A COMERCIALIZAÇÃO NA AGROINDÚSTRIA DE PEQUENO … · A estratégia de pesquisa utilizada foi...

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A COMERCIALIZAÇÃO NA AGROINDÚSTRIA DE PEQUENO PORTE: A AGRICULTURA FAMILIAR EM EVIDÊNCIA – O CASO DE LONDRINA João Luiz Passador Luiz Artur Bernardes da Rosa Cláudia Souza Passador Resumo O objetivo geral deste artigo é identificar, descrever e analisar as dificuldades na comercialização da produção agroindustrial em relação a mercado, recursos financeiros e regularização, segundo a percepção dos agricultores agroindustriais familiares, selecionados no município de Londrina, no Paraná. Destacando o tempo de funcionamento, matéria prima, capacidade de produção, processos de transformação, produtos, localização, pontos de comercialização, estrutura para distribuição da produção, vendedores, tipos de clientes e propaganda; dificuldades na relação com o mercado e com recursos financeiros; regularização da agroindústria, do produto e dos impostos. A perspectiva dos agricultores de poderem produzir, agroindustrializar e comercializar, apropriando-se destes três segmentos na cadeia produtiva, despertou o interesse em pesquisar quais são as dificuldades na comercialização da produção agroindustrial. Assim, neste trabalho, o estudo da comercialização nas agroindústrias de pequeno porte limitou-se a abordar o mercado, os recursos financeiros e a regularização. Palavras-chaves: agronegócio, agricultura familiar, comércio. Introdução 1. Tema e Problema da Pesquisa Nas últimas décadas, as mudanças ocorridas na economia mundial têm provocado a reorganização de vários setores. Entre estes, o setor rural é um dos que sofrem mais fortemente a concorrência internacional. Sua reestruturação, além de depender de políticas econômicas governamentais que garantam competitividade, estabilidade na renda e acesso às oportunidades de mercado, depende principalmente da capacidade de seus gestores em administrar os recursos dentro e fora da porteira. A concepção da agricultura familiar como uma forma social residual, transitória ou em vias de desaparecimento, é rejeitada por Lamarche (1998), que considera que ela ocupa um espaço próprio nas sociedades modernas, capitalistas ou socialistas, avançadas ou em processo de desenvolvimento. O mesmo autor afirma que a agricultura familiar nas sociedades modernas é, antes de tudo, uma realidade multiforme e que esta realidade resulta, sobretudo, de sua capacidade de adaptação a contextos sociais e políticos os mais diversos. No Paraná, a atividade rural está distribuída entre a agricultura familiar e a empresarial que produzem para o mercado interno e externo. A agricultura familiar tem sua produção diversificada entre produtos para consumo interno e para exportação. Entretanto sua maior contribuição para o abastecimento interno não tem sido recompensada por preços que remunerem satisfatoriamente a atividade. Por outro lado, a falta de escala nas culturas de exportação também não permite a lucratividade necessária para esta categoria. O Paraná destaca-se nacionalmente pela expressiva participação na produção de commodities. No entanto, em torno de 80% da produção do Estado é proveniente da agricultura familiar que

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A COMERCIALIZAÇÃO NA AGROINDÚSTRIA DE PEQUENO PORTE: A AGRICULTURA FAMILIAR EM EVIDÊNCIA – O CASO DE LONDRINA

João Luiz Passador

Luiz Artur Bernardes da Rosa Cláudia Souza Passador

Resumo O objetivo geral deste artigo é identificar, descrever e analisar as dificuldades na comercialização da produção agroindustrial em relação a mercado, recursos financeiros e regularização, segundo a percepção dos agricultores agroindustriais familiares, selecionados no município de Londrina, no Paraná. Destacando o tempo de funcionamento, matéria prima, capacidade de produção, processos de transformação, produtos, localização, pontos de comercialização, estrutura para distribuição da produção, vendedores, tipos de clientes e propaganda; dificuldades na relação com o mercado e com recursos financeiros; regularização da agroindústria, do produto e dos impostos. A perspectiva dos agricultores de poderem produzir, agroindustrializar e comercializar, apropriando-se destes três segmentos na cadeia produtiva, despertou o interesse em pesquisar quais são as dificuldades na comercialização da produção agroindustrial. Assim, neste trabalho, o estudo da comercialização nas agroindústrias de pequeno porte limitou-se a abordar o mercado, os recursos financeiros e a regularização. Palavras-chaves: agronegócio, agricultura familiar, comércio. Introdução 1. Tema e Problema da Pesquisa Nas últimas décadas, as mudanças ocorridas na economia mundial têm provocado a reorganização de vários setores. Entre estes, o setor rural é um dos que sofrem mais fortemente a concorrência internacional. Sua reestruturação, além de depender de políticas econômicas governamentais que garantam competitividade, estabilidade na renda e acesso às oportunidades de mercado, depende principalmente da capacidade de seus gestores em administrar os recursos dentro e fora da porteira. A concepção da agricultura familiar como uma forma social residual, transitória ou em vias de desaparecimento, é rejeitada por Lamarche (1998), que considera que ela ocupa um espaço próprio nas sociedades modernas, capitalistas ou socialistas, avançadas ou em processo de desenvolvimento. O mesmo autor afirma que a agricultura familiar nas sociedades modernas é, antes de tudo, uma realidade multiforme e que esta realidade resulta, sobretudo, de sua capacidade de adaptação a contextos sociais e políticos os mais diversos.

No Paraná, a atividade rural está distribuída entre a agricultura familiar e a empresarial que produzem para o mercado interno e externo. A agricultura familiar tem sua produção diversificada entre produtos para consumo interno e para exportação. Entretanto sua maior contribuição para o abastecimento interno não tem sido recompensada por preços que remunerem satisfatoriamente a atividade. Por outro lado, a falta de escala nas culturas de exportação também não permite a lucratividade necessária para esta categoria.

O Paraná destaca-se nacionalmente pela expressiva participação na produção de commodities. No entanto, em torno de 80% da produção do Estado é proveniente da agricultura familiar que

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comercializa na forma in natura, a maior parte de sua produção de alimentos, perdendo a oportunidade de agregação de valor ao produto primário através da agroindustrialização.

O mercado para produtos alimentares agroindustrializados apresenta um grande potencial de crescimento e expande-se fortemente tanto no âmbito internacional como nacional. No Brasil, em 1998, cerca de 38 mil empresas cadastradas em alimentos e bebidas venderam US$ 71,4 bilhões em produtos alimentares. (NEVES, 2000, p. 30). No Paraná, o potencial financeiro de consumo de produtos industrializados derivados de carnes, leite e frutas é de R$ 3,12 bilhões por ano (PARANÁ, 2001, p.77-78).

A agroindustrialização da produção agropecuária é a possibilidade de o agricultor familiar inserir-se nesse mercado. O processamento de alimentos nas agroindústrias de pequeno porte representa uma promissora alternativa de renda e emprego para a agricultura familiar. Desenvolver a agroindustrialização integrada aos sistemas produtivos pode garantir maior rentabilidade e sustentabilidade à atividade rural. Segundo Zylbersztajn (2000) na Europa ganha espaço o conceito da multifuncionalidade do uso do espaço rural, o que leva o agricultor a pensar no desenvolvimento de outras atividades geradoras de renda, que não apenas a agricultura. Tais conceitos chegam ao Brasil nesta virada do milênio, o que motiva a formação de um novo perfil do tradicional homem do campo.

Embora a agroindústria de pequeno porte represente uma boa oportunidade de negócio aos agricultores familiares, existem muitas dificuldades para entrar e permanecer nesta atividade, como o domínio da tecnologia de produção, a comercialização dos produtos, o acesso a recursos financeiros, a adequação às leis que regulamentam o setor, a capacidade de articulação com outros atores dos complexos agroindustriais, políticas públicas diferenciadas para o setor, entre outras.

