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Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano IV, Nº 4 e Ano V, Nº 5 - 2003-2004 CLÁUDIA RENATA DA E. LEMOS PERRET 361 A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA Claudia Renata da E. Lemos Perret* SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. A Desconsideração da Personalidade Jurídica. 2.1. Conceito e natureza Jurídica da Personalidade Jurídica. 2.2. Histórico. 2.2.1. Direito Romano. 2.2.2. Direito Germânico. 2.2.3. Direito Canônico. 2.3. Noções gerais e o nascedouro da personalidade jurídica. 2.4. Teorias. 2.5. Conceito de desconsideração da personalidade jurídica. 3. Noções de direito comparado e a desconsideração da personalidade jurídica. 3.1. Direito Brasileiro. 3.2. Direito Inglês. 3.3. Direito Alemão. 3.4. Direito Italiano. 3.5. Direito Francês. 3.6. Direito Suíço 3.7. Direito Argentino. 3.8. Direito Espanhol. 3.9. Direito Português. 4. A desconsideração da personalidade jurídica e as Legislações pertinentes. 4.1. Leis anteriores. 4.2. CLT - Consolidação Das Leis Do Trabalho (Aprovada Pelo Decreto-Lei n.º 5.452/43). 4.3. CTN - Lei n.º 5.172/66 - Código Tributário Nacional. 4.4. Decreto n.º 3.078/19 - Sociedades por quotas de responsabilidade limitada. 4.5. Decreto-Lei n.º 7.661/45 - Lei de falências. 4.6. Lei n.º 3.807/60 - Lei Orgânica da Previdência Social. 4.7. Lei n.º 4.591/64 - Condomínio em edificações e incorporações Imobiliárias. 4.8. Lei n.º 4.595/64 - Conselho Monetário Nacional. 4.9. Lei n.º 4.729/65 - Crime de sonegação fiscal. 4.10. Lei n.º 6.024/74 - Intervenção e Liquidação Extrajudicial de Instituições Financeiras. 4.11. Lei n.º 6.404/76 - Sociedades por ações. 5. Lei n.º 8.078/1990 - Código de Defesa do Consumidor. 6. Lei * Advogada. Mestranda na Área de Concentração Relações Privadas e Constituição na Faculdade de Direito de Campos.

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Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano IV, Nº 4 e Ano V, Nº 5 - 2003-2004

CLÁUDIA RENATA DA E. LEMOS PERRET 361

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADEJURÍDICA

Claudia Renata da E. Lemos Perret*

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. A Desconsideração daPersonalidade Jurídica. 2.1. Conceito e natureza Jurídicada Personalidade Jurídica. 2.2. Histórico. 2.2.1. DireitoRomano. 2.2.2. Direito Germânico. 2.2.3. DireitoCanônico. 2.3. Noções gerais e o nascedouro dapersonalidade jurídica. 2.4. Teorias. 2.5. Conceito dedesconsideração da personalidade jurídica. 3. Noçõesde direito comparado e a desconsideração dapersonalidade jurídica. 3.1. Direito Brasileiro. 3.2. DireitoInglês. 3.3. Direito Alemão. 3.4. Direito Italiano. 3.5. DireitoFrancês. 3.6. Direito Suíço 3.7. Direito Argentino. 3.8.Direito Espanhol. 3.9. Direito Português. 4. Adesconsideração da personalidade jurídica e asLegislações pertinentes. 4.1. Leis anteriores. 4.2. CLT -Consolidação Das Leis Do Trabalho (Aprovada PeloDecreto-Lei n.º 5.452/43). 4.3. CTN - Lei n.º 5.172/66 -Código Tributário Nacional. 4.4. Decreto n.º 3.078/19 -Sociedades por quotas de responsabilidade limitada. 4.5.Decreto-Lei n.º 7.661/45 - Lei de falências. 4.6. Lei n.º3.807/60 - Lei Orgânica da Previdência Social. 4.7. Lein.º 4.591/64 - Condomínio em edificações eincorporações Imobiliárias. 4.8. Lei n.º 4.595/64 -Conselho Monetário Nacional. 4.9. Lei n.º 4.729/65 - Crimede sonegação fiscal. 4.10. Lei n.º 6.024/74 - Intervençãoe Liquidação Extrajudicial de Instituições Financeiras.4.11. Lei n.º 6.404/76 - Sociedades por ações. 5. Lei n.º8.078/1990 - Código de Defesa do Consumidor. 6. Lei

* Advogada. Mestranda na Área de Concentração Relações Privadas eConstituição na Faculdade de Direito de Campos.

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n.º 8.884/94 - Lei Antitruste. 7. Lei n.º 9.605/98 - Proteçãoao meio ambiente. 8. Projeto do novo código civil. 9. Lein.º 10.406/2002 - Novo Código Civil. 10. Análise deJurisprudências. 11. Conclusão.

1. Introdução

O presente trabalho possui a finalidade de abordara temática sobre: A Desconsideração da PersonalidadeJurídica e o Fenômeno Empresarial, tendo em vista asinovações trazidas pelo Novo Código Civil, que revoga aparte geral do Código Comercial. Hoje nos vemos frente aum Código Civil que traz em seu bojo regulamentaçãorelativa a Direito Comercial. Encontramo-nos diante de umaunificação!

Não só diante do Novo Código Civil, se aterá talpesquisa, uma vez que abordará a temática desde suafase histórica, seu nascedouro, suas teorias, conceitos,natureza jurídica, breve noções de direito comparado, aslegislações pertinentes, até chegarmos a análisejurisprudencial. Faz-se necessário ressaltar o conceito depessoa ou personalidade jurídica para enfim, entender afigura da desconsideração, que está diretamenteconectada com a responsabilidade dos sócios em umasociedade.

Quanto a legislação, atentará principalmente, parao preceituado no art. 28, do Código de Defesa doConsumidor, sendo este o pioneiro à elencar tal Institutono Direito Pátrio, tendo em vista que, anteriormentesomente se verificava tal instituto através de jurisprudência,ficando demonstrado a preocupação dos tribunais com arealidade atual, tendo em vista as gigantescas mutaçõessofridas pela sociedade como um todo.

Ressalta-se também, que as legislações antigas jácitavam, porém de forma muito tímida, a responsabilidadedos sócios, não denominado-a de desconsideração da

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pessoa jurídica, mas sim de responsabilidade societária,conforme abordaremos no Cap. III.

2. A desconsideração da personalidade jurídica

2.1. Conceito e natureza jurídica da personalidadejurídica

Considerou-se que o conceito de personalidadejurídica, tendo sido teoricamente elaborado pelospandectístas, perdurou por um bom tempo intangível, masnão imortal. A personalidade jurídica era um dogma.

O dogma da pessoa jurídica, procurava eximi-la dequalquer indagação eventual de responsabilidade de seussócios. Tendo em vista à tardia elaboração do seuconceito, discutia-se em torno da personificação dassociedades.

Na doutrina e na legislação dos séculos XVI, XVII eXVIII, não houve registro, de qualquer progresso naelaboração teórica do conceito de pessoa jurídica. Masna doutrina canônica, retomam-se conceitos já superadose na civilística, em particular na italiana, torna-se mais nítidaa idéia de contraposição entre sujeitos incorporados e osentes abstratos, atenuando-se a noção deresponsabilidade coletiva.

Até o séc. XIX, quando ainda não se fazia patente adistinção entre corporação, instituição e fundação, não selogrou formar um conceito de pessoa jurídica, cuja teoriasó principiou com Savigny, a partir da qual voltaram osjuristas a sua atenção para o tema disputandoexasperadamente a primazia, procurando precisar ofundamento e a natureza da pessoa jurídica.

Começou-se a discutir sobre o tema apenas em finsdo século XIX e início do século XX, surgindo, com a teoriada ficção de Savigny, a da própria pessoa jurídica. Entre

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nós, Clóvis Beviláqua, em Teoria Geral do Direito Civil,trouxe tal discussão.

Vejamos o conceito de pessoa jurídica, segundo DePlácido e Silva:1

Em oposição à pessoa natural,expressão adotada para indicação daindividualidade jurídica constituída pelohomem, é empregada para designar asinstituições, corporações, associaçõese sociedades, que, por força oudeterminação da lei, se personalizam,tomam individualidade própria, paraconstituir uma entidade jurídica, distintadas pessoas que a formam ou que acompõe. Diz-se jurídica porque semostra uma encarnação da lei. E,quando não seja inteiramente criada porela, adquire vida ou existência legalsomente quando cumpre asdeterminações fixadas por lei. ... apessoa jurídica somente temexistência quando o Direito lhe imprimeo sopro vital. Criando-se ou asconfirmando, é, pois, o Direito quedetermina ou dá vida a estas entidades,formadas pela agremiação de homens,pela patrimonização de bens, ou paracumprir, segundo as circunstâncias, arealização do próprio Estado.

Vejamos agora o conceito de personalidade jurídica,segundo também De Plácido e Silva:

Denominação propriamente dada àpersonalidade que se atribui ou seassegura às pessoas jurídicas, emvirtude do que se investem de uma

1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15.ª ed. Rio de Janeiro: EditoraForense, 1999. p. 609.

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qualidade de pessoa, que as tornamsuscetíveis de direitos e obrigações ecom direito a uma existênciaprópria, protegida pela lei. É, assim,uma especialização terminológicada personalidade civil paradesignar as pessoas constituídaspor força da lei, em distinção àpersonalidade física, próprias àspessoas naturais. 2

O italiano Prof. Gaetano Catalano, diz que o conceitode pessoa jurídica, é como centro de imputação de direitos,obrigações, poderes, etc., típico da dogmática do séculoXIX e do séc. XX.3

Existem duas grandes posições doutrinárias quantoa natureza jurídica, destas pessoas jurídicas, ou seja, aTeoria Realista e a Teoria Ficcionista.

Os filiados da concepção ou teoria realista,consideram a pessoa jurídica como entes reais, aos quaiso ordenamento jurídico apenas reconhece personalidade.Como seguidor da Teoria Realista temos LamartineOliveira: “Para que a lei reconheça, é preciso quereconheça algo que, anteriormente ao conhecimento, jápossua as características ontológicas necessárias aoreconhecimento. A lei não reconhece qualquer coisa...”4

Os seguidores da teoria ou concepção ficcionista,afirmam que as pessoas jurídicas são criações doordenamento jurídico, da lei, sendo instrumentos paraatender à consecução de objetivos práticos. Podemos citarSavigny, que elenca o seu surgimento à época que sebuscava dar unidade aos Estados, antes divididos em

2 Ibidem, p. 606.3 CATALANO, Gaetano. Apud GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Desconsideraçãoda pessoa jurídica. In: Separata da Revista "O Direito". Ano 122.º 1990, I. p. 20.4 OLIVEIRA, J. Lamartine Corrêa de. A dupla crise da pessoa jurídica. SãoPaulo: Saraiva, 1979. p. 17.

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feudos, atribuindo-se àqueles o poder de criar a pessoajurídica.

Savigny,5 acredita que as pessoas físicas tinhamrealidades, enquanto que as coletivas são criaçõesarbitrárias do Estado,6 outros afirmam claramente quetanto as pessoas jurídicas individuais quanto as coletivassão jurídicas, ou seja, meras criações da lei.7

Pode-se dizer que, quanto a natureza jurídicaentendida como ficção, as sociedades somente teriampersonalidade por disposição legal, ou seja, apersonalidade jurídica das sociedades corresponde a umdesejo da lei em atribuir-lhe esta personalidade. Na teoriada realidade, as sociedades constituem centros deinteresses distintos, sendo o interesse da sociedadediverso do interesses dos sócios, onde a sociedade temum interesse próprio. O Direito não atribui e sim reconheceuma personalidade. Verifica-se a adoção desta teoria noart. 115, da Lei n. 6.404/76, que dispõe sobre associedades por ações.

Cabe ressaltar que, tanto os defensores de umateoria, como de outra concordam que a pessoa jurídicacorresponde a um instrumento, uma técnica jurídica quetem como objetivo alcançar determinados fins práticos,como a autonomia patrimonial e a limitação deresponsabilidades.

Vejamos o entendimento de Koury:

...adotando-se uma concepçãoficcionista para a pessoa jurídica, ouseja, concebendo-a como decorrente

5 Veja SAVIGNY. Apud KOURY, Susy Elizabeth Cavalcante. A desconsideraçãoda personalidade jurídica (Disregard Doctrine) e os grupos de empresas. 2.ªed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998. p. 2-6.6 Neste sentido DEL VECCHIO. Lições de filosofia do direito. Trad. Antônio José Brandão.Coimbra: Arménio Amado, 1979. p. 451, Apud KOURY. Op. cit., nota 5, p. 1-2.7 Seguindo este entendimento, RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito. Trad. L.Cabral de Moncada. Coimbra: Arménio Amado, 1979, p. 262 e também SICHES,Luis Recaséns. Tratado General de Filosofia del Derecho. 5.ª ed. México:Porrúa, 1975. p. 269-272. Apud KOURY. Op. cit., nota 5, p. 2.

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de uma criação da lei, afirma-seigualmente que a lei pode, a qualquermomento, suspender seus efeitos,desconsiderando-a. Por outro lado, osdefensores da teoria realista enfocama desconsideração como uminstrumento do Direito positivo paraajustar as construções jurídicas a seusreferencias metajurídicos.8

No que concerne a aplicabilidade dadesconsideração da personalidade jurídica, um doselementos essenciais é a existência de personalidadejurídica, pois sem esta não haveria o que se desconsiderar.Claro está que uma vez personificado, o ente passa a terexistência jurídica, adquire personalidade econsequentemente atua no mundo jurídico. Para ilustrareste fato, vejamos o que muito bem nos coloca Verrucoli:

... de um modo ou de outro, cada umadas teorias (...) designa, pelo menos,uma realidade juridicamente relevante,a existência de um sujeito ou de umaentidade considerada peloordenamento jurídico estatal comocentro autônomo de interesses e deimputação de relações.9

O atendimento às formalidades legais faz com quea sociedade torne-se um novo ser, distinto de seuscomponentes e com um patrimônio próprio e autônomo.Diz-se que ocorre crise da função da personalidadejurídica, todas as vezes que as funções da personalidadejurídica entram em conflito com os valores do ordenamento

8 KOURY. Op. cit., nota 5, p. 3.9 VERRUCOLI, Piero. Il superamento della personalità giuridica delle societàdi capitali nella "common law"e nella "civil law". Milano: Giuffrè, 1964. p. 6.Apud KOURY, 1998. p. 3.

