A Educação Infantil frente aos diferentes padrões de sono ... · Mirella Mastrobuono, minhas...
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MARIA GORETI MIGUEL SANTOS
A Educação Infantil frente aos diferentes padrões de sono e vigília de crianças de 0 a 3 anos:
dilemas e equívocos.
Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação
PUC/SP São Paulo
2006
MARIA GORETI MIGUEL SANTOS
A Educação Infantil frente aos diferentes padrões de sono e vigília de crianças de 0 a 3 anos:
dilemas e equívocos.
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profa. Dra. Claudia Davis
Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação
PUC/SP São Paulo
2006
COMISSÃO JULGADORA:
______________________________________
Dedico esta Dissertação
À minha família: Fábio, meu amor e
companheiro, Eduardo e Brunna,
meus filhos amados;
À Dra. Carla Mirella Mastrobuono,
minha amiga, responsável por tudo
isso.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pois sem Ele nada é possível.
À minha mãe, Glória, pelo incentivo e por sempre acreditar em mim.
Ao meu pai, Expedicto, e meus irmãos pela compreensão.
Às amigas-irmãs Janí e Fabiana, pela paciência, pela compreensão e
apoio afetivo.
Às amigas Cristina, Danielle, Danny, Ivonete e Sônia, pelo apoio técnico.
À minha querida orientadora Profa. Dra. Claudia Davis, por me conduzir
nos caminhos da pesquisa.
Às amigas do grupo de pesquisa: Maria das Dores, Maria de Lourdes e
Maria Regina.
À Profa. Dra. Mitsuko Aparecida Makino Antunes e Profa. Dra. Carla
Mirella Mastrobuono, minhas queridas qualificadoras.
Às educadoras e as crianças da escola.
À CAPES, pelo apoio financeiro.
RESUMO
O sono é uma atividade de caráter cristalizado nas instituições de
Educação Infantil de atendimento à criança de 0 à 3 anos. Este trabalho
teve por objetivo investigar como os educadores de uma escola pública de
Educação Infantil lidavam com os diferentes ritmos de sono e vigília das
crianças de 0 à 3 anos. No entanto, a análise dos dados coletados
permitiu identificar, além das respostas buscadas, várias outras práticas
cristalizadas, que engendram a rotina institucional das crianças. É urgente
e necessário repensar a formação profissional daqueles que atuam junto à
criança pequena. De fato, os dados revelam desperdício de um tempo
precioso, que poderia ser utilizado em prol do desenvolvimento e da
aprendizagem da clientela. Como isso não ocorre, os propósitos da
instituição são desvirtuados e o papel da Educação Infantil tende a ser
desvalorizado. Espera-se que os resultados aqui alcançados permitam
aprofundar e discutir um assunto importante, ainda não devidamente
estudado.
Palavras-chaves: creche, sono vespertino, criança, Educação
Infantil, Psicologia da Educação, Vygotski, Wallon.
ABSTRACT
Sleep is an activity that has remained unchanged in day care
centers which deal with infants up to the age of 3 years old. This paper
aimed at investigating how educators of public schools for children dealt
with the different sleep and/or vigil rhythms of these children;
nevertheless, an analysis of the collected data showed us that there were
other practices that have also remained unchanged and that are part of
the institutional routine of these children. It is, therefore, of vital
importance to re-examine the educational background of those
professionals who are responsible for young children. In fact, the data
collected shows that there is a waste of time that could be used in a more
productive way in terms of how these children develop and learn. As time
is not used adequately, there is no progress and the objectives of Children
Education tend to be minimized. We hope results shown here will make it
possible to debate in depth such an important issue – which has not been
properly studied yet.
Key words: day care centers, naps, child, children education, education
psychology, Vygotski, Wallon.
1
SUMÁRIO
Introdução............................................................................ 02
I – Ritmos Biológicos.............................................................. 09
II– Educação Infantil no Brasil: atendimento de 0 a 3
ano......................................................................................22
III – A criança de 0 a 3 anos................................................... 26
IV – Método......................................................................... 44
1. Local.............................................................. 44
2. Participantes................................................... 45
3. Procedimentos................................................. 45
V – Análise dos dados............................................................ 49
1. Caracterização da escola................................ 49
2. Selecionando alguns dados centrais................. 61
VI – Considerações finais........................................................ 73
VII – Bibliografia................................................................... 77
VIII – Anexos....................................................................... 79
2
INTRODUÇÃO1
Este tema de pesquisa está ancorado na prática docente de um
grupo de cinco profissionais cursando Mestrado na PUC-SP. Estávamos,
inicialmente, preocupados em compreender como os educadores lidam
com os diferentes ritmos de sono e vigília em sala de aula, da Educação
Infantil até o Ensino Médio. Em discussão e observação de fatos ocorridos
em nossa trajetória profissional, podemos verificar que a maioria dos
educadores e pais desconhece ou ignora essa circunstância que, com
freqüência, prejudica o desempenho escolar de seus alunos e filhos.
Atrasos e sonolência durante as aulas são as manifestações mais
comuns da falta de sintonia entre os ritmos de sono e vigília dos alunos e
os horários escolares. Suas conseqüências mais comuns são rebaixamento
do rendimento escolar, aumento nos conflitos familiares causados pela
briga diária dos pais para que o filho consiga chegar a tempo na escola e
dela tirar proveito. A qualidade da formação dos profissionais é também
um aspecto relevante, pois, por não saberem como trabalhar as
diferenças individuais procuram, na maioria das vezes, escondê-las,
ignorá-las ou ainda para justificar as ações pedagógicas. Já nas
instituições de atendimento de crianças de 0 a 3 anos, em período
integral, o cochilo é obrigatório para todas as crianças após o almoço, sem
levar em conta, muitas vezes, as reais necessidades de sono de cada
criança.
1 Essa introdução foi escrita pelo grupo de pesquisa sobre “ritmos biológicos: sono”.
3
Situações como as acima descritas, podem ser mais bem
apreendidas por meio de comentários colhidos entre educadores que
atuam em creches: “a criança necessita dormir após o almoço”, “a criança
precisa se enquadrar na rotina da creche” ou, ainda, “precisamos de um
descanso: ninguém merece...”. Presenciamos, também, uma conversa
entre a educadora da sala e uma criança do maternal (2 anos e 9 meses),
cuja pergunta, feita ao adulto, força-a a aceitar o argumento da
autoridade:
Cr: “Tia, por que eu tenho que dormir?”
Educ.: “Porque sim”.
Haddad (2002, p. 47) preocupou-se com este assunto em sua
dissertação de mestrado, mas, no entanto não se aprofundou. Ao analisar
uma creche da periferia de São Paulo, descreve:
“O repouso era obrigatório para todas as crianças, ocorrendo após
o almoço, num período de duas horas (12h às 14h). As que
acordavam antes deveriam permanecer no lugar, sem fazer nada.
As pagens aproveitavam esse horário para tricotar, fazer unha,
conversar. Muitas vezes, esse horário era utilizado para reuniões
emergenciais”.
No entanto, professores do Ensino Fundamental e Ensino Médio
relatam situações nas quais alguns alunos dormem durante suas aulas.
Estas situações são, algumas vezes, ignoradas pelo professor; outras são
sentidas como extremamente incômodas, mas o fato é que os docentes
parecem não saber como lidar com essa situação. Presenciamos uma
4
situação onde a professora afirma: “Se ele for indisciplinado, eu prefiro
que ele durma, principalmente quando as salas têm mais de 45 alunos.
Mas, se for um bom aluno, eu busco saber por que ele está com sono”.
Neste momento, percebemos que seria importante pesquisar melhor
– e de maneira mais aprofundada – o assunto. No entanto, as tentativas
de encontrar subsídios na literatura mostraram-se infrutíferas, uma vez
que dificilmente se encontram artigos e trabalhos voltados ao tema.
Demo-nos conta de que o assunto praticamente não é abordado. Se isso
constituía, inegavelmente, um fator que dificultava a pesquisa, por outro
já existia entre nós a preocupação e, sem dúvida, o interesse, em saber
como os professores vinculados a diferentes níveis de ensino lidam com os
variados ritmos de sono e de vigília, dentro da sala de aula.
É notório que a organização do tempo das instituições escolares
busca seguir um mesmo padrão e um mesmo ritmo para todos os alunos,
não levando em conta as peculiaridades de cada um. Segundo Perrenoud
(1996), a escola não pode ser indiferente às diferenças: não se deve
esperar que todas as crianças apresentem o mesmo comportamento, sob
o risco de se homogeneizar o que é, em essência, distinto. Vermeil (1999,
p.6) afirma que:
“Homogeneizar os horários da jornada, os programas da semana,
ou do ano, unicamente em função da vontade da equipe escolar e
das necessidades do sistema de ensino não é, de forma alguma,
uma situação aceitável. É preciso, ao contrário, lembrar, com
insistência, que as exigências de sono não são as mesmas para
5
todos, variando, consideravelmente, no próprio indivíduo, em
função de sua saúde ou e de suas preocupações”.
Mas o que é sono? Stampi (1996), Louzada e Menna-Barreto (2004)
afirmam que a criança, ao nascer, apresenta sono polifásico, ou seja,
vários períodos de sono e vigília durante o período circadiano (ciclo de 24
horas), dormindo aproximadamente 18 horas diárias. Este sono polifásico
caminha, com o passar dos anos, na direção do sono monofásico. Mas há
de se levar em conta os diferentes ritmos biológicos. Berlucchi (1996, p.
1) mostra que:
“(...) a atividade cerebral, cuja função é manter a alternância
entre sono-vigília, depende de processos endógenos relacionados
à atividade cíclica neuronal ou de circuitos neuronais, que
constituíram os relógios biológicos. Estes grupos neuronais/redes
encontram-se submetidos a retroalimentações neuronais ou
bioquímicas. Tanto a atividade neuronal como acúmulo ou
esgotamento de neurotransmissores podem desequilibrar o
sistema para a vigília ou para o sono”.
Para entendermos o comportamento do sono devemos entender,
primeiro, como se dá o desenvolvimento humano. Para isso fomos buscar
subsídios nas teorias de desenvolvimento de Gesell, Wallon e Vygotski.
Gesell concebe o desenvolvimento da criança como um “continuum”.
Embora admita as diferenças individuais, sua teoria apresenta certa
linearidade por afirmar que a psicologia da criança de cinco anos, por
exemplo, é o produto de tudo que aconteceu nos quatro anos após seu
6
nascimento, mais as 40 semanas que antecederam o nascimento. Esse
“produto”, por sua vez, é determinado pela maturação do sistema
nervoso, isto é, predominantemente pelos fatores orgânicos. Não há, para
esse teórico, grande influência do meio social ou da cultura no
desenvolvimento da criança.
Em contraposição a essa concepção – que vê ou entende o
desenvolvimento de maneira linear – a teoria psicogenética walloniana
supõe que o desenvolvimento se faz por meio de determinações
recíprocas entre os fatores orgânicos e o meio social e culturais da
criança. A passagem de um a outro estágio do desenvolvimento não é
uma simples ampliação das habilidades adquiridas no estágio anterior,
mas implica uma ampla reformulação, no bojo da qual se instalam
conflitos que podem influenciar a conduta da criança.
Para Wallon, embora os fatores orgânicos sejam mais determinantes
no início da vida, progressivamente eles vão cedendo espaço aos de
natureza social. Presente desde as aquisições básicas (como a preensão, a
marcha, etc.), a influência do meio social torna-se mais decisiva para a
conquista das condutas psicológicas superiores. Ou seja, o simples
amadurecimento do sistema nervoso não é suficiente para explicar o
desenvolvimento de habilidades intelectuais mais complexas, como a
representação simbólica, a linguagem, a imitação e o desenho.
Deste modo, Wallon propõe abordar a criança de uma forma
contextualizada, considerando que se instala, entre seus recursos
7
biológicos e seu meio físico e social, uma dinâmica de determinações
recíprocas. Assim, em cada cultura, as pessoas próximas, a linguagem, o
ambiente em que se vive constituem o contexto de desenvolvimento da
criança.
Assim como Wallon, Vygotski aponta que a condição biológica é a
base material para o desenvolvimento humano, salientando, ainda, que as
condições sociais e culturais de cada indivíduo não se dissociam. Na
verdade, o homem não é mero produto das condições biológicas; ao
contrário, as condições sociais fazem dele um ser “ativo, social e histórico”
(Bock, 1999, p.30), de modo que, se há uma base biológica no ser
humano, ela, por si só, não é suficiente para o humanizar. O homem, ao
nascer é, antes de tudo, candidato à humanidade, condição que só
alcança se embebido em condições sociais e culturais que o humanizam.
Pino (2003, p. 51), discutindo Vygotski, confirma esta visão:
“... o que define o homem como ser humano (sua essência) não é
algo previamente dado, como é a natureza biológica que herda
dos seus antepassados, mas algo que se constitui na história
social dos homens”.
Nesse sentido, também Bock (1999, p. 28) afirma que: “na idéia de
condição humana, nada no homem está aprioristicamente concebido”.
Partindo desta concepção, entendemos que os ritmos de sono e vigília não
são determinados somente pelo fator biológico, mas dependem, em
8
muito, das circunstâncias sociais e culturais em que os indivíduos estão
inseridos.
Nesta pesquisa, investigamos como uma instituição pública de
Educação Infantil lida com os diferentes ritmos de sono e vigília de
crianças de 0 a 3 anos. Os dados foram coletados por meio de entrevistas
e, também, de observações em sala de aula. Nossa meta é que os
resultados aqui alcançados possam auxiliar os educadores a trabalhar
mais e melhor com a diversidade de educandos que se encontram sob sua
guarda, garantindo, a cada um deles, as melhores condições para explorar
seu ambiente físico e social, segundo seus próprios ritmos e tempos, de
modo a tirar melhor proveito da experiência escolar.
9
I. RITMOS BIOLÓGICOS2
Segundo Menna-Barreto e Louzada (2004), relógios biológicos “são
variações recorrentes, periódicas e previsíveis de comportamento, na
maioria dos casos, sincronizados aos ciclos ambientais”. Todos os seres
apresentam um relógio biológico, pois existem “sistemas orgânicos
especializados em gerar ciclos funcionais, que caracterizam os ritmos
biológicos” (Lent, 2004, p. 521). Muitos comportamentos são cíclicos por
natureza como, por exemplo, o cio, o ciclo menstrual e ciclo das 24 horas.
Em todos estes ciclos, há alterações orgânicas e, muitas vezes,
psicológicas (Coren, 1996). As variações observadas dentro de um ciclo
são chamadas de ritmo circadiano do ciclo sono/vigília e, do dia para a
noite, variam a pulsação, a pressão sanguínea, a temperatura corporal,
bem como vários outros fenômenos fisiológicos e psicológicos. O ritmo
circadiano corresponde à organização temporal cujas flutuações se
completam a, aproximadamente, cada 24 horas. Neste estudo, entre os
diversos ritmos biológicos, focaremos o sono/vigília de crianças pequenas,
buscando verificar e compreender como os educadores lidam com este
fato em sala de aula.
Segundo Coren (1996), vigília é o momento em que estamos
processando informações por meio de nossos sentidos e monitorando o
mundo a nossa volta. O oposto da vigília é o sono. Segundo Martinez
(1999) o sono não é um processo mental ou psíquico e sim um processo
2 Esse texto foi escrito em parceria pelo grupo de pesquisa sobre “ritmos biológicos: sono”.
10
neural que tem sua origem no Sistema Nervoso Central em estruturação
subcorticais, ocorrendo o mesmo em animais inferiores. Para os
psicólogos, segundo Coren (1996), tanto o sono quanto à vigília
representam estados de consciência, só que em níveis diferentes.
Chamamos consciência ao fato de percebemos o que ocorre à nossa volta,
mesmo quando isto não chama nossa atenção. Ainda que não notemos,
nosso cérebro registra tudo que ocorre no ambiente que nos envolve.
Até por volta da metade do século passado, acreditava-se que o
sono era um processo passivo, semelhante a um “desligamento”
temporário do cérebro. Sabemos que, no sono, a freqüência de descargas
dos neurônios chega a ser maior do que durante a vigília, de forma que
podemos considerá-lo como um processo ativo. Assim, a maioria dos
seres vivos possui “relógios internos” - chamados de sistema de
temporização - que regulam o ciclo sono/vigília. A luminosidade, ao que
tudo indica, é um dos fatores que monitora o sono.
