A COMUNICAÇÃO VISUAL DA CIÊNCIA: ANÁLISE DAS … · capas reflete aspectos de uma cultura...
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A COMUNICAÇÃO VISUAL DA CIÊNCIA: ANÁLISE DAS CAPAS DO
PERIÓDICO BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMÍLIO GOELDI1
Elaynia Ono (PPGCOM-UFPA-Pará)2
Guaciara Freitas (PPGCOM-UFPA-Pará)3
Resumo: No presente artigo, realizaremos uma análise visual das capas do periódico
científico Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, nas suas duas versões, Ciências
Humanas e Ciências Naturais, considerado atualmente, o mais antigo do Brasil ainda em
circulação, desde 1894. A abordagem abrange os três últimos momentos específicos de
transição da composição gráfica, adotada ao longo do período correspondente entre 1984
a 2016. Trataremos a materialidade empírica do objeto como narrativas imagéticas
impressas, enfatizando aspectos da produção editorial. Assim, analisamos as capas
segundo uma perspectiva teórica de interação imagética dos sujeitos e relacional do
campo científico com a sociedade. Consideramos que as referidas capas viabilizam a
circulação de representações da Amazônia e do mundo científico, tanto para cientistas,
como para o público em geral. Neste sentido discutimos de que modo a constituição das
capas reflete aspectos de uma cultura científica e como participa do processo de
comunicação da ciência.
Palavras-chave: Periódico Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi; Comunicação
visual; Comunicação científica.
INTRODUÇÃO
Neste artigo abordaremos a dimensão das práticas do conhecimento cientifico
dentro do contexto de uma ciência emergente, que se imagina como objeto transformador,
configurando-se em uma ciência que busca a compreensão do mundo, com o propósito
de formar indivíduos voltados a um “paradigma social, o paradigma de uma vida
decente”, Santos (2008, p. 60).
1 Trabalho apresentado no II Encontro de Antropologia Visual da América Amazônica, realizado entre os
dias 25 e 27 de outubro de 2016, Belém/PA. 2 Mestranda pelo programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia da Universidade Federal
do Pará. [email protected] 3 Professora, Pesquisadora vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Cultura e
Amazônia da Universidade Federal do Pará pelo Programa Nacional do Pós-Doutorado (PNPD) da Capes.
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Entendemos que a sociedade contemporânea é fruto de suas práticas de
conhecimento científico e tecnológico, o indivíduo, portanto faz parte desse processo,
desse modo não pode permanecer passivo diante de seu desenvolvimento, e conquistar
seu lugar como agente transformador de sua própria realidade, torna-se vital. Desse modo
buscaremos refletir como a comunicação científica e seus métodos de linguagem atuam
no processo de interação com a sociedade, e de como esse processo estimula a essa mesma
sociedade, refletir de maneira a se apropriar da ciência como ferramenta de “sabedoria
cotidiana”, incorporando-a como valores de uma prática cultural. É nesta ordem de
entendimento que atravessaremos o conceito de cultura científica de Carlos Vogt, para
tentar esclarecer a dinâmica que a difusão do conhecimento científico se estabelece e
penetra nos tecidos sociais.
Por fim, tentaremos aqui elucidar, através da narrativa imagética das capas dos
Boletins do Museu Paraense Emílio Goeldi, produzido na Amazônia, o desenvolvimento
dessa ciência que emerge como produto da cultura científica, e de como os aspectos do
processo de produção dessas capas podem refletir na interação entre a comunicação
científica e a sociedade. A discussão proposta também ressalta a trajetória do processo de
construção da imagem pública que o periódico possui enquanto patrimônio nacional do
conhecimento cientifico produzido na “periferia do mundo” para o mundo. (FERREIRA,
FUNARI, 2009. p.11).
A análise aborda os três últimos períodos específicos que apresentam uma
transição na composição gráfica do Boletim, enfatizando aspectos de sua linha editorial
que influenciaram na escolha da imagem da capa, do logotipo e dos demais aspectos, que
contribuíram para essa construção ao longo do período correspondente entre 1984 a 2016.
