A Critica e o Livro-Ilustrado

download A Critica e o Livro-Ilustrado

of 11

description

Peter Hunt

Transcript of A Critica e o Livro-Ilustrado

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    1/11

    Diante dessa descober ta enorme e talvez opress iva, que repre-senta uma falta de ft!na linguagem como instrumento comunicativo,alegro-me muito em dizer que, como pai, cidadao, escri tor e acade-mica, tenho padroes diferentes - e que sao todos compativeis . Saopadroes controlados e resolvidos em uma cren~a na humanidade(apesar de toda evidencia); mas, no curso normal da vida, porque te-mos de ser diferentes em tempos diferentes, esses padroes estao asvezes fadados aentrar em conflito. Passamos nossa vida - como nos-sos filhos passarao - constantemente processando, pesando e equili-brando uma gama fenomenal de conhecimento, percepcoes e sensa-~oes. Nao podemos ser simplistas a respeito deles e nao esperamosque nossos filhos sejam, Deve sec obvio que 0mesmo aconteca emnossas abordagens dos livros para crianca e na relacso com eles.

    [10] A CRITICA E0LlVRO-

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    2/11

    Deque serue um livre semfiguras nem di d l ogos?LEWIS CARROLL

    A LITERATURA INFANTIL TOMA EMPRESTADAS CARACTERisTICAS DEtodos OS generos, Mas existe um genero para 0 qual ela tern contri-buido: 0 livro-ilustrado, que e distinto do livre com ilustraeao, Essadis tincao e, em grande parte , organizacional. Porern , se Iembrar-mos que a ilustracao altera 0modo como lemos 0 texto verbal, issose aplica ainda mais ao livro-ilustrado.Diante dessa diferenca no modo de ler tanto 0 livro com ilustra-

    9ao como livro- ilus trado, a cnt ica e a teor ia tern s ide mui to limi -tadas, tendendo a recorrer a chavoes figurativos. Como observou ailustradora Celia Berridge, "0 verdadeiro motivo de os livros-ilustra-dos obterem tratamento tao sintetico nas resenhas nao e por seremconsiderados deficientes a par ti r de uma avaliacao ser ia , mas parserem todos considerados a parte menos importante do universo dolivre". ' Como tambern notou urn resenhista norte-americano, a des-valorizacao do livro-ilustrado resulta da simplicidade da linguagem;pois "grande parte da complexidade, como 0uso da metafora, parexernplo, e expressa pelos elementos visuais: 0tamanho eo formatodo liVIO, aespessura do papeI, as fontes [.. .]".2Em suma, precisamos de uma l inguagem cri tica paraessa nova

    area, de potencial muito grande. "Acomplexidade da interacao en-tre significado da imagem e significado dotexto [.. .. [e]0que essa in-teracao possibilita", escreve Philip Pullman, " e a maior descobertada narr acao de histor ia s do seculo xx: ou se ja , 0 contraponto. ,,3Pullman destaca a principal dificuldade para os resenhistas:

    Urn tipo d iferen te de v isua lizacao esta envolvido : 0 de simultanei-dad e que t emos no cinema [ .. .] .Em uma h istor ia em quad rinhos,podemos visualizar variascoisas acontecendo juntas, e nao importaqual lemos primeiro. Na estrutura dos quadrinhos, 0fluxo do tempose d ivide em pequ eno s redemo inhos ~ e es se af roux amento da ti-ran i a do fluxo de mao unica possibi li ta a con trapon to , lancando 0mais extraordinario virtuosisrno na narracao de histories.'

    233

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    3/11

    Os livros-ilustrados podem explorar essa relacao complexa; as pa-lavras podem aumentar, contradizer, expandir, ecoar ou interpre-tar as imagens - e vice-versa. Os livros-ilustrados podem cruzar 0l imite entre os mundos verbal e pre-verbal ; podem ser a liados dacrianca-lei tora, como vimos no caso de 0 passeio de Rosinha. Comodiz Margaret Meek:

    Podernos d izer que uma pagina em urn livro- ilustrado e urn{cone para ser ccntemplado, narrado, explicado pelo especta-dor. Ela guarda a his toria ate que haja uma narracao, Assim, nocomeco, as palavras sao poucas; as acontecirnentos da his t6riaestao nas i lustracoes que formam 0 texto polissemico. 0 leitortern que descobrir qual dOB eventos pict6ricos transmite 0 argu-mento , enquanto cada relei tura most ra que out ros dados tam-bern podem ser levados em conta. Alicao essencial de0passeiode Rosinha depende da nao existencia de mencao a raposa, po-rem 0 lei tor sabe que nao haveria his toria sem ela. Isso nao podese r descoberto em par te alguma senao na interacao do lei torcom 0 texto."