Se em um final de semana não colocarmos o relógio para despertar,
provavelmente acordaremos no mesmo horário de costume; mas, ao
lembrar que é final de semana, voltaremos a dormir. Se fizermos o
mesmo teste na noite seguinte, tendo o cuidado de fechar todas as
cortinas, impedindo a entrada da luminosidade, dormiremos várias horas
mais do que costumamos fazer. Essas pequenas observações nos indicam
que, mesmo dormindo, nosso organismo está regulado por fatos que
ocorrem ao nosso redor.
11
O ramo da ciência que estuda os ritmos biológicos é a Cronobiologia,
uma disciplina em ascensão em vários campos: a área molecular, a
fisiologia, a saúde pública, a medicina e, inclusive, a psicologia, com a
identificação da importância da ritmicidade biológica para as funções
cognitivas, principalmente para o processo de aprendizagem e para a
memória. Apesar disto, a área da educação desconhece e/ou ignora os
ritmos biológicos.
Partimos do pressuposto de que somos uma sociedade em que se
valoriza quem dorme pouco, quem trabalha mais horas do que o previsto
ou quem está alerta a maior parte do tempo. Ora, dormir pouco, como é
de muito sabido, é um costume que, além de ser prejudicial à saúde,
altera a atenção, a concentração e a aprendizagem, podendo, inclusive,
provocar acidentes. Mas apesar das evidências destes fenômenos a
ciência, segundo Martinez (1999), ainda não conseguiu comprovar que o
sono seja restaurador.
Thomas Alva Edison, ao inventar a lâmpada, colaborou para que o
homem dormisse menos. Para ele, que não dormia mais do que 4 a 5
horas por dia, o sono era um desperdício. Seu invento transformou a
sociedade, alongando o período de vigília. Sabe-se, hoje, que o ser
humano, mesmo na ausência de luminosidade, continua apresentando um
ritmo circadiano. Menna-Barreto e Louzada (2004, p.17) relatam que:
“Em um desses experimentos, pesquisadores, curiosos em saber
o que ocorria com o ciclo sono/vigília na ausência dos ciclos
ambientais, isolaram-se em cavernas, longe de qualquer pista
12
que denotasse a passagem do tempo. Nessa situação,
observaram que o ciclo sono/vigília, bem como outros ritmos
biológicos (como, por exemplo, o ritmo da temperatura corporal)
persistem, mas, sua expressão se modifica. O período do ciclo, ao
contrário de apresentar 24 horas, passa a se expressar em um
período maior, em alguns casos de 25 horas. Ou seja, nossos dias
tornam-se mais longos”.
Isto significa que pessoas submetidas a essa situação dormem um
menor número de “noites”, o que vai causando uma defasagem em
relação ao mundo externo (fora da caverna). Mas como conciliar as
defasagens do ritmo circadiano humano e as exigências da sociedade
contemporânea? Lent (2004) acredita que a luminosidade sincroniza o
relógio interno com o horário local, pois, para este autor, o núcleo
supraquismático - situado no hipotálamo e acima do quiasma óptico - é o
responsável pelo sistema temporizador circadiano dos mamíferos. Ao
receber a informação da luminosidade do ambiente, gera um ritmo
acoplado ao ciclo da noite e do dia. Nesse sentido, luminosidade é um
estímulo temporizador, também chamado de Zeitgeber3.
A luz é um fator central no ciclo sono/vigília, pois regula o ritmo
deste sistema. Pessoas com deficiência visual não dispõem deste fator
externo para regular o ciclo e, segundo Coren (1996), cerca de 76% delas
apresentam dificuldade para dormir no horário habitual, costumando
acordar várias vezes durante a noite e ter sonolência durante o dia.
3 Palavra alemã utilizada em textos técnicos da neurociência.
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A glândula pineal é responsável por manter a regulação endócrina
(equilíbrio hormonal). Quando a noite chega, ou seja, quando diminui a
luminosidade, ocorre um desencadeamento de sinais neurais que estimula
a glândula pineal e, com isso, o hormônio, chamado melatonina, que nos
torna sonolentos, é liberado. Pesquisas indicam que “a melatonina atua
sobre o núcleo supraquiasmático, mantendo o ciclo sincronizado com o dia
de 24 horas” (Coren, 1996, p. 75). Durante o sono, os níveis de
melatonina estão dez vezes aumentados em relação ao período diurno e,
no final da noite, começam a decair, levando, assim, o corpo a despertar.
Em diferentes idades, os níveis de melatonina também variam. Os
jovens liberam o dobro deste hormônio em relação a uma pessoa adulta.
As crianças pequenas, como estão em desenvolvimento, apresentam, às
vezes, oscilações que justificam o sono repentino e imprevisível. Não
podemos esquecer, porém, que este mecanismo natural - o relógio
biológico - pode sofrer alterações caso ocorram mudanças fisiológicas
como, por exemplo: aumento de temperatura, que torna o ritmo do
organismo mais rápido; circunstâncias culturais; variações das estações
do ano, que tornam os dias mais longos ou mais curtos.
Além disso, as pessoas diferem psicologicamente e, segundo o
autor, “não é de surpreender que nossos relógios biológicos não
trabalhem na mesma velocidade. Apesar de todas as pessoas iniciarem
seu dia quando a luz reajusta o relógio circadiano, nem todas seguem o
mesmo ritmo” (Coren, 1996, p. 76). Há pessoas que gostam de acordar
cedo e realizam todas as suas atividades a rigor durante o dia, diminuindo
14
o ritmo ao anoitecer. Indivíduos que seguem esta rotina são o que os
pesquisadores chamam de cotovias ou “tipos solares”. Ao contrário delas,
existem outras que gostam de acordar tarde e de realizar suas atividades
até altas horas da noite, sem demonstrar cansaço ou sonolência. São os
chamados “tipos lunares” ou “corujas”.
A maior luminosidade pode, efetivamente, prolongar o dia. Em
função disso, a indústria criou diferentes turnos de trabalho e as fábricas
passaram a funcionar 24 horas. Hoje, com o advento da Internet e toda a
facilidade da era da informação, já é comum ouvirmos a seguinte frase:
“O dia com 24 horas é pouco para tudo que tenho para fazer”. Percebe-se
que qualquer atividade adicional em nossas vidas diminui nossas horas de
sono, confirmando nosso apreço pela vigília. Sabe-se, no entanto, que é
recomendável dormir mais ou menos oito horas por dia, para não nos
sentirmos sonolentos ou cansados, conseguindo concentrar-nos no
trabalho ou nos estudos, embora haja variações individuais.
Em 1953, na Universidade de Chicago, Aserinsky e Kleitman
identificaram dois momentos durante o sono. O primeiro é aquele em que
não há ocorrência de movimentos oculares, enquanto que, no segundo,
estes se fazem presentes. Os autores denominaram este último período
de REM (Rapid Eye Movement) e, com esse estudo, permitiram que dois
estágios muito distintos de sono fossem identificados: a) o sono de ondas
lentas, ortodoxo ou não-REM; b) o sono REM, ativado ou paradoxal. Estes
estágios alternam-se durante a noite, formando ciclos com duração
aproximada de 90 minutos. William Dement que pertencia a esta equipe
15
de pesquisadores verificou que em 88% dos sujeitos observados, quando
acordados no sono REM, apresentavam relato de sonho (Martinez, 1999).
Após experimentos, Coren (1996) concluiu que o sono é constituído
pelos seguintes estágios: sonolência, sono leve, sono moderadamente
profundo e sono muito profundo. Cada um desses estágios possui
características próprias. Na sonolência, estamos em um estágio de
semiconsciência, em um momento de transição entre a consciência do
ambiente e o sono propriamente dito. A seguir, vem o sono leve que,
conforme o próprio nome sugere, é aquele do qual a pessoa acorda com
facilidade e, às vezes, confunde-se com o cochilo. Já os sonos
moderadamente profundo e muito profundo - medidos por meio de
aparelhos de EEG (eletro-encefalograma) – são marcados por ondas
lentas, havendo dificuldade em acordar. Quando isso ocorre, a pessoa
parece estar desorientada e leva algum tempo para se dar conta do
ambiente ao seu redor. Em uma noite, passamos por 4 a 6 ciclos de sono.
A parte mais profunda do sono de ondas lentas é um sono
reparador, desde que apresente maiores quantidades de sono delta4 e
paradoxal. Estudos revelam que a privação do sono é prejudicial à saúde:
quanto maior for a privação, mais os sintomas se acentuam, de modo que
se pode ir da dificuldade em resolver simples testes até a presença de
alucinações, distorções de visão, delírios, paranóias, mudanças negativas
4 Segundo Coren (1996) o sono delta é um sono profundo seguido do sono REM, ou seja, um estágio anterior ao sono REM.
16
de humor, alterações de coordenação motora ou das capacidades
sensoriais, dificuldade de concentração etc.
Os pesquisadores acreditam que o sono é uma forma de proteger o
organismo: ao dormir, o sistema imunológico está alerta a qualquer
ataque de microorganismos, de modo que diminuição do tempo normal de
sono aumenta, em geral, o risco de infecções (Coren, 1996; Martinez,
1999; Ruddy & Nagel, 2004). A maior parte das experiências de privação
de sono realizadas até hoje foi com pessoas comuns e um determinado
objetivo: permanecer “X” horas sem dormir. Tomou-se o cuidado de
envolver apenas pessoas jovens e saudáveis que, após a privação do
sono, pudessem se recuperar rapidamente. Mas, o que aconteceria se
essas pessoas não fossem jovens e persistissem na experiência? Estudos
com animais mostraram que a persistência da privação do sono pode
levar à morte (Houzel, 2002; Ruddy & Nagel, 2004).
Houzel (2002) descreve o experimento de Alan Rechtschaffen sobre
privação do sono. Nesse estudo, dois ratos foram criados em condições
idênticas, mas somente a um era permitido dormir. Após a quarta semana
de experimento, o rato privado de sono morreu com falência generalizada
do equilíbrio energético do corpo. Houzel (2002) acredita que o sono
cumpre uma função reparadora para o corpo e para o cérebro. No
entanto, a despeito da literatura deixar claro que o sono é necessário para
a saúde, as conseqüências físicas decorrentes de sua ausência são ainda
bastantes desconhecidas.
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O sono muda ao longo da vida, ainda que seja um fenômeno
constante: o recém-nascido, por exemplo, dorme em média 18 horas, em
períodos fracionados durante o dia (sono polifásico), pois o ritmo
circadiano não está estabelecido, algo que só ocorrerá por volta de 4
meses. Nesta fase inicial da vida do bebê, o responsável por cuidar da
criança deve zelar pela qualidade de seu sono, uma vez que ele depende
de fatores biológicos e externos (ruídos, bem como temperatura e
claridade, são variáveis que poderão influenciar na qualidade do sono da
criança). Mazet (1990) afirma que estes fatores não podem ser
dicotomizados, uma vez os fatores biológicos sofrem influência dos fatores
externos na qualidade do sono:
“O sono não é, no entanto, unicamente uma função
neurofisiológica. Os cuidados maternos (manutenção,
manipulação, voz, calor, contatos) impregnam o sono de sua
carga afetiva, permitindo assim ao bebê abandonar-se ao sono. A
mãe é, assim, uma verdadeira ‘guardiã’ do sono de seu bebê (p.
156)”.
Ainda segundo Mazet (1990), o impacto de mudança do modo de
vida e a educação atual são pontos que devem ser destacados no
comportamento do sono, pois as condutas familiares serão de grande
importância na estruturação do padrão do sono da criança. À medida que
o bebê cresce, os períodos de vigília tendem a aumentar e a criança deixa
de fracionar o sono durante o dia (Reimão e Diament,1956). Após o sexto
mês de vida, segundo estes autores, o sono infantil passa de polifásico
18
para bifásico, ou seja, o sono se diferencia entre dois períodos: o noturno
e o diurno, após o almoço. Wussbluth e colaboradores (apud Reimão e
Diament, 1956) observaram um declínio na duração do sono diurno: até
um ano a criança dorme em média 3h; aos dois anos esta média cai para
cerca de 2h e aos 3 anos a criança dorme em média 1h30. Nesse sentido,
alguns autores, tais como Gesell, indicam que, por volta dos 4 anos de
idade, a criança abandona a sesta e passa a possuir somente um ciclo de
sono-vigília (de 10 à 12 horas de sono noturno) no seu ritmo circadiano: o
chamado de monofásico.
De acordo com as pesquisas realizadas por Ragin e Schachter (apud
Reimão e Diament, 1956) a partir dos dois anos, 8% das crianças
observadas apresentavam sono monofásico, e o restante das crianças
observadas apresentava o sono bifásico. No entanto existe uma grande
variação de uma criança para outra em relação à duração do sono diurno:
de 1 hora a 2 horas e meia. Nesse sentido, como vimos, existe uma
grande variação e não se deve esperar o mesmo ritmo de todas crianças.
Já o pré-adolescente e o adolescente dormem menos: cerca de 8
horas por dia. Esta redução de horas dormidas deve-se a vários fatores: à
escola, às atividades de lazer, às de cunho social e outras. O ideal seria
que os jovens dormissem mais ou menos 10 horas por dia, o que
normalmente não ocorre, na medida em que tendem a imitar os adultos.
Reimão e Diament (1952) afirmam que nesta idade existe um déficit
crônico de sono determinado socialmente, e surgindo muita sonolência
diurna. Já o idoso dorme menos, cerca de 6 horas diárias. Sabe-se,
19
também, que o ser humano com privação de sono dorme mais rápido,
algo que pode ser comprovado pelo teste conhecido como ‘Latência do
Sono’5.
Acrescente-se a isto, o fato de que a semana escolar não
acompanha o ciclo individual de sono/vigília, de modo que, ao final, o
jovem acumula um enorme déficit de sono. Isto faz com que reclame de
sonolência durante o dia, além de apresentar “redução no período de
concentração, redução do desempenho de tarefas que exigem atenção,
movimentos precisos, memória, capacidade de decisão e outras
habilidades cognitivas” (Coren, 1996, p. 98). A preocupação com o sono
do aluno deveria, portanto, estar presente na proposta pedagógica das
escolas. No entanto, ela ainda não faz parte da cultura escolar, como bem
explicam Menna-Barreto e Louzada (2004, pp. 50-51):
“Momentos que merecem atenção são aqueles que se referem a
períodos de transições, principalmente aqueles que se dão da 4ª
para a 5ª série do Ensino Fundamental e da 8ª série do Ensino
Fundamental para a 1ª série do Ensino Médio. Além do desafio de
enfrentar novas disciplinas e professores, há, muitas vezes, um
aumento das exigências acadêmicas, com a necessidade de
enfrentar desafios de natureza temporal. (...) Se a puberdade
atrasa a expressão da ritmicidade biológica, os alunos nessas
situações têm que acelerar seus ritmos, como se estivessem
andando na contramão, contrariando a tendência característica
dessa etapa do desenvolvimento. (...) Estudos realizados em
escolas norte-americanas mostraram que um adiantamento de 45
minutos no horário de início das aulas já é o suficiente para
5 Período desde o apagar das luzes à noite até o momento que se inicia o 1º estágio do sono (Reimão e Diament, 1952, pg. 6).
20
acentuar a privação de sono nos adolescentes e para afetar o
desempenho escolar dos alunos”.
A maioria das escolas brasileiras reserva o período da tarde para as
crianças pequenas (até a 4ª série do Ensino Fundamental) e o período da
manhã para os alunos de 5ª série em diante. Ora, esses últimos são
aqueles que já entraram - ou entrarão brevemente - na adolescência. A
entrada na puberdade desencadeia inúmeras mudanças no organismo e
no comportamento dos adolescentes. Uma delas é o atraso no dormir e no
acordar. Os horários escolares, no entanto, não acompanham esse atraso,
caminhando, pois, na contramão das modificações biológicas das crianças,
pré-adolescentes e jovens.
Mesmo com as aulas começando logo pela manhã (em geral, entre
7h e 7h30), as faixas etárias mais baixas não são capazes de dormir mais
cedo, ainda mais se há televisão, Internet ou amigos por perto. Como se
sabe, a sonolência em sala de aula diminui a atenção e o interesse dos
alunos, podendo, inclusive, comprometer seu desempenho escolar. Uma
outra conseqüência, que também está relacionada à aprendizagem, é o
prejuízo que a falta de sono traz para a memória. Além disso, a privação
do sono tem efeitos negativos sobre o humor e o controle do
comportamento: irritabilidade; agressividade e baixa tolerância à
frustração; aumento da impulsividade e da sensação de tristeza são
manifestações típicas de falta de sono.
