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A EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS* Iara de TaZeda Fernandes Procuradora chefe da Procuradoria Regional de Bauru - São Paulo - PR-7. Mestra e Doutora em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora e Coordenadora do Programa de Mestrado em Direito, Linha de Pesquisa: As garanlias de acesso à justiça. Cen tro de pós-graduação da Faculdade de Direito de Bauru - lTE. ''Na atual crise de valores, o mundo pede aos juristas idéias novas, mais que sutis interpretações" Tulio Ascarelli "O de que se trata é saber se queremos uma sociedade que tenha o mínimo de respeito pelo conceito de ter um direito ou se vamos entender que se pode, às vezes, abrir mão disso em nome de algum suposto benefício geral" Márcio Sotelo Felippe, "O direito de ter direitos" Folha de São Paulo - 26/02/96 'Tese aprovada no XXIV Congresso Nacional de Procundores do Estado, realiudo de 30;08 a 03;09 de 1998, em Campos do J ordão/SP.

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A EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS*

Iara de TaZeda Fernandes Procuradora chefe da Procuradoria Regional de Bauru -São Paulo -PR-7.

Mestra e Doutora em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Professora e Coordenadora do Programa de Mestrado em Direito,

Linha de Pesquisa: As garanlias de acesso à justiça.

Centro de pós-graduação da Faculdade de Direito de Bauru - lTE.

''Na atual crise de valores, o mundo pede aosjuristas idéias novas, mais que sutis interpretações"

Tulio Ascarelli

"O de que se trata é saber se queremos uma sociedade que tenha o mínimo de respeito pelo

conceito de ter um direito ou se vamos entender que se pode, às vezes, abrir mão disso em nome de

algum suposto benefício geral" Márcio Sotelo Felippe, "O direito de ter direitos"

Folha de São Paulo -26/02/96

'Tese aprovada no XXIV Congresso Nacional de Procundores do Estado, realiudo de 30;08 a 03;09 de 1998, em Campos do Jordão/SP.

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I. DEliMITAÇÃO DO CAMPO DE REFLEXÃO - PROPOSTA DE UM MODELO DE EFETMDADE DAS NORMAS CONSTITIJCIONAIS

Prestigioso neste momento histórico finissecular simétrico à consagração dos dez anos de vigência da constituição de 1988, apausa mediativa pertinente àefetivida­de das normas constitucionais, sem perda do pano defundo -Ademocracia ea cida­dania no Brasil -por conta da candente vocação institucional- constitucional de seus nobres misteres.

Elegendo como dados históricos, amoldado àsingeleza do presente estudo, pri­meiramente, a lentidão da institucionalização de formas de participação política da so­ciedade frente àprecoce estruturação do Estado, formulador do chavão OBrasil teve Estado antes de ter sociedade atribuído aAlceu de Amoroso lima, ao depois, o clássi­co dualismo estanque entre Estado e Sociedade, e, finalmente, a proposta de Trans­fonnação do Estado pelos Constituintes de 1988, a meta de estudo convergirá, nos lindes da efetividade das normas constitucionais, e sem desapego da experiência cons­titucional desses dez anos, na visualização do momento em que as normas constitu­cionais adquirem feição de instrumento de realização política. Momento em que, a pressão social (cidadania como mecanismo de mobilização) exige dos Poderes Cons­tituídos (Legislativo, Executivo, Judiciário) a realização do projeto social ideológico 1

agasalhado no leito constitucional. Trilhando como métodos interpretativos a Concretização de Konrad Hesse 2 e

].J. Gomes Canotilho 3 afinada àteoria problemática de Theodor Vieweg, ancorada no significado substancial da Constituição de Ronald Dworkin 4 menos se preocupar com a sinopse retrospectiva cótica da efetividade constitucional da Constituição Fede­ral de 1988 e, mais, com a projeção de um modelo de efetividade onde o Estado Demo­crático de Direito e Estado Social se fundam s. Ao intérprete constitucional, sobrepor-se­á o plano de eficácia (efetividade), traduzido num redirecionamento à configuração da ordem sodal desejada 6, com proposta reiventiva da democracia para o terceiro milênio.

'Proposital a ulilização da expressão projeto social ideológico ao invés do modelo normativo constitucional, com a servemia de sinalização de um pensar expansi\isla à muralha legal e principiológica. '''A interpretação constitucional é concretização (Konkreti sierung)". Escn'tos de Derecbo Constitucional, p. 43. '''Concretizar a Constituição", traduz-se, fundamemalmeme, no processo de densifiçação de regras e princípios constitucionais" (...) Densifiçar uma norma significa preencher, complememar e precisar o espaço normativo dde um preceito constitucional, especialmeme carecido de concretização, a fim de tornar possível a solução, por esse preceito, dos problemas concretos". Direito Constitucional, p. 2021203­"'Los Derecbos en Sério'; passim. 'Oportuno avaliar que até mesmo o controle da constitucionalidade (imra e infn1. nesse modelo, extravasa da estreiteza do domínio da validade (piramidal Kelseniana) para o di,. i!o : ivo da eficácia 'Historicameme, essa junção pode oportunizar a ruptura constitucional (objetivos normatizados e na realidade ignorados - cresceme pressão social Xabalo da relação de poder). Esse o desafio - idemidade de comamos do Estado democrático e Estado Social sem ruptura. 'Basta lembrar datar dos idos de 1931 a Teoria do Direito Social.

11. DIREITO SOCIAL· ESTA CO-RElAÇÃO DE com

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R.OPOSTA DE UM INSTITIJCIONAIS

r simétrico à consagração dos 1ediativa pertinente àefetivida­undo -Ademocracia ea cida­udonal- constitucional de seus

1ge1eZl do presente estudo, pri­sde participação política da so­ulador do chavão OBrasil teve oroso Uma, ao depois, o clássi­lalmente, a proposta de Trans­o.eta de estudo convergirá, nos l desapego da experiência cons­to em que as normas constitu­) política, Momento em que, a ~ação) exige dos Poderes Cons­) do projeto social ideológico 1

retização de Konrad Hesse 2 e ~ Theodor Vieweg, ancorada no >Workin 4 menos se preocupar titucional da Constituição Fede­fetividade onde o Estado Demo­rete constitucional, sobrepor-se­:ecionamento à configur.lção da nocncia pan o terceiro milênio,

o modelo normativo constitucional, com incipiológica, ritos de Derecho Conslituciorlal, p, 43, ) de densificação de regras e princípios :memar e precisar o espaço nonnativo o, a fim de tornar possível a solução, por

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11. DIREITO SOCIAL· ESTADO SOCIAL: CO-REIAÇÃO DE CONTEÚDO E CONTINENTE

Aconformação do Estado Democrático de Direito e Estado Social perpassa, es­sencialmente, pela concepção, revitalizada e reconstruída 7 do Direito Social.