    Logo, os l ivros-ilust rados podem desenvolver a diferenea entreler palavras e ler imagens: nao sao limitados por sequencia l inear,mas podem orquestrar 0movimento dos olhos. 0 mais importante,como disse Sonia Landes, e que "no entendimento dos ilustrado-res de hoje , os l ivros-ilustrados lidam na real idade com dois argu-mentos, 0visual e 0verbal; e cada urn pode ser escalon ado sepa-radamente para um mutuo reforco, contraponto, antecipacao auexpansao"." Eles tern urn grande potencial semiotico/semantico; de-cididamente niio sao simples colecoes de imagens, "Jivros de pintu-ras costuradas juntas de modo negligen te ou astucioso", 7 Esse e urnmeio no qual as paginas podem servistas em termos de aberturas ede livre exploracao das interacoes de dais meios; pa is, como disse

    234

    A g :a li f" h a A o sl fl ha . 1 0 1pesseer .a lardLrlha

    o passeio de RoPat HutchinsGlobal. 2004

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    4/11

    Nicholas Tucker, "a a rt e do l ivro-i lust rado [ .. .J res ide nas interacoesentre a ilustracao e 0 texto" .8

    Mas - e infel izmente is to e verdade na maior ia dos casos - os l ivros-ilus trados tambern podem fixar as palavras numa interpret acao rest ri -tiva, prosaica. E obvio que nao ha nenh urn sen tido no qual as imagenspossam "simplesmente" i lustrar 0que as palavras dizem; e las deveminterpret s- la s, mas a interptetacao pode ser insipida ou ajustar-se aest ereotipos visua ls de forma ou cor ou padroes visual -verba ls comer-ciais /populares . Toda ilustracao e uma interp retacao, apesar da opi-niao de Brian Alderson de que mu itos dos primeiro s exempJares de li-vros com ilustracoes sao "de ordem da representacao: retratos literaisdo que 0 t ex to diz [ ...J . [0ilustr adorJ busca dar uma versao simplesdos fen6menos como ele osVi".9Essa mesma concepcao e encontradaem Sonia Landes: "Urn dos papeis das imagens em urn livro-iIustradoe realcar 0 significado de uma hist6r ia iIustrando as palavras. Mas osbons a rt ist as do l ivro-i lust rado vao bern a lern dis so , gracas a invencaoe ao desenvolvimento de material adicional da historia"."

    Mas qua l e a relacao dessa teoria com as criancas? E evidente,como vimos, que, mesmo em um estagio bastante avancado de so-cializacao, as criancas percebem as coisas de modo diferente dosadultos; no entanto, paradoxalmente, pode ser que com 0 livro-ilustrado adultos e criancas estejam em seu ponto de maior proxi-midade. Nicholas Tucker cita Maurice Sendak , autor-ilustrador dealguns dos mais ber n-sucedidos e influentes livros-ilustr ados mo-demos, que, apos ser acusado de realizar trabalho grotesco por de-senhar criancas com cabecas g randes, disse: "Eu conheco as propor-c ;oes do corpo de uma cr ianca . Mas es tou tentando desenhar 0modocomo as criancas s e s en te m - ou melhor, 0modo como imagino quee las se sintam"."

    Exist em mui tas evidencias mai s e rnpi ri cas das propr ias c ri ancas.Joan Cass obse rvou que :

    236

    Ascriancas tambern tendem nessa idade (de doi s anos e meio at res anos e meio) a reconhecer objetos nas imagens - se ja qua lfor a posicrao deles no espaco: isso significa que as vezes olha-rao para sel ls Iivros-ilustrados de cabeca para baixo e ainda con-seguirao nomear os objetos que estao ali . Essa propensao paraignorar a organizacao espac ial s igni fl ca que nem sempre e lasanalisam 0que veem e, por isso, nao separarn 0 importante doinsignificante [.. .];dos quatro aos quatro anos e meio, as crian-crasnao reconhecem lima sequencia de acraoem diferentes ima-gens; elas veem cada uma como separada do resto."

