A ANALOGIA DOMÉSTICA: UM CAMINHO PARA CONFERIR … · Resumo Os internacionalistas costumam...
Transcript of A ANALOGIA DOMÉSTICA: UM CAMINHO PARA CONFERIR … · Resumo Os internacionalistas costumam...
A ANALOGIA DOMÉSTICA: UM CAMINHO PARA CONFERIR EFETIVIDADE AO DIREITO INTERNACIONAL?**
Bethânia Itagiba Aguiar Arifa*
Resumo Os internacionalistas costumam recorrer ao direito interno para decidir questões internacionais. O objetivo do artigo foi perquirir de que maneira a analogia doméstica pode representar um caminho para a efetividade do direito internacional. No primeiro momento, discuti o conceito do instituto, as analogias com o direito privado e público, sua utilização como fonte de direito internacional e os limites territoriais na solução de desafios globais. Em seguida, analisei a relação entre a analogia doméstica, o constitucionalismo global e a efetividade do direito internacional. Concluí que, apesar da fundamentação contrária, a analogia doméstica não pode ser rechaçada; em contrapartida, não deve ser atrelada, de maneira descuidada, às ideias de efetividade e unificação do direito internacional.
Palavras-chave: analogia doméstica – direito internacional – constitucionalismo global – efetividade
AbstractThe Internationalists increasingly resort to domestic law to decide international issues. The aim of the paper was examining how domestic analogy may represent a way to grant the effectiveness of international law. At first, I introduced the concept of the institute, the analogies with private and public law, its use as a source of international law and territorial boundaries in the solution of global chalanges. Then, I analised the relationship between the domestic analogy, global constitutionalism and the effectiveness of international law. I concluded that, despite the opposing arguments, the domestic analogy can't be rejected. However, should not be carelessly linked to the ideas of unification and effectiveness of international law.
Key-words: domestic analogy – international law – global constitutionalism – effectiveness
** Artigo científico apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina “Direito Internacional Público”, do programa de Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade de Brasília (UnB), ministrada pelo Professor Doutor George Rodrigo Bandeira Galindo, Diretor da Faculdade de Direito da UnB. * Mestranda em Direito na UnB. Especialista em Direito Penal e Processual Penal. Pesquisadora do grupo Crítica & Direito Internacional (UnB) e do Centro de Direito Direito Internacional (VIII Anuário).
INTRODUÇÃO
“Nos últimos anos, as ideias constitucionais têm dirigido, de maneira
significativa, a atenção dos estudiosos do direito internacional”1. Além dos debates
sobre constituições nacionais e supranacionais específicas, os internacionalistas cada
vez mais utilizam analogias constitucionais para discutir as atividades das Nações
Unidas e de outras organizações internacionais2, fundamentar suas ideias e atos e
proferir as decisões das cortes internacionais.
É comum o recurso a regras, conceitos e institutos do direito interno dos Estados
com a finalidade de solucionar problemas do direito internacional. O estudo da analogia
doméstica é, portanto, crucial para melhor compreender o direito internacional,
sobretudo em uma época tão marcada pelo desenvolvimento de teorias e doutrinas
unificadoras.
Contudo, é necessário perquirir como e em que medida a analogia doméstica
pode, de fato, representar um caminho para conferir efetividade ao direito internacional
e quais os argumentos contrários e favoráveis à sua aplicação.
No presente artigo, essa análise será realizada da seguinte forma. No primeiro
momento, será apresentado o conceito de analogia doméstica. Em seguida, serão
abordadas as analogias com o direito privado e com o direito público, debatidos os
argumentos contrários e favoráveis à sua aplicação no direito internacional e enfrentada
a questão dos limites territoriais como obstáculo à solução de questões globais.
Expostas as considerações introdutórias, será apresentado um estudo crítico da relação
entre a analogia doméstica, o constitucionalismo global e a efetividade do direito
internacional. Ao final, verificar-se-á se a analogia doméstica pode ou não ser um
caminho para conferir efetividade ao direito internacional.
1 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012, p. 137. Tradução da autora feita do seguinte trecho: “In recent years, constitutional ideas have significantly commanded the attention of academics in the field of international law.”2 DUNOFF, Jeffrey L. Constitutional Conceits: The WTO’s “Constitution” and the Discipline of International Law. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 17. Nº 3, 2009, p. 647-675.
1 O QUE É A ANALOGIA DOMÉSTICA?
De acordo com Lorimer, o maior desafio para o direito internacional é encontrar
equivalentes internacionais para os fatores conhecidos do direito doméstico3 Apesar de
ser um desafio, “the application of domestic legal experience to international law is
really the main stock in trade of modern international thought”.4 O pensamento
internacional é, portanto, fortemente influenciado por aquilo que teóricos de relações
internacionais5 e de direito internacional6 denominam analogia doméstica e que pode ser
facilmente compreendido, em um primeiro momento, a partir da apresentação de alguns
exemplos de institutos, conceitos e princípios do direito internacional e seus correlatos
no direito doméstico.
A celebração de tratados internacionais remete à teoria geral dos contratos.
Toma-se de empréstimo do direito civil a autonomia das vontades, o pacta sunt
servanta, as condições e termos dos contratos, dentre outros. A denúncia de um tratado
internacional se pauta em regras sobre o distrato do direito civil. A ocupação de terras
de um Estado por outro é um tema internacional que remete, no direito civil, à
usucapião como meio originário de aquisição da propriedade. A elaboração do conceito
de território como elemento formador do Estado soberano remete às noções de
propriedade privada.
Valendo-se de metodologia semelhante, Lauterpacht também apresenta alguns
exemplos do emprego da analogia doméstica. Os direitos e deveres do Estado
decorrentes de mudança de soberania, divisão territorial ou formação de um novo
Estado busca soluções em regras de sucessões e condomínio. A defesa de um Estado
submetido a julgamento por cortes internacionais costuma indicar regras e princípios
jurídicos sobre procedimentos e provas advindos do direito doméstico. O atraso na
liquidação de indenizações de uma guerra recorre às regras de direito interno sobre juros
moratórios. Os danos ambientais internacionais são matéria que, em muito, se pauta nas
3 LORIMER, James. The Institutes of the Law of Nations. Edinburgh: Blackwood, 1884.4 MORGENTHAU, Hans Joachim. Scientific Man versus Power Politics. Chicago: University of Chicago Press, 1946.5 Por exemplo: Hidemi Suganami.6 Por exemplo: Hersch Lauterpacht.
regras de responsabilidade civil. Tratados sobre arbitragem adotam os princípios gerais
de direito do direito interno.7
Essas são situações práticas que revelam, ainda que de uma maneira bem
simples, o que é a analogia doméstica. Por meio desses exemplos, o conceito da
temática abordada no presente artigo se torna mais palpável. Permite-se, assim, que, a
partir dessa ideia inicial, avancemos na sua definição.
Na era da globalização, decisões domésticas têm efeitos que extrapolam o
âmbito interno. Diante disso, ouso dizer que a analogia doméstica, além de ser um
recurso ao direito privado, constitucional ou administrativo local, ocorre até mesmo em
relação a institutos do direito internacional quando interpretados e aplicados pelo direito
interno. Ou seja, quando o direito internacional recorre ao que decidido em cortes
nacionais acerca de conceitos, institutos ou princípios próprios do direito internacional.
Como afirmam Paulus e Weiler, “domestic courts are playing an indispensable
role as interpreters and ‘translator’ of international standards and principles into
action”8. Para ilustrar essa afirmação convém destacar o recente julgado da Corte
Internacional de Justiça (CIJ) no caso “Germany v. Italy: Greece Intervening”, referente
a imunidades jurisdicionais dos Estados. O acórdão da CIJ mencionou decisões de
diversas cortes domésticas, inclusive do Brasil9, que reconheciam a imunidade de
jurisdição dos Estados por atos praticados em territórios de Estado estrangeiro.
Ademais, para bem conceituar a analogia doméstica é importante levar em
consideração que o seu uso está associado à ideia de efetividade do direito internacional.
Partindo do pressuposto de que o direito interno é efetivo, acredita-se na analogia
7 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212.8 PAULUS, Andreas e WEILER, J. H. H. The Structure of Change in International Law or Is There a Hierarchy of Norms in International Law. European Journal of International Law. Vol. 8. Nº 4, 1997, p. 545-565, p. 249. 9 Eis o trecho da decisão que cita caso da justiça federal do Rio de Janeiro: “Judgments by lower courts in Belgium (Judgment of the Court of First Instance of Ghent in 2000 in Botelberghe v. German State), Serbia (Judgment of the Court of First Instance of Leskovac, 1 November 2001) and Brazil (Barreto v. Federal Republic of Germany, Federal Court, Rio de Janeiro, Judgment of 9 July 2008 holding Germany immune in proceedings regarding the sinking of a Brazilian fishing vessel by a German submarine in Brazilian waters) have also held that Germany was immune in actions for acts of war committed on their territory or in their waters.” CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Jurisdictional Immunities of the State (Germany v. Italy: Greece Intervening). 3 de fev. 2012. Disponível em: <http://www.icj-cij.org/docket/files/143/16883.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013.
doméstica como um mecanismo que pode gerar efetividade também para o sistema
internacional.10
Os direitos fundamentais, que tão bons resultados trouxeram para o direito
interno, são utilizados como analogias domésticas para tratar, no campo internacional,
dos direitos humanos. A supremacia constitucional, que possibilita o controle de
constitucionalidade e a segurança jurídica, é adotada como parâmetro para a construção
do jus cogens. O mesmo acontece com determinadas instituições internacionais. Por
exemplo, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) é lido a
partir de elementos do poder executivo e as organizações internacionais, a partir de
elementos do poder legislativo. Nessa perspectiva, chega-se a afirmar que o
“International Law is private law writ large”.11
É possível, portanto, definir a analogia doméstica como a prática de recorrer a
regras e conceitos construídos e aplicados pelo direito interno dos Estados, visando ao
desenvolvimento e à efetividade do direito internacional.