Serena a constatação quando se holofota a sociedade contemporânea de massa no limiar do novo século, na qual, senão impossibilitados, ao menos, toleráveis, com­preensíveis os grotões de conflitos, mormente nos adjetivados direitos sociais (assen­tamento rural, habitação, previdência, trabalho, saúde, educação, consumo, produção e quejandos), O não-aformoseamento do modelo político do Estado do Bem-Estar fomentador de angústias derivadas de expectativas frustradas, prestigiam eclosões com propensão, muita vez, a perpetuação dos litígios,

A resposta a esta sociedade complexa (e perplexa), decididamente, refoge do modelo-padrão que vê como fontes do Direito a lei e o costume, Quebrar-se a moldu­ra, permitindo a expansão da paisagem (Ortega y Gasset formula ter a realidade, tal qual apaisagem, infinitas projeções), é imperioso, Repudiar as noções de completude e unicidade à ordem estatal impõe-se,

Com visão na "paisagem-realidade" expandida, amoldável o pluralismo jurídico de Georges Gurvitch 8 numa perspectiva alerta contraposta ao historicismo jurídico (or­dem jurídica = direito positivo (positivismo jurídico) e de tal modo alargada (além dos caracteres de subordinação à ordem estatal, de zonas de exclusão - inclusão - inter­secção ao plano de validade) cuja teleologia se desgam, teoricamente, da ordem estatal. Essa a primazia do Direito Social gurvitchiniano, Abandona-se a idéia de força

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coercitiva, doutrina o jus-sociólogo russo, aflorando a legitimação da incorponção das normas pelos atores sociais que as auto-instituem Nesse quadro social desmoldundo, possibilita-se acoexistência da normatividade-<:oercitiva (estatal) e normatividade social.

Oportuno o ensino de Norberto Bobbio 9 Aimagem de um ordenamento, com­posto somentepordoispersonagens, o legislador que coloca as normas eos súditos que as recebem, é puramente escolástica, O legislador é um personagem inuginário que esconde uma realidade mais complicada, (..,) A complexidade de um ordenamento juridico deriva do fato de que a necessidade de regras de conduta numa sociedade é tão grande que não existe nenhum poder (ou órgão) em condições de satisfazê-la sozinho": Por essas razões, escreve o Catedrático da Universidade de Turim 10 "em cada ordena­mento, ao lado da fonte direta, temos fontes indiretas que podem ser distinguidas nes­tas duas classes: fontes reconhecidas e fontes delegadas (...) Outra fonte de normas de um ordenamento juridico é o poder atribuído aos particulares de regular, mediante atos voluntários, os próprios interesses: trata-se do chamado poder de negociação" 11,

"'L'Idée du J1roit Social Notion et Systéme du Droit Social, Histoire Doctrinale depuis Ie XVll éme, Siêde jusqu" á laFin duX,( eme", 9"Teoria d~ OrdenarnemoJurídico", pp, 37138, "Dp, ci' , pp, 38/41 "05 grifas são do autor.

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Assentado como premissa-mor o pluralismo jurídico, agrilhoando-o ao Direito Social- Bobbio/Gurvitch (aprisionado, este último, como Homem da época 12 - esmae­cer do século XX) na compreensibHidade propugnada por José Luiz Bolzan de Morais 13 ao Direito Social de'Gurvitch da não-redução "a simples produção social de uma normatividade, ou seja, de um direito cuja única distinção seria sua origem", sua teorização permite vislumbrar, para além, um novo conjunto de preocupações que impõem ao direito uma nova estrutura legitimadora.

Semelhante "nova estrutura legitimadora" nos moldes do Direito Social, para a modernidade de massa, com a quebra da hegemonia do direito individual, polemi­za, instiga, a nível da efetividade da Lei Maior, a reordenação (com eventual redire­cionamento) do Estado Social.

A interligação Direito Social - Estado Social, conquanto de soslaio, guarde '" parecença (pelo menos terminológica), asinonímia é de pronto, descomplicadamen­

te, afastada. Eo alcance da literalidade é suficiente à solução. Inegável o discrímen dos substantivos Direito e Estado, e a nível científico, o apontamento do primeiro com aporte àseara jurídica, e o segundo àciência política, afiora de abrupto. Todavia, a disparidade é aparente, como soe acontecer com as colocações ab initio. Há cor­relação continente-conteúdo (é verdade que não necessária, mas apenas opcional), figurando o Direito Social como a proposta jurídica de campo investigatório (con­teúdo) a culminar no Estado Social, projeção da realidade social não somente fática, mas também enquanto expectativas, anseios, angústias e desesperanças) almagama­da ao projeto social ideológico (faces da mesma moeda), naquele momento históri­co, carente de realização (efetividade normativa-política).

III. ESTADO DE DIREITO E ESTADO SOCIAL· PROPOSTA DE COMPATIBIUZAÇÃO . QUEBRA DO ~ODELO ClÁSSICO FORMAUSTA DO ESTADO DE DIREITO (DEFORMAilZAÇÃO)

Alerta, com proficiência doutoral, Tércio Sampaio Ferraz Júnior 14 "O que vem sendo percebido, no entanto, na experiência recente da Constituição brasileira vi­gente, é que uma compatibilização do Estado de Direito como Estado Social traz algu­mas dificuldades significativas. Seria preciso, de um lado, garantir em cada caso uma situação de compromisso entre os grupos sociais que assegurasse um mínimo de cri­térios comuns de valores que fossem admitidos por todos. De outro lado, um quadro

"Expressiva a confissão de George Gurvitch "Para terminar, seja-me permitido indicar que o destino quis que. muüas vezes, na minha retlexão e 110 meu esforço estivesse "Contra a corrente". O riuno do meu pensamento esteve quase sempre em def=memo com o que estava na moda. Sou pois um excluído da horda "por vocação, por assim dizer", in "meu Itinerário Intelectual ou OExcluído da Horda" - "Tratado de Sociologia", v. li, p. 656 (edição portuguesa). 'Y'Aidéia de Direito Social", p. 97­""Constituição Brasileira e modelo de Estado: hibridismo ideológico e condicionantes históricas", in, Cadenws de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 17, p. 45

IARA. TOLEDO FERNANDES

constitucional rigoroso sem o pos de pressão e ainteresses nar facilmente uma espécie d( tames de princípios públicos r ce das exigências mencionada elas têm caráter distinto. Aexi: político nos seus meios e fin rigoroso é um problema ti] Forsthoff l5

, arremata o jurisf de caráter vem sendo perceb um conceito formalmente jun conceito de Estado Social".

Frente a essas clificuldad Direito" e "Estado Social", par tucionais que se vem propor Direito clássico, formalista. Na traduzir essa quebra como mc rações sociais vivenciado sol 1967/69, em oposição ao modi ficando a singularidade na "ton expressada na Europa desde o:

Por conseguinte, a ultral de efetividade, considerando o Estado" pela Constituinte de política da sociedade civil", pre palavras, deformalização intef] cidadania. Assim, os componen e do constitucionalismo rigom !ização entre Estado de Direito tividade constitucional a ser gJ

cidadania", concretizadora da CI

formuladora do modelo de Est ção da Constituição".

II"Rechstsstaats in Wandel, 1976, p.89". Op "Conforme delineado no pórtico deste mo de um novo modelo de efetil~dade das no! "FERRAZ JÚN10R, Tércio Sampaio, op. cit.,

TlTUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA TOLEDO FERNANDES

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11, conquanto de soslaio, guarde éde pronto, descomplicadamen­

~ à solução. Inegável o discrímen lco, o apontamento do primeiro olítica, afiora de abrupto. Todavia, I as colocações ab initio. Há cor­lecessária, mas apenas opcional), :a de campo investigatório (con­l!idade social não somente fática, ;tias e desesperanças) almagama­)eda), naquele momento históri­ítica).