21
No entanto, a privação do sono pode ser compensada de duas
formas. Primeiro, a sociedade admira tanto o esforço, que supervaloriza
aqueles que chegam a passar noites em claro para estudar ou executar
tarefas tidas como importantes, em especial quando bons resultados são
alcançados. Isto é mais fácil de acontecer em disciplinas que envolvem a
memorização de fatos, dados ou fórmulas, material que fica retido na
memória até o momento das avaliações. Tudo será, posteriormente,
esquecido, uma vez que não foram devidamente armazenados na
memória de longa duração.
Se na escola o sono é algo que passa despercebido para os
educadores, já em instituições de Educação Infantil de atendimento a
crianças de 0 a 3 anos, o sono é uma prática obrigatória para todas as
crianças que, muitas vezes, não leva em conta as reais necessidades e
ritmos de sono e vigília de cada criança, constituídos no círculo cultural e
familiar.
Como vimos existem variações que devem ser respeitadas. Esta
pesquisa investigou como os educadores de escolas públicas de Educação
Infantil lidam com os diferentes ritmos de sono e vigília das crianças de 0
a 3 anos. Para tanto, o próximo capítulo fará uma pequena exposição dos
avanços e das conquistas da Educação Infantil nesta faixa etária, aqui no
Brasil.
22
II – EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: ATENDIMENTO DE 0 A 3
ANOS
Este capítulo tem o objetivo de descrever como o atendimento
escolar de crianças de 0 a 3 anos no Brasil passa por transformações e
emancipações. Segundo Scarpa (1998), Oliveira (1992,2001), Haddad
(2002) e Kuhlmann (1998) as creches abriram suas portas adotando um
critério basicamente assistencialista, no intuito de resolver problemas
relativos ao trabalho feminino, à mortalidade infantil, ao abandono e à
pobreza de forma predominantemente filantrópica médico-assistencial. As
creches e as pré-escolas eram vistas como “espaços de recreação e
brincadeiras destinados a garantir o cuidado e a assistência à criança”
(Scarpa, 1998, p. 20). Haddad (2002, p. 25) caracteriza as circunstâncias
em que as creches foram instituídas:
“Provém dessa fase inicial sua vinculação [da creche] à pobreza,
ao abandono e às sociedades de proteção à infância. Um vínculo
marcado pela tarefa de moralizar as vidas das famílias atendidas
e de estabelecer com elas uma relação de favor, salientando sua
incompetência em arcar com as responsabilidades junto a seus
filhos. Por atuar desde sua origem num campo que não era
legítimo, a existência da creche tem sido justificada como um
paliativo, não se configurando enquanto instituição permanente,
que necessita de recursos próprios para sobreviver. Essa marca
de instituição emergencial se evidencia na precariedade e
insuficiência de recursos; na má-qualidade do atendimento; nos
quadros profissionais deficitários e sem formação específica,
muitas vezes compostos por voluntários; na baixa razão
23
adulto/crianças; na ausência de legislação específica e de normas
básicas de funcionamento. Enfim, nas dificuldades generalizadas
de investimentos de qualquer natureza – de ordem material,
física ou Humana –, impedindo a promoção da qualidade nas
creches”.
No Brasil, até hoje, algumas destas características são ainda
encontradas: destacamos entre elas a improvisação, a falta de propostas
educativas e de política públicas. No entanto, em 1988, a nova
Constituição Brasileira, pela primeira vez, estabelece, no artigo 208, inciso
IV, que é dever do Estado e direito da criança prover e ter acesso ao
atendimento em creches e pré-escolas. A Constituição do Estado de São
Paulo, de 1989, em seu artigo 240, enfatiza ser da responsabilidade dos
municípios autorizarem e supervisionarem o funcionamento das
instituições de educação infantil que atendam crianças de 0 a 6 anos. Em
1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente destaca, também, este
mesmo direito. Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases (Lei
nº 9394/96), ficou estabelecido que as creches e pré-escolas passariam a
integrar-se ao sistema se ensino e seriam consideradas como instituições
de Educação Infantil; e ainda, no título III - Do Direito à Educação e do
Dever de Educar -, o artigo 4º, inciso IV, afirma que: “O dever do Estado
com Educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de
atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis
anos de idade”. No título IV, artigo 11 considera-se que:
24
“Os municípios incumbir-se-ão de oferecer a educação infantil em
creches e pré-escolas e, com prioridade, o ensino fundamental,
sendo permitida a atuação em outros níveis de ensino quando
estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de
competência e com recursos acima dos percentuais mínimos
vinculados pela manutenção e desenvolvimento do ensino”.
Em 1998, o MEC (Câmara de Educação Básica - CEB) aprova o
Parecer Nº 022/98 que visa nortear as propostas curriculares e os
projetos pedagógicos por meio das Diretrizes Curriculares para Infantil e o
CEB nº 022/98 vem ao encontro do Referencial Curricular Nacional para
Educação Infantil (MEC, 1998), cujo objetivo é servir de guia de reflexão
para os educadores, respeitando estilos pedagógicos e a diversidade
cultural do nosso país. Estes avanços constitucionais e a formulação de
políticas públicas para atendimento à Educação Infantil foram
impulsionados pela inserção da mulher no mercado de trabalho e pelas
mudanças estruturais e de organização familiar ocorridas nas últimas
décadas.
Nesse sentido, a Educação Infantil ganhou importância e
legitimidade, conforme afirma Scarpa (1998), justamente porque
representa um avanço e um direito da criança e não da mãe trabalhadora
ou de uma classe social desfavorecida. Tratava-se de mais uma opção
para a família. Apesar de a Educação Infantil ganhar legitimidade na
forma de lei, na prática os avanços ainda são pequenos, passando quase
despercebidos. Na prática, pode-se dizer que a Educação Infantil
25
encontra-se em um processo de construção de identidade, restando ainda
muito chão a ser percorrido. Concordamos com Oliveira (1992, p.16),
quando afirma:
“Acreditamos ser básico, na garantia de uma boa qualidade no
trabalho junto às crianças, a formação dos educadores, associada
aos demais aspectos estruturais da creche: sua filosofia, sua
proposta pedagógica e condições de trabalho. Tal instituição
poderá, assim, efetivar sua ação educativa dando passos
significativos na modificação de sua história”.
Para dar continuidade a este trabalho, faz-se necessário apresentar
a concepção de desenvolvimento humano que defendemos: a da teoria
sócio-histórica, segundo a qual o homem se constitui na e pela interação
social “que estabelece com outros homens e com a natureza, sendo
produto e produtor destas relações num processo histórico” (Davis, Silva e
Espósito, 2004 p.641). Este será o objetivo do próximo capítulo.
26
III. A CRIANÇA DE 0 A 3 ANOS
Este capítulo tem como objetivo descrever o desenvolvimento da
criança de zero a três anos, foco da nossa pesquisa. A questão de como o
ser humano se desenvolve é, conforme mencionado, objeto de estudo de
inúmeros teóricos. Nesse texto, no entanto, escolhemos privilegiar as
teses de Arnold Gesell (1880-1961), Liev Semiónovitch Vygotski6 (1896-
1934) e Henri Wallon (1879-1962).
Escolhemos falar de Gesell porque suas idéias estabelecem um bom
contraponto aos outros autores adotados, pois adota uma concepção
inatista de desenvolvimento, ou seja, a de que ele é basicamente
determinado por fatores biológicos e hereditários (Oliveira, 1992). Até
hoje, infelizmente a nosso ver, esta concepção de desenvolvimento
influencia as propostas e as práticas educativas, como bem afirma Oliveira
(1992, p.28): “A idéia inatista é ainda forte em nossa cultura e serviu de
base para a formulação de algumas teorias pedagógicas, influenciando
muitas das práticas educativas, em especial as que ocorrem com crianças
pequenas, antes da escola de primeiro grau”.
Para Gesell, o desenvolvimento é previsível, pois a cada faixa etária
espera-se que a criança apresente um determinado comportamento, a
partir das potencialidades dadas já ao nascer. Nesse sentido, a maturação
6 No Brasil existem várias formas de grafar o nome deste autor como Vigotski, Vigotsky entre outros. Adotaremos neste trabalho a grafia Vygotski como na tradução espanhola das Obras Escogidas, no entanto serão respeitadas as outras grafias dos autores citados no texto.
27
biológica tem grande destaque em seu enfoque de desenvolvimento
humano. Gesell afirma:
“O estudo de milhares de bebês e crianças pequenas e sadias nos
facultou determinar as tendências médias de seu
desenvolvimento comportamental. Verificamos que (a) as
seqüências de desenvolvimento, isto é, a ordem em que
aparecem os padrões comportamentais, e (b) a idade cronológica
em cada padrão aparece são significativamente uniformes.
(mimeo, s.d., p. 6)”.
Gesell divide o desenvolvimento infantil em etapas cronológicas
rígidas, para as quais a cultura pode contribuir, mas seu papel é, sem
dúvida, menor do que o processo de maturação biológica. O
desenvolvimento segue um ritmo previsível, que seria a súmula da
evolução da espécie humana, ou seja, a ontogênese reproduziria a
filogênese ainda que de maneira breve. Gesell afirma que:
“O homem não se fez num dia. Foram necessários milênios para
que atingissem a forma atual as suas capacidades de locomoção,
de linguagem, de manipulação, de funcionamento cerebral, de
percepção matizada, de previsão profundamente imaginativa. A
criança tem de re-atravessar, de forma sumária, todos esses
milênios. Isso também leva tempo. O seu organismo tem de
apanhar os fios essenciais dessa ancestralidade e tornar a tecê-
los. As vastas complexidades do seu sistema nervoso
correspondem à vastidão do seu passado ancestral. (...) todo
desenvolvimento sempre é produto de tudo o que já lhe
aconteceu (...) todo crescimento assenta num crescimento
anterior.” (2002, p. 27)
28
Enfim, para este autor o desenvolvimento está centrado na
maturação biológica e nas potencialidades dadas pela hereditariedade ao
nascer. A visão determinista de desenvolvimento de Gesell afasta-o,
consideravelmente, das propostas de Wallon e de Vygotski, uma vez que,
para estes últimos, a cultura é fator indispensável para o
desenvolvimento. Wallon e Vygotski são dois teóricos que se aproximam
teoricamente, pois seus fundamentos filosóficos apóiam-se nos
pressupostos do Materialismo Dialético. No entanto, vale notar que
existem entre eles diferenças de vulto, que fogem ao escopo deste
trabalho7.
Wallon e Vygotski eram contemporâneos, e Vygotski citou, em sua
obra, os trabalhos de Wallon, entre os anos de 1932 e 1934. Wallon,
entretanto, só teve contato com a obra de Vygotski em meados de 1954,
quando Leontiev, que tinha sido seu colaborador, apresentou-lhe alguns
trabalhos do companheiro. Tanto Wallon como Vygotski fundamentaram-
se, epistemológica e metodologicamente, no materialismo histórico e
dialético marxista. Essa teoria contribuiu para a Psicologia com seu
método de análise da realidade. Neste sentido, o materialismo histórico e
dialético “caracteriza-se pelo movimento do pensamento através da
materialidade histórica da vida dos homens em sociedade, isto é, trata-se
de descobrir (pelo movimento do pensamento) as leis fundamentais que
diferem a forma organizativa dos homens em sociedade através da
história” (Pires, 1997, p. 83).
7 Para discussão das diferenças entre Wallon e Vygotski ver CLOT, Y. (0rg). Avec Vygotski. 2.ed. La Dispute:
29
Pautados nos fundamentos filosóficos de Marx, Wallon e Vygotski
afirmam que o homem difere dos outros animais, pois conseguiu transpor
“os limites impostos pelas ‘eternas leis da natureza’ e assumiu o curso da
própria evolução que constituiu a História” (Pino, 2003, p. 41). Portanto, o
homem ao nascer é, segundo eles, tão somente candidato à humanidade;
ele só se torna homem na e pela interação social, “que estabelece com
outros homens e com a natureza, sendo produto e produtor dessas
relações num processo histórico” (Silva e Davis, 2004 p. 641). Nesse
sentido, tudo que o homem tem de humano vem da vida em sociedade.
Charlot (1979, p. 268) afirma: “O homem é inteiramente, ao mesmo
tempo, biológico e social. Porque são satisfeitas graças a condutas sociais,
e não graças a instintos, as necessidades biológicas do homem, como já
vimos, adquirem uma significação social”. Esse autor é categórico quando
afirma existir apenas uma condição humana e não uma natureza humana,
uma vez que a criança, ao nascer, necessita de um outro para suprir suas
necessidades. Nessa medida, “os modelos sociais suprem a ausência de
instintos predeterminados” (1979, p. 272). Também nesse sentido, Bock
(1999, p. 28) afirma que:
“A idéia/conceito da condição humana é fundamental para
darmos o salto da concepção naturalista do homem para uma
concepção sócio-histórica. Na idéia de condição humana, nada no
homem está aprioristicamente concebido. Não há nada em
termos de habilidade, faculdade, valores, aptidões ou tendências
que nasçam com o ser humano. As condições biológicas
hereditárias do homem são a sustentação de um desenvolvimento
Paris, 1999-2002.
30
sócio-histórico, que lhe imprimirá possibilidades, habilidades,
aptidões, valores e tendências historicamente conquistadas pela
humanidade e que se encontram condensados nas formas
culturais desenvolvidas pelos homens em sociedade”.
Pautado neste pressuposto, Vygotski desenvolveu sua teoria. Agora,
veremos suas principais idéias. Ele, entre outras coisas, investigou como o
homem transforma as funções psicológicas elementares (reflexos, reações
automáticas) em funções psicológicas superiores (ações planejadas e
intencionais), que são tipicamente humanas e que nos diferenciam de
outras espécies.
Discutiremos, inicialmente, o momento histórico em que Vygotski
estava inserido e seu método de estudo e análise. Vygotski entendia que a
crise na psicologia decorria, sobretudo, de um problema de método.
Acreditava que a psicanálise, o behaviorismo e a Psicologia subjetiva
trabalhavam com objetos e fatos diferentes. Nesse sentido, Vygotski
(1984, p. 69), iluminado pela dialética, buscou unificar a ciência
psicológica:
“Baseado na abordagem materialista dialética da análise da
história humana, acredito que o comportamento humano difere
qualitativamente do comportamento animal, na mesma extensão
que diferem a adaptabilidade e o desenvolvimento dos animais. O
desenvolvimento psicológico dos homens é parte do
desenvolvimento histórico geral de nossa espécie e assim deve
ser entendido. A aceitação dessa proposição significa termos que
encontrar uma nova metodologia para a experimentação
psicológica”.
31
Vygotski acreditava que os processos de investigação científica na
análise dos problemas metodológicos estavam centrados no fato de se
trabalhar molecularmente a palavra. Nesse sentido, afirmava ser
necessário ir à origem dos processos, para além das aparências, quando
se trata de apreender o movimento em uma relação dinâmica: cabe
descobrir a essência de cada fenômeno, inserido no momento histórico e
no processo dialético. Aguiar destaca que Vygotski:
“Apontava a necessidade de um método que desse conta da
complexidade no seu objeto de estudo. Já afirmava que a tarefa
da psicologia era substituir a análise do objeto pela análise do
processo, da sua constituição, da sua gênese. Afirmava a
necessidade de apreender os processos internos, e que, para isso
era preciso exteriorizá-lo, era preciso observar o não observável o
lado escuro da lua.” (2001, p. 129)
Vygotski acreditava que o homem, ao se apropriar do curso da sua
própria evolução, transforma seu modo de atuar sobre a natureza, criando
suas condições de sobrevivência. Pino (2000, p. 51) afirma: “A história do
homem é a história dessa transformação, a qual traduz a passagem da
ordem da natureza à ordem cultural”. Vygotski postulava que o
desenvolvimento é um processo histórico e cultural, articulado tanto na
ontogênese, quanto na filogênese. Sem desprezar a base biológica, a
cultura é, para ele, o fator primordial do desenvolvimento. De fato, em
sua visão, é o acesso à cultura que permitirá que a criança se humanize e
esse processo só pode acontecer por meio da interação social que mantém
com outros seres humanos. O processo de desenvolvimento não é
32
uniforme e muito menos previsível: depende das modalidades de
interações sociais vivenciadas pelos indivíduos, no momento histórico e
cultural em está inserido. Segundo Oliveira (1997), a teoria de Vygotski
está centrada em três idéias:
A estrutura biológica da nossa espécie forma a base para as
funções psicológicas, ou seja, o homem possui a possibilidade
de fazer parte da espécie humana, pois apresenta uma
estrutura biológica (cérebro) que lhe permitirá construir e
utilizar as funções psicológicas superiores, que são
tipicamente humanas;
O biológico transforma-se em sócio-histórico, uma vez que na
e pela interação social o homem se transforma em ser social;
A relação do homem com o mundo é mediada; toda relação é
indireta e mediada por signos e instrumentos.