O recorte de tempo se justifica por representar o intervalo após a adoção do número
internacional para registro de periódicos seriados nos Boletins, o ISSN (International
Standard Serial Number) e pelas expressivas reconfigurações visuais gráficas das capas
no período citado.
O BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMÍLIO GOELDI
O atual periódico “Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi”, foi idealizado por
Emílio Goeldi ainda no século XIX, denominado inicialmente de Boletim do Museu
Paraense de História Natural e Ethnographia, com a missão de configurar na região, uma
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tradição de produção científica voltada para o intercâmbio de experiências entre os
pesquisadores da Amazônia e o resto do mundo. Durante sua trajetória o Boletim passou
por diversas reformulações, tanto no âmbito editorial e gráfico, quanto a situações
relacionados a sua baixa ou irregular periodicidade e até mesmo falta de circulação,
geralmente ligadas a falta de investimentos públicos.
Nos seus primeiros anos, entre 1894-1914, foi caracterizado por ser o período
áureo de produção e difusão do conhecimento Amazônico para o mundo, ganhando fama
internacional, o periódico transformou o antigo Museu Paraense na mais produtiva
instituição científica do país, responsável, juntamente com os demais museus de história
natural, pela introdução das teorias evolucionistas e ecológicas nas ciências naturais
brasileiras.
Sua história segue com momentos de restabelecer a produção e circulação do
Boletim, o que só voltou a aconteceu por volta de 1933, após 20 anos sem novos
lançamentos, mantendo uma escassez de publicação até meados de 1950, quando o
Conselho Nacional de Pesquisas (atual Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico – CNPq), através do Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (INPA), passou a administrar o Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) (SITE
INSTITUCIONAL, 2016).
Neste período até 1983, diversos fascículos avulsos do Boletim, sem periodicidade
e desmembrados em quatro séries (Antropologia, Zoologia, Botânica e Geologia) foram
publicados. Em 1984, com a transferência da administração do Museu diretamente para
o CNPq os boletins passaram por outra adequação, uma nova reformulação editorial e
gráfica e a adoção do número internacional para registro de periódicos seriados (ISSN-
International Standard Serial Number), sendo mantidas as três primeiras áreas de estudo,
Antropologia (ISSN 0522-7291), Zoologia (ISSN 0077-2232) e Botânica (ISSN 0077-
2216) e a quarta substituída pela série Ciências da Terra (ISSN 0103-4278).
Entre 2002 e 2005 se instaurou um outro momento de dificuldades de publicação,
e sua produção é suspensa, só voltado a circular novamente em 2005, com um novo
regime editorial e gráfico, porém, mantendo ainda uma periodicidade irregular, o Boletim
concentrou suas séries em duas grandes áreas Ciências Naturais e Ciências Humanas,
porém permaneceu com características de revista seriada, o que poderia ser visto na
primeira página do impresso, antes do título, a palavra série.
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Em 2006, com o apoio da Fundação Biblioteca Nacional juntamente com
Biblioteca Virtual em Saúde do Instituto Evandro Chagas, sugere-se um ajuste tanto no
título quanto no seu ISSN. Nesta nova fase a contagem do Boletim é reiniciada e novos
registros ISSN são adotados. No ano seguinte uma nova equipe de produção reestrutura
um outro plano de reconfiguração total das condutas editoriais e gráfica do periódico,
conduzindo ações voltadas às normas internacionais de publicação científica. Atualmente
os Boletins são encontrados em duas versões: Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi.
Ciências Humanas (ISSN 1981-8122) e Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi.
Ciências Naturais (ISSN 1981-8114), com publicação quadrimestral, lançadas três vezes
ao ano nos meses de abril, agosto e dezembro, distribuída por todo território nacional e
ampla circulação internacional.