. PROPOSTA DE ELO CIÁSSICO >EFORMALIZAÇÃO)

paio Ferraz Júnior 14 "O que vem Ite da Constituição brasileira vi­~ito como Estado Social traz algu­lado, garantir em cada caso uma ~ assegurasse um mínimo de cri­odos. De outro lado, um quadro

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:ondicionantes históricas", in, Cadernos

constitucional rigoroso sem o qual a atuação do Estado, inevitavelmente sujeito a gru­pos de pressão e a interesses estamentais e corporativistas da burocracia, pode-se tor­nar facilmente uma espécie de exercício de arbitrariedade camuflado por supostos di­tames de princípios públicos relevantes. As dificuldades dessa compatibilização, em fa­ce das exigências mencionadas, repousam afinal no inevitável reconhecimento de que elas têm caráter distinto. Aexigência de um compromisso é um problema tipicamente político nos seus meios e fins, enquanto a exigência de um quadro constitucional rigoroso é um problema tipicamente jurídico formal". Com apoio em Ernest Forsthoff l5

, arremata o jurisfilósofo da Universidade de São Paulo "Essa dualidade de caráter vem sendo percebida, na verdade, no fato de que o Estado de Direito é um conceito formalmente jurídico, jurídico formal, o mesmo não sucedendo com o conceito de Estado Social".

Frente a essas dificuldades tecidas, e à necessidade de fusão entre o "Estado de Direito" e "Estado Social", para um novo modelo de efetividade das normas consti­tucionais que se vem propor 16, pressupõe-se a quebra do modelo de Estado de Direito clássico, formalista. Nada há, diga-se apressadamente, de novidadeiro, se se traduzir essa quebra como modelo de Estado comfunção de legitimação das aspi­rações sociais vivenciado sob a égide das Constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967/69, em oposição ao modelo constitucional de Estado com função de bloqueio, ficando a singularidade na "tomada de consciência (social e política) dessa distinção, expressada na Europa desde os anos vinte e apontada por Max Weber 17.

Por conseguinte, a ultrapassagem das dificuldades, em prol do novo modelo de efetividade, considerando os dados históricos de "proposta de transformação do Estado" pela Constituinte de 1987 e o "retardamento das formas de participação política da sociedade civil", pressupõe a deformalização da Constituição (em outras palavras, deformalização interpretativa) e o florescimento e amadurecimento da cidadania. Assim, os componentes da "situação de compromisso" dos grupos sociais e do constitucionalismo rigoroso", comprometedores da imprescindível compatibi­lização entre Estado de Direito e Estado Social à serventia do novo modelo de efe­tividade constitucional a ser gizado, serão transfigurados pelo "fortalecimento da cidadania", concretizadora da concepção da Constituição como sistema de valores e formuladora do modelo de Estado (projeto social ideológico) e pela "deformaliza­ção da Constituição".

l5"Recbstsstaats in Wandel, 1976, p.89". Op. cit, p. 45. I'Conforme delineado no pórtico deste modesto estudo -item nO 1 - Delimitação do campo de reflexão. Proposta de um novo modelo de efeti\~dade das normas constitucionais. "FERRAZJÚNIOR, Tércio Sampaio, op. cit., p. 47.

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N. O NOVO MODELO DE EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS FRENTE ÀTEORÉTICA CONSTITUCIONAL EFICÁCIA]URÍDICA. EFICÁCIA SOCIAL - EFETIVIDADE

Muito embora passada alargada se detecte no afincamento das pilastras (teses­mor) da "deformalização da Constituição" e do "fortalecimento da cidadania", impos­sível o caminhar sem fixação do entendimento de "Eficácia Constitucional".

Rumando em marcha de contramão à Teoria Egológica do Direito de Carlos Cóssio 18 ao postular como vocábulos sinônimos "positividade, vigência, eficácia, observância, facticidade e efetividade" do Direito, é com apego ao atraente pensa­mento de AlfRoss 19 que, após realçar o pensamento norteador das teorias realistas no tema "Conceito de direito vigente", na frase "Todas las teorias realistas están de acuer­

11' do en interpretar la vigencia dei derecho en términos de efetividad social de las nor­mas juódicas", posiciona-se pela síntese entre as correntes psicológica e condutista, tendo por norma vigente a aceitação pela consciência popular e se aceita pelos Tribunais como base de suas decisões, e por que não, acumulando-se a doutrina Kelseniana 20 elucidativa ao discorrer "dizer que uma norma vale (é vigente) traduz algo diferente do que se diz quando se afirma que ela é efetivamente aplicada e respeitada, se bem que entre vigência e eficácia possa existir uma certa conexão" (...) "Um mínimo de eficácia (como soe dizer-se) é a condição de sua vigência". Prestigia­se, como enriquecedora à linha de pensamento adotada, a lição de José Afonso da Silva 21 ao lecionar "A lei é tanto mais eficaz quanto mais se projeta no meio social, em

•• que deve atuar; quanto mais seus termos abstratos se enriquecem de conteúdo social, do Direito". Cultural, mais eficaz ela é. Sem um mínimo de eficácia, a lei não passará de mera construção teórica".

Complemente-se a opção de plano teórico da "Eficácia Constitucional", com a compreensibilidade Bobbiniana 22 que, após dilucidar o problema da definição do Di­reito enquadrando-o na "Teoria do ordenamento jurídico", e não na 'Teoria da nor­ma", com lucidez, expõe: "O problema da validade e da eficácia, que gera dificuldades insuperáveis desde que se considere uma norma do sistema (a qual pode ser v,ílida sem ser eficaz), diminui se nos referirmos ao ordenamento juódico, no qual a eficácia é o próprio fundamento da validade." 23

Assim, no tablado sobre o qual se erigirá o novo modelo, afivelam-se, essen­cialmente, a "Teoria Realista" eclética de Alf Ross e a "Teoria do Ordenamento

''Teoria de la Verdad Jurídica, p. 180. wSobre el derecho y lajusticia, p. 69. "'Teoria Pura do Direito, p. 29130. "Princípios do Processo de Formação das Leis no Direilo ConstilUcional, p. 236. "Teoria do Ordenamemo Jurídico, p. 29. "Os grifos não são do autor.

Juódico" de Norberto Bobl da Conceituação de Eficá sinonímia as palavras eficá V. "FORTALECIMENTO

CONSTITUIÇÃO" • J'y

CONSTITUIÇÃO-jUE

Com o "tablado" (o~

faz a tessitura do liame ent rio da Constituição Juódic2

Aefetividade das nOI dadania" e da "deformaliZ2 normativa" constitucional,

Ao propor-se a "queb pugnar-se por uma interpn na formação da consciênci para o novo modelo de ef( lateralmente, na chamada ", As reflexões de Konrad He~

zam a "vontade de COnstitl compreensão da necessida

"Além das leorias de Hans Kelsen eJ< Miguel Reale que, com apoio em sua fundamemo = valor), escreve: "O Di sociedade, como algo que se incorpo por conseguime, serformalmente vá eSludos de Maria Helena Diniz, lenda eficacial funções que desempenha "n; normativa relacionada com outros COI

social e com seus endereçados, analis (Norma Constitucional eseus efeitos "Força normativa no sentido posruh de força normativa, deve ser viSla abr axiológico - Cadernos de ConstiruCioI 16À fOIça normativa da Constiruição,p "Conferência proferida, em 16 de abI Verfassungswesen), lendo por lese fu mas sim queslões políticas". Para Las, capacidade de Iegular e de motivar e~

