A Carta

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Aperiódico. Edição Zero. agircultural.org Esta é uma publicação da Agir Cultural. Caa é , basicamente , uma correspondência , uma mensagem que é enviada a alguém – o destinatário. A caa , poanto, cria um elo, ainda que fugaz ou irrealizado; ela deseja o destinatário, pretende seduzi-lo. Basta lembrar o costume antigo de perfumar ou beijar a caa que se endereça ao ser amado; a caa quer tocar o outro, quer comovê- lo, mas quer principalmente alcançar seu corpo. E nessa materialidade da caa reside a grande diferença com relação a seu sucessor, o email . A caa é um corpo. Mas é , também, um jogo. Ou, talvez, uma jogada rumo à caada final . Vitória de um, derra de outro. Soe , habilidade ou destino? Pra você , leitor, nossa caada . Agora é sua vez. Ca rta a

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Atualmente o escritor independente fica prensado entre a mídia de massa e a fragmentação virtual. A abundância de informações e idéias nos dias atuais não suprir a escassez de canais impressos (na internet é mais comum) para que essas idéias possam se movimentar pela sociedade, entre as pessoas, ligando ideias e ideais. A Carta é um fanzine que busca melhorar esse espaço, apostando em novas e outras maneiras de se ler e ver a nossa sociedade.

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Aperiódico. Edição Zero.agircultural.org

Esta é uma publicação da Agir Cultural.

Carta é, basicamente, uma correspondência, uma mensagem que é enviada a alguém – o destinatário.

A carta, portanto, cria um elo, ainda que fugaz ou irrealizado; ela deseja o destinatário, pretende seduzi-lo. Basta lembrar o costume antigo de perfumar ou beijar a carta que se endereça ao ser amado; a carta quer tocar o outro, quer comovê-lo, mas quer principalmente alcançar seu corpo. E nessa materialidade da carta reside a grande diferença com relação a seu sucessor, o email .

A carta é um corpo. Mas é, também, um jogo. Ou, talvez, uma jogada rumo à cartada final . Vitória de um, derrota de outro. Sorte, habilidade ou destino? Pra você, leitor, nossa cartada. Agora é sua vez.

Cartaa

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6 A Intimidade de uma re lação aberta

7 Foto/Poesia

Nas páginas da carta...

8 A Reunião de Jonny Fuenttes

EdiçãoFábio BispoElisa Tonon

Projeto GráficoFábio Bispo

Juliana Duclós

RevisãoJoana Zanotto

Esta é uma publicação independente.

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eDITORIAL

Será que o mundo muda se o vemos por outros ângulos, com outras formas, cheiros, ritmos e cores? O avesso do avesso pode ser mais revelador que a mira-da cansada na telenovela das oito —e toda intenção de superar o maniqueísmo usual será considerado loucura.

Vão dizer por aí que a vida real vale mais que um amontoado de palavras num pedaço de papel e te farão acreditar que o sentido da vida é a “soma” diária de todo dia. Vão te estacionar entre balizas, e, como o Grande Irmão, vão controlar e oprimir.

Não se assuste. Tentarão te convencer de que foi vã a verborragia dos Titãs, que lá pelos idos de 1987, em Jesus Não tem Dentes no País dos Banguelas, bradavam: “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.

—Cadê nosso ópio?

Entre uma coca-cola e outra, a vida pode fruir. O gozo do sonho é mais saboroso ao ver a Ilha pela impressão do boitatá de Cascaes, “apreciando, de riba, as ses-senta praias que ela possui, brancas quiném jasmim”, na espiral louca de supor que a cidade afundaria numa sexta-feira de lua cheia. E não irá? A Carta quer levar adiante o devaneio, o impulso dionisíaco que dissolve no universal.

A realidade complexa em que vivemos é mostrada nesta edição zero numa viagem pelo tempo através de outra Praça XV que parece não existir mais. Em O Profeta da Praça XV, o jornalista Fernando Evangelista lembra dias mais aprazíveis no Centro da cidade, contrapondo-os com uma dura realidade que coloca a outrora bucólica colônia açoriana, agora, nas manchetes nacionais.

E o resgate cultural não para por aí. O Oceano de Criatividade dos rapazes da banda Sociedade Soul é exaltado por Daniel Silva, mostrando, com o lançamento do EP Fundo de Coral, que a banda ainda tem muita pólvora pra queimar. No texto Elefantes Brancos, o administrador Samuel Felippe questiona a falta de ocupação de espaços públicos para atividades culturais.