    Isso esta muito distante da percepcao do adulto, e e raro um autoi lust rador conseguir abordar esse problema. 0mais surpreendentesao os livros de David McKee, cujoAgora nita, Bernardo foi discutidantes. Seu Odeio meu ursinho depelucia (1982/1994) pode ser dc ri to par urn lei tor adulto como urn exerc ic io surrea li st a. 0 textobas tante coerente. Comeca da seguinte forma:

    Naquinta-feira a mae de Brenda foi vis itar a mae doJoao.[Paqina] ABrenda foijunto para brincar com 0joao,r Paginaj - Par que voces nao van brincar lafora com seus ursinhosdepe luc ia>- diss e a mae doJoao,[Paginaj joao e Brenda sairam com seus ursinhos,[Paginaj- Odeio meu ursinho de pehicia - disse joao.[Paginal - Odeio meu ursinho de pehicia - disse Brenda.[Paqina] - Mas 0meu ursinho e melhor do que 0seu - disse joao.[Paginaj - Nada disso, 0meu ursinho e melhor do que 0sell -disse Brenda.

    Nas primeiras tres imagens, ha urn reflexo direto das palavrasBrenda e sua mae sao mostradas na porta do apartamento de JoaBrenda conhece joao: os dois sao mandados br in car fora do apart

    2

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    5/11

    Ode io meu urs lnho de petuc ia .David McKeeMartins Fontes, 1994

    ODEIO MEU YRSINHODEPELUCIA

    _ . .. __ . .. . u "' "'_ . .. ._" ' r _ " ' _

    mento. Nas imagens seguintes , Brenda e Joao sao vistas brigando.Ate entao, coerencia, Mas, mesmo na primeira imagem, algumasperguntas ficam sern resposta. Existem varies personagens adultosdo lado de fora daporta, urn segurando chocolates, outro segurandoflores, urn terceiro escrevendo num bloco de notas . Duas velhas se-nhoras apontam para eles, E, 0mais notavel, tres homens descempela escada carregando uma mao enorme. Todos esseselementossuscitam questoes irnediatas da narrativa. Chegaremos a descobriro que oshornens estao fazendo com a mao au quem osoutros estaovisitando? Ainda mais perturbador eo fato de que as perspectivasest ao er radas; a pa tamar e os degraus nao es tao no mesmo planoque os personagens (como virnos, as criancas conseguem ler as figu-ras de qualquer angulo).Nasegunda irnagem, em que Brenda conhece joso, descobrimos

    que 0apartamento e poueo mobil iado: ha urn sofa, uma espregui-cade ira, tabuas e caixas de cha, uma contendo artigos para cha , aoutra, muitas cartas, Amae de Brenda esta chorando; a mae deIoaoobserva uma carta e uma foto. Pelajanela seveurnpe enorme sendobaixado par urn guindaste.Na terce i ra imagem, a pagina te rn t res dimensoes reduzidas a

    duas , de modo que t res comodos e t res conjuntos de acoes sao s i-mult aneamente apresentados - e em seguida Brenda eJoao saernpara urn mundo assombrosamente bizarro no qual ha centenas defragmentos de narrativa: mulheres tendo a mao, uma luva perdida(que uma mulher lamen ta , var ias paginas adiante) , u rn homernagarrando a sobrancelha ejogando fora urn jornal , uma mulher pin-tando urn arco-Iris , pessoas olhando todas elas na mesma direcao,urn casal de velhos com sorvete na mao se entreolhando sugestiva-mente, pessoas passando uma apos outra por urn estranho arco, fi-las de mulheres vestindo roupas identicas +, todos eles envolvendoadul tos em at ividades que nao tern uma resolucao def inida , Namaioria das imagens, maos enormes estiio sendo carregadas.

    239

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    6/11

    Para 0 leitor adulto, e uma li

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    7/11

    mos que nao sopodemos, mas devemos atribuir uma ordem a issoe devemos dividir nossa impressao em pedacos de nossa propriaescolha eapresenta-los nao simultaneamente, mas urn por urn."

