A Arte Japonesa - Capítulo I, II e III

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A Arte |aponesa CaPítulo I OS PRINCÍPIOS DA ARTE JAPONESA Contactos lendrlrios entre a China e o Japão Diz.sequeoJapãoéfllhojádavelhicedomundo.Seriatalvezmaiscertodizer que o Japão ainda dormia quando a Ásia continental e o mundo mediterrânico andavam entregues à criação das suas grandes culturas clássicas. Antes da era cristã, os seus "ontu"tos com a Ásia continental eram intermitentes e acidentais, e os Chineses acre- ditavamqueasilhasqueseencontravamaolonge'nomaroriental'deviamser as P'eng Lai, as Ilhas Eleitas dos Imortais, enquanto uma lenda conta que o primeiro imperador Ch'in, Shih Huang-Ti (221-229 a' C'), mandou um barco carregado de rapazes e raparigas para recolherem o elixir que crescia nas encostas' O resultado desta expedição e de outras anteriores é desconhecido' Paraosjaponesesdaquelaépoca,aChinadeviaigualmenteparecerremotaelen- dária,sendopoucososvestígiosdoprimeiroseculodaeracristãqueindiquemter havido qualquer intercâmbio cultural directo' E, quanto a pinturas' não as há' A pintura nos tempos pré-históricos osvestígiosmaisremotosdaartepictóricajaponesaqueatéagorasedescobriram são decorações em cerâmica e desenhos em relevo em sinos de bronze (a) do período Medio Yayoi (seculo I da nossa era). Pintava-se homens que andavam à caça (n), iam de barco, batiarp o aÍÍoz (c) ou se ocupavam noutros trabalhos rurâis, além desepintaranimaisepássaros,principalmenteveadoseavesquáticas'Aformaeo género do desenho tornam estes sinos totalmente diferentes de tudo o que a china produzia naquela altura, ainda que possa haver uma relação remota com a arte do bronze praticada no vale do Yang-Tsé, no reino de Ch'u' As minúsculas cenas têm a nitidez do desenho e o cuidado na execução que viriam a ser características essen- ciais da arte jaPonesa. Poucoposterioréaépocaaqueremontamaspinturasdesepulturas,noperíodo dos Túmulos (c. 250-550 d. C.), a maior parte das quais foi descoberta na região a norte de Kyushu, próximo da Coreia' Das setenta e uma sepulturas encontradas' as mais importantes são a de Otsuka (sepultura real), próximo de Fukuoka, e a Se. pulturadaaldeiadeTakehara,quedatamdoséculovoudocomeçodoséculovr. As lajes de pedra que forravam os túmulos eram recobertas.de uma fina camada de barro, em que eram pintados homens, cavalos, plantas estilizadas, dragões e os barcos que transportavam as almas dos mortos. A§ cores, vermelho, verde, amarelo e preto, são fort"s, aplicadas cruamente, mostrando os deçenhos certa afinidade com as pin- turas muito mais requintadas dos túmulos da Coreia desse tempo' (A) Sino de Bronze Dotaku, provàvelmente século r d. C. Tóquio, Mus. Nacional $ s0 "frk- (o) Cena de Caça: desenho de um relevo em bronze de um sino Dotaku' provàvelmente seculo I d. C. Tóquio, Mus. Nacional (c) Descasque do Arroz: desenho de relevo em bronze de um sino Dotaku' orovàvelrnente século r d'C. Taquio, Mu* Nacional 99 hff ,

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arte japonesa

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  • A Arte |aponesaCaPtulo I

    OS PRINCPIOS DA ARTE JAPONESA

    Contactos lendrlrios entre a China e o Japo

    Diz.sequeoJapofllhojdavelhicedomundo.Seriatalvezmaiscertodizerque o Japo ainda dormia quando a sia continental e o mundo mediterrnico andavam

    entregues criao das suas grandes culturas clssicas. Antes da era crist, os seus

    "ontu"tos com a sia continental eram intermitentes e acidentais, e os Chineses acre-

    ditavamqueasilhasqueseencontravamaolonge'nomaroriental'deviamseras P'eng Lai, as Ilhas Eleitas dos Imortais, enquanto uma lenda conta que o primeiroimperador Ch'in, Shih Huang-Ti (221-229 a' C'), mandou um barco carregado derapazes e raparigas para recolherem o elixir que crescia nas encostas' O resultadodesta expedio e de outras anteriores desconhecido'

    Paraosjaponesesdaquelapoca,aChinadeviaigualmenteparecerremotaelen-dria,sendopoucososvestgiosdoprimeiroseculodaeracristqueindiquemterhavido qualquer intercmbio cultural directo' E, quanto a pinturas' no as h'

    A pintura nos tempos pr-histricososvestgiosmaisremotosdaartepictricajaponesaqueatagorasedescobriram

    so decoraes em cermica e desenhos em relevo em sinos de bronze (a) do perodo

    Medio Yayoi (seculo I da nossa era). Pintava-se homens que andavam caa (n),iam de barco, batiarp o aoz (c) ou se ocupavam noutros trabalhos ruris, almdesepintaranimaisepssaros,principalmenteveadoseavesquticas'Aformaeognero do desenho tornam estes sinos totalmente diferentes de tudo o que a chinaproduzia naquela altura, ainda que possa haver uma relao remota com a arte dobronze praticada no vale do Yang-Ts, no reino de Ch'u' As minsculas cenas tma nitidez do desenho e o cuidado na execuo que viriam a ser caractersticas essen-ciais da arte jaPonesa.

    Poucoposteriorapocaaqueremontamaspinturasdesepulturas,noperododos Tmulos (c. 250-550 d. C.), a maior parte das quais foi descoberta na regioa norte de Kyushu, prximo da Coreia' Das setenta e uma sepulturas encontradas'as mais importantes so a de Otsuka (sepultura real), prximo de Fukuoka, e a Se.pulturadaaldeiadeTakehara,quedatamdosculovoudocomeodosculovr.As lajes de pedra que forravam os tmulos eram recobertas.de uma fina camada debarro, em que eram pintados homens, cavalos, plantas estilizadas, drages e os barcosque transportavam as almas dos mortos. A cores, vermelho, verde, amarelo e preto,

    so fort"s, aplicadas cruamente, mostrando os deenhos certa afinidade com as pin-turas muito mais requintadas dos tmulos da Coreia desse tempo'

    (A) Sino de Bronze Dotaku,provvelmente sculo r d. C.Tquio, Mus. Nacional

    $ s0"frk-(o) Cena de Caa: desenho de um

    relevo em bronze de um sino Dotaku'provvelmente seculo I d. C.Tquio, Mus. Nacional

    (c) Descasque do Arroz: desenho deo relevo em bronze de um sino Dotaku'orovvelrnente sculo r d'C.Taquio, Mu* Nacional

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  • (l) Vista Geral do Mosteiro deHoryu-Ji, sculo vttNara, Japo

    (B) O Tigre Jataka: do Relicriode Tamamushi, provvelmente 650-675Nara, Japo, Horyu-Ji

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    O perodo Asuka (552{45)

    O despertar do Japo para a cultura da sia continental ocorreu de um mododramtico e sbito. Os missionrios budistas do reino Paekche da Coreia devem teratingido o Japo antes do final do sculo v, embora a meno do primeiro que alichegou se refira a 538, quando o senhor $e Paekche enviou ao imperador Kimmeium presente de sutras, uma imagem de Buda e um estandarte. A princpio, verificou-segrande reaco contra a nova religio, e um pagode que fora erguido em 585 foi des-trudo pela faco anti-estrangeira. Mas logo em 588 chegou da Coreia um grupo demonges arquitectos, acompanhados por um pintor, e, pouco depois, foi erguidoo femplo Shitenno-Ji, onde actualmente se situa Osaka, sendo este o mais antigotemplo budista do Japo, de que ainda existem os alicerces. Em 610, um pintor vindodo reino de Koguryo, na Coreia, trouxe para o Japo as tcnicas da preparao de tintas.

    No tempo da imperatriz Suiko (593-628), o budismo propagou-se rpidamente,e o regente Shotoku Taishi (592-622), inspirado, sem dvida, no exemplo do grandemonarca budista indiano Asoka, estabeleceu mais de quarenta fundaes religiosasna capital do Japo, em Asuka, na regio de Nara e em redor dela. Destas, Horyu-Ji(l), Daian-Ji e Horin-Ji so as mais conhecidas. Embora os principais arquitectos,escultores e pintores que neles trabalharam fosem muito certamente coreanos, tiverampor ajudantes japoneses, os quais pueram no trabalho no s o desejo de aprender,mas ainda o alto nivel de execuo que se tornou peculiar ao Japo. Logo de prin-cpio, a regio de Nara foi o ponto de irradiao do budismo no Japo, nunca dei-xando de o ser, e desde ento tornou-se ponto de peregrinao para os amadores daarte budista. Dos templos T'ang chineses muito poucos foram poupados pela per-seguio de 845, e os que se encontram na Coreia so ainda em menor nmero.Os templos de Nara ainda se encoritram de p, tendo .Sido uma verdadeira escolade arquitectura, escultura e, ainda h bem pouco tempo, de pintura, (o. perodo demaior esplendor na hisria da arte budista do Extremo Oriente.

    Desta prieira fase, apenas se salvaram duas relquias da pintura budista noJapo, sendo uma delas o tapete que descreve o paraso de Miroku (Maitreya), exe-cutado pelas damas da corte en 622, para assegurr o repouso da alma de ShotokuTaishi.- A mais irnportante relquia do gnero d pintura de Asuka o Relicrio de Tama-mushi, assim chamado por os seus painis estarem enquadrados por barras de bronzedourado, todas rendilhadas, postas por cima das aas iridescentes de um escaravelho,conhecido por insecto-jia (tanwmushi/. O relicrio (c), que tem a forma de um temploem miniatura colocado sobre uma base elevada, foi executado provvelmente de65O a 675. As portas-painis tm pintadas figuras dos guardies celestes, as portasIaterais so ornamentadas com bodhisattvas e na parte de trs v-se a pintura esti-lizada do Bico de Abutre. Os quato painis da base mostram a montanha sagradaMeru, adoradores diante de uma relquia de Buda e duas histrias tiradas de jatakas (n).A execuo das pinturas de uma linha ntida e fluente, em laca amarela, vermelhae verde, sobre um fundo preto. A tecnica aproxima-se da pintura a leo ocidental,e o estilo, que se pode designar por sino-coreano, tem um efeito decorativo em super-fcie e encanta pelo ter agradado imenso ag gosto japons da poca.