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jurídico, ou seja, quando esta sirva para encobrir interessesimorais ou antijurídicos.

No que tange a personificação, sua conseqüênciaimediata, independentemente do tipo societário constituído,é a separação patrimonial10 da sociedade, limitando o risco ea responsabilidade dos sócios.

Decorre a necessidade de uma doutrina como a dadesconsideração, visando fixar limites de utilização dapersonalidade jurídica, criada por lei, em conformidade como interesse social.

2.2. Histórico

Para melhor esclarecimento, passemos a uma breveanálise da formação histórica do conceito de pessoa jurídica,citando o Direito romano, germânico e o canônico, onde cadaum elaborou um conceito autônomo, mais ou menosdesenvolvido, das corporações e instituições.

2.2.1. Direito romano

Neste, veremos três fases:• Fase pré-clássica – José Carlos Moreira Alves11

ensina que, nesta fase não se havia concebido a idéia deque entes abstratos pudessem ser sujeitos de direitossubjetivos, à semelhança das pessoas físicas, o que requeriacapacidade de abstração incompatível com aquele período;

10 Por separação patrimonial, entende-se que a personalidade jurídica adquireautonomia patrimonial, na qual, o patrimônio social não de confunde com osdos sócios, sendo o patrimônio da sociedade, seja ele qual tipo for, responsávelpelas obrigações contraídas por esta. O art. 20 do Código Civil de 1916, tratavada regra da separação absoluta dos patrimônios. Verifica-se que a sociedadecomercial têm como princípios gerais a separação patrimonial e a limitação daresponsabilidade dos sócios, devendo serem analisados à luz da boa-fé, doabuso de direito e da fraude à lei.11 ALVES, José Carlos Moreira. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 19.

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• Fase clássica - surgi a noção de que, ao lado dohomem, certas entidades abstratas, que não vão além dascorporações, podem também ser titulares de direitos; e

• Fase pós-clássica - chegaram os Romanos àidealização de uma das espécies de pessoa jurídica: acorporação ou associação, que não se extinguia com amorte dos associados, desde que houvesse a substituiçãopor outros.

Concluiu-se ser esta uma das vantagens da pessoajurídica, por permitir superar a fragilidade humana para aconsecução de determinados objetivos, mediante acontinuidade de esforços que excede a duração da vidahumana e a formação de patrimônio superior ao individual.

No Direito Romano a construção da pessoa jurídicacomo ente autônomo, sujeito de relações jurídicas, é frutoda teorização iniciada por Sinibaldo Fieschi (futuroInocêncio IV), retomada pela pandectística e acolhida emtodos os ordenamentos contemporâneos, com base naqual vem justificada a separação, imposta pelasnecessidades práticas, entre a responsabilidade daspessoas singulares e do ente, e dos respectivospatrimônios.12

2.2.3. Direito germânico

O Direito germânico teve sua influência em matériade associações ao solicitar menos esforço de abstração,o que se conciliava melhor com os tempos antigos. Estesconheciam as associações como livres, porém nãodistinguiam entre estas e seus membros, principalmentequanto à responsabilidade civil e pessoal, atribuição debens, direitos de uso, representação em juízo, etc.

A primeira tentativa de sistematização foi com osglosadores que a fixaram em brocados, e acolhiam um

12 GOMES. Op. cit., nota 3, p. 19.

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direito de quota dos associados sobre os bens comuns e umasubsidiária responsabilidade pelos débitos e obrigações dauniversitas.

2.2.3. Direito canônico

Os canonistas aproveitaram-se do conceito decorporação ou universitas, redescorberto pelos glosadores,transformando-o e chegando, em ousadia institucional, àconcepção da pessoa ficta sive intellectualism, simplesesquema ou nomem iuris.

Encontraram-se facilitados através da possibilidade derecorrer à terminologia figurativa adotada pela espiritualizaçãodas relações materiais na congregatio fidelium, corpusmysticum Christi e na Igreja, a mater fidelium ou a sponsaChristi, transferidas do campo teológico para o jurídico,fornecendo o material semântico para a idéia de personalidadeabstrata, distinta da mera soma ou totalidade dos componentes.

No ordenamento canônico, o conceito de instituição seencontrava latente e a doutrina o colocou em evidência. Aconcentração e autoridade da organização eclesiástica, quesubtraem, na vida coletiva, o ente à livre disposição dos seusmembros, dão a nota de indivisível unidade e entremostram ovínculo unitário que entrelaça a Igreja, gerando o seu dominiumeminens.

A elaboração canonista encontra seu ápice comSinibaldo Fieschi.

Cabe ressaltar que, os ensinamentos dos canonistasinfluenciaram os civilistas.

2.3. Noçôes Gerais e o nascedouro da personalidadejurídica

A noção universitas estende-se abrangendo todo tipode ente de caráter público ou privado, com substrato

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corporativo ou institucional e as próprias piae causae sãoimpelidas para as categorias das ecclesiae ou dos collegiapauperum.

Na teoria da ficção, infiltram-se elementos daconcepção germânica como:

• do direito dos membros utilizarem os bens comunsiure colegii sive universitatis;

• do direito à quota no caso de dissolução ou lícita retirada; e• da corresponsabilidade pelas obrigações da universitas.Aqui já se aborda sobre a boa-fé e a má-fé, sobre o

dolo, o animus possidendi, e ainda da acusação criminal,por decorrência de identificação entre a corporação e atotalidade dos seus membros.

Ressalta-se que diplomas datados de 1903 e 1907,(Decreto n.º 1.102, de 21/11/1903 e Lei n.º 1.637, de 05/01/1907), instituía regras para o estabelecimento dearmazéns gerais, e outorgando aos sindicatospersonalidade civil, reconheciam personalidade àquelesentes.

Existem outras ocasiões legais, nas quais, respondeo sócio pelas obrigações sociais, em conformidade como preceituado no art. 350 do Código Comercial (hojerecepcionado pelo novo Código Civil, art. 1.024) mesmoalém da sua participação normal, conforme também severifica nos arts. 10 e 11 do Decreto n.º 3.078/1919, quantoas sociedades por quotas de responsabilidade limitada.Percebe-se que as legislações citadas já traziam aresponsabilização dos seus sócios, mesmo sendo estasdatadas de 1850 (Código Comercial) e 1919 (Lei queregulamenta a sociedade por quotas de responsabilidadelimitada).

Em casos que não estejam expressamentecontemplados em lei, não quer dizer que deixem deincorrer em responsabilidade as situações diversas. Comoexemplo, podemos citar o fato de que: quando um sóciovenha auferir proveitos de atos praticados pela sociedade,guiado pela sua vontade em proveitos de objetivos

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individuais, confundindo seus patrimônios, e sendopromíscuos os negócios sociais e os negócios destesócio, revelando-se assim, insuficiente o patrimônio dasociedade para responder por obrigações contraídas noevidente interesse do sócio que a controla soberanamente,verifica-se que há a responsabilidade por estas obrigaçõesque consequentemente serão inadimplidas, causandoinjusto e intolerado prejuízo a credores, já que estes ao sevincularem agiram na mais pura boa-fé. Os credorespoderão buscar os bens do sócio, independentemente daforma societária. Trata-se do típico caso de abuso de poderdeste sócio que agia soberanamente, e que ainda fraudavao objetivo da sociedade, lesionando terceiros.

O princípio da separação patrimonial entre sociedadee os membros que a integram, há ser concebido emconsonância com valores resguardados pela ordemjurídica, como a proteção da boa-fé13 (princípio basilar detodo Direito), a repulsa ao abuso de direito e, o exorcismodos resultados injustos que decorrem da indevida utilizaçãode figuras e institutos.

Quando não observados tais valores, postos àdisposição dos homens para o atendimento de fins de quese desviam, camufla-se para fuga da responsabilidade emdetrimento de toda a tessitura social, tendo comoconseqüência o abalo da segurança da sociedade, onde

13 FABIAN, Christoph. O dever de informar no direito civil. São Paulo: Ed.Revista dos Tribunais, 2002. p. 59-67, entende que: "O termo jurídico 'boa-fé'é uma cláusula geral. O princípio da boa-fé penetra em todas as relações dodireito privado.(...) A boa-fé como cláusula geral, não é um termo vazio. Elacontém um conceito valorativo." Veja quanto a boa-fé, o completo conceitode MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor:o novo regime das relações contratuais. 4.ª ed. ver., atual. e ampl. São Paulo:RT, 2002. p. 181: "A boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação refletida,uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual,respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativasrazoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução,sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir obom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realizaçãodos interesses das partes."

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se torna necessário a imputação de responsabilidades deacordo com as reais posições assumidas nodesenvolvimento dos negócios, tendo como objetivodesvendar o que realmente se passou, para recuar airresponsabilidade dos que se comprometem, sobre omanto e por meio da pessoa jurídica, objetivando destaforma, restaurar o prestígio do critério e a confiança nasrelações sociais, base da ordem jurídica.

Nos dias atuais, a pessoa jurídica possui uma funçãosocial, abarcando a Teoria Institucionalista da Empresa,conforme preceitua o art. 116, parágrafo único, da Lei n.6.404/76 (Sociedade por ações), no qual, se verifica quea empresa tem uma função social a cumprir, e nestesentido, o interesse da sociedade sobrepõe-se aos dossócios. A Teoria Institucionalista da Empresa, surgiu dareunião de outras duas teorias: a Teoria da Empresa e aTeoria da Sociedade em si. Na primeira, havia acontraposição entre o fim social com obtenção de lucro eo objeto social (realização da atividade para a qual foidesenvolvida), na qual, diante do choque de interesses,deverá prevalecer o objeto social. Na segunda, distingui-se o interesse da sociedade do interesse do sócio, e nessecaso, o interesse da sociedade deveria sobrepor-se aointeresse do sócio.

Isto posto, pode-se verificar que o sistema jurídicopermite e reclama a aplicação da teoria dadesconsideração da personalidade jurídica, ponto queveremos a seguir.

2.4. Teorias

No que concerne as Teorias, visando adesconsideração da personalidade jurídica, existem trêsvertentes doutrinárias: a Teoria Subjetiva, Teoria inspiradana Jurisprudência de Interesses e Teoria Intermédia, o queanalisaremos abaixo.

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1.ª - Teoria Subjetiva (Rolf Serick e Drobnig):- conceito unitário de desconsideração, ligado a uma visãounitária da pessoa jurídica, como ente dotado de essênciapré-jurídica;- não distinção entre tipos de pessoa jurídica com relaçãoà organização interna;- verifica-se que é o elemento subjetivo, principalmenteno que concerne ao abuso de direito, a medida daadmissibilidade da desconsideração;- a desconsideração da autonomia jurídica e patrimonial éexceção, para Serick, a personalidade jurídica é a regra.

Em conformidade com o entendimento defendido porSerick, a Dr.ª Carla C. Marshall,14 em sua rica obra Asociedade por quotas e a unipessoalidade, diz:

O Prof. Serick ao desenvolver a teoriada desconsideração o fez, tendo emvista seu caráter subjetivo, o quesignifica que, a não ser que sejaevidenciada a fraude ou abuso daautonomia patrimonial da pessoajurídica, não se pode falar emdesconsiderá-la. O elo de ligação queautoriza a aplicação da teoria emquestão está ligada à manipulação daautonomia patrimonial, daí apossibilidade de, quanto aquele fato ounegócio específico, ir buscar o autorda manipulação, perpetuando-se,todavia, os demais atos e a própriaempresa.

Para Drobnig, a penetração se dá para fins deresponsabilidade e elenca quatro formas principais:15

• penetração direta – credor da sociedade buscaatingir o sócio da sociedade devedora;

14 MARSHALL, Carla C. A sociedade por quotas e a unipessoalidade. Rio deJaneiro: Ed. Forense, 2002. p. 144.15 DROBNIG, Ulrich. Apud OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 333-334.

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• penetração invertida – credor do sócio buscaacionar a sociedade;

• penetração limitada direta – em caso de falência évedado ao sócio fazer valer pretensão contra a sociedade,para assim aumentar as possibilidades de satisfação doscredores; e

• penetração especial - a responsabilidade pessoalque a lei especial tenha imposto aos titulares de contasde determinada espécie de sociedade, é tambémestendida aos casos em que tais titulares são, por suavez, sociedades de capitais.

No que tange a titularidade de poder absoluto sobrea outra sociedade, o domínio por si só não justifica adesconsideração. Além de que, o desrespeito a formassocietárias e a mistura de negócios e valores, tambémpor si só, não justificam a desconsideração.

Diz que o controle ou domínio de outra sociedadenão pode autonomamente ser considerado causa para adesconsideração, a não ser que haja uma mistura deesferas ou negócios, ou a sucção do patrimônio dasociedade pelo sócio ou sociedade dominante.

Conforme verifica-se a desconsideração tem porfinalidade levantar o véu da pessoa jurídica que lhe deucausa, quando esta agir com abuso de direito ou fraude àlei, não importando na extinção da personalidade jurídicacomo um todo, mas em uma espécie de perda de eficáciapara certos sócios e bens, que deverão responder peloato danoso, abusivo ou fraudulento.

2.ª Teoria inspirada na Jurisprudência de Interesses(Müller Freienfels)- a personalidade jurídica não passa de um mero símbolo;- a pessoa jurídica é diferente da pessoa natural, e hádiferentes pessoas jurídicas;- defende um tratamento diferenciado das pessoasjurídicas segundo as diversas funções econômicas quedesempenham;

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- conhecida como teoria dos centros de imputação;- dominante na Alemanha, deveria ser chamada de anti-unitária;- a pessoa jurídica depende da ordem pública, na qual, aidéia de ordem pública e a finalidade da norma devem seros critérios a informar toda a matéria da desconsideração.Importante ressaltar que a norma procura determinar oescopo de cada norma em particular, para determinar aqual sujeito (sócio ou sociedade) deverá ser aplicada;- entende ser decisivo o alcance e o sentido da normajurídica concreta, relativamente a uma determinada unidadede imputação;- decisivo também é o interesse dos credores e o equilíbrioa ser assegurado entre eles.

