A 3ª idade e o sofrimento como missão

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Irmã Conceição Vicente, aci

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A 3ª IDADE E O SOFRIMENTO COMO MISSÃO

Todos nós temos uma missão enquanto vivermos neste

mundo. Seja na saúde ou na doença. Na alegria ou na tristeza…

E com mais razão se somos cristãos. A longevidade é uma

bênção de Deus.

A muita idade é sabedoria acumulada; é experiência de vida; é

muito amor para dar; é maior proximidade de Deus… Tenho mais tempo para rezar, para fazer aquilo que gosto.

Mas, também é sofrimento, sofrimento que vai muito para além

do físico: Perdes capacidades; é necessário ir despojando-te de tudo, até da tua própria vontade, do "teu próprio amor querer e interesse" (S. Inácio). E sofrerás muito mais se assim não acontecer.

"Quando eras mais novo ias para onde querias, quando fores velho, outro te cingirá e te levará para onde não queres". (cf Jo 21, 18)

Que inteligente é, o saber retirar-se a tempo! Dar lugar aos outros… Mas que difícil também…

Por vezes oiço pessoas, que ao atingirem a idade da reforma dizem: "Agora já não sirvo para nada… Já ninguém me quer

para trabalhar, fico sem nada para fazer. Eu não aguento sem fazer nada. Que vai ser de mim?"

Qualquer pessoa só fica sem fazer nada se quiser: Se não vive

muito longe pode inscrever-se na Universidade Sénior.

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Enriquece a sua vida desenvolvendo as suas capacidades. Cria

novos amigos.

Pode inscrever-se como voluntário para qualquer área. Há tanta

necessidade de voluntários…

Talvez tenha alguma capacidade, por exemplo de mãos, que nunca teve possibilidade de desenvolver. Tenho visto coisas

lindas por idosos que já não podem fazer mais nada.

Ou simplesmente, pode ajudar outro idoso que está sozinho,

fazendo-lhe companhia, a ir ao médico, a fazer-lhe os recados que ele já não pode fazer. E ainda o colaborar nas tarefas de casa, para que à tardinha possam dar um passeio juntos. E isto

aplica-se tanto à mulher como ao homem. Para já não falar sequer da ternura dos avós pelos netos, quem tem a sorte de os

ter por perto…

Sta Rafaela Mª dizia que "O mundo seria um paraíso, se todos nos preocupássemos por fazer felizes os que nos rodeiam"

E Jesus diz-nos: "Tudo o que fizerdes a um destes meus irmãos é a mim que o fazeis".

O sofrimento é missão, como o foi o de Jesus.

O sofrimento ajuda-nos a crescer como pessoas e capacita-nos

para nos aproximarmos cada vez mais de Deus, porque Deus agora pode ocupar o espaço todo. Já desapareceram muitas

preocupações da vida, embora, por vezes surjam outras: Começa a interessar cada vez mais só o essencial.

"Na debilidade pode resplandecer a força de Deus, se confiamos n'Ele". (CGXVI,D.I.) "Grande confiança n'Aquele que tanto nos ama e tão poderoso é" (Sta Rafaela Mª).

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Mas só serás plenamente feliz se puseres toda a tua confiança

só em Deus, unicamente e não em criatura alguma.

E se aceitares com paz as tuas debilidades e pobreza, as tuas

limitações e pequenez.

"Meus irmãos, considerai como motivo da maior alegria, as provações porque tendes passado". (Tgo. 1,2)

Terás que integrar o sofrimento na tua vida, o que não é nada fácil. Primeiro terás que deixar-te reparar, refazer. O Senhor

purifica-nos como o ouro no crisol. Mas também nos convida a unir o nosso sofrimento ao Seu pela redenção do mundo.

Sofrimento aceite e oferecido "Por Cristo com Cristo, e em Cristo":

» Pela Igreja, santa e pecadora, tão longe do ideal de Jesus

Cristo.

"Completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo, pelo seu corpo que é a Igreja". (Col.1,24) Isto é missão.

» Pelo mundo, este mundo "roto pelo pecado", pelo qual Jesus Se entregou e deu a sua vida. Este mundo, cada vez mais

esquecido de Deus, que parece querer afastá-LO para o mais longe possível. Mas é este o mundo que Deus ama.

» Pela paz, por tanta gente escravizada, oprimida, marginalizada, maltratada, condenada como Jesus. Isto é

missão.

Sta Rafaela Mª, já com alguma idade e com muito sofrimento, escrevia:

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"Eu estou neste mundo como num grande templo e eu como sacerdote dele devo oferecer a Deus contínuo sacrifício de ação de graças". É lindo! Ofereço-me como oferenda agradável ao

Pai. Melhor dito, é o próprio Jesus que me oferece com Ele ao Pai.

» Sofrimento oferecido também pelas vocações para a Igreja:

Sacerdotais, Religiosas e Missionárias

» Pelos Institutos Religiosos, para que sejam santos em todos

os seus membros e vivam com alegria e entusiasmo a missão, os desafios que o Senhor lhes confia hoje, na Igreja e no mundo. Isto é missão.

» Pelos Leigos que consagram a sua vida ao serviço dos outros.

Os idosos e doentes são o suporte daqueles que estão na linha

da frente:

Tudo por Ele, com Ele e n'Ele, para a Glória de Deus Pai.

"Permanecei em Mim…porque sem Mim nada podeis fazer".(cf.Jo.15,4-5)

Deus só nos pede disponibilidade ao seu amor. Ele fará o resto.

