A cor da pele

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REFLEXÃO CRÍTICA: SÉCULO DO POVO - A COR DA PELE Universidade do Algarve - Escola Superior de Educação e Comunicação (ESEC) Curso Superior de Educação Social Ano letivo de 2014/2015 3.º Ano 1º Semestre Unidade Curricular: Desenvolvimento e Participação Docente: António Fragoso Discente: Cláudia Brito Número: 47027

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REFLEXÃO CRÍTICA: SÉCULO DO POVO - A COR DA PELE

Universidade do Algarve - Escola Superior de

Educação e Comunicação (ESEC)

Curso Superior de Educação Social

Ano letivo de 2014/2015

3.º Ano – 1º Semestre

Unidade Curricular: Desenvolvimento e Participação

Docente: António Fragoso

Discente: Cláudia Brito

Número: 47027

REFLEXÃO CRÍTICA: SÉCULO DO POVO - A COR DA PELE 2014/2015

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No documentário “O Século do Povo – A Cor da Pele” é referenciada a proclamação da

abolição da escravatura (1 de Janeiro de 1863), pelo presidente Abraham Lincoln. Sabe-

se que a escravatura existe, ainda que hoje possa assumir outras formas e terminologias,

desde as épocas mais antigas, e que tem sido praticada por muitos povos e em muitas

regiões. Contudo, foi na idade moderna que a escravatura floresceu com o transporte

forçado de africanos para as américas (tráfico negreiro), durante o período colonialista.

Alguns dos países europeus que contribuíram para este florescimento foram a França, a

Espanha, a Inglaterra, Portugal, Holanda.

Essa exploração cessou, com a abolição da escravatura no século XIX, pelo menos em

teoria, devido ao contributo daquele que pode ser reconhecido como o primeiro

movimento social da história: a Revolução Francesa. Não só os ideais iluministas, que

defendiam a igualdade, liberdade e fraternidade entre os homens, (quando proclamados

pelos revolucionários franceses, não eram para todos), mas também a ciência económica

na Europa, foram contributos essenciais para que, no século XIX, a escravatura passasse

a ser considerada pouco produtiva, moralmente incorreta e, por isso, extinta.

Importante será referir que, para além da Revolução Francesa em 1789, mais dois

acontecimentos da modernidade: a Revolução Americana em 1776 e a Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão de 1973; foram bases para a criação da doutrina dos

Direitos Humanos.

Mas, se a escravidão da era moderna, baseada num forte preconceito racial (negros eram

considerados inferiores aos brancos) se extinguiu no século XIX, nove décadas mais tarde

(no período pós guerra civil americana), assiste-se, nos E.U.A, a uma regressão, com a

criação de leis segregacionistas e a negação dos direitos cívicos aos negros.

Na verdade, a história mostra-nos que, apesar do sistema ter reconhecido igualdade de

direitos para todos, subsistiam normas que enfatizavam a segregação racial. A situação

tornou-se, obviamente, mais grave, quando, a partir de 1876, essas normas ganharam o

estatuto de leis. Ainda que fossem contra muitos princípios da constituição, as leis de Jim

Crown (separate, but equal), promoviam a segregação racial entre negros e brancos.

Como se pôde ver no documentário, em 1957, cerca de nove décadas após a abolição da

escravatura nos E.U.A, milhares de negros saem à rua (Alabama), para contestar a

segregação racial e reclamar a igualdade de direitos. Nesse mesmo ano, saem também à

rua os negros vítimas do regime segregacionista racial instaurado desde 1948 pelo Partido

Nacional da África do Sul, mais conhecido como Apartheid.

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Importante será referir que, se nos E.U.A foi necessária uma década para que a igualdade

de direitos fosse concedida aos negros, na África do Sul, foram precisas quase cinco

décadas (1948 a 1994) para obterem essa vitória.

Tal como nos mostrou o documentário, tanto nos E.U.A como na África do Sul, os

brancos justificavam a sua supremacia, perante os negros, devido à sua superioridade

intelectual. Na vida quotidiana, isso significava uma negação dos direitos civis aos

negros, ou seja, uma desigualdade que se refletia na vida económica, no acesso à saúde,

à educação, aos transportes e espaços públicos, etc. Mas, mais do que estarem privados

dos direitos civis, a vida quotidiana dos negros era, tanto nos EUA como na África do

sul, pautada pela humilhação e desrespeito, que era infligida aos negros não só por

policias mas também por civis e organizações racistas (ex. Ku Klux Klan), que tentavam

impedir, a todo o custo, a integração social dos negros. Importante também será referir

que a nível da justiça, todo o sistema judicial (jurados, juízes, promotores) era conivente

com estas práticas racistas, ao não condenar/punir os agressores civis e organizações que

praticavam crimes contra os negros.

No que se refere à educação dos negros, vimos que muitas escolas de estados americanos,

adotando políticas segregacionistas, não permitiam que os negros as frequentassem. Por

isso, episódios como a desagregação em Little Rock, (Arkansas) ficaram na história.

Na África do Sul, no que se refere à educação, que pode ser um meio para ascensão social,

as escolas, tinham como único objetivo preparar os negros para o mundo do trabalho.

Mas a partir da década de 50, o regime segregacionista dos EUA iria sofrer um “ataque”

com os protestos dos afroamericanos (para acabar com a segregação nas escolas, nos

transportes públicos, nos restaurantes, etc.) que reivindicavam direitos.