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  • O perodo Nara (710-794)

    Em 645, o imperador Kotoku promulgou uma srie de decretos tendentes a reor-ganizar o reino segundo a imagem da china dos T'airg, que se aproximava ento doznite em poder e prestgio na sia ocidental. A coreia j no servia de guia ao Japo,pelo que o governo e a organizao social, as artes, a maneira de vestir, a etiquetae a prpria lngua deviam ser decalcados o mais aproximadamente possvel pelos dachina. A nova capital, criada no ano 710, em Nara, era uma cpia da cidade T'angchamada ch'ang An. os anos que formaram o perodo Nara, desde 710 at mu-dana da capital para Quioto, em 794, marcam o cume desta vaga de influnciachinesa, sendo por vezes designadg por perodo Tempyo, embora este perodo, parasermos mais exactos, se estenda apenas de 729 a 748. outras vagas de arte e culturachinesa derramaram-se pelas costas do Japo, mas nunca com o vigor das que trou-xeram a brilhante civilizao da Dinastia T'ang.

    As pinturas murais no Kondo de Horyu-Jium decreto de 701 criou um centro de pintura, dependente do Ministrio dos

    Assuntos Internos, que inclua quatro mestres pintores, sessenta pintores, oficiais eajudantes, sendo provvelmente pintores pertencentes a este departamento que seencarregaram da decorao da maior parte dos edifcios religiosos e palcios erguidosem Nara e em seu redor durante os seculos vrr e v[r. As suas obras deveriam englobar,sem dvida, a grande srie de pinturas murais no Kondo (palcio Dourado) deHoryu-Ji, em Nara (o).

    No se conhece a data certa destas pinturas, embora muitos conhecedores lhesatribuam o perodo de 680 a 710. Decoram as paredes interiores do palcio e desti-navam-se a edificar os devotos que faziam uma circum-ambulao em redor dos conesno estrado central. Quatro grandes painis, cada um com mais de trs metros de alturapor vinte e quinze centmetros de largura, representam os quatro parasos que, segundoas doutrinas espalhadas ento pelo Japo, se encontram para alm das fronteiras domundo. Na parede ocidental, encontra-se o Paraiso de shakyamuni, na paredenordeste, o de Yakushi, o Buda que cura, e na de noroeste o de Miroku (Maitreya),enquanto na parede oriental se encontra o de Amida (Amitabha) (r), cujo cultoera o mais propagado. Entre eles h oito painis verticais, cada um deles com umbodhisattva. o Paraso um arranjo puramente formal, com a divindade que presidenum trono de ltus, no centro, sob um dossel de flores, ladeada de bodhisattvas eaclitos (p. 205). com nobreza calma e austera, pertencem a um mundo intemporalmuito remoto em relao s vises extremamente humanas de um pintor religiosodo ocidente, como, por exemplo, Fra Angelico. Foram desenhados em argamassaseca, com uma pincelada maravilhosamente fluente e subtil, e um sombreado muitoleve d a sensao de solidez plstica; a cor comedida, mas o pigmento foi amon-toado numa sobreposio rica na representao das flores e das jias. Alguns conhe-cedores descobriram nestes paineis a influncia da pintura budista da sia Central,mas' no entanto, so essencialmente chineses pelo estilo, se bem que mais belos quequalquer pintura budista daquela poca que ainda exista na china. Aps mil e du-zentos anos de conservao, foram, em grande parte, deitrudos num incndio em 194g.

    (c) Relicrio de Tamamushi,provvelmente 650-675Nara, fapdo, Horyu-Ji

    (D) Vista Ioterior do Kond,seco \.ItNara, fapo, Horyu-ti

    (r) NNtrr{o Paraso de Amida(pormenor): pintura mural, c. Z)Naru, tapo, Iloryu-Ji

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  • (,r) ANNMoMandara de Hokke-Do (pormenor),sculo vrrrBoston, Mus. of Fine rts

    (r) ANNrMoEstandarte Kichijo-Jen, seclo vmNaro, fapo, Yakushi-Ji

    toz

    Outras pinturas budistas do perodo Nara

    euase nada resta dos numerosos estandartes que decoravam 65 lernplos budistasdo perodo Nara, mas alguns fragmentos do.Paldso de mida, tecido em tapeariade seda, encontram-se no Taima Dera, templo situado a sul de Nara. O mais impor-tante dos estandartes ainda existentes o chamado mandara Hokke-Do (DiagramaMstico da Pregao), que mostra Shakyamuni fazendo a sua pregao sobre o Bicodo Abutre. Conservou-se no Hokke-Do de Todai-Ji, o grande templo de Nara, atao fim do sculo xx, e faz actualmente parte dos tesouros do Museum of Fine Artsde Boston. Embora danificado, enegrecido e muito retocado, as imagens da divin-dade e dos seus aclitos sobressaem, com um brilho que no parece terreno, de umfundo de montanhas cobertas de rvores (a.). Por ele se pode fazer um estudo do estiloT'ang da paisagem, e o facto de a mandara estar pintada sobre linhagem grosseira'em vez de seda, leva concluso de que foi executado no Japo, e no na China.

    Os bens dos mosteiros budistas de Nara eram devidos, enl grande parte, generosaproteco da corte, proteco que no podia deixar de ter influncia na arte budista.Um documento surpreendente desta influncia pode ver-se num pequeno estandarteque se conserva em Yakushi-Ji (n), o qual representa Kichijo-Ten (Mahashri), deusada abundncia e encarnao da beleza, cuja adorao foi imposta pela imperatriz porum decreto de 767. A graciosa f,gura, envolta em vestes difanas e panejamentosondeantes realados a ouro, tem um ar absolutamente terreno, de que emana no Sa espiritualidade budista, mas muito mais o tipo opulento da beleza feminina criadana China por Chang Hsuan e Chu Fang, pintores da corte T'ang (p' 158)'

    0s rolos de IngakYoPor falta de documntos histricos, no h possibilidade de saber ao certo por

    quem ou onde foram executadas pinturas como a Kichiio-Ten. evidente, por outrolado, que os manuscritos da Escritura das Causas e Efeitos, o! Ingakyo, foram copia-dos no Japo de um original chins. Quatro verses, que se encontram em colecesjaponesas, foram pintadas em meados do seculo vIII, com uma quinta verso pro-vvelmente meio sculo mais tarde, e deles existm tambm fragmentos em vriosmuseus ocidentais. O Ingakyo conta a histria da vida e as vidas anteriores de Buda.A ilustrao encontra-se acima do texto, e l-se, como em todas as escrituras doExtremo Oriente; da direita para a esquerda (p. 206). Embora os factos tenhamocorrido na ndia do seculo YI a. C., esto representados, do mesmo modo que naspinturas de Tunhuang, segundo o estilo da China de T'ang. So notveis pelo seuencanto ingnuo e pela sua limpidez.

    Pinuras do rec'rio de Shoso-InConstrudo em756,o relicrio do grande templo deTodai-Ji abriga uma das maiores

    e mais antigas coleces de artes e ofcios do mundo. Por morte do imperador Shomu,ocorrida naquele ano, a piedosa imperatriz ofereceu os tesouros da borte ao templo,sendo colocados num enorme amazm constl'udo em madeira, o Shoso-In (o), ondepernaneceram em perfeitas condi@es, embora alguns objecto tenham desaparecido

  • e outros fossem acrescentados. Entre os dez mil objectos, h exemplos de qualidadesuperior da arte decorativa do estilo T'ang que nem sequer se manteve na prpriaChina. O inventrio primitivo indicava cem biombos)), mas destes s existe umnico exemplar pintado (c). Cada um dos seus seis painis representa uma bela se-nhora, gorda, segundo a moda da poca, de p ou sentada debaixo de uma rvore.Este assunto, vulgar na arte T'ang, surgiu j no final, vindo do Prximo Oriente,e um dos muitos exemplos da influncia da sia Ocidental na arte de Shoso-In.

    Outra relquia preciosa de Shoso-In (p. 2a$ um grande quadrado de linhagemem que foi livremente desenhado a tinta um bodhisattva, com uma pincelada enrgicasemelhante que tornara famoso o mestre Wu Tao-Tzu da corte T'ang, na quala linha harmoniosa d a sensao de uma forma slida que se aproxima da de algumasesculturas desse perodo. Compare-se, por exemplo, esta figura com o modelado volup-tuoso do Buda das cavernas do Norte da China, em T'ien Lung-Shan (p. 285).

