A distância entre ciência, tecnologia, inovação e...
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VII ESOCITE.BR tecsoc - ISSN∕ 1808-8716 Oliveira. Anais VII Esocite.br/tecsoc 2017; 1(gt29):1-20
A distância entre ciência, tecnologia, inovação esociedade nas políticas de inovação
G29 - Estado, Ciência & Tecnologia: crises, desafios e perspectivas
Cyntia Sandes Oliveira
Resumo: O que vem sendo realizado no ambiente científico e decisório e, consequentemente aspolíticas de inovação, têm se distanciado da sociedade. Na medida em que o acesso em massa àinformação transmite uma ilusão de conhecimento, a ciência é banalizada, na mesma proporção emque se distancia ainda mais da sociedade. A discussão de significância da atividade científica deve serconsiderada enquanto epistémica e prática, envolvendo a busca não de uma mera verdade, conformea ciência mertoniana, mas de uma verdade significativa associada ao contexto no qual está inserida(Kitcher, 2001). As estruturas de saber ora vigentes reforçam a desigualdade entre quem detém osaber especializado e a população. Essa população é, muitas vezes, a executora e implementadora deprocessos técnicos, inseridos no seu dia a dia e, nesse sentido, vemos a distância entre ciência esociedade como a consequência mais palpável do distanciamento entre ciência e técnica. Esse trabalhobuscar demostrar a importância de utilizar diferentes métodos, teorias e dados para fundamentar atese de que ciência, tecnologia e inovação estão apartados da sociedade. A reflexão em torno dalegislação brasileira sobre ciência, tecnologia, inovação (CTI) e fomento à inovação constituiu-se noprimeiro passo para a estruturação do presente texto. Propomos uma análise dos instrumentos dapolítica nacional de inovação, com o levantamento de suas prioridades textualmente explicitadasversus as prioridades executadas a partir da alocação de recursos prevista em lei e sua execução nosúltimos anos. Para além desses elementos, para trabalhar a distância entre CT&I e sociedade,buscamos utilizar os dados obtidos na última pesquisa da percepção pública de ciência e tecnologia noBrasil de 2015 (CGEE, 2017). Também buscamos utilizar métodos quantitativos, a exemplo da análisedo número de publicações com alto fator de impacto e dados de cooperação internacional, disponíveisna base de dados da Scopos (Scival) e do número de registros de patentes (base de dados da WIPO)para demonstrar onde situa-se o Brasil em termos de inovação frente aos principais países inovadoresmundialmente. A partir dessa análise, buscamos evidenciar o distanciamento entre a ciência e atécnica, entre CTI e sociedade. Diante da racionalização progressiva da sociedade, ligada ainstitucionalização do progresso científico e técnico que, em última instância, desencadeia osprocessos de inovação, discutimos a função da ciência na sua relação com a sociedade, em direção àreflexão a respeito do que as políticas públicas em execução podem e devem aportar em termos designificância.
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Introdução
Na medida em que o acesso em massa à informação transmite uma ilusão de
conhecimento, a ciência é banalizada, na mesma proporção em que se distancia ainda mais da
sociedade. O agir racional comunicativo é distorcido pelo agir racional com respeito a fins,
sendo a imagem banalizada e as relações despolitizadas, entrando-se na questão da técnica
pela técnica. Assim, o que vem sendo realizado no ambiente científico e decisório e,
consequentemente, as políticas de inovação, têm se distanciado da sociedade. Diante dessa
percepção, o presente estudo apresenta uma necessária reflexão a respeito das conexões entre
ciência e técnica no contexto brasileiro, com suas correlações com as ambições e prioridades
de desenvolvimento nacionais e conexões com sociedade que, em última instância, busca
servir.
Nesse contexto, a distância entre ciência e sociedade evidencia-se como a
consequência mais palpável do distanciamento entre ciência e técnica. Para articular essa
discussão, é necessário compreender como ciência e tecnologia vem sendo tratadas no
encadeamento dos conceitos de inovação e desenvolvimento, uma vez que estes estão
interligados no discurso. Nesse sentido, partimos de uma análise multidisciplinar, nos
utilizando de autores de diferentes bases teóricas, em busca de promover o diálogo e conexões
entre argumentos que se reforçam, desde diferentes pontos de partida disciplinares.
Assim, partimos da sociologia da ciência, utilizando-nos da tese de Kitcher (2006), no
que diz respeito a significância da atividade científica e dialogamos com Harding (2016), já
no âmbito da filosofia da ciência, que traz o conceito de “forte objetividade” (Harding, 2016).
Ambos os autores trazem à tona uma discussão em torno da necessidade de pensar a ciência a
partir da técnica e das necessidades sociais, invertendo a lógica posta desde a segunda guerra
nesse sentido. As ideias de Heidegger (2006), no que diz respeito a necessidade de o
conhecimento partir de um ponto de vista pragmático, também vêm se somar a este
argumento.