Este trabalho é a dobra da dobra. A liberdade de um sonho. Emergido dos cacos de sua própria fragmentação, que desmontam e remontam significações frente aos seus olhos. Um sonho que não busca superfície nenhuma, se não a mais profunda imersão de sua própria marginalidade.

Boa leitura.

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Bete chegou em casa e encontrou o marido transando com uma garota. Eram meados dos anos 70 e ela tinha acabado de voltar de uma viagem de férias a Fortaleza, em que fora de ca-rona com o seu padrinho de ca-samento. Já fazia dois meses que não via e nem conversava com Chicão. “A gente tem um proble-ma, porque eu estou voltando e quero ficar contigo. É mais im-portante o que tu teve com ela ou o nosso relacionamento?” O relacionamento era mais impor-tante. Sempre era. Na mesma noite, tudo estava resolvido, e os três, Elisabete Portugal, Chico Daniel e a garota, se encontraram na Esquina Maldita.

O cruzamento da Avenida Osval-do Aranha com a Rua Sarmento Leite era famoso por reunir in-telectuais e revolucionários. Ba-foradas de baseado e a droga da política se confundiam no gueto formado por quatro bares no entorno da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Alaska, aliás, o pioneiro e um dos mais frequentados, foi o responsável pela formação de alguns lite-ratos, que cansados de discutir sobre Faulkner entre uma cerveja e outra, transformaram a boemia em inspiração.

Bete e Chicão faziam parte do grupo de bebedores assíduos da esquina. Não só bebedores. Os fundadores do jornal esquerdista Lampião levavam ao pé da letra o lema da época, “sexo, drogas e rock’n roll” e experimenta-

de uma relação

Um gueto boêmio com

vida intelectual inquieta e

independente. Nele, duas

vertentes – a dos que pretendiam mudar o mundo

e a dos que propunham

revolucionar a própria vida –

produziram uma boemia com ares existencialistas,

que oscilava entre o proselitismo e a

porra-louquice.

Esquina Maldita (Paulo Cesar Teixeira. Libretos, 2012, 215 páginas)

*Joana Zannotto é acadêmica de jornalismo na UFSC. Devoradora de livros e aficionada pelos detalhes da escrita. Pre-miada na edição 2012 do programa Jovem Jornalista, do Instituto Vladmir Herzog de Direitos Humanos.

vam de tudo. Transavam com pessoas diferentes sempre que sentiam atração, em relações hetero e homossexuais; faziam ménages e promoviam bacanais em sua casa. “A gente encarnava o ideal, numa parceria completa. Tudo era compartilhado, profun-do e extremamente legal”, define hoje, Bete Portugal, o casamento que durou nove anos. Para ela, “o amor tem que incentivar e nunca limitar. As pessoas sentem medo de perder o parceiro por insegu-rança. A segurança que a gente ti-nha vinha de um relacionamento tão legal que dificilmente o outro arriscaria. Se o terceiro fosse tão bacana que pudesse ter o mesmo nível de relacionamento e tanta leveza nesse entendimento, essa pessoa valeria a pena conhecer”.

Há cinco anos Bete estava em sua casa em São Paulo, quando rece-beu de Chicão um artigo sobre o que tinha representado o amor para a sociedade nos anos de luta pela democracia. Para o autor do texto, um antropólogo que ela não recorda mais o nome, amor era significado de liberdade. Bete é amiga de todas as seis ex-esposas de Chicão e o considerou membro da família até a sua morte. A his-tória do casal entrou para o livro do jornalista Paulo Cesar Teixei-ra, Esquina maldita, lançado em novembro de 2012 pela editora Libretos. O autor entrevistou 80 pessoas que frequentaram nos anos 70 o famoso beco under-ground de Porto Alegre e que participaram do movimento de contracultura na capital gaúcha.

A intimidade

aberta

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Se parados

(Karine Bitencourt)

Juntos e separados.

Juntos. Separados.

Juntos; separados.

Juntos-separados.

Juntos se parados.

Juntos e parados.

*Karine Bitencourt. Jornalista graduada pela Unisul. Poeta e fotógrafa nas horas vagas. Uma apaixonada pela vida e suas cores.

*Foto: Eduardo Valente. A maioria escolhe a profissão, mas existem pessoas que são selecionadas e impulsionadas pelo talento. Eduardo Valente foi levado, pela vida, para o mundo das imagens e do fotojornalismo.