Mas o que se entende por instrumento? Para Vygotski, ele é um
elemento de mediação do indivíduo e do objeto, podendo ser externo ou
não à pessoa. Por exemplo: a faca é um instrumento que serve para que
possamos cortar, entre outras coisas, o pão. Nesse caso, a faca é um
instrumento externo, pois ela altera, modifica a realidade física (a forma
do pão). Um outro tipo de instrumento é o signo, aspecto central da
atividade psicológica. Por exemplo: a palavra ‘pão’ representa um
alimento feito à base de farinha – o pão real. Mas a palavra pão é um
signo e como tal ela em nada modifica no meio físico, ainda que altere,
33
em muito, o próprio sujeito e aqueles que estão a seu redor. O signo,
portanto, é um instrumento que se volta para dentro, que se dirige ao
interno, seja ele a pessoa ou o os outros.
O uso de instrumentos e signos permitiu ao homem avançar da
atividade direta (imediatismo – Funções Psicológicas Elementares - FPE)
para a atividade mediada (Funções Psicológicas Superiores – FPS),
distinguindo-se, assim, das demais espécies. Vygotski concebeu o
desenvolvimento humano como um processo em movimento dentro de
um determinado grupo cultural, em um determinado tempo e lugar. Neste
processo, o social converte-se em individual e o individual, modificado
pelo social altera, por sua vez, o social. Nesse sentido, é na interação
social que o indivíduo incorpora a cultura de seu grupo e de sua época.
Nesse sentido, o bebê humano constitui-se enquanto tal por meio de
um processo que, sendo interpessoal (social), atua tanto no plano
individual como no do coletivo. Portanto, o desenvolvimento humano,
para Vygotski, ainda que leve em conta a maturação biológica, necessita
do contato social “já que as formas psicológicas mais sofisticadas
emergem da vida social” (Rego, 1995, p. 61). Ao transformar o social em
individual o indivíduo internaliza, ou seja, faz uma “... reconstrução
interna de uma operação externa” (Vygotski, 1998, p. 74), reconstruindo
formas culturais de comportamento [...], com base nas operações com
signos” (idem, p. 74). Deve ficar claro que a linguagem assume um
destaque muito grande na visão vygotskiana, pois é ela que permite à
criança planejar sua conduta, comunicar-se com o entorno e,
34
notadamente, regular sua própria conduta. Nesse sentido, Vygotski (1998,
p. 38) afirma:
“... a linguagem habilita as crianças a providenciarem
instrumentos auxiliares na solução de tarefas difíceis, a superar a
ação impulsiva, a planejar uma solução para um problema antes
de sua execução e a controlar seu comportamento. Signos e
palavras constituem para as crianças, primeiro e acima de tudo,
um meio de contato social com outras pessoas”.
Wallon, tal como Vygotski, fundamentou sua teoria na base filosófica
marxista. Trata-se de uma proposta centrada no estudo da formação da
pessoa, ou seja, na busca de compreender como o “eu” se constitui no
sujeito. Para Wallon, a criança, ao nascer, está num estado nebuloso
(sincrético) e, com o passar do tempo, irá paulatinamente conquistar sua
individualização. Para este autor, o desenvolvimento é contínuo, mas
marcado por diversos conflitos, cuja solução gera uma nova forma de agir,
ou seja, uma reformulação. Desse modo, para Wallon, os fatores
orgânicos e os fatores culturais são ambos privilegiados, visto que no
desenvolvimento do homem um depende do outro. Afirma Galvão (1995,
p.41) que:
“Assim, não é possível definir um limite terminal para o
desenvolvimento da inteligência, nem tão pouco da pessoa, pois
ambas dependem das condições oferecidas pelo meio e do grau
de apropriação que o sujeito fizer delas. As funções psíquicas
podem prosseguir num permanente processo de especialização e
sofisticação, mesmo que, do ponto de vista estritamente
orgânico, já se tenha atingindo a maturação”.
35
Segundo Mahoney (2003), a análise de Wallon consiste em
estabelecer várias comparações, como entre crianças normais e
“patológicas”8, crianças e adultos, etc. Chamava este método de análise
genética comparativa multidimensional, ou seja, uma análise social,
orgânica, neurofisiológica etc. Mahoney esclarece, ainda, que a teoria de
Wallon está centrada nas dimensões motoras, cognitivas e afetivas, cuja
predominância se altera em determinadas estágios de desenvolvimento, o
qual é regidas por três leis:
Alternância Funcional: o foco de atenção da criança ora está
voltada para si (direção centrípeta), ora está voltada para o
conhecimento do mundo exterior (direção centrífuga);
Predominância Funcional: ora predomina na criança o aspecto
motor, ora o afetivo, ora o cognitivo;
Integração Funcional: refere-se à passagem de um estágio ao
outro, que implica novas estruturas que se integram às
anteriores.
Wallon elaborou uma seqüência de estágios do desenvolvimento,
aos quais denominou de: Impulsivo Emocional: que se estende de 0 a 1
ano; Sensório-Motor e Projetivo: que vai de 1 a 3 anos; Personalismo:
que engloba dos 3 aos 6 anos; Categorial: que vai dos 6 aos 11 anos;
Puberdade e Adolescência: 11 anos em diante.
8 Termo usado na época, atualmente em desuso.
36
Mahoney (2003) alerta que as idades propostas por Wallon estavam
voltadas para a realidade da época e da cultura em que viveu. Para a
autora (2003, p. 12), os fatores orgânicos e sociais estão integrados de
forma que diferem “as possibilidades e os limites dessas características”.
No presente texto, serão abordados somente os dois primeiros estágios do
desenvolvimento postulados por Wallon, uma vez que são eles que situam
a faixa etária que é de nosso interesse: o estágio impulsivo emocional e o
sensório-motor e projetivo.
Estágio impulsivo emocional:
Esse estágio, que vai desde o nascimento até 1 ano de idade, está
divido em duas etapas: motora e emocional. A impulsividade motora, que
marca a primeira etapa desse estágio, vai desde o nascimento até o
terceiro mês de vida. Em seguida, observa-se a impulsividade emocional,
que irá do 3º mês até o final do primeiro ano de vida. Duarte e Gulassa
(2003) descrevem que a criança está voltada, inicialmente, para suas
necessidades primárias fisiológicas que, no período fetal, eram
automaticamente atendidas. No nascimento, essas necessidades se
transformam em desconforto:
“Esse desconforto provocará descargas motoras que são
movimentos reflexos, impulsivos, descontínuos, não-intencionais,
que não têm nenhuma outra utilidade a não ser a de obter a
diminuição desse estado de tensão, sejam estes de origem
orgânica ou suscitados por excitações exteriores”. (Duarte e
Gulassa, 2003, p. 21)
37
Nesta fase, a criança está voltada para as sensações viscerais - de
fome, de respirar (chamadas por Wallon de interoceptivas) e, também,
para aquelas ligadas ao movimento e ao equilíbrio do corpo (denominadas
pelo autor de proprioceptivas). As sensações interoceptivas e as
proprioceptivas estão relacionadas às funções internas. Assim, o aparelho
muscular reage, “levando a criança a se voltar quase totalmente para
estas manifestações e a exercitar respostas a estas sensibilidades” (Ibid.,
p. 22). Já na direção oposta, a sensibilidade exterioceptiva está
relacionada aos estímulos externos, que, segundo os mesmos autores
(2003), funcionam como descarga motora.
Para Wallon, a relação de dependência da criança em relação a
outros seres humanos para sobreviver é entendida como simbiose
fisiológica. Ou seja, por total imperícia, ela não consegue distinguir “as
sensações, nem as formas de satisfação” (Ibid., p. 23). As trocas entre o
bebê e o meio, nesta fase, são puramente afetivas, uma vez que a
criança, ainda desprovida de instrumentos cognitivos, necessita que
alguém satisfaça suas necessidades básicas. É por meio das trocas sociais
que a vida psíquica tem início, pois elas permitirão a formação das:
“[...] primeiras imagens mentais, nas quais se imprimirão as
primeiras marcas de sua individualidade. Deste modo, se
estabelecerá entre ambas, conforme as suas disposições
recíprocas de momento, toda uma sinalização expressiva, feita de
mímica e de atitudes. A princípio, só dela é que a criança poderá
tirar resultados úteis, sendo os seus gestos praticamente
ineficazes. Com efeito, na espécie humana, são as relações
38
afetivas com o meio que começam por dominar o
comportamento” (Wallon, 1979, p. 60).
Inicialmente, falta intencionalidade na forma de se relacionar com o
mundo exterior. Posteriormente, as trocas tornar-se-ão deliberadas,
surgindo, assim, os primeiros sinais da cognição. As atividades circulares
– denominação dada por Wallon àquelas que se repetem, promovendo a
aprendizagem - avançam de casuais para intencionais e a criança, por
intermédio de seu aparato sensorial vai, paulatinamente, conhecendo os
objetos e a si mesma, explorando tanto seu próprio corpo como, também,
a linguagem. Por exemplo, a atividade circular é empregada para explorar
os muitos e variados sons, como o balbucio. Duarte e Gulassa (2003)
afirmam que a atividade circular é essencial, pois possibilita a
aprendizagem em diferentes áreas e, neste sentido, leva a criança a
avançar para o próximo estágio.
Estágio sensório-motor e projetivo:
Se no primeiro estágio a criança está voltada para o conhecimento
de si (direção centrípeta), com predominância no aspecto motor e no
afetivo, nesse novo estágio ela avança para a exploração do mundo
exterior (direção centrífuga), no qual predominará o fator cognitivo. Costa
(2003, p. 31) aponta que esta fase se caracteriza “pela investigação e
exploração da realidade exterior, bem como pela aquisição da aptidão
simbólica e pelo início da representação”.
39
As aquisições da marcha e da linguagem são as grandes conquistas
do estágio sensório-motor e projetivo. A primeira permite um diferente
campo visual e, portanto, uma nova atuação sobre o espaço. A segunda
aquisição – a linguagem - amplia a atividade intelectual. Galvão (1995, p.
78) destaca:
“A linguagem, ao substituir a coisa, oferece à representação
mental o meio de evocar objetos ausentes e de confrontá-los
entre si. Os objetos e situações concretos passam a ter
equivalentes em imagens e símbolos, podendo, assim, ser
operados no plano mental de forma cada vez mais desvinculada
da experiência pessoal e imediata”.
Para Wallon (1979, p. 54), a linguagem é, portanto, um instrumento
indispensável para o desenvolvimento psíquico da criança, pois é por seu
intermédio que ela entra no mundo simbólico:
“Foi esse, com efeito, o passo essencial que a evolução biológica
fez dar ao homem. Existem no seu sistema nervoso centros que
lhe permitem o uso da palavra. Capaz de dar um nome às coisas
e às relações entre as coisas, pode evocá-las quando ausentes
combinar as suas imagens a seu modo, transmitir o seu saber,
acolher o dos outros”.
Nesse sentido, fica claro que Wallon (1979, p. 54) não descarta os
fatores orgânicos, pois, para que a criança se aproprie do uso da
linguagem, necessita, antes de qualquer coisa, do aparato biológico. A
linguagem contribuirá para libertar a criança do imediatismo, pois vai lhe
permitir realizar ações mentais: “Mas o homem é, ele próprio,
40
transformado pelas realizações mentais e técnicas sociais que a linguagem
lhe permitiu elaborar”.
No entanto nesta fase, a criança ainda necessita apoiar-se em
gestos para se expressar. Nesse sentido, “o gesto, portanto, precede a
palavra, pois a criança não é capaz de imaginar sem representar” (Costa,
2003, p. 33). Essas conquistas proporcionam a exploração do mundo de
diversas maneiras, e, nesta fase, a imitação e os simulacros ganham
destaque. Na imitação, a criança reproduz cenas que acabou de
presenciar, mas nas quais irá imprimir algo novo (participação e
desdobramento). Opondo-se ao modelo, a criança dele se diferencia e,
assim, pode romper com o imediatismo. O simulacro também contribuirá
para a representação, visto que permite à criança tornar presentes
objetos ausentes, via simulação ou representação, e, ainda, substituí-los.
Como afirma Costa (2003, p. 35) “esse desdobramento implica o
nascimento e a formação da representação e, aliado às relações
interpessoais e culturais em que a linguagem é fator constitutivo, contribui
com as várias funções que conduzem à expressão da atividade mental”.
A partir da representação (ou função simbólica) e da exploração do
seu próprio corpo e dos objetos à sua volta, a criança avança para uma
progressiva individualização, diferenciando o seu “eu” do mundo exterior.
No entanto, apesar das várias conquistas que esse estágio possibilita,
cabe ressaltar que será somente no próximo que a criança concretizará a
diferenciação do seu “eu”.
41
Estágio do Personalismo:
Se no estágio anterior a criança estava centrada na exploração no
espaço físico (direção centrífuga), agora, no Personalismo, a exploração
de si mesmo ganha destaque. Segundo Bastos e Dér (2003) esta fase
implica uma alternância funcional com predomínio do afetivo e voltado
para si, direção centrípeta. Este estágio, que se inicia por volta dos três
anos e estende-se até o sexto ano de vida, é caracterizado por diversos
conflitos, pois a personalidade está em pleno processo de formação. Nesse
estágio, a criança “opõe-se sistematicamente ao que distingue como
sendo diferente dela, o não eu: combate qualquer ordem, convite ou
sugestão que venha do outro, buscando, como confronto, testar a
independência de sua personalidade recém desdobrada, expulsar o eu do
não-eu” (Galvão, 1995, p.53).
Como a criança encontra-se em conflito e sua personalidade é ainda
muito difusa, ela faz uso de vários recursos, que vão, paulatinamente, se
tornando cada vez mais elaborados: ciúmes, trapaças, tirania e
dissimulação para obter destaque e garantir a superioridade pessoal.
Nesse estágio, a oposição é um recurso para a diferenciação do eu,
cedendo para a sedução: a criança empenha-se para obter a admiração
do outro, por meio de graças. Outra fase do Personalismo é a imitação,
quando a criança imita atitude e modelos de pessoas admiradas por elas.
Segundo Galvão (2003, p. 55) são “movimentos de reaproximação do
outro que tinha sido negado”.
42
Bastos e Dér (2003, p. 47) afirmam que a oposição, a sedução e a
imitação têm como objetivo principal “promover a individualização de sua
pessoa em relação a seu ambiente (pessoas e objetos)”. De fato, a
individualização (consciência de si) permitirá à criança uma maior visão de
si e do outro. É justamente essa nova visão que lhe possibilitará alcançar
as conquistas no estágio Categorial, que privilegia o desenvolvimento
intelectual.
Como vimos, o desenvolvimento humano tanto para Wallon como
para Vygotski não se dá de forma previsível e rígida, conforme propõe
Gesell. Tampouco é baseado na maturação biológica, a partir da herança
genética que herdamos de nossos pais. Para os dois autores, o
desenvolvimento avança nas e por meio das interações sociais. Nesse
sentido, vale lembrar que o sono também sofre influências do meio. Como
vimos anteriormente, fatores como o ritmo diário e a luminosidade têm
impacto sobre o ritmo do sono em crianças e adultos.
É claro e notório que a criança pequena necessita dormir um
número maior de horas, mas os hábitos de seus familiares podem alterar
substancialmente seu ritmo de sono e vigília. Em instituição de Educação
Infantil de 0 aos 3 anos, a criança ingressa em uma outra rotina, que não
contempla as peculiaridades de cada criança. No entanto, tanto Wallon
como Vygotski afirmam que, inicialmente, a criança necessita interagir
com o meio, inclusive por uma questão de sobrevivência. Nesse sentido, o
padrão do sono faz parte de um processo de negociação da criança com
seu entorno. A necessidade biológica precisa ajustar-se às interferências
43
do meio, tais como a luminosidade, o nível de ruído presente no ambiente
e, especialmente, o ritmo familiar.