Para tratar da distância entre ciência, tecnologia, inovação e sociedade na gestão da
politica de inovação brasileira, é necessário aliar a concepção exposta acima ao entendimento
das bases técnicas a partir das quais países como o Brasil estruturam seu processo de
inovação. Consequentemente, é fundamental a reflexão em torno dos modelos disponíveis.
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Considerando a perspectiva de apropriação social da atividade científica, agregamos à análise
elementos da economia e da administração pública, ao tratar dos modelos de inovação
(FREEMAN, SOETE, 2008; LUNDVAL, 2002; NELSON, WINTER, 2005; NELSON, 2014;
ETZKOWITZ ET LEYDESDORFF, 2000). A discussão dos modelos clássicos de inovação é
fundamental para situarmos em que direção se coloca a trajetória brasileira, a partir de como
as relações entre ciência, tecnologia, inovação e sociedade têm sido construídas na gestão da
política de inovação no Brasil. Neste contexto, partimos da concepção de destruição criadora
(SCHUMPETER, 1997), cerne das discussões a respeito de inovação, e agregamos reflexões
neo-schumpeterianas, em busca de entender o processo de inovação, suas continuidades e
descontinuidades, entrevendo não só as bases técnicas que moldam o ritmo e a direção da
inovação, mas também as bases sociais, conforme noção de revolução tecnológica discutida
por Perez (2009:5).
Nesse sentido, soma-se à reflexão teórica, o argumento de Moreira e Velho em torno da
associação de atitudes e práticas de atores científicos a outros atores não científicos (MOREIRA, M.
L.; VELHO, L. 2008, p.626-629) caracterizando a construção do conhecimento enquanto fenômeno
socialmente difuso. Resgatamos a ideia de agir racional (WEBER, 1968; SELL, 2013) na reflexão em
torno da forma em que ciência e tecnologia vem sendo abordadas na contemporaneidade, colocando
em evidência a argumentação de Heidegger (1977) e Marcuse (1982) quanto à não neutralidade da
técnica. Nesse mesmo sentido, Habermas (2011) traz elementos relevantes à discussão, agregando a
ideia de que ciência e tecnologia não só encadeiam a inovação, como também justificam um projeto de
dominação. Outro autor que acrescenta elementos relevantes à presente abordagem é Sclove (1995),
do qual utilizamos a demonstração de como a divisão do trabalho é compartimentalizada, para discutir
como o alto nível de especialização cria barreiras de entrada que mantém a desigualdade instaurada na
estrutura da divisão do trabalho.
A importância do contexto
Considerando as ideias em torno de uma sociedade do conhecimento de Castells
(2016), as reflexões de Vessuri (2003) sobre política de ciência, tecnologia e inovação, como
elemento de operacionalização e legitimação de decisões que estão alheias a política científica
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em si, ajudam a justificar o argumento de que a associação de inovação a desenvolvimento é
elemento legitimação politica e, como tal, ocorre fora da política de inovação em si.
Conforme Law (2015), “a ciência é necessariamente social” e deve dialogar com o
contexto. Soma-se a esse argumento, o pensamento de Szmrecsányi (2000, p. 8), segundo o
qual “a teoria nao possui um fim em si mesma”. Pensar a política nacional de inovação exige,
portanto, uma reflexão ampla e articulada que, conforme Taylor (2016), possibilite
generalizações que combinem métodos e casos diversos, em uma abordagem multidisciplinar
para a discussão.
Autores cepalinos, como Furtado (2000), Prebisch (2000, 2011), Fajnzylber (2000),
além de outros autores neoschumeterianos, como Mazzucato (2014), argumentam em favor do
papel central do Estado para geração da inovação. Nesse contexto, o Estado assume aquilo
que Feyerabend (1978) conceitua como intercâmbio guiado e que está relacionado às decisões
sobre a política de CTI. No Brasil, por exemplo, 70% dos investimentos em C&T são feitos
pelo Estado (MCTIC, 2017), o que demonstra a pouca participação do setor privado e o fator
determinando que possui o poder público frente as ações relacionadas ao tema.
Na política nacional de inovação, uma forma de tentar subverter a distância instituída entre
técnica e ciência tem sido o enfoque dado à inovação como meio para o alcance da melhoria nos
índices de produtividade nacional. Não obstante, a inovação torna-se um discurso que não altera
práticas que mantém uma lógica linear, segundo a qual a inovação passa pela ciência e esta encontra-
se dentro da Universidade. Argumentamos que essa lógica torna difícil a efetivação de um processo de
inovação brasileiro, pois não leva em conta que, efetivamente, a centralidade da técnica é muito mais
ampla e inclui também elementos sociais, políticos e econômicos.
