A Cultura da Mudança

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A Cultura da Mudança Vicente Falconi Campus Todo final de ano é época de grandes reflexões, balanços e planos para o futuro. É muito bom que seja assim. É uma época muito especial para todos nós. No final do ano passado recebemos uma excelente mensagem de ano novo do Abel Ribeiro de Jesus, da Caraiba Metais, um amigo da Bahia. Ele fala da grande necessidade de estarmos sempre observando e atuando em relação ao novo. Fala também do efeito revolucionário do processo educacional e da autotransformação das pessoas que deve preceder à transformação das organizações e dos países. Concordamos com ele. Isto é válido não só em relação às empresas, mas também e talvez, principalmente, em relação à nossa vida pessoal. Penso em minha própria família e como têm sido diferentes os nossos Natais. Já não posso mais contar com a presença de meu pai, de meu sogro e de dois cunhados. Uma de nossas filhas casou e agora tem que dividir suas festas entre a sua família e a de seu marido. Os sobrinhos já estão se casando e as suas brincadeiras em nossa casa já não mais acontecem. Eles já têm suas próprias famílias. Por outro lado, temos esperanças de netos para repor o barulho e a inocência dos dias de Natal. Fatos acontecem diariamente que mudam as realidades em nossa volta e temos que mudar e criar soluções novas, a cada dia, para continuarmos a desfrutar dos desafios e das felicidades da vida. As empresas são organizações humanas como as famílias. Todo dia acontecem fatos novos, não só dentro das empresas como fora delas, que mudam as suas realidades e criam novos cenários, alterando as suas condições de equilíbrio dinâmico. Uma empresa pode estar (momentaneamente) bem, mas nunca se pode dizer que uma empresa é boa por suas vendas, por seu balanço ou por uma situação episódica qualquer. A boa empresa é aquela que sabe reagir de forma rápida e eficaz às mudanças em sua volta. O processo gerencial é essencialmente isto: estabelecer e atingir

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A Cultura da MudançaVicente Falconi Campus

Todo final de ano é época de grandes reflexões, balanços e planos para o futuro. É muito bom que seja assim. É uma época muito especial para todos nós.

No final do ano passado recebemos uma excelente mensagem de ano novo do Abel Ribeiro de Jesus, da Caraiba Metais, um amigo da Bahia. Ele fala da grande necessidade de estarmos sempre observando e atuando em relação ao novo. Fala também do efeito revolucionário do processo educacional e da autotransformação das pessoas que deve preceder à transformação das organizações e dos países.

Concordamos com ele. Isto é válido não só em relação às empresas, mas também e talvez, principalmente, em relação à nossa vida pessoal. Penso em minha própria família e como têm sido diferentes os nossos Natais. Já não posso mais contar com a presença de meu pai, de meu sogro e de dois cunhados. Uma de nossas filhas casou e agora tem que dividir suas festas entre a sua família e a de seu marido. Os sobrinhos já estão se casando e as suas brincadeiras em nossa casa já não mais acontecem. Eles já têm suas próprias famílias. Por outro lado, temos esperanças de netos para repor o barulho e a inocência dos dias de Natal. Fatos acontecem diariamente que mudam as realidades em nossa volta e temos que mudar e criar soluções novas, a cada dia, para continuarmos a desfrutar dos desafios e das felicidades da vida.

As empresas são organizações humanas como as famílias. Todo dia acontecem fatos novos, não só dentro das empresas como fora delas, que mudam as suas realidades e criam novos cenários, alterando as suas condições de equilíbrio dinâmico. Uma empresa pode estar (momentaneamente) bem, mas nunca se pode dizer que uma empresa é boa por suas vendas, por seu balanço ou por uma situação episódica qualquer. A boa empresa é aquela que sabe reagir de forma rápida e eficaz às mudanças em sua volta. O processo gerencial é essencialmente isto: estabelecer e atingir metas (alcançar resultados) que posicionem bem a empresa em novos cenários que surgem continuamente.