Müller, critica o unitarismo e o subjetivismo de Serick,mas também não acolhe a tese objetivista. Sua saída seriauma interpretação para se tentar desvendar qual afinalidade da norma.16

O autor afirma que o esquema regra/exceção deSerick erra ao ver na personificação jurídica – e,consequentemente, no seu contrário, a desconsideração– um fenômeno unitário. Diz ainda que, respeitar ou não aseparação patrimonial depende da análise da situaçãoconcreta e da verificação do objetivo do legislador ao imporuma determinada disciplina.17

3.ª Teoria Intermédia (Rudolf Reinhardt, PeterErlinghagen, Ottmar Kuhn e Kalter)- atribui valor próprio, institucional a pessoa jurídica;- concede valor próprio ao princípio da separação;- não-unitarista;- a transposição destes limites configura o abuso doinstituto, sendo este determinado por critérios objetivos.

16 FREIENFELS, Müller. Apud OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 364.17 SALOMÃO FILHO, Calixto. O novo direito societário. 5ª ed. São Paulo: Ed.Malheiros, 2002. p. 85-86.

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Para Reinhardt, primeiro autor partidário da funçãoinstitucionalista, no qual, a pessoa jurídica tem valor próprioe institucional. Este autor considera sobremaneira asociedade unipessoal, quebrando o unitarismo de Serick.

O abuso do instituto da pessoa jurídica é configurávelatravés de critérios objetivos, determináveis por meio dereferência à princípios jurídicos superiores.

Diz ainda que: “a personalidade jurídica não seidentifica com a pessoa dos sócios.”18

Erlinghagen, um objetivista, tendo sua obra datadade 1960, ilustra muito bem seu objetivismo: “A separaçãojurídica da sociedade e de seus sócios deixa de existirsempre que – e na medida em que – isso seja necessáriopara evitar resultados juridicamente condenáveis.”19

Quanto a Kuhn, trata-se de um objetivista, anti-unitarista e que prega o dever de compensar. Já Kalter,versa sobre a subcapitalização20 e demonstra o retorno àposição subjetivista.

Agora que já conhecemos as teorias maissignificativas, quanto a desconsideração da personalidadejurídica, podemos verificar o seu desenvolvimento.

A Teoria da Desconsideração da PersonalidadeJurídica (Disregard Doctrine), foi desenvolvida no Direitonorte-americano, sob a exigência de serem enfrentadassituações em que, sob a corporação, ou em grupo desociedades, a nova realidade gerada pelo capitalismoindustrial, na qual, o controlador, pessoa natural ou outrapessoa jurídica, emprestava à entidade sob seu comandodestinação incompatível com os fins para o qual fora

18 REINHARDT, Rudolf. Apud OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 368-369.19 ERLINGHAGEN, Peter. Apud OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 384.20 Entende-se por subcapitalização, segundo OLIVEIRA. Op. cit. nota 4, p. 427,como sendo a desproporção entre o âmbito ou volume de negócios e o capitalpróprio, de forma que o capital seja demasiadamente pequeno, gerando perigo,ou melhor, receio de iliquidez. Diz ainda: "A subcapitalização poder ser, issosim, instrumento de um comportamento contrário aos bons costumes, quandocaracteriza a intenção de lesar terceiros."

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constituída, servindo para encobrir outras, não condizentescom os princípios jurídicos como o da boa-fé e outros queregem a vida societária. Os Tribunais não hesitaram emcaracterizá-los como abusivos de direito, levantando o véuda pessoa jurídica, penetrando-a até ao seu substrato,material e humano, para ensejar a responsabilização dosseus membros ou qualificá-la, de acordo com a realidadeque veste, para fins de aplicar-se a devida regra legal.Ressalta-se que a Teoria da Desconsideração não visaanular a personalidade jurídica, objetiva sim,desconsiderar, no caso concreto, dentro de seus limites,a pessoa jurídica em relação às pessoas ou bens queatrás dela se escondem.21

Esclarecendo ainda, a doutrina diferenciadesconsideração de despersonificação. Na primeira, temcomo objetivo desconsiderar apenas no caso concreto, oinstituto da pessoa jurídica. A segunda têm por finalidadeanular a personalidade jurídica, por lhe faltar condiçõesde existência (casos de invalidade do contrato social oudissolução de sociedade).

A Teoria da Desconsideração, teve sua origem najurisprudência, sobretudo sendo amplamente desenvolvidano sistema da common law, principalmente nos EUA. Masa maioria dos estudiosos acreditam que sua origem foi naInglaterra, no final do século XIX, onde identifica-se com o“leading case” conhecido como Salomon x Salomon & Co.,julgado pela House of Lords - última instância, em 1897,que de forma resumida, trata-se:

Salomon x Salomon & Co. – Ocomerciante individual Aaron Salomon,

21 Neste mesmo entendimento, veja Prof. Fábio Ulhoa Coelho, onde diz que estateoria liga-se profundamente ao princípio da preservação da empresa, já queo que se pretende ao aplicá-lo é coibir o mau uso da pessoa jurídica, declarando-se a ineficácia da autonomia da personalidade jurídica, somente, em relação àconduta fraudulenta ou abusiva da pessoa que a utilizou indevidamente,permanecendo a sociedade existente, válida e eficaz para todos os outrosaspectos de sua vida jurídica. Apud AMORIM, Manoel Carpena. Desconsideraçãoda Personalidade Jurídica. In: Revista da EMERJ. V. 2. Nº 8. p. 65-66.

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havia constituído uma company, emconjunto com outros seis componentesda sua família, e cedido seu fundo decomércio à sociedade que fundara,recebendo em conseqüência vinte milações representativas de suacontribuição, enquanto para cada umdos outros membros coube apenasuma ação para a integração do valorda incorporação do fundo de comércioà nova sociedade. Salomon recebeuobrigações garantidas no valor de dezmil libras esterlinas. A sociedade logoem seguida se revelou insolvável, sendoo seu ativo insuficiente para satisfazeras obrigações garantidas, nadasobrando para os credoresquirografários. O liquidante, nointeresse dos credores quirografários,sustentou que a atividade da company

era atividade de Salomon que usou deartifício para limitar a suaresponsabilidade e, em conseqüência,Salomon deveria ser condenado aopagamento dos débitos da company,

devendo a soma investida na liquidaçãode seu crédito privilegiado, serdestinada à satisfação dos credores dasociedade. O Juízo de primeirainstância e depois a Corte acolheramessa pretensão, julgando que acompany era exatamente umaatividade fiduciária de Salomon, oumelhor, um seu agent ou trustee, e queele, na verdade, permanecera como oefetivo proprietário do fundo decomércio. Era a aplicação de um novoentendimento, desconsiderando apersonalidade jurídica de que serevestia Salomon & Co. A Casa dos

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Lordes reformou, unanimemente, esseentendimento, julgando que a company

havia sido validamente constituída, nomomento em que a lei simplesmenterequeria a participação de sete pessoasque haviam criado uma pessoa diversade si mesmas. Não existia, enfim,responsabilidade pessoal de AaronSalomon para com os credores deSalomon & Co., e era válido o seucrédito privilegiado.”22

Requião assinala que, apesar de ter surgido naInglaterra com o caso exposto acima, a Teoria daDesconsideração obteve sucesso nos Tribunais alemãs,onde foi desenvolvida sob o nome de Teoria daPenetração, e principalmente, nos Tribunais norte-americanos, onde recebeu a designação de Disregard oflegal Entity, devido as peculiaridades existentes nestespaíses.23

As Cortes decidiram, sob a inspiração da equity,invocando conceitos basilares, assim como o já citado,de boa-fé, sendo este um dos pilares do Direito americanodas sociedades, e hoje do moderno direito das obrigaçõesda civil law, como as idéias matrizes de: consciênciapopular dominante, realidade da vida, força ou poder dosfatos, ou ainda, exigências da vida econômica.

O Jurista alemão, Rolf Serik, apenas na segundametade da década de 50, com a publicação do seutrabalho, Aparencia y Realidad en las SociedadesMercantiles, tradução espanhola de Puig Brutau.Barcelona: Ed. Ariel, 1958, foi o primeiro a desbravar

22 Descrição de REQUIÃO, amparado na monografia do Prof. Piero Verrucoli,da Universidade de Pisa, intitulada "Il Superamento della Personalità Giuridica

delle Società di Capitali". Apud BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito

societário. 5.ª ed. rev., aum. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 65-66.23 REQUIÃO. Apud AMORIM, Manoel Carpena. Op. cit., nota 21, p. 57.

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sistematizando o tema, onde discorreu longamente sobre oDireito Alemão, sobre cujas decisões se dedicou, paramostrar ser lícito ao juiz to look to the behind the mask, todaa vez que a pessoa jurídica, técnica utilizada para objetivosque o ordenamento não desaprova, for empregada, emautêntico abuso, atentatório da boa-fé, em destinação alheiaou contrária à vida societária.24

Em 1955, R. Serick, teve suas conclusões aplaudidas,no que diz respeito as críticas recebidas, mas a doutrina noDireito daquele país, prescrevia que a personalidade daspessoas jurídicas se distingue daquela das pessoas físicasde uma maneira essencial, tanto quanto se considere a suaextensão como se observe a sua transparência.

Na metade dos anos 50 também se desenvolveu umateoria que procurou atingir os mesmos efeitos dadesconsideração – e daí seu pioneirismo – sem, no entanto,lidar com o conceito de pessoa jurídica, que foi desenvolvidapor W. Bigiavi, que utilizava a figura do “sócio tirano”, ou seja,aquele que usa a sociedade como se fosse coisa própria.25

A responsabilidade ilimitada do sócio tirano, é atribuída pormeio de sua equiparação com o empresário oculto, para oqual já havia deduzido uma regra de responsabilidadepessoal. A desconsideração da personalidade jurídica queesta teoria implica é bastante evidente, ainda que assim, nãoseja qualificada expressamente.

O jurista Wormser, citado por Rubens Requião,26 em“O abuso do direito e fraude através da personalidade jurídica”,professava a seguinte doutrina:

... quando o conceito de pessoajurídica (corporate entity) se empregavapara defraudar credores, para subtrair-

24 SERIK, Rolf. Aparencia y Realidad en las Sociedades Mercantiles. Traduçãoespanhola de Puig Brutau. Barcelona: Ed. Ariel. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p.10.25 SALOMÃO FILHO. Op. cit., nota 17, p. 77.26 REQUIÃO, Rubens. O abuso do direito e fraude através da personalidadejurídica. In: Revista dos Tribunais. nº 410. nº 2. 1969. p. 67-84.

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se uma obrigação existente, paradesviar a aplicação de uma lei, paraconstituir ou conservar um monopólioou para proteger velhacos oudelinqüentes, os tribunais poderãoprescindir da personalidade jurídica econsiderar que a sociedade é umconjunto de homens que participaativamente de tais atos e fará justiçaentre pessoas reais.

Requião assinala que, os tribunais norte-americanosalargaram mais ainda o conceito, aplicando a doutrinaquando a desconsideração da pessoa jurídica levar a umresultado injusto, partindo assim, do conceito de fraude,basilar na enumeração de Wormser, para abrangertambém o abuso de direito.27

Erigiu-se um fundamento comum para a civil law e acommon law, jurisprudencialmente e casuísticamente,onde conferiram pronta resposta ao problema à concepçãode que a personalidade jurídica das sociedades de capitalderiva de privilégio concedido pelo Estado, no qual não seadmite que operasse contra este ente público ou suasfinalidades.

No que tange a casuística, segundo entendimentode Salomão Filho,28 verifica-se alguns resultadosaplicativos, como:

• Desconsideração atributiva – que permite aaplicação de certas normas em forma coerente com aintenção do legislador, possuindo quatro casos:- características pessoais do sócio podem ser atribuídasà sociedade;- comportamentos dos sócios podem ser atribuídos àsociedade;

27 Ibidem, p. 69.28 SALOMÃO FILHO. Op. cit., nota 17, p. 88-97.

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- conhecimento dos sócios podem, em certos casos, seratribuídos à sociedade; e- proibições impostas ao sócio podem ser estendidas àsociedade.

• Desconsideração para fins de responsabilidades- confusão de esferas, subcapitalização e abuso de forma,podendo se configurar tanto uma quanto outra.- confusão de esferas: caracteriza-se quando adenominação social, a organização societária ou opatrimônio da sociedade não se distinguem de forma clarada pessoa jurídica;- subcapitalização: esta se divide em simples e qualificada.Na primeira, ocorre quando a subcapitalização não éevidente, tornando-se necessário evidenciar a culpa oudolo dos sócios, em não proverem o capital suficiente àatividade social. Na outra, o capital social é insuficientepara o cumprimento dos objetivos e da atividade social;- abuso de forma: distingui-se entre individual einstitucional. Neste último, caracteriza-se por umautilização do privilégio da responsabilidade limitada deforma contrária a seus objetivos e função. Suacaracterística diferencial é a possibilidade dedesconsideração à favor de qualquer credor. Na individual,utiliza-se da personalidade jurídica com o objetivoespecífico de causar dano a terceiro, e só este podepleitear a desconsideração.

• Desconsideração em sentido inverso – a doutrinae jurisprud6encia alemã, atribuí sua utilização somente associedades unipessoais. Uma das principais razõesinvocadas para a limitação da desconsideração em sentidoinverso, é exatamente a necessidade de proteção do capitalsocial, visando a garantia dos credores. Parte da doutrinaadmite este tipo de desconsideração, somente quando setrata de caso em que o sócio tenha criado a aparência denegociar em nome da sociedade.

• Desconsideração em benefício do sócio – ocorrenos casos de atribuição de legitimidade ao sócio único

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para postular em nome próprio o ressarcimento de danossofridos pela sociedade. Possui dois requisitos: o primeiroé que a sociedade não possa obter ressarcimento emnome próprio; e o segundo é que se trate de sociedadeunipessoal.

2.5. Conceito de desconsideração de personaliadejurídica

Necessário se faz a exposição, de alguns juristasque muito colaboraram para a formação da Teoria daDesconsideração da Personalidade Jurídica, tendo emvista uma melhor composição para se chegar ao seuconceito.