    Desse modo, a linearidade e uma caracteri st ic a do tex to verbal , masnem sempre das imagens. Fo rcar as imagens para entrar no mesmomolde que as palavra s parece potencialmente improdu tivo , exceto emtermos do estabelecimento deconvencoes , quando isso e evidente epordef inicao necessario." Aspalavras podem suger ir uma indicacao muitomais precisa sobre 0que as coisas si gnificam, mas nem sempre umaimpressao global mais precisa, Aspalavras sao vasilhas semanticas ne-cessariamente vazias: elas limitam 0sentido, mas nao 0prescrevem, Asimagens podem fazer 0mesmo, 0 exemplo britanico class ico e EdwardArd izzone , cujas imagens con te rn muitos e lementos s emiocul tos nassombras e cujo f orte e ra desenha r a s costas das pessoas, Como disse 0proprio Ardizzone, Little Tim and the Brave Sea Captain [0pequeno Timeo bravo capitiio do mar, 1936] f oi e sc ri to para s eus f ilhos e com a a judadeles, Is so tern a van tagem de que 0t ex to verbal e ber n leg ivel , j a queseus f ilhos faziam sugestoes a medida que 0 livro se desenvolvia, Elediz das criancas: "Elas acrescentarao os maravilhosos detalhes incon-sequen tes que soas c riancas conseguem imagina r e que tan to enrique-cern a nar rativa quando a ela sao incorporados" .19 Observe-se a palavra"inconsequentes" ern justaposicao a palavra "enriquece": 0raciocinioaqui se encont ra cl aramente em dois niv ei s, que n em sempre se com-pat ib il iza rn . Aopiniao de Brian Alderson de que " a forca de urn tex topode se dil uir ou mesmo se perder por tras do virtuosismo artistico, amente deixa de a tentar para as implicacoes nar ra tiva s par a aval ia r des -vios ou asnicias visuais'?" seria assim vista como adultista.

    Como em outras form as de textos, pode-se dizer piamente quenao deveriamos limi tar as criancas; mas, da me sma forma, para naoas limitar, preci samos de certa avali acao sobre aqu ilo para que asestarnos liberando. Segundo John Rowe Townsend, "muitas vezes

    242

    os l iv ros-i lust rados sao a primei ra int roducao da c rianca a arte e aIiteratura [...] .Dar a ela livros-ilustrados crus, estereotipados e abrir 0caminho para tudo 0mais que ecru e estereotipado [ ... ]m esmo queas c riancas nem sempre apreciem 0melhor quando 0veem, elas naoter ao nenhuma chance de apr ec ia -lo se nao ovi rem". "

    Tudo isso esta muito certo, mas ainda contem 0conce ito de "mel hor", 0 que torna born urn livro-ilustrado? Exist e algum modo de le10 que nos permita fazer esse jufzo de valor? Pessoalmente, descon-f lo mui to de panaceias , porque 0mundo parece cheio de excecoes .o artista australiano Ray Reardon sugeriu que os principios basicos da teoria da Gestalt tambern sao caracterist icas de uma obra dearte naturalmente atraente: boas relacoes (positivo-negativo) f igura-f undo , p rinc ip ios clar os de organ izacao, a per si st encia au recorren-cia da ilustracao e 0 fato de que a ilustracao e dinamica. Esses prin-cfpios tendern a produzir arte agradavel, arte que se inclina para asimetria, 0equi libri o e a simplicidade.v

    Como suger e Pa tr ic ia Cianc io lo , s e "exi ste pouco consenso ent reos critic os da literatura i nfantil so bre os cri terios que se devem usarpara aval iar a s i lust racoes em l iv ros l idos por c riancas" , 23 por ondepodemos comecar?

    Asabordagens descri tiva s parecer n ma is prove itos as, como as deWil li am Moebius eJane Doonan. Noart igo ja c it ado, Moebius nota asvariaveis em acao nos livros-ilustrados: 0 leiaute, 0conceito de "aber -turas" em lugar de paginas , 0tarnanho do quadro (0exemplo ma is comumente citado e 0Onde vivem os monstros [1963/2009], de MauriceSendak, em que 0 quadro e cor re la to ao desenvolvimento da imagi -nacao do personagem) e 0pro je to da pag ina como urn todo. Apart irdisso, Moebius propoe codigos de posicao, tamanho, retornos decrescentes (mais de uma vez na pagina) , perspectiva, enquadramento,linha e capilaridade, alern de cor. Todos esses codigos podem sers imbolicos, alusivos, referenciais dentro dos textos, humor is ticos, aupodem es ta r de manei ra rnetaf iccional f ora do tex to , comentando-o ,