Os Boletins hoje, estão indexados e fazem parte de um grupo de indicadores de
excelência em produção científica. Na área de humanas o Boletim se encontra nas bases
de dados da Anthropological Index Online, Anthropological Literature, da Citas
Latinoamericanas en Ciencias Sociales y Humanidades (CLASE), Directory of Open
Access Journals, da International Bibliography of the Social Sciences (IBSS), do
Latindex, do sistema Scientific Electronic Library Online (SciELO), e do SCOPUS
ELSEVIER. Sendo classificado na avaliação QUALIS, na categoria A2.
Na área de Ciências Naturais, o Boletim está indexado nas plataformas: CAB
Abstracts, Directory of Open Access Journals, International Bibliography of the Social
Sciences (IBSS), e no Sistema Regional de Información en Línea para Revistas
Científicas de América Latina, el Caribe, Espanã y Portugal (LATINDEX).
A CONSTRUÇÃO DE UMA IMAGEM PÚBLICA
Os Boletins do Museu Paraense Emílio Goeldi são dois periódicos, publicados por
uma Instituição de pesquisa vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação,
o Museu Paraense Emílio Goeldi, localizada em Belém, região Amazônica. A instituição
foi fundada em 1886, e tem como missão “realizar pesquisas, promover a inovação
científica, formar recursos humanos, conservar acervos e comunicar conhecimentos nas
áreas de ciências naturais e humanas relacionados à Amazônia” (Plano Diretor 2011-
2015. p.10).
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Por estar inserida em um contexto geográfico estratégico, o processo de
construção de sua identificação, sempre esteve ligado ao significado que a Amazônia
adquiriu para a ciência, tanto como lugar de grande riqueza natural, e elemento mítico
que permeia o imaginário coletivo sobre o mundo natural Amazônico e
sua exuberante Biodiversidade, como área de preservação ambiental
para a manutenção da vida no planeta, e expressivo canteiro econômico de interesse
mundial, ingredientes que encantaram a comunidade científica a se juntar ao projeto de
desenvolver em Belém do Pará, uma “colônia científica” (Sanjad, 2010), e que continua
a despertar até hoje, a atenção de pesquisadores do mundo inteiro e de órgãos
competentes, para a importância de se perpetuar o projeto científico proposto por seus
fundadores.
“O Museu”, como é conhecido entre a população paraense, é parte da construção
histórica e cultural da cidade, estando presente nas lembranças do imaginário coletivo da
sociedade local, sendo admirado por seus habitantes como ponto de visitação turística, de
educação, de entretenimento familiar e contato com a natureza, viver em Belém é ter uma
parte de suas lembranças construída na própria instituição, que desde o início de sua
trajetória, propiciou uma estreita ligação com a sociedade local, promovendo não só um
espaço de convívio social, mas atuante no sentido de despertar na sociedade o interesse
pelo mundo natural, e pelas ciências.
O Museu Goeldi é hoje um centro de referência internacional no desenvolvimento
dos estudos voltado as questões Amazônicas, no que concerne a sua biodiversidade,
ecossistemas e dinâmicas socioculturais.
Os periódicos do Museu Goeldi, atuam neste contexto não apenas como veículo
de informação da produção de saberes dessa instituição, mas se configuram como
representante de uma cultura científica, delineada pela trajetória histórica em se pensar
ciência de forma integrada e compromissada com a sua democratização. Representa a
memória de uma ciência, que conta em sua própria trajetória as diversas narrativas que
configuraram a construção de sua imagem, uma imagem que para ser descrita é
necessária que ultrapasse seus conceitos de funcionalidade prática e se enverede por uma
dimensão mais ampla, que seja possível abarcar uma interpretação mais subjetiva que dê
conta do plano dos sentidos qual está inserido.
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O OBJETO: CAPA
Denominamos de capa, o invólucro de um objeto. No caso de um livro, de uma
revista periódica ou outro material impresso a capa é a parte exterior da publicação,
muitas vezes produzida em material diferenciado do restante, denominado de miolo ou
corpo de livro. São componentes da capa: a primeira capa, que é a parte da frente da capa,
a segunda capa, parte de trás da primeira capa, terceira capa que é a parte de dentro da
quarta página, e a quarta capa ou contracapa parte de trás do material impresso, faz parte
também da composição da capa, a orelha ou aba, parte da capa dobrada para dentro e que
podem conter informações do autor, e a lombada que apresenta informações da obra como
título e nome do autor.