Vislumbramos que é necessário ir além dos modelos e buscar uma gestão pública inovadora
que viabilize a capacidade de transformar conhecimento em inovação, que de fato contribua para o
desenvolvimento nacional. Ao descrever a concepção de um sistema de pesquisa e desenvolvimento
plural e envolvendo diferentes unidades decisórias independentes, Nelson (2014) relata a existência de
vínculos complexos entre a pesquisa e desenvolvimento, associados à aprendizagem formal e
científica e à aprendizagem empírica, proporcionada pela experiência prática. Entendemos que essa
visão de sistema de inovação, que pretende articular diferentes instituições e atores, no sentido de
estabelecer uma relação entre a produção do conhecimento e produtividade, é apenas parte da
determinação das diretrizes estratégicas que articulam ciência, tecnologia, inovação e
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desenvolvimento. Devem-se buscar formas de estabelecer uma articulação mais clara entre CT&I e o
contexto social e técnico brasileiro.
Para isso, caracterizar o ambiente de inovação brasileiro frente ao mundo é
fundamental. Assim, nos utilizamos da análise de rankings científicos e de inovação para
situar o Brasil frente ao mundo. Corroboramos a reflexão de Taylor (2016), que demonstra a
tese de que, ainda que os rankings científicos e de inovação tenham vieses quando observadas
as suas premissas individualmente, os indicadores produzidos por esses rankings e a
observação combinada de seus resultados demonstram a sua validade enquanto medidas
aplicáveis ao planejamento e avaliação de políticas e da posição de um dado país frente ao
mundo no quesito inovação.
O ambiente de inovação brasileiro pode ser caracterizado pelo retrocesso nos diversos
rankings que buscam medir a inovação mundial comparativamente. Ao analisarmos o impacto
das publicações brasileiras, verificamos que ele é de 0.86, portanto, abaixo da média global
(SciVal, 2017), o que implica em dizer que o crescimento na quantidade de publicações nos
últimos anos não foi, necessariamente, acompanhado do crescimento de sua qualidade.
Adicionalmente, ao consultarmos o ranking global de inovação, constatamos que o Brasil caiu
da 47a posição em 2011 para a 69a em 2016. Além disso, nossas universidades caíram nos
rankings interacionais, a exemplo do Times Higher Education (THE).
Figura 3 – Impacto das publicações brasileiras
Fonte: Scival, 2017.
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Ao observarmos a produção nacional de patentes (WIPO Statictics Database, 2017), o
panorama não é muito melhor. É possível observar uma queda nos depósitos de patentes
relacionadas ao desenho industrial de itens (industrial design), bem como no número de
patentes depositadas nos últimos anos. Essa queda não acompanha necessariamente a queda
no Produto Interno Bruto brasileiro, que vem em uma curva ascendente desde 2001 até 2014,
quando sofre uma queda, enquanto que o depósito de patentes vem caindo desde 2013 e di
desenho industrial de itens desde 2011. Evidencia-se, portanto, mais uma peculiaridade do
nosso sistema de inovação, que não reflete a sua robustez na capacidade de investimentos, ao
mesmo tempo em que demonstra grande capacidade de produzir marcas de sucesso global
(trademarks) em um tipo de inovação não tecnológica, cuja marca Havaianas é um grande
exemplo.
Além do exposto, quando observamos o registro de patentes no Brasil, além de baixo
em relação ao resto do mundo, os números têm caído nos últimos anos, com uma queda
contínua desde 2011 (WIPO Statictics Database, 2017). No caso do baixo registro de patentes,
há que se observar o grau de dificuldade de registrar patentes no Brasil, ainda muito maior
que em países como os Estados Unidos da América (EUA), o que corrobora para os baixos
números apresentados, mas não pode ser apontado como causa fundamental, já que há outros
fatores que influenciam este quesito.
Além dos dados acima expostos, outro dado preocupante evidencia-se quando
observamos que a maioria das solicitações de reconhecimento de patentes brasileiras é feita
por não residentes, mais de 25 mil solicitações em 2015, enquanto que os residentes
apresentaram menos de 5 mil (WIPO Statictics Database, 2017). Esse dado torna-se ainda
mais grave quando avaliamos que o Brasil é um país passivo em termos de
internacionalização do seu ensino e pesquisa, enviando mais estudantes e pesquisadores para
o exterior que recebendo-os no país (CAPES, 2017).