Lamartine Corrêa de Oliveira, em sua obra: A duplacrise da pessoa jurídica,29 analisa com profundidade aproblemática da desconsideração, que dilargou os lindesda sua investigação, aos direitos estrangeiros, máxime oalemão, comentando ainda, excelentes pareceres deinsignes jurisconsultos:

• Francisco Campos – recorre ao negócio jurídicoindireto, onde conferiram soluções, na linha dadesconsideração, a casos de criação de interposta pessoajurídica por sócios de outra, julgada inidónea, paraprosseguir negociando com a Administração. Exemplificano caso em que uma sociedade foi constituída porsimulação;

• Caio Mário da Silva Pereira – recorre a figura decontrato consigo mesmo, onde à alienação pelo marido,em desavenças com a mulher, munido de procuração dela,de bens do casal à companhia em que detinha 99,93 %das ações; e

• Simão Isaac Benjó – recorre a simulação fraudulenta,onde à fixação de alimentos devidos à mulher por marido

29 OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 542-550.

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que se qualifica como empregado de sociedade de quefora sócio.

Lamartine, em sua obra já citada, p. 613, eposteriormente à análise e objeções de cunho dogmáticoa várias correntes que procuram justificar adesconsideração, com penetração e amplitude científica,dentre as quais, as de inspiração subjetiva, expõe seupensamento:

Os problemas de desconsideraçãoenvolvem freqüentemente um problemade imputação. O que importabasicamente é a verificação daresposta adequada à seguintepergunta: no caso em exame, foirealmente a pessoa jurídica que agiu,ou foi ela mero instrumento nas mãosde outras pessoas, físicas ou jurídicas?É exatamente porque a nossaconclusão quanto à essência dapessoa jurídica se dirige a uma posturade realismo moderado, repudiados osnormativismos, os ficcionismos, osnominalismos, que essa pergunta temsentido. Se é em verdade uma ou outrapessoa que está a agir, utilizando apessoa jurídica como escudo, e se éessa utilização da pessoa jurídica, forade sua função, que está tornandopossível o resultado contrário à lei, aocontrato, ou às coordenadasaxiológicas fundamentais da ordemjurídica (bons costumes, ordempública), é necessário fazer com quea imputação se faça com predomínioda realidade sobre a aparência.

30 VARELA, Antunes. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 29.

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Nesse mesmo sentido, tinha razão Antunes Varela30

quando afirmava visar a “desconsideração em corrigir acontradição entre a aparência e a realidade, na constituiçãoe funcionamento da pessoa jurídica.”

Adere também a corrente da despersonalização, oeminente desembargador Dr. Wellington MoreiraPimentel,31 em seu artigo: A aplicação da Teoria doSuperamento da Personalidade Jurídica, onde conclui:

... não negar aquela a existência dapersonalidade jurídica da sociedade decapital, nem a distinção e separaçãoentre o patrimônio desta e dos sócios,mas despreza e supera tais conceitose distinções se a pessoa jurídica éusada como escudo para aresponsabilidade civil por ato ilícito,para a prática de fraudes ou emdetrimento do interesse público.

Da mesma forma, sob a invocação de fraude à lei, oinsigne processualista Calmon de Passos, abraça a teseda desconsideração.

Em conformidade com a Teoria daDesconsideração, verifica-se a obra do Dr. Marçal JustenFilho,32 Desconsideração da personalidade societária nodireito brasileiro, em que:

... partindo da historicidade doconceito, contingente, de pessoajurídica, propugna por suadesestimação, que diz com a ineficáciada personificação, ao verificar-se o seuabuso, que terá lugar quando o

31 PIMENTEL, Wellington Moreira. A aplicação da teoria do superamento dapersonalidade jurídica. In: Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado

do Rio de Janeiro. N.º 2. 1981. p.13.32 JUSTEN, Marçal Filho. Desconsideração da personalidade societária no

direito brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1987. p.154-158.

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sacrifício do interesse alheio se originarde uma util ização anormal esurpreendente da pessoa jurídica.

Entre nós e pioneiro, versando o assunto de formaespecífica e com tratamento esquemático, foi o Prof.Rubens Requião, no final da década de 60, em conferênciana Faculdade de Direito da Universidade Federal doParaná, na palestra intitulada “Abuso de direito e fraudeatravés da personalidade jurídica”, onde atentou para ofato de que a personalidade jurídica, poder vir a ser utilizadacomo anteparo de fraude ou abuso de direito, sendo certoque, em alguns casos, a diferença entre a pessoa jurídicae o sócio, se constitui em mera aparência. Seus estudosse basearam nas obras de Piero Verrucoli e Rolf Serick.

O autor invoca os limites da concessão dapersonalidade jurídica pelo Estado, que não pode serutilizada contra seus fins, e funda a teoria dadesestimação, no nosso Direito, sobre os conceitos deabuso de direito e fraude.33

O emérito Prof. Fábio Comparato,34 discorda do Prof.Requião, no que tange aos fundamentos para adesconsideração, inclinando-se para a corrente objetiva,ao desprezar como tais a fraude e o abuso de direito, aseu pensar insatisfatórios, assentando-a como decorrentedo poder do controle societário, critério para adesestimação, onde assim expõe:

De tudo o que se vem expor, decorreque esse efeito jurídico fundamental dapersonalização - separação depatrimônios - que pode ser atingido poroutras técnicas de direito, comolembramos, deve ser normalmente

33 REQUIÃO, Rubens. Op. cit., nota 26, p. 67-84.34 COMPARATO, Fábio. O poder de controle na sociedade anônima. 3.ª ed. Riode Janeiro: Ed. Forense, 1983. p. 271 e ss.

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afastado, quando falte um dospressupostos formais, estabelecidosem lei; e também, quando desapareçaa especificidade do objeto social deexploração de uma empresadeterminada, ou do objetivo social deprodução e distribuição de lucro – oprimeiro como meio de se atingir osegundo; - ou, ainda, quando ambosse confundem com a atividade ou ointeresse individuais de determinadosócio.

Visando finalizar a exposição dos eméritos, insignesdoutrinadores, jurisconsultos, enfim estudiosos do Direito,veremos em síntese lapidar, o que descreve o Prof. ArnoldWald:

Se formos examinar a evolução dialéticada personalidade jurídica na históriacontemporânea, encontraremos umatese, uma antítese e uma síntese. Atese foi no sentido de considerá-la umaficção, fazendo depender ofuncionamento da sociedade anônimade decisão do poder público, que lheconcedia a personalidade. Em seguida,passamos à antítese. Sociólogos,historiadores e juristas reconhecem aexistência do grupo, como realidadesocial autônoma e independente doindivíduo, com vontade própria eresponsabilidade limitada em todas ashipóteses, não se admitindo que osatos da empresa possam repercutir naspessoas físicas dos seus diretores eacionistas.Finalmente, ocorre a síntese. Diante dosabusos, fraudes e distorções, o direito,reconhecendo a personalidade própriada empresa, não permite mais que

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possa funcionar como uma espécie debiombo ou véu para garantir aimpunidade de diretores ou acionistas.Sucessiva ou simultaneamente, odireito penal, o direito fiscal, o direitotrabalhista e o direito falimentarconsagram o princípio da transparênciaou da desconsideração da pessoajurídica, não aceitando que a sociedadeanônima possa encobrir a fraude dosdiretores e acionistas. Assim sendo,predominam, em ocasiões normais, osprincípios que asseguram aindependência entre a empresa e oacionista, mas passam a ser aplicadas,eventual ou excepcionalmente, quandohá dano causado a empregados,acionistas minoritários, credores outerceiros em geral, as normas quealcançam, atrás ou através da pessoajurídica, as pessoas físicas que amanipulam e cujos atos ilícitos aempresa acobertava.35

A matéria é muito recente em nosso ordenamento,anteriormente constava-se de assentadas dajurisprudência (veremos no Cap. IV), vindo contempladas,ainda que casuísticamente e isoladamente, em textoslegislativos, nos dias atuais porém, encontramospreceituado em dois códigos do nosso Direito Pátrio, ondeo primeiro a conter tal teoria foi o Código de Defesa doConsumidor (Lei n.º 8.078/90), no seu artigo 28; e osegundo e mais recente foi o Novo Código Civil (Lei n.º10.406/02), em seu artigo 50, os quais serão objeto deestudo no Cap. III.

Diante de todo o exposto, podemos conceituar ateoria da desconsideração da personalidade jurídica, comoaquela que poderá ser argüida, quando um ente da

35 WALD, Arnold. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 28.

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sociedade, agir contrário a lei, com abuso de direito e/oufraude, visando prejuízo a outrem, em benefício próprio eem contrariedade com o fim que se destina a sociedade,burlando assim, a transparência36 que lhe deveria serbasilar.

3. Noções de direito comparado e a desconsideraçãoda personalidade jurídica

3.1. Direito brasileiro

Desde 1916, no art. 20 do Código Civil, continha anorma sobre a separação patrimonial, tratando-se tambémda responsabilidade subsidiária.

A questão referente a responsabilização dos sócios,diretores, gerentes e/ou administradores, foi evoluindo emconformidade com as legislações referentes a cada tiposocietário. (Cap. III)

Adentrando no campo da Teoria da Desconsideraçãoda Personalidade Jurídica, esta foi iniciada no nosso DireitoPátrio, pelo Prof. Rubens Requião, no fim da década de60, fundado nos casos de fraude e abuso de direito. Sendoque não foi profundamente assimilada por nosso contextojurídico.37

Apesar da forma tímida, foi sendo utilizada pelajurisprudência, visando a quebra do princípio da separaçãopatrimonial, a fraude ao dever contratual e a fraude à lei. Ajurisprudência não possuía critérios fixos, para determinarquando e sob que pressupostos, os tribunais estavampropensos a romper o véu corporativo.

Alguns autores chegam a afirmar, a existência noordenamento brasileiro, de hipóteses de desconsideração

36 FABIAN, Op. cit., nota 13, p. 70 "... serve a transparência para realizar alealdade e confiança. E, finalmente devem as partes agir com clareza para obterconfiança e ser leais em relação à outra parte." O autor entende ainda, que atransparência é um subprincípio da boa-fé, elencando o art. 51, IV, do CDC.37 MARSHALL. Op. cit., nota 14, p. 138.

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da personalidade jurídica, como por exemplo: CLT – art.2.º, § 2.º (resp. solidária) ; CTN – art. 134 (resp. solidária)e art. 135 (resp. pessoal e direta); Decreto-Lei n.º 3.708/19 – art. 10 ( resp. solidária e ilimitada); Lei n. º 6.404/76 –art. 1.º (resp. limitada), art. 117 (resp. por abuso de poder),e art. 158 (resp. do administrador).

O que se pode afirmar é que o Código de Defesa doConsumidor, foi a primeira legislação brasileira, a fazermenção expressa à desconsideração da personalidadejurídica, apesar de sua redação sofrer críticas por algunsautores, devido a dissonância com a elaboração doutrináriada Teoria.

Mais recentemente, podemos citar o art. 50 doCódigo Civil/2002, que traz no seu bojo a desconsideração,sendo certo também que o seu texto é objeto de críticas,por não ter trazido de forma pura a teoria enfocada.

3.2. Direito Inglês

No Direito Inglês, não teve muita liberdade paracrescer, tendo em vista a força vinculativa do precedente,que mais adstringe, a reter a evolução do instituto. Irradiou-se a doutrina disregard para o direito continental, onde osjuristas se esforçaram para justificá-la com fórmulas dopassado, enquadradas no sistema sob a invocação deconceitos e de princípios gerais como o abuso do direito.

O Prof. João Casillo, baseado no estudo do Prof.Ben A. Wortley, cita seis casos em que as Cortes inglesasconsideram, para além da fachada da pessoa jurídica, arealidade constituída pelo poder econômico que pertenceaos membros ou diretores, em algum momento. São eles:casos de fraudes e declarações inexatas; controle emtempo de guerra; no Direito fiscal, quando há subordinaçãode uma empresa a outra, com controle de fato; nassociedades subordinadas em função de alguns benefíciosfiscais e outros interesses; em imunidades de entidades

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privadas controladas por Estados estrangeiros; e, naexpropriação de bens de sociedades estrangeiras situadasna Inglaterra.38

3.3. Direito Alemão

Foi o jurista Rolf Serick, o primeiro a desbravar esistematizar o tema, possibilitando ao juiz desconsiderara pessoa jurídica toda vez que esta for utilizada com abusoatentatório a boa-fé e em destinação contrária à vida dasociedade. Entende que, em qualquer lugar que seapresente a separação entre a pessoa jurídica e seusmembros, propõe-se o problema de evitar resultadosinjustos e contrários ao Direito.39

O jurista concluiu poder dar-se a desestimação emdois casos: quando a pessoa jurídica é utilizadaabusivamente para fins ilícitos; e, para vincular certasnormas com a pessoa jurídica.

Ainda quanto ao estudo de Direito Comparado queprocedeu, extrai quatro regras gerais, que possibilitampenetrar-se na pessoa jurídica: nos casos de abuso; burlaà lei; a infração de obrigações contratuais; e, em casosde prejuízo fraudulento a terceiros.

3.4. Direito Italiano

Na Itália, segundo Prof. Piero Verrucoli,40 diante dadoutrina de Superamento (transpõe-se a pessoa jurídica),o poder central contém e corrige a força dos gruposrestabelecendo o equilíbrio comprometido, combate os

38 CASILLO, João. Desconsideração da pessoa jurídica. In: RT. v. 528. ApudGOMES. Op. cit., nota 3, p. 15.39 SERICK, Rolf. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 13.40 VERRUCOLI, Piero. Il Superamento della Personalità Giurídica. Milano:Giuffrè, 1941. p. 202, n. 240. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 10.

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abusos dos privilégios concedidos, realiza os finsprosseguidos que resultem de qualquer modocomprometidos por um rígido respeito formalístico dooutorgado privilégio da personalidade jurídica.

Segundo o autor, disserta concernir o problema dosuperamento ao uso indireto do esquema societário, parafins não consentidos na lei e para contornar obstáculosfixados por normas imperativas para os particulares. Expõeque a superação deve dar-se em decorrência de:

a) direta realização de interesses do Estado (denatureza tributária, política, no atinente à nacionalidade dasociedade);

b) repressão à fraude e também à fraude contratual;c) da realização de interesses de terceiros, quando

não milite fraude até o momento inicial da operação(constituição do contrato, estipulação do contrato); e

d) da realização dos interesses dos sócios.Observa-se que na hipótese b) exige o elemento

intencional – há a intenção de fraudar, e na c) o elementoobjetivo do dano.

Nicola Distaso,41 sustenta não se enquadrar osuperamento na simulação nem no negócio indireto,devendo estruturar-se autonomamente sobre as estacasda boa-fé e repulsa ao abuso.