A capa tem a função prática de proteger o exemplar, sendo também um
componente visualmente atrativo que convida à leitura, é a vitrine de uma publicação, é
a apresentação de um conteúdo, mas é também sua identidade. Para se formar um
conjunto final integrado de design, a capa apresenta diversos elementos como, o próprio
layout, tipografia, o formato, a qualidade de impressão, o tipo de papel, o acabamento e
as imagens, todos esses elementos desenvolvem uma mensagem. Para Fonseca (2008, p.
261-262) “a capa é muito mais que uma embalagem, porque o produto que está dentro
dela, não é detergente nem chocolate, mas pensamento do espírito humano”.
DESENVOLVENDO OS CONCEITOS
Não é novidade alguma afirmar que vivemos em uma sociedade altamente visual,
nossas relações com o mundo estão intimamente ligadas com as representações
simbólicas, que as imagens podem construir no nosso cotidiano.
As experiências visuais criam sensações que nos remetem as ideias, a formulação
de conceitos, e a recordação das experiências vividas. Retomamos parte de nossas
lembranças a partir da evocação de uma imagem guardada no subconsciente, podemos
acionamos em alguns minutos, o rolo do filme de nossas vidas, quando buscamos nossas
lembranças imagéticas afim de narrar toda uma história de vida.
A imagem atrai instiga ao pensamento, o tempo que se dedica ao admirar uma
imagem, nos faz refletir, sentir, interpretar e construir modelos a partir de sua experiência,
se colocando no contexto apresentado e se reconhecendo no mundo como indivíduo
participante da sua própria realidade.
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Bakhtin (1997. p. 220) nos fala da imagem como símbolo produtora de sentidos.
A passagem da imagem para o símbolo revela-lhe a profundidade e a
perspectiva de sentido. Relação dialética entre identidade e não-identidade. A
imagem deve ser compreendida pelo que ela é e pelo que significa. O conteúdo
do símbolo autêntico aparece através do encadeamento mediador de um
sentido que foi correlacionado com a idéia da totalidade universal (do conjunto
universal cósmico e humano). O mundo tem um sentido — “a imagem do
mundo manifestada na palavra” (Pasternak) [...]. (BAKHTIN, 1997. p. 220).
Para ele a definição de sentido se encontra na compreensão daquilo que
descobrimos, através do ato de contemplação e dos movimentos criativos que o
submetemos, e que o aprofundamento da compreensão de sentidos depende de uma
racionalização entre a análise científica habitual e a interpretação filosófica-artística.
“Até que ponto é possível descobrir e comentar o sentido (da imagem
ou do símbolo) unicamente mediante outro sentido isomorfo (símbolo ou
imagem)? O sentido não é solúvel no conceito. Papel do comentário. Teremos
quer uma racionalização relativa do sentido (a análise científica habitual), quer
um aprofundamento do sentido, com a ajuda dos outros sentidos (a
interpretação filosófico-artística). O aprofundamento mediante ampliação das
distâncias contextuais.
Uma explicação das estruturas simbólicas tem de entranhar-se na
infinidade dos sentidos simbólicos; por isso não pode tornar-se urna ciência na
acepção desta palavra quando se trata das ciências exatas.”
Uma interpretação dos sentidos não pode ser de ordem científica, mas
mesmo assim conserva seu valor profundamente cognitivo. Pode servir
diretamente à prática que concerne às coisas.
“Cumpre reconhecer que a simbologia não é uma forma não-científica
do conhecimento, mas uma forma científica-diferente do conhecimento,
dotada de suas próprias leis internas e de seus critérios de exatidão”
(Averintsev). (BAKHTIN, 1997. p. 220).