    243

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    8/11

    O N O E V I V E M O S M O N S T R O SI

    III1 Io .......... _4

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    9/11

    memoria, talvez) sao importantes, quer 0 l ivro seja l ido em uma se-quencia convencional ou nao. Seu Come away from the water, Shirley[Saia da agua, Shirley, 1977J e seu sucessor, Time toget out of the bath,Shirley [Hora de sair do banho, Shirley, 1978], contrastam, nas pagi-nas duplas, 0mundo banal e sern cor dos adultos, com suas palavrasrotineiras, e 0mundo brilhante e imaginat ivo dentro da cabeca dacrianca, que nao tern palavras.A "abertura" de pagina dupla nos da imagens s imul taneas para

    as quais podernos olhar, escolhendo nosso proprio ritmo." Esse eum ponto basico na ilustracao, e Jane Doonan expande sua eoncep-C;aoa respeito:

    Diretamente vemos as formas em uma tela (ou pagina ilus-tradal assumirem propriedades espaciais e representaremalgo; a repeticao abstrata de forrnas e proporcoes e padroesno esquema da pintura [...J assume uma nova forca. Amesmaforma repetida emdiferentes objetos [...J e em formas negativasdelxadas entre eles, na mesma escala, fornece lacos que fazemassociacoes e afinidades entre objetos e eventos e areas de pin-tura. 0 elo rnetaforico e tanto formal como psicologico e deveseu poder it ambiguidade."

    Por iS50, podemos ter alusao visual mediante a cornbinacao de for-mas e cores simbolicas de angustia e prazer.Isso sugere que 0 livro-ilustrado atravessa fronteiras, embora

    haja a invasao de urn certo perigo de insipidez, Bettina Hurlimannna tou os paradoxes inerentes ao canceito de "Europrinting":' "As

    " Processo de producao chamado de coedicao: 0mesmo livre e impresso em largaescala, trocando apenas 0texto em diversos ldiomas, as exernplares silodistrihuidosem paises da Europa, [N.A.]

    24 6

    J~3-..';:J"-T i m e to g et o ut o f t il e b a th , S h ir le y

    imagens falarn uma l inguagem universal [ .. .J mas 0 risco residenuma tendencia a uniformidade - as diferentes earacterist icas na-cionais sendo engolfadas em proveito do "mercado europeu". 30o aspecto rnultimidia do Iivro-ilustrado nao e novo. MargeryFisher salients que a "escritor sagaz dessa era [1920J (Beatrix Pottere urn exernplo brilhante) reserva adjetivos, por assim dizer, para asilustracoes, onde imimeros pequenos aspectos, alguns deles sofisti-cados, podem ser destacados" .wDe ana em ana, ha poueo do que Pullman chamou de "libe ra-

    9ao do mais extraordinario virtuosismo na narracao de historias" .32Na verdade, 0que existe sao oportunidades perdidas: os livros quenao fazern uso nenhum - e muito menos uso pleno - do meio. Nemsempre e claro, por exemplo, por que as palavras estao presentes.Conquanto eu s impatize com a nocao de que 0livro-imagem priveas criancas das palavras, 0 conceito de "palavras-porque-precisa-haver-palavras" e tao "limitador" quanta uma ilustracao prosaica.Asvezes , a ausencia de palavras pode fornecer urn "hiato" que ne-eessita da inteligencia e da Imaginacao para ser preenchido. Ha urn

    ~~ 0 autor se refere a quest6es deformato, escolha depapel, acabamento, composi-o ;: ao d e t ex to e imagern, que exigem conhecirnentes extratextuais e s ao fundamentalspara 0 livro-ilustrado. [N,E.]