"Doulrina o ProfessoI da Urtiversidad terminologia acima referida, Consti, Elas condicionam-se mutuamente, n de forma absoluta, a Constituição jl como elemento autônomo no cam[X força normativa na medida em que força normativa da constituição ap de vontade de Constituição (Willw z

INSTITUiÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA TOLEDO FERNANDES

DAS NORMAS n1CA CONSTITIJCIONAL \.L. EFETIVIDADE

~ no afincamento das pilastras (teses­'fortalecimento da cidadania", impos­le "Eficácia Constitucional". Xlria Egológica do Direito de Carlos lOS "positividade, vigência, eficácia, to, é com apego ao atraente pensa­nto norteador das teorias realistas no as las teorias realistas están de acuer­ninos de efetividad social de las nar­)correntes psicológica e condutista, lsciência popular e se aceita pelos lue não, acumulando-se a doutrina uma norma vale (é vigente) traduz que ela é efetivamente aplicada e

lossa existir uma certa conexão" (...) condição de sua vigência". Prestigia­adotada, a lição de José Monso da omais se projeta no meio social, em l se enriquecem de conteúdo social, 1Ínimo de eficácia, a lei não passará

da "Eficácia Constitucional", com a idar oproblema da definição do Di­jurídico", e não na "Teoria da nor­:e da eficácia, que gera dificuldades do sistema (a qual pode ser válida namento juridico, no qual a eficácia

novo modelo, afivelam-se, essen­lSS e a "Teoria do Ordenamento

Jnal, p. 236.

Juridico" de Norberto Bobbio 2', para a padronização, como ferramenta de trabalho da ConceituaçJo de Eficácia Constitucional, prima fade compreendendo como sinonimia as palavras eficácia jurídica, eficácia sodal e efetividade. V. "FORTALECIMENTO DA CIDADANIR' E DEFORMALIZAÇÃO DA

CONSTITUIÇÃO" • MODELO DE EFETMDADE SUBSUMÍVEL À CONSTITUIÇÃO-JURÍDICA

Com o "tablado" (opção teórica de Eficácia Constitucional) pronto, mister se faz a tessitura do liame entre os "pilares" da deformalização" e "cidadania" no cená­rio da Constituição Jurídica.

Aefetividade das normas Constitucionais resultante do "fortalecimento da ci­dadania" e da "deformalização da Constituição", constitui-se em modelo de "força normativa" constitucional, é importante ressaltar 25

Ao propor-se a "quebra" da moldura legislativa-estatal (Direito Social); ao pro­pugnar-se por uma interpretação criativa-histórica (deformalização), e ao centrar-se na formação da consciência-constitucional (projeto social-ideológico) do cidadão, para o novo modelo de efetividade da Constituição, risco haverá em buscá-la, uni­lateralmente, na chamada "Constituição-real", alheando-se à"Constituição-jurídica". As reflexões de Konrad Hesse 26, face ao pensamento de Ferdinand Lassalle7 enfati­zam a "vontade de Constituição" 28 - presente na consciência geral e originária da compreensão da necessidade e valor de uma ordem normativa inquebrantável, a

UAlém das teorias de Hans Kelsen eJosé Monso da Silva, trazidas para o texto, indispensáveis os estudos de Miguel Reale que, com apoio em sua visão tridimensional do Direito (vigência = norma; eficácia = fato; fundamento = valor), escreve: "O Direito autêntico não é apenas declarado, mas reconhecido, é vivido pela sociedade, como algo que se incorpora e se integra na sua maneira de conduzir-se... Aregra de direito deve, por conseguinte, serfonnalmente válida e socialmente eficaz (Lições Preliminares de Direito, p. 113); estudos de Maria Helena Diniz, tendo por base as lições de Tércio Sampaio FerrazJr, propõe ao fenõmeno eficacial funções que desempenha "não só no contexto normativo, mas também a leitura ideológica da significação normativa relacionada com OUtros comandos, com a realidade social, com o valor nela positivado, com seu emissor social e com seus endereçados, analisando assim o papel dos fatores extranormativos na justificação da eJicácia". (Norma Constitucional e seus efeitos, p. 34). "Força nonnativa no sentido postulado por Anna Carla Agozzi, in veriJÍs: Aconstituição, ao ser considerada de força normativa, deve ser vista abrangendo a realidade social que lhe dê o conteúdo fático e o sentido axiológico - Cadernos de Constitucional e Ciência Política, v. 14, p. 202. "À força normativa da Constituição,passim. "Conferência proferida, em 16 de abril de 1862, em Berlim, sobre a essência da constituição (Vber das Verfassungswesen), tendo por tese fundamental serem as "questões constitucionais não questões jurídicas, mas sim questões políticas". Para Lasalle, a Constituição Jurídica não passa de "um pedaço de papel" - sua capacidade de regular e de motivar está limitada à sua compatibilidade com a Constituição real. ~Doutrina o Professor da Universidade de Freiburg eJuiz Ex-Presidente da Cone Constitucional Alemã: Para usar terminologia acima referida, COTlStituição real e COTlstituição juridica estão em uma relação de coordenação. Elas condicionam-se mutuamente, mas não dependem, pura esimplesmente, uma da outra. Ainda que não de forma absoluta, a Constituição juridica tem significado próprio. Sua pretensão de eficácia apresenta-se como elemento autônomo no campo de forças do qual resulta a realidade do Estado. A Constituição adquire força normativa na medida em que logra realizar essa pretensão de eficácia, ( ..) Portanto, a intensidade da força normativa da constituição apresenta-se, em primeiro plano, como uma questão de vontade normativa, de vontade de Constituição (Willw zur Veifassung). - Aforça normativa da Constituição, p. 15-24.

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carecer de constante processso de legitimação e do concurso da vontade humana ­tanto mais estruturável quanto florescente a cidadania. Na modelagem da efetivida­de das normas constitucionais, ora proposto, no pressuposto da deformalização constitucional, instiga-se o exegeta à incorporação do "estado espiritual" do seu tempo, com busca aos princípios fundamentais explícitos e implícitos, e submetida ao princípio da "ótima concretização da norma".

Por conseguinte, dos pressupostos do "fortalecimento da cidadania" e "defor­malização da Constituição" derivam força "normativa" constitucional a desmistificar a força "da realidade" constitucional. Realmente, emanando o projeto social ideológico (concepção substancial de Constituição) da conscientização popular e interpretada a norma constitucional de forma a concretizar satisfatoriamente o sentido da propo­sição normativa dentro das condições reais presentes numa determinada situação e num determinado momento histórico, não há de se falar em descoincidência da "Constituição real" e "Constituição-Jurídica", Todavia, se a vontade normativa atingiu o limite interpretativo inevitável, afigurar-se-á a revisão constitucional, com ruptura da situação jurídica vigente. Se do quadro social brotar alteração do projeto social ideológico, transmudam-se as problemáticas constitucionais de "questões jurídicas" em "questões de poder". Porque condicionantes naturais, exauridos os limites da força normativa da Constituição, reconhecível o sucumbimento da Constituição jurídica face à Constituição real.

VI. A"DEFORMAIlZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO" EA HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL

Para o modelo de efetividade a desenhar-se, tendo como um dos pressupos­tos a "deformalização da Constituição", convenhável a explicitação terminológica rente à Teoria da Interpretação Constitucional.