3.5. Direito Francês

Segundo Jean Foyet,42 as decisões dos tribunaisacolhem a tese da mise en écart de la personne morale,

em que ora declara que a sociedade e a personalidadesão puramente aparentes, fictícias, ou fraudulentas; ora asociedade tem existência certa, porém é controlada pôrcertos associados ou dirigentes que detém o seu poder

41 DISTASO, Nicola. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 16.42 FOYET, Jean. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 17.

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econômico. Mas, Jean diverge destes critérios, propondo,o exame das relações entre sócios e a sociedade,concluindo ser a personalidade jurídica concebida comouma técnica ordenada a fins essencialmente práticos elimitada por esses fins.

3.6. Direito Suíço

Informa o Prof. Jacques-Michel Grosen,43 ser estávela jurisprudência quando aceitar a desconsideração,recorrendo, às vezes, aos conceitos de abuso de direito eviolação de interesses legítimos, no qual exemplificacitando o caso de uma sociedade anônima controlada poruma ou interposta pessoa.

Destaca, porém, poder a doutrina dadesconsideração ser invocada a benefício da sociedade,como na hipótese de uma das empresas de uma holding

não haver usado certa marca no prazo da sua caducidade,mas outra tê-lo feito, hipótese em que a perda do direitonão se dá.

3.7. Direito Argentino

Héctor Masnatta,44 diz que a doutrina possui um

largo alcance desde 1941, e que impõe ser vista sob três

ângulos:

• doutrinário;

• jurisprudencial; e

• legislativo.

43 GROSEN, Jacques-Michel. Apud GOMES. Op. cit., nota 3, p. 17.44 MASNATTA, Héctor. El Abuso del Derecho atraves de la Persona Colectiva

- Teoria de la Penetración. Apud. GOMES. Op. cit., nota 3, p. 17.

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3.8. Direito Espanhol

Puig Brutau,45 em preciosos e fundados comentáriosà obra de Serick, explana que apesar da doutrina dadisregard não ter sido objeto de aberta discussão, no seupaís, na realidade está presente em diversos problemasque reclamam uma diretiva que lhe forneça a soluçãomais adequada. Assevera que, se esta não está a reclamaruma profunda revisão do conceito de pessoa jurídica,serve para assinalar os limites além dos quais aparececomo resultado absurdo de uma jurisprudência maquinala obtenção de deduções à base de uma premissailusoriamente acariciada. O conceito de pessoa jurídica,entre os juristas espanhóis já havia amadurecido aconvicção de transformar a tradicional e rotineira crençana personalidade jurídica das sociedades mercantis.

Examina aspectos da doutrina da Disregard como:a transferência do local de negócio; a sociedadeunipessoal, a relatividade do conceito de pessoa jurídicanas diferentes categorias societárias, a incongruência entrea estrutura jurídica e a base econômica da sociedade, aquestão em face de terceiros, e, a nacionalidade dassociedades.

3.9. Direito Português

Em conformidade com o Código Civil português, art.998, n.° 2, no que tange a responsabilidade por fatos ilícitos,preceitua que: “Não podendo o lesado ressarcir-secompletamente, nem pelos bens da sociedade, nem pelo

45 PUIG BRUTAU. Apud. GOMES, Op. cit., nota 3, p. 17-18.* O estudo de Direito Comparado foi baseado nas riquíssimas aulas do Dr.Desembargador e Prof. Luiz Roldão de Freitas Gomes, de Direito CivilAprofundado e Comparado, no curso de Pós-Graduação em Direito Privado,da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), e tambémno seu artigo: A desconsideração da pessoa jurídica, publicado em Separatada Revista "O Direito", ano 122.º, 1990, I. p. 7-40.

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patrimônio do representante, agente ou mandatário, ser-lhe-á lícito exigir dos sócios o que lhe faltar, nos mesmostermos em que o poderia fazer qualquer credor social.”(verifica-se a figura do lesado comparado ao credor social)

4. A desconsideraçao da personalidade jurídica e aslegislaçoes pertinentes

4.1. Leis Anteriores

4.1.1. CLT – Consolidação das Leis do Trabalho(aprovada pelo Decreto-Lei n.º 5.452/43)

Art. 2. º, parágrafo 2.º - prever a responsabilidadesolidária, para efeitos da relação empregatícia, da empresaprincipal e cada uma das subordinadas, quando constituamum grupo industrial, comercial ou de qualquer atividadeeconômica.

Tal dispositivo prescreve a solidariedade entreempresas do mesmo grupo econômico, como por exemploo caso das empresas de holding.

4.1.2 . CTN – Lei n.º 5.172/66 - Código TributárioNacional

Art. 134, VII - quanto a responsabilidade solidária dossócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas;

Art. 135, III - quanto a responsabilidade pessoal dosdiretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicasde direito privado, resultante de atos praticados comexcesso de poder ou infração à lei, contrato social ouestatutos.

Esta legislação, que dispõe sobre o SistemaTributário Nacional e institui normas gerais de direitotributário aplicáveis à União, Estados e Municípios, nos

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artigos citados, refere-se a créditos correspondentes aobrigações tributárias, onde já verifica-se o termo infraçãoà lei e excesso de poder, no qual este último, pode serinterpretado como abuso de direito.

Tais regras legais trazem duas hipóteses deresponsabilidade dos sócios, pela obrigação tributária.No art. 134, versando sobre a responsabilidade solidária,e no art. 135, III, a responsabilidade direta e pessoal.

4.1.3. Decreto n.º 3.708/19 – Sociedades por quotasde responsabilidade limitada.

Este decreto é a mais antiga provisão que abriga apenetração até ao sócio gerente.

Art. 10 - Os sócios-gerentes respondem solidáriae ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atospraticados com violação do contrato ou da lei;

Art. 11 - Preceitua que, além da responsabilidadecriminal, cabe ação de perdas e danos em face do sócioque usar indevidamente da firma social ou que delaabusar.

Podemos verificar que em se tratando de umalegislação datada de 1919, já trazia em seu bojoresponsabil idade perante terceiros solidária eilimitadamente, além de perdas e danos, na qual,despertava o abuso de direito e violação à lei.

4.1.4. Decreto-Lei n.º 7.661/45 – Lei de Falências

Art. 191 - na falência das sociedades, equipara osseus diretores, administradores, gerentes ou liquidantesao devedor ou falido, para todos efeitos penais previstosna Lei.

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4.1.5. Lei n.º 3.807/60 – Lei Orgânica da PrevidênciaSocial.

Art. 86, parágrafo único - quando impõe sanção adiretores, gerentes e sócios solidários por falta derecolhimento de contribuições;

4.1.6. Lei n.º 4.591/64 – Condomínios em edificaçõese as incorporações imobiliárias.

Art. 43, III, in fine - quanto a responsabilidadesubsidiária que incide sobre os bens pessoais doincorporador, no caso de falência deste;

Art. 65, parágrafo 1.º, II - elencando no caput tratar-se de crime de economia popular promover incorporação,fazendo propostas com afirmação falsa. No § 1.º, II, aocominar a mesma pena aos diretores e gerentes deempresa coletiva, incorporadora, corretora ouconstrutora, que usarem, ainda que a título deempréstimo, em proveito próprio ou de terceiro, bens ouhaveres destinados à incorporação por administração,sem prévia autorização dos interessados.

4.1.7. Lei n.º 4.595/64 – Conselho Monetário Nacional

Art. 34, III, IV e V - quanto a proibição às instituiçõesfinanceiras de efetuar empréstimo ou adiantamentos àspessoas físicas ou jurídicas que participem do seu capital,com mais de 10%;

Art. 42 - quanto a responsabilidade solidária dosdiretores e gerentes das instituições financeiras pelasobrigações assumidas durante a sua gestão;

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4.1.8. Lei n.º 4.729/65 – Crime de sonegação fiscal.

Art. 6.º - caso de verdadeira responsabilidade penal,em se tratando de pessoa jurídica, que serão responsáveistodos os que direta ou indiretamente estejam ligados àmesma, de modo permanente ou eventual, que tenhampraticado ou concorrido para prática da sonegação fiscal.

4.1.9. Lei n.º 6.024/74 – Intervenção e liquidaçãoextrajudicial de instituições financeiras.

Art. 36 - quanto a indisponibilidade dos bens de seusadministradores em geral, na hipótese de intervenção,liquidação extrajudicial ou falência, que terão todos os seusbens indisponíveis, até a apuração e liquidação final desuas responsabilidades;

Art. 40 - quanto a responsabilidade solidária dosadministradores de instituições financeiras, pelasobrigações assumidas durante sua gestão, até que secumpram.

4.1.10. Lei n.º 6.404/76 – Sociedades por ações.

Art. 1.º - trata da responsabilidade dos sócios ouacionistas, que será limitada ao preço as emissão dasações subscritas ou adquiridas.

Verifica-se que este preceito legal, versa sobre aresponsabilidade do sócio perante a companhia, por débitopróprio, e não responsabilidade do sócio perante terceiros,por débito da companhia;46

Art. 116 - versa sobre a possibilidade do acionistaresponder pessoalmente, em razão da sua atuação comoadministrador ou controlador da sociedade;

46 AMORIM. Op. cit., nota 21, p. 59.

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Art. 117 – que elenca a responsabilidade do acionistacontrolador pelos danos causados por atos praticadoscom abuso de poder;

Art. 158 - dispõe sobre a responsabilidade civil doadministrador pelos prejuízos que causar, quandoproceder: dentro das suas atribuições ou poderes, comculpa ou dolo; e com violação da lei ou do estatuto. Nosparágrafos deste artigo, ressalta-se a responsabilidadesolidária do administrador pelos prejuízos causados noexercício das funções.

Nesta legislação também se verifica o termo violaçãoà lei, e abuso de poder.

5. Lei N.º 8.078/1990 - Código de Defesa do Consumidor

Até o advento do Código de Defesa do Consumidor,não constava de texto de lei tal teoria, a não ser porinfluência de jurisprudência e da doutrina da disregard,fundada no abuso de direito, ato ilícito e/ou fraude à lei,pôde verificar-se a sua aplicabilidade.

Entre nós, começou a ser adotada no final da décadade 60, pelo Prof. Rubens Requião, conforme já foi expostoacima.

O CDC, ao acolher em suas disposições ospostulados da disregard doctrine, seguiu os passos dessatendência rompendo com o esquema rígido da autonomiapatrimonial das sociedades personalizadas.

Conforme entendimento de Cristina Tereza Gaulia,“com o surgimento do art. 28 da Lei nº 8.078/90, ficaram,entretanto, superadas todas e quaisquer dúvidas que ooperador jurídico nacional podia ter a respeito do tema.”47

47 GAULIA, Cristina Tereza. A desconsideração da personalidade da pessoajurídica no Código de Defesa do Consumidor: eficácia das decisões judiciais.In: Revista de Direito do Consumidor, n. 43. São Paulo: Revista dos Tribunais,2003. p. 165.

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Vejamos o que preceitua o art. 28, do CDC:

O juiz poderá desconsiderar apersonalidade jurídica da sociedadequando, em detrimento do consumidor,houver abuso de direito, excesso depoder, infração da lei, fato ou ato ilícitoou violação dos estatutos ou contratosocial. A desconsideração tambémserá efetivada quando houver falência,estado de insolvência, encerramentoou inatividade da pessoa jurídicaprovocados por má administração.§ 1.º - Vetado (A pedido da parteinteressada, o juiz determinará que aefetivação da responsabilidade dapessoa jurídica recaia sobre o acionistacontrolador, o sócio majoritário, ossócios-gerentes, ao administradoressocietários e, no caso de gruposocietário, as sociedades que aintegram).§ 2.º - As sociedades integrantes dosgrupos societários e as sociedadescontroladas são subsidiariamenteresponsáveis pelas obrigaçõesdecorrentes deste Código.§ 3.º - As sociedades consorciadassão solidariamente responsáveis pelasobrigações decorrentes deste Código.§ 4.º - As sociedades coligadas sóresponderão por culpa.§ 5.º - Também poderá ser desconsideradaa pessoa jurídica sempre que suapersonalidade for, de alguma forma,obstáculo ao ressarcimento deprejuízos causados aos consumidores.

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Analisando o caput do dispositivo, podemos verificarque:

1.º - A tarefa do juiz não é puramente cognoscível,muito menos mecânica, mas valorativa dos interesses emconflito, além de ser criativa de novas normas, onde odispositivo teve a cautela de autorizar a aplicação dadesconsideração como faculdade do juiz, a cujo prudentearbítrio confiou o exame preliminar e a aferição dospressupostos, para concessão da medida externa. Porém,alguns autores criticam o poder do juiz como umafaculdade, quando deveria ser uma imposição;

2.º - Elenca todas as hipóteses materiais para aincidência da desconsideração, visando ampla proteçãoao consumidor, assegurando-lhe assim, livre acesso aosbens patrimoniais dos administradores sempre que odireito subjetivo de crédito resultar de quaisquer daspráticas “abusivas” constantes neste dispositivo. No quese refere ao abuso de direito, aborda a funcionalização dapessoa jurídica, que deverá estar em conformidade comos fins que se destina. Cabe ressaltar que muitosdoutrinadores,48 não concordam, devido ao excesso depoder, a infração da lei, fato ou ato ilícito, violação deestatutos e do contrato social, não serem pressupostospara a desconsideração, pois já está previsto em leis queregulamentam as sociedades, como por exemplo: art. 10do Dec. nº 3.708/19, e arts. 148, 153 e 158, da Lei nº 6.404/76, entre outros;

3.º - quanto a falência é necessário uma minuciosaaferição do caso concreto, sendo também necessário apresença de fraude ou abuso de poder. No que concernea má administração, quando verificada, a responsabilidaderecairá sobre o administrador, ou sobre aquele a quem sepossa diretamente atribuir a prática do ato.

48 Neste entendimento compartilham Fábio Ulhoa Coelho, Manoel Carpena Amorime José Edwaldo Tavares Borba, em conformidade com as obras já citadas nocorpo deste trabalho.

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Vejamos o entendimento de José Borba:

A noção de má administração, para quese verifique a desconsideração, deverápressupor a administração ruinosa,pautada em meios fraudulentos,envolvendo dilapidação patrimonial, queacabam por tornar insolvável asociedade. Não poderá haver, (...) adesconsideração por fato de simplesincompetência administrativa (...). Oadministrador honesto, de boa-fé,porém infeliz nos atos deadministração, sendo até mesmoincompetente, não poderá serresponsabilizado com estribo nopreceito legal em comento. (...) oconceito de má administraçãoencontra-se sintonizado com aquelesatos que fazem presumir a falência doempresário, elencados no art. 2.º,incisos II e IV do Dec.-Lei n.º 7.661.45,embora a eles não se limite.49

Quanto ao veto do parágrafo 1.º, entendeu oPresidente da República à época, que o caput já continhaos elementos necessários à aplicação dadesconsideração, que constitui, doutrina amplamentedominante no direito pátrio e alienígena, técnicaexcepcional de repressão a práticas abusivas.