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Ele ouviu a campainha e desceu as escadas lentamente. Estava sozinho em casa. Levou um susto quando a viu:

– Vamos dar uma volta no centro? – ela perguntou.

– Só nós dois?

– Que mal pode ter?

Ele tinha uns nove, dez anos, e era uma criança assustada, assustadíssima. Não ia a lugar algum sem um adulto e sem uma mochila com os seguintes itens: bússola (em caso de mudança de rota), fichas telefônicas (em caso de emergência), canivete suíço (em caso de imprevisto), nome e endereço completos na carteira (em caso de amnésia).

– Que mal pode ter? – repetiu a menina.

A pergunta e a visita lhe pegaram desprevenido. Alguma coisa ele precisava fazer, não havia dúvida. Fechar a porta na cara dela estava fora de questão.

Ela tinha olhos verdes bem claros e era um ano mais velha do que ele. Além disso, parecia também bem mais alta. Os olhos verdes, a altura e a idade impunham respeito. Ele não poderia decepcioná-la.

Havia um empecilho, porém: sua inseparável mochila estava sendo chacoalhada, de um lado

para outro, dentro da máquina de lavar. O que fazer?

“Nada vai acontecer”, ele disse para si mesmo, estufando o peito e erguendo o queixo, num ato de inesperada coragem. Finalmente, provaria para o mundo sua bravura.

– Vamos – ele disse.

E foi neste passeio, sem mochila, sem mapas, sem fichas telefônicas, sem canivete ou carteira, que a vida lhe ofereceu o primeiro grande espanto.

As duas crianças caminhavam pelo centro quando viram um homem com uma bíblia numa das mãos e um microfone na outra. A voz de trovão, amplificada pelas potentes caixas de som, cortava a Praça XV de Novembro, assustando bêbados e pombos.

Equilibrando-se sobre um caixote de madeira, vestindo um terno cinza um número abaixo de sua medida, o homem alertava os infiéis contra as fraquezas da mente, do espírito e da carne, principalmente da carne.

As crianças ficaram hipnotizadas. Um dos dois perguntou para o engraxate, encostado numa árvore ao lado, quem era aquele sujeito.

– Quem é e o que ele faz, eu não sei, não. Mas todo mundo o conhece como Profeta.

– Ele prevê o futuro – disse outro engraxate, que se aproximara do grupo à procura de companhia.

Profeta? O menino nunca tinha visto profetas ao vivo. Sabia que eles existiam por causa

O XVprofeta dapraça

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das aulas de religião, mas jamais poderia imaginá-los ali na praça, no centro da cidade, numa tarde de sol, estrebuchando coisas estranhas.

Foi então que os olhos do profeta depararam com os olhos arregalados do menino. Ele apertou com força as mãos da amiga.

– Para te proteger – disse, disfarçando.

– Venha cá, garoto – ordenou o homem da bíblia.

As duas crianças se aproximaram, mas a menina deteve-se quando o profeta ordenou gravemente:

– Só ele.

Tomado de curiosidade e apreensão, o garoto seguiu em frente. O homem encostou o microfone sobre a caixa de som, inclinou-se para frente, e disse bem baixinho, com voz tranquila:

– Aconteça o que acontecer, não deixe o medo tomar conta de sua vida.

O tempo passou, o menino cresceu, a menina se mudou para outro Estado, o profeta virou político, o político fundou uma igreja, a igreja se absteve quando a prefeitura fechou a praça, expulsando artesãos, engraxates, mendigos e profetas.

CRÔNICA

*Fernando Evangelista é jornalista, mestre em Comunicação pela Universi-dade de Coimbra/Portugal. Atuou como correspondente da Revista Caros Amigos e cobriu conflitos no Oriente Médio, Eu-ropa, Iraque e Líbano. Em 2003 recebeu o Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos.

XV no Sul, região celebrada pela mídia como modelo social e econômico, talvez esteja ainda pior nas outras regiões”.

“Os jornais exageram”, ele repete para si mesmo. E lembra-se da amiga de infância e do conselho do profeta.

Ao sair da banca, é abordado por dois homens brancos, bem-vestidos e bem apessoados. Um deles coloca um revólver na sua barriga e outro exige a carteira e o celular, os óculos de sol e o cinto da calça – por pouco não levam também a calça. “Passa logo, passa rápido, passa bonzinho, não faz nada, não faz merda porque senão leva chumbo”.