Vygotski afirma que a humanidade do homem vem da vida em
sociedade, alocando à cultura uma grande e considerável importância na
constituição do sujeito. Nesse sentido, entendemos que os padrões de
sono e vigília se são necessidades biológicas, são, também, socialmente
reguladas. Para crianças que vivem no meio rural, os padrões do sono são
muito diferentes daqueles de crianças que vivem na zona urbana, uma
vez que esta lhes coloca outras necessidades e, portanto, outros ritmos.
O ingresso da criança, a partir dos 4 meses de idade, em instituições
de Educação Infantil, é, de fato, um fator relevante nos padrões do sono,
visto que, este último, bem como a vigília, sofre influências do novo meio.
Com isso, a criança é levada a se adaptar aos horários e à rotina da
instituição, o que implica passar por transformações e modificações de
comportamento, inclusive de padrões de sono e vigília. Como bem diz
Wallon, ora a criança está voltada para si, ora está voltada para o mundo,
em um percurso pleno de conflitos, que certamente envolve o ritmo do
dormir e do estar acordado. No entanto, até o momento, não
encontramos, na literatura, estudos que tratem especialmente de como os
educadores de escolas públicas de Educação Infantil lidam com os
diferentes ritmos de sono e vigília das crianças de 0 a 3 anos. Decorre daí
sua relevância social, bem como teórica. O presente estudo busca suprir
essa lacuna, descrevendo como os educadores lidam com tais diferenças
em sala de aula.
44
IV. MÉTODO
O objetivo desta pesquisa foi investigar como os educadores de
escolas públicas de Educação Infantil lidavam com os diferentes ritmos de
sono e vigília das crianças de 0 a 3 anos. O trabalho de pesquisa foi
desenvolvido sob o enfoque qualitativo, que busca entender o fenômeno
de maneira mais aprofundada.
1. Local:
Esta pesquisa foi realizada em uma escola da rede pública9,
localizada na região central de uma cidade da região metropolitana de São
Paulo. Mais especificamente, a escola encontra-se dentro de uma favela
que, parcial e recentemente, foi verticalizada. Dessa forma, metade da
favela está verticalizada e o restante dos moradores está aguardando, em
acomodações precárias, o término da construção de suas casas. A escola
atende crianças de 0 a 3 anos de idade (em período integral) e crianças
de 4 a 6 anos (em atendimento por turnos de 4 horas cada, denominados
como estágios). A clientela pertence, grosso modo, à favela local.
Algumas crianças são de sua vizinhança, outras da Casa Abrigo da cidade,
outras ainda são de outro bairro, no qual freqüentavam uma escola que
foi desativada. Estas crianças utilizavam transporte escolar gratuito para
se locomover até a unidade escolar pesquisada.
45
2. Participantes:
Os participantes iniciais da pesquisa foram o Diretor da escola e o
Professor Coordenador. Após três dias de observações durante o horário
do sono, foram selecionados os demais participantes: dois ADI’s10 da sala
do Maternal e dois alunos que, segundo elas, apresentavam sono
diferenciado e seus respectivos pais.
3. Procedimentos
3.1: Estabelecendo contato:
A primeira visita feita à Escola Maria Dalvina11 ocorreu no mês de
agosto de 2005, no período da manhã. Fui recebida pela Direção da
Escola, oportunidade em que entreguei a carta de apresentação da PUC e
conheci as dependências da escola. Ficou agendada para a próxima visita
a entrevista com a Diretora. Na segunda visita, após assinar o termo de
consentimento12, a Diretora participou da entrevista, com roteiro semi-
estruturado13, a qual foi gravada e transcrita na íntegra. Nessa mesma
ocasião, ficou combinado que, na próxima visita, a Coordenadora seria
entrevistada. Na terceira visita, fui recebida pela Coordenadora que
informou não estar disponível para a realização da entrevista, pois estava
9 Fazem parte desta rede: 27 creches mantidas pela prefeitura e 42 creches conveniadas que recebem verba e formação desta municipalidade 10 Agente de Desenvolvimento Infantil: função criada por Decreto Municipal em 2002 em substituição à anterior denominada de recreacionista. 11 Todos os nomes utilizados nessa pesquisa são fictícios, para assegurar o anonimato daqueles que dela participaram. 12 Ver Anexo I 13 Ver Anexo II
46
muito ocupada na H.A.14. Convidou-me, então, para participar da reunião
com as ADI’s.
A Coordenadora deu início à reunião e não me apresentou às
participantes, que ficaram visivelmente curiosas. Como a presença da
Profª Coordenadora foi solicitada na Diretoria, eu aproveitei a
oportunidade para me apresentar e, também, para falar da pesquisa. Elas
logo se interessaram sobre o tema a ser estudado. Uma das ADI’s
(Maternal) disse: “Mas se você ficar na sala, irá atrapalhar o sono das
crianças”. Outra ADI (Berçário) disse: “Não, as crianças ficarão com medo
e irão dormir mais rápido”.
Logo pude perceber que se tratava de um assunto que chamava a
atenção desse público, que demonstrava visível falta de conhecimento
sobre o tema. Ao retornar à sala, a Coordenadora continuou a sua reunião
e somente em seu final, lembrou-se de me apresentar às ADI’s, que logo
disseram que já sabiam da razão de minha presença naquela reunião e
que a proposta que eu trazia era interessante. As demais visitas foram
agendas com a Diretora e a Profª Coordenadora, a fim de realizar as
entrevistas. As observações não foram agendadas, para garantir
aleatoriedade às minhas visitas.
3.2. Instrumentos de coleta de dados:
14 Hora Atividade: horário (1h por dia) reservado para atividades com a Profª Coordenadora.
47
Os dados foram coletados no período de agosto de 2005 a novembro
do mesmo ano. As visitas à escola foram semanais, com duração média
de seis horas. Foram utilizados os seguintes instrumentos:
3.2.1: Observações sistemáticas15 da creche, objetivando
caracterizar sua rotina, mediante registro cursivo dos dados;
3.2.2: Observação sistemática das crianças selecionadas e das ADI’s
no horário do sono, objetivando coletar dados pertinentes à pergunta da
pesquisa. Foi empregado, para registrar as observações, registro cursivo;
3.2.3: Entrevistas com roteiro semi-estruturado para a Diretora e
para a Profª Coordenadora16, as quais foram agendadas previamente e
tiveram duração média de 60 minutos;
3.2.4: Entrevistas com roteiro semi-estruturado17 para as ADI’s e
para os pais18 das crianças selecionadas, as quais ocorreram em horários
agendados previamente e tiveram uma duração média de 60 minutos;
3.2.5: Conversas informais, registradas cursivamente, que tinham
como objetivo esclarecer algumas impressões e/ou coletar informações
sobre aspectos que, durante as observações e entrevistas, passaram
despercebidos.
15 Ver em anexo III a transcrição de um dia de observação como exemplo. 16 Ver Anexo IV 17 Ver Anexo V 18 Ver Anexo VI
48
Os locais das entrevistas garantiram privacidade, de modo que os
relatos foram todos gravados e, posteriormente, transcritos na íntegra
para análise.
49
V. ANÁLISE DOS DADOS
Após coleta sistemática, os dados foram organizados com o objetivo
de construir categorias a posteriori de análise, para que, em articulação
com o referencial teórico adotado, fosse possível responder ao problema
de pesquisa. Inicialmente, cada uma das fontes da coleta de dado foi
analisada, a fim de verificar quais eram seus aspectos centrais. Em
seguida, estes foram identificados em categorias. Trabalhei com os dados
categorizados de todos os participantes, buscando verificar se havia entre
elas pontos de convergência e desacordo. As categorias, portanto,
precisavam:
Responder ao problema da pesquisa, ou seja, como os
educadores de escolas públicas de Educação Infantil lidam
com os diferentes ritmos de sono e vigília das crianças de 0 a
3 anos;
Permitir a construção de um retrato desta escola específica em
relação ao sono das crianças, dando-lhe um tratamento
teórico;
Permitir análise intra e inter fontes de dados, articulando-os
entre si.
1. Caracterização da Escola:
1.1. Estrutura física:
50
As dependências da escola estão distribuídas em um terreno plano.
O prédio está cercado por grades que permitem a visualização da área
externa (estacionamento e solário) e da área semicoberta. A Diretora
relatou que o prédio foi adaptado para atender às necessidades dos alunos
da escola:
“Aqui não era para ser uma escola. Era para ser uma quadra
esportiva. Depois, montaram um esquema para ser uma escola. A
escola tem uma fundação ótima, pois era para ser uma quadra. O
engenheiro esteve aqui depois que apareceram umas rachaduras
entre o prédio e o córrego e disse: Vocês têm uma fundação
ótima! Não vai cair!”.
O prédio foi organizado de forma a atender ao mais urgente: salas
de aula, cozinha e refeitório. Outros aspectos fundamentais foram
deixados de lado: parque para as crianças e um pátio coberto para
atividades de lazer. O portão principal dá acesso ao pátio, que é utilizado
como refeitório. Existem lá 12 mesas, com 6 cadeiras em cada uma e 10
cadeirões para os bebês do Berçário I. Na lateral direita do pátio, estão a
cozinha e a lavanderia.
Atravessando este pátio, chega-se ao corredor principal, no centro
do qual se localiza a diretoria, improvisada junto à Secretaria. À direita,
estão a sala dos professores, os banheiros dos funcionários e os das
crianças dos estágios, a sala de TV e as salas de aula dos estágios. À
esquerda do corredor encontram-se as salas da creche, o lactário e o
depósito.
51
A estrutura interna da escola não conta com iluminação natural,
recorrendo-se a lustres. A pintura está em boa conservação e os trabalhos
dos alunos e das ADI’s estão expostos nas paredes com temas relativos à
época do ano (datas comemorativas) em que a pesquisa foi realizada, ou
sejam, de agosto a novembro de 2005. Percebe-se, em alguns detalhes, o
empenho da direção da escola em tornar o ambiente agradável aos ADI’s
e professores, uma vez que a sala desses últimos apresenta uma boa
organização, com materiais à disposição de todos (livros, revistas
especializadas, fitas de vídeo), geladeira, cafeteira, bebedor e forno de
microondas para refeições dos profissionais que ali atuam. Os banheiros
dos funcionários estão sempre com flores da época e apetrechos para
assepsia das mãos, uma vez que as ADI’s trocam fraldas e necessitam,
portanto, de uma boa higienização.
1.2. Nível sócio-econômico dos alunos:
O nível sócio-econômico da clientela é predominantemente baixo,
visto a escola localizar-se em área de antiga favela. Mas são também
atendidas crianças de classe média, como afirma a diretora:
“É uma mescla. A gente tem famílias daqui da favela, a gente tem
as famílias do prezinho [famílias das crianças transferidas de uma
escola dos arredores que foi fechada], a gente tem as famílias da
comunidade, que tem um poder aquisitivo melhor”.
1.3 A sala de aula:
A sala de aula é ampla (49m²), possuindo duas janelas com
persianas, um banheiro acoplado à sala (com uma pia e dois vasos
52
sanitários). Há duas portas: uma de entrada pelo corredor interno da
escola e outra de acesso ao estacionamento. As paredes são pintadas na
cor bege e encontravam-se enfeitadas com desenhos e cartazes
produzidos pelas ADI’s e pelas crianças. O mobiliário consistia em:
1 mesa redonda com três cadeiras tamanho infantil, as quais são
utilizadas somente pelas ADIs;
1 armário de ferro com duas portas;
1 pilha de colchões (que são distribuídos no chão na hora do
sono) encostados na parede;
3 colchões emparelhados que servem de sofá para as criança;
1 caixa com pedaços de brinquedos, onde as crianças não tem
acesso;
ganchos sob as janelas para pendurar as mochilas;
1 mesa pequena com canecas e uma garrafa (tipo pet) com
água.
A disposição das salas permite captar o barulho das outras salas e,
também do refeitório, praticamente utilizado todo o tempo com as
refeições dos alunos da creche e dos alunos dos estágios. Para
complementar a descrição, encontra-se, no anexo VII, a planta da sala.
1.4. Funcionamento da escola:
53
A escola19 funciona em duas modalidades de turnos: integral para as
crianças da creche (0 a 3 anos) e turnos de 4 horas para as crianças dos
estágios (3 a 6 anos). A primeira modalidade cumpre seu horário das 8h
às 17h; três turnos de 4 horas cada ocorrem em períodos distintos:
manhã, das 7h às 11h; intermediário, das 11h às 15h; e, tarde, das 15h
às 19h. Nesse estudo, focalizei meu olhar no atendimento de crianças de
0 a 3 anos, que são o foco desta pesquisa.
1.4.1. Organização das turmas:
As crianças estão distribuídas segundo o critério de idade, formando
assim, módulos. Para cada módulo há um número equacionado de
crianças e de ADI’s:
Quadro 1: Organização das turmas20
Módulo Idade da criança Quantidade de ADI por criança
Berçário-I 4 meses a 1 ano 1 ADI para cada 5 crianças
Berçário-II Crianças que irão completar 2 anos no decorrer do ano letivo
1 ADI para cada 7 crianças
Maternal Crianças que irão completar 3 anos no decorrer do ano letivo
1 ADI para cada 15 crianças
O quadro 2, a seguir, revela a organização das atividades que, no
início de cada ano, são elaboradas pela equipe de gestores em conjunto
19 A escola segue as Diretrizes da Secretaria de Educação do Município. Em linhas gerais: 1-Democratização do acesso e permanência em todas as etapas-modalidades de Ensino; 2- Garantia da qualidade de ensino; 3- Valorização dos profissionais da Educação e 4- Democratização da Gestão. 20 Esta municipalidade atende as especificações da CEB 022/98 (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil) no que refere a equação do número de crianças atendidas e ADI’s responsáveis.
54
com as ADI’s. Ele nos mostra a distribuição do tempo dedicado à
alimentação, às atividades, à hora do sono, à entrada e à saída.
Quadro 2: organização oficial da rotina da creche
Horário Atividade Tempo
8h às 8h30 Entrada: as crianças ficam sentadas esperando todos chegarem.
30’
8h30 às 9h Café da manhã: servido no pátio. 30’
9h às 10h40 Atividade dita ‘pedagógica’21 1h40
10h40 às 11h10 Almoço: servido no pátio. 30’
11h10 às 14h Hora do sono22 2h50
14h às 14h30 Colação: servida na sala 30’
14h30 às 15h30 Atividade dita ‘pedagógica’ 1h
15h30 às 16h Jantar: servido no pátio 30’
16h às 16h30 Atividade dita ‘pedagógica’ 30’
16h30 às 17h Saída: as crianças ficam sentadas, esperando seus pais as virem buscar.
30’
Abramowicz e Wajskop (ano) afirmam que:
“A rotina orienta a ação da criança, assegura a ela o dia-a-dia,
possibilitando que perceba e se situe na relação tempo-espaço,
permitindo modificações, sem necessariamente cair na mesmice,
no repetir sempre o mesmo.”
Mas durante a rotina diária, apesar da organização oficial assegurar
um tempo destinado às atividades com intencionalidade educativa, na
prática isto não acontece. O que se observa está longe de cumprir com o
21 Atividade com intencionalidade educativa planejada.
55
previsto. Não se percebeu, durante o período observado, qualquer
intencionalidade educativa. Ao contrário, como veremos a seguir,
predomina a improvisação:
“9h00 - Ao retornar do café da manhã, a ADI pega o rádio na
Diretoria, liga-o e deixa as crianças à vontade. Algumas delas
dançam, outras correm pela sala.
9h10 - Enquanto as crianças correm e dançam, as ADI’s
conversam. Nesse momento, elas desligam o rádio e pedem para
que as crianças se sentem no “sofá”23, pois estão fazendo muito
barulho e elas não conseguem conversar.
9h13 – As ADI’s começam a discutir para resolver quem irá na
H.A. As crianças permanecem sentadas.
9h14 – Uma das ADI’s decide participar da H.A., saindo da sala. A
outra liga novamente o rádio, solicitando às crianças que fiquem
quietas, senão ela irá desligá-lo. Algumas crianças pegam seus
brinquedos na mochila e a ADI diz: “Guardem os brinquedos, pois
hoje não é dia”. As crianças imediatamente guardam seus
brinquedos. Algumas crianças dançam em dupla e a ADI dança
com uma delas.