Ab initio, afugentem-se liames à "destronização" da Constituição (intangível en­quanto Lei Maior com função estabilizante e integradora), à "Crise de Constituição" ("impulso tanático" ou "corrida para amorte da Constituição" 29, ou ao apregoado ana­cronismo constitucional decorrente da criação de ordens jurídicas supranacionais. Se­quer se polariza a deformalização da Constituição, lado a lado, ao alardeamento, por Burdeau, dos riscos quanto à progressiva ideologização das Constituições, ou à teoria de Loewenstein, de cedência da força normativa da Constituição.

Oprincípio 10 da "deformalização da Constituição", focalizado na seara da her­

~CANOTILHO, J,J. Gomes, caracterizando como ilegítima a ilação de que a lei fundamemal " hoje um instrumen­to pervertido, inútil e obsoleto, emende-se que, algumas vezes, esse impulso tanlltico ou cvrrida para a morte da constjmição, de que falam os amores, assenta-se numa pré-compreensão (ou pré-compreensões) de Estado e de sociedade que hoje está perdida: a pré-compreensão liberal da radical separação entre Estado - sociedade, a pré-compreensão hegeliana e organicista da integração harmonizame e totalizame das leis, a pré-compreensão normativista - positivista e 3 pré-compreensão sociológico - positivista -Direito Constitucional, p. 78. '"A desformalização da constituição anglria namreza de princípio por servir de ratio e fundamento ao modelo de efetividade propugnado, e pelo acentuado gr<JU de abstração, de indesmenúvel caráter jurislilosófico.

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Perceptível, facilmer Gurvitchiniano 12

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liÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA TOLEDO FERNANDES

ncurso da vontade humana ­Na modelagem da efetivida­ssuposto da deformalização ) "estado espiritual" do seu tos e implícitos, e submetida

[lento da cidadania" e "defor­onstitucional a desmistificar a do o projeto social ideológico ação popular e interpretada a iamente o sentido da propo­[luma determinada situação e falar em descoincidência da ia, se a vontade normativa 1 revisão constitucional, com ai brotar alteração do projeto :onstitucionais de "questões lantes naturais, exauridos os lecível o sucumbimento da

do como um dos pressupos­a explicitação terminológica

la Constituição (intangível en­:a), à "Crise de Constituição" ição" 29, ou ao apregoado ana­sjurídicas supranacionais. Se­a lado, ao alardeamento, por jas Constituições, ou à teoria stituição. ,", focalizado na seara da her­

lei fundamental i- hoje um instrumen­IV tanático ou CU/Tida para a morte ) (ou pré-compreensões) de Estado e ,paração entre Estado - sociedade, a uizame das leis, a pré-compreensão ?ito Constitucional, p. 78. 'ir de ratio efundamento ao modelo entivel caráter jurisfilosóJico.

menêutica constitucional, e partindo da premissa de que se projeta na parte dogmá­tica das Constituições onde se engastam os "direitos fundamentais", e :l estrutura normativa-material aberta, fragmentária e indeterminada e com predominante ape­go ao "direito vivo" (efetividade = teoria de resultado), torna plausível sua decodi­ficação no seguinte ideário:

P) Acolhe a ciência de Peter Haberle da "Sociedade aberta dos Intérpretes da Constituição".

Estruturando-se nos pensamentos que "todo aquele que vive a Constituição é seu legítimo intérprete; de que "não existe norma jurídica, senão norma jurídica inter­pretada" e formulando conceitualmente, interpretação com as palavras "quem vive a norma acaba por interpretá-la ou pelo menos por co-interpretá-Ia", propõe aseguinte tese: "no processo de interpretação constitucional estão potencialmente vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível estabelecer-se um elenco cerrado ou fL'(ado com numerus clausus de intérpretes da Constituição. Interpretação constitucional tem sido, até agora, consci­entemente, coisa de uma sociedade fechada. Dela tomam parte apenas os intérpretes jurídicos "vinculados às corporações" (Zünftmassige Interpreten) e aqueles partici­pantes formais do processo constitucional. Ainterpretação constitucional é, em reali­dade, mais um elemento da sociedade aberta. Todas as potências públicas, participan-' tes materiais do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, ele­mento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade (... Weil ve~fassung-sinterpretation diese o.ffene Gesellschaft immer von newem mitkollStituiert und on íhr KOllStítuiert wird). Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade" ll.

Perceptível, facilmente, o encaixe da doutrina Haberliana ao Direito Social Gurvitchiniano l2, pois a legitimação da incorporação das normas pelos atores sociais que as auto-instituem (normatização social), com negação às noções de completude e unicidade, encontrará ancoradouro seguro na interpretação pluralista e procedi­mental da Constituição dentro do redimensionamento hermenêutica da Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição de Peter Haberle.

2a) Compactua com o método tópico-problemático de Theodor Vieweg ll , no qual a norma se põe como um topoí do discurso jurídico constitucional, privilegiando a discussão dos problemas, ensejando a compreensão do justo num contexto aberto argumentativo. Reforçam Podlech l" com o ensino "Uma teoria jurídica que fique limi­tada à lógica normativa perde de vista a vinculação social da jurisdição. Anegação da ideologia da subsunção não significa que oS órgãos de aplicação do direito devam atuar como "geradores de causalidade" e Peter Haberle l5 ''A vinculação judicial à lei e

'[Hermenêutica Constitucional, p. 13. )'Pedra básica do presente estudo. "Tópica de Jurisprudência, passim. "A. R. 95 [1970), p. 185 [190f], apud, n.r. nO 50 da obra de Peter Haberle, Hermenêutica Constitucional, p. 32. l5Op. cit.,p. 31 e33.

251

252 INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA TOLEDO FERNANDES

à independência pessoal e funcional dos juízes não podem escamotear o fato de que o juiz interpreta a Constituição na esfera pública e na realidade (... in der Offentlichkeit und Wírklichkeit die verfassung interpretiert). (.. .) "Do ponto de vista teorético-constitucional, a legitimação fundamental das forças pluralistas da sociedade para participar da interpretação constitucional reside no fato de que essas forças rep­resentam um pedaço da publicidade e da realidade da Constituição (ein Stück Offentlichkeit und Wirklichkeit der Verfassung), não podendo ser tomadas como fatos brutos, mas como elementos que se colocam dentro do quadro da Constituição...".

Y) Aglutina os métodos hermenêutico-concretizador (Hesse/Canotilho) e científico-espiritual, na medida em que, através de uma tarefa criadora, o intérprete, perpassando pela "pré-compreensão" do texto normativo, "concretiza" a norma dentro de uma realística (concreta) conjuntura (situação histórica), associando os dados axiológicos subjacentes à Constituição e sua ressonância no processo de vivência comunitária (caracteres espirituais), conectando "texto e contexto" (norma e realidade) compondo o chamado "circulo-hermenêutica".

43) Realçados são os princípios da "máxima efetividade" e da "força normati­

va", sintetizados no máximo rendimento sócio-jurídico às normas constitucionais (hiperpotencialização), com eleição da exegese de maior eficácia ou efetividade, e assegurando a primazia às soluções que densificam o conteúdo normativo.

53) Apregoa a atividade criadora do juiz, também chamada de ativismo judicial. Sem se correr o risco de penetrar temas clifíceis, aprofundados, ligados àcriati­

vidade jurisprudencial, tais como a "revolta contra o formalismo" (Morton G. White), legitimação democrática, debilidades e virtudes do Direito Jurisprudencial, "politiza­ção" do juiz, tendência aproximativa dos sistemas da "Civil Law" e da "Common Law", suficiente para o presente estudo, de pronto, assentar camo subprincípios: a) caráter acentuadamente criativo da Justiça Constitucional das Liberdades e b) o novo papel dos Juízes na proteção dos interesses coletivos e difusos e nos conflitos de classe.