    247

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    10/11

    argumento em favor desse Iivro-ilustrado "puro"'" - 0 que nao s ig-nifica que 0portfolio de pinturas importe. Tal portfolio e estatico,o mesmo pode ser dito de "pecas" fabricadas ou coisa que 0valha.Palavras e imagens devem atuar em conjunto.o gabarito deve ser 0livro interativo, que, por ser interativo, naopode facil rnente se enquadrar em (ou ser exclu ido de) nenhumafaixa etaria, Em Granpa, a relacao ent re os dois personagens nao econfortavel ou sent imental, e a relacao ent re as palavras e as i rna-gens ref lete i sso por ser muito ambigua. Burningham define urnpadrao para a narrativa interat iva que evi ta 0 cliche visual. Qual 0sentido de se colocar fami lias de hipopotamos ou ursos fazendocoisas essencialmente humanas? E verdade que ha alguns bonsmotives: 0 animismo, evitar estereotipos racistas (embora em cer-tas aplicaeoes comerciais os ursinhos "travessos" sejam menos "pu-ros" na cor que osvirtuosos), a universalizacao, a permissao para ascriancas sentirem empat ia pelo, d igamos , mau comportamento , eao mesmo tempo reconhecerem (como nos cartuns) que isso naoe realidade. Mas , quase sempre, nenhum usa autentico e fei to daspossibilidades. Asobras de Mary Rayner sobre a familia Porco saourn born exemplo. Enquanto Mr s. P ig 's N ig ht Out [Anoi te em que asenhor Porcosaiu, 1976] fazia uma mordaz (e ate notoria) proposta(a baba e urn lobo), seu sucessor" envolve apenas domesticidadescomuns, evitando so urn pouquinho da insipidez gra9as a irnundice.Existem centenas de livros desse mesmo tipo.Muitos livrosusam imagens para complementar as palavras mos-

    trando cenas dificeis de imagi nar ou misturando fantasia e realidade.Osmelhores sustentam a ideia ao longo de todo 0livro. Ja menciona-mos 0 livro de Felix P ir an iA b ig ai l a t t he B e ac h. 0 que nao se descreve

    H" 0 autor se refere ao Iivro-imagern, cuja narrativa e construida apenas com ilustra-coes, sern a presence do texto. [N.E.]

    248

    no texto e a relacao int ima ent re pai e f ilha e a apl icacao pratica dafantasia de combater os perigos do mundo real. Enquanto seu pai I eurn romance de fantasia e bebe cerveja de verdade, Abigail defendeseu verdadeiro castelo de areia de outras criancas maiores e de suasbicicletas e cachorros , enquanto as imagens tarnbem mostram amodo como sua imaginacao esta tratando a mundo.Muitos Iivros-ilustrados classicos - por exemplo, os Iivrosda serie

    Little Tim de Edward Ardizzone e os de Quentin Blake - entrelacamtexto e imagens fisicamente na pagina.Expandir as fronteiras na tentativa de explorar as possibilida-des do livro-ilustrado nos aproxima do conceito de livro como jogo,

    que e talvez multo melhor por isso , Urn exemplo in teressante eolivro de Phillipe Dupasquier A grande confusdo (1981/1991), em queurn hotel e levado ao caos par uma horda de ratos verdes. Mas to-dos as quartos sao vis tas simultaneamente e, ass im, e preciso es-colher ent re ler var ias narrativas ao mesmo tempo e acompanharos acontecimentos em urn unico quarto ao longo dol ivro in teiro edepois voltar e fazer a mesmo com outro quarto. Muito semelhanteaos livros de escolha bina ria do tipo "escolha sua propria aven-tura" , essa obra demonstra as possib il idades narrativas e visuaisdo livro-ilustrado.Mas, apesar de toda a evidencia do excelente material grafico emcomparacao aos tradicionais, os livros que se valern da forma conti-

    nuam a ser minoria. 0 que pode te r surgido aqui e 0 imenso poten-cial dessa classe de livros, E claro que toda avaliacao de livros per-rnanecera regional, se nao efetivamente pessoal; 0que vimos e umamaneira de investigar seurn livro esta avancando rumo aopotencialda forma. Como conclui Jane Doonan:

    Quer a ilustracao corresponda ao texto ou se desvie dele, 0 leitor-espectador sera capaz deproduzir mais sentidos senao presumirque as ilustracoes meramente reforcam 0 t ema das palavras epermitir que as imagens falem por siproprias. Perdemos muito

    249

  • 5/9/2018 A Critica e o Livro-Ilustrado

    11/11

    I ,

    A grande confusao,Phillipe DupasquiarMartins Fontes, 1991

    em qualquer obra dearte seapenas procurarnos por aquilo queesperarnos encontrar, em lugar de nos abrirrnos para 0 que elatern a oferecer."

    Defato, conforme notou PerryNodeiman, "as livros-ilustrados posuem ritmos singulares, convencoes singulares de forma eestruturaurn corpo singular de tecnicas narrativas" .3;Tanto a cntica comoeditoracao taivezpudessem atentar rnais para esse fato.

    25