9h16 – A ADI resolve trocar o CD. Colocando o da Xuxa e tenta
iniciar uma coreografia com quatro crianças, que apresentam
algum interesse. E o restante corre pela sala, gritando e
brigando.
9h20 –A ADI pára de dançar e resolver embrulhar um pacote que
estava na mesa.
9h30 – A ADI, novamente, resolve trocar o CD. Agora é o da Kelly
Key. Quatro crianças ficam eufóricas e começam a dançar a
coreografia da música. Neste momento, dois meninos tiram seus
sapatos e começam a jogar um no outro. A ADI não percebe, pois
está muito envolvida fazendo o pacote. Eu me levantei e me dirigi
22 Algumas crianças dormem até as 14h40
56
às crianças, pedindo que parassem, pois havia risco de se
machucarem. A ADI, então, chamou a atenção dos meninos, para
que calçassem os sapatos.
9h45 – A ADI, que continuava embrulhando o pacote, percebe o
desinteresse das crianças e resolve, mais uma vez, trocar a faixa
do CD. Algumas poucas crianças voltaram a dançar; as demais
ficam correndo, brigando e se batendo.
9h50 – A outra ADI retorna a sala e convida as crianças para
dançar. Nesse momento, entra na sala a ADI do Berçário com
uma criança, dizendo: “Ele pode ficar aqui, pois ele está muito
terrível na sala?” (a criança, com cerca de dois anos de idade está
descalça e visivelmente desambientada). Esta nova ADI
estabelece uma conversa com as ADI’s da sala. Pouco depois,
retorna à sua sala, deixando a criança.
9h55 – ADI troca de CD. Agora são músicas infantis. A ADI do
Berçário volta à sala e calça a criança que havia deixado.
Enquanto as crianças correm pela sala e brigam, uma das ADI’s
está verificando as agendas das crianças, enquanto a outra
realiza atividades sentada à mesa.
10h15 – As ADI’s desligam o aparelho e as crianças sentam-se
encostadas na parede, para aguardar o horário do almoço, que
será às 10h40. As crianças se batem, choram, gritam sem
conseguir chamar atenção das ADI’s que, nesse momento,
fecham as cortinas para arrumar a sala para a hora do sono”.
(caderno de campo)
Como podemos perceber, o tempo destinado às atividades ditas
pedagógicas é ocupado com atividades cujo principal intuito parece ser
permitir que as crianças se mantenham entretidas, sem perturbar a
conversa das ADI’s. De acordo com o relato da profª Coordenadora, isso
23 Alguns colchões dispostos no canto da sala.
57
não deveria ocorrer. De fato, segundo ela, todas as atividades da creche
são elaboradas com antecedência e registradas em um semanário.
Esperava-se que, com isso, cenas como as observadas não se passassem.
Diz ela:
“[as ADI’s] têm a tabela do semanário, que é dividido por dias.
Aí, elas colocam toda a rotina do dia da creche. Cada turma é
diferente, porque cada uma tem um horário específico para estar
trabalhando. Então, naquele dia, naquele horário, elas fazem uma
atividade pedagógica; Com isso, aquele horário específico é
destinado a uma musiquinha, a um teatrinho ou a uma
brincadeira de massa de modelar e assim por diante”.
Ainda conforme relata a profª Coordenadora, os projetos
desenvolvidos na escola são elaborados mensalmente, em dia
especialmente destinado a essa atividade. Com base nas sugestões dadas,
cada sala define quais serão feitas:
“A cada mês, a gente pára um dia pra falar o que vamos
trabalhar neste mês. Então, planejamos as atividades do mês.
Nós damos, vamos dizer assim, sugestão para serem trabalhadas
e cada um vai adaptando de acordo com a sua sala”.
Diariamente, as ADI’s deveriam participar de H.A. com a profª
Coordenadora (das 9h às 10h), que segue um rodízio que busca
contemplar a todos, sem prejuízo do bom andamento das atividades na
sala. No entanto, durante o período de observações, somente uma ADI
participou da H.A. A profª Coordenadora deveria seguir um cronograma
58
(conforme quadro 3) durante a semana, a ser utilizado nas H.A. Observei,
porém, que o tempo destinado à rotina diária é muito mais longo: são
quatro horas de reuniões só para atender às ADI’s da creche e aos
professores dos estágios. Desta maneira, o restante do tempo é
insuficiente para visitar as salas de aula e observar o andamento dos
projetos. A profª Coordenadora queixa-se, não sem razão, da falta de
tempo:
“Eu trabalho das 7h às 16h e 4 horas praticamente é só destinado
pra Hora Atividade! Com os outros horários é uma ocorrência ali,
uma ocorrência lá. Você vai pra lá, a gente não pára, né?”
A Diretora também reclama do fato de ficar muito envolvida com as
tarefas da Secretaria, algo que a impede de ter um contato mais próximo
com as ADI’s e com os professores. Disse que tem vontade de estar mais
presente, sobretudo para incumbir-se do que denomina de parte sensitiva,
ou seja, sobre como seu pessoal percebe o estar na creche:
“Este ano está complicado, muita coisa acontecendo. Aí, eu tive
que ficar um pouco mais aqui na secretaria. Antigamente, é uma
coisa que me entristece muito, mas até o ano passado eu
participava de todas as H.A.! Todos os dias e todos os horários!
Este ano tem sido bem mais raro a minha presença na H.A. Mas
eu falei para elas [as ADIs e os professores] que de vez em
quando eu vou participar. Como a coordenadora dá uma parte
mais dinâmica, eu dou mais a parte sensitiva. Então eu peço para
fazer uma pintura, fazer um desenho. Faz uma comida diferente.
Ou a gente diz: Hoje a gente está aqui para conversar. Conversar
sobre o que você está sentindo.”
59
Quadro 3: cronograma da Hora Atividade
Dia da Semana Atividades
2ª feira Elaboração das atividades (livre)
3ª feira Atendimento aos pais
4ª feira Troca de experiência
5ª feira Leitura e reflexão; dinâmicas; textos; socialização
6ª feira Planejamento das atividades para semana seguinte
Cada sala possui um caderno de registro, em que são anotados as
informações, os recados da equipe gestora e os textos que são
trabalhados durante a H.A. As ADI’s que dela participam são responsáveis
por passarem as informações às que não estiveram presentes naquele dia.
1.4.2. As ADI’s da sala.
A ADI Cida tem 36 anos, é solteira e não possui filhos. É graduada
em Educação Física, mas não exerce a profissão. Participa de cursos de
formação oferecidos pela Secretaria Municipal de Educação. Ingressou na
rede por meio de concurso público e destaca que escolheu esta escola por
se tratar de local de fácil acesso:
“Não escolhi aqui [risos]. É que na escola em que eu estava não
deu pra ficar, né? Por causa da pontuação e porque a 2ª opção foi
aqui, que ficava perto e dava pra eu fazer o curso legal”.
Já a ADI Denise tem 34 anos, é casada e tem três filhos. Sua filha
caçula, de 10 meses, está matriculada na creche e freqüenta a sala do
Berçário I. Está cursando o ensino superior, mais precisamente a
60
Licenciatura em Pedagogia. Por estudar durante a noite e trabalhar
durante o dia, afirma que não encontra tempo de fazer um dos cursos
oferecidos pela Secretaria Municipal de Educação. Ingressou na rede de
ensino por meio de concurso público e foi transferida para esta escola há
seis meses, quando terminou sua licença gestante e necessitava de uma
vaga para sua filha no berçário:
“Porque eu estava em outra escola e minha filha estava
matriculada aqui. E não tinha como eu deixar a menina aqui e
entrar às 8h na outra creche”.
Ambas cumprem uma jornada de 40h semanais: das 8h às 17h com
uma hora de intervalo para o almoço. Seguem, portanto, o mesmo horário
de entrada e saída dos alunos.
1.4.3. As crianças da pesquisa:
Na tentativa de responder o problema da pesquisa, observamos uma
sala do Maternal, uma vez que nesta faixa etária a criança começa a
deixar o sono bifásico e encaminha-se para o sono monofásico. As ADI’s
desta sala indicaram duas crianças para serem estudadas mais de perto,
tendo em vista que apresentavam padrões de sono diferentes das demais.
São elas:
a) Narciso, que nasceu em fevereiro de 2002. Está nesta mesma
creche desde os quatro meses de idade. As ADI’s relatam que a criança
apresenta resistência para dormir desde o ano anterior. Narciso mora com
os pais e possui dois irmãos mais velhos: um de seis anos e outro de 14
61
anos. O pai relatou na entrevista que a criança não dorme em casa
durante o dia e segue o ritmo dos irmãos mais velhos:
“De final de semana, ele fica o dia todo acordado, até a hora que
os irmãos vão dormir. Não tem como ele dormir”.
b) Karen, nasceu em fevereiro de 2002, tem uma irmã de nove
meses, também aluna da creche. Ingressou nesse espaço em agosto de
2005. A mãe relatou que a criança já tinha o hábito de dormir à tarde.
Afirma, no entanto, que é quase impossível a fazer dormir antes das
13h00:
“Ela deita às 13h da tarde e dorme até às 15h. Se ela não dorme,
ela fica perturbando a madrinha dela. Aí, a madrinha dela já não
gosta e ela fala pra Karen ir dormir”.
2. Selecionando alguns dados para a análise:
Após a coleta de dados, deparamos com uma série de informações a
serem trabalhadas, muitas das quais me pareciam imprescindíveis. No
entanto, para responder ao problema de pesquisa - como os educadores
de escolas públicas de Educação Infantil lidam com os diferentes ritmos de
sono e vigília das crianças de 0 a 3 anos – centrei-me em algumas
categorias de análise, que apresentarei a seguir.
2.1. Visão naturalizante do sono:
Como vimos nos capítulos anteriores, a criança nesta idade
apresenta o sono bifásico, ou seja, dorme em dois momentos: durante a
62
noite e também tira uma soneca durante o dia. Mas cada criança
apresenta o seu ritmo biológico e fatores externos podem influenciar - e
certamente influenciam - este momento. No entanto, em instituições de
Educação Infantil, a prática do sono é um acontecimento cristalizado, tido
como necessário sem que se saiba suas razões. Em geral, tem-se por
certo que as crianças precisam descansar, pois, caso contrário, ficam
agitadas e, portanto, incontroláveis. De uma maneira geral, o sono não
chama a atenção nem dos educadores e nem dos gestores da escola.
Assim, parece-me, a princípio, que é preciso refletir sobre se ele é (ou
não) imprescindível para todas crianças.
Essa visão naturalizante do sono é bem relatada pela profª
Coordenadora, ao ser indagada se havia na escola crianças com
necessidades variadas de sono. Respondendo, afirma não ter
conhecimento desse assunto, ainda que use sua própria experiência para
explicar porque as crianças precisam dormir à tarde:
“Olha, eu acho que até os três anos eles costumam dormir aqui
na creche. Eu não me lembro bem da infância dos meus filhos. Eu
só me lembro, mais ou menos assim, que eles dormiam à tarde e
eu achava super. Era bom, porque eles acordavam às quinze
horas e, depois, não tinham, vamos dizer assim, mais ânimo pra
fazer alguma coisa. Eu acho super importante, sim, as crianças
descansarem nesse período”.
A ADI Denise revela, também, uma visão semelhante quanto ao
sono:
63
“Eu acho que sim, acho que relaxa, acho que acalma, que, às
vezes, tem criança bem agitada, bem nervosa e que é difícil
mesmo de dormir. Aí, depois que acorda, a criança está mais
relaxada, mais calma. Já não está mais agitada: é como se ela
estivesse realmente deitada ali, relaxada, descansada. É
importantíssimo”.
Cida, a outra ADI, afirma que o sono é importante para que as
crianças acordem mais dispostas. Chama a atenção o fato de sinalizar,
também, que ele é essencial para o descanso das ADI’s:
“Eu acho que nesta idade eles ainda precisam desse período de
descanso, porque depois eles acordam com todo o vapor [risos].
E, às vezes, você está mais cansada e aproveita para descansar
[risos]”.
Ao ser perguntada como seria o dia se não houvesse este momento
de sono para as crianças, Cida espanta-se:
“Nossa, seria terrível! A gente ia ter que ter alguma atividade de
repouso, de descanso, alguma coisinha bem mais leve pra eles
fazerem nesse horário! A gente (as ADIs) precisaria disso”.
Como pode ser observado a partir das falas dos entrevistados,
existe, entre os profissionais que atuam na creche, uma visão
estereotipada do sono: para eles não existe um objetivo claro para esta
atividade, que é uma constante em todas as instituições de Educação
Infantil.
64
O horário do sono é uma atividade padronizada na maioria das
instituições. Os educadores que ali atuam repetem modelos
historicamente constituídos sem respeitar as diferenças individuais de
cada um. Os Referenciais Curriculares para Educação Infantil contêm
sugestões para a hora do sono:
“Os horários de sono e repouso não são definidos a priori, mas
dependem de cada caso, ou cada tipo de atendimento. A
freqüência em instituições de educação infantil acaba regulando e
criando uma constância. Mas é importante que haja flexibilidade
de horários e a existência de ambientes para o sono ou pra
atividades repousantes, pois as necessidades das crianças são
diferentes.
Para crianças maiores que freqüentam instituições de período
integral é aconselhável prever momentos em que possam relaxar,
com atividades mais livres e tranqüilas, para repor suas energias
ou terem suas necessidades de privacidade e de isolamento
respeitada. As vezes, algumas crianças, dependendo do clima e
do número de horas de sono à noite, precisam de um breve
cochilo na instituição. Para isso, é necessário um local tranqüilo e
confortável, que lhes permita descansar enquanto as demais
desenvolvem outras atividades”.
Veremos, a seguir, como é a interação das ADI’s com seus alunos
antes do horário do sono.
2.2. Interação ADI/aluno durante as atividades que precedem o
horário do sono
Esta análise tem como objetivo explicar como é a interação dos
alunos com as ADI’s, nas atividades que antecedem o horário do sono. Os
65
dados foram coletados desde a entrada das crianças na creche até o
momento que estas acordavam do sono da tarde. Pudemos verificar que
existe uma preocupação excessiva das ADI’s quanto ao tipo de atividade a
ser desenvolvida no período da manhã. Ficou claro que o objetivo maior é
cansar as crianças, para que durmam mais tempo e mais rapidamente.
Denise relata que, nesse período, as atividades são de movimento, de
mexer o corpo:
“Ah, de manhã, é mais pra eles se cansarem [risos]. A gente faz
bastantes coisas com movimento, tipo dança, música, esquente o
corpo, correr... A gente vai tentar jogar bola, mais pra cansar,
mesmo. Aí eles começam:’ olha, tia, estou cansado” [risos].
Desse jeitinho, pra cansar mesmo, porque às vezes eles ficam
pouco cansados e não conseguem dormir. Então, a gente faz isso.
Ah! Às vezes, quando tem época, assim, de comemoração, ou
alguma festa, alguma data especial, aí, nessas datas, a gente,
claro, faz atividades relacionadas com aquelas datas, pra não
passar em branco. O dia da árvore, da primavera, tudo [é feito e
comemorado] junto com eles.”
Durante uma atividade, Denise perguntou às crianças: “Quem está
cansado?” E as crianças responderam: “Eu, eu, eu”. E ela disse em voz
alta, para si mesma: “Essa era a minha intenção!” Cida também explicita
a vontade de, deliberadamente, deixar as crianças fatigadas, prontas para
dormir à tarde:
“As atividades de movimento, essas a gente procura fazer de
manhã, atividades que nem atlética. Eu acho que pode melhorar
o sono deles. Acho que o cansaço é maior. Aí, terminando o café,
a gente vem pra sala e, geralmente, a gente provoca uma
66
atividade assim. Mesmo porque vai ficar só uma de nós na sala: a
gente tem a H.A.”
Percebe-se, mais uma vez, que não existe uma intenção educativa
nas atividades propostas, uma vez que elas se voltam, todas, para o sono
vespertino. Dormir o sono da tarde aparece, assim, como a atividade
central da sala, posto que todas as demais estão a seu serviço. Durante
as observações em sala de aula, verifiquei que de fato, o objetivo era
apenas e tão somente cansar as crianças para que dormissem à tarde.