Estar sempre atentos e disponíveis para "fazer só e só e sempre a sua vontade" (Sta R.Mª)

Não, os idosos e doentes, não são uma carga, nem são inúteis. São um dom de Deus á família e um testemunho de vida para

os mais jovens. Continuam a missão que o Senhor lhes confiou na Igreja e no mundo. São parte integrante do projeto de amor e misericórdia que Deus tem para este. São as colunas deste

edifício que é a Igreja, Corpo Místico de Cristo. São chamados a testemunhar a Eucaristia que celebram. Isto é missão.

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Deus precisa de nós e continua a sofrer em cada um de nós.

Para mim, a grandeza do meu sofrimento é esta, precisamente: Jesus Cristo sofre em mim. E não posso vê-lo de outra maneira:

Se Ele me ama e me habita, não pode deixar de sofrer também em mim, igual que ama em mim, e eu atrever-me-ia a dizer que Se ama em mim e comigo continua a oferecer-se ao Pai.

"Estou cruxificado com Cristo… É Cristo que vive em mim… vivo animado pela fé no Filho de Deus que me amou e se entregou a si mesmo por mim". (cf.Gál.2, 19-20)

"Estou crucificado com Cristo", não estou sozinho na minha Cruz. "É Cristo que vive em mim", sofre em mim, suaviza, com a

sua graça, o meu sofrimento. Acompanha-me desde dentro. É Ele que me dá força, para seguir a caminhada até alcançar a

meta. É esta a fé que me anima. Porque tenho a certeza de que "Ele me amou primeiro" e "Se entregou por mim". Sofreu por

mim. "Quem nos poderá separar do amor de Jesus Cristo? A tribulação, a angústia...? Mas em tudo isto somos nós mais que vencedores, graças Àquele que nos amou". (cf.Rom.8,35-37) "Basta-te a minha graça, porque é na fraqueza que a minha força se revela totalmente…por isso glorio-me nas minhas fraquezas, nas afrontas…nas angústias por Cristo, pois quando me sinto fraco, então é que sou forte". (cf.2Cor.12,9-10)

Não estamos sozinhos na maratona da vida. O sofrimento e os anos tornam-nos mais humanos, mais agradecidos, mais compreensivos e misericordiosos: Isto é missão.

Mas o sofrimento também nos pode escravizar. O sofrimento não me humaniza, quando não o aceito, quando me fecha ao

sofrimento dos outros, quando me fecha ao AMOR.

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O sofrimento é também testemunho de vida: Pela fidelidade

vivida, pela alegria e entrega, a Deus e aos outros. Já falámos muito, já fizemos muito, talvez seja o momento de parar e

deixar que Deus fale, que Deus faça. "Que termine em mim a obra que Ele começou". Que bom é ver algumas pessoas com tanta idade e tanto sofrimento, estarem tão felizes! sempre com

um sorriso nos lábios e com e com tão bom humor e boa disposição… Isto é missão.

O sofrimento não é impedimento à felicidade, porque se somos e estamos em Deus, Deus é a FELICIDADE, como dizia aquela Escrava aos 93 anos e três dias antes de morrer. À pergunta da

enfermeira: "Então Irmã, como é que se sente hoje?" Respondeu: "Muito bem, estou em Deus e Deus é a felicidade".

Que coisa maravilhosa!

Tudo isto não se improvisa e só se pode forjar numa íntima

união com Deus: "Tudo posso n'Aquele que me dá força". (Fil.4,13) De contrário é impossível. Podemos tornarmo-nos, egoístas, amargurados, impossíveis de aturar, em que só vemos

os defeitos dos outros e podemos chegar a ser uma verdadeira carga, para nós próprios e para os que nos rodeiam. Mas, "em tudo isto, somos mais que vencedores graças Àquele que nos amou". (Rom.8,37)

A muita idade "vem a ser um arder constante e lento, expressando o amor na luz da alegria dos dias claros e no fumo escuro e escondido dos passos cinzentos de cada dia… A lâmpada ilumina sem que a luz grite… O incenso arde na sua presença como expressão de um amor silencioso e gratuito… (Precisamos de) aprender a lição da gratuidade: Fazer tudo por amor, entregar-se por amor, abandonar-se por amor… Quando entras na nuvem misteriosa da dor, descobres que, desde essa escuridão, podes viver numa intercessão constante". ("Peregrino

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del silencio" de Jaume Boada i Rafi). E, "o amor tudo vence. Peçamos continuamente esse amor". (Cf.Sta R.Mª)

Por vezes vive-se um grande paradigma: Por um lado sente-se

uma pobreza enorme e por outro uma riqueza interior indizível. E é lindo, quando olhamos para trás e vemos como a mão carinhosa de Deus nos foi conduzindo, com tanto amor e

ternura, até chegar aqui…

Sejamos agradecidos, pelo dom da fé: Este saber-nos amados

por Deus e que somos importantes para Ele. Sabermos que nada daquilo que nos acontece na vida Lhe é indiferente. E que: "Deus concorre em tudo para o bem dos que O amam".(Rom.8,28)

Por tudo isto damos glória a Deus Pai, que nos amou primeiro.

Damos glória ao Filho que nos amou e Se entregou por nós.

Damos glória ao Espírito Santo que nos anima e nos dá força nesta caminhada, até ao fim.

SEJA FELIZ!

Conceição Vicente, aci