Para Manguel (2001, p. 21) as “imagens que formam nosso mundo são símbolos,
sinais, mensagens e alegorias, são a matéria a qual somos feitos”. Para ele as narrativas
existem no tempo, e as imagens no espaço, onde podemos recriar novas narrativas através
da interpretação de outras narrativas recriando assim, um “museu de imagens”, ao qual
nos assemelhamos e nos refletimos nas várias interpretações que elas podem causar.
É a imagem como código visual, que emerge preocupada em se fazer entender na
sua plenitude, como um organismo vivo, que molda a sociedade e a natureza de como o
indivíduo se percebe nesse processo, como ele constrói sua percepção do mundo através
do olhar estético.
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É principalmente por meio da experiência visual que o indivíduo interpreta o
mundo que o cerca, as experiências vividas alimentam e expandem seus significados,
comove a imaginação, desperta sentidos, podendo criar laços afetivos familiar de
reconhecimento de seu mundo, com a representatividade oferecida pela própria imagem.
É através do campo da sensibilidade visual e imagética que conseguimos
“ (...) pensar o mundo não apenas e a partir da pretensão à
racionalidade pura, não apenas a partir de modelos gerais ou teóricos e, sim do
ponto de vista de um imaginário social, latente em cada um de nós, sempre
uma interpretação desta visão de mundo” (SAMARIN, 1999, p. 39).
AS “NOVAS” CAPAS DO BOLETIM
Em 1984, os Boletins recebem seu ISSN (International Standard Serial Number),
neste momento percebemos, mesmo que de forma pouco explorada, uma aproximação da
ciência com uma linguagem mais expressiva de comunicação. A composição da imagem
da capa apresentada por uma tipografia com serifa clássica, de nuances quadrada, nos
remete ao tradicionalismo árido, expressa a ideia de uma ciência
conservadora, rígida, e “imperialista” afastada das artes e do mundo dos sentidos. Não se
trata aqui de uma tentativa de aproximar a análise estética das capas, para uma dimensão
apenas artística, mas, como bem coloca BRASIL (1999, p. 19), de observa-lo a criar
tensões e linhas de fuga em outros regimes, forçando a variações no interior das
estruturas, sejam elas científicas, tecnológicas, filosóficas ou sociais.
A exaltação de parte do título do periódico, “Museu Paraense Emílio Goeldi” em
relação a primeira parte do título, “Boletim do”, sugere a importância da
instituição na própria geografia da região, a escolha das cores para a capa, representam
cada área de estudo e delimita seu campo de ação, o peso das cores fortes e sólidas
intensificam a ideia de imponência. Quanto aos aspectos físicos o periódico mantinha um
padrão de sua dimensão em aproximadamente 22 X 15,5 cm, composto nas cores: verde
para a série de Botânica, cor laranja para série de Zoologia, e tons de marrom para
Ciências da Terra e Antropologia. (Figura 1)
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Figura 1. Apresentação das capas do Boletim a partir de 1984. Fonte: acervo da pesquisa.
Esse modelo de capa foi utilizado até 2004, quando passa no ano
seguinte a introduzir nas suas linhas editoriais uma outra proposta de disseminação
científica, a proposta foi apresentada na carta editorial do primeiro número de janeiro de
2005 por Peter Mann de Toledo, na época diretor do Museu Goeldi.
Ele ressalta o novo formato da revista (figura 2) como sentido de ação para a
difusão científica, o qual permitiria uma comunicação de forma coerente entre as diversas
áreas do conhecimento. A apresentação do novo formato editorial do periódico, ressaltava
a importância de “uma instituição centenária de pesquisas científicas que está inserida
num ambiente geográfico que se transforma rapidamente e que não pode, em princípio,
manter-se distante da sociedade e dos movimentos sociais”.
(...) “deve também se preocupar em conduzir, incentivar e induzir
programas e ações de disseminação científica. Tais instrumentos devem
permitir uma comunicação de forma coerente e condensada das novidades
científicas e reflexões sobre a história social e natural expressa no
diálogo entre diferentes áreas do conhecimento. Nesse sentido, com o apoio da
comunidade científica, esta gestão apresenta esse novo formato de revista
científica” (TOLEDO, 2005. p. 5.)