Conforme Jasanoff (2004), as nossas formas de saber e representar o mundo são
inseparáveis das formas que escolhemos para viver em tal mundo. Ainda que, eventualmente,
tenhamos ferramentas de gestão bem-sucedidas do ponto de vista do fomento à produtividade,
como no caso do setor agrícola brasileiro, persiste a necessidade de reflexão em torno das
respostas que a tecnologia, e as possibilidades de inovação que ela fomenta, efetivamente têm
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produzido e até que ponto elas correspondem às questões que têm se apresentado como
necessidades para o desenvolvimento da nossa sociedade. Nesse quesito, conjecturamos que a
realização de uma pesquisa de percepção com especialistas em conexão com a qualidade de
vida da população pode auxiliar no desenvolvimento dessas questões.
Nesse sentido, um estudo que agrega elementos interessantes para a presente análise é
a pesquisa de percepção pública de ciência e tecnologia no Brasil de 2015 (CGEE, 2017). Ao
serem perguntados a respeito do desenvolvimento de ciência e tecnologia no país, apenas
7,6% dos respondentes afirmou que a sociedade não se importa com o desenvolvimento
científico. Por outro lado, 61% respondeu ser interessado, ou muito interessado, em temas de
ciência, tecnologia e inovação. Corroborando esse argumento, 46,9% dos respondentes afirma
que a população deve ser ouvida nas grandes decisões sobre os rumos da ciência e tecnologia.
Ainda que o interesse da população em questões de CT&I seja explicitado mediante as
pesquisas de percepção pública, persiste no ambiente científico a falta de diálogo entre as
pesquisas conduzidas e os anseios da população. Conforme Jasanoff (2004, p.2), “the
dominant discourses of economics, sociology and political science lack vocabularies to make
sense of the untidy, uneven processes through which the production of Science and technolog
É possível partir da Estratégia Nacional de Ciência, tecnologia e Inovação (ENCTI) para
realizar um exercício de reflexão em torno do planejamento estratégico do país para o setor.
Nesse contexto, é necessário refletir até que ponto a apropriação ativa da inovação técnica tem
incluído a sociedade na reflexão sobre a escolha da nossa forma de viver e se inserir no
mundo e é para este desafio que se volta o presente estudo.
Método
Esse trabalho buscar demostrar a importância de utilizar diferentes métodos, teorias e
dados para fundamentar a tese de que ciência, tecnologia e inovação estão apartados da
sociedade. A reflexão em torno da legislação brasileira sobre ciência, tecnologia, inovação
(CTI) e fomento à inovação constituiu-se no primeiro passo para a estruturação do presente
texto. Propomos uma análise dos instrumentos da política nacional de inovação, com o
levantamento de suas prioridades textualmente explicitadas versus as prioridades executadas a
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partir da alocação de recursos prevista em lei e sua execução nos últimos anos. Para além
desses elementos, para trabalhar a distância entre CT&I e sociedade, buscamos utilizar os
dados obtidos na última pesquisa da percepção pública de ciência e tecnologia no Brasil de
2015 (CGEE, 2017). Também buscamos utilizar métodos quantitativos, a exemplo da análise
do número de publicações com alto fator de impacto e dados de cooperação internacional,
disponíveis na base de dados da Scopos (Scival) e do número de registros de patentes (base de
dados da WIPO) para demonstrar onde situa-se o Brasil em termos de inovação frente aos
principais países inovadores mundialmente. A partir dessa análise, buscamos evidenciar o
distanciamento entre a ciência e a técnica, entre CTI e sociedade.
Literatura
Partimos do conceito de verdade significativa de Kitcher (2006), segundo o qual a
discussão de significância da atividade científica não pode ocorrer desassociada do contexto.
Essa significância deve ser considerada enquanto epistémica e prática, envolvendo a busca
não de uma mera verdade, conforme a ciência mertoniana, mas de uma verdade significativa e
que, portando, trate da função da ciência na sua relação com a sociedade. Além disso, seu
papel precisa ser discutido em direção à reflexão a respeito do que as políticas públicas em
execução podem e devem contribuir para a efetivação da conexão entre tecnologia &
inovação e o desenvolvimento nacional.
Corrobora a reflexão de Kitcher (2006), o pensamento de Harding (2016), segundo a
qual a objetividade epistemológica científica deve buscar uma “forte objetividade” (Harding,
2016), no sentido de pesquisadores aliarem suas agendas de pesquisa a necessidades dos
grupos sociais nos quais estão inseridos, buscando além da pesquisa “avant guard”, um tipo
de pesquisa de base, “rear guard”, que parte do contexto social situacional, em lugar de partir
da abstração. Nesse mesmo sentido, Heidegger (2006) coloca a necessidade de o
conhecimento ter um ponto de vista pragmático, segundo o qual a essência da técnica parte da
interação do sujeito na experiência concreta no mundo. Conforme a fenomenologia
Heidggeriana, a inovação perpassa a ciência e a tecnologia, em que a ciência cuida dos
fenômenos, a tecnologia do conhecimento aplicado e a inovação é necessariamente utilizada
no processo produtivo.