    .3;

    (c) ANNn'{o Senhora sob Uma Arvore(pormenor): painel de biombo, sculo vtttNara, apo, Toda-J, Relicrio de Shoso-In

    (D) Relicrio de Shoso-In, constrdo em 756Nara, lapo, Todai-Ji

    O perodo Heian (794-f185)No final do sculo vrrr, os mosteiros tinham acumulado tantas riquezas e tanto

    poder que se tornou indispensvel, se o Estado no queria ser governado pelos monges,mudar a administrao para um lugar afastado de Nara cuja distncia oferecessesegurana. Por isso, foi inaugurada em 794, em Quioto, ou Heian, como ento erachamada, uma nova capital. O ltimo perodo de Heian, de 901 a 1185, frequen-temente designado por Fujiwara, nome da poderosa famlia que governou o Japona qualidade.de regentes de uma sucesso de imperadores incapazes ou que se tinhamvisto obrigados a abdicar. Na bela Heian, Cidade da Paz e da Tranquilidade>>, cer-cada por colinas arborizadas, os.palcios que se iam estendendo com os seus telhados

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  • "d

    (n) Atribudo princesa SrrnrroPormenor de ilustrao do

  • contemplao de divindades de aspecto terrvel, os Cinco Reis Esclarecidos (Myo-O).Pintados com meticulosa realidade, armados at aos dentes e aureolados de chamas,os Myo-O esplendiam nas paredes do templo, ameaando de destruio no s osinimigos da f, mas tambm os daqueles que lhes prestavam culto. A divindade erainvocada numa cerimnia meia-noite, e, ao surgir de entre o fumo do incenso, luz oscilante das velas, devia formar um espectculo aterrador.

    Na mais antiga pintura existente de um dos Myo-O, o Fudo Amarelo, conservadono mosteiro de Tendai, em Mii-Dera, no lago Biiva, a postura rigidamente de frente.Representaes posteriores, tais como as do conjunto de cinco datado de 1127, noTo-Ji, em Quioto, e o Myo-O Sentado Num Touro, em Boston (c), apresentam um mo-vimento lateral que vai aumentando, para culminar no Ftdo a Correr, do sculo xru.Um aspecto especialmente feroz apresentado na p.245. Desenhado a tinta com umalinha vigorosa e mostrando Fudo em glria numa praia de rochas, era invocado nofim do sculo xru como protector contra a ameaadora invaso mongol.

    Pintura da seita Amida

    Nem as tortuosas metafsicas das seitas esotricas, nem as terriveis vises dosReis Esclarecidos, proporcionavam grande conforto aos honens e s mulheres na horada morte. Esse conforto era procurado na adorao de Amida (Amitabha), o Budaque preside ao Paraso ocidental e ao cuidado e proteco do qual passam as almasde todos aqueles que lhe invocam o nome. O seu culto, designado no Japo por Jodo,propagou-se, a partir de 985, no monte Koya, pelo monge Genshin, que ensinavaum caminho paa a salvao obtido nicamente pela f. O mais famoso"santurio ami-dista que existe, o Pavilho Fnix do Byodo-In, em Uji (o), foi construido em 1053.A elegncia dos seus pavilhes, que se reflectem na gua, e o esplendor das pinturasque cobrem as paredes e as portas, so expresso perfeita do requinte feminino da artereligiosa dos Fujiwara. O arranjo decorativo destas pinturas trata principalmente dosnove aspectos de Amida Raigo (literalmente, Amida Que D as Boas-Vindas), querepresentam a divindade a descer no meio de nuvens, entre uma multido de deusese anjos, a receber a alma do crente e' a levla para o Paraso. Outra forma, algoposterior, pintada numa tela e colocada diante da pessoa prestes a morrer, apresentava

    (c) ANNrMoMyo-O Sentado Num Touro, sculo xrrBoston, Mus. of Fine rts

    (o) Vista do Pavilho Fnix,construdo em 1053Uji, Japo, Byodo-In

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  • () ANr.'nro Amida Yamagoshi,sculo xtIIQuioto, Japo, Zenrin-li

    (B). ANNIMoUm dos Dezasseis Rakan: da srie dosEstandartes Raigo-Ji, sculo xrTquio, Mus. Nacional

    r06

    Amida Yamagoshi (Amida Atravessando as Montanhas) surgindo. como um enormeSol poente acima do horizonte (e).

    Estas representaes de Raigo e outras primeiras composies, tais como a ma-ravilhosa viso da descida de Amida guardada em Daein-In, no monte Koya (p. 213),so simtricas, de acordo com o costume dos Parasos chineses, apesar de Raigo serde inveno puramente japonesa. Mas, com o tempo, surgiu o Rripido Raigo, na qualo exrcito celeste Se precipita, vindo do cu, em direco imagem do morto, nocanto inferior, direita. o Raigo Rpido, tal como o Fudo que corre, exprimem demodo dramtico o desejo premente de conforto e de ploteco que se apoderavados homens e das mulheres durante os anos de agitao que anunciaram a quedado regime Fujiwara.

    Duas obras-primas da pintura budista Fuiiwara

    A atraco da arte budista Fujiwara era frequentemente mais para os olhos e paraos.sentidos que para o esprito. De mesmo modo que a literatura da poca, exprimesentimentos de grande delicadeza numa linguagem extremamente requintada, masraramente sonda as profundidades da experincia religiosa. O exemplo mximo desteesteticismo emocional o grande painel de seda do nirvana de Buda, datado de 1086e guarado no monte Koya, composio demasiado rica em pormenor para ser sati-fatriamente reproduzida a cores.

    Pelo contrrio, o Shaka Nyorai, do Jingo-Ji, em Quioto (p.207), foi escolhidocomo igualmente tpico da poca. Shakyamuni aqui representado a pregal de umtrono elevado, vestido de roupas de rico colorido realado pelo emprego de kirikane,uma teia de folha de ouro recortada e aplicada sobre a cor de base. O desenho delicado e o modelado sugerido por um sombreado levemente perceptvel. At a faixade luz que irradia da aurola de Shakyamuni ornamentada com flores de ouro -caracterstica extravagncia Fujiwara. 0 efeito total deste estandarte mais o de umajia faiscante que o de um cone religioso.

    Retratos religiososNo Japo antigo, a pintura, no sentido ocidental, era desconhecida, e os (etratos

    que foram importados da China, como, por exempld, o famoSo conjunto dos cincoestandartes doS patriarcas da seita Shingon, pelo pintor Li Chen, represenaavam maisque a mera parecena dos indivduos, pois eram tentativas para exprimir o poderespiritual dos grandes chefes religiosos em profunda meditao ou entregues a vivadiscusso teolgica. A influncia de modelos chineses visvel no retrato cheio de vidado professor de Kobo Daishi, o sa@rdote Gonzo, que morreu em 827, retrato quefoi executado por um artista japons (p. 208). Embora a pintura que hoje se possuiseja uma cpia do sculo xI, reproduz o estilo original do sculo Ix com bastantefidelidade.' Nos etratos do final do perodo Fujiwara, esta intensidade .de sentimento foisubstituda pela mesma combinao de esplendor decorativo e de vazio espiritual quecaracterizavam o Shaka Nyorai (p. 207). Mais impressionantes entre as obras finaisdo siulo xr so as pinturas dos Dezasseis Rakan (santos budistas) de Raigo-Ji,

  • actualnente no Museu Nacional de Tquio. Os seus rostos no so caricaturais,nem esto deformados, como em muitas verses chinesas, mas sim tratados de ummodo naturalista, e cada figura est colocada numa paisagem maravilhosa, que mostracomo o pintor japons j comeava a utilizar o estilo decorativo T'ang para as suasnecessidades instintivas (n).

    Captulo IIYAMATO.E

    Descobrimento do Japo pelos aistas iaponesesEm 894, Sugawara No Michizane, erudito proeminente e conselheiro dos neg-

    cios estrangeiros, foi encarregado de chefiar outra misso cultural China. Ento,dirigiu um pedido ao rei, no apenas para que o dispensasse, mas para que deixassedefinitivamente de mandar embaixadas. A viagem era perigosa, fazia ele notar, e aChina mostrava-se agitada. De facto, a queda da Dinastia T'ang estava iminentee parecia que nada havia a ganhar com a continuao de mais contactos. Alm disso,o Japo, que durante trs sculos fora discpulo da China, comeava flnalmente a tera noo da sua prpria identidade cultural. Do que ele precisava no era j mais dacivilizao chinesa, mas de tepo para digerir o que aprendera e oportunidade parase servir disso a seu modo. E durante os trs sculos seguintes o Japo vai ficar isoladodo continente, sendo nesse perodo que tomar corpo uma arte verdadeiramenlenacional. Ser chamada Yamato-E, ou, literalmente, Arte de Yamato, a rea docento de Honshu, em redor de Quioto e Nara, que os Japoneses consideram o centroda sua civilizao.

    Assim como, durante o perodo Nara, a paixo dos Japoneses pela novidadee pelo que era actual fizera que as pessoas pretendessem ser o mais chinesas possvel,fazia agora que as coisas chinesas e os gneros de pintura e de escrita chineses seencontrassem repentinamente postos de lado. Como se viu no ltimo capitulo, forama fico e os dirios escritos pelas damas da corte, na sua prpria lngua, que irimeiroabriram o caminho a uma nova liberdade de expresso. Os poetas seguiram este exemplo,descrevendo a beleza da terra de Yamato como Se a vissem pela primeira vez, con19,at certo ponto, de facto sucedia, e. vrios poemas recolhidos no Kokinshu, umaantologia de 922, exaltavam temas que viriam a ser considerados como tipicamentejaponeses-quedas de gua, ameixeiras em flor e as para sempre popularizadas cere-jeiras floridas, para os Japoneses smbolo da pungente impermanncia das coisas belas.

    A escola de KoseO primeiro quadro que se possui de uma cena puramente japonesa, Folhas Ver'

    melhas Deslizando pelo Rio Tatsuta, foi pintado entre 866 e 876, um biombo com cenada vida diria japonesa foi pintado em 905 e, entre 868 e 872, Kose No Knaoka,director do centro de pintura, executou para Michizane uma vista do jardim imperial,do qual era o encarregado. Os seus netos Kintada e Kinmochi continuaram a tra-dio, pelo que a escola de Kose, como ficou a ser chamada, considerada como

    (c) ANNIMoMichizane no Exlio (pormenor):do Rolo Kitano Tenjin-Engi,c. 1219Quioto, Japo, Santudrio de Kitano

    I(osE No KANAoKA

    *

    )sl

    to1

  • (a) ANNnro Paisagem (pormenor):dos rolos de suspenso de AmidaRaigo, fins do seculo >aWakayama, Japo, Monte Koya,Daien-In

    (s) ANNtr!o O poeta po Chu-Irrma P4is4gem .(pormenor):do Biombo To-Ji, fins do seculo xQuioto, apo, Kyoo Gokoku-Ji

    o mago da tradio acional. Nessa altura, o velho centro de pintura fechou, e nanova escola de pintura os artistas passaram a gozar de maior considerao junto dacorte. Esra importante mudana, que correspoDdia, em certo sentido, elevao dospintores da corte da china ao nvel de uma academia imperial sob a Dinastia sung,contribuiu para o carcter aristocrtico dos trabalhos da escola de Kose.