Não existe posição definitiva de conforto. Isto é um fato da vida e foi reconhecido por Abraham H. Maslow ("Motivation and Personality") em suas análises do comportamento humano: a vida é uma alternância contínua entre satisfação e insatisfação e o que faz a motivação da vida é exatamente esta luta pela satisfação humana. O bom processo gerencial é altamente motivador por mais desafiante que seja. A busca do melhor resultado, do resultado excepcional, é a verdadeira alegria do trabalho humano. Observem nossos artistas.

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Agora vejam o que acontece com as empresas em seu dia-a-dia. Aparecem novas tecnologias que mudam completamente a maneira de se fazer negócios. Observem a Internet, as transformações do setor de comércio e as ameaças a atual estrutura comercial do turismo. Observem ainda a evolução da tecnologia da informação e as mudanças nas áreas de serviço e administração das empresas. Novos materiais aparecem a cada dia modificando produtos e processos. Um grande exemplo disto é o aparecimento de novos materiais de embalagem e a indústria de laticínios. Mudanças na política econômica mudam a competitividade dos negócios. A estabilização monetária trouxe grandes desafios ao setor de comércio em geral que passa por dramáticas modificações. Trouxe também um novo cenário à administração pública que já não pode contar com o infame imposto inflacionário para fechar seus "orçamentos". Diante destas mudanças, cada vez mais rápidas e dramáticas, quem não estiver disposto a enfrentá-las como elemento de seu dia-a-dia será atropelado por elas.Estas mudanças são disseminadas em todas as frentes internas e externas da empresa. Diante da aceleração destas mudanças e da complexidade de algumas delas, já não é mais possível para uma empresa ter um ou dois heróis que as "comandem". As mudanças precisam acontecer em todas as frentes e devem ser atacadas por todas as pessoas da organização de forma alegre e voluntária. Não existe outra forma definitiva de fazê-lo e é por isto mesmo que nos dias atuais a educação é não só importante, mas fator de sobrevivência das organizações e da própria sociedade. O grande desafio é levar competência a todos para que cada um possa conduzir as modificações necessárias dentro de sua área de competência.

"As empresas são organizações humanas como

as famílias. Todo dia acontecem fatos novos, não

só dentro das empresas como fora delas, que mudam as

suas realidades e criam novos cenários, alterando as suas

condições de equilíbrio dinâmico."

Surge aí, então, outro desafio dos tempos atuais: a grande lacuna existente entre a quantidade de conhecimento das pessoas e aquela realmente transformada em benefício para a organização. Dois professores da Universidade de Stanford nos EUA, Pfeffer e Sutton, conduziram pesquisa sobre o assunto e publicaram um livro muito interessante chamado "The Knowing-Doing Gap", no qual concluem que nada menos de US 60 bilhões por ano são investidos nos EUA para treinar pessoas que acabam não aplicando aquilo que supostamente aprenderam (conhecimento inútil e desperdiçado). Após estas pesquisas, concluíram que a única forma de levar conhecimento às pessoas com a garantia de que o produto do conhecimento seja aplicado na empresa é "aprender fazendo".

No Brasil temos caminhado razoavelmente por esta estrada. Ainda investimos muito pouco em treinamento e também gastamos de forma inócua em muitos casos. No entanto, nesta última década, por influência

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japonesa, temos adotado em larga escala, nas empresas, nos programas de Gestão pela Qualidade Total, a prática de aprendizado de "aprender fazendo e focado na produção de resultados". A extensão do trabalho que é feito e os resultados já experimentados por várias empresas nos levam a acreditar que esta década mostrará muitas empresas brasileiras como expoentes mundiais de desempenho, coisa inacreditável até poucos anos atrás.

Tendo como base tudo que temos visto em centenas de empresas brasileiras, estamos convencidos de que se conseguirmos, em nível nacional, fazer uma revolução no ensino e investir em massa na educação de primeiro e segundo graus, colocaremos o Brasil em posição muito vantajosa para enfrentar as gigantescas mudanças que o mundo estará enfrentando neste século. Somos capazes disto. Está em nossas mãos!

Vicente Falconi Campos, PhD, é Consultor e membro do Conselho Superior de Administração da FDG - Fundação de Desenvolvimento Gerencial. É também membro do Conselho de Administração da AmBev e do Comitê de Finanças do Conselho da Telemar.Matéria publicada na revista Economia do Estado de Minas, nº 34, fevereiro/2001, págs. 48 e 49.