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Portanto, a discussão de significância da atividade científica deve ser considerada
enquanto epistémica e prática. Não obstante, as estruturas de saber ora vigentes reforçam a
desigualdade entre quem detém o saber especializado e a população. Essa população é, muitas
vezes, a executora e implementadora de processos técnicos, inseridos no seu dia a dia e, nesse
sentido, vemos a distância entre ciência e sociedade como a consequência mais palpável do
distanciamento entre ciência e técnica que, conforme Ihde (1998) é refletida no descompasso
do pensamento sobre a ciência e sobre a tecnologia.
Ao verificar os elementos aportados por modelos de inovação (FREEMAN, SOETE,
2008; LUNDVAL, 2002; NELSON, WINTER, 2005; NELSON, 2014), identificamos que, em
sua essência, a associação ao conceito de desenvolvimento perpassa três arquétipos: o modelo
schumpeteriano; o modelo de tripla hélice; e um modelo hierárquico, linear ofertista, da
relação entre ciência, tecnologia e desenvolvimento. Esses modelos, principalmente os dois
últimos, aliam a atuação da firma no fomento ao conhecimento com o objetivo de fomentar a
destruição criadora e proporcionar a geração de lucros, com o conhecimento estando centrado
na atuação da universidade como principal geradora da inovação para o setor produtivo.
O modelo schumpeteriano parte da concepção de destruição criadora
(SCHUMPETER, 1997), segundo a qual, em uma economia de mercado, novos produtos
possibilitam a renovação das demandas de mercado e conduzem a exclusão de empresários
incapazes de inovar e trazer novidades para o mercado. Nesse cenário, os empresários são os
principais responsáveis pelo o processo de inovação e pelo crescimento econômico
sustentado. A firma é colocada no centro da política de ciência, tecnologia e inovação, como
parte do conceito de papel criador das estruturas de mercado, produtos e processos. Essa
abordagem parte de um outro momento da história econômica e encontra limites quando
transportada para o contexto latino-americano, em especial, brasileiro. No Brasil, o
empresário não é inovador e boa parte das inovações existentes está vinculada a pesquisas
acadêmicas que nem sempre encontram aplicação econômica (DAGNINO, 2014, 2016;
VELHO, 2014; BAGATTOLLI, 2014) .
De acordo com a noção de revolução tecnológica discutida por Perez (2009:5), com base no
esforço neo-schumpeteriano de entender o processo de inovação, as continuidades e descontinuidades
do processo de inovação denotam as bases técnicas que moldam o ritmo e a direção da inovação. Não
há um salto automático entre conhecimento e inovação, consideramos que deve ser feita uma reflexão
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a partir de que bases técnicas países como o Brasil partem dentro do seu processo de construção de um
sistema de inovação. Não basta apenas mimetizar “casos de sucesso” é preciso tornar-se um caso de
sucesso a partir da articulação política que observa as necessidades da sociedade brasileira e a sua
estrutura.
Segundo o modelo de tripla hélice (ETZKOWITZ ET LEYDESDORFF, 2000), há três
“hélices” que garantem a dinâmica econômica e a bem-sucedida inserção na sociedade do
conhecimento: com a Universidade desempenhando o papel de indutora das relações com o
setor produtivo de bens e serviços; a empresa como recebedora das inovações oriundas da
Universidade e implementadora dessas no ambiente produtivo; e o Governo, enquanto
regulador e fomentador da atividade econômica, com o objetivo de estimular a produção de
novos conhecimentos, a inovação tecnológica e, consequentemente, o desenvolvimento
econômico. Especialmente no caso brasileiro, é perceptível a tentativa de fazer da
Universidade o locus da inovação (ENCTI 2012-2015, ENCTI 2016-2022), porém ela está
distante do setor produtivo (DAGNINO e VELHO, 1998; VELHO, 2014; CAMPOS e
COSTA, 2014; AVELLANEDA e LINSINGEN, 2014), o que já distancia a realidade nacional
da ideia de que universidade e empresa estão interligados, havendo uma relação privada de
financiamento da produção do conhecimento aplicado, que, fundamentalmente, não ocorre no
Brasil.