Após o café da manhã, as crianças eram conduzidas à sala. A ADI ligava o
rádio e as crianças ficavam correndo pela sala, algumas brigando, outras,
por vezes, dançando. Esta atividade não despertava o interesse das
crianças e, quando acontecia um episódio de briga, ele não chamava a
atenção da ADI. Enquanto as crianças permaneciam soltas, a ADI
guardava as roupas de cada uma delas em suas respectivas mochilas,
verificava as agendas (para ver se havia alguma mensagem dos pais) ou
ficava sentada, meramente recortando papel para alguma outra atividade.
Uma outra situação ocorreu no estacionamento da escola. Denise
conduzia as crianças descalças até o estacionamento, com a intenção de
dar uma aula de educação física. A atividade resumia-se em correr, pular,
deitar e fazer ginástica com os pés. Percebi que, no desenrolar da
atividade, a ADI criava alguns movimentos com o objetivo único de fazer
as crianças se mexerem. Durante esta atividade, chamou-me a atenção a
maneira pela qual Denise lidava com o comportamento das crianças. Uma
67
delas foi retirada da turma (sem motivo aparente) e colocada dentro do
solário dos bebês, localizado ao lado do estacionamento. A criança
começou a chorar desesperadamente e a ADI, além de não se importar
com o fato, dizia: “Ó, olha só ele: é bebê. Quem quer ficar com ele? Quem
não obedecer também vai ficar lá”.
Em outra ocasião, observei esse mesmo tipo de ameaça. Durante
uma atividade em sala de aula, uma das crianças não estava obedecendo.
Denise, então, perguntou-lhes: “O que a gente faz com criança que não
quer obedecer?” e as crianças responderam em coro: ”Coloca no
banheiro”. Infelizmente, parece que esta é uma prática constante.
2.3. Interação: ADI/Aluno na hora do sono:
A partir das 10h15, inicia-se o ritual para a hora do sono. Neste
momento, as atividades são encerradas e as crianças ficam sentadas,
todas encostadas à parede, esperando as ADI’s arrumarem a sala para
que os alunos possam dormir: colocar os colchonetes com lençóis no chão
e fecharem as cortinas, deixando a sala na penumbra. Não existe uma
atividade para as crianças neste momento; se estiverem quietas,
observando as ADI’s, não recebem atenção. Basta, no entanto, que
fiquem mais agitadas para que uma das ADI cantar com eles, de modo a
evitar toda e qualquer perturbação. Às 10h40 as ADI’s organizam a fila
das crianças, seguindo rigorosamente, o critério de tamanho. Uma vez
formada a fila, todas são conduzidas ao refeitório para o almoço.
68
Quando ele termina, por volta das 11h10, as ADI’s retornam à sala
com as crianças. Em seguida, vem a hora de levá-las ao banheiro e, na
volta, de colocá-las em seus colchonetes. Algumas crianças utilizam
chupeta ou paninho, mas a maioria não faz uso de nenhum objeto para
dormir. Quando alguém não se acalma, as ADI’s deitam com as crianças
com o intuito de fazê-las dormir. Os mais agitados (como dizem elas)
acabam por receber mais atenção, algo que incentiva a agitação. De fato,
todos querem merecer cuidados.
Durante o período que vai do deitar ao começar a dormir, as ADI’s
chamam constantemente a atenção de quem não está quieto, por meio de
ameaças, como a que se segue:
- “Eu só vou dar o edredom para quem ficar quieto”.
- “Você quer ficar com a chupeta? Então fique quieto!”
- “Dorme, Karen. Se você não dormir, vou tirar o seu colchão”.
- “Quem não dormir vai para a sala da Tia Lúcia (secretária da
escola)”.
Nesse último caso, a ameaça é tão explícita e provavelmente tão
comum, que as ADI’s nem se preocupam com a presença da
pesquisadora. Em um dado momento, Karen mostra-se muito resistente a
dormir e fica cantarolando. A maioria das crianças já está dormindo. Cida
chama a atenção da menina várias vezes e ameaça levá-la para a sala da
Tia Rita (a ADI de outra sala de Maternal, de quem, segundo as outras, as
crianças têm um grande medo). Denise diz:
69
“Você quer ir para a sala da Tia Rita? Vai e não volta nunca mais!
Viu? E não volta nunca mais!”
Como a criança não pára de cantarolar, Denise retira-a do
colchonete e leva-a para fora da sala. Retorna em alguns minutos com a
menina, dizendo:
“Então, deita e dorme! Deita e dorme, senão eu te levo para a Tia
Rita”.
A menina deitou-se em seu colchão e Denise colocou-a de lado para
dormir. Logo ficou quieta e adormeceu. Perguntei à Denise por que Karen
estava agitada e não queria dormir. Recebi, como resposta, que a criança
ingressou na creche há alguns meses e ainda não se adaptou à sua rotina:
“A Karen [pausa], ela chegou agora... Então, para ela, é tudo
novo! Ela está se acostumando. Ainda está naquela fase que ela
acha que pode fazer tudo que ela faz em casa (risos). Ela ainda
não tem medo! Ela não tem limites e acha que pode fazer tudo!
Mas agora, a gente coloca ela de ladinho e, assim, ela dorme
sozinha”.
Existe uma prática de atemorizar as crianças, usada para fazê-las
dormir sempre, todos os dias e no mesmo horário. Durante as
observações, verificamos 33 episódios de ameaça, em 6 dias de
observação sistemática.
2.4. Tempo de espera antes e depois do sono:
70
O tempo que a criança permanece deitada no colchonete, esperando
o sono ou, após ter dormido, esperando a autorização para levantar, não
causa nenhum problema para as ADI’s. Verifiquei, como demonstra os
quadros abaixo, o tempo de espera antes e depois do sono das duas
crianças observadas.
Quadro 4. Horário de sono do Narciso:
Dia Hora de
deitar
Espera Para
dormir
Dormindo Hora em que acorda
Espera para
levantar
Permissão para
levantar
Tempo total de Espera
1º 11h20 1h 12h20 14h02 - 14 1h
2º 11h20 1h05 12h25 14h02 - 13h45 1h05 3º 11h10 55’ 12h05 14h06 - 13h40 55’ 4º 11h25 1h 12h25 14h20 5’ 14h25 1h05 5º 11h12 23’ 11h35 13h57 23’ 14h20 46’ 6º 11h25 1h 12h25 14h10 - 14h05 1h
O fato de Narciso ficar, em média, uma hora acordado antes de
dormir parece não chamar a atenção das ADI’s. Na verdade, ele não
incomoda as outras criança e, portanto, não é visto com alguém que
atrapalha a situação proposta. Cida observa que:
“Às vezes, parece que ele está dormindo. Mas, quando chegamos
perto pra verificar, observamos que está acordado. Ele não quer
dormir mesmo (risos)! A gente ainda não entendeu porque
motivo que ele acha que ele não deve dormir! Eu não sei, mas, às
vezes, ele não tem sono, até porque ele não quer dormir. Eu já o
vi quase dormindo, assim, cochilando... E ele levanta a cabeça e
não dorme”.
71
Ao questionar as ADI’s sobre as prováveis razões que levavam
Narciso a demorar a dormir, percebi que elas achavam que isso ocorria
porque o pai dele trabalhava à noite, fato que levava a criança a não
possuir uma rotina adequada em casa. A argumentação, como pode ser
vista, não se sustenta: se a criança dorme mais tarde, deveria estar mais
cansada e dormir com maior facilidade! Vejamos o relato das ADI’s:
“Eu não sei se o problema dele é em casa, porque o pai trabalha
à noite e a mãe de dia. Se bem, que se fosse isso, teria caído na
rotina da creche. Mas eu acho que ele dorme em horários
diferentes em casa. A mãe deve estar cansada e vai dormir: não
vai deitar na hora que ele dorme! Então, ele deve dormir muito
tarde. Eu acho assim, a gente imagina que a mãe chega cansada
em casa e dorme, sem prestar atenção aos horários em que ele
dorme”.
Quadro 5. Horário do sono da Karen
Dia Hora de
deitar
Espera Para
dormir
Dormindo Hora em que
acorda
Espera para
levantar
Permissão para levantar
Tempo total de Espera
1º 11h20 10’ 11h30 13h10 50’ 14h 1h 2º 11h20 18’ 11h38 12h25 1h20 13h45 1h38 3º 11h10 20’ 11h30 13h02 38’ 13h40 58’ 4º 11h25 50’ 12h15 13h40 45’ 14h25 1h35 5º 11h12 18’ 11h30 14h 20’ 14h20 38’ 6º 11h25 10’ 11h35 12h30 35’ 14h05 45’
Diferentemente de Narciso, Karen demora menos para adormecer:
em média, 20 minutos. Acorda, no entanto, antes dos demais colegas e é
obrigada a ficar deitada no colchonete, esperando que todos acordem,
bem como a autorização para se levantar. Assim, a menina permanece
deitada cerca de 45 minutos após acordar, fato que requer dela muita
72
disciplina, visto não poder fazer barulho nenhum, para não acordar os
colegas. Para quem acorda mais cedo, portanto, não há nenhuma
alternativa. As ADI’s crêem que fazer alguma coisa mais interessante
pode atrapalhar o horário do sono e, como veremos na fala de Denise,
essa é uma questão fechada:
“Aqui não tem. Mas, no ano passado, tinha duas ou três crianças
que não dormiam. Então, a gente deixava o colchãozinho
afastado e dava pra elas um brinquedinho. Aí, elas ficavam
deitadinhas. Geralmente, era um brinquedo de espuma e, aí, elas
dormiam. Às vezes não dormiam, mas se você deixa assim,
ficavam fazendo bagunça e acordavam os outros. Isso não pode!”
Se considerarmos que o tempo de espera de Narciso e Karen é, em
média, de 1h por dia e se considerarmos 200 dias letivos, conclui-se,
então, que cada criança passa uma média de 200 horas por ano acordada,
deitada no colchão, sem nenhuma atividade. Essa conta simples permite
verificar como é grande o desperdício de tempo e de possibilidades
educativas para a criança pequena.
73
VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste trabalho foi o de investigar como os educadores de
escolas públicas de Educação Infantil lidam com os diferentes ritmos de
sono e vigília das crianças de 0 a 3 anos. No entanto, a análise dos dados
coletados permitiu alcançar, além das respostas buscadas, várias outras
práticas empregadas e cristalizadas, que engendram a rotina nas
instituições de Educação Infantil. Analisando a rotina diária de uma delas,
podemos constatar que as atividades básicas estavam voltadas para a
alimentação e o sono. Oliveira (1992, p.79) afirma que este tipo de
preocupação é muito comum nas creches que se orientam por uma rotina
tipo hospitalar. Segundo a autora, “elas transmitirem uma impressão de
abandono, desamparo, com as crianças passando a maior parte do tempo
esperando pela sua vez, em um cotidiano sempre igual”.
Muito se conquistou em legislações e políticas públicas em relação à
Educação Infantil no Brasil. No entanto, elas ainda não foram suficientes
para que, de fato, as transformações preconizadas aconteçam. Campos
(2002, p. 27) afirmou a esse respeito: “Nossa tradição cultural e política
sempre foi marcada por essa distância [legislação e realidade] e, até
mesmo pela oposição entre aquilo que gostamos de colocar no papel e o
que de fato fazemos na realidade”. Nesse sentido, é necessário trazer
para este trabalho uma discussão maior: para que serve mesmo a
Educação Infantil?
74
As mudanças nas legislações e nas políticas públicas vêm mudando
o foco da função da Educação Infantil, ao a legitimarem como sendo um
direito das crianças e não como atendimento às mães trabalhadoras ou às
crianças carentes. E esta criança – sujeito de direitos – “passa a ter direito
que vão ‘além’ da educação recebida na família e na comunidade, tanto no
que diz respeito à profundidade de conteúdos, quanto à sua abrangência.”
(Oliveira, 2002, p.37)
Essa pesquisa nos mostrou que a criança não é, ainda, sujeito de
direito dentro da escola. Direitos básicos são-lhes negados: o de brincar, o
de dormir e acordar quando têm vontade, o de perguntar e de ser ouvida,
entre tantos outros. Com isso, os tempos e os espaços da educação
infantil não são respeitados naquilo que a lei prescreve: a escola limita-se
a cumprir com o velho (e importante) papel de cuidar e zelar do bem
estar físico de sua clientela. Mas isso está longe de ser suficiente, embora
seja necessário. É preciso que a escola de educação infantil promova uma
ação educativa intencional que, ao provocar aprendizagens, impulsione o
desenvolvimento que, por sua vez, abre novas possibilidades de
aprendizagem, como bem apontou Vygotski. Se as escolas não agirem
assim, perdem as crianças e perde o país. Um espaço importante para a
construção do sujeito e do cidadão transforma-se em um grande
dormitório e em grande refeitório.
Vygotski e Wallon defendem que desde o nascimento as interações
sociais são a base do desenvolvimento da criança. Mas qual é a qualidade
das interações sociais que ocorrem dentro da escola, que segue uma
75
rotina rígida de horários e atividades vazias, sem intencionalidade
educativa? Interações ao sabor do acaso geram formas de pensar, sentir e
agir totalmente aleatórias e, isso, é o que não precisamos. Ao contrário,
queremos que desde pequenos, os alunos possam ensaiar, com proteção,
orientação e amparo comportamentos, atitudes e valores que são, do
ponto de vista de nossa sociedade, importantes para a civilização. Mas
como enfrentar este desafio?
Apontamos, como um primeiro aspecto, a necessidade de superar a
visão assistencialista, que se atém apenas ao cuidar. Isso pode ser
alcançado, com relativa facilidade, reservando recursos para serem
investidos na formação do profissional (preferencialmente in lócus) que
atua diretamente junto à criança. Dessa forma, as ADI’s, sem deixar de
cuidar do bem estar físico de seus alunos, passarão a cumprir,
efetivamente, o papel de mediadora da cultura e dos conhecimentos tidos
como importantes, em nossa sociedade, de serem apropriado pela faixa
etária com a qual trabalham. Um segundo aspecto parece estar nas
condições de trabalho deste profissional: é preciso colocar um ponto final
nas jornadas de trabalho cansativas e na remuneração incompatível com a
importância da profissão. Afinal, são os educadores quem se ocupam do
futuro de nossas crianças. Nós delegamos a eles esse papel e nós
devemos cobrar do estado que invista neles, porque investir neles é,
antes de tudo, investir nos cidadãos brasileiros de amanhã.
Muito embora este trabalho tenha sido realizado numa determinada
escola, acredito que as análises aqui tecidas possam contribuir para uma
76
discussão ampla sobre a Educação Infantil de 0 a 3 anos. Encerro aqui
este trabalho, convidando a todos para pensarmos, juntos, uma boa
solução para os problemas detectados. Não podemos - nem queremos -
adiar mais uma proposta pedagógica viável e adequada para a faixa etária
atendida pela instituição de Educação Infantil. É preciso, urgente e
necessário que esse espaço ganhe dignidade e força, para cuidar e,
notadamente, educar nossos filhos. Silva e Hoffmann colocam bem essa
questão. Faço de suas palavras as minhas:
“É urgente repensar sobre o papel verdadeiramente educativo das
creches e sua importância em relação ao futuro de muitas
crianças. Esse repensar deve se dar em duas dimensões: do
institucional ao pedagógico. Assim como no interior de muitas
instituições nega-se a importância de uma efetiva ação educativa
para as crianças de 0 a 3 anos, também a sociedade nega o papel
social dessas instituições, abandonando-as a uma precária
sobrevivência.” (1995, p.15)
77
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78
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79
VIII. ANEXOS
Anexo - I
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,______________________________________________________,
declaro ter sido informado e estar devidamente esclarecido sobre os
objetivos e intenções deste estudo, sobre os procedimentos a que estarei
sendo submetido, sobre os riscos e/ou desconfortos que poderão
acontecer. Recebi garantias de total sigilo e de obter esclarecimentos
sempre que o desejar. Sei que minha participação está isenta de
despesas. Concordo participar voluntariamente deste estudo e sei que
posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem nenhum
prejuízo ou perda de qualquer benefício.