Apesar deste trabalho não utilizar uma abordagem de redes para analisar as agroindústrias de pequeno porte, é importante destacar que este conceito tem aparecido com freqüência crescente na literatura que trata de políticas públicas. Isso deriva de um novo padrão de políticas baseado na parceria entre as diversas instâncias e órgãos do poder público, as empresas privadas e as organizações da sociedade civil. Alguns autores consideram o fenômeno como o surgimento de um novo padrão de relação entre o Estado e a sociedade que pode vir a representar mudanças significativas em nossa matriz política, econômica e social. (PASSADOR, 2003, p.43)

Os Agricultores Agroindustriais Familiares (AAF) necessitam aperfeiçoar e expandir suas relações com o mercado, pois ao longo dos anos priorizaram a capacitação em tecnologias de produção, buscando o aumento da produção e da produtividade, estando a comercialização restrita a intermediários, cooperativas e indústrias. A comercialização da produção agroindustrial representa, assim, um desafio para os AAF que atuarão em canais de comercialização mais próximos dos consumidores. Com o objetivo de conhecer mais profundamente a comercialização de produtos agroindustrializados, este trabalho investiga um grupo de seis AAF que comercializam seus produtos na Feira Rural de Londrina, procurando responder a seguinte questão: Quais são as dificuldades na comercialização da produção agroindustrial em relação a mercado, recursos

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financeiros e regularização, segundo a percepção de um grupo de agricultores agroindustriais familiares?

As respostas para esta questão estão apresentadas neste artigo. O primeira parte apresenta os conceitos e características do agronegócio e sua utilização como instrumento analítico para as cadeias produtivas. Apresenta, ainda, a relação da agricultura familiar com o setor de produção agropecuária e a agroindústria de pequeno porte, como alternativa de geração de emprego e renda à agricultura familiar. A segunda aborda a comercialização de produtos agroindustrializados, enfocando a relação dos AAF com o mercado, o acesso a recursos financeiros e a adequação às exigências legais. A terceira parte contém a caracterização de Londrina e seu meio rural, a pesquisa de campo, a análise e interpretação dos dados. Na última parte, este trabalho apresenta as considerações finais, que ressaltam o alcance e as conseqüências dos resultados obtidos bem como indicam o que pode ser feito para torná-los mais significativos. 2. Metodologia Para a presente pesquisa adotou-se o método qualitativo, entendendo-se esta escolha como uma oportunidade, que o método permite, de estar o pesquisador imerso no ambiente natural onde o fenômeno ocorre, compreendendo a sua essência dentro de um contexto dinâmico (WANDERLEY apud TRIVIÑOS, 1994, p.119).

A pesquisa realizada apresenta-se como descritiva, pois busca descrever um fenômeno específico (GIL, 1999, p.44), e está preocupada em responder à questão de pesquisa proposta e descobrir quais são os fatores limitantes, segundo a percepção de um grupo de APP, à comercialização da produção agroindustrial (COOPER & SCHINDLER, 1995, p.136). Para este fim, utilizou-se de levantamento bibliográfico, de visitas e de entrevistas a seis AAF que participam da Feira Rural de Londrina.

A presente pesquisa tem caráter exploratório, na medida em que se propõe a investigar uma questão emergente no cenário do agronegócio e no âmbito da comercialização da produção nas agroindústrias de pequeno porte. A estratégia de pesquisa utilizada foi estudo de casos múltiplos, sendo a preferida quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real (YIN, 2001, p.19).

Como delimitação da pesquisa, optou-se por estudar os AAF que comercializam na Feira Rural de Londrina, organizada pela Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento e que acontece o ano todo, durante quatro dias por mês, desde 1995. O objetivo da feira é apoiar os AAF na comercialização da produção agroindustrial e está aberta à participação de todos os AAF do município de Londrina.

A amostra foi do tipo não probabilística intencional. O pesquisador esteve interessado na opinião de determinados elementos da população, mas não representativos da mesma. O pesquisador não teve o interesse de conhecer a opinião de toda a população, mas de um grupo que reunia as características desejadas para alcançar o objeto de pesquisa (MARCONI & LAKATOS, 1996, p. 47).

A coleta de dados para este estudo foi realizada através de fontes de dados primários e secundários. Os dados primários foram obtidos através de pesquisa de campo, com a realização de entrevista não estruturada com seis APP participantes da Feira Rural de Londrina. Os dados secundários foram obtidos através de bibliografia nacional e estrangeira.

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Através do roteiro básico de pesquisa, puderam ser segmentadas e analisadas quatro temáticas principais. Inicialmente procedeu-se ao levantamento da caracterização dos AAF e das agroindústrias. Posteriormente buscou-se verificar as dificuldades encontradas pelos AAF na comercialização de seus produtos em relação ao mercado, abordando as dificuldades com clientes, produtos, pontos de venda, distribuição, apoio governamental e também dos próprios agricultores enquanto comerciantes. Como terceira temática, verificaram-se as dificuldades dos AAF em relação aos recursos financeiros para comercialização, abordando a demanda atual, fontes de recursos utilizadas e o acesso a elas. Por último levantaram-se as dificuldades com a regularização da agroindústria, dos produtos e dos impostos. 1 AGRONEGÓCIO 1.1 DEFINIÇÕES Nos campos da administração e da economia, o termo agribusiness está sujeito a várias interpretações. Sobre o conceito de agribusiness existem divergências e discussões nas publicações de pesquisa no Brasil. (LAUSCHNER,1995, p.23). As escolas praticam diferentes denominações e variam os enfoques. Assim, de acordo com a preferência e inclinação de cada uma, aparecem citações como sistema agroalimentar, sistemas de alimentos e fibras, complexos agroindustriais e cadeias produtivas, dentre outras. No Brasil, o termo agronegócio também é amplamente utilizado.

Goldberg e Davis (apud ARAÚJO, 1990, p.3, BATALHA, 1997, p.25, MEGIDO, 1995, p.31, LAUSCHNER, 1995, p.29, PINAZZA, 1999, p.24), já em 1957, enunciaram o conceito de agribusiness como sendo “a soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; as operações de produção nas unidades agrícolas; e o armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos por eles”. (ARAÚJO, 1990, p.3).

Estão presentes ao longo deste trabalho algumas variações na denominação de agronegócio e seus agregados, utilizados por diferentes autores. Assim:

• Sistema Agroindustrial, Sistema Agroalimentar e Agronegócio buscam exprimir o conteúdo da palavra agribusiness.

• Setor de insumos, insumos e bens de produção, setor “antes da porteira da fazenda” que equivalem ao conjunto de atividades econômicas que ofertam produtos e serviços para a agricultura.

• Agricultura, setor rural, agropecuária, setor agrícola, produção agropecuária e produção agrícola e atividades “dentro da porteira da fazenda” são sinônimos, representando o agregado que, dentro das unidades ou estabelecimentos rurais, é responsável pela produção vegetal e animal.

• Processamento e distribuição, agregado situado “depois da porteira da fazenda” e que envolve as atividades na indústria e nos serviços para a conversão e comercialização dos bens de consumo feitos com produtos de origem agropecuária.