    Durante o sculo rx, os temas e estilos chineses na pintura eram ainda predo-minntes, mas,'num concurso de pintura descrito no conto de Genji, o trabalhochins recusado por estar fora de moda, sendo uma cena japonesa, pintada segundoum novo mtodo nativo, que recebe o prmio. Pode notar-se o aparecimentos destenovo estilo num conjunto de painis que contam a vida de Shotoku Taishi e se en-contram actualmente no .Museu da casa Imperial. No entanto, sofreram tantos res-tauros que pouco mais resta que o desenho original. As paisagens das vinhetas,na parte inferior de vrias pinturas de Raigo, fornecem uma prova mais aceitvele apresentam alguns contrastes interessantes. A que se encontra no canto inferioresquerdo da grande pintura Amida Raigo, no monte Koya (p. 213), foi grandementeexecutada maneira T'ang (l), rnas, quando se consideram as composies de Raigonas portas do Pavilho Fnix, em Uji, depara-se-nos algo totalmente diferente.Aqui, o estilo T'ang foi simplificado, a escala das colinas foi reduzida e sugeridapor largas aguadas, o pormenor desapareceu, as rvores so estilizadas, a cor refrescante, simples e alegre, enquanto a pincelada, que forma a base da pinturachinesa da paisagem, foi suprimida por completo.

    com o tempo, os pintores da escola de Kose iniciaram novas convenes, que setornaram caracteristicas do novo estilo, nomeadamente a faixa de puvens e a casacom o telhado levado pelo vento)). As nuvens, dispostas em largas camadas horizontais,tinham por fim escurecer o horizonte, pr a cena em primeiro plano e esconder partesindesejveis, alm de, quando executadas a ouro, acrescentar um efeito deorativo.A casa sem telhado permite-nos ter uma viso para dentro dos quartos e observaro drama humano u a comdia que ali se desenrolava.

    Todavia, a mudana para o novo estiio no se verificou de um dia para o outro,pois ainda havia artistas capazes de trabalhar antiga maneira chinesa ou de fazeruma combinao dos dois estilos. Ainda existe, por exemplo, descrio de umapintura do fim do sculo x, que era na faixa central acima da gua eYamato-E na parte que ficava por baixo. A famosa paisagem do biombo To-Ji, emQuioto (n), um exemplo interessante da fuso dos dois estilos, ou melhor, de umestdio intermdio para um puro estilo Yamato-E..o assunto, provvelmente o poetaPo Chu-I no meio de uma paisagem a receber uma visita diante da sua casa, chins,iomo o so o estilo da pincelada e da estrutura bsica da cena, mas o colorido suavee plano, a simplificao, das formas e a reduo da paisagem a propores humanasso puramente japoneses;

    Os rolos narrativos

    As manses do imperador e da nobreza. Fujiwara eram providas de biombos(byobu) e de portas de correr (usuma), com uma cobertura de papel, que ofereciamsuperfcies ideais para uma decorao do novo estilo. Mas eram frgeis e inflamveis,

    108

  • e a paisagem do biombo To-Ji j mencionado quase o ltimo exemplo que ficoudaquele periodo. Por outro lado, cem conjuntos de rolos (e-maki ou e-makimono),datados do sculo xrr ao sculo xrv, encontram-se em templos ou em colecesparticulares. nestes rolos que se pode estudar o desenvolvimento e a maravilhosavariedade da Yamato-E

    O erudito japons Akiyama Terukazu dividiu-os nos seguintes grupos:1. Rolos de assuntos profano, de carcter puramente artstico. Neles etoincludas novelas ilustradas, escritas principalmente por damas da corte, his-trias populares e narrativas histricas, ilustres de poemas e retratos depoetas clebres e ilustraes de novelas militares.2. Rolos de assuntos profanos, com um fim utilitrio, geralmente decora-tivo. Entre eles h quadros de cerimnias da corte, de campanhas e feitosmilitares.3. Rolos.edificantes, de natureza religiosa, que se iniciam com os rolosIngakao apresentados no captulo anterior e compreendem as ilustraespaa sutros (escrituras) e para as vidas dos grandes monges e chefes reli-giosos, alm de rolos moralizadores que descrevem os sofrimentos humanose os horrores do Inferno. So na maioria budistas, mas h alguns de assuntosShinto entre os ltimos.4. Rolos satricos e caricaturais, alguns dos quais podem ter um fim edifi-cante e de advertncia.

    Os rolos de GenjiUm dos mais primitivos e mais belos trabalhos ainda existentes, pertencentes ao

    primeiro grupo, a srie de rolos que ilustram o conto de Genji, dos quais existemapenas pinturas de quatro de um grupo de dez rolos originais, que ilustravam dezanoveepisdios,. do romance (c). Alm de cada desenho em si, h o texto, escrito numaletra cursiva de muita graa e elegncia. A data exacta destes rolos no conhecida,embora tenha sido sugerida a hiptese de terem sido pintados para com eles pre-sentear o imperador ou a imperatriz durante a primeira metade do sculo xrr, po-dendo tambm tratar-se, muito provvelmente, do conjunto que se sabe ter sidoencomendado pelo imperador em 1119. Qualquer que seja a sua origem, mostraa Yamato-E no e_splendor da sua juventude, embora ainda buscasse inspirao nomundo feminino e imaginrio da corte Fujiwara.

    (c) ANNruo O Conto de Genji(pormenor): de um rolo, provvelmentesculo xrrQuioto, lapdo, Fundado Reimeikai

    109

  • (a) Atribudo a FUJTWARA NonuzaNeUm dos Trinta e Seis Poetas(pormenor): rolo, sculo xtrW'ashington, Freer Gall. of rt

    FUJIWARA NOBUZANE

    (r) ANNlt{o Gnio Descendo doCu Numa Nuvem (pormenor):do Rolo Myoren, fios do seculo ruNara, Japo, Cho-Go Sonchi-li

    110

    -)}xf"&.4AJ

    ^

    O pormenor presentado na p. 223 representa uma cena do fim do livro, emque as damas de servio esto de vela pela noite fora, enquanto para lm da cena, direita, o neto de Genji, Niu, brinca com a sua nova consorte. Olhando de cimapara dentro da sala, o pintor tira proveito das grandes verticais do painel, ficandoem contraste a firmeza das suas linhas e ngulos com as ondeantes curvas dos vo-lumes das roupas das raparigas. As ricas e brilhantes cores minerais, maravilhosa-mente atenuadas pelo tempo, surgem em maior riqueza devido ao contraste com oscabelos negros da rapariga, caracterstica muitas vezes descrita com amor na literaturada poca.

    Chama-se esta tcnica tsukuri-e (pintura de make-up). Aqui, a composio foiprimeiro delineada a preto, sendo as cores minerais aplicadas depois em vrias ca-madas espessas, aps o que os principais contornos foram de novo marcados a tinta.Os rostos eram desenhados numa especie de estenografia designada por hiki-me kagi--hana (olhos em linha recta e narizes em linha curva), que deixa transparecer poucasindicaes sobre o carcter, as emoes ou, at, sobre o sexo. Supe-se que esta con-veno foi criada pelas damas da corte, as quais queriam ilustrar os seus romancesfavoritos, mas no tinham muita habilidade para desenhar faces. Mas esta ausnciade traos deflnidos apresentava as suas vantagens, pois no causava embaraos aosaristocratas que procuravam identiflcar-se com as principais personagens represen-tadas, permitindo, alm disso, criar uma atmosfera de irrealidade para estas histriasromnticas.

    O Rolo dos Trinta e Seis PoetasAlgo desta irrealidade se conservou na pintura da corte ainda aps a queda do regime

    Fujiwara, nomeadamente no Rolo dos Trinta e Seis Poetas, provvelmente pintadopor Fujiwara Nobuzane (1176-1265). Os trinta e seis poetas eram homens e mulheresda era Fujiwara, clebres pelos seus poemas em lngua nativa (a), e os retratos delespopularizaram-se tanto na poca que receberam o nome especial de kasen-e (retratosdos poetas imortais). Os

  • de histrias acerca do monte Shiji que servem de ilustrao a lendas do mongeMyoren, que ali restaurou um templo em princpios do seculo x. Um dos rolos contaa histria da sua mgica tigela de arroz, que andava de um lado para o outro arecolher comida para o seu proprietrio, e o que aconteceu ao rico fazendeiro queno cumpriu devidamente as Suas obrigaes de protector; o segundo. o relato decomo Mygren conseguiu curar o imperador, embora se enontrasse a grande diS-tncia, sendo o terceiro o relato do encontro milagroso com a sua velha irm.

    O contraste do tratamento entre estes e os rolos de Genji notvel, pois, se osltimos fazem pensar em lances de um grande fllme de aco, o conjunto de Myorenapresenta-se como o prprio filme. Os rolos de Genji foram feitos de peas sepa-radas, compostas a cor, mas a aco das histrias de Myoren prolonga-se atraVs deuma paisagem ininterrupta, sendo o sentido do movimento intensificado por umamagistral linha a tinta executada maneira chinesa (s) e a cor apenas usada paraaumentar o realismo. As figuras so desenhadas com um humor irnico, quasecaricatural. No entanto, evidente, atravs da familiaridade que o artista patenteia,no segundo rolo, com os aposentos interiores do palcio, que devia tratar-se dealgum profissionalmente ligado corte.

