têm reformulado suas pautas,a elas incorporando os temas circunscritos ao urbano – saneamento básico, pro-teção de recursos hídricos, poluição industrial, entre outros. Citaríamos, comoexemplo, a ampla campanha pela despoluição do rio Tietê em São Paulo, pro-movida pela Fundação Mata Atlântica, organização de conteúdo conservacionista.

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Por outro lado, a presença crescente da questão ambiental nos debates queantes se faziam no âmbito da questão social redirecionou a agenda dos agentes einstituições que se articulavam em torno do padrão da reforma urbana redis-tributiva. Foram incorporados às reivindicações dos movimentos sociais urbanosos temas da defesa do meio ambiente nas cidades, como observam Cardoso eRibeiro (1994).

Retomaremos o assunto nos capítulos seguintes, na análise da situaçãoconcreta do impacto de determinada política de proteção ambiental nas formas deprodução do espaço na metrópole paulista e nas concepções de espaço e meioambiente resultantes dos processos estudados e no Capítulo 4, quando trataremosdo Programa Guarapiranga. Contudo, ao analisarmos este tema ambiental, obser-vamos que as assertivas de Argan e de Habermas se configuram num devir bas-tante longínquo para nós.

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Notas

1. Utilizamos aqui o conceito de natureza artificializada com base no texto de SANTOS,Milton. “1992: A redescoberta da Natureza”, in Revista Estudos Avançados. jan.-abr., n. 14,São Paulo, Editora USP, 1992.

2. Carta de Atenas (1933), documento que expressa a formulação doutrinária do grupo emtorno dos CIAM – Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna.

3. Essas propostas serão retomadas no Capítulo 4, na análise de experiências de projetossustentáveis, nos quais tal formulação esteve presente.

4. Os artigos a que nos referimos podem ser encontrados em BURGESS, E; PARK R. E. eMcKENZIE, R. The City. Chicago, The University of Chicago Press, 1967, e em PARK, R.E. “A cidade: sugestões para a investigação do comportamento humano no meio urbano”,in VELHO, O. G. (org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro, Ed. Guanabara, 1987. pp. 26-67.

5. Ver a respeito DELLA DONNE, M. Teorias sobre a cidade. Lisboa, Martins Fontes, 1983.

6. A leitura dessas teorias foi baseada nas obras de BERRY, B. J. L. “Fronteiras de pesquisada geografia urbana” e THOMPSON, W. R. “Crescimento e desenvolvimento econômicourbano no sistema nacional de cidades”, in HAUSER, P & SCHONORE, L. F. (org.). Estudosde urbanização. São Paulo, Pioneira, 1976, como também nas análises de DERYCKE, P. H.Economia y Planificación Urbanas. Madri, Instituto de Estudios de Administracion Local,1983, pp. 174-88, e GOTTDIENER, M. A produção social do espaço. São Paulo, Edusp,1993, p. 57.

7. As citações basearam-se na leitura de DERYCKE, P. H., op. cit., pp. 97-126.

8. Baseado em GOTTDIENER, M., op. cit., 1993. p. 49.

9. Baseamo-nos na leitura crítica da pesquisa urbana de inspiração marxista empreendida porTOPALOV, C. “Fazer a história da pesquisa urbana: a experiência francesa desde 1965”, inRevista Espaço e Debates, ano VIII, n. 23, 1988, pp. 5-30, e por GOTTDIENER, M., 1993,op. cit.

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10. Conforme texto publicado em FORTI, R. (org.). Marxismo e urbanismo capitalista. SãoPaulo, Livraria Editora Ciências Humanas, 1979.

11. Unidades de conservação: áreas legalmente protegidas, instituídas por decreto ou lei,em nível federal, estadual ou municipal, com o objetivo de proteger bancos genéticos deinestimável valor para o desenvolvimento de pesquisas científicas a garantir às geraçõesfuturas o patrimônio biótico. Outras áreas sob proteção: todas as áreas legalmente protegidas,mas que não constituem unidades de conservação, como o caso das áreas inseridas nos limitesde proteção dos mananciais.

12. Tomamos contato com o debate acerca do conceito de natureza do ponto de vistafilosófico através da obra de ROSSET (1989), na qual é analisada a idéia de natureza e adelimitação das fronteiras entre as noções de natureza (mundo natural) e artifício (mundoartificial). Consta também na obra desse autor uma bibliografia crítica sobre o tema, queextrapola, porém, os limites deste livro.

13. PARK, R.E., 1987, op. cit., 26-67.

14. MEADOWS, D. et al. Los Limites del Crescimiento. México, Fondo de Cultura Económica,1972.

15. Utilizamos aqui o termo preservação no sentido de expressar algo intocado e intocável,mantendo-se suas condições primitivas naturais isentas de qualquer ação antrópica, econservação como um sentido mais flexível, entendido como algo passível de sofreralterações mediante obras que possam ajudar a manter os ecossistemas compatibilizados deforma integrada à intervenção.

16. 1971, pp. 3-4. Citação extraída de MELNICK, S. R., in SUNKEL, O. & GLIGO, N. op cit.,p. 259.

17. “Declaração sobre o ambiente humano – Conferência de Estocolmo”, in SECRETARIADE ESTADO DO MEIO AMBIENTE – CONSEMA. Política estadual do meio ambiente edos recursos naturais. São Paulo, SMA, 1984 (mimeo).

18. As estratégias de desenvolvimento preconizadas no citado documento foram retiradasdo resumo desse trabalho publicado pela SECRETARIA DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE,op cit., 1984.

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19. Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. “Declaração do Rio sobre meioambiente e desenvolvimento”, in Documentos oficiais: Organização das Nações Unidas.Organizações não-governamentais. São Paulo, SMA, 1993.

20. FREUD, S. Introdução geral à psicanálise, 1920, citado por SANTOS, Milton, op. cit.,p. 102.

21. HABERMAS, J. “A nova intransparência – a crise do estado de bem-estar social e oesgotamento das energias utópicas”, in Revista Novos Estudos Cebrap, n. 18. São Paulo,Cebrap, set.-out., 1987, p. 113.

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Capítulo 2A cidade e as águas

Desde o início da história da civilização, as cidades comumente se locali-zavam junto às águas. De fato, observamos na análise da história urbana em-preendida por Benévolo (1983) que das cidades da Mesopotâmia (localizadas nabacia aluvial dos rios Tigre e Eufrates) às do Egito (localizadas às margens do rioNilo), a água dos rios e canais construídos delimitava as cidades e permitia trans-portar por toda parte produtos e matérias-primas. Isso se aplica igualmente àscidades da civilização greco-romana, na bacia do Mediterrâneo, berço da antigaRoma, no curso inferior do rio Tibre, ou as civilizações do Extremo Oriente,localizadas próximas aos impetuosos rios do Himalaia.

As cidades européias da Idade Média que cresceram sobre antigos traçadosurbanos também foram recortadas pelas águas: Londres junto ao Tâmisa; Parisjunto ao Sena; Nuremberg, na Alemanha, junto ao rio Pegnitz; e Veneza loca-lizada em plena laguna formada por vários canais que convergem e desembocamno mar aberto.

No Renascimento, a cidade utópica de Thomas More é minuciosamentedelimitada pelas águas, como nos mostra o texto abaixo:

Em todo o espaço compreendido entre a cidade e o mar, e algumas milhasacima da cidade, o fluxo e o refluxo, que duram seis horas por dia, mo-dificam singularmente o curso do rio. Na maré cheia, o oceano enche comsuas vagas o leito do Anidro (…). As duas margens do Anidro são ligadaspor uma ponte de pedra (…). Encontra-se essa ponte na parte mais afastadado mar (…). Outro rio, pequeno é certo, mas belo e tranqüilo, corre tam-bém dentro dos muros de Amarouta (More, p. 75).

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A localização das cidades antigas, determinada pela presença das águas,propiciou a elas uma situação ímpar no que se refere à disponibilidade dos re-cursos hídricos. A Grande Paris tem cerca de 10 milhões de habitantes e o RioSena, no trecho em que cruza a cidade, tem vazão média da ordem de 300 m3/s.Roma tem cerca de 6,5 milhões de habitantes e o rio Tibre, em seu trecho ro-mano, cerca de 360 m3/s de vazão média. A cidade de Lyon tem cerca de 6milhões de habitantes, e o rio Ródano, que recebe o rio Saona, 700 m3/s de vazão.A Região Metropolitana de São Paulo, em comparação, tem aproximadamente 16milhões de habitantes e a bacia onde está situada, a do rio Tietê, região de ca-beceira de cursos de água, apresenta uma vazão média de 90 m3/s, de acordo comdados de Nucci (1993).

A abundância desses recursos não resultou em uma situação de equilíbriocom o meio natural. Pelo contrário, é bastante conhecida a situação crítica dapoluição a que chegaram os rios Tâmisa e Sena. A esse respeito, encontramos naliteratura relatos impressionantes da poluição do Tâmisa na Londres industrial doséculo XIX.

A situação das grandes cidades americanas entre si é bastante distinta emfunção da diversidade biogeofísica de seu território. Nova York tem uma situaçãomais favorável em relação à poluição por estar situada em região estuarina, ondeos movimentos da maré asseguram dinamismo às águas. No entanto, importaágua de reservatórios distantes devido à contaminação dos poços locais junta-mente com as demandas do Brooklin e Long Island, que comprometem o abas-tecimento da área metropolitana. Segundo Spirn (1995), a disputa sobre o direitodas águas foi um dos conflitos mais violentos do oeste americano. E cidadesdistanciadas por um terço do continente, como Los Angeles e Denver, disputamo uso da mesma água.

As formas de urbanização também tiveram um impacto intenso nos ma-nanciais hídricos na América, chegando a níveis críticos no tocante à qualidadedas águas. Era o caso de Chicago, por exemplo, que até o século XX despejavaseu esgoto no lago Michigan e dele retirava a água para a população.

Outra questão no continente americano que o coloca diante da iminênciade uma grave crise refere-se aos elevados padrões médios de consumo de águasdas cidades americanas – em torno de 640 litros por dia, enquanto, por exemplo,o da Região Metropolitana de São Paulo, hoje, é da ordem de 200 litros por dia.

Por meio da verificação de outro momento histórico, e utilizando um parâ-metro mais homogêneo (pois o nosso inclui a imensa maioria da população combaixos padrões de consumo), constatamos, segundo dados de Spirn (1995), quecidades européias na década de 1940 – Londres e Berlim, por exemplo – apre-

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sentavam um consumo médio de 150 litros por dia, enquanto o uso per capita daágua nas cidades americanas era em torno de 600 litros por dia.

Em estudo recente da Organização das Nações Unidas constata-se a manu-tenção desse elevado padrão de consumo per capita de água em alguns países,incluindo o consumo agrícola, industrial e doméstico, conforme os dados apre-sentados referentes ao consumo anual per capita na América do Norte em tornode 1.680 m3/s e do Egito em torno de 952 m3/s, em contraposição aos valoresverificados na Europa de aproximadamente 626 m3/s e do Brasil de 246 m3/s(Margat, 1998).

A propósito da questão da desigualdade da distribuição e consumo daságuas entre países, dados do Banco Mundial indicam que 1 bilhão de pessoas nomundo não têm acesso adequado ao abastecimento de água. A recomendação daAgenda 21 é que a meta de fornecimento seja de 40 litros de água tratada por dia,por pessoa, até o ano de 2005. Esses dados evidenciam a apropriação extrema-mente desigual dos recursos naturais, assim como a insustentabilidade dos padrõesatuais de apropriação dos recursos ambientais em algumas regiões.

Nos demais continentes, a situação é ainda mais dramática. No balanço fei-to sobre a questão hídrica na reunião preparatória da Conferência de Hábitat II,chegou-se a cogitar a possibilidade futura de guerras entre países pela disputa daságuas, sobretudo nos países da África e do Oriente Médio.

Na América Latina, a Cidade do México apresenta uma das situações maiscríticas em termos de recursos hídricos superficiais. No Brasil, este é o quadro –alarmante – que temos: poluição dos rios por mercúrio, rejeitos sólidos dos ga-rimpos, dejetos dos esgotos sanitários das grandes cidades, assoreamento e inter-ferência no ciclo das águas por grandes projetos, exploração descontrolada dosrecursos subterrâneos, desertificação no Nordeste brasileiro, nos pampas do RioGrande do Sul e no noroeste do Paraná, conforme relatório do perfil ambientaldo Brasil realizado em 1992 (Sema, Ibama, Abema, SMA-SP, 1992).

A escassez de água, a contaminação dos mananciais e as enchentes repre-sentam as maiores ameaças à saúde e à segurança, em virtude da maneira comosão estabelecidos os processos de apropriação dos recursos ambientais, em espe-cial os oriundos das formas de urbanização inadequadas vigentes.

Hoje em dia, no meio técnico-científico, são bastante conhecidas e estu-dadas as características do ciclo hidrológico, da dinâmica da poluição, dos pro-cessos de assoreamento e a correlação destes com o uso do solo urbano.

A alternativa encontrada em diversos países para a reversão dessa pro-blemática e do equacionamento dos conflitos que se sobrepõem aos vários usosda água – abastecimento público, energético, controle de enchentes, irrigação etc.

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– foi a estruturação de sistemas institucionais de gestão das águas, com a par-ticipação da comunidade, com o estabelecimento de parâmetros de controle paraa determinação dos limites de tolerância dos sistemas naturais e de instrumentosde normatização do uso do solo, e cobrança pelo uso da água e pela poluiçãogerada (o chamado poluidor pagador).

Na literatura sobre o assunto (Yassuda, 1991), verifica-se que a experiênciaestrangeira analisada – França, Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos – é diver-sificada. A França adotou a gestão das águas por bacia hidrográfica com a criaçãode comitês de bacia (pequeno parlamento de usuários e autoridades no assunto)com autonomia financeira e a adoção de cobrança pelo uso das águas. Na Ingla-terra, o modelo é semelhante ao francês, porém com ações executivas de interessecomum centralizadas. Na Alemanha, a gestão é integrada, participativa e descen-tralizada no nível de bacia hidrográfica, com estrutura gerencial efetuada porassociações de usuários (condomínios) e estrutura operacional com a participaçãodas empresas. As normas gerais são ditadas pelo governo federal, embora osestados tenham autonomia para legislar suas peculiaridades hídricas. Já nosEstados Unidos, a experiência é centralizada no governo federal, e a articulaçãoé feita junto aos estados interessados. Destaca-se a experiência da TennesseeValley Authority – TVA –, uma autarquia federal.

As possibilidades de intervenção apresentadas acima, com a mediação dosconflitos entre cidade e meio ambiente, serão retomadas quando da discussão dosignificado do projeto ambientalista e a cidade, retomando-se também questõeslevantadas anteriormente sobre as possibilidades efetivas de uma gestão descen-tralizada, como a do modelo francês, em uma metrópole globalizada, fragmentadae excludente, com uma dualidade em sua estrutura social, como é o caso de SãoPaulo.

Dos chafarizes à gestão das águas

A dimensão histórica da relação entre cidade e águas na área metropolitanade São Paulo nos oferece a oportunidade de verificar as relações conflituosas entreos espaços e os interesses privados, a apropriação dos recursos ambientais e afunção social desses recursos e espaços ao longo do tempo.

Os elementos que fazem parte dessa história remontam ao planejamento deum primeiro chafariz na paragem Inhangavahu, em 1744: “(…) de pedra e cal

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(…) capaz de serventia ao povo (…) com capacidade de ficar vistosa a fonte, queteria doze palmos em quadra de chão lajeado, duas pias de boa pedra; e maisconfrontispício de doze palmos em quadra com sua cimalha bem feita”.1

Durante um século esta foi a forma de abastecimento público na provínciade São Paulo – chafarizes. Seguiu-se a construção de vários chafarizes de águascaptadas dos córregos na própria área urbana: o córrego das Almas, que alimen-tava a mais bela fonte; o chafariz da Misericórdia; o córrego Saracura, que ali-mentava a Pirâmide da Memória; e os chafarizes do Jardim Botânico da Luz, dolargo São Bento, enfim catorze deles espalhados pela cidade.

Em 1877 formou-se, pela iniciativa privada, a Companhia Cantareira deÁguas e Esgoto, que recebeu a concessão para cuidar do abastecimento públicode São Paulo. Essa empresa iria captar águas do distante ribeirão Pedra Branca,na serra da Cantareira, interligando setenta e um prédios no bairro da Luz. Porém,por dez anos a população continuou a utilizar-se de fontes naturais até a completadestruição dos chafarizes pela Companhia Cantareira, como forma de obrigar oshabitantes a fazer as interligações domiciliares de água. Essa obrigatoriedade foiacompanhada de violenta revolta popular.2

No mesmo ano da destruição dos chafarizes, o governo estadual, atendendoàs reclamações populares, rescindiu o contrato de concessão que havia firmadocom a empresa dez anos antes. Criou então um setor na administração públicapara tratar do abastecimento de água e do saneamento público.

O modelo de proteção dos recursos hídricos adotado no início do século atéa década de 1930 foi o da preservação total dos recursos, com a desapropriaçãode todas as bacias hidrográficas contribuintes do manancial, situadas geralmenteem áreas serranas.3 Esse modelo impedia qualquer tipo de uso ou de manejo dosrecursos naturais e a ele devemos as raras reservas florestais existentes hoje nametrópole, como o Parque do Estado e o Parque da Cantareira.

Essa prática mostrou-se inviável nos anos posteriores à década de 1940devido aos altos preços da terra, à extensão das áreas a serem protegidas – neces-sárias para suprir demandas crescentes da metrópole – e ao comprometimento douso do solo com a urbanização ou mesmo com atividades rurais.

A promulgação do Código das Águas em 1934, em que se declarava apropriedade social dos recursos hídricos, desvinculou a propriedade das águas dado solo e estabeleceu normas com o intuito de superar conflitos quanto aos dife-rentes usos da água.

O Código das Águas apresentou avanços significativos; contudo, teve suaaplicabilidade reduzida em decorrência de acordos, sobretudo para a exploraçãoenergética, como o que foi estabelecido junto à empresa canadense The São Paulo

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Railway Light & Power, que obrigava o Estado a compensar o volume de águaretirado do Reservatório Guarapiranga.

Os processos de urbanização da metrópole ocorreram de forma extensivae periférica, levando a um comprometimento do uso do solo nas bacias contri-buintes, degradando paulatinamente os recursos hídricos já escassos na RegiãoMetropolitana. A política adotada entre os anos trinta até a década de 1970 foia da promulgação de sucessivas medidas de controle da poluição com leis espe-cíficas, sobretudo para as indústrias. As proposições evoluíram para um modelode ocupação do solo nas áreas contribuintes dos reservatórios e cursos d’água, enão mais através de medidas de desapropriação de glebas.

Na década de 1970 foi promulgada a legislação ambiental de proteção dosmananciais hídricos metropolitanos, objeto de nossa análise a seguir. Essa legis-lação ainda se encontra em vigor, pelo menos enquanto não forem elaboradas asleis específicas para as áreas de proteção e recuperação dos mananciais, esta-belecidas pelas diretrizes e normas para a proteção das bacias hidrográficas dosmananciais de interesse regional do estado de São Paulo, editadas pela lei estadual9.866 de 1997.

A legislação ambiental promulgada consistiu basicamente de um modeloteórico de ocupação desejável na bacia a ser protegida mediante a aplicação dedispositivos disciplinando o uso do solo nas bacias – prática derivada da legis-lação urbanística –, com a montagem de um sistema institucional de controle doespaço.

Após mais de 20 anos de vigência da referida legislação, o quadro insti-tucional e político do país alterou-se substancialmente. Houve avanços signifi-cativos no tocante aos instrumentos de políticas ambientais e urbanas, viabilizadospela reforma constitucional. Fez-se necessário um reordenamento legal, ade-quando os instrumentos de proteção dos mananciais às novas figuras jurídicascriadas com as cartas constituintes, a federal de 1988 e a estadual de 1989, ins-tituindo a gestão das águas por bacia hidrográfica, e não mais por limites admi-nistrativos. Essa readequação dos instrumentos de proteção dos mananciais, de-corrente da delegação de maior autonomia política ao poder local, com ênfase nopapel estratégico das cidades, possibilitou a aglutinação de interesses comuns naforma de consórcios intermunicipais, em oposição à centralização das políticaspúblicas das últimas décadas.

Com os avanços incorporados na área de saneamento e o controle da po-luição nas últimas duas décadas, evidenciou-se também a necessidade de se pro-ceder à revisão técnica da legislação e do próprio modelo de ocupação do soloproposto, de acordo com as características físicas e a capacidade de diluição eautodepuração de cada reservatório em face do padrão de água que se queriaestabelecer.

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Tais aspectos traduzem avanços significativos na sociedade e na relaçãoentre cidade e meio ambiente. A emergência do projeto ambientalista na direçãoda sustentabilidade ambiental e social coincidiu com o processo de revisãoconstitucional. No caso das águas, delimitou-se claramente a prioridade para oabastecimento público por meio da gestão das águas em detrimento da energética,que orientou durante décadas as políticas desenvolvimentistas.

A partir dessas definições, assistiu-se a um rápido e intenso processo deinstitucionalização da gestão das águas em São Paulo. Com a promulgação delegislação específica, criou-se um sistema de gestão nos moldes da experiênciafrancesa, que incluía a constituição de um Conselho de Recursos Hídricos cujafunção consiste em assegurar a participação paritária de Estado e poder local comrepresentantes da sociedade civil, por meio de organizações não-governamentais.O sistema é composto, ainda, de uma Unidade de Gerenciamento dos RecursosHídricos (UGRHI), Comitês de Bacias e outras instâncias que objetivam dar su-porte técnico ao processo decisório. Foi também instituído um fundo de finan-ciamento para as ações – Fehidro (Fundo Estadual de Recursos Hídricos) – erecentemente criada a figura jurídica da agência de bacias que, com leis próprias,atua como uma fundação de direito não-público, com autonomia administrativano que se refere à gestão dos recursos financeiros pertinentes a cada bacia hi-drográfica.

A opção pelo modelo que segue a experiência francesa suscitou várias dis-cussões. Questionaram-se, por exemplo, as idéias fora do lugar, a transposiçãopara a nossa realidade de um modelo participativo europeu baseado em outrocontexto social, em que o grau de organização dos diferentes atores sociais e dasformas de produção e apropriação dos espaços se apresenta totalmente distinto.Algumas avaliações da experiência francesa permearam as discussões, como aempreendida por Barraque, da qual transcrevemos o texto abaixo:

Não é portanto por acaso que as seis agências francesas de bacia nasceramsob a forma de organismos financeiros leves e ágeis (…), a fim de facilitara adoção de uma iniciativa do tipo econômica e contratual entre grupos so-cioambientais, em torno de objetivos específicos: aumentar a quantidade ea qualidade de água disponível para os diferentes usos, bacia por bacia,sempre contornando a fragilidade da regulamentação da matéria.Tudo isto favoreceu então uma integração na privatização da gestão dociclo da água: assim, o fato de se pagarem a taxa-poluição e a taxa desaneamento com a fatura da água potável encorajará, com o tempo, a uni-ficação do setor, enquanto, desde já, ele proporcionará confortáveis reservasfinanceiras às companhias privadas que gerem água potável (1992, p. 43).

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Os horizontes da experiência francesa como delineado por Barraque in-dicam uma apropriação privada dos recursos ambientais, tema ao qual retorna-remos na análise da inserção da legislação de mananciais neste quadro.

Consideramos que a profunda inflexão do cenário político, com o triunfoaparente do modelo neoliberal e as alterações na estrutura econômica produtivaem direção às formas pós-fordistas de produção, tem reduzido as possibilidadesde conquista por meio de uma reforma social redistributiva realizada em con-junção com a reforma urbana, bem como as de avanços na área ambiental.

Em face do exposto, o redesenho da área metropolitana no nível espacial,anunciando formas mais integradas entre a cidade e o meio ambiente, com apromulgação de inúmeras áreas de proteção ambiental na década de 1980, e oredesenho da estrutura de participação no nível institucional, no caso das águaspossibilitado pelo estabelecimento de estruturas e sistemas de gestão, com asalterações constitucionais nos níveis federal e estadual e a consubstanciação destasem legislações específicas, também nos níveis federal e estadual, correm o riscode tornarem-se inócuos ou pouco eficazes em razão da emergência de um novopatamar institucional que caminha na direção de um modelo que vem sendo deno-minado Estado mínimo, a exemplo do que vem ocorrendo com o projeto de Re-forma Urbana.

Nesse sentido, a reflexão sobre os processos e as propostas em curso acercada legislação de proteção dos mananciais, agora no âmbito do sistema de gestãodas águas, adquire importância ímpar na discussão dos vínculos entre a emer-gência do projeto ambientalista e o projeto neoliberal, com impactos profundossobre a cidade e o meio ambiente.

A defesa de um projeto de uso e ocupação do solo baseado em pactos terri-toriais entre os diversos agentes que atuam na questão e não em uma visão de umzoneamento de espaço rígido e em um modelo de cidade ideal e excludente, comotem sido defendido por amplos setores vinculados a grupos populares – urbanose ambientais –, enseja, nesse sentido, a possibilidade do efetivo exercício partici-pativo nessas novas formas organizativas como a da Agência de Bacia Hidro-gráfica. Essa possibilidade é, também, reiterada pelo fato dos temas como o dasustentabilidade ambiental encontrarem-se muitas vezes desvinculados de in-teresses de grupos sociopolíticos determinados, ou seja, os temas ambientais têmsido apoiados em interesses territoriais que muitas vezes transcendem interessesde classes sociais específicas.

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Cidade ideal e águas limpas: o debate sobre a proteção dosmananciais

A formulação da legislação de proteção dos mananciais na década de 1970insere-se em um contexto do planejamento urbano com a tônica do pensamentoracionalista da organização das grandes estruturas espaciais, para nós um mo-mento de forte centralização política, distante, portanto, do contexto atual.

Cabe esclarecer que a legislação ambiental editada em 1975 estará em vi-gência até que sejam promulgadas as leis específicas das áreas de proteção erecuperação dos mananciais, segundo a atualização feita pela Lei 9.866 de 1997,de proteção dos mananciais do estado de São Paulo, que estabelece diretrizes enormas para a proteção e recuperação das bacias hidrográficas.

Tal legislação fazia parte de um conjunto de instrumentos esboçados apartir do Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado – PMDI, elaboradoem 1971, pelo então grupo de trabalho encarregado de traçar diretrizes de plane-jamento metropolitano. Esses instrumentos, que incluíam o zoneamento industriale a legislação de mananciais, buscavam a reorientação das tendências de cres-cimento e desenvolvimento urbano regional, bem como o estabelecimento demedidas quanto à proteção dos recursos naturais.

É importante destacar que esse plano representou grande avanço em relaçãoaos planos diretores que o antecederam – os da década de 1950 –, ao tratar dequestões concernentes aos recursos naturais no âmbito metropolitano. Comoexemplo, citaríamos o Plano Urbanístico Básico – PUB (Asplan, 1968) – para omunicípio de São Paulo, que além de não contemplar questões como a do abas-tecimento de água, propusera, entre suas diretrizes de expansão, a desconcen-tração urbana com a implantação de um núcleo urbano-industrial de porte naregião sul do município de São Paulo (Parelheiros) em bacia de drenagem deproteção dos mananciais.

Cabe também assinalar que o plano elaborado em 1971 foi pautado pelodebate internacional sobre os limites ambientais do desenvolvimento, como osuscitado pelos trabalhos do Clube de Roma,4 com as hipóteses centradas noesgotamento dos recursos não-renováveis em um horizonte de tempo próximo.

Entre outras diretrizes que o Plano Metropolitano propunha, podemos citarde forma esquemática, para os propósitos deste texto, as seguintes:• Orientação das tendências de crescimento e desenvolvimento da metrópole nos

vetores leste e nordeste, onde se encontram os terrenos mais adequados à

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ocupação urbana, e restrição do crescimento nos vetores norte, sul, sudoeste esudeste, onde se localizam os mananciais hídricos;

• Promoção de um sistema integrado metropolitano de grandes espaços abertos,visando à proteção dos recursos hídricos, à criação de áreas de recreação ativa,à preservação da paisagem regional e à garantia de ampla reserva de espaçospúblicos para o futuro;

• Estabelecimento de uma política quanto ao uso dos recursos hídricos da regiãoque dê prioridade ao abastecimento e à recreação, em contraposição à supre-macia do uso energético.

Para atingir essas metas foi formulado um conjunto de instrumentos paraa área metropolitana, como a legislação de zoneamento industrial e a dos manan-ciais. O modelo de uso e ocupação do solo preconizado na legislação de ma-nanciais incide em 50% da superfície metropolitana delimitada entre as baciashídricas a serem protegidas.

Os pressupostos desse modelo foram baseados na visão de uma gestãourbano-ambiental fundamentada em um processo racional de tomada de decisões,de acordo com um modelo de ordem urbana ideal tendo em vista a integraçãocidade-campo e cidade-meio ambiente.

A exemplo das cidades ideais do final do século XIX, que eram propostasna forma de círculos concêntricos com a presença de vazios urbanos variandosegundo os anéis, como a cidade de Fourier (1822) e o conhecido modelo de Parke Burgess (1925), as áreas urbanas existentes nos mananciais foram delimitadasem anéis de círculos concêntricos, e a área de expansão urbana prevista foidelimitada em círculos decrescentes de densidade.

A superfície na qual incide a legislação ambiental é da ordem aproximadade 53% da superfície metropolitana, englobando vinte e sete dos trinta e novemunicípios que integram a região metropolitana, a saber:

Vetor centro município de São Paulo (547 km2, 36,2% da superfície)Vetor norte municípios de Mairiporã (246 km2, 80,1%) Caieiras

(21 km2, 20,2%) e Franco da Rocha (7 km2, 4,9%)Vetor oeste municípios de Cotia (211 km2, 64,9%), Itapevi (2 km2,

2,3%) e Vargem Grande Paulista (27 km2, 93,1%)Vetor sudoeste municípios de Itapecerica da Serra (136 km2, 100%),

Embu (40 km2, 58,8%), Embu-Guaçu (171 km2, 100%),Juquitiba (550 km2, 100%) e São Lourenço da Serra(192 km, 100%)

Vetor nordeste municípios de Guarulhos (99 km2, 29,6%), Arujá(49 km2, 51%) e Santa Isabel (296 km2, 82%)

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Vetor leste municípios de Salesópolis (409 km2, 97,8%), Biritiba-Mirim (367 km2, 88,6%), Mogi das Cruzes (358 km2,49%), Suzano (136 km2, 73%), Ferraz de Vasconcelos(10 km2, 40%) e Poá (1 km2, 5,9%)

Vetor sudeste municípios de Santo André (96 km2, 53,6%), SãoBernardo (216 km2, 52,6%), Mauá (13 km2, 19,4%),Ribeirão Pires (107 km2, 100%), Rio Grande da Serra(33 km2, 100%) e Diadema (7 km2, 21,9%)

Nessa divisão verificamos que os municípios de Itapecerica da Serra,Embu-Guaçu, Juquitiba, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, São Lourenço daSerra e Vargem Grande Paulista, situados no vetor sudoeste, têm seus territóriostotalmente englobados nas áreas de proteção dos mananciais, e a cidade de SãoPaulo possui 36% de seu território dentro desses limites.

As áreas inseridas nos limites de proteção contêm os mananciais atuais eos estratégicos para ampliações futuras, englobando parte das bacias do AltoTietê, do Paraíba do Sul, do rio Juquiá e da vertente oceânica. Inúmeras bacias,bem como seus reservatórios e cursos d’água5, foram declaradas áreas de pro-teção.

Cabe destacar que esses mananciais estão integrados a sistemas produtoresque hoje possuem em sua totalidade uma capacidade de vazão de 23,5 m3/s, re-presentando 43% da capacidade de atendimento atual na região metropolitana,interligados antropicamente por obras de engenharia, formando bacias hidrográ-ficas. Atualmente em utilização estão o sistema Guarapiranga, ao sul da regiãometropolitana, com capacidade de 11 m3/s, que se configura como manancialestratégico para o abastecimento futuro da metrópole, contando atualmente com1 m3/s, proveniente da reversão do rio Capivari, manancial de vertente marítima;e o sistema Rio Claro, com capacidade de 3,9 m3/s, que se utiliza das águas dorio Claro, pertencente à bacia do Alto Tietê, no vetor leste da região metro-politana.

Os sistemas produtores incluem, ainda, os sistemas Rio Grande, com capa-cidade de 4 m3/s, que faz uso das águas do rio Grande, um dos formadores daBillings, no vetor sudeste da região metropolitana; o sistema Cotia, com 1,3 m3/s,utilizando-se das águas do rio Cotia, a oeste da metrópole; e o sistema Alto Tietê,em fase inicial de implantação, com 4,6 m3/s, que se utiliza das águas da baciado rio Tietê, pela regularização de quatro dos seus afluentes (Taiaçupeba, Jundiaí,Itatinga e Paraitinga), localizados no vetor leste da metrópole, com uma produçãoatual de água da ordem de 3,5 m3/s.

O principal manancial do Sistema Adutor Metropolitano, o da Cantareira,tem hoje uma capacidade de 33,8 m3/s, o que representa 56% da produção de

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água na metrópole, atendendo, portanto, a 60% da população metropolitana.Contudo, os mananciais desse sistema – localizados nos municípios paulistas deNazaré Paulista, Atibaia e Bragança Paulista – encontram-se fora dos limitesadministrativos da Região Metropolitana de São Paulo, o que acaba por gerar umconflito quanto ao uso das águas entre as regiões, com a drenagem de parte dosrecursos hídricos da bacia do rio Piracicaba, localizada na região de Campinas,para a região metropolitana de São Paulo. Isso nos leva a concluir que é críticaa questão das águas nessas áreas metropolitanas.

Para uma compreensão mais clara do modelo proposto e de suas revisões,bem como da análise do impacto nos processos de estruturação urbana, deta-lhamos a seguir os conceitos e fundamentos da legislação em questão.6

Os fundamentos da legislação: o modelo de proteção ambiental

Até meados do século XX, o conceito de proteção ambiental no Brasilesteve associado à proteção de ecossistemas de valor estético e cultural, posturareiterada no Código Florestal promulgado em 1934, tanto para as áreas públicas(parques nacionais) como para as de propriedade privada (florestas protetoras), aodeterminar como unidade de preservação permanente as áreas de proteção daflora, da fauna e das belezas cênicas naturais.7

Na década de 1960, ocorreu “uma mudança de ênfase na conceituação dasunidades de conservação, que passou da proteção dos grandes ecossistemas devalor estético e cultural (os monumentos públicos naturais) para a proteção deecossistemas e espécies ameaçadas, em particular as migratórias, ou as com esto-ques comerciais em declínio, ou melhor, além da ênfase na criação de monu-mentos naturais somou-se à da proteção de ecossistemas e espécies ameaçadas”(SMA, 1998). O Código Florestal foi alterado em 1965, para que contemplasseoutras categorias de espaços a serem protegidos.

Nas décadas seguintes, o conceito abrangeu e enfatizou a proteção dosecossistemas representativos da biodiversidade. A preocupação com a proteçãoambiental evoluiu para a da conservação da biodiversidade no contexto dos dife-rentes sistemas econômicos de produção sustentável.8

A inclusão das áreas produtoras de água ou de uso múltiplo de recursos,como concebido pela União Internacional para a Conservação da Natureza, entre

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as categorias a serem conservadas e protegidas no âmbito da legislação ambientalé recente, tendo sido inserida no projeto de lei sobre a estruturação do sistema deunidades de conservação, ainda em discussão no âmbito federal. Essa inclusãodecorre de uma nova visão das áreas protegidas que se origina com o enten-dimento dessas áreas como espaços estratégicos para os países, uma vez que sãoindispensáveis para o desenvolvimento futuro destes e para a busca de condiçõesde vida adequadas em seus territórios (UICN, 1997).

A proteção dos mananciais da metrópole paulista foi exercida até meadosdeste século em obediência a medidas que estabeleciam áreas reservadas para aprodução de águas, independentemente do fato de tais áreas não serem concebidascomo unidades de conservação segundo o Código Florestal. Na década de 1970adotou-se outra postura ante o problema da proteção dos mananciais, com a for-mulação de instrumentos de proteção no âmbito de políticas de estruturação doespaço urbano-regional. Portanto, a concepção dessas áreas de proteção dosmananciais não se originou da política ambiental e da extensa legislação sobreessa questão editada nas últimas décadas.

O modelo de proteção ambiental aos mananciais concebido na década de1970 baseou-se na definição de um zoneamento do uso do solo. Estabeleceram-se áreas impróprias à ocupação humana, com a proibição ao assentamento urbanoe rural, exceto para os usos de pesca, esportes náuticos, ancoradouros, obras deaproveitamento, regularização dos cursos d’água e tanques de piscicultura.

Foram consideradas impróprias ao assentamento urbano as áreas ambien-talmente frágeis e os ecossistemas ainda preservados, constituídos pelos corposd’água; as faixas de 50 m nas margens dos reservatórios; as de 20 m a partir dosrios e afluentes definidos na Lei 898/75; as faixas dos demais córregos, conformeestipulado no Código Florestal; as áreas em cotas inferiores a 1,5 m a partir donível máximo dos reservatórios; as áreas onde as declividades médias forem su-periores a 60% e a superfície, recoberta por matas e demais formas de vegetaçãoprimitiva. Essas áreas non aedificandi foram classificadas como as de “primeiracategoria”.

Áreas propícias ao assentamento humano – designadas como “áreas desegunda categoria” – foram estabelecidas a partir de um modelo matemático deuso e ocupação do solo, com base no cálculo da população equivalente máximade cada bacia e, conseqüentemente, a densidade equivalente média respectiva aocálculo dos índices de poluentes gerados. Tais áreas podem ser utilizadas para oassentamento urbano sob determinadas condições, que dizem respeito às taxas deocupação, coeficiente de aproveitamento, índice de elevação e taxas de imper-meabilização dos lotes.

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Para a concepção do modelo em questão, partiu-se da delimitação de anéisde densidades demográficas decrescentes, sendo o anel central constituído pelasáreas urbanizadas na época de promulgação da lei, com densidades demográficasmédias iguais ou superiores a 30 habitantes por hectare (hab./ha). Esses anéis,denominados “Classe A”, tinham um crescimento urbano previsto de até 50 hab./ha e cota ideal do terreno de 500 m2.

A densidade demográfica prevista nos demais anéis deve decrescer à me-dida que se afasta da Classe A e conforme a distância dos mananciais. No entornodas áreas de Classe A, configura-se um anel intermediário – denominado “ClasseB” – destinado à expansão urbana, com densidades máximas de ocupação pre-vistas entre 34 e 25 hab./ha.

Para o restante da superfície da bacia – classificado como “Classe C” –previu-se uma ocupação do solo com densidades máximas entre 24 e 6 hab./ha.Nas áreas de Classe C (artigo 22 da Lei 1.172/76), não é permitida a instalaçãode redes de água e esgoto.

Os fatores que determinaram as densidades médias preconizadas basearam-se, portanto, na distância da gleba até a área de segunda categoria – a Classe Amais próxima –, ou seja, a área urbanizada mais próxima e a distância da glebaao manancial. A partir disso, calcula-se então a cota ideal do lote e da área cons-truída.

Lopes simulou a aplicação das leis de proteção dos mananciais em seisbacias protegidas – Guarapiranga, Billings, Juqueri, Taiaçupeba, Alto Cotia eItatinga – buscando a população equivalente máxima de cada bacia e, em conse-qüência, a densidade demográfica equivalente média respectiva e o formato espa-cial do zoneamento de cada bacia (1980, p. 72). Esse trabalho contém mapas etabelas, os quais apresentamos a seguir, a fim de oferecer dados que propiciemuma melhor compreensão do modelo de ocupação do solo nas áreas protegidasproposto pela legislação de proteção dos mananciais.

As tabelas a seguir nos permitem verificar que, nas faixas de Classe C, adensidade média varia de 13 a 6 hab./ha na bacia da Billings (no vetor sudeste)e na do Guarapiranga (no vetor sudoeste); de 13 a 6 hab./ha na do Taiaçupeba(no vetor leste); de 10 a 6 hab./ha na bacia de Itatinga (vetor leste), de 8 a 6 hab./hano Alto Cotia (no vetor oeste); e na bacia do Juqueri (no vetor norte), de 10 a6 hab./ha. Esses números traduzem lotes com tamanhos médios de 3.000 a7.500 m2, apesar de a legislação não mencionar essa informação.

Vale destacar nos mapas do zoneamento por bacias que as faixas de ClasseC compõem a maior parte da superfície territorial estabelecida no modelo deproteção ambiental; muito distante, portanto, dos parâmetros do restante do terri-tório metropolitano.

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O modelo contempla o parcelamento do solo e a edificação tanto para finsresidenciais como para fins industriais (cada empregado equivale a 60% de uni-dade de população) e para o uso terciário, englobando indistintamente, num únicomodelo matemático em quadros de índices urbanísticos, os diversos espaços deli-mitados pela legislação, nos vetores norte-nordeste, leste, sul, sudeste e sudoesteda metrópole.

As medidas de preservação das matas em conjunção com a idéia de den-sidade demográfica equivalente constituem-se no núcleo central do zoneamentoproposto. A vegetação é vista como condição necessária para a preservação dociclo hidrológico, a manutenção dos espaços verdes destinados à recreação, acontenção dos processos erosivos, e o controle das cargas poluentes difusas carre-gadas para os corpos d’água pelas águas pluviais e para o estabelecimento datransição entre a área urbanizada da metrópole e o Parque da Serra do Mar9,vinculada aqui às questões atmosféricas, com a finalidade de manter os índicesde pluviosidade (caixa-d’água metropolitana) e preservar a cobertura vegetal davertente continental da serra do Mar. Para a consecução desses propósitos foiefetuado, em 1977, um levantamento aerofotogramétrico específico e definidos ostipos de vegetação a preservar, considerando-se sua localização em relação aosmananciais, sua função e as características regionais como solo, umidade, tem-peratura, densidade etc.10

A legislação ambiental também previu medidas de estímulo à preservaçãodas matas por meio de dispositivos de bonificação para os empreendimentos situa-dos na Classe C, a fim de que se resquarde a cobertura vegetal em troca da ele-vação dos índices de densidade demográfica permitidos, conforme o Quadro IIIanexo à Lei 1.172/76, sobre o cálculo da densidade bruta equivalente.

Concluiu-se, por conseguinte, que a legislação em análise não se utiliza deconceitos amplamente assinalados pela legislação urbanística, como o de lotemínimo e o de vinculação direta entre taxa de ocupação e índice de aprovei-tamento. Ao contrário, introduz o critério do índice de elevação, tornando a legis-lação confusa e hermética. A propósito, Moreira Lima (1990) indicou a neces-sidade de repensar os instrumentos de proteção dos mananciais em face do graude complexidade dos critérios e parâmetros dessa legislação, de modo que selevem em conta os processos de abertura política do país, impondo condiçõesoutras no relacionamento entre a sociedade civil e os órgãos técnicos do governo,com maior transparência nos procedimentos de licenciamento.

Tal legislação permitiu a prática de quase todas as atividades urbanas, em-bora com restrições: o uso residencial, o industrial (de acordo com a relação dasatividades permitidas pela Cetesb, o cálculo das densidades brutas equivalentespor gênero industrial e as cotas de áreas construídas), o comercial (com exceção

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA DE GUARAPIRANGASimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 3.300

A Dbeq > 30 Oceq/ha 3..802 120 456.240

B1 Dbeq = 25 Oceq/ha 1.794 25 44.850B2 25 Oceq /ha < Dbeq < 34 Oceq/ha 43 29,5 12.714B3 Dbeq = 24 Oceq/ha 922 24 22.128

Influência de A 18.312 15,5 283.8366 Oceq/ha < Dbeq < 25 Oceq/ha

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 1.173 6 7.038Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 7.034 7 49.238Obeq >/ 5.000 m²

C3 8 Oceq/ha < Dbeq \< 10 Oceq/ha 25.275 9 227.475Qbeq = 5.000 m²

C4 10 Oceq/ha < Debeq \< 13 Oceq/ha 1.057 11,5 12.155Qbeq >/ 3.00 m²

SUB-TOTAIS 59.800 18,66 1.115.674

TOTAIS 63.100 1.115.674

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

12341234123412341234

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Figura 1 - Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia do Guarapiranga.

Regiões de proteção dos mananciais

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA DO ALTO COTIASimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 398

A

B

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 9.924 6 59.544Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 362 7 2.534Obeq >/ 5.000 m²

SUB-TOTAIS 10.286 6,04 62.078

TOTAIS 10.684 62.078

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

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Figura 2 - Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia do Alto Cotia.Regiões de proteção dos mananciais

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA DE GUARAPIRANGASimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 530

A Dbeq > 30 Oceq/ha 228 120 27.360

B1 Dbeq = 25 Oceq/ha 160 29,5 4.720

Influência de A 1.952 15,5 30.2566 Oceq/ha < Dbeq < 25 Oceq/ha

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 11.450 6 68.700Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 5.045 7 35.315Obeq >/ 5.000 m²

C3 8 Oceq/ha < Dbeq \< 10 Oceq/ha 10.142 9 91.278Qbeq = 5.000 m²

SUB-TOTAIS 28.977 8,89 257.629

TOTAIS 29.507 259.627

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

12341234123412341234

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Figura 3- Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia JuqueriRegiões de proteção dos mananciais.

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA DE TAIAÇUPEBASimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 2.060

A Dbeq > 30 Oceq/ha 160 120 19.200

B Dbeq = 25 Oceq/ha 112 25 2.800

Influência de A 1.354 15 20.9876 Oceq/ha < Dbeq < 25 Oceq/ha

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 12.334 6 74.004Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 3.152 7 22.064Obeq >/ 5.000 m²

C3 8 Oceq/ha < Dbeq \< 10 Oceq/ha 2.856 9 25.704Qbeq = 5.000 m²

SUB-TOTAIS 19.968 8,25 164.759

TOTAIS 22.028 164.759

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

12341234123412341234

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Figura 4 - Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia Taiaçupeba.Regiões de proteção dos mananciais

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA BILLINGSSimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 12.710

A Dbeq > 30 Oceq/ha 3.013 120 361.560

B1 Dbeq = 25 Oceq/ha 493 25 12.325B2 25 Oceq /ha < Dbeq < 34 Oceq/ha 1.595 29,5 47.052

Influência de A 16.651 15,5 258.0906 Oceq/ha < Dbeq < 25 Oceq/ha

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 15.0589 6 90.348Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 4.080 7 2.8.560Obeq >/ 5.000 m²

C3 8 Oceq/ha < Dbeq \< 10 Oceq/ha 4.010 9 36.090Qbeq = 5.000 m²

C4 10 Oceq/ha < Debeq \< 13 Oceq/ha 160 11,5 1840Qbeq >/ 3.00 m²

SUB-TOTAIS 45.060 18,55 835.865

TOTAIS 57.770 835.865

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

123412341234123412341234

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Figura 5 - Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia Billings.Regiões de proteção dos mananciais

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POPULAÇÃO EQUIVALENTE MÁXIMA DA BACIA ITATINGASimulação da Lei 1172 de 1976

CATEGORIA DAS ÁREAS ÁREA DENSIDADE POPULAÇÃO EQUIVALENTEMÉDIA MÁXIMA

(ha) (hab/ha) (hab)

1ª RESERVATÓRIOS E RIOSCA ÁREAS VERDESTE FAIXASGO DECLIVIDADE > 60%RI DEPRESSÕESA

SUB-TOTAIS 1.200

A

B

C1 Dbeq - 6 Oceq/ha 7.039 6 42.234Qbeq = 7.500 m²

C2 6 Oceq/ha < Dbeq \< 8 Oceq/ha 380 7 2,660Obeq >/ 5.000 m²

C3 8 Oceq/ha < Dbeq \< 10 Oceq/ha 81 9 729Qbeq = 5.000 m²

SUB-TOTAIS 59.800 18,66 45.623

TOTAIS 8.700 45.623

LEGENDA (conforme texto legal) Fonte: LOPEZ, Guido M. (1980)Dbeq - Densidade Bruta EquivalenteOceq - Ocupantes EquivalentesQbeq - Quota Bruta EquivalenteHa - HectareHab - Habitante

C

A

T

E

G

O

R

I

A

12341234123412341234

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Figura 6 - Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia Itatinga.Regiões de proteção dos mananciais

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do comércio atacadista) e os usos institucionais e de serviços (salvo hospitais,sanatórios ou outros equipamentos de saúde pública não destinados à populaçãolocal e desde que não sejam especializados em doenças transmissíveis). Na leiturada lei, pode-se verificar que também são permitidos usos voltados ao lazer, o usohortifrutícola, com restrições, e os usos para florestamento, reflorestamento eextração vegetal.