O modelo de tripla hélice segue a lógica linear ofertista instituída no pós-guerra,
segundo a qual a pesquisa científica precede e possibilita a inovação, em uma sequência linear
para a qual ciência gera tecnologia & inovação e estas favorecem o desenvolvimento revertido
em ganhos para a sociedade. As grandes fundações de fomento nacionais e internacionais, a
exemplo da National Science Foundation (NSF), nos Estados Unidos, e de Capes e CNPq, no
Brasil, surgiram dentro deste contexto. Não obstante, além de o modelo linear ofertista dar
sinais de esgotamento em nível mundial, a realidade brasileira vai de encontro aos seus
preceitos (MOREIRA e VELHO, 2008; SALOMON, 1996). No Brasil, a política de C&T está
desconectada da política industrial e há um apartamento entre ciência & tecnologia e
inovação, assim como entre essas e a sociedade, com impactos sobre o desenvolvimento
nacional. O esgotamento global do modelo linear ofertista evidencia-se na multiplicação de
estudos que demonstram:
o papel social e cultural que desempenham a ciência e tecnologia; a
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transformação nas formas de produção do conhecimento e na concepção dadinâmica das relações entre a universidade, o governo e a indústria; o novoentendimento das relações entre pesquisa básica e aplicação prática; e anoção de que a prática e atitudes dos cientistas estão relacionadas com as deoutros atores não científicos, que também participam do processo deprodução de conhecimento.
(MOREIRA, M. L.; VELHO, L. 2008, p.626-629)
A forma como ciência e tecnologia vem sendo abordadas, coloca o agir racional
weberiano (WEBER, 1968; SELL, 2013) dentro de um contexto em que a técnica é
pressuposta como eficiente e neutra, portanto, autolegitimável. A inovação para o
desenvolvimento com fim último de alavancar produtividade, conforme inserido na política
nacional de inovação, deve obrigatoriamente perpassar a reflexão sobre a própria noção de
neutralidade da técnica e reflexão em torno da verdade significativa que a ciência deve
aportar. Considerar a técnica neutra nos torna cegos diante da sua essência que é humana
(HEIDEGGER, 1977; MARCUSE, 1982). A técnica não é neutra e a sua instrumentalização
em favor de um discurso associado à produtividade como elemento desencadeador de
desenvolvimento é uma das discussões de fundo que o presente texto se propõe a evidenciar.
Na sociedade da informação, em especial, o domínio da técnica associada ao conhecimento é
poder.
System builders seek to create a network of heterogeneous but mutuallysustaining elements. They seek to dissociate hostile forces and associatethem with their enterprise by transforming them. The crucial point, however,is that the structure of the network reflects the power and the nature of theboth forces available and the forces with which the network collides. To say,then, that an artifact is well adapted to its environment is to say that it formsa part of a system or network that is able to assimilate (or turn away)potentially hostile external forces.
(LAW, J. 2012, p. 115)
Nesse contexto, a discussão sobre ciência e tecnologia é necessária, pois não só
encadeiam a inovação, como também justificam um projeto de dominação (HABERMAS,
2011). Conforme Marcuse (1982), racionalidade e a manipulação técnico-científica estão
fundidas em novas formas de controle social em que o discurso da tecnocracia ganha força e o
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agir racional com respeito a fins é o exercício do controle exponenciado. Dessa forma, o
conceito de racionalidade possui um conteúdo político, não é neutro, e o conceito de razão
técnica é, em si mesmo, ideologia, convertendo-se em fundamento de legitimação.
Ao retratar a divisão técnica da organização do trabalho na sociedade, Sclove (1995)
demonstra como a divisão do trabalho é compartimentalizada, separando as pessoas em
esferas de produção: concepção e pesquisa; produção e distribuição e vendas. Segundo ele,
dentre essas esferas, poucos tem uma visão abrangente de todo o processo. Esse processo de
compartimentalização é refletido também na divisão estabelecida entre áreas de conhecimento
científico. A divisão do trabalho é refletida, então, em nível mundial, social e acadêmico e,
nesse contexto:
o papel social e cultural que desempenham a ciência e tecnologia em umasociedade em particular, a transformação nas formas de produção doconhecimento e na concepção da dinâmica das relações entre a universidade,o governo e a indústria, a noção de “arenas transepistêmicas” e a relaçãoentre pesquisa básica e aplicação prática.
(MOREIRA, M. L.; VELHO, L. 2008, p.635)
O conhecimento perpassa todas as suas subdivisões do trabalho uma vez que o alto
nível de especialização cria barreiras de entrada que mantêm a desigualdade instaurada na
estrutura da divisão do trabalho em seus diversos níveis. Essa desigualdade é questionada por
Sclove (1995, p. 125), na medida em que “those that control the technological system can
became more powerful than the communities they serve.”
Diante dos imperativos da sociedade do conhecimento (CASTELLS, 2016), para
discutir inovação, é inevitável discutir política científica e como esta tem sido relacionada ao
fomento das capacidades inovativas e em que medida ela realmente tem produzido resultados
nesse sentido. Dessa maneira, entendemos que a política de inovação não pode ser vista
isoladamente, mas em conexão com os elementos necessários para inovar e as políticas que
tangenciam esse processo.
A política de inovação é resultado de um processo de operacionalização e legitimação,
no qual a associação ao conceito de desenvolvimento é elemento fundamental de legitimação.