Com Mauro Cappelletti 36, fundamente-se a tarefa criativa do juiz. Doutrina o mestre italiano de leitura obrigatória: ''A resposta dada neste ensaio à indagação de que se a tarefa do juiz é interpretar ou criar o clireito, posidona-se no sentido de que o juiz, inevitavelmente, reúne-se em si uma e outra função, mesmo no caso - que constitui, quando muito, regra não sem muitas exceções - em que seja obrigado a aplicar lei pré-existente. Nem poderia ser de outro modo, pois a interpretação sem­pre implica um certo grau de discricionariedade e escolha e, portanto, de criativi­dade, um grau que é particularmente elevado em alguns domínios, camo a justiça constitucional e a proteção judiciária de clireitos sociais e interesses difusos".

No clireito pátrio, elucidativos ensinamentos propugnam pela ampliação dos poderes instrutórios do juiz. Exemplificadamente: ''A escassez de iniciativas probató­rias oficiais, mesmo quando manifesta a sua conveniência, tem sido apontada como

"Juízes Legisladores, p. 128.

uma das causas do mau funci necessita ser alterada, a fim de sual" -José Roberto dos Santo exige imparcialidade no que e estabelecer clistinções em ralá personalíssimas.l'íão se lhe tole

Prestativo ao Direito so constitucional, a ampliação do: do juiz no papel de "inanimad a figura do juiz comprometido

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Fecundo no tema quant co do Jurisfilósofo da Universi hecimento jurídico tem come humana e, portanto, como ob duo em sua integridade. É COI

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VII. FORTALECIMENTO DA

Propende àefetividade e sodal ideológico, o fortaledml

Não se infira a desconô lar das "coisas" do Estado (org. tais e Liberdades Públicas é m;

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"Poderes Instrutórios do Juiz, p. 82. "'A InsU11mcmalidadc do Processo, p. 275 "Op. cíl, pp. 59/60 ~Razão Jurídica e Dignicilde Humana, pp. Geral do Estado de São Paulo.

rUlçÃO TOLEDO DE ENSlNO IARA T OLEDO FERNANDES

Idem escamotear o fato de que 1 e na realidade (... in der -etiert). (.. .) "Do ponto de vista ;forças pluralistas da sociedade 10 fato de que essas forças rep­e da Constituição (ein Stück dendo ser tomadas como fatos lo quadro da Constituição... ". etizador (Hesse/Canotilho) e la tarefa criadora, o intérprete, nativo, "concretiza" a norma lção histórica), associando os ressonância no processo de

Ido "texto e contexto" (norma utico". tividade" e da "força normati­co às normas constitucionais aior eficácia ou efetividade, e conteúdo normativo. chamada de ativismo judicial. lprofundados, ligados à criati­malismo" (Morton G. White), ~ito Jurisprudencial, "politiza­vil Law" e da "Common Law", orno subprincípios: a) caráter iberdades e b) o novo papel ;e nos conflitos de classe. acriativa do juiz. Doutrina o neste ensaio à indagação de siciona-se no sentido de que nção, mesmo no caso - que es - em que seja obrigado a lo, pois a interpretaç,'io sem­JJha e, portanto, de criativi­1S domínios, como a justiça e interesses difusos". )ugnam pela ampliação dos assez de iniciativas probató­ia, tem sido apontada como

uma das causas do mau funcionamento do mecanismo judiciário. Essa mentalidade necessita ser alterada, a fim de que o magistrado assuma seu papel na relação proces­sual" -José Roberto dos Santos Bedaque 37; "O juiz moderno compreende que só lhe exige imparcialidade no que diz respeito à oferta de iguais oportunidades e recusa estabelecer distinções em razão das próprias pessoas ou reveladoras de prefer~ personalíssimas. Não se lhe tolera, porém, aindiferença -Cândido Rangel Dinamarco 38.

Prestativo ao Direito social, ao modelo de efetividade com a deformalização constitucional, a ampliação dos poderes do juiz, derrubando-se a ficção tradicionalista do juiz no papel de "inanimada boca da lei", do juiz em posição búdica, erguendo-se a figura do juiz comprometido com o momento histórico, com a realidade social.

À concreção da "Justiça Constitucional das liberdades", dada a caracterização dos textos normativos como vagos, fluídos, programáticos imprescindível elevado grau de ativismo e criatividade jurisdicionais. Nas palavras de Cappelletti 39 "A outra alternativa, pelo contrário, é a de que os próprios juízes sejam capazes de "crescer", erguendo-se à altura dessas novas e prementes aspirações, que saibam, portanto, tornar-se eles mesmos protetores dos novos direitos "difusos", "coletivos" e "fragmentados", tão característicos e importantes da nossa civilização de massa, além dos tradicionais direitos individuais".

Fecundo no tema quanto à proteção dos "Direitos do Homem", alerta-poéti­co do Jurisfilósofo da Universidade de São Paulo Márcio Sotelo Felippe {o "O con­hecimento jurídico tem como objeto imediato a ordem normativa da dignidade humana e, portanto, como objeto mediato a comunidade humana, ou cada indiví­duo em sua integridade. É com este sentido que se pode dizer que a totalidade é objeto e condição do conhecimento jurídico.

Para dizê-lo com Goethe: "Se no todo te quiseres dessedentar, no mais pe­queno hás de o todo buscar".

VII. FORlALEClMENTO DA CIDADANIA· PROJETO SOCIAL IDEOLÓGICO

Propende àefetividade da Constituição, vista no seu âmago como um Projeto social ideológico, o fortalecimento da cidadania.

Não se infira a desconexão jurídica a este princípio. Aconscientização popu­lar das "coisas" do Estado (organizacional) e o aprendizado dos Direitos Fundamen­tais e liberdades Públicas é matéria jurídica.

Compõe a cidadania e sua expansão a fazer do profissional do Direito, no mo­delo do Direito Social, Direito desmoldurado dos lindes oficiais, o direito bratante e vivenciado.

"Poderes Instrutórios do Juiz, p. 82. "AInsrrumentalidade do Processo, p. 275 "op. cit., pp. 59160. "Razão Jurídica e Dignidade Humana, pp. 1091110. O autor é Presidente do Colégío de Procuradores e Procurador Geral do Estado de São Paulo.

253

I

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENS1NO254

Dir-se-á, corresponder à ciência da Sociologia Jurídica (ou Etnologia Jurídica), à sua vez, àPolítica Legislativa, mas, com proficiência, explicitaJosé de Oliveira Ascenção 41

A"Sociologia Jurídica tem grande importância, não só para a Política Legislativa, como para a própria ciência do direito. Se o direito é uma ordem da sociedade, é preciso co­nhecer a sociedade para conhecer o direito. Aregra legal, por exemplo, não pode ser vista como algo de separado e que tem em si um sentido perfeito, mas como uma base cujo sentido só será plenamente captado através do confronto com dada situação social".

