A Casa Kabila
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Transcript of A Casa Kabila
APONTAMENTOS PARA O MESTRADO
A casa ou o mundo às avessas – Pierre Bourdieu
A casa kabila é dividida em duas partes, na parte maior ficam os humanos, na
menor os animais, existe uma porta onde se acessa de um lado ao outro. Essas duas
partes são separadas por uma mureta. Aí perto da mureta ficam as provisões destinadas
ao consumo diário, do outro lado, perto da porta, fica a água. Acima do estábulo existe
um jiral onde são guardadas ferramentas e alimentos dos animais, é lá também, a parte
escura da casa, onde se dorme e onde se faz sexo.
De acordo com Bourdieu, uma descrição da casa, enquanto espaço físico é
essencial porque ela, representa de maneira explicita o sistema simbólico dos Kabila, ela
é central nesse sistema.
Bourdieu afirma ser fundamental a oposição entre os “dois pontos de vista” o
masculino e o feminino.
Parede oposta: da obscuridade, da jovem, do sono, do túmulo.
A parede do kanun se opõe ao estábulo, como o alto ao baixo. A palavra
estábulo, em kabila, está associada a palavra baixo.
A disposição da casa kabila não é meramente técnica, apesar de apresentar
características proveniente de sistemas técnicos/funcionais.
Relação de oposição entre a parte baixa e a parte alta da casa Baixa: escura,
noturna, lugar de objetos úmidos, lugar de animais atos naturais, como o sexo, o parto e
a morte. Alta: iluminada, nobre, lugar de humanos, onde se recebe os convidados, do
fogo, dos objetos fabricados pelo fogo, utensílios de cozinha, o fuzil, tear.
O fuzil segundo Bourdieu é o símbolo da honra masculina, que protege a honra
feminina.
O tear é lugar de atividades culturais: cozinha e tecelagem.
Essas relações de oposição se expressam através de um conjunto de indicadores
convergentes que, ao mesmo tempo que as criam, recebem delas seu sentido.
Homologia entre o sono e a morte.
Tear exerce proteção mágica.
O tear também é símbolo da proteção masculina, a posição dela em relação ao
tear vai mudando: antes do casamento está atrás do tear (proteção das pessoas do sexo
masculino, pais, irmãos) no dia do casamento ela se senta à frente do tear (virando as
costas para ele, ou seja, para seus pais e seus irmãos), em seguida, se sentará para tecer
Oposição baixa e alta (partes da casa) – feminina e masculina, divisão sexual
do trabalho.
Essa oposição reproduz, dentro da casa, aquela estabelecida entre o dentro e o
fora, entre o espaço feminino da casa e do jardim e o espaço do masculino.
Parte baixa = sexualidade e procriação.
No centro da parede de separação se situa a viga mestra de todo o vigamento da
casa, ela é identificada ao dono da casa e está encaixada a um tronco de árvore
bifurcado que dá sustento a viga, que é identificada com a esposa. Essa viga masculina é
a guardiã da honra da casa.
O autor segue dando uma série de exemplos de rituais e ditos populares que
ligam o homem a viga e a mulher ao tronco de árvore bifurcado. Segundo ele, esses
troncos representam um casamento fértil, a união entre homens e mulheres.
O autor retoma uma série de oposições que existem dentro da casa, como a de
masculino e feminino e a de natureza e cultura.
Oposição entre a casa e o resto do universo, oposição de mesmo nível de
natureza e cultura.
Mundo: masculino. Casa: feminino.
A mulher está presa à casa e o marido excluído dela durante o dia. Durante o dia
os homens devem cuidar do campo.
Masculino x Feminino = Público x Privado.
Enquanto mundo é Masculino e a casa é feminina, a casa é ainda, masculina e
feminina. Portanto, o feminino = feminino-masculino (parte masculina da casa, que por
sua vez, na relação maior é femininia)+ feiminino-feminino.
Nesse sentido, o mesmo princípio que organiza as relações dentro da casa,
segundo Bourdieu, as organiza fora dela, no mundo.
A casa é feminina-masculina e femininia-feminina, do mesmo modo, podem ser
as partes da casa e os objetos nessas partes da casa.
Apesar de a casa se opor ao mundo público, sendo assim, natureza, onde se faz
sexo, por exemplo, ela também, e por extensão a aldeia, é cultura, se comparado com os
espaços onde os homens não ocupam, os campos abertos.
Os ritos realizados na casa são úteis para assegurar a fecundidade do campo e da
casa.
Atos rituais também asseguram a fartura da casa.
A SOLEIRA É A DIVISÃO ENTRE DOIS MUNDOS OPOSTOS: A CASA,
FEMININA, E O MUNDO, MASCULINO.
Ao casamento são associados uma série de tabus, que se estendem a primeira
entrada no do casal na casa, as ações devem ser feitas de maneira correta visando a
fecundidade da mulher e a prosperidade da casa.
Masculino
Feminino
Feminino
Masculino
Legenda
Casa
Mundo
A fecundidade da mulher na casa contribui para a fecundidade do mundo agrário.
Casa: para o homem um lugar que se sai. Já o movimento da mulher é em
direção ao interior da casa, portanto: a direção do homem é para o exterior, da
mulher para o interior.
Saída: movimento masculino.
Importância atribuída a orientação da casa. A
porta principal, masculina, é voltada em dire
ção ao leste. A parte onde fica o fogão fica
voltada para o norte, o estábulo para o sul e
a parede do tear a oeste.
Entrada: de leste para oeste.
Saída: de oeste para leste.
Segundo Bourdieu, a posição da casa em relação a posição do mundo exterior é
inversa, como se ela tivesse sido obtida por uma meia rotação da fachada ou da soleira,
aí, a parede que recebe a luz da porta oposta a porta é o leste da casa, a parede escura,
onde fica a porta o este, e isso se repete com norte e sul. Nesse sentido
Portanto, casa e mundo exterior tem sentido simétrico invertido, essa meia
rotação da casa em relação ao mundo exterior tem na soleira sei eixo de rotação. O que
leva o autor a afirmar que a soleira é portanto uma fronteira mágica onde se opera uma
inversão lógica entre dois mundo, por isso, são realizados ali rituais que esperam a
inversão das coisas, como rituais por chuva por exemplo.
Casa
Homem
Mulher
Na figura o quadrado representa a
casa, a abertura a soleira e as setas o
homem e a mulher
Mundo exterior
N
S
L O
N
S
L O
Casa
Oeste
Norte
Leste
Sul
úmido
esquerda
Norte baixo
Inverno
outono
oeste
Leste
Primavera
seco
Alto sul
verão
Por isso tudo, a casa é um mundo às avessas, um reflexo invertido. (Eu diria que
na lógica do pensamento do Bourdieu a mulher seria então um homem às avessas).
Por fim, o autor aponta para uma hierarquização do feminino pelo masculino.
Sendo o masculino mais importante. O fora, o público.