A política científica é parte desse processo e tangencia em muitos aspectos a política de
inovação nacional. Sem o entendimento e o exercício dessas conexões em relação às
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necessidades da sociedade, estamos fadados ao fracasso. Conforme Vessuri (2003), “science
policy is not powerful by itself. Often its main result is the operationalization and
legitimization of decisions that have accumulated or were made by reasons foreign to science
policy” (Vessuri, 2003, p. 265).
É intrínseca, portanto, a reflexão sobre nosso modelo de ciência e o contexto social na qual
está inserida, “science is necessarily social” (LAW, 2015). Law (2015) afirma que o conhecimento
científico é moldado pela sua interação com o mundo propriamente dito e com a cultura científica e
seus métodos. No caso brasileiro, pode-se afirmar que, salvo iniciativas de extensão universitária com
alguns casos de sucesso (CAPES, 2016), há uma distância instituída entre a universidade e a
sociedade, carecendo-se de uma reflexão em relação ao papel social da ciência brasileira. No
“Seminário Lei do Bem” realizado na Capes em 2016, foram apresentados casos de projetos
desenvolvidos entre universidades e/ou instituições de pesquisa e empresas, evidenciando desafios
para implementação de novos projetos, considerando o capítulo III, da "Lei do Bem", que trata da
concessão de incentivos fiscais às pessoas jurídicas que financiem projetos de pesquisa científica e
tecnológica a ser executado por Instituição Científica e Tecnológica (ICT). Segundo o Professor Jorge
Almeida Guimarães, em palestra proferida na ocasião, o Ministério da Educação incorporou na lei do
bem a lei nº 11.487, de 15 de junho de 2007, então apelidada de a “lei Rouanet da CTI”. Com esta lei,
iniciativas de parcerias público-privadas para inovação deveriam ocorrer a partir das instituições de
pesquisa, sobretudo das Universidades, tendo a Capes como órgão implementador da política. O
professor relata que os resultados foram pobres, com poucos projetos submetidos, mesmo diante dos
benefícios garantidos pelo financiamento público e das vantagens que poderiam ser auferidas pelas
empresas selecionadas por meio de incentivo fiscal.
Szmrecsányi (2000), desde um ponto de vista associado estudos desenvolvimentistas
da Cepal, aborda o tema a partir dos vínculos entre o conhecimento científico e o técnico e
entre eles e as atividades sociais e econômicas. Segundo o autor, há uma relação dita
“externalista” perante a qual fatores socioeconômicos influenciam o desenvolvimento
científico e tecnológico, o que extrapola a visão “internalista” e na qual fundamentalmente
baseia-se a estratégia brasileira para CTI. Nos alinhamos às ideias de Szmrecsányi (2000), em
especial a seguinte afirmação:
a teoria não é um fim em si mesma, mas basicamente um instrumento deapropriação e de decodificação da realidade para fins de conhecimento. Oconhecimento que aqui almejamos é o de evolução através do tempo (e do
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espaço) das relações entre a ciência e a tecnologia, de um lado, e entre estase a vida econômica e social, do outro.
(SZMRECSANYI, 2000:8)
Nesse sentido, as ideias de Taylor (2016) vêm se somar ao argumento de Szmrecsányi
(2000), na medida em que incorporam a necessidade de pensar de maneira mais ampla e
articulada sobre a política nacional de inovação. Segundo Taylor (2016), “We need to combine
dispersed problem-specific and country-specific approaches into a more generalizable
theoretical and policy-relevant cross-field debate about the politics of innovation”. Nesse
sentido, buscaremos nos utilizar do que o autor considera serem os cinco pilares da inovação
(direitos de propriedade intelectual, subsídios para a pesquisa, educação pública,
universidades de pesquisa e políticas comerciais) para conduzir um estudo extensivo da
política de inovação brasileira.
Para Taylor (2016), mesmo quando as pessoas apoiam a ciência e a tecnologia, a
resistência política pode ocasionar uma paralise nas instituições e políticas que promovem a
inovação. Segundo ele, “This resistance can take the form of fights over patent laws, trade
policies, antitrust regimes, and so forth, all of which are important for S&T progress but also
create winners and losers within society” (TAYLOR, 2016, p.14).
No caso do sistema de inovação que foi desenvolvido em torno da produtividade da
produção agrícola brasileira, por exemplo, há causalidades políticas e históricas que
remontam à própria formação econômica brasileira, com o papel que assume o estado como
ator que promove o que Feyerabend (1978) chama de “intercâmbio guiado”, o qual coloca os
cientistas como a parte do tripé, no modelo de tripla hélice, responsável pela inovação. Para
além disso, ao se verificar a representatividade do congresso nacional brasileiro, verifica-se a
forte presença de uma bancada em prol de interesses ruralistas, que favorece o fortalecimento
de uma política de inovações no setor agrícola voltada à produtividade.