Os demais parágrafos, 2.º, 3.º e 4.º, disciplinam aresponsabilidade solidária, em via principal ou subsidiária,das sociedades componentes dos grupos societários, bemcomo das sociedades consorciadas e coligadas. Istoposto, o consumidor lesado poderá prosseguir na cobrançacontra as demais integrantes, em via subsidiária. Porém,interessante se faz esclarecer que, no plano sistemático,

49 BORBA, Op. cit., nota 22, p. 69.

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todos os parágrafos padecem do vício de pertinência,devido a verdade que, estariam melhor situados na SeçãoIII, relativa à responsabilidade por vício do produto ouserviço, e não como se apresentam, na Seção IV, ondepreceitua o tema deste estudo.

No § 3.º, do art. 28, derrogou-se expressamente oart. 278 e segs. da Lei de Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76) criando, nas relações de consumo, um vínculo desolidariedade entre as empresas consorciadas, embenefício do consumidor, tendo em vista que, o consórcioconforme disciplina os artigos citados acima na referidaLei, é mera reunião de sociedades que se agrupam paraexecutar determinado empreendimento, onde verifica-seque no consórcio não há personalidade jurídica e, emprincípio, as consorciadas somente se obrigam em nomepróprio, sem previsão de solidariedade (§ 1.º, do art. 278).

No § 4.º, regulamenta a responsabilidade dassociedades coligadas, onde verifica-se que as sociedadesse associam a outras, porém conservam a respectivaautonomia patrimonial e administrativa, o Código admiteapenas sua responsabilidade na ocorrência de culpa, ouseja, em caráter excepcional, quando ficar demonstradoque participaram do evento danoso ou incorreram em víciode qualidade ou quantidade por negligência ouimprudência. Ainda quanto a responsabilidade dassociedades coligadas, disposta no § 1.º do art. 245 da Lei6.404/76, que participam com 10% ou mais do respectivocapital social, porém não chegam a exercer o respectivocontrole acionário.

Enfim o § 5.º, no que tange a eficácia, reconhece oseu comprometimento, no plano das relações de consumo,apesar de também sofrer críticas, e deve ser aplicado emconjunto com o caput.

Segundo Fábio Ulhoa Coelho,50 os parágrafos 2º, 3ºe 4º, em nada equipara-se com a desconsideração. Diz

50 COELHO, Fábio Ulhoa. Apud. BORBA. Op. cit., nota 22, p. 67.

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que: “... a dissonância entre o texto da lei e a doutrinanenhum proveito traz à tutela dos consumidores, aocontrário, é fonte de incertezas e equívocos.”O autor mais adiante ressalta que, o preceito legal omitiu-se quanto a fraude, que segundo ele é o ”principalfundamento para desconsideração.”

Ulhoa traduz que a Teoria da Superação só se mostrapertinente:

... quando a responsabilidade não podeser, em princípio, diretamente imputadaao sócio, controlador ou representantelegal da pessoa jurídica. Se aimputação pode ser direta, se aexistência da pessoa jurídica não éobstáculo à responsabilização dequem quer que seja, não há porquecogitar do superamento de suaautonomia. E quando alguém, naqualidade de sócio, controlador ourepresentante legal da pessoa jurídica,provoca danos a terceiros, inclusiveconsumidores, em virtude decomportamento ilícito, responde pelaindenização correspondente. Nessecaso, no entanto, estará respondendopor obrigação pessoal, decorrente doilícito em que incorreu.51

Segundo este entendimento de Ulhoa, pode-seconcluir o porque ele critica os parágrafos 2.º, 3.º e 4.º, doCDC, já que não há que se falar em desconsideração dapessoa jurídica, uma vez que, esta pode responder deforma direta.

Vejamos o que diz o Prof. Calixto Salomão:52

51 Ibidem, p. 67-68.52 SALOMÃO FILHO. Op. cit., nota 17, p. 116.

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Apenas no Código de Defesa doConsumidor nota-se uma menorpreocupação com a neutralidade dasleis e sua utilização com funçãosubstitutiva (Ersatzfunition) nasrelações em que o mercado em si nãoconsegue estabelecer um equilíbrioentre as partes. Os §§ 2.º a 4.º impõea responsabilidade subsidiária dassociedades de grupo controladas econsorciadas pelos débitos perante oconsumidor sem qualquerdemonstração de culpa. Finalmente, o§ 5.º contém uma norma geral, capazde dar liberdade ao juiz, que prevê adesconsideração sempre que apersonalidade jurídica for, de qualquermodo, um óbice ao ressarcimento dosdanos causados ao consumidor.

Confrontando o CDC com as regras legais do Direitosocietário, percebe-se que, na realidade o art. 28 do CDC,preceitua casos de responsabilidades dos representantesda sociedade, que se encontram preceituadas de formapacífica no Direito societário.53

O que também torna-se percebível, é que o referidoCódigo, não menciona a fraude, sendo este fundamentoprimeiro da pura Teoria da Desconsideração, onde permiteao juiz levantar o véu da personalidade jurídica, para enfim,verificar o que se encontra por trás da mesma. O que uneo preceituado no CDC, à Teoria da Desconsideração, ésimplesmente o abuso de direto, este é o elo de ligaçãoexistente entre eles. 54

Apesar de todas as críticas sofridas, Manoel CarpenaAmorim,55 declara: “... o mencionado artigo representou

53 Compartilham desse entendimento, MARSHALL, REQUIÃO, ULHOA, entre outros.54 Conforme entendimento da Ilustre Dr.ª e Prof.ª MARSHALL. Op. cit., nota 14, p.140; e do Prof. REQUIÃO. Op. cit., nota 26, p.15.55 AMORIM. Op. cit., nota 21, p. 60.

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inegável avanço em função da possibilidade de sua aplicaçãoanalógica.”

Sem cogitar qualquer dúvida, o CDC viabilizou opreenchimento da lacuna que existia em nosso ordenamentojurídico, quando preceituou a doutrina da desconsideraçãoda personalidade jurídica, o que há muito vinha sendoidealizado nos projetos do Novo Código Civil, hoje estandopreceituado no seu art. 50, onde afirmava-se a necessidadede alinhamento da ordem jurídica à realidade apresentadaem nossos tribunais.

6. Lei n.º 8.884/94 - Lei Antitruste

Esta legislação dispõe sobre a prevenção e arepressão às infrações contra a ordem econômica, etambém constatou-se a existência de um artigo preceituandoa possibilidade de desconsiderar a personalidade jurídica,mas em muito verifica-se o que já foi preceituado no CDC,ocorrendo uma dissonância56 com a Teoria daDesconsideração. O art. 18, dispõe:

A personalidade jurídica do responsávelpor infração da ordem econômicapoderá ser desconsiderada quandohouver da parte deste abuso de direito,excesso de poder, infração da lei, defato ou ato ilícito ou violação dosestatutos ou contrato social. Adesconsideração também seráefetivada quando houver falência,estado de insolvência, encerramentoou inatividade da pessoa jurídicaprovocados por má administração.

56 Segundo entendimento, MARSHALL. Op. cit., nota 14, p. 139.

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408 A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Necessário não se faz, um amplo comentário sobreo referido dispositivo, tendo em vista sua semelhança como art. 28 do CDC, uma vez que já foi exaustivo seucomentário no tópico anterior.Mas, nítida é a demonstração que o art. 18, da citada lei,também não toca no que tange a fraude, preceituadoapenas o abuso de direito.

Percebe-se que o legislador ordinário da LeiAntitruste agregou os atos da administração, como sendoelementos passíveis de identificação, quando daaplicabilidade da desconsideração, sem ter mencionadoa fraude, elemento indispensável para a elaboração dateoria discutida.57

7. Lei n.° 9.605/98 – Proteção Ao Meio Ambiente

O meio ambiente é constitucionalmente garantido,no art. 170, VI da CF/88, quando é elencado como um dosprincípios da ordem econômica, com a finalidade deassegurar a todos existência digna, conforme os ditamesda justiça social; e no art. 225 da CF/88, no qual, verifica-se que o meio ambiente é direito de todos, essencial àqualidade de vida, sendo responsabilidade do PoderPúblico e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para aspresentes e futuras gerações. Vejamos o dispositivo naíntegra:

Art. 225. Todos têm direito ao meioambiente ecologicamente equilibrado,bem de uso comum do povo essencialà qualidade de vida, impondo-se aoPoder Público e à coletividade o deverde defendê-lo e preservá-lo para aspresentes e futuras gerações.

57 Ibidem, p. 140.

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Cabe ressaltar também, o § 3.º, do art. 225, queversa sobre as sanções penais e administrativas depessoas físicas ou jurídicas, pelas condutas e atividadesconsideradas lesivas ao meio ambiente,independentemente da obrigação de reparar os danoscausados.

Nesta legislação, Lei nº 9.605/98, no art. 4.º, verifica-se a preocupação com o meio ambiente a ponto de versarsobre a possibilidade de desconsideração da pessoajurídica, visando o ressarcimento dos prejuízos causadosà qualidade do meio ambiente, tendo em vista ser este,direito de todos. Vejamos o dispositivo na íntegra:

“Art. 4.°. Poderá ser desconsiderada a pessoajurídica sempre que sua personalidade for obstáculo aoressarcimento de prejuízos causados ̀ a qualidade do meioambiente.”

8. Projeto do Novo Código Civil

O Anteprojeto do Código Civil, datado de 1972, noseu art. 49, trazia uma disposição onde visava prevenir erepelir abusos perpetrados à sombra da pessoa jurídica.

Mas necessário foi uma nova análise, sendoencaminhada a Comissão Revisora e Elaboradora doCódigo Civil, onde o Ilustre Prof. Miguel Reale foi supervisor,devido à excessiva sanção prevista no Anteprojeto anterior.É do nosso conhecimento as inúmeras correções ereexames pela qual passaram as alterações propostas,até chegarmos a atual Lei n.º 10.406/02, que passou avigorar em nosso ordenamento jurídico a partir de 10/01/03, conforme preceituado em seu art. 2.044.

A desconsideração da personalidade jurídica,havendo sofrido objeções a redação originária, buscaramos autores do anteprojeto aperfeiçoá-la, conforme declarou

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o Prof. Miguel Reale, na Exposição de Motivos doAnteprojeto Revisto (MJNI, 1973, p. 8):

Alguns outros pontos da Parte Geralmerecem, outrossim, referência, como,por exemplo, a solução adotada no art.48, que condena o uso indevido dapersonalidade jurídica, quando desviadados fins econômicos-sociais quelegitimam a distinção entre opatrimônio dos sócios e o das pessoasjurídicas. Foi julgada procedente acrítica quanto à excessiva sançãoprevista no anteprojeto anterior,estatuindo-se, agora, ou tão-somentea exclusão do sócio responsável, queresponderá perante a pessoa jurídicae terceiros, ou, então, tais sejam ascircunstâncias, até mesmo adissolução da associação ou dasociedade.

No discutível artigo do Projeto de Lei n.º 634-B, de1975, já aprovado pela Câmara dos Deputados, o assuntoem tela vinha abordado da seguinte forma:

A pessoa jurídica não pode serdesviada dos fins estabelecidos no atoconstitutivo, para servir de instrumentoou cobertura à prática de atos ilícitos,ou abusivos, casos em que poderá ojuiz, a requerimento de qualquer dossócios ou do Ministério Público,decretar a exclusão do sócioresponsável, ou, tais sejam ascircunstâncias, a dissolução daentidade.Parágrafo único. Neste caso, semprejuízo de outras sanções cabíveis,responderão, conjuntamente com os

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da pessoa jurídica, os bens pessoaisdo administrador ou representante quedela se houver utilizado de maneirafraudulenta ou abusiva, salvo se normaespecial determinar a responsabilidadesolidária de todos os membros daadministração.58

Tal texto, ainda recebeu críticas, no que diz respeitoa não permitir a terceiros, maiores interessados, levantaro véu da pessoa jurídica. Limitou a responsabilidade aosbens do administradores, quando na verdade todos os quese encontram atrás da entidade deveriam responder, alémdisso, quanto a dissolução da sociedade ou exclusão dosócio constituem penalidade, o que não é imposta peladisregard.

Verifica-se que, por influência da doutrina e dajurisprudência, a desconsideração entre nós, fundou-seem dois pilares: abuso de direito e ato ilícito ou fraude àlei.

Miguel Reale,59 atendendo a algumas ponderações,alterou a redação inicial do dispositivo, que passou a sero seguinte:

A pessoa jurídica não pode serdesvirtuada dos fins estabelecidos noato constitutivo, para servir deinstrumento ou cobertura à prática deatos ilícitos ou abusivos, caso em quepoderá o juiz, a requerimento dequalquer dos sócios ou do MinistérioPúblico, decretar a exclusão do sócioresponsável, ou, tais sejam ascircunstâncias, a dissolução daentidade.

58 GOMES. Op. cit., nota 3, p. 35-36.59 XAVIER, José Tadeu Neves. A teoria da desconsideração da personalidadejurídica no novo Código Civil. In: Revista de Direito Privado. nº 10. São Paulo:Ed. RT, 2002. p. 72.60 REQUIÃO, Apud XAVIER. Op. cit., nota 59, p. 73.

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O jurista Rubens Requião60 manifestou-se emsentido contrário, pois entendeu que o anteprojeto haviaelaborado solução diferente, determinando a dissoluçãoda sociedade, importando em punir os demais sóciosatingidos, o que não seria justo. O jurista inconformado,apresentou a seguinte proposta de redação:

A pessoa jurídica não pode serdesviada dos fins que determinaram asua constituição, para servir deinstrumento ou cobertura à prática deatos ilícitos ou abusivos de sócios.Neste caso, o juiz, desconsiderando aexistência da personalidade jurídica, ado credor do sócio, poderá permitir aefetivação de sua responsabilidadesobre os bens incorporados nasociedade para a sua participação nocapital social.