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Figura 2. Modelos de capas adotados entre o período 2005 a 2008, nas suas duas séries
Ciências Humanas e Ciências Naturais. Fonte: acervo da pesquisa.
O Boletim passaria a exibir o formato fechado nas dimensões aproximadas de 25
x 21,2 cm. Na capa a imagem de uma pena nas cores que se estende de um tom de marrom,
com toque avermelhado ao azul, a ideia da imagem interpretaria tanto elementos da área
de Humanas quanto o arcabouço de Ciências Naturais, o título ganha uma outra
organização e não mais aparece desmembrado em hierarquias diferentes, mantendo uma
unidade entre título e área de conhecimento, ocupando toda a parte inferior do periódico,
assim como a indicação do volume e número da edição, a posição do ISSN
é mantida no canto superior direito, a capa se apresenta limpa de outros ornamentos e
imagens, dando ênfase a áreas de atuação, que a partir desse momento se apresentam
condessas em duas séries Ciências Naturais e Ciências Humanas.
Na quarta capa (Figura 3) foi mantida o sumário e introduzidos a marca da
instituição, seguida dos logos do Museu Paraense Emílio Goeldi, e do Ministério da
Ciência e Tecnologia, Órgão de apoio e fomento ao desenvolvimento científico. A
lombada continuava a expor o nome do periódico a área, o volume, número, e ano da
edição, a capa se alongou e ganhou um formato com orelhas. As edições posteriores a
2005, adotaram um novo ISSN, mantendo apenas os formatos e o layout de capa.
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Figura 3. Capa e contracapa dos Boletins de Ciências Humanas e de Ciências Naturais, nas suas duas
séries Ciências Humanas e Ciências. Fonte: acervo da pesquisa.
Percebemos nessa ação de reformulação de formato e de capa, um primeiro passo para o
ajustamento de uma linguagem comunicacional, preocupada tanto em expandir suas ações de
interação com os campos sociais onde circula, como reforçar a sua representação enquanto
lugar de produção de sentidos, e que apoia a construção de um conhecimento
que precisa constantemente se reposicionar, se reconhecer como objeto de transformação
social.
Entende-se aqui como processo de interação o movimento de comunicação que
representa ações sociais, construídas a partir de uma complexa estrutura de experiências,
que condicionam estímulos de respostas, dotada de significados e simbolismo que
realimenta o círculo de interatividade social humana (FRANÇA, 2008).
A partir do volume 4, número 1 de 2009, e já sobre o domínio de outro ISSN, e
dando prosseguimento as fases de reformulação, os Boletins passaram por uma nova
adequação de seus padrões editoriais gráficos, adotando uma performance visual mais
dinâmica e atrativa. As capas são redefinidas dentro das áreas que a compete
de maneira distinta, cada número passou a ser abordado com uma imagem especifica,
gerando uma expectativa por parte dos autores, da própria instituição e do
público em geral quanto ao lançamento da próxima edição, de como seriam as próximas
capas dos Boletins (Figura 4).
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Figura 4. Adotadas a partir de janeiro de 2009, as capas dos Boletins de Ciências Humanas e de Ciências
Naturais, ganham novo visual a cada edição. Fonte: acervo da pesquisa.
A mudança não ocorre somente na inclusão da imagem como novos parâmetros
de apresentação, o título também evolui em formato e cores, e se adapta a um quadrante
de proporções gráficas que foge de um padrão convencional se alinhando a um formato
inovador e contemporâneo, sugerindo uma ciência que pode ser interpretada por
diversos ângulos.