Portanto, misturar-se com a população, auscultar a sua prática jurídica, com­partilhar o aprendizado democrático e da cidadania é o mais significativo papel do jurista no limiar do século XXI. Com o seu talento criativo e sensibilidade para as amarguras sociais, o jurista é o mais aperfeiçoado profissional para a acuidade do "transbordar" do direito em relação ao fato. Na sociedade moderna, multifacetária,

nl transnacional, globalizada, perplexa e complexa, nos múltiplos setores do direito (agrário, ambiental, financeiro-bancário, fundamentais do homem, sociais, etc.) , usará o jurista o instrumental da sociologia jurídica, da etnologia jurídica (antropolo­gia cultural) para os lindes do campo investigatório, desenhando a ordem social, sentida e vivida como direito, que poderá estar solidamente implantada e até, quiçá, contrastando (e até freqüentemente) com o direito oficial.

E aos Procuradores do Estado? Juristas vocacionados ao interesse-público­social, com aguçada sensibilidade para as mazelas do viver diário, têm, nesse novo papel, acentuada responsabilidade. Aefetividade da Constituição, pelo estigma pú­blico que norteia sua atuação profissional, é o mais excelso mandamento do ideário

,. na sua missão institucional 42.

VIII. AS NORMAS CONSTITUCIONAIS ENQUANTO INSTRUMENTO DE REAIlZAÇÃO POÚTICA E O MODELO DE EFETMDADE PROPOSTO· ANÁUSE CRÍTICA

Responderá o modelo de efetividade cotejado àvisão das normas constitucio­nais enquanto instrumento de realização política? Projetou-se no item "Delimitação do campo da reflexão", como meta de estudo, a visualização do momento em que as normas constitucionais adquirem feição de instrumento de realização política (realização do projeto social ideológico agasalhado no leito constítucional). Ares­posta afirmativa parece verdadeira. Ao privilegiar-se, no modelo proposto, a cidada­

"O Direito, introdução e teoria geral, p. 86. "Permitindo-nos, reverentemente, narrar aos Congressistas dos outros Estados presentes neste XXN Congresso Nacional de Procuradores do Estado, o magrúfico trabalho desenvolvido pela Procuradoria do Estado de São Paulo, através do Procurador Geral Df. Márcio Sote1o Felippe e Dr". Márcia Junqueira Z Zonattifd em co-partici­pação com o Governo Estadual e Imprensa Oficial com o lançamento e distribuição de 50.000 cartilhas Conheça seus Direitos e do livro Instrumentos InternacionaL, de Proteção dos Direitos Humanos, órgãos oficiais, agentes políticos e representações comunitárias já nesse caminhar de tlorescimento da cidadania, e, consequentemente, trabalhando a efetividade da Constituição.

IARA TOLEDO FERNANI

nia e o seu fortalecimento correlatamente tenderá à social para a efetividade e Com a junção do princíI como eixo gravitacional, encontro da fusão do Est

IX. AS ESTRATÉGIAS D E DA DESCONSTIT PROPOSTO

José Eduardo Faria, após delinear limitações e do o Estado ao atingimenl qüência, pelos governante tura do direito positivo e [ ais, e o recurso às estratég nalização, levados a efeite públicos, termina o texto tipo de ordenamento?". D( e subsistemas sócio-econê processo de desregulame pergunta do seguinte racio microssistemas legais e es~

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uridica (OU Etnologia Jurídica), à plicitaJosé de Oliveira Ascenção 41

)para a Política Legislativa, como rdem da sociedade, é preciso co­egal, por exemplo, não pode ser do perfeito, mas como uma base fronto com dada situação social", tar a sua prática jurídica, com­é o mais significativo papel do :riativo e sensibilidade para as rofissional para a acuidade do ~dade moderna, multifacctária, s múltiplos setores do direito ais do homem, sociais, etc.) , 1etnologia juridica (antropolo­, desenhando a ordem social, mente implantada e até, quiçá, ,ficiaL ionados ao interesse-público­viver diário, têm, nesse novo

:onstituição, pelo estigma pó­celso mandamento do ideário

ro INSTRUMENTO IE EFETMDADE

visão das normas constitucio­~tou-se no item "Delimitação ização do momento em que nento de realização política leito constitucional). Ares­modelo proposto, a cidada­

los presentes neSle XXIV Congresso I Procuradoria do ESlado de São mqueira ZZonaltifd em co·partid· ibuição de 50.000 cartilhas Conheça os Humanos, órgãos oficiais, agentes la cidadania, e, consequememente,

nia eo seu fortalecimento, e compreendida esta como "mecanismo de mobilização", correlatamente tenderá à busca da realização política, dentro do prisma da pressão social para a efetividade da força normativa da Constituição (Constituição jurídica). Com a junção do princípio da deformalização, com seus sub-princípios, ver-se-á, como eixo gravitacional, o projeto social ideológico constitucional, ensejador do encontro da fusão do Estado Democrático de Direito e Estado Social.

IX. AS ESTRATÉGIAS DA DESREGUIAMENTAÇÃO, DA DESLEGAUZAÇÃO E DA DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO E O MODELO DE EFETIVIDADE PROPOSTO

José Eduardo Faria, no artigo intitulado "Direito positivo na economia global" 4J,

após delinear limitações estruturais do direito positivo e suas instituições, conduzin­do o Estado ao atingimento dos limites de sua soberania político-juridica, e a conse­qüência, pelos governantes, da revisão da politica legislativa, para reformular a estru­tura do direito positivo e redimensionar o campo de ação de suas instituições judici­ais, e o recurso às estratégias de desregulamentação, deslegalização e desconstitucio­nalização, levados a efeito paralelamente à promoção da ruptura dos monopólios públicos, termina o texto com a inquietante interrogação "Que futuro pode ter esse tipo de ordenamento?". Decorre o questinamento da intricada articulação de sistemas e subsistemas sócio-econômicos nos planos interno e externo, conseqüência desse processo de desregulamentação, deslegalização e desconstitucionalização. Brota a pergunta do seguinte raciocínio tecido pelo autor: ':Assumindo aforma de redes, esses microssistemas legais e essas cadeias normativas se caracterizam peja extrema multi­plicidade e heterogeneidade de suas regras; pela evidente provisoriedade e mutabili­dade de suas engrenagens normativas; pelo acolhimento de uma pluralidade de pre­tensões contraditórias e, muitas vezes, excludentes. Num ordenamento jurídico com tais características, por isso mesmo, as tradicionais idéias do "bem comum" e de "inte­resse geral e universal" das leis não conseguem mais exercer o papel de princípios toralizadores", destinados a integrar e harmonizar interesses específicos. Elas podem até continuar preservadas retoricamente nos textos legais, sobrevivendo aos proces­sos de desregulamentação, deslegalização e desconstitucionalização. Contudo, não têm o mesmo peso simbólico e funcional detido à época do advento do Estado cons­titucional, da democracia representativa e das modernas declarações de direitos. Que futuro pode ter esse tipo de ordenamento?"

Frente a esse quadro, ao qual se acrescente, por necessária constatação, e ainda com apoio na lúcida argumentação deJosé Eduardo Faria", aImposição de condições e limites à atuação dos Estados pelo processo decisório do sistema econômico finan­ceiro mundial, com nitidez revelada pela crise asiática. Sistema econômico-financeiro

"Jornal oEstado de São Paulo, 31/8;')7, p, 2 "Artigo "4 crise e o tempo, jornal O Estado de São Paulo, 20/1/98, p, 2,

255

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA TonDO FERNANDES256

desterritorizado e policêntrico, com referência no aqui-e-agora, não se compatibilizan­do, muita vez, com os processos legislativo e judicial. Estreita-se o campo da política (perda da autonomia decisória dos Estados) augurando alguns a "morte" da política, antevendo outros a substituição da democracia representativa por um sistema de au­toridades justapostas e de soberanos supra-estatais privados e difusos, representados pelos agentes econômicos. Os esquemas cognitivos, afirma o Mestre de Filosofia do Direito e Sociologia Jurídica da USP, "com que aprendemos a interpretar a política, com suas tradicionais distinções entre Estado e sociedade, público e privado, legal e legítimo, nacionaI e internacional, hoje são simples demais para propiciar uma respos­ta a essa indagação" (refere-se o autor àindagação: "Quem estará certo?").