    Outros manuscritos budistas. dos sculos xrr e xlII mostram o xito com quea pintura chinesa a tinta da Dinastia Sung se misturou Yamato-E, j a tornarseadulta. Muitos dos rolos so chineses pela tcnica, sendo produzidos por artistasligados ao Kozan-Ji, prximo de Quioto, e contam a histria, em parte vrdadeira,em parte lendria, de Gisho (c) e Gerigyo, chefes coreanos da seita Kegon.

    outro grupo de rolos de maior importncia, chamados Biografia Pictrica deIppen Shonin, refere-se vida de uma figura proeminente do movimento popularNembutsu que pregava a salvao pela crena em Amida. Das trs verses que aindaexistem, a melhor o conjunto de doze rolos pintados sobre seda e uma parte quese encontra actualmente no Kangiko-Ji, em Quioto, e a outra no Museu Nacionalde Tquio. Uma inscrio diz-nos que foram acabados em 1209, dez anos depoisda morte de Ippen, e os caracteres foram escritos pelo Sacerdote Shokai, sendo apinturas executadas por Hogen En-I (p).

    Um estudo deste rolo faz pensar que Hogen En-I tenha acompanhado de factoIppen durante os quinze anos em que percorreu o Japo em todos o sentidos, cornomonge mendicante, pois este o assunto neles tratado. Quando Ippen atravessa um

    (c) ANNnro Gisho Num Barco .Irvado por Um Drago (pormenor):das L,endas da Seita Kegon, sculo xtIIQuioto, .apo, Koza

    HocEN EN-I

    4r

    (D) HocEN EN-r A Vida de Ippen(pormenor): rolo, 1299Qrtioto, .Iapo, Kangiko:li

    n1

  • (A) ANN&,ro Macaco AdorandoUma R (pormenor):rolos animalsticos, sculo xlrQuioto, apo, Kozan-Ii

    (s) ANNn\.oR Atirando ao Cho Uma Lebre:(pormenor): rolos animalsticos,sculo :

  • nos rolos Genji, enquanto, do outro lado das paredes dos seus palcios, poderosasforas destruidoras estavam em aco. Assim, perante o declnio do poder do impe-rador Fujiwara, cada vez mais aumentava o poder dos senhores feudais, emboraaquele tivesse tentado submetlos com a oferta de terrs, o que apenas contribuiupara intensificar a luta entre as famlias rivais.

    Em meados do seculo xu, dois cls, o Taira e o Minamoto, abriram caminhopara a supremacia, desencadeando uma guerra civil que durante trinta anos revolveuo Japo numa luta de ferocidade inigualvel. euioto foi abandonada, o grandeTodai-Ji, em Nara, ioi destrudo, e os campos foram devastados pelos exrcitos quefaziam a sua pilhagem. Cerca de 1185, cs Minamoto, depois de vrias contrariedades,emergiram triunfantes sobre os Taira, estabelecendo a su capital em Kamakura, aosul de Tquio, to longe quanto possvel da enervante influncia da corte Fujiwara.o xgum (literalmente, general brbaro dominador) Minamoto No yoritomo orga-nizou os seus servidores numa grande disciplina administrativa, conhecida comobagu-fu, ou quartis militares, e muitos homens astutos, fugindo atmosfera sufo_cante de Quioto, foram oferecer os seus prstimos a Kamakura, onde entretanto ossamurai (literalmente, aqueles que servem) haviam formado uma nova lite que impsa si mesma um rgido afastamento tanto das massas, como da aristocracia da corte,que desprezavam, sobrepondo-lhes um ideal espartano de lealdade pessoal e auto-disciplina (c).

    A literatura pica deste periodo, tal como o Heike Monogatari, ou Hiskjria deHeike, que descreve a ascenso e a queda do cl Taira, est cheia de feitos de cora-gem, pertincia e lealdade, tlpicamente homricos. de pouca importncia para osseus admiradores que a lealdade fosse, por vezes, efeito de cobia e bravura, man-chada pela mais revoltante crueldade, mas tambm um facto digno de interesseque as guerras de Taira, principalmente as atrocidades cometidas ao longo delas,inspirassem aos artistas japoneses alguns dos seus mais brilhantes trabalhos.

    0s rolos de guerrasContudo, nem todos os rolos narram os acontecimentos das guerras de Taira.

    um dos primeiros ilustra a histria de Ban Dainagon, ou Tomo No Dainagon, o eruditoconselheiro do sculo D< que, para prejudicar o seu rival Minamoto Nobu, Ianoufogo ao prtico imperial, culpando disso Minamoto. Mas acaba por descobrir-sea verdade, e Tomo expulso. os trs pergaminhos, que fazem agora parte da colecosakai, em Tquio, foram pintados na segunda metade do sculo xrr e mostram o fogono prtico, o pnico que se estabelece atrs dele e a confuso na ru. o realismodestes quadros est atenuado pelos traos muito delicados e pela cor.

    Os trs rolos que ainda existem de um conjunto ilustrativo do Heiji Monogatari,pintados de uma forma menos subtil, mas talvez mais atraente, datpm provvelmentede trs perodos diferentes do seculo xlu. Este livro descreve os acontecimentos doInverno de 1159-60, quando os Taira esmagaram temporriamente os Minamoto.o Heiji Monogatari e outras novelas militares deste perodo, tais como o HogenMonogatati e .o Heike Monogaari, esto escritos num estilo directo, muito diferentedo estilo cheio de subtileza que caracterizava o estilo literrio da corte dos Fujiwara.

    (c) Trs Samurai: do fitme japons

  • (A) ANNnio O Incndio do Palcio'Sapjo (pormenor)do Rolo Heiji Monogatari, meados do culo xttBoston, Mu* of Fine lrts

    Da mesma maneira, tambm o realismo frio dos quadros inspirados nestes livros apre-senta um contraste notvel em relao s abstraces umptuosas dos rolos Genji.

    Nas pp. 214-215 e em (A) e (n), pode ver-se pormenores dos primeiros rolos doHeiji Monogatari, agora expostos em Boston, no Museum of Fine Arts. O romancedescreve a constituio das foras de Taira e Minamoto e conta como um tirano,o nobre Fujiwara No Nobuyori, desvastou o palcio do velho imperador antes dedestruir o seu rival, o ministro Shinzei. O texto escrito no rolo exposto em Bostonrelata como Nobuyori se apressou a pr o imperador em segurana, pois a sua pessoaera sagrada:

  • um nariz negro hereditrio at s alucinaes. So notveis no tanto pelo estilo,que, embora vivo, relativamente indistinto, como pelo conhecimento que demons-tram acerca do modo de viver das classes pobres, assunto que no focado nos rolosclssicos e aristocrticos deste perodo, alm de mostrarem ainda como a arte budistadeste tempo de ansiedade transmite os temores e sofrimentos do povo, mbora a ma-neira como ests aflies so retratadas se assemelhe muitas vezes caricatura.

    Aliados de perto a estes rolos,.embora muito mais horrendos no contedo, soaqueles que mostram o Inferno budista e o Reino dos Fantasmas Famintos, doisdos seis mundos nos quais,. de acordo com a crena budista, os seres sensveispodem reencarnar, e de que smente os reencarnados no Paraso podem salvar-se.Da srie, existem cinco rolos, dos quais trs so originais de fins do sculo xrr,sendo os outros dois apenas cpias. Os mais notveis so os que estiveram primiti-vamente na Coleco Hara e se encontram agora ao cuidado da Comisso para a Pro-teco da Propriedade Cultural, em Tquio. Pintados com a flnalidade de assustar aspessoas simples durante o seu curto trajecto terreno, mostram os tormentos horrveisque esperam o pecador no outro mundo. Os horrores sinistros do Inferno so mos-trados atravs de um contraste dramtico entre a atmosfera lgubre e a cor rica eluminosa das figuras dos demnios e das vtimas. A mais arrepiante de todas oGalo Gigante (o), que despedaa os culpados de crueldade para os outros. As penasterminam em chamas e do bico sai uma lingua de fogo. A grandeza e o temor dotema inspiraram os artistas destes Rolos do Inferno a um dos mais extraordinriosacontecimentos da histria da pintura ja.ponesa, e nestes, como noutros rolos, o fogo,quer seja o fogo eterno do Inferno ou o dos incendirios Minamoto das ruas deQuioto, parece ser um smbolo do estado japons nos sculos xrr e xrrr,

    um alvio passar desses horrores pata a grande srie de rolos do sculo xrrr,o Kitano Tenjin-Engi (literalmente, rolo da Histria do Ser Celeste de Kitano). Contaa histria de Sugawara No Michizane (845-903), o erudito conselheiro imperial men-cionado no princpio deste subcaptulo que foi exilado para Kyushu por instigaodo invejoso Fujiwara, vindo a morrer abandonado no seu posto solitrio. Entretantovrias calamidades caram sobre a corte, pelo que lhe foi levantado o exlio a titulopstumo e a sua memria reabilitada, a fim de que o seu esprito tivesse paz, almde ser erigido um templo que lhe era dedicado no distrito de Kitano, perto de Quioto.

    O culto de Michizane foi muito popular durante o periodo Kamakura, existindoainda dez rolos antigos que ilustram a sua histria. Destes, o mais antigo e o melhor,ainda conservado no santurio de Kitano, data de 1219, ou pouco mais tarde(p. 116, n), e relata a sua carreira poltica, o seu desterro, as ltimas palavrasdoseuprofeta,.o monge Nichizo, a inaugurao do templo dedicado a Miehizane e os mi-lagres l ocorridos. A estampa da p. 210 mostra um pormenor do rolo, no qualo ministro exilado contempla uma tnica que lhe foi mandada pelo imperador. Qs_rolos, no seu todo, mostram um notvel balano entre as histrias dramticas e opaganismo, o realismo e a decorao abstracta. As caras so de homens reais e muitos--pormenores so tirados directamente da Natureza e da vida das ruas. Alm disso, esterealismo est mesclado de um brilhante uso da arquitectura e da paisagem, com tonsnegros provenientes de carros, armas ou touros, o que faz que cada pergaminho sejauma unidade pictrica completa.