O posicionamento do título, assim como os demais elementos na página, foi
distribuído obedecendo regras de produção gráfica visual, que leva em consideração o
arranjo alinhadamente “agradável, atraente e confortável” (FONSECA, 2008. p. 210),
uma organização visual que direciona o leitor a uma hierarquia de sequência
lógica de leitura, nessa elaboração aparece na capa um outro elemento, uma espécie de
tema para a edição, uma chamada, quase um convite para a leitura, e na contracapa surge,
além do sumário e dos logos institucionais, um selo (neste número foi adotado a imagem
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de um anfíbio), que representam as edições especiais, como o que usada no primeiro
número de 2010, na edição especial sobre os resultados de pesquisas realizadas durante
as expedições a Calha Norte, que resultou na edição sobre os vertebrados do norte do
Pará. (Figura 5)
Figura 5. Imagem do anfíbio na contracapa para representar o número especial do Boletim de Ciências Naturais
v.5 n.1 de janeiro/abril de 2010.Fonte: acervo da pesquisa.
A ideia da composição da capa não era apenas de inserir uma imagem bonita, mas
a de compor um cenário que mostrasse um significado uma mensagem ou uma história,
observando-a neste contexto podemos perceber a utilização de todos os componentes da
capa, usados como um quadro de representação (Figura 6).
A naturalidade da composição da paleta de cores, sombreamentos e contrastes
usados nos elementos tipográficos, são percebidas e obtidas da própria imagem da capa,
o que produz uma unidade harmônica e de efeito elegante. A escolha da imagem
para a capa obedecia a critérios específicos de seleção, e representava temas da
edição, a imagem geralmente pertencia a um dos artigos publicadas naquele
número, essa escolha de imagem significava para o autor um reconhecimento a mais de
sua obra, elevando a importância da imagem do seu artigo a um outro status de referência.
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Figura 6. Imagem da capa do Boletim de Ciências Humanas v.4 n.2 maio/agosto de 2009, para representar
o contexto histórico que estava presente nesta edição. Fonte: acervo da pesquisa.
Para os autores em geral, a capa era uma forma de identificar rapidamente a sua
produção, em qual número havia sido publicado e facilmente localizado, para a sociedade
em geral, a proposta de capas distintas em cada edição, significava o ciclo de constante
renovação científica, de uma ciência em movimento, atualizada com as demandas da
sociedade, e do próprio mercado editorial, e que por sua vez acaba por gerar um outro
ciclo de interesses, o de se buscar por essa ciência que se faz presente, participativa e
atual, proporcionando, assim, um fluxo interacional mais ativo entre a comunicação da
ciência e a divulgação científica, sendo a experiência vivida das relações estéticas e
imagética a amalgama desse processo interacional.
Efetivamente, na experiência vivida (que se pode dar frente a coisas
do mundo, a situações vivenciadas ou a materiais expressivos de qualquer
ordem) parece ocorrer, junto com a emoção, uma reação proprioceptiva desta.
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No esforço de compartilhar – expressando para outros, tentando
incluir aí mais que um relato frio de uma experiência exaurida para recuperar
uma expressão o próprio afeto relatado – se encontraria o elemento central da
experiência estética relacionada aos processos interacionais da sociedade
(BRAGA 2010, p. 82).
São nesses processos interacionais que envolve a comunicação e a divulgação
científica, que surge uma ciência que se afasta do antigo modelo cartesiano de produção
científica determinada pela negação da “racionalidade em todas as formas de
conhecimento, pautadas nos seus princípios epistemológicos, e regras metodológicas”
Santos (2008, p. 21), para ser imaginada como objeto transformador, configurando-se em
uma ciência que busca a compreensão do mundo, com o propósito de formar indivíduos
voltados a um “paradigma social, o paradigma de uma vida decente”,
Santos (2008, p. 60).
Para Santos (2008), a ciência que emana do paradigma emergente se apresenta
como um conhecimento “não dualista”, que se funda na superação das distinções, que
para ele parecem tão “obvias” e “familiares” como “natureza/cultura, natural/artificial,
vivo/inanimado, mente/matéria, observador/observado, subjetivo/objetivo,
coletivo/individual, animal/pessoa”. Ele também sustenta que o paradigma emergente se
caracteriza muito mais por uma dimensão contemplativa do que “ativa”.