Como sabemos nos movimentos há sempre figuras emblemáticas que se destacam, devido

à sua capacidade de arrastar, motivar, influenciar e orientar coletividades para objetivos

concretos: os líderes. Nos EUA, o carismático ativista politico Martin Luther King,

destacou-se nas lutas pelos Direitos Civis dos negros, com os seus discursos fervorosos,

que incentivavam a raça negra a lutar pela igualdade de direitos, através de marchas e

protestos. Será importante referir que o Martin Luther King utilizou a desobediência civil

(conceito originalmente formulado por Thoreau), como forma de protesto político

pacifico para lutar pelos direitos civis e eliminar a segregação racial, tal como fez

Mahatma Gandhi no processo de independência da Índia e do Paquistão. Mas,

contrariamente à política de integração pacífica de Luther King, surgiram grupos, como

os “Black Power” ou os “Panteras” negras, que enfrentavam violência com violência.

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Mais tarde, é sancionada pelo presidente Lyndon Johnson a “Lei dos Direitos Civis”,

possivelmente antecipada pelas manifestações pelo assassinato de Luther King em 1968,

que proibia a aplicação desigual dos requisitos e registo para os votantes, a segregação

nas escolas, nos locais de trabalho, etc.

Mas se nos EUA houve esta mudança na sociedade, na África do Sul, o regime

segregacionista (Apartheid) continuou instaurado, impedindo que os negros tivessem

acesso à propriedade privada e à participação politica. Mais do que isso, obrigava-os a

viver em zonas diferentes das dos brancos e a possuírem passes para poderem circular.

Apesar dos protestos contra o Apartheid na década de 50, só quase meio século depois a

África do Sul, reconhece o direito de voto aos negros e lhes consagra direitos

democráticos. Tal como no caso dos EUA, um líder se destacou no movimento

antiapartheid – Nelson Mandela. Após a possibilidade de voto dos negros, o ativista do

ANC (Congresso Nacional Africano), Nelson Mandela, que durante décadas esteve preso,

é libertado e sobe ao poder, tornando-se no primeiro presidente negro na África do Sul.

Como podemos concluir, foi com os movimentos, tanto dos afro-americanos (que

duraram quase cinquenta anos) como os dos sul-americanos (que duraram uma década),

que os negros conseguiram acabar com a segregação racial, com a política do apartheid

na África do Sul e conquistar direitos civis. Além disso, a ressonância das lutas dos negros

contra a pobreza, a violência e a discriminação noutras partes do mundo, funcionou, sem

dúvida, como alavanca para os movimentos sociais que ocorreram até à década de 90

(movimentos estudantis, sindicais, ecológicos, feministas, etc.).

Percebe-se assim, que os movimentos sociais (sociedade civil organizada) têm

capacidade de abalar o poder e provocar a mudança social, que as coletividades anseiam.

Podem, por isso, ser entendidos como uma forma de participação social, uma vez que as

coletividades fazem uso deles para reclamar direitos que lhes são negados.

Curiosamente, se podemos reconhecer que os movimentos sociais foram, ate à década de

90, uma ferramenta que permitiu a mudança social, será legítimo perguntarmos por que

razão, na atualidade, onde persiste a desigualdade e a pobreza e muitos afirmam estar a

perder direitos outrora adquiridos, não surgem movimentos?

Não é fácil a resposta. Muitos defendem que devido aos avanços tecnológicos, o espaço

de participação politica deixa de ser as ruas para passar a ser os espaços virtuais. A meu

ver, considero que existe um timing em que, não suportando mais as condições adversas

a que estão submetidas, as coletividades, explodem e manifestam-se. Acredito, por isso

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que novos movimentos sociais surjam, quando coletividades estejam no limite para

suportar as injustiças a que estão submetidos.

No que se refere à questão do racismo, apesar das grandes vitórias, que contribuíram

fortemente para o derrube de muitas barreiras raciais e moldar sociedades mais plurais,

na atualidade, ele ainda persiste, ainda que de forma muitas vezes implícita e subtil.

Não podemos pensar que estas vitórias conseguidas tanto pelos afro-americanos como

pelos sul-americanos, seria o fim do racismo. Na verdade, a meu ver, foi o princípio para

que a mudança começasse a acontecer na vida dos negros. Foi um princípio, porque a

partir desta “abertura” à defesa dos direitos dos negros, organizações, ativistas, nunca

mais cessaram de combater o racismo e a discriminação racial.

O Racismo e a discriminação racial têm sido, por isso, objeto de várias convenções,

declarações e conferências de várias organizações (ex. ONU). Entre dezenas, destaco a

Conferência Mundial Contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas

Conexas de Intolerância, realizada recentemente (2009) em Durban.

É claro perceber que o racismo e a discriminação racial ainda existem no mundo.

No que diz respeito à recente eleição do presidente Barack Obama nos EUA, podemos, a

meu ver, tirar uma conclusão: a polémica que se gerou na eleição do primeiro negro na

presidência dos EUA mostra que a questão do racismo ainda não está ultrapassada.

Se verificarmos atentamente as condições (económicas, sociais, educativas, etc.) em que

vivem os negros na era da globalização, percebemos claramente que o racismo e a

discriminação racial ainda que de forma mais ténue que outrora, ainda subsistem. Se o

processo da globalização tem permitido uma maior proximidade entre diferentes raças,

isso não significa que não existam práticas discriminatórias entre elas.

A meu ver a questão do racismo é delicada e perigosa. Basta olharmos para o nazismo

alemão, e para a sua tentativa de criar uma raça pura, eliminando todos aqueles que

tivessem características físicas e biológicas diferentes das pretendidas, para percebemos

como o racismo pode representar um perigo para a humanidade. Por esta perigosidade ele

deve de ser ferozmente combatido. Mas, mais do que isso, defendo, por questões morais

a igualdade a todos os níveis de todos os homens na terra, para que possamos viver sem

conflitos e tensões, e alcançar a tão almejada paz mundial.