No que tange ao uso industrial, constatamos que a atividade é permitida naregião com algumas restrições, segundo a legislação retromencionada. A esserespeito salientamos que cabe à legislação de zoneamento industrial, promulgadaem 1978 (Lei nº 1.817), preconizar maiores restrições à implantação de indústriasnos mananciais.

O zoneamento industrial definiu a área de mananciais como reserva am-biental e estipulou a área construída máxima nessa região em 2.500 m2. Comreferência ao uso do solo, restringiu a implantação das indústrias aos estabeleci-mentos que não utilizem nenhuma operação de fabricação limitando-se apenas àmontagem de produtos. Esses estabelecimentos são classificados, na referida le-gislação, na categoria denominada ID.

A normatização dos aspectos de saneamento básico e de controle da po-luição hídrica foi realizada de forma abrangente. Contém dispositivos como aobrigatoriedade de afastamento dos esgotos pela rede pública, para fora da baciaprotegida, havendo a possibilidade de se efetuar um tratamento conveniente quan-do se tratar de áreas de segunda categoria, com disposição no solo. Foram esti-puladas também medidas de controle dos processos erosivos e de restrições aouso de nutrientes, defensivos agrícolas e substâncias tóxicas.11

Cabe observar que em diversos dispositivos deparamos com a visão sani-tarista do problema dos mananciais. Para ilustrar, podemos citar a restrição quantoà implantação de sistemas públicos de abastecimento de água e esgoto nas áreasde segunda categoria, Classe C, o que representa a quase totalidade da superfíciedas bacias, e o extremo detalhamento das normas no que diz respeito aos demaisaspectos de saneamento nos diversos artigos da Lei nº 1.172 de 1976. Por outrolado, faltam parâmetros para a oferta dos demais sistemas de infra-estrutura, comoo viário, por exemplo.

De fato, na leitura dos textos legais, verificou-se que nenhum dispositivotrata da promoção de infra-estrutura urbana. Nesse sentido, a intervenção estataloscilou entre a total ausência de investimentos nas áreas protegidas, gerando umpadrão urbanístico desqualificado, sobretudo nas classes B e C – fato que con-tribuiu amplamente para o processo de degradação ambiental –, ou foi incisivaem áreas não consolidadas, com a duplicação e pavimentação de vias expressas,caso da estrada de Parelheiros (atual avenida Senador Teotônio Vilela), na bacia

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do Guarapiranga, que se configurou num importante vetor de indução para aregião sul do município de São Paulo.

Quanto aos equipamentos de transportes, a realidade tem sido pautada pelaexistência de um conflito constante entre os planos e projetos setoriais e a variávelambiental.

Por fim, vale registrar que a legislação ambiental instituiu um sistema delicenciamento e controle das atividades em áreas de mananciais. No entanto, astabelas referentes às autuações de empreendimentos efetuadas pela Divisão deFiscalização dos Mananciais, atualmente departamento da Secretaria do MeioAmbiente, envolvendo 1.180 autuações no período que compreende os anos de1976 a 1991, evidenciam a insuficiência de ação fiscalizadora diante dos demaisindicadores relativos à dinâmica de uso e ocupação do solo.

A visão do meio ambiente na legislação

As origens da legislação de proteção dos mananciais da metrópole paulistaremontam ao âmbito dos instrumentos de controle do uso do solo urbano-regional,constituindo parte integrante de um conjunto de estratégias de ordenamento doterritório. Pretendem, com isso, minimizar os impactos ambientais nas regiões me-tropolitanas. No Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado, documentode referência para a criação da legislação de mananciais, não encontramos mençãoàs preocupações conservacionistas de proteção aos recursos ambientais. Questõescomo a do equilíbrio dos ecossistemas e da biodiversidade surgiram posterior-mente em virtude da ampla divulgação das teses conservacionistas após o debateinternacional resultante da Conferência de Estocolmo.

A tônica das diretrizes de planejamento do Plano Metropolitano de Desen-volvimento Integrado era buscar reordenar os recursos naturais – os hídricos, nocaso – em uma perspectiva de utilização econômica para as gerações futuras, comas hipóteses centradas no esgotamento dos recursos não-renováveis em um ho-rizonte de tempo próximo, influenciadas pelo documento de Clube de Roma,divulgado na época.

No plano metropolitano em foco, a região dos mananciais é compreendidacomo um conjunto de espaços abertos destinados à recreação e lazer, bem comoao uso econômico dos recursos naturais existentes. A questão ambiental é enten-

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dida em um sentido restrito circunscrevendo-se ao controle da poluição geradapelas atividades econômicas e aos problemas do esgotamento dos recursosnaturais.

As leis que posteriormente regulamentaram a matéria já apresentam umenfoque global das interações ambientais, em que predomina uma percepção doselementos biogeofísicos atuando sobre a qualidade das águas.12 A compreensãodas estruturas espaciais como resultantes dos ciclos biogeoquímicos na linha dostrabalhos de McHarg (1969), que elaborou um método de análise da capacidadede suporte do solo por meio do mapeamento dos ecossistemas frágeis, orientounesse período vários trabalhos desenvolvidos na Emplasa, órgão de planejamentoda metrópole paulista responsável pela elaboração do projeto de lei dos manan-ciais.

A questão da vegetação passou a ser considerada parâmetro essencial nadinâmica de uso e ocupação do solo nos mananciais, em função do papel quedesempenhava na manutenção do equilíbrio hidrológico, da contenção de pro-cessos erosivos e da minimização da poluição dos cursos d’água por sedimentos,com a retenção das águas pluviais.

A vegetação ainda foi justificada, enquanto função a desempenhar, comoárea verde de transição entre a metrópole e a escarpa atlântica, indispensável àmanutenção do equilíbrio climático e do ciclo das águas oceânicas, conformeassinalado na exposição de motivos do Projeto 241, de 1975, que encaminhou alegislação de proteção dos mananciais para a Assembléia Legislativa (Costa eSilva, 1993).

A propósito, lembramos que a vegetação da região metropolitana está inse-rida nas áreas que restaram do chamado cinturão verde de São Paulo, e seusremanescentes vegetais foram incluídos nos limites da Reserva da Biosfera daMata Atlântica.

A delimitação das áreas de primeira categoria evidencia a preocupação comrelação à preservação dos compartimentos ambientais frágeis e vulneráveis àocupação humana, embora sobre alguns espaços já vigorasse uma legislação atémais restritiva (o Código Florestal, por exemplo).

Gostaríamos de apontar aqui a proximidade entre a abordagem ambientalna regulamentação dessa legislação específica e algumas das estratégias definidasno documento Estratégia mundial para a conservação,13 elaborado pela UICN,no qual se estabelecem os aspectos ecológicos do desenvolvimento sustentado,que pautou as estratégias conservacionistas na última década.

Esse documento estabelece entre seus paradigmas que o desenvolvimentosustentado deve prever a manutenção dos processos ecológicos fundamentais, dosquais depende a sobrevivência humana, tais como a fotossíntese, os ciclos hidro-

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lógicos e a reciclagem dos nutrientes, contexto no qual se insere a visão do meioambiente que permeia a legislação dos mananciais, nos artigos que disciplinamo uso do solo e a interferência dos fatores biogeoquímicos.

Entretanto, para o caso específico dos mananciais da metrópole paulista, talabordagem se mostra restrita, pois os recursos naturais em referência já sofreramações antrópicas e os parâmetros de qualidade das águas visam ao abastecimentohumano, e não à preservação da vida no ambiente aquático. Destacamos aindaque outros pressupostos fundamentais do documento da UICN não são contem-plados, caso, por exemplo, da preservação da diversidade genética.

O processo recente de revisão da legislação ambiental enfatizou a questãohídrica, devendo ser retomados os conceitos vinculados às estratégias conser-vacionistas. Parcelas territoriais das áreas de mananciais devem ser entendidascomo biorregiões e corredores entre espaços de proteção ambiental, na elaboraçãodas leis específicas por bacia hidrográfica e dos planos de desenvolvimento eproteção ambiental.

Ainda com respeito a esse aspecto, cabe mencionar que deve ser feita aarticulação institucional com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação,como proposto no projeto de lei que regulamenta o assunto que se encontra emtramitação na Câmara Federal. Esse projeto inclui no grupo das unidades de usosustentável as reservas produtoras de água, aspecto que foi negligenciado na revi-são da legislação de mananciais e na proposta do Sistema Estadual de Unidadesde Conservação.

O anteprojeto do Sistema Estadual de Unidades de Conservação não con-templa entre as unidades definidas a caracterização da área de proteção dosmananciais, apesar de o documento de referência a esses sistemas – o da UICN– especificar uma categoria baseada na definição de zonas de uso múltiplo de re-cursos, consoante uma nova visão das áreas protegidas enquanto espaços estra-tégicos para os países na busca de condições de vida adequadas.

Afirmar a natureza conservacionista da lei, entretanto, não altera o ritmodos impactos ocorridos nas superfícies protegidas, nem a intensidade da ocupaçãoclandestina, o desmatamento, a ocupação das áreas de primeira categoria etc. Anosso ver, é importante apontar esse aspecto e buscar o entendimento de comoos recursos ambientais foram apropriados, com base na compreensão da dinâmicade produção e apropriação privada do espaço.

Outro aspecto dessa legislação a ser salientado refere-se à compatibilizaçãodo desenvolvimento com a proteção ambiental: embora não proponha estratégiaspara o desenvolvimento sustentável, ela possibilita a adoção de atividades comrestrições. Ao contrário do caráter restritivo comumente adjetivado à legislação,na leitura dos artigos da Lei 1.172 de 1976 já constatamos várias possibilidades

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que podem viabilizar estratégias de desenvolvimento sustentável para a região demananciais, relativas aos usos urbanos e rurais, aspecto a ser destacado, tendo emvista o processo de revisão da legislação por sub-bacia.

O senador Almino Afonso, então secretário dos Negócios Metropolitanos,órgão responsável pela aplicação e fiscalização da legislação de mananciais, afir-mou em depoimento concedido em 1985:

Por exemplo, com freqüência se diz que a lei dos mananciais impede odesenvolvimento industrial nas áreas que ela delimita. Não é bem verdade,cento e trinta e cinco, cento e trinta e seis possibilidades de indústrias secas,outros tipos de atividades econômicas, podem ser implantadas nesta regiãoporque não são poluentes, e tudo depende de que o poder público possa termeios de induzir a instalação dessas indústrias, ao invés de ver passiva-mente elas se instalarem em áreas onde é possível qualquer tipo de locali-zação industrial. 14

O depoimento acima expõe, de forma bastante clara, dois aspectos quenormalmente são confundidos: o primeiro diz repeito às possibilidades, ditadaspelo espaço legal, da instalação de atividades compatíveis com a proteção dosmananciais, evidenciando o caráter conservacionista da legislação, ao contrário doque se imagina. Em segundo lugar, ao destacar a necessidade de programas defomento de usos compatíveis, acaba apontando a fragilidade do documento legalno que tange à obrigatoriedade de implantação de planos de desenvolvimentonessas regiões. Trata-se de questões pertinentes a uma política de proteção am-biental e não apenas à elaboração de instrumentos normativos.

A crise econômica dos anos oitenta, a ausência de propostas de desen-volvimento, conforme assinalou o próprio senador, e as novas formas de orga-nização do território impostas pelo processo de reestruturação econômica do paísexplicam as tendências do crescimento da ocupação informal, inclusive no ramoindustrial, como as microindústrias instaladas na bacia do Guarapiranga.

Nesse sentido, verificamos que não foi incorporada no conteúdo da legis-lação de mananciais a noção de sustentabilidade como é entendida hoje, de acordocom definição elaborada pela Comissão Brundtland (1987), incorporando as dife-rentes dimensões que essa noção deve conter – a da sustentabilidade ecológica,social, econômica, espacial e cultural (Sachs, 1993).

De fato, a crítica mais contundente que tem sido feita à visão de meioambiente presente nessa legislação, editada na década de 1970, refere-se à omis-são quanto à obrigatoriedade de implantação de planos e programas de desen-volvimento sustentável e de mecanismos de compensação financeira para aregião. A noção da sustentabilidade, conforme exposto anteriormente, traz hoje

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embutida em seu conteúdo a dimensão social ausente no texto da lei, consi-derando, sobretudo, a extensa superfície sobre a qual a legislação incide.

A problemática dos mananciais, a exemplo das demais unidades de pro-teção ambiental no Brasil com estrutura fundiária semelhante, reside em chegar-se a um consenso quanto à maneira mais eficiente de manter a visão de meioambiente presente na legislação, na busca da base ecológica centrada na con-servação dos ecossistemas naturais e conciliá-la com a diversidade genética e arelação dessas áreas com as sociedades nas quais estão inseridas. O que tornasingular – e mais crítica – a questão dos mananciais de áreas metropolitanas emcomparação com as demais áreas de proteção ambiental é a intensidade e os pa-drões de urbanização vigentes sobre os recursos ambientais.

As proposições em torno das alternativas de desenvolvimento e proteçãoambiental para a região de mananciais permearam o recente debate acerca darevisão dessa legislação, principalmente em função das prefeituras municipaiscontidas nas áreas de proteção, 15 que, após a promulgação da Carta Constituintede 1988, conferiu maior autonomia aos municípios e um papel estratégico àscidades, exercendo maior pressão nesse sentido.

As novas diretrizes e normas para a proteção e recuperação dos mananciaisavançaram na proposição de um plano de desenvolvimento e proteção ambiental.

Com relação às demandas municipais, gostaríamos de evidenciar que alegislação ambiental promulgada posteriormente, nos níveis nacional e estadual,assegura ao poder público a faculdade de editar normas que limitem ou proíbama implantação e o funcionamento de indústrias potencialmente poluidoras, capazesde afetar os mananciais de água (lei federal 6.902, de 1981). Existem ainda osprincípios constitucionais promulgados em 1988 e a legislação correlata que tratadas indústrias, arcabouço que, por si só, deveria redimensionar o debate sobre asindústrias e mananciais, pois no nível federal há ampla legislação, até mais res-tritiva. A pergunta que se faz a respeito é: qual o significado da extensa polêmicaque envolve a aplicação da lei de mananciais ao longo dos últimos vinte anoscom relação à perspectiva da proteção ambiental?

Os limites e os alcances de estratégias de desenvolvimento sustentávelpodem ser evidenciados na legislação editada nos anos setenta, pois ela davaespaço para inúmeras atividades que não foram viabilizadas, devido à ausênciade instrumentos para sua implementação e, em particular, de projetos de desen-volvimento econômico.

Cabe, neste momento, tecer algumas considerações sobre as teses da sus-tentabilidade ambiental, no intuito de delimitar melhor nossa leitura da legislaçãode mananciais nos aspectos que tangem às propostas de proteção e recuperaçãoambiental em discussão para os mananciais do Guarapiranga. A questão principal

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é a da viabilidade da implantação de modelos de desenvolvimento sustentado,tendo em conta o universo de contradições que os atuais processos de reestru-turação econômica impõem como decorrência da globalização da economia.

Devemos nos lembrar das críticas a esse modelo, tal como assinaladas porRedclift (1984) e conforme análise de Diegues (1992), autor que centra seus argu-mentos na própria concepção de desenvolvimento sustentado elaborada pelaComissão Brundtland, “ao ignorar as contradições internas dos países em desen-volvimento, as relações sociais desiguais entre os países e a crença nos meca-nismos de mercado”. Entretanto, as estratégias de desenvolvimento sustentado aserem propostas nas leis específicas de proteção e recuperação ambiental por sub-bacia podem ser compreendidas enquanto instrumentos capazes de viabilizar pac-tos sociais entre os diferentes agentes sociais, ainda que em um cenário marcadopor profundas contradições.

A produção social do espaço e a lei

Vimos que o modelo de uso e ocupação do solo, formulado pela legislaçãode proteção dos mananciais, baseou-se num zoneamento que estabeleceu as áreasimpróprias à ocupação humana, proibindo o assentamento urbano e rural nessasfaixas, e definiu as áreas passíveis de sofrer assentamento.

As diretrizes atuais de proteção e recuperação dos mananciais alteram essemodelo, vinculando sua vigência até a elaboração futura de um plano e legislaçãoespecíficos por área de proteção e recuperação dos mananciais, sendo que essasáreas poderão ser constituídas por uma ou mais sub-bacias hidrográficas. Portanto,esse modelo de proteção ambiental ainda está em vigor.

Nesse sentido, vamos expor alguns aspectos da análise dos diversos indi-cadores e o quadro referencial formulado com o propósito de propiciar uma refle-xão sobre os processos de produção do espaço no âmbito da Lei 898 de 1975 ea Lei 1.172 de 1976, bem como fornecer elementos que possam contribuir paraa elaboração dos planos e legislações específicas.

Assim, os fundamentos de proteção ambiental nos mananciais vigentes nasáreas passíveis de assentamento humano originam-se de um modelo matemático deuso e ocupação do solo, apoiado no cálculo da população equivalente máxima, emfunção da carga de depuração de efluentes de cada bacia, e, conseqüentemente, dadensidade equivalente média. Englobaram-se num único modelo os diversos

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espaços delimitados pela legislação em questão nos vetores norte-nordeste, leste,sul, sudeste e sudoeste da metrópole, conforme analisado anteriormente.

Para entender a concepção de espaço subjacente ao texto legal, destacamosalguns elementos, já assinalados, na leitura da legislação de proteção dosmananciais, que produziram impacto nos processos de expansão da manchaurbana. O primeiro aspecto refere-se à proibição de instalação de redes de águae esgotos sanitários nas áreas de Classe C, dispositivo que pretende deter aocupação urbana nessas áreas. Por outro lado, ressalta-se o fato de não ter sidoestabelecido nenhum dispositivo com a finalidade de definir parâmetros paraalguns elementos historicamente estruturadores do espaço urbano, como o sistemaviário e o de transportes, tampouco no sentido de restringir a atuação dessesequipamentos, enquanto indutores da ocupação urbana ou da sua promoção,estabelecendo um padrão urbano minimamente qualificado nas áreas definidas sobtal condição.

No modelo proposto, ressalta-se também que nas áreas passíveis de ocupa-ção urbana não foi estabelecido um zoneamento da atividade industrial no espaço.De acordo com o texto legal, a indústria pode localizar-se em qualquer ponto,desde que atendidas as condições estabelecidas.

Assim, temos que o modelo de uso e ocupação do solo idealizado paraessas porções territoriais da metrópole, que representam uma superfície equiva-lente a 53% do território metropolitano, traz de forma implícita os modelos expli-cativos da expansão metropolitana preconizados pelos primeiros ecólogos daEscola de Chicago, na década de 1920, nos Estados Unidos.

A visão de espaço que se depreende do texto legal ignora os processossociais mais gerais que atuam na produção e apropriação do território. A propostade uso e ocupação do solo nos mananciais aproxima-se, a nosso ver, dos modelosde círculos concêntricos de densidades decrescentes, tais como formulados porPark e Burgess (1925), na tentativa de explicar a morfologia e a expansão urbanametropolitana funcionalista e unidimensional (Gottdiener, 1993, p. 237). No nossocaso, temos a presença do Estado como agente controlador desse processo.

De acordo com Burgess, “a cidade começa na forma de um núcleo singularcentralizado, que abriga todos os elementos de diferenciação funcional metropo-litana. Então, por um processo de descentralização e desenvolvimento da áreamarginal, há um complexo desdobramento de áreas funcionais (…) através daszonas (…)” (Gottdiener, 1993, p. 236). Conforme a teoria de Burgess, ao redordas zonas centrais, formam-se as zonas de transição; por meio de um processo deexpansão para fora e de sucessão, dá-se a transposição desses anéis, com den-sidades demográficas cada vez mais rarefeitas.

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Figura 7 - Vistas aéreas da bacia Billings

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A conceituação de espaço, urbano e processo de urbanização é frágil,mesmo do ponto de vista dos desenvolvimentos posteriores da escola ecológica,partindo-se da teoria dos setores, elaborada por Homer Hoyt, em 1939, o qualagregou aos modelos urbanos três elementos constitutivos do espaço urbano, asaber:

(…) a diferença do nível social do espaço na cidade, dos eixos de trans-portes e a progressiva densificação do tecido urbano, desde o centro até aperiferia. Dessa forma, em lugar de formar zonas concêntricas, a cidade seestende de dentro para fora, de forma diversa, segundo os eixos de trans-portes, e cada um desses cortes transversais possui o caráter do setor centralinicial de que parte a expansão.16

Homer Hoyt introduzia, nesse sentido, o sistema viário de transportes comoelemento estruturador do espaço já na década de 1930, aspecto negligenciado naatualidade na legislação de proteção dos mananciais.

Os meios de transportes configuravam-se como elementos sociais já nasabordagens acerca do urbano e da urbanização pelos ecólogos da Escola deChicago, representados por Hoyt e Mckenzie (1926).

Já em 1926 Mckenzie acreditava que “a concentração territorial modernanunca é o resultado apenas do aumento natural da população. Representa semprea mudança da população de um território para outro. (…) O grau de concentraçãoatingido por qualquer localidade é, portanto, uma medida de seus recursos e dassuas vantagens de localização em comparação com os recursos e vantagens deseus competidores. Essa força (…) depende das condições de transporte e decomunicação. 17

As hipóteses centradas nos avanços tecnológicos dos meios de transportese de comunicações, como fatores explicativos das alterações do espaço urbano,foram retomadas na década de 1950 por autores como Hawley que, por meio dateoria da ecologia humana sobre a expansão metropolitana, salientavam o papelfundamental das alterações tecnológicas de transportes e de comunicações paraentender as formas de cidade, com base nos pressupostos de Mckenzie.

A economia neoclássica retomada na década de 1960 em trabalhos comoos de William Alonso (1964) também tinha como foco principal o papel dossistemas de transportes. Alonso desenvolveu um modelo de equilíbrio geral dosdiferentes usos da terra e vários pressupostos sobre o preço desta, relacionando-os com variáveis tais como crescimento demográfico, distância ao centro e me-lhoria nos transportes. Como efeito tem-se que a melhoria dos transportes oca-siona o aumento das terras a serem urbanizadas e a expansão do tecido urbano.De fato, as evidências do papel estruturador que desempenham os meios de trans-

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portes e de comunicações são inegáveis, como mostrou um conjunto de trabalhossobre situações históricas concretas.

Para o nosso caso citamos especificamente a extensa análise desenvolvidapor Langenbuch (1971) sobre o processo histórico da metrópole paulista, em quedemonstra o papel estruturador dos meios de transportes nos processos de expan-são urbana, conforme o texto abaixo:

O arranjo espacial da Grande São Paulo repousa sobretudo na infra-estru-tura em vias de transportes. Sem encontrar grandes obstáculos físicos pelafrente, tanto indústrias quanto habitantes funcionalmente vinculados a SãoPaulo puderam se estabelecer onde a comunicação com a capital fosse maisfácil. O caráter radiocêntrico da metrópole repousa, é claro, nas vias decirculação responsáveis pela estruturação dos elementos radiais, “eixos deurbanização em cotas”, “eixos de urbanização embrionária”.A rede de transportes, além de oferecer eixos à expansão metropolitana,provocou a estruturação de pólos, cristalizadores do desenvolvimento emescala local.As ferrovias radiais de São Paulo constituíram os principais eixos de desen-volvimento suburbano, funcionando as estações como os principais pólos.As rodovias neste particular assumem uma posição secundária. Passandoa participar mais tarde, já encontraram o essencial esboçado; oferecendotransporte menos rápido não propiciaram expansão a tão grandes distâncias.Dada a dispersão dos serviços rodoviários, a polarização local também foimenos pronunciada: entroncamentos e alguns aglomerados preexistentesforam os principais pólos do domínio rodoviário, uns mais importantes queas estações do domínio rodoviário.Uma vez cristalizado um certo desenvolvimento suburbano, os pólos cita-dos passam a propiciar um efeito de “bola de neve”. Em escala semprecrescente, os aglomerados e as fábricas suburbanas passam a atrair umdesenvolvimento ulterior em função do que eles mesmos significam; a via(ou meio) de transporte em muitos casos deixa de ser um fator prepon-derante do desenvolvimento suburbano, para funcionar como instrumentodo processo…A estrutura interna dos subúrbios se relaciona também, de modo muitosignificativo, com o elemento (ou elementos) viário(s), que propiciou (pro-piciaram) seu surgimento, o desenvolvimento inicial” (1971, pp. 334-5).O texto de Langenbuch (1971) enfatiza o papel dos sistemas de transportes

nos processos de produção do espaço. Ilustra, nesse contexto, a negligência dospressupostos básicos do modelo de proteção ambiental nos processos históricosde estruturação da metrópole paulista.18

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Em síntese, gostaríamos de destacar que, embora as teorias neoclássicas eda ecologia urbana e humana tenham se mostrado insuficientes para explicar osprocessos de alteração dos padrões espaciais, com base nos pressupostos for-mulados, elas contemplam um conjunto de elementos fundados em análises con-cretas, que já dimensionam a fragilidade da concepção dos processos de produçãoe de apropriação do espaço metropolitano na lei de proteção dos mananciais.

A diversidade de situações encontradas concernentes, em especial, à relaçãoentre os processos de expansão urbana e a existência de sistemas viários e detransportes aponta para os limites explicativos da teoria neoclássica da localiza-ção. Por sua vez, essa diversidade assinala especificações da produção social doespaço, que é diferenciado por exemplo no vetor norte da Região Metropolitanade São Paulo e nos vetores sul, sudeste e sudoeste da metrópole.

A construção da teoria da renda fundiária urbana durante a década de1970 segundo a visão marxista, por autores como Lojkine (1979), Lipietz (1982),Topalov (1979) e Harvey (1980), traz elementos explicativos dos processos deprodução do espaço urbano, com a transposição da teoria da renda fundiáriamarxista para o contexto urbano, sobretudo o conceito de renda diferencial e asformas de apropriação dessa renda.

Reiteram a afirmação do papel estruturador dos sistemas viários e de trans-portes, no processo de urbanização, os levantamentos sobre o processo de expan-são urbana ocorrida de forma irregular e clandestina nas áreas de influência dessessistemas.

Assim, a intensa ocupação do solo ao longo das vias de circulação éapreendida por nós na perspectiva analítica da produção social do espaço, bemcomo os resultados apresentados da dinâmica diferenciada do uso do solo nosvetores norte-nordeste em contraposição aos dos vetores sul, sudoeste e sudesteda metrópole.

Os processos mencionados acima ocorridos nas áreas de mananciais dizemrespeito tanto aos empreendimentos industriais aprovados como à parte dos lotea-mentos aprovados, conforme listagem fornecida pelo órgão responsável pelolicenciamento de atividades.

Temos enfatizado a relação entre sistemas viário e de transportes e estru-turação do espaço urbano no intuito de dimensionar essa questão, que tem pau-tado as relações entre as diversas políticas públicas, de proteção ambiental e asdemais políticas setoriais. 19

Retomando a discussão dos processos históricos de estruturação do espaçourbano metropolitano e as referências teóricas que possibilitam a compreensãodesses processos, cabe ressaltar que as formas de produção do espaço na me-

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trópole, sobretudo no município de São Paulo, não guardam nenhuma semelhançacom os anéis de densidades decrescentes formulados por Park e Burgess ou pelalegislação de proteção dos mananciais.

O processo histórico de parcelamento do solo ao longo do século é mar-cado pela irregularidade do uso e ocupação (Grostein, 1987; Rolnik, 1997), incor-porando um extenso perímetro de áreas ao urbano, formando imensos vaziosintersticiais à espera da valorização imobiliária e criando áreas desprovidas deinfra-estrutura. Esses processos é que dão os contornos da base física e social dametrópole.

Como observou Morse (1954), referindo-se ao processo de parcelamentodo solo no município de São Paulo, já desde o início do século:

Antes de 1913 enormes áreas de terrenos eram compradas a baixo preçopara fins particulares, ou eram simplesmente tomadas pelo sistema degrilos. Eram arruados segundo o estilo de “xadrez” (…) e vendidas emlotes. O ideal era dividir uma dada área no maior número de lotes possível,todos de idêntico tamanho. Freqüentemente um especulador deixava umlote vago ou uma casa semiconstruída (…), enquanto ele esperava pela suavalorização (…). Ao serem vendidos, muitos terrenos estavam ainda vir-tualmente sem melhoramentos e sem ligações adequadas com o resto dacidade (1954, pp. 293-4).Esse processo acirrou-se na década de 1970, período no qual foi promul-

gada a legislação de proteção dos mananciais, pautada em duas vertentes: de umlado, a intensa valorização das terras urbanas, com a apropriação do excedenteeconômico gerado na economia para o mercado fundiário; por outro lado, o pro-cesso de pauperização de grande parte da população.

A desqualificação das áreas para usos urbanos, com a proibição de ins-talação de sistemas públicos de água e esgotos sanitários, configurou a partir dosanos setenta a impossibilidade de obtenção das rendas diferenciais urbanas gera-das por esses investimentos públicos, o que tem sido qualificado genericamentede desvalorização dos terrenos em áreas de mananciais.

A distribuição desigual dos meios de consumo coletivos produz zonas alta-mente diferenciadas e, em decorrência, processos de segregação físico-sociais,fato reiterado nas áreas de mananciais. O processo histórico de produção do espa-ço clandestino e irregular é efetivado em determinados vetores nas áreas de pro-teção (sul, sudeste e sudoeste), prática fundada na criação de zonas pioneirasdesde o início do século.

A análise por nós efetuada sobre as alterações espaciais vinculadas aosprocessos mais gerais do desenvolvimento econômico, pela ação entre os dife-

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rentes agentes sociais que interagem na produção do espaço e o Estado, encontra,a nosso ver, um rebatimento espacial nas áreas de mananciais. Isso nos leva aconcluir pela inadequação da legislação com respeito aos dados da realidade sobrea qual se aplica, que pressupõe uma visão de espaço neutro com referência àatuação dos diferentes agentes que interagem nos processos de uso e ocupação dosolo.

Assim, as conclusões deste trabalho mostram a inadequação da legislaçãode proteção dos mananciais editada nos anos setenta, no que se refere aos meca-nismos de controle de dinâmica de uso e ocupação do solo, apesar da visão cor-reta do ponto de vista ecológico, ou seja, da sustentabilidade ecológica, não asocial.

No que diz respeito à questão da localização industrial, a legislação deproteção dos mananciais e, sobretudo, a lei de zoneamento industrial normatizamapenas os aspectos que concernem ao controle da poluição industrial, princi-palmente no que se refere aos efluentes líquidos.

Do ponto de vista urbanístico, a referida legislação disciplina ainda hojeparte dos empreendimentos permitidos e a densidade média resultante da implan-tação dessa atividade no espaço (por exemplo, cem empregados numa indústriacorrespondem a sessenta moradores, no cálculo das densidades médias permi-tidas). Contudo, os diversos compartimentos ambientais e sociais nos diferentesvetores da metrópole são designados genericamente pelo termo “áreas de reservaambiental”, não sendo especificada a questão da localização industrial nessasáreas para as categorias permitidas.

Conforme análise empreendida sobre a expansão urbana, verifica-se que osempreendimentos industriais aprovados entre 1976 a 1983 se concentram em suamaior parte ao longo dos eixos viários da rodovia Régis Bittencourt e da ligaçãoviária Suzano-Ribeirão Pires, que se transformaram, nos anos posteriores, emnúcleos de indução à ocupação urbana.

A localização dos empreendimentos industriais é explicada, nos termos daeconomia clássica, de corte weberiano, com a minimização de custos em funçãoda proximidade dos sistemas de transportes para a otimização do lucro máximo(Wingo, 1961; Alonso, 1964) e, na perspectiva da lógica marxista, nos termos dosefeitos úteis de aglomeração como condição geral de produção (Lojkine, 1979),questões não contempladas na legislação em análise.

As alterações espaciais ocorridas a partir da década de 1970, tais como osprocessos de desconcentração industrial e o direcionamento do perfil funcionaldas cidades voltado ao setor terciário, recolocam outras questões resultantes dastransformações tecnológicas dos sistemas de transportes e de comunicações. A

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tomada de decisão sobre a localização industrial, outrora sedimentada nos efeitosúteis da aglomeração, se dá hoje segundo uma lógica totalmente distinta da quesubsidiou as tomadas de decisões sobre localização industrial nas fases anteriores.

A desconcentração industrial verificada após meados dos anos setenta tevecomo conseqüência a reorganização territorial, com base nos novos pressupostosda divisão internacional do trabalho, colocando em pauta as formas de organiza-ção espacial concebidas no modelo fordista (Storper, 1994) e as novas formas deprodução surgidas com a crise desse modo de produção.

Assim, a lógica da localização industrial comporta hoje outros elementos.Contudo, a legislação de mananciais desconsidera tanto os tradicionais processosde localização industrial como os novos padrões de assentamento, pois não con-templa no texto legal as questões pertinentes a esses processos.

No caso das indústrias, há uma absorção nos mananciais do setor informaldessa atividade, pois as microempresas estão dispensadas do processo de licen-ciamento. Considerando as análises dos processos de produção do espaço pós-fordista (Sassen, 1998; Aglietta, 1979; Lipietz, 1994), verificamos que é exa-tamente esse tipo de indústria, formada por uma cadeia de subempreiteiros e pelainformalização, que teve sua participação ampliada, em contraposição à indústriacaracterística do período fordista, estruturada com a produção em massa padro-nizada nas cidades globais, entre as quais se inclui São Paulo.

Acreditamos que essas questões devem permear a elaboração dos planos dedesenvolvimento e proteção ambiental, uma vez que têm impacto direto nos pro-cessos de produção do espaço e de controle do ambiente.

Por fim, cabe ressaltar que o território delimitado pelas áreas de manan-ciais, conforme a análise dos indicadores pesquisados, traduz os fluxos da me-trópole globalizada e os processos a ela vinculados. Essas áreas se configuramcomo receptáculos dos processos resultantes – pobreza e exclusão social –, bemdistantes do espaço neutro idealizado pelo modelo de proteção ambiental.

As normas preconizadas pela legislação de proteção dos mananciais devemser o reflexo de uma visão do território no qual as leis ambientais se aplicam,partindo do espaço local (a sub-bacia) e chegando ao regional (a metrópole), demodo a contemplar os processos históricos sociais mais amplos que estruturamo espaço.

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A lei de mananciais, os espaços e os interesses privados

A abordagem que adotamos quanto ao entendimento do espaço em áreasde mananciais como produto contingente da articulação entre estruturas – o mododa produção capitalista (e ação), a expressão dos interesses e conflitos dos dife-rentes atores sociais mediados pelo Estado – nos levou à sistematização das dife-rentes posições de setores da sociedade civil perante essa questão. Tais posiçõesrefletem uma visão da relação entre meio ambiente e cidade nos marcos da es-trutura fundiária existente.

Essas posturas foram apreendidas durante a leitura dos anteprojetos, reso-luções ou estudos técnicos efetuados para a revisão da legislação ambiental nosmais de vinte anos de sua aplicação. 20

O tema de esgotamento dos recursos naturais e a conseqüente destruiçãoda base material da existência, o que aparentemente afeta todos os segmentos so-ciais, aglutina interesses de forma mais ampla que a questão urbana, por exemplo.

Isso se evidenciou na aprovação da Carta Constituinte de 1988, na qualpraticamente todas as propostas ambientais em votação foram elevadas à condiçãode norma constitucional, em contraposição aos temas da reforma urbana, assimcomo a promulgação da extensa legislação ambiental brasileira, considerada umadas mais avançadas do mundo.

Na leitura das leis 898 de 1975 e 1.172 de 1976, sobre a proteção dosmananciais da metrópole paulista, constata-se também que quase todos os dis-positivos preconizados foram aprovados. A parte vetada pelo governador, re-ferente ao artigo 35, que tratava da obrigatoriedade da implantação de parquespúblicos em 5% da superfície protegida, foi mantida pela Assembléia Legislativa.

O debate e as divergências em torno da aprovação dessas leis versaramsobre a situação de propriedade das áreas com maiores restrições e dos imóveiscuja utilização econômica foi inviabilizada. Foi proposta, então, desapropriaçãopelo Estado dessas áreas ou imóveis. 21

Outra discussão suscitada pelo projeto de lei contempla a questão das com-petências, atribuições e prerrogativas do poder municipal no processo de definiçãodo uso do solo. Expressando o interesse de grupos sociais, as propostas perti-nentes ao assunto, apesar de não terem sido aprovadas, pautaram a trajetória dalegislação de proteção de mananciais nas mais de duas décadas de sua vigência.

O primeiro conflito entre a aplicação dos dispositivos de proteção dosmananciais e outros interesses relativos às demais políticas públicas circunscreveu-se no âmbito das políticas de abastecimento de água e energética, em 1975.

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O acórdão do Supremo Tribunal Federal, em 1979, concluiu sobre a in-constitucionalidade dos artigos das leis 898 e 1.172, que dispõem sobre a prote-ção dos corpos d’água. Na representação efetuada pelo procurador geral da Repú-blica argüiu-se que a classificação e o enquadramento dos corpos d’água deviamlevar em consideração as condições existentes de produção de energia elétrica ede navegação, as quais eram objeto de concessões de autorizações federais.

Essa medida se endereçava, sobretudo, à bacia da Billings, localizada novetor sul da metrópole, em virtude do conflito do uso com a sobreposição devários sistemas de infra-estrutura nesse reservatório, entre eles o abastecimentode água potável e da geração de energia elétrica para a usina de Henry Borden,em Cubatão. Essa questão tem permeado ainda hoje o debate técnico sobre ma-nanciais e conseguiu mobilizar substancialmente entidades representativas declasses profissionais e organizações ambientalistas, como o Movimento de Comis-são de Defesa da Billings e o Núcleo Pró-Tietê, dando novos contornos à proble-mática ao inserir o equacionamento desse conflito em norma constitucional, em1989.

Em 1979 foi efetuada a primeira alteração na lei dos mananciais. Modi-ficou-se o perímetro de área protegida na sub-bacia do rio Guaió, no vetor lesteda região metropolitana, tendo sido estipulado o novo perímetro como a futuravia expressa São Paulo – Mogi das Cruzes, na divisa entre os municípios de Poáe Suzano, e excluídas parcelas territoriais dos limites de proteção. Essa alteração,segundo Costa e Silva (1993), atendeu a interesses específicos para implantaçãode loteamentos habitacionais.

As demais medidas legais promulgadas até 1982 regulamentaram aspectosda sistemática do licenciamento e averbação de empreendimentos, principalmenteos voltados ao uso residencial, constituindo-se nas primeiras tentativas de integraras várias esferas do governo.

Em 1982 efetuou-se a segunda alteração na lei. Modificou-se o perímetrodas áreas protegidas na sub-bacia de Botujuru, em Mogi das Cruzes, também novetor leste da metrópole. Essa alteração respondeu às demandas vinculadas aosinteresses industriais, conforme explicitado no texto legal (artigo 3º da Lei 3.286).

Os estabelecimentos industriais no perímetro alterado passaram, a partir deentão, a ser regidos pela lei de zoneamento industrial; retiraram-se, portanto, asrestrições impostas às zonas de reserva ambiental, definidas em lei.

A pressão para que se alterassem os limites das áreas protegidas foi intensaem meados dos anos oitenta. Em oposição, foi elaborado um projeto de lei, pro-veniente do âmbito técnico, de acordo com o qual as alterações dos perímetroslegais deveriam ser instruídas com pareceres da Companhia de Tecnologia e

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Saneamento Ambiental – Cetesb – e da Secretaria dos Negócios Metropolitanos– SNM –, segundo a Lei 3.746/83.

O texto legal foi ainda complementado com vários outros dispositivos du-rante os anos de 1982 a 1986, regulamentando aspectos técnicos, como os dosdepósitos de lixo e das usinas de beneficiamento de resíduos sólidos.

O questionamento da inadequação da legislação de proteção dosmananciais em face da situação social real nas áreas protegidas circunscreveu odebate da legislação em análise, em meados da década de 1980. Quanto aoconflito decorrente dessa questão, no período compreendido entre 1986 e 1988foram encaminhados à Assembléia Legislativa dois projetos de revisão dalegislação de mananciais, elaborados pelo Poder Executivo,22 sendo que um delesincorporou a proposta de autoria do próprio Legislativo (substitutivo ao projetode lei 508, de 1986). O conteúdo dessas propostas consistia na proposição deregularização das construções irregulares em mananciais. 23

Emendas à legislação apresentadas entre 1986 e 1988, em particular peloPartido dos Trabalhadores, traduziram as preocupações daquele momento: o con-flito entre a questão ambiental e a social, enfatizando-se a preocupação com ascondições de vida da população residente nos mananciais.

As questões subjacentes ao tema da proteção ambiental estavam restritasnaquele momento ao meio técnico. Na agenda do movimento ambientalista, eramtênues as colocações pertinentes aos problemas do saneamento básico (Viola,1991). As manifestações sobre esse projeto de lei partiram, sobretudo, da Co-missão de Defesa da Represa Guarapiranga.

A análise das posições da sociedade civil ante a questão dos mananciais,realizada por Grostein, Sócrates e Tanaka (1985), testemunha a manifestação aque fizemos menção.

A Sociedade Amigos da Riviera Paulista, bairro às margens da Guara-piranga (…) manifesta-se no sentido de preservar o uso do solo com baixadensidade e de manter a lei de proteção dos mananciais e desta forma evitara desvalorização da área. Estes princípios serão retomados pela Comissãode Defesa da Guarapiranga em 1983.Como vemos, os objetivos da Comissão de 1974 em torno da defesa do usopúblico no local se transforma na defesa do uso privado da área e da ma-nutenção do valor da terra (1985, pp. 97-8).Assim, o debate das questões dos mananciais, suscitado pelo projeto de lei

508, foi recortado, de um lado, pelas preocupações com a questão da habitaçãosocial e, de outro, por um viés elitista, vinculado ao interesse da valorizaçãofundiária das áreas de mananciais, defendida por entidades de bairro com umperfil de renda elevada.24

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Em 1988 foi encaminhado pelo poder público o projeto de lei 262 (Assem-bléia Legislativa, 1988), que em sua versão original tratava de uma reedição doprojeto de lei mencionado anteriormente. Esse projeto recebeu um número signi-ficativo de emendas, tendo sido redigido um projeto substitutivo por deputadosdo Partido dos Trabalhadores, traduzindo a evolução do debate sobre a questãodos mananciais naquele momento, em que se reiterava o conflito entre a questãosocial e a ambiental.25

Houve outras iniciativas de revisão e aperfeiçoamento da legislação deproteção dos mananciais, no âmbito técnico, as quais buscavam ouvir os demaissetores da administração pública, nos níveis municipal, estadual e federal, tendoem vista o processo de regulamentação do sistema de gestão das águas em curso(que abrange os vários setores envolvidos) e a maior autonomia dos municípiosapós a Constituição de 1988, num cenário bastante distinto do da década de 1970,quando a lei foi promulgada.

O anteprojeto de modificação das leis de proteção dos mananciais (SHDUR– Emplasa, 1991), do qual participei como representante do órgão ambiental,traduz as visões, os interesses e os conflitos da questão dos mananciais naquelemomento, tendo sido bastante influenciado pelos interesses particularizados dosmunicípios, numa tentativa da Emplasa de reforçar o sistema de planejamentometropolitano, que se encontrava em processo de enfraquecimento no tocante àssuas atribuições e estruturas.

O documento resultante propôs basicamente a criação de um fundo deapoio à proteção dos mananciais na linha dos instrumentos de compensação finan-ceiro-ambiental. Visava à aplicação de recursos financeiros em obras referentesà proteção a esses recursos, de forma corretiva ou de apoio às atividades eco-nômicas compatíveis, na linha do desenvolvimento sustentado, sobretudo no setorrural. Os recursos previstos eram provenientes de dotações orçamentárias e detaxas de cobrança do uso da água, proposta que se sobrepunha à criação do FundoEstadual de Recursos Hídricos – Fehidro – do Sistema de Recursos Hídricos.

O documento esboçava ainda várias alternativas para a captação de recursose o financiamento de atividades necessárias ou compatíveis, tais como a urba-nização ou a remoção de favelas em área de mananciais. Essas propostas tinhamo mérito de não serem desvinculadas da realidade orçamentária para a implan-tação dos projetos.

Outro ponto a destacar é o da regularização das edificações, tendo sido ree-ditadas as medidas preconizadas nos anteprojetos de lei mencionados anterior-mente. Foi a primeira vez que se inseriu nas propostas a questão da urbanizaçãode favelas.

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A abordagem da questão da regularização das edificações e favelas buscavainserir no Anteprojeto de Modificação das Leis de Proteção dos mananciais ele-mentos estruturantes do espaço, introduzindo o conceito de áreas saturadas paraos bolsões a serem regularizados. Foi vedada nesses locais a implantação de cons-truções residenciais e demais equipamentos públicos ou privados em períodoposterior às regularizações efetivadas, assim como obras públicas de impactocomo as vias estruturais, evitando-se a indução de novas atividades.

Outro conceito urbanístico introduzido nos processos de regularização foio da compensação ambiental. Por exemplo, os conjuntos verticais poderiam serregularizados, desde que feita a doação de áreas verdes em troca da regularizaçãodas taxas de uso do solo ultrapassadas, segundo os limites da lei. A propostaamplia ainda o sistema de bonificação para a manutenção de áreas verdes, esten-dendo-o para as Classes B.

Quanto aos novos parcelamentos do solo, o modelo conceitual da lei foimantido para todas as bacias hidrográficas, nos vários vetores da metrópole.

No que diz respeito aos usos permitidos em áreas de mananciais, a propostaflexibiliza os concedidos atualmente, sobretudo as áreas de uso industrial, aten-dendo à pressão dos municípios integrantes das faixas protegidas. Essas alteraçõese a regularização das edificações evidenciam a expressão dos interesses maislocalizados das autoridades municipais, traduzindo as preocupações que emergemna instância do território local.

O processo de revisão dos mananciais foi interrompido com as alteraçõesinstitucionais vigentes a partir de então, e o ano de 1991 se caracterizou por umainflexão da trajetória institucional da questão dos mananciais. A aplicação dalegislação específica passou a ser atribuição do órgão ambiental do Estado (De-creto nº 33.135 de 1991). Os avanços institucionais conseguidos nesse período sãoinegáveis: a incorporação de áreas ao perímetro protegido, como o da bacia hidro-gráfica do córrego Vermelho ou ribeirão Vargem Grande, no vetor oeste da me-trópole, opõe-se ao processo de exclusão de áreas protegidas que se deu nos anosoitenta.

Data também de 1991 a criação do sistema integrado do licenciamento doparcelamento do solo, o Grupo de Análise de Projetos Habitacionais – Graprohab–, cuja atribuição consistia em tentar agilizar o processo de aprovação dos em-preendimentos e dirimir conflitos de legislação nas várias esferas do governo.

Com o mesmo propósito, foi instituído um sistema integrado de fiscali-zação das atividades nas bacias Billings (SOS Billings) e Guarapiranga (SOSGuarapiranga), com a finalidade de integrar e dar efetividade à extensa (e nova)legislação concernente aos mananciais, com a incorporação das recentes medidasambientais editadas.

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Formulou-se ainda o Programa de Saneamento Ambiental da Bacia doGuarapiranga, com recursos do Banco Mundial, objetivando corrigir os problemasambientais existentes e promover a aplicação da proposta do desenvolvimentosustentado para uma das áreas mais críticas dos mananciais. Esse programa ense-java uma postura mais realista da aplicação da legislação em face dos processosde produção e apropriação do espaço.

Outra medida implementada foi a contratação de um consórcio de empresaspara revisar, atualizar e aperfeiçoar a legislação de proteção dos mananciais, aindano ano de 1991. Concomitantemente foi instituída a Política Estadual de RecursosHídricos e o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SIGRH–, regulamentando a Constituição Paulista nessa matéria, legislação que expressoufortemente os interesses das entidades de classe profissionais.

A lei que dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos estabelececomo princípios e diretrizes gerais o gerenciamento descentralizado: a adoção dabacia hidrográfica como unidade físico-territorial de planejamento e gerencia-mento; o reconhecimento de recursos hídricos como bem público; o rateio docusto das obras de aproveitamento múltiplo entre os beneficiados; a consulta eprevenção das causas e dos efeitos da poluição, das inundações, das estiagens, daerosão do solo e do assoreamento dos corpos d’água; a compensação financeiraaos municípios afetados por áreas inundadas e a compatibilização do gerencia-mento dos recursos hídricos com o desenvolvimento regional e com a proteçãodo meio ambiente, numa linha de gestão das águas nos moldes da experiênciafrancesa.