    (c) ANNrMo O Homem dosDentes Soltos: dos Rolosdas Doenas, c. lZ(NTquio, Col. Arihiko Sekido

    (o) ANNn'{o O Inferno do GaloGigante (pormenor): dos Rolos doInferno, sculo xrrTquio, Comisso para a Protecoda Propriedade Cultural

    il5

  • Furrwane TaeNosu r}-:*42(-

    () ANrqrvo O Fantasma de Michizane Lana Fogo s Portas da Cidade (irormenor):do Rolo Kitano Tenjin-Engi, c. 1219Quioto, Japo, Santurio de Kitano

    O Rolo dos Dez Touros FamososA estampa da p. 216 mostra uma pintura de um touro negro que poderia ser um

    pormenor aumentado da siie Kitano Tenjin-Engi, mas que, na realidade, uma dasseces que restam do Rolo dos Dez Touros Famosos, pintado cerca de 1300. Osoutros dois fragmentos ainda existentes esto em Cleveland e em Tquio. O artistaconcentrou-se no essencial, e os touros so mostrados em silhueta, sendo o seu slidovolume sugerido atravs de amplos contornos e uma misteriosa

  • revolucionrio dos heris idealizados do passado a que estavam habituados. Huma forte linha romntica no temperamento japons que d colorido ao seu panoramareligioso, e j vimos isso nas interpretaes de Fujiwara de Shakyamuni e o AmidaRaigo. Agora ela aparece-nos de novo no encantador ((retrato)) do grande fundadorda seita Shingon, Kobo Daishi em criana (c e p. 289). De acordo com a lenda,o apaz teve um sonho no qual se viu sentado num ltus de oito ptalas, discutindoa doutrina budista com vrias divindades. O artista representou-o como uma visode tocante beleza, sabedoria e inocncia,.com todos os pormenores do cabelo, dasmos e da tnica florida delineados com grande amor e preciso, por meio de tintadourada e prateada. O sentimento que esta pintura evoca tpico do romantismo reli-gioso de Fujiwara, mas a tcnica, a importncia da silhueta, as formas angulares dastnicas, o tratamento do cabelo negro-azeviche, tudo isto mostra como est perto, noretrato, de Minamoto No Yoritomo, embora possa ter sido pintado muito antes do fimdo seculo xtIr.

    Duplo Shinto e pintura paisagstica

    A criao de um estilo nacional na pintura, o Yamato-E, foi um aspecto da matu-rao da cultura japonesa que se verificou aps a primeira grande onda de influnciachinesa. Durante o perodo Heian, a antiga religio japonesa, Shinto, ou Caminhodos Deuses, teve de render-se, tal como sucedeu com o taosmo durante as Seis Dinas-tias da China, ante o poder e o prestgio do budismo. Mas agora, tal como outras antigasinstituies japonesas, tornara-se suficientmente forte para enfrentar o budismo noseu prprio campo. Esta reconciliao teve inmeras formas diferentes, de acordocom o perodo e com as doutrinas das diferentes seitas budistas com as quais estavaaliado. A fuso com Shingon, por exemplo, deu origem ao nascimento do DuploShinto, em que os espiritos de Shinto eram vistos como manifestaes de Budas ebodhisattvas, enquanto Amaterasu, a antiga deusa do Sol, se tornava uma encamaode Dai Nichi-Nyorai, a suprema divindade da seita Shingon. Desta sntese, foi possvelpara Shinto, que at ento no tivera qualquer arte religiosa prpria, fornecer pintorescom inspirao e assuntos.

    O Rolo Kitano Tenjin-Engi, em especial as ltimas seces, que esto relacionadascom a pintura do templo de Michizane e os milagres ali ocorridos, pode ser olhadocomo exemplo desta nova arte do Duplo Shinto. Mas talvez ainda mais tpicas soas pinturas de templos, montanhas e quedas de gua famosas pela sua beleza e pelassuas antigas associaes com Shinto (p). A primeira e a melhor destas paisagens o roloque se encontra no Museu Nezu, representando a queda de gua Nachi, em Kumano,onde no sculo xrr foi o centro do culto Duplo Shinto (p. zail. O rolo, pintado poucodepois de 1300, mostra. a cascata como um grande lenol de gua descendo vertical-mente at s rochas, no sop de uma falsia. Embora exista um templo entre as rvores,nenhuma figura humana enira no pavoroso espectculo, no h qualquer poeta vaga-bundo como esperaramos encontrar num trabalho chins com semelhante tema e fcil imaginar o Iocal visitado pelo seu poderoso gnio local, Hiryu Gongen. O grandedisco cor de laranja do Sol iluminando o topo da falsia foi interpretado como smbolode Dai Nichi-Nyorai, numa unio mstica com o esprito da queda de gua. Assim,

    (c) AxNnro Kobo Daishi emCriana (pormenor),fins do sculo xrrlMikage, Japo, Col. N. Murayama

    (o) ANNuo Mandara das TrsMontanhas de Kumano,sculo xIuTquio, Mus. Naconal

    tt7

  • (.ql ANNtrlo Forjando UmaEspada de Samurai: do Rolodos Artfices, sculo xvtTquo, Mus. de Okakura Shukokan

    118

    a pintura mais que uma paisagem - um ntandara, no qual esto simbolizadas tantoas foras csmicas como as foras naturais, embora estas aqui no tomem a formausual de divindades, mas de montanhas, da gua e do Sol. Na pintura de paisagenschinesas encontramos imptcito o mesmo simbolismo, ms no to explcito. Nestapoca, foram feitas no Japo inmeras pinturas de templos e de lugares famosos e olhadoscomo mandai,a.r, mas nunca conseguiram aproximar-se da grandiosidade do rolo doMuseu Nezu.

    Captulo IIIPINTURA A TINTA MONOCROMTICA

    0 xogunato Ashikaga (1392-f573)O problema que todos os governos japoneses enfrentaram at aos nossos dias

    consistiu no facto de no haver algum suficientemente forte que controlasse os grandescls e os chefes regionais por mais que um perodo limitado e o que os mantinha no poderera menos a sua prpria autoridade do que a constante rivalidade entre os seus adver-srios, Durante a ltima metade do seculo XIII, as sedues da vida da corte de Quiotocomearam a ter influncia nas regras militares de Kamakura, enfraquecendo a sua flr-meza no Japo, at que, em 1336, a poderosa famlia Ashikaga apresentou um candi-dato rival a imperador, o qual tentou fazer renascer o poder da casa imperial. Entoseguiu-se uma longa luta, amarga e sem sentido, pela sucesso, um perodo conhecidopor Namboku-Cho (perodo das cortes de Norte e Sul), durante as quais os xgunsAshikaga de Quioto ganharam fora, para flnalmente, em 1392, serem capazes dederrubar o regime rival. A era de 1392 a 1573, durante a qual a famlia Ashikagagovernou como regente, geralmente chamada o perodo Ashikaga, sendo tambmconhecida por periodo Muromachi, do nome do distrito de Quioto onde estava situadoo palcio do xgum.

    Na sua nsia de pder e na sua alegria por o terem conquistado, os xguns Ashikagaprecisaram de grandes somas de dinheiro, tendo-o adquirido, em parte, pelo que tiraramaos seus adversrios, e, por outro lado, fazendo renascer o comrcio com a China,o qual estava suspenso devido s invases monglicas do fim do sculo xItr. Cercade 1400, constituiu-se uni departamento do governo para controlar este comrcio, masa sua orientao, at no que se refere ao equipamento da frota, foi entregue aos grandesmosteiros de Quioto, principalmente aos da seita Zen.

    Renovados os ynculos culturais com a ChinaPor intermdio do Zen, comeou-se a discutir a pintura chinesa dos fins dos perodos

    T'ang e Sung do Sul, e a sua influncia na pinturajaponesa iria ser grande e duradoura.O Zen foi introduzido rio Japo, no sculo xII, por dois monges, Min An-Eisai e Dogen,e o seu empenho pela autodisciplina e aco rpida, a sua austeridade e simplicidade,imediatamente atingiram uma massa responsvel da lite militar de Kamakura. Aosseus olhos, havia nisto duas virtudes adicionais: era a verdadeira anttese do ascetismode Fujiwara e, acima de tudo, era algo novo. Durante o sculo XIII, os monges viajaram

  • pela China e estudaram a doutrina, e no seu regresso fundaram os mosteiros Zen, sendonotveis os mosteiros de Enkaju-Ji e Kencho-Ji, em Kamakura, e Tenrnr-Ji, em Quioto.A se juntavam nobres e samurai, no apenas para estudarem a doutrina Zen, mas'parase embeberem da requintada atmosfera que se respirava nestes mosteiros. Mas o Zen erasmente um dos aspectos culturais Sung do Sul, e era a cultura Sung no seu todo queas camadas mais elevadas da sociedade japonesa ento quiseram adquirir, to vidamentecomo os seus antepassados se haviam moldado na de T'ang.

    Um dos primeiros, e certamente um dos mais poderosos patronos da culturaSung, foi o xgum Yoshimitsu, que reinou de 1367 a 1395. No Pavilho Douradode Quioto (n), para onde se retirou, levou a vida de um monge, esteta e patrono das artes.Yoshimitsu gostava de ser transportado numa liteira chinesa, vestindo um trajo chins,e assim foi imitado pelos nobres da corte no apoio s modas da China.