Definida a analogia doméstica, avançaremos na discussão sobre a sua utilização
e a efetividade do direito internacional. Nesse percurso serão realizados alguns
questionamentos: qual a importância da analogia doméstica para o direito internacional?
Como ela acontece? Qual é o paradigma: o direito público ou o direito privado? A
analogia doméstica pode ser utilizada como fonte de direito internacional? O que isso
implica? Como os problemas da analogia doméstica refletem no processo de
constitucionalização? A analogia doméstica é, de fato, um caminho para conferir
efetividade ao direito internacional?
2 A ANALOGIA COM O DIREITO PRIVADO E COM O DIREITO PÚBLICO
Quando se fala em analogia doméstica não se deve restringi-la à busca de
conceitos e institutos do direito romano. Embora, de fato, o recurso tenha sido
10 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. O uso das analogias domésticas como busca da efetividade do direito internacional. Painel apresentado no 10º Congresso de Direito Internacional da Academia Brasileira de Direito Internacional. Rio de Janeiro, 2012. 11 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law, p. 173-212. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 206.
originalmente aplicado com base nesse direito, a analogia ocorre também com o direito
público. Neste capítulo, serão apresentadas, portanto, as duas “formas” de analogia: com
o direito privado e com o direito público.
Sir Arnold Mc Nair, quando membro da Corte Internacional de Justiça, observou
que “[i]nternational law has recruited and continues to recruit many of its rules and
institutions from private systems of Law”12. Dentre outras, podemos apontar as seguintes
influências do direito privado no direito internacional: servidão, leasing, condomínio,
responsabilidade civil, contratos, concepção de território do Estado, teoria e prática de
aquisição, modificação e divisão da soberania territorial, liberdade do mar, limites
marítimos, soberania no espaço aéreo, sucessão de Estados, responsabilidade dos
Estados e suas consequências, medidas de reparação de danos por ilícitos internacionais,
tratados internacionais (formação, conclusão, interpretação, condições, efeitos, extinção
etc.), provas e procedimentos, arbitragem e liquidação judicial internacionais.13
Todavia, como tem demonstrado a evolução de diversos ramos do direito
internacional, a função básica do direito interno não se limita ao direito privado. Em
uma perspectiva histórica, a ideia de constituição, embora seja a mais propalada, seria
apenas um dos muitos conceitos jurídicos que primeiro tomaram forma no contexto
doméstico e, mais tarde, foram aplicados no direito internacional. Tratados e costumes
como fontes do direito, a doutrina dos sujeitos de direito, o tribunal como um meio de
interpretação da lei e da resolução de litígios, todos são conceitos cujo desenvolvimento
precedeu ao conceito de comunidade internacional e, de certo modo, assim como a ideia
de constitucionalização, advieram do direito interno14, mas não necessariamente do
direito privado ou do direito romano.
Na verdade, é essencial que, no emprego das analogias domésticas para
solucionar questões de direito internacional, seja possível o recurso tanto ao direito
público quanto ao direito privado. Qualquer transação entre Estados soberanos, apesar
12 FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution), p. 84. 13 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law, p. 173-212. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975.14 FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution).
de ser uma relação típica de direito privado, consiste em uma relação de direito
internacional público.15 E, nas situações em que os Estados realizam negócios
puramente privados, sem referência ao exercício de império, por exemplo, o melhor não
seria o recurso ao direito privado? Ao identificar a questão internacional é preciso,
portanto, buscar o objeto de comparação mais adequado, sem se limitar a um ou outro
ramo do direito.
3 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS E FAVORÁVEIS AO USO DA ANALOGIA DOMÉSTICA
Apesar de ser um recurso bastante utilizado, a analogia doméstica comporta
críticas. A doutrina se divide entre adeptos e contrários à sua aplicação no direito
internacional. A seguir, serão estudados argumentos já expostos por juristas e autores de
relações internacionais e outros aqui construídos na tentativa de defender ou refutar o
recurso a regras e conceitos do direito interno dos Estados para solucionar problemas de
direito internacional.16
3.1 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS AO USO DA ANALOGIA DOMÉSTICA
Segundo Bull, um dos maiores críticos da analogia doméstica17, o recurso deve
ser abandonado por completo, não apenas porque a tentativa de entender alguma coisa
por meio de outra é um sinal de imaturidade, mas também porque a sociedade
15 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law, p. 173-212. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975.16 Veja a sistematização e indicação de autores feita por Suganami a respeito do debate sobre a analogia doméstica: “On the one hand, the opponents of domestic analogy appear to include: Hobbes, Spinoza, Pufendorf, Wolff and Vattel; certain international lawyers of the late nineteenth and the early twentieth century who stressed the specific character of international law; Manning, Bull, and those who follow, or agree with, their basic tenets about the uniqueness of international society. On the other hand, the supporters of the domestic analogy seem to include: Saint-Pierre and Kant; Saint-Simon, Ladd, Lorimer and Bluntschli; Oppenheim, Lauterpacht, and those contemporary writers who follow their paths either in advancing a proposal or in diagnosing the conditions of international life.” SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy), p. 22.17 Entre os que indicam Hedley Bull como um dos maiores críticos da analogia doméstica está Chiara Bottici. BOTTICI, Chiara (2005). The Domestic Analogy and the Kantian Project of Perpetual Peace. Disponível em: <http://eprints.sifp.it/64/1/BOTTICI.html>. Acesso em: 18 mar. 2013.
internacional é única e sua natureza e características estão relacionadas à situação
específica dos Estados soberanos.18 Nesse sentido, Bull apresenta diversos argumentos
contrários ao uso da analogia doméstica: (i) a confiança no sistema de Estados
soberanos para lidar com os vários problemas enfrentados pela humanidade; (ii) a
preferência por pequenos ajustes dentro do sistema a alterações radicais de estrutura;
(iii) a clara distinção entre relações humanas inter e intra sociedades; (iv) a visão do
Estado como um tipo de pessoa diferente da pessoa do indivíduo; (v) a estimativa de
que é baixo o grau em que os padrões morais das relações humanas em nível
internacional podem ser elevados até os da esfera doméstica; (vi) a desconfiança do
legalismo.19
De maneira geral, o primeiro argumento utilizado para refutar o uso da analogia
doméstica é que o mecanismo impede a purificação, a independência e o
desenvolvimento do direito internacional e das relações internacionais. Suganami diz
que C. A. W. Manning, um dos fundadores das Relações Internacionais como disciplina
acadêmica na Inglaterra, defende enfaticamente que a sua autonomia só seria possível se
houvesse uma dissociação dos fenômenos sociais domésticos.20 Sustenta-se que a
analogia doméstica ameaça frustrar, mediante a introdução de aspectos técnicos e
complexos do direito interno, qualquer tentativa de se realizar uma atividade científica
fecunda e criadora no domínio das relações internacionais e, também, do direito
internacional. 21
Na mesma linha, defende-se que a tendência à imitação é lastimável por ignorar
a estrutura e o caráter especial das relações internacionais. Os aplicadores do direito,
incapazes de compreender o caráter especial e bastante peculiar das relações
18 BULL, Hedley. Society and Anarchy in International Relations. IN: BUTTERFIELD, Herbert and WIGHT, Martin. Diplomatic Investigations: Essays in the Theory of International Politics. London: George Allen and Unwin, 1966, p. 35-50.19 Para um estudo sistemático dos argumentos expostos por Hedley Bull, c.f. SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy), p. 15.20 SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy).21 Especificamente sobre o argumento em relação ao Direito Internacional, c.f.: FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution), p. 83.
internacionais, moldam o direito internacional a partir do padrão do direito privado e,
ignorando as especificidades das relações internacionais, transformam-no em mera
especulação ou filosofia do direito.
A respeito da falta de conformidade do direito internacional com o interno,
afirma-se que os sujeitos, as matérias e as abordagens do direito internacional e do
direito doméstico são distintos.22 As relações entre Estados não podem ser comparadas
às relações entre indivíduos. Argumento que, segundo Suganami, é originário de
Hobbes, para quem as condições sociais de ordem entre Estados não são as mesmas
condições de ordem entre indivíduos.23
A doutrina da soberania dos Estados é considerada portadora dos mais elevados
e vitais interesses da nação, que não podem se submeter a padrões ordinários de direito
privado, concebidos para cuidar precipuamente da regulação de interesses econômicos.