A lei em questão instituiu ainda, entre outras medidas, a criação do FundoEstadual de Recursos Hídricos, para dar suporte financeiro à política estadual derecursos hídricos. A implementação dessa lei foi efetivada, já tendo sido instituídaa maior parte dos conselhos e comitês previstos. No caso da metrópole paulista,foi implantado o Comitê da Bacia do Alto e desenvolvido o Plano Integrado deAproveitamento e Controle dos Recursos Hídricos das Bacias do Alto Tietê, Pira-cicaba e Baixada Santista.

As medidas implantadas constituem-se em espaços e instrumentos quevisam explicitar e mediar os conflitos de interesses na gestão das águas, entre osdiversos setores sociais (nas diferentes esferas de governos ou grupos sociais).Elas resultaram, em grande parte, da intensa mobilização das entidades de classe,como a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes), Conselho Regionalde Engenharia e Arquitetura (Crea-SP), Associação dos Engenheiros da Sabesp,Associação dos Engenheiros do Departamento de Águas e Energia (DAEE) etc.,que buscavam regulamentar preceitos da Constituição Paulista de 1989 pertinentesà gestão das águas.

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O movimento ambientalista, por sua vez, ampliou sua agenda, incorporandoquestões como a do saneamento ambiental e outros temas vinculados às condiçõesde vida sociais e ambientais da população. Exemplo disso são as organizaçõesnão-governamentais mais bem estruturadas, como a Fundação SOS Mata Atlân-tica, que abrigou o recém-criado Núcleo Pró-Tietê, acompanhando na agendaambiental a trajetória do debate internacional sobre o meio ambiente e vinculandoas questões relativas ao saneamento e proteção de mananciais urbanos, e que tempressionado o governo estadual para que implemente políticas ambientais nossetores mencionados.

A resolução conjunta assinada entre as secretarias do Meio Ambiente e dosRecursos Hídricos em outubro de 1991 estabeleceu que as águas do rio Pinheirosdeixariam de ser bombeadas para a Billings. Essa medida resultou da pressãoexercida pelo Movimento de Defesa da Represa Billings no Conselho Estadualdo Meio Ambiente, que exigiu o cumprimento das medidas constitucionais, resta-belecendo o reservatório como manancial hídrico.

Diversas entidades se mobilizaram e formaram uma rede de organizaçõesnão-governamentais da bacia do Guarapiranga, reunindo entidades como o Centrode Educação, Saúde e Meio Ambiente (Cesma); Espaço – Formação, Assessoriae Comunicação; SOS Represa Guarapiranga e Instituto Socioambiental, entreoutras, que passaram a cobrar medidas de controle ambiental para o citado reser-vatório, após o surgimento das algas tipo anabaena em decorrência de alto graude degradação da qualidade das águas em 1990. Esse trabalho teve continuidadecom o apoio de uma organização não-governamental italiana, a Legambiente.

Grande parte desses avanços institucionais circunscreveram-se, no plano deum discurso bastante ambientalizado do Estado, como resposta às demandas orga-nizadas da sociedade civil. Contudo, esse discurso estava muito distante das açõesefetivas relativas às demais políticas setoriais, assim como ao próprio conteúdodas políticas na área ambiental e da lógica dos processos de produção e apro-priação privada dos espaços protegidos. É o que demonstraremos por meio daanálise dos indicadores de expansão urbana, dos levantamentos dos loteamentosclandestinos e dos índices de qualidade das águas.

Sobre as medidas elencadas anteriormente, cabe mencionar que as con-tribuições do processo de licenciamento ambiental integrado para a efetividade dalegislação de mananciais foram inexpressivas, o que pode ser comprovado pelonúmero reduzido de projetos em análise nos últimos anos.

No que diz respeito ao processo de fiscalização integrada das atividades emmananciais, embora dispondo de um extenso arcabouço legal, a atividade carecede recursos humanos e materiais, conforme relatório do Programa de SaneamentoAmbiental da Bacia do Guarapiranga encaminhado ao Conselho Estadual do MeioAmbiente (Cosema) em setembro de 1994.26

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Enquanto alguns setores da administração pública buscam implantar o Pro-grama de Recuperação Ambiental da Bacia do Guarapiranga, outros órgãos dopróprio governo estadual – a Secretaria dos Transportes Metropolitanos, atravésda Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e do Metrô – propu-seram o Projeto Sul, constituído por um sistema de transportes, uma nova linhade metrô e a modernização do sistema ferroviário até os limites dos mananciais.Há ainda a proposta do Rodoanel Metropolitano de São Paulo, que recorta a baciade Guarapiranga.

Esses projetos e obras demonstram a escolha do vetor sul-sudoeste comodireção prioritária de investimentos de grande impacto nas dinâmicas de uso eocupação do solo, com reflexos na área de mananciais.

Ainda com referência aos aspectos institucionais elencados, cabe reiterar ograu de desarticulação institucional que emerge na questão dos mananciais. Asáreas protegidas dos mananciais não foram incorporadas na proposta do Sistemade Unidades de Conservação do Estado.

Essa questão, pauta constante das reivindicações dos municípios inseridosem áreas de mananciais, tem como efeito prático a não-inclusão desses muni-cípios nos mecanismos de compensação financeira ambiental, em razão das res-trições ao desenvolvimento econômico promulgadas nos últimos anos. Aos muni-cípios com territórios em mananciais na metrópole paulista foram designados osrecursos que serão provenientes do Fehidro, numa visão fragmentada dos manan-ciais enquanto recurso ambiental e frágil do ponto de vista de fomento à proteçãodessas áreas.

As áreas de mananciais, em face de sua extensão, significado ambiental eexpressão econômica, deveriam estar contempladas em ambos os sistemas, o hí-drico e o ambiental, questão também não tratada no âmbito das diretrizes atuaisde proteção e recuperação dos mananciais.

Em 1997 foi promulgada a Lei de Proteção das Bacias Hidrográficas dosMananciais de Interesse Regional do Estado de São Paulo, estabelecendo as dire-trizes e normas para a proteção e recuperação dessas bacias. A atualização a quese procedeu refere-se, sobretudo, à adequação da legislação existente no âmbitometropolitano do Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos,existente desde 1991. A fim de atender a esse propósito, é prevista a criação dasÁreas de Proteção e Recuperação dos Mananciais (APRM), compostas por umaou mais sub-bacias.

Tais diretrizes tratam basicamente da estruturação de um sistema de gestãovinculado ao sistema dos recursos hídricos; a obrigatoriedade de planos de desen-volvimento e proteção ambiental para as bacias hidrográficas; o estabelecimentode um sistema de informações e a definição de instrumentos de manejo do uso

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do solo para os mananciais, com a criação das áreas de intervenção para fins derecuperação ambiental, de restrição à ocupação e de ocupação dirigida. Há tam-bém algumas diretrizes que dizem respeito à infra-estrutura sanitária.

O projeto de lei foi precedido de um debate público intenso, que resultouna elaboração pelo Partido dos Trabalhadores, do projeto de lei substitutivo 581de 1996. As principais divergências com relação à proposta do governo estadualforam as de natureza institucional, por exemplo a vinculação do sistema de gestãodos mananciais ao Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos, enão ao órgão metropolitano de planejamento, no caso dos mananciais que per-tencem ao território metropolitano, e a definição do órgão técnico de implemen-tação da referida legislação nos moldes de uma entidade não-pública – a Agênciade Bacias Hidrográficas.

Esses posicionamentos refletiram claramente a preocupação com o reforçodas entidades ambientais e de planejamento existentes no âmbito estadual, doEstado, na perspectiva da manutenção dos instrumentos de controle da esferapública, posição reiterada pela área acadêmica, que refletem projetos e pontos devista sobre o papel do Estado na sociedade.

A principal divergência manifestada pelas organizações não-governamen-tais referia-se ao artigo que determina a elaboração do Plano Emergencial deRecuperação dos Mananciais da Região Metropolitana da Grande São Paulo(Folha de S. Paulo, 1 set. 1997). As ongs eram contrárias à forma proposta paraa regularização de imóveis nessas áreas. A questão encontra-se em debate públicoaté o momento atual.

O desenho institucional do sistema de proteção dos mananciais está, por-tanto, delineando um novo papel do Estado na gestão da questão ambiental, rede-finindo atribuições públicas e privadas, em um modelo descentralizado. Conformeexpusemos, a Agência de Bacias poderá ser efetivamente participativa e repre-sentativa de vários setores da sociedade, se conseguir ampliar sua pauta ou refletirinteresses econômicos e de entidades de classe profissionais, como apontado porBarraque (1992) para o caso da França. Esse objetivo poderá ser atingido se aquestão principal girar em torno da redistribuição dos recursos do Fehidro, pro-veniente da taxa de cobrança pelo uso da água.

O direcionamento da política de proteção das águas na metrópole paulistapoderá caminhar, assim, em direção contrária à formulada por Pádua (1989), paraquem a política ambiental sugere uma conceituação voltada à “redescoberta dosentido da razão pública e do espaço público”, questão que discutiremos no Ca-pítulo 4.

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Notas

1. Citação extraída de YOSHIMOTO, P. M. et al., in “RMSP – Evolução do aproveitamentodas águas,” Revista SPAM, ano I, n. 4, p. 17, São Paulo, Emplasa, 1980.

2. YOSHIMOTO, P. M. et al., op. cit. p. 18.

3. Datam de 1882 as medidas de proteção dos mananciais da Cantareira, de 1918, as medidasdo Alto Cotia e de 1937, as do rio Claro.

4. MEADOWS, D. et al. Los Limites del Crecimiento. México, Fondo de Cultura Económica,1972.

5. Reservatório Billings; Reservatório do Cabuçu, do rio Cabuçu de Cima até a barragem nomunicípio de Guarulhos; Reservatório da Cantareira, do rio Cabuçu de Baixo até as barragensno município de São Paulo; Reservatório do Engordador, até a barragem do município de SãoPaulo; Reservatório de Guarapiranga, até a barragem do município de São Paulo; Reservatóriode Tanque Grande, até a barragem do município de Guarulhos; rios Capivari e Monos, até abarragem da Sabesp no município de São Paulo; rio Guaió, até o cruzamento com a rodoviaSão Paulo–Mogi das Cruzes, na divisa de municípios de Poá e Suzano. Ainda, os mananciaisrio Itapanhaú, até a confluência com o ribeirão das Pedras, no município de Biritiba-Mirim;rio Itatinga, até os limites da região metropolitana; rio Jundiaí, até a confluência com o rioOropó, no município de Mogi das Cruzes.

6. A legislação de proteção dos mananciais é composta por um conjunto de dispositivoslegais, sendo os principais instrumentos a lei estadual nº 898 de 1975, que estabeleceu as áreasde proteção e os princípios gerais do disciplinamento do uso do solo, visando à proteção, ea Lei 1.172 de 1976, que determinou as normas de restrições de uso do solo. Ainda, o decretoestadual nº 9.714 de 1977, que regulamentou as leis supramencionadas e definiu ascompetências dos órgãos envolvidos e demais providências necessárias à aplicação dessesinstrumentos legais, e sua atualização pela lei estadual nº 9.866 de 1997, que estabeleceu asdiretrizes e normas adequando a legislação em questão ao Sistema Estadual de Gestão dosRecursos Hídricos e as normas constitucionais.

7. Esse código inclui também, entre as categorias a serem preservadas, as florestas deexploração econômica.

8. Ver a respeito da evolução do conceito de conservação “Unidades de conservação: umdebate conceitual”, in Proposta para a discussão do sistema estadual de unidades deconservação. São Paulo, Secretaria do Meio Ambiente, Série Bio/SP, 1998.

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9. Segundo consideração feita por um dos autores da lei de proteção dos mananciais, COSTAE SILVA, R., “Instrumentos de política de recursos hídricos na lei de proteção dosmananciais”, in Política e gestão de recursos hídricos no estado de São Paulo. Secretaria doMeio Ambiente, 1993.

10. Estabeleceram-se padrões de vegetação com critérios bem mais amplos (baseados emDora Romariz), considerando, portanto, primordial o papel da vegetação na proteção dosmananciais englobando todas as formas, inclusive as matas nos estágios inicial e médio deregeneração. Ver a respeito Projeto 7220/001 – Mapeamento das matas e demais formas devegetação primitiva. São Paulo, Emplasa, 1984 (mimeo).

11. Cabe ressaltar que no período de vigência da legislação de mananciais, vários problemasambientais se tornaram focos de conflitos, gerando grande impacto no ambiente. Comoexemplo, citamos as questões referentes ao tratamento de resíduos sólidos e à atividademinerária. Os conflitos entre essas atividades, o uso do solo e a proteção ambiental sãoapontados neste trabalho a fim de fornecer ao leitor a dimensão da questão dos mananciais;contudo, extrapola o escopo de nossa análise o aprofundamento dessas questões.

12. Embora Lopes assinale que não foram nem ao menos levados em consideração os aspectosfísico-químicos e biológicos e a capacidade de diluição e autodepuração específica para cadasub-bacia.

13 “Estratégia mundial para a conservação” (resumo), in Política estadual do meio ambientee dos recursos naturais. São Paulo, Secretaria do Meio Ambiente, 1984 (mimeo).

14. Depoimento transcrito no documento elaborado por GROSTEIN, M. D. et. al. “A cidadeinvade as águas: qual a questão dos mananciais”, in Sinopses – Edição Especial. São Paulo,FAU-USP, 1985, p. 118.

15. Baseamo-nos aqui no anteprojeto de revisão da lei de proteção dos mananciais, elaboradopela Emplasa em 1991, e no documento elaborado pela Secretaria do Meio Ambiente e asempresas de consultoria JNS, Equipe UMAH e SRL, em dezembro de 1992, e no documentoNormas e diretrizes de recuperação e proteção dos mananciais de interesse do estado de SãoPaulo, elaborado pela Secretaria do Meio Ambiente, entre os anos de 1995 e 1997, comentadoadiante.

16. Citação extraída de CASTELLS, M. Problemas de Investigación en Sociologia Urbana.Buenos Aires, Siglo Veintiuno Ed. S.A., 1972, p. 137 (tradução da autora).

17. A citação faz parte de um artigo de MCKENZIE de 1926, publicado in PIERSON, D.Estudos de ecologia humana. São Paulo, Martins, 1970, pp. 44-5.

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18. A intensa ocupação urbana nas áreas de mananciais verificada ao longo da rodovia RégisBittencourt, no vetor sudoeste; das rodovias Suzano – Ribeirão Pires, Anchieta e Imigrantes,no vetor sudeste; ao longo da avenida Senador Teotônio Vilela e da estrada do M’Boi Mirim,ao sul do município de São Paulo, e da rodovia Fernão Dias e estrada Santa Inês, no vetornorte, reiteram as evidências apontadas pela geografia, economia e sociologia urbana naperspectiva neoclássica sobre o papel estruturador dos sistemas de comunicações e detransportes nos processos de produção do espaço.

19. A propósito, citamos como exemplo os projetos em andamento nas diversas esferas degoverno que incidem em áreas de mananciais ou terminam nos limites das áreas de proteção:construção da linha sul do metrô; dos corredores de transportes coletivos pela municipalidadeem área de mananciais; do corredor M’Boi Mirim e Guarapiranga; do corredor Interlagos eo corredor Itapecerica; a duplicação da estrada M’Boi Mirim na bacia de Guarapiranga pelaprefeitura do município de São Paulo; o projeto de modernização do sistema ferroviário novetor sudoeste, ligando a estação Osasco ao distrito de Jurubatuba pela Companhia de TrensMetropolitanos; a construção da linha 5 do metrô Campo Limpo – Santo Amaro (Projeto Sul);e, ainda, a construção do Grande Anel Viário (Rodoanel) conectando as rodovias querecortam a área metropolitana (cruzando a área de mananciais) pela Secretaria de Transportesdo Estado.

20. Cabe informar que o tema dos mananciais nessa perspectiva já foi abordado porGROSTEIN, SÓCRATES E TANAKA, 1985, op. cit., em trabalho baseado em registros daimprensa e em depoimentos dos diversos setores da sociedade. Essa análise, entretanto, temcomo referência a conjuntura de meados da década de 1980. Nosso objetivo foi o de atualizaressa leitura das diferentes posições em face da legislação dos mananciais, através de registrosdas alterações da legislação de proteção dos mananciais em nível de estudos, anteprojetos deleis, leis e decretos.

21. As propostas mencionadas foram objeto da emenda número 3, que estabelece que, “nocaso do imóvel atingido pela faixa de maior restrição, referido no parágrafo primeiro do artigo4º, o Estado deveria proceder de imediato à sua desapropriação”, e da emenda número 4, queestendeu o princípio de “onde couber na legislação”, constando que o “proprietário de imóvelcuja utilização se tornar economicamente impossível, em virtude das restrições impostas pelapresente lei, terá direito à indenização através de processo de desapropriação” (AssembléiaLegislativa, 1975). Essas propostas referentes à estrutura fundiária, consubstanciadas noartigo 32, foram, portanto, as únicas alterações no projeto de lei no momento de suaaprovação.

22. Uma leitura dos referidos projetos de lei pode ser encontrada em MOREIRA LIMA,Antonio C. Política pública de proteção dos mananciais. São Paulo, dissertação de mestradoapresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1990.

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23. Em 1986 foi criada uma Comissão de Revisão para Aperfeiçoamento da Lei de Proteçãodos mananciais, na Emplasa. O objetivo básico dos trabalhos dessa comissão era buscarsuperar problemas mais imediatos levantados pela legislação de mananciais, considerando osdispositivos que vinham provocando divergências ou dúvidas quanto à sua aplicação eaqueles cujo emprego vinha sendo contestado. O referido trabalho apontou para a necessidadede uma revisão mais abrangente da legislação dos mananciais, incluindo uma reavaliação deconceitos e diretrizes. Contudo, nessa etapa do trabalho, organizaram-se apenas as propostasimediatas, agrupando-as em três níveis de questões. Em primeiro lugar, os assuntos ligadosà eficácia da legislação, como os procedimentos de análise, fiscalização, sanções e mecanismosde compensação financeira para os municípios contidos nas áreas protegidas; em segundolugar, os conceitos limitadores da aplicabilidade da legislação, como as situações controversasou irregulares. Por fim, foram efetuados levantamentos e proposições e elaborados osinstrumentos legais para as alterações de assuntos vinculados a prescrições técnicas, comominerações, movimentos de terra etc. As propostas técnicas foram consubstanciadas nasvárias medidas legais editadas posteriormente, por resoluções da Secretaria dos NegóciosMetropolitanos.Com referência ao projeto de lei 508 de 1986 (Assembléia Legislativa, 1986), tratava-sebasicamente de proposta de regularização das edificações de uso residencial e misto,localizadas em áreas de proteção dos mananciais, existentes ou iniciadas até a publicaçãodessa lei. Na tramitação do projeto, foi feita apenas uma emenda que estipulava a obrigatoriedadede a Sabesp, no prazo de um ano, apresentar projeto de rede de água potável e de esgotamentosanitário, de forma a atender às edificações e, no caso de esses sistemas de infra-estruturaestarem a cargo das municipalidades, estas deveriam apresentar um cronograma de obras.

24. Extrapola o âmbito deste trabalho mapear a evolução da agenda do movimento ambientalistadiante da questão dos mananciais. As observações feitas sintetizam a reflexão sobre aspectoslevantados.

25. Essa proposta, além de contemplar a regularização das edificações de uso residencial emisto, atingindo as construções existentes (o uso misto tem um teto de área construída),dispõe ainda sobre a possibilidade de instalação de sistemas de abastecimento de água potávele de esgotamento sanitário, em casos excepcionais, nas faixas de Classe C.As emendas propostas constituíram-se basicamente de restrições às medidas preconizadaspelo projeto em foco, buscando agora conciliar o atendimento aos graves problemas sociaisexistentes e a proteção dos mananciais. Na justificativa do projeto substitutivo não se verificamais a ênfase apenas nos aspectos sociais da questão. Objetiva-se restringir as regularizaçõespara não configurarem uma ampla anistia às irregularidades do uso e ocupação do soloexistentes, não induzindo a novas ocupações nem criando a jurisprudência para todas assituações. Verificamos que as emendas propunham suprimir a regularização do uso industrial;condicionar a regularização das edificações e dos loteamentos e desmembramentos, esomente no caso das habitações de interesse social; estipular a área máxima das edificações;

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exigir a obrigatoriedade de conclusão dos sistemas de água e esgoto, com tratamentolocalizado no caso de conjuntos habitacionais. Outras medidas propostas reiteravam aregularização das edificações para habitações de interesse social, excluíam as áreas deprimeira categoria, criavam um Conselho de Fiscalização de Mananciais e restringiam oprocesso de regularização às edificações nas bacias Billings e do Guarapiranga.

26. Os indicadores atuais do número de favelas para o ano de 1994, assim como a listagemdos loteamentos clandestinos, corroboram essas afirmações, conforme trabalho elaboradopelo PMSP – FIPE – Prefeitura do Município de São Paulo e Fundação Instituto de PesquisasEconômicas e a referida listagem fornecida por PMSP – Sehab – Resolo.

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Capítulo 3A cidade real e (in)sustentável

A questão da proteção dos mananciais está vinculada aos processos maisgerais de estruturação do espaço físico-territorial e socioeconômico da metrópolepaulista. A configuração entre cidade e recursos naturais existente no presentepode ser remetida às formas de definição da estrutura fundiária no século passado.Segundo Murillo Marx (1991), o reflexo do processo da lenta definição da pro-priedade coletiva do patrimônio público nas vilas, povoados e cidades brasileiras,de características tão duradouras e de transformações profundas, foi decisivo napaisagem circundante de nossas cidades no século XIX. A indefinição dos limi-tes fundiários do patrimônio coletivo possibilitou a lenta privatização dos recur-sos naturais, dando os contornos e espelhando a relação entre cidade e os recur-sos naturais no século XX.

No quadro da evolução urbana, temos que as vilas, os povoados e as cida-des brasileiras surgiram rodeadas de terras vazias, utilizadas como reserva depastagem para o gado, de lenha para o uso dos moradores, de terra cultivável parapequenas hortaliças e pomares de subsistência, ou terras vazias que podiam seraforadas e concedidas para exploração.

As áreas de uso coletivo, conhecidas como áreas do rossio, “cuja própriaindefinição alimentava tal aparência, eram retratadas geralmente como solo mal-cuidado, além de vazio, como terras aparentemente esquecidas, ao Deus-dará”(Marx, 1991, p. 85). Essa indefinição foi lentamente superada, mas ao mesmotempo propiciou a invasão de glebas cada vez maiores, que com o tempo foramsendo desmatadas para o aproveitamento da madeira como estoque de lenha ematerial de construção.

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No contexto das cidades paulistas, após o surto do café – ciclo econômi-co que conta a história da urbanização paulista e também a história do desma-tamento (Moraes Victor, 1975) –, as principais causas da degradação ambientalse originaram dos efeitos dos processos de expansão urbana sobre a vegetação pri-mitiva e os cursos de água pelos usos urbano-industriais, bem como sobre os de-mais elementos do meio biofísico, uma vez que os ecossistemas são interligados.

No caso da metrópole paulista, o processo de metropolização já estavaconfigurado nos anos sessenta. Nessa década acentuou-se o ritmo de crescimen-to econômico-demográfico impresso na década anterior, após a implantação dachamada Restauração Kubitscheck, em que o papel do Estado na economia econseqüentemente no urbanismo foi relevante, potencializando a acumulação docapital industrial. Passaram a ser de competência pública amplos setores da pro-dução, gerenciamento e operação das condições gerais de produção, inclusive dosmeios coletivos de consumo.

Na literatura sobre o assunto, são bastante comentadas as novas articula-ções do processo de industrialização que reordenavam as atividades agrárias,subordinando parte de seu movimento à atividade industrial, tendência eviden-ciada pela expansão quer dos compartimentos dos bens de produção para o se-tor industrial, quer da agroindústria processadora, respaldada pelos financiamentosexternos então implantados.

Em termos ambientais, esse processo significou a intervenção na maioriados ecossistemas naturais, convertidos em agrossistemas mecanizados à base degrandes fluxos de petróleo com a utilização cada vez mais generalizada de ferti-lizantes e agrotóxicos, o que resultou na erosão dos solos na agricultura e nacontaminação de recursos hídricos.1

No tocante aos aspectos sociais, os avanços tecnológicos no campo, coma crescente expulsão da mão-de-obra rural para a cidade, e, por outro lado, osprocessos de ampliação do terciário urbano, com as novas formas de comercia-lização e consumo advindas de atividades tipicamente urbanas, produziram umgrande impacto no espaço físico territorial. De um lado, deu-se a expansão doarcabouço material e social crescentemente diferenciado e complexo e, de outro,faziam-se notar as marcas da exclusão e da segmentação (Cano, 1992, p. 20).

A fim de evidenciar a dimensão da nova qualidade da urbanização e a re-lação entre cidade e campo nos anos sessenta, transcrevemos abaixo trecho de umtexto de Oliveira (1979), ainda que fora de seu contexto, tentando dar visibilidadeaos fenômenos processados nas relações entre urbano e desenvolvimento econô-mico:

O que é o urbano nesse contexto? (...) O urbano, agora, é a unificação domercado de trabalho propriamente urbano e rural, é bóia-fria, acumulação

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e miséria (...). Pode parecer muito abstrata esta colocação: então não existemais divisão do trabalho entre campo e cidade, então não existe mais oespecificamente urbano? Por certo, muitas diferenças persistem, mas opovo é a conversão da agricultura em indústria, no sentido mais rigorosodo termo (1979, p. 73).Os vultosos investimentos realizados entre 1956 e 1962, para que se cum-

prisse o Plano de Metas, alteraram radicalmente o padrão de acumulação do ca-pital da economia brasileira. Deu-se a implantação da indústria pesada de bens deprodução, principalmente na região da Grande São Paulo, com reflexos intensosnos padrões de urbanização, processo que foi facilitado pela alteração do regimepolítico após 1964.

A Região Metropolitana de São Paulo, é consolidada então como pólo donovo padrão de acumulação do capitalismo brasileiro, passou a receber inves-timentos consideráveis em infra-estrutura, a fim de que se adequasse às novascondições, sobretudo no setor de transportes e sistema viário.

A tradução desse processo nas formas de apropriação dos recursos naturaisé perversa. No ano de 1962, apenas 25% da superfície territorial da Região Metro-politana de São Paulo se apresentava recoberta por matas, originalmente compos-ta, em sua maior parte, pela floresta tropical latifoliada decídua, com alta quan-tidade das espécies sempre-verdes à medida que se aproximava da escarpa atlân-tica, e o restante por várzeas, brejos e campos.2

O município de São Paulo, já em 1963, retirava 1.500 m3 de terra na dra-gagem do rio Tietê,3 processo que teria seu volume ampliado com a ocupaçãofora dos limites da bacia sedimentar de São Paulo.

Quanto aos recursos hídricos, já mostravam nos anos sessenta sinais decriticidade em relação à sua qualidade e quantidade para o abastecimento públi-co. Alguns anos depois foi elaborado o Plano de Desenvolvimento Global deRecursos Hídricos das Bacias do Alto Tietê e Cubatão (Hibrace, 1967). De acordocom esse plano, com a implantação do Sistema Cantareira procurar-se-ia supriros déficits de abastecimento de água a ser captada nos mananciais fora da RegiãoMetropolitana de São Paulo, na bacia do rio Piracicaba,4 de aproximadamente33 m3/s, o que significava 62% do abastecimento da metrópole.

Em síntese, os indicadores ambientais de que dispomos na caracterizaçãoda região metropolitana configuravam, já no ano de 1965, um quadro de degra-dação ambiental, com apropriação perversa dos recursos naturais. Nas décadasposteriores, a situação ambiental tornou-se mais crítica por causa do ritmo que seimprimiu ao processo de urbanização.

A ação centralizadora e monopolizadora das áreas metropolitanas, em es-pecial no caso da Região Metropolitana de São Paulo, foi facilitada pela própria

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configuração espacial, haja vista sua estrutura radioconcêntrica determinada aolongo de sua formação histórica. Com referência à participação da região metro-politana na geração da renda nacional, passou a representar em 1970, 43,5% doValor de Transformação Industrial (VTI) do país.

O modelo radial concêntrico da Região Metropolitana de São Paulo, refor-çado pelas políticas urbanas, orientando também as rotas de transportes coletivos,formou basicamente três anéis: o central, o intermediário e o periférico, que de-linearam o desenho metropolitano, muito distante contudo do processo de expan-são urbana descrito pelos ecólogos. Acontece que a produção e a apropriação doespaço deram-se extensiva e descontinuamente, com a abertura de novos lotea-mentos cada vez mais distantes do centro urbano. Essa dinâmica de ocupação doespaço gerou extensas glebas de terras vazias entre o novo espaço incorporado ea mancha urbana já consolidada, à espera da valorização imobiliária a ser obti-da com a instalação posterior de infra-estrutura pelo poder público.

Na análise desses processos destacam-se os trabalhos desenvolvidos peloNúcleo de Economia da Unicamp, sobretudo os de Cano (1990, 1992),5 cujoobjeto de estudo eram as transformações do espaço metropolitano ao emergir osanos sessenta. Cano analisa de que maneira a estrutura industrial, as transforma-ções na agropecuária e a ampliação da infra-estrutura passaram a impor novosignificado à urbanização paulista, privilegiando-se os segmentos da indústria,enquanto os setores de bens de consumo tiveram de redimensionar suas capaci-dades para a produção em massa, em um mercado nacional unificado. As trans-formações nas bases produtivas primária e secundária manifestaram-se nas cida-des sob a forma de uma estrutura social cada vez mais complexa, em que a gran-de empresa, o desenvolvimento das funções do Estado, o incremento do terciáriomoderno e novos segmentos sociais ganharam expressão. Ainda, as atividadestipicamente urbanas recebem enorme impulso.

A valorização dos terrenos, internalizando as rendas fundiárias urbanas, temsido concebida como elemento determinante do padrão, do ritmo, da intensida-de e da direção da expansão urbana, ou seja, constitui-se o indicador da possibi-lidade de formação de capital, em contraposição às hipóteses centradas na teorianeoclássica da localização a partir da acessibilidade.

As questões atinentes ao processo de parcelamento do solo urbano no mu-nicípio de São Paulo,6 já amplamente divulgadas na literatura urbanística, são aquiressaltadas porque, mediante sua análise, é possível entender os processos de pro-dução e apropriação do espaço em áreas de mananciais, com todas as especi-ficidades que envolvem a questão.

A produção do espaço, nas formas supramencionadas, consolidou no pe-ríodo em análise a chamada periferia nova, composta pela parcela da faixa de

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urbanização mais recente, que se formou a partir de 1954, conforme analisado porCosta (1984), para o caso do município de São Paulo. O anel periférico estendeu-se para os municípios limítrofes em todas as direções.

A estruturação do espaço metropolitano refletia em 1965 as práticas recor-rentes da ocupação irregular ou clandestina do solo. Os processos de autocons-trução em loteamentos periféricos assumiram um papel preponderante na produ-ção do espaço (Grostein, 1987; Rolnik, 1997).

Cabe destacar, entretanto, que a configuração dessa cidade ilegal só foipossível com a interveniência dos vários agentes do mercado imobiliário e como consentimento do Estado. Esse dado é importante para que entendamos melhora questão na área de proteção dos mananciais nos anos posteriores.

A ilegalidade da ocupação do solo tem sido quantificada periodicamente,no caso específico do município de São Paulo, pela legislação promulgada em1913, sobretudo a Lei 2.611 de 1923, que estabelece exigências mínimas de im-plantação, doação e dimensões dos loteamentos, bem como a posterior regulari-zação junto ao governo municipal. Ressalte-se que é possível cotejar esses pro-cessos com aqueles oriundos da legislação de proteção dos mananciais.

Para os demais municípios constituintes da Região Metropolitana de SãoPaulo não dispomos de elementos que ilustrem a trajetória da normatização eregularização desses processos. Podemos apenas supor que o problema e as prá-ticas da ilegalidade se estenderam para os municípios vizinhos em função dosdispositivos municipais de controle do uso do solo existente e o decreto-lei federal58 de 1937, que trata de loteamentos e venda de terrenos.

As favelas, por sua vez, constituíram-se em alternativas de moradias ape-nas mais recentemente. Até 1965, o município de São Paulo possuía duzentas evinte e duas favelas, com 48.481 domicílios. A maior parte dessas construçõeslocalizava-se nas regiões mais consolidadas do município, em áreas públicas mu-nicipais, destinadas a áreas verdes nos novos projetos de parcelamento do solo,segundo exigências da legislação urbanística. Esse processo será examinado quan-do nos detivermos na análise da legislação de proteção dos mananciais, cotejan-do a ocupação das áreas definidas como non aedificandi pela referida legislaçãocom a implantação de favelas.

No tocante ao processo de expansão urbana, até os anos sessenta encontra-va-se contido nos limites físicos e geomorfológicos da bacia sedimentar de SãoPaulo. A partir dessa data, a ocupação passou a ocorrer com mais freqüência so-bre solos de maior declividade e altamente vulneráveis à erosão, localizados nasencostas limítrofes.

De maneira geral, na década de 1960 o crescimento demográfico das áreasperiféricas da metrópole paulista foi de 346% e na área central, de 171%, con-

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forme Langenbuch (1971, p. 251). Nessa época foi elaborada a legislação quedisciplinaria o parcelamento do solo na zona de expansão rural, tendo sido pro-mulgada em 1967, tal a magnitude do processo de expansão da área urbanizada.

O binômio pobreza urbana e risco ambiental acentuou-se a partir de então,a exemplo do binômio pobreza urbana e exclusão dos serviços e equipamentoscoletivos, compondo um quadro que poderíamos chamar de espoliação ambiental,correspondente aos processos de espoliação urbana conceituados por Kowarick(1979). Trata-se da exploração ambiental e da inexistência das condições míni-mas ambientais, socialmente necessárias à subsistência dos trabalhadores, emboratenhamos presente que a idéia de espoliação urbana também deriva desses as-pectos.

O período seguinte – 1965-74 –, analisado por nós quanto aos aspectos daevolução da área urbanizada nos anos que precederam a edição da legislação demananciais, foi marcado pelo “milagre econômico”, entre 1968 e 1973, anoscaracterizados pela ocorrência de elevadas taxas de crescimento do produto e darenda nacional.

De acordo com o exposto por Cano (1992), esse desempenho da economiabrasileira foi em parte resultado das reformas tributária, financeira e administra-tiva, realizadas sob a vigência do modelo político implantado em 1964, que es-tabeleceu a base da modernização capitalista no Brasil. A conjuntura internacio-nal dos primeiros anos da década de 1970, extremamente favorável, apesar dossinais de esgotamento do ciclo de expansão do pós-guerra ao fim do decênioanterior, também se constituiu numa condicionante desse crescimento econômi-co, num boom sincronizado das principais economias mundiais.

Assim, o Brasil atrelou sua estratégia de desenvolvimento ao financiamentoexterno. Porém, nela não estava incluída a dimensão ambiental; segundo MoraesVictor (1973, p. 38), “neste clima, naturalmente próprio da fase industrial, nãohaveria terreno para prosperar teses ambientalistas”.

Além das reformas efetivadas, a política econômica alterou as relaçõesentre capital e trabalho, o que acarretou acentuada queda do salário real. O ce-nário econômico que se apresentava teve como reflexo uma urbanização explo-siva e caótica da metrópole.

A crescente modernização da economia impulsionou o processo de indus-trialização e a mecanização do trabalho no campo, liberando enormes contingen-tes populacionais para as cidades – sobretudo para as áreas metropolitanas –, emum modelo de crescimento econômico perverso do ponto de vista social, ampla-mente estudado na literatura sobre os fenômenos migratórios e as condições devida e de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo na década de 1970.

Do ponto de vista ambiental, o estilo de desenvolvimento econômico ado-tado também foi nocivo, conforme exposto anteriormente.7 Em relação às indús-

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trias, foram privilegiadas aquelas cujos processos produtivos se caracterizavampelo uso intensivo de energia e grande consumidor de água (como as indústriasde alumínio), bem como as altamente poluentes (química, petroquímica etc.), quesofreram retrições nos países do Primeiro Mundo.8

No espaço metropolitano de São Paulo, na capital, os intensos investi-mentos no urbano pelo Estado foram possibilitados pelo financiamento externoe voltaram-se para o suporte material das condições gerais de produção: a cons-trução das rodovias Castelo Branco, Raposo Tavares e a dos Bandeirantes; aconstrução de avenidas marginais e das vias fundos de vales como a Bandeiran-tes, o sistema metropolitano (linha norte-sul) e as inúmeras pontes sobre o rioPinheiros, assim como as intervenções normativas sobre os padrões de uso eocupação do solo (data dessa época a lei de zoneamento para o município de SãoPaulo). Todas essas conseqüências das inversões de capital remodelaram o espaçourbano radicalmente. As transformações produzidas geraram uma valorizaçãointensa e desigual dos terrenos urbanos, uma vez que as intervenções se concen-traram em determinadas áreas do espaço.

Os reflexos negativos do modelo econômico adotado – a queda brutal dosalário-mínimo para a classe trabalhadora e a intensa valorização da terra – re-sultaram nos extensos e caóticos processos de produção do espaço de forma clan-destina, por meio da ocupação predatória do solo e dos recursos ambientais, con-forme as Tabelas I, II e III apresentam. A partir de então, acentuaram-se os pro-cessos de segregação social e espacial.

Tabela I – Cidade de São Paulo – favelas por tempo de ocupação (1965-91)

SITUAÇÃO DEPROPRIEDADE Até 1965 1965-74 1974-77 1977-80 1980-85 1985-90 1991 Total

Total de favelas 222 567 309 186 275 184 27 1770

Total de domicílios 48.481 112.015 31.729 11.208 19.429 16.480 1.164 240.506

Municipal 100 359 226 136 213 115 23 1.172

Estadual 6 10 6 4 12 3 0 41

Federal 3 2 4 4 5 3 0 21

Particular 66 106 42 29 28 36 1 308

Público/Privado 35 65 25 7 10 12 2 156

Municipal/Estadual 3 10 4 1 2 0 0 20

Municipal/Federal 2 2 1 2 1 0 0 8

Sem informação 7 13 1 3 4 15 1 44

Fonte: MARCONDES, M. J. A., 1995.Fonte básica: Listagem de favelas, in Favelas na cidade de São Paulo. PMSP – Sehab – Habi/Fipe, 1994.

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As clássicas definições de rural e urbano alteram-se de modo significativonesse período; porém, a legislação urbanística continuou a tratar igualmente adelimitação das fronteiras entre o mundo urbano e rural, produzindo uma legis-lação urbanística inócua, em face da cidade que ia se construindo.

A estrutura metropolitana sofreu os impactos do grande volume de inver-sões no urbano, alterando ligeiramente a distribuição de atividades. A ação cen-tralizadora da capital continuou, no período de 1960 a 1970, com uma distribui-ção das atividades econômicas no espaço, ainda que restrita, conforme demons-tram os indicadores.

De fato, os indicadores de volume de transformação industrial, de pessoalocupado e de número de estabelecimentos industriais da capital paulista em com-paração aos demais municípios da metrópole decrescera nesse período. Com isso,ampliou-se a base econômica industrial no vetor sudeste e, de forma incipiente,no nordeste, acentuando o processo de crescimento econômico em direção àsáreas delimitadas posteriormente como de proteção dos mananciais. Com relaçãoà atividade terciária, também houve uma queda na participação do município deSão Paulo se comparado com os demais municípios do vetor sudeste. Constituiu-se, no entanto, num movimento muito pequeno, mantendo-se a capital como pólodas atividades de serviços e comércio.

No plano econômico, alteraram-se as condições da economia brasileira,após a fase do chamado milagre econômico, resultante da interrupção do cresci-mento da economia internacional e da crise do petróleo que ocorreu na década de1960. Segundo Cano (1992), o governo brasileiro, com o segundo Plano Nacio-nal de Desenvolvimento (II PND), pretendia manter o crescimento econômico,completando o processo de industrialização e estabelecendo um novo padrão deexpansão econômica. Esse plano propunha avanços significativos na expansão deindústrias de bens de capital, na petroquímica, nos insumos básicos, bem comona infra-estrutura e na substituição energética por meio do Proalcool.9

O II PND também estabeleceu um conjunto de políticas de promoção àdesconcentração da Grande São Paulo, assim como medidas de controle da po-luição. Fez-se um reordenamento institucional para sua implementação, e a pau-ta ambiental, amplamente divulgada após a Conferência de Estocolmo, em 1972,foi incluída.

Paradoxalmente às medidas de controle da poluição em áreas metropolita-nas, as estratégias do II PND estavam baseadas no incentivo às chamadas indús-trias sujas e intensivas quanto ao uso dos recursos naturais, como a petroquímica.Indústrias com essas características passariam a localizar-se em pólos industriaisfora da Região Metropolitana de São Paulo.

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Nesse sentido, as premissas de orientação das tendências de crescimento edesenvolvimento da metrópole conferiram à legislação de proteção dos manan-ciais um caráter estruturador do espaço metropolitano, assim como as hipótesesdesenvolvidas posteriormente por Cano (1992) e Torres (1993). Segundo essesautores, a legislação ambiental promulgada na região metropolitana foi um dosfatores responsáveis pelo processo de desconcentração industrial verificado após1975, conforme demonstram os indicadores econômicos. Essas premissas e hipó-teses sobre o impacto da legislação de mananciais constituem-se em tópicos cen-trais da nossa problemática de análise.

A estrutura econômica da metrópole paulista, já analisada em diversos tra-balhos,10 sofreu uma perda de participação na geração da renda nacional, parti-cularmente no setor industrial, de acordo com os censos industriais de 1975 e1980, em contraposição ao índice de 70,61% em relação ao Valor da Transfor-mação Industrial do estado em 1970.

Na região metropolitana, sobretudo na capital paulista, acentuou-se o pro-cesso de terciarização da metrópole.11 No setor terciário, os segmentos de comér-cio, transportes e comunicações e outros ramos de atuação como instituições decrédito, seguros e capitalização, bancos, caixas econômicas e cooperativas torna-ram-se cada vez mais representativas no processo de arregimentação da Popula-ção Economicamente Ativa (PEA).12 Esse processo, que constitui referência paranosso trabalho, tornou-se pronunciado já em meados da década de 1970 e inten-sificou-se nos anos oitenta.

A estrutura urbana da metrópole na década de 1970 foi pautada basicamen-te por duas vertentes: de um lado, um acelerado processo de periferização e deinvasões de terras com a incorporação de uma vasta área à malha urbana e, poroutro lado, o adensamento da população com a ocupação vertical nas, áreas cen-trais dos municípios mais consolidados, como São Paulo, e em menor grau emMogi das Cruzes e Santo André, criando zonas altamente diferenciadas.

Em decorrência dos processos supramencionados, constatou-se intensa va-lorização da terra urbana na década de 1970, fato que internalizou o excedenteeconômico gerado, por meio do modelo econômico altamente concentrador derenda e da canalização desse excedente para o mercado fundiário e financeiro,acarretando a desaceleração dos investimentos privados. O parcelamento do usodo solo nas áreas rurais foi intenso nesse período, viabilizando, parcialmente, omodelo de proteção ambiental nos mananciais, ao tornar disponíveis grandes lo-tes para chácaras de recreio.

A valorização dos terrenos urbanos, dos agentes e interesses envolvidos naprodução e apropriação do espaço, bem como o intenso processo de parcelamento

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do solo para fins especulativos foram expressivos no período, constituindo-se nocentro dos debates e trabalhos no meio acadêmico e no das políticas públicas.

Documentos técnicos elaborados no período13 indicavam a existência de8.379 ha de glebas vazias com dimensões superiores a 1 ha. Campanário (in Kris-chke, 1984), com base em estudos realizados anteriormente pela própria Prefei-tura do Município de São Paulo, em 1976, apresenta o montante de 24.620 haconstituídos por vazios urbanos na cidade de São Paulo, dos quais 10.766 ha selocalizavam na periferia.

Além da intervenção pública direta, com a realização de vultosas obraspúblicas distribuídas desigualmente pelas diferentes áreas da cidade, outro aspectoque produziu impactos significativos no processo de estruturação urbana refere-se à legislação urbanística e ambiental, promulgada no período. Data dessa épo-ca a implantação da lei de zoneamento do município de São Paulo (Lei 7.805/72)e de um conjunto de leis e decretos elaborados ao longo da década, regulamen-tando o uso do solo.

O impacto dessa legislação tem sido analisado pelos efeitos adversos queprovocou na formação e consolidação das rendas fundiárias urbanas diferenciais,com a diferenciação legal dos terrenos. Por outro lado, os requisitos técnicosestabelecidos para a implantação de novos parcelamentos do solo reiteraram aprodução clandestina do espaço. Dados divulgados pela Secretaria de Habitaçãodo Município de São Paulo comprovam os efeitos desse impacto: de 1972 a 1979,apenas sete loteamentos estavam de acordo com as exigências da Lei 7.805/72,situação que refletiu diretamente nos processos de periferização.14

Os informes demográficos do município de São Paulo nos anos setentaindicam uma taxa líquida de 24,10% do movimento migratório, tendo sido da or-dem de 446% o índice de aumento dos números de domicílios em favelas. Essesíndices refletem bem os efeitos polarizadores da metrópole, as formas de ocupa-ção do espaço no período e a alteração das condições de vida da população.

Os reflexos diretos nos padrões de vida desse enorme contingente popu-lacional que afluiu à região, em face do quadro econômico vigente e da ausên-cia de políticas sociais, traduziram-se numa situação de extrema pauperizaçãodessa população.

Ainda nesse mesmo período foi elaborado um diagnóstico das condiçõesde vida e de trabalho na metrópole15, que comprovou o agravamento das condi-ções sociais na década de 1970. A conjuntura urbana dos anos setenta é bastan-te conhecida na literatura sobre o assunto, tendo sido a tônica central das pesqui-sas posteriores com temas correlacionando os processos de urbanização, peri-ferização, segregação social e espacial e exclusão social. Para nós interessa apro-

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fundarmo-nos a fim de compreender o papel desempenhado pelas áreas de pro-teção dos mananciais nesses processos.

Os vários indicadores sociais examinados apontam para o aumento do nú-mero de novas favelas no período de 1974 a 1980 (Tabela I). A produção dacidade ilegal e clandestina é constatada também ao compararmos os registros donúmero de loteamentos aprovados, os de evolução da mancha e os informes re-ferentes à superfície ocupada por loteamentos irregulares ou clandestinos nesseperíodo. Os loteamentos ilegais perfaziam 359,29 ha, em sua maior parte locali-zados na região sul do município de São Paulo, com uma superfície de 118,84 haentre os anos de 1977 e 1980, em contraposição ao período compreendido entre1974 e 1977, em que a concentração se deu na região leste do município, con-forme demonstra a Tabela II. Ao examinarmos a Tabela III, verificamos que aárea de mananciais, em grande parte, foi o local em que ocorreu essa produçãoclandestina do espaço.

Como bem observa Milton Santos (1990), na metrópole paulista afirmou-se, na década de 1970, o fenômeno da metrópole corporativa, que é segundo oautor a cidade “voltada essencialmente à solução dos problemas das grandes fir-mas e considerando as demais como questões residuais” (1990, p. 96).

A estrutura físico-territorial metropolitana da década de 1980 traduziu asalterações ocorridas na sua estrutura econômica, apresentando os efeitos da faserecessiva – de 1980 a 1984, período em que o Brasil urbano enfrentou sua mai-or crise (Cano, 1990) –, quando o Produto Interno Bruto manteve-se constante ea produção industrial sofreu uma queda de 2%.

Em meados dessa década, a economia apresentou uma inflexão, experimen-tando um breve período de recuperação; porém, a situação de estagnação econô-mica restabelece-se já no final dos anos oitenta. O desempenho da economianesses anos é apontado como resultado de uma política de ajustamento estrutu-ral da base econômica ante a crise internacional.

Tendo em vista o perfil industrial da metrópole, “todos os indicadores sãounânimes em apontar que as conseqüências maiores da crise recaíram sobre aregião metropolitana” (Pacheco e Cano, 1992). Essas conseqüências foram ame-nizadas em outras regiões pelas políticas de interiorização do desenvolvimento,de incentivo às exportações ao setor agrícola, etc.

A Região Metropolitana de São Paulo sofreu uma alteração em sua estru-tura produtiva, direcionando-se para o setor terciário. O município de São Pau-lo, a exemplo de outros “grandes centros industriais do passado como Nova York,Tóquio, Londres, Boston, Paris, Milão, Chicago etc., após um período de estag-nação, ajustou sua base econômica e passou a exercer um papel cada vez maisimportante, à medida que os novos padrões tecnológicos e de cooperação faziam

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ruir as relações de produção baseadas no fordismo e no taylorismo” (Sempla,s.d., p. 22).

Na passagem dos anos setenta para a crise dos anos oitenta, a oferta de ser-viços da metrópole paulista sofisticou-se e diversificou-se, passando a ser umasede de serviços ultra-especializados, com a reestruturação dos chamados servi-ços pessoais. Segundo Negri e Pacheco (1994), foi justamente a partir desseperíodo que a Grande São Paulo se transformou na metrópole nacional porexcelência.

Várias análises têm sido desenvolvidas sobre a cidade global, um novo tipohistórico de cidade, consolidado a partir da década de 1980, no qual tem se en-quadrado a metrópole paulista, apesar das diferenças existentes com relação àsoutras metrópoles, tanto no que diz respeito à estrutura econômica específica,como à estrutura social e espacial resultante, conforme resenha elaborada porPreteceille (1994). Destacam-se nas cidades globais o desenvolvimento e a pre-ponderância de atividades ligadas aos serviços do chamado terciário superior, coma concentração de atividades ligadas à informática e às funções direcionais queas empresas passaram a priorizar em detrimento dos demais setores da economia.

A espacialização funcional das metrópoles nos serviços do que vem sen-do chamado terciário superior gerou empregos para um número reduzido de pes-soas, culminando no desemprego e na exclusão social e econômica da maior parteda população. O processo de redistribuição das atividades no espaço foi mais pro-fundo na capital paulista em comparação com os demais municípios da regiãometropolitana.

Entende-se a dualização econômica e urbana resultante dos processos deglobalização da economia como conseqüência da estruturação do mercado detrabalho, com o novo tipo de concentração de funções globais que se apresentou.Cabe sempre observar, entretanto, que o número de indústrias na área metropo-litana é ainda hoje muito grande.

Assim, ao lado da estrutura sofisticada e moderna que foi se consolidan-do, a década de 1980 pautou-se por um profundo processo de exclusão social. Osindicadores econômicos no contexto da crise econômica são eloqüentes, sobretudoquanto ao nível de emprego. Conforme assinalam Campanário e Kowarick, emestudo sobre a Grande São Paulo, havia no final de 1983 “cerca de 1,5 milhãode desempregados, o que corresponde a 20% da população economicamente ativa.Mais de 40% da força de trabalho quando a estes se somam os subempregados.De fato, se adotarmos um índice 100 para a oferta de emprego em 1980, este caipara 72, em 1981 e 1982, e para 51, no trágico 1983” (1988, pp. 41-2).

Os indicadores demográficos nos permitem verificar que na área metropo-litana, que havia várias décadas vinha se apresentando como o único pólo de

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atração populacional do estado, essa tendência histórica se reverteu. Entre os anos1970 e 1980, o saldo migratório da Grande São Paulo foi superior a 2 milhõesde pessoas; no período de 1980 a 1990, ele tornou-se negativo em menos 275 milpessoas, um fato inédito em cinqüenta anos. A taxa de crescimento anual da po-pulação na década foi de 1,86% em contraposição à taxa de 4,46% na décadaanterior.

No urbano, a crise econômica e mudanças no quadro social, com o sur-gimento de uma pobreza essencialmente urbana, resultaram na ampliação da pro-dução periférica do espaço na metrópole e da clandestinidade, tornando visíveisos processos de exclusão social.

Ao contrário de alguns trabalhos apresentados pelos órgãos oficiais no iní-cio dos anos noventa, que apontavam uma inflexão no padrão de crescimentoperiférico, com taxas de crescimento populacional menores nas áreas da perife-ria do município e maiores nas áreas mais centrais,16 os dados do censo demo-gráfico de 1991 identificaram uma situação totalmente inversa, com taxas anuaisde crescimento negativas nas áreas centrais e elevadas na periferia. Essa tendênciase confirmou na década de 1990 como indicam as taxas de crescimento demo-gráfico do período compreendido entre 1991 e 1996, embora o levantamento daárea urbanizada não tenha contemplado esses anos.

No município de São Paulo, observou-se que tanto o anel central como ointermediário vêm perdendo importância. “A participação da área central no cres-cimento da população da capital passou de 16,40% em 1980 para 12,73% em1991, enquanto na área intermediária esse percentual caiu de 51,64% para48,06%. Já a situação da periferia foi bem diferente: o peso na população domunicípio aumentou de 31,96% para 39,21% nesse período. É fácil concluir,portanto, que a população do município de São Paulo está se afastando do cen-tro para a periferia, extrapolando inclusive os seus limites geográficos” (Seade,1993, p. 30).

Cabe também assinalar dois outros aspectos marcantes do período, de acor-do com Kowarick (1988): de um lado, o processo de abertura democrática, quese traduziu nas políticas urbanas sob a forma do planejamento participativo, bus-cando incorporar reivindicações da população, agora mobilizada e organizada emmovimentos populares, tendência esboçada desde 1974; por outro lado, o agra-vamento das condições de vida da população metropolitana, iniciando-se nesseperíodo, com intensidade, as invasões organizadas de terras.17 As áreas de manan-ciais ao sul do município de São Paulo e no vetor sudeste foram os principaisfocos dessas invasões.

O contexto dos anos oitenta, portanto, se mostrou bastante distinto do exis-tente na área da promulgação da legislação de proteção dos mananciais esboçada

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no Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado, o qual pressupunha umcrescimento contínuo, concentrado e acelerado da região metropolitana, amparadona expectativa da manutenção da situação favorável da economia.

Outro aspecto marcante do período constitui o caráter centralizador e au-toritário do processo decisório nas políticas públicas, expresso na legislação deproteção dos mananciais por medidas de controle do uso do solo, as quais tinhampor objetivo redirecionar o crescimento das cidades.

A fragmentação do espaço, a crise econômica, os conflitos gerados pelouso do solo e a proteção de mananciais colocaram em questão os pressupostosbásicos da legislação de mananciais referentes aos objetivos de controle das ten-dências de crescimento e desenvolvimento da metrópole.

No final da década de 1980 sobretudo, a emergência do conceito de cida-de real, em oposição às idéias de clandestinidade, ilegalidade e invisibilidade departes da cidade perante os órgãos públicos, configurou um quadro bastante dis-tinto.

A questão ambiental ganhou destaque no início da década, com a promul-gação da legislação que estabeleceu a Política Nacional de Meio Ambiente e ascondições para sua implementação. Foram instituídas diversas unidades de con-servação, distintas quanto aos seus objetivos e às formas jurídicas de equacio-namento da situação de propriedade.

A lei forneceu a base legal para a criação de várias unidades de conserva-ção. Assim, com a promulgação da extensa legislação ambiental de âmbito mu-nicipal, estadual e federal, a metrópole paulista foi redesenhada: áreas tombadaspela Administração Estadual da Serra do Japi, Guaxinduva e Jaguacora (1983);a Reserva Florestal da Cantareira e o Parque Estadual da Capital (1983), a serrado Boturuna (1983); o Parque da Serra do Mar (1985); as nascentes do rio Tietê(1990); as áreas declaradas de Proteção Ambiental pela Administração Estadualde Cajamar (1984) e Tietê (1986) e pela Administração Federal da bacia doParaíba do Sul (1982); as estâncias criadas em Poá (1970) e Embu (1989), osparques estaduais da serra do Mar (1977) e a Reserva Biológica do Alto da Ser-ra de Paranapiacaba (1938), a Reserva Florestal de Morro Grande (1979) e as re-servas indígenas da Administração Federal de M’Boi Mirim (1987), Jaraguá(1987), Krukutu (1987), Barragem e Rio Branco (1987), e mais recentemente asalterações do Código Florestal no tocante à vegetação ao longo dos cursos deágua e medidas como o Decreto-lei 750 de 1993 e suas atualizações, que buscamimplantar um sistema de proteção dos remanescentes da província florestal atlân-tica, incidindo também em áreas urbanas metropolitanas, e a Resolução Conama04 de 1990, que normatiza as reservas ecológicas.

A maior parte das unidades de conservação criadas nesse período incidiramespecialmente em regiões com baixo dinamismo econômico,18 o que reduziu o

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conflito entre conservação dos recursos ambientais e desenvolvimento, apesar daextensão da superfície territorial legislada.

Quanto à conservação desses ecossistemas, a questão dos manancais hí-dricos pautou em grande parte o debate entre meio ambiente e urbanização nametrópole em face dos conflitos entre os diversos usos do solo na região e aspolíticas públicas de transportes, habitação e energia.

Até a década de 1990 a questão dos mananciais ficou à mercê dos diferen-tes agentes que produzem e se apropriam do espaço e dos trâmites das políticaspúblicas. Vimos que a proteção dos recursos hídricos entrou posteriormente naagenda ambientalista, salvo manifestações isoladas.

O índice de desmatamento no período de 1971 a 1992 comprova as afir-mações acima. Suprimiu-se 31% da superfície recoberta por matas, vegetaçãocontida em sua maior parte nas áreas de proteção dos mananciais.

Em 1992, restava aproximadamente 10% da superfície territorial metropo-litana recoberta por matas, um dos indicadores mais alarmantes de que dispomospara caracterizar as condições ambientais. Se esses dados fossem desagregadospelos subperíodos de 1973 a 1980 e de 1980 a 1992, poderíamos afirmar que adécada mais que perdida para a economia também o foi para a proteção de boaparte dos remanescentes florestais da metrópole, com a extensiva ocupação pe-riférica de áreas recobertas por matas em áreas de proteção dos mananciais, ain-da que pesassem todas as medidas protecionistas.

Houve, no final da década de 1980 e início dos anos noventa, uma preo-cupação com a preservação dos remanescentes florestais em áreas urbanas, sobre-tudo nas regiões metropolitanas. Em razão disso, incluíram-se dispositivos noCódigo Florestal (leis 7.803 e 7.875 de 1989), em resoluções do Conselho Na-cional do Meio Ambiente (Resolução nº 04/90) e, posteriormente, o Decreto 750/93,que regulamentou o uso de áreas da Mata Atlântica, numa visão integrada dosecossistemas naturais.

Esses remanescentes, vistos como mantenedores das dinâmicas ambientais(em alguns casos são corredores ou rotas de espécies migratórias), desempenhamimportante papel no equilíbrio das condições climáticas e na conservação dosrecursos hídricos.

No entanto, no período de 1990 a 1995, a região metropolitana foi a maisatingida pelo desmatamento no estado de São Paulo, de acordo com o últimolevantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Na área quecompreende os municípios da região, foram devastados 12,9 mil hectares de mataatlântica, quase o triplo da devastação ocorrida no período entre 1985 e 1990.

Assim, a imagem evocada por Argan (1992), a da natureza que cercava azona da fronteira da cidade e do campo, é representada na metrópole atual porcerca de 8,5% da superfície total, localizada predominantemente nas zonas de

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escarpa atlântica e em algumas áreas serranas, respondendo os mananciais poruma parcela desses espaços.

Ao analisarmos os dados dos loteamentos clandestinos ou irregulares noperíodo, verificamos que só no ano de 1991 foram ocupados ilegalmente 11 mi-lhões de metros quadrados, dos quais 10 milhões o foram na região sul do mu-nicípio de São Paulo em área de mananciais, de acordo com dados da Secreta-ria da Habitação Municipal. As favelas nesse município abrigavam, em 1993, umapopulação estimada em 1.900 mil pessoas, ou seja, 20% da população paulistana(Fipe, 1994).

Esses indicadores retratam uma cidade real e (in)sustentável, se pensarmosnos aspectos da sustentabilidade social e ecológica. A problemática ambientalaparece expressa em ações como a criação de estruturas governamentais para tra-tar da questão e da promulgação de uma extensa legislação ambiental nos vári-os níveis de governo. Contudo, em decorrência de tudo o que expusemos, per-manece a indagação: qual o significado do paradigma ambiental na ação públi-ca? Essa questão será tratada a seguir, na análise do impacto da legislação de con-trole ambiental no processo de estruturação físico-territorial da metrópole, sobre-tudo nos processos de irregularidade da ocupação do solo e no de localização in-dustrial.

Controle ambiental e os vetores de expansão urbana

A necessidade de intervir no processo de crescimento e desenvolvimentourbano-regional em busca de um espaço mais equilibrado e o esgotamento dosrecursos ambientais, temas que permeavam o debate ambiental no início dos anossetenta, formam o contexto de um conjunto de instrumentos esboçados no Pla-no Metropolitano de Desenvolvimento Integrado – PMDI.

A implementação de instrumentos, tais como o zoneamento industrial e alegislação de mananciais, tinha por finalidade reorientar as tendências de cresci-mento e desenvolvimento urbano-regional e estabelecer medidas de proteção aosrecursos naturais, como parte de um projeto de modernização e integração. Comesses instrumentos, buscou-se amenizar as contradições de um processo de urba-nização acelerado que provocou impactos negativos no meio natural.

Eis as principais diretrizes esboçadas no PMDI: a) a reordenação dos ve-tores de expansão de crescimento e desenvolvimento da metrópole; b) a criação

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de amplos espaços abertos; e c) priorização do uso das águas para o abastecimen-to humano.

Por meio da leitura dos indicadores apresentados buscamos avaliar o cum-primento das diretrizes acima. Por outro lado, procuramos subsidiar a construçãode novos parâmetros para a ocupação e proteção da área de mananciais no âm-bito das novas diretrizes de proteção e recuperação dos mananciais.

Hoje, após mais de vinte anos de aplicação do zoneamento industrial e dalei de mananciais, é possível, a partir de elementos empíricos, indagar a respei-to da ordem racional imposta nas estruturas espaciais: quais são os fatores impor-tantes na produção do espaço? Que fatores contrubuem para a expansão metro-politana? Qual é a relação entre eles na produção do espaço? Qual a especifi-cidade da produção do espaço na área de proteção dos mananciais e qual o im-pacto da legislação ambiental específica de mananciais nesses processos? É possi-vel delinear uma relação mais equilibrada entre cidade e meio ambiente?

Essas questões nortearam a abordagem ao recente processo de estruturaçãofísico-territorial da Região Metropolitana de São Paulo, mediante análise dosvetores de expansão da área urbanizada, e a relação desse processo com a legis-lação ambiental. Procuramos resumir neste capítulo os resultados das pesquisasempíricas realizadas sobre as alterações no espaço físico-territorial metropolita-no nas três últimas décadas, a partir de indicadores urbanísticos,19 ambientais,demográficos e econômicos.20

Os indicadores ambientais utilizados foram os índices da cobertura vege-tal existente e os de desmatamento, os índices de assoreamento dos recursos hí-dricos e informes da aplicação da referida legislação (autuações e aprovações deempreendimentos).

O principal indicador urbanístico utilizado foi a análise da evolução da áreaurbanizada associada aos demais informes. Apresentamos essa análise a seguir,por subperíodos: 1965-74, 1974-80 e 1980-90.

No período imediatamente anterior à promulgação da legislação de prote-ção dos mananciais, verificou-se um incremento acentuado da área urbanizada,acarretando uma aceleração no ritmo de crescimento econômico e de investimen-tos urbanos. A expansão urbana nesse período atingiu 320 km2, praticamente ametade da superfície urbanizada metropolitana em 1965, representando 43,05%da área urbanizada ao longo do processo histórico de urbanização, que era de744 km2, como mostram as Tabelas IV e V.

A partir dos levantamentos efetuados pelo PMDI pudemos analisar a evolu-ção da mancha urbana entre os anos de 1965 e 1974, segundo levantamento aero-fotogramétrico e planimetria realizados pela Emplasa em 1972 e atualizados em1974.21

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Tabela IV – Região Metropolitana de São Paulo – evolução da área urbanizada,segundo municípios e regiões (1965-90).

Municípios e regiões 1965-74 % 1974-77 % 1977-80 % 1980-85 % 1985-90 %

Centro 119,53 37.29 52.72 32.10 43.40 22.31 26.58 21.70 48.72 22.24São Paulo 115,03 35.89 49.12 29.91 39.36 20.23 24.26 19.81 45.9 20.95Osasco 4,50 1.40 3.6 2.19 4.04 2.08 2.32 1.89 2.82 1.29Noroeste 19,63 6.12 18.08 11.01 20.68 10.63 8.92 7.28 20.46 9.34Carapicuíba 7,38 2.30 4,48 2,73 2,6 1,34 1,12 0,91 1,52 0,69Barueri 8,68 2,71 11,48 6,99 7,56 3,89 1,72 1,40 5,32 2,43Cajamar 2,02 0,63 2,12 1,29 2,24 1,15 0 0,00 1,9 0,87Santana de Par2aíba 1,55 0,48 0 0,00 8,28 4,26 6,08 4,96 11,08 5,06Pirapora de Bom Jesus 0,00 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0,64 0,29Oeste 19,96 6,23 10,4 6,33 18,24 9,37 8,32 6,79 21,22 9,69Cotia (1) 9,35 2,92 7,92 4,82 11,6 5,96 3,20 2,61 7,04 3,21Vargem Grande Paulista (1) 1,44 3,16 2,58 4,36 1,99Itapevi (1) 6,73 2,10 1,04 0,63 5,2 2,67 1,96 1,60 7,12 3,25Jandira 3,88 1,21 1,44 0,88 0 0,00 0 0,00 2,7 1,23Sudoeste 13,58 4,24 10,72 6,53 15,64 8,04 6,6 5,39 10,24 4,67Taboão da Serra 5,17 1,61 3,4 2,07 0 0,00 0 0,00 0 0,00Itapecerica da Serra 5,50 1,72 2,88 1,75 4,6 2,36 2,96 2,42 3,38 1,54Embu 0,00 0,00 3,68 2,24 1,88 0,97 1,32 1,08 3,84 1,75Embu-Guaçu 2,25 0,70 0,6 0,37 5,24 2,69 2,32 1,89 2,32 1,06Juquitiba 0,66 0,21 0,16 0,10 3,92 2,01 0 0,00 0,7 0,32São Lourenço da SerraSudeste 52,09 16,25 17,56 10,69 14,96 7,69 10,7 8,74 28,26 12,90Santo André 6,78 2,12 1,84 1,12 4,8 2,47 1 0,82 8,12 3,71São Bernardo do Campo 17,10 5,34 9,28 5,65 5,96 3,06 5,74 4,69 10,7 4,88São Caetano do Sul 0,41 0,13 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00Mauá 9,16 2,86 1,68 1,02 3,56 1,83 0,8 0,65 1,94 0,89Diadema 6,23 1,94 3,48 2,12 0 0,00 0 0,00 2,38 1,09Ribeirão Pires 10,32 3,22 1,12 0,68 0,4 0,21 2,64 2,16 4,08 1,86Rio Grande da Serra 2,09 0,65 0,16 0,10 0,24 0,12 0,52 0,42 1,04 0,47Leste 46,63 14,55 23,41 14,25 36,84 18,93 16,56 13,52 27,8 12,69Mogi das Cruzes 23,51 7,34 11,24 6,84 6,92 3,56 5,8 4,74 6,04 2,76Suzano 11,89 3,71 2,25 1,37 11,84 6,09 8,08 6,60 3,68 1,68Poá 2,32 0,72 0,72 0,44 0 0,00 0 0,00 0,4 0,18Itaquaquecetuba 3,97 1,24 5,72 3,48 8 4,11 1,44 1,18 12,58 5,74Ferraz de Vasconcelos 2,19 0,68 1,44 0,88 6,12 3,15 0 0,00 1,18 0,54Guararema 1,33 0,41 0,68 0,41 2,68 1,38 0,52 0,42 2,52 1,15Biritiba-Mirim 0,53 0,17 1,2 0,73 1,24 0,64 0,72 0,59 0,64 0,29Nordeste 32,66 10,19 26,16 15,93 18,16 9,33 17,56 14,34 36,2 16,53Guarulhos 28,13 8,78 21,84 13,30 13,48 6,93 13,8 11,27 30,12 13,75Arujá 2,33 0,73 2,84 1,73 4,48 2,30 2,88 2,35 6,08 2,78Santa Isabel 2,2 0,69 1,48 0,90 0,2 0,10 0,88 0,72 0 0,00Norte 16,43 5,13 5,19 3,16 26,65 13,70 27,24 22,24 26,16 11,94Franco da Rocha 5,02 1,57 2,56 1,56 3,76 1,93 6 4,90 8,2 3,74Mairiporã 3,56 1,11 1,75 1,07 12,13 6,23 10,28 8,39 10,46 4,77Caieiras 3,64 1,14 0,44 0,27 3,44 1,77 7,88 6,43 3,62 1,65Francisco Morato 4,21 1,31 0,44 0,27 7,32 3,76 3,08 2,51 3,88 1,77RMSP 320,51 100,00 164,24 100,00 194,57 100,00 122,48 100,00 219,06 100,00

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Tabela V – Região Metropolitana de São Paulo – evolução da área urbanizada,segundo vetores de crescimento (1965-90)

Vetores 1965 1965-74 % 1974-77 % 1977-80 % 1980-85 % 1985-90 %superfície

Centro (*) 1.509,00 115,03 7,62 49,12 3,26 39,36 2,61 24,26 1,61 45,90 3,04São Paulo 1.509,00 115,03 7,62 49,12 3,26 39,36 2,61 24,26 1,61 45,90 3,04Oeste (2) 275 31,17 11,33 22,04 8,01 19,40 7,05 7,12 2,59 19,48 7,08Osasco 68 4,50 6,62 3,60 5,29 4,04 5,94 2,32 3,41 2,82 4,15Carapicuíba 36 7,38 20,50 4,48 12,44 2,60 7,22 1,12 3,11 1,52 4,22Barueri 61 8,68 14,23 11,48 18,82 7,56 12,39 1,72 2,82 5,32 8,72Itapevi 88 6,73 7,65 1,04 1,18 5,20 5,91 1,96 2,23 7,12 8,09Jandira 22 3,88 17,64 1,44 6,55 0,00 0,00 0,00 0,00 2,70 12,27Oeste (3) 605 20,02 3,31 17,88 2,96 18,08 2,99 7,48 1,24 14,26 2,36Cotia (1) 325 9,35 2,88 7,92 2,44 11,60 3,57 3,20 0,98 7,04 2,17Taboão da Serra 20 5,17 25,85 3,40 17,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00Embu 68 0,00 0,00 3,68 5,41 1,88 2,76 1,32 1,94 3,84 5,65Itapecerica da Serra 192 5,50 2,86 2,88 1,50 4,60 2,40 2,96 1,54 3,38 1,76Sudeste (2) 841 52,09 6,19 17,56 2,09 14,96 1,78 10,7 1,27 28,26 3,36Santo André 179 6,78 3,79 1,84 1,03 4,80 2,68 1,00 0,56 8,12 4,54São Bernardo do Campo 411 17,10 4,16 9,28 2,26 5,96 1,45 5,74 1,40 10,70 2,60

São Caetano do Sul 12 0,41 3,42 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00Mauá 67 9,16 13,67 1,68 2,51 3,56 5,31 0,80 1,19 1,94 2,90Diadema 32 6,23 19,47 3,48 10,88 0,00 0,00 0,00 0,00 2,38 7,44Ribeirão Pires 107 10,32 9,64 1,12 1,05 0,40 0,37 2,64 2,47 4,08 3,81Rio Grande da Serra 33 2,09 6,33 0,16 0,48 0,24 0,73 0,52 1,58 1,04 3,15Leste (3) 1.041 43,88 4,22 21,37 2,05 32,88 3,16 15,32 1,47 23,88 2,29Mogi das Cruzes 731 23,51 3,22 11,24 1,54 6,92 0,95 5,8 0,79 6,04 0,83Suzano 185 11,89 6,43 2,25 1,22 11,84 6,40 8,08 4,37 3,68 1,99Poá 17 2,32 13,65 0,72 4,24 0,00 0,00 0,00 0,00 0,40 2,35Itaquaquecetuba 83 3,97 4,78 5,72 6,89 8,00 9,64 1,44 1,73 12,58 15,16Ferraz de Vasconcelos 25 2,19 8,76 1,44 5,76 6,12 24,48 0,00 1,18 4,72Nordeste 430 30,46 7,08 24,68 5,74 17,96 4,18 16,68 3,88 36,2 8,42Guarulhos 334 28,13 8,42 21,84 6,54 13,48 4,04 13,8 4,13 30,12 9,02Arujá 96 2,33 2,43 2,84 2,96 4,48 4,67 2,88 3,00 6,08 6,33Não conurbados 3.406 27,86 0,82 11,59 0,34 51,93 1,52 40,92 1,20 51,08 1,50Franco da Rocha 143 5,02 3,51 2,56 1,79 3,76 2,63 6,00 4,20 8,2 5,73Mairiporã 307 3,56 1,16 1,75 0,57 12,13 3,95 10,28 3,35 10,46 3,41Caieiras 104 3,64 3,50 0,44 0,42 3,44 3,31 7,88 7,58 3,62 3,48Embu-Guaçu 171 2,25 1,32 0,6 0,35 5,24 3,06 2,32 1,36 2,32 1,36Juquitiba 550 0,66 0,12 0,16 0,03 3,92 0,71 0,00 0,00 0,70 0,13Cajamar 132 2,02 1,53 2,12 1,61 2,24 1,70 0,00 0,00 1,90 1,44Santana do Parnaíba 179 1,55 0,87 0,00 0,00 8,28 4,63 6,08 3,40 11,08 6,19Pirapora do Bom Jesus 99 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,64 0,65Biritiba-Mirim 414 0,53 0,13 1,20 0,29 1,24 0,30 0,72 0,17 0,64 0,15Salesópolis 418 0,89 0,21 0,16 0,04 0,04 0,01 0,00 0,00 0,76 0,18Guararema 262 1,33 0,51 0,68 0,26 2,68 1,02 0,52 0,20 2,52 0,96Santa Isabel 361 2,20 0,61 1,48 0,41 0,20 0,06 0,88 0,24 0,00 0,00Vargem Grande Paulista 29 0,00 0,00 0,00 0,00 1,44 4,97 3,16 10,90 4,36 15,03São Lourenço da Serra 192 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00Francisco Morato 45 4,21 9,36 0,44 0,98 7,32 16,27 3,08 6,84 3,88 8,62RMSP 8107,00 320,51 3,95 164,24 2,03 194,57 2,40 122,48 1,51 219,06 2,70

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A urbanização na metrópole foi de grande magnitude no período de 1965a 1914: extrapolou os limites da bacia sedimentar de São Paulo, nas áreas cor-respondentes às colinas de São Paulo, e extravasou para compartimentos am-bientais inadequados à expansão urbana, com amplitudes topográficas altas eprocessos de evolução de vertentes mais dinâmicos. Em razão disso, são áreasmais vulneráveis à erosão, recortadas por densas redes de drenagem que corres-pondem à serrania de São Roque (que rodeia os municípios de Francisco Moratoe Franco da Rocha) e à morraria de Embu, que circunda a bacia sedimentar deSão Paulo a oeste, ao sul e a leste, com o mar de morros do reverso da escarpaatlântica.

Tabela V

(*) O município de São Paulo foi subdividido nos setores vetores de crescimento: centro, leste (1),leste (2), oeste, norte e sudeste (1).Fonte: MARCONDES, M. J. A., 1995.Fonte básica: (1) Planimetria, através de grade milimetrada, da mancha urbana de 1965, com base emrecobrimento aerofotogramétrico de 1965 e em informações sobre o uso do solo urbano referentes aoano de 1967. Planimetria realizada pela Emplasa.(2) Planimetria, através de grade milimetrada, da evolução da mancha urbana de 1974 e 1977 e em cartado Sistema Cartográfico Metropolitano, 1ª ed., 1977, realizada sobre levantamento aerofotogramétricodo IBC (1973), do Gegran (1974) e do SCM (1977), com escala 1:10.000.(3) Planimetria da evolução da mancha urbana com base no levantamento aerofotogramétrico de 1980,com escala 1:35.000.(4) Planimetria da mancha urbana do ano de 1985, com base em interpretação visual das imagensobtidas pelo sensor Thematic Mapper (TM), do satélite norte-americano Landsat 5, de 1985.(5) Planimetria da mancha urbana sobre carta do Sistema Cartográfico Metropolitano, com base eminterpretação visual da imagem do satélite Landsat 5, de 1990, feita pela equipe do SCM -- Emplasa.

Fontes

Tabela IV

Fonte: MARCONDES, M. J. A., 1995.Fonte básica: (1) Planimetria, através de grade milimetrada, da marcha urbana de 1965, com base emrecobrimento aerofotogramétrico de 1965 e em informações sobre o uso do solo urbano, referentes aoano de 1967. Planimetria realizada pela Emplasa.(2) Planimetria, através de grade milimetrada, da evolução da mancha urbana de 1974 e 1977 e em cartado Sistema Cartográfico Metropolitano, 1ª ed. 1977, realizado sobre levantamento aerofotogramétricodo IBC (1973), do Gegran (1974) e do SCM (1977), com escala 1:10.000.(3) Planimetria da evolução da mancha urbana com base no levantamento aerofotogramétrico de 1980,com escala 1:35.000.(4) Planimetria da mancha urbana do ano de 1985, com base em interpretação visual das imagensobtidas pelo sensor Thematic Mapper (TM), do satélite norte-americano Landsat 5, de 1985.(5) Planimetria da mancha urbana sobre carta do Sistema Cartográfico Metropolitano, com base em

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A extensão da área urbanizada nos limites da zona rural e nos ecossistemasnaturais pode ser observada nos dados sobre a evolução da cobertura florestalnatural na região metropolitana. A propósito, estima-se que a cobertura vegetaltenha decrescido aproximadamente 1.700 km2 entre os anos de 1962 e 1973, in-cluindo as matas e capoeiras, sendo de 820 km2 a superfície de matas suprimidano período, utilizando-se o índice de desmatamento verificado para o conjunto dosmunicípios do Estado de São Paulo.

Em 1965 foi promulgado o novo Código Florestal, com o qual se preten-dia uma doutrina mais intervencionista por parte do poder público, “que não sesustentou à medida que ignorou a desapropriação das terras protegidas, sem daro devido respaldo jurídico” (Moraes Victor, 1975, p. 39).

Data ainda desse período a regulamentação do parcelamento do solo emáreas rurais do município de São Paulo (Lei 7.035 de 1967), medida que obje-tivava inibir o processo de expansão urbana em face das dimensões assumidas atéentão no processo de urbanização. No entanto, esse dispositivo legal mostrou-sepouco eficaz, conforme indicam as taxas de crescimento demográfico nas zonasrurais do município de São Paulo fornecidas pelo IBGE – Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística.

Segundo o estudo da evolução da mancha urbana contínua da Grande SãoPaulo, realizado pela Emplasa em 1978 e bastante utilizado como medida doprocesso de urbanização na década de 1970, a maior parte da expansão urbanaocorreu dentro dos limites urbanos legais; portanto, o perímetro urbano funcio-nou como freio da expansão urbana.23

O trabalho da Emplasa a que nos referimos, no entanto, delimitou parcial-mente a superfície da região metropolitana para estudo, circunscrita ao norte atéa região da Cantareira, a leste até parte de Suzano, ao sul até a altura das repre-sas Billings e Guarapiranga e a oeste, até o município de Carapicuíba. Ficaram,assim, excluídos os municípios de Francisco Morato, Franco da Rocha e o dis-trito de Perus (no município de São Paulo) na região norte; a e Santa Isabel; anordeste de Mogi das Cruzes, Guararema, Biritiba-Mirim e Salesópolis a leste; deJuquitiba a sudoeste; os municípios de Itapevi e Jandira a oeste; e ao sul a aná-lise foi delimitada até a altura das represas Billings e Guarapiranga.

Nesse sentido, as conclusões da análise da expansão urbana foram impre-cisas. Não se sustentando, por conseguinte, a tese de que o limite legal da zonarural foi utilizado como freio à expansão urbana, em razão dos índices de incre-mento da área urbanizada verificados no período24 e dos indicadores demográficosna região central da metrópole.

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A área cultivada no município de São Paulo decresceu de 12.158 ha em1960 para 9.536 ha em 1970, indicando, também, a pressão das atividades urba-nas sobre a zona rural. A atividade rural, entretanto, ampliou-se na década de1960 no conjunto do espaço metropolitano: de 224.763 ha aumentou para246.494 ha. Isso se deu por causa da estruturação de regiões voltadas às funçõesde apoio e manutenção ao binômio urbano-industrial instalado na capital paulista.Os catorze municípios contidos nos vetores que denominamos não conurbadosapresentaram nesse período um incremento pouco expressivo da área urbanizada,em Franco da Rocha e Francisco Morato: 8,69%.

De fato, os maiores incrementos em números absolutos ocorridos nesseintervalo de tempo de 1965/1974, foram registrados nos vetores centro (35,89%),formado pelo município de São Paulo, e sudeste (16,25%), sobretudo em SantoAndré, São Bernardo do Campo, Diadema, Mauá e Ribeirão Pires, demonstran-do a polaridade exercida pelos núcleos urbano-industriais nos processos de expan-são urbana.

A expansão também ocorreu no vetor leste (3), a que chamamos de “lestelongínquo”, embora com menor grau de participação: 13,69% de incremento daárea urbanizada, principalmente nos municípios de Mogi das Cruzes e Suzano.Destaca-se ainda a expansão no vetor nordeste nos municípios de Guarulhos eArujá, com 9,5% de incremento da área urbanizada (ver Tabela V).

Quanto ao município de São Paulo especificamente, verificou-se que osmaiores acréscimos de áreas ocorreram no vetor sul, cuja participação em núme-ros relativos e absolutos cresceu substantivamente no período, com um incremen-to de 41,5 km2, representando 33% da área urbanizada. Embora o vetor leste te-nha apresentado maior participação na área urbanizada do município, sua parti-cipação relativa no total da área urbanizada da Grande São Paulo caiu entre osanos de 1965 e 1974.

Os dados supramencionados refletem o grande impacto dos investimentospúblicos e privados realizados no vetor sul do município de São paulo e a con-solidação do núcleo industrial de Santo Amaro, que desde a década de 1950 sefirmava como pólo industrial da metrópole, junto com os municípios do ABC dovetor sudeste. Essa situação seria consagrada posteriormente, com a legislação decontrole do uso industrial promulgada em 1976, que acabou por agravar os con-flitos entre o uso do solo e a proteção ambiental na região.

Alguns aspectos se destacam nesse período, cabendo observar que os in-crementos mais significativos na área urbanizada ocorreram principalmente nosvetores de maior dinamismo econômico, em que se implantaram as condiçõesgerais de produção. O crescimento do setor industrial foi acompanhado pelo de-senvolvimento do setor terciário, com a implantação dos serviços produtivos (nos

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quais se inclui a intermediação financeira, os bancos), dos serviços distributivose das atividades sociais e de administração pública, que demandaram espaçosfísico-territoriais.

As áreas que apresentavam maior dinamismo econômico dispunham deparcela pouco significativa de loteamentos não ocupados, ao contrário do queocorreu nas décadas anteriores, conforme constatado por meio do aumento dataxa de densidade25 e dos resultados da fotointerpretação de imagens aéreas doperíodo realizada pela Emplasa.

Verifica-se, entretanto, que as áreas de intenso dinamismo econômico nãoforam as que receberam os maiores contingentes populacionais que migraram paraa metrópole nessa década, com exceção dos municípios de Mauá e Diadema. Aocompararmos a evolução da mancha urbana por vetor de crescimento e as taxasde crescimento anual da população, constatamos que o assentamento populacionalse deu principalmente nos municípios de baixo dinamismo econômico.

Em suma, o eixo leste-oeste, estruturado em torno das ferrovias e das es-tações de subúrbio, respondeu nesse período pelo assentamento habitacional dascamadas de baixa renda da população, uma vez que as indústrias começaram aimplantar-se ao redor das rodovias. Foi o caso, por exemplo, do município deFrancisco Morato, que constituiu, junto com outros municípios de situação simi-lar, os municípios ou bairros-dormitórios.

Mediante exame da distribuição territorial da população por anéis e vetoresde urbanização no município de São Paulo, verificamos que na região leste seconcentrava o maior contingente populacional do município, sobretudo a popu-lação situada na faixa de renda de até cinco salários-mínimos, representando 30%da população residente do município da capital.26

Os indicadores acima demonstram, portanto, que o grande contingente depopulação que afluiu à metrópole produziu seus espaços em superfícies exíguas,em áreas periféricas, distantes dos centros de emprego, acentuando as caracterís-ticas dos municípios e bairros-dormitórios, segregados física e socialmente emespaços carentes de infra-estrutura urbana.

A ocupação irregular ou clandestina do solo, conforme verificamos naTabela II, se deu mais acentuadamente nas regiões leste, com 167 ha, sudeste,com 72 ha, e sul, com 67 ha, constituindo-se, nesse período de 1965/1974, nosmaiores incrementos de superfície ocupada clandestina ou irregularmente.

Com relação ao aumento do número de favelas no período em questão, ainvasão de glebas ocorreu de forma explosiva. Entre os anos de 1965 e 1974,formaram-se quinhentas e sessenta e sete novas favelas – até 1965, havia duzentase vinte. Elas se localizam predominantemente na extrema periferia, ao contráriodas existentes até 1965, que incidiam nos anéis central e intermediário do muni-

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cípio de São Paulo. Nas regiões norte e sul, verificaram-se os maiores incremen-tos, com cento e vinte e duas e duzentas e noventa e seis novas favelas respec-tivamente, sendo que noventa e uma delas foram construídas em áreas posterior-mente delimitadas como de proteção dos mananciais.

O processo de urbanização descrito acima foi fortemente criticado emmeados da década de 1970 no âmbito das políticas públicas. De maneira geral,ocorreu um questionamento dos padrões de crescimento econômico a partir da re-organização do sistema capitalista, após a crise de 1973. Veio à tona o discursoda desaceleração do crescimento econômico e da qualidade de vida, com refle-xos diretos nos padrões de crescimento urbano das metrópoles a partir de então(Topalov, 1979).

A problemática que delimitamos para estudo é aqui também influenciadaapós a Conferência de Estocolmo em 1972, quando se levantou a questão dasustentabilidade das metrópoles, inserindo-se no centro dos debates as questõesambientais e os estilos de desenvolvimento.

No período anterior à promulgação da legislação de proteção dos manan-ciais, a expansão urbana encontrou as barreiras físicas que condicionavam o cres-cimento urbano: ao norte, a serra da Cantareira; a sudeste e sudoeste, o mar demorros da escarpa da serra do Mar; e, ao sul, o conjunto de lagos artificiais(Langenbuch, 1971, p. 335), gerando conflitos entre as formas de urbanizaçãoaqui descritas e a proteção ambiental.

A leitura e a interpretação da planimetria da expansão da mancha urbanano período de 1974 a 1980 foram realizadas em dois períodos, de 1974 a 1977e de 1977 a 1980, a fim de melhor delimitar o impacto da legislação de prote-ção dos mananciais no direcionamento dos vetores de urbanização.

Ao compararmos a planimetria dos levantamentos aerofotogramétricos rea-lizados pela empresa Terrafoto e fotointerpretados pela Emplasa, verificamos, naTabela IV, que em apenas seis anos a mancha urbana metropolitana teve sua áreaampliada em 33,65%, passando de 1.064,93 km2 em 1974 para 1.423,34 km2 em1980.27 De maneira geral, nos primeiros anos da aplicação da legislação de pro-teção dos mananciais, os efeitos e a correlação da urbanização da metrópole coma dinâmica específica da ocupação das áreas de mananciais se apresentavam di-ferenciados dos processos evidenciados atualmente.

A dinâmica da produção do espaço metropolitano nesses anos teve comocaracterística principal os mecanismos de obtenção de rendas fundiárias urbanas,processo que teve desdobramentos nas áreas de mananciais. Em números abso-lutos, os acréscimos ocorridos na expansão da mancha urbana entre 1974 e 1980mantiveram-se acima da proporção do período anterior. Esses acréscimos são

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confirmados pelas tendências históricas do parcelamento de glebas acima dasnecessidades reais, decorrentes do intenso processo de valorização da terra, ain-da que refletindo o impacto das elevadas taxas migratórias populacionais para aárea metropolitana.

Os informes apresentados foram correlacionados com a dinâmica de uso eocupação do solo na área de proteção dos mananciais na escala 1:25.000 e osregistros na carta da área urbanizada, na escala 1:100.000. Mostrou-se expressi-va a participação de loteamentos desocupados sobre a expansão da mancha ur-bana, aproximadamente 10% do total da área urbanizada no período, onde osloteamentos se encontravam abertos, porém não ocupados.

O aspecto apontado acima evidencia que a expansão da mancha urbana nãose deu preferencialmente, para a implementação de atividades econômicas ou parao assentamento habitacional, como no período compreendido entre 1965 e 1974.Na verdade, ratifica o intenso processo de retenção da terra à espera da valori-zação fundiária, expressão das ações dos agentes e interesses econômicos domercado fundiário e imobiliário.

Esse fato é fortemente evidenciado nos municípios de Mairiporã, Arujá,Itapecerica da Serra, Cotia, Embu-Guaçu e na região sul do município de SãoPaulo, os quais encerram parcelas integrais ou substantivas de seus territórios emzonas de proteção dos mananciais. Nessas localidades, sobretudo em Mairiporã,uma parte significativa da área parcelada continuava desocupada em 1980.

De modo geral, os vetores centro e sudeste tiveram um decréscimo relati-vo nos índices de incremento da área urbanizada, com uma expansão de, respec-tivamente, 29,91% e 20,23%, nos períodos de 1974 a 1977 e 1977 a 1980, emcontraposição ao índice de incremento do vetor centro de 35,89% no períodoanterior. No vetor sudeste, os índices foram de 10,69% e 7,69% entre 1974 e1977 e 1977 e 1980, em relação ao índice de 16,25% no período anterior (verTabela IV).

Se excluirmos esse decréscimo do ritmo da superfície urbanizada no mu-nicípio de São Paulo e nos municípios contidos no vetor sudeste, constataremosque a expansão urbana, no período de 1974 a 1980, seguiu múltiplas direções;deu-se o processo de periferização, bem como o intenso parcelamento urbano parafins especulativos, ou para residências de lazer. Buscavam-se as mais diferenteslocalizações, em especial nas zonas de proteção dos mananciais.

Podemos afirmar, pois, que já em meados da década de 1970 se acentuouum processo de fragmentação urbana, com uma expansão periférica avançandoem todas as direções, com especificidades, porém, de reflexos diretos na produ-ção do espaço nas áreas de mananciais.

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É possível constatarmos que houve um incremento da área urbanizada,principalmente nos vetores oeste (2). Esses vetores encerram espaços diferenci-ados no contexto metropolitano. Por um lado, os municípios de Cotia e em me-nor grau o de Itapecerica da Serra, ambos inseridos no vetor oeste (3), configu-ravam-se na estrutura metropolitana em meados da década de 1970 como muni-cípios periféricos, voltados sobretudo às funções de lazer e de turismo, com-patibilizando o parcelamento do solo com as propostas contidas na legislação deproteção dos mananciais, isto é, grandes lotes para chácaras de recreio, e desen-volvendo um setor terciário de apoio, conforme demonstra a carta da evolução deuso do solo. A intensa atividade imobiliária dos anos setenta encontrou nessasregiões condições favoráveis para a implantação de parcelamentos do solo quecorrespondessem às aspirações antiurbanas de partes da classe média.

O município de Embu respondia em parte pelas atividades de lazer e turis-mo, conforme verificamos na carta da evolução do uso do solo. No restante domunicípio, a ocupação se dava como um transbordamento da ocupação periféri-ca do município de São Paulo, de acordo com a taxa de crescimento anual dapopulação – entre os anos de 1970 a 1980.

Osasco, Barueri, Itapevi e Jandira, contidos no vetor oeste (3), desempenha-vam a função de municípios-dormitórios, estruturados pela ferrovia e o eixo viáriode penetração a oeste, recortando o vale do Tietê e seus afluentes. O municípiode Barueri, todavia, apresentou incremento significativo por causa da abertura doempreendimento Alphaville, destinado à população de renda mais elevada, dan-do início ao processo de desconcentração urbana. A propósito, cabe assinalar quea viabilidade desse megaprojeto, que direcionou a suburbanização das faixas derenda mais elevadas para o vetor sudoeste da metrópole, deve-se, em parte, àestrutura fundiária da região, pois uma parcela da gleba era constituída por ter-ras da União, cedidas em regime de concessão.

Com relação aos municípios contidos nos vetores não conurbados, apresen-taram uma ampliação expressiva da área urbanizada, da ordem de 26,69% entreos anos de 1977 e 1980 (ver Tabela V). Os processos de produção do espaço nosmunicípios que pertencem a esses vetores resultaram da expansão periférica pelapopulação de baixa renda, como em Francisco Morato, Caieiras e Franco daRocha, onde tanto as taxas de crescimento demográfico como os índices de evo-lução da mancha urbana foram significativos.

Confrontando os índices de incremento da área urbanizada, os indicadoresdemográficos e a dinâmica de uso do solo registrada na carta de uso do solo, épossível detectar o parcelamento do solo para camadas de população compostaspor faixas de renda mais elevadas, destinado à implantação de chácaras de lazernas áreas de mananciais, como em Mairiporã, ao norte, com uma taxa de cres-

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cimento demográfico de apenas 3,47% entre 1970 e 1980 e expressivos incremen-tos da área urbanizada, respectivamente, 175 ha, entre os anos de 1974 e 1977,e 1.213 ha, entre 1977 e 1980.

Quanto ao município de São Paulo, embora a região leste apresentasseacréscimos substantivos, foi a região sul que continuou apresentando um ritmo decrescimento intenso. A estruturação dessa região do município de São Paulo ca-racteriza-se pela presença do distrito industrial de Santo Amaro e pela proximi-dade com os centros industriais de Diadema e de Santo André, São Bernardo doCampo e São Caetano do Sul. Associada a vetores de urbanização integradospelos eixos de transportes, que também concentram atividades terciárias, umaenorme demanda habitacional foi gerada nessa região. A lei de zoneamento in-dustrial, ao instituir nessas áreas Zonas de Uso Predominantemente Industrial(Zupis), consolidou essa tendência. As bacias Billings e Guarapiranga, integradasa esse espaço, sofreram influência direta desses processos.

O acelerado processo de expansão urbana definiu um padrão de assenta-mento urbano marcado pela inexistência de infra-estrutura e de equipamentosurbanos. Esse padrão não se alterou com a promulgação da legislação de prote-ção dos mananciais nessa região. Ao contrário, na região sul do município de SãoPaulo, acentuaram-se os índices de superfície ocupada por loteamentos clandes-tinos ou irregulares, totalizando 118 ha entre os anos de 1977 a 1980, em con-traposição a 0,1 ha, entre 1974 e 1977, e 67 ha, entre 1965 e 1974. Por outro lado,a região leste, caracterizada historicamente pela produção irregular do espaço, teveum incremento menor nesse período (46 ha entre 1977 e 1980) com relação aosanos anteriores (87 ha, entre 1974 e 1977, e 167 ha, entre 1965 e 1974).

De fato, ao examinarmos o quadro de loteamentos irregulares em manan-ciais (ver Tabela III), podemos constatar que foi na região leste que o processode produção irregular e clandestina do solo se deu com mais intensidade, após apromulgação da legislação de proteção dos mananciais, porém em escala muitomenor da que ocorre na atualidade.

No vetor leste, a expansão urbana manteve o mesmo ritmo de urbanizaçãoque nos anos imediatamente posteriores à aplicação da legislação, acentuando-seesses índices no período de 1977 a 1980. Esse fato demonstra que as diretrizesde direcionamento dos vetores de expansão urbana no vetor leste, preconizadasno PMDI, não produziram os efeitos esperados (ver Tabelas IV e V).

No vetor nordeste, as tendências verificadas comprovam as premissas esbo-çadas no PMDI que dizem respeito à dinamização do crescimento urbano na di-reção nordeste, sendo expressivos os incrementos da área urbanizada (2.616 haentre 1974 e 1977, conforme a Tabela V). Provavelmente o impacto dos inves-timentos públicos e privados que começaram a ser implantados no município de

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Guarulhos explique as alterações ocorridas no espaço urbano, como o Aeropor-to Internacional, por exemplo.

Podemos afirmar que ocorreu um pequeno redirecionamento dos vetores deexpansão urbana na metrópole paulista no período de 1974 a 1980, em funçãoprincipalmente dos investimentos públicos realizados na década de 1970, situa-ção que se modificou na década seguinte em virtude do esgotamento da capaci-dade de investimento do setor público.