Porém, este novo texto substitutivo apresentado, nãofoi acolhido pela nossa doutrina, pois restringiu a Teoria daDesconsideração da Personalidade Jurídica aos casos emque ela serviria para atender às pretensões dos credoresparticulares dos sócios.

Enfim, veremos que grandes foram as mudanças atéchegar-se ao atual art. 50 do CC/2002, sendo notória atendência evolutiva do nosso Direito legislado, no queconcerne a desconsideração da personalidade jurídica.

9. Lei n.º 10.406/2002 - Novo Código Civil

O Novo Código Civil, em seu art. 50, trouxe preceituadoa Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica deforma objetiva, fala de desvio de finalidade e confusãopatrimonial. Não foi por acaso que preceituou desta maneira,

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pois tradicionalmente a desconsideração era aplicada quandohavia fraude à lei ou abuso de direito, porém a pesquisadesses elementos pressupõe uma certa investigação deordem subjetiva, ou seja, era preciso saber se havia aintenção de fraudar à lei, o que em termos de prova, eramuito complexo tal demonstração.

Quanto ao desvio de finalidade, verifica-se que oNovo Código Civil foi muito feliz ao adotar tal expressão,pois ela traduz algo eminentemente objetivo, demonstrávelmais facilmente, e em consonância com a razão de serda formação da pessoa jurídica.

Vejamos na íntegra tal dispositivo - art. 50 do NCC/02:

Em caso de abuso da personalidadejurídica, caracterizado pelo desvio definalidade, ou pela confusãopatrimonial, pode o juiz decidir, arequerimento da parte, ou do MinistérioPúblico quando lhe couber intervir noprocesso, que os efeitos de certas edeterminadas relações de obrigaçõessejam estendidos aos particulares dosadministradores ou sócios da pessoajurídica.

Em conformidade com o exposto acima, o Novo Códigotambém se refere ao abuso - “em caso de abuso dapersonalidade jurídica” – mas este se caracteriza pelo desviode finalidade ou pela confusão patrimonial.

José Tadeu Neves Xavier, entende que o elemento fraudeestá inserido de forma implícita no art. 50 do referido Código,quando faz referência ao abuso da personalidade jurídica e aodesvio de finalidade. Entende o autor: “Da mesma forma, abusca do ideal de justiça está presente em toda a atuação dodireito, não sendo necessário pontuar este aspecto.”61

No que tange a confusão patrimonial, verifica-se a suaocorrência, quando não fica claro a separação patrimonial, ou61 XAVIER.Op. cit., nota 59, p. 75.

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seja, a separação entre o patrimônio social e o do sócio, oudos sócios.

Para que não haja qualquer dúvida, já que o dispositivonão versou à respeito, a subcapitalização ocorre quando ocapital social é insuficiente para a realização dos fins daempresa, ou seja, trata-se da inadequação do capital aosrecursos necessários para o desempenho seguro daatividade social. Entre nós, não há lei que preceitue quantoao capital social mínimo, mas seguindo o princípio daadequação do capital social, é necessário que este sejaadequado para o desenvolvimento de sua atividade, nãogerando riscos no mercado.

Ressalta-se que muitas vezes ao lado da confusãopatrimonial, a subcapitalização tem sido apontada comocausa ensejadora da desconsideração. Porém algunsautores entendem que seria um sanção excessiva, já queo legislador não impôs a obrigação de capital mínimo, oque seria difícil exigir do sócio uma previsão correta, nomomento da constituição da sociedade.62

Através da desconsideração da personalidadejurídica, hoje codificada em nosso Direito, é possível levantar-se o véu da pessoa jurídica, para ver o que há por trás, ouseja, por ela penetra-se através da pessoa jurídica paraalcançar aquele que age com fraude à lei ou com abuso dedireito, não tendo desta forma, o objetivo de anular a pessoajurídica.

10. Análise de Jurisprudência

Este capítulo têm por objetivo ilustrar o que já foiexposto nos capítulos anteriores, através da decisões dosTribunais, verificando assim, a maneira pela qual vêm sendoaplicada a Teoria da Desconsideração da PersonalidadeJurídica.

62 Segundo entendimento de CALIXTO, Salomão Filho. Apud. XAVIER. Op. cit.,nota 59, p. 82.

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No Direito brasileiro, as jurisprudências possuem decisõesque evidenciam quebra do princípio da separação.

Lamartine de Oliveira63 classificou os julgados, de modogeral, em quatro categorias:

• Decisões que visavam impedir fraude a dever contratual- como por exemplo nos casos de contrato de venda de ações,onde posteriormente alega-se que não houve a assembléia paraa devida autorização; caso no qual o indivíduo contrata e depoisnão se responsabiliza, pois alega ser dever da pessoa jurídica;

• Decisões que visam proibir fraude à lei – venire contrafactum propirum (pessoa faz certo ato e depois alega esse atocomo fato impeditivo da responsabilidade);

• Decisões que desconsideram a separação apenas paralimitados efeitos de natureza processual;

• Decisões que, de modo genérico, estendem aresponsabilidade aos sócios em caso de insolvência dasociedade.

É interessante citar a súmula 486 do STF, que visoudesconsiderar a separação entre sócio e sociedade: “Admite-se a retomada para a sociedade da qual o locador, ou seucônjuge, seja sócio com participação predominante no capitalsocial.”

Constata-se através dos acórdãos proferidos pelosnossos Tribunais, que não há sintonia com os reais requisitosindispensáveis à concretização da Teoria da Desconsideraçãoda Personalidade Jurídica, mesmo assim vêm sendo aplicada.64

Vejamos a afirmação de Serick, quanto a aplicabilidade da teoriana jurisprudência:

... a jurisprudência há de enfrentar-secontinuamente com os casosextremos em que resulta necessárioaveriguar quando pode prescindir-se daestrutura formal da pessoa jurídica paraque a decisão penetre até o seu próprio

63 V. OLIVEIRA. Op. cit., nota 4, p. 524-529.64 MARSHALL. Op. cit. nota 14, p. 138.

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substrato e afete especialmente a seusmembros. 65

Apesar dos entendimentos acima citados, não sepode esquecer que os tribunais brasileiros vêm evoluindona aplicabilidade da teoria da desconsideração, chegandoinclusive ao mesmo entendimento de Serick, quanto adesconsideração ser exceção, e a regra ser a autonomiada pessoa jurídica, conforme veremos no acórdão abaixo,na p. 48, em um agravo de instrumento, proferido peloDes. Sérgio Cavalieri Filho, que teve votação unânime.

Os Tribunais invocam a necessidade de justiça docaso concreto!

Passemos então, para a exposição e análise dosjulgados, nos quais relatam a aplicabilidade dadesconsideração.

RE 94.066-9 - RJ, Relator MinistroClóvis Ramalhete, DJU de 2 de Abrilde 1985, p. 2885, cuja ementa:Personalidade Jurídica. Possíveldesconsiderar-se a personalidade dapessoa jurídica sob controle absolutoda pessoa física, se ambas em conluiopara fraude a direito de terceiros. –Aplicação da teoria inglesa e norte-americana da disregard of legal entity,surgida no direito mercantil, masaplicável igualmente no civil como notributário.66

Verifica-se neste julgado datado de 1985, apossibilidade de desconsideração no caso de fraude contraterceiros, estendendo sua aplicação à esfera civil etributária.

65 SERICK, Rolf. Rechtsform und Realitaet Juristischer Personen, p. 14. Apud.MARSHALL. Op. cit., nota 14, p. 138.66 GOMES, Op. cit., nota 3, p. 29.

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AC. da 1.ª Câm. Cív. do TJ do RGS, 8de maio de 1984, Rel. Des. AthosGusmão Carneiro, destaca-se:Sociedade por quotas deresponsabilidade limitada. Execuçãofiscal com penhora dos bens do sócio-gerente. Embargos de terceiro.Sociedade realmente fictícia, em queo sócio-gerente é dono de 99,2 % docapital, sendo os restantes 0,8 % desua mãe e de um concunhado. Aassertiva de que a pessoa da sociedadenão se confunde com a do sócio é umprincípio jurídico básico, não um tabu,e merece ser desconsiderada, quandoa sociedade é apenas um alter ego deseu controlador, em verdadecomerciante em nome individual. Liçãode Konder Comparato. Embargos deterceiro rejeitados. Apelação provida.67

Este julgado ressaltou a aplicabilidade do princípioda separação patrimonial, desconsiderando apersonalidade, quando há a confusão patrimonial. Nomesmo sentido, foi a decisão da Ap. Cív. n.º 584036800,1.ª Câm. Cív do TJRGS, 15 de maio de 1985, Rel. Des.Athos Gusmão Carneiro.

No Tribunal de São Paulo, utilizando a norma doCDC, e tratando-se de empresa sucessora comresponsabilidade solidária, interessante é a jurisprudênciacitada por Luiz Antônio Rizzatto Nunes, vejamos a decisão:

Defesa do Consumidor – Empresasucessora – Responsabilidade solidária– Teoria da desconsideração dapersonalidade jurídica – Aplicação.“A ré, desde 21-8-91 é sucessora daoriginal vendedora, tem mesmo fundo

67 Ibidem, p. 31.

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de comércio, mesmo ramo de atividadee mesmo endereço. Responde peloscontratos firmados pela antecessora.O Código de Defesa do Consumidor dizem seu art. 6.º - VIII (Direitos Básicos)– que há a inversão do ônus da provaquando verossímil: comprou, pagou,não recebeu e, a sucessora não querentregar. É caso para o MinistérioPúblico e também para as autoridadesFazendárias. No CDC, há solidariedadede responsabilidade (art. 18 e 19) e hádesconsideração da personalidadejurídica (art. 28) houve aqui flagranteato ilícito. Aplica-se, no caso, porinteiro o art. 28 em seu § 5.º;desconsidera-se a pessoa jurídicaquando sua personalidade for obstáculoao ressarcimento dos prejuízos doconsumidor.(TACSP, 11ª Câm., AC 557.007-2, Rel.Juiz Mendes de Freitas, j. 24-3-1994,ac. un., apte.: Lourival Rodrigues, apta.:Nihon Com. De Pisos e AzulejosLTDA., ementa IOB, por transcriçãoparcial – IOB, 3:9589).68

No caso exposto, verifica-se a incidência do CDC,no seu art. 28 e § 5.º, quanto a efetiva aplicabilidade dateoria da desconsideração, e ainda aos arts. 18 e 19,quanto a responsabilidade solidária, devido a existênciade flagrante ato ilícito. Não poderia deixar de ressaltar, acitação feita quanto ao ônus da prova, sendo este direitobásico do consumidor, conforme o dispositivo 6º, incisoVIII do CDC. Claro está que sempre que houver prejuízoaos consumidores, poderá ser desconsiderada a

68 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O Código de Defesa do Consumidor e sua

Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 303-304.

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personalidade jurídica, e desta forma, deve-se aplicarconjuntamente com o caput do art. 28 , o § 5.º, do CDC.No caso abaixo, do Superior Tribunal de Justiça, aplicouregra do CDC, por estar configurada a relação deconsumo, e ainda versa sobre as hipóteses de fraude edesvio de finalidade:

RESP. 252759/SP; Recuso Especial2000/0027914-5, DJ 27/11/2000, p. 157,Rel. Min. Carlos Alberto MenezesDireito, 12/09/2000, julgado pela 3.ªTurma do STJ.Ementa: Doutrina da desconsideraçãoda personalidade jurídica. Art. 28 doCódigo de Defesa do Consumidor.Precedentes.1.Não desqualificada a relação deconsumo, possível a desconsideraçãoda personalidade jurídica, provada nasinstâncias ordinárias a existência deato fraudulento e o desvio dasfinalidades da empresa, ainda maisquando presente a participação diretado sócio, em proveito próprio.2.Recurso especial não conhecido.69

Dando continuidade as decisões do STJ, vejamosalguns acórdãos:

ROMS 12872/SP; Recurso Ordinárioem Mandado de Segurança 2001/0010079-1, DJ 16/12/2002, P. 306, Rel.Min. Nancy Andrighi, 24/06/2002,julgado pela 3.ª Turma, STJ.Ementa: Processo civil. Recursoordinário em mandado de segurança.Falência. Grupo de sociedades.Estrutura meramente formal.

69 Acórdão retirado do site www.stj.gov.br, em 20/04/03, usando o seguintecritério de pesquisa: desconsideração da personalidade jurídica.

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Administração sob unidade gerencial,laboral e patrimonial. Desconsideraçãoda personalidade jurídica da falida.Extensão do decreto falencial a outrasociedade do grupo. Possibilidade.Terceiros alcançados pelos efeitos dafalência. Legitimidade recursal.Pertencendo a falida a grupo desociedades sob o mesmo controle ecom estrutura meramente formal, o queocorre quando as diversas pessoasjurídicas do grupo exercem suasatividades sob unidade gerencial,laboral e patrimonial, é legítima adesconsideração da personalidadejurídica da falida para que os efeitosdo decreto falencial alcancem asdemais sociedades do grupo.Impedir a desconsideração dapersonalidade jurídica nesta hipóteseimplicaria prestigiar a fraude à lei oucontra credores.70

A aplicação da teoria dadesconsideração da personalidadejurídica dispensa a propositura de açãoautônoma para tal. Verificados ospressupostos de sua incidência,poderá o Juiz, incidentalmente nopróprio processo de execução (singulare coletiva), levantar o véu dapersonalidade jurídica para que o atode expropriação atinja terceirosenvolvidos, de forma a impedir aconcretização de fraude à lei ou contraterceiros.Os terceiros alcançados peladesconsideração da personalidadejurídica da falida estão legitimados ainterpor, perante o próprio juízo

70 Ibidem, nota 68.

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falimentar, os recursos tidos porcabíveis, visando a defesa de seusdireitos.

Neste acórdão, pode-se dizer que será semprepossível desconsiderar a personalidade jurídica da falida,alcançando-se as demais sociedades do grupo. Necessáriose faz a ocorrência dos pressupostos, como fraude à lei eabuso de direito, e neste caso específico fraude contracredores. Outro ponto relevante é a possibilidade de aplicar-se a desconsideração na mesma ação, onde o juizincidentalmente, no próprio processo de execução, poderáproceder a desconsideração da pessoa jurídica.