    O oitavo xgum, Yoshimasa, que reinou de 1449 a 1474, tentou s como esteelegante e luxuoso patrono, embora com menos autoridade e menos recursos, e noseu tempo, como disse o historiador Sir George Sansom, a esttica Muromachi atingiue viveu grande florescncia, deixando tombar as suas ptalas florescentes uma a uma, medida que se aproximava o fim do sculo xv. O reinado de Yoshimasa curiosa-mente semelhante ao do imperador Hui Tsung, da Dinastia Sung (v. p. 58), cuja paixopelas artes igualmente o conduziu a perigos para os quais o seu pas se arrastava. ParaHui Tsung, o fim foram as invases trtaras de 1125; para Yoshimasa, a guerra deOnin, que durou de 1467 a 1477 e reduziu Quioto a cinzas.

    Seria de esperar que as pinturas trazidas para o Japo para enriquecer as grandescoleces de Yoshimitsu e Yoshimasa fossem no estilo contemporneo Ming, mastal no acontece. Os monges Zen, que foram os principais coleccionaldores destaspinturas, no estavam absolutamente nada interessados nas obras letradas dos Yuane dos Ming. Assim, como os seus contactos eram mantidos atravs dos mosteiros Zen,apenas pensavam em pinturas em tinta monocromtica dos mestres chineses Zen,tais como Mu Ch'i e Liang K'ai, no tendo pana eles qualquer importncia que esteestilo de pintura estivesse j ultrapassado na China. Criou-se ento entre a aristocraciae a'ilite militar do Japo um gosto pelas pinturas a tinta monocromtica. Posterioresexpedies mandadas pelos xguns para aquisio de pinturas trouxeram paisagensseculares do mesmo estilo, da autoria de Ma Yuan, Ma Lin e Hsia Kuei, sendo estaa explicao de muitas das melhores obras existentes de pintores da academia Sungdo Sul estarem a ser hoje encontradas no Japo.

    O Zen e a arteO povo japons encontrou no Zet um ensino perfeitamente adequado s suas

    aspiraes, e a doutrina Zen de que a esncia de Buda pode ser encontrada em todasas coisas tocou estes homens que viviam muito ligados Natureza. Alm disso, o seudesmentido da utilidade da leitura e da metafisica estava de acordo com a sua maneirade pensar sem especulao, enquanto a sua preferncia pelo quietismo.e pela auto-disciplina estava de acordo com o carcter nacional. Contemplar tranquilamente umaqueda de gua, uma flor ou uma rocha era limpar o esprito de todas as impurezas eaproximar-se mais da natureza divina. Meditar sobre uma pintura focando um assunto

    (s) O Pavilho DouradoKinkal:u-Ji, 1397Quoto, fapo

    (c) Jardim de Uma Residncia,-princpios do sculo xvrrQuioto, fapo, Daisen-In, Datoku-i

    119

  • (l) Utensos para a Cerimniado ChFotografa cedida pela ssociaoNacional de Turismo do Japdo

    semelhante acabou por ter a mesma finalidade. A pintura inspirada to Zeft tornou-seela prpria objecto de meditao, quase de venerao, e, colocada no toko-no-mo,um amplo recanto num dos lados da sala principal de uma casa ou de um templo,a pintura tomou um carcter de cone religioso, perfeito em si mesmo e isolado doespectador, pedindo-lhe a mxima concentrao.

    Este ascetismo, esta absoro consciente na beleza natural e naquelas coisashumanas que parecem encarn-la, levou ao desenvolvimento dessa instituio japo-nesa nica, a cerimnia do ch (a e p. 273), na qual qualquer gesto, qualquer palavradita ou qualquer objecto usado se justifica pela sua beleza, pela sua simplicidade e pelasua naturalidade. Um dos paradoxos da cultura japonesa a cerimnia do ch, quelevou venerao do naturalismo a um tal ponto que perdeu a espontaneidade e setransformou em culto. No entanto, apesar disso, os estetas da cerimnia do ch esti-mularam arquitectos, artifices e desenhadores de jardins (p. 119, c) criao de muitodo que, ao longo dos tempos, tem sido belo no Japo.

    O pintor, inspirado pelos ideais Zen, procurou, atravs da sua escolha do assunto,aliar em todas as coisas da Natureza a unidade visual com aespiritual. Anfase do Zenem relao disciplina e ao autodominio e a sua desconfiana e a sua dvida emrelao ao apelo sexual levaram-no a banir a cor das suas pinturas e a expressar-sesimplesmente num trao de tinta e aguarela, um tecnica chamada suiboku-ga (emchins, shui-mo hua). S quisesse sugerir a chama repentina, irracional, da iluminaoque vem aos adeptos do Zen, pintava em haboku-ga (em chins, p'o rtto-hua), ou tinta emsalpicos, como a pintura reproduzida na p.260. Mas a pintura Zenn.o erasmenteuma questo de tcnica, e qualquer pintura que, pelo seu tema e tratamento do mesmo,ajudasse a limpar a mente e a levasse ao conhecimento das coisas eternas, poderiadizer-se que encarnava os ideais do Znn.

    Retraos do 7*nAntes de referir a pintura a tinta, deveria mencionar-se uma pintura Znn que,

    com a mesma flnalidade, usa uma tecnica completamente diferente. Um princpioessencial da doutrina Zen diz que a iluminao se obtm por intuio directa, ajudadapor um estmulo que passa, como uma corrente electrica, do mestre ao discpulo. Depoisde alguns anos de estudo, com intimidaes e humilhao, o aluno devia, como gra-duao, receber um retrato do seu mestre, o qual lhe servia de diploma, certiflcando queobtivera aproveitamento e lhe dava o direito de usa. o matrio do seu professor. Estesretratos, chamados chin-zo, eram feitos com um cuidado reverente, e os melhores deentre eles so estudos profundos no s da aparncia fsica do mestre, mas tambmdo seu carcter, discernimento e dignidade. O maior expoente deste tipo de retratospintados foi Cho Densu (1352-1431), pintor profissional Iigado a Tofuku-Ji, que aindahoje guarda a sua obra-prima, o retrato do

  • prximo de Hangchow onde viveu Mu Ch'i (v. p. 62). Criou um estilo to prximodo de Mu Ch'i (p. 176), estendendo-se at ao uso dos seus sinetes, que as suas obrasso difceis de distinguir. Moku-An e outros pioneiros japoneses da pintura a tintarestringiram-se aos assuntos relacionados com o Zen, mas, no princpio do sculo xv,essa pintura passou a incluir paisagens no estilo da academia Sung do Sul.

    Um domnio completo do suiboku-ga foi adquirida por Tensho Shubun (c), pintor,escultor e administrador do Sokoku-Ji, em Quioto, o.qual desenvolveu a sua,actividadeentre 1425 e 1450. O seu professor foi Josetsu, acerca de quem pouco se conhece.Em 1423, Shubun acompanhou uma misso budista Coreia, e, como director do depar-tamento de pintura, foi o primeiro a ser oficialmente reconhecido como praticante donovo estilo chins. No h dvida de que foi uma escolha feliz para este posto, pelaperfeio e preciso do seu trabalho com o pincel e pela sua grande viso, tendo cons-titudo um padro que todos os seus continuadores na pintura a tinta se esforarampor imitar. No h acerteza de que exista algum trabalho saido das suas mos, mas apaisagem, to cheia de sensibilidade, Lendo Num Ermitrio Num Bosque de Bambus(p. 246), tem-lhe sido sempre atribuda, devendo estar muito prxima do seu esiilo.

    Sesshu e os seus coutinuadores

    O aluno mais famoso de Shubun foi Sesshu Toyo (1420-1506). Depois de terfeito a sua aprendizagem com Shubun no Sokoku-Ji, Sesshu foi para a China em 1468, alientrando logo em contacto com pintores da escola Che, discpulos de Tai Chin (v. p. 76),que deram nova vida pintura a tinta da tradio acadmica Sung do Sul. Sesshutambm visitou Pequim, onde foi alvo de muitas honrarias e teve oportunidadede ver e copiar pinturas feitas pelos prprios mestres Sung. Isto desapontou-o ao pontode referir o fraco nvel da pintura que encontrou, mas o ano que passou na Chinano foi perdido, pois a influncia do estilo de pintura da escola Che libertou-o doestilo demasiadamente perfeito do seu mestre Shubun e fez caft por terra os ltimosideais. Alm disso, das composies de pssaros e flores Ming adquiriu o poder deas desenhar em grande escala, o que mais tarde passou a usar nas suas pinturas debiombos.

    Sesshu pintou uma paisagem maneira de Kao K'o-Kung, mas parece que ignoroucompletamente os trabalhos dos ltimos mestres do Sul, como Shen Chu e Wen Cheng--Ming, que foram quase seus contemporneos. Isto pode surpreender, mas tambm certo que Sesshu no vira os trabalhos deles na China, porque os letrados Mingformavam uma sociedade paite, na qual nenhum estranho, e muito menos um pintor

    .profissional japons, podia ser admitido.Quando regressou ao Japo, em 1469, Sesshu foi primeiramente para Kyushu.

    Ento, depois de viajar trs anos pelo Japo, fixou-se no seu templo, o Unkoku-An, emHonshu do Sul, onde permaneceu at morrr. A sua influncia espalhou-se rpidamentepelos seus colegas pintores e cedo ele adquiriu grande reputao.

    Ao contrrio de Shubun, que,continuou toda a sua vida a pintar maneira chi-nesa, Sesshu tinha por esta altura absorvido completamente a tcnica e os princpiosdo suiboku-ga e fora berh sucedido ao transform-lo, pelo poder claro da sua perso-

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    (c) tribudo a TpNsno SnusuNPavilho dos Trs Mritos (pormenor)rolo de suspenso, sculo xvTquio, Fundtto Seikado

    TrNsno SHUBTTN

    Josersu

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  • (n) SrssHu. Toyo Paisagem aTinta Salpicada: rolo de suspenso,sculo xv Tquio, Mus. Nacional(B) SEssHU Toyo Paisagem(pormenor): rolo, 1468Yamaguchi, .apo,Col. Motomichi Mor

    nalidade artstica, num estilo japons. Foi tambm um intrprete perfeito do haboku-ga(pintura de salpicos de tinta) e de retratos no estilo Zen e mestre calgrafo (a).