Como afirma Moser, disputas entre nações livres não podem ser resolvidas pela Lei de
Justiniano.24 Na mesma linha, Holtzendorff, da escola positivista alemã, preceitua que o
direito internacional decide disputas entre Estados soberanos e independentes, logo não
pode ter como fonte a analogia com o direito privado25, que cuida de relações privadas
entre indivíduos, que são permanentemente sujeitos a leis autoritárias.26 27
Essa corrente ressalta, ainda, que, no âmbito interno, os princípios e conceitos
são construídos a partir de um paradigma distinto que, na maioria dos casos, não se
adéqua às realidades da esfera internacional, onde não existe uma ordem social, política 22 Nesse sentido, Bynkershoek defende que regras de direito público não podem ser derivadas do direito civil ou do direito canônico, porque os dois têm objetos diferentes e se submetem a princípios distintos. (BYNKERSHOEK, Cornelius van. De Foro Legatorum Liber Singularis: A Monograph on the Jurisdiction Over Ambassadors in Both Civil and Criminal Cases. Translated by Gordon J. Laing. Oxford: Clarendon Press, 1946). Apesar disso, o autor é apontado por Lauterpacht como um grande admirador do direito romano (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212, p. 191).23 SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy).24 MOSER, Johann Jacob. Teutsches Staatsrecht. Parte II, Livro I. Stein, 1738.25 Na verdade, Holtzendorff rejeita não apenas a analogia com o direito romano, mas com qualquer direito privado em geral. 26 HOLTZENDORFF, Franz von. Handbuch des Völkerrechts: Auf Grundlage europäischer Staatspraxis. German: C. Habel Year, 1885.27 Para um estudo sistematizado dos argumentos expostos por Moser e Holtzendorff acerca da analogia doméstica, c.f.: LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212, p.192 e 194.
e jurídica consolidada. Os valores estabelecidos no direito privado são harmoniosos
porque existe um corpo político estruturado. Em contrapartida, no direito internacional,
a aplicação desses mesmos valores envolveria a criação de um governo internacional,
ainda inexistente e dificilmente consolidável ou, diria, indesejável. Como defende Bull,
“anarchy among states is tolerable to a degree to which among individuals is not.”28
O próprio conceito de analogia doméstica construído por Bull é elucidativo
desse argumento, por pressupor um poder central:
Domestic analogy is the argument from the experience of
individual men in domestic society to the experience of states,
according to which states, like individuals, are capable of
orderly social life only if, to use the Hobbesian expression, they
stand in awe of a common power.29
Outro argumento é a inexistência de reconhecimento mútuo entre os ramos.
Como o direito internacional não reconhece automaticamente o direito doméstico e
vice-versa, não há como procurar, validamente, em um sistema jurídico não
reconhecido, a solução para o preenchimento de lacunas existentes. Nessa linha, Grotius
cita o caso dos contratos do direito internacional, que, a seu ver, não devem ser
interpretados a partir do direito romano, exceto quando for expressamente aceito por
aquele, o que, todavia, não se presume.30 31
28 BULL, Hedley. Society and Anarchy in International Relations. IN: BUTTERFIELD, Herbert and WIGHT, Martin. Diplomatic Investigations: Essays in the Theory of International Politics. London: George Allen and Unwin, 1966, p. 35-50, p. 45. 29 BULL, Hedley. The Anarchical Society: A Study of Order in World Politics. London: Macmillan, 1977, p. 46.30 GROTIUS, Hugo. O direito da guerra e da paz: (De Jure Belli ac Pacis). Tradução: Ciro Mioranza. Ijuí: Fondazione Cassamarca: Unijui, 2005.31 Segundo Lauterpacht, Grotius é contraditório no que se refere à analogia doméstica. Para Lauterpacht, o capítulo sobre os tratados de Grotius é como um misto de direito privado romano e direito natural e que a contradição advém da tentativa do autor de conceituar o jus gentium. O que Grotius entende por direito civil não é o direito romano ou o direito privado em si, mas o direito doméstico. Este não é aplicável na solução de controvérsias entre Estados e soberanias, mas, sim, o jus gentium. Para Grotius, o direito natural não é o direito internacional, mas a fonte por meio de que são preenchidas as suas lacunas. A questão é saber quais são as fontes do denominado direito natural. Não seria o direito romano? Lauterpacht afirma, então, que embora Grotius negue aceitar o direito romano como fonte, aceita, com outra nomenclatura, as regras e princípios do direito romano como aplicáveis (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212).
Por fim, o argumento comum à maioria dos autores contrários à analogia
doméstica32 é que, embora se fale em analogia doméstica, o que realmente tem lugar no
direito internacional e no constitucionalismo global é o desenvolvimento de noções
gerais e princípios comuns a todos os direitos ou o recurso à própria noção de
moralidade.
Lauterpacht sistematiza esse argumento a partir da perspectiva de alguns autores33, dentre os quais destaco Jellinek, Oppenheim e Triepel.34
Lauterpacht explica que Jellinek defende que a analogia só pode ser empregada
quando expressamente reconhecida como uma fonte de direito por um dado sistema
jurídico. Assim, em um sistema onde não se admite a analogia doméstica como fonte, a
semelhança entre regras contratuais do direito privado e do direito internacional se
explica pelo fato de o contrato ser regido por conceitos jurídicos universais. Segundo
Jellinek, apesar de o direito privado ter trazido os princípios gerais sobre os contratos
para a consciência jurídica universal, esta é que é utilizada como fonte, não o direito
interno.
Segundo Lauterpacht, essa ideia foi originalmente defendida por Oppenheim,
para quem o fato de, no direito internacional, a natureza do contrato não poder ser
diferente e a noção de propriedade não poder ser alterada é uma decorrência dos
chamados valores universais, não do direito privado. Ou, ainda, conforme a visão de
Triepel, também exposta por Lauterpacht, diante do dualismo, não é possível a analogia
doméstica. Na verdade, a repercussão do direito romano decorre da influência do direito
natural na formação do direito internacional. O recurso empregado é, então, a
moralidade e a razão das coisas, de onde emana a solução para os problemas jurídicos.
32 Dentre os autores que apontam argumentos contrários ao uso da analogia doméstica, estão: Grotius, Selden, Bynkershoek, Moser, Heffter, Holtzendorff, Bulmering, Jellinek, Oppenheim, Nippold, Triepel, Liszt, Bonfilis, Despagnet, Thus Anzilotti e Cavaglieri, Manning, Moorhead Wright, Hedley Bull, Hobbes, Spinoza, Pufendorf, Wolff e Vattel.33 Lauterpacht indica também Nippold e Liszt como autores que defendem o recurso a noções e princípios gerais, e não a analogia doméstica. Cita, ainda, positivistas italianos, como Anzilotti e Cavaglieri, que repudiam a aplicação do direito privado no direito internacional e defendem a utilização dos princípios gerais (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212). 34 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212, p. 194-197.
Além desses argumentos indicados pela doutrina, vários outros podem ser
construídos na tentativa de refutar o uso da analogia doméstica no direito internacional.
Um dos possíveis argumentos é o paradoxo de se adotar a analogia doméstica como um
mecanismo de efetividade do direito internacional, visto que, muitas vezes, os princípios
de direito doméstico invocados não são cumpridos no plano interno. Outro argumento é
a falta de efetividade dos mecanismos e institutos domésticos. Busca-se no direito
interno solução para desafios do direito internacional, quando, na verdade, os desafios
persistem até mesmo na esfera interna. Parece não fazer sentido pretender solucionar o
problema de efetividade do direito internacional fechando os olhos para os desafios
decorrentes da aplicação desses mesmos institutos, conceitos e construções nos
respectivos sistemas de origem.
Essa realidade é muito bem retratada no direito administrativo global. Grant e
Keohane afirmam que os mecanismos de prestação de contas, essenciais ao
desenvolvimento do direito administrativo global, devem ir além dos mecanismos
usuais de direito administrativo interno.35 Para Kingsbury, Krisch e Stewart, a
abordagem dos dois autores é interessante, na medida em que lança luzes sobre as sérias
limitações de uma concepção do direito administrativo global de responsabilização e
prestação de contas pautada em modelos internos36 e sobre a possibilidade de a
transferência de mecanismos de accountability domésticos para a esfera internacional
suscitar problemas.
The advantages and disadvantages of such approaches have not
yet been fully explored. Nor has the potential more generally of
other non-traditional tools of domestic administrative law as
sources of ideas for global regimes. For example, public-private
networks and economic incentive mechanisms have become
35 GRANT, Ruth; KEOHANE, Robert. Accountability and Abuses of Power in World Politics. IN: American Political Science Review. Vol. 99. Nº 1, fevereiro de 2005, p. 29-43. Disponível em: <http://www.princeton.edu/~rkeohane/publications/apsr_abuses.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013.36 Apesar disso, segundo Kingsbury, Krisch e Stewart, os autores Grant e Keohane reconhecem que qualquer sistema baseado na prestação de contas tem suas limitações e que há também seu valor em continuar a trabalhar dentro das limitações específicas da abordagem de direito administrativo, pois, a partir do direito doméstico, são expostos os obstáculos estruturais que devem ser considerados também no âmbito global (KINGSBURY, Benedict; KRISCH, Nico; STEWART, Richard B. The Emergence of Global Administrative Law. Law and Contemporary Problems. Durham. Vol. 68. Nº 1, 2005, p. 15-61, p. 57).
prominent in domestic administration, and they may be
preferable to the classical command and control tools of
administrative law in a global setting characterized by a lack of
traditional enforcement capacities. Yet challenges confronting
these innovations within domestic systems, particularly
challenges in establishing accountability to a broader public
through prevailing mechanisms of administrative law, are likely
to be acute if they are transposed to global administration.