Outro aspecto de bastante evidência foi o intenso processo de internalizaçãodo excedente econômico na aquisição de terras urbanas. Houve um direciona-mento de parte deles, situados nas áreas de mananciais, para a aquisição da cha-mada segunda residência, de acordo com o modelo de parcelamento do solo paraa implantação de chácaras de recreio, apesar da forte pressão já exercida para aocupação irregular do solo.

Com relação ao processo de urbanização do período de 1980 a 1990, ve-rificou-se uma inflexão no ritmo do incremento da área urbanizada, sobretudo nosprimeiros cinco anos, em que houve uma desaceleração da expansão da manchaurbana. Esse fato entretanto, resultou mais dos efeitos no espaço da crise econô-mica e dos processos de reestruturação da base econômica, em especial da capi-tal paulista, do que dos efeitos da aplicação dos instrumentos de controle am-biental no espaço metropolitano.

Na análise dos valores e índices de área urbanizada por vetores, constata-se que houve um significativo processo de desconcentração urbana. De um lado,deu-se menor incremento da área central, representado pelo município de SãoPaulo, processo já evidenciado entre os anos de 1977 e 1980; por outro lado, oaumento expressivo da área urbanizada (33,41%) nos municípios contidos nosvetores não conurbados, provocando a continuidade do processo de urbanizaçãoextensiva e periférica da metrópole, agora, porém, de forma mais acentuada (verTabela V).

A leitura dessas informações, por regiões geográficas e municípios (verTabela IV), permite-nos concluir que a área urbanizada aumentou em várias re-giões no anel periférico, entre os anos de 1980, 1985 e 1990: a região norte, com53,4 km2; a região nordeste, com 53,76 km2, a região sudeste, com acréscimo de38,96 km2, apresentando uma tendência de expansão, sobretudo entre os anos de1985 e 1990. Esta última região encontrava-se em processo de consolidação damalha urbanizada em vários municípios, caso de Santo André, São Bernardo doCampo e São Caetano do Sul.

Diferentes processos interagiram na expansão metropolitana que ocorreunessa década, evidenciando-se as novas formas de configuração do espaço urbanodecorrentes da reestruturação do setor terciário ou as inversões econômicas pú-

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blicas ou privadas no espaço urbano. Por outro lado, os instrumentos de contro-le ambiental, mediante o uso e ocupação do solo, especialmente a lei de manan-ciais, não apresentaram os efeitos esperados.

No entanto, os dados relativos à diminuição do crescimento demográficoe da área urbanizada na região central, ao incremento da mancha urbana e às taxaselevadas de crescimento demográfico nos vetores não conurbados devem ser as-sociados às novas configurações do espaço urbano, com polinucleação desse es-paço desconcentrado como resultado “de forças socioestruturais que transformamas vantagens comparativas de lugar, especialmente a nova divisão internacionaldo trabalho, as atividades das grandes firmas e multinacionais, a intervenção doEstado e as ações do setor imobiliário”, a exemplo das cidades americanas(Gottdiener, 1993, p. 266).

Essas observações são pertinentes, embora com ressalvas, para o caso dasalterações ocorridas em Cotia e em Barueri ao longo da rodovia Castelo Branco,nas proximidades do Parque Ecológico de Tietê, com a implantação de empreen-dimentos como Tamboré e demais fases do loteamento Alphaville (Barueri) e osloteamentos da Granja Viana (Cotia), em que se tem a integração entre residên-cia/serviços/indústria. Igualmente se têm os processos de expansão urbana emMairiporã, com a duplicação da rodovia Fernão Dias, e em Santana do Parnaíba,ainda que direcionados em alguns municípios para o assentamento de chácaras delazer.

O processo de desconcentração urbana, tal como descrito acima, ocorreuprincipalmente fora das áreas de proteção dos mananciais. Isso significa que areversão do modelo de densidades decrescentes, rarefeitas no anel periférico, coma ocupação do solo em moldes mais compatíveis com a proteção ambiental, deu-se, sobretudo, no vetor oeste da metrópole localizado fora das áreas protegidas,com os empreendimentos integrados em um padrão de ocupação do solo em gran-des lotes e elevado porcentual de áreas verdes.

Entretanto, o processo de desconcentração urbana das atividades residen-ciais de maior poder aquisitivo respondia parcialmente pelos aumentos expressi-vos da área urbanizada na periferia, O clássico modelo dos anéis – o central e ointermediário cercados pelo anel periférico com densidades mais rarefeitas e ocu-pados por população de baixa renda – não é alterado na década em questão.

Ao contrário, entre os anos de 1985 e 1990, principalmente, intensificou-se o processo de ocupação clandestina ou irregular do solo pelas populações debaixa renda, agora com uma dinâmica de apropriação dos recursos naturais maiscaótica, traduzindo os processos de exclusão social.

Ao falarmos em exclusão social, estamos nos referindo ao processo demarginalização no campo de trabalho, à ruptura no sistema sociofamiliar de so-

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ciabilidade e proteção e à ausência de políticas sociais. Trata-se de um contingen-te populacional cuja reprodução se realiza abaixo do nível socialmente necessá-rio (Ribeiro, 1994).

Próximos à malha urbana na região sul do município de São Paulo, encon-travam-se as áreas de proteção dos mananciais precursoras na implantação deempreendimentos integrados de densidades rarefeitas, destinados às classes derenda mais elevada. Como exemplo desses empreendimentos citaríamos o lotea-mento em Interlagos em torno dos lagos existentes. Tais áreas transformaram-se,na década de 1980, no local de onde emergiram problemas sociais, delineando emseus bolsões de pobreza o estigma da violência urbana, o que afetou o sucessodesses empreendimentos. A infinidade de agentes que produzem e se apropriamdo espaço urbano configuram, assim, um desenho urbano incompatível com ascondições da conservação ambiental.

Na região norte, nas áreas excluídas do perímetro de proteção dos manan-ciais, o processo extensivo e periférico da urbanização foi mais intenso. Ao exa-minarmos a taxa de crescimento populacional na década, despontam com a taxamais alta da área metropolitana – TGCA de 10,27% – os municípios de FranciscoMorato e Santana de Parnaíba. Na área urbanizada, os acréscimos também foramsignificativos.

Cabe ressaltar que na região norte a oferta de empregos industriais é bai-xa;28 as Zonas de Uso Predominantemente Industriais (Zupi-1 nº 179 a 188, emCaieiras, e Zupi-1 nº 305 a 309, em Franco da Rocha) tornaram-se pouco ocupa-das, pois as condições ambientais são extremamente desfavoráveis à ocupaçãourbana.

Os municípios do vetor norte encontram-se encravados em um conjunto deserras, destacando-se a da Cantareira, de Itaberaba e de Bananal, com cotas aci-ma de 800 m de altitude, em compartimentos ambientais impróprios ao assenta-mento urbano. As ocupações efetuadas no período de 1985 a 1990 ocuparamcotas de até 900 m de altitude, em áreas antes recobertas por reflorestamento ouáreas de mata natural (conforme uso do solo registrado na carta de 1974), fomen-tando os acidentes geológicos associados a escorregamentos.

As condições geomorfológicas impuseram limites ao uso urbano-industrial,pois, apesar de a região ser entrecortada por um complexo sistema rodoferroviário– há a estrada velha de Campinas, a estrada de ferro Santos-Jundiaí e a rodoviados Bandeirantes –, os assentamentos industriais foram praticamente ausentes. Poroutro lado, a presença do sistema ferroviário atraiu enormes contingentes popu-lacionais.

O processo que se evidenciou nesses municípios foi distinto do da produ-ção do espaço em Mairiporã, também no quadrante norte da metrópole, onde a

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legislação de proteção dos mananciais institucionalizou uma dinâmica de uso eocupação do solo direcionada a outras faixas de renda, inicialmente em virtudeda presença da vegetação e da existência de reservatórios, bem como por causada acessibilidade. A mesma situação se verificou no município de Caieiras coma implantação do loteamento Nova Caieiras, destinado à classe média, em trechocontido nos limites de proteção dos mananciais. Embora não tenhamos os dadosrelativos aos anos de 1990 a 1999, observa-se, de acordo com registros na impren-sa sobre a situação dos mananciais, que esse processo vem sendo alterado nosúltimos anos.

Examinando as tabelas referentes à área urbanizada no período, por muni-cípios e regiões e vetores de crescimento, é possível verificar também um incre-mento substantivo no vetor nordeste, no município de Guarulhos, fora dos limi-tes de mananciais, de 43,92 km2, representando, respectivamente, 11,27% e13,75% em relação à superfície total urbanizada da metrópole entre os anos de1980/1985/1990. No vetor sudeste, constatou-se um incremento de 12,9% e 8,7%,da ordem de 38,96 km2, entre os anos de 1980 e 1990, conforme a Tabela IV.

As transformações do espaço constatadas em Guarulhos ilustram bem oprocesso de terciarização da metrópole. O município tem aumentado significati-vamente sua participação no crescimento metropolitano devido, sobretudo aovolume de investimentos que recebeu em obras de grande impacto, configuran-do um setor terciário altamente concentrado. O Aeroporto Internacional deCumbica, o Terminal Intermodal de Cargas, o Parque de Tancagem da Petrobráse obras como a rodovia dos Trabalhadores e conjuntos habitacionais são exem-plos emblemáticos. Nesse vetor foram consubstanciadas as diretrizes preconiza-das no PMDI, haja vista o volume elevado de investimentos na região.

O vetor sudeste, que apresentou um crescimento urbano menos expressi-vo até meados da década de 1970, experimentou, na década de 1980, um processomais acentuado de crescimento urbano nas áreas de mananciais dos municípiosde São Bernardo, Santo André e Ribeirão Pires. Ao confrontarmos os índices deincremento da área urbanizada com as taxas de crescimento populacional da dé-cada, verificamos um processo de periferização por parte da população dos pró-prios municípios, uma vez que as taxas de crescimento demográfico não foramaltas no período em relação à média da metrópole.

Entre os anos de 1980 a 1990 o processo de urbanização adquiriu outroscontornos em municípios como Itapecerica da Serra (expansão urbana de 6,34km2) e Embu-Guaçu (4,64 km2), ambos do vetor sudoeste, locais que passarama abrigar grandes contingentes de população de baixa renda em loteamentos clan-destinos de forma semelhante aos processos ocorridos no vetor sudeste, alteran-

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do o processo de parcelamento do solo para grandes lotes destinados à implan-tação de chácaras de lazer.

No vetor leste longínquo da metrópole, o crescimento foi significativo: emItaquaquecetuba, no período de 1980 a 1990, houve um incremento de 14,02 km2,acompanhado de elevada taxa de crescimento demográfico — TGCA de 7,67%;no município de Suzano, de 11,76 km2; e no município de Mogi das Cruzes, umincremento de 11,84 km2. No vetor leste (2), constituído pelos distritos de SãoMiguel Paulista, Itaim Paulista, Guaianazes e Itaquera, a ocupação também foiintensa como conseqüência do imenso volume de investimentos no setor de ha-bitação popular realizado pelo estado ou pelo município, da implantação da linhaleste-oeste do metrô e da modernização das linhas de subúrbios.

A análise dos indicadores da área urbanizada para a região leste permiteverificar que essa região, em seu conjunto, não polarizou o crescimento urbanotal como proposto nas diretrizes do Plano Metropolitano de DesenvolvimentoIntegrado, que determinou a expansão da metrópole para o vetor leste-nordestee a restrição das áreas delimitadas como de proteção dos mananciais, nas direçõessul e sudeste. Entre os anos de 1980 a 1990 verificou-se até um pequeno decrés-cimo da participação desse vetor no conjunto da área urbanizada metropolitana,pois os acréscimos da área urbanizada mencionados devem ser referenciados coma extensão dos territórios que alguns municípios dessa região encerram.

Ao lado da lei de mananciais e do zoneamento industrial, o Poder Muni-cipal também reafirmou, mediante instrumentos normativos, o direcionamento domunicípio de São Paulo para o vetor leste e a vocação dessa região para uso in-dustrial (Lei municipal 9.300/81), delimitando um perímetro equivalente ao es-paço necessário para abrigar um número de empreendimentos e empregos nobairro de Santo Amaro, na região sul do município. Essas medidas não tiveramefetividade, conforme apontam os indicadores econômicos do período.29

Os indicadores da produção rural também ratificam as funções de apoio àsatividades urbanas que a região leste continua desempenhando no contexto me-tropolitano, em contraposição às premissas da sua estruturação como vetor dedesenvolvimento urbano-industrial. Na década de 1980, as áreas rurais dessa re-gião diminuíram em torno de 10% em relação à superfície total recoberta comlavouras na metrópole. Entretanto, o decréscimo da superfície ocupada com la-vouras no conjunto da região metropolitana – da ordem de aproximadamente 20%– foi maior. Alguns municípios dessa região, como Biritiba-Mirim, por exemplo,inseridos em áreas de proteção dos mananciais, ampliaram sua superfície ocupadapor lavouras.

Porém, a manutenção do vetor leste enquanto núcleo expressivo de ativi-dades rurais não significou que a legislação do município de São Paulo, promul-

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gada no início dos anos oitenta, foi eficaz no sentido de evitar a intensa e desor-denada ocupação das áreas rurais: as taxas de crescimento demográfico foramelevadas nos distritos rurais na direção norte, sul e leste, como em Perus (TGCAde 4,11%), Parelheiros (TGCA de 5,69%) e Guaianazes (TGCA de 8,23%) ten-do em vista que a taxa de crescimento anual médio da capital girou em torno de1,15%.

As leis municipais 9.300/81 e 9.412/81, instrumentos legais municipais quevisavam ordenar a relação entre urbanização e recursos naturais nessa década, pormeio da proposição de medidas para a zona rural do município de São Paulo,criaram espaços que pudessem ser ocupados economicamente, sem alterar ascaracterísticas do sítio físico, de modo a evitar a ocupação clandestina e desarti-culada.

Os informes sobre o número de loteamentos clandestinos ou irregulares naszonas rurais, apresentados na listagem do Departamento de Regularização do Soloda Secretaria de Habitação do Município de São Paulo – 109 loteamentos emzonas especiais (Z8-100 do tipo 1 ao 5) –, também indicam a inexpressividadeda ação pública no controle do uso do solo na zona rural, por intermédio da le-gislação municipal ou de proteção dos mananciais.

Cabe ainda mencionar que a promulgação da lei municipal 9.413/81, noinício da década, instituiu três tipos de loteamento, dentre eles o loteamento po-pular, com menos exigências para o loteador com o objetivo de baixar os custosdos serviços urbanos e propiciar a oferta de lotes para a população de baixa renda,a fim de reduzir a pressão da clandestinidade na região sul do município, quemantinha os parâmetros da legislação de proteção dos mananciais, com lotes mí-nimos em torno de 500 m2.

Os parâmetros dessa legislação também basearam-se no cenário econômi-co da década de 1970, que, apesar do quadro recessivo, garantiu a geração de em-pregos que incorporou grande número de trabalhadores, minimizando até certoponto as conseqüências sociais da deterioração salarial, processo drasticamenterevertido no decênio em curso.

Nessa década, marcada pela profunda exclusão social, inviabilizaram-se osprojetos baseados no sistema tradicional de compra em prestações e aquisição delote popular, alterando as formas de produção dos loteamentos clandestinos. Al-guns trabalhos realizados nas décadas de 1980 e 1990 apontaram para a impos-sibilidade de manter o padrão de expansão urbana fundamentado no tripéloteamento clandestino – periferia – autoconstrução (Kowarick e Bonduki, 1988,Bogus, 1992).

Vários argumentos têm sido utilizados para explicar as dificuldades deacesso das camadas de baixa renda à casa própria, fundados na conjuntura dosanos oitenta: a promulgação da legislação relativa ao parcelamento do solo, pre-

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vendo a punição dos loteamentos clandestinos; a ausência de financiamento pú-blico destinado à produção de habitações populares; o aumento constante dosmateriais de construção, que se manteve acima dos níveis de inflação; a quedabrutal do salário-mínimo, associada ao contexto de crise e desemprego, e o au-mento dos custos de transportes.

As características assumidas pela urbanização nessa década reiteraram,entretanto, o padrão periférico de expansão urbana e a produção clandestina doespaço; o que se alterou nesse período foram suas formas de produção e apropria-ção, visto que o loteamento clandestino foi resultado de uma invasão da gleba,posteriormente adquirida em sua totalidade pelos invasores e por eles subdividi-da, os quais passaram a deter a fração ideal da gleba. Em vez da tradicional aqui-sição de lotes em prestações proporcionais ao salário-mínimo, a figura do loteadorclandestino recaiu nos próprios adquirentes, cuja atuação se dava por intermédiodas associações comunitárias, que tinham por finalidade equacionar a questãojurídica da propriedade da terra sobre os loteamentos irregulares e clandestinos,conforme listagem de PMSP-Sehab-Resolo.

Há casos em que a própria liderança do movimento representa a figura doloteador, caso de Maria Sipriana Henrique na área de mananciais. Ademais sãoinúmeras as associações, tais como a Associação dos Moradores dos Sem-TerraUnidos, a Associação dos Filhos, entre outras.

Foi significativo o aumento de favelas, principalmente considerando a taxaanual de crescimento demográfico da metrópole na década, em torno de 1,86%,e o saldo negativo do movimento migratório, em contraposição às décadas ante-riores. No período em pauta, surgiram quatrocentas e cinqüenta e nove novasfavelas no município de São Paulo, formadas, sobretudo, pela invasão organiza-da de glebas. Duzentas e cinqüenta delas implantaram-se na região sul; oitenta eseis na região leste; e oitenta e três na região norte, em contraposição ao núme-ro de quarenta favelas nas regiões mais consolidadas, no centro e sudeste domunicípio (ver Tabela I).

Os números da evolução do número de favelas nos demais municípios daregião metropolitana (ver Tabela VI) indicam os níveis de pobreza urbana dapopulação na década, refletindo o chamado processo de metropolização da po-breza. Ao confrontar esse indicador e o saldo migratório negativo para a metró-pole paulista na década de 1980, verificamos a ocorrência de movimentos migra-tórios dentro da própria metrópole. Os números expressivos de novas favelas nosdemais municípios traduzem essa realidade, segundo dados do IBGE e da Com-panhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo, prin-cipalmente nos municípios de Guarulhos, Osasco, Santo André, São Bernardo doCampo, Taboão da Serra, Embu, Itapecerica da Serra, Ribeirão Pires e Mauá.Ressalte-se que vários deles estão contidos em área de proteção dos mananciais.

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Tabela VI – Região Metropolitana de São Paulo – distribuição de favelas,segundo municípios e regiões (1980-90)

Municípios – Regiões 1980 1991(1) 1990(2)POPULAÇÃO FAVELAS % POPULAÇÃO FAVELAS % POPULAÇÃO FAVELAS %

Centro 354.266 467 76,06 711.987 731 67,69 212.009 1.718 63,99São Paulo 335.344 431 70,20 647.622 629 58,24 194.009 1.592 59,29Osasco 18.922 36 5,86 64.365 102 9,44 18.000 126 4,69Noroeste 2.483 5 0,81 26.427 40 3,70 6.287 74 2,76Carapicuíba 1.684 3 0,49 14.944 26 2,41 600 20 0,74Barueri 799 2 0,33 10.216 12 1,11 5.000 40 1,49Cajamar 0 0 0,00 1.267 2 0,19 516 10 0,37Santana de Parnaíba 0 0 0,00 0 0 0,00 125 2 0,07Pirapora de Bom Jesus 0 0 0,00 0 0 0,00 46 2 0,07Oeste 0 0 0,00 655 1 0,09 6.420 10 0,37Cotia (1) 0 0 0,00 655 1 0,09 0 0 0,00Vargem Grande Paulista (1) 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Itapevi (1) 0 0 0,00 0 0 0,00 6.000 5 0,19Jandira 0 0 0,00 0 0 0,00 420 5 0,19Sudoeste 0 0 0,00 23.847 37 3,43 8.562 116 4,32Taboão da Serra 0 0 0,00 12.263 15 1,39 2.538 28 1,04Itapecerica da Serra 0 0 0,00 2.209 5 0,46 1.024 21 0,78Embu 0 0 0,00 9.375 17 1,57 5.000 67 2,50Embu-Guaçu 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Juquitiba 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00São Lourenço da Serra 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Sudeste 73.566 112 18,24 235.492 205 18,98 80.216 493 18,36Santo André 15.901 25 4,07 53.975 41 3,80 15.000 89 3,31São Bernardo do Campo 45.352 49 7,98 80.219 53 4,91 27.000 91 3,39São Caetano do Sul 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Mauá 9.957 15 2,44 38.891 29 2,69 8.200 122 4,54Diadema 2.356 23 3,75 62.054 80 7,41 30.000 190 7,08Ribeirão Pires 0 0 0,00 353 2 0,19 0 0 0,00Rio Grande da Serra 0 0 0,00 0 0 0,00 16 1 0,04Leste 0 0 0,00 252 1 0,09 2.117 34 1,27Mogi das Cruzes 0 0 0,00 0 0 0,00 400 8 0,30Suzano 0 0 0,00 0 0 0,00 300 8 0,30Poá 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Itaquaquecetuba 0 0 0,00 252 1 0,09 1.000 6 0,22Ferraz de Vasconcelos 0 0 0,00 0 0 0,00 400 11 0,41Guararema 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Salesópolis 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Biritiba-Mirim 0 0 0,00 0 0 0,00 17 1 0,04Nordeste 25.102 30 4,89 52.373 64 5,93 39.741 235 8,75Guarulhos 25.102 30 4,89 52.373 64 5,93 39.741 235 8,75Arujá 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Santa Isabel 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Norte 0 0 0,00 602 1 0,09 110 5 0,19Franco da Rocha 0 0 0,00 602 1 0,09 60 3 0,11Mairiporã 0 0 0,00 0 0 0,00 0 0 0,00Caieiras 0 0 0,00 0 0 0,00 50 2 0,07Francisco Morato 0 0 0,00 0 0 0,00 (3) 0,00RMSP 455.417 614 100,00 1.025.234 1.080 100,00 355.462 2.685 100,00

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A título de conclusão, verificamos, pela análise dos indicadores urbanísti-cos, sociais e econômicos apresentados, que a lei de mananciais não produziu osefeitos desejados no redirecionamento dos vetores de urbanização no sentido lestee na restrição da ocupação nas direções norte, sul, sudeste e sudoeste, onde se lo-calizam os mananciais hídricos.

Deram novos contornos à metrópole a redução da capacidade de investi-mentos do poder público em obras de infra-estrutura urbana previstas no PMDI,como decorrência da recessão que sofreu a economia brasileira, e a inviabilidadedas propostas em torno do núcleo industrial da região leste com os processos dereestruturação da base econômica da metrópole paulista, a partir de meados dadécada de 1970. Ampliou-se e fragmentou-se a produção dos espaços, como de-monstra o quadro da evolução da área urbanizada da metrópole, em que se ob-serva o intenso ritmo de expansão nos municípios não-conurbados no período de1974 a 1990.

Os processos de reestruturação econômica geraram fenômenos brutais deexclusão social e de marginalização, o que se traduziu numa urbanização perifé-rica cada vez mais descontínua, evidenciada pela planimetria da área urbanizada.Esse fato refletiu diretamente nos padrões de ocupação do solo e da apropriaçãodos recursos ambientais, como sugerem os elevados índices de desmatamento.Tais processos estavam muito distantes da visão da cidade controlada com rela-ção aos eixos prioritários de expansão urbana.

No vetor nordeste, consubstanciaram-se as diretrizes preconizadas noPMDI, como conseqüência do volume elevado de investimentos na região, sen-do que os oriundos do setor público se constituíram na linha de frente da ma-terialização desse processo. No entanto, o incremento da expansão urbana paraesse vetor não restringiu a expansão nos vetores sul, sudeste, norte, sudoeste. Aplanimetria da área urbanizada revelou grande espraiamento da mancha urbanaem perímetros descontínuos à área urbanizada, formando a chamada região des-concentrada. No caso da metrópole paulista, esses processos de desconcentraçãourbana foram mediados principalmente por processos de exclusão social e loca-lizaram-se com predominância nas regiões de mananciais e na região norte. Emmenor escala, refletem-se nos processos de suburbanização das classes de rendasmais elevadas voltados à implantação de moradias situadas fora das áreas dosmananciais, sobretudo no vetor oeste.

Fonte básica: IBGE, censo demográfico de 1980 e 1991.(1) Dados IBGE.(2) Dados CDHU – SIH (Sistemas de Informações de Habitação), 1990.(3) Sem informação.Levantamentos incluem as favelas com menos de cinqüenta domicílios.

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A área urbanizada da metrópole, segundo a planimetria por nós realizada,ampliou-se em 1.020,86 km2 entre os anos de 1965 e 1990. Esse número repre-senta mais que o dobro da superfície que a metrópole possuía em 1965, quandocontava com 744,54 km2, com uma média anual de incremento de 32 km2/ano,sendo que em 1990 contava uma superfície urbanizada de aproximadamente1.765 km2. Em contraposição, a superfície recoberta por matas na região metro-politana, que em 1973 era de 1.261,60 km2 (Serra Filho et al., 1975), passou, em1990 (SMA, 1993), para 858,40 km2. Essas áreas desmatadas, situadas principal-mente na região dos mananciais, constituíam um dos parâmetros fundamentaispara a proteção dos recursos hídricos.

Assim, a leitura dos indicadores ambientais apontou os anos oitenta comoa “década perdida” no que se refere aos aspectos ambientais. Um fato ilustrativoe metafórico dessa afirmação é o objetivo de redução da carga de poluente aflu-ente ao reservatório Guarapiranga, estabelecido quando da formulação de diretri-zes para o desenvolvimento e a proteção ambiental da bacia desse reservatório.Utilizou-se como referência o parâmetro das cargas afluentes em 1980, ou seja,o cenário a ser atingido, considerando todas as ações já realizadas nessa região,pretendia retomar os índices de qualidade das águas vigentes no início da “décadaperdida”.

Ao atualizarmos esse informe para o período compreendido entre 1990 e1995, verificamos que o desmatamento na área metropolitana atingiu 129 km2

(Inpe, 1998), informação que pode ser associada às novas configurações do es-paço urbano-regional com o incremento do processo de desconcentração urbananos anos noventa. De fato, verifica-se nas taxas de crescimento demográfico, entreos anos de 1991 a 1996, que a área em torno da cidade de São Paulo foi a quemais cresceu no estado, resultado mais do deslocamento da população da capi-tal do que da imigração de pessoas de outras áreas para a região metropolitana,fato que indica intenso processo de desconcentração urbana. Embora não tenha-mos os dados da evolução da área urbanizada, pudemos constatar, pelas taxaselevadas de crescimento demográfico dos municípios de Vargem Grande Paulista,Arujá, Santana do Parnaíba e Barueri, a intensificação das tendências expressasna década anterior, em que a expansão urbana direcionou as classes de maiorpoder aquisitivo para condomínios fechados.

Os padrões de crescimento do espaço de assentamento voltados às popu-lações de baixa renda também têm tido continuidade no modelo periférico nosanos noventa, nos municípios de Guarulhos, Itaquaquecetuba, Caieiras e FranciscoMorato. Com isso, delineia-se com maior intensidade a metrópole desconcentrada,

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com impactos significativos no meio ambiente, e dificulta-se o controle ambientalem face também da dispersão das atividades no espaço.

Essa análise evidenciou ainda a intervenção estatal em áreas estratégicas.Houve um direcionamento do vetor de expansão urbano-regional no sentido nor-deste, onde foram significativos os investimentos do estado. As diretrizes dodirecionamento da expansão urbana com as obras de impacto do poder público,entretanto, confirmam atualmente os vetores sul e sudoeste como as faixas prio-ritárias do processo de estruturação urbano-regional. De fato, verifica-se na dé-cada de 1990 a proposição de projetos de impacto para os processos de estru-turação da metrópole, com financiamentos de órgãos de cooperação financeirainternacional (BID, BIRD, Overseas Economic Cooperation Fund, do Japão) vin-culados aos sistemas de transportes, que indicam claramente os vetores sul esudoeste como prioritários para o crescimento urbano da metrópole.

A defesa da desregulamentação e a proposição de instrumentos de avalia-ção da capacidade de suporte das estruturas espaciais para a gestão urbana e am-biental e a defesa de pactos territoriais: esse é o caminho que tem sido defendi-do em projetos de cidades sustentáveis, embora se trate de um cenário muitodistinto das evidências da dinâmica da produção do espaço configuradas nestapesquisa.

A especificidade da irregularidade e da clandestinidade nosmananciais

As áreas de proteção dos mananciais, que envolvem uma superfície de4.346 km2, representando 53% do território metropolitano, são constituídas porregiões bastantes distintas entre si, sobretudo em relação à dinâmica de uso eocupação do solo. A análise desses espaços englobados no perímetro de manan-ciais, conforme sua classificação no âmbito da legislação editada na década de1970, pouco significa para a compreensão da dinâmica dos processos deestruturação do espaço e de seus reflexos nos processos de proteção ambiental.A subdivisão utilizada neste texto – primeira categoria, segunda categoria, comclasses A, B e C – serve apenas como parâmetro de avaliação do modelo de pro-teção ambiental adotado.

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Uma configuração das áreas de proteção dos mananciais pode ser extraí-da do trabalho realizado pela Emplasa30 acerca da capacidade de suporte do meioambiente para o conjunto da superfície metropolitana, em que se aferiu o grau deadequação do território, considerando um conjunto de variáveis físicas e urbanís-ticas.

Os níveis topográficos regionais e setoriais, as declividades, amplitudestopográficas, redes de drenagem, dados litológicos, clima e vegetação foram asvariáveis físicas consideradas. As variáveis urbanísticas, por sua vez, buscavamapreender o grau de preparação do espaço para a ocupação urbana; tal apreensãofoi qualificada no referido trabalho da Emplasa de acordo com os investimentospúblicos existentes: a presença ou projeto em curto prazo de redes de água, deesgoto, de sistema viário e de transportes, incluindo redes de trólebus, de metrôe suas estações, de subúrbio e suas estações, rede ferroviária e seus terminais evias estruturadoras, com ponderação maior dos indicadores de saneamento.

Esses dados foram correlacionados com os usos e padrões de ocupação dosolo nas várias regiões, estabelecendo-se uma distinção entre os usos urbanos enão-urbanos (reflorestamento, mata, mineração, hortifrutigranjeiros, vegetaçãoherbácea) e o padrão de intensidade da ocupação.

O conjunto de informações delimitou nove tipos de áreas diferenciais paraações de planejamento. Na carta elaborada na escala 1:100.000, é possível veri-ficar que as áreas de proteção dos mananciais se enquadram nas divisões abaixodescritas:1. Áreas geomorfologicamente inadequadas ao assentamento urbano, bastante

ocupadas pela urbanização, em geral carentes de equipamentos e infra-estru-tura urbana e com características de expansão periférica, constituídas pelosmunicípios de Ribeirão Pires, parte do município de Itapecerica da Serra, par-celas territoriais dos municípios de São Paulo, localizadas próximo à represaBillings e Guarapiranga, de Diadema, próximo do Reservatório Billings, deEmbu e de São Bernardo do Campo.

2. Áreas geomorfologicamente inadequadas ao assentamento urbano, tradicional-mente ligadas ao desenvolvimento de atividades primárias de reflorestamentoe de produção hortifrutigranjeira e com tendência a serem incorporadas ao pro-cesso de urbanização, envolvendo em geral os núcleos urbanos de pequenoporte dos municípios situados em áreas de proteção dos mananciais, como osde Salesópolis, Cotia, Juquitiba, Embu-Guaçu, Santa Isabel, Vargem GrandePaulista e espaços territoriais de Rio Grande da Serra, Ferraz de Vasconcelos,Suzano, Santo André, Mauá, sul de São Bernardo do Campo, São Paulo

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(Parelheiros), pequeno trecho de Caieiras e quase todo o município deMairiporã.

3. Áreas tradicionalmente estruturadas em função de atividades do setor primá-rio (basicamente produção de alimentos), cuja preservação e conservação sãoessenciais para a manutenção da qualidade e quantidade de água e de alimen-tos, onde se observa a presença de núcleos urbanos de pequeno porte, comoBiritiba-Mirim, Salesópolis, Mogi das Cruzes, Santa Isabel e pequena parcelade São Bernardo do Campo e de São Paulo (próximo a Embu-Guaçu) e Cotia.

4. Áreas inadequadas ao assentamento urbano do ponto de vista físico, não estan-do integradas ao processo de urbanização da metrópole, nem tendo grandeexpressão na atividade de produção agrícola, a não ser em pequenas produçõesagrícolas de subsistência, formadas por parcelas da superfície territorial de San-to André, São Lourenço da Serra, Embu-Guaçu, Guarulhos e Arujá.

5. Áreas de relevo extremamente acidentado, impróprias a qualquer tipo de as-sentamento. Encontram-se praticamente sem ocupação, pois em geral são áreasde serras ou de cobertura vegetal primitiva, cuja preservação é fundamentalpara garantir o equilíbrio na região, contendo superfícies territoriais de Sale-sópolis, Santo André, São Bernardo do Campo, Cotia, Mairiporã e Juquitiba.Essas regiões perfazem aproximadamente 20% da superfície de mananciais.

Cabe ressaltar que a delimitação acima esboçada representa a estrutura fí-sico-territorial da região de mananciais na década de 1980, tendo sido registradasalterações na dinâmica de produção desses espaços após esse período, as quaisjá incorporamos neste texto.

De maneira geral, dois aspectos caracterizam bem a região de mananciais:o primeiro deles refere-se ao perfil econômico dessas áreas, evidenciado pelapresença inexpressiva de indústrias – eram quinhentas e sessenta e quatro em1980 –, concentradas em sua maior parte nas bacias da Billings e do Guarapi-ranga, e pela proliferação de microempresas, concentradas também nessas bacias.O outro aspecto, já mencionado, diz respeito à vegetação remanescente da áreametropolitana nos mananciais. De acordo com o estudo elaborado por Serra Fi-lho et al. (1975), em 1973 havia 1.261 km2 de mata e 1.379 km2 de capoeirasrecobrindo a superfície metropolitana. Em 1977, segundo levantamentos realiza-dos pela Emplasa sobre as áreas de mata das bacias hidrográficas existentes nosmananciais, a superfície recoberta por matas era de 720 km2, principalmente aoleste, no município de Salesópolis, e ao sul, no município de Juquitiba, confor-me a tabela seguinte.

Page 157: 951303_Cidade e Natureza_Proteção Dos Mananciais e Exclusão Social

158

Tabela VII – Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – superfícierecoberta por matas

Município Bacias abrangentes Área de mata Área do municípioha % Área Área Mata do município

dentro (2) fora (2) (3) em %Área do município

1- Arujá Rio Jaguari 295,70 100,00Total 295,70 100,00 4.900,00 4.700,00 6,03

2- Biritiba-Mirim Rio Itapanhaú 4.190,20 70,20Rio Tietê 1.423,30 23,85

Rio Biritiba 355,40 5,95Total 5.968,90 100,00 36.700,00 4.700,00 16,26

3- Caieiras Rio Juqueri 471,95 100,00Total 471,95 100,00 2.100,00 8.300,00 22,47

4- Cotia (4) Reservatório de Guarapiranga 176,00 1,79Rio Cotia 9.631,30 98,21

Total 9.807,30 100,00 12.800,00 1.970,00 76,625- Diadema Reservatório Billings 14,40 100,00

Total 14,40 100,00 700,00 2.500,00 2,066- Embu Reservatório de Guarapiranga 199,90 100,00

Total 199,90 100,00 4.000,00 2.800,00 5,007- Embu-Guaçu Reservatório de Guarapiranga 1.346,95 100,00 7,90

Total 1.346,95 100,00 17.100,008- Ferraz de Vasconcelos Rio Guaió 130,70 100,00

Total 130,70 100,00 1.000,00 1.500,00 13,079- Franco da Rocha Rio Juqueri 100,80 100,00

Total 100,80 100,00 700,00 13.600,00 14,4010- Guarulhos Reservatório do Cabuçu 2.301,05 50,16

Reservatório de Tanque Grande 285,30 6,22Rio Jaguari 2.001,00 43,62

Total 4.587,35 100,00 9.900,00 23.500,00 46,3411- Itapecerica da Serra (5) Reservatório de Guarapiranga 2.080,30 39,68

Rio Juquiá 3.161,75 60,32Total 5.242,05 100,00 32.800,00 15,98

12- Juquitiba Reservatório de Guarapiranga 42,00 0,27Rio Juquiá 15.530,20 99,73

Total 15.572,20 100,00 55.000,00 28,31

13- Mairiporã Rio Juqueri 3.797,90 100,00Total 3.797,90 100,00 24.600,00 6.100,00 15,44

14- Mauá Rio Guaió 76,00 100,00Total 76,00 100,00 1.300,00 5.400,00 5,85

15- Mogi das Cruzes Rio Itatinga 749,10 26,98Rio Jundiaí 835,05 30,08

Rio Taiaçupeba 860,80 31,00Rio Tietê 212,35 7,65

Rio Biritiba 119,20 4,29Total 2.776,50 100,00 35.800,00 35.800,00 7,76

16- Poá Rio Guaió 1,75 100,00Total 1,75 100,00 100,00 1.600,00 1,75

Page 158: 951303_Cidade e Natureza_Proteção Dos Mananciais e Exclusão Social

159

Município Bacias abrangentes Área de mata Área do municípioha % Área Área Mata do município

dentro (2) fora (2) (3) em %Área do município

17- Ribeirão Pires Reservatório Billings 650,25 67,99Rio Guaió 185,50 19,39

Rio Taiaçupeba 120,70 12,62Total 956,45 100,00 10.700,00 8,94

18- Rio Grande da Serra Reservatório Billings 508,80 100,00Total 508,80 100,00 3.300,00 15,42

19- Salesópolis Rio Tietê 12.510,20 100,00Total 12.510,20 100,00 40.900,00 900,00 30,59

20- Santa Isabel Rio Jaguari 2.945,20 100,00Total 2.945,20 100,00 29.600,00 6.500,00 9,95

21- Santo André Reservatório Billings 2.574,00 100,00Total 2.574,00 100,00 9.600,00 8.300,00 26,81

22- São Bernardo Reservatório Billings 2.119,15 100,00Total 2.119,15 100,00 21.600,00 19.500,00 9,81

23- São Paulo Reservatório Billings 1.221,15 10,52Reservatório da Cantareira 806,60 6,95

Reservatório do Engordador 847,35 7,30Reservatório de Guarapiranga 1.735,35 14,94

Rios Capivari e Monos 7.001,75 60,30Total 11.612,20 100,00 54.700,00 96.200,00 21,23

24- Suzano Rio Guaió 316,90 39,18Rio Taiaçupeba 491,90 60,82

Total 808,80 100,00 13.500,00 5.000,00 5,99Total Geral 84.425,15 423.400,00 19,94

Fonte: Emplasa – CTD, com base em:(1) Levantamento aerofotogramétrico realizado em 1977, plotado na base cartográfica de 1980.(2) Corresponde à área do município dentro ou fora do limite estabelecido pela lei de proteção dosmananciais.(3) Na relação entre área de mata e área do município, foi levada em conta apenas a área do municípioque está dentro do limite estabelecido pela lei de proteção dos mananciais.(4) Município atualmente desmembrado: Cotia e Vargem Grande Paulista e incluindo a área deRibeirão Vargem Grande, em 1991, como de proteção dos mananciais. Contudo, não computada no(5) Município atualmente desmembrado: Itapecerica da Serra e São Lourenço da Serra.

Page 159: 951303_Cidade e Natureza_Proteção Dos Mananciais e Exclusão Social

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162

Os dados contidos na Tabela VII apontam para a criticidade da situação dosmananciais da região metropolitana no tocante à proteção ambiental, uma vez quea cobertura vegetal atingia aproximadamente 20% da área de mananciais. Em setratando de um elemento indispensável para a proteção de recursos hídricos, suaausência é responsável pela intensa sedimentação dos cursos d’água.

Quanto à expansão urbana, entre os anos de 1974 e 1980, observou-segrande incremento da superfície urbanizada nas áreas de mananciais, da ordemde 8.052 ha. Se desdobrarmos os elementos pesquisados sobre a evolução dos em-preendimentos aprovados pela Secretaria dos Negócios Metropolitanos (ver Ta-bela IX), será possível verificar que, no período de 1976 a 1980, foram aprova-dos 4.847 ha distribuídos em sessenta e cinco loteamentos, perfazendo uma su-perfície de 3.828 ha, setenta e oito estabelecimentos industriais, em uma área de833,9 ha, e sessenta e oito deles voltados ao uso terciário em uma superfície de186,41 ha, localizados principalmente nos vetores sudeste e sudoeste da metró-pole.

A superfície total aprovada no período de 1976 a 1980, representa aproxi-madamente 15% da área total urbanizada na metrópole no mesmo período, o queé bastante significativo no que se refere à dinâmica imobiliária, tendo em vistao baixo dinamismo econômico da maior parte da região de mananciais. Essesnúmeros revelam, também, que nos primeiros anos da aplicação da legislaçãohouve uma demanda para o parcelamento do solo nos moldes preconizados pelalegislação de proteção dos mananciais, mesmo levando em conta que há um trâ-mite entre a aprovação e a implantação dos empreendimentos.

Os índices da superfície aprovada para loteamentos foram expressivos nosmunicípios inseridos nos vetores não conurbados – caso de Embu-Guaçu (1317,6 ha)e Juquitiba (260,3 ha) –, assim como nos inseridos no vetor oeste – Itapecericada Serra (335,9 ha) –, no vetor sudeste – Rio Grande da Serra (303,7 ha) – e leste,como Suzano (447,5 ha).

A correlação entre os indicadores pertinentes à evolução da área urbanizada(ver Tabela VIII) e os pertinentes à evolução da superfície legalmente aprovadanos mananciais (ver Tabela IX) é distinta segundo as regiões. É possível constatarem alguns municípios uma expansão significativa da área urbanizada que não foiacompanhada de incremento dos índices da superfície legalmente aprovada. As-sim foi em São Paulo, com 123 ha aprovados para o parcelamento do solo, em-preendimentos industriais e para o setor terciário, com expansão urbana de2.544 ha; em São Bernardo do Campo, com 281,5 ha de superfície legalmenteaprovada e expansão de 584 ha; em Embu, com expansão de 356 ha e nenhumempreendimento aprovado; e em Mairiporã, com 1.224 ha de expansão urbana e186,4 ha de superfície legalmente aprovada.

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163

A expansão urbana registrou, portanto, dois processos distintos: um re-ferente à ocupação clandestina do solo e outro, representado pela intensa ati-vidade imobiliária, com o parcelamento do solo, cumprindo-se os procedi-mentos legais, para fins de lazer e, em menor grau, para a implantação deindústrias.

Ao examinarmos esses indicadores, constatamos que foi principalmente nomunicípio de São Paulo que a urbanização ocorreu de forma ilegal nas regiões deproteção ambiental. A ocupação clandestina do solo se deu predominantementeao sul do município, ao longo das vias de penetração da então estrada de Pare-lheiros, na bacia do Guarapiranga, e das estradas do Bororé e do Alvarenga nabacia da Billings. Em menor proporção se deu em São Bernardo do Campo, pró-ximo às rodovias Imigrantes e Anchieta, e ainda no município de Embu.

O segundo processo assinalado é representado pela intensa atividade imo-biliária como decorrência do parcelamento do solo para fins de lazer, nos muni-cípios de Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra, Juquitiba e Mairiporã, conforme aanálise da dinâmica de uso e ocupação do solo, efetuada por mapeamento

Tabela IX – Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – relação dosempreendimentos a atividades aprovados por tipo de uso (1976-85)

Loteamentos Uso industrial Uso terciárioANOS (1) nº de Superfície Área nº de Superfície Área nº de Superfície Área

média média médialoteamentos (ha) do lote Empreendimentos (ha) do lote Empreendimentos (ha) do lote

1976 14 758,10 0,00 23 71,60 0,46 2 0,56 0,091977 4 149,70 0,00 5 6,70 1,34 1 0,05 0(2)1978 9 442,80 1,00 23 109,60 1,68 19 14,8 0,91979 25 1.179,70 0,52 19 23,00 1,21 36 179,0 4,41980 13 1.297,70 0,50 8 623,00 (3) 2,96 10 2,0 0,51981 22 725,37 0,51 11 53,35 4,85 19 24,0 2,71982 25 655,15 0,53 8 11,57 1,45 8 2,4 3,41983 4 265,98 0,70 3 5,72 1,91 11 3,7 11984 1 22,94 0,70 4 1,35 0(2) 9 5,93 11985 14 414,94 0,46 5 16,90 0(2) 20 21,13 3,6

Fonte: Marcondes, M. J. A, 1995.Fonte básica: Emplasa – Projeto 4.133 – revisão da legislação referente a mananciais – e Projeto 7.301– análise técnica das tendências de crescimento em APM, s.d.(1) A informação não estava disponível na Secretaria do Meio Ambiente para os anos compreendidosentre 1986 e 1991.(2) Sem informação.(3) Desse total, 602 (ha) referem-se a uma única indústria.

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em escala sub-regional (1:25.000), com especificação dos diferentes usos dosolo implantados nos subperíodos estabelecidos. Nos municípios citados ve-rificamos que foi possível, na década de 1970, na área de proteção dos ma-nanciais, a viabilização do parcelamento do solo em grandes lotes(comumente em chácaras de recreio). Tais processos internalizavam o exce-dente econômico gerado na economia para a formação de rendas fundiáriasurbanas.

A ocupação verificada ao longo do eixo Suzano–Ribeirão Pires conecta-seno mesmo período com a interligação viária Ribeirão Pires–Riacho Grande, vindoa constituir um vetor de intensa pressão da urbanização oriunda da região doABC, formada por Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul.Essa ocupação ocorreu, em sua maior parte, de forma legal, conforme listageme localização dos empreendimentos (loteamentos e indústrias) aprovados. A as-sociação se deu entre uso industrial e loteamentos em áreas ocupadas anterior-mente por atividades rurais.

Esses processos refletem os mesmos mecanismos do mercado fundiário daRegião Metropolitana de São Paulo na década de 1970, sendo tanto a clandesti-nidade como a intensificação da atividade imobiliária das áreas protegidas paraatividades de lazer traduções de um mesmo movimento, isto é, a geração de rendafundiária urbana em face da intensa valorização da terra no período considerado.

Também consideramos parte integrante dessa questão a ocupação periféricano chamado ABC expandido, em que se incluíram Ribeirão Pires e Mauá. Apossibilidade de aquisição de terrenos mais baratos em locais mais distantes via-bilizou o atendimento às exigências da legislação de proteção dos mananciais, fatoreiterado pelo número de empreendimentos aprovados no município de RibeirãoPires.

A ocupação ilegal de terras, intensificada nesse período, direcionou-se,principalmente, para a zona sul do município, em áreas públicas. Mais da meta-de das favelas implantadas entre 1974 e 1980 localizavam-se nessa região – fo-ram duzentas e oitenta e cinco favelas; na área de mananciais surgiram cento edezessete novas favelas, com 9.328 domicílios, em áreas ribeirinhas remanescen-tes dos loteamentos, como as sub-bacias rio das Pedras, rio Bonito e Guavirutuva,ou ainda em áreas de encostas.

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Tabela X – Cidade de São Paulo , área de mananciais – distribuição de favelaspor tempo de ocupação (1965-91)

Situação de propriedade Até 1965 1965-74 1974-77 1977-80 1980-85 1985-90 1991 Total

Total de favelas 20 91 68 49 59 11 0 298Total de domicílios 3.123 8.880 6.857 2.471 2.479 741 0 24.551Municipal 13 75 60 42 48 7 0 245Estadual 1 0 1 1 4 0 0 7Federal 1 0 0 0 0 0 0 1Particular 2 4 3 4 3 2 0 18Público/Privado 3 8 3 1 5 1 0 21Municipal/Estadual 0 3 1 0 1 0 0 5Municipal/Federal 0 0 0 1 0 0 0 1Sem informação 0 1 0 0 0 1 0 2

Fonte: Marcondes, M. J. A., 1995.Fonte básica: PMSP – Sehab – Habi/Fipe, 1994.