A qualidade do conhecimento afere-se menos pelo que ele controla
ou faz funcionar no mundo exterior do que pela satisfação pessoal que dá a
quem a ele acede e o partilha. A dimensão estética da ciência tem sido
reconhecida por cientistas e filósofos da ciência, de Poincaré a Kuhn, de
Polanyi a Popper. Roger Jones considera que o sistema de Newton é tanto uma
obra de arte como uma obra de ciência. A criação científica no paradigma
emergente assume-se como próxima da criação literária ou artística, porque à
semelhança destas pretende que a dimensão activa da transformação
do real (o es-cultor a trabalhar a pedra) seja subordinada à contemplação do
resultado (a obra de arte). Por sua vez, o discurso científico aproximar-se-á
cada vez mais do discurso da crítica literária (SANTOS, 2008. p. 86-87).
É desta maneira, que uma ciência pautada num paradigma social, que sua
construção e difusão ganham um outro sentido, estabelecendo uma relação mais ativa na
sociedade, onde o indivíduo tem a possibilidade de se tornar objeto participante do
próprio processo de construção de sua realidade, podendo se apropriar das questões
científicas, refletir sobre elas, e gerir uma consciência crítica de seu envolvimento com o
mundo. Tornando a ciência tema corriqueiro, parte da vida comum, possibilitando desde
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suas bases educacionais primárias a formação um de um indivíduo capaz de se apropriar
dela como aparelho de construção e transformação do mundo contemporâneo,
estabelecendo a ciência como um “esforço de criação e difusão das ideias e valores” de
uma sociedade, e se posicionando como um processo cultural.
“(...) a ideia de que o processo que envolve o desenvolvimento
científico é um processo cultural, quer seja ele considerado do ponto de vista
de sua produção, de sua difusão entre pares ou na dinâmica social do
ensino e da educação, ou ainda do ponto de vista de sua divulgação na
sociedade, como um todo, para o estabelecimento das relações críticas
necessárias entre o cidadão e os valores culturais, de seu tempo e de sua
história”. (VOGT, 2003.)
É também neste ambiente que o Boletim busca se inserir na sociedade, como
produto da cultura científica, proporcionando ações que possam promover seu
reconhecimento público dentro dos vários quadrantes da cultura científica, o que Vogt
chama de espiral da cultura científica.
Tomando-se como ponto de partida a dinâmica da produção e da
circulação do conhecimento científico entre pares, isto é, da difusão científica,
a espiral desenha, em sua evolução, um segundo quadrante, o do ensino da
ciência e da formação de cientistas; caminha, então, para o terceiro
quadrante e configura o conjunto de ações e predicados do ensino
para a ciência e volta, no quarto quadrante, completando o ciclo, ao eixo de
partida, para identificar aí as atividades próprias da divulgação científica (...)
(...) Assim, a título de ilustração, teríamos no primeiro quadrante, com
seus respectivos papéis, as universidades, os centros de pesquisa,
os órgãos governamentais, as agências de fomento, os congressos, as revistas
científicas; no segundo, acumulando funções, outra vez as universidades, o
sistema de ensino fundamental e médio, o sistema de pós-graduação;
no terceiro, os museus e as feiras de ciência; no quarto, as revistas de
divulgação científica, as páginas e editorias dos jornais voltadas para o tema,
os programas de televisão, etc. (VOGT, 2003).
Nessa dinâmica as capas dos Boletins funcionam como símbolo, memória,
identidade, visibilidade e ligações afetivos de envolvimento, promovendo um outro
sentido para a ciência, valorizando a sua democratização. E como bem coloca Barthes
(1990, p. 161), (...) “nada chega ao homem sem estar acompanhado de um sentido, sentido
dado por outros homens, e assim por diante, voltando ao infinito”.
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REFERÊNCIAS
BARTHES, Roland. O óbvio e o obtuso: ensaios críticos III. Trad. Léa Novaes. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1990. p. 161.
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