Some other proven domestic tools for promoting official
accountability, such as requiring agencies to base regulatory
decisions on cost benefit analysis, subject to administrative
review by a separate body connected with the elected
government leaders, or tort law, may be less exposed to these
challenges if used in global administration, but would face
severe problems of effectiveness.37
O estudo desses argumentos é crucial para a análise da analogia doméstica, pois
nos permite enxergar e enfrentar a questão de uma forma muito mais consciente e
crítica. Assim, atentos à fundamentação contrária ao uso da analogia doméstica no
direito internacional, passo à apresentação dos argumentos favoráveis a fim de que,
munido de ambos os argumentos, o leitor possa construir questionamentos ou chegar às
suas próprias conclusões.
3.2 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS
Os positivistas afirmam que a vontade dos Estados é a fonte primeira do direito
internacional. Consequentemente, apesar de a analogia doméstica conferir certo grau de
confiança e segurança, toda e qualquer fonte além dos costumes e dos tratados deve ser
refutada.38
37 KINGSBURY, Benedict; KRISCH, Nico; STEWART, Richard B. The Emergence of Global Administrative Law. Law and Contemporary Problems. Durham. Vol. 68. Nº 1, 2005, p. 15-61, p. 59.
No entanto, a interpretação do artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de
Justiça, ao prever, no item 4, “os princípios reconhecidos pelas nações civilizadas”
como fonte de direito internacional39, acaba permitindo o uso da analogia doméstica,
que nada mais é que o recurso a esses princípios, já consolidados no direito interno dos
Estados, para o preenchimento de lacunas no direito internacional.
De acordo com Gentilis, todos se submetem ao direito civil como uma espécie
de jus gentium, pois a Lei de Justiniano não é mera lei privada, mas uma lei geral. Dessa
forma, a aplicação do direito romano não é mera questão de imitação, mas uma questão
de princípios.40 No mesmo sentido, Taylor afirma ser impossível compreender o direito
internacional sem entender o direito romano, que é a base filosófica do jus gentium.41
Também Rivier, ao discutir o significado da expressão “princípios gerais de direito”
utilizada em tratados sobre arbitragem, diz ser clara a visão de que, na ausência de
declaração de vontade das partes, as regras de direito romano devem ser aplicadas. Para
Rivier, desde que com a devida cautela, o direito internacional pode recorrer não apenas
ao direito romano, mas às regras do direito civil em geral.42
Na tentativa de impedir o uso da analogia doméstica argumenta-se, ademais, que
o mecanismo impede o desenvolvimento e a independência do direito internacional e
das relações internacionais. Chega-se a se afirmar que a única forma de entender as
relações inter estatais é refutando a analogia doméstica.
Linklater, por sua vez, defende que o desenvolvimento progressivo das relações
internacionais exige uma transferência dos entendimentos das relações sociais dos seus
38 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212. Importante fazer a ressalva de que Lauterpacht apenas expõe o argumento, mas com ele não coaduna. Pelo contrário, o autor é um dos adeptos da utilização da analogia doméstica. 39 NAÇÕES UNIDAS. Estatuto da Corte Internacional de Justiça. São Francisco, 26 de junho de 1945.40 GENTILIS, Alberico. Hispanicae advocationis libri duo. New York: Oxford University Press, 1921. Importante, contudo, destacar, como o faz Lauterpacht, que Gentilis apresenta a ressalva de que o que se aplica a um Estado não pode se estender, indistintamente, para além de suas fronteiras. Também de acordo com Lauterpacht, Selden critica a opinião de Gentilis acerca da força vinculante universal do direito romano. (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212). 41 TAYLOR, Hannis. Treatise on International Public Law. Chicago: Callaghan, 1901.42 RIVIER, Alphonse. Principes du droit des gens. Vol. 1 e vol. 2. Paris: Arthur Rousseau, 1896.
estabelecimentos originais para a área internacional.43 O mesmo raciocínio se aplica ao
direito internacional, que, para se desenvolver, precisa dialogar com o direito interno
dos Estados que integram a comunidade internacional. Como assevera Morgenthau, a
aplicação da experiência jurídica doméstica ao direito internacional é realmente a ação
mais importante para o pensamento internacional moderno.44
O argumento da analogia doméstica como obstáculo à independência e ao
desenvolvimento do direito internacional também pode ser superado a partir da
constatação exposta por Lauterpacht de que o desenvolvimento do direito internacional
foi facilitado e teve seu conteúdo moral fortalecido pela sua estreita conexão com o
direito privado.45 É interessante perceber, por exemplo, que o caráter patrimonial dos
Estados no período de formação do direito internacional foi um fator determinante para
explicar a forte ligação com o direito privado e que, mesmo depois de ultrapassada a
concepção patrimonialista do Estado, a influência do direito privado continua
inabalável.
Lauterpacht defende, ainda, que o fato de os sujeitos, os assuntos e as
abordagens do direito internacional e do direito doméstico serem distintos e a ausência
de reconhecimento mútuo entre os direitos são insuficientes para impedir o uso da
analogia, que tem uma força persuasiva própria.46
Quanto aos sujeitos, convém destacar que não são tão distintos quanto se afirma.
Na verdade, há semelhanças suficientes que justificam o emprego da analogia. A
afirmação de que o sujeito do direito internacional são os Estados e o do direito civil são
os particulares não é absoluta. O direito internacional moderno reconhece indivíduos e
43 LINKLATER, Andrew. Men and citizens in the theory of international relations. London: Macmillan, 1982.44 MORGENTHAU, Hans Joachim. Scientific Man versus Power Politics. Chicago: University of Chicago Press, 1946.45 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212. Ao tratar da Carta das Nações Unidas como a constituição global, Fassbender aborda o tema da analogia doméstica e cita Lauterpacht exatamente para dizer que a prática de recorrer a regras e conceitos do direito privado visa a desenvolver o direito internacional. FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution), p. 84.46 LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212.
entidades, que não são Estados, como sujeitos e beneficiários diretos dos direitos
internacionais. Mesmo quando a entidade personificada do Estado é considerada como
sujeito de direitos e deveres internacionais, esses configuram, em última análise, os
direitos e deveres dos seres humanos individuais.47 Ademais, no âmbito interno, o
direito civil é constantemente utilizado para solucionar demandas entre o Estado e o
indivíduo, preenchendo-se lacunas do direito administrativo. Princípios de direito
privado, como a equidade, são princípios aplicáveis tanto a indivíduos quanto ao estado.48
Gardbaum, tratando especificamente das diferenças e semelhanças das
constituições domésticas e internacionais de direitos humanos, afirma que, seja qual for
o grau geral de analogia ou disanalogia entre o direito internacional e constitucional49, as
cartas de direitos humanos nacionais e internacionais desempenham a mesma função
básica de afirmar limites sobre o que os governos podem fazer com as pessoas dentro de
suas jurisdições.50 Além disso, para o autor, existe uma semelhança clara entre os dois,
em termos de idade. Embora seja inegável a existência de importantes precursores e
desenvolvimentos subsequentes em cada sistema, ambos foram essencialmente criados
depois de 1945, como respostas às violações maciças dos direitos fundamentais
ocorridas imediatamente antes e durante a Segunda Guerra Mundial. As limitações
impostas, interna e internacionalmente, preencheram, portanto, as principais lacunas em
ambos os sistemas jurídicos. Essas semelhanças não podem ser ignoradas.51
47 Para um estudo sobre o indivíduo como sujeito de direito internacional c.f. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Desafios e Conquistas do Direito Internacional dos Direitos Humanos nos Início do Século XXI, p. 207-321. IN: Jornadas de Direito Internacional Público no Itamaraty (2005: Brasília, DF). Desafios do direito internacional contemporâneo/ Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros, organizador. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2007.48 “Halleck, who, like Manning, connects the problem of Roman Law with the demand for universal jurisprudence, says: pratical equity, which furnishes principles of universal jurisprudence, applicable alike to individuals and to States.” (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212). 49 O autor indica a leitura de HELFER, Laurence R. Constitutional Analogies in the International Legal System. Loyola of Los Angeles Law Review, 2003. 50 Gardbaum faz a seguinte ressalva: “I do not intend to suggest in either case that this is the only function or, in the case of international human rights law, the only basic function.” (GARDBAUM, Stephen. Human Rights as International Constitutional Rights. IN: European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 4, 2008, p. 749-768, p. 750). 51 GARDBAUM, Stephen. Human Rights as International Constitutional Rights. IN: European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 4, 2008, p. 749-768.
Toda analogia é imperfeita. Um caso semelhante, objeto da analogia, não é a
mesma coisa que um caso idêntico, senão nem seria analogia. Como afirma Lorimer, a
pergunta que deve ser feita não é se as condições dos dois problemas, direito
internacional e direito doméstico, são as mesmas. O que se deve perguntar é se eles se
assemelham o suficiente para se admitir a aplicação de uma solução anterior do direito
interno ao caso em análise.52
Destaco, ainda, que a analogia é um mecanismo de interpretação ou de
integração de normas utilizado em diversos ramos do direito. O sistema jurídico
constitucional brasileiro, por exemplo, é fortemente influenciado pelo direito da
Alemanha e dos Estados Unidos. É corriqueiro o recurso a conceitos e institutos do
direito germânico e norte americano para solucionar problemas constitucionais internos.