Uma visão geral dos agregados do SAI e de seus elementos está representada na figura 1 abaixo:

Fornecedores de insumos e bens de produção

Produção agropecuária

Processamento e transformação

Distribuição e consumo

Sementes Calcário

Produção animal Lavouras

Alimentos Têxteis

Restaurantes Hotéis

C o

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Fertilizantes Rações Defensivos vegetais Produtos veterinários Tratores Colheitadeiras Implementos Equipamentos Máquinas Motores

permanentes Lavouras

temporárias Horticultura Silvicultura

Extração vegetal Indústria naval

Vestuário Madeira Bebidas Álcool Papel Fumo Óleos

Bares Padarias Fast food

Self service Supermercados

Comércio atacadista Exportação

n s u m i d o r e s

Serviços de apoio: veterinários, agronômicos, P&D, bancários, marketing, vendas, transporte, armazenagem, portuários, assistência técnica, informações de mercados, bolsa,

seguros, outros. Figura 1. Elementos do SAI. Fonte: Araújo (1990, p.209).

Dentro do SAI, ocorrem dois tipos de ligações dos estágios por onde passam os produtos. Estágios ligados verticalmente referem-se à direção dos estágios que conduzem a matéria-prima ao produto final. Estágios ligados horizontalmente referem-se à reprodução de unidades no mesmo estágio. Quando dois ou mais estágios são coordenados pela mesma empresa, está ocorrendo integração vertical. 1.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL A dimensão do agronegócio de tudo que estava “antes da porteira da fazenda” (insumos, bens de produção e serviços para agropecuária), “dentro da porteira” (a produção agropecuária em si) e “depois da porteira” (processamento agroindustrial e distribuição até o varejo) representava em 1990 um negócio de quase US$ 6 trilhões/ano, quando contabilizado de forma integrada. E as projeções para o ano 2028 indicam um crescimento acima de 50% desse valor, alcançando um montante de mais de US$ 10 trilhões a serem movimentados pelo agronegócio mundial. (MEGIDO, 1996, p.18).

Tabela 1. Projeções sobre volumes e participações de negócios dentro da cadeia agroalimentar mundial. US$ bilhões ANO

SETORES 1980 1990 2028 “ANTES DA PORTEIRA” Insumos, bens de produção e serviços para a gropecuária

375 (12%) 500 (9%) 700 (7%)

“DENTRO DA PORTEIRA” Produção agropecuária

750 (24%) 1.115 (20%) 1.465 (14%)

“DEPOIS DA PORTEIRA” Processamento agroindustrial e distribuição

2.000 (64%) 4.000 (71%) 8.000 (79%)

TOTAL 3.125 (100%) 5.615 (100%) 10.165 (100%)

Fonte: Goldberg (apud MEGIDO, 1996, p.18)

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A estrutura de participação dos diversos componentes do agronegócio brasileiro, em termos de valores e taxas percentuais, pode ser visualizada na Tabela 2. Tabela 2. Estrutura do Agronegócio no Brasil – 2001 Agricultura Valor

R$ milhões Participação

(%) Pecuária Valor

R$ milhões Participação

(%) Insumos 12.954,8 5,44 Insumos 7.036,8 6,58

Agricultura 54.542,1 22,91 Agricultura 44.858,7 41,96 Indústria 93.050,9 39,09 Indústria 18.294,6 17,11

Distribuição 77.498,4 32,56 Distribuição 36.727,3 34,35 Total 238.037,2 100,00 Total 106.917,3 100,00

Total Valor

R$ milhões Participação

(%) Total Participação

Agricultura(%) Participação Pecuária(%)

Insumos 19.982,6 4,46 Insumos 64,79 35,21 Agropecuária 99.400,7 27,47 Agropecuária 54,87 45,13

Indústria 111.345,5 34,02 Indústria 83,57 16,43 Distribuição 114.225,6 34,05 Distribuição 67,85 32,15

Total 344.954,5 100,00 Total 69,00 31,00

Total Valor (R$ milhões) Participação no PIB Brasil(%)

PIB do Agronegócio da Agricultura PIB do Agronegócio da Pecuária PIB do Agronegócio Total

238.037,2 106.917,3 344.954,5

18,67 8,39

27,06 Fonte: CEPEA/CNA – USP (2002) Conforme a tabela 2, no ano de 2001, o PIB do agronegócio total atingiu R$ 344.954,5 milhões representando 27,06 % do PIB do Brasil. Observa-se, ainda, que a participação dos componentes de serviços e distribuição, na agricultura, na pecuária e no total, apresenta uma taxa percentual acima de 30 %. Especificamente para a agricultura, o segmento que apresenta peso maior é o processamento (39,09 %), enquanto que para a pecuária, o próprio setor é que possui uma maior participação no PIB (41,96 %).

Esses resultados refletem a alta diversidade do setor agrícola, que possui um grande número de indústrias processadoras. A tendência do segmento formado pelos setores industrial de base agrícola e de distribuição final é o de ser mais representativo no valor total da produção vendida ao consumidor, indicando ser um segmento altamente dinâmico e diversificado do sistema do agronegócio. (CEPEA/CNA-USP, 2002).

A trajetória da participação do PIB do agronegócio total no PIB do Brasil, no período de 1994 a 2001, mostra que o PIB do agronegócio brasileiro apresentou tendência declinante. No ano de 1994 representou cerca de 31 % do PIB do Brasil, chegando a uma participação de 27,06 % em 2001, um dos valores mais baixos do período.

Dentro do Agronegócio, o segmento da agropecuária é o que demonstra o comportamento da renda dos produtores rurais dentro das porteiras das propriedades. Neste segmento, a agricultura familiar representa a maioria dos estabelecimentos rurais e do pessoal ocupado, tendo uma participação significativa na produção de várias culturas. 1.3 PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA E AGRICULTURA FAMILIAR

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De acordo com o Censo Agropecuário 1995/96, existem no Brasil 4.859.864 estabelecimentos rurais, ocupando uma área de 353,6 milhões de hectares. Na safra 1999/2000, o Valor Bruto da Produção (VBP) Agropecuária foi de R$ 47,8 bilhões e o financiamento total foi de R$ 3,7 bilhões. Segundo a metodologia adotada pelo IBGE, são 4.139.369 estabelecimentos familiares, ocupando uma área de 107,8 milhões de hectares, sendo responsáveis por R$ 18,1 bilhões do VBP total e recebendo apenas R$ 937 milhões de financiamento rural. Os agricultores patronais são representados por 554.501 estabelecimentos, ocupando 240 milhões de hectares. (BRASIL, 2000) Guanziroli et al. (2000, p.12) mostram que “os agricultores familiares representam 85,2 % do total de estabelecimentos, ocupam 30,5 % da área total e são responsáveis por 37,9 % do VBP nacional, recebendo 25,3 % do financiamento da agricultura”. Os autores também destacam que a agricultura familiar é responsável por 76,9 % do pessoal ocupado na agricultura brasileira e tem uma participação significativa na produção de fumo (97%), mandioca (84%), feijão(67%), suínos (58%), pecuária de leite (52%), milho (49%), ave/ovos (40%), soja (32%), arroz (31%) e outros.

O processo de modernização da agricultura se fez acompanhar de unidades de produção cada vez maiores, com conseqüente deteriorização da distribuição de renda no setor agrícola. As políticas de incentivo à modernização, a partir de 1970, subsidiaram fortemente insumos modernos, especialmente fertilizantes, defensivos e mecanização, contribuindo com as condições de maior lucratividade das culturas modernas (como cana de açúcar, café, soja, trigo, etc.); ainda mais porque, sendo produtos de exportação e de transformação industrial, têm sempre uma evolução dos preços mais favorável do que as culturas tradicionais, que são basicamente os produtos alimentícios. (GRAZIANO,1981, p.29).

No Paraná, a partir da segunda metade dos anos 60, o Estado se mobiliza e implementa o projeto de modernização da agricultura. Dentre as políticas econômicas implementadas pelo Estado, a de crédito rural foi decisiva, uma vez que viabilizou a aquisição de insumos. (FLEISCHFRESSER, 1988, p. 13).