Autores cepalinos, como Furtado (2000), Prebisch (2000, 2011), Fajnzylber (2000), além
de autores neoschumeterianos, como Mazzucato (2014), argumentam em favor do papel
central do Estado para geração da inovação a partir dos incentivos diretos dados ao setor e dos
investimentos passivos em momentos de incerteza. Não obstante, Taylor (2016) demonstra
que instituições e políticas não explicam os índices nacionais de inovação. Ao buscar
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responder a pergunta “por que algumas nações são melhores que outras em termos de
inovação?”, o autor utiliza o conceito de insegurança criativa, segundo o qual as inovações
são fruto da necessidade de garantir a segurança nacional, “it is the positive difference
between the threats of economic or military competition from abroad and the dangers of
political-economic rivalries at home” (TAYLOR, 2016, p. 13).
Para analisar as nações que mais se destacam em termos de inovação, Taylor (2016)
evidencia a necessidade de se utilizar de múltiplos indicadores para discussão da inovação,
como parte de um contexto em que indicadores devem ser olhados em conjunto com outros
fatores inerentes à realidade do país e que corroboram o interesse das mentes mais brilhantes
na produção do conhecimento aplicado. Segundo o autor,
The national environment helps to explain why the best and brightestdirect their energies toward S&T rather than religion, war, the arts, orillegal activities. The national environment also helps to explain theresults of these innovative energies. (…) Therefore, a focus on thenation-state makes sense.(TAYLOR, 2016, kindle, posição 671)
Há uma racionalização progressiva da sociedade ligada a institucionalização do
progresso científico e técnico que, em última instância, desencadeia os processos de inovação.
No presente contexto, a função da ciência na sua relação com a sociedade, bem como ao papel
central que possuem as instituições estatais no caso da América Latina e, em particular, do
Brasil, precisam ser discutidos. Essa análise crítica perpassa a reflexão a respeito do que as
políticas públicas em execução podem e devem aportar, sem, no entanto, perder de vista que
elementos políticos e estruturais influenciam decisivamente na característica inovativa
brasileira.
Resultados Parciais
A partir das análises conduzidas até o momento, é possível indicar alguns elementos que
indicam o cenário atual das relações entre CT e sociedade e que deverão ser aprofundados em
trabalhos futuros. Nesse contexto, as dificuldades de utilizar os recursos disponíveis, de articular o
conhecimento gerado com a realidade social fora dos muros da universidade, a prioridade colocada
sobre o controle dos gastos públicos em lugar de seu efetivo gasto, representando de fato investimento,
são alguns dos entraves diagnosticados a partir dos dados coletados e análises feitas até o momento.
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Na análise da estrutura de fomento à inovação nacional, a partir das leis de estímulo à pesquisa
e desenvolvimento (Apêndices I e II), bem como das que criam os fundos voltados à pesquisa,
observa-se a baixa catalização de recursos privados, com o investimento limitando-se a áreas
específicas, com abrangência de benefícios restrita. Ainda nesse sentido, ao analisarmos o gráfico de
distribuição de recursos por setor do MCTIC, evidencia-se a opção pela centralidade no repasse de
recursos para a Universidade, pois 62% dos recursos são a ela direcionados.
Nesse mesmo sentido, a análise das informações apresentadas no Seminário da Lei do Bem de
2016, realizado na Capes, também evidencia a grande dificuldade de estabelecer pontes entre as
Universidades e o setor privado, com casos de sucesso sendo poucos e que superam uma série de
entraves institucionais para se realizar.
É possível verificar ainda que ênfases distintas são dadas à relação entre inovação e
desenvolvimento na política de inovação brasileira e estas têm implicações sobre o planejamento
estratégico nacional e na escolha e implementação de políticas públicas para os setores envolvidos
nesse processo. Essas ênfases divergentes advêm da tentativa de conciliar vontades políticas que não
estão explícitas no discurso ou na visão da atuação da universidade no contexto de inovação como
ferramenta para o desenvolvimento brasileiro.
Com base nesses e em elementos deles decorrentes, buscaremos aprofundar as
questões ora propostas na construção dos elementos que estabeleçam a distância entre ciência
e tecnologia no contexto brasileiro, bem como o distanciamento de ciência e tecnologia em
relação à sociedade e, consequentemente, ao desenvolvimento nacional. Para isso,
buscaremos ainda realizar uma discussão do sistema nacional de inovação, estabelecendo a
relação entre investimentos e prioridades nacionais em CT&I e propondo indicadores que
evidenciem como a relação entre desenvolvimento e inovação se efetiva no ambiente
complexo de realização da política.
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