O direito administrativo também recorre frequentemente ao direito civil para o
preenchimento de lacunas. Não há razão suficiente para impedir, então, que uma técnica
comumente adotada no enfrentamento de problemas jurídicos seja refutada apenas no
direito internacional.
Ademais, de acordo com Dupuy e Traisbach, o direito internacional não pode ser
visto como um sistema jurídico autossuficiente e fechado. Pelo contrário, as diferentes
ordens jurídicas devem ser entendidas como ordens interdependentes e que se reforçam
mutuamente. Assim, não se deve impedir que o direito internacional busque, no direito
interno, soluções para os desafios que enfrenta. A analogia doméstica é um mecanismo
que permite o diálogo entre o direito interno e o direito internacional e concretiza a ideia
de que um poder ser fundamento do outro. Ao invés de enfraquecer o direito
internacional, a analogia doméstica o torna mais robusto, da mesma forma que, ao ser
aplicada, reforça também o próprio direito interno. Na verdade, a efetividade somente é
alcançada em ordenamentos jurídicos robustos e abertos à interação.53
Muito se fala na ausência de aceitação automática do direito interno pelo direito
internacional e vice-versa como argumento para refutar a analogia doméstica. Todavia,
como reconhecem Nijman e Nollkaemper, o dualismo tem um poder limitado para
52 LORIMER, James. The Institutes of the Law of Nations. Edinburgh: Blackwood, 1884.53 DUPUY, Pierre-Marie; TRAISBACH, Knut. Taking International Law Seriously: On the German Approach to International Law. EUI Working Paper Law nº 2007/34. Disponível em <http://cadmus.eui.eu/bitstream/handle/1814/7629/LAW_2007_34.pdf?sequence=3>. Acesso em: 18 mar. 2013.
descrever, explicar e prever as múltiplas interações entre a ordem jurídica internacional
e as esferas jurídicas domésticas que caracterizam nossa época. Embora seja inegável a
distinção entre o direito internacional e o direito doméstico, é preciso questionar se as
interações entre os dois sistemas não se tornaram tão multiformes a ponto de minar a
natureza autossuficiente de um e outro.54
Os estudiosos de direito internacional não podem ignorar os muitos canais
formais e informais de comunicação entre as sociedades nacionais e internacionais.
Assim, mesmo que eles não afastem a regra básica de que o direito internacional não
tem validade automática na ordem jurídica interna, acabam relativizando essa regra. É
nesse sentido que Nijman e Nollkaemper afirmam que a divisão entre o direito
internacional e o direito interno está se desgastando. E esse desgaste é que, de fato, deve
ser levado em consideração ao se discutir o uso da analogia doméstica.55
Ainda utilizando-se dos ensinamentos de Nijman e Nollkaemper, verifica-se que
as normas que protegem os interesses da comunidade internacional como um todo,
automaticamente, protegem os interesses das sociedades domésticas.56 Por conseguinte,
não há motivos cabais para impedir que conceitos, institutos e decisões dessas
sociedades sejam adotadas, em determinadas situações, como paradigma para o
enfrentamento de desafios internacionais.
3.3 OS LIMITES TERRITORIAIS COMO OBSTÁCULO À SOLUÇÃO DE QUESTÕES GLOBAIS
Para o constitucionalista alemão Ulrich K Preuss, a ideia de constituição não
está intrinsecamente ligada ao conceito de Estados territorialmente delimitados. O autor
desconecta a soberania do conceito de território e estabelece uma ligação com o
autogoverno coletivo de uma multitude.57 A partir desse pressuposto, embora
54 NIJMAN, Janne; NOLLKAEMPER, André. New perspectives on the divide between National & International Law. New York: Oxford University Press Inc., 2007.55 NIJMAN, Janne; NOLLKAEMPER, André. New perspectives on the divide between National & International Law. New York: Oxford University Press Inc., 2007.56 NIJMAN, Janne; NOLLKAEMPER, André. New perspectives on the divide between National & International Law. New York: Oxford University Press Inc., 2007.57 PREUSS, Ulrich K. Disconnecting Constitutions from Statehood: Is Global Constitutionalism a Viable Concept? IN: DOBNSER, Petra and LOUGHLIN, Martin (ed.). The Twilight of Constitutionalism? Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 23-46.
originalmente adotado em um debate diverso do que aqui se apresenta, é perfeitamente
aceitável recorrer a regras e conceitos do direito doméstico a fim de que, desapegando-
se de limitações territoriais, seja possível buscar o desenvolvimento e a efetividade do
direito internacional e o diálogo com o direito interno.
Preuss defende que uma constituição, mesmo que pareça estar focada no Estado,
é, na verdade, a constituição da sociedade. Para fortalecer sua tese, cita o artigo 16 da
Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão - frequentemente invocada
como a quintessência do conceito de uma constituição - que, ao dizer que uma
sociedade onde não há a garantia de direitos nem a separação de poderes não tem
constituição, refere-se a “sociedade”, não a “estado”.58 Afirma, ainda, que a liberdade é
o fim último de uma associação política. Ou seja, até mesmo a fixação de limites à
liberdade natural, através do direito, visa à garantia da própria liberdade.59
Dessa forma, se a constituição é da sociedade, não do estado, e, se a sua
finalidade precípua é garantir a liberdade, não há problemas em recorrer à analogia
doméstica como um mecanismo de constitucionalização do direito internacional. Para
tentar solucionar falhas ou omissões (constitucionais) do direito internacional, não
convém impor limites territoriais ou jurisdicionais – da mesma forma que não o convém
para fins de delimitação do que seja uma constituição, sobretudo porque o que se
pretende é a proteção da liberdade das sociedades e indivíduos ou, como queira, até
mesmo, dos estados.
O poder supremo pressupõe uma pluralidade de poderes em potencial ou já
existentes.60 Trazendo essa afirmação para o contexto do presente artigo, pode-se
afirmar que o constitucionalismo global pressupõe ordens constitucionais já existentes.
Não há, então, razão para, na tentativa de enfrentar desafios de ordem internacional ou
58 FRANÇA. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. França, 2 de outubro de 1979. 59 PREUSS, Ulrich K. Disconnecting Constitutions from Statehood: Is Global Constitutionalism a Viable Concept? IN: DOBNSER, Petra and LOUGHLIN, Martin (ed.). The Twilight of Constitutionalism? Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 23-46.60 A afirmação de Preuss é a seguinte: “Supreme power pressuposes a plurality of potential or actual porwers, with one supreme because it is superior to all other.” (PREUSS, Ulrich K. Disconnecting Constitutions from Statehood: Is Global Constitutionalism a Viable Concept? IN: DOBNSER, Petra and LOUGHLIN, Martin (ed.). The Twilight of Constitutionalism? Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 23-46, p. 33). O contexto dessa assertiva é o estudo da relação entre constitucionalismo e territorialidade, oportunidade em que o autor defende, em síntese, que o importante não é a soberania territorial, mas a soberania popular.
global, impedir o recurso às decisões, conceitos e princípios das ordens domésticas.
Como afirmam Nijman e Nollkaemper, há uma nova ordem jurídica
which has traditionally guarded the door between the
international and the domestic sphere, has lost its controlling
power. (…) In such diverse areas as economic transactions,
individual rights, and individual crimes, private persons are
more and more drawn into an internationalized order, no
longer shielded by, and invisible within, the State.61
No contexto de globalização, a regulação da sociedade, as interações além-
fronteiras e o diálogo entre o direito internacional e o direito interno e devem ocorrer
por meio de um direito de fontes plurais. O direito, assim como o indivíduo, não pode
ser isolado e atomizado. Pelo contrário, deve se inserir em um paradigma de recurso a
fontes nacionais e internacionais.
De acordo com Suganami, “the term ‘domestic analogy’ or its equivalents has
been used more as weapon of debate than as a tool of analysis.”62 Nos capítulos
seguintes, será, então, estudada, de forma crítica, a relação da analogia doméstica e do
constitucionalismo global e os riscos da utilização dessa prática como arma para os
debates sobre a efetividade do direito internacional.
4 A ANALOGIA DOMÉSTICA, O CONSTITUCIONALISMO GLOBAL E A EFETIVIDADE DO DIREITO INTERNACIONAL
A relação entre a analogia doméstica e o constitucionalismo global pode ser
primeiramente explicada a partir da argumentação de Kant de que os Estados devem se
unir em um corpo internacional assim como foi necessário aos indivíduos se unirem sob
Estados individualizados.63 Além disso, acredita-se que muitos dos princípios
61 NIJMAN, Janne e NOLLKAEMPER, André. New perspectives on the divide between National & International Law. New York: Oxford University Press Inc., 2007, p. 348. 62 SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy), p. 23.63 SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy).
domésticos utilizados pelo direito internacional são princípios universais, que governam
a conduta humana de uma maneira geral.64 Os Estados e os indivíduos, como membros
de uma comunidade mundial, sujeitam-se, em seus diferentes Estados, a regras comuns.