Essas políticas de estímulo à modernização, no entanto, não atingiram as pequenas unidades agrícolas, especialmente as que produziam gêneros alimentícios, e que dificilmente podem assumir um comportamento empresarial, produzindo basicamente para sua própria subsistência e gerando pequeno excedente para o mercado. (GRAZIANO, 1981, p. 31).

No Brasil, a noção de modernização conservadora se constitui num quase consenso para caracterizar as transformações no campo nos últimos trinta anos. Esta noção transmite, sobretudo, a idéia de que a modernização no Brasil se processou sem modificações fundamentais na estrutura fundiária e, por implicação, na modernização da grande propriedade. (WILKINSON, 1996, p.104). 1.4 AGROINDÚSTRIA DE PEQUENO PORTE Este trabalho utiliza a expressão agricultores agroindustriais familiares (AAF) referindo-se aos agricultores familiares que possuem agroindústrias de pequeno porte. Assim, para conceituar os AAF, adotou-se a definição de agroindústria, em sentido amplo, como sendo “a unidade produtiva que transforma o produto agropecuário natural ou manufaturado para utilização intermediária ou final” (LAUSCHNER, 1995, p.51), e a definição de agricultura familiar como “aquela em que a gestão, a propriedade e a maior parte do trabalho vêm de indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou de casamento”. (ABRAMOVAY, 2003).

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A implantação de agroindústrias de pequeno porte, como forma de promover a industrialização rural e a verticalização do setor primário, está presente em políticas estaduais de desenvolvimento rural, em curso no país. Os formuladores de políticas públicas, percebendo a importância do pequeno e médio empreendimento no setor rural, têm feito esforços no sentido de criar condições mínimas para que o pequeno agricultor tenha alguma perspectiva de permanência e sustentabilidade na atividade agroindustrial. Algumas experiências mais inovadoras em estados brasileiros são aquelas em que a criação de pequenas agroindústrias é feita em rede, utilizando um nível maior de organização dos produtores familiares. São destacados o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) – Agroindústria, em nível nacional, e o Programa de Verticalização da Pequena Produção Rural (PROVE), no Distrito Federal. (LOURENZANI & SILVA, 2001). A agroindústria rural surge, geralmente, a partir de duas motivações mais comuns. Quando os excedentes da produção agropecuária, que o produtor não consegue comercializar por não atender aos padrões de comercialização ou por problemas de qualidade, são aproveitados como matéria-prima para o processamento. A segunda motivação surge quando os preços para sua produção agrícola apresentam um histórico de declínio e o produtor vê na agroindustrialização a oportunidade de lhe adicionar valor. O aporte tecnológico geralmente se origina da própria família do produtor, transmitido entre as gerações, ou do agente de extensão rural. Pouca atenção também é dada à qualidade, embalagens e apresentação dos produtos. Geralmente, as oportunidades de mercado não são levantadas e representam problemas sérios de colocação dos produtos no mercado. A taxa estimada de sobrevivência desses empreendimentos está em torno de 3%. (VIEIRA, 1998, p.11).

O desenvolvimento das pequenas agroindústrias apresenta potencialidades e fatores limitantes. As potencialidades estão relacionadas a oportunidade de agregação de valor aos produtos agrícolas, criação de empregos no meio rural, fortalecimento das organizações de agricultores, assim como a melhoria dos produtos da agricultura familiar e sua colocação em nichos de mercado especializados.

Entre os fatores limitantes, estão as deficiências de assistência técnica nas instâncias públicas e privadas nesse setor, o baixo nível de educação e capacitação dos AAF, as dificuldades de acesso ao crédito, a inserção fraca nos mercados com poucos produtos diversificados, a baixa qualidade dos produtos, a legislação inadequada, entre outros. (BUSTAMANTE, 1997, p.78). 2 COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO AGROINDUSTRIAL O sistema de comercialização envolve o produto, desde a produção até sua colocação no mercado para ser adquirido pelos consumidores, no local, na hora e na forma desejada. Conhecer o funcionamento da comercialização é fundamental para os agricultores que necessitam tomar decisões eficientes para posicionarem seus produtos no mercado.

A adoção de um mecanismo de comercialização inapropriado fatalmente implica prejuízo à empresa, mesmo sendo ela competitiva em termos de eficiência produtiva. A eficiência relevante à empresa é mais abrangente do que somente a eficiência produtiva, embora esta seja um componente importante. A competitividade global de uma empresa depende profundamente de sua eficiência na comercialização de seus insumos e produtos. (BATALHA, 1997, p.50). A comercialização da produção das agroindústrias de pequeno porte geralmente engloba as quatro transformações descritas, mas em alguns casos pode envolver apenas algumas delas. É o caso, por exemplo, do morango, que é colhido na área rural de Londrina, selecionado e

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acondicionado em bandejas, sendo comercializado in natura, no mesmo dia, no varejo de Londrina. Pode-se dizer que as únicas alterações ocorridas foram de espaço (da área rural para a urbana) e na posse do produto (do produtor para o consumidor). 2.1 MERCADO

Os agricultores familiares produtores de commodities localizam-se na cadeia produtiva no setor de produção. A integração vertical da produção através da agroindustrialização de seus produtos é uma forma viável de inserção no mercado evitando uma descaracterização como unidade de produção autônoma, impedindo a vinculação dos processos produtivos às empresas oligopolizadas, a excessiva intermediação e os gargalos de comercialização. A agroindustrialização e a manutenção diversificada da produção na agricultura familiar permitem a flexibilização das formas de agregação de valores e a promoção de uma integração com o mercado consumidor. (WILKINSON apud BREDA, 2001, p.3).

A inserção de um produto no mercado envolve o conhecimento das características da cadeia produtiva em que este produto se insere, e da economia em que essa cadeia funciona. É um trabalho que exige acompanhamento conjuntural permanente, para que as mudanças de condições de operação, de regulamentação, de financiamento, de tecnologia produtiva e de comercialização possam ser detectadas com antecedência e na medida em que vão surgindo, graças à dinâmica da economia.

No trajeto produtor-consumidor, as mercadorias passam por diferentes níveis de mercado. O nível do atacado é onde ocorrem transações mais volumosas. O atacado é composto de empresas que distribuem produtos ao pequeno varejo, a grandes consumidores prestadores de serviços (restaurantes industriais, grandes restaurantes, lanchonetes, hotéis, hospitais) e consumidores institucionais. No varejo, os comerciantes estão em contato mais direto com os consumidores, ocorrendo neste nível uma comercialização de vários tipos de produtos, vendidos em pequenos lotes. O varejo é composto por supermercados, mercearias, mini-mercados, açougues, padarias, lojas de conveniências, equipamentos públicos de abastecimento (feiras, varejões).

De acordo com Neves (2000, p.28), o setor de distribuição, composto pelo atacado e varejo, cresce em importância e poder de negociação no SAI, pois identifica com mais facilidade as tendências de consumo e coordena o fluxo de informações e mercadorias na cadeia produtiva. Essa referência permite saber quem compra, quando, quanto, o quê e até através de que tipo de promoção. Para qualquer cadeia produtiva torna-se necessário cada vez mais conhecer o comportamento do consumidor.