Ele faz como lhe ordenam e num piscar de olhos os homens somem, levando suas coisas e um pouquinho da sua esperança. No caminho de casa, ele volta a pensar no profeta: Como não viver refém do medo?

Se alguém souber, por favor, diga ao menino. Ele precisa de uma resposta.

Os pombos continuaram por ali.

A cidade e o menino mudaram juntos.

Agora, tantos anos depois, ele caminha pelo centro daquela cidade, entra numa banca de revistas e esbarra nas manchetes dos jornais: “dezenas de mortes na madrugada em São Paulo, tiroteio em túnel no Rio de Janeiro, sequestro relâmpago em Mato Grosso, chacina no Espírito Santo”.

“Os jornais exageram, a vida é muito melhor do que eles nos fazem crer”, diz para si mesmo. Volta a ler as manchetes penduradas na banca e uma lhe chama especial atenção: “Santa Catarina é o Estado brasileiro onde mais cresce o número de homicídios”.

De acordo com o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgado no começo de novembro, houve um aumento de 44,8% de assassinatos em comparação ao ano anterior no Estado. São 11,7 homicídios por 100 mil habitantes.

A Organização Mundial de Saúde considera 10 homicídios por 100 mil habitantes como o máximo aceitável. Acima disso, o problema é epidêmico. Diante das manchetes, ele fica pensando: “Se é epidêmico

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O m a r d e s f i l a suas belezas por toda parte, neste lugar. Acho que é por isso que gosto tanto daqui. Sempre fui um admirador do mar, o mar é outro planeta, outro universo, um mundo diferente do nosso. U m m u n d o e m t o n s a z u i s , enquanto o nosso está cada vez mais cinza. Mas nem sempre foi assim. Sabe, lá se vão mais de vinte anos desde que “Eles” decidiram como a coisa toda iria funcionar. Tudo planejado em minúcias, ponto por ponto. Uma t rama do grupoo. . .um momento, ouço passos. Shhhh...silêncio! Acho que são “Eles”, é melhor você partir. A propósito, a m a n h ã f a r e i u m j a n t a r d e coxas de frango ao holofote e você está convidado. Será na praça, num daqueles pontos de iluminação que embelezam as palmeiras imperiais, próximo ao coreto, sabe? Não conheço grelha melhor. As coxas serão servidas depois da reunião, às oito horas. Aproveite e leve um exemplar daquele jornal...como é mesmo o nome? Aquele...não que eu vá ler, é que gosto de papel. Sem o papel o mundo moderno seria inviável. Esta invenção chinesa garante um certo ar de formalidade e seriedade a tudo. E quem sabe possamos utilizá-lo, como guardanapos, após a ceia. Ah! Peço o máximo de discrição, por favor. Há muitas câmeras espalhadas por toda a cidade e não quero que pensem que somos um grupo de subversivos tramando a olhos nus. Não que não sejamos um grupo de subversivos, mas temos que manter a reputação de maltrapilhos usuários de crack. Não que sejamos maltrapilhos

usuários de crack...Tá! também somos maltrapilhos usuários de crack, mas o que importa o que somos ou deixamos de ser se todos acabam seus dias mais cedo ou mais tarde? Sobre a reunião, só posso lhe dizer a pauta: “Consenso de Washigton- a famigerada trama orquestrada pelo grupo...”, Shhhhhhh! Os passos continuam, vá logo porque podem ser “Eles”. Faz assim: passe lá em casa amanhã, às cinco e meia, e partiremos juntos. Moro na ala insular da ponte, ao lado de uma pichação onde se lê: Fora FMI. Procure não ser seguido. Quando avistar alguns papelões no chão, pare. Não pise sobre os papelões, por favor, durmo neles. Agora vá, vejo sombras há alguns metros. Até.

Jonny Fuenttes

*Silvestre Lacerda é jornalista, contista e cronista. Apaixonado por literatura e pela cidade de Florianópolis.

A reunião de

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MAIS UM FILHO DE DEUS(kELTON)

Sou mais um filho de Deus que não recebe mesada É só trabalho, trabalho, esporro e chibatada Corro pra lá e pra cá sempre em busca de nada E quando chego em casa com a mente já desgastada Ligo a TV e engulo mentiras pré-programadas É mais novela iludindo contando conto de fada Discurso de um poderoso na Rampa da Esplanada Outra crise financeira jogo de cartas marcadas Enquanto Deus fecha os olhos pra multidão massacrada Ainda fico com medo d’Ele me dar umas palmadas Nem posso beber cerveja sentado na arquibancada Colocam a culpa nas drogas pra violência enraizada Esquecem que a educação ta sendo sucateada As alas dos hospitais tão sempre superlotadas Nossa divisão de renda é uma grande piada Que os empresários que lucram com o suor da moçada Os governantes por trás fingindo ter mãos atadas Nos paraísos fiscais com sua grana roubada Aproveitando a vida às custas da pátria amada Tiraram a sabedoria de uma grossa camada Eu quero só ver o dia que a multidão revoltada Depois de abrir os olhos querer pegar essa cambada Sei que eles vão se esconder atrás da turma fardada Só que também essa turma que teve a mente lavada Um dia vai se ligar que o seu trabalho é fachada Que estamos do mesmo lado; ovelhas bem controladas Enquanto nada acontece resta rezar outra prece pra alma não ser castigada.

poesia

*Kelton Luiz da Silva

é natural de Florianópolis e criado em São José. Começou a escrever poemas aos 17 anos pra impressionar uma garota e acabou encontrando um amor pra vida toda, a poesia. Parte de sua obra pode ser lida em seu blog .

http://kmusicasepoe-

sias.blogspot.com.br

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O s c i n c o a n o s d e c a r r e i r a d a Sociedade Soul têm ren-dido frutos a esse talentosíssimo quarteto de Florianópolis, que já tem um disco de estúdio (2010), um DVD ao vivo e um clipe – “Jar-dim das Delícias” que concorreu a prêmio internacional no currículo. Recentemente, a banda se lançou em uma pequena turnê na Suécia, onde apresentou o EP Fundo de Coral, primeiro registro do grupo em mais de dois anos, que foi gra-vado no fim do ano passado e traz quatro músicas inéditas.

O miniálbum abre com o single “Fundo de Coral”, já conhecido do público. O alto astral predomina nesse trabalho, cujo diferencial em relação ao disco de estreia é aproximar o ouvinte do som que é praticado ao vivo. Foram muitos shows para a Sociedade Soul atin-gir essa pegada da música “Pra Frente”, em que o tecladista Diego Carqueja divide os vocais com o

grande Gustavo Barreto (guitarra). André FM (bateria/percussão) e Marco “Nego” Aurélio (baixo) são os responsáveis pelo groove irre-sistível da banda.

A pedrada “Mais Vale” é atual, mais eletrônica e com forte influ-ência de Jamiroquai. Destaque para a interpretação de Carqueja, que guia a música com a sua virtuose. Fundo de Coral fecha com Manga-ba, uma composição instrumental, que mistura de forma impecável o funk/soul à batida do samba. Esses valiosos 14 minutos mostram que eles têm muita lenha para queimar. Talento é o que não falta para a So-ciedade Soul. Espero ansiosamente pelo próximo disco!

Formada em 2008, por Gustavo Barreto (vocal e guitarra), André FM (bateria), Nego Aurélio (baixo) e Diego Carqueja (teclados), a Sociedade Soul já colhe os frutos dos seus trabalhos. O primeiro disco homônimo, lançado em 2010 foi selecionado para a publicação “Disc Collection Brasilian Music”. O livro é uma compilação de 500 discos da música brasileira e foi editado exclusivamente para público do Japão.

música

oceano

*Daniel Silva é jornalista, repórter esportivo do jornal Notícias do Dia, mas a sua paixão mesmo é a música, seja death metal ou bossa nova. Editor do finado blog Estética Musical.-esteticamusical.blogspot.com.br

de

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Elefantes

Mesmo com a notícia de que o prefeito de Florianópolis , e lei-to no f inal do ano passado, vai iniciar um processo de es-tudos sobre as possibilidades de utilização dos terminais abandonados ou subutilizados (Jardim Atlântico, Capoeiras e Saco dos Limões), um plano de ação efetivo e com a participa-ção da população local ainda parece longe de sair do campo das ideias e partir para a ação. Atualmente, Florianópolis conta com cinco terminais em funcionamento, sendo dois no Norte, um no Sul e dois na re-gião central. Outros três estão completamente abandonados.

Em capoeiras os moradores reve-laram a indignação pelo descaso em vídeo. Com uma câmera cap-

turaram cenas das instalações deterioradas. .Esse patrimônio, conhecido como TICAP (Ter-minal de Capoeiras), custou R$ 2,5 milhões à população.

Com as eleições municipais, nos últimos meses de 2012 a segu-rança do local foi extinta sem aviso.

O TICAP nunca entrou em fun-cionamento, e desde 2003 os sinais de vandalismo e aban-dono completo são notados. Um “elefante branco”, dizem na comunidade. Até o início de 2013, sequer havia reposição da segurança no local.

A prefeitura não tem estimativa de quanto dinheiro público “a mais” será necessário para re-ativação, mas calcula que cerca de 70.000 usuários do transporte público coletivo continental pos-sam utilizar o espaço dentro de seis meses.

O novo secretário d o s T r a n s p o r t e s , Valmir Humberto Piacentini, diz que o estudo projetado no inicio da década pas-sada para a implan-tação dos terminais procurou abranger a futura deficiência da mobilidade urbana, esta na qual estamos enfrentando hoje, e por isso estes terminais são mais necessários do que nunca.

Nesses quase 10 anos de inutilidade pú-blica , os terminais poderiam ser usados para outras finali-dades : a t iv idades culturais e educati-vas, quiçá. Por outro lado, o espaço serviu de símbolo da falta de planejamento e mal uso do dinheiro público.

O transporte urbano não aconteceu no TICAP, assim como nos outros terminais da cidade. Outras opções para dar uso contínuo ao espaço público não foram criadas. O que po-deria ser solução de transporte, arte, cul-tura ou educação se tornou problema de saúde e segurança pública.

E n q u a n t o i s s o , entre desculpas e promessas, para os preocupados com esta deprimente si-tuação, cont inuar a mobil ização é o que resta.

*Texto: Samuel Felippe. Mestre em administração pela UFSC

Brancos

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Possivelmente você já ouviu falar do edital Elisabete Anderle. É o maior e mais importante projeto de incentivo à cultura do estado de Santa Catarina. Está na boca dos agentes culturais. E também presente no discurso político, principalmente nos tempos de campanhas. O cance-lamento da edição do ano passado (2012) deixou de distribuir R$ 10 milhões para projetos nas áreas de arte popular, artes visuais, dança, letras, música, patrimônio cultural e teatro.

Não houve chamada por conflitos com a legislação eleitoral, isso por-que o referido edital não foi regulamentado através de lei, o que per-mitiria seu lançamento regular sem cair nas restrições. A distribuição democrática das verbas, então, tomou outros rumos, e a promessa para 2012 foi de investir em cultura por outras vias (através de órgãos do próprio governo). Vale lembrar que a única edição foi realizada em 2009. Premiou 189 projetos. Desde então a permanência do edital e seus benefícios para cultura local ficaram a mercê da boa vontade dos nossos governantes.

A falta de institucionalização da cultura acaba fazendo parte de um mesmo contexto de outras áreas da gestão pública. O histórico arrocho dos governos catarinenses em investimento público criou a nossa pró-pria “bomba social”. Saúde, Educação, Transporte, Segurança Pública e Cultura foram palco de episódios lamentáveis, que revelam o grau de comprometimento de nossos políticos com o bem estar da população.

Também não foram realizados o Salão Nacional Victor Meirelles e o Prêmio Cruz e Sousa de Literatura. Além do calote que a Academia Catarinense de Letras levou de Raimundo Colombo —a verba anual não chegou.

Maratona Cultural e o show de Paul McCartney também contaram com verba destinada à cultura. Para o show do beatle, R$ 800.000,00 da SANTUR foram repassados para a produtora RBS. Mesmo assim o acesso ao show ficou restrito a quem pudesse arcar com o preço salgado da entrada. São José, por exemplo, gastou R$ 4 milhões em cultura no ano passado. No aniversário da cidade, show do Alexandre Pires e do Restart consumiram boa parte de todo esse dinheiro.

Criado em 2008, o edital é uma seleção pública de projetos culturais. Sua existência colabora para sustentar a cultura como pilar da nossa sociedade, garantindo a produção, pesquisa, circulação, preservação e difusão. Existem promessas de que o edital tenha reedição este ano. Diferente do que prometeram para o ano passado (R$ 10 milhões), Beto Martins, recém-chegado para assumir a SOL (Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte), garante que o edital sai no primeiro qua-drimestre, com verba de R$ 7 milhões. Quem viver, verá.

*Fábio Bispo

maisEu quero

cultura,e você?