RESP 63652/ SP; Recurso Especial1995/0017378-6, DJ 21/08/2000, p. 134,Rel. Min. Barros Monteiro, 13/06/2000,julgado pela 4.ª Turma, STJ.Ementa: Falência. Desconsideraçãoda Personalidade Jurídica. Duasrazões sociais, mas uma só pessoajurídica. Quebra decretada de ambas.Inexistência de afronta do art. 460 doCPC. O Juiz pode julgar ineficaz apersonificação societária, sempre quefor usada com abuso de direito, parafraudar à lei ou prejudicar terceiros.Consideradas as duas sociedadescomo sendo uma só pessoa jurídica,não se verifica a alegada contrariedadeao art. 460 do CPC. Recurso especialnão conhecido.

Neste dois acórdão citados acima, trata-se de casode falência, na qual verifica-se a possibilidade para adesconsideração, porém reforça a necessidade de incidênciados seus pressupostos como: abuso de direito, fraude à leiou a intenção de prejudicar a terceiros. E para ilustrar talnecessidade, vejamos:

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RESP 437086/ SP; Recurso Especial2002/0057665-6, DJ 10/03/03, p. 194,Rel. Min. Carlos Alberto MenezesDireito, 05/12/02, julgado pela 3.ª Turma.Ementa: Execução. Desconsideraçãoda personalidade jurídica.Descabimento.1. Considerando o Acórdão recorridoque não estão presentes ospressupostos para a aplicação dadoutrina da desconsideração dapersonalidade jurídica, dispondo aempresa executada de bens para agarantir a execução, não tem passagemo especial que pretende manter apenhora de bens com aquelasustentação. 2. Recurso especial nãoconhecido.

No acórdão abaixo, verifica-se que há divergênciajurisprudencial, quanto a necessidade de comprovaçãoda responsabilidade subjetiva, e não a simples presunção,no caso de execução fiscal de sociedade por quotas deresponsabilidade limitada.

RESP 8711/RS; Recurso Especial1991/0003665-0, DJ 17/12/92, p. 24233,Rel. Min. Peçanha Martins, 21/10/92,julgado pela 2.ª Turma, STJ.Ementa: Execução fiscal – Sociedadepor quotas de responsabilidade limitada– Penhora de bens de patrimônio desócio que não exerceu função dedireção – Decreto-Lei n. 3.708/19, art.16 e CTN, art. 135, III – Divergênciajurisprudencial.É impossível a penhora dos bens desócio que jamais exerceu a gerência,a diretoria ou mesmo representasse aempresa executada.

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Há de ser utilizada a Teoria daDesconsideração da PersonalidadeJurídica, prevalecendo o princípio daresponsabilidade subjetiva, e não asimples presunção. Recursoconhecido, mas desprovido.71

Dando continuidade, analisaremos alguns acórdãosdo TJ-RJ, que versam sobre a aplicabilidade dadesconsideração da personalidade jurídica, em casoscomo: incorporação imobiliária, penhora de bem de sócio,ação indenizatória e responsabilidade civil.

Apelação Cível, processo n.º2000.001.15063, 23/03/2001, 7.ª Câm.Cív., TJRJ, Des. Luiz Roldão F. Gomes,julgado em 06/02/2001.Ementa: Incorporação imobiliária.Venda de imóvel em construção. Imóvelregistrado em nome de terceiro. Atrasona entrega da obra. Inadimplementocontratual. Desconsideração dapersonalidade jurídica. Art. 28 do CDC.Propaganda enganosa. Exclusão damulta. Contravenção penal. Danomaterial. Dano moral. Descabimento.Civil. Incorporação imobiliária.Promessa de venda de fração de imóvele de apartamento a ser construído,outorgada por firma, que não haviadivulgado a incorporação doempreendimento. Atraso excessivonas obras, que inviabilizava sua entregano prazo, as quais se arrastaram porquatro anos no esqueleto. Ação doautor, visando privar o contrato deefeitos, com o retorno ao “status quo

71 Ibidem, nota 68 e 69.

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ante”, mediante a devolução dasprestações em dobro e cominação demulta moratória. Desconsideração dapessoa jurídica da ré, cabível porincidência do art. 28 do CODECON,tendo-se em vista que ela agiu comviolação da Lei e prática de ato ilícito,causando-lhe prejuízo. Aplicação, porigual, de multa pelo descumprimentode norma da Lei n.º 4.591/64 (§ 5.º doart. 35 e § 1.º de seu art. 31) porinobservância das regras atinentes àincorporação, que não se concretizou.Imóvel registrado ainda em nome deterceiro no RGI. Propaganda enganosacaracterizada. Tipificação de ilícitopenal. Remessas de peças ao MP.Exclusão de multa por contravençãopenal, cuja aplicação compete àJustiça Criminal (art. 66 da Lei n.º4.591/64). Outros danos materiais emorais também não caracterizados.Recurso da ré parcialmente provido edo autor desprovido.72

Nesta apelação, proferida pelo insigne Des. LuizRoldão de F. Gomes, verifica-se a aplicabilidade dadesconsideração por incidência do art. 28 do CDC, porter-se violado à Lei, prática de ato ilícito, ensejando prejuízo.Interessante também, foi a caracterização de propagandaenganosa.

Apelação Cível, processo n.º2001.001.26463, 26/03/02, 6.ª Câm.Cív., TJRJ, Des. Luiz Zveiter, julgadoem 26/02/02.

72 Jurisprudência pesquisada no site www.tj.rj.gov.br, em 18/04/03, usandocomo critério de pesquisa a expressão: desconsideração da personalidadejurídica.

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Ementa: Execução. Penhora de bemde sócio. Desconsideração dapersonalidade jurídica. Embargos deterceiro. Improcedência do pedido.Embargos de terceiro disregard of legalentity efetiva comprovação de dolo comintenção de fraude a terceiros – abusode direito – Lesão à boa-fé e a moral –Correção da sentença que entendepela desconsideração da pessoajurídica como medida excepcional aatingir bens de sócio para garantia decrédito de terceiros, lesados bem defamília, comprovação efetiva daresidência de casal ou entidade familiar– Não ocorrência. Preliminaresrejeitadas. Recurso Improvido.73

É nítida a comprovação de dolo com intenção defraude a terceiros, abuso de direito, lesando o princípiobasilar da boa-fé e consequentemente a moral.Interessante é esta caracterização de infringência da boa-fé, sendo a sentença corrigida, visando a aplicabilidadeda Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica.

No agravo de instrumento abaixo, não foi aplicada adesconsideração, devido a ausência de elementos comoo abuso de direito e fraude à lei, o que segundo osentendimentos analisados até o momento, devem sercomprovados e não apenas presumidos.

Agravo de instrumento, processo n.º1998.002.03702, 02/10/1998, 10.ªCâm. Cív., TJRJ, Des. EduardoSocrates Sarmento, julgado em 25/08/1998.Ementa: Agravo em ação deexecução. Pedido de desconsideração

73 Ibidem, nota 71.

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da personalidade jurídica da executada-agravada, para indicar à penhora bensparticulares dos seus sócios.Indeferimento. Ausência de elementosde prática abusiva ou fraudulenta dapersonalidade jurídica da ora agravadaou dos seus sócios em relação a ela.Desprovimento do agravo.74

No agravo de instrumento seguinte, verifica-seaplicabilidade da desconsideração, por serem inequívocosos elementos: fraude à lei, ato ilícito e prejuízos a terceiros,prosseguindo a execução em face dos sócios queintegravam a sociedade. Vejamos:

Agravo de instrumento, processo n.º2002.002.05832, 03/07/2002, 10.ºCâm. Cív., TJRJ, Des. SylvioCapanema, julgado em 28/05/2002.Ementa: Agravo de instrumento. Açãode indenização. Empresa detransporte. Encerramento dasatividades. Desconsideração dapersonalidade jurídica. Recurso provido.Agravo de instrumento. Açãoindenizatória. Execução da sentença.Encerramento das atividades daempresa. Desconsideração dapersonalidade jurídica. Estandotransitada em julgado a sentençacondenatória, e sendo inequívocos ossinais de ter a empresa ré encerrado,irregularmente suas atividades,impedindo as vítimas de receber o quelhes é devido, admite-se adesconsideração da personalidadejurídica, prosseguindo a execução

74 Ibidem, nota 71.

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contra os sócios que integravam asociedade, à época do evento danoso.Provimento do recurso.75

No mesmo sentido, ou seja, entendendo serfundamental a efetiva comprovação da existência dospressupostos que configurem a possibilidade dadesconsideração da personalidade jurídica, vejamos oagravo abaixo, que ainda ressalta muito bem, quanto aaplicabilidade da desconsideração ser exceção,mantendo-se como regra a autonomia entre a sociedadee os seus membros.

Agravo de instrumento, processo n.º1998.002.01243, 22/06/1998, 2.ª Câm.Cív., TJRJ, Des. Sérgio Cavalieri Filho,julgado em 07/05/1998.Ementa Execução extrajudicial.Desconsideração da personalidadejurídica. Art. 28 do C. de Defesa doConsumidor. Descabimento. Fraude.Abuso de direito. Inocorrência.Desconsideração da pessoa jurídica.Falta de prova do abuso de direito oude fraude no uso da sociedade.Descabimento. A autonomia entre asociedade e os seus membroscontinua sendo a regra, só estando oJuiz autorizado a desconsiderar apessoa jurídica quando esta é utilizadapara a realização de fraude ou abusode direito. A simples insatisfação deum crédito não é suficiente, por si só,para o desprestígio da personalização.Desprovimento do recurso. (CEL)76

Finalizando este capítulo, expõe-se uma últimajurisprudência do TJRJ, do insigne Des. Sérgio Cavalieri

75 Ibidem, nota 71.76 Ibidem, nota 71.

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Filho, que de forma brilhante elenca a responsabilidadesolidária do incorporador e construtor, no caso dodesabamento do Palace II, na Comarca da Capital, sendoum caso público e notório, devido a gravidade dos danosprovocados, inclusive a morte de alguns moradores. Adesconsideração foi aplicada, pela incidência do art. 28do CDC, e ainda com o intuito de buscar o verdadeiroresponsável pelos danos, fazendo uma justiça digna,garantindo a efetividade da prestação jurisdicional àsvítimas dessa tragédia. Ressalta-se que a votação foiunânime.

Apelação Cível, processo n.º2001.001.21725, 13/03/2002, fls.33949/33957, 2.ª Câm. Cív., TJRJ, Des.Sérgio Cavalieri Filho, julgado em 22/11/2001.Ementa: Responsabilidade Civil.Desabamento de prédio. Construçãodefeituosa. Danos causados apropriedade vizinha. Desvalorização doimóvel. Responsabilidade Civil doconstrutor. Responsabilidade Civil doincorporador. Solidariedade.Desconsideração da personalidadejurídica. C. de Defesa do Consumidor. Responsabilidade do incorporador/construtor. Defeitos da obra.Solidariedade passiva entre oincorporador e o construtor. Incidênciado Código de Defesa do Consumidor.Desconsideração da personalidadejurídica. Incorporador, consoantedefinição legal, e não somente o quecompromissa ou efetiva a venda defrações ideais de terrenos objetivandoa vinculação de tais frações a unidadesautônomas, como também, eprincipalmente, o construtor e oproprietário do terreno destinado ao

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empreendimento. Essa vinculaçãolegal entre todos os que participam daincorporação decorre do fato de ser aedificação o seu objeto final, de sorteque quando o incorporador celebra,posteriormente, contrato de empreitadacom o construtor, está na realidade,se fazendo substituir por este. E quemse faz substituir é responsável,solidariamente com o substituído, pelosdanos que este vier a causar. Em facedo conceito claro e objetivo constantedo art. 3.º, § 1.º do Código doConsumidor, o incorporador é umfornecedor de produtos, pois quandovende e constrói unidades imobiliáriasassume uma obrigação de dar coisacerta, e isso é a própria essência doconceito de produtos. E quando essaobrigação é assumida com alguém quese coloca no último elo do cicloprodutivo, alguém que adquire essaunidade para dela fazer sua residênciae da sua família, está fechada arelação de consumo, tornando-seimpositiva a disciplina do CDC, cujasnormas são de ordem pública. Sendoassim, nenhuma das partes – quer oincorporador quer o construtor – podeinvocar em seu favor cláusulascontratuais que, à luz do Código doConsumidor, são abusivas e nulas depleno direito. A desconsideração dapersonalidade jurídica, à luz do art. 28do CDC, pode ter lugar não apenas nocaso de falência ou estado deinsolvência da sociedade, mas tambéme principalmente, quando esta estiversendo utilizada abusivamente, emdetrimento do consumidor, para

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infração da lei ou prática de ato ilícito.Configurados esses pressupostos,pode e deve o Juiz desconsiderar apessoa jurídica em qualquer fase doprocesso em garantia da efetividade doprovimento jurisdicional. Destarte,sendo público e notório que asempresas responsáveis pela tragédiaimobiliária do Palace II integram ummesmo grupo, a propiciar a atuaçãodo sócio principal no ramo daconstrução civil, que as utilizava paraencobrir e mascarar os seus abusos,impõe-se a desconsideração dapersonalidade jurídica para buscar overdadeiro e principal responsávelpelos danos, como se a pessoajurídica não existisse. Reforma parcialda sentença. (GAS)77

11. Conclusão

O estudo desenvolvido pôde concluir que adesconsideração da personalidade jurídica no Direitobrasileiro, apesar de ter sofridos diversas críticas, vemsendo aplicada de forma eficaz, atentando para a efetivanecessidade da existência dos seus pressupostos, comoo abuso de direito e fraude à lei, sendo estes os principais.Porém, o CDC, a Lei Antitruste e o CC/02, trouxeram outrashipóteses de aplicabilidade da desconsideração, como éo caso de desvio de finalidade, confusão patrimonial (art.50 do CC/02); excesso de poder, fato ou ato ilícito, ouviolação dos estatutos ou contrato social, nestes casosespecíficos, sempre que estes forem exercidos emdetrimento do consumidor (art. 28 do CDC).

77 Ibidem, p. 71

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A desconsideração da personalidade jurídica serásempre possível, quando configurado o abuso de direito efraude à lei, permitindo assim, que se levante o véu dapessoa jurídica, alcançando-se aquele que utilizou-se damesma, de forma indevida.

Faz-se importante ressaltar que a regra é aautonomia societária, sendo a desconsideração dapersonalidade jurídica a exceção, devendo ocorrer quandopresentes forem os seus elementos, conforme citadoacima, além do que, a desconsideração não possui oobjetivo de anular a pessoa jurídica, apenas desconsiderapara buscar os respectivos responsáveis.

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