Souza (2001, p.10) comenta que os consumidores para abastecerem suas residências com alimentos industrializados freqüentam em média seis estabelecimentos. Os supermercados são os locais mais procurados, seguidos por padarias, açougues e feiras livres. 2.2 RECURSOS FINANCEIROS As políticas de estímulo à modernização da agricultura brasileira favoreceram o desenvolvimento da grande propriedade que conseguiu se impor como modelo socialmente reconhecido. (GRAZIANO, 1981, p.31, LAUSCHNER, 1995, p.16, WILKINSON, 1996. p.104). Isso foi possível, principalmente, pela facilidade de acesso ao crédito proporcionado pelo Estado a esta categoria de produtores, para que pudessem financiar a compra de insumos. Segundo Corrêa e Ortega (2002, p.1), em 1994, um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e

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Alimentação constatou que, do total dos estabelecimentos que obtiveram financiamentos no Brasil, 44,2% eram familiares, atingindo apenas 11% do valor total financiado pelas fontes formais de recursos. O Estudo conclui que estes estabelecimentos necessitavam de uma política de crédito especial.

Em 1996 foi criado o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, com a finalidade de promover o desenvolvimento sustentável dos agricultores familiares, aumentando sua capacidade produtiva, gerando empregos e melhorando sua renda. Dessa forma, o Programa tem sido, entre as opções disponíveis, a que melhor viabiliza o acesso ao crédito para a agricultura familiar. Assim sendo, entende-se que uma abordagem ao PRONAF, neste trabalho, poderá contribuir, embora de forma limitada, para a compreensão de alguns aspectos da relação dos agricultores familiares com os recursos financeiros para implantação de agroindústrias e comercialização dos seus produtos.

Para sua operacionalização, o PRONAF estabelece três linhas principais: Infra-estrutura e Serviços, Capacitação e Crédito. Cada uma delas com uma lógica de funcionamento diferenciada. O Financiamento de Infra-estrutura e Serviços nos municípios visa a implantação, ampliação e modernização da infra-estrutura necessária ao fortalecimento da agricultura familiar com o objetivo de dinamizar o setor produtivo e assegurar o desenvolvimento rural. Nessa linha, quem demanda e recebe os recursos é o município. A capacitação e profissionalização de agricultores familiares têm como objetivo habilitar os agricultores familiares e ainda os técnicos para que possam levantar as demandas dos agricultores e suas organizações, compatibilizando-as com as prioridades e ações dos governos municipal, estadual e federal. Outras habilidades pretendidas referem-se à definição das ações a serem desenvolvidas para o atendimento das demandas e a elaboração e monitoria das ações do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural. Nesse sentido, os perfis das liberações são as mesmas do Pronaf – Infraestrutura.

O Financiamento da produção da agricultura familiar – Pronaf Crédito - é a modalidade que tem como objetivo apoiar financeiramente as atividades agropecuárias e não agropecuárias exploradas pelos agricultores e suas associações. A liberação do crédito nesta modalidade é feita diretamente entre o banco e o demandante do crédito.

A participação dos agricultores familiares no PRONAF deve obedecer a critérios e limites para concessão dos recursos. Dentre os critérios, destaca-se a intenção de restringir recursos efetivamente a agricultores familiares, com dedicação quase exclusiva à atividade agropecuária. Durante a vigência do PRONAF, algumas alterações adequaram os critérios e limites de concessão de recursos. A partir do lançamento pelo Governo Federal do Plano Safra 2003/2004, o enquadramento dos beneficiários do PRONAF está organizado em seis categorias denominadas grupos A, B, C, A/C, D e E. As linhas de financiamento específicas para cada grupo dividem-se em custeio e investimento. Os limites de financiamento para custeio estão entre R$ 500,00 e 28.000,00, com juros de 4% até 7,25% ao ano; para investimento entre R$ 500,00 e R$ 300.000,00 (incluindo-se investimentos coletivos), com juros de 1% até 7,25%. (ANÁLISE..., 2003, p. 5-7).

Um grande desafio para o PRONAF parece ser o de aumentar o número de contratos de financiamento. Considerando as últimas quatro safras, os agricultores familiares acessaram entre 47,9% a 56,9% do total de recursos anunciados, esse fato pode estar relacionado com dificuldades encontradas por esses produtores na tomada de financiamentos.

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Outro fato a se observar é que o PRONAF tem priorizado a linha de crédito para custeio em detrimento das demais, o que dificulta a real participação e envolvimento das comunidades. Os critérios a partir dos quais são escolhidos os municípios beneficiados com recursos do PRONAF favorecem a burocratização dos conselhos de desenvolvimento rural e tendem a fazer deles pouco mais que um instrumento pelo qual o poder local recebe recursos federais, com a supervisão de representantes da sociedade civil local. Por outro lado, o autor argumenta que tanto as representações sociais quanto o corpo técnico envolvido na construção dos conselhos estão mal preparados para enfrentar o desafio dos processos de desenvolvimento no meio rural. Por sua vez, a dificuldade de acesso ao crédito nas agroindústrias de pequeno porte tem impedido a regularização dos estabelecimentos e de seus produtos. O elevado custo para cumprir as exigências legais impõe a muitas agroindústrias atuarem na clandestinidade. 3 AGRICULTORES AGROINDUSTRIAIS FAMILIARES DE LONDRINA: ANÁLISE DOS RESULTADOS 3.1 CONTEXTO TERRITORIAL DE LONDRINA E SEU MEIO RURAL Pólo de uma região essencialmente agrícola, Londrina tem uma produção agropecuária bastante diversificada. Os sistemas de produção mais freqüentes nas propriedades rurais possuem como principais explorações soja, milho, fruticultura, olericultura, café, bovinos de leite, bovinos de corte e feijão. (LONDRINA, 1996, p.35). No período de 1985 a 1994, o contingente de pessoal ocupado anualmente nestas atividades apresentou valores bastante próximos: no início do período, em 1985, com 18.725 pessoas ocupadas e no final do período, em 1994, com 18.716 pessoas ocupadas. (LONDRINA, 1996, p.24). As agroindústrias de pequeno porte instaladas em Londrina destinam suas produções para o consumo familiar e para o mercado. Apesar de direcionar parte de sua produção para o mercado, os AAF continuam transformando sua produção de forma simples e informal, em pequenas instalações improvisadas. Em sua maioria são produtos simples, com baixo uso de tecnologia e um valor agregado pouco significativo. Assim, ao dirigir-se ao mercado encontram consumidores tradicionais que adquirem os produtos diretamente dos produtores ou através de canais informais de distribuição, semelhante ao que Boucher apud Motter (1999, p.36) observou nas agroindústrias artesanais na América Latina.

A produção destinada ao mercado é na maioria entregue a intermediários e vendida diretamente ao consumidor. Para queijo e requeijão, por exemplo, os dados do IBGE indicam que, dos 247 estabelecimentos que produzem estes produtos, 87 entregam a intermediários, 59 vendem diretamente ao consumidor e o restante consome no próprio estabelecimento. (IBGE, 1995/96). A ampliação do mercado para estes e outros produtos exige melhorias na qualidade dos produtos, principalmente nos aspectos sanitários, e a superação de outros fatores que limitam o desenvolvimento das agroindústrias de pequeno porte. Segundo Motter (1998, p.62), os principais problemas, enfrentados pelos AAF de Londrina, estão relacionados a formação empreendedora, adoção de tecnologias, comercialização, acesso ao crédito e complexidade da legislação.