Tabela XI – Cidade de São Paulo, área de mananciais – bacia Billings – distribuição defavelas por tempo de ocupação (1965-91)

Situação de propriedade Até 1965 1965-74 1974-77 1977-80 1980-85 1985-90 1991 Total

Total de favelas 11 29 30 21 26 6 0 123

Total de Domicílios 725 3.002 4.220 1.097 1.372 510 0 10.926

Municipal 7 21 2 618 21 3 0 672

Estadual 1 0 0 0 1 0 0 2

Federal 1 0 0 0 0 0 0 1

Particular 2 2 2 3 2 2 0 13

Público/Privado 0 4 1 0 2 0 0 7

Municipal/Estadual 0 2 1 0 0 0 0 3

Municipal/Federal 0 0 0 0 0 0 0 0

Sem informação 0 0 0 0 0 1 0 1

Fonte: Marcondes, M. J. A., 1995.Fonte básica: PMSP – Sehab – Habi/Fipe, 1994.

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As faixas ao longo dos corpos d’água (20 m de largura para os cursos e50 m para os reservatórios e áreas com declividade média superior a 60%), fo-ram consideradas de primeira categoria, de acordo com a legislação de proteçãodos mananciais. Contudo, não acreditamos que esses dispositivos legais tenhamsido os responsáveis pela ampliação do número de favelas em mananciais.

A análise do processo histórico de formação de favelas no municípiode São Paulo leva-nos a constatar que a incidência dessa forma de habitaçãosempre ocorreu em áreas similares às faixas de primeira categoria da legisla-ção de proteção dos mananciais, pois as áreas ribeirinhas ou muito íngremescomumente eram reservadas como áreas do sistema de lazer nos projetos deparcelamento do solo, assim como já eram objeto de restrições ao uso e ocu-pação pela legislação ambiental existente. Para que se tenha dimensão desseaspecto, citamos a propósito os levantamentos da Secretaria do Planejamentodo Município de São Paulo sobre os 32 milhões de m2 de terrenos que fo-ram doados para a construção de praças ao longo dos cem anos de processode urbanização. Desse estoque de terrenos, aproximadamente 10 milhões dem2 encontram-se ocupados por favelas (Sempla, s.d.).

A esse respeito a questão dos mananciais apresenta algumas particularida-des, visto que no debate acerca da revisão da legislação, por exemplo, semprese apontaram as intensas invasões de glebas nas áreas de mananciais como conse-qüência do processo de aplicação da lei de proteção. Essa polêmica, entretanto,

Tabela XII – Cidade de São Paulo, área de mananciais – bacia do Guarapiranga –distribuição de favelas por tempo de ocupação (1965-91)

Situação de propriedade Até 1965 1965-74 1974-77 1977-80 1980-85 1985-90 1991 Total

Total de favelas 9 62 38 28 33 5 0 175

Total de Domicílios 2398 5878 2637 1374 1107 231 0 13625

Municipal 6 54 34 24 27 4 0 149

Estadual 0 0 1 1 1 0 0 3

Federal 0 0 0 0 0 0 0 0

Particular 0 2 1 1 1 0 0 5

Público/Privado 3 4 2 1 3 1 0 14

Municipal/Estadual 0 1 0 0 1 0 0 2

Municipal/Federal 0 0 0 1 0 0 0 1

Sem informação 0 1 0 0 0 0 0 1

Fonte: Marcondes, M. J. A., 1995.Fonte básica: PMSP – Sehab – Habi/Fipe, 1994.

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não foi travada em torno das alterações do Código Florestal em 1989, quando sedeterminaram medidas até mais rígidas que a legislação de mananciais em rela-ção ao aspectos de preservação dos espaços ao longo dos córregos e da vegeta-ção em áreas urbanas.

Com relação aos compartimentos considerados non aedificandi, cabe apontarque a maior parte desses espaços já eram protegidos por legislação correlata, econtinuam sendo, agora pela lei de parcelamento do solo, promulgada três anosdepois (Lei 6.766/79), e pela legislação ambiental editada mais tarde.

Segundo a legislação de mananciais, ficaram proibidos os assentamen-tos em encostas com declividades superiores a 60 graus – a lei deparcelamento fala em 30% (salvo se forem tomadas medidas adequadas), e oCódigo Florestal, em 45%. Assim como esse, há outros aspectos polêmicosmais restritivos que dispõem de legislação correlata, tal como aobrigatoriedade da preservação das faixas dos córregos.

A intensidade do processo de irregularidade e clandestinidade da ocupaçãodo solo nas regiões de proteção dos mananciais deve ser entendida no quadromais amplo da desqualificação das áreas urbanas, produzindo uma extensa pai-sagem de habitações precárias, compreendida entre os lagos Billings e Guara-piranga, com as favelas Cocaia, Alto da Alegria, Nova Grajaú, Jardim Marilda,entre outras, na Billings; e Nakamura, Alto da Riviera, Sete de Setembro, SãoJosé, Cidade Dutra, entre outras, na bacia de Guarapiranga.

Nos demais municípios da região metropolitana, a criação de novas fave-las intensificou-se. Esse incremento se deu de forma mais acentuada, nesse pe-ríodo, no vetor sudeste; há, pois, uma relação entre a proximidade de regiões comoferta de empregos e a área de mananciais. Nos municípios do vetor sudestehavia, em 1980, quarenta e nove favelas em São Bernardo do Campo, vinte ecinco em Santo André, vinte e três em Diadema e quinze em Mauá.

Em face do que expusemos até aqui, podemos caracterizar o processo deocupação clandestina do solo em áreas de proteção dos mananciais no vetor suldo município de São Paulo, na região do ABC31 expandido e em Embu. No pe-ríodo de 1977 a 1980, portanto, esse processo esteve restrito mais diretamente àsáreas de influência do uso industrial e em áreas públicas.

Os processos de segregação urbana e social intensificaram-se nessas áre-as com a baixa qualificação do solo em termos de infra-estrutura urbana. Tal si-tuação se institucionalizou na década por causa das restrições em investimentospúblicos nas áreas de proteção dos mananciais, ou seja, para cumprir requi-sitos legais, com a proibição de instalação da rede de esgotos em áreas deClasse C, ou proveniente de políticas públicas, as quais direcionaram os in-vestimentos para outras regiões da metrópole em nível regional.

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Não se quer dizer com isso que o poder público ou privado tivessefeito investimentos nas áreas urbanas contidas no limites de mananciais, so-bretudo em infra-estrutura, de modo a gerar um padrão urbano mais qualifica-do nessas áreas, seria viabilizada a proteção ambiental da região. A experiên-cia histórica nos mostra a intensa correlação entre infra-estrutura eadensamento das áreas, com efeitos totalmente adversos em relação aos ob-jetivos da conservação dos recursos ambientais.

Gostaríamos de salientar que a legislação de proteção dos mananciais,ao determinar um modelo de uso e ocupação de solo fundamentado em umavisão técnica e sanitarista das questões urbanas, não enfrentou os problemasda produção periférica do espaço na metrópole. Ao contrário, a periferizaçãodo espaço, que se deu em virtude da ausência de infra-estrutura urbana, emáreas cada vez mais distantes do centro urbano, confirmou-se com a referidalegislação nas regiões sul e sudeste do município.

Em meados da década de 1970, inviabilizou-se o perfil do uso do soloesboçado na região situada entre os lagos nos vetores sul do município de SãoPaulo, desde a experiência inacabada da implantação dos loteamentos de baixadensidade demográfica, na década de 1950, em Interlagos e nos que surgiramposteriormente na margem esquerda da represa do Guarapiranga, como o RivieraPaulista. Esses loteamentos foram implantados com formas de ocupação do solomais compatíveis com a preservação dos mananciais, de maneira a aproveitar opotencial paisagístico da região, que hoje convive com uma intensa expansãoperiférica e predatória, sobretudo, na região que circunda os lagos Billings eGuarapiranga.

Acreditamos que a incompatibilidade entre as demais políticas públicassetoriais para a região e os objetivos da proteção ambiental também pode tercondicionado as formas de produção do espaço nos vetores sul e sudeste. Comoexemplo, citaríamos a legislação de zoneamento industrial e a operação ener-gética, com a reversão das águas dos rios Tietê e Pinheiros, que derivou nos anossetenta para o Reservatório Billings 270 m3/s das águas poluídas do Tietê, a fimde gerar energia elétrica em Cubatão.

Há ainda outro aspecto, que se refere à irregularidade da ocupação do solonos parcelamentos do solo direcionados à população de renda mais elevada. Foio que ocorreu em Mairiporã, com a abertura de loteamentos com lotes de gran-des dimensões para chácaras residenciais e de recreio. Esse município teve umaexpansão urbana de 1.065 ha entre os anos de 1977 e 1980 na área de mananci-ais, sendo que contava, em 1977, com número expressivo de loteamentos aber-tos e não ocupados, conforme o levantamento aerofotogramétrico demonstrou. Apaisagem existente, a presença de eixos viários indutores de expansão urbana, tais

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como a estrada Guarulhos–Mairiporã, a rodovia Fernão Dias, a estrada SantaInês e a Nova Cantareira, criaram possibilidades de geração de rendas fundiárias,provocando o intenso parcelamento do solo, num processo que vinha se desen-volvendo desde a década de 1950, como observa Langenbuch (1971, p. 247).

A irregularidade e a clandestinidade nesse vetor norte também estiverampresentes, no que diz respeito às formas de apropriação dos recursos naturaise de ocupação do solo. A Tabela IX, relativa à superfície dos empreendimen-tos aprovados em área de proteção dos mananciais, apresenta uma superfíciede 186,4 ha aprovados para loteamentos em Mairiporã. Essa indicação nosinforma da clandestinidade do parcelamento nesse município, considerando-sea magnitude da área urbanizada no período e os informes referentes aos empre-endimentos autuados pela Divisão de Fiscalização dos Mananciais.

O parcelamento do solo em Mairiporã reitera um processo de resistênciaaos instrumentos legais característicos da produção do espaço metropolitano aolongo do século. Embora em conformidade com a legislação de proteção dosmananciais no que tange à área dos lotes, a urbanização ocorreu irregularmen-te; verificaram-se também formas irracionais de implantação dos parcelamentosdo solo, com a conseqüente degradação da paisagem.

Na região em análise, no período comprendido entre 1977 e 1980, aquestão ambiental não se sobrepôs ao problema social, à pauperização da po-pulação e às condições de vida; ela evidenciou, no entanto, as relaçõesconflituosas entre urbanização e meio ambiente, em decorrência de formas ir-racionais de apropriação privada de recursos naturais – no caso, da vegetação– e conseqüentemente da qualidade das águas dos mananciais hídricos da baciado Juqueri, apesar de toda a legislação existente.

É interessante observar, entretanto, que nos municípios limítrofes, forada área de proteção dos mananciais, como Francisco Morato, Caieiras e Francoda Rocha, os incrementos da área urbanizada foram elevados, respectivamentede 776 ha, 388 ha e 632 ha. As taxas de crescimento da população também oforam: em Francisco Morato, entre 1980 e 1990, da ordem de 9,77%, absor-vendo em geral populações de baixa renda, com exceção de Caieiras, onde seobserva a presença de chácaras de recreio fora do perímetro de mananciais.

A legislação de proteção dos mananciais no vetor norte, ao contrário dosvetores sul e sudeste, institucionalizou no período em questão, um padrão deocupação não-periférico – no sentido da periferia social –, com densidades ra-refeitas, abrigando extratos da população de rendas mais elevadas, enquanto oespaço produzido para as faixas de baixa renda, com grau diminuto de infra-estrutura urbana, localizava-se prioritariamente fora dos mananciais.

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Em alguns municípios não conurbados como Biritiba-Mirim eSalesópolis foi configurado o reverso do processo de urbanização ocorridono espaço metropolitano em face das transformações ocorridas nos espaçosrural e urbano na década de 1970, pois em Biritiba-Mirim observou-se umaumento da área cultivada e em Salesópolis, a manutenção do setor primáriocom as mesmas taxas referentes à produção rural do período anterior.

No período de 1980 a 1990, verificamos que o ritmo da expansão urbanana área de proteção dos mananciais foi diferenciado ao longo da década. De fato,a superfície total urbanizada a partir de 1985 foi de 73,62 km2, o dobro da veri-ficada nos primeiros cinco anos do decênio, que perfez 34,94 km2 (ver TabelaVIII). Por outro lado, iniciou-se uma outra dinâmica do uso e ocupação do solo emmananciais, muito distinta das diretrizes e normas estabelecidas na legislação.

De acordo com a Tabela IX referente aos empreendimentos aprovadospor tipo de uso, 22,06 km2 foram aprovados entre os anos de 1981 e 1985para sessenta e seis parcelamentos do solo em loteamentos residenciais, trintae dois empreendimentos industriais e sessenta e sete deles voltados ao usoterciário. Esses dados indicam uma diminuição das superfícies parceladas, poiso número de empreendimentos para loteamentos residenciais é praticamenteigual ao do período anterior, traduzindo a desaceleração do mercado imobili-ário com relação aos empreendimentos com grandes lotes, situação reiteradapela análise da carta da evolução do uso do solo (escala 1:25.000). Assim, aconfiguração do modelo de ocupação do solo voltado para a implantação dechácaras residenciais e de recreio sofreu uma retratação, e as áreas de proteçãodos mananciais no quadrante sudoeste, sobretudo Embu-Guaçu, Embu eItapecerica da Serra, assumiram nesses anos a posição de municípios-dormitó-rios, passando a sofrer dos problemas urbanos e ambientais característicos daregião sul do município de São Paulo e dos municípios do vetor sudeste.

Nesses municípios, a evolução da população residente por municípios eregiões, no período em foco, apresentou taxas anuais de crescimentopopulacional entre 4% e 5%, superiores, portanto, à taxa anual de crescimentodemográfico médio da metrópole.

O município de Mairiporã continuou apresentando intenso ritmo de parce-lamento do solo, correspondendo a 7,80 km2 da área urbanizada nos mananciaisentre os anos de 1980 e 1985. O parcelamento do solo deu-se ao longo da rodo-via Fernão Dias e das linhas de drenagem que recortam o município, num pro-cesso irracional de parcelamento e de ocupação da serra da Cantareira, constan-do vinte e seis autuações nos primeiros cinco anos do decênio em referência,conforme se verifica na Tabela XIII referente aos loteamentos autuados.

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Tabela XIII – Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – relação dosempreendimentos e atividades autuados por tipo de uso (1978-91)

MUNICÍPIOS Loteamentos, Residência Construções Construções Movimento de Mineração Construções TotalREGIÕES e Conjuntos residenciais (1) comerciais terra industriais

Centro 104 181 42 11 30 15 44 427São Paulo 104 181 42 11 30 15 44 427Osasco 0Noroeste 0 0 0 0 0 0 0 0Carapicuíba 0Barueri 0Cajamar 0Santana do Parnaíba 0Pirapora do Bom Jesus 0Oeste 0 0 0 0 0 0 0 0Cotia 0 0 0 0 0 0 0 0Vargem Grande Paulista 0 0 0 0 0 0 0 0Itapevi 0 0 0 0 0 0 0 0Jandira 0Sudoeste 58 41 32 4 45 15 28 223Taboão da Serra 0Itapecerica da Serra 18 26 17 2 11 8 11 93Embu 5 13 5 0 12 1 13 49Embu-Guaçu 14 2 5 1 9 3 3 37Juquitiba 21 0 5 1 13 3 1 44São Lourenço da Serra 0Sudeste 45 106 23 29 12 6 23 244Santo André 3 1 0 0 0 0 0 4São Bernardo do Campo 22 17 10 5 4 0 13 71São Caetano do Sul 0Mauá 4 0 0 0 0 0 0 4Diadema 5 2 1 0 0 0 0 8Ribeirão Pires 10 86 11 24 6 3 8 148Rio Grande da Serra 1 0 1 0 2 3 2 9Leste 29 1 5 5 6 7 4 57Mogi das Cruzes 5 1 0 0 3 0 1 10Suzano 7 0 3 1 0 0 1 12Poá 0 0 0 0 0 0 0 0Itaquaquecetuba 0Ferraz de Vasconcelos 0 0 0 0 0 1 0 1Guararema 0Salesópolis 4 0 2 3 2 1 0 12Biritiba-Mirim 13 0 0 1 1 5 2 22Nordeste 12 2 0 0 14 7 8 43Guarulhos 1 0 0 0 0 3 0 4Arujá 4 0 0 0 0 1 2 7Santa Isabel 7 2 0 0 14 3 6 32Norte 44 83 13 8 30 6 2 186Franco da Rocha 1 0 0 0 0 0 0 1Mairiporã 41 73 13 8 27 6 2 170Caieiras 2 10 0 0 3 0 0 15Francisco Morato 0RMSP 292 414 115 57 137 56 109 1.180

Fonte básica: Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Paulo, listagem deempreendimentos autuados (referente aos anos de 1978 a 1991); Secretaria do Meio Ambiente de SãoPaulo, listagem de empreendimentos autuados (referente ao ano de 1991).(1) Inclui sobrados e prédios de apartamentos.

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No vetor oeste, nas áreas transformadas em mananciais após 1991, com aincorporação da sub-bacia hidrográfica do córrego Vermelho ou do ribeirão daVargem Grande, também é possivel detectar um ritmo de parcelamento do solomais intenso em Cotia e em Vargem Grande Paulista, com 3,20 km2 e 3,16 km2,respectivamente, de incremento da área urbanizada. No município de Cotia, aexpansão urbana ocorreu nas proximidades de Caucaia do Alto, voltada paraloteamentos de camadas de renda mais alta. Na relação dos loteamentos aprovados,verificamos o parcelamento do solo para loteamentos nos municípios de Biritiba-Mirim e Juquitiba e a expansão nas extremidades das áreas de proteção dos ma-nanciais, voltadas ao uso recreativo e de acordo com a legislação ambiental.

Já no período de 1985 a 1990, constatamos um incremento significativoda área urbanizada, sobretudo nos municípios de São Paulo, Itapevi, SãoBernardo do Campo, Santo André, Ribeirão Pires e Mairiporã. A expansão urba-na na região sul do município de São Paulo avançou em direção a Parelheirosnuma ocupação fortemente induzida pela duplicação da antiga Estrada deParelheiros (atual Senador Teotônio Vilela), chegando até perto de EngenheiroMarsilac, em compartimentos ambientais desfavoráveis à expansão urbana.

Outra gleba ocupada ao sul do município foi a da Colônia, árearevestida por vegetação de porte significativo, quando da ocupação por movi-mentos populares dos sem-terra.32 Atualmente essa área se encontra tombada,por constituir um monumento arqueológico.

Na sub-bacia da Billings, a ocupação também alcançou grandes propor-ções com a ocupação de glebas que se encontravam, nas cotas de inundaçãomais elevadas, praticamente sobre o espelho-d’água; oitenta e cinco novosloteamentos clandestinos surgiram entre 1985 e 1990 nas sub-bacias Billings eGuarapiranga, envolvendo uma superfície de 1.053 ha: Parque Colorado, Jar-dim Baronesa, Chácara Santa Maria, CondomínioTrês Marias, Jardim NovoParelheiros, Recanto do Céu, Jardim Ideal, Condomínio Lago Azul, CidadeLuz, Condomínio Vale Verde, Jardim dos Álamos, entre outros. Os nomes dosloteamentos normalmente referenciam a paisagem do entorno.

Grande parte desses loteamentos compõe-se de glebas invadidas e pos-teriormente adquiridas pelos movimentos populares; cada novo morador recebea fração ideal da gleba, que mais tarde é subdividida em inúmeros lotes. Essafoi a solução jurídica encontrada para a venda de terrenos em áreas de manan-ciais,33 segundo registros da imprensa e a listagem das autuações dosloteamentos nos vetores sul e sudeste da região metropolitana.

De fato, processo semelhante pôde ser verificado nos municípios do vetorsudeste, sobretudo em São Bernardo do Campo, Santo André e Ribeirão Pires,com um incremento no período de 8,24 km2, 4,78 km2 e 4,08 km2, respectivamen-

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te, em áreas não integradas ao processo de urbanização, inadequadas à ocupaçãourbana e com compartimentos ambientais frágeis.

A expansão urbana nesses municípios resultou, principalmente, da pro-dução periférica do espaço pelas populações de baixa renda. Em São Bernardodo Campo, a expansão se deu na direção sul, ao longo das rodovias dos Imi-grantes e Anchieta. Em Santo André, entre os reservatórios do rio Grande e dorio Pequeno, braços da Billings, partindo do espelho-d’água em direção à áreado morro do Bonilha, de 232 ha, região anteriormente ocupada por refloresta-mento e recortada por linhas de drenagem – trata-se, portanto, de área absolu-tamente inadequada à ocupação urbana do ponto de vista físico –, e em áreasdistantes da mancha urbana, próximas à serra de Paranapiacaba no municípiode Rio Grande da Serra, no núcleo urbano formado pela indústria Eletrocloroe o ramal ferroviário, em que o relevo é extremamente acidentado, imprópriopara qualquer tipo de assentamento.

Cabe ressaltar que, como não dispúnhamos do mapeamento da evoluçãoda dinâmica de uso e ocupação do solo entre os anos de 1985 a 1990, confron-tamos os dados com o mapeamento do uso do solo contido na carta de 1974.

No município de Ribeirão Pires, a urbanização ocorreu predominante-mente ao longo da ligação viária Ribeirão Pires–Suzano, numa expansão urba-na que sofreu a pressão dos municípios do ABC.

Constatamos que a superfície ocupada por loteamentos clandestinos entreos anos de 1980 e 1990 totalizou uma área de 1.637,88 ha, valor superior àmédia das superfícies ocupadas ilegalmente nos períodos anteriores, mesmo emse tratando de um levantamento amostral da PMSP – Sehab, envolvendo quatro-centos e vinte e dois processos de loteamentos abertos após 1972 (Lei 7.805/72).

Na Tabela III, verifica-se que os 1.241, 85 ha de superfície ocupada demaneira ilegal se localizavam na região sul do município de São Paulo, espe-cificamente em áreas de proteção dos mananciais. Embora não disponhamosde informações sobre a ilegalidade nos outros municípios, a correlação entreos informes referentes à expansão da área urbanizada e a superfície legalmenteaprovada para loteamentos indica a incidência desse processo também no vetorsudeste e em partes do vetor sudoeste.

Ainda de acordo com a Tabela III, um número significativo de autuaçõesfoi dirigido às próprias administrações municipais, sobretudo à de São Bernardodo Campo na década de 1980, quando a prefeitura desse município adquiriuglebas em mananciais para a construção de conjuntos populares. Esse preceden-te foi aberto pela prefeitura de São Paulo em 1985, com a construção dos con-juntos habitacionais Bororé I, II e III, envolvendo 2.642 unidades, construídaspela Cohab – PMSP na zona sul do município, na sub-bacia da Billings.

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Os responsáveis por essa prática no poder público municipal se justifica-vam alegando que, com os baixos custos da terra das áreas de mananciais, seriapossível equacionar a questão social. Tais custos, porém, não incluíam os inves-timentos em urbanização – pois não raro eram glebas distantes da áreaurbanizada e sem infra-estrutura urbana – , tampouco o fator indutor desses em-preendimentos e, principalmente, o cumprimento da legislação competente.34

O conflito de interesses entre as diversas esferas do governo tem pautadoa aplicação da legislação de proteção dos mananciais (ver Capítulo 2), emer-gindo os ônus que os mananciais representam para os municípios contidos nasáreas protegidas, com a estagnação das receitas orçamentárias e intensificaçãodas demandas sociais. Contudo, essa questão tem tomado outros contornos nopresente, visto que as instâncias municipais têm incorporado os interesses deâmbito regional com a formação de consórcios municipais e dos comitês debacias hidrográficas.

Juntamente com os loteamentos clandestinos, a irregularidade teve umpapel preponderante na estruturação do espaço em áreas de mananciais, emvirtude da prática do desmembramento dos lotes aprovados segundo os dita-mes da legislação. Isso significa que os lotes projetados eram subdivididos nafase de implantação do parcelamento, através da venda de cotas ou fraçõesideais não da gleba, mas do lote (500 m2 em Classe A e entre 1.500 a 10.000m2 nas demais classes).

A desvalorização dos terrenos em áreas de mananciais implica, do pontode vista da teoria de renda fundiária, a impossibilidade de apropriação das ren-das pelos investimentos públicos, produzindo terrenos diferenciados. O preçoda terra equivale ao preço da terra rural, Representado pela renda fundiáriaabsoluta, proveniente da condição da propriedade da terra, sem os rendimentosauferidos pelos investimentos públicos ou privados.

O processo histórico de formação e retenção de vazios urbanos à esperada valorização imobiliária foi rompido com a promulgação do instrumento le-gal que coibiu esses investimentos. Esse processo, no entanto, foi evidenciadonos vetores sul e sudeste e parcialmente no vetor sudoeste. No vetor norte, aocupação periférica de baixa renda ocorreu fora da área de proteção dos ma-nanciais, até os anos noventa. Isso é explicado, possivelmente, pela naturezadiferenciada do espaço nesse último vetor em face da consolidação de usossem finalidades urbano-industriais.

Conforme análise desenvolvida por Grostein (1987) e Rolnik (1998),para o município de São Paulo, a prática das anistias dos loteamentos irregula-res e/ou clandestinos por parte do poder público foi um processo comumenteutilizado ao longo do século.

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Até o presente, as áreas de proteção dos mananciais, entretanto, não fo-ram objeto de regularização do solo. A lei municipal 11.775, de maio de 1995,autorizou a regularização de parcelamentos do solo implantados a partir de1972, contudo não incluiu os loteamentos irregulares das áreas de proteção dosmananciais, apesar da forte pressão exercida pela Câmara Municipal a favor dainclusão dessas áreas.

A questão das edificações irregulares foi retomada quando do estabele-cimento de diretrizes e normas para a proteção das bacias hidrográficas dosmananciais de interesse regional do estado de São Paulo, aprovadas em 1997,com a delimitação das áreas de recuperação ambiental.

Concluindo sobre a questão da especificidade da irregularidade e daclandestinidade nos mananciais, observa-se a tradução direta nessas áreas dasdiferentes situações socioeconômicas vigentes no período de 1965 a 1990,devendo ser matizado em diferentes conjunturas o longo e excludente períodoque se abre em 1964, pois verificamos várias nuances nas formas de produçãodos espaços nesse período.

O parcelamento do solo em grandes lotes (comumente em chácaras de re-creio) situados em áreas de proteção dos mananciais começou a ser viabilizadona década de 1970, por intermédio de um processo que internalizava o exceden-te econômico gerado na economia para a formação de rendas fundiárias urba-nas, mesmo nos vetores sul, sudoeste e parcialmente no sudeste. Contudo, talprocesso foi interrompido na década seguinte nesses vetores.

Já nos anos setenta, esboçava-se essa dinâmica de uso e ocupação dosolo nas áreas contidas nos vetores mencionados a ser implementada nos anosseguintes. Essas áreas sofriam então os efeitos polarizadores da metrópole e asformas de ocupação do espaço, resultantes do modelo econômico vigente, como afluxo de contingentes populacionais por meio dos conhecidos processos deurbanização – periferização – segregação social.

Na década de 1980, marcada por profundos processos de exclusão sociale por crises econômicas, reverteu-se a tendência de implantação de grandes lo-tes nos mananciais. Essas regiões passaram a refletir o processo de dualizaçãosocial, configurando-se em ilhas de exclusão social. A desqualificação dessasáreas para usos urbanos, a proibição de instalação de sistemas públicos de águae de esgotos sanitários nas áreas inseridas nas classes C (artigo 22 da Lei 1.172/76) – que representam a quase totalidade da superfície protegida –, bem como aausência de investimentos no setor viário, caracterizam emblematicamente taisregiões, seguindo-se a isso a impossibilidade de obtenção das rendas diferenciaisurbanas, geradas pelos investimentos públicos nos vetores sul, sudeste e, pos-teriormente, no vetor sudoeste do município, medidas por meio das quais o ter-

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ritório foi redesenhado, interferindo nos processos de segregação espacial e so-cial intensificados nessas áreas.

A configuração das áreas de mananciais como ilhas de exclusão socialevidencia-se claramente na pesquisa realizada pela Pontifícia Universidade Cató-lica de São Paulo (Sposati, 1996) sobre o mapa da exclusão/inclusão social dacidade de São Paulo sobre uma base de dados de 1991. Essa pesquisa revelou queo distrito de Marsilac, inserido em área de mananciais, tem o mais baixo índicede qualidade de vida e também o de mais baixa qualidade ambiental dos domi-cílios.35 Ao distrito de Parelheiros, também situados nos mananciais, foi atribuí-do o quarto menor índice dos referidos parâmetros entre os noventa e seis distritosda cidade de São Paulo.

A proximidade desses vetores com os núcleos industriais de Santo Amaroe da região do ABC potencializa a pressão pela urbanização, situação reiteradapela promulgação das Zonas de Uso Predominantemente Industriais próximas oumesmo contíguas às áreas de mananciais, dando os contornos físicos e sociaisdesses vetores. Tais contornos são bastante distintos dos objetivos da preserva-ção dos recursos naturais, a exemplo das áreas contidas nos vetores leste, nordestee norte.

Assim, podemos observar a especificidade da ocupação irregular e clandes-tina das áreas de proteção dos mananciais, sobretudo, nas formas de equacio-namento da situação fundiária das glebas, onde o invasor (e posterior adquirente)e o proprietário da gleba parecem conviver com essa alternativa. O quadro ela-borado sobre a superfície ocupada ilegalmente no município de São Paulo após1972 aponta para o fato de a solução da moradia na década ter sido equacionada,em parte, no tripé periferia – autoconstrução – loteamento clandestino em ma-nanciais.

O impacto do controle ambiental na localização industrial

Na legislação do zoneamento industrial metropolitano (Lei 1.817/78 e suasatualizações), procurou-se traçar o perfil industrial da metrópole, partindo daclassificação das zonas de uso e dos estabelecimentos industriais. Objetivava-se, com esse procedimento,delimitar as localizações possíveis desses estabe-lecimentos segundo zonas compatíveis, com uma classificação em ordemdecrescente de restrição. É no escopo dessa legislação, em que as áreas de

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mananciais são definidas como reserva ecológica, é que encontramos a re-gulamentação do uso industrial nos mananciais e o estabelecimento das cate-gorias dos usos industriais possíveis e as respectivas normas para olicenciamento dessa atividade.

De acordo com a legislação de mananciais, admite-se nas faixas de se-gunda categoria o uso industrial, consoante a relação de indústrias permitidaspela Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Ambiental, Cetesb.Assim, a análise do impacto do controle ambiental nos processos de localiza-ção industrial deve ser realizada por meio do cotejo entre essas duas legisla-ções, levando-se em conta, sobretudo, a industrial.

A principal questão que surge no tocante à aplicação dos instrumentos le-gais já mencionados diz respeito aos impactos possíveis nos processos de estru-turação do espaço urbano-regional e, mais especificamente, no papel desempenha-do pela legislação dos mananciais nos processos de reestruturação da base eco-nômica da metrópole, os quais redefiniram o perfil funcional dessa região, sobre-tudo o da cidade de São Paulo, direcionando-a ao setor terciário, incluindo oterciário superior que refere-se às atividades e tecnologias ligadas à circulação eao tratamento da informação e o que vem sendo chamado terciário produtivorelacionado aos serviços destinados à produção. O impacto das legislações queregulamentam a localização e o controle das indústrias é considerado significa-tivo, tendo em vista que em geral a implantação dessa atividade é realizada como cumprimento das exigências legais, ao contrário dos processos de parcelamentodo solo para loteamentos habitacionais.

A problemática aqui delimitada é também recortada pela emergência dasustentabilidade das metrópoles e pelos estilos de desenvolvimento que surgiramapós meados da década de 1970, com reflexos diretos nos padrões de cres-cimento urbano.36

Nossa análise dos indicadores industriais foi dividida em subperíodos. Noprimeiro período, que cobre os anos de 1974 a 1980, destaca-se o processode perda de participação da metrópole paulista em relação aos principais in-dicadores da produção industrial, constituídos pelo valor da transformaçãoindustrial, o número de estabelecimentos e o número de empregos gerados,se comparados com os indicadores do interior paulista e das demais regiõesdo país, sobretudo a capital paulista (ver Tabela XIV).

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Tabela XIV – Região Metropolitana de São Paulo – número deestabelecimentos industriais (1960-85)

MUNICÍPIOS – 1960 1970 1975 1980 1985REGIÕES nº abs. % nº abs. % nº abs. % nº abs. % nº abs. %

Centro 14.576 84,76 20.838 80,81 25.901 79,83 32.396 78,12 23.883 76,11São Paulo 14.576 84,76 20.543 79,66 25.444 78,42 31.732 76,52 23.425 74,65Osasco 0 0,00 295 1,14 457 1,41 664 1,60 458 1,46Noroeste 71 0,41 259 1,00 287 0,88 477 1,15 462 1,47Carapicuíba 0 0,00 76 0,29 82 0,25 137 0,33 93 0,30Barueri 41 0,24 84 0,33 92 0,28 184 0,44 210 0,67Cajamar 7 0,04 28 0,11 38 0,12 69 0,17 70 0,22Santana do Parnaíba 13 0,08 31 0,12 44 0,14 54 0,13 58 0,18Pirapora do Bom Jesus 10 0,06 40 0,16 31 0,10 33 0,08 31 0,10Oeste 171 0,99 150 0,58 262 0,81 393 0,95 326 1,04Cotia 165 0,96 106 0,41 200 0,62 248 0,60 183 0,58Vargem G. Paulista (1) 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 31 0,10Itapevi 6 0,03 30 0,12 34 0,10 74 0,18 69 0,22Jandira 0 0,00 14 0,05 28 0,09 71 0,17 43 0,14Sudoeste 175 1,02 494 1,92 520 1,60 666 1,61 480 1,53Taboão da Serra 49 0,28 58 0,22 110 0,34 195 0,47 209 0,67Itapecerica da Serra 67 0,39 228 0,88 178 0,55 161 0,39 74 0,24Embu 59 0,34 83 0,32 99 0,31 168 0,41 125 0,40Embu-Guaçu 0 0,00 114 0,44 109 0,34 115 0,28 46 0,15Juquitiba 0 0,00 11 0,04 24 0,07 27 0,07 26 0,08São Lourenço da Serra 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00 0 0,00Sudeste 1.236 7,19 2.255 8,74 3.468 10,69 4.549 10,97 3.825 12,19Santo André 457 2,66 781 3,03 1.048 3,23 1.187 2,86 903 2,88São Bernardo do Campo 284 1,65 589 2,28 1.077 3,32 1.296 3,13 1.061 3,38São Caetano do Sul 262 1,52 468 1,81 586 1,81 700 1,69 523 1,67Mauá 84 0,49 110 0,43 236 0,73 304 0,73 212 0,68Diadema 37 0,22 198 0,77 381 1,17 870 2,10 971 3,09Ribeirão Pires 112 0,65 100 0,39 119 0,37 163 0,39 134 0,43Rio Grande da Serra 0 0,00 9 0,03 21 0,06 29 0,07 21 0,07Leste 356 2,07 688 2,67 697 2,15 1.039 2,51 881 2,81Mogi das Cruzes 134 0,78 229 0,89 251 0,77 365 0,88 289 0,92Suzano 59 0,34 179 0,69 214 0,66 260 0,63 174 0,55Poá 30 0,17 33 0,13 61 0,19 72 0,17 77 0,25Itaquaquecetuba 74 0,43 107 0,41 79 0,24 179 0,43 193 0,62Ferraz de Vasconcelos 25 0,15 61 0,24 45 0,14 102 0,25 82 0,26Guararema 27 0,16 58 0,22 25 0,08 33 0,08 48 0,15Salesópolis 7 0,04 14 0,05 13 0,04 16 0,04 11 0,04Biritiba-Mirim 0 0,00 7 0,03 9 0,03 12 0,03 7 0,02Nordeste 486 2,83 837 3,25 1.113 3,43 1.657 4,00 1.343 4,28Guarulhos 453 2,63 720 2,79 955 2,94 1.516 3,66 1.226 3,91Arujá 18 0,10 43 0,17 52 0,16 68 0,16 57 0,18Santa Isabel 15 0,09 74 0,29 106 0,33 73 0,18 60 0,19Norte 125 0,73 267 1,04 197 0,61 291 0,70 178 0,57Franco da Rocha 26 0,15 54 0,21 53 0,16 53 0,13 48 0,15Mairiporã 83 0,48 132 0,51 69 0,21 128 0,31 59 0,19Caieiras 16 0,09 52 0,20 49 0,15 75 0,18 58 0,18Francisco Morato 0 0,00 29 0,11 26 0,08 35 0,08 13 0,04RMSP 17.196 100,00 25.788 100,00 32.445 100,00 41.468 100,00 31.378 100,00

Fonte Básica: IBGE, censos industriais do estado de São Paulo, 1960-1970-1975-1980 e 1985.

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O processo delineado acima não configura uma desindustrialização dametrópole, mas sim o início de uma reestruturação urbano-industrial, que sefirmou nos anos oitenta, conforme a bibliografia consultada.37

As interpretações que têm sido utilizadas para explicar esse processo naliteratura econômica baseiam-se na noção de desconcentração industrial. Esseconceito, por sua vez, se fundamenta na reversão da polarização associada àsdeseconomias de aglomeração geradas a partir da intensificação da industrializa-ção e da urbanização. A desconcentração é incentivada através de medidas depolíticas públicas reorientadas, com estímulos à atividade industrial em determi-nadas regiões (principalmente em nível federal) ou às de controle ambiental (emnível estadual), no contexto do II Plano Nacional de Desenvolvimento. A lei deproteção dos mananciais e a de indústrias inseriram-se nesse contexto.

A reversão da polarização também estaria baseada na homogeneizaçãodo espaço no que diz respeito à localização do parque fabril. Nas interpreta-ções a que nos referimos, a tendência é a da especialização funcional nosetor terciário da metrópole, sobretudo do município de São Paulo.

O movimento esboçado acima é constatado nos principais centros dos paí-ses do capitalismo avançado. Isso significa que com a alteração das condições delocalização industrial, com o avanço das telecomunicações, dos transportes e dossistemas produtivos criam-se novos espaços industriais, com padrões espaciaisnão contemplados nas teorias da localização de corte weberiano.

Haveria outro desenho para a região metropolitana, sem que a legislaçãode proteção dos mananciais reorganize os espaços, uma vez que a atividade in-dustrial é implementada de acordo com as exigências legais?

A fim de facilitar o entendimento do que será exposto a seguir, faz-se ne-cessário destacar alguns aspectos concernentes às restrições da legislação quedisciplina a atividade industrial. Em primeiro lugar, cabe ressaltar que, de acor-do com a legislação de mananciais, admite-se nas faixas de segunda categoria ouso industrial. Calcula-se a densidade equivalente média para essa atividade,segundo o gênero industrial e a aplicação de um fator de equivalência aonúmero de empregos a ser gerado com o empreendimento.

As maiores restrições a essa atividade provêm da legislação de zoneamentoindustrial, que definiu a área de mananciais como zona de reserva ambiental,permitindo somente a implantação de estabelecimentos industriais classificadoscomo ID, ou seja, nos quais não seja concretizada nenhuma operação de fabri-cação, apenas de montagem, com área construída de até 2.500 m2.

Ainda, a propósito da questão da reversão da polarização – em especial noque se refere à localização espacial das indústrias –, baseada nas deseconomiasde aglomeração e no impacto da legislação de proteção dos mananciais na estru-

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tura físico-territorial da metrópole, Cano (1992) identifica a questão ambiental naRegião Metropolitana de São Paulo como um dos fatores responsáveis pelo pro-cesso de desconcentração industrial verificado nessa metrópole. Torres (1993)também considera relevante, nesse processo, o papel desempenhado pela legis-lação ambiental.

Torres apresenta uma análise da dinâmica espacial da atividade industrialcorrelacionada com o controle ambiental em determinadas regiões. Levanta tam-bém algumas questões relevantes para o entendimento do binômio indústria emananciais ao discriminar a evolução dos padrões de localização dessa ativida-de em face dos três grupos de indústrias elencados – intermediárias, tecnológicase tradicionais. Para Torres, o processo de relativa desconcentração industrial daRegião Metropolitana de São Paulo que caminha na direção do seu entorno seaplica às indústrias intermediárias.

A dinâmica da localização industrial no país, a partir do II Plano Nacionalde Desenvolvimento, adotou como estratégia a continuidade do processo de subs-tituição de importações. Investiu-se maciçamente no setor das indústrias inter-mediárias, que se tornou o mais dinâmico da economia, passando a exportar, apartir de 1980, produtos metalúrgicos, de celulose, fertilizantes e minerais não-metálicos. Porém, esse grupo de indústrias apresenta alto potencial poluidor comograndes consumidoras de recursos naturais (terra, água, reservas minerais e níveisde insolação) e de energia e com um potencial maior de degradação ambiental.Para demonstrá-lo, Torres elaborou uma matriz sobre o potencial de degradaçãoambiental por gênero da indústria por meio da montagem de critérios quantitati-vos e qualitativos, classificando, assim, o potencial de impacto dos três gruposcitados.

Torres conclui que a emergência da indústria de bens intermediários con-figurada a partir de 1974, com o II PDN, gerou profundos impactos ambientais,direcionando-se esse segmento para regiões com base institucional menos desen-volvida, do ponto de vista do controle ambiental.

Para Cano, “na metrópole, além das políticas do governo federal, foramainda mais importantes alguns fatos a que se convencionou chamar de custoscrescentes de aglomeração. Ao seu lado, o progressivo fortalecimento de atividadesindical no ABC e o problema ambiental na capital desestimularam ainda maisa continuidade da concentração anterior” (1992, v. V, p. 28).

Não há dúvida de que a delimitação de áreas de reserva ambiental e oscondicionantes impostos pelas legislações de mananciais e do zoneamento indus-trial restringiram a instalação do grupo de indústrias intermediárias, consideradoo mais dinâmico da economia nas duas últimas décadas. Essa assertiva, entretanto,resultou de um conjunto de medidas de políticas públicas articuladas entre si, a

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saber a institucionalização das áreas metropolitanas e as medidas de controle dapoluição nessas áreas, culminando na desconcentração industrial. A lei de prote-ção dos mananciais e a lei de zoneamento industrial constituem apenas um dosaspectos dessas políticas reorientadoras do desenvolvimento industrial metropo-litano.

A dimensão do papel desempenhado por essas leis deve ser analisada nocontexto dos principais indicadores econômicos dos setores secundário e terciário,com referência à distribuição das atividades no interior da própria metrópole. Taisindicadores apontam a inexpressividade da participação dos municípios inseridosnas áreas de mananciais no valor da transformação industrial (VTI), levandoem conta o número de estabelecimentos e de empregos industriais, bemcomo a receita gerada nos setores do comércio e serviços e o número deestabelecimentos e de empregos gerados nesses setores. Os indicadores men-cionados são pertinentes ao conjunto da área metropolitana, com exceção dacapital, no vetor sul, e aos municípios do vetor sudeste e aos do vetor nor-deste. As alterações nos indicadores econômicos, no período de 1975 a1980, também foram inexpressivas, salientando-se apenas a variação do VTIdo município de Mauá, que passou de 1,44% em 1975 para 3,17% em 1980.

A Tabela XV, a seguir, demonstra o reduzido peso da atividade indus-trial nas áreas de proteção dos mananciais.

Tabela XV – Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais –relação de indústrias existentes (1980)

BACIA HIDROGRÁFICA Município Indústria

Billings São Paulo 157DiademaRibeirão PiresSão Bernardo do CampoRio Grande da SerraSanto André

Guarapiranga Embu 255Itapecerica da SerraSão PauloEmbu-GuaçuCotiaJuquitiba

Juquiá Itapecerica da Serra 19Juquitiba

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De acordo com a Tabela XV, no período em análise apenas quinhen-tas e sessenta e quatro indústrias se localizavam em área de mananciais, con-centradas nas sub-bacias da Billings e Guarapiranga, na zona sul do municí-pio de São Paulo, porém dispersas nas superfícies territoriais de Embu,Itapecerica da Serra, São Paulo e Embu-Guaçu (sub-bacia de Guarapiranga,com duzentas e cinqüenta e cinco indústrias), em contraste com as regiõesfora de mananciais, onde concentravam-se 31.881 estabelecimentos industri-ais em 1975.

A esse respeito cabe assinalar que as evidências do processo de estrutu-ração do espaço foram negligenciadas pela legislação de mananciais. Ao estabe-lecer um modelo de ocupação baseado em densidades demográficas a partir dasáreas urbanizadas preexistentes e da proximidade aos corpos d’água, o instrumen-to legal não contemplou os condicionantes do assentamento urbano que se apre-sentaram ao longo do processo de urbanização da metrópole.

Assim, ao não estabelecer um zoneamento de usos compatíveis consideran-do os compartimentos ambientais existentes, a localização do uso industrial se deu

BACIA HIDROGRÁFICA Município Indústria

Guaió Ferraz de Vasconcelos 12

Suzano

Mauá

Ribeirão Pires

Itapanhaú Biritiba-Mirim 2

Jundiaí Mogi das Cruzes 3

Juqueri Mairiporã 9

Taiaçupeba Suzano 30Ribeirão Pires

Tietê Mogi das Cruzes 35SalesópolisBiritiba-Mirim

Jaguari Santa Isabel 42GuararemaArujá

Total de indústrias em mananciais 564

Total RMSP 32.445

Fonte: Emplasa, Projeto 7301-043, levantamento e mapeamento das indústrias existentes em áreas deproteção dos mananciais.Fonte Básica: Emplasa (levantamento de campo). Prefeituras municipais, Receita Federal, Ministérioda Fazenda.

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em espaços rurais que contavam com acessos viários, provocando impactos am-bientais. Não se controlou a localização da atividade industrial em seus aspectosindutores da ocupação urbana, mesmo nos casos em que as normas legais foramcumpridas.

Esses dados, embora significativos no perímetro dos mananciais em facedo número de indústrias até então existentes, são inexpressivos em relação aoquantum da região metropolitana.

Outras implicações nas áreas de mananciais foram as decorrentes do não-estabelecimento de faixas de transição entre as áreas protegidas e as zonas de usoindustrial definidas em lei em perímetros contíguos aos limites das áreas de ma-nanciais. Foi o que ocorreu ao sul do município de São Paulo nas áreas próximasaos reservatórios Billings e Guarapiranga, nas Zupis categoria 1, 129, 122, 130,131; no vetor sudeste, nas Zupis categoria 1, 124, 126, 127, 146, 148, 156, bemcomo no município de Embu, com a delimitação da Zupi categoria 2, 220.

No subperíodo de 1980 a 1990, entrou em pauta uma nova discussão vol-tada para a problemática da reestruturação produtiva em curso nas economias dospaíses industrializados e para os intensos reflexos nas configurações espaciais,particularmente sobre os “novos espaços” industriais, do papel atribuído às áreascentrais nas chamadas cidades globais, que agregam elementos para a análise docontrole ambiental nos processos de localização industrial. O exame da bibliogra-fia (Storper, 1994; Lipietz, 1994; Lipietz e Leborgne, 1990, e Sassen, 1991, 1998)revela grande diversidade e abordagens divergentes sobre a natureza e a exten-são dos processos de transformação, em especial se transpusermos a discussãopara o nosso contexto.

Duas abordagens sobre as análises do papel das grandes cidades mundiaiscontemporâneas se destacam: uma primeira, focada na produção industrial, temcomo objeto de estudo a desindustrialização de certas regiões com a industriali-zação de outras, formando os novos espaços industriais, os processos de acumu-lação flexível e os desdobramentos dessas mudanças em associação com a crisedo regime fordista em novas formas especiais. A outra abordagem toma comoponto de partida a visão “pós industrial”, centrada no terciário superior e nosserviços e tecnologias que garantem o desenvolvimento e o predomínio dessasatividades.

Há consenso, entretanto, quanto à especialização de algumas cidades emdeterminadas atividades predominantes na economia ligadas às funções de co-mando e controle, ao mercado financeiro e ao desenvolvimento de uma cadeiade serviços relacionados com essas atividades. São Paulo é uma dessas cidades.No contexto da metrópole paulista, é inequívoca sua tendência à especializaçãofuncional no setor terciário. Por outro lado, segundo Torres, começa a emergir um

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ÁREA DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAISÁREA DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAISÁREA DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAISÁREA DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAISÁREA DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS

LEGENDALEGENDALEGENDALEGENDALEGENDA

ZONA DE USO INDUSTRIAL (ZUPI)ZONA DE USO INDUSTRIAL (ZUPI)ZONA DE USO INDUSTRIAL (ZUPI)ZONA DE USO INDUSTRIAL (ZUPI)ZONA DE USO INDUSTRIAL (ZUPI)

PARQUE ESTADUAL / PARQUE ECOLÓGICOPARQUE ESTADUAL / PARQUE ECOLÓGICOPARQUE ESTADUAL / PARQUE ECOLÓGICOPARQUE ESTADUAL / PARQUE ECOLÓGICOPARQUE ESTADUAL / PARQUE ECOLÓGICO

ÁREA NATURAL TOMBADAÁREA NATURAL TOMBADAÁREA NATURAL TOMBADAÁREA NATURAL TOMBADAÁREA NATURAL TOMBADA

ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTALÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTALÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTALÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTALÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL

RESERVA BIOLÓGICA / RESERVA FLORESTAL /RESERVA BIOLÓGICA / RESERVA FLORESTAL /RESERVA BIOLÓGICA / RESERVA FLORESTAL /RESERVA BIOLÓGICA / RESERVA FLORESTAL /RESERVA BIOLÓGICA / RESERVA FLORESTAL /HORTO FLORESTAL / JARDIM BOTÂNICOHORTO FLORESTAL / JARDIM BOTÂNICOHORTO FLORESTAL / JARDIM BOTÂNICOHORTO FLORESTAL / JARDIM BOTÂNICOHORTO FLORESTAL / JARDIM BOTÂNICO

ÁREA SOB PROTEÇÃO ESPECIALÁREA SOB PROTEÇÃO ESPECIALÁREA SOB PROTEÇÃO ESPECIALÁREA SOB PROTEÇÃO ESPECIALÁREA SOB PROTEÇÃO ESPECIAL

Figura 9 - Região Metropolitana de São Paulo – área de manaciais: zonas de uso industriale outras áreas ambientais.

RESERVA INDÍGENARESERVA INDÍGENARESERVA INDÍGENARESERVA INDÍGENARESERVA INDÍGENALIMITE DA REGIÃO METROPOLITANA DE S. P.LIMITE DA REGIÃO METROPOLITANA DE S. P.LIMITE DA REGIÃO METROPOLITANA DE S. P.LIMITE DA REGIÃO METROPOLITANA DE S. P.LIMITE DA REGIÃO METROPOLITANA DE S. P.

LIMITE DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS LIMITE DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS LIMITE DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS LIMITE DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS LIMITE DE PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS

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padrão de especialização regional de São Paulo, vinculado à industria tecnológica,com base nos dados dos censos industriais de 1970, 1975, 1980 e 1985. Tal proces-so também reflete na estrutura de emprego e em novas configurações espaciais.

O principal impacto desses processos nas configurações espaciais dascidades consiste na geração de alterações na estrutura produtiva, como na deempregos. Verifica-se o aumento das categorias superiores e de empregosmais qualificados nas indústrias tecnológicas e no setor terciário superior, emdetrimento das categorias menos qualificadas. Esse fato acaba por acarretar amaterialização de um processo de dualização urbana em que são marcantesos fenômenos brutais de exclusão social e de marginalização com reflexosdiretos nos padrões de ocupação do solo e da apropriação dos recursosambientais nas áreas de mananciais.

Essa discussão, ainda que controversa, levanta algumas questões sobre aspossibilidades de um controle ambiental mais efetivo no que se refere à poluiçãoindustrial nas chamadas cidades globais com a perspectiva do declínio das indús-trias tradicionais e a especialização no setor terciário e nas indústrias tecnológicas.Por outro lado, a emergência de outro padrão de estrutura produtiva característi-co da fase do pós-fordismo pode resultar numa dispersão acentuada das ativida-des industriais e em impactos ambientais nos domínios mais longínquos do meionatural, ao contrário do processo da localização industrial vigente até meados dosanos setenta, então circunscrito à área urbanizada da metrópole. O padrão “pós-fordista” a que nos referimos apresenta como características maior mobilidadeocupacional, flexibilidade gerencial, automação e terceirização dos processos detrabalho. Sua expressão espacial é a eliminação das grandes plantas industriais eo estabelecimento de pequenos e médios produtores numa cadeia de subcon-trações.

Na análise da atividade industrial na metrópole, é inquestionável a reduçãodo número de estabelecimentos industriais na região metropolitana entre osanos de 1980 a 1985:38 passou de 41.468 indústrias, em 1980, para 31.378,em 1985. Trata-se de uma queda significativa fora das regiões de proteçãodos mananciais decorrente da reestruturação da base econômica e da reorga-nização espacial dessa atividade.

No contexto dos mananciais, houve, no período considerado, também umdecréscimo da área aprovada para estabelecimentos industriais (ver Tabela IX),referente à superfície dos empreendimentos aprovados nas áreas de proteção dosmananciais. Entre os anos de 1980 a 1985, foram licenciadas trinta e uma novasindústrias, em contraposição aos setenta e oito estabelecimentos aprovados entre1976 e 1980. Esses dados mostram que a aplicação das legislações não promo-veu uma reversão da polarização da atividade industrial nos mananciais, em ra-

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zão do próprio significado inexpressivo dessa atividade nas áreas protegidas,como também não conseguiu redirecionar as indústrias que pretendiam se insta-lar nessa região.

Para uma melhor compreensão do impacto por meio de medida adminis-trativa, da legislação de mananciais na produção do espaço industrial, cabe ain-da assinalar que o órgão responsável pelo licenciamento industrial, a Cetesb, dis-pensou as microempresas do processo de licenciamento industrial do estado. 39 Aesse respeito, em análise do uso e ocupação do solo realizada no âmbito do Pro-grama Guarapiranga,40 constaram-se concentrações significativas de microindús-trias nessa área, gerando efeitos poluidores dadas a intensa aglomeração e a au-sência de controle ambiental – isso se dá porque não são objeto de licenciamento.

Estima-se que, na sub-bacia do Guarapiranga, existam hoje aproximada-mente oitocentos estabelecimentos em tais condições, configurando uma situaçãopossivelmente recortada pela problemática da renda fundiária. Os baixos preçosde terreno nos vetores sul, sudeste e sudoeste da metrópole em área de manan-ciais constituem um condicionante para o assentamento dessas atividades, quetiveram ampliação expressiva com o quadro recessivo da economia nos anos oi-tenta.

Outra possibilidade que consideramos seria a da associação entre a amplia-ção de microindústrias e os processos de reestruturação industrial, com o estabe-lecimento de uma cadeia de “subempreiteiros” e prestadores de serviços, carac-terística dos processos industriais ditados pela flexibilidade e a terceirização dosprocessos de trabalho, em contraposição à grande indústria fundamentada na pro-dução em série, na padronização e nas grandes plantas industriais. Entretanto, parao desenvolvimento de hipóteses nessa perspectiva, devem ser efetuadas análisesdos perfis industriais desses estabelecimentos.

Importante ressaltar que a dinâmica da localização industrial no próprioperímetro dos mananciais acentuou o processo de dispersão dessa atividade noespaço. Verificamos a propósito, segundo o cadastro de empreendimentos indus-triais aprovados pela Emplasa para o período compreendido entre 1976 e 1983,que a maior parte dos terrenos industriais aprovados se encontravam fora dasmanchas urbanas (nas classes definidas como B e C). Trata-se de um fato resul-tante da limitação do modelo de uso e ocupação do solo baseado em densidadese da ausência de definição de zonas de uso industrial nas áreas protegidas.

A título de conclusão, consideramos que a legislação de proteção dos ma-nanciais, em conjunção com outros instrumentos jurídico-urbanísticos, produziuimpactos nos processos de estruturação físico-territoriais, ao restringir os usosindustriais do grupo intermediário. Essa afirmação, entretanto, adquire significadosomente se partirmos da hipótese do esgotamento da superfície edificável fora dos

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limites dos mananciais para a categoria industrial intermediária. A perda da par-ticipação da metrópole paulista em relação aos principais indicadores da produ-ção industrial a corrobora.

A questão das indústrias e dos mananciais também pautou-se nesse perío-do pela definição das Zonas de Uso Predominantemente Industriais, contíguas àsáreas de mananciais. Nesse aspecto, os limites territoriais deveriam ultrapassar anoção de bacia hidrográfica, considerando a escala regional de planejamento.

As diretrizes e normas para a proteção e recuperação das bacias hidro-gráficas dos mananciais de interesse regional do estado de São Paulo, estabe-lecidas em lei promulgada em 1997, remetem aos planos de desenvolvimento eproteção ambiental a elaboração de diretrizes para a criação de programas deindução à implantação de usos e de atividades compatíveis com a proteção e arecuperação ambientais.

A experiência de aplicação das legislações específicas nos últimos vinteanos mostra a complexidade de outros aspectos da estrutura socioeconômica queinterferem na problemática do espaço, pois a implantação das indústrias compa-tíveis com a proteção ambiental não foi viabilizada nessas áreas, revelando, as-sim, os limites das estratégias da sustentabilidade ambiental.

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Notas

1. Ver a respeito CEPAL/PNUMA. Avances en la Interpretación Ambiental del DesarrolloAgrícola de América Latina. Chile, 1985; SUNKEL, O. & GLIGO, N. Estilos de Desarrolloy Medio Ambiente en la América Latina. México, Fondo de Cultura Económica, 1980;VIOLA, Eduardo J. & LEIS, Héctor. “Desordem global da biosfera e a nova ordeminternacional: o papel organizador do ecologismo”, in LEIS, H. et al. (org.). Ecologia epolítica mundial. Rio de Janeiro, Vozes/FASE/AIRI/PUC, 1991.

2. De acordo com estimativas baseadas nos trabalhos de BORGONOVI e CHIARINI (1965)e BORGONOVI (1967) sobre a evolução da cobertura vegetal no estado de São Paulo. Aclassificação da vegetação foi retirada de GEISER, R. R. Vegetação da Região Metropolitanade São Paulo. São Paulo, Gegran, 1975.

3. Dados extraídos da Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla. São Paulo: crise emudança. São Paulo, Brasiliense, s.d., p.76.

4. Atualmente o sistema Cantareira fornece em torno de 25 m3/s por causa dos conflitos coma região da bacia de Piracicaba.

5. Extrapola os propósitos deste trabalho analisar as transformações econômicas do período.Para uma reflexão das várias dimensões desse processo, assinalamos os trabalhos de CANO,Wilson. Perspectiva da Região Metropolitana de São paulo no contexto econômico nacionale mundial. São Paulo, Emplasa, maio 1990, e, do mesmo autor, “Cenários da urbanizaçãopaulista”, in São Paulo no limiar do século XXI, v. 5, São Paulo, Fundação Seade, 1992;OLIVEIRA, Francisco. “Acumulação capitalista, Estado e urbanização: a nova qualidade doconflito de classes”, in MOISES, J. A. et al. Contradições urbanas e movimentos sociais. Riode Janeiro, Cedec / Paz e Terra, 1979; TAVARES, Maria Conceição & ASSIS, J. C. O grandesalto para o caos – a economia política e a política econômica do regime autoritário. Rio deJaneiro, Jorge Zahar, 1985.

6. A temática da produção e reprodução do ambiente construído e a expressão econômicadesses processos – a renda da terra – foram objeto de vários artigos, dissertações e teses nadécada de 1980, dentre os quais citamos CAMPANÁRIO, M. Abreu. Land Rent and theReproduction of Labor Force: Some evidence from São Paulo, Graduate Field of City andRegional Planning. Cornell University, Sthaca, 1981; CUNHA, P. V. & SMOLKA, M. O.Notas críticas sobre a relação entre rendas fundiárias e uso do solo urbano. Seminário: a rendafundiária na economia urbana. São Paulo, Fundap, 1978; e MARCONDES, Maria José A.

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Formação do preço do solo urbano no município de São Paulo: 1900-1985. Dissertação demestrado apresentada no IPPUR-UFRJ. Rio de Janeiro, 1986.

7. Ver a respeito CEPAL / PNUMA, 1985, po. cit., e SUNKEL. O. & GLIGO, N., 1980, op.cit.

8. VIOLA, E. J. & LEIS, H. R., 1991, op. cit.

9. Para o entendimento do panorama econômico dessa fase, baseamo-nos nos trabalhos deCANO, Wilson, v. V, 1992, op. cit., e de LESSA, C. A. A estratégia de desenvolvimento1974-1976: sonho e fracasso. Rio de Janeiro, 1978 (mimeo).

10. Reportamo-nos aos seguintes trabalhos: Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla,s.d.,op. cit.; Casso W., op. cit., v. I, V e VI, 1992; LENCIONI, Sandra. “Reestruturaçãourbano-industrial no estado de São Paulo: a região da metrópole desconcentrada”. RevistaEspaço e Debate, n. 38, ano XIV, São Paulo, Neru, 1994; e AZZONI, Carlos Roberto. O novoendereço da indústria paulista. Texto apresentado no 20º encontro da Anpur, Nova Friburgo,1987 (mimeo).

11. Ver a respeito CANO, W. op. cit., v. V, 1990, pp. 52-7.

12. Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla, s.d., op. cit., p. 22.

13. Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla. Plano Diretor do município de SãoPaulo:1985-2000. São Paulo, 1985, v. I. p.24.

14. Secretaria do Interior do Estado de São Paulo – Cepam. Pesquisa sobre o problemafundiário urbano. São Paulo, Cepam—Finep, 1983.

15. BRANT, Vinícius C. & KOWARICK, Lúcio (orgs.). São Paulo, 1975: crescimento epobreza. São Paulo, Loyola, 1976.

16. Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla, s.d., op. cit., p. 36, e Secretaria dePlanejamento e Gestão – Fundação Seade, v. 6, op. cit., pp. 159-60, baseado na estimativa daSempla.

17. A emergência da questão dos mananciais e as invasões de terra motivaram a celebraçãode convênio entre a Prefeitura do Município de São Paulo, através de sua Secretaria da Famíliae Bem-estar Social, e FAU-USP-Cesad Laboratório de Dados, no intuito de estudar a questão,processo que acompanhei como coordenadora da equipe de Terras da assessoria técnica deHabitação de Fabes — PMSP.

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18. Com exceção de algumas unidades, como as áreas de proteção ambiental de Cajamar,Tietê e Paraíba do Sul, devido ao potencial econômico que apresentam.

19. Elaboramos cartas temáticas e a planimetria da evolução da mancha urbana na escala1:100.000, para os anos de 1974, 1977, 1980, 1985 e 1990, segundo municípios, regiões,vetores de crescimento e os limites das áreas de proteção dos mananciais, a partir defotointerpretação e da base cartográfica da Emplasa. Apenas para o ano de 1985 realizamosa interpretação visual de imagens obtidas do satélite Landsat T-5. Foi feita, também, acartografia da área urbanizada referente a loteamento vago, quadra vaga, indústria, área vaga,chácaras de recreio, movimentos de terra e equipamentos urbanos com base em cartas daEmplasa, e investimentos públicos de porte implantados no período 1974-1990, na escala1:25.000 para o perímetro da área de mananciais. Elaboramos, também, quadros do uso dosolo irregular – favelas e loteamentos irregulares –, com base em dados da FIPE de 1993(favelas) e da Sehabe – PMSP (listagem dos loteamentos irregulares) de 1995.

20. Com base nos censos econômicos da FIBGE, elaboramos os quadros da área de cultivo,índices de produção industrial e índices do volume dos setores de serviços e comércio pormunicípio da Região Metropolitana de São Paulo. Para as indústrias, foi efetuado olevantamento das existentes nas áreas de mananciais, quando da promulgação da lei, combase em levantamento e mapeamento realizados pela Emplasa. Os dados foram organizadospor município e por bacia hidrográfica.

21. A planimetria empregada para o período de 1965 a 1974 – na escala 1:100.000 – foirealizada pela Emplasa no Projeto 4.133 em 1980. Utilizamos esses informes pelo fato de oprocedimento do cálculo da área urbanizada ser idêntico ao que adotamos como o cômputodos loteamentos abertos e não ocupados, e por não necessitarmos dos dados desagregadospara a área de mananciais nesse período.

22. Conforme levantamentos de BORGONOVI & CHIARINI (1965) e BORGONOVI et al.(1967) para o ano de 1962, e de SERRA FILHO, Renato et al. (1975) para os anos de 1971a 1973. Com respeito à desagregação das informações para a metrópole, utilizou-se o índicede devastação florestal estimado para o estado.

23. Evolução da mancha urbana da Grande São Paulo. Emplasa, 1978. Esse trabalhoabrangeu o período de 1965 a 1974.

24. Trabalhos da própria Emplasa retificaram esse informe posteriormente, conformeplanimetria da empresa para o período de 1965 a 1974, contemplando toda a superfíciemetropolitana (planimetria realizada pelo Projeto 4.133, 1980. Cabe também assinalar quevárias observações que fizemos na análise dos dados, nesse período, apoiaram-se nosresultados do referido projeto. A respeito dessa questão, gostaríamos ainda de acrescentar que

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o trabalho desenvolvido pela Fundação Seade em convênio com a Unicamp apresentoudivergências as mais significativas quanto aos índices de evolução da mancha urbana nosperíodos de 1974 a 1980 e 1980 a 1985, em relação à nossa planimetria e a realizada pelaEmplasa para o período de 1974 a 1980. Nesse trabalho citou-se como fonte de dados a própriapesquisa Seade/Unicamp; contudo na análise dos dados desagregados por região, utilizou-seoutra fonte (Foresti, 1986, in São Paulo no limiar do século XXI. São Paulo, Fundação Seade,v. I e VI, 1992).

25. Baseamo-nos nas densidades apresentadas em VILLAÇA, Flávio M. A estrutura dametrópole sul brasileira. São Paulo, tese de doutorado apresentada no Departamento deGeografia da FFLCH/USP, 1978.

26. Prefeitura do Município de São Paulo – Sempla. Projeto PDDI II, São Paulo, 1982. Citadopor COSTA, L. C. Aspectos da produção das periferias na Grande São Paulo. Dissertaçãode Mestrado apresentada na FAU-USP, 1984.

27. Conforme já assinalado, admitimos neste livro como quantum total da superfície a áreaurbana metropolitana existente em 1974. Essa informação foi publicada no Sumário de dadosda Grande São Paulo – 1989, editado pela Emplasa. A partir desse ano, procedemos aosacréscimos da área urbanizada ocorridos para o cômputo total da área urbana, conformemetodologia adotada na nossa pesquisa.

28. A região norte é caracterizada como franja de expansão industrial da metrópole, com 14empregos por ha, segundo o Plano Metropolitano da Grande São Paulo – 1993-2010. SãoPaulo, Emplasa, 1993. p. 62.

29. Com base em análises do Plano Metropolitano da Grande São Paulo – 1993-2010, op.cit., p.61, sobre a densidade de empregos industriais por regiões, na metrópole.

30. Emplasa, Políticas e diretrizes para o ordenamento do uso e ocupação do solo naR.M.S.P., São Paulo, Emplasa, 1984.

31. Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Diadema.

32. A invasão dessa área em 1989 pelo movimento Unifag, liderado por Maria SiprianaHenrique, envolveu a invasão, a aquisição e a subdivisão em lotes de uma gleba de 283 ha,recoberta por matas na ocasião.

33. As informações aqui expostas baseiam-se na listagem dos loteamentos irregulares eclandestinos fornecida por PMSP – Sehab – Resolo.

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34. As administrações representadas pelo Partido dos Trabalhadores avançaram na questão,propondo inclusive medidas de compensação financeira com a diminuição do ImpostoPredial e Territorial Urbano (IPTU) para lotes vagos em mananciais, como fez a Prefeiturano município de São Paulo em 1992.

35. Índice de qualidade de vida: composto pelos índices de qualidade dos domicílios, atraçãodos investimentos públicos e do déficit dos serviços sociais. Índice de qualidade ambientaldos domicílios: mensurado pelos índices de disponibilidade dos serviços públicos de água eesgoto.

36. Situação paradoxal para os países em desenvolvimento conforme apontamos anteriormente,pois as chamadas indústrias “sujas” existentes nos países do Primeiro Mundo foramtransferidas para muitos dos países dependentes, como o Brasil.

37. Baseamo-nos em AZZONI, Carlos Roberto. O novo endereço da indústria paulista, textoapresentado no XX Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores Urbanos.Nova Friburgo, 1987 (mimeo); CANO, W. v. I e V. op. cit., 1992; LENCIONI, Sandra.“Reestruturação urbano-industrial no estado de São Paulo: a região da metrópoledesconcentrada”, in Revista Espaços e Debates, ano XIV, n. 38, São Paulo, NERU, 1994. pp.54-61.NEGRI, Barja & PACHECO, C. A. “Mudança tecnológica e desenvolvimento regional nosanos 90: a nova dimensão espacial da indústria paulista”, in Revista Espaços e Debates, anoXIV, n. 38, São Paulo, NERU, 1994. pp. 62-82; Prefeitura do município de São Paulo,Sempla, s.d., op. cit., pp. 20-4.

38. Cabe observar que os dados censitários se encontram bastante defasados. O último censoeonômico realizado pela FIBGE data de 1985, tendo sido divulgado apenas com dadosparciais. Para os anos de 1985 a 1990, utilizamos projeções elaboradas pela Emplasa, combase em estudos setoriais da SNIC, Abinee, Anfavea, Secretaria da Fazenda, Rais, Fiesp, etc.publicadas no Plano metropolitano da Grande São Paulo. São Paulo, Emplasa, 1993.

39. Com base em resolução de Diretoria, deliberada em 1986. As microempresas não foram,contudo, dispensadas da licença do órgão responsável pelo uso do solo em mananciais daSecretaria do Meio Ambiente, o DUSM. No entanto, esse pedido de autorização tem sidoburlado, por causa da dispensa concedida pela Cetesb.

40. Análise realizada no âmbito do Projeto Controle de Fontes Poluidores do Programa deSaneamento Ambiental da Bacia de Guarapiranga, do qual fui coordenadora entre 1991 e1995.

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Capítulo 4Experiências e projetos sustentáveis:O Programa Guarapiranga

O Programa de Saneamento Ambiental da Bacia do Guarapiranga foi ela-borado no âmbito nacional do Programa de Saneamento Ambiental em ÁreasMetropolitanas, composto ainda pelos Programas de Recuperação do Alto Iguaçu,em Curitiba, e os de Recuperação dos ribeirões Arruda e do Onça, em Belo Hori-zonte, inicialmente com a coordenação da Secretaria Nacional de Saneamento emais tarde apenas com sua interveniência.

Na formulação desses programas buscou-se inseri-los na nova agenda doBanco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), elaboradapara os anos 90 (World Bank, 1991). Tal agenda incorporou questões ambientaise institucionais em uma visão distante da abordagem de ajustamento estrutural doBIRD, que tivera anteriormente impactos sociais negativos entre as camadas derenda mais pobres da população e dos grandes projetos de infra-estrutura queredundaram, nos países em desenvolvimento, em impactos ambientais adversosao previsto nas décadas passadas.

A agenda dos anos 90 do BIRD, ao contrário, estabeleceu os programas degestão ambiental ou urbana como o elo principal entre as políticas setoriais deorientação de suas operações financeiras. O programa de saneamento ambiental,em nível nacional, tinha como compromisso a elaboração, avaliação e assinatu-ra desses programas na escala estadual até junho de 1992, ou seja, concomitan-temente ao evento da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente eDesenvolvimento, no Rio de Janeiro.

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O conteúdo dos programas envolveu três áreas metropolitanas – São Pau-lo, Belo Horizonte e Curitiba – e é bastante distinto quanto à escala das interven-ções propostas. Contudo, as diretrizes que nortearam as três cartas consultas aoBanco Mundial enfatizavam os problemas que se articulam a partir da interseçãoentre o processo de urbanização e a dinâmica dos recursos hídricos nas baciasselecionadas.

Assim, na concepção desses programas, as equipes técnicas dos diversosestados e prefeituras envolvidos formularam estratégias de intervenção, funda-mentadas no desenvolvimento de mecanismos de gestão ambiental, de capacitaçãode pessoal local e de fortalecimento de instituições para a gestão das bacias hidro-gráficas, antecipando-se às alterações institucionais da questão dos recursos hí-dricos que se estruturou posteriormente, sobretudo em São Paulo.

Em seu escopo, tais programas continham uma dimensão em longo prazoe uma visão integrada das ações e componentes necessários à elaboração de pla-nos que subsidiassem a gestão dos recursos ambientais dos diferentes setoresintervenientes, como resíduos sólidos, mineração, controle da qualidade das águas,drenagem, coleta de efluentes e o problema da habitação, também ajustados ànova postura de minimização dos impactos sociais do Banco Mundial.

A metodologia utilizada nos programas das três áreas metropolitanas foiformulada partindo-se de uma concepção de desenvolvimento sustentável do terri-tório na qual se inserem, com a definição de estratégias de intervenção em trêsníveis. No primeiro nível, com ações corretivas nas áreas já comprometidas coma urbanização, mediante medidas de recuperação ambiental e urbana, consolidan-do a urbanização em níveis compatíveis com a preservação dos recursos am-bientais por meio de ações de melhoria do sistema de coleta, intercepção e dis-posição final de efluentes domésticos bem como dos sistemas de coleta e dis-posição final de resíduos sólidos; recuperação de córregos e respectivas faixas deproteção e drenagem; revegetação de áreas de interesse; e remoção de famíliasassentadas em áreas de risco. A mesma preocupação com a minimização do im-pacto social norteou essas propostas, prevendo-se o mínimo de remoções.

No segundo nível, a estratégia de intervenção voltou-se para medidas quevisassem ao desestímulo ao avanço da urbanização por meio do incentivo aodesenvolvimento de atividades compatíveis com os objetivos da conservação dosrecursos ambientais. Essas estratégias foram bastante diferenciadas nas trêsáreas metropolitanas.

No terceiro nível, a estratégia formulada voltou-se para o estabelecimentode mecanismos institucionais necessários à viabilização do programa e ao novoordenamento das atividades nas regiões. Propôs-se um modelo de gestão, comuma unidade de gerenciamento para a operacionalização dos respectivos progra-

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mas, diferenciadamente estruturada nas regiões metropolitanas de São Paulo, BeloHorizonte e Curitiba.

Foram propostas diversas atividades, como a capacitação de técnicos dosórgãos públicos e de organizações não-governamentais; a montagem de um sis-tema de informações geográficas; a implantação de programas de educação sani-tária e ambiental; a organização de atividades capazes de definir aspectos par-ticulares da gestão como aprimoramento da legislação; o controle da qualidadedas águas; a fiscalização integrada; e a estruturação dos serviços públicos (habi-tação, sistemas viários e de transportes e equipamentos sociais), de forma com-patível com a preservação dos mananciais e a promoção de formas adequadas deocupação das bacias.

O Programa de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Curi-tiba definiu os diferentes níveis de intervenção, estabelecendo entre os compo-nentes promocionais programas de incentivo à ocupação e uso conservacionistado solo rural, à recomposição florestal, à criação de parques denominados “am-bientais”, bem como à criação do Museu do Saneamento, entre outras atividades.Os componentes de gestão enfatizaram projetos voltados às organizações não-governamentais, por meio de planos e ações de reordenamento territorial e deatividades de monitoramento dos recursos ambientais. As estratégias direcionadasà recuperação ambiental foram semelhantes às do Programa Guarapiranga, dire-cionadas à minimização e à correção de ações antrópicas ao meio natural.

A respeito do Programa das Bacias dos Ribeirões Arruda e do Onça, emBelo Horizonte, foi delimitada uma superfície de área urbanizada muito extensa,com ênfase nas obras de infra-estrutura. Contudo, inseriram-se em seu conteúdoas ações de gestão das bacias e diversos componentes ambientais, com a criaçãode parques e ações de repovoamento vegetal.

Cabe ainda mencionar o Programa de Despoluição da Baía da Guanabara,de início incluído no Programa de Saneamento Ambiental em Áreas Metropoli-tanas, mas posteriormente desenvolvido em uma linha própria de co-financia-mento com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Overseas Eco-nomic Cooperation Fund – OECF, do Japão, e o Governo do estado do Rio deJaneiro. Programa que consistiu basicamente em ações de despoluição da baía daGuanabara, em ampla escala física de intervenção, com componentes do projetodirecionados aos sistemas de adução, coleta e distribuição de água, sistemas decoleta e tratamento de efluentes, componentes de macrodrenagem, sistemas decoleta e tratamento de resíduos sólidos. Também incorporou componentes ins-titucionais, tais como a estruturação de sistemas de controle e monitoramentoambiental, o projeto de educação ambiental integrada e o projeto de reforço ins-titucional, incluindo o desenvolvimento de recursos humanos, da informatização

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e de estudos, assim como a realização de pesquisas e a atualização de cadastrosimobiliários.

A implantação dos programas de saneamento ambiental em São Paulo,Belo Horizonte e Curitiba representou grande avanço no tratamento dos pro-blemas urbanos e ambientais, ao enfatizar uma abordagem integrada dos váriosaspectos atuantes, a preocupação com o impacto social e a base institucional paraviabilizar o acompanhamento das ações. Entretanto, seis anos após o início des-ses programas, temos que indagar acerca da viabilidade desses projetos susten-táveis num contexto das cidades inseridas em um processo de globalização daeconomia, com a perspectiva de uma urbanização periférica, fragmentada, des-concentrada e excludente, e incidindo num espaço onde o poder local tem parti-cipação cada vez mais reduzida, com as decisões tomadas até mesmo num níveltransnacional. Em suma, é válido o questionamento das possibilidades, limites ealternativas da gestão ambiental de extensas superfícies territoriais no tipo deurbanização que vem se processando.

A questão adquire complexidade ainda maior no caso de São Paulo, porcausa dos efeitos da crise econômica dos anos oitenta e dos reflexos da rees-truturação em curso no espaço urbano.

A avaliação assume importância em decorrência do caráter piloto do pro-grama, o qual objetivou subsidiar ações concretas semelhantes em outras metró-poles do país, caso de Belém do Pará (lagoa Bolonha e lago Preto), Brasília (lagoDescoberto) e, mais recentemente, na bacia Billings em São Paulo.

Guarapiranga: fronteira entre a cidade e a mata atlântica

A bacia do Guarapiranga, selecionada para integrar o Programa Nacionalde Saneamento Ambiental em Regiões Metropolitanas, é emblemática no que serefere aos problemas ambientais que emergem a partir da interseção entre o pro-cesso de urbanização e a dinâmica dos recursos ambientais em um determinadoespaço, constituindo um exemplo ímpar das formas perversas, do ponto de vistasocioambiental, que assumiram os padrões de urbanização vigentes. A urbani-zação de apenas 15% de sua superfície territorial gerou o aporte brutal de cargaspoluidoras na represa, colocando em risco a capacidade de assimilação do reser-vatório e aumentando as possibilidades de perda de produção de água com qua-

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lidade compatível para o abastecimento público com tratamentos convencionais,haja vista os episódios sucessivos de concentração de algas tóxicas, em 1991.

Para o entendimento da problemática que delineamos, cabe lembrar que areferida bacia se localiza no vetor sudoeste da metrópole paulista, geologicamentesituada na região das morrarias de Embu, entre a serra do Mar e as colinas de SãoPaulo. Formada pelo reservatório do Guarapiranga e seus principais contribuin-tes, os rios Embu-Guaçu e Embu-Mirim, possui uma área de aproximadamente630 km2, abrangendo parte do município de São Paulo (parcelas dos distritos deCapela do Socorro, Parelheiros e Santo Amaro), toda a superfície territorial deEmbu-Guaçu e partes dos municípios de Juquitiba, Itapecerica da Serra, Embu-Mirim, Cotia e São Lourenço da Serra.

A dinâmica do uso e apropriação do espaço da bacia do Guarapiranga émarcada pelo fato de ser limítrofe com regiões estruturais nos aspectos que tan-gem ao dinamismo econômico da metrópole, sendo contígua às regiões do ABCe à região sul do município de São Paulo, com a presença intensa da atividadeindustrial e terciária e de eixos estruturais do sistema viário e de transportes cons-tituídos a partir da década de 1960. A localização singular desse manancial hí-drico tem pautado o conflito entre o uso do solo urbano e a proteção dos recur-sos ambientais na metrópole paulista.

A principal característica da bacia em questão é sua função de manancialregional de abastecimento de água: 25% da população da metrópole paulista éabastecida por ela, representando 3 milhões de habitantes, suplantado em vazãoapenas pelo sistema da Cantareira. Sua posição estratégica em relação aos possí-veis mananciais hídricos no futuro (no sentido de um reservatório de passagemcom os polêmicos projetos de reversão das bacias do Capivari-Monos, trechosuperior do Juquiá e de contribuintes da Billings), as previsões de crescimento dasdemandas por água na metrópole no vetor sudoeste e o fato do sistema da Can-tareira importar água de uma bacia hidrográfica localizada numa região bastantecrítica conferem ao manancial do Guarapiranga uma importância ímpar no sis-tema global de abastecimento da Grande São Paulo.

A bacia do Guarapiranga tem importância, ainda, como reduto dos rema-nescentes florestais da metrópole, estabelecendo a transição entre a área urbani-zada da metrópole e o Parque da Serra do Mar. Vincula-se, portanto, às questõesatmosféricas, visando à manutenção dos índices de pluviosidade (caixa-d’águametropolitana) e das condições climatológicas e à preservação da cobertura vege-tal da vertente continental da serra do Mar.

A esse respeito, acrescentamos a preocupação do final da década de 1980e início dos anos noventa acerca da preservação dos remanescentes florestais emáreas urbanas, sobretudo nas regiões metropolitanas.1

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Figura 10 - Vista aérea da bacia do Guarapiranga – 1980.

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Os remanescentes florestais são vistos como mantenedores das dinâmicasambientais (em alguns casos são corredores ou rotas de espécies migratórias).Além disso, desempenham importante papel no equilíbrio das condições climá-ticas e na conservação dos recursos hídricos.

Os informes sobre o desmatamento na bacia, entretanto, mostram que asituação quanto a esse aspecto é crítica. Segundo levantamentos aerofotogra-métricos realizados em 1988 pela Emplasa, a superfície recoberta pela mata atlân-tica densa era da ordem de 88 km2, e a superfície recoberta por matas nos está-gios médio e inicial de regeneração da ordem de 383 km2. De acordo com dadosatuais do Instituto Socioambiental (1998), a cobertura vegetal diminuiu significa-tivamente entre os anos de 1989 e 1996. Existia em 1996 a superfície de 56 km2

de mata densa, 199 km2 de mata em estágio médio e avançado de regeneração e52 km2 de mata no estágio inicial de regeneração.

Com referência à bacia do Guarapiranga e sua importância socioambiental,podemos mencionar ainda a existência de atividades sustentáveis e de apoio àmetrópole representadas pela produção agrícola e silvícola nas áreas rurais deItapecerica da Serra, Embu-Guaçu, Marsilac, Cotia, Juquitiba e São Lourenço daSerra, em uma superfície aproximada de 18% da área total da bacia. O uso ru-ral é constituído pelas atividades agrícolas de subsistência ligadas a pequenas pro-duções de caráter local, sítios de pequeno e médio portes localizados em áreas derelevo acidentado nos quais se praticam a silvicultura, o desenvolvimento deagricultura de várzeas e produções agrícolas isoladas em meio a espaços ocupa-dos por loteamentos de chácaras de recreio, segundo documento elaborado pelaSecretaria de Meio Ambiente de São Paulo (1988).

Tais atividades, no entanto, estão em processo de rápido declínio, ceden-do espaço às atividades urbanas ao mesmo tempo em que apresentam superfíciesinadequadas com severas restrições ao assentamento urbano. É o que analisare-mos a seguir.

Nas áreas urbanizadas, representadas por 15% da superfície total da bacia,residia uma população em torno de 622 mil pessoas em 1995. Metade dessa po-pulação tinha renda média de três salários-mínimos e um quarto dos habitantes,renda média de três a cinco salários-mínimos, segundo dados da Unidade deGerenciamento do Programa Guarapiranga (Governo de São Paulo, 1998). Emrelação ao território, mais de 50% da superfície urbanizada era ocupada por habi-tações precárias em loteamentos clandestinos de baixo padrão, com densidadesmédias de 105 hab/ha até 500 hab/ha.

De acordo com estudos elaborados pela Emplasa (1986), por nós adotadocomo base para as propostas do referido programa em 1991, acerca da dinâmi-ca de produção do espaço nessa bacia hidrográfica, foram identificados diversos

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conjuntos de áreas urbanizadas, dentre eles aquele formado pelas áreas de Inter-lagos, Bororé, Riviera e Embu, de caráter periférico e expansão urbana contínua,associada ao município de São Paulo.

Essas áreas caracterizam-se, de um lado, pela existência de bairros de pa-drão elevado, situados no entorno da represa, sendo um deles remanescente doprojeto de loteamento de alto padrão da década de 1950 em Interlagos, na regiãoentre os lagos, o qual antecipou a versão atual dos condomínios fechados subur-banos posteriores à década de 1980. Trata-se de bairros ou quadras em que seintegram elementos do meio natural, residências e equipamentos sociais. No pro-jeto inacabado de Interlagos, hoje uma zona estritamente residencial, previa-se,além do Clube Santa Paula – ainda existente no local –, a construção de um ho-tel e de demais equipamentos em um padrão de ocupação de densidades rarefei-tas, compatíveis com a conservação dos recursos ambientais. Por outro lado, amancha urbana contínua da superfície da bacia é constituída por bairros dormi-tórios de alta densidade, situados e estruturados ao longo de eixos viários: asestradas Parelheiros, de M’Boi Mirim, Baronesa, do Rio Bonito e na margemesquerda do reservatório, com taxas de crescimento bastante elevadas. Nessasáreas ocorre uma concentração significativa da população favelada – cerca de13.625 domicílios, em aproximadamente cento e setenta e cinco favelas, ocupamfundos de vale e encostas, de acordo com cadastro da Prefeitura Municipal de SãoPaulo e da FIPE de 1993. 2

Em Embu, no trecho contido em área de mananciais, a área urbana é estru-turada pela rodovia Régis Bittencourt, margeando a várzea do rio Embu-Mirim,em assentamento típico das indústrias. Essa localização foi reiterada pelo zonea-mento industrial metropolitano, cujo perímetro faz limite com as áreas de manan-ciais nessa região. O restante do território do município de Embu contido nosmananciais é constituído por sua sede urbana, de reconhecida importância his-tórica, mas que se figura cada vez mais num transbordamento do crescimentoperiférico de São Paulo, com taxas de crescimento populacional situadas entre18,10 e 4,52, nas décadas de 1970 e 1980, e com elevados índices de expansãoda área urbanizada, principalmente nos anos de 1974 a 1977 e 1985 a 1990.

O segundo compartimento é composto pelos núcleos urbanos isolados deParelheiros, Cipó e Embu-Guaçu, em direção às áreas florestais ao sul da bacia.Nessa região, ao contrário do que ocorre na área metropolitana e, sobretudo, nacapital, cujas taxas de crescimento foram negativas, o crescimento populacionalavança.3 O mesmo processo verifica-se na área urbanizada, pois entre os anos de1977 a 1980 e 1985 a 1990 esses núcleos urbanos isolados apresentaram signi-ficativa expansão urbana, delineando o padrão de crescimento desconcentrado eavançando para a periferia, fato reiterado pela tabela da evolução da área urba-

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nizada segundo municípios (ver Tabela IV). A configuração desse compartimentocomo ilha de exclusão social fica claramente evidenciada na pesquisa realizadapor Sposati (1996) sobre o mapa da exclusão/inclusão social da cidade de SãoPaulo. Na referida pesquisa, alguns distritos inseridos na região em foco – comoMarsilac e Parelheiros – apresentaram os piores índices quanto aos indicadoresde qualidade de vida.

Em Embu-Guaçu, surgiram dezenove novas favelas nos últimos anos, situa-ção também verificada em Itapecerica da Serra onde existem hoje trinta e seisfavelas. Esse município não configura um núcleo isolado e não é contíguo a SãoPaulo. Os informes da evolução da área urbanizada no período de 1980 a 1990– sistematizados por nós neste livro – são provas inequívocas da expansão urbanaem direção ao sul da bacia e ao vetor oeste, onde se encontravam espaços ex-tensos ainda desocupados, as principais concentrações florestais e grande núme-ro de nascentes, identificando pressão atrópica em áreas de extrema fragilidadeambiental.

O terceiro conjunto de áreas abrangido pelo trabalho da Emplasa (1986) écomposto pelas áreas de expansão urbana com forte presença de chácaras de re-creio, em Embu-Guaçu, Juquitiba, Itapecerica da Serra, Cotia (no trecho incor-porado aos mananciais em 1991) e São Lourenço da Serra.

A esse respeito, assinalamos que no exame da dinâmica de uso e ocupa-ção do solo constatamos que nos municípios de Embu-Guaçu, Itapecerica da Serrae Juquitiba, todos contidos no vetor sudoeste, foi intensa a ocupação por cháca-ras de recreio dispersas na superfície entre os anos de 1976 e 1980. Nesse períodoregistrou-se um índice expressivo de superfície aprovada para loteamentos dechácaras de recreio: 1.317,6 ha em Embu-Guaçu, 260,3 ha em Juquitiba e 335,9ha em Itapecerica da Serra, tendência, entretanto, revertida nos anos posteriores.

De 1986 a 1990, observou-se na planimetria realizada a expansão de apro-ximadamente 18 km2 da área urbanizada em todos os municípios nas mais va-riadas direções, consolidando um padrão de urbanização fragmentada, extensivae dispersa, com maiores dificuldades para o controle ou a gestão ambiental. Aatualização da evolução da área urbanizada na bacia do Guarapiranga nos últimosanos foi realizada por organizações não-governamentais coordenadas pelo Ins-tituto Socioambiental, em estudo que mostra o aumento dos índices de urba-nização: de 10,36% do total da bacia em 1988 passaram para 15,83% em 1996.

A atividade industrial é reduzida na bacia, segundo levantamentos da Em-plasa realizados em 1980. Nesse ano, lá havia duzentas e cinqüenta e cinco in-dústrias de vários tipos e portes. A listagem da Cetesb das indústrias objeto decontrole e monitoramento ambiental continha, em 1993, cento e vinte estabele-cimentos industriais; porém a Cetesb tinha conhecimento da existência de oito-

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centas microindústrias espalhadas na região que não possuíam nem licenciamentonem monitoramento ambiental. A maior parte dessas indústrias localizam-se aolongo da rodovia Régis Bittencourt, e o restante, espalhadas pelo território, im-plantadas nas áreas de Classe C, fora das manchas urbanas.

A esse respeito, em análise do uso e ocupação do solo realizada no âmbi-to do Programa Guarapiranga,4 constataram-se concentrações significativas, ge-rando efeitos poluidores, em virtude da intensa aglomeração e da ausência decontrole ambiental.

A atividade minerária é outro uso em conflito com a proteção dos recur-sos ambientais. Existem vinte e cinco minerações, principalmente de caulim, nasplanícies aluviais dos rios Embu-Mirim e Embu-Guaçu, e pedreiras no sul dabacia e no município de Embu, acarretando impactos ambientais sérios.

O Programa Guarapiranga: projetos sustentáveis e cidadesinsustentáveis

A partir de meados da década de 1980, foram elaboradas, pela Emplasa,várias propostas e diretrizes de intervenção na bacia do Guarapiranga. Em 1988,a Secretaria do Meio Ambiente elaborou uma proposta de intervenção no mes-mo território no âmbito do Programa Nacional de Meio Ambiente (PNMA), tendoem vista a solicitação de financiamento ao BIRD, a qual não foi incorporada aesse programa por causa das características conservacionistas dos projetos elegí-veis, da escala urbana e do grau de ações antrópicas presentes nos problemas da bacia do Guarapiranga, em contraposição aos demais projetos inseridos noPNMA.

Em 1991, a questão da recuperação ambiental da Guarapiranga foi retoma-da e reelaborada na perspectiva da agenda do BIRD. Deu-se ênfase aos compo-nentes institucionais e à montagem de um sistema de gestão das águas segundoo campo de ação do Programa Nacional de Saneamento Ambiental em ÁreasMetropolitanas, cuja implantação coincidiu com a emergência da questão do ma-nancial do Guarapiranga em virtude dos episódios repetidos de eutrofização e dosurgimento de concentração de algas tóxicas, direcionando, então, os esforços dosórgãos estaduais e municipais envolvidos na questão. Nesse sentido, com a coor-denação da Secretaria de Recursos Hídricos e a coordenação adjunta da Secretaria

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do Meio Ambiente e a colaboração dos demais órgãos envolvidos,5 formulou-seo Programa de Saneamento Ambiental da Bacia do Guarapiranga.

Na elaboração desse programa, buscamos adotar estratégias e um conjun-to de instrumentos para a consecução dos objetivos de recuperação ambiental,sem nos limitarmos às medidas corretivas na área de saneamento ou à visão res-tritiva à ocupação urbana presente na legislação de proteção dos mananciais.

A idéia fundamental era a de associar ações corretivas, visando a recupe-ração e a qualificação do ambiente urbano deteriorado, com ações de planejamen-to direcionadas à compatibilização da área para o desenvolvimento de atividadesde sustentação de apoio nas áreas ainda não comprometidas com a urbanização.Pretendia-se a incorporação de teses do desenvolvimento sustentável para a regiãocomo um todo e a estruturação de um sistema de gestão dos recursos ambientais.

As ações corretivas foram formuladas para as áreas já comprometidas coma urbanização por meio de medidas de recuperação ambiental e urbana. Assim,consolidar-se-ia a urbanização em níveis compatíveis com a preservação dos re-cursos ambientais, promovendo ações de melhoria do sistema de coleta, a inter-cepção e disposição final de efluentes domésticos, a adequação e o controle dossistemas de coleta e a disposição final de resíduos sólidos, a recuperação de cór-regos e as respectivas faixas de proteção e drenagem, o desvio de cargas po-luidoras afluentes à represa, a revegetação de áreas de interesse, a urbanização defavelas, a adequação de infra-estrutura e a remoção e o reassentamento de famí-lias habitantes de áreas de risco.

A aplicação de tais ações concentrou-se em Interlagos, Bororé, Riviera eEmbu, áreas de caráter periférico e expansão urbana contínua, formando bairros-dormitórios de alta densidade, situados e estruturados ao longo das estradas deParelheiros, M’Boi Mirim, Baronesa e do Rio Bonito e nas margens do reserva-tório, com taxas de crescimento bastante elevadas, sobretudo nas áreas onde sedá significativa concentração da população favelada, que ocupou fundos de valenos córregos Julião, Gomes Pedrosa, Rio Bonito, das Pedras e São José, na mar-gem direita, e nos córregos Guaravituba e Piraporinha, na margem esquerda. Osmunicípios de Embu-Guaçu e Itapecerica da Serra também sofreram os proces-sos de intervenção e recuperação urbana.

As ações promocionais formuladas na Secretaria do Meio Ambiente defi-niram duas linhas de atuação, sendo a primeira voltada ao planejamento estraté-gico da região com a promoção de equipamentos de porte capazes de estimularsua vocação turística, dando alternativas ao binômio urbano-industrial e aprovei-tando o potencial paisagístico e cênico da represa e das áreas florestadas, e avocação turística e histórica do município de Embu.

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A requalificação dos usos urbanos, com o poder público na linha de fren-te da materialização desse processo, norteou as propostas no âmbito do Progra-ma Guarapiranga. A perspectiva naquele momento era a de um “Estado” cujasatribuições na área social e ambiental haviam sido fortalecidas no processo dereforma constitucional, sobretudo na área ambiental e urbana com a aplicação denovos instrumentos de intervenção, em que pese, no início dos anos noventa, acrise fiscal que atingiu as máquinas administrativas.

A espacialização dessas metas consusbstanciou-se com a proposta de cria-ção de um sistema de parques em áreas públicas concentradas no entorno da re-presa e no município de Embu. Tal sistema compunha-se de quatro parques, oParque Ecológico de Guarapiranga, localizado na margem esquerda da represa,entre dois braços, próximo ao bolsão da Riviera Paulista, e na porção sul, próximoà planície aluvial do rio Embu-Mirim, com 330 ha; o Parque Nove de Julho, si-tuado em três áreas distintas, com aproximadamente 65 ha, junto à avenida damargem direita do reservatório, de intenso afluxo de pessoas; o Parque Várzea doEmbu-Guaçu, situado no extremo sul do reservatório na planície aluvial do rioEmbu-Guaçu, com 147 ha; e o Parque Ilha dos Eucaliptos, na ilha situada nocentro do reservatório, com 35 ha. Executando-se o Parque Guarapiranga, cons-tituído por áreas da companhia energética Eletropaulo e do governo federal, osdemais situavam-se em áreas de propriedade exclusiva da Eletropaulo. A funçãodesses parques, salvo o Parque Nove de Julho, que se tratava de um parque ur-bano, era voltada à recuperação e à conservação dos recursos ambientais, cons-tituindo uma transição entre os parques urbanos e os parques naturais do estado.