Frente a essa complexidade conjuntural, tanto mais preocupante quando se aprende com o mesmo mestre que esse "presente onipresente" (repetindo o termo

'lO de autoria de Raffaele Di Diorgi, Norbert Lechner e Boaventura Santos) "é avassala­dor" e que "destrói as condições vitais para a existência da própria democracia" 45,

numa visão crítica, põe-se em questão o modelo de eficácia constitucional propos­to. Será, também, simplista demais para a complexidade desse "presente contínuo" (vive-se somente o presente, o futuro é fumaça?).

Realmente, se até a desconstitucionalização é componente dessa vertente avas­saladora do "agora" com os mercados financeiros tomando o lugar do Estado, se, de repente, poder-se-á questionar a própria existência da Constituição nessa proposição sem dimensão, sem fronteiras de passado, presente e futuro, sem supedâneo para o processo histórico; se aprendizagem cívica e legitimação institucional podem ser subs­

I.'t tituídas pelo cálculo frio e objetivo das oportunidades (tudo resumído num tempo real, qualidade e rapidez das informações); se a tendência no desenvolvimento do di­reito aponta para o ritmo de regressão dos direitos sociais e dos direitos humanos 46,

uma tendência ao desalento pode precipitar a capitulação do novo modelo de efetivi­dade constitucional. Desperto do momentâneo desalento, cristalina se põe a versão de sobrevida desse modelo. Arrisca-se mais, afirmando a sua relevância. Ora, se os di­reitos humanos, por exemplo, correm o risco de ser enfraquecidos com a relativização de soberania do Estado, somente o princípio do fortalecimento da cidadania poderá conter esse risco. Ademais, o princípio da deformalização da Constituição decompos­to nos subprincípios retro delineados permitirá acreditar-se, a mantença, a revitaliza­ção da força normativa constitucional acompanhando o desenvolvimento do direito, nas suas tendências de "reprivatização", de redução do grau de coercibilidade do direi­to positivo, de desfiguração do direito do trabalho e dos direitos sociais 47.

li'

"Anigo A crise e o tempo, jornal OEstado de São Paulo, 20/1/98, p. 2. "A percepção é de José Eduardo Faria no artigo Para onde vai o direito', in: jornal OEstado de São Paulo, 15/8/97, p. 2. "A propósito o excelente anigo, Odireito de ter direitos de Márcio Sotelo Felippe, in: Folha de São Paulo, de 26(2/96, p. 2.

X. ÀGUISA DE CONCLUSJ

Omodelo de efetividadl ta-se à apreciação pelos emine curadores do Estado, de evidl pelo aniversário de dez anos d ''A Democracia e a Cidadania efetividade no Direito Constitt para a cadente temática da reÍl tivo pela galhardia com que o mento da cidadania, e incitadc seu reflexo na atual sociedade cialmente a dados históricos, c

Omodelo, em síntese, tI rídico e a força normativa da C pios estendem-se: (1) a defol cidadania. Do primeiro, em lec

Graficamente,desenhe-s

Moc - reinvençã,

Constituiçã

t Normas Co realização jl

deformai. consto fón

Estado Derr Direito =E

Direito Social

Numa só expressão, aefe cado, em versão representativa perada ânsia de alcançar o just<

"A frase é de Sérgio Gischkow Pereira, a ~

Federal de Uberlândia, v. 12, p. 178.

,TITUlÇÃO TOLEDO DE ENSINO IARA T OLEDO FERNANDES

~ui-e-agora, não se compatibilizan­al. Estreita-se o campo da política mdo alguns a "morte" da política, resentativa por um sistema de au­privados e difusos, representados s, afirma o Mestre de Filosofia do mdemos a interpretar a política, :iedade, público e privado, legal e jemais para propiciar uma respos­"Quem estará certo?"), Ito mais preocupante quando se onipresente" (repetindo o termo ~ Boaventura Santos) "é avassala­tência da própria democracia"45, le eficácia constitucional propos­idade desse "presente contínuo"

componente dessa vertente avas­lmando o lugar do Estado, se, de h Constituição nessa proposição e futuro, sem supedâneo para o ção institucional podem ser subs­jes (tudo resumido num tempo ênda no desenvolvimento do cli­50ciais e dos clireitos humanos 46,

!ação do novo modelo de efetivi­lIento, cristalina se põe a versão lo asua relevância, Ora, se os cli­:nfraquecidos com a relativização alecimento da cidadania poderá lçãO da Constituição decompos­:!itar-se, a mantença, a revitaliza­) o desenvolvimento do clireito, )grau de coercibilidade do clirei­ios clireitos sociais 47

", in: jornal OEstado de 5/io Paulo,

lo Felippe, in: Folha de 5/io Paulo, de

x. ÀGUISA DE CONCLUSÃO

Omodelo de efetividade das normas constitucionai" que, reverentemente, ofer­ta-se àapreciação pelos eminentes Congressistas do XXIV Congresso Nacional de Pro­curadores do Estado, de evidentíssima relevância ao Constitucionalismo pátrio, quer pelo aniversário de dez anos da Constituição-cidadã de 1988, quer pelo temário geral, 'A Democracia e a Cidadania no Brasil", mira uma modesta contribuição à teoria da efetividade no Direito Constitucional com acentuada preocupação àcolheita de dados para acadente temática da reínvenção da democracia, neste momento histórico, fes­tivo pela galharclia com que o regime democrático viceja, reafirmado com o floresci­mento da cidadania, e incitador àreflexão dos operadores científicos da Lei Maior pelo seu reflexo na atual sociedade brasileira mudancista, finissecular, amalgamado essen­cialmente a dados históricos, complexa e multifacetária,

O modelo, em síntese, tem como embasamento o Direito Social- pluralismo ju­rídico e a força normativa da Constituição Juríclica, Desse tronco, dois ramos -princí­pios estendem-se: (1) a deformalização da Constituição e (2) o fortalecimento da cidadania, Do primeiro, em leque se abrem sub-princípios, quais sejam,

Graficamente, desenhe-se:

Modelo de Efetividade Constitucional - reinvenção da democracia para o terceiro milênio ­

deformal, const. ~ rtalec. cidadania

Direito Social (pluralismo jurídico)

NormasConstitucionais = realização política

Estado Democrático de Direito = Estado Social

Direito Social Constituição Juríclica ______Direito Social = pluralismo juríclico

Numa só expressão, a efetividade das normas constitucionais, no modelo decal­cado, em versão representativa "é vida, ésociedade, é valoração, é incessante e deses­perada ânsia de alcançar o justo" 48,

"A frase é de Sérgio Gischkow Pereira, a respeito do direito, in: Rwista do Curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, v, 12, p, 178,

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INSTITUiÇÃO TOlEDO DE ENSINO258

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