Principais problemas que os agricultores agroindustriais familiares rurais de Londrina enfrentam:

FATORES MOTIVAÇÕES/CAUSA 1.Escassa formação empreendedora

Aversão ao risco Desarticulação das ações organizacionais Baixo nível de articulação dos agricultores

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Falta de capital de investimento 2.Baixo nível de adoção de tecnologias

Escassa disponibilidade de capital Sistemas de produção ineficientes/ineficazes Restrito acesso às informações Escassa coordenação das estruturas técnicas

3.Sistemas de comercialização ineficientes

Sistema arcaico com muitas perdas Baixo nível de organização dos agricultores Desinformação sobre exigências e padrões de qualidade dos distintos canais de comercialização

4.Dificuldade de acesso ao crédito

Despreparo das instituições de crédito para avaliar e acompanhar projetos de pequeno porte Carência de orientação integral aos agricultores

5.Complexidade da legislação e dos processos burocráticos

Muitas leis independentes umas das outras Desarticulação nas ações das organizações

Fonte: Motter (1998, p. 62)

Dentro deste contexto territorial, rico em recursos naturais, com acelerado crescimento populacional e aptidão histórica à produção de alimentos, observa-se um grande potencial para o desenvolvimento das agroindústrias de pequeno porte. As atenções, portanto, precisam estar voltadas à compreensão das necessidades dos AAF, às suas inter-relações com os outros segmentos e aos entraves que dificultam sua sobrevivência. 3.2 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A diversidade de agricultores que processam produtos agropecuários no município de Londrina (IBGE, 1995/96) orientou esta pesquisa, na seleção de um grupo de agricultores que apresentasse alguma característica comum na comercialização dos produtos. Assim optou-se em identificar junto à Feira Rural de Londrina quais feirantes se enquadravam como agricultores agroindustriais familiares, ou seja, agricultores que possuem uma unidade produtiva agroindustrial de pequeno porte, que transforma o produto agropecuário natural ou manufaturado e cuja propriedade, gestão e maior parte do trabalho vêm de indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou de casamento.

Procurou-se realizar as entrevistas com os principais responsáveis pelas agroindústrias. Nas agroindústrias familiares pesquisadas, o casal que lidera a família também dirige o empreendimento, assim as entrevistas foram realizadas com 5 homens e 1 mulher que dirigem as agroindústrias e participam da comercialização dos produtos. 3.2.1 ANÁLISE DO PERFIL DOS AGRICULTORES AGROINDUSTRIAIS FAMILIARES No conjunto dos entrevistados, observa-se que a metade possui idades entre 45 e 52 anos e a outra metade está acima de 60 anos. Uma característica comum dos administradores rurais é exercerem, juntamente com a família, as funções de gerência e execução das tarefas operacionais na produção primária. Quando ocorre a integração dentro das cadeias produtivas das atividades de produção primária (agroindustrialização e comercialização), há um aumento do trabalho e, conseqüentemente, maior ocupação da mão-de-obra familiar. Nesse sentido, quando consideramos que, além do trabalho intelectual, a atividade rural demanda grande esforço físico, administradores com idades mais avançadas encontram dificuldades para desempenhar satisfatoriamente as atividades agropecuárias e agroindustriais.

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Outro aspecto associado às idades dos administradores refere-se à sucessão nos empreendimentos agroindustriais. O crescimento da demanda de mão-de-obra familiar, proporcionado pela transformação e distribuição da produção, cria oportunidades de emprego para os jovens e a possibilidade de permanecerem no meio rural, sucedendo os pais. No entanto, conforme estudo realizado por Abramovay et. al. (2001b), no oeste de Santa Catarina, a permanência dos jovens no meio rural depende principalmente do fortalecimento da rede que articula os principais atores de desenvolvimento rural nos Estados e suas agências, prefeituras, cooperativas, sindicatos e ONGs. É necessário abrir espaço para a participação e decisão desses atores em fóruns de desenvolvimento que tratem do reordenamento fundiário, educação, formação profissional, criação de oportunidades de trabalho e renda, entre outros.

Com relação à escolaridade do grupo pesquisado, destaca-se o primeiro grau como nível máximo atingido por quatro AAF. Apesar do baixo nível de escolaridade formal, observa-se neste grupo um conhecimento empresarial diferenciado. Acredita-se que este fato pode estar relacionado à participação em cursos profissionalizantes, conforme relatado por alguns entrevistados, e ao desempenho de atividades agrárias com produtos de maior valor agregado, como frutas, verduras, mel, ervas medicinais, que demandam maior conhecimento em tecnologias de produção e a atuação em canais de comercialização mais próximos dos consumidores. O maior contato com o meio urbano também pode ter contribuído com o conhecimento diferenciado do grupo. O Sr. Dirceu e o Sr. Jaime atualmente residem no meio urbano e, com exceção do Sr. Elzo, todos os demais já residiram no meio urbano. O pouco contato com o meio urbano foi apontado pelo Sr. Elzo como um entrave à comercialização.

Filhos de agricultores, exceto o Sr. Odácio, os entrevistados possuem área de terra inferior a 8,0 alqueires e retiram mais de 80% da renda bruta anual familiar das atividades agropecuárias e agroindustriais. Nas agroindústrias estudadas, com exceção da do Sr. Dirceu, as mulheres são responsáveis pela transformação dos produtos e participam da comercialização. Como observa Moura apud Kiota (1999, p.72), nas unidades produtivas onde a transformação do produto está inserida nos sistemas produtivos, as mulheres estão assumindo gradualmente maiores responsabilidades nas atividades voltadas ao comércio. Durante a realização da pesquisa na Feira Rural, observou-se que em três casos as mulheres foram as responsáveis pela comercialização da produção. 3.2.2 ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DAS AGROINDÚSTRIAS A localização da maioria das agroindústrias na área rural (somente duas na área urbana) é um componente importante na redução de custos com transporte da matéria-prima. Por outro lado, grandes distâncias entre as agroindústrias rurais e os pontos de venda, como ocorre com o Sr. Elzo (35 km) e com a Sra. Francisca (60 Km), aumentam consideravelmente os gastos com transporte, representando 20% e 15%, respectivamente, do total de suas receitas na Feira Rural.

No grupo pesquisado, o tempo de uso dos veículos que distribuem a produção, acima de 12 anos de uso, pode representar ainda um outro fator que eleva os custos de manutenção dos veículos e encarece a comercialização. Esses veículos, que também servem ao transporte da família, são modelos de passeio e de transporte de cargas, mas em nenhum dos casos observados possuem compartimentos isolados que garantam, durante o transporte dos produtos, o controle da temperatura e a ausência de contaminantes externos, componentes importantes para manter a qualidade sanitária dos produtos.

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O tempo de funcionamento das agroindústrias pesquisadas é, em dois casos, entre 2 e 3 anos, para as demais, acima de 7 anos. O cruzamento dos dados sobre o tempo de funcionamento das agroindústrias e o tempo de participação na Feira Rural demonstra que, para o Sr. Otávio, a Sra. Francisca, o Sr. Odácio e o Sr. Elzo, há semelhança entre estes dados, ou seja , o início de funcionamento das agroindústrias destes AAF coincide com o início da participação na Feira Rural. Isso pode indicar que a Feira Rural contribuiu para o início das atividades agroindustriais destes agricultores e que, ainda, representa para eles um importante canal de comercialização. A principal matéria-prima das agroindústrias pesquisadas origina-se de produção própria e apenas o Sr. Jaime levantou que, na entressafra do milho, busca este produto no Ceasa de Londrina. A agroindustrialização da matéria-prima própria permite a estes AAF a apropriação de um segmento dentro da cadeia produtiva e possibilita expandir os canais de comercialização e a determinação dos preços dos produtos.

Sistemas de parcerias com outros agricultores para produção de matéria-prima destinadas às agroindústrias de pequeno porte, como o praticado pelo Sr. Dirceu, constituem-se em alternativas de diversificação de renda para os agricultores parceiros. Sistemas de parceria nas agroindústrias que processam produtos de maior valor agregado, como ervas medicinais, morango e outros, podem, ainda, contribuir com a geração de progresso técnico e econômico em suas fontes de abastecimento de matérias-primas.

Nas agroindústrias pesquisadas, o processamento da produção agropecuária é feito em pequenas edificações, com áreas entre 16 e 50 m². Apenas o Sr. Odácio, que reformou uma granja de suínos, tem a agroindústria instalada em área de 100 m². Metade das agroindústrias estão instaladas em áreas ligadas às residências, e o restante em áreas isoladas.

As Agroindústrias instaladas em edificações próprias e isoladas de outras construções, mesmo aquelas instaladas em edificações simples que foram reformadas, oferecem mais possibilidades de conterem em seus projetos obras destinadas ao gerenciamento da poluição ambiental e controle da qualidade sanitária dos produtos.

A capacidade de produção das agroindústrias estudadas está otimizada em três casos. Nos outros três, a produção pode ser duplicada. A maioria dos entrevistados manifestou interesse em ampliar as agroindústrias, ou em construir novas edificações isoladas de outras construções. Em todos os casos, observou-se que, apesar do interesse dos entrevistados, o crescimento da produção está limitado à demanda de mercado, à maior disponibilidade de recursos humanos, à pequena capacidade das máquinas e equipamentos e à disponibilidade de recursos para investimentos. Todas as agroindústrias pesquisadas adotam tecnologia simples nos processos agroindustriais e utilizam pequenas máquinas e equipamentos, que na maioria são divididos com o uso doméstico. Observou-se, como comenta Vieira (1998, p.11), que o aporte tecnológico geralmente se origina da própria família do produtor, transmitido entre as gerações, ou do agente de extensão rural. A adoção de tecnologias mais sofisticadas no processo produtivo depende, entre outros fatores, da busca de conhecimento externo e de investimentos em máquinas e equipamentos modernos. No município de Londrina, a EMATER-PR, a Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento e a Federação da Agricultura do Estado do Paraná oferecem cursos gratuitos, para agricultores, em tecnologia de produção agroindustrial. No entanto, os cursos geralmente abordam tecnologias básicas para produtos tradicionais,

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contribuindo pouco com os AAF que desejam tecnologias mais sofisticadas para melhorarem seus produtos, ou mesmo para lançarem novos produtos. Por outro lado, as dificuldades de acesso ao crédito subsidiado para investimentos (CORRÊA E ORTEGA, 2002, p.11; PEREIRA, 2002, p.7) e a reduzida capacidade de contrair financiamentos a juros de mercado impedem a aquisição de máquinas e equipamentos modernos.

A armazenagem da produção é pouco praticada pelos AAF entrevistados. Apenas o Sr. Dirceu e a Sra. Francisca aproveitam a época da safra da produção agropecuária para ampliar a agroindustrialização e armazenar os produtos para comercializá-los na entressafra. Os demais entrevistados comercializam a produção imediatamente após a agroindustrialização. A comercialização da produção do grupo estudado é feita pela própria família para consumidores finais na Feira Rural, feiras livres e residências, para varejistas e intermediários em outros pontos de venda. As feiras, principalmente, e os supermercados são os pontos de venda mais utilizados pelos AAF estudados e, segundo Souza (2001, p.10), são também os locais preferidos pelo consumidor brasileiro para compra de alimentos. Três AAF pesquisados comercializam seus produtos na Feira Rural, há mais de 7 anos e os demais entre 2 e 4 anos.

A divulgação dos produtos agroindustrializados é feita por todos os entrevistados na relação com os consumidores. Somente o Sr. Odácio faz propaganda de seus produtos, distribuindo um cartão aos clientes e ocasionalmente em programas de rádio local. Apesar dos limites deste estudo, foi possível observar que o desinteresse na propaganda dos produtos pode estar relacionado ao equilíbrio entre a capacidade de produção dos AAF e a demanda atual de mercado e o custo deste serviço. 3.2.3 RECURSOS FINANCEIROS No grupo de AAF pesquisados, a demanda de recursos financeiros para a comercialização está associada à necessidade de aumentar a produtividade dos fatores e a quantidade de produtos, assim, há necessidade de alocação de recursos para investimento em máquinas e equipamentos como fornos, batedeiras, máquina envasadora, câmara fria e conjunto de irrigação para hortaliças. A principal demanda de recursos, manifestada por quatro AAF, é para a aquisição de veículos maiores para transportarem maior quantidade de produtos e equipamentos e, ainda, proporcionando maior economia de tempo e combustível na distribuição da produção.

O recurso financeiro próprio é a principal fonte de recurso para a comercialização dos produtos agroindustrializados dos AAF entrevistados. Somente a Sra. Francisca tem insuficiência de recursos próprios para a comercialização, todos os demais declararam que estes recursos são suficientes para a comercialização.

Os empréstimos bancários para a comercialização e outros fins são evitados por todos os AAF entrevistados. Para estes AAF, entre as principais dificuldades encontradas de acesso aos recursos bancários estão as exigências de avalistas, a apresentação de vários documentos, altas taxas de juros, hipoteca da propriedade rural, muito tempo para liberação do empréstimo e o risco unilateral que deve ser assumido em função de frustração de safra. O Sr. Elzo é o único do grupo que participa do PRONAF e teve acesso a recursos bancários para serem aplicados no custeio da lavoura de café. CONSIDERAÇÕES FINAIS A presente pesquisa pôde confirmar a presença e a relevância das dificuldades dos AAF na comercialização da produção agroindustrial em relação ao mercado, a recursos financeiros e à

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legislação. As análises e sugestões para os problemas investigados consideram a relação destes com o conjunto de elementos presentes nas cadeias produtivas, que vão da produção até os consumidores finais e envolvem os agentes fornecedores de insumos e fatores de produção, os produtores, os armazenadores, os processadores e distribuidores, além dos prestadores de serviço.

As características que mais se ressaltaram foram a origem da matéria-prima, a importância da participação das mulheres nas agroindústrias, a idade avançada dos administradores, as inadequação das edificações agroindustriais, a simplicidade das máquinas e equipamentos e a tecnologia pouco sofisticada.

Observou-se que a principal matéria-prima das agroindústrias estudadas origina-se de produção própria. Em concordância com o referencial teórico, isso demonstra a possibilidade de agregação de valores aos produtos agrícolas através da agroindustrialização, o que pode gerar maior renda e mais empregos às famílias rurais. Pode-se pensar, ainda, que o crescimento da produção destas pequenas agroindústrias, pode agregar outros agricultores que estão no entorno das agroindústrias, gerando pólos de produção.

As mulheres exercem funções importantes nas agroindústrias estudadas, podendo-se afirmar que grande parte delas deixaria de existir sem a participação da mulher. Durante o levantamento realizado com 14 participantes da Feira Rural, pôde-se observar a presença de mulheres em 10 barracas. A maior habilidade comercial das mulheres, observada durante as visitas à Feira Rural, corrobora observações anteriores em um grupo de 16 agricultores agroindustriais familiares, que, juntamente com o pesquisador, organizaram uma feira livre no município de Cambé. Programas destinados ao desenvolvimento das agroindústrias de pequeno porte precisam dar maior suporte à participação das mulheres nestes empreendimentos, inclusive favorecendo o acesso delas a financiamentos bancários, o que ainda é pouco comum.

A idade acima de 60 anos de três AAF pode significar limitações ao exercício das atividades agroindustriais e sugere atenção à sucessão nos empreendimentos rurais. As agroindústrias de pequeno porte são alternativas de renda e empregos para as famílias rurais do município de Londrina e criam oportunidades de ocupação dos jovens. No entanto, a permanência dos jovens no meio rural depende de incentivos governamentais que facilitem o acesso à educação, a terra, a recursos financeiros, entre outros.

As edificações que abrigam as agroindústrias pesquisadas foram construídas sem um projeto específico, que permita o controle adequado da contaminação dos alimentos e do ambiente. Grande parte das máquinas e equipamentos são de uso doméstico, inadequados para uso industrial. A tecnologia pouco sofisticada limita a qualidade e a inovação dos produtos. Em função deste quadro, pode-se concluir que as dificuldades na comercialização dos produtos, em parte, estão relacionadas à capacidade operacional das agroindústrias. A solução para estes problemas está no aporte de recursos financeiros para construírem novas agroindústrias e adquirirem novas máquinas e equipamentos.

No que se refere à relação dos AAF com o mercado, os fatores que mais se destacaram foram os pontos de venda e os meios de transporte. Entre os pontos de venda, as feiras livres são os locais mais importantes de comercialização dos AAF entrevistados. A análise dos dados permitiu observar que a Feira Rural foi um agente motivador da instalação de quatro agroindústrias pesquisadas. Para aqueles agricultores que possuem recursos humanos e

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conhecem tecnologias básicas de produção, a oportunidade de participar das feiras livres cria as condições finais para iniciar a produção agroindustrial, resta adequar-se às exigências legais que variam de grau conforme o produto. As feiras livres reúnem os interesses dos agricultores como pontos de vendas e dos governos municipais em oferecer alimentos a preços menores à população. O apoio mais intensivo dos órgãos governamentais poderia melhorar as condições estruturais das feiras, disponibilizando áreas restritas para estacionamento dos veículos dos feirantes, sanitários químicos, pontos de energia elétrica, pontos para captação de água e barracas mais adequadas. As formas de rateio das despesas devem considerar o interesse público, o volume de vendas e o tempo de participação na feira, entre outros fatores. Iniciativas governamentais ainda podem integrar, de um lado, as potencialidades de crescimento das feiras livres e, de outro, as potencialidades de criação de novas agroindústrias familiares.

Constatou-se nesta pesquisa que os supermercados apesar de constituírem-se nos principais canais de comercialização dos produtos da agroindústria de pequeno porte, são pontos de venda mais utilizados pelos AAF que comercializam produtos in natura como frutas, verduras e mel. As dificuldades destacadas pelos entrevistados, para comercializarem nestes estabelecimentos, referem-se ao pagamento a prazo e à apresentação dos produtos com embalagens e rótulos exigidos pela legislação. As condições impostas pelos supermercados, mencionadas no referencial teórico, excluem principalmente as agroindústrias de menor aporte tecnológico e de capital. A inserção nas redes varejistas pode ser possível, se forem criadas condições especiais para estes pequenos agroindustriais. Ações, nesse sentido, estão sendo desenvolvidas no Estado do Paraná, através de convênio entre a Secretaria de Estado da Agricultura e a Associação Paranaense de Supermercados, objetivando a implantação de gôndolas, com produtos da agricultura familiar, nos supermercados das principais cidades paranaenses. Este estudo permitiu observar que as agroindústrias de pequeno porte instaladas na área rural estão expostas aos mesmos problemas viários que afetam a produção agropecuária em muitos estados brasileiros. Isso representa maior dificuldade para a distribuição da produção das agroindústrias, que distribuem a produção com maior freqüência e até mesmo diariamente. Observou-se que, para dois AAF estudados, os gastos na distribuição da produção influenciam fortemente os resultados econômicos da atividade, em função dos veículos utilizados e da longa distância entre as agroindústrias e os pontos de venda. Para estes AAF, veículos mais apropriados para transportar a produção e maiores volumes de produtos comercializados são importantes para a sobrevivência dos empreendimentos. Para os agricultores familiares que desejam iniciar o processamento e a distribuição de produtos, a distância entre a agroindústria e os pontos de venda e os veículos para a distribuição dos produtos são componentes importantes a serem observados no plano de negócios. Organizar-se em torno de uma entidade associativa, que tenha o objetivo de promover a comercialização, poderia facilitar a aquisição de veículos, de uso coletivo, adaptados para a distribuição da produção. Grande parte dos agricultores familiares que enfrentam problemas na distribuição da produção e, até mesmo aqueles que não possuem veículos, estariam amparados pela associação.

Com relação aos recursos financeiros, o trabalho de campo permitiu concluir que a estratégia de evitar empréstimos bancários e financiar seus empreendimentos com recursos próprios tem sido ineficaz para atender as demandas de investimentos na produção e na distribuição dos

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produtos, indicando a necessidade de fontes de recursos externas. Por outro lado, os recursos para investimentos e comercialização nas agências bancárias são escassos e seletivos. Com relação à regularização das agroindústrias e dos produtos, o trabalho de campo permitiu concluir que, com exceção do Sr. Dirceu que cumpre todos as exigências de regularização, as demais agroindústrias cumprem parcialmente ou não cumprem a legislação. Pôde-se observar que a informalidade, na fase inicial da vida das agroindústrias pesquisadas, contribuiu para capitalização, melhoria da capacidade operacional e posicionamento no mercado. Por outro lado, após a consolidação das agroindústrias, a informalidade limita a expansão para outros mercados, como as redes varejistas, que podem absorver grande parte da produção das pequenas agroindústrias. Acredita-se que a simplificação/flexibilização da legislação, o financiamento dos custos de adequação sanitária e o reforço da linha de crédito e facilitação do acesso ao PRONAF – investimento podem contribuir fortemente para a regularização das agroindústrias.

Da mesma forma que os agricultores familiares têm uma visão orientada para a organização da produção, o enfoque maior de parte dos programas governamentais de apoio às agroindústrias de pequeno porte tem sido bastante concentrado no apoio à assistência técnica e investimentos em tecnologias de produção. Pouca ênfase tem sido dada ao apoio da capacitação gerencial ou à busca de soluções para os entraves da comercialização. Considerando que a competitividade global de uma empresa depende profundamente de sua eficiência na comercialização de seus produtos, talvez a efetividade dos programas desenvolvimentista para as pequenas agroindústrias pudesse ser maior, se implementados com enfoque no mercado, com igual ênfase para a capacitação gerencial, para a capacitação tecnológica e para a comercialização.

O processo de formulação e implementação de políticas públicas voltadas à capacitação dos agricultores agroindustriais familiares deve considerar a tendência crescente de se privilegiar o conceito de rede no envolvimento de múltiplos atores neste processo. Devido à natureza integrada dos problemas gerenciais, tecnológicos e comerciais, a correta definição dos mesmos e o campo de atuação para enfrentá-los ultrapassa o âmbito de uma só organização, ministério, setor ou instância do poder público. As ações para enfrentar problemas integrados exigem abordagens multissetoriais, interdisciplinares e interinstitucionais, envolvendo não só a coordenação entre diferentes agências governamentais como também entre estas e as organizações da sociedade civil.

No Paraná, o trabalho de assistência técnica e extensão rural pública é realizado pela Emater-PR, que assessora a elaboração e implantação de vários projetos agroindustriais de pequeno porte. A atuação em rede para capacitação gerencial, tecnológica e comercial dos agricultores agroindustriais familiares poderia ser articulada pela Emater-PR visando a integração das ações de secretarias estaduais, secretarias municipais, universidades, Iapar, Embrapa, Sebrae, bancos oficiais e privados, cooperativas, associações de agricultores, sindicatos, entre outros. BIBLIOGRAFIA ABRAMOVAY, R. Conselhos além dos limites. Estudos Avançados. Universidade de São Paulo, Volume 15, número 43, setembro/dezembro de 2001a. ABRAMOVAY, R. et. al. Agricultura familiar e sucessão profissional: novos desafios. In: XXXIX Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural. Recife, PE. 2001b. CD-ROM. ABRAMOVAY, R. Gip agricultura familiar: conceitos. Disponível em: <http://gipaf.cnptia.embrapa.br/temas/conceitos/index.html> Acesso em 3 jul. 2003. ANÁLISE do plano safra para a agricultura familiar 2003/2004. Boletim do deser: conjuntura agrícola, Curitiba, jun.2003. Edição especial.

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