O uso da analogia revela, dessa forma, tanto o declínio quanto a assunção de uma
comunidade moral universal e, consequentemente, reforça a possibilidade de uma ordem
constitucional global.
Os defensores do constitucionalismo global rejeitam a afirmação de que as
constituições existem apenas no âmbito dos Estados soberanos. Apesar de as teorias do
constitucionalismo terem se desenvolvido no contexto de Estados nações, não há uma
razão específica para impedir que a noção de constituição possa ser também
transplantada para outros contextos. Ademais, a ideia de constituição mundial sequer
depende da existência de um Estado mundial.
O constitucionalismo global é profundamente baseado na tradição do
constitucionalismo no contexto doméstico. Como afirma Werner, o constitucionalismo é
“uma tentativa de explicar a evolução existente no direito internacional emprestada, em
termos, do constitucionalismo nacional, com o objetivo de promover uma agenda
normativa de internacionalismo, integração e controle jurídico de políticas.”65
O “tipo ideal”66 de constituição, que é a base do constitucionalismo global,
pauta-se em instituições e processos desenvolvidos no direito interno. Vem, portanto, do
constitucionalismo doméstico a noção de constituição como fundamento de uma ordem
jurídica hierarquicamente estruturada que unifica a comunidade e limita o exercício do
poder político. A própria definição do constitucionalismo global, como um projeto
situado entre fatos e normas que explica algumas construções do direito internacional
baseado na existência de uma constituição que é válida para toda a comunidade
64 Embora haja entendimento em sentido contrário, conforme exposto no item 3.1., o reconhecimento dos princípios domésticos como princípios universais não implica dizer que não se trata de analogia doméstica.65 WERNER, Wouter. The Never-Ending Closure: Constitutionalism and International Law. IN: TSAGOURIAS, Nicholas. Transnational Constitutionalism: International and European Models. Cambridge University Press, 2007, p. 329-367, p. 330.66 Expressão utilizada por FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution).
internacional67, demonstra que se trata de um projeto construído com esteio em
analogias domésticas.68
Em suma, a relação entre a analogia doméstica, o constitucionalismo global e a
efetividade do direito internacional pode ser explicada a partir da seguinte colocação de
Galindo:
One important question arises for someone who is encountering
the literature on international constitutionalism for the first
time: why does international law need to pass through a process
of constitutionalisation? Or, why does international law need a
constitution at all?69
Para comprovar a necessidade de uma constituição ou constitucionalização é
preciso construir uma imagem do direito internacional como um direito imperfeito,
menos evoluído, ou primitivo, que procura em ordens jurídicas internas, já estruturadas,
a efetividade e o preenchimento de suas lacunas.70
Resta, contudo, saber se o constitucionalismo global, e também a analogia
doméstica, é ou não capaz de resolver os paradoxos e as limitações do
constitucionalismo doméstico e do direito internacional. Permanecendo, por exemplo, as
tensões entre a política e a sociedade, visto que há fatores que escapam ao direito,
questiona-se: os problemas são remediáveis pela simples remição a institutos, conceitos
e decisões do direito interno? A analogia pode ser um caminho para conferir efetividade
ao direito internacional?
67 WERNER, Wouter. The Never-Ending Closure: Constitutionalism and International Law. IN: TSAGOURIAS, Nicholas. Transnational Constitutionalism: International and European Models. Cambridge University Press, 2007, p. 329-367.68 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.69 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012, p. 143. Tradução da autora: Uma questão importante surge para aqueles que estão diante da literatura sobre o constitucionalismo internacional pela primeira vez: por que o direito internacional precisa passar por um processo de constitucionalização? Ou, por que o direito internacional precisa de uma constituição em tudo?70 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.
4.1 NECESSIDADE (OU DESNECESSIDADE) DO ELEMENTO UNIFICADOR E DA INSTITUCIONALIZAÇÃO
A Constitucionalização, o Direito Administrativo Global e o Exercício da
Autoridade Pública Internacional71 são modelos teóricos que, cada um à sua maneira, se
utilizam do direito interno para que o direito internacional se efetive. O que é unificador
se torna importante, na medida em que, a partir da experiência jurídica dos Estados
individualmente considerados, assegura efetividade para os sistemas. No
Constitucionalismo, o que é unificador é a constituição. Todavia, a mera identificação
desse elemento não é suficiente para solucionar os desafios emergentes. Existe uma
série de outros questionamentos subjacentes a esse debate: o que é a constituição? Seria
a Carta da ONU72, a Declaração Universal dos Direitos Humanos73 ou o jus cogens74?
Essa constituição, seja qual for, é de fato necessária para se conferir efetividade ao
direito internacional? Por que o direito internacional precisa passar por um processo de
constitucionalização?
A análise dessas e de outras perguntas pressupõe o estudo de vários fatores. A
apresentação aqui realizada não pretende indicar as respostas para todas elas; pelo
contrário, poderá fazer surgir tantas outras indagações. O escopo é lançar luzes sobre a
necessidade de se pesquisar e debater, de forma consciente e crítica, o tema proposto.
71 Para uma compreensão da teoria ou projeto do Exercício da Autoridade Pública Internacional c.f. VON BOGDANDY, Armin; DANN, Philipp; GOLDMANN, Matthias (2010). Developing the Publicness of Public International Law: Towards a Legal Framework for Global Governance Activities. 9 Germain Law Journal 1275-1400, at 1381 et seq. Disponível em: <http://www.germanlawjournal.de/pdfs/Vol09No11/PDF_Vol_09_No_11_1375-1400_Articles_von%20Bogdandy_Dann_Goldmann.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013. 72 Para o estudo do tema, c.f. FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution). 73 Para o estudo do tema, c.f. VON BERNSTORFF, Jochen. The Changing Fortunes of the Universal Declaration of Human Rights: Genesis and Symbolic Dimensions of the Turn to Rights in International Law. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 5, 2008, p. 903-924 e GARDBAUM, Stephen. Human Rights as International Constitutional Rights. IN: European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 4, 2008, p. 749-768. 74 Para o estudo do tema, c.f. PAULUS, Andreas. Jus Cogens in a Time of Hegemony and Fragmentation: An Attempt at a Re-appraisal. Nordic Journal of International Law. Lund. Vol. 74. Nº 2, 2005, p. 297-334; ORAKHELASHVILI, Alexander (2008). Peremptory Norms as an Aspect of Constitutionalisation in the International Legal System. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1286926>. Acesso em: 18 mar. 2013; WEIL, Prosper. Towards Relative Normativity in International Law. American Journal of International Law. Washington. Vol. 77. Nº 2, 1983, p. 413-442; e KOSKENNIEMI, Martti. Hierarchy in International Law: A Sketch. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 8. Nº 3, 1997, p. 566-582.
4.2 INSTITUCIONALIZAÇÃO, UNIFICAÇÃO, HIERARQUIZAÇÃO E EFETIVIDADE
Muitas das analogias feitas com o direito interno, sobretudo as analogias
constitucionais, estão permeadas por uma visão hierárquica que, em inúmeros aspectos,
nos remete à pirâmide Kelseniana. Parte-se do pressuposto de que um direito
institucionalizado e hierarquizado é mais efetivo. É, contudo, necessário questionar a
veracidade dessa premissa.75 Será, que, de fato, a hierarquia e o controle de
constitucionalidade, existentes no direito constitucional interno, são essenciais para a
efetividade do sistema? E, ainda: será que os modelos constitucionais existentes no
direito interno são capazes de compreender os “fundamentos morais” do direito
internacional?
Como afirmam Dupuy e Traisbach, compreender o direito internacional como
um sistema jurídico unificado exige também pensar sobre situações em que o conteúdo
substantivo de uma norma é considerado contrário a concepções fundamentais de justiça
ou a lei parece ser incompleta ou equivocada.76 Nesses casos, a solução pode, sim, ser
procurada nos ordenamentos jurídicos internos. Todavia, esse exercício não pode ser
feito de qualquer maneira. Deve-se buscar, por meio da analogia doméstica, um
significado e conteúdo específico para as questões afetas ao direito internacional, sem
perder de vista os seus fundamentos morais e as suas peculiaridades. A analogia,
embora seja uma técnica pautada na busca por semelhanças, como mecanismo de
solução dos problemas de efetividade do direito internacional, não pode ficar presa a
75 Dupuy e Traisbach, referindo-se especificamente ao direito alemão, reconhecem que: não há surpresa no fato de encontramos muitas analogias à legislação doméstica e organizações federais na doutrina alemã de direito internacional, permeada por uma visão hierárquica que remete à pirâmide Kelseniana. No entanto, os autores ressalvam que Kelsen pode ser considerado como um remanescente bastante distante da percepção contemporânea alemã de direito internacional, que defende que a unidade da ordem jurídica internacional compreende também considerações de moralidade e justiça (DUPUY, Pierre-Marie; TRAISBACH, Knut. Taking International Law Seriously: On the German Approach to International Law. EUI Working Paper Law nº 2007/34. Disponível em: <http://cadmus.eui.eu/bitstream/handle/1814/7629/LAW_2007_34.pdf?sequence=3>. Acesso em: 18 mar. 2013, p. 7). 76 DUPUY, Pierre-Marie; TRAISBACH, Knut. Taking International Law Seriously: On the German Approach to International Law. EUI Working Paper Law nº 2007/34. Disponível em: <http://cadmus.eui.eu/bitstream/handle/1814/7629/LAW_2007_34.pdf?sequence=3>. Acesso em: 18 mar. 2013.
conceito prontos e acabados. Pelo contrário, na sua utilização é crucial estar muito mais
atento às diferenças que às similitudes.