A proposta incluía a recuperação, por parte do poder público, de duas áreasde mineração já exauridas com extensos lagos, a serem cedidas para uso públi-co, integrando-se ao sistema de parques. A escolha dessas áreas se deu em fun-ção de sua localização estratégica: uma, em frente ao Parque Ecológico de Gua-rapiranga (área da Baronesa) e a outra, no município de Embu (área de minera-ção Giosa).

Pretendia-se, com essas propostas, recuperar a paisagem e desenvolver umsistema de parques na linha dos projetos water-front,6 intervenções com as quaisse buscou a revitalização de territórios degradados, com a incorporação da áreamarginal a corpos d’água, aproveitando-se o alto potencial paisagístico da área.

Outra proposta nessa direção foi a da implantação de um sistema de repo-voamento vegetal em 4.500 ha, nas faixas de domínio das ferrovias e rodoviasque atravessam a bacia, bem como nas faixas de drenagem dos rios e córregosda bacia, a fim de recuperar as matas ciliares nas áreas urbanas não ocupadasremanescentes de loteamentos, estimadas em 800 ha, e nas margens do reserva-

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tório com espécies da mata atlântica, na tentativa de reforçar as ações de conser-vação da área.

A segunda linha de atuação, foi fundamentada no estímulo dos usos alter-nativos ao binômio urbano-industrial, nas áreas ainda não comprometidas com aurbanização. Nessas áreas foram propostas ações de incentivo às atividades deagricultura, silvicultura e piscultura, todas elaboradas pela Secretaria do MeioAmbiente em conjunto com a Prefeitura Municipal de São Paulo. As propostasde incentivo à piscultura em reservatório eram direcionadas à pesquisa e ao fo-mento de programas de educação ambiental. Com relação especificamente a es-sas propostas tinha-se presente o grau de dificuldade para sua implementação, emfunção da questão econômica, da questão fundiária, da superposição de compe-tência, no que se refere à tributação do solo, e do desinteresse, por parte dos mu-nicípios, em manter o uso do solo rural, em face da diminuição dos tributos e ta-xas em relação ao uso do solo urbano. Contudo, foram definidas algumas medi-das de caráter tributário aplicando incentivos à permanência do solo rural, bemcomo propostas de condomínios para facilitar a organização dos produtores ru-rais, medidas de fomento como, por exemplo, assistência e a implantação demercado com infra-estrutura específica, de modo a facilitar a comercialização dosprodutos no núcleo urbano de Parelheiros, retomando propostas anteriores damunicipalidade de São Paulo e a inserida no Programa Nacional de Meio Am-biente/BIRD.

A terceira estratégia formulada voltou-se ao estabelecimento de mecanis-mos institucionais que viabilizassem o programa e o novo ordenamento das ati-vidades na região. A proposta elaborada pelo conjunto dos órgãos executores doPrograma Guarapiranga, em consonância com as diretrizes da agenda do BIRD,consistia num modelo de gestão, com uma unidade de gerenciamento para a ope-racionalização do programa e um conselho consultivo com a participação da so-ciedade. Foram sugeridas diversas atividades concernentes ao aspecto institu-cional, a exemplo dos demais programas de saneamento ambiental metropolita-no elaborados no âmbito do Programa Nacional de Saneamento.

A implantação dos diversos projetos do Programa Guarapiranga inseriu-seem um contexto institucional marcado por profundas alterações do papel do Es-tado na sociedade, particularmente nos aspectos urbanos e ambientais. Rede-finiram-se suas funções enquanto promotor de investimentos públicos no espaçoe seu papel de regulamentação do território, sobretudo na escala metropolitana.Adotaram-se novas formas de intervenção, privilegiando o papel estratégico dascidades em detrimento do planejamento regional, e emergiram as formas de ges-tão dos recursos ambientais, exemplificadas pelas agências de bacias.

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O futuro das águas do Guarapiranga

Os propósitos deste livro centram-se na questão da viabilidade da implan-tação de projetos sustentáveis, conciliando-se a proteção dos recursos ambientaiscom a ocupação do solo no contexto de uma cidade inserida em um processo deglobalização da economia.

Nesse sentido, seria oportuno perguntar se os projetos de proteção am-biental propostos produziram os impactos esperados nos processos de requali-ficação urbana e ambiental dos espaços, tendo em vista que esses projetos obje-tivaram induzir a implementação de usos alternativos ao binômio urbano-indus-trial, como a implantação do sistema de parques ao redor da represa Guarapirangae no município de Embu, concebido na tentativa de sedimentar uma vocação daregião para o turismo, com o poder público na linha de frente da criação de pro-jetos de impacto, a exemplo do caminho percorrido por outras cidades, na recu-peração, por exemplo, de áreas portuárias degradadas (ver nota 6). Por outro lado,verificar se o fomento às atividades agrícolas e silvícolas foi efetivamente reali-zado e quais teriam sido os impactos ocorridos em termos da reversão das for-mas de urbanização até então vigentes.

Interessa-nos discutir também os cenários de desenvolvimento propostospara o território em questão contidos na proposta do Plano de Desenvolvimentoe Proteção Ambiental da Bacia do Guarapiranga, uma vez que as diretrizes deproteção e recuperação ambiental para as áreas de mananciais preconizadas naLei 9.866/1997 se inscrevem nesse contexto. Importante ressaltar, ainda, que setrata de um plano piloto das ações futuras de proteção das águas na metrópolepaulista.

A avaliação do Programa Guarapiranga vem sendo realizada pelas organi-zações não-governamentais, que se articularam em torno do projeto DiagnósticoSocioambiental Participativo Preliminar na Bacia do Guarapiranga, iniciado em1995 com recursos do Projeto Ecoscambio, programa de cooperação idealizadopelas organizações não-governamentais italianas Terra Nuova, Legambiente ePangea em conjunção com o Instituto Socioambiental, a Fundação Mata Atlân-tica, SOS Represa Guarapiranga, o Instituto Vitae Civilis, a Sociedade Ecológi-ca Amigos do Embu Espaço Assessoria e Documentação, a Associação de Mu-lheres do Grajaú e o Centro de Educação, Saúde e Meio Ambiente. 7

Essa tarefa vem sendo desenvolvida no projeto que mencionamos, junta-mente com a montagem de um sistema de informações geográficas da bacia doGuarapiranga, tendo como propósitos a gestão e a valorização dos recursos am-

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bientais de áreas de grande importância ecológica e socioeconômica, assim comoa realização de um amplo trabalho de educação ambiental, contexto no qual seinscreve o projeto com as ongs italianas.

Vale salientar que houve um redirecionamento do Programa Guarapiranga,com a concentração maciça de recursos nas ações corretivas – as de recuperaçãourbana principalmente –, tendo sido 28% dos recursos canalizados para as açõesda Sabesp, 18% para as ações de recuperação urbana e reassentamento de mora-dias pela CDHU, e 38% para as ações também de recuperação urbana promovi-das pela municipalidade de São Paulo.

Os recursos reprogramados para todas as ações relativas à proteção am-biental, propostas no âmbito da Secretaria do Meio Ambiente, atingiram 8% dasverbas destinadas ao programa, incluindo a contrapartida nacional. Tais propos-tas consubstanciaram-se na implantação do sistema de parques (com a inclusãoposterior do Parque da Represinha e do Parque Temático em Itapecerica da Ser-ra, com 26 ha e 7,80 ha, respectivamente), do sistema de repovoamento vegetal,da recuperação de áreas mineradas, do apoio às atividades agrícolas, de silvicul-tura e piscicultura, bem como as de educação ambiental, de reforço do sistemade fiscalização do uso e ocupação do solo, da elaboração do plano diretor demineração, do recadastramento de fontes de poluição industrial e difusas e ativi-dades do sistema de controle da qualidade das águas.

Para as atividades de gerenciamento e de elaboração dos planos de desen-volvimento e proteção ambiental, para o estudo de atividades econômicas com-patíveis, bem como para o plano de aquisição de equipamentos para o sistema deresíduos sólidos, o repovoamento de áreas públicas em Embu, a capacitação téc-nica para a gestão das ongs e para a aquisição de equipamentos a serem empre-gados no sistema de informações, foi destinado um montante de recursos da or-dem de 9% (Informe da Unidade de Gerenciamento do Programa, 1998).

Observou-se, portanto, que os recursos se concentraram nas ações correti-vas. As ações preconizadas para a reversão da dinâmica de uso e ocupação dosolo tiveram seu porte e conteúdo reduzidos, sobretudo aquelas direcionadas aoapoio às atividades agrícolas – como de assistência técnica e implantação de ummercado do produtor em Parelheiros – e ao apoio às atividades de silvicultura.Direcionaram-se para o futuro as possibilidades de intervenção nesta linha, deacordo com o Plano de Desenvolvimento e Proteção Ambiental.

A alteração dos processos de produção e reapropriação do espaço é mui-tas vezes lenta. Certamente a alteração do ritmo da urbanização e das formasvigentes observadas, principalmente no período de 1986 a 1990, anterior à for-mulação e implementação do Programa Guarapiranga, demandaria um horizon-te de tempo maior. Contudo, os informes que possuímos indicam que, ao contrá-

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rio da reversão dos processos vigentes de urbanização, a referida bacia passou porum processo em que o ritmo e as formas foram aceleradas e mais perversas, inci-dindo em áreas longínquas e em compartimentos ambientais mais frágeis.

O impacto desses processos na qualidade das águas é intenso. Em mo-nitoramento realizado nos trabalhos técnicos do Programa do Guarapiranga, cons-tatou-se que, em 1991, a carga média de fosfato hidrolisável afluente aos cursosd’água era de 530 kg/dia, passando para, em 1995, 645 kg/dia, a maior parteproveniente da margem esquerda do reservatório, nas sub-bacias Itupu, Gua-virutuba e vizinhanças. Cabe salientar que 88% da carga gerada de fosfato é pro-veniente de esgotos domésticos. Nessas sub-bacias incidiu grande parte dasintervenções entre os anos de 1991 a 1995 como a reversão dos córregos Itupue Guavirutuba, a reurbanização de várias favelas e, posteriormente, a implanta-ção do Parque Ecológico de Guarapiranga.

Os dados acima evidenciam que a implementação de ações corretivas, semque se altere a dinâmica de uso e ocupação do espaço, tornam-se inócua citadasao longo do tempo. Várias obras já haviam sido concluídas nas áreas em 1995,sem impacto nos índices de qualidade das águas, pois novas ocorrências neutra-lizaram os impactos positivos.

O número de ocorrências irregulares na bacia do Guarapiranga confirma opadrão de ocupação exposto acima. No período de 1989 a 1996, foram registradasaproximadamente 1.500 ocorrências irregulares (Socioambiental, 1998), incluin-do, além de loteamentos, indústrias e a atividade comercial, as atividades rurais,desmatamento, lixo, mineração, movimento de terra, extensão de rede de água eluz e outras ocorrências. Em levantamentos efetuados para o conjunto dos manan-ciais da área metropolitana no período de 1978 a 1990, observamos 1.180 ocor-rências dessa natureza. A fiscalização integrada do uso e ocupação do espaçoocorreu; todavia, a legislação de proteção dos mananciais não foi suficiente paraalterar a realidade sobre a qual se aplica.

Com referência ao Plano de Desenvolvimento e Proteção Ambiental daBacia do Guarapiranga, ainda em discussão nos órgãos públicos, segue em for-ma e conteúdo o projeto de lei estadual 9.866/97, fornecendo os elementos paraa formulação da primeira lei de proteção dos mananciais por sub-bacia, com asdiretrizes e normas determinadas pela legislação mencionada.

Da análise desse plano, destacamos alguns pontos. A partir de uma matrizdo potencial poluidor das atividades no espaço e do cruzamento dos dados dostipos de uso e ocupação do solo, bem como do aporte de cargas poluidoras, ela-borou-se uma classificação dos compartimentos ambientais, que abrange as se-guintes categorias: áreas de restrição à ocupação, áreas de ocupação dirigida eáreas de recuperação ambiental, direcionando a proteção dos recursos ambientais

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à manutenção dos índices da qualidade das águas, sem mencionar as demais fun-ções que a bacia do Guarapiranga cumpre.

As áreas de restrição à ocupação do solo correspondem às áreas de primeiracategoria, compostas por matas protegidas pela lei de mananciais, áreas delimi-tadas com declividade superior a 60%, a faixa de proteção de 30 m dos corposd’água, a faixa de proteção do reservatório e planícies aluviais dos rios com lar-gura superior a 10 m. Cabe acrescentar que não foi feita a compatibilização coma legislação ambiental promulgada nas décadas de 1980 e 1990, que dispõe denormas bem mais restritivas para os territórios, mesmo para aqueles onde nãoincide a proteção dos mananciais. Ao mencionar outras formações florestais, alémdas protegidas pelas leis de mananciais, não há sequer referência aos estágios davegetação, aspecto já delimitado pela legislação de conservação ambiental exis-tente.

As áreas de ocupação dirigida “correspondem àquelas de interesse para aconsolidação ou implantação de usos rurais e urbanos, desde que atendidos osrequisitos que garantam a manutenção das condições ambientais necessárias àprodução de água em quantidade e qualidade para o abastecimento das popula-ções atuais e futuras”, segundo as diretrizes preconizadas na Lei 9.866/97. Parao caso específico da Guarapiranga, foi delimitado um cenário direcionado para odesenvolvimento da região. Estima-se um acréscimo populacional de até 30% dapopulação atual com os novos empreendimentos, a partir de um parâmetro esta-belecido de aporte de cargas poluidoras.

A atração, indução e compensação ambiental dos empreendimentos possí-veis, mediante medidas de flexibilização, serão fornecidas pela recém-criada agên-cia de bacias, uma entidade não pública que será o órgão técnico responsável pelaaplicação da legislação de proteção dos mananciais, num desenho institucionalbastante distinto da figura do poder público enquanto agente normatizador eregulamentador da relação entre uso do solo e meio ambiente, como configura-do nas leis ainda em vigência de proteção dos mananciais.

As áreas de ocupação dirigida foram identificadas a partir do estágio docomprometimento com a urbanização, das potencialidades para a indução denovos empreendimentos compatíveis com a proteção dos mananciais e das con-dições para a disponibilização de infra-estrutura sanitária e viária. Os comparti-mentos definidos resultaram nas áreas de consolidação da ocupação urbana, nosassentamentos dirigidos para a população de baixa renda nas áreas complemen-tares àquelas de consolidação urbana, nos usos vinculados à represa, nas áreas deassentamento controlado, nas áreas para assentamento preferencial para empreen-dimentos de turismo e lazer, nas áreas de assentamento dirigido para usos diver-sificados e nas áreas de baixa densidade de ocupação.

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Nas áreas de consolidação da ocupação urbana, a visão implícita é a daqualificação dos espaços urbanos com a provisão de infra-estrutura viária, sani-tária e de transportes, com o reconhecimento das cidadelas existentes e com acompreensão mais aprofundada dos processos de produção dos espaços em rela-ção à que se depreende das leis de mananciais vigentes. Nessas áreas, os parâ-metros são flexibilizados, admitindo-se a figura da compensação ambiental paraos casos de verticalização e diversificação de usos. As áreas de assentamentodirigido para baixa renda correspondem praticamente a uma versão das áreas derecuperação ambiental.

Nos usos vinculados à represa, propôs-se, na forma de um plano para o fu-turo, a implantação de projeto já detalhado no âmbito do Projeto Parque Nove deJulho, que delimitou três áreas para intervenção e especificou as normas para oscomodatos e usos das margens da represa, que já deveria ter sido implantado.

Nas áreas de assentamento controlado, está sendo proposta a verticalizaçãode parte da área de drenagem do rio Embu-Mirim para empreendimentos habi-tacionais de médio e alto padrão, numa visão totalmente avessa às teses con-servacionistas e às possibilidades que esse espaço oferece. Nesse compartimen-to, destaca-se a intervenção do Rodoanel no trecho que recorta a bacia, antecipan-do-se à definição dessa intervenção, ainda em discussão na sociedade.

Quanto às áreas preferenciais para turismo e lazer, definiu-se o eixo peri-metral Itapecerica da Serra–Embu-Guaçu para empreendimentos de lazer, turis-mo e recreação, bem como para empreendimentos administrativos e empresari-ais, serviços compatíveis e usos institucionais de grande e médio portes, por meiode mecanismos de gestão e compensação ambiental.8

Os mecanismos de flexibilização e de desregulamentação adotados nesseplano buscam conciliar sua aplicação a uma área restrita e delimitada com pro-cedimentos semelhantes ao instrumento das operações interligadas, o que possi-bilita a flexibilização por empreendimento. Esse instrumento, que tem reflexosnos mecanismos de apropriação das rendas fundiárias, tem sido muito questionadoentre os urbanistas.

O compartimento articulado ao longo da rodovia Régis Bittencourt foi in-dicado para usos diversificados, sobretudo para a implantação de atividades in-dustriais não-poluentes ou comerciais de grande porte, mediante negociação ba-seada nos diversos mecanismos de flexibilização dos padrões de uso e ocupaçãodo solo. Trata-se de uma via potencial de comunicação com o Mercosul.

As propostas para esse setor da bacia têm que ser visualizadas em cartageográfica, pois há uma sobreposição de propostas no texto do plano, visto queas áreas ao longo da rodovia Régis Bittencourt seguem o curso do rio em um mo-delo de estruturação viária típica da metrópole paulista — rio, rodovia ou ferro-

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via e indústria —, referindo-se, portanto, à planície aluvional do rio Embu-Mi-rim. Por conseguinte, não é possível compatibilizar os usos industriais ou comer-ciais de porte e de habitação para as camadas de mais alta renda e a preservaçãoda várzea do rio Embu-Mirim, como preconizado no texto do referido plano.

As proposições acerca das possibilidades de implantação de indústrias aolongo dessa rodovia devem ser lidas em consonância com as novas discussões queapresentamos sobre o papel estratégico de comando e gerenciamento presentes naliteratura sobre as cidades globais. Uma nova visão da cidade pós-industrial cen-trada no terciário superior, voltado ao “modo de produção informacional”, foidesenvolvida por autores como Castells (1985) e Sassen (1998), que analisarama relação entre a alta tecnologia, a reestruturação econômica e o processo urba-no regional, que se encontra em curso em São Paulo, conforme análises de Tor-res (1993) e Negri e Pacheco (1994).

A ênfase nas alterações da legislação dos mananciais para a implantação deindústrias caminha em direção contrária ao percurso das principais cidades mun-diais, que têm buscado alternativas para o novo papel conferido às cidades, crian-do possibilidades de gerar empregos e receitas para as municipalidades. Na cidadede São Paulo, observa-se há duas décadas uma profunda reestruturação na suabase econômica, com a gradativa diminuição das indústrias — inclusive em facedo papel exercido pela legislação ambiental promulgada na metrópole paulista nadécada de 1970 —, restringindo-se sobretudo as industrias intermediárias, consi-derado o setor industrial mais dinâmico, embora também seja o mais poluente. Aimplantação de indústrias não-poluentes é possível no âmbito da legislação vigen-te, conforme analisamos, e o aumento da área construída permitida é atualmen-te inócuo; os processos de produção têm se alterado com a terceirização do seg-mento industrial, ocasionando uma tendência à diminuição das áreas industriais.

Para as áreas de baixa densidade de ocupação, inseridas nos vetores sul eoeste da bacia, deverão ser mantidas e estimuladas a baixa densidade de ocupa-ção e a predominância do setor primário, ou seja, empreendimentos turísticos ede lazer. De acordo com o Programa do Guarapiranga, novos assentamentos ur-banos não são recomendáveis, devendo ser controlado o vetor de expansão Embu-Guaçu–Cipó–Parrelheiros.

A manutenção dos espacos agrícolas existentes na bacia transformou-senuma diretriz para o futuro, denotando as limitações para a implantação de usosalternativos ao binômio urbano-industrial e das estratégias para um desenvolvi-mento sustentável.

A implantação de chácaras de lazer é absolutamente compatível com omodelo de uso e ocupação do solo da legislação ambiental. Nesse aspecto, o pla-

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no não inova nem acrescentando reais possibilidades desse tipo de uso. Cabedestacar ainda que a implementação das chácaras de recreio no contexto dos anossetenta só se fez possível quando o excedente da economia foi canalizado parao mercado fundiário, incluindo a chamada segunda residência.

As mudanças propostas representam instrumentos de intervenção mais di-nâmicos e mais adequados para a realidade sobre o qual se aplicam. Contudo,podem representar o desmonte do poder público e a substituição pelos mecanis-mos de mercado e a expressão destes nos interesses localizados.

Acreditamos que, para a utilização de mecanismos de flexibilização dasnormas ambientais, seja necessário definir parâmetros além dos sanitários, poisvárias diretrizes preconizadas são muito genéricas, há confusão dos usos desejá-veis para determinados compartimentos — caso da várzea do rio Embu-Mirim —,faltam parâmetros para os elementos estruturadores do espaço, como o sistemaviário e de transportes, e a proposta de implantação de indústrias, além das per-mitidas pela legislação atual, encontra-se na contramão das alternativas que asgrandes cidades mundiais têm buscado para enfrentar a questão da geração deemprego e de receitas para os governos locais.

No que se refere às áreas de recuperação ambiental, são elas definidas,segundo as diretrizes da Lei 9.866/97, “como aquelas cujos usos e ocupaçõesestejam comprometendo a fluidez, potabilidade, quantidade e qualidade dos ma-nanciais de abastecimento público, e que necessitem de intervenção de carátercorretivo. Após a intervenção nessas áreas, estas serão caracterizadas como deocupação dirigida ou como áreas de restrição”. Nesse aspecto, o plano reitera aproposta do Programa Guarapiranga, de minimizar os impactos sociais com arelocação da população, reconhecendo e adequando, quando atenderem aos parâ-metros, essas verdadeiras cidadelas que se formaram na região do Guarapiranga.

O modelo institucional proposto no plano segue as diretrizes das leis 7.663,de 1991, e 9.866, de 1997, que dispõem sobre a Política Estadual de RecursosHídricos, e a Lei 710 de 1998, referente à constituição das agências de baciashidrográficas, já discutidas anteriormente.

A reflexão sobre os processos e propostas em curso concernentes à legis-lação de proteção dos mananciais, agora no âmbito do Sistema de Gestão dasÁguas, adquire importância ímpar na discussão dos vínculos entre a emergênciado projeto ambientalista e o projeto neoliberal, com impactos sobre a cidade e omeio ambiente.

Entretanto, amplos setores vinculados a grupos populares — urbanos eambientais — têm defendido a elaboração de um projeto de uso e ocupação dosolo abalizado em pactos territoriais entre os diversos agentes que atuam na ques-tão, não fundamentado na visão de um zoneamento do espaço rígido, baseado em

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um modelo de cidade ideal e excludente. A não-apropriação de “bandeiras” comoa da sustentabilidade e do meio ambiente por determinados grupos sociopolíticosenseja ainda a possibilidade do efetivo exercício participativo nessas novas for-mas organizativas. Trata-se de tema para muitas discussões, considerando os en-caminhamentos e os debates realizados no Poder Legislativo sobre a questão dagestão dos recursos financeiros do Fehidro, como os provenientes da cobrança douso das águas.

Para nós, questões em torno do processo de formação e apropriação dasrendas fundiárias urbanas, de desvalorização do ambiente construído e de espa-ços naturais constituem a face mais visível da problemática dos mananciais, nãosendo possível modificar esse quadro da degradação ambiental sem enfrentar asquestões da propriedade da terra. Assim, a implantação dos chamados projetossustentáveis é limitada pelo próprio conteúdo de suas ações, como evidenciam osdados da expansão da área urbanizada e da qualidade das águas na bacia doGuarapiranga.

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Notas

1. A preocupação com os remanescentes florestais em áreas urbanas pode ser verificada nosdispositivos no Código Florestal e suas atualizações (Leis 7.803 e 7.875 de 1989), naResolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Resolução nº 04/90), na legislação emtramitação que regulamenta o uso de áreas da Mata Atlântica (Decreto Federal 750/93 e suasalterações), na inclusão do cinturão verde de São Paulo nos limites da reserva da biosfera e,mais recentemente, em dispositivos do Código Ambiental aprovado em 1998, numa visãointegrada dos ecossistemas naturais.

2. Ver a sistematização dos dados da Sehab/Fipe referentes às favelas localizadas em áreasde mananciais in MARCONDES, Maria José Azevedo. Urbanização e meio ambiente: osmananciais da metrópole paulista. Tese de doutoramento apresentada a FAU-USP, SãoPaulo, 1995.

3. Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que apontam asseguintes taxas de crescimento demográfico entre os anos de 1980/1970 e 1991/1980:Parelheiros, 8,23 e 5,69; Embu-Guaçu, 7,43 e 4,97; e Cipó, 8,36 e 6,23; as taxas médias domunicípio de São Paulo giram em torno de 3,67 e 1,15 e as da Região Metropolitana, em tornode 4,46 e 1,86.

4. Análise realizada no âmbito do Projeto de Controle de Fontes Poluidores do Programa deSaneamento Ambiental da Bacia de Guarapiranga, do qual fui coordenadora entre os anos de1991 e 1995.

5. O Programa de Saneamento Ambiental foi elaborado por um grupo de trabalho criadoatravés do Decreto 32.266, de 15 de maio de 1991, e composto por técnicos da atual Secretariade Recursos Hídricos, Secretaria do Meio Ambiente, Secretaria da Fazenda, Secretaria doPlanejamento e Gestão, Prefeitura do Município de São Paulo, Companhia de SaneamentoBásico, Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano, Eletropaulo, Emplasa eCompanhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental. Esse grupo de trabalho contou com aparticipação da empresa Cobrape. Participei da elaboração desse programa e atuei comocoordenadora durante quatro anos, na implementação dos seguintes projetos deresponsabilidade da Secretaria de Estado do Meio Ambiente: Sistema de Parques (ParqueEcológico de Guarapiranga, do Embu-Guaçu, da ilha dos Eucaliptos); Sistema deRepovoamento Vegetal (margens da represa, faixas de domínio de rodovias e ferrovias darepresa, matas ciliares e áreas públicas urbanas nos seis municípios da bacia de Guarapiranga);recuperação de áreas mineradas (Baronesa e Giosa-Embu), Plano Diretor de Mineração da

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Bacia de Guarapiranga, Projeto de Controle de Fontes Poluidoras; Programa de EducaçãoAmbiental; Sistema de Controle da Qualidade das Águas e Plano de Resíduos Sólidos.

6. Com as proposições citadas, tinha-se a perspectiva de intervenções na direção dos projetosInner Harbor de Baltimore, Boston Waterfront em Boston, South Street Seaport em NovaYork e Docklands em Londres, ainda que em escala e com usos distintos.

7. No desenvolvimento desse trabalho, integro a equipe de coordenação e avaliação.

8. Os mecanismos de compensação ambiental referem-se, por exemplo, à aquisição eresponsabilidade por áreas a preservar, à implantação de infra-estrutura, à urbanização ourelocação de favelas, à recuperação de áreas degradadas e a demais medidas que promovama redução líquida da carga poluidora.

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Capítulo 5Cidade e natureza no limiar doséculo XXI

Na história da modernidade posterior ao século XVII, as características queestruturaram e determinaram as relações entre os espaços naturais e os construídosse assentaram na noção da dominação dos recursos naturais pelo homem, com aperspectiva de superar os limites da escassez, difundir os valores do domínioprivado sobre o público e reificar o espaço urbano.

A reificação do urbano na Idade Moderna foi exposta no século passadopor Marx,1 por meio da identificação das formas de organização social e do es-paço de assentamento ligados ao modo de produção. Nessa perspectiva, a histó-ria moderna é entendida como a urbanização da zona rural em contraposição àhistória clássica antiga, compreendida como a história de cidades baseadas na pro-priedade da terra e na agricultura mediante um processo de ruralização dascidades, e da história da Idade Média, quando o campo era o locus da socieda-de, cujo desenvolvimento posterior ocorreu pela oposição entre cidade e campo.

As formas de urbanização dos territórios adquiriram diferentes contornosao longo da história urbana contemporânea. De maneira esquemática, verifica-seque nos primórdios da industrialização os núcleos urbanos possuíam uma formabem definida, com clara diferenciação entre campo e cidade. Nessa última, o ca-pitalismo industrial era representado pela fábrica e a forma espacial correlata, acidade industrial, com os limites do entorno bem delimitados. Já nas cidades dopós-guerra, com o aparecimento da empresa multinacional na fase denominada

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“capitalismo tardio”, surgiu a região metropolitana, com vários centros e esferasde influência sediados em unidades diversas de produção em função da empre-sa multinacional.

Na atualidade, a pesquisa contemporânea sobre a expansão das cidades –em especial da expansão metropolitana – enfatiza os processos de desconcen-tração urbana. Acredita-se que o encadeamento das atividades no espaço regio-nal se dê por intermédio de formas de organização social ligadas por telecomu-nicações, campos eletrônicos de processamento de informação e deslocamento depessoas por meio dos sistemas de transportes. Configura-se, pois, cada vez maisacentuadamente, uma metrópole desconcentrada.

Em meio às diferentes abordagens que delineamos anteriormente, eviden-ciou-se uma nova configuração espacial com transformações na estrutura econô-mica das grandes cidades, agora voltadas ao terciário superior e às funções degestão e de comando, com reflexos diretos nos padrões de ocupação do solo e daapropriação dos recursos ambientais.

A reificação das relações urbanas no território realizou-se mediante a inte-gração das cidades em um sistema de serviços, informações e comunicações cadavez mais unificado globalmente. Em outros termos, a inexorabilidade da urbani-zação dos territórios não implicou a unificação urbanística de todo o território,mas sim o predomínio dos processos urbanos.

Nas últimas décadas, as distinções entre cidade e campo diluíram-se comreflexos intensos nos domínios mais distantes do meio ambiente. Esse fato acen-tuou-se nos processos de urbanização decorrentes das alterações no modo deprodução fordista, cujos impactos espaciais resultaram da adoção de uma novalógica dos processos de localização industrial: ressalta-se as formas como são ocu-pados os espaços, e não mais a célebre questão da definição dos limites urbanosdas cidades. Por outro lado, os níveis de desenvolvimento econômico e os padrõesvigentes nos processos de urbanização demandam cada vez mais vastas superfí-cies territoriais para sustentar uma cidade. Citaríamos como exemplo as cidadesde Londres, Los Angeles e Nova York, que consomem recursos naturais de áre-as aproximadamente cem a quatrocentas vezes maiores que a superfície ocupa-da pelo assentamento urbano, conforme dados de Alberti (1997).

A inexorabilidade da urbanização dos territórios conduziu à reflexão de umurbanismo ecológico, de acordo com Argan (1992), que considera superada, nasteorias urbanas atuais, a concepção racionalista do urbanismo como subdivisão,distribuição, organização e construção do espaço. Tal concepção foi sucedida peloconceito de ambiente, que não admite nenhuma definição racional ou geométri-ca e que se concretiza em um conjunto de relações e interações.

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Para nós, os contornos dessa discussão referem-se aos processos sociaisresultantes das reestruturações das cidades globais. A esse repeito, destacaríamosque as cidades mais ligadas ao processo de globalização, dentre as quais se in-clui a cidade de São Paulo, caracterizam-se pela existência de contrastes sociaisassustadores, em que a concentração da propriedade e as alterações na estruturaprodutiva refletem diretamente nos padrões de urbanização e nos processos deapropriação dos recursos ambientais.

Os reflexos das formas de urbanização vigentes, com referência à conser-vação dos recursos naturais, são eloqüentes na metrópole paulista. Até o início dadécada de 1990 a superfície urbanizada chegou a pouco mais de 20% do territóriometropolitano, com 1.765 km2; contudo, os impactos ambientais resultantes sãobrutais, de acordo com o que pudemos constatar por meio da análise dos indica-dores ambientais apresentados, como o de desmatamento e o do esgotamento daprodução de água nos limites metropolitanos para suprir as demandas existentes.Os indicadores de incremento da área urbanizada, bem como os dos índices dedesmatamento e o último recenseamento demográfico reafirmam as tendências dadesconcentração urbana e da pressão da urbanização sobre os recursos ambientaisremanescentes.

Foi nesse contexto da inexorabilidade da urbanização dos territórios queinserimos a problemática dos mananciais da metrópole paulista, buscando captarsuas especificidades. Para a dimensão dessa problemática, cabe mencionar que asáreas de proteção dos mananciais abrigavam, em 1991, uma população estima-da em 1.350.000 pessoas.

Assim, no contexto socioeconômico das cidades globais, questionamos adimensão do projeto ambientalista e as possibilidades reais de controle ou degestão ambiental em direção à construção de cidades sustentáveis e de um urba-nismo ecológico em face da perspectiva de uma urbanização periférica e exclu-dente, de uma mobilidade ocupacional e flexibilidade gerencial, que permita arecolocação de unidades produtivas de uma região à outra, compondo um vínculocada vez mais tênue entre residência e trabalho e a produção de um espaço emque o poder local tenha sua participação reduzida, no bojo de uma estrutura depropriedade privada da terra.

Da mesma forma que buscamos na teoria crítica as noções sobre espaçolocal, espaço físico e estrutura urbana e a recuperação de suas dimensões, bus-camos nessa direção a leitura do espaço enquanto expressão de relações sociaismais amplas, como resultado da propriedade privada da terra e de sua expressãoeconômica – as rendas fundiárias –, e dos interesses e conflitos latentes nas di-nâmicas da produção do espaço urbano. Valendo-nos desses aspectos, questiona-

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mos amplamente as possibilidades da intervenção pública nos processos de pro-dução dos espaços e de gestão dos recursos ambientais.

Na atualidade, essas possibilidades de intervenção adquiriram outros con-tornos com o vigoroso questionamento, nas últimas décadas, da racionalidadepresente nas políticas de controle do espaço, emergindo, como conseqüência, umconjunto de novas referências para o tema da urbanização e do controle ambien-tal. No contexto atual, marcado pela fragmentação dos discursos e práticas e pelaidéia de pactos territoriais, em contraposição ao estabelecimento de modelos rí-gidos formulados pela tecnocracia do Estado, emergem novas questões, tanto nodiscurso neoliberal como nos setores comprometidos com a questão socioam-biental.

A proposição de estruturas de planejamento totalizantes foi amplamentequestionada nas últimas décadas, tendo como ponto de partida o questionamentodo próprio pensamento moderno, sobre o qual se estruturam as práticas por nósestudadas e o contexto no qual este livro se insere.

A defesa da desregulamentação e a proposição de instrumentos de avalia-ção da capacidade de suporte das estruturas espaciais para a gestão urbana e am-biental e para a defesa de pactos territoriais: eis o caminho que tem sido defen-dido no projeto de cidades sustentáveis ou de urbanismo ecológico. Porém, ocenário que se apresenta está muito distante das evidências da dinâmica da pro-dução do espaço configurada na pesquisa que realizamos.

Habermas (1987), ao ver no emergente movimento ambientalista um papela desempenhar nas transformações de formas de vida, com o fim das utopiassocialistas, anuncia uma possibilidade futura (vide página 50). Os mecanismosinstitucionais de gestão dos recursos ambientais que estão sendo estabelecidos,introduzindo as estratégias dos pactos territoriais para o equacionamento de con-flitos em torno de projetos de impacto ambiental, de formas de produção e apro-priação dos espaços e de gestão dos recursos ambientais, lançam possibilidadesde contratendências do quadro de crise social e ambiental da área de mananciais.

A esse respeito, acreditamos que o caminho a ser percorrido, no que serefere à questão da proteção dos mananciais e da urbanização dos territórios, sejao da ampliação da atuação de amplos setores comprometidos com a questãosocioambiental, incluindo os movimentos sociais urbanos e o movimento am-bientalista. A atuação que objetivamos deve se fundamentar na avaliação críticada legislação editada na década de 1970 e em suas atualizações. A discussãosobre as possibilidades e os limites de um urbanismo ecológico nos mananciaisfunda-se nessa perspectiva.

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Possibilidades e limites de um urbanismo ecológico nosmananciais

A pesquisa desenvolvida no âmbito desta obra identificou três direções: aespecificidade da irregularidade e da clandestinidade do uso do solo em área demananciais; o impacto do controle ambiental na localização industrial; e, porúltimo, o impacto da aplicação da legislação de mananciais no direcionamento daexpansão urbana. Tais aspectos, levantados quando da análise da legislação edi-tada em meados da década de 1970, amparam-se em um pensamento de baseracionalista, fundado na idéia do controle ambiental do espaço por meio de mo-delos ideais de ocupação do solo, regulamentando as relações entre o meio am-biente e o uso e a ocupação do solo, em especial do solo urbano.

A segunda vertente do trabalho baseou-se na leitura dos chamados proje-tos sustentáveis implantados em uma região emblemática, do Guarapiranga, SãoPaulo, assim determinada por causa dos problemas que se articulam a partir dainterseção entre o processo de urbanização e a dinâmica dos recursos hídricos emuma bacia hídrica específica. Nessa região, a urbanização de parte de sua super-fície territorial gerou o aporte brutal de cargas poluidoras na represa, colocandoem risco a capacidade de assimilação do reservatório, com possibilidade de per-da de produção de água com qualidade compatível para o abastecimento públi-co com tratamentos convencionais.

A terceira vertente debruçou-se sobre o primeiro plano de proteção e recu-peração ambiental das bacias hidrográficas protegidas, o qual foi formulado noâmbito das novas diretrizes de proteção e recuperação dos mananciais do estadode São Paulo. As propostas reguladoras das relações entre o uso do solo e a pro-teção ambiental inserem-se na perspectiva da desregulamentação, flexibilizaçãodas normas e compensação ambiental, em um novo cenário institucional.

O objetivo geral, a ser alcançado por meio das três dimensões da análisedesenvolvida, foi o entendimento das possibilidades e dos limites do controle egestão ambiental de uma urbanização desconcentrada e excludente.

O impacto das medidas de controle ambiental nos processos de produçãodo espaço foi diferenciado, segundo as várias regiões da área metropolitana. De-monstra-se assim, a natureza social da produção do espaço, observando-se inclu-sive uma ampliação da área agrícola no vetor leste da metrópole e apropriaçõesdiferenciadas no vetor norte, o qual detinha, até os anos noventa, um padrão maisqualificado no que diz respeito às dinâmicas urbanas e ambientais nas áreas con-tidas no perímetro dos mananciais, em contraposição às áreas situadas fora des-

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ses limites. As regiões sul e sudoeste da metrópole, entretanto, nas quais houveum processo de apropriação do solo sob formas intensamente degradantes, pas-saram a traduzir o processo de dualização social, configurando-se em ilhas deexclusão social.

Os efeitos da aplicação da legislação ambiental também foram diferencia-dos ao longo do tempo: na década de 1970 foi possível viabilizar, na área deproteção dos mananciais, o parcelamento do solo em grandes lotes, como preco-nizado no modelo proposto, mesmo nos vetores sul, sudoeste e parcialmente nosudeste. Tais processos de parcelamento internalizavam o excedente econômicogerado na economia para a formação de rendas fundiárias urbanas. Na década de1980, todavia, esse processo foi interrompido.

Quanto ao impacto da legislação de mananciais no direcionamento da ex-pansão urbana na metrópole, os levantamentos efetuados não confirmaram aspremissas esboçadas, a saber o fomento da urbanização para o vetor leste e darestrição da expansão urbana nos vetores sul e sudeste, apontando inclusive umareversão das tendências verificadas nos anos setenta. Para o vetor nordeste, aspremissas do Plano Metropolitano se confirmaram, embora as transformaçõesocorridas nos espaços do vetor nordeste evidenciem claramente as formas deocupação do espaço, resultantes das intervenções do Estado. O crescimento ur-bano nesse vetor foi redirecionado, haja vista o volume de investimentos públi-cos realizados sobretudo nas atividades do setor terciário. Essa situação não serepetiu no vetor leste, com a interrupção dos investimentos após a construção dalinha do metrô, nos anos oitenta.

A legislação de proteção dos mananciais, junto com outros instrumentos,produziu impactos nos processos de estruturação físico-territoriais, ao restringiros usos industriais do denominado “grupo intermediário”, considerado um dossetores mais dinâmicos da economia brasileira na década de 1980 e com alto po-tencial poluidor. Por outro lado, a implantação das indústrias compatíveis com aproteção ambiental não foi viabilizada nessas áreas, denotando aqui os limites dasestratégias da sustentabilidade e a complexidade de outros aspectos da estruturasocioeconômica que interferem na problemática.

Quanto à segunda vertente do trabalho – a leitura dos chamados projetossustentáveis – os informes que possuímos sobre a continuidade do Programa Gua-rapiranga indicam que houve um redirecionamento, com a concentração maciçade recursos nas ações corretivas de recuperação urbana. Os indicadores ambientaisdisponíveis permitem constatar ainda que a urbanização incidiu em áreas longín-quas e em compartimentos ambientais frágeis, com um padrão de ocupação dosolo que seguiu nas mais variadas direções, tanto nos núcleos antes ocupados pela

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atividade rural como nos núcleos urbanos isolados e em áreas florestadas em di-reção ao sul da bacia.

Nos dias de hoje, a questão dos mananciais da metrópole paulista inscre-ve-se em outra visão do papel a ser desempenhado pelo poder público no con-trole e gestão do espaço e dos recursos ambientais. De fato, as proposições atuaiscontidas no Plano de Desenvolvimento e Proteção Ambiental para as áreas dabacia do Guarapiranga, ainda em discussão no meio técnico, constituem-se emuma inflexão no modelo de gestão urbana e ambiental vigente fundamentada naracionalidade dos processos de tomada de decisão, segundo um modelo precon-cebido e ideal de cidade e de sua interface com o meio ambiente.

As mudanças propostas baseadas na idéia da desregulamentação – a flexi-bilização das normas, a compensação ambiental e a urbanização compartida –representam instrumentos de intervenção mais dinâmicos e mais adequados àrealidade sobre a qual se aplicam. Contudo, a efetividade das medidas propostaspode ter resultados distintos, a depender do grau de articulação e de organizaçãodos diversos agentes com poder de interferência. Esses novos instrumentos po-dem representar o desmantelamento dos sistemas de controle ambiental e a subs-tituição destes pelos mecanismos do mercado imobiliário e sua expressão repre-sentados nos interesses localizados; por outro lado, podem gerar a emergência depráticas de gestão de conteúdo e alcance socioambiental, diante da descentra-lização do poder que possibilitam essas novas formas de gestão, como a da Agên-cia de Bacias.

Nas áreas de ocupação dirigida, introduziu-se o conceito de flexibilização,em contraposição ao estabelecimento de um zoneamento e à adoção de um mo-delo de uso e ocupação do solo de acordo com a legislação em vigor. Tal con-ceito, que norteia e inova a maneira de encarar a gestão e o controle dos recur-sos ambientais, tem estado constantemente presente nos debates urbanos e am-bientais.

A flexibilização, por sua vez, corresponde à chamada desregulamentaçãopara o caso urbano, em contraposição aos esquemas rígidos do zoneamento dourbanismo moderno cuja aplicação permeou o século XX. Esse outro conceito,junto com a idéia da urbanização compartida – que vem a ser a implantação deempreendimentos de porte pela iniciativa privada, sendo as normas vigentes flexi-bilizadas em troca da implantação, por parte dos empreendedores privados, deatividades ou obras cuja atribuição recai normalmente sobre o poder público, ouainda de outras medidas de compensação ambiental –, demanda a fixação deparâmetros e diretrizes ambientais e um reforço no papel regulador do Estado.

A propósito, julgamos que, para a utilização dos mecanismos propostos,seja necessário definir critérios além dos sanitários, pois não há parâmetros paraos elementos estruturadores do espaço, tais como o sitema viário e o de transpor-

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tes. Como exemplo emblemático, destacaríamos o Rodoanel, uma via de 116 kmque interliga a região metropolitana e atravessa a área de mananciais ao norte eao sul, e outros projetos viários de impacto mencionados anteriormente, de modoa permitir a compatibilização desses sistemas com os sistemas de meio ambiente.

A avaliação das possibilidades de intervenção nos processos de produçãodo espaço dependerá, assim, do grau de articulação dos diferentes atores sociaise da articulação destes com as outras escalas que têm influência sobre a áreapropriamente dita. A mencionada avaliação deve considerar a inexorabilidade daurbanização dos territórios e as possibilidades e limites de um urbanismo ecoló-gico nos mananciais, de modo a reverter o quadro da degradação ambiental e daexclusão social, no novo cenário institucional desenhado com a promulgação dalegislação que cria as agências de bacias hidrográficas e as normas e diretrizespara a recuperação e proteção dos mananciais no estado de São Paulo, para agestão dos recursos hídricos.

No Capítulo 3, verificamos um discurso bastante ambientalizado (ideoló-gico) do Estado, em que pesasse a extensa legislação ambiental promulgada nasdécadas de 1980 e 1990, principalmente. Contudo, pressente-se a ausência davariável ambiental nas demais políticas públicas setoriais.

Os avanços da questão dos mananciais ocorreram em virtude da mobi-lização de determinados segmentos da sociedade civil. Como exemplo citamos aelaboração da Constituição paulista, em 1989, na qual determinou-se como pre-ceito constitucional a despoluição da represa Billings.

À guisa de conclusão, retomamos a idéia desenvolvida por Pádua (1989),segundo o qual a conceituação do que hoje se denomina política ambiental deveser a redescoberta do sentido da razão pública e do espaço público, expressõesnegadas na história da modernidade com a valorização do espaço e da atividadeprivada. A perspectiva da problemática ambiental no contexto dos mananciais,apontada por nós ao longo deste livro, emerge hoje como uma possibilidade deintervenção dos setores que contemplem e reúnam interesses socioespaciais ba-seados, por exemplo, na noção de território, e que transcendam os interesses declasse, como no caso do movimento ambientalista.

Notas

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Page 235: 951303_Cidade e Natureza_Proteção Dos Mananciais e Exclusão Social

237

Índice das tabelas

Tabela I Cidade de São Paulo – favelas por tempo de ocupação (1965-91) ..... 121Tabela II Cidade de São Paulo – superfície (m2) ocupada por loteamentos

clandestinos por região (1965-91) ......................................................... 122Tabela III Cidade de São Paulo, área de mananciais – superfície (m2) ocupada

por loteamentos clandestinos por região, município de São Paulo,área de mananciais (1965-91) ................................................................ 123

Tabela IV Região Metropolitana de São Paulo – evolução da área urbanizada,segundo municípios e regiões (1965-90) .............................................. 134

Tabela V Região Metropolitana de São Paulo – evolução da área urbanizada,segundo vetores de crescimento (1965-90) ........................................... 135

Tabela VI Região Metropolitana de São Paulo — distribuição de favelas, segundomunicípios e regiões (1980-90) ............................................................. 152

Tabela VII Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – superfícierecoberta por matas ................................................................................ 158

Tabela VIII Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – evoluçãoda área urbanizada (1965-90) ................................................................ 160

Tabela IX Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais — relação dosempreendimentos a atividades aprovados por tipo de uso (1976-85) . 163

Tabela X Cidade de São Paulo, área de mananciais – distribuição de favelaspor tempo de ocupação (1965-91) ........................................................ 165

Tabela XI Cidade de São Paulo, área de mananciais – bacia Billings –distribuição de favelas por tempo de ocupação (1965-91) .................. 165

Tabela XII Cidade de São Paulo, área de mananciais – bacia do Guarapiranga –distribuição de favelas por tempo de ocupação (1965-91) .................. 166

Tabela XIII Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais – relaçãode empreendimentos e atividades autuados por tipo de uso (1978-91)171

Tabela XIV Região Metropolitana de São Paulo — número de estabelecimentosindustriais (1960-85) .............................................................................. 178

Tabela XV Região Metropolitana de São Paulo, área de mananciais — relação deindústrias existentes (1980) ................................................................... 181

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Índice das figuras

Figura 1 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia do Guarapiranga.Regiões de proteção dos mananciais ...................................................... 75

Figura 2 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia do Alto CotiaRegiões de proteção dos mananciais ...................................................... 77

Figura 3 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia JuqueriRegiões de proteção dos mananciais ...................................................... 79

Figura 4 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia TaiaçupebaRegiões de proteção dos mananciais ...................................................... 81

Figura 5 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia BillingsRegiões de proteção dos mananciais ...................................................... 83

Figura 6 Zoneamento ambiental (classes de uso) – bacia Itatinga ...................... 85Figura 7 Vistas aéreas da bacia Billings ................................................................ 94Figura 8 Região Metropolitana de São Paulo – Área de Mananciais –

Evolução da Área Urbanizada – 1974/1990 ......................................... 141Figura 9 Região Metropolitana de São Paulo – Área de Mananciais:

Zonas de Uso Industrial e outras Áreas Ambientais ............................. 184Figura 10 Vista aérea da bacia do Guarapiranga – 1980 ...................................... 198