    A maior pintura de Sesshu foi um grande rolo executado erh 1486, o qual descreveuma paisagem em transio atravs das estaes da Primavera ao Inverno (n e p. 263).A estampa da p. 217 mostra uma outra cena de Inverno, uma das duas pinturas querestam de um conjunto das quatro estaes, agora no Museu Nacional de Tquio.Nesta pintura e na sua companheira, Outono, Sesshu mostra grande capacidade no tra-balho a pincel, o que nos aproxima mais de Fan K'uan (p. 162) que de qualquer outropintor japons. A firme angularidade da linha e os tons muito frios da tinta so altamenteevocativos da disposio sombria do Inverno, sendo bastante evidente a influncia deHsia Kuei. Mas no se trata de uma mera cpia da pintura sung do sul, pois a com-posio densament compacta, a reduo escala, o desenho e o tom, notvelmentedecorativos - ainda que sesshu possa conscientemente tJo desejado assim -, almdas montanhas que formam um pano de fundo e os traos pesados e densos, demons-tram as caractersticas essenciais japonesas. Esta diferena torna-se mais clara se com-pararmos esta pintura com o rolo de Hsia Kuei das pp. 54 e 254.

    outros pintores que, como sesshu, estavam profundamente influenciados porshubun, incluindo Bunsei, Jasoku e sotan, exerceram a sua actividade em euiotodurante os meados e ltimos anos do sculo xv. Embora Sotan tivesse sucedido ao seumestre na direco do departamento de pintura, no h a ceteza de terem sido identi-ficadas obras suas. Jasoku e Bunsei foram famosos principalmente devido aos seusretratos de padres doZen, por exemplo, o ltimo, o magnfico Yuima (o). Numa ins-cri.o na metade superior da pintura, o abade de Nanzen-Ji explica que um padrezen, ao transformar a casa dos seus antepassados num mosteiro, encomendou a Bunseia sua principal imagem para devoo, o retrato de seu pai cmo Yuima (vimatakirti),o discpulo de shakyamuni. notvel no s pela sua expresso de grande fora espiri-tual e intelectual, mas tambm pela mestria com que Bunsei trabalhou duas tcnicascompletamente diferentes do pincel: um trao nervoso no desenho das tnicas, umapreciso fria na interpretao dos pormenores dos rostos.

    um exemplo admirvel da expresso da influncia de sesshu no Japo pode serobservado atravs da carreira de sesson shukei (c. 1504-d. 1589), que nasceu no lon-gnquo Nordeste do Japo e a flcou toda a sua vida. Sesson dominou uma grande varie-dade detemas e estilos de tinta (c), ea sua obra maisconhecida talyezumadasmais

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    122

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    (c) SrssoN Srrtxrr Tigre: de um biombo de seis painis, sculo xvrCleveland, Mus. ol Art

    pequenas, uma folha de lbum com um barco de pesca numa tempestade a navegarapressadamente para o abrigo da m-argem (p. 218). O facto de Sesson ter passado a suavida nesta rea remota a estudar a pintura a tinta dos mestres chineses e japonesesprova que nesta altura os trabalhos daqueles foram muito copiados e passados demo em mo, constituindo ainda um outro exemplo da rapidez com que novas ideiase novos estilos artsticos se tornavam correntes no Japo.

    A famlia AmiOs Japoneses viram sempre com respeito a transmisso de uma arte ou oficio de

    pais para fllhos. Se faltasse um filho com o talento necessrio, o pai poderia adoptarum jovem prometedor para transmitir o nome e a tradio da famlia, e estas linha-gens artsticas, como a da famlia Kose, j mencionada, acabaram por tornar-se umacaracterstica comum na pintura japonesa. Uma das mais famosas a famlia Ami:No-Ami(1397-1471),seufilho Gei-Ami(1431-85)e seu neto So-Ami,que morreu em 1525.Foram, por sucesso, pintores e avaliadores de arte oficiais de trs xguns e compi-laram ao longo dos anos o catlogo da coleco das pinturas.dos xguns, o Catlogoda Secretaria de rte dos Xtguns, documento de grande valor para o estudo da pin-tura chinesa e japonesa a tinta deste perodo. Regista obras * algumas das quaisforam cpias posteriores - atribudas a cerca de cento e setenta artistas chineses,das Seis Dinastias ao perodo Ming. Embora seja'evidente, pelo seu nome, que osmembros da famlia Ami foram amidistas, todos eles pintaram temas Zen. No-Amifoi um admirador entusistico' de Mu Ch'i, enquanto Gei-Ami tinha um estilomais pesado, inspirado em Sesshu.

    Dos trs, . o mais talentoso e influente foi So-Ami. Como paisagista, foi notvelpela sua mestria no estilo do Sul, numa altura em que muitos dos pintores trabalhavamno estilo do Norte, como Shubun e Sesshu. A sua obra-prima, as portas de correr deDaisen-In, no Daitoku-Ji, Quioto G,. 222), mostra uma amplitude de viso notvelnum pintor japons. A atmosfera carregada de humidade, os suaves contornos arre-

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    (o) BuNsEr Retrato de Yuima Kojr(pormeoor): rolo de suspenso, 1457Osaka, apo, Mus. Yamato Bunkakan

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  • (A) So-AI,rr O Jardim de pedra emRyoan-Ji (pormenor), princpios dosculo xvrQuioto, Jopo

    dondados, os traos compridos e livres, os pontos colocados com um toque de pincel,provm no dos acadmicos Sung do Sul, mas de Kao K'o-Kung, Mi yu-Jen e, pos-teriormente, dos primeiros mestres do Sul, Tung Yuan e Chu Jan.

    Mas So-Ami no foi smente pintor e crtico. A sua fama aos olhos dos Japoneses igualmente firme pela sua contribuio em relao ao intrincado ritual da cerimniado ch e por ser um servidor das artes e dos perfumes de incenso, arranjo de florese. desenho de jardins, tendo em todos estes preceitos deixado uma marca permanentepara o gosto cultivado dos Japoneses. A ele se atribui o famoso jardim de pedras emRyoan-Ji, perto de Quioto (l), cujas rochas nuas, subtilmente dispostas num leitode areia cuidadosamente limpa, sugerem ilhas surgindo do mar. A arte do desenhode jardins foi inventada na china, mas no Japo, como tantas outras coisas que os Japo-neses importaram do continente, foi elaborada e codificada num sistema, ou antes,numa srie de escolas intimamente ligadas pintura de paisagens e inspiradas no Zen.

    A escola de Kano

    Uma das mais rlotveis linhagens artsticas da"histria da pintura certamentea da famlia Kano, que ocupou o lugar de pintores principais dos xguns por mais deduzentos anos a partir do fim do sculo xv, continuando a manter o estilo oflcial>durante mais de um sculo depois. O quadro que se,segue mostra os principais membrosdesta famlia notvel, indicando os nmeros a Iinha principal na sucesso artsticacomo aceite no Japo:

    Masanobu

    2. Motonobu Yukinobu

    3. Munenobu(morreu novo)

    6. MitsunobuII7. Sadanobu

    (morreu novo)I8. Yasunobu

    (adoptado na linha principal:actualmente, filho de Takanobu)

    Naonobu YasunobuII

    Tsunenobu

    Shoei

    IEitoku

    Takanobu

    Tannyu

    124

  • A acrescentar aos artistas j nomeados, houve, at ao sculo.xrx, pintores de rolosque foram membros da escola de Kano, ou nela tentaram ser admitidos como membros.

    As figuras principais da geneanologia so: Motonobu, que fundou a escora comosendo um ramo nacional da pintura a tinta chinesa; Eitoku, que a desenvolveu atum colorido brilhante e um estilo decorativo no perodo Momoyama, e Tannyu, quea fossilizou como estilo oficial da academia Tokugarva.

    Quando, no fim do sculo xx,.escolas do ocidente, como a de Ernest Fenolosa,comearam a estudar a histria da pintura japonesa, a escola de Kano era ainda consi-derada a espinha dorsal>> da tradio japonesa. Grande nmero de pinturas da escolaKano, especialmente de artistas posteriores, encontram-se em coleces ocidentais,mas, a partir do perodo de Fenollosa, este critrio sofreu uma modificao radical,sabendo-se agora que grande parte da pintura Kano, especialmente dos ltimos duzentosanos, amaneirada, oca e repetida. No entanto, no seu primeiro fluxo, a escola produziuum grupo de pintores de grande vigor e originalidade.

    A posio nica da escola de Kano na histria da pintura japonesa deve-se a vriosfactores. Em primeiro lugar, a famlia tomou uma posio firme como pintores dosxguns e dos snhores feudais nas provncias, pelo que a escola teve a categoria deacademia oficial, categoria que alargou aos ramos regionais. Em segundo Iugar, apoiouo tipo exacto do artfice profissional, que, at introduo da pintura literria chinesa,no sculo xvrrr' sempre manteve grande prestgio no Japo. Em terceiro lugar, enquantoas tcnicas e os temas convencionais eram geralmente chineses, em todos os outrosaspectos - a nfase em relao ao seu trabalho de artfice, o realismo

  • fLt'to

    MoroNoBU

    MrrsuNoBU

    (a) KNo MoroNosu A Histriade Hsiang Yen: biombo, seculo xvlTquio, Mus, Naconal

    126

    pintar a tinta no estilo chins. o casamento de Motonobu com a f,lha de Tosa Mitsu-.robo, qu. morreB em 1522, foi um ponto-chave no desenvolvimento da escola, pois aescola de Tosa, que tradicionalmente fornecia pintores corte, era a herdeira-da tradi-

    oYamato.E,eoprprioMitsunobufoifamosopelosseusrolosvivosecoloridos,ilustrando romances e poemas picos (u). o casamento de Motonobu e posteriorescasamentos entre membros das famflias Kano e Tosa-usando o termo