Tocqueville, ao criticar o caráter democrático de um poder soberano irrestrito
que poderia advir de uma constituição, falou em tirania da maioria.77 Tomando de
empréstimo essa construção, é possível afirmar que, a depender do paradigma adotado, a
analogia doméstica, assim como o constitucionalismo global, pode suscitar uma tirania
no direito internacional.78 É o que será analisado no capítulo a seguir.
4.3 ANALOGIA DOMÉSTICA, CONSTITUCIONALISMO E EXCLUSÃO: O RISCO DO IMPÉRIO DA UNIFORMIDADE
A analogia doméstica e o constitucionalismo, a depender dos paradigmas
adotados, correm o risco de, ao invés de auxiliarem na consolidação de um direito
internacional efetivo, construírem um “império da uniformidade”, para usar um termo
cunhado por James Tully e citado por Galindo.79 É necessário, então, questionar: se o
direito doméstico não é efetivo, como pretender que o que é construído a partir de suas
bases o seja?
Conforme Galindo, a analogia doméstica pode ser enganadora, na medida em
que se articula em uma narrativa mítica de progresso sobre a maneira como estruturas
constitucionais domésticas têm se desenvolvido. Os Estados nem sempre enfrentam o
problema da inclusão/exclusão em suas próprias sociedades, e, quando o fazem, nem
sempre conseguem elaborar uma constituição representativa dos interesses dos
diferentes segmentos da sociedade. 80
Não é uma coincidência que muitos sistemas jurídicos nacionais enfrentam
sérios problemas em reconhecer as minorias religiosas, étnicas ou estrangeiras dentro de
suas fronteiras. Nem mesmo a aplicação das atuais regras de direitos humanos é capaz
77 TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracy in America. New York: Vintage Books, 1990.78 Segundo Preuss, “as we know, the Founders of the US constitution were sceptical about the democratic version of unrestricted sovereign power, which Tocqueville, two generations later, famously labelled the tyranny of the majority.” (PREUSS, Ulrich K. Disconnecting Constitutions from Statehood: Is Global Constitutionalism a Viable Concept? IN: DOBNSER, Petra and LOUGHLIN, Martin (ed.). The Twilight of Constitutionalism? Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 23-46., p. 24).79 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.80 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.
de resolver ou, pelo menos, diminuir as tensões. Segundo Galindo, há possivelmente
muitas razões para isso, mas grande parcela se deve à incapacidade do discurso
constitucional atual para lidar com a diferença.81 Assim, o constitucionalismo moderno
corre o risco de ser visto como o "império de uniformidade".
Como se vê, o constitucionalismo global parece não mostrar alternativas
plausíveis para lidar com as diferenças82. Na verdade, necessita desenvolver ferramentas
para o diálogo com aqueles que são diferentes. Com efeito, é possível pressupor que os
mesmos erros cometidos nas ordens internas sejam repetidos na esfera internacional. 83
Utilizar cegamente a analogia doméstica para resolver o desafio da efetividade do
direito internacional pode ser extremamente perigoso para a humanidade. O mecanismo,
assim como os projetos ou teorias correlatas, pode implicar o desrespeito a questões
relacionadas à igualdade e, mais em geral, à distribuição social.84
Diante disso, indaga-se: como deve ser realizada a analogia doméstica?
Há uma diferença entre (i) invocar uma norma de direito interno para a solução
de um caso específico, de maneira isolada, e (ii) buscar instituições comuns a um grande
número de sistemas jurídicos nacionais a fim de explicar fatos e condições no direito
internacional que já existem como uma questão de fato, mas ainda não são
adequadamente compreendidos. A primeira forma de analogia doméstica, embora
aceita, deve ser vista com reservas. Em contrapartida, a segunda, certamente, não pode
ser criticada como um dificultador de uma atividade científica frutífera e criativa no
direito internacional, pois pressupõe que seja uma análise a revelar diferenças e, assim, a
81 Galindo ressalta que, de fato, não é possível generalizar, pois existem inúmeros constitucionalistas domésticos que desenvolveram teorias para lidar com as diferenças. Cita, por exemplo, James Tully, Strange Multiplicity: Constitutionalism in an Age of Diversity (Cambridge University Press, 1995) e Michel Rosenfeld, The Identity of the Constitutional Subject: Selfhood, Citizenship, Culture, and Community (Routledge: Oxford, 2009). Em seguida, destaca que a sua afirmação, contudo, é no sentido de que a forma como muitos constitucionalistas internacionais veem o constitucionalismo doméstico ignora a complexa questão da diferença. (GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012).82Anne Peters, defensora do constitucionalismo internacional, tenta refutar a acusação de que o constitucionalismo internacional é antipluralista. (PETERS, Anne. Conclusions. IN: KLABBERS, Jan; PETERS, Anne; ULFSTEIN, Geir. The Constitutionalization of International Law. Oxford: Oxford University Press, 2011, p. 342-352). 83 GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.84 Conclusão a que chega Galindo especificamente em relação ao Constitucionalismo (GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012, p. 161).
particularidade da ordem constitucional global. Como afirma Allott, a constituição de
cada sociedade é única, em função de sua própria história, realizações e sociedade, e o
mesmo deve ser dito em relação ao constitucionalismo global.85
Desse modo, a analogia doméstica permitirá a construção de uma ideia
constitucional autônoma no direito internacional, e não mera extensão do direito de
determinado Estado ou de um grupo de Estados dominantes. Um direito internacional
atento às diferenças, ainda que recorra a institutos, conceitos e princípios do direito
doméstico, acabará por se emancipar de suas origens, e, então, já não será necessário
voltar ao seu histórico e teórico ponto de partida.86
CONCLUSÃO
Conforme Suganami, “'domestic analogy’ has not been delineated with
sufficient precision in the ‘debate’ about it”87. O tema não pode, portanto, continuar a
ser encarado como algo simples ou de somenos importância. Pelo contrário, necessita
ser estudado como algo que perpassa diversas outras questões relacionados ao
desenvolvimento e à efetividade do direito internacional. É crucial lançar luzes sobre a
analogia doméstica em si, mas também sobre todas essas questões e desafios que lhes
são subjacentes e pensar em maneiras e possibilidades de enfrentá-los.
Mesmo depois de todos os argumentos contrários ao uso da analogia, conceitos
de direito interno se integraram ao direito internacional de tal forma que é impossível
eliminá-los ou modificá-los. Então se questiona: se é tão refutável a analogia doméstica,
por que as correntes contrárias não conseguem eliminar os conceitos advindos do direito
doméstico?88 Será que os críticos da utilização do direito doméstico como fonte de
85 ALLOTT, Philip. Eunomia: New order for a new word. Oxford: Oxford University Press, 1990. 86 FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution). 87 SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy), p. 23.88 Eis a indagação de Lauterpacht: “how, after all, do conceptions of private Law enter into the corpus of international public law and remain embedded there while even the most sweeping positivism is unable to eliminate them?” (LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212, p. 194).
direito internacional são realmente capazes de escrever ou decidir questões
internacionais sem fazer menção a institutos do direito doméstico?
A analogia doméstica, sem dúvida, é um recurso lógico. Todavia, exatamente
pelo seu grau de complexidade, não deve ser atrelada, de maneira descuidada, às ideias
de efetividade e unificação do direito internacional. Um direito constitucional único para
o mundo inteiro corre o risco de ser um direito internacional que não dê espaço a
diferenças. A depender do paradigma adotado, a analogia doméstica, assim como o
constitucionalismo global, pode suscitar uma tirania no direito internacional.
Não se pretende com isso rechaçar o uso desse recurso, mas propor que seja
realizado levando-se em conta não apenas às semelhanças, mas às particularidades do
interno e do internacional, pois é a partir das diferenças que se constroem sistemas, quer
internos quer internacionais, de fato, efetivos. Desse modo, a analogia doméstica
poderá, sim, ser um caminho para conferir efetividade ao direito internacional.
REFERÊNCIAS
ALLOTT, Philip. Eunomia: New order for a new word. Oxford: Oxford University Press, 1990.
BYNKERSHOEK, Cornelius van. De Foro Legatorum Liber Singularis: A Monograph on the Jurisdiction Over Ambassadors in Both Civil and Criminal Cases. Translated by Gordon J. Laing. Oxford: Clarendon Press, 1946.
BOTTICI, Chiara (2005). The Domestic Analogy and the Kantian Project of Perpetual Peace. Disponível em: <http://eprints.sifp.it/64/1/BOTTICI.html>. Acesso em: 18 mar. 2013.
BULL, Hedley. The Anarchical Society: A Study of Order in World Politics. London: Macmillan, 1977.
BULL, Hedley. Society and Anarchy in International Relations. IN: BUTTERFIELD, Herbert and WIGHT, Martin. Diplomatic Investigations: Essays in the Theory of International Politics. London: George Allen and Unwin, 1966, p. 35-50.
CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Jurisdictional Immunities of the State (Germany v. Italy: Greece Intervening). 3 de fev. 2012. Decisão: “THE COURT, (1) By twelve votes to three, Finds that the Italian Republic has violated its obligation to respect the immunity which the Federal Republic of Germany enjoys under international
law by allowing civil claims to be brought against it based on violations of international humanitarian law committed by the German Reich between 1943 and 1945; IN FAVOUR: President Owada; Vice-President Tomka; Judges Koroma, Simma, Abraham, Keith, Sepúlveda-Amor, Bennouna, Skotnikov, Greenwood, Xue, Donoghue; AGAINST: Judges Cançado Trindade, Yusuf; Judge ad hoc Gaja; (2) By fourteen votes to one, Finds that the Italian Republic has violated its obligation to respect the immunity which the Federal Republic of Germany enjoys under international law by taking measures of constraint against Villa Vigoni; IN FAVOUR: President Owada; Vice-President Tomka; Judges Koroma, Simma, Abraham, Keith, Sepúlveda-Amor, Bennouna, Skotnikov, Yusuf, Greenwood, Xue, Donoghue; Judge ad hoc Gaja; AGAINST: Judge Cançado Trindade; (3) By fourteen votes to one, Finds that the Italian Republic has violated its obligation to respect the immunity which the Federal Republic of Germany enjoys under international law by declaring enforceable in Italy decisions of Greek courts based on violations of international humanitarian law committed in Greece by the German Reich; IN FAVOUR: President Owada; Vice-President Tomka; Judges Koroma, Simma, Abraham, Keith, Sepúlveda-Amor, Bennouna, Skotnikov, Yusuf, Greenwood, Xue, Donoghue; Judge ad hoc Gaja; AGAINST: Judge Cançado Trindade; (4) By fourteen votes to one, Finds that the Italian Republic must, by enacting appropriate legislation, or by resorting to other methods of its choosing, ensure that the decisions of its courts and those of other judicial authorities infringing the immunity which the Federal Republic of Germany enjoys under international law cease to have effect; IN FAVOUR: President Owada; Vice-President Tomka; Judges Koroma, Simma, Abraham, Keith, Sepúlveda-Amor, Bennouna, Skotnikov, Yusuf, Greenwood, Xue, Donoghue; Judge ad hoc Gaja; AGAINST: Judge Cançado Trindade; - (5) Unanimously, Rejects all other submissions made by the Federal Republic of Germany. Done in French and in English, the French text being authoritative, at the Peace Palace, The Hague, this third day of February, two thousand and twelve, in four copies, one of which will be placed in the archives of the Court and the others transmitted to the Government of the Federal Republic of Germany, the Government of the Italian Republic and the Government of the Hellenic Republic, respectively.” Disponível em: <http://www.icj-cij.org/docket/files/143/16883.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013.
DUNOFF, Jeffrey L. Constitutional Conceits: The WTO’s “Constitution” and the Discipline of International Law. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 17. Nº 3, 2009, p. 647-675.
DUPUY, Pierre-Marie; TRAISBACH, Knut. Taking International Law Seriously: On the German Approach to International Law. EUI Working Paper Law nº 2007/34. Disponível em: <http://cadmus.eui.eu/bitstream/handle/1814/7629/LAW_2007_34.pdf?sequence=3>. Acesso em: 18 mar. 2013.
FASSBENDER, Bardo. The United Nations Charter as the Constitution of the International Community. Leiden: Martinus Nijhoff, 2009, p. 77-115 (Chapter 5: The UN Charter as a Constitution).
FRANÇA. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. França, 2 de outubro de 1979.
GALINDO, George Rodrigo Bandeira. Constitutionalism Forever. IN: Finnish Yearbook of International Law. Vol. 21, p. 137-170, 2012.
_________. O uso das analogias domésticas como busca da efetividade do direito internacional. Painel apresentado no 10º Congresso de Direito Internacional da Academia Brasileira de Direito Internacional. Rio de Janeiro, 2012.
GARDBAUM, Stephen. Human Rights as International Constitutional Rights. IN: European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 4, 2008, p. 749-768.
GENTILIS, Alberico. Hispanicae advocationis libri duo. New York: Oxford University Press, 1921.
GRANT, Ruth; KEOHANE, Robert. Accountability and Abuses of Power in World Politics. IN: American Political Science Review. Vol. 99. Nº 1, fevereiro de 2005, p. 29-43. Disponível em: <http://www.princeton.edu/~rkeohane/publications/apsr_abuses.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013.
GROTIUS, Hugo. O direito da guerra e da paz: (De Jure Belli ac Pacis). Tradução: Ciro Mioranza. Ijuí: Fondazione Cassamarca: Unijui, 2005.
HOLTZENDORFF, Franz von. Handbuch des Völkerrechts: Auf Grundlage europäischer Staatspraxis. German: C. Habel Year, 1885.
KINGSBURY, Benedict; KRISCH, Nico; STEWART, Richard B. The Emergence of Global Administrative Law. Law and Contemporary Problems. Durham. Vol. 68. Nº 1, 2005, p. 15-61.
KOSKENNIEMI, Martti. Hierarchy in International Law: A Sketch. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 8. Nº 3, 1997, p. 566-582.
LAUTERPACHT, Hersch. Private Law Sources and Analogies of International Law. IN: LAUTERPACHT, Elihu (ed.). International Law: Being the Collected Papers of Hersch Lauterpacht. Vol. 2. Cambridge: Cambridge University Press, 1975, p. 173-212.
LINKLATER, Andrew. Men and citizens in the theory of international relations. London: Macmillan, 1982.
LORIMER, James. The Institutes of the Law of Nations. Edinburgh: Blackwood, 1884.
MORGENTHAU, Hans Joachim. Scientific Man versus Power Politics. Chicago: University of Chicago Press, 1946.
MOSER, Johann Jacob. Teutsches Staatsrecht. Parte II, Livro I. Stein, 1738.
NAÇÕES UNIDAS. Estatuto da Corte Internacional de Justiça. São Francisco, 26 de junho de 1945.
NIJMAN, Janne; NOLLKAEMPER, André. New perspectives on the divide between National & International Law. New York: Oxford University Press Inc., 2007.
ORAKHELASHVILI, Alexander (2008). Peremptory Norms as an Aspect of Constitutionalisation in the International Legal System. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1286926>. Acesso em: 18 mar. 2013.
PAULUS, Andreas e WEILER, J. H. H. The Structure of Change in International Law or Is There a Hierarchy of Norms in International Law. European Journal of International Law. Vol. 8. Nº 4, 1997, p. 545-565.
PAULUS, Andreas. Jus Cogens in a Time of Hegemony and Fragmentation: An Attempt at a Re-appraisal. Nordic Journal of International Law. Lund. Vol. 74. Nº 2, 2005, p. 297-334.
PETERS, Anne. Conclusions. IN: KLABBERS, Jan; PETERS, Anne; ULFSTEIN, Geir. The Constitutionalization of International Law. Oxford: Oxford University Press, 2011, p. 342-352. PREUSS, Ulrich K. Disconnecting Constitutions from Statehood: Is Global Constitutionalism a Viable Concept? IN: DOBNSER, Petra and LOUGHLIN, Martin (ed.). The Twilight of Constitutionalism? Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 23-46.
RIVIER, Alphonse. Principes du droit des gens. Vol. 1 e vol. 2. Paris: Arthur Rousseau, 1896.
SUGANAMI, Hidemi. The Domestic Analogy and World Order Proposals. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 9-39 (Chapter 1: The Domestic Analogy Debate: A Preliminary Outline e Chapter 2: The Range and Types of the Domestic Analogy).
TAYLOR, Hannis. Treatise on International Public Law. Chicago: Callaghan, 1901. TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracy in America. New York: Vintage Books, 1990.
TRIEPEL, Carl Heinrich. Les Rapports entre le Droit Interne et le Droit International. Recueil des Cours. Académie de Droit International de la Haye, 1923.
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Desafios e Conquistas do Direito Internacional dos Direitos Humanos nos Início do Século XXI, p. 207-321. IN: Jornadas de Direito Internacional Público no Itamaraty (2005: Brasília, DF). Desafios do direito internacional contemporâneo/ Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros, organizador. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2007.
VON BERNSTORFF, Jochen. The Changing Fortunes of the Universal Declaration of Human Rights: Genesis and Symbolic Dimensions of the Turn to Rights in International Law. European Journal of International Law. Firenze. Vol. 19. Nº 5, 2008, p. 903-924.
VON BOGDANDY, Armin; DANN, Philipp; GOLDMANN, Matthias (2010). Developing the Publicness of Public International Law: Towards a Legal Framework for Global Governance Activities. 9 Germain Law Journal 1275-1400, at 1381 et seq. Disponível em: <http://www.germanlawjournal.de/pdfs/Vol09No11/PDF_Vol_09_No_11_1375-1400_Articles_von%20Bogdandy_Dann_Goldmann.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2013.
WEIL, Prosper. Towards Relative Normativity in International Law. American Journal of International Law. Washington. Vol. 77. Nº 2, 1983, p. 413-442.
WERNER, Wouter. The Never-Ending Closure: Constitutionalism and International Law. IN: TSAGOURIAS, Nicholas. Transnational Constitutionalism: International and European Models. Cambridge University Press, 2007, p. 329-367.