__________________ ___________________ Assinatura do sujeito Testemunha
Pesquisador responsável
Eu, Maria Goreti Miguel Santos, responsável pelo Projeto: Sono-vigília. Declaro que obtive espontaneamente o consentimento deste sujeito de pesquisa para realizar este estudo. Data____________ __________________________
80
Anexo - II
Roteiro de entrevista semi-estruturado da Diretora:
Data de inauguração:
Horário de funcionamento:
Direção: ( )sim ( )não
Assistente de Direção: ( )sim ( )não
Profº Coordenador: ( )sim ( )não
Cozinheira: ( )sim ( )não - Quantos?
Serviçais: ( )sim ( )não - Quantos?
Vigia : ( )sim ( )não – Quantos?
Administrativo: ( )sim ( )não - Quantos?
Outros funcionários: ( )sim ( )não - Quais?
Sala de aula: Banheiro: Chuveiros: Cubas: Refeitório: Diretoria: Lactário: Parque: Biblioteca: Sala de TV: Sala de multi-uso: Sala dos educadores: Secretaria: Cozinha:
TURMA MENINOS-idade MENINAS-idade EDUCADORES
NÍVEL SÓCIO-ECONÔMICO DA COMUNIDADE
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PARTICIPAÇÃO DOS PAIS NO CE E RPM
ESCOLARIDADE DOS EDUCADORES NOME NÍVEL
História da Creche: como surgiu? Foi por intermédio de lutas da população? Qual a participação da comunidade na creche? Principais problemas, soluções aventadas, principais vantagens etc.
Qual o critério para a efetivação da matrícula da criança? A creche é destinada a crianças de mães que trabalham? Atende as necessidades de todas as mães? A escola atende a demanda da comunidade local? A rede possui um PPP? A escola possui um PPP? Em que se baseia? Formação continuada? Outros projetos? Como acontecem as horas atividades? Quais as dificuldades da escola? Quais as suas dificuldades? O que você acha sobre o sono vespertino das crianças da creche? Algum ADI já se queixou do sono das crianças da creche?
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Anexo - III
Transcrição de um dia de observação:
OBSERVAÇÃO – Maternal – 20/09/2005 – Tempo: quente e ensolarado
22 presentes neste dia.
10h10: Após assistir a H.A., eu me dirijo à sala do Maternal.
As crianças estavam na sala de aula, local em que tinham acabado de
realizar uma atividade de movimento, segundo Denise.
10h15: As ADI’s começaram arrumar a sala para a hora do sono. As
crianças sentaram-se encostadas na parede e eram encaminhados ao
banheiro.
10h40: As ADI’s arrumaram as filas (de meninas e de meninos) para irem
ao refeitório. Quando lá chegaram, cada criança sentou-se numa cadeira
livremente. Neste dia foi servido: polenta com molho e couve refogada. A
maioria das crianças não gostou do cardápio e alguns nem o
experimentaram.
11h20: Retorno à sala de aula. As ADI’s arrumaram as filas. Karen é uma
aluna que está há pouco tempo na escola e ainda não está habituada à
rotina da creche. Quando as ADI’s chamam as crianças para formarem as
filas, ela está comendo a sobremesa e sai correndo. Procura um lugar na
fila e não consegue. Durante a disputa por um lugar, ela bate em outra
criança que revida. Karen começa a chorar bem alto. Denise retira a
criança da fila e a leva para a diretoria. Chegando lá, entrega a menina
para a secretária, que parece não saber o que fazer. O restante da turma
foi conduzido à sala de aula. Ao lá chegarem, as crianças foram
encaminhadas ao banheiro e, em seguida, deitam nos colchões. Cida liga
o aparelho de CD com música infantis. Algumas crianças se ajeitam se
lado para dormir; outras procuram em suas mochilas chupetas e
paninhos.
11h30: Denise vai até a diretoria e traz Karen de volta à sala. A menina
deita-se em seu colchão e fica quieta.
11h32: Sete crianças estão dormindo.
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11h35: Onze crianças estão dormindo.
11h38: Karen dormiu.
11h40: Nove crianças estão acordadas.
11h45: Sete crianças estão acordadas.
11h55: Três crianças estão acordadas. Narciso está impaciente no seu
colchão e fica procurando uma posição. Denise sai da sala para cumprir o
horário de almoço.
12h05: Narciso está acordado e ainda está se mexendo muito. Uma outra
menina continua acordada.
12h10: Cida disse que a menina não dormiu ainda, pois está sentindo
faltada da chupeta que esqueceu em casa.
12h25: Narciso e menina dormiram e Karen acordou.
12h30: Karen está quieta, mas Cida diz: “Karen feche os olhos e durma”.
Cida está sentada no canto da sala folhando um livro.
12h33: Mais uma criança acordou, mas permanece quieta.
13h10: Samira está acordada. Cida deita-se com a criança no colchão e
diz para ela ficar quieta, para não acordar o restante das crianças.
13h12: Quatro crianças estão acordadas. Há muito barulho na rua da
creche.
13h20: Cinco crianças estão acordadas, mas permanecem deitadas nos
colchões. Uma delas pede a Cida para ir ao banheiro.
13h30: Karen não quer mais ficar deitada e fica brincando com Samira,
que está deitada do seu lado acordada. Cida diz: “Se vocês não ficarem
quietos eu vou levá-los para a Tia Ana”.(Tia Ana é a Secretária da Escola)
13h32: Sete crianças acordadas. Cida deita-se no colchão de Karen e
pede para que fique quieta.
13h35: Oito crianças acordadas. Começa muito barulho no pátio, pois é
horário do lanche das crianças do Estágio.
13h45: Cida solicita para que as crianças que estão acordadas que se
levantem e sentem-se encostadas na parede.
13h50: As crianças recebem um pedaço de maçã e comem, calmamente,
sentadas no chão.
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13h55: Treze crianças estão acordadas; o restante dorme. As ADI’s abrem
as cortinas da sala.
14h02: Narciso acordou.
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Anexo IV
Roteiro semi-estruturado da Professora Coordenadora:
Qual a sua escolaridade? Fez magistério?
Você fez aonde Psicopedagogia?
Você é casada?
Quantos filhos você têm?
Qual a idade deles?
Qual a sua experiência profissional?
Você já era professora aqui dessa escola?
.Você foi escolhida pelos seus pares?
Os ADI’s também participaram dessa escolha?
Você está desde desse último processo seletivo?
Esse é seu segundo ano?
Você participa de algum curso de formação continuada na rede?Quais?
E dessa formação o que você consegue, trabalhar aqui na escola?
É você está nessa escola há quanto tempo?
E você está na rede há quanto tempo?
Como que é a hora da atividade?
Como os educadores planejam o seminário ?
Como que é o grau de comprometimento das educadoras na participação
da hora da atividade?
Como são elaboradas as atividades?
Como se dá o processo de avaliação do desenvolvimento da criança?
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E os educadores da escola eles participam dos projetos de formação
oferecidos pela Secretaria de Educação?
O que você acha dos educadores eles cuidam mais ou educam mais. Qual
o objetivo maior deles aqui dentro da creche?
O que um ADI faz que significa educar?
Você acha que é importante o sono?
Até que idade você acha importante?
Você já recebeu queixa de criança que não dorme?
Você tem conhecimento do que as educadoras fazem para as crianças
entrar nessa rotina? Como que elas conseguem chegar momento que
todo mundo dorme no mesmo horário?
O que as educadoras fazem no horário do sono?
Você indicaria alguma criança para fazer essa pesquisa de sono tanto da
EMEI quanto da creche?
Você já viu criança que dorme fora do horário, que cochilava de manhã ou
que dormia à tarde?
Que tipo de criança que resiste mais para dormir? As crianças mais
agitadas, as crianças mais calmas?
E vocês já pensaram dar outra opção pra essa criança que fica muito
tempo deitada no colchão sem sono?
Pra você: o que é sono?
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Anexo-V
Roteiro semi-estruturado das ADI’s:
DDAADDOOSS PPEESSSSOOAAIISS
NOME: IDADE: ESCOLARIDADE: ESTADO CIVIL: Nº DE FILHOS: CHEFE DA FAMÍLIA: IDADE DOS FILHOS: EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL: TEMPO DE TRABALHO NESTA ESCOLA E EM OUTRA CRECHE: NESTA TURMA: FAZ CURSO DE FORMAÇÃO: PARTICIPA DA HORA ATIVIDADE:
Questões O QUE EU QUERO SABER 1- Gostaria de saber por que você escolheu esta
escola para trabalhar? - Se ele foi para aquela escola,
porque se interessou pela proposta pedagógica;
- Se foi para esta escola por conveniência (perto do local de moradia)
- Se foi para esta escola por falta de opção;
- Se está nela contra a sua vontade; 2- Quem trabalha com você nesta turma? Você
tem amizade com ela (e)? Você pode me dar um exemplo de como se dá essa cooperação entre
vocês?
- Se os as pessoas que trabalham juntas mantém uma relação de parceria no trabalho;
- Se existe um vínculo de amizade e de cooperação;
3- Você acha importante o sono para as crianças? E para a rotina da creche e dos educadores? Por que?
- Qual importância que o sono tem para ele e para a criança;
- Se a sesta na escola faz somente parte da rotina ou é tida como uma necessidade da maioria das crianças;
4- O que você e seus parceiros fazem quando as crianças estão dormindo?
- A importância deste momento para ele;
- Deixa-se para os educadores um período livre para outras atividades ou para descansar;
5- Todo ano você tem algum aluno que apresenta um padrão de sono diferente da maioria dos alunos? Como lida com essa situação?
- Se ela já pensou sobre esse assunto;
- Se este é um fato que a incomoda;
- Se ela lida com essas crianças de maneira padronizada ou se reconhece a especificidade de cada criança
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6- Você indicou essas crianças para participar dessa pesquisa. No que o sono delas difere das demais?
- Se o educador percebe que as crianças apresentam diferenças e que possuem uma singularidade;
- Se existe alguma visão negativa associada ao fato da criança não dormir;
7- Qual a idade da criança? Fale-me sobre ela: - Como o ADI vê esta criança;
8- Por que você acha que essas crianças não dormem ou, ao contrário, dormem demais?
- Visão do educador sobre a resistência a dormir ou a dormir muito: esses alunos são vistos como rebeldes, agitados, pirracentos; apáticos, preguiçosos etc.
9- Há quanto tempo esta criança está na instituição? (Se estiver há muito tempo: Na outra turma, essa questão também aparecia? Como ficou sabendo desse fato?)
- Se a criança ainda está em período de adaptação;
- Se desde o início ela não dorme ou dorme excessivamente;
- Se já se passou um período de tempo suficiente para a criança entrar no ritmo da creche;
- Se já era uma preocupação nos anos anteriores;
10-O que você faz para eles dormirem ou ficarem acordados? Por que faz isso?
- Se o educador é carinhoso com a criança;
- Canta-se ou conta uma história; - Está se importando com o fato da
criança demorar (ou não) a dormir e razões para isso;
11-O que você sente quando eles não dormem? Por que acha que se sente assim?
- Se o educador fica angustiado, irritado, indiferente ou é tomado por outro sentimento;
- Se, para ele, a criança dormir é importante;
12-De acordo com sua experiência, que tipo de criança resiste mais a dormir/dorme mais freqüentemente? Quando isso ocorre com maior freqüência?
- Se há alguma idéia pré-formada acerca das crianças e/ou de suas famílias
- Se as crianças demonstram alterações no padrão de sono, sobretudo quando saem da rotina;
- Se algumas determinadas atividades interferem no padrão de sono das crianças;
- Se o clima interfere no sono; - Se situações de conflito ou disputa
(com os colegas, educadores ou familiares) facilitam alterações no padrão de sono;
- Idem para atividades festivas na escola;
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13- Essas crianças necessitam de algum objeto para dormirem?
- Se a criança necessita de chupeta, paninho ou algum outro objeto;
- Se o educador dá à criança algum objeto que a família indicou;
14- Como você tenta solucionar os problemas de alterações no padrão de sono das crianças? Quem você envolve na solução do problema? Essas pessoas buscam uma solução ou são simplesmente informadas?
- Busca-se ajuda dos parceiros; - Encaminha-se o problema para a
coordenação e direção; - Se segue as orientações; - Se a direção e coordenação
apresentam preocupação com este fato;
15- Você já conversou com a família sobre esse assunto?
- Se o educador procura a cooperação da família;
- Se para ele é importante levar em conta a visão e a experiência familiar;
- Se ele tem um envolvimento maior com a vida desta criança;
16- Você oferece uma outra alternativa para a criança que não quer dormir? Qual?
- Se ele percebe que existem diferenças entre as crianças e se importa em respeita-las;
- Obriga-se a criança a permanecer o tempo todo deitado, sem sono, quieto para não acordar os colegas;
17- Descreva como é a rotina da sua turma:
- Se há um planejamento para a rotina;
- Se existe a preocupação em elaborar estratégias que favoreçam o clima para o sono ou para o despertar;
18- Você considera a sua função importante para o desenvolvimento da criança?
- O que ela pensa sobre a sua função enquanto educadora;
- Qual a relevância que atribui à sua função;
19-Que outras característica tem a criança? - Se existem outras informações importantes que anteriormente não foram ditas;
20- O que é sono? Por que devemos dormir?
- Tem-se algum conhecimento
sobre sono;
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Anexo – VI
Roteiro semi-estruturado dos pais:
DDAADDOOSS PPEESSSSOOAAIISS
NOME: IDADE: ESCOLARIDADE: ESTADO CIVIL: Nº DE FILHOS: CHEFE DA FAMÍLIA: IDADE DOS FILHOS: TRABALHO DA MÃE: LOCAL ONDE TRABALHA: PERTO DE CASA: HORÁRIO DE TRABALHO: TRABALHO DO PAI: LOCAL ONDE TRABALHA: HORÁRIO DE TRABALHO: NOME DA CRIANÇA: DATA DE NASCIMENTO DA CRIANÇA: COM QUAL IDADE INGRESSOU NA CRECHE: MORA PERTO DA CRECHE: QUESTÕES O QUE QUERO SABER 1- Qual a sua rotina diária? - Se a mãe tem tempo para a casa
e para os filhos; - Se a rotina tem uma constância
ou é sempre alterada; - Se ela interage com a criança
COMO e quando; 2- Qual a rotina diária do seu marido? - Se o pai tem tempo para a casa
e para os filhos; - Interage-se com a criança,
quando e como;
3- Quantas pessoas moram na sua casa? E qual a rotina diária delas?
- Qual é a dinâmica da casa; - Se existem pessoas na casa que,
ao interagir com a criança, interferem seu padrão de sono; Em caso positivo, quando e como isso ocorre?
4- Quem cuida da criança em casa?
- Se é a mãe que cuida e como cuida;
5- Quantas horas a criança dorme por dia? Que horas ela vai dormir? Que horas que ela acorda?
- Conhecer a rotina de sono da criança;
6- Como é a rotina diária da criança? - Quais são os horários de sono desta criança;
- Dorme-se bem; - Come-se bem; - Brinca-se de que, com quem,
quando e onde; 7- Nos finais de semana como é a rotina dela?
- Quais os horários de sono e quantidade;
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- Tipo de lazer e implicações para o sono (agitação excessiva, pouca estimulação etc.);
8- A criança tem algum ritual para dormir? Quem cuida deste ritual?
- Como a mãe participa deste momento do sono;
- Como o sono é encarado: sua importância e respeito aos ciclos da criança;
- Dorme-se sozinho ou necessita da presença de alguém para dormir;
- Se tem seu próprio quarto, no qual dorme sozinha;
- Possui-se uma cama só para ela; 9- O sono é tranqüilo? Sempre? - Se existe qualidade do sono
noturno e diurno; 10- Pela manhã: acorda sozinho ou precisa ser acordado? Qual é seu estado de ânimo ao acordar?
- Tem-se resistência para acordar; - Acorda-se mal humorado e
irritado; 11- Como era o sono da criança antes dela entrar na creche?
- Como era o padrão de sono antes da criança entrar na creche;
- Se ela tinha o hábito de fazer a sesta à tarde;
12- Depois que a criança ingressou na creche, o sono dela se modificou? Se sim, como?
Se e como a rotina modificou os padrões de sono da criança;
13- Você sabe se seu filho está com dificuldades para se adaptar ao horário de sono da creche?
- Se os ADI’s já conversaram com a mãe sobre algum tipo de problema no sono da tarde;
14- (Se a criança ingressou no ano anterior) Na outra turma, a criança também apresentava dificuldade para dormir na creche?
- Se a mudança de turma modificou o padrão do sono;
- Se é uma dificuldade antiga;
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Anexo – VII
Planta da sala de aula: